Universidade Estadual Paulista Campus de São José do Rio Preto Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas Construções de Reticulados via Extensões Ćıclicas de Grau Ímpar Everton Luiz de Oliveira Orientador: Prof. Dr. Antonio Aparecido de Andrade Dissertação apresentada ao Departamento de Matemática - IBILCE - UNESP, como parte dos requisitos para a obtenção do t́ıtulo de Mestre em Matemática São José do Rio Preto Fevereiro - 2011 Everton Luiz de Oliveira Construções de Reticulados via Extensões Ćıclicas de Grau Ímpar Dissertação apresentada para obtenção do t́ıtulo de Mestre em Matemática, área de Álgebra, junto ao Programa de Pós-Graduação em Matemática do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista, “Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de São José do Rio Preto. BANCA EXAMINADORA Prof. Dr. Antonio Aparecido de Andrade Professor Adjunto UNESP – São José do Rio Preto Orientador Prof. Dr. Edson Donizete de Carvalho Professor Assistente Doutor UNESP – Ilha Solteira Prof. Dr. Clotilzio Moreira dos Santos Professor Assistente Doutor UNESP – São José do Rio Preto São José do Rio Preto, 28 de fevereiro de 2011. Oliveira, Everton Luiz de. Construções de reticulados via extensões ćıclicas de grau ı́mpar / Everton Luiz de Oliveira. - São José do Rio Preto : [s.n.], 2011. 122 f. : il. ; 30 cm. Orientador: Antonio Aparecido de Andrade Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas 1. Álgebra comutativa. 2. Teoria dos números. 3. Teoria dos reticulados. I. Andrade, Antonio Aparecido de. II. Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas. III. T́ıtulo. CDU - 512.56 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do IBILCE Campus de São José do Rio Preto - UNESP Aos que trouxeram força durante os dias de elaboração deste trabalho, dedico. Em especial, aos meus pais, Claudio e Cleide. Ficar, deixar... como vir a ser, quiçá. Onde for que há de ir o que fica é o ińıcio do que vir. E assim, o que surge em torno a ti te espera reagir... e ver... viver Resumo Neste trabalho, descrevemos construções ćıclicas de reticulados algébricos Zn-rotacionados de dimensão ı́mpar. Essas construções são obtidas através da imersão no Rn, via o homomorfismo canônico, de determinados Z-módulos livres de posto finito contidos em subcorpos de extensões ciclotômicas do tipo Q(ζp), Q(ζp2), Q(ζpq) e Q(ζpq2), com p e q primos ı́mpares. Caracterizamos os reticulados obtidos e apresentamos propriedades e aplicações na Teoria da Informação. Palavras-Chave: Extensões ćıclicas, ramificação de ideais, reticulados algébricos, anéis de grupo, reticulados Zn-rotacionados. 6 Abstract In this work we describe cyclic constructions of rotated algebraic Zn-lattices of odd dimension. These constructions are obtained by immersion in Rn via the canonical homomorphism, of certain Z-free modules of finite rank contained in subfield cyclotomic extensions of type Q(ζp), Q(ζp2), Q(ζpq) e Q(ζpq2), with p and q odd prime. Featuring the obtained lattices and presenting properties and applications in Information Theory. Keywords: Cyclic extension, ideal ramification, algebraic lattices, group rings, rotated Zn- lattices. 7 Índice de Śımbolos N: conjunto dos números naturais Z: conjunto dos números inteiros Q: conjunto dos números racionais R: conjunto dos números reais C: conjunto dos números complexos∑ : somatório∏ : produtório #B: cardinalidade do conjunto B A = (aij): matriz det(A): determinante da matriz A a|b: a divide b a ≡ b(mod m): a congruente a b módulo m δij: delta de Kronecker Ker(f): núcleo da aplicação f Im(f): imagem da aplicação f ◦(G): ordem do grupo G H 6 G: H é subgrupo de G H ▹ G: H é subgrupo normal de G A,R: anéis S−1R: anel de frações de R com respeito a S RG: anel de grupo de G sobre R I,J ,P ,M, ...: ideais I + J : soma de ideais IJ : produto de ideais R/I: anel quociente M,N : módulos K, L, M, F, ...: corpos KL: corpo composto de K e L [L : K]: grau da extensão K ⊆ L 8 Gal(L : K): grupo de Galois de L sobre K TrL/K(α): traço do elemento α ∈ L NL/K(α): norma do elemento α ∈ L N (I): norma do ideal I OR(A): anel de inteiros de R sobre A OK: anel de inteiros do corpo de números K D(α1, . . . , αn): discriminante de {α1, . . . , αn} ⊂ K DK: discriminante do corpo de números K D(R/A): discriminante de R sobre A ∆−1 K/Q: codiferente de K sobre Q Zn: grupo das classes residuais módulo n Z∗ n: grupo das classes residuais invert́ıveis módulo n ζn: raiz n-ésima da unidade ϕn(x): n-ésimo polinômio ciclotômico Q(ζn): n-ésimo corpo ciclotômico Λ: reticulado Vol(Λ): volume do reticulado Λ div(Λ): diversidade do reticulado Λ dp,min(Λ): distância produto mı́nima de Λ σK: homomorfismo canônico σα: perturbação do homomorfismo canônico σK(M), σα(M): reticulados algébricos (I, T rα): reticulado ideal (Trα): matriz da forma traço 9 Sumário Introdução 12 1 Teoria Algébrica dos Números 14 1.1 Conceitos preliminares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 1.2 Traço e norma . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 1.3 Módulos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 1.4 Anel de inteiros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 1.5 Norma de um ideal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 1.6 Discriminante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 1.7 Anéis noetherianos e de Dedekind . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 1.8 Ideais fracionários . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 2 Ramificação de Ideais 26 2.1 Anéis de frações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26 2.2 Fatoração de um ideal primo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 2.3 Ramificação via discriminante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 3 Reticulados 40 3.1 Reticulados no Rn . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 3.2 Reticulados algébricos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 3.2.1 Homomorfismo canônico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 3.2.2 Perturbação do homomorfismo canônico . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 3.3 Reticulados ideais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 4 Reticulados de dimensão ı́mpar via Extensões Ćıclicas 59 4.1 Reticulados de dimensão ı́mpar sobre OK . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 4.1.1 Obtenção do reticulado σK(OK) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65 4.1.2 Algoritmo de construção . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 4.2 Terminologia dos reticulados Zn-rotacionados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74 4.3 Anéis de grupos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75 10 4.4 Reticulados Zn-rotacionados de dimensão (prima) ı́mpar n . . . . . . . . . . . . 80 4.4.1 Caso I: um único primo p ̸= n ramifica em OK, com n ı́mpar . . . . . . . 81 4.4.2 Caso II: n é o único primo que ramifica em OK . . . . . . . . . . . . . . 94 4.4.3 Caso III: pelo menos dois primos ramificam em OK, com n primo ı́mpar . 104 4.5 Conclusões e perspectivas futuras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 118 Índice Remissivo 121 11 Introdução O recente surgimento de novos canais de comunicação na Teoria da Informação influencia diretamente na importância de determinados reticulados. Em particular, há interesse pelo reticulado Zn devido à aplicabilidade no canal Rayleigh Fading e, por esta razão, há uma busca por diferentes formas de obtenção de reticulados isomorfos à Zn, chamados Zn-reticulados. Neste trabalho, apresentamos a descrição de algumas famı́lias de Zn-reticulados através da Teoria Algébrica dos Números, utilizando determinados Z-módulos de extensões ćıclicas de grau ı́mpar (por vezes primo ı́mpar). Originalmente, as estruturas que utilizamos provêm de construções algébricas desenvolvi- das em décadas passadas. No ano de 1984, P. E. Conner e R. Perlis indagaram, em [10], sobre a existência de uma base, para um determinado ideal fracionário do anel de inteiros de um corpo de números, que faria a matriz da forma traço coincidir com a identidade. Quatro anos depois B. Erez exibiu tal base, em [20], para o caso particular em que o corpo de números é ćıclico de grau primo ı́mpar, onde fez o estudo da forma traço, dividindo em alguns casos de ramificação. Entretanto, Erez utilizou-se de bases fornecidas pelas construções feitas em [21], por S. Ullom no final dos anos sessenta. Estas bases geram estruturas algébricas, chamadas Z-módulos, que podem ser imersas no Rn fornecendo reticulados algébricos. Além disso, como veremos na Seção (4.2), o fato da matriz da forma traço associada coincidir com a matriz identidade faz com que esses reticulados sejam isomorfos à Zn. Esse é o foco de nosso estudo nesse texto. Fazemos a obtenção de Zn- reticulados tomando como referência as construções desenvolvidas em [18] e [19], e utilizando as estruturas algébricas fornecidas por [20]. Organizamos o texto da seguinte maneira: No Caṕıtulo (1), percorremos os elementos fundamentais da Teoria Algébrica dos Números. Na Seção (1.1), é introduzida uma miscelânea de conceitos e resultados que serão utilizados no decorrer do texto, onde utilizamos as referências [1], [4], [5] e [6]. Na Seção (1.2), apresentamos os conceitos de traço e norma em corpos de números, juntamente com suas propriedades fun- damentais, em que fizemos uso das referências [4] e [5]. Na Seção (1.3), é feita uma abordagem sobre módulos, utilizando [2] e [5] como referência. Na Seção (1.4), expomos alguns resultados sobre a estrutura de um anel de inteiros; fizemos uso das referências [4], [5] e [6]. Na Seção 12 (1.5), é apresentado o conceito de norma de um ideal e as propriedades que ela preserva, onde utilizamos a referência [5]. A Seção (1.6) é destinada ao conceito de discriminante em corpos de números e alguns resultados de importante aplicação relacionados a este parâmetro; fizemos uso das referências [4], [5] e [14]. Na Seção (1.7), são introduzidas as propriedades que definem anéis noetherianos e de Dedekind e verificamos que o anel de inteiros de um corpo de números as satisfaz, onde utilizamos as referências [5] e [6]. Por fim, na Seção (1.8), apresentamos uma estrutura de importante aplicação em reticulados ideais, chamada ideal fracionário, em que fizemos uso das referências [5] e [11]. No Caṕıtulo (2), apresentamos resultados sobre anéis de frações e a fatoração de ideais, permitindo um estudo da ramificação de ideais primos (ou de números primos) através do discriminante. Como principal resultado, é caracterizada a ramificação de um número primo no anel de inteiros de um corpo de números, fornecendo valiosa ferramenta para as construções de reticulados deste trabalho. Utilizamos as referências [5] e [18]. No Caṕıtulo (3), apresentamos três abordagens sobre reticulados: a Teoria dos Reticula- dos Clássica, Reticulados Algébricos e Reticulados Ideais. Na primeira, introduzimos o con- ceito de reticulado no Rn, algumas propriedades e parâmetros de importante aplicação, como volume, diversidade e distância produto mı́nima, onde fizemos uso das referências [9], [11] e [12]. As outras duas abordagens descrevem maneiras de se obter reticulados no Rn através da Teoria Algébrica dos Números, fornecendo propriedades e fórmulas expĺıcitas para alguns parâmetros desses reticulados, em que utilizamos as referências [5], [11], [12], [16] e [17]. No caṕıtulo (4), descrevemos construções de famı́lias de reticulados algébricos de dimensão ı́mpar (por vezes prima ı́mpar), imergindo no Rn, via homomorfismo canônico, determinados Z- módulos livres de posto finito contidos em extensões ćıclicas. Na seção (4.1), apresentamos uma construção inicial imergindo o anel de inteiros de uma extensão ćıclica no Rn, fornecendo alguns parâmetros dos reticulados obtidos. Na Seção (4.2), é introduzido o conceito de reticulado Zn- rotacionado e apresentamos uma condição suficiente para obtê-lo, onde utilizamos as referências [15] e [18]. Na seção (4.3), é apresentado o conceito de anel de grupo visando intermediar as abordagens feitas em [18] e [20], referências utilizadas para a Seção (4.4), na qual é feita a obtenção de reticulados Zn-rotacionados. Na Seção (4.4), fizemos uso também das referências [14] e [21] e na Seção (4.3), utilizamos as referências [8], [10] e [20]. Por fim, apresentamos uma conclusão do caṕıtulo e expomos posśıveis novas construções e generalizações de resultados na Teoria Algébrica dos Números. Neste trabalho, quando citado um anel, ele é comutativo e possui unidade. 13 Caṕıtulo 1 Teoria Algébrica dos Números Neste caṕıtulo, apresentamos uma introdução sobre a Teoria Algébrica dos Números. São abordados conceitos fundamentais, como traço e norma, anel de inteiros e discriminante de um corpo de números, norma de um ideal e as principais propriedades relacionadas a esses elementos. A demonstração de determinados resultados é omitida. Alguns por se tratarem de resultados clássicos e outros pela extensa demonstração. Todavia, inserimos a referência nos que seguem sem demonstração. 1.1 Conceitos preliminares Nesta seção, introduzimos alguns conceitos e resultados fundamentais da Teoria de Galois e da Teoria Algébrica dos Números. Definição 1.1.1 Se K é um subcorpo de um corpo L, dizemos que L é uma extensão de K, ou ainda, que K ⊆ L é uma extensão. O grau da extensão K ⊆ L é a dimensão de L como espaço vetorial sobre K, e denotamos por dimK L = [L : K]. No caso em que [L : K] é finito, dizemos que K ⊆ L é uma extensão finita. Definição 1.1.2 Uma extensão finita K do corpo Q dos números racionais é chamada de corpo de números. Se [K : Q] = n, dizemos que K é um corpo de números de grau n. Definição 1.1.3 Sejam K ⊆ L uma extensão e Aut(L) o grupo dos automorfismos de L. O conjunto Gal(L : K) = {σ ∈ Aut(L); σ(x) = x, ∀x ∈ K} é um subgrupo de Aut(L), chamado de grupo de Galois de L sobre K. Definição 1.1.4 Uma extensão finita K ⊆ L tal que [L : K] = ◦(Gal(L : K)) é chamada de extensão de Galois, ou galoisiana. Nesse caso, se Gal(L : K) é abeliano, dizemos que K ⊆ L é abeliana e se Gal(L : K) é ćıclico, dizemos que K ⊆ L é ćıclica. 14 Teorema 1.1.1 ([1],Teo.12.1)(Teorema da Correspondência de Galois) Seja K ⊂ L uma extensão galoisiana contida num corpo algebricamente fechado. (i) Se H é um subgrupo de Gal(L : K), então existe um único corpo intermediário M de K ⊂ L tal que H = Gal(L :M). Nesse caso, M é dito o corpo fixo de H. (ii) Se M é um corpo intermediário de K ⊂ L, então M ⊂ L é galoisiana e Gal(L : M) é o único subgrupo de Gal(L : K) que satisfaz [M : K] = ◦(Gal(L : K)) ◦(Gal(L :M)) . (iii) Seja M um corpo intermediário de K ⊂ L. Temos que K ⊂M é galoisiana se, e somente se, Gal(L :M) é um subgrupo normal de Gal(L : K), e nesse caso Gal(M : K) ≃ Gal(L : K) Gal(L :M) . Definição 1.1.5 Seja n um inteiro positivo. Dizemos que ζn é uma raiz n-ésima da unidade se ζnn = 1, e que ζn é uma raiz n-ésima primitiva da unidade se ζnn = 1 e ζjn ̸= 1, para todo j = 1, . . . , n− 1. Se ζn é primitiva, chamamos o polinômio ϕn(x) = n∏ j=1 mdc(j,n)=1 (x− ζjn) de n-ésimo polinômio ciclotômico. O corpo Q(ζn) é dito o n-ésimo corpo ciclotômico. Observação 1.1.1 Considere Q(ζn) um corpo ciclotômico e Z∗ n o grupo das classes residuais invert́ıveis módulo n. Temos que Gal(Q(ζn) : Q) = {σi : Q(ζn) → Q(ζn); σi(ζn) = ζ in, mdc(i, n) = 1, i = 1, . . . , n}. Desse modo, Gal(Q(ζn) : Q) ≃ Z∗ n via o isomorfismo natural σi 7→ i. Teorema 1.1.2 ([6],pág.44) O grupo Z∗ n é ćıclico se, e somente se, n = 2, 4, pr ou 2pr, com r ≥ 1 e p um primo ı́mpar. Exemplo 1.1.1 Se p é um primo ı́mpar, segue da Observação 1.1.1 e do Teorema 1.1.2 que o corpo ciclotômico Q(ζp) é uma extensão ćıclica de grau p − 1 sobre Q, cujo grupo de Galois é dado por Gal(Q(ζp) : Q) = {σ1, . . . , σp−1}, onde σi : ζp 7→ ζ ip, para i = 1, . . . , p− 1. Além disso, 15 o p-ésimo polinômio ciclotômico é dado por ϕp(x) = xp − 1 x− 1 = xp−1 + . . .+ x+ 1. Teorema 1.1.3 ([6],pág.273)(Teorema de Kronecker-Weber) Se Q ⊆ K é uma extensão abeliana, então existe uma ráız n-ésima da unidade ζn, tal que K ⊆ Q(ζn). Definição 1.1.6 Seja Q ⊆ K uma extensão abeliana. O menor inteiro positivo m tal que K ⊆ Q(ζm) é chamado de condutor do corpo K. Teorema 1.1.4 ([5],pág.34)(Teorema do Elemento Primitivo) Se K ⊂ L é uma extensão finita, então existe α ∈ L tal que L = K(α). O elemento α é chamado elemento primitivo. Corolário 1.1.1 Se K ⊂ L é uma extensão finita de grau n e F é um corpo algebricamente fechado contendo K, então existem exatamente n K-monomorfismos distintos de L em F. Demonstração: Pelo Teorema 1.1.4, temos que existe α ∈ L tal que L = K(α). Como K ⊂ K(α) é finita de grau n, segue que o grau do polinômio minimal p(x) de α sobre K é n. Desse modo, como p(x) é irredut́ıvel, ele possui n ráızes distintas α1, . . . , αn em F. Portanto, para cada i = 1, . . . , n, temos definido o K-monomorfismo σi : K(α) → F, dado por σi(α) = αi, como queŕıamos. Observação 1.1.2 Se Q ⊂ K é uma extensão galoisiana de grau n, segue pelo Teorema 1.1.4 que existe α ∈ K tal que K = Q(α), desse modo Gal(K : Q) = {σ1, . . . , σn}, onde os σi’s são exatamente os monomorfismos dados pelo Corolário 1.1.1. Definição 1.1.7 Sejam K um corpo de números de grau n e σ1, . . . , σn os Q-monomorfismos distintos de K em C. (i) Se σi(K) ⊆ R dizemos que σi é um monomorfismo real. Caso contrário, dizemos que σi é um monomorfismo imaginário. (ii) Se σi(K) ⊆ R, para todo i = 1, . . . , n, dizemos que K é um corpo totalmente real. Se σi(K) * R, para todo i = 1, . . . , n, dizemos que K é um corpo totalmente imaginário. Teorema 1.1.5 ([6],pág.20)(Lema de Dedekind) Se K ⊂ L é uma extensão finita de grau n e σ1, . . . , σn os K-monomorfismos distintos de L num corpo algebricamente fechado F contendo K, então {σ1, . . . , σn} é linearmente independente sobre F. 16 1.2 Traço e norma Introduzimos nesta seção os conceitos de traço e norma em corpos de números e apresentamos suas propriedades elementares. Definição 1.2.1 Sejam K ⊆ L uma extensão de grau n de corpos de números e σ1, . . . , σn os K-monomorfismos de L em C. Definimos o traço e a norma de um elemento α ∈ L, com respeito a extensão K ⊆ L, como sendo respectivamente: TrL/K(α) = n∑ i=1 σi(α) e NL/K(α) = n∏ i=1 σi(α). Proposição 1.2.1 Sejam M ⊆ K ⊆ L extensões de corpos de números, tal que [L : K] = n. Se α, β ∈ L e a ∈ K, então valem as seguintes propriedades: 1. TrL/K(α+ β) = TrL/K(α) + TrL/K(β) 2. TrL/K(aα) = aTrL/K(α) 3. TrL/K(a) = na 4. NL/K(αβ) = NL/K(α)NL/K(β) 5. NL/K(aα) = anNL/K(α) 6. NL/K(a) = an 7. TrL/M(α) = TrK/M(TrL/K(α)) 8. NL/M(α) = NK/M(NL/K(α)) 9. TrL/M(a) = nTrK/M(a) 10. NL/M(a) = NK/M(a) n. Observação 1.2.1 Quando subentendida a extensão K ⊆ L da qual α ∈ L, denotamos simplesmente Tr(α) = TrL/K(α) e N (α) = NL/K(α). 1.3 Módulos Nesta seção, é apresentado o conceito de módulo e algumas de suas propriedades fundamentais. 17 Definição 1.3.1 Seja R um anel. Um grupo abeliano aditivo (M,+) munido de um produto escalar · : R×M →M é dito um R-módulo se satisfaz as seguintes propriedades: (i) a(m+ n) = am+ an (ii) (a+ b)m = am+ bm (iii) (ab)m = a(bm) (iv) 1m = m, para todo a, b ∈ R e m,n ∈M . Definição 1.3.2 Sejam R um anel e M um R-módulo. Um subgrupo N de M é chamado de um R-submódulo de M , se para todo a ∈ R e n ∈ N tivermos an ∈ N . Definição 1.3.3 Sejam R um anel e M um R-módulo. (i) Dizemos que um subconjunto {x1, . . . , xn} ⊂ M é um gerador de M se todo elemento m ∈M é da forma m = a1x1 + . . .+ anxn, com ai ∈ R, para i = 1, . . . , n. (ii) O conjunto {x1, . . . , xn} é dito uma base de M se é formado por geradores linearmente independentes sobre R. Se M possui uma base, M é chamado de R-módulo livre e o número de elementos dessa base é chamado de posto de M . Definição 1.3.4 Sejam R um anel e M,N dois R-módulos. Dizemos que uma aplicação φ :M → N é um homomorfismo de R-módulos se satisfaz as seguintes condições (i) φ(x+ y) = φ(x) + φ(y) (ii) φ(ax) = aφ(x), para todo x, y ∈ M e a ∈ R. Se, além disso, a aplicação φ é injetiva (sobrejetiva), dizemos que φ é um monomorfismo (epimorfismo) de R-módulos, e se φ é bijetiva dizemos que é um isomorfismo de R-módulos. Teorema 1.3.1 ([5],pág.21) Se R é um anel principal, M um R-módulo livre de posto n e N um R-submódulo de M , então: (i) N é livre de posto q, com 0 ≤ q ≤ n. (ii) Se N ̸= {0}, então existem uma base {e1, . . . , en} deM e elementos não nulos a1, . . . , aq ∈ R tal que {a1e1, . . . , aqeq} é uma base de N , de modo que ai divide ai+1, para 1 ≤ i ≤ q − 1. 18 Proposição 1.3.1 Sejam K um corpo de números de grau n, σ1, . . . , σn os Q-monomorfismos distintos de K em C e M ⊆ K um Z-módulo livre de posto n. Se {x1, . . . , xn} é uma Z-base de M , então det(σi(xj)) n i,j=1 ̸= 0. Demonstração: Se det(σi(xj)) n i,j=1 = 0, então as colunas da matriz (σi(xj)) n i,j=1 são linear- mente dependentes. Assim, existem a1, . . . , an ∈ C, não todos nulos, tal que ∑n i=1 aiσi(xj) = 0, para todo j = 1, . . . , n. Desse modo, teremos ∑n i=1 aiσi(x) = 0, para todo x ∈ M , o que contradiz o Teorema 1.1.5 (Lema de Dedekind). Portanto, det(σi(xj)) n i,j=1 ̸= 0. 1.4 Anel de inteiros Nesta seção, introduzimos o conceito de anel de inteiros e apresentamos algumas propriedades relacionadas a sua estrutura. Definição 1.4.1 Sejam A ⊆ R anéis. Dizemos que um elemento α ∈ R é inteiro sobre A se existe um polinômio mônico não-nulo f(x) com coeficientes em A tal que f(α) = 0, isto é, existem a0, . . . , an−1 ∈ A, não todos nulos, tal que αn + an−1α n−1 + . . .+ a1α+ a0 = 0. Se todo elemento de R é inteiro sobre A, dizemos que R é inteiro sobre A. Definição 1.4.2 Sejam A ⊆ R anéis. O conjunto de todos os elementos de R que são inteiros sobre A é um subanel de R, que denotamos por OR(A). O anel OR(A) é chamado de anel de inteiros de R sobre A. Se K é um corpo de números, o anel de inteiros OK(Z) de K sobre Z será denotado simplesmente por OK, e chamado de anel de inteiros de K. Proposição 1.4.1 ([5],pág.38) Se K é um corpo de números e α ∈ OK, então TrK/Q(α) e NK/Q(α) são números inteiros. Definição 1.4.3 Sejam R um domı́nio e K seu corpo de frações. Dizemos que R é um anel integralmente fechado se OK(R) = R. Proposição 1.4.2 Se R é um domı́nio, K seu corpo de frações e K ⊆ L uma extensão finita, então OL(R) é integralmente fechado. Demonstração: Seja M o corpo de frações de OL(R). Temos que K ⊂ M ⊂ L. Seja x ∈ M tal que x é inteiro sobre OL(R). Como OL(R) é inteiro sobre R, segue que x é inteiro sobre R. Assim, seOM é o conjunto dos elementos deM que são inteiros sobreOL(R), entãoOM ⊂ OL(R). Mas, como OL(R) ⊂ OM, segue que OL(R) = OM. Portanto, OL(R) é integralmente fechado. 19 Teorema 1.4.1 ([5],pág.40) Sejam R um anel principal, K seu corpo de frações e L uma extensão finita de grau n sobre K. Temos que: (i) OL(R) é um R-módulo livre de posto n; (ii) Se I é um ideal de OL(R), então I é um R-módulo livre de posto n. 1.5 Norma de um ideal Considere K um corpo de números de grau n. Apresentamos o conceito de norma de um ideal do anel de inteiros OK e algumas propriedades que ela preserva. Definição 1.5.1 Seja I um ideal não-nulo do anel de inteiros OK. A norma do ideal I é definida como sendo a cardinalidade do anel quociente OK/I, isto é, N (I) = # OK I . Proposição 1.5.1 ([5],Seç.3.5) Se ⟨α⟩ é um ideal principal do anel de inteiros OK, então N (⟨α⟩) = |N (α)|. Proposição 1.5.2 ([5],Seç.3.5) Se I,J são ideais não-nulos de OK, então N (IJ ) = N (I)N (J ). Proposição 1.5.3 ([5],Seç.3.5) Seja I um ideal não-nulo do anel de inteiros OK. Se {w1, . . . , wn} for uma Z-base de OK e {e1w1, · · · , enwn} uma Z-base de I, onde e1, . . . , en são inteiros não- nulos, então N (I) = |e1 . . . en|. 1.6 Discriminante Esta seção é destinada ao conceito de discriminante em corpos de números. Utilizamos este parâmetro no estudo da ramificação de ideais e dos reticulados algébricos. Considere K um corpo de números de grau n. Definição 1.6.1 Sejam σ1, . . . , σn os Q-monomorfismos de K em C e {α1, . . . , αn} um con- junto de elementos de K . Definimos o discriminante desse conjunto por D(α1, . . . , αn) = det[(σi(αj)) n i,j=1] 2. 20 Proposição 1.6.1 Se {α1, . . . , αn} é um subconjunto de K, então D(α1, . . . , αn) = det(TrK/Q(αiαj)) n i,j=1. Demonstração: Sejam σ1, . . . , σn os Q-monomorfismos de K em C. Para cada i, j = 1, . . . , n, temos que TrK/Q(αiαj) = n∑ k=1 σk(αiαj) = n∑ k=1 σk(αi)σk(αj). Desse modo, D(α1, . . . , αn) = det(σi(αj)) 2 = det(σj(αi))det(σi(αj)) = det( n∑ k=1 σk(αi)σk(αj)) = det(TrK/Q(αiαj)), o que justifica a proposição. Proposição 1.6.2 Seja {α1, . . . , αn} um subconjunto de K. Se {β1, . . . , βn} é um conjunto de elementos de K tal que βj = ∑n i=1 aijαi, com aij ∈ Q, para j = 1, . . . , n, então D(β1, . . . , βn) = (det(aij)) 2D(α1, . . . , αn). Demonstração: Se σ1, . . . , σn são os Q-monomorfismos de K em C, então D(β1, . . . , βn) = det(σk(βj)) 2 = det(σk( n∑ i=1 aijαi)) 2 = det( n∑ i=1 aijσk(αi)) 2 = det((aij)(σk(αi))) 2 = det(aij) 2det(σk(αi)) 2 = det(aij) 2D(α1, . . . , αn), o que conclui a demonstração. Definição 1.6.2 Seja {α1, . . . , αn} uma Z-base do anel de inteiros OK. Dizemos que o discriminante D(α1, . . . , αn) é o discriminante do corpo de números K, e denotamos por DK. 21 Os três seguintes resultados, demonstrados por José Othon D. Lopes em [14], fornecem valiosa ferramenta para as construções de reticulados do Caṕıtulo 4. Teorema 1.6.1 ([14],Cor.3.2) Se p é um primo ı́mpar e K é um subcorpo do corpo ciclotômico Q(ζp), então |DK| = p[K:Q]−1. Teorema 1.6.2 ([14],Cor.3.9) Se K é um corpo de números abeliano de grau primo p e condutor m, então |DK| = mp−1. Teorema 1.6.3 ([14],Cor.3.5) Se p é um primo ı́mpar e K é um subcorpo do corpo ciclotômico Q(ζpr), com [K : Q] = upj, onde u e p são relativamente primos, então |DK| = pu[(j+2)pj−( p j+1−1 p−1 )]−1. Definição 1.6.3 Sejam K ⊂ L corpos de números e A ⊂ R anéis tal que A ⊂ K e R ⊂ L, onde R é um A-módulo livre de posto n. Se {α1, . . . , αn} é uma base de R sobre A, definimos o discriminante de R sobre A, como sendo o ideal de A gerado por D(α1, . . . , αn), e denotamos por D(R/A). Definição 1.6.4 Seja R um anel. Um elemento α ∈ R é dito nilpotente se existe um inteiro positivo r tal que αr = 0. Dizemos que R é reduzido se o único elemento nilpotente de R é o zero. Proposição 1.6.3 ([5],pág.73) Sejam K um corpo finito de caracteŕıstica zero e R um anel tal que, R é um K-módulo livre de posto finito com K ⊂ R. Temos que D(R/K) ̸= {0} se, e somente se, R é reduzido. 1.7 Anéis noetherianos e de Dedekind Nesta seção, apresentamos as propriedades que definem anéis noetherianos e de Dedekind e verificamos que o anel de inteiros de um corpo de números satisfaz essas propriedades. Definição 1.7.1 Sejam R um anel e I1 ⊂ I2 ⊂ . . . ⊂ In ⊂ . . . uma sequência crescente de ideais de R. Dizemos que a sequência (Ii)i∈N é estacionária se existir no ∈ N tal que In = Ino, para todo n ≥ no. 22 Definição 1.7.2 Dizemos que um anel R é noetheriano se satisfaz uma das seguintes condições: (i) Todo ideal de R é finitamente gerado. (ii) Toda sequência crescente de ideais de R é estacionária. (iii) Toda famı́lia não-vazia de ideais de R contém um elemento maximal. Definição 1.7.3 Dizemos que um domı́nio R é um anel de Dedekind se é noetheriano, integralmente fechado e todo ideal primo não-nulo de R é maximal. Exemplo 1.7.1 O anel Z é um anel de Dedekind. Teorema 1.7.1 Se R é um anel de Dedekind, K é seu corpo de frações e K ⊆ L é uma extensão finita, então OL(R) é um anel de Dedekind. Demonstração: Pela Proposição 1.4.2, temos que OL(R) é integralmente fechado. Seja P um ideal primo não-nulo de OL(R). Assim, P ∩R é um ideal primo de R. Mostremos que P ∩R é não nulo. Seja α ∈ P−{0}. Como P ⊂ OL(R), segue que existem ai ∈ R, com i = 0, . . . , n−1, tal que αn + an−1α n−1 + . . . + a1α + a0 = 0, e suponha que n seja o grau mı́nimo com esta propriedade. Desse modo, a0 ̸= 0, pois caso contrário obteŕıamos uma equação de grau menor. Assim, a0 = α(−αn−1 − an−1α n−2 − . . .− a1) ∈ αOL(R) ∩R ⊂ P ∩R. Portanto, P ∩ R ̸= {0}. Como P ∩ R é um ideal primo de R, que por sua vez é de Dedekind, segue que P ∩ R é um ideal maximal de R e, assim, R/(P ∩ R) é um corpo. Considere a aplicação φ : R i−→ OL(R) π−→ OL(R) P , onde i é a inclusão e π a projeção. Como OL(R) é inteiro sobre R, segue que OL(R)/P é inteiro sobre R/(P ∩R). Assim, como R P ∩R ≃ Im(φ) ⊂ OL(R) P e R/(P∩R) é um corpo, segue que OL(R)/P é um corpo. Dessa forma, P é maximal. Portanto, como OL(R) é noetheriano, conclúımos que é um anel de Dedekind (veja a Seção 3.2 de [5]). Corolário 1.7.1 Se K é um corpo de números, então o anel de inteiros OK é um anel de Dedekind. Demonstração: Como K é uma extensão finita de Q, o qual é o corpo de frações de Z, segue do Teorema 1.7.1 que OK é um anel de Dedekind. 23 1.8 Ideais fracionários Nesta seção, é introduzido o conceito de ideal fracionário de um domı́nio. O objetivo ao apresentar essa estrutura é a aplicação em reticulados ideais. Definição 1.8.1 Sejam R um domı́nio e K seu corpo de frações. Um R-submódulo I de K do qual existe d ∈ R−{0} tal que dI ⊂ R, é dito um ideal fracionário de R. Neste caso, dI é um ideal J de R e I = d−1J . Observação 1.8.1 Os ideais de um domı́nio R são exatamente os ideais fracionários que estão contidos em R. Se K é um corpo de números, um OK-módulo I ⊂ K é um ideal fracionário de OK, se existe d ∈ OK não-nulo tal que dI ⊆ OK. Definição 1.8.2 Sejam R um domı́nio e I, J ideais fracionários de R. Definimos a soma I + J como sendo o conjunto I + J = {a+ b; a ∈ I, b ∈ J }, e o produto IJ como sendo IJ = { n∑ i=1 aibi; ai ∈ I, bi ∈ J } . De modo análogo, se M é um R-módulo definimos o produto IM . Definição 1.8.3 Seja R um domı́nio. Um ideal fracionário I de R é inverśıvel se existe um ideal fracionário J de R tal que IJ = R. Definição 1.8.4 Sejam R um domı́nio e I,J ideais fracionários de R. Dizemos que I divide J se existe um ideal M de R tal que J = MI. Proposição 1.8.1 Sejam R um domı́nio e I,J ideais fracionários inverśıveis de R. Temos que I divide J se, e somente se, J ⊂ I. Demonstração: Se I divide J , então existe um ideal M de R tal que J = MI ⊂ I. Agora, supondo que J ⊂ I, segue que J I−1 ⊂ II−1 = R. Mas, desse modo J I−1 é um ideal de R tal que (J I−1)I = J . Portanto, I divide J . Proposição 1.8.2 Se R é um domı́nio noetheriano, K seu corpo de frações e L uma extensão finita de K, então todo ideal fracionário I de OL(R) é um R-módulo finitamente gerado. 24 Demonstração: Como I é um ideal fracionário de R, segue que existe d ∈ R − {0} tal que dI ⊆ R, e assim I ⊆ d−1R. A aplicação φ : R → d−1R, definida por φ(x) = d−1x, para x ∈ R, é um isomorfismo. Logo, como R é noetheriano, segue que d−1R é noetheriano. Portanto, I é um R-módulo finitamente gerado. Proposição 1.8.3 Se R é um anel principal, K seu corpo de frações e K ⊆ L finita de grau n, então todo ideal fracionário não-nulo I de OL(R) é um R-módulo livre de posto n. Demonstração: Se I é um ideal fracionário de OL(R), então existe d ∈ OL(R)− {0} tal que dI ⊂ OL(R). O ideal J := dI de OL(R) é um R-módulo livre de posto n (veja Teorema 1.4.1). Seja {w1, . . . , wn} uma R-base de J . Desse modo, {d−1w1, . . . , d −1wn} gera I sobre R. Agora, se ∑n i=1 aid −1wi = 0, para ai ∈ R, com i = 1, . . . , n, então d−1 ∑n i=1 aiwi = ∑n i=1 aid −1wi = 0. Logo, ∑n i=1 aiwi = 0, e como {w1, . . . , wn} é linearmente independente sobre R, segue que ai = 0, para todo i = 1, . . . , n. Portanto, I é um R-módulo livre de posto n. Teorema 1.8.1 ([5],pág.50) Se R é um anel de Dedekind, então todo ideal fracionário não- nulo I de R pode ser unicamente expresso como um produto I = q∑ i=1 Pei i de ideais Pi primos não-nulos de R, onde q e ei, com i = 1, . . . , q, são inteiros positivos. 25 Caṕıtulo 2 Ramificação de Ideais Neste caṕıtulo, introduzimos resultados sobre anéis de frações e a fatoração de ideais primos, fornecendo condições para uma abordagem sobre ramificação de ideais primos via discriminante. O objetivo é apresentar o conceito de ramificação de um ideal primo (ou número primo) no anel de inteiros OK de um corpo de números e caracterizar a ramificação de um número primo p, garantindo que p ramifica em OK se, e somente se, p divide o discriminante de K. 2.1 Anéis de frações Nesta seção, apresentamos o conceito de anel de frações e alguns resultados relacionando-o com outros elementos, como anéis noetherianos e de Dedekind. Definição 2.1.1 Sejam R um domı́nio, K seu corpo de frações e S ⊂ R − {0} fechado com relação à multiplicação, com 1 ∈ S. Definimos o anel de frações S−1R, de R com respeito a S, como sendo o conjunto S−1R = {a s ; a ∈ R, s ∈ S } ⊂ K. Claramente S−1R é um anel comutativo, pois é um subanel de K. Se S = R − {0} então S−1R = K e se S = {1} teremos S−1R = R. Proposição 2.1.1 Sejam R um domı́nio e S um subconjunto de R−{0} fechado com relação à multiplicação, com 1 ∈ S. Ao denotar R′ = S−1R, temos que: (i) Para qualquer ideal I ′ de R′ tem-se que (I ′ ∩R)R′ = I ′. Assim, a aplicação I ′ 7→ I ′ ∩R é uma injeção (crescente) do conjunto dos ideais de R′ no conjunto dos ideais de R. (ii) A aplicação P ′ 7→ P ′ ∩R é uma bijeção do conjunto dos ideais primos de R′ no conjunto dos ideais primos P de R, que satisfazem P ∩ S = ∅. A aplicação inversa é P 7→ PR′. Demonstração: (i) Seja I ′ um ideal de R′. Se x ∈ (I ′ ∩ R)R′, então x = ∑ i a ′ ir ′ i, com a′i ∈ I ′ ∩ R e r′i ∈ R′. Logo a′ir ′ i ∈ I ′, e assim x ∈ I ′. Dessa forma, (I ′ ∩ R)R′ ⊂ I ′. Seja, 26 agora, x ∈ I ′ ⊂ R′ = S−1R, isto é, existem a ∈ R e s ∈ S tal que x = a/s. Logo, como S ⊂ R ⊂ R′ e I ′ é um ideal de R′, segue que a = xs ∈ I ′ e, assim, a ∈ I ′ ∩ R. Desse modo, x = a(1 s ) ∈ (I ′ ∩ R)R′, assim I ′ ⊂ (I ′ ∩ R)R′. Portanto, (I ′ ∩ R)R′ = I ′. Agora, se I ′ e J ′ são ideais de R′ tal que I ′ ∩R = J ′ ∩R, então I ′ = (I ′ ∩R)R′ = (J ′ ∩R)R′ = J ′, ou seja, a aplicação I ′ 7→ I ′∩R é injetora e, além disso, crescente, pois se I ′ ⊂ J ′ então I ′∩R ⊂ J ′∩R. (ii) Denotemos por φ : P ′ 7→ P ′ ∩ R a aplicação definida no conjunto dos ideais primos de R′ e por ψ : P 7→ PR′ a aplicação definida no conjunto dos ideais primos de R que satisfazem P ∩ S = ∅. Mostremos que φ está bem definida. Seja P ′ um ideal primo de R′. Assim, P ′ ∩R é um ideal primo de R e, pondo P := P ′∩R, tem-se P ∩S = ∅, pois se x ∈ P ∩S então x ∈ P ′ e 1 = ( 1 x )x ∈ R′P ′ = P ′, o que é uma contradição. Portanto, φ está bem definida. Mostremos agora que ψ está bem definida. Seja P um ideal primo de R com P ∩S = ∅. Devemos mostrar que PR′ é um ideal primo de R′. Note que PR′ = {p s ; p ∈ P , s ∈ S } ⊂ R′. Sejam a/s e b/t pertencentes a R′ com (a/s)(b/t) ∈ PR′. Assim, existem p ∈ P e u ∈ S tal que (a/s)(b/t) = p/u. Logo abu = pst ∈ P . Uma vez que P ∩ S = ∅, tem-se que u ̸∈ P . Logo ab ∈ P e, assim, a ∈ P ou b ∈ P . Dessa forma a/s ∈ PR′ ou b/t ∈ PR′, ou seja, PR′ é um ideal primo de R′. Portanto ψ está bem definida. Agora, mostremos que φ ◦ ψ = id, isto é, PR′ ∩ R = P. Claramente P ⊂ PR′ ∩ R. Seja x ∈ PR′ ∩ R. Assim existe p ∈ P e s ∈ S tal que x = p/s. Logo sx = p ∈ P . Como P ∩ S = ∅, segue que s ̸∈ P e assim x ∈ P . Portanto PR′ ∩R = P . Mostremos agora que se P ′ é um ideal primo de R′ então (P ′ ∩R)R′ = P ′, isto é, ψ ◦ φ = id. Claramente (P ′ ∩ R)R′ ⊂ P ′. Se x ∈ P ′ ⊂ R′, então existe a ∈ R e s ∈ S tal que x = a s = a(1 s ). Assim, a ou 1/s pertence P ′. Mas, 1/s ̸∈ P ′, pois caso contrário teŕıamos que 1 ∈ P ′. Assim, a ∈ P ′ e dessa forma x = a/s ∈ (P ′ ∩ R)R′. Portanto (P ′ ∩ R)R′ = P ′. Conclúımos, então, que φ é uma bijeção cuja inversa é ψ. Corolário 2.1.1 Se R é um domı́nio noetheriano então todo anel de frações R′ = S−1R é noetheriano. Demonstração: Seja R′ = S−1R um anel de frações de R e considere a aplicação φ : I ′ 7→ I ′ ∩ R definida no conjunto dos ideais de R′ e aplicando no conjunto dos ideais de R. Seja (I ′ n)n uma sequência crescente de ideais de R′. Pelo ı́tem (i) da Proposição 2.1.1, tem-se que φ é crescente. Logo (φ(I ′ n))n é uma sequência crescente de ideais de R, que é noetheriano. Assim (φ(I ′ n))n é estacionária, isto é, existe no inteiro positivo tal que φ(I ′ n) = φ(I ′ n+1), para todo n ≥ no. Ainda pelo ı́tem (i), tem-se que φ é injetiva, e assim I ′ n = I ′ n+1, para todo n ≥ no, ou seja, (I ′ n)n é estacionária. Portanto, R′ é noetheriano. 27 Proposição 2.1.2 Sejam R um domı́nio, A um subanel de R e S ⊂ A − {0} fechado na multiplicação, com 1 ∈ S. Se B = OR(A), então o anel de inteiros de S−1R sobre S−1A é S−1B. Demonstração: Denotemos por A′ = S−1A, B′ = S−1B e R′ = S−1R. Mostremos que B′ = OR′(A′). Se α ∈ B′, então existem b ∈ B e s ∈ S tal que α = b/s. Como b é inteiro sobre A, segue que existem a0, a1, . . . , an−1 ∈ A tal que bn + an−1b n−1 + . . . + a1b + a0 = 0. Multiplicando a igualdade por 1/(sn) obtemos( b s )n + an−1 s ( b s )n−1 + . . .+ a1 sn−1 ( b s ) + a0 sn = 0. Como ai/s n−i ∈ S−1A = A′, para todo i = 0, . . . , n − 1, segue que α = b/s é inteiro sobre A′. Além disso, como B′ ⊂ R′, segue que α ∈ OR′(A′). Portanto, B′ ⊂ OR′(A′). Agora, se α ∈ OR′(A′), então existem ai ∈ A e si ∈ S, com i = 0, . . . , n− 1, tal que αn + an−1 sn−1 αn−1 + . . .+ a1 s1 α+ a0 s0 = 0. (2.1.1) Pondo s = s0s1 . . . sn−1 e multiplicando a igualdade 2.1.1 por sn, obtemos (sα)n+an−1(s0 . . . sn−2)(sα) n−1+ . . .+a0(s1 . . . sn−1)s n−1 = (sα)n+ bn−1(sα) n−1+ . . .+ b0 = 0, em que bi = ai(s0 . . . si−1si+1 . . . sn−1)s n−1−i ∈ A, para i = 0, . . . , n − 1. Como α ∈ R′, segue que existem r ∈ R e t ∈ S tal que α = r/t. Dessa forma,(sr t )n + bn−1 (sr t )n−1 + . . .+ b0 = 0. (2.1.2) com bi ∈ A, para i = 0, 1, . . . , n − 1. Multiplicando a igualdade 2.1.2 por tn obtemos que (sr)n + bn−1t(sr) n−1 + . . . + b0t n = 0. Assim, sr ∈ OR(A) = B, ou seja, sr = b ∈ B, o que implica que r = b/s ∈ S−1B = B′. Desse modo, como 1/t ∈ B′, segue que α = r/t ∈ B′. Assim, OR′(A′) ⊂ B′, e portanto OR′(A′) = B′. Corolário 2.1.2 Se R é um anel integralmente fechado, então todo anel de frações R′ = S−1R é integralmente fechado. Demonstração: Sejam R′ = S−1R um anel de frações e K o corpo de frações de R. Por hipótese R = OK(R). Como K é um domı́nio e R ⊂ K é um subanel, segue da Proposição 2.1.2 que, OS−1K(R ′) = S−1R = R′. Seja K′ o corpo de frações de R′. Mostremos que K′ = S−1K. Se x ∈ K′, então x = (r1/s1)/(r2/s2) = r1s2 s1r2 = 1 s1 r1s2 r2 ∈ S−1K, com ri ∈ R e si ∈ S, para i = 1, 2. 28 Agora, se x ∈ S−1K, então existem a/b ∈ K e s ∈ S tal que x = (a/b)/s = (a/s)/b ∈ K′. Logo K′ = S−1K e, portanto, OK′(R′) = R′, ou seja, R′ é integralmente fechado. Proposição 2.1.3 Se R é um anel de Dedekind, então todo anel de frações R′ = S−1R é um anel de Dedekind. Demonstração: Seja R′ = S−1R um anel de frações de R. Primeiramente, R′ é um domı́nio pois R o é. Pelos Corolários 2.1.1 e 2.1.2 garantimos, respectivamente, que R′ é noetheriano e integralmente fechado. Resta provar que todo ideal primo não-nulo de R′ é maximal. Seja P ′ ⊂ R′ um ideal primo não-nulo. Pela injetividade de P ′ 7→ P ′ ∩ R, vista no ı́tem (ii) da Proposição 2.1.1, segue que P ′ ∩ R é um ideal primo não-nulo de R. Logo, como R é Dedekind, segue que P ′ ∩ R é maximal. Seja I um ideal de R′ tal que P ′ ⊆ I ⊆ R′. Assim P ′ ∩ R ⊆ I ∩ R ⊆ R′ ∩ R = R. Desse modo, I ∩ R = P ′ ∩ R ou I ∩ R = R. Mas, pela injetividade da aplicação I 7→ I ∩ R, tem-se que I = P ′ ou I = R′, ou seja, P ′ é um ideal maximal em R′. Portanto, R′ é um anel de Dedekind. Proposição 2.1.4 Se R é um anel de Dedekind, P ⊂ R um ideal primo não-nulo e S = R−P, então R′ = S−1R é um anel principal. Mais precisamente, os ideais de R′ são da forma ⟨pn⟩, com p ∈ R′ e n um inteiro positivo. Demonstração: Seja P um ideal primo não-nulo de R. Tem-se que P é único tal que P∩S = ∅, pois se Q é um ideal primo não-nulo de R tal que Q ∩ S = ∅, então Q ⊂ P, com Q maximal, e assim Q = P . Note que o fato de P ser primo garante que R′ = S−1R está bem definido e o isomorfismo P 7→ PR′ do ı́tem (ii) da Proposição 2.1.1 garante que B := PR′ é o único ideal primo não-nulo de R′, pela unicidade de P . Pela Proposição 2.1.3, tem-se que R′ é Dedekind, assim do Teorema 1.8.1, todo ideal não-nulo de R′ se fatora de maneira única como um produto de ideais primos de R′. Desse modo, pela unicidade do ideal primo B ⊂ R′, segue que todo ideal de R′ é da forma Bn, sendo n um inteiro positivo. Considere a sequência de ideais . . . ⊆ Bn ⊆ . . . ⊆ B2 ⊆ B ⊆ R′. Seja p ∈ B −B2. Tem-se que existe no ∈ N∗ tal que ⟨p⟩ = Bno , com ⟨p⟩ ⊂ B e ⟨p⟩ ̸⊂ B2. Logo ⟨p⟩ = B. Mas como ⟨pn⟩ = ⟨p⟩n, segue que ⟨pn⟩ = Bn. Portanto, todo ideal de R′ é da forma ⟨pn⟩, com p ∈ R′ e n um inteiro positivo. Dessa forma, R′ é principal. Proposição 2.1.5 Sejam R um domı́nio e R′ = S−1R um anel de frações de R. Se M é um ideal maximal de R tal que M∩ S = ∅, então R′ MR′ ≃ R M . 29 Demonstração: Se M é um ideal maximal de R, então R/M é um corpo, que por sua vez é um domı́nio. Logo M é um ideal primo de R. Assim, como M∩ S = ∅, segue da Proposição 2.1.1, que MR′ é um ideal primo de R′. Considere a aplicação φ : R i // R′ π // R′/(MR′) , onde i é a inclusão e π a projeção. Afirmamos que Ker(φ) = M. De fato, x ∈ Ker(φ) se, e somente se, x ∈ R e φ(x) = x = 0, que por sua vez é condição necessária e suficiente para que x ∈ MR′ ∩ R. Assim, Ker(φ) = MR′ ∩ R. Porém, pelo ı́tem (ii) da Proposição 2.1.1, tem-se que MR′ ∩ R = M, e desse modo Ker(φ) = M. Mostremos que φ é sobrejetiva. Seja x ∈ R′/(MR′), em que x = r/s, com r ∈ R e s ∈ S. Como M ∩ S = ∅, segue que s ̸∈ M. Logo s ̸= 0 é inverśıvel no corpo R/M, isto é, existe b ∈ R/M tal que sb = 1, e deste modo 1− sb ∈ M. Dessa forma, r s − rb = r s (1− sb) ∈ MR′, ou seja, r/s+MR′ = rb+MR′. Assim, φ(rb) = rb+MR′ = x, pois r/s = x. Portanto φ é sobrejetiva e, desse modo, conclúımos que R M = R Ker(φ) ≃ Im(φ) = R′ MR′ , o que prova a proposição. 2.2 Fatoração de um ideal primo Nesta seção, consideramos R um anel de Dedekind, K seu corpo de frações, L uma extensão finita de grau n sobre K e B = OL(R). Pelo Teorema 1.7.1, tem-se que B é um anel de Dedekind. Sendo assim, se P é um ideal primo não-nulo de R, segue do Teorema 1.8.1 que o ideal BP de B pode ser unicamente expresso na forma BP = q∏ i=1 Pei i , onde os Pi’s são ideais primos de B, com q e ei inteiros positivos, para i = 1, . . . , q. Proposição 2.2.1 Sejam P um ideal primo não-nulo de R e BP = ∏q i=1 P ei i a fatoração do ideal BP. Os ideais Pi’s de B são os únicos tal que Pi ∩R = P. Além disso, BP ∩R = P. Demonstração: Como Pi é um ideal primo de B e R ⊂ B, segue que Pi ∩R é um ideal primo de R. Como P ⊂ BP ⊂ Pi, para todo i, segue que P ⊂ Pi ∩R. Porém, P é maximal, pois R é Dedekind, e assim P = Pi ∩ R. Seja, agora, Q um ideal primo de B tal que Q ∩ R = P . Logo P ⊂ Q e assim BP ⊂ BQ = Q, ou seja, ∏q i=1 P ei i ⊂ Q. Desse modo, existe j ∈ {1, . . . , q} tal que Pj ⊂ Q. Mas, como B é Dedekind, segue que Pj é maximal, e assim Pj = Q. Portanto, Q 30 é fator na fatoração de BP . Por outro lado, tem-se que P ⊂ BP ∩ R e, como BP ⊂ Pi, segue que BP ∩R ⊂ Pi ∩R = P. Portanto BP ∩R = P. Observação 2.2.1 Sejam P ideal primo não-nulo de R e BP = ∏q i=1 P ei i a fatoração do ideal BP de B. Como R e B são anéis de Dedekind, segue que P e Pi são ideais maximais de R e B, respectivamente. Dessa forma, R/P e B/Pi são corpos, para todo i = 1, . . . , q. Para os próximos resultados, consideramos P um ideal primo não-nulo de R e BP =∏q i=1 P ei i a fatoração do ideal BP de B. Lema 2.2.1 O corpo R/P pode ser identificado com um subcorpo de B/Pi e, além disso, B/Pi é um espaço vetorial de dimensão finita sobre R/P, para todo i = 1, . . . , q. Demonstração: Considere a aplicação φ : R id // B π // B/Pi , em que id é a inclusão e π a projeção. Tem-se que Ker(φ) = {x ∈ R; φ(x) = x = 0} = {x ∈ R; x ∈ Pi} = R ∩ Pi = P . Assim R/P ≃ Im(φ), que é subcorpo de B/Pi. Dados x+Pi, y+Pi ∈ B/Pi e a+P ∈ R/P , mostremos que o espaço vetorial B/Pi, com as operações (x + Pi) + (y + Pi) = (x + y) + Pi e (a+ P)(x+ Pi) = ax+ Pi, tem dimensão finita sobre R/P . Pelo Teorema 1.4.1, tem-se que B é um R-módulo livre de posto n. Seja {x1, . . . , xn} uma base de B sobre R. Se b ∈ B/Pi, então existem a1, . . . , an ∈ R tal que b = a1x1 + . . .+ anxn. Assim, b = b+ Pi = (a1x1 + Pi) + . . .+ (anxn + Pi) = (a1 + P)(x1 + Pi) + . . .+ (an + P)(xn + Pi), isto é, {x1, . . . , xn} é um conjunto de geradores de B/Pi sobre R/P , portanto B/Pi tem dimensão finita sobre R/P . Definição 2.2.1 O grau fi = f(Pi/R) da extensão B/Pi sobre R/P é chamado grau residual de Pi sobre R. O expoente ei = e(Pi/R) é chamado ı́ndice de ramificação de Pi sobre R. Lema 2.2.2 A sequência decrescente B ⊃ P1 ⊃ P2 1 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 ⊃ Pe1 1 P2 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 Pe2 2 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 . . .Peq q = BP de ideais de B é maximal. Demonstração: Tem-se que dois elementos consecutivos desta sequência são da forma Q e QPi, onde Q é um produto de alguns ideais Pj, com j = 1, . . . , q. Seja A um ideal de B tal que Q ⊇ A ⊇ QPi. Como B é um domı́nio, segue que A e QPi são fracionários. Logo, pela 31 Proposição 1.8.1, segue que A divide QPi, isto é, existe um ideal I de B tal que QPi = IA. Analogamente existe um ideal J de B tal que A = JQ. Assim QPi = IJQ, e deste modo Pi = IJ . Dessa forma, Pi = IJ ⊆ I ⊆ B. Como B é Dedekind, segue que Pi é maximal. Logo I = Pi ou I = B. Assim, Pi = IJ = BJ = J , ou seja, Pi = I ou Pi = J . Desse modo, A = Q se Pi = I ou A = QPi se Pi = J . Portanto, a sequência é maximal. Lema 2.2.3 Considere a sequência decrescente de ideais de B dada por: B ⊃ P1 ⊃ P2 1 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 ⊃ Pe1 1 P2 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 Pe2 2 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 . . .Peq q = BP . Se Q é um ideal diferente de BP desta cadeia, então Q/QPi, B/Q e B/QPi são espaços vetoriais sobre R/P e, além disso, [B/QPi : R/P] = [B/Q : R/P ] + [Q/QPi : R/P ]. Demonstração: Analogamente ao Lema 2.2.1, mostra-se que B/Q e B/QPi são R/P-espaços vetoriais. Seja a aplicação φ : B/QPi → B/Q dada por φ(x+QPi) = x +Q. Tem-se que φ é uma transformação linear sobrejetora. Além disso, Ker(φ) = {x+QPi ∈ B/QPi; x+Q = φ(x+QPi) = Q} = {x ∈ B/QPi; x ∈ Q} = Q/QPi. Assim, Q/QPi = Ker(φ) é um espaço vetorial sobre R/P e, pelo Teorema do Núcleo e da Imagem, segue que [B/QPi : R/P] = [B/Q : R/P ] + [Q/QPi : R/P ], o que prova o lema. Lema 2.2.4 Considere a sequência de ideais de B dada por: B ⊃ P1 ⊃ P2 1 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 ⊃ Pe1 1 P2 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 Pe2 2 ⊃ . . . ⊃ Pe1 1 . . .Peq q = BP . Se Q é um ideal diferente de BP desta cadeia, então Q/QPi é um espaço vetorial sobre B/Pi e [Q/QPi : B/Pi] = 1, para todo i = 1, . . . , q. Demonstração: Dados x +QPi, y +QPi ∈ Q/QPi e a + Pi ∈ B/Pi, tem-se que Q/QPi, com as operações (x+QPi) + (y +QPi) = (x+ y) +QPi e (a+ Pi)(x+QPi) = ax+QPi, é um espaço vetorial sobre B/Pi. Podemos identificar B/Pi com um subanel de Q/QPi, e dessa forma B/Pi pode ser visto como um subespaço de Q/QPi. Porém, os únicos subespaços de Q/QPi são os triviais, pois se existir um subespaço não trivial, deve ser da forma A/QPi, onde QPi A Q, o que contradiz o Lema 2.2.2. Desse modo, como B/Pi ̸= {0}, segue que B/Pi ≃ Q/QPi, e portanto [Q/QPi : B/Pi] = 1. 32 Observação 2.2.2 Note que B/BP é um espaço vetorial de dimensão finita sobre R/P. A verificação é análoga ao Lema 2.2.1, substituindo Pi por BP. Teorema 2.2.1 Se fi = [B/Pi : R/P ], para i = 1, . . . , q, então q∑ i=1 eifi = [B/BP : R/P ]. Demonstração: Seja Q um ideal diferente de BP da cadeia do Lema 2.2.4. Utilizando os Lemas 2.2.1 e 2.2.4 podemos dizer, a menos de isomorfismo, que R/P ⊂ B/Pi ⊂ Q/QPi, em que os dois primeiros são corpos e o terceiro é um anel. Ainda, pelos mesmos lemas e pela multiplicidade dos graus, tem-se que [Q/QPi : R/P] = [Q/QPi : B/Pi][B/Pi : R/P ] = 1fi = fi, para i = 1, . . . , q. Fixando o ı́ndice i e variando as possibilidades para o ideal Q, tem-se exatamente ei quocientes da forma Q/QPi, isto é, pode-se obter de tal cadeia exatamente ei espaços vetoriais de dimensão fi sobre R/P . Assim, do Lema 2.2.3, tem-se que [B/BP : R/P ] = [B/(Pe1 1 . . .Peq−1 q ) : R/P ] + [(Pe1 1 . . .Peq−1 q )/(Pe1 1 . . .Peq q ) : R/P ] = [B/(Pe1 1 . . .Peq−1 q ) : R/P ] + fq = [B/(Pe1 1 . . .Peq−2 q ) : R/P ] + [(Pe1 1 . . .Peq−2 q )/(Pe1 1 . . .Peq−1 q ) : R/P ] + fq = [B/(Pe1 1 . . .Peq−2 q ) : R/P ] + fq + fq = [B/P1 : R/P ] + (e1 − 1)f1 + e2f2 + . . .+ eqfq = e1f1 + . . .+ eqfq = q∑ i=1 eifi, o que conclui a demonstração. Lema 2.2.5 Se R é um anel principal então [B/BP : R/P ] = n. Demonstração: Como R é principal, pelo Teorema 1.4.1, segue que B é um R-módulo livre de posto n. Seja {x1, . . . , xn} uma base de B sobre R. Mostremos que C = {x1+BP , . . . , xn+BP} é uma base de B/BP sobre R/P. Se b = b+BP ∈ B/BP , então existem a1, . . . , an ∈ R tal que b = ∑n i=1 aixi + BP . Logo b = (a1x1 + BP) + . . .+ (anxn + BP) = (a1 + P)(x1 + BP) + . . .+ (an + P)(xn + BP), isto é, C é um gerador de B/BP sobre R/P . Agora, suponhamos que (a1+P)(x1+BP)+ . . .+ (an +P)(xn +BP) = 0 +BP = 0. Desse modo ∑n i=1 aixi +BP = BP , isto é, ∑n i=1 aixi ∈ BP . 33 Assim existem bj ∈ B e pj ∈ P , com j = 1, . . . , s, tal que ∑n i=1 aixi = ∑s j=1 bjpj. Porém, para cada j, existem cij, . . . , cnj ∈ R tal que bj = ∑n i=1 cijxi. Logo n∑ i=1 aixi = s∑ j=1 ( n∑ i=1 cijxi)pj = n∑ i=1 ( s∑ j=1 cijpj)xi. Dessa forma, n∑ i=1 (ai − s∑ j=1 cijpj)xi = 0. Como {xi}ni=1 é linearmente independente sobre R, segue que ai = ∑s j=1 cijpj, o que implica que ai ∈ P para todo i = 1, . . . , n. Assim, ai + P = 0 para todo i = 1, . . . , n, e portanto C = {x1+BP , . . . , xn+BP} é linearmente independente sobre R/P e consequentemente é uma base de B/BP sobre R/P . Observação 2.2.3 O Lema 2.2.5 é válido para o caso particular em que R é principal. Na seguinte proposição consideramos o caso em que R é apenas Dedekind, de modo a obter o Teorema da Igualdade Fundamental, que é o principal resultado desta seção. Proposição 2.2.2 Se R é um anel de Dedekind, K seu corpo de frações, L uma extensão finita de grau n sobre K, B = OL(R), P um ideal primo não-nulo de R, BP = ∏q i=1 P ei i a fatoração do ideal BP de B e fi = [B/Pi : R/P ], para i = 1, . . . , q, então [B/BP : R/P ] = n. Demonstração: Pela Proposição 2.1.4, tem-se que R′ = S−1R é um anel principal, onde S = R−P. Além disso, como L é um domı́nio, R é um subanel de L e S ⊂ R− {0} é fechado na multiplicação (pois P é primo) com 1 ∈ S, segue da Proposição 2.1.2 que OS−1L(R ′) = S−1B. Porém, como L é um corpo com S ⊂ L, segue que S−1L = L, e então OL(R ′) = S−1B. Assim, pelo Teorema 1.4.1, tem-se que B′ := S−1B é um R′-módulo livre de posto n, e do Lema 2.2.5 tem-se [B′/B′P : R′/R′P ] = n. Da fatoração BP = ∏q i=1 P ei i em B, obtemos a fatoração B′P = ∏q i=1(B′Pi) ei em B′, e como Pi ∩ R = P (veja Proposição 2.2.1), com P ∩ S = ∅, e os B′Pi’s são ideais primos não-nulos de B′, segue do Teorema 2.2.1 que [B′/B′P : R′/R′P ] = q∑ i=1 ei[B′/B′Pi : R ′/R′P ]. Desse modo, como R′/R′P ≃ R/P e B′/B′Pi ≃ B/Pi (veja Proposição 2.1.5), conclúımos que [B/BP : R/P ] = q∑ i=1 eifi = q∑ i=1 ei[B′/B′Pi : R ′/R′P] = [B′/B′P : R′/R′P ] = n, 34 o que prova a proposição. Teorema 2.2.2 (Igualdade Fundamental) Se R é um anel de Dedekind, K seu corpo de frações, L uma extensão finita de grau n sobre K, B = OL(R), P um ideal primo não-nulo de R, BP = ∏q i=1 P ei i a fatoração do ideal BP de B e fi = [B/Pi : R/P ], para i = 1, . . . , q, então q∑ i=1 eifi = [B/BP : R/P ] = n. Demonstração: Decorre diretamente do Teorema 2.2.1 e da Proposição 2.2.2. Proposição 2.2.3 Com as mesmas hipóteses do Teorema 2.2.2, tem-se que B BP ≃ B Pe1 1 × . . .× B Peq q . Demonstração: Afirmamos que, para cada i = 1, . . . , q, Pi é o único ideal maximal de B que contém Pei i . De fato, Pi ⊃ Pei i e como B é Dedekind e Pi é um ideal primo não-nulo de B segue que Pi é maximal. Suponha, agora, que M seja um ideal maximal de B com M ⊃ Pei i . Assim, M é primo e M ⊇ Pi. Desse modo, Pi é maximal com Pi ⊆ M B (M ≠ B, pois é primo). Logo, M = Pi. Mostremos agora que Pei i + Pej j = B, para i ̸= j. Se Pei i + Pej j B com i ̸= j, então existe um ideal maximal M de B tal que Pei i +Pej j ⊂ M ⊂ B. De Pei i ⊂ Pei i +Pej j segue que Pei i ⊂ M, e assim M = Pi. Analogamente, como Pej j ⊂ Pei i + Pej j , segue que Pej j ⊂ M, e assim M = Pj. Dessa forma Pi = Pj, o que é uma contradição. Sendo assim, tem-se que Pei i + Pej j = B para i ̸= j. Portanto, pelo Lema 1.1.2 de [11], conclúımos que B BP = B q∏ i=1 Pei i ≃ B Pe1 1 × . . .× B Peq q , o que demonstra o teorema. Exemplo 2.2.1 Seja p um número primo e denotemos ζ = ζpr . Mostraremos que [Q(ζ) : Q] = pr−1(p− 1), utilizando a fatoração de ideais. Considere o pr-ésimo polinômio ciclotômico ϕpr(x) = xp r − 1 xpr−1 − 1 = xp r−1(p−1) + xp r−1(p−2) + . . .+ xp r−1 + 1. Denotemos s := pr−1(p − 1) e z1, . . . , zs as ráızes pr-ésimas primitivas da unidade. O termo constante do polinômio ϕpr(x + 1) é p e suas ráızes são zj − 1, com j = 1, . . . , s. Desse modo ∏s j=1(zj − 1) = ±p. Consideremos o anel Z de Dedekind, Q seu corpo de frações, Q(ζ) extensão finita de Q, B = OQ(ζ) o anel de inteiros de Q(ζ), o ideal ⟨p⟩ primo não-nulo de Z, 35 Bp = B⟨p⟩ = ∏q i=1 P ei i a fatoração do ideal Bp de B e fi = [B/Pi : Z/⟨p⟩], para i = 1, . . . , s. Tem-se que zj ∈ B e além disso zj − 1 ∈ B(zk − 1), para todo j, k = 1, . . . , s, pois zj é uma potência (zk) t de zk e (zk) t − 1 = (zk − 1)(zt−1 k + . . . + zk + 1). Assim os ideais B(zj − 1) são iguais, para i = 1, . . . , s. Logo, Bp = s∏ j=1 B(zj − 1) = B(z1 − 1)s. Como [Q(ζ) : Q] coincide com o grau do polinômio minimal de ζ, segue que [Q(ζ) : Q] ≤ s. Assim, pelo Teorema da Igualdade Fundamental, segue que ∑q i=1 eifi ≤ s. Porém, como fi ≥ 1 e os ei’s são múltiplos de s, segue que q = 1, f1 = 1 e s = e1, e portanto [Q(ζ) : Q] = e1 = s. 2.3 Ramificação via discriminante Nesta seção, apresentamos resultados que relacionam a fatoração de ideais com o discriminante. Definição 2.3.1 Sejam R um anel de Dedekind, K seu corpo de frações, K ⊂ L uma extensão finita, P um ideal primo não-nulo de R e POL(R) = ∏q i=1 P ei i a fatoração do ideal POL(R) de OL(R). Dizemos que P ramifica em OL(R) se um dos ı́ndices de ramificação ei é maior do que 1. Em toda seção, consideramos K ⊂ L corpos de números e P um ideal primo não-nulo do anel de inteiros OK. Dessa maneira, tem-se que OK é um anel de Dedekind (veja Corolário 1.7.1) e L é uma extensão finita do corpo de frações K′ de OK, pois Q ⊂ K′ ⊂ K ⊂ L. Além disso, OL = OL(OK). Sendo assim, podemos definir a ramificação do ideal P em OL. Teorema 2.3.1 O ideal P ramifica em OL se, e somente se, OL/OLP não é reduzido. Demonstração: Suponhamos que P ramifica em OL, isto é, se OLP = ∏q i=1 P ei i é a fatoração do ideal OLP de OL, então existe k ∈ {1, . . . , q} tal que ek > 1. Tem-se que OLP Pi, para todo i = 1, . . . , q, pois se OLP = Pj para algum j, segue pela unicidade da fatoração de OLP , que ej = 1 é o único ı́ndice de ramificação, contrariando a hipótese. Seja ai ∈ Pi −OLP , para i = 1, . . . , q. Assim, x = a1a2 . . . aq ∈ OL−OLP, pois OLP é um primo. Logo x = x+OLP ̸= 0. Pondo r = e1e2 . . . eq, segue que xr = xr = (a1a2 . . . aq)r = ar1a r 2 . . . a r q +OLP = 0, pois ari = (aeii ) e1...ei−1ei+1...eq ∈ Pei i , o que implica que ar1a r 2 . . . a r q ∈ ∏q i=1 P ei i = OLP . Desse modo, x ̸= 0 é um elemento nilpotente de OL/OLP, ou seja, OL/OLP não é reduzido. Reci- procamente, suponha que OL/OLP não é reduzido. Pela Proposição 2.2.3, segue que OL OLP ≃ OL Pe1 1 × . . .× OL Peq q , 36 e assim, existe x ∈ OL/OLP não-nulo nilpotente com x = (x1 + Pe1 1 , . . . , xq + Peq q ) ̸= 0. Dessa forma, existe j ∈ {1, . . . , q} tal que xj +Pej j ̸= 0, isto é, xj ̸∈ Pej j . Além disso, existe um inteiro positivo s tal que xsj ∈ Pej j . Logo ej > 1, pois caso contrário teŕıamos xsj ∈ Pj com Pj primo, o que implica que xj ∈ Pj, o que é uma contradição. Portanto, P ramifica em OL. Corolário 2.3.1 O ideal P ramifica em OL se, e somente se, D( OL OLP /OK P ) = {0}. Demonstração: Pelo Teorema 2.3.1, tem-se que P ramifica em OL se, e somente se, OL/OLP não é reduzido. Pela Proposição 1.6.3 esta é uma condição necessária e suficiente para que D( OL OLP /OK P ) = {0}, o que conclui a demonstração. Teorema 2.3.2 O ideal P ramifica em OL se, e somente se, D(OL/OK) ⊂ P. Demonstração: Suponhamos que P ramifica em OL. Sejam S = OK − P, O′ K = S−1OK, O′ L = S−1OL e P ′ = PO′ K. Pela Proposição 2.1.4, segue que O′ K é principal e, assim, pelo Teorema 1.4.1 segue que O′ L = OL(O′ K) é um O′ K-módulo livre de posto finito e da Proposição 2.1.5, tem-se que OK P ≃ O′ K P ′ e OL OLP ≃ O′ L O′ LP ′ . Seja {e1, . . . , en} uma base de O′ L sobre O′ K. Logo {e1, . . . , en} = {e1 +O′ LP ′, . . . , en +O′ LP ′} é uma base de O′ L/O′ LP ′ sobre O′ K/P ′, e também uma base de OL/OLP sobre OK/P . Pelo Corolário 2.3.1 tem-se que D( OL OLP /OK P ) = {0}. Assim, 0 = D(e1, . . . , en) = D(e1, . . . , en) ∈ O′ K/P ′ e deste modo, D(e1, . . . , en) ∈ P ′. Agora, se {x1, . . . , xn} é uma base de L sobre K contida em OL ⊂ O′ L, então existem aij ∈ O′ K com 1 ≤ i, j ≤ n tal que xi = ∑n j=1 aijej, com i = 1, . . . , n. Assim, pela Proposição 1.6.2 segue que D(x1, . . . , xn) = (det(aij)) 2D(e1, . . . , en) ∈ O′ KP ′ ⊂ P ′ e como D(x1, . . . , xn) ∈ OK, obtemos D(x1, . . . , xn) ∈ OK ∩ P ′ = P (veja a Proposição 2.1.1). Portanto, pondo d := D(x1, . . . , xn), teremos D(OL/OK) = dOK ⊂ P . Reciprocamente, suponha que D(OL/OK) ⊂ P . Tem-se que ei = yi/si, com yi ∈ OL e si ∈ S, i = 1, . . . , n. Pondo s = s1s2 . . . sn, segue que ei = zi/s, com zi = (s1 . . . si−1si+1 . . . sn)yi ∈ OL e s ∈ S. Dessa forma, {z1, . . . , zn} é uma base de OL sobre OK, pois é linearmente independente sobre O′ K e consequentemente sobre OK. Logo, D(e1, . . . , en) = det(TrL/K(eiej)) = det(TrL/K( zizj s2 )) = 1 s2n det(TrL/K(zizj)) = 1 s2n D(z1, . . . , zn) ∈ O′ KD(OL/OK) ⊂ O′ KP = P ′. Assim, 0 = D(e1, . . . , en) = D(e1, . . . , en) ∈ O′ K/P ′ ≃ OK/P , e deste modo D( OL OLP /OK P ) = {0}. Portanto, pelo Corolário 2.3.1, segue que P ramifica em OL. 37 Exemplo 2.3.1 Sejam K = Q e L = Q(ζp), com p primo ı́mpar. Os ideais primos não-nulos de OK = Z são exatamente os ideais da forma ⟨q⟩, com q primo. Pelo Teorema 1.6.1, segue que |DL| = pp−2. Dessa forma, pelo Teorema 2.3.2, tem-se que um ideal primo ⟨q⟩ de Z ramifica em OQ(ζp) se, e somente se, ⟨±pp−2⟩ ⊂ ⟨q⟩. Assim, se q = p, então ⟨±pp−2⟩ ⊂ ⟨p⟩ = ⟨q⟩, e deste modo ⟨q⟩ ramifica. Reciprocamente, se o ideal ⟨q⟩ ramifica, então ⟨±pp−2⟩ ⊂ ⟨q⟩, o que implica que q = p, pois caso contrário pp−2 ∈ ⟨±pp−2⟩, com pp−2 ̸∈ ⟨q⟩, o que acarreta ⟨±pp−2⟩ * ⟨q⟩, que é uma contradição. Portanto, o único ideal primo de Z que ramifica em OQ(ζp) é ⟨p⟩. Corolário 2.3.2 Existe somente um número finito de ideais primos de OK que ramificam em OL. Demonstração: Considere a fatoração do ideal D(OL/OK) = DLOK = q∏ i=1 Pei i de OK, em ideais primos não-nulos de OK. Pelo Teorema 2.3.2, tem-se que um ideal primo P de OK ramifica em OL se, e somente se, D(OL/OK) ⊂ P . Afirmamos que os ideais P1, . . . ,Pq são os únicos primos que contém D(OL/OK). De fato, seja M um ideal primo de OK que contém D(OL/OK) = ∏q i=1 P ei i . Desse modo, tem-se que M ⊃ Pi para algum i = 1, . . . , q, e como OK é Dedekind (veja Corolário 1.7.1), segue que Pi é maximal, e assim M = Pi. Portanto, os ideais primos P1, . . . ,Pq de OK são os únicos que ramificam em OL. Considere o caso em que K = Q. Definição 2.3.2 Dizemos que um número primo p ramifica em OL quando o ideal primo ⟨p⟩ ramifica em OL. Teorema 2.3.3 Os números primos que ramificam em OL são exatamente os primos na fatoração do discriminante DL. Demonstração: Considere a fatoração do ideal D(OL/Z) = DLZ = q∏ i=1 Pei i em ideais primos não-nulos de Z (veja Teorema 1.8.1). Pelo Corolário 2.3.2, segue que os ideais primos P1, . . . ,Pq de Z são os únicos que ramificam em OL. Por outro lado, considere a fatoração em primos do discriminante DL = p e′1 1 . . . p e′r r . Desse modo, DLZ = (p e′1 1 . . . p e′r r )Z = (p e′1 1 Z) . . . (p e′r r Z) = (p1Z)e ′ 1 . . . (prZ)e ′ r = r∏ i=1 (piZ)e ′ i . 38 Assim, pela unicidade de representação, segue que r = q e Pi = piZ, para todo i = 1, . . . , r. Portanto, os ideais primos p1Z, . . . , prZ de Z são os únicos que ramificam em OL, isto é, os números primos p1, . . . , pr são os únicos que ramificam em OL. Exemplo 2.3.2 Seja L um corpo de números abeliano de grau n primo, cujo condutor é m = pe11 . . . perr . Pelo Teorema 1.6.2, segue que |DL| = mn−1. Desse modo, p1, . . . , pr são os únicos primos que ramificam em OL. 39 Caṕıtulo 3 Reticulados Neste caṕıtulo, são apresentadas três abordagens sobre reticulados: a Teoria dos Reticulados Clássica, Reticulados Algébricos e Reticulados Ideais. Na primeira, introduzimos o conceito de reticulado no Rn, algumas propriedades e parâmetros que utilizamos no decorrer do texto. Nas duas outras abordagens descrevemos maneiras de se obter reticulados no Rn via Teoria Algébrica dos Números, fornecendo propriedades e fórmulas expĺıcitas para alguns parâmetros desses reticulados. 3.1 Reticulados no Rn Apresentamos o conceito de reticulado no Rn, algumas propriedades e parâmetros de importante aplicação, como matriz Gram, volume, diversidade e distância produto mı́nima. Definição 3.1.1 Seja {v1, . . . , vm} um conjunto de vetores do Rn linearmente independentes sobre R, com m ≤ n. Definimos o reticulado Λ de dimensão m e base {vi}mi=1 como sendo o conjunto Λ = { m∑ i=1 aivi; ai ∈ Z } ⊂ Rn. Observação 3.1.1 De outro modo, o reticulado Λ pode ser expresso como Λ = Zv1 + . . .+ Zvm, ou seja, um reticulado é um Z-módulo livre de posto finito contido no Rn, cuja base é linear- mente independente sobre R. Exemplo 3.1.1 O espaço Zn é um reticulado n-dimensional, gerado pela base canônica {(1, 0, . . . , 0), (0, 1, . . . , 0), . . . , (0, . . . , 0, 1)} ⊂ Rn. 40 t t t t t t t t tt t t t t t t t tt t t t t t t t tt t t t t t t t tt t t t t t t t tt t t t t t t t tt t t t t t t t tt t t t t t t t tt t t t t t t t t - 6 Z2 Observação 3.1.2 Um reticulado Λ é um conjunto discreto do Rn, pois para qualquer subcon- junto compacto K ⊂ Rn, temos que K ∩ Λ é finito. Consideramos a partir de agora somente os reticulados no Rn cuja base apresenta n vetores, ou seja, os reticulados n-dimensionais no Rn. Proposição 3.1.1 Sejam {v1, . . . , vn} ⊂ Rn uma base de um reticulado Λ e {w1, . . . , wn} um conjunto de vetores de Λ linearmente independentes sobre R, tal que wi = ∑n j=1 aijvj, com aij ∈ Z. Tem-se que {wi}ni=1 é uma base de Λ se, e somente se, det(aij) = ±1. Demonstração: Como w1 ... wn  =  a11 a12 · · · a1n ... ... . . . ... an1 an2 · · · ann   v1 ... vn  , segue que, {wi}ni=1 é uma base de Λ quando (aij) é a matriz mudança de base, ou seja, quando det(aij) = ±1. Definição 3.1.2 Sejam Λ ⊂ Rn um reticulado e β = {v1, . . . , vn} uma base de Λ. O conjunto Pβ = { n∑ i=1 λivi; 0 ≤ λi < 1 } , é chamado de região fundamental de Λ com relação à base β. Exemplo 3.1.2 Tem-se que Λ = {(a, b) ∈ Z2; a+ b ≡ 0(mod 2)} é um reticulado gerado pelos vetores v1 = (2, 0) e v2 = (1, 1), cuja região fundamental está representada na figura abaixo: 41 t t t t tt t t tt t t t tt t t tt t t t tt t t tt t t t tt t t tt t t t t � � � � � � � � � � � � � � � � � � � �� -� �� -� � � � � � � � v1 v2 Definição 3.1.3 Sejam Λ ⊂ Rn um reticulado e {v1, . . . , vn} uma base de Λ. Dizemos que a matriz M =  v11 v12 · · · v1n v21 v22 · · · v2n ... ... . . . ... vn1 vn2 · · · vnn  é uma matriz geradora do reticulado Λ, onde vi = (vi1, . . . , vin), para i = 1, . . . , n. Observação 3.1.3 Se M é uma matriz geradora de um reticulado Λ ⊂ Rn, podemos represen- tar o reticulado na forma Λ = {λM ; λ ∈ Zn}. Definição 3.1.4 Sejam Λ ⊂ Rn um reticulado, β = {v1, . . . , vn} uma base de Λ, Pβ sua região fundamental e M = (vij) a matriz geradora de Λ com respeito à β. Definimos o volume da região fundamental Pβ como sendo Vol(Pβ) = |det(M)|. Se {v1, . . . , vn}, {w1, . . . , wn} ⊂ Rn são duas bases de um reticulado Λ, segue da Proposição 3.1.1 que |det(vij)| = |det(wij)|, isto é, o módulo do determinante da matriz geradora de um reticulado independe da base escolhida. Isto nos permite a seguinte definição: Definição 3.1.5 Sejam Λ ⊂ Rn um reticulado e β = {v1, . . . , vn} uma base de Λ. Definimos o volume do reticulado Λ por Vol(Λ) = Vol(Pβ). 42 Definição 3.1.6 Sejam Λ ⊂ Rn um reticulado e M uma matriz geradora de Λ. Definimos a matriz Gram de Λ associada à matriz geradora M , como sendo a matriz G =MM t. Na seguinte proposição, vemos que o determinante da matriz Gram de um reticulado independe da base escolhida. Proposição 3.1.2 Sejam {v1, . . . , vn}, {w1, . . . , wn} ⊂ Rn duas bases de um reticulado Λ. Se G =MM t e G′ =M ′M ′t, onde M = (vij) e M ′ = (wij), então det(G) = det(G′). Demostração: A verificação decorre do fato de que |det(M)| = |det(M ′)|, pois, det(G) = det(M)det(M t) = det(M)2 = det(M ′)2 = det(M ′)det(M ′t) = det(G′), o que demonstra a proposição. Definição 3.1.7 Sejam Λ ⊂ Rn um reticulado e G uma matriz Gram de Λ. Definimos o determinante de Λ por det(Λ) = det(G). Observação 3.1.4 Dado um reticulado Λ ⊂ Rn, tem-se que det(Λ) = Vol(Λ)2. Exemplo 3.1.3 A matriz identidade Idn é geradora do reticulado Zn, isto é, Zn = {λIdn; λ ∈ Zn}. Assim, a matriz Gram associada é G = Idn e Vol(Zn) = det(Zn) = 1. Porém, a matriz M ′ dada por M ′ = ( 0 −1 1 1 ) também é geradora de Zn, cuja matriz Gram associada é G′ = ( 1 −1 −1 2 ) . Desse modo, Vol(Zn) = |det(M ′)| = 1 = det(G′) = det(Zn). Este fato ilustra a independência do volume e do determinante de um reticulado quanto à base escolhida. Definição 3.1.8 Sejam x = (x1, . . . , xn) e y = (y1, . . . , yn) dois vetores no Rn. Definimos a diversidade, ou distância de Hamming, entre x e y por 43 div(x, y) = #{i; xi ̸= yi, i = 1, . . . , n}. Definição 3.1.9 Definimos a diversidade, ou distância mı́nima de Hamming, de um subcon- junto S ⊆ Rn, por div(S) = min{div(x, y); x ̸= y, x, y ∈ S}. Como um reticulado Λ ⊂ Rn possui estrutura de grupo aditivo e contém o vetor nulo do Rn, podemos definir a diversidade de um elemento x ∈ Λ como sendo a diversidade entre x e o vetor nulo, como segue: Definição 3.1.10 Sejam Λ ⊆ Rn um reticulado e x = (x1, . . . , xn) ∈ Λ. (i) A diversidade de x é definida como div(x) = #{i; xi ̸= 0, i = 1, . . . , n}. (ii) A diversidade de Λ é definida como div(Λ) = min{div(x); x ∈ Λ, x ̸= 0}. Definição 3.1.11 Sejam Λ ⊂ Rn um reticulado e x = (x1, . . . , xn) ∈ Λ− {0}. (i) A distância produto de x é definida por dp(x) = ∏ xi ̸=0 |xi|. (ii) A distância produto mı́nima de Λ é definida por dp,min(Λ) = min{dp(x); x ∈ Λ, x ̸= 0}. Observação 3.1.5 Se um reticulado Λ ⊂ Rn tem diversidade máxima n, então a distância produto de qualquer elemento não-nulo x = (x1, . . . , xn) ∈ Λ poderá ser expressa como dp(x) = n∏ i=1 |xi|. Exemplo 3.1.4 Considere o reticulado Λ = Zv1 + Zv2 + Zv3, onde v1 = (−1, 1, 0), v2 = (−1,−1, 1) e v3 = (0, 0,−1). Temos que div(Λ) = 1, pois v3 apresenta a diversidade mı́nima, isto é, div(v3) = 1. Dado o elemento x = (−1,−1, 2) ∈ Λ, temos que dp(x) = 2. 44 3.2 Reticulados algébricos Nesta seção, identificamos um Z-módulo livre de posto finito contido num corpo de números K com um reticulado no Rn, o qual chamamos de reticulado algébrico. Essa identificação permite apresentar algumas caracteŕısticas do reticulado obtido através das propriedades do corpo K, de modo que, fornecemos a matriz geradora, matriz Gram e exibimos fórmulas expĺıcitas para o volume do reticulado. Apresentamos duas formas de identificação, via homomorfismo canônico e via perturbação do homomorfismo canônico. 3.2.1 Homomorfismo canônico Seja K um corpo de números de grau n. Tem-se que existem exatamente n Q-monomorfismos distintos σi : K → C, com i = 1, . . . , n (veja o Corolário 1.1.1). Se σj é um monomorfismo imaginário, o seu conjugado σj também pertence ao conjunto dos n monomorfismos distintos de K em C. Desse modo, caso exista, temos um número par de monomorfismos imaginários. Assim, denotando por r1 o número de monomorfismos reais e por 2r2 o número de monomorfismos imaginários, teremos n = r1 + 2r2, e podemos reordenar os monomorfismos σi’s de modo que σ1, . . . , σr1 sejam reais e σr1+1, . . . , σr1+2r2 sejam imaginários, com σr1+r2+j = σr1+j, para j = 1, . . . , r2. Isto nos permite a seguinte definição: Definição 3.2.1 O homomorfismo injetivo de anéis σK : K→ Rn definido por σK(x) = (σ1(x), . . . , σr1(x),ℜ(σr1+1(x)),ℑ(σr1+1(x)), . . . ,ℜ(σr1+r2(x)),ℑ(σr1+r2(x))), é chamado de homomorfismo canônico, ou homomorfismo de Minkowski, onde ℜ e ℑ represen- tam, respectivamente, as partes real e imaginária de um número complexo. Exemplo 3.2.1 Considere o corpo ciclotômico K = Q(ζ3), onde ζ3 = e 2πi 3 . Tem-se que os Q-monomorfismos σ1 e σ2 de K em C, são dados por σi(ζ3) = ζ i3, com i = 1, 2. Desse modo, K é totalmente imaginário, com r1 = 0 e r2 = 1. Se x = a + bζ3 ∈ K, então σK : K → R2 é dado por σK(x) = (ℜ(σ1(x)),ℑ(σ1(x))) = (ℜ(a− b 2 + b √ 3 2 i),ℑ(a− b 2 + b √ 3 2 i)) = (a− b 2 , b √ 3 2 ). Teorema 3.2.1 Se M ⊆ K é um Z-módulo livre de posto n e {x1, . . . , xn} é uma Z-base de M, então σK(M) é um reticulado no Rn, cujo volume é dado por Vol(σK(M)) = 2−r2 | det(σi(xj))ni,j=1|. 45 Demonstração: Para cada xj ∈M , com j = 1, . . . , n, o vetor σK(xj) é dado por σK(xj) = (σ1(xj), . . . , σr1(xj),ℜ(σr1+1(xj)),ℑ(σr1+1(xj)), . . . ,ℜ(σr1+r2(xj)),ℑ(σr1+r2(xj))). Considere a matriz quadrada A de ordem n, cuja j-ésima coluna é dada pelo vetor σK(xj). Utilizando a relação σr1+r2+j = σr1+j, com j = 1, . . . , r2, e adicionando e subtraindo as linhas da matriz A convenientemente, de modo a utilizar as igualdades ℜ(z) = 1 2 (z + z) e ℑ(z) = 1 2 (z − z), para z ∈ C, obtem-se que det(A) = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ σ1(x1) . . . σ1(xj) . . . σ1(xn) σ2(x1) . . . σ2(xj) . . . σ2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1(x1) . . . σr1(xj) . . . σr1(xn) ℜ(σr1+1(x1)) . . . ℜ(σr1+1(xj)) . . . ℜ(σr1+1(xn)) ℑ(σr1+1(x1)) . . . ℑ(σr1+1(xj)) . . . ℑ(σr1+1(xn)) ... . . . ... . . . ... ℜ(σr1+r2(x1)) . . . ℜ(σr1+r2(xj)) . . . ℜ(σr1+r2(xn)) ℑ(σr1+r2(x1)) . . . ℑ(σr1+r2(xj)) . . . ℑ(σr1+r2(xn)) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ σ1(x1) . . . σ1(xj) . . . σ1(xn) σ2(x1) . . . σ2(xj) . . . σ2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1(x1) . . . σr1(xj) . . . σr1(xn) 1 2 [σr1+1(x1) + σr1+1(x1)] . . . 1 2 [σr1+1(xj) + σr1+1(xj)] . . . 1 2 [σr1+1(xn) + σr1+1(xn)] 1 2i [σr1+1(x1)− σr1+1(x1)] . . . 1 2i [σr1+1(xj)− σr1+1(xj)] . . . 1 2i [σr1+1(xn)− σr1+1(xn)] ... . . . ... . . . ... 1 2 [σr1+r2(x1) + σr1+r2(x1)] . . . 1 2 [σr1+r2(xj) + σr1+r2(xj)] . . . 1 2 [σr1+r2(xn) + σr1+r2(xn)] 1 2i [σr1+r2(x1)− σr1+r2(x1)] . . . 1 2i [σr1+r2(xj)− σr1+r2(xj)] . . . 1 2i [σr1+r2(xn)− σr1+r2(xn)] ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ 46 = ( 1 2i )r2 ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ σ1(x1) . . . σ1(xj) . . . σ1(xn) σ2(x1) . . . σ2(xj) . . . σ2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1(x1) . . . σr1(xj) . . . σr1(xn) σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj) . . . σr1+1(xn) σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj) . . . σr1+1(xn) ... . . . ... . . . ... σr1+r2(x1) . . . σr1+r2(xj) . . . σr1+r2(xn) σr1+r2(x1) . . . σr1+r2(xj) . . . σr1+r2(xn) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = ( 1 2i )r2 ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ σ1(x1) . . . σ1(xj) . . . σ1(xn) σ2(x1) . . . σ2(xj) . . . σ2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1(x1) . . . σr1(xj) . . . σr1(xn) σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj) . . . σr1+1(xn) σr1+2(x1) . . . σr1+2(xj) . . . σr1+2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1+2r2(x1) . . . σr1+2r2(xj) . . . σr1+2r2(xn) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = (2i)−r2 det(σi(xj)) n i,j=1. Pela Proposição 1.3.1, temos que det(σi(xj)) ̸= 0, e assim det(A) ̸= 0. Desse modo, os vetores σK(xj) ∈ Rn são linearmente independentes sobre R, e como σK(M) = ZσK(x1) + . . .+ ZσK(xn) = { n∑ j=1 ajσK(xj); aj ∈ Z } , segue que σK(M) é um reticulado no Rn, do qual At é uma matriz geradora. Portanto, Vol(σK(M)) = |det(A)| = 2−r2 |det(σi(xj))ni,j=1|, o que conclui a demonstração. Corolário 3.2.1 Se I é um ideal não-nulo do anel de inteiros OK, então σK(OK) e σK(I) são reticulados no Rn, cujos volumes são dados respectivamente por Vol(σK(OK)) = 2−r2|DK| 1 2 e Vol(σK(I)) = Vol(σK(OK))N (I). 47 Demonstração: Temos que I e OK são Z-módulos livres de posto n (veja Teorema 1.4.1). Assim, pelo Teorema 3.2.1, segue que σK(I) e σK(OK) são reticulados no Rn e, dada uma Z-base {x1, · · · , xn} de OK, tem-se que Vol(σK(OK)) = 2−r2 |DK| 1 2 , pois o discriminante DK = det(σi(xj)) 2. Pelo Teorema 1.3.1, tem-se que existem uma Z-base {w1, . . . , wn} de OK e inteiros não-nulos a1, . . . , an, tal que {a1w1, . . . , anwn} é uma Z-base de I. Assim, Vol(σK(I)) = 2−r2 |det(σi(ajwj))| = 2−r2 |a1 . . . an| |det(σi(wj))|. Porém, pela Proposição 1.5.3, tem-se que N (I) = |a1 . . . an|, portanto Vol(σK(I)) = 2−r2 |DK| 1 2N (I) = Vol(σK(OK))N (I), o que conclui a demonstração. Exemplo 3.2.2 Considere o corpo quadrático K = Q(i), onde i2 = −1. Tem-se que seu anel de inteiros é OK = Z[i] (anel dos inteiros de Gauss), com Z-base {1, i}. Dado x = a+ bi ∈ K, o homomorfismo canônico σK : K→ R2 é definido por σK(x) = (ℜ(σ1(x)),ℑ(σ1(x))) = (a, b), onde σ1(x) = a+ bi e σ2(x) = a− bi são os Q-monomorfismos de K em C. Seja I = ⟨2− i⟩ um ideal principal de Z[i]. Assim, dado x ∈ I, temos que x = (2− i)(a+ bi) = (2a+ b)+ (2b− a)i, onde a, b ∈ Z. Logo, a imagem σK(I) ⊆ R2 é dada por σK(I) = {(2a+ b, 2b− a) ∈ R2; a, b ∈ Z}. Desse modo, σK(I) é um reticulado no R2, do qual {(2,−1), (1, 2)} é uma base. O volume de σK(OK) é dado por Vol(σK(OK)) = 2−1 ∣∣∣∣∣det ( σ1(1) σ1(i) σ2(1) σ2(i) )∣∣∣∣∣ = 1 2 ∣∣∣∣∣det ( 1 i 1 −i )∣∣∣∣∣ = 1 2 .2 = 1. Além disso, pela Proposição 1.5.1, tem-se que N (I) = |N (2− i)| = 5, e portanto Vol(σK(I)) = Vol(σK(OK))N (I) = 5. 48 3.2.2 Perturbação do homomorfismo canônico Nesta subseção, é apresentada a perturbação σα do homomorfismo canônico. Veremos que, além de propriedades semelhantes às obtidas pela identificação σK, os reticulados obtidos pela perturbação σα apresentam matriz Gram igual a matriz da forma traço associada. Considere K um corpo de números de grau n. Definição 3.2.2 Sejam σ1, . . . , σn os Q-monomorfismos de K em C. Um elemento α ∈ K tal que σi(α) ∈ R, com σi(α) > 0, para todo i = 1, . . . , n, é chamado totalmente positivo. Definição 3.2.3 Seja α ∈ K um elemento totalmente positivo. O homomorfismo injetivo σα : K −→ Rn dado por σα(x) = ( √ α1σ1(x), . . . , √ αr1σr1(x), √ 2αr1+1ℜ(σr1+1(x)), . . . , √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(x))), onde αi = σi(α), para i = 1, . . . , r1+r2, é chamado de perturbação do homomorfismo canônico, em que ℜ e ℑ representam, respectivamente, a parte real e imaginária de um número complexo. Teorema 3.2.2 Se M ⊆ K é um Z-módulo livre de posto n e {x1, . . . , xn} é uma Z-base de M, então σα(M) é um reticulado no Rn, cujo volume é dado por Vol(σα(M)) = (N (α)) 1 2 | det(σi(xj))ni,j=1|. Demonstração: Para cada xj ∈M , com j = 1, . . . , n, o vetor σα(xj) é dado por σα(xj) = ( √ α1σ1(xj), . . . , √ αr1σr1(xj), . . . , √ 2αr1+r2ℜ(σr1+r2(xj)), √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(xj))). Considere a matriz quadrada A de ordem n, cuja j-ésima coluna é dada pelo vetor σα(xj). Utilizando a relação σr1+r2+j = σr1+j, com j = 1, . . . , r2, e adicionando e subtraindo as linhas da matriz A convenientemente, de modo a utilizar as igualdades ℜ(z) = 1 2 (z + z) e ℑ(z) = 1 2 (z − z), para z ∈ C, obtem-se que 49 det(A) = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ √ α1σ1(x1) . . . √ α1σ1(xj) . . . √ α1σ1(xn) ... . . . ... . . . ... √ αr1σr1(x1) . . . √ αr1σr1(xj) . . . √ αr1σr1(xn)√ 2αr1+1ℜ(σr1+1(x1)) . . . √ 2αr1+1ℜ(σr1+1(xj)) . . . √ 2αr1+1ℜ(σr1+1(xn)) √ 2αr1+1ℑ(σr1+1(x1)) . . . √ 2αr1+1ℑ(σr1+1(xj)) . . . √ 2αr1+1ℑ(σr1+1(xn)) ... . . . ... . . . ... √ 2αr1+r2ℜ(σr1+r2(x1)) . . . √ 2αr1+r2ℜ(σr1+r2(xj)) . . . √ 2αr1+r2ℜ(σr1+r2(xn))√ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(x1)) . . . √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(xj)) . . . √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(xn)) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ √ α1σ1(x1) . . . √ α1σ1(xn) ... . . . ... √ αr1σr1(x1) . . . √ αr1σr1(xn) 1 2 √ 2αr1+1[σr1+1(x1) + σr1+1(x1)] . . . 1 2 √ αr1+1[σr1+1(xn) + σr1+1(xn)] 1 2i √ 2αr1+1[σr1+1(x1)− σr1+1(x1)] . . . 1 2i √ 2αr1+1[σr1+1(xn)− σr1+1(xn)] ... . . . ... 1 2 √ 2αr1+r2 [σr1+r2(x1) + σr1+r2(x1)] . . . 1 2 √ 2αr1+r2 [σr1+r2(xn) + σr1+r2(xn)] 1 2i √ 2αr1+r2 [σr1+r2(x1)− σr1+r2(x1)] . . . 1 2i √ 2αr1+r2 [σr1+r2(xn)− σr1+r2(xn)] ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = ( 1 2 )r2 ( 1 2i )r2 √ α1 · · ·αr12αr1+1 · · · 2αr1+r2D, onde, D = ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ σ1(x1) . . . σ1(xj) . . . σ1(xn) σ2(x1) . . . σ2(xj) . . . σ2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1(x1) . . . σr1(xj) . . . σr1(xn) σr1+1(x1) + σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj) + σr1+1(x1) . . . σr1+1(xn) + σr1+1(x1) σr1+1(x1)− σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj)− σr1+1(xj) . . . σr1+1(xn)− σr1+1(xn) ... . . . ... . . . ... σr1+r2(x1) + σr1+r2(x1) . . . σr1+r2(xj) + σr1+r2(x1) . . . σr1+r2(xn) + σr1+r2(x1) σr1+r2(x1)− σr1+r2(x1) . . . σr1+r2(xj)− σr1+r2(xj) . . . σr1+r2(xn)− σr1+r2(xn) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ . 50 Utilizando propriedades elementares de determinantes, a saber, a adição da (r1+2l)-ésima linha à sua anterior e pela subtração da (r1 + 2l − 1)-ésima linha à sua posterior, com l = 1, . . . , r2, tem-se que det(A) = ( 1 2i )r2 √ α1 . . . αr12αr1+1 . . . 2αr1+r2 ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ σ1(x1) . . . σ1(xj) . . . σ1(xn) σ2(x1) . . . σ2(xj) . . . σ2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1(x1) . . . σr1(xj) . . . σr1(xn) σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj) . . . σr1+1(xn) σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj) . . . σr1+1(xn) ... . . . ... . . . ... σr1+r2(x1) . . . σr1+r2(xj) . . . σr1+r2(xn) σr1+r2(x1) . . . σr1+r2(xj) . . . σr1+r2(xn) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = ( 1 2i )r2 √ α1 . . . αr12αr1+1 . . . 2αr1+r2 ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ σ1(x1) . . . σ1(xj) . . . σ1(xn) σ2(x1) . . . σ2(xj) . . . σ2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1(x1) . . . σr1(xj) . . . σr1(xn) σr1+1(x1) . . . σr1+1(xj) . . . σr1+1(xn) σr1+2(x1) . . . σr1+2(xj) . . . σr1+2(xn) ... . . . ... . . . ... σr1+2r2(x1) . . . σr1+2r2(xj) . . . σr1+2r2(xn) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ = (2i)−r2√α1 . . . αr12αr1+1 . . . 2αr1+r2 det(σi(xj)) n i,j=1. Pela Proposição 1.3.1, tem-se que det(σi(xj)) ̸= 0, e assim det(A) ̸= 0. Desse modo, os vetores σα(xj) ∈ Rn são linearmente independentes sobre R, e como σα(M) = Zσα(x1) + . . .+ Zσα(xn) = { n∑ j=1 ajσα(xj); aj ∈ Z } , segue que σα(M) é um reticulado no Rn, do qual At é uma matriz geradora. Dessa forma, Vol(σα(M)) = |det(A)| = 2−r2√α1 . . . αr12αr1+1 . . . 2αr1+r2| det(σi(xj))ni,j=1|. 51 Agora, temos dois casos a considerar: (i) Se r2 = 0, então Vol(σα(M)) = √ α1 . . . αr1 | det(σi(xj))ni,j=1| = ( n∏ i=1 σi(α) ) 1 2 | det(σi(xj))ni,j=1| = (N (α)) 1 2 | det(σi(xj))ni,j=1|. (ii) Se r1 = 0, então Vol(σα(M)) = 2−r2 r2∏ i=1 2r2σi(α)| det(σi(xj))ni,j=1|. Como σr1+r2+j = σr1+j, para j = 1, . . . , r2, segue que σr2+j(α) = σj(α) = σj(α), pois σj(α) ∈ R. Assim, r2∏ i=1 σi(α) = (N (α)) 1 2 , e portanto, Vol(σα(M)) = (N (α)) 1 2 | det(σi(xj))ni,j=1|, o que prova o teorema. Corolário 3.2.2 Se I é um ideal não-nulo do anel de inteiros OK, então σα(OK) e σα(I) são reticulados no Rn, cujos volumes são dados por: Vol(σα(OK)) = (|DK|N (α)) 1 2 e Vol(σα(I)) = (|DK|N (α)) 1 2N (I). Demonstração: Temos que I e OK são Z-módulos livres de posto n. Assim, pelo Teorema 3.2.2, segue que σα(I) e σα(OK) são reticulados no Rn e, dada uma Z-base {x1, . . . , xn} de OK, tem-se que Vol(σα(OK)) = (|DK|N (α)) 1 2 , pois o discriminante DK = det(σi(xj)) 2. Pelo Teorema 1.3.1, tem-se que existem uma Z-base {w1, . . . , wn} de OK e inteiros não-nulos a1, . . . , an, tal que {a1w1, . . . , anwn} é uma Z-base de I. Assim, Vol(σα(I)) = (N (α)) 1 2 | det(σi(ajwj))| = (N (α)) 1 2 |a1 . . . an| | det(σi(wj))|. 52 Porém, pela Proposição 1.5.3, temos que N (I) = |a1 . . . an|, e portanto Vol(σα(I)) = (N (α)) 1 2 |DK| 1 2N (I) = (|DK|N (α)) 1 2N (I), o que conclui a demonstração. Proposição 3.2.1 Se M ⊆ K é um Z-módulo livre de posto n e {w1, . . . , wn} é uma Z-base de M, então a matriz Gram do reticulado σα(M), com respeito a essa base, é dada por G = (TrK/Q(αwiwj)) n i,j=1. Demonstração: Como vimos no Teorema 3.2.2, tem-se que A =  √ α1σ1(w1) · · · √ αr1σr1(w1) √ 2αr1+1ℜ(σr1+1(w1)) · · · √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(w1)) √ α1σ1(w2) · · · √ αr1σr1(w2) √ 2αr1+1ℜ(σr1+1(w2)) · · · √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(w2)) ... . . . ... ... . . . ... √ α1σ1(wn) · · · √ αr1σr1(wn) √ 2αr1+1ℜ(σr1+1(wn)) · · · √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(wn))  é uma matriz geradora do reticulado σα(M). Desse modo, denotando por G = (gij) n i,j=1 a matriz Gram de σα(M) com respeito a A, temos que cada termo de G = AAt é dado por gij = r1∑ k=1 √ αkσk(wi) √ αkσk(wj) + r2∑ k=1 √ 2αr1+kℜ(σr1+k(wi)) √ 2αr1+kℜ(σr1+k(wj)) + r2∑ k=1 √ 2αr1+kℑ(σr1+k(wi)) √ 2αr1+kℑ(σr1+k(wj)) = r1∑ k=1 αkσk(wiwj) + r2∑ k=1 2αr1+k[ℜ(σr1+k(wi))ℜ(σr1+k(wj)) + ℑ(σr1+k(wi))ℑ(σr1+k(wj))] = r1∑ k=1 αkσk(wiwj) + r2∑ k=1 2αr1+kℜ(σr1+k(wi)σr1+k(wj)) = r1∑ k=1 αkσk(wiwj) + r2∑ k=1 αr1+k2ℜ(σr1+k(wiwj)) = r1∑ k=1 αkσk(wiwj) + r2∑ k=1 αr1+kσr1+k(wiwj) + r2∑ k=1 αr1+kσr1+k(wiwj) = r1∑ k=1 σk(αwiwj) + r2∑ k=1 σr1+k(αwiwj) + r2∑ k=1 σr1+k(αwiwj) = r1+2r2∑ k=1 σk(αwiwj) = TrK/Q(αwiwj), 53 o que conclui a demonstração. Definição 3.2.4 Seja M ⊆ K um Z-módulo livre de posto n. Os reticulados σK(M) e σα(M) são chamados de reticulados algébricos. Observação 3.2.1 Note que, quando K é totalmente real e α = 1, tem-se que σα(M) = σK(M). Determinados ideais fracionários do anel de inteiros de um corpo de números apresentam uma estrutura de Z-módulo livre de posto finito, com imagem da forma traço contida em Z (veja, por exemplo, a referência [20]). Além disso, a Proposição 3.2.1 fornece a matriz Gram de um reticulado algébrico através da forma traço associada, o que motiva a definição de uma classe de reticulados algébricos sobre ideais fracionários, cuja imagem da forma traço está contida em Z, chamados reticulados ideais. 3.3 Reticulados ideais Introduzimos o conceito de reticulado ideal e apresentamos propriedades sobre alguns parâmetros, como diversidade e distância produto mı́nima. Considere K um corpo de números de grau n. Proposição 3.3.1 Se I é um ideal fracionário de OK, então existe d ∈ Z − {0} tal que dI ⊂ OK. Demonstração: Pelo Teorema 1.1.4, tem-se que existe β ∈ K tal queK = Q(β) e {1, β, . . . , βn−1} é uma base de K sobre Q. Seja {γ1, . . . , γn} uma Z-base de I. Para cada i = 1, . . . , n, temos que γi = ∑n−1 j=0 aijβ j, com aij ∈ Q. Assim, aij = bij/cij, com bij, cij ∈ Z e cij ̸= 0. Se d = mmc{cij; i = 1, . . . , n, j = 0, 1, . . . , n − 1}, então dγi ∈ Z[β], para todo i = 1, · · · , n. Portanto, dI = d n∑ i=1 Zγi = n∑ i=1 Zdγi ⊂ Z[β] ⊂ OK. Definição 3.3.1 Sejam α ∈ K um elemento totalmente positivo e I um ideal fracionário de OK. Considere a forma traço: Trα : K×K −→ Q (x, y) 7−→ Trα(x, y) = TrK/Q(αxy). Dada uma Z-base {w1, . . . , wn} de I, a matriz (Trα(wi, wj)) n i,j=1 é chamada matriz da forma traço associada à I com respeito à base {w1, . . . , wn}, e denotada por (Trα). Teorema 3.3.1 Se α ∈ K é um elemento totalmente positivo e I é um ideal fracionário do anel de inteiros OK, então det(Trα) = N (I)2N (α)|DK|. 54 Demonstração: Pela Proposição 3.3.1, temos que existe d ∈ Z − {0} tal que dI ⊂ OK. Denotemos J = dI. Como OK é um Z-módulo livre de posto n e J é um Z-submódulo de OK, segue, pelo Teorema 1.3.1, que existe uma Z-base {w1, . . . , wn} de OK e inteiros a1, . . . , an tal que {a1w1, . . . , anwn} é uma Z-base de J . Porém, I = d−1J , e assim {a1d−1w1, . . . , and −1wn} é uma Z-base de I. Assim, a matriz da forma traço é dada por (Trα) =  Tr(αa1d −1w1a1d−1w1) · · · Tr(αa1d −1w1and−1wn) ... . . . ... Tr(αand −1wna1d−1w1) · · · Tr(αand −1wnand−1wn)  =  a21Tr(α(d −1)2w1w1) · · · a1anTr(α(d −1)2w1wn) ... . . . ... a1anTr(α(d −1)2wnw1) · · · a2nTr(α(d −1)2wnwn)  . Dessa forma, det(Trα) = (a1 · · · an)2det  Tr(α(d−1)2w1w1) · · · Tr(α(d−1)2w1wn) ... . . . ... Tr(α(d−1)2wnw1) · · · Tr(α(d−1)2wnwn)  = (a1 · · · an)2((d−1)2)ndet  Tr(αw1w1) · · · Tr(αw1wn) ... . . . ... Tr(αwnw1) · · · Tr(αwnwn)  . Pela Proposição 1.5.3, tem-se que N (J ) = |a1 . . . an|. Assim, det(Trα) = N (J )2((d−1)2)ndet(G), (3.3.1) onde G =  Tr(αw1w1) · · · Tr(αw1wn) ... . . . ... Tr(αwnw1) · · · Tr(αwnwn)  . Porém, podemos escrever G =MM⊥, onde M = ST =  σ1(w1) · · · σn(w1) ... . . . ... σ1(wn) · · · σn(wn)   √ σ1(α) · · · 0 ... . . . ... 0 · · · √ σn(α)  , 55 M⊥ é a transposta conjugada de M e σ1, . . . , σn são os Q-monomorfismos de K em C. Assim, det(G) = det(M)det(M⊥) = det(S)det(T )det(S⊥)det(T⊥) = (det(S))2(det(T ))2. Mas, temos que (det(T ))2 = σ1(α) . . . σn(α) = N (α) (3.3.2) e, além disso, det(S) = det(σi(wj)) n i,j=1 = √ DK. (3.3.3) Logo, substituindo as Equações (3.3.2) e (3.3.3) na Equação (3.3.1), obtem-se det(Trα) = N (J )2((d−1)2)nN (α)|DK|. Porém, como d ∈ Z, segue que N (I) = N (J )N (d−1) = N (J )(d−1)n. Portanto, det(Trα) = N (I)2N (α)|DK|, o que conclui a demonstração. Definição 3.3.2 Sejam α ∈ K um elemento totalmente positivo e I um ideal fracionário do anel de inteiros OK, tal que Trα(x, y) ∈ Z, para todo x, y ∈ I. Nesse caso, o reticulado σα(I) é chamado de reticulado ideal, e denotado por (I, T rα). Definição 3.3.3 O conjunto ∆−1 K/Q = {x ∈ K; TrK/Q(xy) ∈ Z, ∀ y ∈ OK}, é chamado de codiferente de K sobre Q. Observação 3.3.1 Note que, se α ∈ K é um elemento totalmente positivo e I é um ideal fracionário de OK, então αIϕ(I) ⊂ ∆−1 K/Q (onde ϕ : K → K é a conjugação complexa) é uma condição suficiente para que o reticulado ideal (I, T rα) esteja bem definido. Proposição 3.3.2 Se I é um ideal fracionário de OK, então o reticulado ideal Λ = (I, T rα) tem diversidade div(Λ) = r1 + r2. Demonstração: Dado y ∈ Λ não-nulo, tem-se que existe x ∈ I − {0} tal que y = σα(x) = ( √ α1σ1(x), . . . , √ αr1σr1(x), √ 2αr1+1ℜ(σr1+1(x)), . . . , √ 2αr1+r2ℑ(σr1+r2(x))). 56 Como x ̸= 0, segue que σi(x) ̸= 0, para todo i = 1, . . . , n. Logo, as primeiras r1 coordenadas de y são não-nulas. Além disso, nas 2r2 coordenadas restantes, temos no mı́nimo r2 não-nulas, pois as partes real e imaginária de σi(x) ̸= 0 não se anulam simultaneamente, para cada i = r1+1, . . . , n. Assim, div(Λ) = min{div(y); y ∈ Λ, y ̸= 0} ≥ r1 + r2. Seja, agora, β ∈ I − {0}. Pela Proposição 3.3.1, tem-se que existe d ∈ Z − {0} tal que dI ⊂ OK, e deste modo dβ ∈ OK. Assim, existem a0, a1, . . . , am−1 ∈ Z tal que (dβ)m + am−1(dβ) m−1 + . . .+ a1(dβ) + a0 = 0, com a0 ̸= 0. Porém, como I é um OK-módulo e d ∈ OK, segue que dβ ∈ I, e assim −a0 = (dβ)m + am−1(dβ) m−1 + . . .+ a1(dβ) ∈ I. Como −a0 ∈ Z, segue que σi(−a0) = −a0, para todo i = 1, . . . , n. Dessa forma, σα(−a0) é um elemento de Λ, com div(σα(−a0)) = r1 + r2. Portanto, div(Λ) = r1 + r2. Corolário 3.3.1 Se I é um ideal fracionário de OK e Λ = (I, T rα) é um reticulado ideal, então: (i) div(Λ) = n, se K é totalmente real. (ii) div(Λ) = n 2 , se K é totalmente imaginário. Demonstração: Se K é totalmente real, tem-se que r2 = 0, e assim div(Λ) = r1 = n. Agora, se K é totalmente imaginário, então div(Λ) = r2 = n 2 . Teorema 3.3.2 Se K é totalmente real e I é um ideal fracionário de OK, então a distância produto mı́nima de um reticulado ideal Λ = (I, T rα) é dada por dp,min(Λ) = min(I) √ det(Trα) |DK| , onde min(I) = min 0̸=x∈I |N (x)| N (I) . Demonstração: Dado y ∈ Λ, tem-se que existe x ∈ I tal que y = σα(x) = ( √ σ1(α)σ1(x), . . . , √ σn(α)σn(x)), pois K é totalmente real. Pelo Corolário 3.3.1, temos que div(Λ) = n. Assim, ao denotar y = (y1, . . . , yn) ∈ Rn, segue que dp,min(Λ) = min{dp(y); y ∈ Λ, y ̸= 0} = min 0 ̸=y∈Λ n∏ i=1 |yi| 57 = min 0̸=x∈I n∏ i=1 ∣∣∣√σi(α)σi(x) ∣∣∣ = n∏ i=1 √ σi(α) min 0̸=x∈I n∏ i=1 |σi(x)| = √ N (α) min 0̸=x∈I |N (x)| . Pelo Teorema 3.3.1, tem-se que det(Trα) = N (I)2N (α)|DK| e, assim, √ N (α) = √ det(Trα) N (I) √ |DK| . Portanto, dp,min(Λ) = √ det(Trα) N (I) √ |DK| min 0̸=x∈I |N (x)| = √ det(Trα)√ |DK| min 0 ̸=x∈I |N (x)| N (I) = min(I) √ det(Trα)√ |DK| , como queŕıamos demonstrar. Lema 3.3.1 Se I é um ideal principal de OK, então min 0̸=x∈I |N (x)| = N (I). Demonstração: Como I ⊂ OK é um ideal principal, segue que existe a ∈ OK tal que I = ⟨a⟩. Desse modo, N (I) = |N (a)|. Dado x ∈ I − {0}, temos que x = ay, para algum y ∈ OK. Assim, |N (x)| = |N (a)||N (y)| ≥ N (I). Além disso, |N (x)| = N (I) para x = a ∈ I. Portanto, min 0̸=x∈I |N (x)| = N (I). Corolário 3.3.2 Se K é totalmente real e I é um ideal principal de OK, então a distância produto mı́nima de um reticulado ideal Λ = (I, T rα) é dada por dp,min(Λ) = √ det(Trα) |DK| . Demonstração: Decorre diretamente do Teorema 3.3.2 e do Lema 3.3.1. Observação 3.3.2 Seja Λ = (I, T rα) um reticulado ideal, onde I é um ideal principal do anel de inteiros OK, com K totalmente real. Se G é uma matriz Gram de Λ, então, pela Proposição 3.2.1, tem-se que G = (Trα). Desse modo, dp,min(Λ) = √ det(G) |DK| . 58 Caṕıtulo 4 Reticulados de dimensão ı́mpar via Extensões Ćıclicas Neste caṕıtulo, apresentamos construções de famı́lias de reticulados algébricos de dimensão ı́mpar via extensões ćıclicas, ou mais precisamente, via subcorpos de extensões ciclotômicas do tipo Q(ζp), Q(ζp2), Q(ζpq) e Q(ζpq2), com p e q primos ı́mpares. Na Seção 4.1, expomos uma descrição inicial de construção ćıclica utilizando o anel de inteiros de subcorpos de Q(ζp). Visando preparar condições para as construções seguintes, na Seção 4.2 é introduzida uma terminologia dos reticulados Zn-rotacionados e na Seção 4.3 é apresentado o conceito de anel de grupo, como um modo de intermediar as abordagens feitas em [18] e [20], referências suporte para a Seção 4.4, na qual é feita a obtenção de reticulados Zn-rotacionados. 4.1 Reticulados de dimensão ı́mpar sobre OK Considerando um corpo de números de grau ı́mpar K contido numa extensão ciclotômica Q(ζp), em que p é um primo ı́mpar, fazemos a imersão do anel de inteiros OK no Rn, via o homomor- fismo canônico, obtendo um reticulado algébrico, do qual fornecemos a matriz geradora, matriz Gram e parâmetros como volume, diversidade e distância produto mı́nima. Proposição 4.1.1 Dados um inteiro positivo n e um primo ı́mpar p tal que p ≡ 1(mod n), temos que existe um único subcorpo K de Q(ζp) que satisfaz [K : Q] = n. Além disso, Q ⊆ K é ćıclica e p é o único primo que ramifica em OK. Demonstração: Seja G = Gal(Q(ζp) : Q). Temos que ◦(G) = p − 1 e G ≃ Z∗ p é ćıclico (veja Teorema 1.1.2). Assim, sendo σ um gerador de G, o grupo ćıclico H := ⟨σn⟩ 6 G tem ordem (p − 1)/n e, como H 6 G = Gal(Q(ζp) : Q) e Q ⊂ Q(ζp) é galoisiana, segue pelo ı́tem (i) do Teorema 1.1.1, que H = Gal(Q(ζp) : K) para algum corpo intermediário K de Q ⊂ Q(ζp). Além disso, pelo ı́tem (ii) do Teorema 1.1.1, tem-se que K ⊆ Q(ζp) é galoisiana e H = Gal(Q(ζp) : K) 59 é o único subgrupo de G tal que [K : Q] = n. Desse modo, K é o único corpo intermediário de Q ⊂ Q(ζp), de grau n sobre Q. Q(ζp) p−1 n {Id} K // H = Gal(Q(ζp) : K)oo Q n G = Gal(Q(ζp) : Q) Afirmamos que Q ⊆ K é ćıclica. De fato, como G é abeliano (pois é ćıclico), segue que todo subgrupo de G é normal e, em particular, H = Gal(Q(ζp) : K) ▹ G. Assim, pelo ı́tem (iii) do Teorema 1.1.1, tem-se Q ⊆ K é galoisiana e, além disso, Gal(K : Q) ≃ Gal(Q(ζp) : Q) Gal(Q(ζp) : K) = G H . Dessa forma, como G é ćıclico, segue que Gal(K : Q) também o é. Portanto, Q ⊆ K é ćıclica. Por fim, como K ⊆ Q(ζp), segue do Teorema 1.6.1 que |DK| = pn−1. Portanto, pelo Teorema 2.3.3, temos que p é o único primo que ramifica em OK. Nas duas observações seguintes, considere as mesmas notações da Proposição 4.1.1. Observação 4.1.1 Como G é ćıclico com gerador σ, segue que G/H também é ćıclico, cujo gerador é σ. Assim, do isomorfismo natural G/H ≃ Gal(K : Q), segue que σ|K é um gerador de Gal(K : Q), isto é, Gal(K : Q) = ⟨σ|K⟩ = {IdK, σ|K, . . . , σn−1|K}. Observação 4.1.2 Note que, do fato de G = ⟨σ⟩ = Gal(Q(ζp) : Q) = {σ1, . . . , σp−1} com σi : ζp 7→ ζ ip, segue que σ = σr para algum r ∈ {1, . . . , p − 1} e, além disso, como G ≃ Z∗ p via o isomorfismo natural σi 7−→ i, segue que r é um gerador de Z∗ p, isto é, r é um elemento primitivo módulo p. Exemplo 4.1.1 Dados n = 5 e p = 11, pela Proposição 4.1.1, existe uma única extensão ćıclica K de Q com K ⊆ Q(ζ11), tal que [K : Q] = 5. Como 2 é um gerador de Z∗ 11, segue da Observação 4.1.2, que σ2 é um gerador de G = Gal(Q(ζ11) : Q). Assim, tem-se que K é o corpo fixo do subgrupo ⟨σ5 2⟩ de G = ⟨σ2⟩, isto é, ⟨σ5 2⟩ = Gal(Q(ζ11) : K). Porém, como σ5 2 = σ25 = σ32 e 32 ≡ 10(mod 11), segue que σ5 2 = σ10. Portanto, do fato de [Q(ζ11) : K] = 2, conclúımos que Gal(Q(ζ11) : K) = {Id, σ10}. 60 Definição 4.1.1 Sejam Q ⊆ K uma extensão galoisiana de grau n, com Gal(K : Q) = {σ1, . . . , σn} e M ⊂ K um Z-módulo livre de posto n. Se existe c ∈M tal que {σ1(c), . . . , σn(c)} é uma Z-base de M , dizemos que tal base é uma base normal de M . Note que, temos bem definido o conceito de base normal do anel de inteiros de um corpo de números, bem como de qualquer um de seus ideais (veja Teorema 1.4.1). Apresentamos agora, três resultados a fim de exibir uma base normal para OK, no caso em que K é um corpo intermediário de Q ⊆ Q(ζp), com p primo. Para isso, fornecemos também uma base do corpo K sobre Q. Lema 4.1.1 Se K é um corpo intermediário de Q ⊂ Q(ζp), com p primo, [Q(ζp) : K] = m, [K : Q] = n e σr é um gerador de Gal(Q(ζp) : Q), então o conjunto {ζrn+1 p , . . . , ζr mn+1 p , ζr n+2 p , . . . , ζr mn+2 p , . . . , ζr n+n p , . . . , ζr mn+n p } é linearmente independente sobre Q. Demonstração: Denotemos G = Gal(Q(ζp) : Q). Pela Observação 4.1.2, tem-se que G = ⟨σr⟩ para algum r ∈ {1, . . . , p − 1} e, do isomorfismo natural G ≃ Z∗ p, temos que Z∗ p = ⟨r⟩ = {r, r2, . . . , rp−1}. Sejam aij ∈ Q tal que n∑ j=1 m∑ i=1 aijζ rin+j p = 0. (4.1.1) Afirmamos que, para 1 ≤ i1, i2 ≤ m e 1 ≤ j1, j2 ≤ n, se ζr i1n+j1 p = ζr i2n+j2 p então i1 = i2 e j1 = j2. De fato, suponhamos que ζr i1n+j1 p = ζr i2n+j2 p e não valha i1 = i2 e j1 = j2. Temos duas possibilidades a analisar; quando uma das duas últimas igualdades não é válida ou quando ambas não são. Suponhamos primeiramente, sem perda de generalidade, que i1 = i2 e j1 ̸= j2. Como ζr i1n+j1 p = ζr i2n+j2 p , segue que ri1n+j1 ≡ ri2n+j2(mod p), o que implica que p | ri1n(rj1−rj2), pois i1 = i2. Como p é primo, segue que p | ri1n ou p | rj1 − rj2 . Mas a primeira condição não é posśıvel, pois acarretaria que p | r, o que é uma contradição pelo fato de r ≤ p − 1. Suponhamos que j1 > j2. Logo existe t ∈ Z+ tal que j1 = j2 + t. Assim, p | rj2(rt − 1) e, dessa forma, rt ≡ 1(mod p) implicando que rt = 1 com t = j1 − j2 ≤ n− 1 < n < p− 1, o que é uma contradição, pois a ordem de r é p− 1. Consideremos, agora, o caso em que i1 ̸= i2 e j1 ̸= j2 e suponhamos que i1 > i2 e j1 > j2. Assim, existem t1, t2 ∈ Z+ tal que i1 = i2 + t1 e j1 = j2 + t2 e, então, t1 = i1 − i2 ≤ m− 1 e t2 = j1 − j2 ≤ n− 1. Logo, como p | ri1n+j1 − ri2n+j2 , segue que p | r(i2+t1)n+(j2+t2) − ri2n+j2 , isto é, p | ri2n+j2(rt1n+t2 − 1). Dessa forma, rt1n+t2 ≡ 1(mod p), ou seja, rt1n+t2 = 1. Porém, como t1 ≤ m − 1 e t2 ≤ n − 1, segue que t1n ≤ (m − 1)n e, assim, 61 t1n+ t2 ≤ mn−1 = p−2 < p−1, contradição. Dessa forma, os valores ζr in+j p , com 1 ≤ i ≤ m e 1 ≤ j ≤ n, são todos distintos, num total de mn = p−1 elementos. Podemos, então, reescrever a Equação (4.1.1) na forma p−1∑ k=1 bkζ k p = 0, com bk ∈ Q, para todo k = 1, . . . , p − 1 e, como {ζp, ζ2p , . . . , ζp−1 p } é uma Q-base de Q(ζp), segue que bk = 0, para todo k = 1, . . . , p − 1. Portanto, aij = 0 para todo i = 1, . . . ,m e j = 1, . . . , n e, dessa forma, o conjunto {ζrn+1 p , . . . , ζr mn+1 p , ζr n+2 p , . . . , ζr mn+2 p , . . . , ζr n+n p , . . . , ζr mn+n p } é linearmente independente sobre Q. Teorema 4.1.1 Se K é um corpo intermediário de Q ⊂ Q(ζp), com p primo, então K = Q(θ), onde θ = TrQ(ζp)/K(ζp). Demonstração: Temos