Presidente Prudente 2016 Câmpus de Presidente Prudente MARCUS VINÍCIUS ANTUNES DE MORAES MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE PROCESSOS EROSIVOS MARGINAIS EM RESERVATÓRIOS DE USINAS HIDRELÉTRICAS POR MEIO DE VARREDURA A LASER Programa de Pós-Graduação em Ciências Cartográficas (PPGCC) Presidente Prudente 2016 Câmpus de Presidente Prudente MARCUS VINÍCIUS ANTUNES DE MORAES MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE PROCESSOS EROSIVOS MARGINAIS EM RESERVATÓRIOS DE USINAS HIDRELÉTRICAS POR MEIO DE VARREDURA A LASER Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Cartográficas (PPGCC) da FCT/UNESP de Presidente Prudente, sob orientação do Prof. Dr. Antonio Maria Garcia Tommaselli, para obtenção do título de Mestre em Ciências Cartográficas. ii FICHA CATALOGRÁFICA Moraes, Marcus Vinícius Antunes de. M822m Monitoramento e avaliação de processos erosivos marginais em reservatórios de usinas hidrelétricas por meio de varredura a laser / Marcus Vinícius Antunes de Moraes. - Presidente Prudente: [s.n], 2016 96 f. Orientador: Antonio Maria Garcia Tommaselli Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia Inclui bibliografia 1. Monitoramento. 2. Erosões marginais. 3. Escâner laser. I. Moraes, Marcus Vinícius Antunes de, II. Tommaselli, Antonio Maria Garcia. III. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Tecnologia. IV. Título. iii iv DEDICATÓRIA À minha família, que teve participação fundamental em minha trajetória acadêmica: Aos meus pais, Lúcia e Eduardo, alicerce desta caminhada; À minha irmã Carol, modelo de dedicação; Aos meus avós, Aparecida e Antônio, Juraci e Suvarine (In memoriam), e a minha Bisavó, Olívia (In memoriam), que nunca permitiram que eu desistisse. v AGRADECIMENTOS Às instituições que financiaram e possibilitaram esta pesquisa, Duke Energy – Geração Paranapanema, ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), CAPES, e Fundunesp. Aos companheiros do P&D, professores Antônio Manoel e João Osvaldo por me presentearem com seus conhecimentos técnicos e experiências de vida. À Nice pela maestria e prontidão em solucionar as pendências administrativas e financeiras de toda a equipe. Aos companheiros, da Duke, Guilherme e Otacílio, por proverem a infraestrutura e os conhecimentos acerca da região de estudos. Ao Mauricio Rúbio e ao Prof. Tadeu Tommaselli, pela oportunidade de atuar no projeto e pela confiança em mim depositada. Aos colegas do Programa de Pós-Graduação em Ciências Cartográficas pelos momentos de discussões e descontração. Aos amigos Érico, Fabrício Prol e Renan Furlan, com quem por horas a fio discuti questões técnicas e de relevância à minha vida pessoal e acadêmica. Aos amigos do grupo de pesquisa, Adilson, Marcato, Raquel, Mariana e Fernanda, que me auxiliaram no desenvolvimento deste trabalho. À Lara Lopes e ao Lucas Silva, bolsistas de iniciação científica com os quais tive a oportunidade e o prazer de trabalhar de forma mais próxima. Aos docentes do Departamento de Cartografia, em especial aos professores Paulo Camargo, Galera e Maurício Galo, que contribuíram de forma direta ou indireta com avaliações do trabalho, sugestões de bibliografias e recomendações. Ao meu orientador, Prof. Antonio Tommaselli, com que tive prazer e privilégio de trabalhar por sete longos e proveitosos anos, desde a Iniciação Científica. À Gabi Takahashi, a quem atribuo uma parcela considerável dos frutos deste trabalho. Pelo convívio diário, carinho, compreensão, auxílio técnico e puxões de orelha, sem os quais esta jornada teria sido bem mais difícil e desinteressante. Por fim, em destaque, à minha família, sem a qual não teria realizado nem uma fração de tudo isso. À minha avó pelo carinho e atenção, desde as coisas mais simples como preparar meu prato predileto, ao abraço terno e reconfortante de uma mãe. À minha irmã e meu cunhado pelo auxílio, apoio, incentivo, consideração e, principalmente, compreensão nos momentos que estive ausente focado no desenvolvimento deste trabalho. Aos meus pais, exemplos para minha vida, e aos quais não tenho palavras para agradecer por tudo, o amor e carinho durante toda a vida, a educação, os conselhos e até as broncas. Muito obrigado! vi RESUMO As erosões marginais são causadas por uma série de fatores que impactam ou atenuam o processo, tais como o tipo de erosão, a constituição do solo, ventos, regime hidrológico, presença e tipo de vegetação, entre outros. Os processos de erosão marginal ocorrem às margens de corpos d’água e demandam estudos específicos para seu entendimento e possível mitigação. Os escâneres LASER (Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation) móveis são indicados para o levantamento de dados para séries temporais, principalmente em áreas com alterações pequenas ao longo do tempo, em virtude de sua elevada resolução espacial e acurácia. Sistemas de escaneamento LASER dotados de posicionamento GNSS/RTK (Global Navigation Satellite System/Real Time Kinematic) têm a vantagem de demandar menos etapas de pós-processamento, uma vez que os resultados imediatos do levantamento são as nuvens de pontos prontas para edição, e com precisão compatível à do RTK. Neste trabalho apresenta-se uma proposta metodológica para a execução dos levantamentos com uso de sistema LASER móvel embarcado, pós-processamento dos dados, geração de produtos e análise dos resultados para fins de monitoramento de processos de erosão marginal. Experimentos para caracterização da acurácia dos levantamentos realizados com uso do escâner móvel MDL Dynascan M150 mostraram que a acurácia média dos levantamentos varia de 5 a 15 cm, conforme a distância da base RTK à área de levantamento. Ainda são apresentados resultados obtidos em um estudo de caso, que demonstram a eficiência da metodologia proposta. vii ABSTRACT River bank erosions are caused by a set of factors that affect or attenuate the process, such as type of erosion, constitution of the soil, and environmental factors such as wind, water regime, presence and type of vegetation, among others. Bank erosion processes occur on the banks of water bodies and require specific studies for their understanding and possible mitigation. Mobile LASER (Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation) scanner systems are suitable to survey data to compose temporal series, mainly in areas with small changes over time, due to their high spatial resolution and accuracy. Laser scanning systems equipped with GNSS/RTK (Global Navigation Satellite System/Real Time Kinematic) positioning have advantage because demand less post-processing steps, since the immediate results of survey are point clouds ready for editing, and their accuracy is compatible with RTK accuracy. This work presents a methodology carrying out Mobile LASER surveys, post-processing data, product generation and analysis of results for monitoring purposes of river bank erosion processes. Experiments to characterize the accuracy of surveys conducted with the use of mobile laser scanner MDL DynaScan M150, show that mean accuracy of surveys vary from 5 to 15 cm according to the distance of RTK basis to survey area. Besides, are presented results of a case study that demonstrate the efficiency of the proposed methodology. viii LISTA DE FIGURAS Figura 1: Esquema demonstrando o avanço linear de um processo erosivo. ................. 16 Figura 2: Formatos do talude: (a) linear; (b) côncavo; (c) convexo. .............................. 17 Figura 3: (1) Diversos retornos de um mesmo pulso devido a interação com os galhos da árvore; (2) Eco estendido devido a uma superfície inclinada; (3) retorno de um único eco semelhante ao sinal emitido. .................................................. 29 Figura 4: (a) plano de escaneamento em relação ao escaner móvel; (b) formação da nuvem de pontos a partir do deslocamento do plano de escaneamento. ..... 30 Figura 5: Geometria de determinação das coordenadas tridimensionais de um ponto por escaneamento LASER, explicitando os sistemas de coordenadas envolvidos (do Terreno, da IMU, do escâner e do feixe LASER), as translações e rotações. ........................................................................................................ 31 Figura 6: (a) Acelerômetro piezoelétrico com secção vertical possibilitando a visualização do elemento piezoelétrico. (b) Giroscópio de fibra óptica. ...... 32 Figura 7: Esquema da (a) simples e (b) dupla diferença, onde ri representam os receptores e si os satélites envolvidos. ......................................................... 34 Figura 8: Arquitetura genérica de integração INS/GNSS onde as linhas contínuas representam as etapas obrigatórias a qualquer sistema INS/GNSS, e as linhas pontilhadas as etapas variáveis de acordo com a configuração de integração adotada. ......................................................................................................... 35 Figura 9: (a) Escâner MDL Dynascan M150 com destaque para seus equipamentos externos e (b) componentes internos. ........................................................... 41 Figura 10: Primeira embarcação adaptada para a operação do escâner LASER. ........... 43 Figura 11: Segunda estrutura desenvolvida para a instalação do escâner na embarcação; (a) Detalhe do sistema articulado da estrutura; (b) estrutura montada com destaque para os estirantes. ........................................................................... 44 Figura 12: Estrutura rígida de montagem do Dynascan e de seus acessórios. ............... 44 Figura 13: Lista de pontos no formato ASCII exportada pelo software QPS Qloud. .... 45 Figura 14: Exemplo de visualização de nuvem de pontos bruta gerada pelo escâner LASER.......................................................................................................... 46 Figura 15: Fluxograma com as etapas do levantamento de campo. ............................... 46 ix Figura 16: Tela do software QPS Qinsy, utilizado para operação do escâner, com destaque para as mensagens de alerta dos sensores, status e carta de navegação. .................................................................................................... 48 Figura 17: Exemplo de nuvens de pontos coloridas segundo a altitude (m), (a) bruta, com a presença de vegetação; (b) filtrada, sem a presença de vegetação. ... 52 Figura 18: Esquema da filtragem da nuvem de pontos com destaque para (a) a posição determinada do escâner e o voxel de convolução utilizado para delimitar a área de busca; (b) os pontos rotulados como solo após o processo de filtragem e; (c) a linha que representa o perfil do barranco. ......................... 54 Figura 19: Representação esquemática da linha de crista (cor amarela) de um barranco. ...................................................................................................................... 56 Figura 20: (a) Esquema gráfico demonstrando a posição de uma série de seções transversais sobre o barranco e, em (b) a vista lateral de uma delas evidenciando o formato do barranco. ........................................................... 57 Figura 21: Exemplo de perfis topográficos reais de duas épocas distintas evidenciando o avanço do processo erosivo, gerados no software Leica HDS Cyclone. ...... 57 Figura 22: Comparativo entre três épocas de escaneamento evidenciando as áreas de ocorrência de erosão e a posição das seções transversais. ............................ 58 Figura 23: Esquema de seções transversais de duas épocas distintas sobrepostas. ........ 60 Figura 24: Representação do prismóide formado por três seções transversais consecutivas ao longo do barranco ............................................................... 61 Figura 25: Fluxograma com as etapas do pós-processamento dos dados LASER. ........ 62 Figura 26: Edificações às margens do reservatório de Chavantes com destaque para as paredes utilizadas como feições de controle. ................................................ 64 Figura 27: Perfil altimétrico comprovando a situação de intervisibilidade entre a base RTK e a área de levantamento do reservatório da UHE de Chavantes. ....... 64 Figura 28: Limites do Campus da FCT/UNESP com destaque para o entorno do salão da ASA, utilizado como área de testes. ........................................................ 65 Figura 29: a) Fachada do prédio levantada por Topografia para ser utilizada como padrão de comparação para o cálculo da dispersão da nuvem de pontos. b) Detalhe de um dos alvos utilizados para materializar os pontos levantados. 65 Figura 30: Distribuição das Bases RTK nos municípios de Álvares Machado e Presidente Prudente. ..................................................................................... 66 x Figura 31: Perfis topográficos (distância x altitude) demonstranstrando a condição de intervisibilidade das bases RTK utilizadas nos experimentos e a área de testes. ............................................................................................................ 67 Figura 32: Alvos artificiais instalados nas proximidades do salão da ASA, nas dependências da FCT/UNESP. ..................................................................... 68 Figura 33: Representação gráfica da distribuição das distâncias entre os pontos LASER e o plano topográfico em relação à distancia entre a base RTK e a área de levantamento. ................................................................................................ 72 Figura 34: Esquema do par de planos concorrentes, na posição vertical, e vetor de distância (D) eles, (a) em perspectiva e (b) vista superior com destaque para os pontos topográficos utilizados para modelar as retas concorrentes, e (c) buffer determinado a partir das retas concorrentes para a seleção dos pontos LASER.......................................................................................................... 74 Figura 35: Distribuição dos pontos LASER para a modelagem das retas e pontos de intersecção em cada um dos conjuntos de dados utilizados no Experimento 3. ...................................................................................................................... 76 Figura 36: Gráfico expondo as componentes verticais (dV), horizontais (dH) e distância (D) para os dados da Tabela 5 do Experimento 3. ........................................ 77 Figura 37: (a) Distribuição dos pontos de máximo e mínimo utilizados para as análises do experimento; (b) nuvem de pontos LASER filtrada que representa a senoide. ......................................................................................................... 79 Figura 38: Representação gráfica dos dados de média e desvio-padrão das discrepâncias apresentados na Tabela 8. ............................................................................. 81 Figura 39: Rio Paranapanema, localizado na divisa entre os estados de São Paulo e Paraná, com destaque para os reservatórios das UHEs de Chavantes e Rosana. ......................................................................................................... 82 Figura 40: Processo erosivo às margens do reservatório da UHE de Chavantes. .......... 82 xi LISTA DE QUADROS Quadro 1: Síntese das características dos principais métodos de levantamento aplicados ao monitoramento de erosões marginais. ..................................................... 18 Quadro 2: Características do escâner a LASER MDL Dynascan M150. ....................... 41 Quadro 3: Levantamentos realizados nos reservatórios de Chavantes e Rosana. .......... 85 xii LISTA DE TABELAS Tabela 1: Classificação dos sistemas inerciais quanto a acurácia. ................................. 33 Tabela 2: Principais erros de medida de um sistema INS e suas magnitudes. ............... 38 Tabela 3: Distâncias entre as bases RTK e a área de levantamento. .............................. 66 Tabela 4: Distâncias médias entre os planos topográfico e LASER (m) e respectivos desvios-padrão (m). ...................................................................................... 69 Tabela 5: Média das distâncias entre os pontos da nuvem LASER e o plano modelado a partir dos dados topográficos (m) e desvios-padrão (m) para cada um dos levantamentos realizados variando as bases RTK. ....................................... 72 Tabela 6: Distância (D) entre as retas modeladas a partir dos dados topográficos e LASER, suas respectivas componentes (dH, dV) e médias para os quatro conjuntos de dados do campo de testes da FCT/UNESP. ............................ 75 Tabela 7: Discrepâncias entre os pontos de máximo e mínimo e as retas modeladas a partir dos pontos topográficos, em metros, médias das discrepâncias por posição na senoide e respectivos desvios padrão. ........................................ 79 Tabela 8: Média e desvio-padrão das discrepâncias entre os dados topográficos de referência e os dados LASER agrupadas por experimento. ......................... 80 Tabela 9: Taxa de evolução estimadas para os processos (m2/mês) para a ‘Área 1’. .... 86 Tabela 10: Área (m2) e volume (m3) erodido por período para a ‘Área 1’..................... 86 Tabela 11: Área (m2) e volume (m3) erodido por período a cada 100 m para a 'Área 1'.86 Tabela 12: Estimativa de área (m2) e volume (m3) erodido por ano para a 'Área 1'. ..... 86 Tabela 13: Avanço linear dos processos erosivos ao longo do projeto para a 'Área 1', em metros. .......................................................................................................... 86 Tabela 14: Taxa de evolução estimadas para os processos (m2/mês) para a ‘Área 2’. .. 87 Tabela 15: Área (m2) e volume (m3) erodido por período para a 'Área 2'. ..................... 87 Tabela 16: Área (m2) e volume (m3) erodido por período a cada 100 m para a 'Área 2'.87 Tabela 17: Estimativa de área (m2) e volume (m3) erodido por ano - para 'Área 2'. ...... 87 Tabela 18: Avanço linear dos processos erosivos ao longo do projeto para 'Área 2', em metros. .......................................................................................................... 88 xiii SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................... 15 1.1. Trabalhos Relacionados ............................................................................ 19 1.2. Objetivos do Projeto ................................................................................. 22 1.3. Contribuições do Projeto .......................................................................... 23 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ........................................................................ 25 2.1. O LASER .................................................................................................. 25 2.1.1. Emissão Estimulada de Radiação ................................................. 26 2.1.2. Medida de Distância ..................................................................... 27 2.1.3. Determinação das Coordenadas Tridimensionais ......................... 29 2.2. Navegação Inercial ................................................................................... 32 2.3. Posicionamento e Navegação Via Satélite................................................ 33 2.4. Integração GNSS/INS ............................................................................... 35 2.5. Fontes de Erros ......................................................................................... 37 2.5.1. Receptor GNSS ............................................................................. 37 2.5.2. Sistema de Navegação Inercial ..................................................... 38 3. METODOLOGIA ............................................................................................ 40 3.1. O Escâner LASER MDL Dynascan M150 ............................................... 40 3.1.1. Acomodação e Instalação do Escâner na Embarcação ................. 42 3.1.2. Operação do Escâner..................................................................... 45 3.2. Cuidados e Restrições para o Levantamento ............................................ 49 3.3. Pós-processamento, geração de produtos e análises ................................. 50 3.3.1. Filtragem da Nuvem de Pontos ..................................................... 50 3.3.2. Produtos ........................................................................................ 55 3.3.3. Análise dos dados ......................................................................... 58 4. EXPERIMENTOS, ESTUDO DE CASO E RESULTADOS ......................... 63 4.1. Caracterização da Acurácia dos Levantamentos LASER ......................... 63 4.1.1. Descrição das áreas de teste .......................................................... 63 4.1.2. Experimento 1 – Discrepância entre planos com dados de levantamento ............................................................................................. 68 4.1.3. Experimento 2 – Discrepância entre planos com dados de campo de teste ........................................................................................... 70 4.1.4. Experimento 3 – Avaliação da acurácia do escâner LASER a partir de alvos artificiais de controle ........................................................ 73 xiv 4.2. Estudo de Caso – Monitoramento de Processos Erosivos ........................ 81 4.2.1. Campanhas de Monitoramento ..................................................... 83 4.2.2. Resultados Obtidos ....................................................................... 85 5. CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÕES ......................................................... 89 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 92 15 1. INTRODUÇÃO Erosões são processos físicos de deslocamento de matéria sólida, composta principalmente por solo, rochas e vegetação, e desencadeados pela ação de águas pluviais, mares, geleiras ou ventos (LEINZ e AMARAL, 1982). Na maioria das vezes os processos erosivos são intensificados por alterações significativas na região de ocorrência de eventos como, por exemplo, desmatamento ou práticas de cultivo inadequadas (LEINZ e AMARAL, 1982). Nas últimas duas décadas, um fenômeno erosivo tem despertado o interesse de pesquisadores, as erosões marginais em corpos d’água (COELHO, 2008; CORREA e SOUZA FILHO, 2009; SILVA, SOUZA FILHO e NEVES, 2011; SIQUEIRA et al., 2013). Tais processos ocorrem usualmente nas margens de rios, lagos, represas, mares e oceanos. No Brasil tem-se dado muita atenção à ocorrência deste fenômeno em margens de reservatórios de usinas hidroelétricas (COELHO, 2008; SIQUEIRA et al., 2013), visto que a matriz energética do País é altamente dependente desta forma de geração de energia, que corresponde a aproximadamente 70% da capacidade de geração instalada (ONS, 2013), e o número de usinas hidroelétricas (UHEs) no País é expressivo. As erosões marginais em reservatórios podem decorrer da ação direta dos ventos sobre as margens, dos constantes impactos de ondas, infiltrações de água no terreno, atividades humanas e outros fatores. Tais processos, assim como as erosões em áreas de cultivo, resultam na redução das áreas produtivas, danos às propriedades localizadas às margens do reservatório e no carreamento de grande quantidade de sedimentos que se depositam no leito dos cursos d’água, resultando em assoreamento dos reservatórios e diminuição de seu volume e vida útil à geração de energia. Empresas produtoras de energia a partir de usinas hidroelétricas estão atentas a tal problema, visando à redução dos impactos ambientais e também os gastos com processos judiciais de reparação de danos materiais movidos pelos proprietários lindeiros aos reservatórios. Projetos de monitoramento e estudo destes processos têm sido desenvolvidos com o objetivo de compreender o fenômeno e, se possível, desenvolver metodologias para mitigá-lo. A compreensão da gênese do processo erosivo requer o estudo do seu entorno, características geológicas, climatológicas, cobertura vegetal, uso e ocupação do 16 solo, além do monitoramento do processo, a fim de mensurar a velocidade de evolução, e uma equipe multidisciplinar para a realização dos estudos. Em posse dos diversos dados, deve-se correlacioná-los para a identificação dos fatores que são contribuintes, ou atenuantes, à evolução do processo erosivo em questão. Algumas técnicas de levantamento de dados utilizadas no monitoramento permitem a reconstrução tridimensional (3D) dos objetos de interesse, como a Topografia, Fotogrametria e Escaneamento a LASER (Light Amplification by Estimulated Emission of Radiation). Já outras permitem apenas o monitoramento, como o Sensoriamento Remoto Orbital. Ao produto dessa reconstrução tridimensional dá-se o nome de modelos tridimensionais, que têm seu uso cada vez mais comum em diversos setores, desde a Medicina, Visão Computacional, indústria e também na Cartografia. Historicamente, técnicas de Topografia clássica são as mais aplicadas ao monitoramento de processos erosivos (GUERRA e CUNHA, 1996; SIQUEIRA et al., 2013). Tais técnicas têm por características principal o baixo custo de implantação e alta precisão posicional. Entretanto, possuem uma baixa amostragem espacial e baixa produtividade. Em geral, com o uso da Topografia é usual mensurar apenas o deslocamento da linha de crista do processo erosivo, ou seja, o avanço linear do processo (Figura 1). Ignora-se, portanto, se o talude é linear, côncavo ou convexo (Figura 2). Ainda vale salientar que a reconstrução tridimensional de processos erosivos a partir de levantamentos topográficos apresenta custo elevado. Figura 1: Esquema demonstrando o avanço linear de um processo erosivo. 17 Técnicas de posicionamento como o GNSS (Global Navigation Satellite System), por exemplo, trouxeram novas possibilidades ao monitoramento por Topografia, através da integração GNSS/Topografia ou substituição total dos equipamentos topográficos clássicos por receptores GNSS, mas sem alterações significativas nas características do produto gerado em termos de precisão, amostragem e produtividade. A evolução mais significativa em relação à Topografia advém do uso de técnicas de posicionamento em tempo real, entre elas, o RTK (Real Time Kinematic) que possibilitaram o aumento da produtividade em campo. Figura 2: Formatos do talude: (a) linear; (b) côncavo; (c) convexo. Dados de Sensoriamento Remoto também já foram aplicados ao longo dos anos ao monitoramento de processos erosivos (SILVA et al., 2011; AMARO et al., 2014; GHOSH, KUMAR e ROY, 2015). O uso de imagens aéreas e orbitais, de resolução espacial adequadas, permite a identificação de áreas de erosão, a quantificação do deslocamento das linhas de crista e geração de modelos de superfície da região. Por fim, a introdução das técnicas de escaneamento a LASER possibilitou o aumento considerável da produtividade e da frequência espacial de discretização dos processos erosivos através da grande quantidade de pontos levantados. Os escâneres LASER são equipamentos capazes de determinar coordenadas tridimensionais de milhares de pontos em segundos, com grande precisão e sem necessidade de contato com o objeto a ser levantado (SHAN e TOTH, 2008). As nuvens de pontos densas geradas por escaneamento a LASER permitem modelar em detalhes as feições presentes nas áreas erodidas e ao seu redor. Os escâneres LASER, aerotransportados (Airborne Laser Scanner - ALS) ou terrestres móveis (Mobile Terrestrial Laser Scanner - MTLS), apresentam altíssima 18 produtividade, mas a precisão posicional inferior e elevado custo de implantação quando comparado às técnicas topográficas convencionais. Já escâneres LASER terrestres estáticos (Terrestrial Laser Scanner - TLS) combinam a alta resolução espacial com a alta precisão posicional, mas menor produtividade quando comparada aos sistemas móveis (ALS e MTLS). O diferencial do uso de escâneres LASER terrestres móveis está na capacidade de visada a partir do corpo d’água, quando embarcado. Esta mudança na geometria de visada permite a geração de diversos produtos, como modelos de superfície, perfis topográficos do barranco, extração das linhas de crista, identificação da formação de processos erosivos subsuperficiais (piping), quantificação do volume erodido, entre outros, que seriam de difícil obtenção por outras técnicas de levantamento. O Quadro 1 sintetiza a comparação entre as técnicas de levantamento considerando seu uso em atividades de monitoramento de processos erosivos. Quadro 1: Síntese das características dos principais métodos de levantamento aplicados ao monitoramento de erosões marginais. Método Resolução espacial Resolução temporal Precisão Produtividade Topografia Clássica (ABNT, 1994) Baixa Alta Alta Baixa GNSS (MONICO, 2008) Baixa Alta Dependente do tempo de levantamento Baixa GNSS+RTK (MONICO, 2008) Baixa Alta Intermediária Intermediária Sensoriamento Remoto (JENSEN, 2009) Intermediária a baixa Baixa Intermediária a baixa Alta Aerofotogrametria (WOLF e DEWITT, 2000) Dependente da escala das imagens Baixa Intermediária Alta ALS (SHAN e TOTH, 2008) Dependente da altura de voo Baixa Intermediária Alta TLS (SHAN e TOTH, 2008) Alta Alta Alta Baixa MTLS (SHAN; TOTH, 2008) Alta Alta Intermediária Alta 19 Em face da demanda elevada de informações sobre o terreno (posição das feições topográfica e elevações, por exemplo) para uma modelagem mais fiel, e das dificuldades de operação em ambientes aquáticos, os escâneres LASER apresentam elevado potencial para a atividade de monitoramento. A versatilidade de operação, em plataformas aéreas ou terrestres, estáticas ou em movimento, dependendo do segmento de equipamento escolhido, além da alta velocidade de aquisição de dados, são diferenciais dos escâneres LASER em relação aos demais equipamentos utilizados para levantamentos topográficos. A partir das nuvens de pontos LASER é possível gerar modelos de superfície, curvas de nível, extrair linhas de crista e perfis topográficos, produtos que permitem a quantificação da evolução dos processos erosivos e de sua velocidade em um determinado intervalo e tempo. Frente às vantagens apresentadas pelo uso de escâneres LASER terrestres móveis embarcados, são necessários estudos experimentais para se extrair o máximo em qualidade e produtividade e também a validação da técnica de monitoramento de erosões por escaneamento a LASER. O desenvolvimento deste projeto de pesquisa se dá no âmbito de um projeto de pesquisa e desenvolvimento – P&D proposto pela Duke Energy International – Geração Paranapanema e desenvolvido em parceria com a UNESP (Universidade Estadual Paulista), com recursos da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica). 1.1. Trabalhos Relacionados A etapa de monitoramento dos processos erosivos mostra-se de suma importância na compreensão de sua evolução, uma vez que nela são identificados os processos ainda ativos e mensurada sua velocidade de evolução e área de abrangência. São diversas as técnicas aplicáveis à atividade de monitoramento, desde a topografia clássica, na qual realizam-se medidas diretamente sobre o barranco (DEL RÍO et al., 2007; SILVA, SOUZA FILHO e NEVES, 2011; SIQUEIRA et al., 2013), análise de documentos históricos (DEL RÍO et al., 2007; APPEANING ADDO, WALKDEN e MILLS, 2008), técnicas de modelagem fotogramétrica e de Sensoriamento Remoto (SILVA et al., 2011; AMARO et al., 2014; GHOSH, KUMAR e ROY, 2015), sistemas 20 de varredura a LASER aerotransportados (SHRESTHA et al., 2005) e escâneres LASER terrestres. Diversos estudos foram desenvolvidos visando a utilização de escâneres LASER terrestres para o levantamento e monitoramento de regiões ribeirinhas. Em geral, os autores ressaltam a versatilidade de operação, agilidade, alta taxa amostral e acurácia na determinação das coordenadas tridimensionais como as principais vantagens da adoção de sistemas LASER. Alho et al. (2009) apresentam um estudo sobre a viabilidade do uso de sistemas LASER escâner terrestre embarcados para o mapeamento de margens de cursos d’água. No estudo foi utilizado um escâner LASER móvel desenvolvido pelo FGI (Finnish Geodetic Institute) da Finlândia baseado na integração de um LASER terrestre FARO LS 880HE80, operando em modo perfilador, com um sistema inercial e um receptor GNSS. A validação dos dados do escaneamento a LASER foi realizada a partir da comparação com dados de escaneamento LASER terrestre estático de maior acurácia, sendo que 80% dos pontos LASER apresentaram discrepância inferior a 2 cm em relação a dados de escaneamento LASER terrestre estático. Os autores destacam ainda a rapidez de levantamento propiciada pelo escâner LASER, sendo possível cobrir uma área de 6 km de extensão em aproximadamente 85 minutos. Mitchell, Suarez e Chazaly (2013) afirmam que campanhas frequentes de escaneamento a LASER são uma forma satisfatória de monitoramento de processos erosivos em áreas costeiras. Os autores trazem um estudo de caso realizado em Carry-le Rouet, na costa da França, no qual escaneamentos subsequentes, com intervalo de oito meses entre eles, possibilitaram a identificação de áreas com retração da encosta com dimensões variando entre 0,5 m e 2 m. Blasone et al. (2014) apresentam uma metodologia para monitoramento de mudanças geomorfológicas causadas por processos de corrida de detritos, através da diferença entre MDTs (Modelos Digitais de Terreno) de diferentes épocas derivados de levantamento com escâner LASER terrestre. Em estudo realizado na região de Moscardo Torrent, nos Alpes Italianos, foram selecionadas três áreas ao longo de um curso d’água: próximo à nascente, na região intermediária do curso, e em sua foz. Três levantamentos foram realizados em cada uma das áreas: em agosto de 2011, setembro de 2011 e outubro de 2012, todos após eventos de deslizamento. Com os resultados dos levantamentos foi possível mensurar o volume de material erodido das regiões mais 21 altas da área de estudo, bem como o volume de material depositado próximo ao vale, além de delimitar as áreas que sofreram alterações significativas. Os autores destacam a grande capacidade do escâner LASER terrestre na detecção e monitoramento de alterações geomorfológicas de pequenas magnitudes, principalmente devido à sua acurácia e densidade de pontos, além da necessidade de rigoroso controle de qualidade dos modelos de terreno gerados para a aplicação da diferença entre MDTs. Dewez et al. (2013) também utilizaram diferença entre MDTs para identificar áreas erodidas de um penhasco na região de Mesnil Val na Normandia, França. Dados de seis levantamentos com escâner LASER terrestre, realizados ao longo de dois anos e meio de estudos, possibilitaram a identificação de aproximadamente 8.500 áreas erodidas ao longo do tempo de projeto, além de suas respectivas dimensões, volume erodido e período de ocorrência. O agrupamento dos eventos segundo a magnitude, o cálculo da função distribuição de probabilidade de cada grupo e o cálculo da função de distribuição acumulada complementar foram utilizados para estimar o tempo de retorno de cada grupo de eventos, servindo assim de base para políticas públicas de intervenção e evacuação da área. Poulton et al. (2006) apresentam uma metodologia de trabalho para o monitoramento de processos erosivos em regiões de penhascos, a partir do estudo de caso realizado na região de Happisburgh em Norfolk, na costa leste da Inglaterra. A metodologia consiste no uso de escâner LASER terrestre de longo alcance (superior a 2 km) com câmaras digitais acopladas, para o monitoramento dos processos erosivos dos penhascos. O escâner LASER provê nuvens de pontos densas e altamente acuradas posicionalmente para a modelagem dos penhascos, que são incrementadas com as informações semânticas dos alvos extraídas das imagens fotogramétricas terrestres. As nuvens de pontos são georreferenciadas por meio de posicionamento DGPS (Differential Global Positioning System). Os autores ressaltam a importância da consideração e entendimento das influências do entorno da área no processo erosivo. Ondas, ventos, atividades antrópicas, uso e ocupação do solo e geologia são alguns dos fatores que devem ser considerados para a análise da evolução dos processos erosivos. Segundo afirmam os autores, o escaneamento anual das áreas de encosta tem provido bons dados para o monitoramento e análise da evolução dos processos erosivos. Amaro et al. (2013) utilizaram um escâner LASER terrestre de longo alcance (OPTECH ILRIS-3D) para mensurar o volume de sedimentos transportados do 22 Morro do Careca para a Praia de Ponta Negra no litoral do Rio Grande do Norte. Dois levantamentos, realizados em setembro e novembro de 2012, possibilitaram a geração e análise de MDEs (Modelos Digitais de Elevação) de ambas as épocas, evidenciando um movimento de deposição de sedimentos de 19.024,13 m3 na Praia de Ponta Negra advindos da região de dunas do Morro do Careca. Segundo os autores, os modelos de elevação derivados do escaneamento LASER foram validados por comparação com modelo de elevação gerado a partir de posicionamento GPS (Global Positioning System). A mesma metodologia foi utilizada para o estudo de transporte de sedimentos e alterações na linha de costa nos arredores das instalações da PETROBRAS localizadas na Praia de Soledade na cidade de Macau/RN (SANTOS, AMARO e SANTOS, 2014). Nasermoaddeli e Pasche (2008) utilizaram um escâner LASER terrestre integrado a um receptor GNSS com RTK e um ecobatímetro para o monitoramento de processos de erosão e deposição em um meando do Rio Hardebek-Brokenlander Au, localizado na cidade de Neumuenster no norte da Alemanha. Os autores destacam a elevada resolução espacial do escâner LASER, além da grande precisão, como aspectos positivos do uso da técnica. A integração dos sensores utilizados permitiu a criação de um perfil detalhado das regiões emersas e submersas do leito do rio, independentemente do nível d’água no momento do escaneamento. Seis campanhas para o escaneamento LASER realizadas entre outubro de 2006 e abril de 2007, e uma sétima campanha em dezembro de 2007, que contou ainda com o uso do ecobatímetro, possibilitaram a identificação e quantificação de diversos processos de erosão/deposição com velocidade variável ao longo do período de estudos influenciada pelo regime de hídrico do curso d’água. 1.2. Objetivos do Projeto O objetivo principal é o desenvolvimento de técnicas para a realização periódica do monitoramento dos processos erosivos em dois reservatórios com uso do escâner LASER terrestre móvel que resultam na quantificação dos totais erodidos e em produtos cartográficos, que servirão de base para futuras análises sobre a gênese dos processos erosivos. Como objetivos específicos do projeto têm-se: 23  Realização de campanhas de monitoramento periódicas para a análise da evolução dos processos erosivos;  Desenvolvimento de técnicas e rotinas para automação dos processos de tratamento dos dados, incluindo filtragem e geração de produtos cartográficos;  Geração dos produtos necessários à futuras análises e estudos acerca da gênese dos processos erosivos;  Validação da metodologia de monitoramento de processos erosivos. 1.3. Contribuições do Projeto Encontram-se disponíveis na literatura utilizada referências sobre o uso de escâneres LASER terrestre, estático ou móvel, para o monitoramento de processos erosivos em cursos d’água ou reservatórios. Geralmente são utilizadas técnicas clássicas de Topografia, como o estaqueamento e piqueteamento (GUERRA, SILVA e BOTELHO, 1999), ou variações dessa, nas quais os instrumentos usuais de medida (teodolitos e estações totais) são substituídos por receptores GNSS, para o monitoramento de processos erosivos. Existem estudos realizados para o monitoramento de processos erosivos em cursos d’água utilizando imagens de satélite (SILVA et al., 2011; GHOSH, KUMAR e ROY, 2015). Tal técnica também já foi utilizada para estudos de retração da linha de costa (AMARO et al., 2014). Tem-se ciência do uso de escaneamento LASER móvel para o monitoramento de processos erosivos em território nacional apenas em áreas costeiras (AMARO et al., 2013; SANTOS, AMARO e SANTOS, 2014). Os reservatórios de usinas hidroelétricas em regiões tropicais apresentam características intrínsecas que demandam adequações às técnicas de monitoramento para que estas sejam consideradas, como é o caso da velocidade de avanço dos processos e tendência à ocorrência de colapso de blocos de material, ou evitadas, como a vegetação arbustiva presente nos taludes. Tais características dos reservatórios de UHEs os caracterizam como um novo ambiente distinto, por exemplo, dos cursos d’água naturais. Frente às constatações anteriores, a principal contribuição do projeto será a adequação da técnica de monitoramento de processos erosivos utilizando escâneres 24 LASER terrestres móvel à realidade brasileira, com foco na aplicabilidade desta aos cursos d’água e reservatórios. Para tal, um reservatório de acumulação, com baixo fluxo d’água, e um fio d’água, mais próximo à realidade de um rio, são utilizados como áreas de estudo. Também foram desenvolvidas técnicas para o processamento e filtragem dos dados LASER. 25 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA A intersecção topográfica foi uma das técnicas pioneiras na determinação de coordenadas tridimensionais de pontos de forma remota, seguida pela triangulação fotogramétrica. Ambas as técnicas são ainda hoje frequentemente utilizadas. No início da triangulação fotogramétrica as determinações das coordenadas dos pontos de interesse eram realizadas de forma gráfica e/ou analítica. Em um segundo momento, essas determinações de coordenadas passaram a ser feitas de forma manual em equipamentos ópticos ou mecânicos conhecidos por restituidores, os quais tinham a capacidade de reconstruir a perspectiva tridimensional a partir de um par de fotografias. A automação do processo de medição de coordenadas tridimensionais por Fotogrametria só foi possível nos anos de 1990 com a possibilidade de digitalização das imagens aéreas e aumento da capacidade de processamento dos computadores, que possibilitou o uso dos algoritmos existentes desde a década de 1960 (ANDRADE, 1998). Nos processos fotogramétricos as determinações das ternas de coordenadas dos pontos são realizadas pela interseção dos raios homólogos oriundos de cada uma das fotografias do estéreo par (ANDRADE, 1998). A busca desses pontos homólogos nas imagens é realizada por um processo denominado matching (WOLF e DEWITT, 2000). A dificuldade deste método é a necessidade de feições com características identificáveis em ambas as fotos, o que exclui, por exemplo, áreas com textura homogêneas. Nas últimas duas décadas, as medidas obtidas com os equipamentos de escaneamento a LASER têm tido grande destaque para a reconstrução tridimensional de feições em virtude da capacidade de determinar as coordenadas de milhares de pontos em poucos segundos com elevada acurácia em qualquer superfície, desde que essa seja capaz de refletir o feixe LASER incidente, mesmo em áreas homogêneas (DALMOLIN e SANTOS, 2004; SHAN e TOTH, 2008). 2.1. O LASER Define-se LASER, acrônimo de Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation, como um dispositivo eletro-óptico que, quando ativado, gera e 26 emite um feixe, ou pulso, de radiação monocromática e altamente colimada que se propaga de forma coerente (DALMOLIN e SANTOS, 2004). As características de propagação do feixe LASER são o que o tornam tão especial e aplicável em diversas atividades, como aplicações médicas, indústria e siderurgia, Topografia, entre outras. Pode-se notar a importância das características de propagação de um feixe LASER quando faz-se um paralelo com a propagação da luz solar, que ocorre de forma difusa e incoerente, ou seja, a energia eletromagnética emitida se propaga por todo o hemisfério visível de forma que suas ondas formadoras interferem de maneira construtiva e/ou destrutiva umas nas outras. Já feixes LASER se propagam de forma colimada, garantindo a concentração da energia emitida em uma pequena porção do espaço, e coerente, de forma que as ondas que o constituem não interferem umas nas outras durante a trajetória de propagação (JENSEN, 2009). São diversos os tipos de LASER disponíveis, que diferenciam-se principalmente pelo material ativo utilizado. Todo escâner LASER tem em sua montagem uma fonte de energia que se constitui de um material que, quando excitado por uma fonte de energia externa, libera fótons que darão origem ao feixe LASER (SHAN e TOTH, 2008). 2.1.1. Emissão Estimulada de Radiação A emissão espontânea de radiação eletromagnética na forma luminosa ocorre pela liberação de fótons por átomos energeticamente carregados. Quando um átomo recebe energia de uma fonte qualquer o elétron que ocupa a camada de valência mais externa tende a saltar para um nível de energia mais elevado, ocorrendo, pouco tempo depois, o retorno deste átomo à condição estável de energia, ou seja, o decaimento do elétron. Este processo de decaimento libera um fóton (JENSEN, 2009). No processo de emissão estimulada de radiação eletromagnética, fundamental à criação do feixe LASER, átomos em estado de estabilidade são 'bombardeados' com fótons incapazes de fornecer a energia necessária para a mudança de nível energético do elétron de valência, mas suficientes para perturbar sua estabilidade, forçando o transito deste elétron entre níveis mais e menos energéticos e a liberação de dois fótons: o incidente e outro gerado durante o decaimento (SHAN e 27 TOTH, 2008). O fóton liberado na emissão estimulada tem a característica de ser idêntico ao fóton incidente, ou seja, mesma direção e sentido de propagação, e com suas ondas em fase. Esse processo de estimulação e incidência ocorre em cadeia, enquanto o processo for alimentado pela fonte externa de energia, a fim de amplificar a quantidade de fótons disponíveis e criar um feixe com a energia necessária, colimado e coerente (SHAN e TOTH, 2008). Apesar do processo de emissão estimulada dobrar o número de fótons emitidos em relação ao incidente, a quantidade de fótons gerados nesse processo ainda é muito baixa para produzir um feixe LASER, sendo de vital importância um ressonador, para retroalimentar a reação e assim ‘amplificar’ a quantidade de fótons disponíveis. 2.1.2. Medida de Distância Dois princípios de medida de distância a LASER estão disponíveis atualmente: i) baseado na medida do tempo de retorno do pulso e; ii) baseado na diferença de fase entre os pulsos emitido e refletido, não apresentado por não fazer parte do escopo deste estudo. Em geral a medida de distância baseada no tempo de retorno do pulso é utilizada em medidores que operam com a emissão de pulsos LASER. Na outra forma de operação existente, baseada na emissão contínua de feixe LASER, aplica-se a medida de distância por diferença de fase. Os equipamentos LASER baseados em pulso são dispositivos utilizados normalmente a grandes distâncias do alvo. Os escâneres terrestres, estáticos e móveis, e aerotransportados se encaixam nesta categoria. Sua principal característica é a emissão do feixe LASER em forma de pulsos e posterior registro do sinal de retorno deste pulso. O que se mede de fato é o tempo de deslocamento, ou, em inglês, time of flight (TOF), do feixe. Um medidor de tempo de alta precisão registra o momento de emissão do pulso e posteriormente o momento de detecção de seu retorno e, baseado no tempo total de deslocamento do pulso e na velocidade da luz, obtém-se a distância (Equação 1). 𝐷 = (𝑐 ∗ 𝑇)/2 (1) Em que, 28 c: velocidade da luz (299.792.458 m/s); T: tempo de deslocamento do pulso. Uma limitação destes equipamentos está na frequência de emissão de pulso, que é altamente dependente da distância entre o escâner e o alvo. Um novo pulso LASER só pode ser emitido pelo equipamento após o retorno do pulso anterior, para que não haja confusão entre os retornos (BALTSAVIAS, 1999). Portanto, durante o planejamento da aquisição, deve-se atentar para a correta configuração da frequência de emissão de pulsos para que ela não limite o alcance de operação do escâner. Em teoria, o intervalo entre a emissão de dois pulsos consecutivos define a distância máxima de operação do escâner LASER. Na prática, outros fatores, como as interferências geradas na interação com a atmosfera, potência do sinal emitido e a sensibilidade do detector, determinam o alcance máximo de operação dos equipamentos (BALTSAVIAS, 1999). Os escâneres LASER modernos são capazes de registrar mais de um retorno de um mesmo pulso, pois, devido ao diâmetro do pulso projetado no terreno (footprint), que não é pontual, pode ocorrer reflexão por mais de um objeto na trajetória do pulso. Alguns equipamentos mais simples apresentam uma limitação na distinção de retornos muito próximos. Por esse fato, tais equipamentos registram os sinais de retorno de forma discreta, normalmente, apenas o primeiro e o último, ou apenas o primeiro. O registro de mais de um retorno de um mesmo pulso emitido é muito útil quando se necessita modelar uma superfície que possui outras feições sobre ela. É o caso da geração dos MDTs a partir da filtragem de modelos digitais de superfície (MDS). Equipamentos do tipo full waveform, capazes de registrar todos os retornos de um mesmo pulso, ampliam as possibilidades de aplicação de processos automatizados de filtragem das nuvens de pontos (MALLET et al., 2011). No caso de diversos retornos de um mesmo pulso, normalmente o último ocorre no terreno e o primeiro nas copas de árvores, vegetação arbustiva ou quinas de feições antrópicas (Figura 3). Sendo assim, é possível modelar tanto a superfície (terreno e feições) quanto o terreno, a partir de técnicas de classificação e filtragem em um mesmo conjunto de dados LASER (MALLET e BRETAR, 2009). A capacidade de distinção de retornos de um mesmo pulso está ligada à resolução da medida de tempo, ou seja, quanto maior for esta resolução, menor será o intervalo de tempo mínimo entre 29 os retornos para que sejam distinguíveis (BALTSAVIAS, 1999). Figura 3: (1) Diversos retornos de um mesmo pulso devido a interação com os galhos da árvore; (2) Eco estendido devido a uma superfície inclinada; (3) retorno de um único eco semelhante ao sinal emitido. Fonte: Adaptada de . 2.1.3. Determinação das Coordenadas Tridimensionais Os escâneres LASER móveis determinam as coordenadas de pontos em um sistema de coordenadas esféricas com origem no interior do equipamento, normalmente no centro eletrônico do emissor, onde ocorre a emissão de pulsos e recepção de seu retorno. O vetor de coordenadas cartesianas (x, y, z) no sistema de coordenadas do sistema LASER é obtido através da distância determinada pelo pulso emitido e pela direção de emissão do pulso, em relação ao plano horizontal, e é dado pela Equação 2 e ilustrado na Figura 3 (SHAN e TOTH, 2008). ( 𝑥 𝑦 𝑧 ) 𝐹𝐸𝐼𝑋𝐸 𝐿𝐴𝑆𝐸𝑅 = ( 𝑆(𝑡) ∗ 𝑠𝑒𝑛𝜃(𝑡) 0 𝑆(𝑡) ∗ 𝑐𝑜𝑠𝜃(𝑡) ) (2) Em que: S: distância medida entre o sensor e o alvo; θ: direção vertical de emissão do pulso; 30 t: instante de tempo de realização das medidas. Nota-se, pelo valor zero da componente y da Equação 2, que o escaneamento será realizado apenas em um plano coincidente com o plano de rotação do emissor de pulsos LASER. A terceira componente da terna de coordenadas será dada pelo deslocamento da plataforma, que fará com que o plano de escaneamento percorra a área a ser levantada. Um esquema gráfico da sistemática do levantamento é apresentado na Figura 4. Figura 4: (a) plano de escaneamento em relação ao escaner móvel; (b) formação da nuvem de pontos a partir do deslocamento do plano de escaneamento. As coordenadas obtidas pela Equação 2 são úteis quando se trabalha em um sistema cartesiano local, onde a origem do sistema pode coincidir com o centro eletrônico do equipamento, e estático, onde a posição da origem do sistema não se altera com o tempo. No entanto, buscam-se, na maioria das vezes, as coordenadas dos pontos em um referencial de mapeamento e, neste caso, faz-se necessário realizar o posicionamento e orientação da estação, que pode ser realizado por várias formas, dependendo do tipo de levantamento executado. Os levantamentos cinemáticos, sejam eles aéreos ou terrestres, têm a posição e atitude da origem do sistema de coordenadas do escâner continuamente alteradas ao longo do tempo. Para isso é necessário que se tenham integrados ao LASER um receptor GNSS e uma unidade de medida inercial (IMU) que possibilitem a 31 determinação da posição e atitude (X0, Y0, Z0, ω, φ, κ) da plataforma durante seu deslocamento. Assim sendo, o cálculo das coordenadas (X, Y, Z) dos pontos escaneados deverá considerar o instante de levantamento (t), a posição e atitude do equipamento, como apresentado na Figura 5 e descrito matematicamente pela Equação 3 (HABIB, BANG e KERSTING, 2010). ( 𝑋 𝑌 𝑍 ) 𝑅𝑀 = ( 𝑋0(𝑡) 𝑌0(𝑡) 𝑍0(𝑡) ) 𝑅𝑀 + 𝑅𝑅𝑀 𝐼𝑀𝑈(𝑡) [( 𝑡𝑥 𝑡𝑦 𝑡𝑧 ) 𝐼𝑀𝑈 𝐸𝑆𝐶Â𝑁𝐸𝑅 + 𝑅𝐼𝑀𝑈 𝐸𝑆𝐶Â𝑁𝐸𝑅 ( 𝑥 𝑦 𝑧 )] (3) Em que: X0(t), Y0(t), Z0(t): representam a posição da origem do sistema local do Sistema de Navegação Inercial (do inglês, Inertial Navigation System - INS) no instante t, em relação ao referencial de mapeamento; RIMU RM(t): a matriz de rotação com os ângulos de atitude da plataforma providos pela IMU em relação ao referencial de mapeamento; tx, ty, tz: os componentes do lever arm entre o sensor LASER e a IMU, no referencial da IMU; e RIMU ESCÂNER: a matriz com os ângulos de boresight entre a IMU e o sensor LASER. Figura 5: Geometria de determinação das coordenadas tridimensionais de um ponto por varredura LASER, explicitando os sistemas de coordenadas envolvidos (do Terreno, da IMU, do escâner e do feixe LASER), as translações e rotações. Fonte: Adaptada de Habib, Bang e Kersting (2010). 32 2.2. Navegação Inercial A navegação inercial baseia-se na medida de uma direção de referência, um azimute, e variações angulares e de aceleração em três eixos de um sistema de coordenadas, para prover dados de deslocamento e posição relativa à origem do sistema coordenado (WOODMAN, 2007). O grande diferencial da navegação inercial em relação a outras técnicas de navegação, GNSS, por exemplo, é não necessitar de informações externas ao sensor, apenas medidas de direção e aceleração realizadas internamente (TAZARTES, 2014). São basicamente dois os sensores inerciais: os giroscópios e os acelerômetros (Figura 6). Os giroscópios são responsáveis por medir as variações angulares em cada um dos eixos dos sistemas ao longo do tempo. Eles podem ser: i) mecânicos, que possuem partes móveis que se desgastam com o tempo e sofrem grandes derivas nas medidas; ii) FOG (Fiber Optic Gyroscope), baseados em fibra ótica ou LASER, menos sujeitos à deriva, mas de custo de produção e aquisição elevados (WOODMAN, 2007); iii) MEMS (Microeletromechanical Systems), micro-sensores eletrônicos mais leves, resistentes e baratos que os sensores mecânicos e de fibra óptica (WOODMAN, 2007). Os acelerômetros, por sua vez, são responsáveis pelas medidas de variação da aceleração. Podem ser mecânicos, com massas suspensas por molas, ou de estado sólido, baseado em elementos como silício e quartzo, que realizam as medidas de aceleração por variações de cargas elétricas (WOODMAN, 2007). Figura 6: (a) Acelerômetro piezoelétrico com secção vertical possibilitando a visualização do elemento piezoelétrico. (b) Giroscópio de fibra óptica. Fonte: (a) www.commons.wikimedia.org/wiki; (b) Sensormap Geotecnologias. 33 Os sistemas de navegação inercial podem ser classificados de acordo com sua acurácia em sistemas ‘táticos de baixo nível’, ‘táticos de alto nível’ e ‘de navegação’. A Tabela 1 apresenta as principais características de cada tipo (SHAN e TOTH, 2008). Tabela 1: Classificação dos sistemas inerciais quanto a acurácia. Performance Alta Acurácia Média Acurácia Baixa Acurácia Tipo de sistema Navegação Táticos de Alto Nível Táticos de Baixo Nível Acurácia Posicional (m) 0,05 – 0,30 0,05 – 0,30 0,05 – 0,30 Acurácia em Atitude 5 – 20 arcos de segundos 0,1 – 1 arcos de minutos 2 – 4 arcos de minutos Tendência dos Acelerômetros (mg) 50 – 100 150 – 200 200 – 1000 Deriva dos Giroscópios ≡ 0,015 0,01 – 1 3 – 10 Preço (US$) 100 – 200 Mil 75 – 100 Mil 50 – 75 Mil Fonte: Adaptada de Shan e Toth (2008). 2.3. Posicionamento e Navegação Via Satélite O posicionamento GNSS consiste na determinação das coordenadas tridimensionais do centro de fase da antena de um receptor em terra, ou próximo a ela, a partir da medida indireta da pseudodistância entre a antena e satélites de uma constelação que orbita o planeta Terra, e da diferença de fase da onda portadora. São quatro as constelações de satélites que compõem a constelação GNSS: a GPS norte americana, a GLONASS (Globalnaya Navigatsionnaya Sputnikovaya Sistema) russa, a Beidou chinesa e a europeia Galileu. São diversos os métodos de posicionamento pelo GNSS, que derivam das combinações das diferentes observáveis (fase da onda portadora e pseudodistância), estados de operação (estático, semi-cinemático e cinemático) e quantidade de receptores utilizados (standalone, relativo ou redes), dos quais os mais usuais são o posicionamento relativo, estático e cinemático, e o RTK. O posicionamento relativo pós-processado caracteriza-se pelo pós- processamento do conjunto de dados de dois ou mais receptores GNSS para a realização das simples e duplas diferenças a partir de combinações lineares das observáveis GNSS. 34 A técnica de simples diferença (Figura 7) exige dados simultâneos de, no mínimo, dois receptores e um satélite, e possibilita a eliminação da influência do erro do relógio do satélite no posicionamento (POLEZEL, SOUZA e MONICO, 2008). Já a dupla diferença exige que, no mínimo, um par de receptores realizem simultaneamente observações a dois satélites para a correção dos erros dos relógios dos receptores e dos satélites (POLEZEL, SOUZA e MONICO, 2008). Esta técnica de posicionamento destaca-se por ser a mais precisa. No entanto, demanda tempo de levantamento maior e a disponibilidade de mais de um receptor GNSS. Após o desligamento da técnica SA (Selective Avaibility) do sistema GPS em 2000, a acurácia no posicionamento do sistema passou a ser de 10 m em modo de navegação e de alguns centímetros em modo pós-processado, refletindo assim a acurácia global do sistema GNSS (MONICO, 2008). Figura 7: Esquema da (a) simples e (b) dupla diferença, onde ri representam os receptores e si os satélites envolvidos. Fonte: Adaptada de Polezel, Souza e Monico (2008). Os sistemas de varredura a LASER aerotransportados utilizam, em sua maioria, o posicionamento relativo cinemático, no qual têm-se dois receptores GNSS, um acoplado ao escâner LASER e outro em solo, próximo à área de levantamento. Este método exige pós-processamento dos dados GNSS com uso de efemérides precisas e provê grande acurácia no posicionamento (SEEBER, 2003). Outro método de posicionamento, este utilizado principalmente nos escâneres terrestres móveis, é o RTK, no qual se utilizam também dois receptores: um acoplado ao escâner LASER (rover) e outro estático (base), posicionado sobre um ponto de coordenadas conhecidas, que é responsável por computar correções ao 35 posicionamento em tempo real e enviá-las ao rover via ondas de rádio ou link de dados GSM (Global System for Mobile Communications). O uso do RTK permite alcançar acurácia melhor que 5 cm em poucos minutos de levantamento (SEEBER, 2003). 2.4. Integração GNSS/INS A integração de sensores tem por propósito tirar vantagem da complementariedade entre os subsistemas embarcados em um sistema integrado, além de tornar a navegação mais confiável que apenas quando utiliza-se um dos subsistemas (OMERBASHIC, 2002). Em se tratando de integração de INS e Receptores GNSS, o objetivo é obter a posição da plataforma com precisão, a partir do posicionamento GNSS e atitude e acelerações do INS. A Figura 8 apresenta um esquema genérico de integração entre INS e receptor GNSS para a obtenção de uma solução integrada de navegação. O resultado da combinação entre INS e GNSS é uma solução de navegação completa, composta pelas altas frequências de medidas e acurácia a curto prazo do INS, e a elevada acurácia a longo prazo do GNSS (GROVES, 2008). As observações GNSS têm por função corrigir a deriva das medidas inerciais, enquanto o INS tem por função suavizar a solução GNSS e preencher as lacunas entre as medidas GNSS (GROVES, 2008), inclusive quando ocorre perda de sinal. Figura 8: Arquitetura genérica de integração INS/GNSS onde as linhas contínuas representam as etapas obrigatórias a qualquer sistema INS/GNSS, e as linhas pontilhadas as etapas variáveis de acordo com a configuração de integração adotada. Fonte: Adaptada de Groves (2008). 36 O ‘Algoritmo de Integração’, apresentado na Figura 8, é um processador lógico no qual estão implementados os modelos matemáticos utilizados na integração dos dados INS/GNSS. O Filtro de Kalman é o método de estimação de parâmetros utilizados na maioria dos sistemas de navegação em tempo real (GROVES, 2008), e consiste em um método de estimação recursivo baseado apenas nas estimativas e medidas recentes, eliminando a necessidade de armazenamento de todas as informações recebidas (MACHADO, 2002). Há diferentes níveis de integração entre o INS e o GNSS em um sistema de navegação: as diferenças entre os níveis estão basicamente no tipo de informação que o receptor GNSS passa ao algoritmo de integração. Os dois níveis mais usuais de integração são o (i) fracamente acoplado (loosely coupled), e (ii) fortemente acoplado (tightly coupled), descritos abaixo. (i) No modo fracamente acoplado, o algoritmo de integração tem como entradas de dados as acelerações e variações angulares medidas pelo INS, e as posições e velocidades medidas pelo GNSS (GROVES, 2008). O pós-processamento deste tipo de dados deve ser realizado em três etapas: primeiramente o processamento das medidas GNSS, em seguida o processamento das medidas inerciais e, finalmente, a integração e suavização dos dois conjuntos de resultados com uso do Filtro de Kalman. (ii) Já no modo fortemente acoplado, as informações providas ao algoritmo de integração pelo receptor GNSS são as pseudodistâncias (GROVES, 2008). Neste caso, o pós-processamento ocorre em etapa única diretamente pelo Filtro de Kalman, e a sinergia entre os conjuntos de medida é maior. Assim como os níveis de integração entre as medidas INS e GNSS definem variações na arquitetura do sistema INS/GNSS, o modo como as correções às medidas inerciais são aplicadas no sistema INS/GNSS também define variações na arquitetura (GROVES, 2008). Quando as correções computadas pelo algoritmo de integração são aplicadas apenas à solução de navegação, a arquitetura é denominada open-loop. Já quando as correções são aplicadas às medidas do INS, a arquitetura é denominada closed-loop. 37 A opção por utilizar a configuração open-loop ou closed-loop na integração INS/GNSS dependerá da qualidade do INS utilizado, bem como da robustez do modelo matemático de integração adotado (GROVES, 2008). Unidades INS de maior acurácia (Táticas de alto nível ou de navegação) são capazes de operar por maiores intervalos de tempo com menor acúmulo de erros nas medidas inerciais, não demandando a correção das mesmas a cada iteração do Filtro de Kalman, e com a vantagem de armazenamento dos dados brutos de medida do INS (GROVES, 2008). Unidades INS de menor acurácia (Táticas de baixo nível) por sua vez, tendem a acumular mais erros nas medidas inerciais, demandando a aplicação das correções computadas pelo Filtro de Kalman às medias brutas (GROVES, 2008). A contribuição da técnica de posicionamento RTK a sistemas INS/GNSS é análoga ao posicionamento GNSS. As correções ao posicionamento em tempo real são calculadas e enviadas ao receptor GNSS do sistema, que por sua vez as aplica ao posicionamento (GROVES, 2008). As contribuições imediatas do uso do sistema RTK à navegação INS/GNSS, assim como ao posicionamento GNSS, são a obtenção instantânea de coordenadas, da solução da ambiguidade e do erro do relógio em tempo real (GUANDALINI, 2012). 2.5. Fontes de Erros Nesta seção serão apresentadas as principais fontes de erros em um levantamento com escâneres LASER móveis e os componentes a eles associados. 2.5.1. Receptor GNSS O uso de receptores GNSS é imprescindível para a geração de nuvens de pontos georreferenciadas. Tais receptores, aliados a sistemas de RTK, permitem o posicionamento em tempo real com precisão centimétrica (SEEBER, 2003). Os erros mais comuns que afetam o posicionamento por GNSS são os erros dos relógios dos satélites e dos receptores, predição das efemérides, cintilação ionosférica, atraso troposférico e multicaminho (MONICO, 2008). Todos estes resultam em deslocamentos no posicionamento da plataforma e, consequentemente, da nuvem de pontos, e afetam tanto os receptores embarcados no escâner quanto aqueles instalados próximos e utilizados para o posicionamento relativo ou em tempo real. Detalhes acerca dos erros 38 que afetam o posicionamento GNSS e os respectivos meios de correção e/ou minimização podem ser encontrados em Monico (2008), Groves (2008) e Hofmann- Wellenhof, Lichtenegger e Wasle (2007), dentre outros. 2.5.2. Sistema de Navegação Inercial Os erros de medida associados ao sistema de navegação inercial têm suas origens em erros residuais nos sensores inerciais, acelerômetros e giroscópios, e prejudicam a precisão do levantamento. A Tabela 2 sumariza os principais erros de um INS. Tabela 2: Principais erros de medida de um sistema INS e suas magnitudes. Tipo de erro Descrição Magnitude Erros de alinhamento Erros em roll, pitch e heading - Acelerômetro: Bias Deslocamento constante nos dados de saída dos acelerômetros 50 – 100 μ (1μ=9,81*10-6 m/s2) Acelerômetros: erros de fator de escala Resulta em um erro de aceleração proporcional a aceleração captada 75 – 200 ppm Não-ortogonalidade dos eixos dos acelerômetros e giroscópios Não-alinhamento nos eixos dos acelerômetros e giroscópios 5 – 25” Giroscópios: Drift Erro devido às variações de temperatura 0,002 – 0,01°/h Giroscópios: erros de fator de escala Erros angulares proporcionados pelas variações de temperatura < 10 ppm Ruídos 0,002°/h Fonte: Ruy (2008). Os erros de alinhamento e não ortogonalidade entre os eixos dos acelerômetros e giroscópios têm por características serem quantidades angulares constantes ao longo do tempo e que podem ser subtraídas das medidas angulares quando se conhece a magnitude dos mesmos. Os erros associados ao fator de escala, que comparecem nas medidas dos giroscópios e acelerômetros, são proporcionais ao sinal de entrada e normalmente modelados de forma linear, apesar de exibirem algum grau de não linearidade (SANTANA, 2011). 39 Por fim, os erros de bias associados aos acelerômetros e giroscópios, shift e drift, respectivamente, são valores constantes de saída que são medidos pelos sensores mesmo quando em repouso e nivelados, e podem ser percebidos quando os sensores são mantidos por longos períodos de tempo em repouso e nivelados (SANTANA, 2011). Os bias associados aos giroscópios são constantes e com crescimento linear proporcional ao tempo de integração (SANTANA, 2011). Já os bias associados aos acelerômetros também são constantes e, quando integrados duas vezes, proporcionais ao quadrado do tempo de integração (SANTANA, 2011). 40 3. METODOLOGIA Nesta seção serão apresentadas a metodologia utilizada para o levantamento, processamento e geração dos produtos representativos dos processos de erosão marginal a partir de dados de escaneamento a LASER e a análise dos resultados. Tal metodologia foi elaborada em paralelo à realização das atividades de monitoramento realizadas durante um projeto de pesquisa e desenvolvimento P&D e este fato permitiu que a metodologia fosse colocada à prova e melhorada ao longo do desenvolvimento do projeto. A sistemática de trabalho apresentada a seguir foi desenvolvida considerando os equipamentos e necessidades do P&D. 3.1. O Escâner LASER MDL Dynascan M150 No estágio de implantação do P&D alguns requisitos foram impostos para seleção da técnica de monitoramento:  Capacidade de operação embarcada;  Acurácia na determinação dos pontos compatível com a taxa de evolução dos processos erosivos;  Grande densidade de pontos para melhor discretizar a área de estudo;  Capacidade de oferecer produtos georreferenciados; e  Capacidade de avaliação dos dados levantados em campo em tempo real, para evitar revisita. Dentre as diversas técnicas aplicáveis, o Escaneamento a LASER Terrestre Móvel foi a que melhor atendeu às condições impostas, principalmente em virtude da sua operação fácil, rápida e acurada, que torna a relação custo benefício vantajosa para projetos de grandes dimensões ou que demandem flexibilidade de operação em diferentes plataformas (terrestres ou aquáticas). O mercado apresenta diferentes opções de escâneres móveis com custos de aquisição bem variados e características de operação igualmente diversificadas. As principais características que diferem os principais modelos do mercado são o alcance de operação, a capacidade de emissão de pulsos, número de registros por pulso e a acurácia nominal do produto gerado. Este último quesito deve ser cuidadosamente 41 analisado, pois melhores acurácias demandam melhores técnicas de posicionamento, o que impacta diretamente no custo de operação e tempo de pós-processamento. Para operar embarcado, o equipamento deve ser portátil, leve, apresentar resistência à umidade e eventuais respingos de água, apresentar baixo consumo de energia e integrado a receptores GNSS e unidades de medida inercial. Estes foram requisitos que restringiram muito as opções de equipamentos para a aquisição. O modelo Dynascan M150 (Figura 9) da fabricante inglesa MDL, apresenta características que atendem aos requisitos impostos. Tais características são sintetizadas no Quadro 2 (MDL, 2008). Figura 9: (a) Escâner MDL Dynascan M150 com destaque para seus equipamentos externos e (b) componentes internos. Fonte: Manfra. Quadro 2: Características do escâner a LASER MDL Dynascan M150. Número de cabeças de escaneamento 1 Posicionamento GNSS L1/L2/RTK Orientação INS/Magnetômetro Frequência de emissão de pulsos 36 kHz Frequência de rotação da cabeça De 5 a 20 Hz Alcance máximo 150 m Acurácia nominal 0,05 m Dimensões (LxAxP) 595 mm x 255 mm x 240 mm Peso 11 kg 42 O Dynascan conta com um par de receptores GNSS e uma unidade inercial integrados ao escâner LASER. Um dos receptores GNSS objetiva o posicionamento da plataforma e o outro o cálculo preciso do azimute. Além das informações providas pelos receptores GNSS, o sistema utiliza-se ainda das informações de atitude providas pela unidade de medidas inerciais, das correções enviadas, via ondas UHF (Ultra Height Frequency), pelo receptor GNSS/RTK posicionado em terra e das medidas de orientação e distância dos pulsos LASER, para a determinação das coordenadas dos pontos da nuvem. Operando a uma frequência de rotação da cabeça de emissão de pulsos de 10 Hz, emitindo 36.000 pontos por segundo, com a embarcação deslocando-se a cerca de 3,6 km/h e a uma distância de 10 m da margem, é possível a obtenção de uma nuvem de pontos com densidade de, aproximadamente, 500 pontos por metro quadrado, com espaçamento de 2 cm entre pontos de um mesmo perfil, por 10 cm entre perfis, com acurácia nominal (σ) de 5 cm. 3.1.1. Acomodação e Instalação do Escâner na Embarcação A instalação do escâner na embarcação deve ser realizada em uma posição tal que as antenas GNSS e RTK estejam livres de obstruções de sinal, bem como o eixo de rotação da cabeça de escaneamento esteja o mais alinhado possível com o sentido de deslocamento da embarcação. Uma estrutura metálica foi especialmente desenvolvida para ser fixada ao barco e acomodar o escâner (Figura 10). Tal estrutura permite a instalação do equipamento a 2,30 m acima do nível d’água, o que facilita o levantamento de barrancos elevados e reduz as áreas de oclusão decorrentes de vegetação presente nas margens do reservatório. Por outro lado, a altura da estrutura impõe algumas restrições à navegabilidade da embarcação e causa alguns efeitos indesejados na operação do escâner como a ocorrência de movimentos pendulares da embarcação durante deslocamentos em baixas velocidades. 43 Figura 10: Primeira embarcação adaptada para a operação do escâner LASER. Durante o projeto, houve a troca da embarcação utilizada por outra, mais adequada às necessidades do projeto, o que demandou a confecção de uma nova estrutura para o escâner (Figura 11). Esta segunda estrutura foi projetada para reduzir as influências na navegabilidade da embarcação, os problemas com a oscilação da embarcação e o tempo de montagem. Com 2,20 m acima do nível da água, a plataforma da nova estrutura foi colocada a 1,60 m acima da borda da embarcação, 0,20 m a menos que a estrutura anterior. A redução na altura da estrutura resultou em uma melhora da navegabilidade e estabilidade da embarcação. As etapas de montagem e desmontagem da antiga estrutura demandavam cerca de 1,5 horas por dia de trabalho, e impunham riscos à equipe e ao equipamento. Para a nova montagem, desenvolveu-se um sistema de articulações (Figura 11a) que permitem que o escâner e seus acessórios sejam montados com a estrutura baixa, à altura do peito e, somente após a instalação do escâner, esta seja suspensa até sua altura de operação. Com o novo sistema articulado, o tempo despendido nas atividades de montagem e desmontagem da embarcação foi reduzido para cerca de 45 minutos por dia de operação. O novo sistema de confecção da estrutura, sem encaixes entre as peças, permitiu ainda a instalação de um conjunto de estirantes (Figura 11b) que prendem a estrutura à embarcação e evitam as vibrações excessivas que ocorriam na operação com a embarcação antiga. As melhorias implementadas na segunda estrutura não 44 influenciaram diretamente na qualidade do levantamento, mas impactaram positivamente na redução do tempo de montagem e desmontagem, aumento da velocidade máxima permitida durante os deslocamentos e na segurança durante a navegação. Figura 11: Segunda estrutura desenvolvida para a instalação do escâner na embarcação; (a) Detalhe do sistema articulado da estrutura; (b) estrutura montada com destaque para os estirantes. A instalação do escâner não é realizada diretamente sobre a estrutura de suporte, como pode ser visto na Figura 12. À estrutura de suporte vai afixada a base de montagem do escâner, que consiste em uma estrutura de alumínio, neste caso uma escada adaptada, cujas posições de montagem do escâner e da segunda antena GNSS são fixas e a relação entre ambos, o lever arm, é conhecida e determinada por processo de Topografia Industrial. Figura 12: Estrutura rígida de montagem do Dynascan e de seus acessórios. 45 À base de montagem do escâner foi fixada uma câmara digital, com o objetivo de adquirir imagens que auxiliem a interpretação das informações LASER durante o processo de manipulação e filtragem dos dados. Como as imagens registradas pela câmara têm apenas finalidade ilustrativa e não métrica, não foram determinados o boresight e lever arm da mesma em relação ao sistema inercial do escâner. 3.1.2. Operação do Escâner A operação do escâner LASER MDL Dynascan M150 é bastante simples e rápida. O posicionamento e navegação por GNSS/RTK/IMU tornam o produto final do levantamento, a nuvem de pontos, disponível em poucos instantes após o término do levantamento. Após a conclusão do levantamento, o banco de dados contendo as informações de posição e atitude da plataforma e medidas de distância LASER, é pós- processado no software QPS Qloud (QPS, s.d.). O QPS Qloud é responsável por computar as coordenadas dos diversos pontos medidos pelo escâner no sistema de coordenadas definido para o projeto e permitir a exportação dos dados de levantamento para formatos abertos, possibilitando assim a importação dos mesmos em qualquer outro software posteriormente. O produto final do pós-processamento, que dura cerca de 60 segundos, é um arquivo no formato ASCII contendo as coordenadas tridimensionais e a intensidade do sinal de retorno dos pontos medidos (Figura 13). Na Figura 14 tem-se a renderização da nuvem de pontos da figura anterior realizada pelo software Leica HDS Cyclone. Figura 13: Lista de pontos no formato ASCII exportada pelo software QPS Qloud. 46 Figura 14: Exemplo de visualização de nuvem de pontos bruta gerada pelo escâner LASER. Os procedimentos de campo necessários para a execução do levantamento com o escâner LASER móvel são apresentados no fluxograma da Figura 15. Figura 15: Fluxograma com as etapas do levantamento de campo. 47 Em posse das informações sobre a área a ser levantada e da base RTK a ser utilizada, o levantamento de campo inicia-se com a instalação dos equipamentos, tanto na embarcação (i.e., escâner LASER) quanto em solo (i.e., receptor GNSS/RTK). Cada uma das etapas apresentadas no fluxograma será descrita a seguir:  Instalação da Base RTK em Solo: A técnica de posicionamento RTK tem por objetivo propiciar a melhoria da acurácia do posicionamento de um receptor GNSS móvel (rover) a partir de correções computadas e enviadas por um receptor de referência (base) instalado nas imediações da área de levantamento. A comunicação entre os receptores dá-se, neste caso, por ondas de rádio UHF. Logo, a distância máxima e a intervisibilidade dos receptores GNSS devem ser respeitadas para a correta aplicação da técnica. O posicionamento GNSS/RTK, também utilizado na Topografia clássica, provê acurácia média de levantamento em torno de 0,05 m (HOFMANN-WELLENHOF, LICHTENEGGER e WASLE, 2007), ideal para as atividades de monitoramento de processos erosivos. O receptor base deve ser instalado sobre um ponto de coordenadas conhecidas, previamente determinadas por uma técnica de acurácia superior à do RTK.  Instalação do Escâner na Embarcação: Nesta etapa, realiza-se a instalação física do escâner na embarcação, através da correta fixação na estrutura, bem como a fixação dos acessórios (antenas GNSS e RTK, interface de comunicação, alimentação de energia e unidade de controle). Por questão de segurança, esta etapa deve ser realizada ainda em solo.  Procedimentos de Inicialização do Escâner: Para cada sensor embarcado no sistema LASER, tem-se um procedimento de inicialização que deve ser respeitado para que se obtenha a qualidade esperada dos dados. Logo após iniciada a alimentação do sistema, deve-se aguardar cerca de cinco minutos com a embarcação parada para a inicialização do receptor GNSS (solução da ambiguidade). Para fins de otimização, utiliza-se o tempo necessário para embarque dos operadores durante o qual a embarcação encontra-se parada para a inicialização do GNSS. Próximo à área de levantamento, deve-se realizar o alinhamento inicial da unidade de medida inercial através da realização de manobras que 48 propiciem mudanças bruscas e contínuas de azimute da plataforma (OXTS, 2015). Para tal, a embarcação deve desempenhar uma velocidade superior a 10 km/h. Por fim, na aproximação ao barranco, realiza-se a inicialização da cabeça de escaneamento do escâner e procede-se o levantamento propriamente dito.  Realização do Levantamento: Durante o levantamento, navega-se paralelamente à margem erodida, mantendo-se a distância até ela e a velocidade da embarcação constantes. Cabe ao operador do escâner, que possui acesso às informações de velocidade e direção de deslocamento da embarcação, orientar o piloto nesta atividade. A precisão do levantamento pode ser acompanhada em tempo real através das telas de monitoramento de cada um dos sensores que o software de controle do escâner apresenta (Figura 16), e também pelos avisos de estado do levantamento, baseados em critérios de tolerância preestabelecidos para os erros em cada um dos sensores. Ações corretivas aos erros de levantamento como reposicionamento da base RTK em local mais próximo à área de levantamento e realinhamento da unidade de medida inercial são simples de serem aplicadas. Figura 16: Tela do software QPS Qinsy, utilizado para operação do escâner, com destaque para as mensagens de alerta dos sensores, status e carta de navegação. 49  Exportação dos Dados de Levantamento para Nuvem de Pontos: Concluído o levantamento, as informações armazenadas dizem respeito à posição e orientação da plataforma em relação ao tempo e à distância entre o sistema LASER e o barranco para cada pulso emitido. Um processo de integração dos dados de levantamento e posterior exportação para o formato de nuvem de pontos faz-se necessário. Esta etapa pode ser cumprida ainda em campo através das ferramentas de exportação do software Qloud que integra a suíte de softwares da QPS.  Verificação da Situação do Levantamento: A vantagem da realização da exportação dos dados ainda em campo é a possibilidade de verificação do sucesso, ou insucesso, do levantamento, evitando a necessidade de novo deslocamento de equipe e equipamentos para a realização de um levantamento em caso de insucesso. No caso de o levantamento ter sido bem-sucedido, finaliza-se o mesmo e prossegue-se para a próxima área de estudo. 3.2. Cuidados e Restrições para o Levantamento Durante o levantamento alguns cuidados devem ser tomados: (i) Deve-se evitar variações de velocidade da embarcação para garantir a homogeneidade na distribuição dos perfis da nuvem. Quanto menor a velocidade, menor será o espaçamento entre os perfis de escaneamento. Por conseguinte, velocidades maiores resultam em um maior espaçamento entre os perfis. No entanto, deve-se considerar a extensão da área a ser escaneada e a duração desse processo, deslocamentos sem alterações de azimute, tendem a acumular o erro da deriva do sistema inercial; (ii) A embarcação não pode aproximar-se em demasiado do barranco para evitar o risco de encalhar ou ficar presa na vegetação aquática, além de evitar a sombra das árvores localizadas nas margens, para que não ocorram perdas de sinal GNSS. Entretanto, deve permanecer o mais próximo possível do barranco para aumentar a densidade de pontos ao longo dos perfis de escaneamento; 50 (iii) Devem-se buscar as condições climáticas ideais para a execução do levantamento. Em determinadas épocas do ano, próximo ao amanhecer, os rios e lagos apresentam-se cobertos por neblina, o que impede a navegação e interfere na medida da distância com o LASER. Períodos de ventos intensos aumentam os riscos na navegação e dificultam a manutenção da direção de deslocamento e velocidade da embarcação durante a atividade de escaneamento. Análise de dados sobre velocidade de vento, oriundos de modelos climatológicos, do CPTEC (Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos), por exemplo, levaram a estabelecer o limite de 10 m/s para os ventos na região do levantamento, acima do qual as variações bruscas na orientação da plataforma resultam em deformações na nuvem de pontos e colocam em risco a segurança da navegação. (iv) Nos finais de tarde, a precisão do levantamento é deteriorada pelas influências eletromagnéticas da atmosfera na propagação dos sinais GNSS e do RTK. Desta forma, o período útil do dia para o escaneamento é limitado entre as 8:00 h e 16:00 h, aproximadamente, como foi verificado nas campanhas de campo realizadas. 3.3. Pós-processamento, geração de produtos e análises A etapa de pós-processamento engloba as atividades de filtragem da nuvem de pontos, geração de produtos que embasem os estudos acerca dos processos erosivos e as análises dos dados. As etapas envolvidas na realização do pós- processamento são descritas com mais detalhes a seguir. 3.3.1. Filtragem da Nuvem de Pontos Além do terreno, a vegetação e as feições antrópicas também aparecem nas nuvens de pontos do levantamento a LASER (Figura 17a). Dessa forma, um processo de filtragem é necessário para a retirada dos pontos levantados sobre essas feições que fogem ao interesse do monitoramento. O resultado da filtragem deverá ser um modelo de superfície que contenha apenas informações do terreno (solo nu ou rochas) (Figura 17b). 51 A mudança na geometria de visada propiciada pelos escâneres LASER terrestres dificulta, em alguns casos chegando a impossibilitar, o uso de rotinas de segmentação e filtragens de dados LiDAR (Light Detection And Ranging) desenvolvidas para uso com dados de escâneres LASER aerotransportados. A geometria de visada dos escâneres LASER terrestres faz com que apareçam na nuvem, por exemplo, paredes ao invés dos telhados de uma edificação, e tronco ao invés da copa de uma árvore, além do fato de o Dynascan registrar apenas um retorno por pulso emitido. 52 Figura 17: Exemplo de nuvens de pontos coloridas segundo a altitude (m), (a) bruta, com a presença de vegetação; (b) filtrada, sem a presença de vegetação. 53 No desenvolvimento do projeto, aplicativos como o FUSION/LDV (McGAUGHEY, 2015) e o CONUPO (BRODU e LAGUE, 2012) foram testados para a realização da filtragem automática dos dados, mas não apresentaram resultados satisfatórios; no caso do CONUPO, o resultado da classificação dos dados não apresentou-se adequado, com excesso de falsos positivos e confusão entre vegetação e solo; já com o FUSION/LDV, o tempo de processamento demandado foi superior ao dispendido para a realização da filtragem manual dos dados com resultados que exigiriam ainda refinamentos manuais. Motivado pela necessidade de adequação/desenvolvimento de uma rotina de segmentação e filtragem, inicialmente, propôs-se o desenvolvimento de uma ferramenta automatizada para o processo de filtragem. Verificou-se, entretanto, as dificuldades em viabilizar esta proposta, devido a algumas restrições técnicas do equipamento, o modelo de escâner utilizado neste projeto é de uma geração anterior que não permite o registro de mais de um retorno por pulso emitido, algo que frequentemente ocorre na vegetação. Considerando-se os avanços tecnológicos que permitiram que a maioria dos escâneres LASER tenham a capacidade de registro de mais de um retorno de um mesmo pulso, não faz sentido o desenvolvimento de uma técnica de filtragem para uma tecnologia já superada. Todavia, uma rotina de refinamento automatizado da filtragem, geração de seções transversais e extração de linhas de crista foi desenvolvida. O código de filtragem e geração de produtos foi desenvolvido em módulos, de forma a propiciar futuras melhorias. O módulo principal tem por base a realização da filtragem da nuvem de pontos LASER. O processo de filtragem baseia-se apenas nas informações geométricas acerca da nuvem de pontos. Por ser a trajetória de deslocamento do escâner LASER aproximadamente paralela ao barranco e com poucas variações bruscas de direção, caso essa não seja conhecida, é possível determinar a posição do escâner a partir da nuvem de pontos e, a partir desta, calcular a distância entre o escâner e cada um dos pontos da nuvem. Em teoria, os pontos que apresentarem as maiores distâncias, quando comparados a uma vizinhança, devem representar retorno do pulso LASER no solo (Figura 18). 54 Figura 18: Esquema da filtragem da nuvem de pontos com destaque para (a) a posição determinada do escâner e o voxel de convolução utilizado para delimitar a área de busca; (b) os pontos rotulados como solo após o processo de filtragem e; (c) a linha que representa o perfil do barranco. Um voxel de convolução percorre toda a nuvem de pontos, de baixo para cima e ao longo de sua extensão, calculando a distância de cada ponto à posição simulada do escâner, assumindo-se o ponto de maior distância dentro de cada voxel como sendo um retorno do pulso no solo. A posição do escâner é recalculada a cada deslocamento de posição do voxel ao longo da extensão da nuvem de pontos. Ao final do processo, restará apenas uma amostra da nuvem de pontos original na qual espera-se que haja apenas informação sobre o terreno. Testes de filtragem realizados com dados de campo não apresentaram os resultados esperados, pois, em decorrência da densidade da vegetação presente em algumas regiões amostradas nos reservatórios e do registro de apenas um retorno por 55 pulso emitido pelo escâner, a vegetação acabou por ocultar por completo o terreno, e a rotina de filtragem seleciona pontos na vegetação ao invés de pontos no terreno. Consequentemente, porções de barranco ficam ocultas caso a vegetação seja muito densa. Por outro lado, a rotina desenvolvida mostrou-se extremamente útil para a remoção de vegetação esparsa do barranco, principalmente gramíneas que são de difícil remoção através de interpretação visual. Com isto, a inspeção visual ainda é necessária, sendo esta rotina realizada sob supervisão do operador que esteve em campo e com o auxílio de imagens RGB adquiridas com a câmara acoplada ao escâner descrita na seção 3.1.1. Os demais módulos desenvolvidos têm por objetivo a preparação dos dados para o processo de filtragem e a geração de produtos, dentre os quais destacam-se os módulos de geração de seções transversais, que segmenta a nuvem de pontos em posições determinada para a geração dos perfis transversais, e o módulo de extração de linha de crista, que busca ao longo da nuvem os pontos de inflexão do barranco e, a partir destes, traça a linha que representa a crista do barranco. 3.3.2. Produtos A evolução dos processos erosivos pode ser avaliada com base na comparação das nuvens de pontos LASER e dos produtos delas derivados, como linhas de crista, curvas de nível e seções transversais de levantamentos de diferentes épocas, constituindo, assim, séries temporais dos processos. Abaixo, serão descritos estes produtos, a forma de geração e sua utilidade na análise da evolução dos processos erosivos. (A) Linha de Crista: é a linha que separa o terreno do talude, como pode ser visto na Figura 19. As linhas de crista podem ser definidas através de levantamento topográfico diretamente sobre o barranco ou, como proposto nesta metodologia, através da vetorização diretamente sobre a nuvem de pontos, ou ainda sobre imagens aéreas e orbitais. A comparação entre linhas de crista de duas épocas distintas de levantamento permite a identificação de áreas onde ocorreu erosão, e o cálculo da área produtiva perdida devido ao processo, principal 56 informação de interesse dos proprietários localizados às margens do reservatório. A extração das linhas de crista pode ser realizada diretamente sobre a nuvem de pontos LASER de forma manual, ou de forma automatizada através da detecção do ponto de inflexão de cada um dos perfis de escaneamento. Para este projeto utilizou-se a extração manual das linhas de crista através de vetorização sobre a nuvem de pontos. Figura 19: Representação esquemática da linha de crista (cor amarela) de um barranco. (B) Seções Transversais: resultam de um corte transversal ao barranco (Figura 20). Têm por objetivo apresentar o formato do barranco em uma determinada porção. As seções transversais permitem além de um estudo pormenorizado do processo erosivo, a estimativa do volume de material erodido em um determinado período através da comparação de duas épocas distintas (Figura 21). Diversos são os softwares de CAD (Computer Aided Design) e topográficos capazes de gerar seções transversais, por ser este um produto usual da Topografia muito aplicado a trabalhos de corte e aterro, por exemplo. 57 Figura 20: (a) Esquema gráfico demonstrando a posição de uma série de seções transversais sobre o barranco e, em (b) a vista lateral de uma delas evidenciando o formato do barranco. Figura 21: Exemplo de perfis topográficos reais de duas épocas distintas evidenciando o avanço do processo erosivo, gerados no software Leica HDS Cyclone. (C) Curvas de nível: Produto muito usual em levantamentos topográficos, as curvas de nível têm por objetivo representar em um plano horizontal o relevo. Diversos são os softwares que realizam a geração de curvas de nível: em geral os topográficos, CADs e SIGs (Sistema de Informações Geográficas) realizam tal função. A metodologia mais usual para a geração das curvas de nível envolve a Triangulação de Delaunay para a triangulação, seguida da interpolação dos contornos. Nos trabalhos realizados no decorrer do projeto, foram utilizados os softwares Leica HDS Cyclone para a geração das curvas de nível a partir da nuvem de pontos, e o ArcGIS para a edição posterior das mesmas. 58 3.3.3. Análise dos dados A análise da evolução dos processos erosivos dá-se, basicamente, sobre as linhas de crista e as seções transversais. As curvas de nível, devido às características do levantamento com o LASER escâner, podem apresentam deslocamento relativo entre duas épocas que não deve ser interpretada a priori como avanço do processo erosivo, mas sim como um erro planimétrico causado pela incerteza altimétrica. Nas áreas com baixa declividade, este deslocamento pode ser significativo e induzir a falsas interpretações. Tal fato faz com que este produto não seja adotado para a análise do processo erosivo, mas sirva apenas para o acompanhamento da estabilidade do barranco e detecção de possível processo de subsidência de grande magnitude. A primeira etapa do processo de análise é a comparação das linhas de cristas das diversas épocas de levantamento. O objetivo desta comparação é a identificação das diferenças entre as linhas que indicarão a ocorrência de erosões no período analisado. O uso de softwares de SIG para a edição e extração das linhas de crista em formato vetorial necessário é recomendável. Para a realização das análises, foi utilizado o ArcGIS que, além das ferramentas básicas de manipulação de dados vetoriais, permite a criação de feições poligonais a partir da diferença entre linhas (Figura 22). Os polígonos gerados a partir da diferença entre as linhas de crista são úteis para a determinação das regiões erodidas e quantificação de suas áreas. Figura 22: Comparativo entre três épocas de escaneamento evidenciando as áreas de ocorrência de erosão e a posição das seções transversais. 59 Qualquer diferença entre duas ou mais linhas de crista gera um polígono. Estudos e experimentos realizados ao longo do desenvolvimento do projeto mostraram que deslocamentos lineares da linha de crista inferiores a 0,25 m não podem ser seguramente classificados como erosão em virtude da acurácia dos dois levantamentos que serão comparados entre si. Por este motivo, polígonos com área inferior a 0,25 m2, equivalente a uma região de 1 m de comprimento por 0,25 m de profundidade, não são considerados como regiões erodidas. Para o cálculo da taxa estimada de avanço dos processos (Taxaproc) utiliza-se a área erodida em um determinado período e a quantidade de meses desse período, como apresentado na Equação 4. 𝑇𝑎𝑥𝑎𝑝𝑟𝑜𝑐 = Á𝑟𝑒𝑎 𝑒𝑟𝑜𝑑𝑖𝑑𝑎 𝑛𝑜 𝑝𝑒𝑟í𝑜𝑑𝑜 𝑞𝑢𝑎𝑛𝑡𝑖𝑑𝑎𝑑𝑒 𝑑𝑒 𝑚𝑒𝑠𝑒𝑠 ( (4) Finalizada a geração e a seleção dos polígonos de erosão das áreas de interesse, tem-se o produto usual do monitoramento de processos erosivos utilizando técnicas topográficas e de Sensoriamento Remoto. No entanto, os dados LASER possibilitam, ainda, a estimativa do volume de material erodido através da análise das múltiplas seções transversais geradas nas regiões erodidas. Uma vez identificadas as regiões de ocorrência de erosões, procede-se com a segunda etapa da análise dos processos erosivos, a geração das seções transversais. O conhecimento do formato do barranco pode dar um indicativo sobre o agente causador do processo erosivo, como por exemplo, escoamento superficial ou sub-superficial, impacto de ondas, entre outros. As seções transversais são geradas utilizando uma ferramenta de geração de perfil do Cyclone. Após a geração das seções, os pontos da nuvem que fazem parte de cada uma delas têm suas coordenadas exportadas para uma lista de pontos, e utiliza- se um código desenvolvido em C++ para a simplificação das seções e representação em formato de linha, uma vez que para a geração destas é necessário um buffer de 1 m de largura ao longo do barranco. A partir d