UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO”, FACULDADE DE CIÊNCIAS DEPARTAMENTO DE FÍSICA E METEREOLOGIA ENZO LEWIN GALINDO CARACTERIZAÇÃO DE BIOMATERIAIS COM TÉCNICAS ALTERNATIVAS: ELASTICIDADE E TRIBOCORROSÃO BAURU 2023 ENZO LEWIN GALINDO CARACTERIZAÇÃO DE BIOMATERIAIS COM TÉCNICAS ALTERNATIVAS: ELASTICIDADE E TRIBOCORROSÃO Trabalho de Conclusão de Curso requerido para obter-se o título de Bacharel em Física de Materiais, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), Campus de Bauru, Faculdade de Ciências (FC). Orientador: Prof. Dr. Carlos Alberto Fonzar Pintão. BAURU 2023 Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Ciências, Bauru. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. G158c Galindo, Enzo Lewin Caracterização de biomateriais com técnicas alternativas : Elasticidade e tribocorrosão / Enzo Lewin Galindo. -- Bauru, 2023 40 p. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado - Física) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Ciências, Bauru Orientador: Carlos Alberto Fonzar Pintão 1. Biomateriais. 2. Elasticidade. 3. Tribocorrosão. I. Título. ENZO LEWIN GALINDO CARACTERIZAÇÃO DE BIOMATERIAIS COM TÉCNICAS ALTERNATIVAS: ELASTICIDADE E TRIBOCORROSÃO Trabalho de Conclusão de Curso requerido para obter-se o título de Bacharel em Física de Materiais, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, campus de Bauru, Faculdade de Ciências. BANCA EXAMINADORA Bauru, 15 de fevereiro de 2023. AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar dou graças a Deus, por suas misericórdias, e por que dEle é que provém todo o conhecimento e sabedoria. Em seguida, sou grato ao orientador pelo ensino e dedicação, em todo esse tempo de trabalho, também aos colaboradores do Laboratório de Anelasticidade e Biomateriais, especialmente ao Renan Lopes, Israel Rodrigues e Giovana Cardoso que forneceram as amostras das ligas que desenvolveram. Agradeço ao senhor Wilians Govedise pela atenção e apoio técnico prestado. Agradeço também ao CNPq e ao PIBIC Reitoria da UNESP, pelo financiamento que forneceu a bolsa de iniciação científica, que gerou este trabalho. Agradeço à minha mãe, por quem fiz este curso, e que apoiou-me em todo o seu decorrer. Dou graças pelos amigos de pesquisa, que também tiveram importância neste trabalho, a saber, Adriana Alencar, Jean Teixeira e Bruna Oliveira. Agradeço pelos amigos da ABU (Associação Bíblica Universitária), irmãos queridos do Senhor, com os quais tive bons momentos, em especial ao Renan Lopes, irmão que o Senhor me deu, e que sempre me concedeu auxílio neste curso. RESUMO Os métodos de caracterização são cruciais para a avaliação da biocompatibilidade de biomateriais. Este estudo explora três técnicas de caracterização desenvolvidas no Laboratório de Caracterização Física e Reológica da UNESP, campus de Bauru: módulo de tração por meio de energia de deformação, módulo de torção por meio de espectroscopia mecânica e tribocorrosão: monitoramento de potencial de circuito aberto e coeficiente de atrito dinâmico em função do tempo. Foram medidos os módulos de elasticidade para o aço inoxidável ASTM F138, com duas amostras cilíndricas de seção transversal circular, uma de 3,0 mm de diâmetro e outra de 3,5 mm. O módulo de tração médio obtido foi de 204 ± 15 GPa para as duas amostras, enquanto o módulo torção foi de 68 ± 4 GPa, para a amostra de 3,0 mm e 65 ± 8 GPa, para a amostra de 3,5 mm. Em tribocorossão, foram caracterizadas amostras de titânio comercialmente puro, da liga Ti6Al4V, e de ligas de Ti-Mo-Zr e Ti-Mo-Nb. Foi discutida e verificada a validação do sistema com os resultados do titânio comercialmente puro e da liga Ti6Al4V; também foi feito um estudo comparativo das ligas de Ti10MoXZr, X = 30, 40, 50 e Ti5MoXNb, X = 10, 20, 30 (% peso). Tais ligas apresentaram uma resistência à tribocorrosão menor que a da liga Ti6Al4V, exceto as amostras de Ti10Mo40Zr e Ti5Mo10Nb que se aproximaram da mesma. Os resultados do módulo de tração convergiram com valores de literatura, enquanto os resultados do módulo de torção foram um pouco abaixo do valor esperado. Palavras-chave: biomateriais; elasticidade; módulo de tração; módulo de torção; aço ASTM F138; tribocorrosão; titânio; ligas de titânio. ABSTRACT The characterization methods are crucial for biocompatibility evaluation of biomaterials. This study explores three characterization techniques developed on Laboratório de Caracterização Física e Reológica: tensile modulus through deformation energy, torsion modulus through mechanical spectroscopy and tribocorrosion: open circuit potential and dynamical friction coefficient monitoring by the time. Elastic modulus was measured for the ASTM F138 steel wtih two cylindrical samples of circular cross section, one of 3.0 mm diameter and another of 3.5 mm diameter. The average tensile modulus obtained was 204 ± 15 GPa for the two samples, while the torsion modulus was 68 ± 4 GPa, for the 3.0 mm sample and 65 ± 8 GPa for the 3.5 mm sample. On tribocorrosion, commercially pure titanium, the alloy Ti6Al4V, and the alloys of Ti-Mo-Zr and Ti-Mo-Nb samples were characterized. The system validation was discussed and verified with commercially pure titanium and Ti6Al4V alloy results; also a comparative study with Ti-Mo-Zr and Ti-Mo-Nb alloys was done. That alloys showed a lower tribocorrosion resistance than Ti6Al4V alloy, excluding the Ti10Mo40Zr and Ti5Mo10Nb alloys which were close. The tensile modulus results converged with the literature values, while the results of torsion modulus was a little below of expected value. Keywords: biomaterials; elasticity; tensile modulus; torsion modulus; ASTM F138 steel; tribocorrosion; titanium; titanium alloys. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO......................................................................................................................5 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA..............................................................................................6 2.1 Biomateriais.........................................................................................................................6 2.1.1 Definição............................................................................................................................6 2.1.2 Metais.................................................................................................................................6 2.1.3 O aço ASTM F138.............................................................................................................8 2.2 Elasticidade..........................................................................................................................8 2.2.1 Módulos de elasticidade de tração e de torção...................................................................8 2.2.2 Métodos de medição de módulos de elasticidade............................................................11 2.3 Tribocorrosão....................................................................................................................14 2.3.1 Definição..........................................................................................................................14 2.3.2 Mecanismos de desgaste e de corrosão............................................................................14 2.3.3 Aparato de ensaio.............................................................................................................16 2.3.4 Procedimentos e interpretação.........................................................................................17 2.4 Teoria de erros...................................................................................................................18 2.4.1 Conceitos básicos.............................................................................................................18 2.4.2 Propagação de incertezas.................................................................................................19 3 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................................20 3.1 Amostras............................................................................................................................20 3.2 Flexômetro quase-estático................................................................................................21 3.3 Pêndulo de torção..............................................................................................................23 3.4 Sistema de tribocorossão..................................................................................................24 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO.........................................................................................28 4.1 Módulo de tração...............................................................................................................28 4.2 Módulo de torção...............................................................................................................32 4.3 Ensaios de tribocorrosão..................................................................................................34 5 CONCLUSÃO......................................................................................................................37 REFERÊNCIAS......................................................................................................................39 5 1 INTRODUÇÃO Há muito tempo que o homem tem usado materiais para o benefício de seu corpo e de animais, seja por estética ou para o assistir em uma debilidade ou doença. Alguns registros mostram exemplos desse uso no Antigo Egito, na França e no contexto dos Maias, na forma de suturas com linhas de ouro, dentes de conchas e dentes de ferro, respectivamente. Também há registros da Idade Média e do Antigo Egito do uso da madeira substituindo o osso. Inicialmente, o conceito de biomaterial preocupava-se apenas com a característica de compatibilidade com o corpo, ou seja, de não causar efeitos tóxicos. No entanto, aumentaram- se os interesses do homem nesse contexto e novas ideias foram introduzidas: materiais bioativos, biodegradáveis e biomiméticos (PIRES, 2015). No mercado, o processo básico do uso clínico de um biomaterial é a sua concepção (visando tratar uma doença ou debilidade do corpo), seguindo do projeto e síntese. Então são feitos os testes de suas diversas propriedades e o projeto escolhido (tanto de material quanto de design) é usado na fabricação. A seguir são necessários testes mais detalhados de toxicologia de biointeração. O projeto ainda precisa passar por agências regulamentadoras, depois por estudos clínicos inicias e acompanhamentos de longo prazo. Estando em uso, o material ainda é analisado pelos explants de pacientes. As propriedades requeridas para os biomateriais dependem de sua aplicação. No geral as características olhadas são: biocompatibilidade, hemocompatibilidade, alergenicidade, citotoxicidade (biológicas); rugosidade, módulo de elasticidade, resistência mecânica, porosidade (físicas); estabilidade forma de degradação, resistência à corrosão (químicas) (PIRES, 2015). À vista destas coisas, pode-se dizer que a caracterização de biomateriais é um fator crucial para o seu projeto e uso clínico. Este trabalho usa de técnicas alternativas (às comerciais) para caracterizar duas importantes propriedades para dispositivos ortopédicos e dentários, a saber, a elasticidade e a resistência à tribocorrosão. Os materiais estudados são o aço inoxidável ASTM F138, o titânio comercialmente puro, a liga Ti6Al4V e ligas dos sistemas Ti-Mo-Zr e Ti-Mo-Nb; esses materiais são de certa forma representativos, já que o aço inoxidável e as ligas de titânio são amplamente utilizados na otrtopedia e odontologia. Entretanto, é necessário enfatizar que o foco deste trabalho é a validação dos métodos de caracterização dos sistemas de medida usados. 6 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Biomateriais 2.1.1 Definição O conceito de biomaterial possui diferentes definições de autores e instituições de saúde. De maneira mais simples, neste estudo, biomaterial é um dispositivo que pode ser usado em sistemas biológicos com uma determinada finalidade, sem causar danos nos mesmos, com as seguintes considerações. Um biomaterial pode ser usado para um indivíduo e também para animais; pode ter finalidade de tratamento de doenças, de diagnóstico, de bem- estar ou de estética; pode ser nas formas sintética e natural (PIRES, 2015). A capacidade de um material executar uma função em sistemas biológicos, levando o mesmo a uma reposta apropriada, e sem causar efeito tóxicos ou prejudiciais é chamada de biocompatibilidade. As diversas propriedades de um material e sua interação com sistemas biológicos devem ser analisadas para caracterizar sua biocompatibilidade ou não. Isso leva a um largo espectro de técnicas de caracterização in vivo e in vitro (HUZUM, 2021). Os biomateriais implantáveis são classificados como tóxicos, se causam morte celular; não tóxicos (bioinertes), se causam a formação de um tecido fibroso em seu redor; bioativos, se causam adesão celular; biodegradáveis, se permitem o crescimento de tecidos que substituem a matriz do implante, ao se degradar. 2.1.2 Metais Os metais possuem notável versatilidade nas aplicações biomédicas, devido às suas propriedades mecânicas, condutividade elétrica e facilidade de esterilização. Algumas das suas principais aplicações são: estruturais: fios, parafusos, placas, implantes dentários, próteses e implantes ortopédicos; instrumentos cirúrgicos: lâminas, brocas, pinças, afastadores etc.; e outras, como válvulas cardíacas, marca-passos e malhas expansíveis para artérias, os stents. Os grupos de metais usados como biomateriais são as ligas de titânio e o titânio comercialmente puro, as ligas de cobalto-cromo-molibdênio e os aços inoxidáveis, sobretudo os aços AISI 316L1 (HUZUM, 2021). 1 Definido pelo AISI, American Iron and Steel Institute, associação de produtores de aço dos Estados Unidos da América. 7 Há um modelo simples que explica algumas propriedades dos metais. Estes podem ser vistos como um conjunto de núcleos iônicos, de carga resultante positiva, envolvidos por um “mar de elétrons”, da camada de valência. Os elétrons livres garantem a condutividade térmica e elétrica. Os núcleos possuem uma certa mobilidade nesse “meio de elétrons”, e as forças de ligação são não direcionais, o que explica a habilidade de sofrer deformações plásticas sem danificar a estrutura do material, que os metais possuem, a chamada ductibilidade. Por outro lado, de um modo geral, os metais são sólidos cristalinos. Os átomos ou íons, vistos como esferas rígidas, são empacotados, em chamadas células unitárias, que se repetem e formam uma rede cristalina; trata-se do modelo atômico da esfera rígida. Por causa das ligações não direcionais, o empacotamento dos metais permite que um átomo tenha muitos vizinhos, o que leva a uma tendência de densidade considerável (CALLISTER, 2021). Quando um arranjo periódico se estende a um determinado comprimento, ele forma um grão. Se esse arranjo se estende por todo o material, este é chamado de monocristalino. No entanto, a maioria dos sólidos cristalinos é formada por muitos grãos, o que os denomina de policristalinos. Os monocristais são caracterizados por propriedades que dependem da direção -anisotrópicas. Os materiais policristalinos, por sua vez, tendo muitos cristais, não têm caráter direcional, o que lhes garente propriedades isotrópicas (CALLISTER, 2021). Há diversas condições que podem envolver um biomaterial metálico e muitas propriedades adequadas podem ser exigidas. Implantes dentários, são submetidos a esforços repetitivos de mastigação, variações de temperatura e pH, dependendo do alimento ingerido, e também a desgastes mecânicos, por atrito. Desse modo é necessário que eles tenham resistência ao fenômeno de tribocorrosão e resistência à fadiga. Como outro exemplo, em aplicações ortopédicas, é desejável que o biomaterial tenha resistência mecânica adequada, resistência à fadiga, capacidade de aderir células, resistência à tribocorrosão, e um módulo de elasticidade semelhante ao do osso. Cada propriedade de um material é importante para um projeto de biomaterial, segundo a sua aplicação. Metais de alta densidade podem tornar-se desconfortáveis no corpo humano. O fenômeno conjunto de desgate mecânico e corrosão, denominado tribocorrosão, pode levar um material a liberar partículas (debris) ou íons metálicos no corpo, causando danos biológicos, como a perda óssea e respostas inflamatórias (MATHEW, 2011). No entanto, tem-se pensado em usar a corrosão para projetar metais biodegradáveis, sobretudo com o magnésio, que apresenta baixa resistência à corrosão, baixa toxicidade e é excretado rapidamente quando degradado. Além disso, tem-se buscado o desenvolvimento de materiais com o módulo de elasticidade comparável com o do osso, visto que os metais usados 8 clinicamente apresentam um módulo muito maior do que esse, podendo ser de cinco a dez vezes maior. Desse modo, as tensões mecânicas não ficam igualmente distribuídas entre o osso e o metal, e esse tende a perder densidade, fenômeno chamado de blindagem óssea (PIRES, 2015). 2.1.3 O aço ASTM F138 Os aços inoxidáveis são muito utilizados como dispositivos de fixação. São compostos de ferro, carbono, cromo e outros elementos. O carbono não é desejado em alto nível para biomateriais, por que ele tende a abaixar a resistência à corrosão pela formação de carboneto de cromo nos contornos de grãos2. Os aços AISI 316L são aços austeníticos3, de baixo teor de carbono (máximo de 0,03%), com 16-18% de cromo, 12-15% de níquel, e 2-3% de molibdênio. Para melhorar a resistência à corrosão intergranular foram desenvolvidos os aços ASTM F138 e ASTM F1394 (que serão abreviados por F138 e F139, respectivamente), que podem ser considerados da mesmo família dos aços AISI 316L. Pela norma, o aço F138 deve ter uma microestrutura homogênea, na forma austenítica e com grãos finos, de tamanho uniforme, ausente de ferrita e deve passar por testes de susceptibilidade à corrosão intergranular (SANTOS, 2019). Por fim, os módulo de tração do aço F138 pode variar de 190 a 210 GPa, e o módulo de torção comumente é dado como 80 GPa. Segundo o datasheet “Medical Grade Stainless Steel 316LVM” (MATWEB), este aço possui módulo de tração em torno de 187,5 GPa, módulo de torção em cerca de 70,3 GPa e coeficiente de Poisson de 0,33. 2.2 Elasticidade 2.2.1 Módulos de elasticidade de tração e de torção Há dois tipos de deformação que um corpo pode sofrer. Quando este se deforma por uma força, mas restaura-se quando ela é retirada, diz-se que o mesmo sofreu uma deformação elástica. Por outro lado, se a força for retirada mas o corpo apresentar uma deformação permanente, é dito que o mesmo sofreu uma deformação plástica. A capacidade de um material sofrer deformações elásticas chama-se elasticidade, e a propriedade de sofrer 2 A formação do carboneto de cromo leva a um empobrecimento de cromo no grão, tornando este menos resistente à corrosão. 3 Termo que se refere à austenita, fase sólida de ferro na forma cúbica de face centrada (CFC). 4 Definidos pela ASTM International, American Society for Testing and Materials, órgão de padronização dos Estados Unidos da América. 9 deformações plásticas sem se quebrar chama-se ductibilidade (ASKELAND, 2019). Para sólidos, de um modo geral, e para pequenas deformações, é válida a lei de Hooke: F ∝ Δ l (1) onde F representa uma força, l um comprimento e Δl uma variação no mesmo. Para avaliar a característica própria do material, sem precisar considerar sua dimensão, é usada a quantidade ε = Δl/l, em vez de l, que é definida como deformação (FEYNMAN, 2008). A força pode causar diferentes tipos de esforços: compressão, tração, cisalhamento, torção e flexão. Os dois primeiros se devem a forças aplicadas perpendicularmente às superfícies da extremidade (em sentidos opostos), o primento no sentido de contrair e o segundo no sentido de alongar. O cisalhamento e a torção se devem a forças aplicadas na direção paralela às superfícies da extremidade, e em sentidos opostos. O primeiro, no sentido de “rasgar” e o segundo, no sentido de torcer (a força implica em um torque que rotaciona as áreas da extremidade). Por fim, a flexão ocorre quando a força está a 90° da direção longitudinal do material, no sentido de vergar. A Figura 1 ilustra esses esforços mecânicos. Figura 1. Tipos de esforços mecânicos. Da esquerda para a direita: compresssão, tração, cisalhamento, torção e flexão. Fonte: www.linearmotiontips.com. As cargas envolvidas nos esforços mecânicos são dadas em tensões, isto é, forças por unidade de área, o que leva, para os esforços de tração e compressão, à equação τ = E ε , (2) na qual τ é a tensão e E é o chamado módulo de elasticidade (módulo E), ou, módulo de Young. Os módulos de elasticidade podem ser vistos em curvas de tensão-deformação na região linear; quando as deformações se tornam relativamente grandes tais curvas apresentam um regime não linear (ver Figuras 2 e 3) (ASKELAND, 2019). 10 No caso de um esforço de torção, a lei de Hooke é colocada em função do ângulo de torção: τ = Gθ , (3) onde θ é o ângulo de torção e G o módulo de torção (módulo G) (FEYNAMN, 2008). Note-se que os módulos de elasticidade têm a mesma unidade de tensão, o pascal (Pa); comumente são dados na forma de GPa ou MPa. Esta constante da lei de Hooke (quer seja de tração ou de torção) indica a rigidez de um material. Quanto maior for o módulo de elasticidade, tanto maior deverá ser a tensão aplicada para provocar uma determinada deformação. Este fator está relacionado com as ligações atômicas, e as forças restauradoras que elas exercem. Se os átomos estão fortemente ligados, é difícil causar uma certa separação entre eles. Desse modo, os módulos de elasticidade também indicam se o ponto de fusão de um sólido será relativamente alto ou baixo (ASKELAND, 2019). Quando um material se deforma em uma de suas dimensões, na tração ou compressão, também deforma-se em suas dimensões a ângulos retos (FEYNMAN, 2008). O coeficiente de Poisson é o fator que relaciona a deformação em uma direção com a deformação decorrida em outra direção (ASKELAND, 2019): γ =− εlateral εlongitudinal (4) Para materiais isotrópicos, o coeficiente de Poisson relaciona os módulos E e G, pela equação (CALLISTER, 2021) E = 2G(1+γ) (5) Os módulos de elasticidade são determinados pelas curvas de tensão-deformação a deformações lentas. A rapidez com a qual um material se deforma é denominada taxa de deformação. Quando esta taxa é considerada alta, o esforço mecânico é chamado de carregamento por impacto, ou simplesmente impacto. Alguns materiais, mesmo exibindo notável ductibilidade podem quebrar-se quando submetidos a impactos, como é o caso da “massa de modelar”; as suas longas moléculas poliméricas “emaranhadas”, quando 11 tracionadas rapidamente, tendem a romper-se em vez de alongar-se e “desenrolar-se”, como ocorre a deformações lentas (ASKELAND, 2019). Outra propriedade elástica importante de se mencionar é a viscoelasticidade. A propriedade de um líquido que relaciona a tensão de cisalhamento a qual é submetido, à sua taxa de variação de deformação, e que também expressa como será o seu escoamento, é chamada de viscosidade. Pode-se fazer uma analogia a um padeiro que rasga uma massa sobre uma mesa. A massa tem uma certa aderência na mesa, e a parte superior da massa ao ser empurrada ou puxada implica em uma tensão de cisalhamento, que rasga a massa. Por semelhante modo, um líquido possui uma tensão de cisalhamento relacionada ao seu escoamento. A viscosidade, portanto, expressa o quão rápida ou lentamente o líquido se deforma por essa tensão de cisalhamento, ou, o quão rápido ou lentamente ele escoa. Um óleo viscoso, por exemplo, se colocado em um prato inclinado, pelas forças gravitacionais começa a escoar lentamente, por causa de sua viscosidade. Essa ideia de um “atraso” na deformação quando uma tensão é aplicada também é usada no contexto dos sólidos. Um sólido viscoso tem uma certa defasagem no tempo, de sua deformação, quando recebe uma determinada tensão. Se esse material possui também a propriedade de elasticidade, é denominado anelástico, equivalente de viscoelástico, termo mais usado para polímeros (AKELAND, 2019). 2.2.2 Métodos de medição de módulos de elasticidade As técnicas de caracterização de módulos de elasticidade são divididas em destrutivas e não destrutivas, quase-estáticas e dinâmicas. No método quase-estático a carga aplicada sobre a amostra pode ser estática ou lentamente variável (CASSOLINO, 2010). Um exemplo é o ensaio mecânico de tração, que resulta em uma curva na forma da Figura 2. Neste ensaio a amostra é tracionada até a ruptura, o que o caracteriza como ensaio destrutivo. A região linear da Figura 2 é a zona elástica da deformação, e a partir do limite elástico, a região não linear, a deformação é plástica. A Figura 3 mostra uma curva característica do ensaio mecânico de torção. Nele se pode ver, semelhantemente à curva de tração, uma região elástica inicial, seguindo uma região de deformação plástica. 12 Figura 2. Curva exemplo de um ensaio de tração para metais. Fonte: próprio autor. Figura 3. Curva característica de um ensaio de torção para metais Da Costa (2019). Os métodos dinâmicos são geralmente não destrutivos, e alguns, além de permitir aferir os módulos de elasticidade, conseguem avaliar o aspecto da amostra, como a sua integridade (ausência de falhas). Eles podem ser divididos em dois: excitação por impulso e varredura de frequência. O seu princípio consiste em determinar os módulos por meio das frequências naturais e da geometria da amostra. No método de excitação por impulso, basicamente a amostra é posta sobre um suporte e sofre um impacto por um pulsador. Um transdutor capta o sinal sonoro e o transforma em sinal elétrico (CASSOLINO, 2010). A Figura 4 mostra um equipamento comercial que utiliza esta técnica. O método de varredura de frequência, em suma, consiste em gerar uma faixa de frequências na amostra e detectar as frequências de ressonância. A amostra é colocada em um suporte, no qual há um acoplamento dos transdutores excitador-detector. O equipamento deve evitar adicionar massa em contato com a amostra, para não interferir na frequência de vibração. Por essa razão, alguns equipamentos suspendem a amostra em fios. A Figura 5 mostra uma ilustração deste método. 13 Figura 4. Sonelastic®. Fonte: Cassolino (2010). Figura 5. Ilustração do método de varredura de frequência. Fonte: Cassolino (2010). Por fim, vale mencionar uma outra técnica conhecida que permite a obtenção dos módulos de elasticidade: a nanoindentação. Esta técnica é um ensaio de penetração e se baseia na ideia de deslocamentos elásticos na superfíce, isto é, deformações superficiais em contatos de pressão (ODO, 2001). A nanoindentação permite determinar propriedades mecânicas na superfície de um material, e é comumente usada para medição de módulo de elasticidade e dureza (SCHUH, 2006). 14 2.3 Tribocorrosão 2.3.1 Definição Tribocorrosão é um processo degradante em materiais sujeitos a esforços mecânicos de fricção em meios corrosivos. O prefixo “tribo”, originado do grego, significa esfregar, o que indica de fato um processo de corrosão com atrito empregado simultaneamente. Mais precisamente, tal processo pode ser definido como uma transformação (perda) irreversível de material, resultante da ação simultânea de esforços mecânicos e interações eletroquímicas com o ambiente (LÓPEZ-ORTEGA, 2018). Portanto, esse fenômeno faz a junção de duas grandes áreas: a corrosão e a tribologia, de modo que seja possível explorar tanto os mecanismos de desgaste quanto os mecanismos de corrosão. A tribocorrosão também é um processo sinergético, quer dizer, fazendo-se os ensaios de desgaste e corrosão separadamente, ao somar os seus efeitos, se terá uma degradação menor comparada com o ensaio feito com ambos os processos, isso significa que um processo influencia o outro. Na verdade, o sinergismo pode aumentar ou diminuir a degradação, dependendo dos mecanismos do fenômeno. Por exemplo, altas tensões nas superfícies em contato, podem formar grãos abrasivos ou filmes (podendo estes ser formados também por reações químicas). No primeiro caso, haverá desgaste, então esse mecanismo irá acelerar o processo de corrosão. No segundo caso, o filme poderá servir como proteção quanto à corrosão, ou lubrificante quanto ao desgaste, diminuindo a taxa de degradação do material (LÓPEZ-ORTEGA, 2018). Atualmente há duas normas sobre o ensaio de tribocorrosão, a ASTM G119 e a UNE5 112086, sendo que a primeira normaliza o teste de desgaste sob polarização anódica e catódica e a segunda normaliza o teste de desgaste sob potencial de circuito aberto. A ASTM G119 também descreve o método de determinação do sinergismo no processo tribocorrosivo, isto é, a degradação excedente ou faltante no ensaio de tribocorossão, quando comparado com a soma da degradação dos processos separados (LÓPEZ-ORTEGA, 2018). 2.3.2 Mecanismos de desgaste e de corrosão No processo tribológico, os mecanismos de desgaste mais comuns são: o de adesão, erosão, abrasão, fadiga, corrosão e fretting. Na adesão, a superfície que opera o desgaste, ao 5 UNE, Asociación Española de Normalización, órgão de normalização da Espanha. 15 deslizar, arranca material por forças de adesão. Na erosão, o desgaste ocorre por partículas duras que colidem com a superfície. Na abrasão, a remoção de material também é feita por partículas duras, mas em dois tipos de contatos: o de dois e o de três corpos. No primeiro, a abrasão é feita pelas asperezas (como ilustrado na Figura 6) ou por partículas duras fixadas à superfície, como se fosse uma lixa (AFFATATO E TRAINA, 2011). No segundo tipo de contato, as partículas duras estão livres para se mover, sendo chamadas de “terceiro corpo”, isto é, um corpo além das duas superfícies, por isso o contato é chamado de três corpos. Quando as partículas rolam, o desgaste é menor, mas quando deslizam, criam sulcos na superfície. Um contato de dois corpos pode facilmente se tornar em um contado de três corpos, e a sua remoção de material é uma ordem de grandeza maior do que este segundo. Além disso, um terceiro corpo pode ser um grão abrasivo ou mesmo um filme, que é formado quando há altas tensões nas superfícies em desgaste (ABDELBARY, 2015). O desgaste por fadiga ocorre quando a carga aplicada é cíclica, de modo que haja repetições de tensão- deformação superficial, até o que os locais tensionados criem falhas que se propagam, ocasionando remoção de material. Por fim, o fretting se refere ao desgaste devido a pequenos deslizamentos, repetitivos, geralmente associado a vibrações. Figura 6. Mecanismos de desgaste. Fonte: Tsujimoto (2018), adaptado. 16 A Figura 7 ilustra mecanismos de corrosão, alguns dos mecanismos mais comuns são: corrosão uniforme, galvânica, pitting e corrosão-fadiga. A corrosão uniforme ocorre em materiais homogêneos, sem considerável passividade, sendo bem distribuída sobre a superfície. A galvânica, por sua vez, ocorre quando há contato entre um material mais nobre que o outro, em um meio corrosivo, de modo que o mais nobre seja reduzido e o menos nobre oxidado. O pitting é uma forma de corrosão localizada, de difícil detecção (ANAEE E ABDULMAJEED, 2016). Ocorre em metais não muito passivos, em meios que contém halogênios6. A corrosão-fadiga é a formação de uma falha devida a tensões na superfície que variam com o tempo, em repetição, juntamente com um ataque corrosivo. Uma falha se inicia e cresce, culminando em uma fratura (ANAEE E ABDULMAJEED, 2016). Figura 7. Mecanismos de corrosão. Fonte: Anaee e Abdulmajeed (2016), adaptado. 2.3.3 Aparato de ensaio O aparato para realizar os ensaios de tribocorrosão consiste em um tribômetro, responsável por operar o desgaste, uma célula eletroquímica, designada para monitorar os parâmetros eletroquímicos e um potenciostato (LÓPEZ-ORTEGA, 2018). O potenciostado aplica um potencial na célula e mede a corrente resultante, funcionando como um gerador de funções junto a um amperímetro (SOUSA, 2021). Para um ensaio de desgaste sob potencial de circuito aberto (OCP), entretanto, o potenciostado não é necessário, em seu lugar pode se usar um multímetro para medir o potencial entre os eletrodos. 6 Elementos do grupo 17 da tabela periódica, caracterizados por serem fortes oxidantes: Flúor, Cloro, Bromo, Iodo e Astato. 17 O tribômetro pode operar um movimento unidirecional, que é o movimento circular, apenas em um sentido, ou um movimento recíproco, que pode ser linear, para frente e para trás, ou em arco, em sentido horário e anti-horário. Na célula eletroquímica, há três eletrodos: o de referência, o contraeletrodo e o de trabalho. Este último é a amostra a ser ensaiada. O eletrodo de referência fornece um referencial para se medir o potencial da amostra. Trata-se de um material estável, geralmente feito de prata e cloreto de prata (Ag/AgCl) ou de mercúrio e calomelano (cloreto de mercúrio) (LÓPEZ-ORTEGA, 2018), em fase aquosa saturada de cloreto de potássio, sendo conhecido como Eletrodo de Calomelano Saturado (SCE, na sigla em inglês), que é menos utilizado em comparação com o primeiro por causa dos riscos do mercúrio à saúde (CORROSIONPEDIA INC, 2016). O contraeletrodo serve para medir/monitorar a corrente elétrica e é feito geralmente de platina, ouro ou grafite; não é usado nos ensaios de OCP (LÓPEZ-ORTEGA, 2018). Os eletrólitos geralmente utilizados são saliva artificial, soluções de NaCl, para simular água do mar e plasma sanguíneo, e tampão fosfato-salino (Phosphate-Buffered Saline PBS, na sigla em inglês), usado por ser capaz de manter seu pH constante e ter a mesma concentração salina do corpo humano (LÓPEZ-ORTEGA, 2018). Por fim, López-Ortega (2018) destaca que não há uma padronização para os instrumentos de ensaios tribocorrosivos e isso dificulta a comparação entre os ensaios de diferentes laboratórios. Além disso, as condições experimentais devem ser escolhidas de um modo a simular de maneira mais próxima possível as condições reais do caso estudado. 2.3.4 Procedimentos e interpretação Segundo López-Ortega (2018), o ensaio de OCP é a técnica mais simples para avaliar o comportamento tribocorrosivo de um material. Mede-se o potencial entre a amostra e o eletrodo de referência antes, durante e após o desgaste. No período anterior ao desgaste, estando a amostra já imersa no eletrólito, espera-se a estabilização do potencial, que varia com o material da amostra e com o eletrólito empregado. O valor deste potencial indica a reatividade do material na solução específica. Se o potencial cresce, aproximando-se do referencial, então há a formação de uma camada passiva de óxido na superfície da amostra. Porém, se o potencial decresce, está se afastando do referencial, o que indica uma perda de sua “nobreza”, isto é, a amostra está se tornando mais suscetível à corrosão. As pequenas variações no valor do potencial indicam corrosão localizada, que aparenta como ruído. Durante o deslizamento, há uma queda no potencial, por causa do rompimento do filme óxido. 18 Quanto maior for a queda, que significa que mais afastado está o potencial da amostra com respeito ao potencial de referência, maior será a corrosão sofrida. Durante esse processo, a parte do material desgastado em contato com a parte do material sem desgaste forma um contato galvânico, entre o mais nobre (passivo) e outro menos nobre (despassivado). Quando o deslizamento termina, a parte da amostra desgastada torna a formar seu óxido, crescendo o potencial até valores próximos com relação a estabilização, fenômeno chamado de repassivação. Desta forma, o ensaio de OCP serve para avaliar a reatividade do material, sua tendência a corroer e sua velocidade de repassivação. 2.4 Teoria de erros 2.4.1 Conceitos básicos Todo processo de medição tem um certo nível de ignorância (incerteza) em seu valor e também erros associados ao procedimento e aos instrumentos de medição utilizados. A teoria de erros trata de como realizar aferições adequadas, como expressar os valores obtidos e como avaliar as incertezas das medidas. O erro de uma medida é definido como um deslocamento da mesma para com o valor verdadeiro, isto é, uma falha no processo de medição ou mesmo no instrumento de medida usado, que desloca a medida do valor verdadeiro. Um erro pode ser aleatório ou sistemático. No primeiro caso, são causas diversas que implicam em variações aleatórias nas medidas; uma maneira de diminuí-lo é fazer a média de uma amostra, que cobrirá essas variações. No segundo caso, o erro é constante nas medidas, por causa de uma falha no procedimento estabelecido ou de um defeito no instrumento de medida. O intervalo de confiança de um desvio padrão, que delimita uma faixa de valores na qual há 67% de chance de conter o valor real, é chamado de incerteza (TABACNIKS, 2009). Em uma medida, os algarismos utilizados para expressar uma grandeza são chamados de algarismos significativos, desconsiderado-se os zeros à esquerda do primeiro algarismo diferente de zero. Pela convenção de Vuolo (1992), a incerteza deve ser expressa com dois algarismos significativos, se o seu primeiro dígito for menor que 3 e com um ou dois algarismos, se o seu primeiro dígito for maior ou igual a 3. O número de algarismos usados deve ser limitado pela incerteza (TABACNIKS, 2009). 19 A fim de minimizar os erros aleatórios, faz-se um conjunto de medições, que representa uma amostra estatística. Algumas das quantidades usadas no tratamento estatístico são: m = 1 n∑i xi (6) s = √ 1 n−1 ∑ i (xi−m) 2 (7) sm = √ 1 (n−1)n ∑ i (x i−m) 2 = s √n (8) onde n é o número de valores da amostra, m é o valor médio, xi é um valor específico, s é o desvio padrão da amostra e sm é o desvio padrão da média (TABACNIKS, 2009). 2.4.2 Propagação de incertezas Cada medida tem uma incerteza associada ao instrumento de medida utilizado. No entanto, se uma grandeza é aferida por meio de uma relação matemática, é necessário calcular a chamada propagação das incertezas individuais (de cada variável). Seja, por exemplo, uma função w = f(x), e o intervalo de incerteza associada a x, σx (Figura 8). O elemento da curva associado a σx tem um comprimento m, e uma inclinação igual a senθ cosθ = ∂w ∂ x , (9) onde θ é o ângulo entre m e σx. Multiplicando os dois lados por m e cos θ, se obtém σ y =|∂w ∂ x |σ x . (10) Para mais de uma variável, σy será a soma pitagórica da quantidade |∂w /∂ xi|σ x i , sendo i o índice da variável (TABACNIKS, 2009). 20 Figura 8. Ilustração de uma propagação de incerteza. Fonte: Tabacniks (2009). 3 MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 Amostras A Tabela 1 expõe as amostras usadas e os ensaios feitos com cada uma. As amostras do aço F138 e do Ti-cp (grau 2) são da forma de barras cilíndricas, de seção transversal circular. O diâmetro médio das amostras foram tomados com 5 medidas, feitas com um paquímetro de incerteza 0,05 mm. Aqui não foi dada importância para o comprimento das amostras, por que para as medidas importa apenas o comprimento usado no aparato experimental, que é regulável. As amostras das ligas de titânio são na forma de pastilhas quadradas, para o sistema Ti-Mo-Nb, e irregulares, para as ligas Ti6Al4V e o sistema Ti-Mo- Zr. Além disso, as amostras desses dois sistemas citados foram: Ti10MoXZr, X = 30, 40 e 50 e Ti5MoXNb, X = 10, 20 e 30 (%p) Tabela 1. Ensaio realizado Amostra Diâmetro (± 0,05 mm) Comprimento (± 0,05 mm) Módulo E Módulo G OCP x COF F138 3,0 3,03 73,65 x x F138 3,5 3,58 73,50 x x Ti-cp 3,18 54,45 x Ti6Al4V - - x Ti10MoXZr - - x Ti5MoXNb - - x Amostras e ensaios realizados. 21 3.2 Flexômetro quase-estático O sistema de ensaio e a técnica utilizada para a medição do módulo E foram desenvolvidos por Pintão e Cardoso (2017). Basicamente, trata-se de um aparato de flexão de uma extremidade fixa e outra livre. A amostra é flexionada lentamente, e é registrada a força versus deslocamento. Através da inclinação da reta, no regime linear, obtém-se o módulo E. A Figura 9 mostra uma imagem do sistema, que é chamado aqui de flexômetro quase- estático, ou simplesmente flexômetro. A chave elétrica (5) aciona o motor (4) que move a mesa coordenada xy em direção ao sensor de força (2). Conectado por meio de polias, o sensor de rotação (SR) (3) registra o deslocamento angular. Na extremidade da mesa coordenada é preso um cilindro, que serve como suporte para a amostra. Desse modo, o conjunto mesa-suporte-amostra é movido pelo motor e a amostra entra em contato com o sensor de força (SF) (1), sendo flexionada. A mesa xy também permite o movimento na direção perpendicular ao SR, o que define o comprimento da amostra que será flexionado. Através de uma interface de monitoramento, os dados são registrados e é obtido um gráfico da força (N) em função do deslocamento angular (rad), que é uma reta, em pequenas deflexões. Figura 9. Flexômetro (a): 1 – sensor de força; 2 – mesa coordenada xy; 3 – sensor de rotação; 4 – motor síncrono; 5 – chave elétrica. Ampliação (b): 1 – cilindro-suporte; 2 – amostra. Fonte: Próprio autor. Neste sistema físico, a amostra tem duas energias envolvidas: a cinética (K) e a interna (U). Pelo princípio da conservação da energia, o trabalho da força de flexão (W), mais o calor deve ser igual a variação da energia total da amostra (ΔE). No entanto, não há calor 22 considerável, e a amostra é movida lentamente contra o SF, de maneira que o processo de flexão pode ser considerado quase-estático. Assim, todo o trabalho realizado pelo sensor de força é absorvido pelo material na forma de deformação elástica: ΔU = W (11) Em seu artigo, Pintão e Cardoso (2017) demostram por meio desta igualdade que a força em relação à deflexão é F = 3π 32 E D4 L3 Δ L = B ' ΔL (12) para uma seção transversal circular, onde F é a força medida no SF, E é o módulo E da amostra, D o seu diâmetro, L o seu comprimento e ΔL a deflexão sofrida. B ' = 3π ED4 /32L3 é o coeficiente angular da reta obtida, se for graficada a relação F por ΔL. No experimento obtém-se um coeficiente angular B em N/rad. Entretanto, foi encontrado por (PINTÃO, 2017) que 1 rad registrado no SR equivale a 0,000160 m. Então o coeficiente angular é convertido em N/m: B’ = B/0,000160m. Com este coeficiente é calculado, por fim, o módulo de elasticidade da amostra ensaiada, pela expressão: E = 32 3π L3B ' D4 f , (13) sendo f um fator de calibração. Este fator é obtido medindo-se o módulo de elasticidade de uma amostra com valor conhecido: f = Eesperado/Emedido; tal parâmetro é usado como calibração para as medidas das amostras a serem estudadas. Para estabelecer os procedimentos experimentais, inicialmente foi traçada uma curva de B’ variando-se o comprimento L, com a amostra de Ti-cp, tendo o valor de E conhecido, medido por uma técnica comercial, o Sonelastic®. Esta curva foi usada como uma calibração para as medidas das amostras de F138. Todas as amostras foram ensaiadas a partir de 5,50 mm de comprimento de flexão, aumentando-o com passos de 2,00 mm, pela mesa coordenada. Foi tomada a média de 3 medidas por amostra, para cada comprimento. 23 3.3 Pêndulo de torção O aparato de medida para o módulo de torção foi desenvolvido por Pintão, Corrêa e Grandini (2017). Em suma, é um pêndulo com massas e momento de inércia conhecidos, ligados a uma extremidade da amostra, sendo a outra fixa. É dado um deslocamento ao pêndulo, que torce a amostra e depois oscila com amortecimento até parar. Pela geometria da amostra e frequência de oscilação é tirado o módulo G. A Figura 10 mostra o sistema de medida. A amostra é fixada na placa de torno, que por sua vez está na base. A base pode ser movida na vertical de modo a regular o comprimento a ser torcido. A outra extremidade da amostra vai no cilindro de torção, que está no eixo central dos braços do pêndulo. O SR registra a oscilação do pêndulo em função do tempo. Figura 10. Pêndulo de torção (a): 1 – braços e massas do pêndulo; 2 - sensor de rotação; 3 – base. Ampliação (b): 1- cilindro de torção; 2 – amostra; 3 – placa de torno. Fonte: Próprio autor. Foi encontrado por Pintão, Corrêa e Grandini (2017) que o módulo de torção está relacionado à frequência angular, pela expressão: G = 32 L πD 4 I ω 2 (1− δ 2 4 π 2 ) (14) 24 onde ω é a frequência angular registrada pelo SR e δ é um parâmetro chamado fator de atrito, que está associado ao atrito interno total do sistema amostra-aparato QT −1 = δ 2π . Para obter-se ω e δ , é feito uma ajuste da curva registrada pelo SR com a expressão (PINTÃO, 2017): ϕ = A exp( −t t 0 )sen( π W t− π tC W ) , (15) no qual W e TC são parâmetros do ajuste, e permitem obter a frequência de oscilação e o fator de atrito: ω= 2 π 2W e δ= 2W t 0 . Com os valores de ω e δ , e com a Equação 14 o módulo G é determinado. Como procedimento experimental para a caracterização do módulo G das amostras, foram feitas medidas variando-se o comprimento. Foram 7 comprimentos ao todo, com 3 medidas por amostra para cada comprimento. Além disso, foram usadas 4 configurações de momento de inércia no pêndulo (ver Figuras 17-20). Isso foi feito utilizando-se diferentes massas nos braços do pêndulo, mas sempre massas iguais nos dois braços. O valor de momento de inércia já havia sido determinado anteriormente para as quatro configurações por (PIEDADE, 2019). 3.4 Sistema de tribocorossão Para os experimentos de tribocorrosão, utilizou-se um tribômetro rotativo unidirecional e uma célula eletroquímica (Figura 10). A relação de polias (1) determina a velocidade angular, que foi fixada a 2 rad/s, medida pelo sensor de movimento rotativo (SR) (2). A base (3) é acoplada às polias, na qual se fixa o suporte (4) da célula eletroquímica (CEQ), com três parafusos. Com os mesmos parafusos, também é usado um fixador (5), que presos com porcas, pressionam a célula a fim de garantir o contado entre a amostra e um eletrodo de cobre, que é ligado a um multímetro. Por meio deste e do eletrodo de referência é possível medir o OCP da amostra. A célula é fixada por dois pinos no interior do suporte, para que não venha ser impedida de rotacionar, por atrito estático. Por fim, há um suporte (6) para 25 o eletrodo de referência capaz de receber também outros medidores, como termômetros, termostatos e medidores de Ph. A Figura 12 mostra a vista superior do aparato. Há uma mesa coordenada xy (1) que permite movimentar o braço, o qual recebe o suporte da esfera que opera o desgaste. Tal esfera recebe uma força peso dada por massas conhecidas (3), de modo que a carga total aplicada no ensaio seja o peso das massas, somado ao peso do suporte e da esfera. Ao rotacionar, surge então no contato esfera-amostra, uma força de atrito dinâmico que desgasta a superfície da amostra, formando uma trilha circular de desgaste. Pela terceira lei de Newton, o material ensaiado empurra a esfera, que desloca o braço de comprimento a, o qual é ligado ao braço de comprimento b, que encosta no sensor de força (2), permitindo inferir qual seja a força de atrito, e por consequência, o coeficiente de atrito dinâmico (COF). A Figura 13 ilustra o esquema de forças atuantes no sistema. Figura 11. Imagem do aparato do experimental: 1 - Polias; 2 - Sensor de movimento rotativo; 3 - Base para o suporte da CEQ; 4 - Suporte; 5 - Fixador; 6 - Suporte para eletrodo de referência e termômetro. Fonte: Próprio autor. 26 Figura 12. Foto da vista superior do aparato de medida. Fonte: Próprio autor. Figura 13. Esquema do sistema físico para a determinação do COF. Fonte: Próprio autor. Segundo o diagrama de forças, considere-se que o ponto O’ apenas liga o braço de comprimento a ao de comprimento b, somente em torno do ponto O há rotação. O torque produzido pela força de atrito é τat = f at d senθ = f at d a d = f at a = μ N a (16) 27 que é exatamente o valor do torque produzido pela força do sensor, porquanto o sistema se encontra em equilíbrio estático, e desse modo, pela igualdade entre os torques é possível calcular o COF: μN a = f sb ⇒ μ = f s N b a (17) A Figura 14 fornece a vista superior da CEQ. A amostra (4) é colocada dentro da célula e é feita a vedação de sua extremidade com silicone (5). O tubo (2) sustenta o receptáculo metálico da esfera de desgaste. O mesmo é esmaltado para não interferir no eletrólito. O eletrodo de referência é posto em contato com o eletrólito e é ligado a um multímetro digital. A amostra é posta sobre um eletrodo de cobre na célula, que também é conectado ao multímetro. Figura 14. Foto da CEQ: 1 - Eletrodo de referência; 2 - Tudo de fibra de carbono; 3 - Receptáculo metálico esmaltado da esfera de desgaste; 4 - amostra; 5 - Silicone para vedação. Fonte: Próprio autor. Figura 15. Fotos das CEQs: a - nylon; b - acrílico; c - nylon. Fonte: Próprio autor. 28 As células usadas nos ensaios são mostradas na Figura 15. Inicialmente os ensaios foram feito com a célula fixada por parafusos vedados (a) e (b), mas havia vazamentos. Logo os furos foram preenchidos com resina acrílica autopolimerizável, e as células passaram a ser fixadas por pinos e por um fixador (Figura 14). Por fim, foi confeccionada outra célula, como forma final, sem furos (c). O procedimento7 adotado para ensaios de tribocorossão consistiu em: preparar a amostra no dia anterior à medida, fazendo-se o lixamento e o polimento do material. O lixamento foi feito em um sentido arbitrário e depois a 90° do mesmo, para cada granulação utilizada, até #1200. O polimento foi efetuado com alumina em suspensão de 0,3 μm; após o polimento, limpar a amostra no ultrassom com água deionizada; em torno de 24h depois, inserir a amostra na CEQ, vedando sua extremidade com silicone; colocar a CEQ no suporte e fixá-la com o fixador; Fixar o braço para o desgaste, inserindo as massas desejadas, deixando a esfera desencostada da amostra, no início; inserir o eletrodo de referência e conectá-lo ao multímetro; inserir o eletrólito; esperar a estabilização do OCP; abaixar o suporte da esfera, deixando-a em contato com a amostra e iniciar a rotação do tribômetro, operando o desgaste por 30 minutos; parar a rotação e desencostar a esfera da amostra; esperar a estabilização do potencial novamente, durante o tempo de repassivação. Os ensaios foram feitos em duas configurações experimentais: configuração 1 (C1) - esfera de alumina de diâmetro 10 mm, com 2,50 N de carga aplicada; configuração 2 (C2) - esfera de alumina de 6 mm de diâmetro e carga de 1,55 N. Nas duas configurações o eletrólito utilizado foi saliva artificial e o eletrodo de referência Ag/AgCl, 3M NaCl. Foram ensaiadas as amostras de Ti-cp e Ti6Al4V (%p) nas duas configurações e as amostras de Ti-Mo-Zr, Ti- Mo-Nb, (%p) apenas na C2. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Módulo de tração Para obter o módulo E, a ideia inicial foi de graficar uma curva de f em função do comprimento de flexão, L, como uma calibração (Figura 16) para as medidas do aço F138, no sentido de medir o módulo E e multiplicar pelo fator de calibração f da curva. No entanto, esta ideia não se mostrou válida. Os valores foram próximos entre si, com uma média de 151 GPa, bem abaixo do valor esperado (em torno de 190 GPa). Assim foram testadas várias hipóteses: 7 O procedimento de ensaio pode ser visualizado no endereço . https://bit.ly/335Dz74 29 de que o volume deformado deveria ser igual, ou que a energia de deformação deveria ser a mesma, para se usar o mesmo f, porém nenhumas das hipóteses funcionou. Na Tabela 2, os resultados são mostrados. Os subescritos 3 e 3,5 em E e f se referem ao diâmetro da amostra. O fator de calibração do aço F138 foi tomado com um valor médio da literatura, de 200 GPa. Assim, f foi calculado como f =200GPa /Emedido. Isso foi feito para saber qual deve ser aproximadamente o fator de calibração correto para as amostras de aço. Outra hipótese chamou atenção: que o fator f talvez não dependa apenas do diâmetro e comprimento, mas também da rigidez do material. Investigando isso, foi construída a Tabela 3. Para as amostras de aço, temos o mesmo comprimento e o mesmo material, mas com diâmetros diferentes. A razão f3,5/f3 mostra que o f da amostra com 3,50 mm de diâmetro é cerca de 2 vezes maior que o f da amostra de 3,0 mm. Como o material é o mesmo, o f das amostras deve variar somente com o diâmetro. Foi calculado um fator d, mostrado na tabela, em relação ao diâmetro das amostras comparadas. Por exemplo, d1 na tabela é d1=( 3,583,03 ) 4 = 1,95, próximo de f3,5/f3.; a quarta potência foi escolhida por que a dependência do módulo de tração com o diâmetro (ver Equação 13) é também da sua quarta potência. Ao comparar agora as amostras de aço com a de titânio, o valor de f deve variar com o diâmetro e também com a rigidez do material. De fato, ao olhar para a razão f2/f1 e considerar a diferença entre os diâmetros, dividindo (por hipótese) pelo fator d, ainda resta uma diferença. Então, por hipótese, f = f(L,D,B). A dependência com o comprimento é desprezada, por que todas as amostras foram ensaiadas com os mesmos comprimentos (Tabela 3). O coeficiente angular B foi usado nesta hipótese pois é a única variável relacionada à rigidez do material na Equação 13. Com isso fez-se o seguinte raciocínio: se o f depende do material, a única informação que se pode usar, que está relacionada à rigidez da amostra é o coeficiente angular B obtido no experimento. Então chegou-se por testes a um fator b que pode expressar a dependência de f com a rigidez do material, inserido na tabela. Os valores b1, b2, e b3 se referem, respectivamente, à comparação entre as amostras de aço-3,5 e aço-3,0; aço-3,0 e Ti-cp; aço- 3,5 e Ti-cp. Os fatores b são próximos às razões de f, levando em conta a diferença de diâmetro. 30 Figura 16. Curva de calibração com a amostra de Ti-cp. Tabela 2. L (mm) BTi-cp (N/rad) B3,0 (N/rad) B3,5 (N/rad) fTi E3 (GPa) f3 E3,5 (GPa) f3,5 5,50 112,50 123,67 129,33 27,1 5,36 37,33 2,76 72,4 7,50 104,33 119,00 117,33 11,5 13,1 15,30 6,35 31,5 9,50 97,53 112,67 110,33 6,07 25,2 7,95 12,1 16,5 11,50 93,35 106,67 109,00 3,57 42,2 4,74 21,3 9,40 13,50 89,40 103,33 102,50 2,31 66,2 3,02 32,4 6,18 15,50 84,93 97,40 96,63 1,60 94,4 2,12 46,2 4,33 17,50 77,37 88,63 91,50 1,22 124 1,62 63,0 3,18 19,50 69,83 80,60 85,80 0,98 156 1,29 81,7 2,45 21,50 63,167 71,97 80,00 0,81 186 1,07 102 1,96 23,50 57,267 - - 0,68 - - - - 25,50 50,93 - - 0,60 - - - - 27,50 42,600 - - 0,57 - - - - 29,50 36,067 - - 0,55 - - - - Coeficiente angular, fatores de calibração e módulos de elasticidade. 31 Tabela 3. L (mm) f3,5/f3 f3/fTi f3,5/fTi f 3,5 / f 3 d1 f 3 / f Ti d2 f 3,5 / f Ti d3 b1 b2 b3 5,50 2,02 1,38 2,67 1,04 1,67 1,66 1,20 1,46 1,66 7,50 2,14 1,33 2,73 1,10 1,61 1,70 0,95 1,69 1,70 9,50 2,16 1,31 2,71 1,11 1,59 1,69 0,92 1,78 1,69 11,50 2,07 1,32 2,63 1,06 1,61 1,64 1,09 1,70 1,64 13,50 2,13 1,31 2,68 1,09 1,59 1,67 0,97 1,78 1,67 15,50 2,13 1,32 2,70 1,09 1,60 1,68 0,97 1,73 1,68 17,50 2,05 1,32 2,60 1,05 1,60 1,62 1,14 1,72 1,62 19,50 1,97 1,31 2,50 1,01 1,59 1,56 1,28 1,77 1,56 21,50 1,90 1,33 2,42 0,976 1,61 1,51 1,53 1,69 1,51 Média 2,06 1,33 2,63 1,06 1,61 1,63 1,11 1,70 1,63 d=( D2 D1 ) 4 b=( B2 B1 ) 4d1 d2 d3 1.95 0.824 1.61 Fatores de calibração e fatores d e b. Aparentemente, os fatores d e b expressam a dependência do fator de calibração com o diâmetro e com a rigidez do material, respectivamente. Portanto, foi proposta uma relação para se achar o fator de calibração de um material, em relação ao fator de outro: f 2= ( D2 D1 ) 4 ( B2 B1 ) 4 f 1 , (18) Para calcular o módulo E de uma amostra, com base em uma curva de calibração, pode-se fazer a razão E2 E1 = ( L2 L1 ) 3 ( D1 D2 ) 4 B2 B1 f 2 f 1 =( D1 D2 ) 4 B2 B1 f 2 f 1 e usando a Equação 18, obter E2 E1 = ( D1 D2 ) 4 B2 B1 ( D2 D1 ) 4 ( B2 B1 ) 4 f 1 f 1 = ( B2 B1 ) 5 ⇒ 32 ⇒ E2= ( B2 B1 ) 5 E1 . (19) Com esta nova expressão, foram calculados os módulos das amostras de aço, como mostra a Tabela 4. Os números em vermelho destacam valores que desviaram muito entre os demais. Esta tabela fornece os valores médios de 204(15) GPa, para a amostra de 3,0 mm, e 204(15) GPa para a amostra de 3,5 mm, desconsiderando os valores em vermelho. Tais módulos estão um pouco acima do valor esperado segundo o datasheet MATWEB, porém dentro da faixa de 190-210 GPa. Note-se que os valores dos desvios 14 e 15 GPa são consideravelmente altos. Isso provavelmente se deve por que a Equação 19 depende da quinta potência dos coeficientes angulares, de maneira que uma pequena variação nos mesmos implica em uma grande variação nas medidas. Portanto, este método requer experimento com alto grau de precisão, para se minimizar o desvio. Tabela 4. L (mm) E3,0 (GPa) E3,5 (GPa) 5.50 168 210 7.50 202 188 9.50 215 194 11.50 204 227 13.50 216 207 15.50 208 200 17.50 206 242 19.50 214 293 21.50 201 341 Módulo E com a Equação 19. 4.2 Módulo de torção Os gráficos abaixo (Figuras 17 e 18) mostram como a frequência de oscilação varia com o momento de inércia e comprimento usados. A frequência foi determinada como ω 2π . Quanto maior o comprimento e também maior o momento de inércia, menos frequentemente o pêndulo oscila. Os experimentos do módulo de torção mostram que o valor de G depende do comprimento da amostra, mas independe do momento de inércia utilizado (Figuras 19 e 20). Para uma amostra de titânio puro, Pintão, Corrêa e Grandini (2017), nesse mesmo sistema de 33 medida, variando o comprimento, encontraram uma região na qual o valor de G de diferentes comprimentos convergiu e correspondeu com o valor da literatura. A Figura 19 mostra que os comprimentos 40,40, 46,20, 55,00, e 61,40 mm deram valores de G próximos. Tomando-se a média desses valores, com o seu desvio padrão, obtém-se o valor de 68(4) GPa. A Figura 20, por sua vez, mostra que os valores ficaram mais dispersos, sendo a curva de 25,30 mm mais afastada das demais. Tomando-se a média a partir da curva de 31,80 mm, juntamente com o seu desvio, afere-se o valor de 65(8) GPa. Esses dois resultados foram um pouco abaixo do valor esperado para aços do grupo AISI 316L (em torno 80 GPa), porém foram próximos do valor de 70,3 GPa do datasheet MATWEB. Portanto, pode-se dizer que as medidas são razoáveis, comparadas com a literatura. Figura 17. Frequência versus momento de inércia, aço-3,0. Figura 18. Frequência versus momento de inércia, aço-3,5. 34 Figura 19. Módulo de torção por momento de inércia, aço-3,0. Figura 20. Módulo de torção por momento de inércia, aço-3,5. 4.3 Ensaios de tribocorrosão Inicialmente, foram realizados os ensaios para o Ti6Al4V e o Ti-cp. A Figura 21 mostra a forma do resultado obtido pelo ensaio, tendo o OCP e COF monitorados em função do tempo. As demais figuras (22-25) expõem as comparações entre os OCPs e os COFs dos experimentos realizados. É possível ver o fenômeno da tribocorrosão na Figura 21: inicialmente há um potencial constante, próximo do eletrodo de referência, indicando a passividade do material. Quando se inicia a fricção, o OCP decresce abruptamente, por que há o rompimento do filme passivo. Nesse momento cria-se um contato galvânico entre a área desgastada e a não desgastada e a amostra começa a corroer. Depois do tempo de fricção, o OCP passa a se reestabilizar, o que indica o fenômeno da repassivação (LÓPEZ-ORTEGA, 2018; SAMPAIO, 2015). 35 A fim de realizar a validação do sistema de medida, foram considerados dois fatores: a coerência dos resultados com a literatura e a reprodutibilidade das medidas. Os gráficos das Figuras 22 e 23 mostram que o sistema permite medidas reprodutíveis. A diferença no diâmetro da esfera e na carga aplicada alterou levemente os valores de OCP no deslizamento e os valores de COF; por certo, a pressão exercida na amostra influencia no OCP no atrito (BUCIUMEANU, 2016), mas ainda assim os resultados foram consistentes, o que evidencia a reprodutibilidade das medidas. Sampaio e colaboradores (2015) encontraram uma estabilização de OCP em torno de - 0,43 e um OCP de desgaste próximo8 de -1,01 V para a liga Ti6Al4V, em saliva artificial a 37 °C, com uma esfera de alumina de 10 mm e uma carga aplicada de 30 N. O OCP estabilizado para o Ti6Al4V na C2 é por volta de -0,37 V, e no atrito cerca de -0,77 V, que são valores um menores. Entretanto, um menor valor de OCP no atrito condiz com o fato da carga aplicada ser menor. O resultado do COF médio, por sua vez, foi próximo: 0,39 em comparação com 0.36 (SAMPAIO, 2015). Buciumenau e colaboradores (2016) encontraram -0,28 V de OCP de estabilização e -0,75 V no atrito e um COF médio próximo de 0,36, o que reforça os resultados anteriores. Seus parâmetros foram: esfera de alumina de 10 mm de diâmetro, carga de 1 N e saliva artificial a 37 °C. As diferenças no OCP inicial se devem principalmente a diferenças no tempo de espera da sua estabilização e a diferenças de temperatura. As Figuras 24 e 25 mostram os resultados dos sistemas Ti-Mo-Zr e Ti-Mo-Nb. Neste primeiro, nota-se que o zircônio aumentou consideravelmente o OCP inicial, deixando-o mais próximo da referência, o que indica uma superfície menos reativa. Entretanto, a liga de 40Zr é a que teve o maior OCP no deslizamento, sendo mais nobre que as outras duas. Além disso, de 30 para 40Zr houve uma diminuição no COF mas de 40 para 50Zr o COF foi próximo. A presença de nióbio no sistema Ti-Mo-Nb melhorou a resistência à corrosão, por aumentar o OCP no deslizamento, mas, por outro lado, intensificou também o COF, fazendo a liga mais suscetível ao desgaste. As ligas Ti10Mo40Zr e Ti5Mo10Nb são relativamente comparadas à liga Ti6Al4V em seu comportamento tribocorrosivo. Assim, análises de outras propriedades como dureza, módulo de elasticidade, citotoxicidade etc. podem fazer um balanço e dizer qual material pode ser mais vantajoso em uma dada aplicação biomédica. 8 Os valores citados são uma conversão dos originais, medidos com o eletrodo de referência SCE, para o eletrodo usado neste trabalho. 36 Figura 21. À esquerda, ensaio da liga Ti6Al4V, à direita, ensaio do Ti-cp. Figura 22. Comparativo entre entre as configurações C1 (preto) e C2 (vermelho) para a liga Ti6Al4V. Figura 23. Comparativo entre entre as configurações C1 (preto) e C2 (vermelho) para o Ti-cp. 37 Figura 24. Comparativo das ligas Ti10MoXZr. Figura 25. Comparativo das lgas Ti5MoXNb. 5 CONCLUSÃO Neste trabalho conseguiu-se uma boa hipótese para o problema de medir o módulo E com amostras de materiais e diâmetros diferentes, com valores coerentes e próximos aos da literatura. No entanto, é preciso investigar mais para confirmar a hipótese com novas medidas e ensaios de outros materiais, e também buscar um método de padronização, a fim de aperfeiçoar o processo de medição. Isso é conveniente para se ter maior exatidão e confiabilidade no método. Nos ensaios de módulo de torção, também chegou-se a valores coerentes com a literatura (70,3 GPa), mas com alta dispersão dos valores de diferentes comprimentos de torção. É necessário realizar mais testes com amostras de aço maiores, para definir melhor qual é a região de comprimento na qual os valores de G convergem. A respeito dessas duas técnicas de caracterização de elasticidade, concluiu-se que são técnicas de baixo custo e funcionais. Precisam ser melhoradas no sentido de praticidade e confiabilidade, com 38 novos ensaios, comparando com a literatura. Assim sendo, esses sistemas de medida podem ser uma boa opção para a caracterização de novos biomateriais. Por outro lado, nos ensaios de tribocorrsão, se evidenciou a validação do sistema de medida e método experimental utilizados, por meio das amostras de Ti6Al4V e Ti-cp. Além disso, foi possível realizar uma caracterização comparativa para as ligas de Ti10MoXZr e Ti5MoXNb, apresentando a interpretação básica do ensaio de OCP versus COF. 39 REFERÊNCIAS PIRES, A. L. R., BIERHALZ, A. C. K., MORAES, A. M. Biomaterials: Types, applications, and market. Quimica Nova, v. 38, n. 7, p. 957–971, 2015. 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