UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CAMPUS DE BOTUCATU HERBIVORIA POR Atta sexdens rubropilosa Forel, 1908 SOBRE ESPÉCIES ARBÓREAS EM RESTAURAÇÃO FLORESTAL BEATRIZ ZIDIOTI FERREIRA Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP – Campus de Botucatu, para obtenção do título de Mestre em Ciência Florestal. BOTUCATU - SP Janeiro/2015 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CAMPUS DE BOTUCATU HERBIVORIA POR Atta sexdens rubropilosa Forel, 1908 SOBRE ESPÉCIES ARBÓREAS EM RESTAURAÇÃO FLORESTAL BEATRIZ ZIDIOTI FERREIRA Orientadora: Profa. Dra. Giselda Durigan Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP – Campus de Botucatu, para obtenção do título de Mestre em Ciência Florestal. BOTUCATU - SP Janeiro/2015 FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO TÉCNICA DE AQUISIÇÃO E TRATAMENTO DA INFORMAÇÃO – SERVIÇO TÉCNICO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - UNESP – FCA – LAGEADO- BOTUCATU (SP) Ferreira, Beatriz Zidioti, 1990- F383h Herbivoria por Atta sexdens rubropilosa Forel, 1908 sobre espécies arbóreas em restauração florestal / Beatriz Zidioti Ferreira. – Botucatu : [s.n.], 2015 x, 54 f. : ils. color., grafs.,tabs. Dissertação(mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Agronômicas, Botucatu, 2015 Orientador: Giselda Durigan Inclui bibliografia 1. Formiga - cortadeira. 2. Ecologia florestal. 3.Res- tauração ecológica. 4. Ecossistemas – Restauração. I. Du- rigan, Giselda. II. Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Campus de Botucatu).Faculdade de Ciên- cias Agronômicas de Botucatu. III. Título. III “E nunca me senti tão profundo e ao mesmo tempo, tão alheio de mim e tão presente no mundo.” Albert Camus IV AGRADECIMENTOS À Profa. Dra. Giselda Durigan, pela orientação e oportunidade de desenvolver essa pesquisa, e junto, a paciência e dedicação de ensinar ciência. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, pelo financiamento do Projeto de Pesquisa (CNPq nº 561771-2010-3): Manejar é preciso: experimentação de técnicas de manejo adaptativo para retificar a trajetória sucessional de ecossistemas em restauração. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior (CAPES) pela bolsa de estudos. À Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo, que emitiu autorização para a realização de todas as intervenções de manejo que foram necessárias para a realização desta pesquisa (Ofício SMA/CBRN/DPB nº 002/2011). À Sra. Maria Amélia de Souza Dias, proprietária da Fazenda Canaçu, que autorizou a instalação do experimento. A Edson Damasceno, Nelson Keki, Natashi A. L. Pilon, Éliton Rodrigo da Silveira, pela ajuda na instalação do experimento e coleta de dados, especialmente a Edison Adriano Berto, que esteve presente em todas as avaliações. Aos conselheiros de redação científica e estatística: Jéssica Margon Garcia, Geissianny Bessão de Assis, Márcio Seiji Suganuma, Mário Guilherme de B. Cava, Antônio Melo e Eliane Honda. À minha mãe, Edislene Zidioti Ferreira, e irmã, Ana Caroline Z F Aredes, pelo apoio e confiança nas minhas escolhas. Ao meu cunhado Everton Lima Aredes, que sempre incentivou meus planos. Aos meus tios Edson Zidioti, Marlene Maria Zidioti e meus primos Rafael Zidioti e Thayná Zidioti, que me ajudaram em todas as minhas mudanças pelo Brasil, com caronas ou com quitutes. V Aos amigos Camila Vaz de Souza, Samuel Thomas da Silva e Nilson Carnietto, que fizeram minha estadia em Botucatu uma grande mudança na minha vida. Aos amigos/parentes Emerson Lima Aredes e Natália Del’Angelo Aredes, pelos conselhos científicos e momentos de descontração. Muito Obrigada! VI SUMÁRIO Página AGRADECIMENTOS .................................................................................................. IV LISTA DE FIGURAS ................................................................................................ VIII LISTA DE TABELAS..................................................................................................... X RESUMO .........................................................................................................................1 SUMMARY ......................................................................................................................3 INTRODUÇÃO ................................................................................................................5 Objetivo ....................................................................................................................... 13 Referências bibliográficas............................................................................................. 14 CAPÍTULO 1 ................................................................................................................. 18 HERBIVORIA SELETIVA POR Atta sexdens rubropilosa Forel, 1908 PODE REDUZIR A DIVERSIDADE DE FLORESTA RIPÁRIA EM RESTAURAÇÃO .... 18 1.1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 18 1.2 MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................... 19 1.2.1 Área de estudo ..................................................................................................... 19 1.2.2 Desenho experimental .......................................................................................... 20 1.2.3 Instalação do experimento.................................................................................... 21 1.2.4 Coleta de dados.................................................................................................... 24 1.2.5 Análise dos dados ................................................................................................ 24 1.2.5.1 Número médio de ataques por espécie ........................................................... 24 1.2.5.2 Herbivoria por grupo funcional...................................................................... 25 1.2.5.3 Curvas de sobrevivência das espécies ............................................................ 25 1.2.5.4 Número de ataques que levam um individuo à morte ..................................... 25 1.2.5.5 Densidade relativa das espécies na comunidade ............................................. 25 1.2.5.6 Diversidade da comunidade ao longo do tempo ............................................. 26 1.3 RESULTADOS ........................................................................................................ 26 1.3.1 Herbivoria seletiva por espécie e por grupo funcional .......................................... 26 1.3.2 Sobrevivência das espécies ao longo do tempo..................................................... 29 1.3.3 Número de ataques que levam um indivíduo à morte ........................................... 30 1.3.4 Densidade relativa das espécies na comunidade ................................................... 32 1.3.5 Variação na diversidade da comunidade ao longo do tempo ................................. 33 1.4 DISCUSSÃO............................................................................................................. 34 VII 1.5 CONCLUSÃO .......................................................................................................... 38 1.6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 38 CAPÍTULO 2 ................................................................................................................. 43 ACLIMATAÇÃO E TAMANHO DE MUDAS NÃO INFLUENCIAM A FREQUÊNCIA DE HERBIVORIA SOBRE MUDAS DE ESPÉCIES ARBÓREAS . 43 2.1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 43 2.2 MATERIAL E MÉTODOS ..................................................................................... 44 2.2.1 Área de estudo ..................................................................................................... 44 2.2.2 Desenho experimental .......................................................................................... 45 2.2.2.1 Aclimatação .................................................................................................. 45 2.2.2.2 Tamanho de mudas ........................................................................................ 46 2.2.3 Coleta de dados.................................................................................................... 46 2.2.3.1 Aclimatação .................................................................................................. 47 2.2.3.2 Tamanho de mudas e mortalidade .................................................................. 47 2.2.4 Análise de dados .................................................................................................. 47 2.2.4.1Análise comparativa da herbivoria entre mudas aclimatadas ou não................ 47 2.2.4.2 Tamanho das mudas e mortalidade ................................................................ 47 2.3 RESULTADOS ........................................................................................................ 48 2.3.2 Herbivoria sobre mudas aclimatadas e não aclimatadas ........................................ 48 2.3.1 Tamanho das mudas e mortalidade....................................................................... 49 2.4 DISCUSSÃO............................................................................................................. 49 2.5 CONCLUSÃO .......................................................................................................... 50 2.6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 51 IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA DA RESTAURAÇÃO ...................................... 53 VIII LISTA DE FIGURAS Figura 2: Localização da Fazenda Canaçu no município de Tarumã – SP (adaptado de Costa, 2008). .................................................................................................................... 20 Figura 3: Clareira na floresta ripária em restauração ao longo do córrego Tarumã (município de Tarumã, SP) onde foi instalado o experimento com o plantio de 400 mudas de espécies florestais nativas. (Foto: Beatriz Z. Ferreira). ................................................. 21 Figura 4: Número de ataques por formigas cortadeiras durante 12 meses, para um indivíduo de cada uma das 20 espécies arbóreas nativas em plantio de restauração de floresta ripária. Boxplot (mediana ± quartis). O resultado do Teste de Tukey é representado pelas letras minúsculas acima de cada caixa. Caixas encimadas pela mesma letra não diferem entre si (p > 0,05). ............................................................................................... 28 Figura 5: Número de ataques por formigas cortadeiras durante 12 meses, para um indivíduo, entre as duas categorias possíveis para cada um dos atributos funcionais de espécies arbóreas. Boxplot (mediana ± quartis). ............................................................... 29 Figura 6: Curvas de sobrevivência das mudas de espécies arbóreas expostas ao ataque de formigas cortadeiras ao longo de um ano em floresta ripária em restauração. (A) Parapiptadenia rigida, (B) Rollinia sylvatica, (C) Croton floribundus, (D) Cariniana estrellensis, (E) Mabea fistulifera, (F) Ceiba speciosa, (G) Gallesia integrifolia, (H) Aspidosperma cylindrocarpon. Espécies que não apresentaram indivíduos mortos não são apresentadas. .................................................................................................................... 30 Figura 7: Número de ataques por formigas cortadeiras necessários para levar à morte um indivíduo de cada uma de oito espécies arbóreas em plantio de floresta ripária. Boxplot (mediana ± quartis). O resultado do Teste de Tukey é representado pelas letras minúsculas acima de cada caixa. Caixas encimadas pela mesma letra não diferem entre si (p > 0,05). 31 Figura 8: Frequência do número de ataques que levam à morte uma muda de espécie arbórea, considerando-se o conjunto total de espécies analisadas. ..................................... 32 Figura 9: Variação do Índice de diversidade de Shannon-Wiener (H’) ao longo de 12 meses, para a comunidade de espécies arbóreas plantadas em floresta ripária em restauração e expostas ao ataque de formigas cortadeiras (Tarumã-SP). ........................... 34 Figura 10: Croqui da área experimental, com a disposição das parcelas de cada tratamento. Tratamento A: mudas aclimatadas e Tratamento B: mudas não aclimatadas. .. 45 IX Figura 11: Número de ataques por formigas cortadeiras por parcela (40 mudas), em mudas aclimatadas e não aclimatadas. Boxplot (mediana ± quartis), com base em observações realizadas em um período de 30 dias, em plantio de restauração de floresta ripária, Tarumã, SP. ................................................................................................................................... 48 X LISTA DE TABELAS Tabela 1: Espécies plantadas na área experimental para avaliação da herbivoria por formigas cortadeiras em plantio de restauração de floresta ripária, Tarumã, SP, categorizadas em grupos funcionais para diferentes atributos. .......................................... 23 Tabela 2: Tabela de Análise de Variância da comparação da mediana do número de ataques de herbivoria por formigas cortadeiras, por espécie. FV = fonte, GL = graus de liberdade, SQ = soma dos quadrados, QM = quadrado médio, F = valor do F de Fisher e p = valor de probabilidade do teste. ..................................................................................... 27 Tabela 3: Análise de Variância do número médio de ataques por formigas cortadeiras que leva à morte as mudas de diferentes espécies arbóreas em plantio de restauração de floresta ripária. FV = fonte, GL = graus de liberdade, SQ = soma dos quadrados, QM = quadrado médio, F = valor do F de Fisher e p = valor de probabilidade do teste............................... 31 1 HERBIVORIA SELETIVA POR Atta sexdens rubropilosa Forel, 1908 SOBRE ESPÉCIES ARBÓREAS EM RESTAURAÇÃO. Botucatu, 2014. 65p. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) - Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista. Autora: BEATRIZ ZIDIOTI FERREIRA Orientadora: GISELDA DURIGAN RESUMO Formigas cortadeiras são herbívoros que possuem grande potencial para modificar comunidades e ecossistemas em sucessão e por isso são considerados engenheiros do ecossistema. A maioria dos danos causados por formigas ocorre em folhas jovens, o que dificulta o estabelecimento e o desenvolvimento inicial das mudas plantadas, de modo que podem atrasar a recuperação da estrutura e da diversidade, no caso de plantios de restauração. O objetivo do presente estudo foi verificar se formigas cortadeiras podem atuar como filtro biótico a determinar a composição de espécies das comunidades vegetais, se podem levar à extinção algumas espécies ou se podem comprometer a estrutura das florestas restauradas. Para isto, instalamos experimento em plantio de restauração de floresta ripária realizado em 1990, no município de Tarumã, SP. O experimento baseou-se na simulação da entrada de espécies na floresta restaurada, por meio da introdução de mudas de 20 espécies arbóreas nativas da flora regional, representativas de diferentes guildas funcionais. Plantamos 20 indivíduos de cada espécie em uma clareira grande, com cerca de 500 m², circundada pela floresta já existente. A densidade de plantio foi definida com base na densidade em que plantas do porte das mudas ocorrem em florestas naturais da região. O desenvolvimento de cada muda plantada e os ataques por formigas foram registrados de dezembro de 2012 a dezembro de 2013. Foi analisada comparativamente a frequência de ataques de herbivoria por formigas entre as espécies arbóreas e investigamos possíveis padrões de resistência à herbivoria associados a atributos funcionais dessas espécies. Avaliamos também o efeito da herbivoria seletiva sobre a diversidade da comunidade em restauração. Do ponto de vista de manejo, investigamos se a frequência de ataques de herbivoria por formigas está associada à aclimatação e se a mortalidade está associada ao tamanho das mudas. As formigas 2 cortadeiras predaram de maneira diferenciada as espécies arbóreas nativas plantadas na floresta ripária em restauração, ocasionando mortalidade diferenciada e em ritmos distintos entre espécies, resultando em perda progressiva de diversidade ao longo do tempo. As análises não mostraram relação entre a mortalidade e o tamanho das mudas para nenhuma das espécies. Também não encontramos diferença na frequência de ataques por formigas cortadeiras entre mudas aclimatadas e não aclimatadas. As formigas cortadeiras, portanto, agem como engenheiras do ecossistema, modificando a abundância relativa das espécies e a diversidade da comunidade. No entanto, não existe um padrão funcional nem para espécies preferidas pelas formigas e nem para aquelas que foram pouco atacadas. Assim, embora seja possível recomendar para os plantios as espécies que sofrem baixa herbivoria, a indicação dependerá de experimentação para todas as espécies, já que não é possível generalizar o perfil funcional das espécies recomendadas. Por outro lado, é possível prever que, em situações onde formigas cortadeiras são abundantes, na ausência de medidas de controle haverá prejuízos para a diversidade da floresta em restauração. Palavras-chave: filtro ecológico, interações planta-animal, floresta ripária, floresta estacional semidecidual, engenheiros do ecossistema. 3 SELECTIVE HERBIVORY BY Atta sexdens rubropilosa Forel, 1908 ON TREE SPECIES IN FOREST RESTORATION. Botucatu, 2014. 65p. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) - Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista. Author: BEATRIZ ZIDIOTI FERREIRA Adviser: GISELDA DURIGAN SUMMARY Leaf-cutting ants are herbivores that have great potential to shape communities and ecosystems functioning and are therefore considered ecosystem engineers. Most damage caused by leaf-cutting ants occurs in young leaves, thus influencing seedlings establishment and development, possibly delaying the restoration processes. The aim of this study was to verify if leaf-cutting ants can act as a biotic filter determining species composition of communities undergoing restoration, and if they can lead to extinction some species or compromise the structure of restored forests. The study was conducted in a riparian forest undergoing restoration since 1990, at the municipality of Tarumã-SP. We simulated the arrival of forest species to the site being restored, by introducing 20 seedlings of tree species of the regional flora, representing different functional guilds. We planted 20 individuals of each species in a large gap, with about 500 m², surrounded by the existing forest. Planting density was defined based on the density in which plants the same size of the seedlings planted occur in the native forest in the study region. The development of each individual and herbivory by ants were recorded from December 2012 to December 2013. We compared the frequency of herbivory among species and investigated possible patterns of resistance to herbivory associated with functional attributes of the tree species. We also evaluated the effect of selective herbivory on the diversity of the community in restoration through time. From the management perspective, we investigated whether or not the frequency of herbivory by ants is associated with time after planting (acclimation), and if mortality rates depend on the size of the seedlings planted. The frequency of herbivory was different among the tree species planted, resulting in different rhythms and different mortality rates among species. As a consequence, a progressive loss of community diversity over time was observed. Leaf- cutting ants therefore act as ecosystem engineers, altering the relative abundance of species 4 and the tree community diversity. However, we did not find a functional pattern related to high or low herbivory. No relationship was found between mortality and size of seedlings for either species. The frequency of herbivory by leaf-cutting ants did not differ between acclimated and non-acclimated seedlings. So while it is possible to recommend for planting those species that suffer low herbivory, this recommendation depends on studying individual species, since it is not possible to generalize the functional guild of the less attacked species. On the other hand, we can predict that in situations where leaf-cutting ants are too abundant or control is inefficient, the diversity of the forest undergoing restoration will be impaired. Keywords: ecological filters, plant-animal interaction, riparian forest, semideciduous forest, ecosystem engineers. 5 INTRODUÇÃO A restauração florestal no Brasil teve início no século XIX, com o primeiro projeto de revegetação realizado no Rio de Janeiro, na Floresta da Tijuca, com o intuito de preservar os recursos hídricos. Na época, o conhecimento científico sobre a restauração era praticamente nulo e as práticas que foram aplicadas não se baseavam em teorias ecológicas e nem em experiências já existentes. Do aumento das atividades de mineração e da construção de hidrelétricas surgiu a necessidade de restaurar ambientes degradados em larga escala. A partir da segunda metade do século XX, projetos de restauração se multiplicaram (DURIGAN; ENGEL, 2012), destacando-se o plantio da Usina Ester (NOGUEIRA, 1997) e a extensa área reflorestada ao redor do reservatório da Itaipu Binacional (ITAIPU BINACIONAL, 2014). Com a intensificação da prática de restauração, começou a se desenvolver no país a Ecologia da Restauração como campo do conhecimento científico. Durigan; Engel (2012) avaliaram a progressão desse conhecimento e apontam os avanços, que são resultados de erros e acertos dos pioneiros na restauração em todo o mundo. Exemplos são os estudos florísticos e fitossociológicos, que permitiram maior conhecimento das espécies e de sua distribuição geográfica. Com a padronização de termos na ciência da restauração, os processos dos ecossistemas tornaram-se mais claros e tangíveis na hora de restaurar. Com o aperfeiçoamento das técnicas de restauração, novos campos de estudos foram surgindo e pesquisas mais aprofundadas abriram caminho para novas perguntas, que, por sua vez, motivam as pesquisas do presente. A prática da restauração também contribui para elucidar os processos da sucessão ecológica, que englobam a estrutura física (riqueza de espécies, 6 densidade, distribuição espacial) e funcional das comunidades (WALKER; WALKER; HOBBS, 2007). Porém, as áreas em restauração estão sempre suscetíveis a diversos distúrbios e podem sofrer mudanças em sua trajetória sucessional. As limitações no ambiente físico e/ou biótico, que operam em diferentes escalas temporais e espaciais, podem dificultar ou impedir o curso da regeneração dos ecossistemas, ou sucessão secundária, e essas limitações são os filtros ecológicos, que vão definir as regras de montagem das comunidades em restauração (HOBBS; NORTON, 2004; MENNINGER; PALMER, 2006). Os filtros representam fatores que atuam sobre os processos ecológicos, geralmente em determinado momento no processo de sucessão. Assim, a restauração pode ser considerada como um esforço contínuo de manipulação de filtros atuantes em cada etapa do desenvolvimento dos ecossistemas sendo restaurados, para se chegar à composição de espécies desejada para cada sítio. É importante entender o filtro chave que está agindo em cada situação para então determinar qual seria a melhor ação de restauração a ser utilizada (HOBBS E NORTON, 2004). Formigas cortadeiras são protagonistas de algumas das interações tróficas mais relevantes, especialmente em regiões tropicais, possivelmente atuando como filtros ecológicos ao longo da sucessão. Por meio do monitoramento das comunidades de formigas em áreas reabilitadas é possível avaliar os métodos empregados e a eficácia das técnicas de revegetação quanto à manutenção da diversidade local e, consequentemente, a autosustentabilidade dos ecossistemas restaurados (PEREIRA et al., 2007). Porém, se, por um lado, a presença de formigas pode ser indício de saúde do ecossistema, por outro lado algumas espécies de formigas, mais especificamente formigas cortadeiras, são vistas como um obstáculo a dificultar as ações de restauração (BIGGER; MARVIER, 1998). Assim, os estudos existentes relacionando formigas e restauração geralmente tratam desses insetos como algo a ser controlado. Para a maioria das pessoas, formigas cortadeiras são vistas como pragas, sendo desconsiderados os possíveis benefícios trazidos por elas ao ecossistema. Entre os benefícios atribuídos às formigas cortadeiras, estudos mencionam que elas interagem com a biota local, alteram a bioquímica do solo e tornam o solo menos denso, facilitando a proliferação de raízes e melhorando as relações hídricas solo-planta (MOUTINHO, 2006). O papel das formigas como obstáculo a ser superado nas etapas iniciais da restauração ecológica tem sido mencionado com relativa frequência na 7 literatura, com abordagem geralmente técnica, em busca de opções para o controle. As práticas mais difundidas entre os agricultores e a maioria das pesquisas desenvolvidas sobre formigas cortadeiras trata de controle químico (DELLA LUCIA; ARAÚJO, 2000). Para entender a atuação das formigas cortadeiras em plantios de restauração e seu papel ao longo da evolução desses plantios é preciso compreender, inicialmente, os processos de sucessão. Sucessão ecológica é uma sequência de desenvolvimento do ecossistema em que cada fase abre o caminho para a próxima (RICKLEFS, 2008), ou seja, envolve mudanças na estrutura e na composição de espécies das comunidades e nos processos ao longo do tempo. Por mais que as fases sigam um roteiro teórico, nem sempre é possível prever as trajetórias sucessionais, porque os regimes de distúrbio são complexos, com diferentes tipos e intensidades, formando um sistema de difícil visualização em campo. Além disso, a previsibilidade diminui na falta de um contexto espacial, pela desconsideração da escala espacial e pelo conhecimento inadequado dos mecanismos sucessionais (FRELICH, 2002). A sucessão secundária florestal é influenciada por eventos estocásticos, pela biologia das espécies, por sua interação com outras espécies (de plantas, animais e microrganismos) e pela interação dos componentes bióticos com os elementos abióticos do ecossistema. Todos esses fatores determinam a composição florística em uma etapa do processo sucessional em particular e também influenciam o grau de recuperação estrutural e funcional da vegetação original (GUARIGUATA; OSTERTAG, 2001). O curso da regeneração natural dos ecossistemas, ou sucessão secundária após perturbação, pode, portanto, ser dificultado ou impedido por limitações no ambiente físico e/ou biótico, que operam em diferentes escalas temporais e espaciais – os chamados filtros ecológicos (HOBBS; NORTON, 2004; MENNINGER; PALMER, 2006). Não é possível identificar todas as restrições a que um ecossistema está sujeito ao longo da sucessão. No entanto, a caracterização da sua estrutura e funcionamento geralmente aponta os principais filtros que atuam na reconstrução da comunidade em restauração. A aplicação do conceito de filtro é mais usual para casos particulares na restauração ecológica, nos quais é necessário identificar fatores que impossibilitam o estabelecimento de algumas espécies. Os filtros que podem atuar sobre ecossistemas em restauração, apontados por Hobbs e Norton (2004) são: 8 1. Filtros abióticos: • Clima: gradientes de chuva e temperatura. • Substrato: fertilidade, disponibilidade de água no solo e toxicidade. • Estrutura da paisagem: uso anterior do solo, tamanho do fragmento e seu isolamento. 2. Filtros bióticos: • Competição: entre espécies estabelecidas e potenciais invasoras. • Interações tróficas - predação: por espécies pré-existentes ou por espécies invasoras, e predação por animais reintroduzidos. • Disponibilidade de propágulos (dispersão): poleiros de aves, a proximidade de fontes de sementes, presença de banco de sementes. • Mutualismo: micorrizas, rizóbios, polinização e dispersão, defesa. • Ordem de chegada das espécies e modelo sucessional: facilitação, inibição e tolerância; efeito de prioridade; acaso. • Composição atual e passada da estrutura (herança biológica): quanto ainda existe da biodiversidade e da estrutura biótica e abiótica originais. Em ecossistemas efetivamente degradados, geralmente foram transpostos limiares (“thresholds”) bióticos ou abióticos, de modo que esses ecossistemas não são capazes de se reintegrar por si mesmos (HOBBS; NORTON, 2004). Nesses casos são necessárias intervenções de restauração, a fim de estabilizar ou reverter os processos de degradação, visando acelerar e direcionar a sucessão natural (ENGEL; PARROTA, 2003). O foco da restauração ecológica é reiniciar os processos ecológicos interrompidos pela ação da degradação, para que a área degradada siga uma trajetória sucessional natural (SER, 2004). As barreiras ou filtros que impedem a regeneração natural das espécies nativas de um ecossistema degradado atuam em uma ou mais fases do ciclo de vida da planta e podem incluir os seguintes fatores, isolados ou combinados: baixa disponibilidade de propágulos, dificuldades no recrutamento, estresse ou falta de interações essenciais para o funcionamento do ecossistema e podem incluir um ou mais desses fatores (ENGEL; PARROTA, 2003). A prática da restauração ajuda a elucidar os processos da sucessão ecológica, que englobam o restabelecimento da estrutura física (riqueza de espécies, densidade, distribuição espacial) e funcional da comunidade (WALKER; WALKER; 9 HOBBS, 2007). Em alguns casos, os processos da sucessão em ecossistemas em restauração são influenciados por fatores que não foram previstos no plano inicial. Esses fatores podem ser relacionados com as próprias mudanças na composição e estrutura da comunidade ao longo do tempo após a intervenção. Esses novos fatores podem ser novos filtros ecológicos atuando na seleção das espécies ao longo da trajetória do ecossistema em restauração. As formigas cortadeiras são protagonistas de algumas das interações tróficas mais relevantes, especialmente em regiões tropicais, atuando como filtros ecológicos ao longo da sucessão. Por exemplo, a herbivoria, associada a diferenças edáficas, mostrou-se como uma força de diversificação entre as espécies em floresta tropical, pois, juntos, os dois fatores proporcionaram um gradiente ainda mais divergente entre micro-habitats (FINE; MESONES; COLEY, 2004). No contexto da restauração ecológica, as formigas podem atuar como um filtro pré-existente, obstruindo o desenvolvimento das espécies desde a sua introdução (mudas ou sementes) ou podem surgir como um filtro intermediário, à medida que a floresta se desenvolve, aumentando a oferta de alimentos. A dinâmica de sucessão de uma floresta tropical não pode ser explicada somente pela composição de espécies, mas sim pela natureza e força da interação entre as espécies que a compõem (GHAZOUL; SHEIL, 2010). Processos como a dinâmica de populações, fluxo de energia, ciclagem de nutrientes, produção primária, estabilidade do ecossistema e biodiversidade afetam a estabilidade e a organização da comunidade. Portanto, interações entre as espécies, como competição, predação, mutualismo e parasitismo modificam o ambiente, podendo alterar as condições ou afetar a disponibilidade de recursos para outros organismos (BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2009). O controle de populações do ecossistema pode ser explicado pelos modelos descendente (top-down) ou ascendente (bottom-up) (Figura 1). O modelo descendente ocorre quando a dinâmica populacional é ditada pelo predador de topo, ou seja, de cima para baixo, sendo que a abundância, biomassa ou diversidade de níveis tróficos inferiores dependem dos efeitos dos consumidores como na cascata (predação). Ou seja, a quantidade de predadores determina o crescimento populacional de suas presas e assim por diante. O modelo ascendente ocorre quando o equilíbrio do sistema é determinado de baixo para cima. Nesses casos, a estrutura da comunidade depende de 10 fatores que atuam a partir de níveis tróficos inferiores, podendo-se citar como exemplos a disponibilidade de presas e a concentração de nutrientes (recursos), entre outros. A herbivoria, em geral, é um mecanismo de controle descendente. Diversos estudos têm demonstrado que os consumidores limitam a distribuição e abundância de plantas em escala local, mas o impacto é muito variável dependendo da biologia da espécie vegetal, do tipo do ecossistema, do nível de perturbação e do modo de atuação do herbívoro (MARON; CRONE, 2006). Embora em outras regiões tropicais do mundo os principais herbívoros sejam mamíferos de grande porte, formigas cortadeiras são descritas como herbívoros dominantes da Região Neotropical (HÖLLDOBLER; WILSON, 1990). As formigas cortadeiras pertencem ao Reino Animal, Filo Arthropoda, Classe Insecta, Ordem Hymenoptera, Subordem Apocrita, Superfamília Formicoidea, Família Formicidae, Subfamília Myrmicinae e Tribo Attini. O grupo é composto por cinco gêneros, mas apenas os gêneros Atta e Acromyrmex utilizam material vegetal fresco (LEAL; WIRTH; TABARELLI, 2012). As espécies desses gêneros são conhecidas popularmente como saúvas e quenquéns, respectivamente. Elas ocorrem nas Américas, dos Estados Unidos até a Argentina. O Brasil é o país que possui o maior número de espécies de formigas cortadeiras (FORTI; BOARETTO, 1997), compreendendo 20 espécies do gênero Acromyrmex e nove espécies do gênero Atta (DELLA LUCIA; FOWLER; MOREIRA, 1993; FORTI; BOARETTO, 1997). A característica comum aos gêneros é o cultivo de um fungo simbiôntico (Basidiomiceto), que será o alimento das MODELO DESCENDENTE MODELO ASCENDENTE Planta Herbívoro Carnívoro Figura 1: Representação em pirâmide trófica dos modelos de controle de população ascendente e descendente. 11 formigas em todas as fases de sua vida. Em função disso, cortam folhas para servir de substrato para o crescimento do fungo. As formigas cortadeiras são insetos sociais, divididos em castas temporárias e castas permanentes. A divisão de castas no formigueiro é morfofisiológica e baseia-se em sua função na sociedade. Assim, um formigueiro é composto pela rainha (sexuada), operárias (estéreis) formadas pelas jardineiras, generalistas, cortadeiras e soldados e os machos alados. O formigueiro é formado após a revoada e fecundação da rainha, cujos ovos dão origem às operárias, que logo começam a trabalhar para o crescimento do ninho e da colônia. A elas cabe a manutenção da colônia, a localização, corte e transporte de material vegetal para o interior do formigueiro e proteção da colônia. Todos os indivíduos são fêmeas e estéreis e as divisões das operárias não podem ser enquadradas em categorias, já que todas podem desempenhar a mesma função (FORTI; ANDRADE; RAMOS, 2000). Os machos são temporários, com a única finalidade de reprodução da rainha. As formigas se desenvolvem por holometabolia, ou seja, passam pelas fases ovo-larva-pupa-adulto (NICKELE et al., 2013). As formigas cortadeiras geralmente controlam as populações de plantas das quais se alimentam e, assim, podem alterar a composição florística e influenciar a diversidade das comunidades (VASCONCELOS; CHERRETT, 1997), bem como os padrões de sucessão e até os processos do solo (GHAZOUL; SHEIL, 2010). Costa et al. (2008) mostraram que formigas cortadeiras controlam a estrutura e a dinâmica das comunidades vegetais, pela redução da biomassa. Assim, essas formigas podem ser consideradas engenheiras do ecossistema (MEYER et al., 2011), pois elas podem controlar os fluxos de energia e de recursos, podendo modificar os habitats causando, assim, mudanças bióticas e abióticas na comunidade (JONES et al., 1994, 1997). No entanto, em certas situações, formigas cortadeiras podem ter suas populações controladas pela redução da oferta de alimento, num modelo característico da relação predador-presa. Exemplo disso é a redução de ninhos ativos à medida que diminui a proporção de espécies pioneiras – que são consideradas preferidas pelas formigas – ao longo do processo de sucessão florestal (SILVA et al., 2009). Em florestas naturais, os efeitos das formigas sobre a comunidade vão além do controle populacional das espécies de que se utilizam. Por exemplo, os sauveiros acabam por funcionar como pequenas clareiras sobre as quais as plantas não se estabelecem (SAHA et al., 2012). Essas clareiras, de tamanhos variáveis, proporcionam 12 microhabitats três vezes mais iluminados do que a floresta longe dos sauveiros. Essas modificações físicas resultam em modificações importantes nos processos de germinação, crescimento e sobrevivência das plântulas ao redor dessas clareiras (MEYER et al., 2011). Em florestas não perturbadas, formigas cortadeiras podem estimular o recrutamento de novos indivíduos e aumentar a riqueza de espécies vegetais. Isso acontece em ambientes naturais, pois o fungo cultivado pelas formigas auxilia no processo de decomposição da serapilheira e, consequentemente, potencializa a ciclagem de nutrientes (FOWLER et al., 1989). Formigas cortadeiras, quando em seus ambientes naturais e não perturbados, agem como espécies-chave para o ecossistema. Porém, estudo recente demonstrou que as formigas tiveram seu papel invertido com a perturbação do ambiente. Meyer et al. (2013) demonstraram que a atividade das formigas cortadeiras reduz a espessura da camada de serapilheira e empobrece os solos, dificultando o recrutamento de novas plantas. Wirth et al. (1997) consideram que, por não possuírem alto investimento em defesa química, espécies vegetais pioneiras são mais cortadas pelas formigas do que espécies características de etapas mais avançadas da sucessão. Ecossistemas restaurados ou perturbados apresentam maior proporção de espécies pioneiras em relação a espécies tardias, aumentando o recurso para as formigas cortadeiras e, consequentemente, sua abundância na comunidade (WIRTH et al., 2007). O mesmo acontece com ambientes fragmentados, pois as bordas das florestas induzem o aumento da herbivoria, por diminuírem a limitação de recurso (VASCONCELOS, 1998; URBAS et al., 2007). Em fragmentos de floresta tropical madura, a densidade de formigas cortadeiras é maior nos primeiros 50 metros de borda (MEYER; LEAL; WIRTH, 2009), seguindo o modelo de controle ascendente (bottom-up), onde a densidade de formigas é controlada pela densidade de espécies pioneiras. A alta taxa de herbivoria nas bordas de fragmentos florestais aumenta os efeitos da fragmentação na dinâmica de sucessão florestal e esses efeitos tornam-se estáveis com o tempo (MEYER; LEAL; WIRTH, 2009). Apesar de comprovado que os efeitos da herbivoria sobre ecossistemas fragmentados é constante ao longo do tempo, Silva et al. (2009) 13 demonstraram que a densidade de ninhos de formigas cortadeiras diminui após 30-40 anos em fragmentos de floresta tropical em regeneração. Como engenheiras do ecossistema, as formigas cortadeiras impedem que plantas jovens se estabeleçam, seja diretamente, por predação, ou, indiretamente, por diminuírem a disponibilidade de recursos e por serem capazes de alterar a estrutura da comunidade e o microclima. O impacto das formigas cortadeiras sobre ecossistemas em restauração é, na maioria das vezes, negativo, sendo necessária intervenção. Por esta razão, em projetos de restauração o controle de formigas cortadeiras é geralmente tido como uma das primeiras etapas a serem cumpridas (BOARETO; FORTI, 1997). Todavia, não há estudos sobre as formigas cortadeiras como possível fator de interferência na montagem das comunidades vegetais em plantios antigos de restauração. Não se sabe se esses herbívoros são capazes de atuar como filtro biótico a determinar a composição de espécies das comunidades, se podem levar à extinção algumas espécies ou se podem comprometer a estrutura das florestas restauradas. O presente estudo visa elucidar algumas das questões pendentes relacionadas à ação de formigas cortadeiras sobre espécies arbóreas em plantios de restauração. Objetivo O objetivo geral desta pesquisa foi avaliar o impacto de formigas cortadeiras sobre plantas jovens de espécies arbóreas nativas em floresta ripária em restauração. Há uma série de questões pendentes relativas ao assunto, algumas das quais buscamos responder com esta pesquisa. Por exemplo: quais são as espécies mais atacadas pelas formigas? Existem padrões funcionais das espécies arbóreas que explicam maior ou menor frequência de herbivoria? O porte das plantas influencia na sua resistência à herbivoria? Os ataques são mais frequentes sobre mudas recém plantadas do que sobre plantas aclimatadas? A partir dessas questões foram testadas as seguintes hipóteses: I. As formigas apresentam preferência por algumas espécies, predando de maneira diferenciada as populações e levando à perda de diversidade da comunidade. II. Existem atributos funcionais das plantas que induzem a forrageamento seletivo pelas formigas cortadeiras. 14 III. A resistência à herbivoria é dependente do tamanho das plantas, sendo mais vulneráveis as plantas menores dentro de uma mesma espécie. IV. Mudas recém plantadas são mais atacadas por formigas cortadeiras do que mudas aclimatadas. Este documento está dividido em dois capítulos, sendo que as hipóteses I e II são tratadas no CAPÍTULO 1 e as hipóteses III e IV no CAPÍTULO 2. Referências bibliográficas BARRER, P.M; CHERRETT, J.M. Some factors affecting the site and pattern of leaf- cutting activity in the ant Atta cephalotes L. Journal Entomology, v.47, p.15-27, 1972. BEGON, M.; TOWNSEND, C. R.; HARPER, J. L. Ecology: From Individuals to Ecosystems. John Wiley & Sons, 2009. p. 752. BIGGER, D. S.; MARVIER, M. A. How different would a world without herbivory be?: A search for generality in ecology. Integrative Biology, v. 1, p. 60–67, 1998. BOARETTO, M.A.C.; FORTI, L.C. 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O mesmo acontece com ambientes fragmentados, pois as bordas das florestas induzem ao aumento da herbivoria, por aumentarem a disponibilidade de recurso (VASCONCELOS, 1998; URBAS et al., 2007). Em se tratando de ecossistemas em restauração, formigas cortadeiras podem atuar como um filtro pré-existente, obstruindo o desenvolvimento das espécies desde a sua introdução (mudas ou sementes), ou podem surgir como um filtro intermediário, à medida que a floresta se desenvolve e aumenta a oferta de alimentos. Formigas cortadeiras exercem importante papel como herbívoros em florestas tropicais e seu forrageamento seletivo por certas plantas, principalmente sobre plantas jovens, afeta a composição da floresta, bem como os padrões de sucessão (SILVA et al., 2012). O efeito da herbivoria em plantas é dependente de diversos fatores e a persistência da planta depende de sua resposta ao ataque. As plantas podem apresentar tolerância aos danos causados ou resistência ao ataque (BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2009). Todavia, não há estudos sobre as formigas cortadeiras como possível fator de impacto na montagem das comunidades vegetais em plantios de restauração. Não se sabe se esses herbívoros são capazes de atuar como filtro biótico a determinar a composição de espécies 19 das comunidades ou se podem até mesmo levar à extinção algumas espécies, diminuindo a diversidade de florestas em restauração. Visando elucidar o papel das formigas cortadeiras em florestas em restauração, neste capítulo testamos as seguintes hipóteses: I. As formigas apresentam preferência por algumas espécies, predando de maneira diferenciada as populações e levando à perda de diversidade da comunidade. II. Existem atributos funcionais das plantas que induzem a forrageamento seletivo pelas formigas cortadeiras. 1.2 MATERIAL E MÉTODOS 1.2.1 Área de estudo O estudo foi desenvolvido em área onde foi efetuado plantio de restauração da floresta ripária do Córrego Tarumã, localizada na Fazenda Canaçu (22°47'50.7"S 50°35'08.8"W), município de Tarumã, estado de São Paulo (Figura 2). O clima regional é do tipo Cfa – temperado úmido com verão quente (ALVARES et al., 2013) e temperatura média anual entre 20° C e 22° C. A temperatura nos meses mais frios varia de -3ºC a 18ºC e nos meses mais quentes a média é superior a 22º C. O solo é do tipo Latossolo Roxo Eutrófico em toda a propriedade e a precipitação média anual oscila entre 1300 e 1600 mm (COSTA, 2008). Em janeiro de 1990, foi realizado plantio de restauração da floresta ripária em todos os corpos d’água da propriedade, em caráter experimental, visando a comparação entre quatro modelos de plantio, que diferem pela composição de espécies, como segue: 1) Pinus elliotti var. densa (puro), 2) 100% espécies pioneiras (duas espécies do gênero Croton), 3) 50% de espécies pioneiras (Croton urucurana e C. floribundus) e 50% de não pioneiras, em linhas alternadas, e 4) plantio misto aleatório de espécies nativas, sendo baixa a proporção de espécies pioneiras. O experimento como um todo ocupou área de 12.060 m2. Resultados desse experimento foram apresentados em Silveira (2001), Silveira e Durigan (2004) e, posteriormente, em Costa (2008). Os resultados, aos dez e aos 17 anos apontaram baixa regeneração natural sob o plantio de Pinus e sob o plantio de pioneiras e o melhor resultado (maior densidade e riqueza de plantas em regeneração) sob o plantio misto aleatório com baixa proporção de pioneiras. Em meados de 2012, foram eliminadas da área 20 experimental todas as árvores do plantio puro de Pinus, formando a clareira na qual foi instalado o experimento de que trata este estudo. Além do corte das árvores plantadas, toda a vegetação existente na clareira foi eliminada, predominantemente gramíneas invasoras, e até mesmo os raros indivíduos regenerantes de espécies nativas, visando homogeneizar a condição da área experimental. Figura 2: Localização da Fazenda Canaçu no município de Tarumã – SP (adaptado de Costa, 2008). Na propriedade também há fragmentos naturais remanescentes nas zonas de interflúvio e ocupação agrícola com plantios de soja, milho e cana-de-açúcar. A vegetação local anterior era Floresta Estacional Semidecidual, segundo a classificação de Veloso; Rangel Filho; Lima (1991). Na área em restauração como um todo existem formigas cortadeiras (Atta sexdens rubropilosa) e não foi efetuada nenhuma prática de controle por alguns anos antes da instalação do experimento e durante a coleta de dados. 1.2.2 Desenho experimental 21 A área de plantio (50 x 8 m) foi dividida em cinco blocos, cada um com duas parcelas (cada uma com dimensões de 4 x 10 m). As mudas foram plantadas em espaçamento de 1 x 1 m (Figura 3), com base na densidade em que as plantas com altura a partir de 50 cm ocorrem nas matas ripárias nativas da região de Floresta Estacional Semidecidual (SUGANUMA et al. 2013). As mudas, produzidas em embalagens plásticas de polietileno, tinham idade variável, uma vez que procuramos padronizar as mudas pelo porte, em torno da altura média de 50 cm. Cada muda recebeu uma etiqueta numerada de alumínio, fixada à base do caule com anel de arame suficientemente amplo para não oferecer risco de estrangular a planta. Todos os registros de herbivoria e medições foram vinculados ao número do indivíduo durante todo o período de avaliação. Figura 3: Clareira na floresta ripária em restauração ao longo do córrego Tarumã (município de Tarumã, SP) onde foi instalado o experimento com o plantio de 400 mudas de espécies florestais nativas. (Foto: Beatriz Z. Ferreira). 1.2.3 Instalação do experimento O experimento baseou-se no plantio de espécies arbóreas nativas da flora regional, em uma clareira grande, com cerca de 500 m² (Figura 4) no interior da floresta em restauração. A ideia original era monitorar a herbivoria sobre as plantas em regeneração existentes sob a floresta plantada. A opção pela instalação de um plantio experimental em 22 vez de amostragem da comunidade existente se fez considerando que 1) assim seria possível ter maior controle das condições ambientais, do número de indivíduos por espécie e por grupo funcional e de sua distribuição espacial, e 2) as espécies já existentes poderiam ter sido selecionadas pelas formigas ao longo do tempo desde o plantio e espécies que foram impedidas de se estabelecer não seriam identificadas. Embora o plantio tenha sido realizado no mês de dezembro de 2012, que pela média histórica seria um período chuvoso, foram necessárias quatro operações de irrigação para evitar que a falta de chuvas prejudicasse o experimento. As 20 espécies utilizadas no experimento (Tabela 1) foram selecionadas buscando- se representar equitativamente diferentes grupos funcionais. Classificamos as espécies, com base na literatura, categoricamente (sim ou não) pelos seguintes atributos: (a) ritmo de crescimento rápido (CARVALHO, 2003; DURIGAN et al., 2004), (b) presença de látex, (c) pioneira (CARVALHO, 2003; DURIGAN et al., 2004), (d) caducifólia (CARVALHO, 2003; DURIGAN et al., 2004), (e) fixadora de nitrogênio (USDA, 2014) , (f) folhas glabras (PIO CORRÊA, 1978). 23 Ta be la 1 : Es pé ci es p la nt ad as n a ár ea e xp er im en ta l p ar a av al ia çã o da h er bi vo ria p or f or m ig as c or ta de ira s em p la nt io d e re st au ra çã o de f lo re st a rip ár ia , Ta ru m ã, S P, c at eg or iz ad as e m g ru po s f un ci on ai s p ar a di fe re nt es a tri bu to s. E sp éc ie s N om e po pu la r Crescimento rápido Látex Pioneiras Caducifólias Fixadoras Glabras A lb iz zi a ni op oi de s ( B en th .) B ur ka rt* fa rin ha -s ec a X X X X A sp id os pe rm a cy li nd ro ca rp on M ül l.A rg . pe ro ba -p óc a X X B al fo ur od en dr on r ie de li an um (E ng l.) E ng l* pa u- m ar fim X C ar in ia na e st re ll en si s (R ad di ) K un tz e je qu iti bá -b ra nc o C ei ba s pe ci os a (A .S t.- H il. ) R av en na * pa in ei ra X X X C ro to n fl or ib un du s Sp re ng .* ca pi xi ng ui X X X E nt er ol ob iu m c on to rt is il iq uu m ( V el l.) M or on g* tim bu ri X X X X X G al le si a in te gr if ol ia ( Sp re ng .) H ar m s* pa u- d' al ho X X E ug en ia m yr ci an th es N ie d. uv ai a X H ym en ae a co ur ba ri l L . ja to bá X L on ch oc ar pu s m ue hl be rg ia nu s H as sl .* em bi ra -d e- sa po X X X X M ab ea fi st ul if er a M ar t. m am on in ha X X X M yr ac ro dr uo n ur un de uv a A lle m ão ar oe ira -p re ta X M yr ox yl on p er ui fe ru m L .f. * ca br eú va -v er m el ha X X P ar ap ip ta de ni a ri gi da (B en th .) B re na n* an gi co -d a- m at a X X P li ni a ca ul if lo ra (M ar t.) K au se l ja bo tic ab ei ra X P oe ci la nt he p ar vi fl or a B en th .* co ra çã o- de -n eg ro X X R ol li ni a sy lv at ic a (A . S t.- H il. ) M ar tiu s ar at ic um F ic us a dh at od if ol ia S ch ot t fig ue ira X X X G oc hn at ia p ol ym or ph a (L es s.) C ab re ra ca nd ei a X X *e sp éc ie s q ue fo ra m u til iz ad as n o pl an tio re al iz ad o em 1 99 0, d en tro d o qu al se e nc on tra a c la re ira o nd e fo i r ea liz ad o o pl an tio d e qu e tra ta e st e es tu do . 24 1.2.4 Coleta de dados As análises realizadas neste capítulo baseiam-se na frequência de ataques a cada indivíduo durante o período de doze meses de observações. A cada ocasião de coleta de dados (coletas semanais durante 12 meses), cada um dos indivíduos (enumerados) era submetido à avaliação em quatro categorias possíveis: a) não atacado; b) atacado por outros insetos; c) perda parcial ou total da folhagem por ataque de formigas e d) morto. Para esta avaliação foi necessário estabelecer um procedimento de diagnóstico do que se caracteriza como um episódio de herbivoria por formigas cortadeiras. Ainda que existam procedimentos usuais para plantas adultas ou em ecossistemas naturais (BARRER; CHERRETT, 1972), foi necessário estabelecer critérios específicos para este estudo, uma vez que tratamos de indivíduos jovens plantados por mudas. Primeiramente, estabelecemos como critério que a herbivoria teria de ter sido provocada por formigas cortadeiras, enquadrando-se em um dos três casos seguintes: 1) perda foliar parcial com formato semilunar na folha (tipo de situação raramente observada neste estudo); 2) todas as folhas cortadas entre duas avaliações consecutivas, reforçada, sempre que possível, pela existência de fragmentos de folhas cortadas sob o indivíduo (forma mais comum de ataque registrada); e 3) observação direta da ação das formigas cortando ou transportando as folhas. Para que fosse registrado um novo ataque a um indivíduo já atacado antes, era preciso que o indivíduo tivesse emitido folhas após o ataque anterior. 1.2.5 Análise dos dados Para todas as análises realizadas neste capítulo foram excluídos os indivíduos que morreram ou sofreram herbivoria por outros agentes que não formigas cortadeiras. Deste modo, o número inicial de indivíduos de cada espécie para avaliação dos impactos da herbivoria correspondeu ao número inicial de mudas plantadas, subtraídos os indivíduos excluídos. 1.2.5.1 Número médio de ataques por espécie A partir dos registros de herbivoria por formigas cortadeiras, calculamos o número médio de ataques por indivíduo, para cada espécie, em um período de observações de 12 25 meses. Os valores médios do número de ataques por espécie foram submetidos a análise de variância (α = 0,05), seguida de Teste de Tukey, para a comparação entre as espécies. As análises foram realizadas no programa R (R CORE TEAM, 2014), utilizando o pacote “multcomp” (HOTHORN; BRETZ; WESTFALL, 2008). 1.2.5.2 Herbivoria por grupo funcional Para as análises da frequência de herbivoria entre categorias dentro de cada atributo funcional foi aplicado o Teste T de Student. Comparamos o número médio de ataques por indivíduo dentro de cada uma das categorias para cada atributo (e.g. fixadoras de nitrogênio vs. não fixadoras de nitrogênio). 1.2.5.3 Curvas de sobrevivência das espécies Para elaborar a curva de sobrevivência de cada espécie utilizamos apenas o último registro de cada mês, contabilizando as plantas vivas e convertendo os dados em porcentagem em relação ao número de mudas plantadas (excluídas as que morreram por outras causas). Realizamos análise descritiva da porcentagem de plantas sobreviventes ao longo do tempo, apresentando graficamente as perdas apenas para as espécies que tiveram indivíduos mortos pela ação das formigas cortadeiras. Para a construção das curvas de sobrevivência utilizamos o programa R (R CORE TEAM, 2014). 1.2.5.4 Número de ataques que levam um individuo à morte A comparação entre espécies pelo número de ataques que levam um indivíduo à morte foi feita por meio de análise de variância (α = 0,05), seguida de Teste de Tukey (HOTHORN; BRETZ; WESTFALL, 2008; R CORE TEAM, 2014). Além desta análise, calculamos a moda e apresentamos graficamente a frequência de ataques que leva à morte as plantas para o conjunto total de espécies. 1.2.5.5 Densidade relativa das espécies na comunidade 26 Para verificar o efeito das formigas sobre a abundância relativa das espécies na comunidade, calculamos a densidade relativa inicial de cada espécie dentro do conjunto de 400 mudas plantadas (excluídos os indivíduos que foram mortos por outras causas que não formigas cortadeiras) e a densidade relativa final, aos doze meses após o plantio. 1.2.5.6 Diversidade da comunidade ao longo do tempo Para esta análise, utilizamos apenas o último registro de cada mês, contabilizando as plantas vivas. Calculamos, ao final de cada mês, o Índice de Diversidade de Shannon- Wiener com logaritmo em base neperiana, utilizando o programa R, pelo pacote “vegan” (OKSANEN et al., 2013; R CORE TEAM, 2014). Os valores de diversidade foram submetidos a uma regressão linear, sendo a variável independente o tempo (dias) desde o plantio. 1.3 RESULTADOS 1.3.1 Herbivoria seletiva por espécie e por grupo funcional A análise comparativa do número médio de ataques por espécie (Tabela 2 e Figura 4) mostrou variação entre 1 e 5 ataques por indivíduo no período de 12 meses. Destacaram- se, pela alta frequência de ataques por indivíduo em um ano, em ordem decrescente do valor mediano, as espécies: Ceiba speciosa (5,3 ataques), Rollinia sylvativa (5,2), Croton floribundus (4,5), Carianiana estrellensis (5), Gallesia integrifolia (4,1) e Enterolobium contortisiliquum (3,8), que não diferiram entre si. No outro extremo, encontra-se um grupo de espécies que se destacaram pela baixa frequência de herbivoria, em ordem crescente: Poecilanthe parviflora (1,2), Myroxylon peruiferum (1,3), Hymenaea courbaril (1,3), Eugenia myrcianthes (1,5), Balfourodendron riedelianun (1,7) Mabea fistulifera (1,8), Myracrodruon urundeuva (1,9) e Gochnatia polymorpha (2,1), que não diferiram entre si. 27 Tabela 2: Tabela de Análise de Variância da comparação da mediana do número de ataques de herbivoria por formigas cortadeiras, por espécie. FV = fonte, GL = graus de liberdade, SQ = soma dos quadrados, QM = quadrado médio, F = valor do F de Fisher e p = valor de probabilidade do teste. FV GL SQ QM F p Espécie 19 889,15 46.797 18.797 < 0,0001 Erro 380 946,05 2.490 28 Fi gu ra 4 : N úm er o de a ta qu es p or fo rm ig as c or ta de ira s d ur an te 1 2 m es es , p ar a um in di ví du o de c ad a um a da s 2 0 es pé ci es a rb ór ea s na tiv as e m p la nt io de re st au ra çã o de fl or es ta r ip ár ia . B ox pl ot (m ed ia na ± q ua rti s) . O re su lta do d o Te st e de T uk ey é re pr es en ta do p el as le tra s m in ús cu la s ac im a de c ad a ca ix a. C ai xa s e nc im ad as p el a m es m a le tra n ão d ife re m e nt re s i ( p > 0, 05 ). 29 A comparação da frequência de herbivoria entre grupos funcionais dentro de cada atributo (Figura 5) não apontou diferença significativa entre as categorias para nenhum dos nove atributos analisados. Figura 5: Número de ataques por formigas cortadeiras durante 12 meses, para um indivíduo, entre as duas categorias possíveis para cada um dos atributos funcionais de espécies arbóreas. Boxplot (mediana ± quartis). 1.3.2 Sobrevivência das espécies ao longo do tempo 30 As curvas de sobrevivência (Figura 6) são apresentadas apenas para as oito espécies que tiveram indivíduos mortos pela ação das formigas. As demais espécies (12) não tiveram plantas mortas em decorrência do ataque de formigas no período de observação. Figura 6: Curvas de sobrevivência das mudas de espécies arbóreas expostas ao ataque de formigas cortadeiras ao longo de um ano em floresta ripária em restauração. (A) Parapiptadenia rigida, (B) Rollinia sylvatica, (C) Croton floribundus, (D) Cariniana estrellensis, (E) Mabea fistulifera, (F) Ceiba speciosa, (G) Gallesia integrifolia, (H) Aspidosperma cylindrocarpon. Espécies que não apresentaram indivíduos mortos não são apresentadas. 1.3.3 Número de ataques que levam um indivíduo à morte Dos 347 indivíduos atacados ao longo de doze meses, 70 mudas (17,5% das 400 mudas plantadas inicialmente), pertencentes a oito espécies, morreram por ataque de formigas cortadeiras. Isto equivale 20% dos indivíduos atacados, pertencentes a 14% das espécies plantadas. O número médio de ataques que leva à morte as mudas plantadas variou de 2 a 6 entre as espécies analisadas. A análise comparativa entre as espécies que tiveram indivíduos mortos por ataque de formigas cortadeiras (Tabela 3 e Figura 7) 31 mostrou que Mabea fistulifera é a espécie cujos indivíduos morrem após o número mais baixo de ataques, embora a média não seja significativamente diferente de Parapiptadenia rigida e Croton floribundus. As espécies que suportam número maior de ataques em comparação com M. fistulifera – Rollinia sylvatica, Cariniana estrelensis, Ceiba speciosa, Gallesia integrifolia, Aspidosperma cylindrocarpon, Parapiptadenia rigida e Croton floribundus – não diferiram entre si quanto ao número de ataques que levam à morte um indivíduo. Tabela 3: Análise de Variância do número médio de ataques por formigas cortadeiras que leva à morte as mudas de diferentes espécies arbóreas em plantio de restauração de floresta ripária. FV = fonte, GL = graus de liberdade, SQ = soma dos quadrados, QM = quadrado médio, F = valor do F de Fisher e p = valor de probabilidade do teste. FV GL SQ QM F p Espécie 7 95.635 13.6621 6.8901 < 0,0001 Erro 62 122.937 1.9829 Figura 7: Número de ataques por formigas cortadeiras necessários para levar à morte um indivíduo de cada uma de oito espécies arbóreas em plantio de floresta ripária. Boxplot (mediana ± quartis). O resultado do Teste de Tukey é representado pelas letras minúsculas acima de cada caixa. Caixas encimadas pela mesma letra não diferem entre si (p > 0,05). 32 Analisados os indivíduos mortos de todas as espécies em busca no número mais provável de ataques que leva à morte um indivíduo na comunidade como um todo (Figura 8), verificamos que a moda está em cinco ataques. Figura 8: Frequência do número de ataques que levam à morte uma muda de espécie arbórea, considerando-se o conjunto total de espécies analisadas. 1.3.4 Densidade relativa das espécies na comunidade A densidade relativa das espécies no momento do plantio foi de 5% para todas as espécies. Ao se excluírem os indivíduos que morreram por outras causas que não formigas cortadeiras, a densidade relativa das espécies variou de 4,2% a 5,3%. Aos doze meses após o plantio, houve considerável aumento na amplitude de valores de densidade relativa entre as espécies, oscilando de 0,3% a 6,5% (Quadro 1). 33 Quadro1: Densidade relativa de 20 espécies arbóreas antes e após doze meses de exposição à herbivoria por formigas cortadeiras. DRo = densidade relativa inicial (das 20 mudas por espécie que foram plantadas excluíram-se as que morreram por outras causas que não a herbivoria por formigas cortadeiras); DRf = densidade relativa após 12 meses. Em destaque azul está a única espécie cuja densidade relativa não se alterou; em verde estão as espécies cuja densidade relativa aumentou e em vermelho as espécies que diminuíram em abundância na comunidade. DRo DRf Espécie % Espécie % Gochnatia polymorpha 5,3% Gochnatia polymorpha 6,5% Lonchocarpus muehlbergianus 5,3% Lonchocarpus muehlbergianus 6,5% Albizia niopoides 5,3% Albizia niopoides 6,5% Plinia cauliflora 5,3% Plinia cauliflora 6,5% Hymenaea courbaril 5,3% Hymenaea courbaril 6,5% Balfourodendron riedelianum 5,3% Balfourodendron riedelianum 6,5% Enterolobium contortisiliquum 5,3% Enterolobium contortisiliquum 6,5% Eugenia myrcianthes 5,3% Eugenia myrcianthes 6,5% Aspidosperma cylindrocarpon 5,3% Myracrodruon urundeuva 6,1% Cariniana estrellensis 5,3% Ficus adhatodifolia 6,1% Myracrodruon urundeuva 5,0% Poecilanthe parviflora 5,8% Ficus adhatodifolia 5,0% Myroxylon peruiferum 5,5% Parapiptadenia rigida 5,0% Parapiptadenia rigida 5,2% Rollinia sylvatica 5,0% Rollinia sylvatica 4,5% Croton floribundus 5,0% Ceiba speciosa 4,5% Poecilanthe parviflora 4,7% Aspidosperma cylindrocarpon 4,5% Myroxylon peruiferum 4,5% Gallesia integrifolia 2,9% Ceiba speciosa 4,5% Croton floribundus 1,6% Gallesia integrifolia 4,5% Cariniana estrellensis 1,3% Mabea fistulifera 4,2% Mabea fistulifera 0,3% 1.3.5 Variação na diversidade da comunidade ao longo do tempo A diversidade da comunidade formada pelas mudas plantadas e expostas à herbivoria por formigas cortadeiras decresceu linearmente ao longo de 12 meses, baixando de H’ = 3,00 para H’ = 2,93 (Figura 9). 34 Figura 9: Variação do Índice de diversidade de Shannon-Wiener (H’) ao longo de 12 meses, para a comunidade de espécies arbóreas plantadas em floresta ripária em restauração e expostas ao ataque de formigas cortadeiras (Tarumã-SP). 1.4 DISCUSSÃO Existe diferença na frequência de herbivoria entre as espécies, sendo Ceiba speciosa, Rollinia sylvatica, Aspidosperma cylindrocarpon e Cariniana estrellensis as espécies mais atacadas (número total de ataques registrados em 20 mudas igual a 106, 104, 104 e 99, respectivamente). Plinia cauliflora e Poecilanthe parviflora foram as espécies menos atacadas, com 18 e 23 ataques, respectivamente, registrados em 20 mudas ao longo de um ano. Todas as vinte espécies foram atacadas por formigas cortadeiras e a média de ataques teve variação entre as espécies (p = 0,0001), indicando forrageamento seletivo. Além disso, a mortalidade variou entre espécies ao longo do tempo, levando à perda gradativa de diversidade na comunidade. No período de um ano de observações, a perda de diversidade seguiu tendência linear, o que levaria, teoricamente, à diversidade H’ = 0 em um momento futuro, o que não é possível. É de se esperar que em período de tempo mais longo as espécies resistentes à herbivoria dominem a comunidade, estabelecendo uma condição de equilíbrio. Esses dois resultados – a herbivoria seletiva e a perda gradativa da diversidade – comprovam a Hipótese I deste estudo e confirmam a ação das formigas como engenheiras do ecossistema em florestas em restauração, sendo capazes de alterar não somente a abundância de organismos, mas também a trajetória sucessional da comunidade vegetal (LEAL; WIRTH; TABARELLI, 2014). As formigas cortadeiras agem como um filtro biótico, resultando em diferenças na probabilidade de estabelecimento de mudas de 35 diferentes espécies (SILVA et al., 2012) e, assim, dirigindo a composição florística da comunidade. As diferenças na frequência de ataques entre espécies estão, provavelmente, relacionadas com aspectos evolutivos na defesa da planta (KOST; TREMMEL; WIRTH, 2011). É de se esperar que ao longo do tempo se tornem mais abundantes na comunidade vegetal espécies que sejam resistentes à herbivoria por formigas cortadeiras. Estudos anteriores indicam que espécies pioneiras são mais atacadas (FARJI-BRENER, 2001; FALCÃO, 2004, FALCÃO et al., 2011), que espécies fixadoras de nitrogênio sofrem mais herbivoria ou que a resistência à herbivoria está associada à presença de compostos secundários (KURSAR; COLEY, 2003; URBAS, 2005). Neste estudo, embora as quatro espécies com as menores frequências de ataques apresentem compostos secundários nas folhas, sugerindo um padrão, algumas das espécies com alta frequência de herbivoria também apresentam compostos secundários (e.g. Croton floribundus). Assim, nossa expectativa de que seria possível identificar padrões funcionais para as espécies que sofrem menos ataques de herbivoria por formigas cortadeiras foi frustrada, refutando a hipótese II. Com base nos resultados obtidos para as 20 espécies estudadas e nos atributos considerados, não foi possível efetuar generalizações baseadas em atributos funcionais das espécies. Os padrões apontados pela literatura como defesa física (tricomas), defesa química (compostos secundários) e látex (CHERRETT, 1972, KURSAR; COLEY, 2003, FALCÃO et al., 2011), para resistência à herbivoria não foram confirmados neste estudo. Além das diferenças observadas no número de ataques por indivíduo em cada espécie, observamos diferença na capacidade das espécies reagirem aos ataques. Umas morrem após poucos ataques e outras rebrotam várias vezes após terem toda a folhagem cortada. Os efeitos da herbivoria dependem diretamente da resposta das plantas ao ataque, e no nosso estudo pudemos observar diferentes respostas aos ataques por formigas cortadeiras. Os danos causados nas plantas ocorreram, em geral, sobre todas as folhas de um indivíduo e a rebrota das mudas ocorria, geralmente, dentro dos primeiros sete dias após a herbivoria, tornando a muda, assim, novamente suscetível ao ataque. Algumas espécies resistem aos ataques, de modo que mesmo com elevada frequência de ataques, alguns indivíduos demoram para morrer (e.g. Ceiba speciosa), enquanto outras apresentam indivíduos mortos após poucos ataques (e.g. Mabea fistulifera). As espécies Ceiba speciosa, Rollinia sylvatica e Aspidosperma cylindrocarpon podem ser classificadas como 36 resistentes à herbivoria, pois apesar do alto índice de ataques (n = 106, n = 104 e n = 104, respectivamente) a maior parte de seus indivíduos continuou a rebrotar após doze meses desde o plantio. Ao final do período de observações, C. speciosa, R. sylvatica e A. cylindrocarpon tiveram entre 25% a 30% dos indivíduos mortos pelo ataque de formigas cortadeiras. Da mesma forma, a espécie Enterolobium contortisiliquum – pioneira de crescimento muito rápido – foi a única no grupo das mais atacadas (n = 71 ataques) ao longo de doze meses que não teve nenhum indivíduo morto em conseqüência da herbivoria. Entre as espécies mais atacadas, alta taxa de mortalidade foi observada em Cariniana estrellensis, Croton floribundus e Gallesia integrifolia, que tiveram seus indivíduos reduzidos a menos de 50% a partir do sexto mês desde o plantio. Em geral, as espécies mais atacadas pelas formigas cortadeiras sofreram maior mortalidade, corroborando as observações de Vasconcelos; Cherrett (1997) e Wirth (2003). A remoção completa das folhas e a alta frequência de forrageamento sobre a muda ultrapassam o limiar que a planta pode suportar e sobreviver (MUNDIM et al., 2012). O número de ataques que mais frequentemente leva à morte do indivíduo é cinco, mas as mudas de Mabea fistulifera morreram após um único ataque, em média, sendo que apenas 25% de seus indivíduos sobreviveram após 12 meses. Outra espécie que teve o número de indivíduos reduzido pela herbivoria por formigas cortadeiras foi Parapiptadenia rigida. Embora a espécie esteja na condição intermediária quanto ao número médio de ataques por indivíduo, ao final de um ano, 15% das mudas estavam mortas em conseqüência da herbivoria. O resultado das diferenças mencionadas é que as espécies vão perdendo seus indivíduos ao longo do tempo em ritmos distintos, que levam à perda gradual e contínua de diversidade. As formigas cortadeiras sempre foram classificadas como generalistas (BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2009), mas em alguns estudos recentes elas têm se mostrado seletivas (VASCONCELOS; CHERRETT, 1997; WIRTH et al., 2007). No presente estudo, pudemos observar que as formigas cortaram folhas de todas as espécies plantadas, mas o forrageamento não foi indiferente entre espécies. Esses resultados apontam para um comportamento explicado pela teoria do forrageamento ótimo (PYKE, 1984; BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2009), onde as formigas coletam de todas as fontes de alimento potenciais para que as colônias possam ter ideia de distribuição de alimento e, assim, terem o melhor custo-benefício, ou seja, muitas espécies de plantas são visitadas pelas formigas, 37 mas o forrageamento é concentrado em poucas delas. A partir desse comportamento, a dieta das formigas cortadeiras é influenciada pela riqueza de espécies da comunidade vegetal, ou seja, quanto mais diversificada for a comunidade, mais espécies serão incluídas no forrageamento (LEAL; WIRTH; TABARELLI, 2012). Porém, menos da metade das espécies (8) sofreu controle populacional pela herbivoria, no modelo topdown. Em busca de inferências sobre as consequências da herbivoria em longo prazo, recorremos ao histórico do plantio efetuado em 1990. Nove das 20 espécies utilizadas no experimento de que trata este estudo foram plantadas no projeto de restauração (Silveira, 2004). Após 24 anos, apenas sete dessas espécies foram amostradas em regeneração na comunidade (G. Durigan, dados não publicados). São elas: Parapiptadenia rigida, Myroxylon peruiferum, Croton floribundus, Poecilanthe parviflora, Lonchocarpus muehlbergianus, Albizia niopoides, Balfourodendron riedelianum. A maioria dessas espécies apresentou incidência de herbivoria baixa, sem registro de plantas mortas pelas formigas, com exceção de P. rigida e C. floribundus, cujas taxas de sobrevivência foram de 85% e 30%, respectivamente. As duas espécies que foram plantadas e não foram amostradas em regeneração após 24 anos são Ceiba speciosa e Enterolobium contortisiliquum. Essas espécies foram classificadas no grupo das mais atacadas no experimento, embora poucas plantas tenham morrido nos primeiros doze meses após o plantio (taxas de sobrevivência de 75% e 100%, respectivamente). Não é possível afirmar que as espécies plantadas em 1990 que não se encontram hoje na floresta ripária foram excluídas da comunidade pela ação da herbivoria por formigas cortadeiras. Porém, essa explicação não pode ser negligenciada mediante os resultados deste estudo. A teoria diz que a predação nem sempre é prejudicial à população de presas, uma vez que estas podem ter baixa contribuição no futuro da população e também devido às mudanças compensatórias em crescimento, sobrevivência ou reprodução das presas sobreviventes (BEGON; TOWNSEND; HARPER, 2009). No entanto, tudo indica que algumas espécies utilizadas no experimento serão eliminadas pelas formigas antes que possam desenvolver mudanças compensatórias no seu desenvolvimento, especialmente porque se trata de plantas, que têm muito menos possibilidades de mudar de comportamento do que presas animais. Os resultados obtidos neste estudo têm fortes implicações para a prática da restauração florestal. Duas estratégias possíveis podem ser adotadas a partir desses resultados para minimizar as perdas causadas por formigas cortadeiras em plantios de 38 restauração: i) utilização de espécies resistentes ou, ii) adoção de práticas de controle de formigas cortadeiras. Boaretto; Forti (1997) afirmam que as características ecofisiológicas, comportamentais e reprodutivas das formigas cortadeiras dificultam a aplicação de manejo integrado de pragas, mas a utilização de técnicas específicas para cada situação pode ajudar a regular a população desses insetos quando se tornam um problema. O aumento da densidade relativa do grupo de espécies arbóreas que apresentam baixa frequência de herbivoria ou que não morrem facilmente quando atacadas por formigas cortadeiras pode ser entendido como indicador das espécies que deveriam ser prioritariamente utilizadas em locais onde as formigas cortadeiras são um filtro ecológico a ser superado. Pelo mesmo princípio, espécies que estão diminuindo em densidade relativa pela ação das formigas deveriam ser evitadas. 1.5 CONCLUSÃO Formigas cortadeiras predam de maneira diferenciada espécies arbóreas nativas plantadas em floresta ripária em restauração, ocasionando perdas nas populações que diferem em dimensão e em ritmo entre espécies, de modo que constituem um filtro biótico relevante para a construção dessas comunidades. A herbivoria pelas formigas leva à perda gradual e contínua da diversidade da comunidade. Formigas cortadeiras, portanto, agem como engenheiras do ecossistema, modificando a abundância relativa e a riqueza de espécies. Com essas ações, podem alterar a trajetória sucessional dos ecossistemas em restauração e, especialmente, sua composição futura, em que devem predominar espécies que tenham desenvolvido defesas contra formigas. No entanto, a inexistência de guildas funcionais claramente relacionadas à resistência à herbivoria impede generalizações que permitam a indicação, a priori, de um conjunto de espécies cujo perfil funcional lhes atribua maiores chances de sucesso em plantios de restauração florestal em situações nas quais a pressão exercida por formigas cortadeiras é elevada. 1.6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVARES, C. A. et al. Köppen’s climate classification map for Brazil. Meteorologische Zeitschrift, v. 22, n. 6, p. 711–728, 1 dez. 2013. 39 BARRER, P.M; CHERRETT, J.M. Some factors affecting the site and pattern of leaf- cutting activity in the ant Atta cephalotes L. Journal Entomology, v.47, p.15-27, 1972. BEGON, M.; TOWNSEND, C. R.; HARPER, J. L. Ecology: From Individuals to Ecosystems. 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Journal of Tropical Ecology, v. 23, n. 04, p. 501, 2 jul. 2007. 43 CAPÍTULO 2 ACLIMATAÇÃO E TAMANHO DE MUDAS NÃO INFLUENCIAM O IMPACTO DA HERBIVORIA POR FORMIGAS CORTADEIRAS SOBRE MUDAS DE ESPÉCIES ARBÓREAS 2.1 INTRODUÇÃO Formigas cortadeiras são os herbívoros dominantes da região Neotropical (WIRTH et al. 2003; CORRÊA et al. 2010). Ao cortarem material vegetal fresco, as formigas cortadeiras afetam diretamente a sobrevivência das espécies vegetais que compõem as comunidades, agindo assim como engenheiras do ecossistema. Formigas cortadeiras interferem nas trajetórias sucessionais da floresta (SILVA et al. 2012) e estudos mostram que o efeito do forrageamento aumenta em ambientes modificados/perturbados (URBAS 2007;FARJI-BRENER, 2001). A saúva-limão (Atta sexdens rubropilosa) é considerada uma praga com grande impacto na agricultura e silvicultura e muito estudos são voltados a encontrar métodos de controle dessa e de outras espécies de formigas cortadeiras (FORTI; ANDRADE; RAMOS, 200). O desafio, geralmente, está em evitar o problema ou mitigar os impactos causados pelas formigas. A herbivoria é uma das principais causas de redução na sobrevivência e no crescimento das plântulas, provocando um efeito negativo na sua capacidade fisiológica de adquirir energia (MARON; KAUFFMAN, 2006). Por esta razão, manuais de restauração de ecossistemas geralmente trazem, entre as recomendações técnicas, a necessidade de controle de formigas cortadeiras (DURIGAN; NOGUEIRA, 1990; STURION, BELLOTE, 2000; NEPSTAD et al. 2007; NAVE e BRANCALION, 2009; DURIGAN et al. 2010; 2011; GUERIN e ISERNHAGEN, 2013) Estudos em busca de compreender a vulnerabilidade das espécies vegetais à herbivoria por formigas indicam que formigas cortadeiras concentram suas coletas em espécies pioneiras (FARJI-BRENER, 2001; FALCÃO, 2004), que têm menos defesas químicas (URBAS, 2005) e maiores taxas de nutrientes nas folhas (FARJI-BRENER, 2001). Além disso, formigas cortadeiras têm preferência por folhas jovens (CHERRETT 1972; KURSAR; COLEY, 2003), que são mais macias e mais fáceis de cortar. Folhas 44 jovens são mais herbivoradas também por conterem menos defesas químicas do que folhas maduras (GHAZOUL; SHEIL, 2010). Além dos aspectos funcionais, estudos já existentes indicam que a taxa de sobrevivência de mudas atacadas por formigas cortadeiras está relacionada com o tamanho da mudas. Vasconcelos; Cherrett (1997) demonstraram que a chance de sobrevivência aumenta em mudas maiores, indicando que há um estágio de desenvolvimento da planta que afeta diretamente a herbivoria por formigas cortadeiras. Essas observações têm respaldado recomendações de controle de formigas nas etapas iniciais da restauração (NAVE e BRANCALION, 2009; DURIGAN et al. 2010; 2011). Há evidências de que a frequência de ataques é maior no período subsequente ao plantio (BOARETTO; FORTI, 1997), de modo que se espera que mudas aclimatadas sejam menos atacadas do que mudas recém plantadas. Neste capítulo, visando elucidar aspectos relativos ao porte das mudas e à aclimatação que possam aprimorar as técnicas de restauração, testamos duas hipóteses: Hipótese III: Mudas recém plantadas são mais atacaadas por formigas cortadeiras do que mudas aclimatadas. Hipótese IV: A resistência à herbivoria é dependente do tamanho das plantas, sendo mais vulneráveis as mudas menores, dentro de uma mesma espécie, em plantio de restauração. 2.2 MATERIAL E MÉTODOS 2.2.1 Área de estudo O estudo foi desenvolvido em área onde foi efetuado, em 1990, plantio de restauração da floresta ripária do Córrego Tarumã, localizada na Fazenda Canaçu (22°47'50.7"S 50°35'08.8"W), município de Tarumã, estado de São Paulo (Figura 3, página 32). O clima regional é do tipo Cfa – temperado úmido com verão quente (ALVARES et al., 2013) e temperatura média anual entre 20° C e 22° C. A temperatura nos meses mais frios varia de -3ºC a 18ºC e nos meses mais quentes é superior a 22º C. O solo é do tipo Latossolo Roxo Eutrófico em toda a propriedade e a precipitação média anual varia entre 1300 e 1600 mm (COSTA, 2008). Em meados de 2012, foi aberta, no interior da floresta em restauração, uma clareira com área aproximada de 500 m², na qual instalamos o experimento de que trata o presente 45 estudo. Toda a vegetação existente na clareira foi eliminada, predominantemente gramíneas invasoras, e até mesmo indivíduos regenerantes de espécies nativas, visando homogeneizar a condição da área experimental. 2.2.2 Desenho experimental Dois aspectos relacionados com o manejo são abordados neste capítulo: a aclimatação das mudas e o tamanho das mudas como possíveis fatores influenciando, respectivamente, a frequência de ataques e a mortalidade das mudas. Cada um desses aspectos envolveu desenho experimental, coleta de dados e análises distintos. 2.2.2.1 Aclimatação Para testar a hipótese de que mudas aclimatadas são menos atacadas por formigas cortadeiras, instalamos um experimento fatorial com três níveis de variação: tratamentos (mudas aclimatadas ou não), espécies (20 espécies nativas) e blocos (cinco), como esquematizado na Figura 10. A área de plantio (50 x 8 m) foi dividida em cinco blocos, cada um com duas parcelas (4 x 10 m). Cada parcela compreendeu 40 mudas, sendo duas de cada espécie, aleatoriamente distribuídas, plantadas em espaçamento 1 x 1 m, reproduzindo a densidade em que as plantas com altura a partir de 50 cm ocorrem em florestas nativas da região (SUGANUMA, 2013). Figura 10: Croqui da área experimental, com a disposição das parcelas de cada tratamento. Tratamento A: mudas aclimatadas e Tratamento B: mudas não aclimatadas. 46 Os tratamentos comparados foram os seguintes: A. Mudas aclimatadas: dentro deste tratamento, imediatamente após o plantio, todas as mudas receberam aplicação de uma substância pegajosa (TangleFoot®), que evita a subida das formigas pelo caule. Após 30 dias (período de aclimatação), o produto protetor foi retirado, de modo que as mudas passaram a ficar expostas às formigas apenas após esse período. B. Mudas não aclimatadas: não receberam nenhuma proteção contra herbivoria, ficando expostas às formigas desde o dia em que foram plantadas. 2.2.2.2 Tamanho de mudas Par