THALES MALUF Análise comparativa de custos e técnicas de perfuração de poços para a produção de água, energia geotérmica, petróleo e gás natural Guaratinguetá - SP 2022 Thales Maluf Análise comparativa de custos e técnicas de perfuração de poços para a produção de água, energia geotérmica, petróleo e gás natural Trabalho de Graduação apresentado ao Conselho de Curso de Graduação em Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia e Ciências do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do diploma de Graduação em Engenharia Mecânica. Orientador: Prof. Dr. Nazem Nascimento Coorientador: Prof. Dr. Mauro Hugo Mathias Guaratinguetá - SP 2022 THALES MALUF ESTE TRABALHO DE GRADUAÇÃO FOI JULGADO ADEQUADO COMO PARTE DO REQUISITO PARA OBTENÇÃO DO DIPLOMA DE “GRADUADO EM ENGENHARIA MECÂNICA” APROVADO EM SUA FORMA FINAL PELO CONSELHO DE CURSO DE GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA MECÂNICA Prof. Dr. Celso Eduardo Tuna Coordenador BANCA EXAMINADORA: Prof. Dr. NAZEM NASCIMENTO Orientador(a)/UNESP-FEG Prof. Dr. DIUNAY ZULIANI MANTEGAZINI Membro Externo Eng. GUNNAR JUNQUEIRA DE SOUZA LIMA Membro Externo Dezembro/2022 DADOS CURRICULARES THALES MALUF NASCIMENTO 24.07.1999 – São Paulo / SP FILIAÇÃO Luís Flávio Maluf Nery Fátima Regina Muassab Maluf 2017/2023 Curso de Graduação em Engenharia Mecânica Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - Campus de Guaratinguetá Este trabalho é dedicado aos meus pais, Luís Flávio e Fátima, que sempre me apoiaram, e aos meus tios Carlos Alberto Muassab e José Roberto Muassab. AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer, primeiramente, à minha família por todo o suporte, toda a compreensão e todo o esforço que por eles foi realizado para que eu pudesse estar aqui, concluindo um curso de graduação em uma instituição como a UNESP. Gostaria de agradecer, especialmente, à minha mãe Fátima e ao meu pai Luís Flávio, por participarem mais ativamente e trabalharem incansavelmente para que eu pudesse concluir essa etapa da minha vida. Agradeço ao meu orientador, o Prof. Dr. Nazem Nascimento, pela contribuição para a conclusão deste trabalho, além da contribuição para minha formação como profissional, não apenas com informações de caráter técnico, mas também com informações de caráter pessoal e profissional que foram fundamentais em minha formação como engenheiro. Por fim, gostaria de agradecer o apoio financeiro da ANP, FINEP e MCTI, que através do programa PRH 34.1 FEG/UNESP, providenciaram os recursos necessários para que eu pudesse redigir o presente trabalho. Este trabalho tem o apoio financeiro da ANP, FINEP e MCTI, através do programa PRH 34.1 FEG/UNESP. “The greatest successes come from having the freedom to fail.” Mark Zuckerberg RESUMO O desenvolvimento da sociedade atual depende diretamente da exploração de recursos naturais e utilização destes em diferentes áreas, desde consumo direto para a realização de atividades cotidianas, até a produção de energia. Alguns desses recursos merecem destaque por sua vital importância para o funcionamento da sociedade, como é o caso da água subterrânea, do petróleo e do gás natural, e outros merecem atenção por representarem soluções alternativas em algumas situações, inclusive no que se refere à produção de energia, como é o caso da geotermia. Apesar de diferentes em sua essência, todos os recursos mencionados apresentam uma característica em comum: todos são extraídos do subsolo por meio da perfuração de poços. Nesse sentido, o trabalho desenvolvido tem o intuito de ampliar o conhecimento acerca dos processos de exploração através da realização de uma análise comparativa de custos e técnicas de perfuração de poços para a produção desses recursos. Tal análise foi baseada na revisão bibliográfica de fontes relevantes que abordavam não apenas aspectos técnicos dos processos de exploração tais como equipamentos empregados, métodos de perfuração utilizados, características do procedimento de completação e bombeamento, mas também características particulares de caráter químico e físico de cada um dos elementos. A partir dessa análise, foram observadas similaridades em termos de mecanismos de perfuração, porém, por conta de diferenças de propriedades entre os recursos, existem algumas particularidades em cada um dos processos, principalmente no que diz respeito à métrica dos poços (profundidade mais especificamente) e nos materiais que compõem equipamentos e outros elementos, o que refletiu diretamente nos custos associados. Desse modo, foi observado que as propriedades físicas e químicas dos recursos associadas diretamente ao seu processo de formação e armazenamento no subsolo, interferem diretamente no seu processo exploratório. PALAVRAS-CHAVE: Recursos Naturais; Energia; Subsolo; Exploração ABSTRACT The development of today's society depends directly on the exploitation of natural resources and their utilization in various fields, ranging from direct consumption in daily activities to energy production. Among these resources, certain ones stand out due to their vital importance for societal development, such as groundwater, oil, and gas whereas others warrant attention for representing alternative solutions in specific situations, particularly for energy production, such as geothermal systems. Despite their differences in essence, all the resources mentioned share a common characteristic: they are extracted from underground sources through well drilling. Given this context, the purpose of this work is to broaden our understanding of exploration processes through a comparative analysis of drilling costs and techniques associated with the production of these resources. This analysis is rooted in a comprehensive review of pertinent literature sources, which not only assess the technical aspects of exploration processes—such as the equipment employed, drilling methods used, completion characteristics, and pumping procedures—but also delve into the chemical and physical attributes of each element. Through this analysis, similarities have emerged in terms of drilling mechanisms. However, owing to the varying properties of the resources, distinct nuances are present in each process. This is especially evident in factors such as well metrics (specifically depth) and the materials used in equipment, both of which directly impact the associated costs. Consequently, it becomes apparent that the physical and chemical properties of these resources, intrinsically linked to their formation and storage underground, exert a direct influence on their exploratory processes. KEYWORDS: Natural Resources; Energy; Underground; Exploration LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Distribuição de água doce no planeta..................................................................19 Figura 2 – Distribuição da utilização das águas subterrâneas no Brasil em 2018................20 Figura 3 – Processo de formação dos recursos geotérmicos.................................................22 Figura 4 – Etapas da perfuração de poços para a extração de recursos................................26 Figura 5 – Estrutura perfuratriz para percussão....................................................................31 Figura 6 – Sonda de perfuração rotativa...............................................................................33 Figura 7 – Imagem ilustrativa de um martelo DTH..............................................................35 Figura 8 – Tipos de broca......................................................................................................37 Figura 9 – Tipos de completação..........................................................................................42 Figura 10 – Estrutura dos poços............................................................................................58 Figura 11 – Processo de construção do poço petrolífero e geotérmico.................................59 Figura 12 – Estruturação de poços para a exploração de petróleo, gás e geotermia.............60 Figura 13 – DTH button bit...................................................................................................66 Figura 14 – Classificação da completação quanto ao número de zonas exploradas.............77 Figura 15 – Bomba manual...................................................................................................78 Figura 16 – Sistemas de bombeamento mecânico/elétrico...................................................79 Figura 17 – Estrutura de bombeio mecânico.........................................................................80 Figura 18 – Análise de custo por metro perfurado................................................................83 Figura 19 – Custos de perfuração em função da profundidade perfurada............................84 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Classes API de cimento Portland......................................................................... 40 Quadro 2 – Estudo comparativo de propriedades................................................................... 47 Quadro 3 – Estudo comparativo da perfuração de poços e extração dos recursos.................. 54 Quadro 4 – Associação entre métodos de perfuração e tipos de solo perfurado..................... 64 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Composição percentual do petróleo...................................................................... 49 Tabela 2 – Custos de perfuração de poços para a extração de petróleo e gás......................... 82 Tabela 3 – Custos de perfuração para a extração de energia geotérmica................................ 82 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABCP Associação Brasileira de Cimento Portland ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas ABPG Associação Brasileira de Petróleo e Gás API American Petroleum Institute ASTM American Society for Testing and Materials BEN Balanço Energético Nacional BOP Blowout preventer BP PLC Brittish Petroleum Company PLC CEI Cornell Energy Institute CETESB Companhia Ambiental do Estado de São Paulo CMC Carboxi Metil de Celulose CPRM Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais CTOG Custo total para a construção de poços para extração de petróleo e gás CTG Custo total para a construção de poços para extração de energia geotérmica DTH Down-the-hole EGS Enhanced Geothermal System EPE Empresa de Pesquisa Energética ESP Electrical Submersible Pump GLP Gás liquefeito de petróleo IGA International Geothermal Association IRENA International Renewable Energy Agency LSP Line Shaft Pump OECD Organization for Economic Co-operation and Development PDC Polycristalline diamond compacts PGT Petroleum Geoscience Technology PM Profundidade medida PVC Polyvinyl chloride ROP Rate of penetration TSP Thermally stable polycrystalline LISTA DE SÍMBOLOS °C graus Celsius kg quilograma t tonelada °API graus API m metros cm centímetros km quilômetros “ polegadas US$ dólares americanos SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................. 17 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................... 19 2.1 ÁGUA SUBTERRÂNEA ................................................................................... 19 2.2 ENERGIA GEOTÉRMICA ................................................................................ 21 2.3 PETRÓLEO E GÁS NATURAL .......................................................................... 25 2.4 FUNDAMENTOS DA EXPLORAÇÃO E PERFURAÇÃO ............................... 26 2.4.1 Estudo da geologia ............................................................................................. 27 2.4.2 Design do poço ................................................................................................... 29 2.4.3 Perfuração .......................................................................................................... 29 2.4.3.1 Métodos de perfuração ....................................................................................... 30 2.4.3.1.1 Método percussivo .............................................................................................. 31 2.4.3.1.2 Métodos rotativos ............................................................................................... 32 2.4.3.1.3 Método rotopercussivo ....................................................................................... 34 2.4.3.2 Brocas .................................................................................................................. 35 2.4.3.3 Fluidos de perfuração .......................................................................................... 37 2.4.4 Revestimento ...................................................................................................... 38 2.4.5 Cimentação ......................................................................................................... 39 2.4.6 Completação ....................................................................................................... 41 2.4.7 Sistemas de elevação ........................................................................................... 42 3 METODOLOGIA .............................................................................................. 44 3.1 MÉTODOS PARA A ANÁLISE COMPARATIVA DE TÉCNICAS DE PERFURAÇÃO ..................................................................................................................... 44 3.2 MÉTODOS PARA A ANÁLISE COMPARATIVA DE CUSTOS .................... 44 4 ANÁLISES COMPARATIVAS ....................................................................... 46 4.1 COMPARAÇÃO DE CARACTERÍSTICAS DOS RECURSOS ....................... 47 4.1.1 Composição ......................................................................................................... 47 4.1.2 Formação ............................................................................................................. 49 4.1.3 Armazenamento .................................................................................................. 51 4.1.4 Meios de exploração ........................................................................................... 52 4.2 COMPARAÇÃO DE TÉCNICAS DE PERFURAÇÃO E EXTRAÇÃO ........... 53 4.2.1 Estudo da geologia .............................................................................................. 55 4.2.2 Estruturação do poço, profundidades e diâmetros ......................................... 57 4.2.3 Métodos de perfuração ...................................................................................... 63 4.2.4 Brocas .................................................................................................................. 66 4.2.5 Fluidos de perfuração ........................................................................................ 67 4.2.6 Revestimento ...................................................................................................... 69 4.2.7 Cimentação ......................................................................................................... 72 4.2.8 Completação ....................................................................................................... 74 4.2.9 Bombeamento ..................................................................................................... 77 4.3 COMPARAÇÃO DE CUSTOS DE PERFURAÇÃO ......................................... 81 5 CONCLUSÃO .................................................................................................... 86 5.1 CONCLUSÕES GERAIS .................................................................................... 86 5.2 RECURSOS HUMANOS .................................................................................... 88 REFERÊNCIAS ................................................................................................. 90 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ...................................................................100 APÊNDICE A .....................................................................................................102 APÊNDICE B .................................................................................................... 103 17 1 INTRODUÇÃO O desenvolvimento da sociedade atual gira em torno do montante de energia possuída e seu consequente consumo (GOLDEMBERG; VILLANUEVA, 2003). Com o passar dos anos, houve uma notória evolução na forma de se obter energia, o que passa diretamente pela obtenção de certos recursos naturais, que, além de servirem como matéria prima para a geração de energia, são empregados em diversas áreas essenciais para a manutenção da vida da população. Tais recursos naturais, definidos por Brito (2006) como recursos que se originam sem qualquer intervenção humana, englobam uma vasta gama de componentes, incluindo recursos minerais, recursos biológicos, recursos ambientais e recursos incidentes (LACERDA, 2014). De forma geral, são divididos em dois grandes grupos com base em sua capacidade de esgotamento: recursos naturais renováveis e não renováveis. Os recursos naturais renováveis são os recursos naturais que, após serem explorados, podem voltar para seus níveis de estoque anteriores por um processo natural de crescimento ou reabastecimento, sendo a sua manutenção na natureza definida pela forma e pela intensidade com que são explorados (OECD, 2022). Dentre os diversos recursos naturais renováveis existentes, pode-se citar a luz solar, vento, vegetais, água subterrânea, fontes geotérmicas, dentre outros. Já os recursos naturais não renováveis consistem nos que não podem ser realocados no meio ambiente pelo homem ou renovados pelo próprio ambiente após sua exploração, correndo risco de deixarem de existir se explorados de maneira desequilibrada (OECD, 2022). Dentre os recursos não renováveis existentes, pode-se mencionar o petróleo e o gás natural. Nesse trabalho, serão abordados tanto recursos naturais renováveis (água subterrânea e as fontes geotérmicas) quanto não renováveis (petróleo e gás natural). Apesar de classificados em categorias diferentes, esses recursos apresentam uma característica em comum: todos podem ser encontrados em reservatórios naturais profundos no subsolo. Desse modo, para que esses elementos sejam explorados e devidamente aproveitados, torna-se necessário o acesso ao subsolo através do processo de perfuração de poços que, por sua vez, exige uma preparação adequada e equipamentos capazes de permitir a ocorrência dessa extração (FANCHI; CHRISTIANSEN, 2017). No entanto, a perfuração de poços e todos os processos posteriores que visam sua adequação para a extração de recursos, envolvem técnicas complexas, diferentes materiais e diferentes equipamentos, tornando-se necessário um estudo que defina a configuração mais apropriada e benéfica para se empregar em cada situação. Portanto, com o intuito de 18 verificar os padrões de perfuração de poços para a extração de água subterrânea, energia geotérmica, petróleo e gás natural, e associar esses padrões às características particulares de cada um desses recursos e dos reservatórios onde são armazenados, de modo ampliar a área de conhecimento acerca do tema, o trabalho realizará uma comparação de ordem técnico- econômica entre esses procedimentos. 19 97% 2% 1% Água Salgada Água Congelada Água Doce (a) (b) 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 ÁGUA SUBTERRÂNEA A importância da água para a sociedade e para as relações biológicas existentes no planeta é um assunto amplamente discutido na atualidade. Apesar de apresentar grande importância para a geração de energia, representando, de acordo com o Balanço Energético Nacional referente ao ano de 2020 disponibilizado pela Empresa de Pesquisa Energética (2021), cerca de 65,2% de toda a energia elétrica e 12,6% de toda a energia primária produzida no Brasil, sua atuação não se restringe apenas a isso. A água tem participação nas mais diversas esferas da sociedade, tais como desenvolvimento agrícola e industrial, composição bioquímica dos seres vivos, produção de bens de consumo e até como fator representativo de valores sociais e culturais. No entanto, por ser um recurso que tem um reabastecimento controlado pela natureza através do ciclo hidrológico, muitas vezes é alvo de explorações mal planejadas que comprometem a integridade e a disponibilidade do recurso para uso. A água subterrânea é definida como água que circula entre espaços vazios de rochas e sedimentos abaixo da superfície (FARACINI, 2014). Embora, de modo geral, não seja uma fonte energética de elevado potencial, os reservatórios de água subterrânea são considerados como uma das principais fontes de água doce disponíveis. A Figura 1 a seguir mostra a distribuição atual da água no planeta. Figura 1 – Distribuição de água no planeta: (a) Ocorrência de água no planeta; (b) Disponibilidade de água doce no planeta Fonte: Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (2022) 2% 98% Superificiais Subterrânea 20 Através da Figura 1 (a) é possível observar que apenas 1% de toda água do planeta é composta por água doce disponível para consumo, enquanto a Figura 1 (b) mostra que, desse 1%, cerca de 98% estão disponíveis em reservatórios subterrâneos. Portanto, esse recurso se apresenta como uma alternativa extremamente atraente para o abastecimento, sendo captado a partir da perfuração de poços tubulares profundos e poços artesianos (CETESB, 2022). O uso da água subterrânea é consideravelmente diverso, podendo ser explorado de diferentes maneiras. Tomando o Brasil como exemplo, segundo a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), o uso das águas presentes no subsolo no ano de 2018 estava distribuído conforme ilustrado na Figura 2. Figura 2 – Distribuição da utilização das águas subterrâneas no Brasil em 2018 Fonte: CPRM (2018) Através da Figura 2 é possível verificar que a água subterrânea faz parte dos mais diversos setores dentro da sociedade, tendo participação tanto no setor de produção de alimentos através da agricultura e pecuária, no consumo diário por parte da população, na produção industrial, nos sistemas de saneamento, no lazer, dentre outras áreas. Também é possível perceber que há um predomínio do uso da água subterrânea para consumo humano, representado na Figura 2 pelo abastecimento doméstico e pelo abastecimento público urbano, o que é um reflexo da Política Nacional dos Recursos Hídricos, estabelecida pela lei nº 9.433 de 1997, a qual apresenta como uma de suas diretrizes, a água como bem econômico de domínio público e de uso prioritário para consumo humano (HAGER; D´ALMEIDA, 2008). Ademais, vale ressaltar que a utilização da água subterrânea no 24% 14% 30% 18% 10% 4% Agricultura/Pecuária Abastecimento múltiplo Abastecimento doméstico Abastecimento público urbano Abastecimento industrial Outros (lazer, etc.) 21 Brasil ocorre como fonte alternativa ou complementar de água em caso de falhas no abastecimento público, se constituindo como uma alternativa mais econômica do que o uso das águas fornecidas pelos serviços públicos (HIRATA; FERNANDES; BERTOLO, 2016). 2.2 ENERGIA GEOTÉRMICA A energia geotérmica, de acordo com Anjos (2018), consiste em uma alternativa energética relacionada ao calor proveniente das camadas mais interiores da terra, que atinge as camadas mais superficiais em função de mecanismos de transferência de calor, tais como a condução e a advecção. A condução, descrita matematicamente pela lei de Fourier, está relacionada à propagação de movimentos atômicos ou moleculares sem o movimento geral do meio ou fluido onde ocorre, enquanto a advecção consiste em um processo de transposição de energia movendo um fluido que contém energia (FITTS, 2015). Nas regiões mais próximas do núcleo externo mais líquido, a transferência se dá por advecção, enquanto na crosta terrestre o calor flui principalmente por condução em uma taxa constante, por conta da condutividade térmica constante dos materiais que a compõe. Desse modo, é criado um gradiente geotérmico (variação de temperatura em função da profundidade) que é essencial de ser determinado na exploração geotérmica (FITTS, 2015). Através desses dois principais mecanismos de transferência de calor que ocorrem na subsuperfície, e de outros mecanismos menos significantes, o calor proveniente do núcleo terrestre atinge camadas próximas à crosta terrestre alcançando regiões de aquíferos subterrâneos alterando a temperatura das águas e provocando, possivelmente, alterações de estado, originando-se o vapor. Essa água quente ou vapor gerado em detrimento a esse processo, pode ficar preso em rochas porosas cercadas por rochas impermeáveis, dando origem aos reservatórios geotérmicos. Desse modo, a extração de vapor e água quente aquecidos pelo calor da terra, quando não há a manifestação espontânea na superfície terrestre como no caso dos hot springs e dos gêiseres, exige uma perfuração desses reservatórios geotérmicos e, por vezes, a perfuração de poços de injeção de água quando a fonte natural de água subterrânea não disponibiliza o volume de água suficiente para extração (BLODGETT; SLACK, 2009). O processo de formação e fluxo dos recursos geotérmicos são ilustrados pela Figura 3. 22 Figura 3 – Processo de formação dos recursos geotérmicos Fonte: Blodgett e Slack (2009) Através da Figura 3 é possível observar que a água proveniente da precipitação adentra o solo, sendo armazenada em regiões que, quando sujeitas à ação do calor da terra, permitem o aquecimento dessa água que pode ser armazenada ou ascender diretamente à superfície, a depender da permeabilidade do solo onde fica armazenada. Segundo Reis (2019), o vapor e a água quente extraídos dos reservatórios geotérmicos são destinados a três usos principais: uso direto, geração de energia elétrica em centrais geotérmicas e controle térmico de ambientes através das bombas de calor. O uso direto dos recursos geotérmicos seria o aproveitamento do vapor e da água quente de forma direta tanto para aquecimento de ambientes, estufas, lagos de aquicultura e piscinas termais, quanto para secagem agrícola, derretimento de neve, dentre outros usos (LUND; BOYD, 2016). Para uso direto, a fonte geotérmica não necessariamente precisa apresentar uma temperatura extremamente elevada, de modo que a exploração de fontes de baixa e média entalpia (temperaturas de armazenamento variando entre 50 °C e 150 °C) é suficiente para essa finalidade (CONFESSOR; SILVA; SOUZA, 2020; SINGHAL; GUPTA, 2010). Já o uso de recursos geotérmicos para a geração de energia elétrica consiste no direcionamento dos vapores extraídos para as centrais geotérmicas através de tubulações, destinando-os para o acionamento das turbinas. As turbinas convertem a energia do vapor de alta pressão incidente em um movimento giratório no rotor, o qual transfere esse movimento a um alternador que é responsável por convertê-lo em energia elétrica direcionada à rede (REIS, 2019). É válido ressaltar que a exploração de geotermia para geração de energia elétrica exige que a fonte de extração dos recursos geotérmicos seja de 23 alta entalpia, ou seja, que a temperatura dos reservatórios alvos da exploração seja superior a 150 °C, sendo que quanto maior a temperatura, maior o potencial energético da fonte (SOUZA FILHO, 2012). Entretanto, diferentemente das fontes de baixa entalpia, as fontes de alta entalpia não são encontradas em qualquer lugar do planeta, mas apenas em zonas de intrusão magmática, representadas principalmente pelas regiões de transição de placas tectônicas, e regiões vulcânicas, o que torna a geração de energia elétrica a partir da geotermia limitada a certas regiões (CONFESSOR et al., 2020). O emprego da geotermia para o controle térmico de ambientes se dá através das chamadas bombas de calor (heat pumps). Essas bombas se baseiam em ciclos de refrigeração e são definidas como equipamentos mecânicos que retiram calor de um local e transferem para outro, através da circulação de água por tubos dispostos abaixo do solo e nos arredores dos prédios ou estabelecimentos a serem aquecidos. De maneira simplificada, para a geração de calor para o ambiente, a bomba promove a circulação de água por entre regiões de elevada temperatura no solo de modo a extrair o calor da terra e torná-lo disponível em outro local, que seria o ambiente que se deseja aquecer. Com a inversão do ciclo, a bomba de calor é capaz de retirar o calor do ambiente e transferi-lo para o subsolo (NEAVE, 2002; BLODGETT; SLACK, 2009). Apesar de ser um recurso natural cuja exploração ainda está em desenvolvimento e de não ser consolidado em diversos lugares do mundo, a energia geotérmica se apresenta como uma alternativa confiável e relativamente limpa para geração de energia elétrica e para aquecimento. Segundo Turgeon e Morse (2012), os recursos geotérmicos têm disponibilidade independente de fatores climáticos, o que significa que sua exploração pode ser feita em qualquer período do ano, além de seu uso envolver apenas baixas emissões de dióxido de enxofre, óxidos nítricos e particulados. Dentre os países que mais aproveitam a energia geotérmica como recurso, encontra-se a Islândia, que apesar de não ser o maior produtor, é o país em que a energia geotérmica tem a maior participação na matriz energética. Segundo IRENA (2021), cerca de 92% de toda a energia elétrica produzida na Islândia é proveniente de fontes renováveis, sendo que desses, 85% são extraídos de fontes geotermais, além de que a energia geotérmica é responsável por suprir mais de 90% da demanda de calor do país. Como consequência dessa aplicação, a qualidade do ar islandês foi considerada como sendo uma das melhores do mundo juntamente com a Finlândia, segundo um estudo publicado pela organização Greenpeace e a empresa de software AirVisual, no ano de 2019 (EUROPEAN WAY, 2019). Levando em consideração a exploração de energia geotérmica no Brasil, é possível 24 afirmar que apesar de o cenário apresentado ser de desenvolvimento, ainda é um cenário bastante discreto. Analisando-se o Balanço Energético Nacional (BEN) de 2022, referente ao ano de 2021 e disponibilizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), é possível observar que não há uma menção individualizada da energia geotérmica como participante da matriz elétrica do país, de modo que ela se mostra praticamente descartada considerando-se a produção total de energia elétrica. No entanto, por existirem esforços que visam garantir a viabilidade da aplicação dos recursos geotérmicos no país, tanto na área de geração de energia elétrica, quanto na produção para uso direto desde a década de 70, tornou-se possível o emprego da energia geotérmica em aplicações agrícolas, industriais e no turismo, especialmente em parques de fontes termais localizados em municípios como Caldas Novas (GO), Pirituba (SC), Olímpia (SP), Águas de Lindóia (SP) e Águas de São Pedro (SP) (ARBOIT et al., 2013). Segundo Castro et al. (2009) são dois os principais fatores que fazem com que o Brasil não apresente tanta eficiência na exploração e altas taxas de aproveitamento de recursos geotérmicos. O primeiro fator é a estabilidade da fonte primária de energia elétrica do país em função da abundância hídrica, associada à disponibilidade de outras fontes renováveis alternativas. O Brasil é um país com corpo hídrico extremamente extenso, de modo que as fontes hidráulicas representam mais da metade da oferta interna de energia elétrica do país. Segundo o Balanço Energético Nacional (BEN) de 2022 disponibilizado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), no ano de 2021, cerca de 56,8% da oferta interna de energia elétrica estava associada a fontes hidráulicas, 10,6% associados à energia eólica, 8,2% à biomassa e 2,47% à energia solar. Desse modo, por ter uma matriz elétrica bem estabelecida em recursos naturais renováveis, poucos são os incentivos que visam o desenvolvimento de novas fontes, dificultando o crescimento da exploração geotérmica no país. O segundo fator está diretamente relacionado às condições geológicas do país, uma vez que, em território brasileiro, as atividades tectônicas e magmáticas são praticamente inexistentes em tempos geológicos recentes, o que torna as fontes geotérmicas disponíveis na região depravadas de elevado conteúdo energético. Assim sendo, mesmo contendo um elevado volume de águas subterrâneas armazenadas em grandes aquíferos, o que representa uma enorme vantagem em termos de exploração de energia geotérmica, a exploração em território nacional esbarra em fontes de baixa entalpia, tendo que destinar sua exploração para aplicações diretas. 25 2.3 PETRÓLEO E GÁS NATURAL O petróleo é definido como uma mistura de hidrocarbonetos (cadeia de moléculas de carbono e hidrogênio) que pode ser encontrada nos estados líquido, sólido ou gasoso a depender das condições de temperatura e pressão a que são submetidos, apresentando traços de outros componentes como o enxofre, nitrogênio, oxigênio e metais (Fe, Ni, V, etc) (Selley e Sonnenberg, 2016). É classificado em função da porcentagem de hidrocarbonetos parafínicos, naftênicos e compostos aromáticos presentes em sua estrutura, o que é determinado pela matéria orgânica original e pelas variáveis termodinâmicas envolvidas no processo de formação (GARCIA BAUTISTA, 2008). Assim como o petróleo, o gás natural é um recurso natural não renovável composto por hidrocarbonetos e não hidrocarbonetos, porém de grupos física e quimicamente distintos (SELLEY; SONNENBERG, 2016). Os hidrocarbonetos que compõem o gás natural, à temperatura ambiente e pressão atmosférica, são predominantemente parafínicos leves com proporções consideravelmente menores de outros hidrocarbonetos de maior peso molecular, de modo que esse recurso é encontrado apenas em fase gasosa ou em solução juntamente do petróleo em reservatórios naturais de subsuperfície (LYRA, 2014; TEIXEIRA, 2015). Tanto o petróleo quanto o gás natural apresentam uma importância extremamente elevada para a sociedade em função do seu elevado conteúdo energético. De acordo com o Balanço Energético Nacional referente ao ano de 2020, disponibilizado pela Empresa de Pesquisa Energética (2021), o petróleo (44,8%) e o gás natural (13,6%) representaram cerca de 58,4% da produção total de energia primária consumida pela população brasileira, ou seja, os dois recursos são responsáveis por mais da metade da produção energética do país. No entanto, essa realidade não é restrita apenas ao cenário brasileiro. Embora muitas alternativas energéticas tenham sido buscadas como forma de solucionar a elevada emissão de gases poluentes em função da queima dos combustíveis fósseis, segundo o Statistical Review of World Energy 2022, disponibilizado pela British Petroleum Public Limited Company (2022), o petróleo (30,95%) e o gás natural (24,42%), em 2021, representaram cerca de 54,4% de toda a energia primária consumida pela população mundial. Desse modo, pode-se afirmar que tais recursos são os maiores responsáveis pela produção e consumo de energia primária no mundo. Entretanto, é necessário ressaltar que o petróleo bruto não tem aplicação direta. É necessário que, após ser extraído, o petróleo passe por um processo de variação contínua de 26 pressão e temperatura, conhecido como refino, de modo que possam ser extraídos produtos derivados, tais como gasolina, GLP, querosene, lubrificantes, asfalto, nafta, propano, dentre outros (ISSA, 2015; ANP, 2021). Assim sendo, por conta dos variados tipos de derivados que podem ser obtidos do petróleo bruto, sua aplicação vai além da queima para a geração de energia para a movimentação de automóveis, trens, aviões e navios. Derivados do petróleo são empregados também na pavimentação de estradas, na lubrificação de máquinas, na produção de plásticos, fibras, borrachas, tintas, cosméticos, dentre outros produtos, o que faz com que esse recurso assuma um valor econômico muito significativo (FARAH, 2013). O gás natural, por sua vez, é utilizado no setor industrial, tanto em segmentos de produção de ferro, aço, papel, dentre outros produtos, quanto como fonte de energia elétrica para aquecimento e climatização de ambientes; é utilizado também no setor domiciliar e comercial sendo utilizado para a cocção de alimentos, climatização de ambientes e aquecimento da água; é usado no setor de transporte, como substituto do etanol e da gasolina em veículos leves, e como substituto do óleo diesel em veículos pesados e embarcações; e também é usado no setor de cogeração, onde auxilia na produção de energia elétrica a partir da sua queima associada a uma turbina a gás ligada a um gerador, e na produção de energia térmica sendo utilizado como gás de exaustão para a alimentação de uma caldeira de recuperação (TEIXEIRA, 2015). 2.4 FUNDAMENTOS DA EXPLORAÇÃO E PERFURAÇÃO O processo de perfuração de poços e a exploração dos recursos naturais armazenados em reservatórios subterrâneos possuem particularidades em função das características geológicas dos reservatórios e das características físico-químicas dos próprios recursos. No entanto, passam, em geral, por uma mesma sequência de procedimentos, a qual é ilustrada pela Figura 4. Figura 4 – Etapas da perfuração de poços para a extração de recursos Fonte: Elaborado pelo autor Estudo da Geologia Design do Poço Perfuração Revestimento Cimentação Completação Bombeamento 27 2.4.1 Estudo da Geologia Primeiramente, para que seja realizada a exploração de recursos subterrâneos em um determinado local, é necessário que se tenha um conhecimento acerca da região que se deseja explorar e da localização exata do reservatório. Para isso, são realizados estudos de propriedades geológicas e geofísicas das formações que se deseja explorar, as quais são capazes de fornecer informações acerca das áreas mais prováveis de armazenamento do recurso desejado e gerar estimativas para a perfuração de poços, indicando a viabilidade da exploração (THOMAS, 2001; KANA et al., 2014). De modo geral, a exploração se inicia com um estudo da geologia do local, o qual envolve um mapeamento geológico através de técnicas específicas como: a fotogeologia, que se refere a fotografias aéreas de dobras, falhas e mergulhos das camadas geológicas visíveis; aerofotogrametria, que envolve fotografias aéreas dos terrenos a partir de um avião carregado com equipamentos; e análise da geologia de subsuperfície (MANZELLA, 1999; THOMAS, 2001). Em alguns casos, a coleta de informações é realizada por meio da perfuração de poços pioneiros, embora seja um procedimento relativamente custoso. Realizados os estudos geológicos da região onde a exploração irá ocorrer, inicia-se a série de estudos acerca das características geofísicas das formações a partir de procedimentos experimentais. O principal intuito desse estudo é a verificação do perfil da formação quanto à algumas propriedades como condutividade elétrica, propriedades elásticas, suscetibilidade magnética, temperatura, dentre outras. Tais propriedades podem auxiliar na identificação da composição de cada camada rochosa do subsolo, e na determinação de importantes propriedades como espessura das camadas, porosidade, prováveis fluidos nos poros, dentre outras informações (MANZELLA, 1999; THOMAS, 2001). Os métodos geofísicos são divididos em dois grandes grupos: os métodos diretos e os indiretos. Os métodos diretos fornecem informações sobre parâmetros influenciados diretamente pela presença do recurso em análise, sendo usualmente executados durante a perfuração ou através da perfuração de poços exploratórios por meio do uso de uma sonda inserida no interior do poço. Esses métodos também são conhecidos como métodos de avaliação da formação, ou métodos de perfilagem geofísica que garantem uma imagem visual que correlaciona uma certa característica da formação em função da profundidade. Os principais exemplos de perfis existentes são: a perfilagem por raios gama, que consiste nos pulsos emitidos pela radiação natural emitida por elementos como urânio, tório e 28 potássio presentes nas rochas através de um cintilômetro; a perfilagem por métodos elétricos, que definem a condutividade das rochas, ou a resistência à passagem de corrente elétrica através de um pacote de rocha localizado entre eletrodos, podendo variar de acordo com o número de eletrodos empregados e o modo de arranjá-los na sonda; o método de potencial espontâneo, que consiste na medição da difusão de cargas elétricas devido a presença de fluidos e outros compostos eletrolíticos dentro das camadas porosas, ou seja, faz a medição da diferença de potencial entre a superfície e o interior do poço, auxiliando em cálculos relativos à porosidade e à permeabilidade da formação; perfilagem por indução, cujo princípio físico tem por base o acoplamento indutivo entre bobinas e rochas, isto é, através de bobinas, é induzido um campo eletromagnético variável que penetra radialmente as camadas vizinhas, permitindo a identificação da condutividade dessas camadas; perfilagem sônica, que consiste em um método para se obter a porosidade dos aquíferos medindo o tempo de propagação de uma onda acústica por um determinado espaço de rocha; o perfil neutrônico, que é utilizado para a detecção da porosidade, litologia e presença de hidrocarbonetos leves, através do bombardeamento de nêutrons na formação e medição de nêutrons termais da rocha; e o perfil de densidade, que permite não só a definição da densidade, mas também da porosidade e das zonas de gás através da detecção de raios gama defletidos por elétrons orbitais dos elementos componentes das rochas (FEITOSA et al., 2008; MORAIS, 2014; THOMAS, 2001). Já os métodos indiretos fornecem informações mais gerais sobre a geologia, tendo a capacidade de evidenciar a existência de reservatórios com precisão. Geralmente são empregados anteriormente à perfuração dos poços, com o auxílio de alguns equipamentos especiais de medição. Os principais métodos indiretos que podem ser mencionados são: o método gravimétrico, que está associado à detecção da variação da densidade na subsuperfície, de modo a tornar possível a estimativa de espessura dos sedimentos, identificar a presença de certas rochas, especialmente rochas magmáticas localizadas em fontes de calor, e avaliar a capacidade de recarga dos reservatórios; a prospecção magnética, que consiste na verificação da intensidade magnética das regiões, de modo a ser útil na identificação de rochas magnéticas, rochas ígneas e bacias sedimentares; e os métodos sísmicos, que podem ser tanto de refração quanto de reflexão, baseando-se na análise da propagação de ondas elásticas emitidas ao subsolo através de fontes artificiais, e que são capazes de prever a profundidade e a espessura de uma formação geológica específica (ARETOUYAP et al., 2016; KANA et al., 2014; THOMAS, 2001). Os métodos indiretos e diretos podem ser empregados tanto individualmente, quanto em conjunto, garantindo um 29 maior detalhamento das informações coletadas (THOMAS, 2001). 2.4.2 Design do Poço Após o estudo prévio da região e determinação dos objetivos a serem alcançados com o processo de perfuração e construção do poço, a equipe de perfuração desenvolve o plano de perfuração, o qual compõe uma proposta que necessita ser aprovada pelo responsável pela administração do processo para que seja executado (PURBA et al., 2022). Nessa etapa são definidos parâmetros métricos como os diâmetros de perfuração, dos revestimentos e a profundidade estimada total e das seções (se o poço for construído em etapas). Além do método de perfuração a ser empregado, essa etapa envolve a definição de todos os elementos envolvidos no processo de perfuração, o que inclui o tipo de broca, a composição dos materiais utilizados no revestimento, o tipo de cimento e o método de cimentação a ser empregado, os elementos a serem usados na completação, os tipos e materiais das brocas, dentre outros fatores. No entanto, conforme a perfuração do poço é realizada e mais informações são coletadas, alguns desses fatores pré-definidos podem sofrer alterações visando uma melhoria na eficiência do processo. 2.4.3 Perfuração Após realizada a etapa de planejamento de construção do poço, inicia-se o processo de perfuração propriamente dito. A perfuração é o método mais efetivo de exploração de recursos subterrâneos e apesar de ser uma prática antiga, com registros de até 4000 anos atrás, vem se desenvolvendo continuamente, permitindo o acesso a regiões cada vez mais profundas e a extração de quantidades cada vez maiores dos recursos (FEITOSA et al., 2008; GIAMPÁ; GONÇALES, 2013). De modo geral, a perfuração de poços é realizada por uma estrutura denominada de sonda de perfuração, também chamada de sonda perfuratriz em alguns casos (THOMAS, 2001). Em essência, a sonda perfuratriz é composta por uma espécie de mastro ou torre de sustentação onde os componentes da coluna de perfuração são suspensos através de cabos e polias e conectados a um guincho que permite o movimento vertical da coluna. A alimentação do conjunto, na grande maioria das aplicações, é feita por uma fonte externa de energia que é responsável pelo funcionamento do sistema (SOULSBY, 2010). A coluna de perfuração é composta por um conjunto de tubos de composições distintas, conectados 30 entre si e conectados a um elemento responsável pela desagregação da formação rochosa, o qual pode ser uma broca, um trépano ou um martelo DTH. Segundo Plácido e Pinho (2009), as principais funções da coluna de perfuração são aplicar peso sobre a broca (WOB) (do inglês, Weight-on-bit), conduzir fluido de perfuração para o fundo do poço, garantir a direção desejada do poço e transmitir o movimento de rotação para a broca. Conceitualmente, as sondas de perfuração mais complexas são compostas por um conjunto de sistemas, os quais executam funções específicas ao mesmo tempo que funcionam em conjunto para a realização da perfuração de poços e para permitir o acesso a reservatórios subterrâneos (MALOUF, 2013). Os sistemas que compõem as sondas de perfuração podem variar de acordo com o método de perfuração que se decidiu empregar e de acordo com o recurso que está sendo explorado. Segundo Thomas (2001), as sondas de perfuração mais empregadas para a perfuração de poços de elevada profundidade são formadas por um sistema de sustentação, um sistema de geração e transmissão de energia, um sistema de movimentação de carga, um sistema de rotação (pode não existir, como no caso de perfurações percussivas), um sistema de circulação de fluidos, um sistema de segurança do poço e um sistema de monitoramento. Apesar de existirem algumas diferenças específicas em função do método de perfuração executado, do tipo de solo e do recurso que está sendo explorado, o processo de perfuração segue um procedimento bem definido. Nos sistemas convencionais, quando os motores das sondas são acionados, o sistema de transmissão de energia transporta essa energia para a coluna de perfuração, gerando o movimento da coluna. A partir desse movimento e do peso que a coluna de perfuração aplica sobre o elemento responsável pela ruptura da rocha (broca, trépano ou martelo DTH) localizado em sua extremidade, a fratura da rocha é realizada. Durante a realização da perfuração, é bombeado um fluido pelo interior ou pela parte externa da coluna de perfuração, conhecido como fluido de perfuração, o qual alcança o interior do poço de modo a resfriar e lubrificar a coluna de perfuração e a broca, facilitar o processo de desagregação das rochas e transportar os cascalhos do fundo do poço. Esse fluido, após retirado do interior do poço, é captado e tratado pelo sistema de circulação para ser reutilizado no processo (BARBOSA, 2019). 2.4.3.1 Métodos de perfuração São 3 os principais métodos de perfuração historicamente empregados: o método percussivo, os métodos rotativos e os métodos rotopercussivos. 31 2.4.3.1.1 Método percussivo O método percussivo promove a perfuração da formação rochosa por sucessivos golpes efetuados por um conjunto de ferramentas composto por porta-cabo, percussor, haste e trépano, com peso total variando entre 800 e 1000 kg, que executa movimentos verticais ascendentes e descendentes continuamente (GIAMPÁ; GONÇALES, 2013). Esse conjunto de ferramentas é suspenso por um cabo enrolado sobre um carretel ou tambor, e o acionamento do conjunto geralmente é feito por motores a diesel. Esse método é mais indicado para a perfuração de rochas sedimentares consolidadas, embora também possa ser realizado em rochas sedimentares inconsolidadas e em formações cristalinas, exige um fluxo constante de fluidos de perfuração, se limita a profundidades de até 200 m e é um processo relativamente lento, o que tornou rara sua utilização na atualidade (GIAMPÁ; GONÇALES, 2013; SOULSBY, 2010). É possível observar, na Figura 5, uma ilustração da estrutura perfuratriz utilizada para a perfuração pelo método percussivo e a ferramenta que executa a perfuração. Figura 5 – Estrutura perfuratriz para percussão: (a) Máquina percussora; (b) Ferramenta de uma percussora Fonte: Costa Filho et al. (1998) A sonda perfuratriz, ilustrada pela Figura 5 (a) é composta basicamente por guincho com 3 tambores (carretel principal, de revestimento e da caçamba), que permite a (a) (b) 32 suspensão do ferramental, uma torre de sustentação, uma unidade motriz, um balancim, que regula a altura da queda do ferramental, cabos de aço, polia de percussão e uma caçamba de limpeza. Já a ferramenta de perfuração, ilustrada pela Figura 5 (b), é composta por um porta cabo, que prende o cabo de aço ao restante da coluna, o percussor, que possui maior resistência e imprime um segundo choque do trépano na formação, a haste, que acrescenta peso à coluna ajudando a manter a verticalidade do poço, e o trépano, que é a ferramenta que efetivamente promove a fratura da formação rochosa (COSTA FILHO et al., 1998). É válido mencionar que, para perfurações mais elaboradas, as perfuratrizes são montadas sobre chassis, enquanto para perfurações mais simples elas são armadas no solo por uma única pessoa (SOULSBY, 2010). 2.4.3.1.2 Métodos rotativos Essencialmente, a sondagem rotativa é um método de perfuração no qual uma broca, elemento que entra em contato direto com a rocha promovendo sua desagregação, é conectada a um sistema rotativo de modo a desgastar a rocha por esforços abrasivos (GAUTO et al., 2016). Os métodos rotativos são mais indicados para perfurações em formações sedimentares e inconsolidadas, por garantirem maior eficiência em termos de taxa de penetração (ROP) (do inglês, Rate of Penetration) e menor taxa de desgaste das brocas em comparação com os demais métodos de perfuração (SILVA, 2017). Assim como os demais métodos, exigem fluxo constante de fluidos de perfuração para resfriar e lubrificar a broca, exercer pressão hidrostática e para transportar os fragmentos (cascalhos) para a superfície, e são recomendados para perfurações em grandes profundidades (de 400 m até milhares de metros como no caso do pré-sal) (CULVER, 1991; GIAMPÁ; GONÇALES, 2013). A Figura 6 ilustra uma sonda perfuratriz rotativa comumente empregada em explorações petrolíferas. 33 Figura 6 – Sonda de perfuração rotativa Fonte: Dipippo (2012) Como pode-se observar na Figura 6, em termos de composição, a sonda perfuratriz rotativa, assim como a máquina percussora, é composta por alguns elementos essenciais: sistema de sustentação, sistema de geração e transmissão de energia, sistema de movimentação de cargas e um sistema de circulação de fluidos. A estrutura de sustentação é composta por um mastro ou por uma torre e por uma base, tendo a função principal de garantir a sustentação geral da sonda, além de suportar deflexões, vibrações e deslocamentos. O sistema de geração e transmissão de energia é responsável por gerar energia e transmitir energia para a alimentação dos demais elementos da sonda como a bomba de lama, a mesa rotativa e o guincho. Os motores, que podem ser tanto elétricos quanto de combustão interna, são responsáveis pela geração de energia e a transmissão pode ocorrer tanto mecanicamente por meio de eixos e rodas, quanto por correntes elétricas através de conjuntos motores e geradores. O sistema de movimentação de carga é o sistema que permite a movimentação vertical da coluna de perfuração, do revestimento e dos equipamentos, sendo composto por um guincho (draw work), um bloco de coroamento (crown block), a catarina, cabos de aço e um gancho (rotary hook). O sistema de circulação, representado na Figura 6 pela bomba de lama e pelo tanque de lama, é responsável pela circulação de fluidos no poço e tratamento do fluido de perfuração, sendo usualmente composto por bombas e estações de tratamento. Além desses elementos, é composta ainda por um sistema rotativo formado pela mesa rotativa e uma haste de conexão conhecida como kelly, por um elemento integrante do 34 sistema de circulação conhecido como swivel, e pela coluna de perfuração. No sistema rotativo, os motores são responsáveis por promover a rotação da mesa rotativa, a qual está conectada diretamente ao kelly que, por estar fixada ao restante da coluna de perfuração, transfere essa rotação para a coluna. Em alguns casos, a mesa rotativa e o kelly são substituídos por um cabeçote hidráulico conhecido como top drive, o qual fica suspenso pelo gancho, é conectado aos tubos de perfuração e, além de apresentar um motor em sua estrutura que promove a rotação da coluna de perfuração, permite a passagem de fluido de perfuração para o interior do poço (DAVIS, 1995). Já o swivel, conectado ao gancho logo abaixo da catarina, é integrante do sistema de circulação de fluidos e, além de impedir que a parte da sonda acima do gancho rotacione, permite a circulação de fluidos de perfuração para o interior da coluna (THOMAS, 2001). O sentido de circulação dos fluidos de perfuração pode ser variado, dando origem a diferentes métodos de perfuração rotativa, tais como métodos de circulação direta (fluido é injetado dentro da coluna de perfuração alcançando o poço por orifícios presentes na broca, e sai do poço através do espaço anular entre a parede do poço e a coluna de perfuração) e circulação reversa (fluido inserido pelo espaço anular e succionado para dentro da coluna de perfuração) (GIAMPÁ; GONÇALES, 2013). Já a coluna de perfuração é composta por três tipos de estruturas: tubos de perfuração, que permitem a conexão do kelly com o restante da coluna; tubos pesados, que fazem uma transição de rigidez na coluna de modo a evitar falhas por fadiga; e os comandos que são tubulações rígidas, espessas e pesadas, sendo os principais responsáveis por garantir peso sobre a broca e garantir rigidez à coluna. A broca é inserida na coluna a partir de uma conexão com o comando, através de elementos de ligação conhecidos como subs (CAVALCANTI NETO, 2016). Ademais, apesar de não representado na Figura 6, o conjunto ainda conta com um sistema de segurança e monitoramento, que são responsáveis pela prevenção de acidentes e pelo controle do processo de perfuração, respectivamente (COSTA FILHO et al., 1998, THOMAS, 2001). 2.4.3.1.3 Método rotopercussivo O método rotopercussivo de perfuração envolve a combinação de uma percussão de alta frequência, promovido por um martelo pneumático de perfuração conhecido como martelo DTH, com o movimento rotativo da coluna de perfuração promovido pelo top drive (COSTA FILHO et al., 1998; CULVER, 1991; GIAMPÁ; GONÇALES, 2013). O martelo 35 down the hole (DTH) é um componente posicionado entre a broca e a coluna de perfuração, e é acionado pelo ar comprimido, proveniente de compressores de elevada potência, que passa por dentro das hastes até alcançar o martelo, de modo a promover percussões de alta frequência que auxiliam na ruptura da rocha (FEITOSA et al., 2008). A Figura 7 ilustra um martelo DTH comumente utilizado na perfuração rotopneumática. Figura 7 – Imagem ilustrativa de um martelo DTH Fonte: Gill Drilling Services (2020) É importante mencionar que nos sistemas rotopercussivos, o próprio ar comprimido utilizado para acionamento do martelo DTH sai por dutos de ar presentes no corpo das brocas, sendo utilizado como fluido de perfuração em conjunto com alguns aditivos (SAPINSKA SLIWA et al., 2015). Desse modo, além de estudos comprovarem o melhor desempenho de métodos rotopercussivos em formações cristalinas, consolidadas e de elevada dureza, o uso desse equipamento em solos mais macios com grãos mais refinados aumenta a probabilidade da ocorrência do entupimento dos dutos de ar e de travamento dos pistões que promovem o movimento de percussão (TEODORIU; CHEUFFA, 2011; SOULSBY, 2010). 2.4.3.2 Brocas As brocas são as ferramentas posicionadas na extremidade da coluna de perfuração, de modo a entrarem em contato direto com a formação rochosa se tornando as responsáveis por promover a ruptura das rochas e permitir a passagem de fluido de perfuração para o fundo do poço (PEIXOTO, 2014). São empregadas nos métodos de perfuração rotativos e rotopneumáticos, que são os métodos mais empregados pela indústria, e apresentam três elementos principais: elementos cortantes, responsáveis pela ruptura da rocha; rolamentos (inexistentes em algumas brocas), que permitem a rotação do corpo visando um aumento na 36 eficiência da perfuração; e o corpo, que recebe os elementos cortantes e apresenta elemento de conexão com o resto da coluna, além de canais para a passagem de fluido (PROMINAS, 2015). De modo geral, as brocas são divididas em dois grandes grupos: as brocas sem partes móveis e as brocas com partes móveis. As brocas sem partes móveis, além de não apresentarem nenhum elemento móvel, não apresentam rolamentos, o que reduz a probabilidade de falha do conjunto, embora envolva um desgaste acelerado dos elementos cortantes. Os principais tipos de brocas sem partes móveis são as brocas de lâmina de aço, que são empregadas em situações especiais em função do seu elevado desgaste e baixa eficiência, as brocas de diamante natural, que rompem a rocha por esmerilhamento além de apresentarem elevada resistência à abrasão, e as brocas de diamante sintético (polycristalline diamond compacts - PDC ou thermaly stable polycristalline - TSP), que são formadas por pastilhas de carbeto de tungstênio revestidas por diamantes sintéticos aglutinados com cobalto montadas sobre bases cilíndricas que são instaladas no corpo da broca (BARBOSA, 2019; MA; CHEN; ZHAO, 2016; THOMAS, 2001). As brocas com partes móveis apresentam de 1 a 4 corpos rolantes compostos por corpo, rolamento e insertos, sendo que a broca mais comumente empregada é a de 3 corpos (tricônica). Os corpos, ou cones, rotacionam em torno do seu próprio eixo por conta da presença dos rolamentos, e apresentam em sua estrutura, fileiras de estruturas cortantes que se interpõem umas as outras. As estruturas cortantes podem ser dentes de aço, os quais são fresados no próprio corpo da broca, ou insertos de carbeto de tungstênio que são posicionados por um processo de interferência em orifícios presentes nos cones da broca (THOMAS, 2001). Quanto aos rolamentos mais utilizados existem os roletes ou esferas não seladas, que não possuem sistema próprio de lubrificação, roletes ou esferas seladas, que possuem sistema próprio de lubrificação e não entram em contato com o fluido de perfuração e mancais de fricção do tipo journal, compostos por metais nobres e com dispositivo interno de lubrificação (THOMAS, 2001). Cada um dos tipos de broca está ilustrado na Figura 8. 37 Figura 8 – Tipos de broca: (a) broca de lâmina de aço; (b) broca de diamante natural; (c) broca de diamante sintético; (d) broca tricônica de dentes de aço; (e) broca tricônica com insertos de carbeto de tungstênio Fonte: Silva (2017); Prominas (2015) A seleção das brocas é feita principalmente de acordo com o perfil geológico da formação e com as dimensões planejadas para o poço. O processo de seleção das brocas deve ser executado da melhor maneira possível, visando não apenas garantir uma elevada ROP, mas também visando aumentar a vida útil da broca, uma vez que o processo de troca das brocas é um procedimento complexo que pode demandar um certo tempo para ser executado. Desse modo, a eficiência do processo de perfuração passa diretamente pela seleção do tipo adequado de broca para a perfuração (PEIXOTO, 2014). 2.4.3.3 Fluidos de perfuração Os fluidos de perfuração são fluidos bombeados para o interior do poço durante o processo de perfuração para remover cascalhos que surgem com o processo de perfuração, refrigerar e lubrificar a broca e a coluna de perfuração e prevenir o colapso da parede do poço (DIPIPPO, 2012). Além disso, os fluidos de perfuração ainda apresentam algumas funções adicionais como minimizar a penetração de fluidos para o interior do poço, evitar problemas de contaminação, reduzir a corrosão da coluna de perfuração, deixar detritos em (a) (b) (c) (d) (e) 38 suspensão durante períodos de não circulação, auxiliar na coleta de amostras e controlar a pressão da formação (CULVER, 1991; NGUGI, 2008). Para que os fluidos sejam bombeados para o interior do poço e exerçam suas funções da melhor forma, é sempre necessário que haja um sistema de circulação que inclui o fluido, as chamadas bombas de lama e os equipamentos de limpeza desse fluido (FINGER; BLANKENSHIP, 2010). Desse modo, após circular no poço, o fluido passa por equipamentos com peneira vibratória, desaerador, dessiltador, mud cleaner e centrífugas, que captam partículas carregadas pelo fluido para depois eliminá-las, mantendo o fluido armazenado em um tanque, onde, por vezes, passa por um processo de resfriamento para depois ser injetado novamente no poço através da bomba (DIPIPPO, 2012). Em termos de composição, os fluidos são compostos por um elemento base e alguns aditivos que garantem algumas propriedades específicas para cada aplicação. Quanto sua composição principal, eles são classificados em fluidos à base de água, fluidos à base de ar e fluidos à base de óleo, sendo que cada um desses são empregados em situações específicas. Os aditivos misturados com o fluido principal apresentam como função principal a promoção de alterações de algumas propriedades dos fluidos base de modo que eles possam exercer sua função como fluido de perfuração da melhor forma, podendo ser de diferentes tipos, sendo que os principais são argilas e polímeros. Algumas das propriedades dos fluidos que mais interferem na sua atuação como fluido de perfuração são a viscosidade, essencial para remover dejetos do interior do poço e mantê-los em suspensão quando a circulação é cessada; a densidade, que é essencial para exercer pressão no fundo do poço evitando perda de circulação e auxiliando na sustentação; e o pH, que deve ser consideravelmente alto para evitar problemas relacionados a corrosão (FINGER; BLANKENSHIP, 2010). 2.4.4 Revestimento O revestimento é uma sequência de tubos instalados no comprimento perfurado de modo a constituir a parede do poço. São posicionados logo após a perfuração de uma dada seção do poço, podem apresentar diferentes configurações ao longo do comprimento perfurado e sofrem dois principais tipos de esforços: tração, devido ao peso da coluna, e pressão de colapso (FEITOSA et al., 2008; THOMAS, 2001). Segundo Finger e Blankeship (2010), são três os principais parâmetros para a seleção dos revestimentos: material, peso e diâmetro. A seleção do material de composição do 39 revestimento, além de estar relacionada com aspectos físicos de resistência dos materiais, como a resistência a tração, a resistência ao colapso, a resistência mecânica, dentre outros fatores, é influenciada também por aspectos químicos relacionados à composição dos recursos extraídos do poço, os quais podem comprometer integridade física do revestimento através da corrosão e outras reações químicas (CULVER, 1991). O peso é influenciado diretamente pelo material selecionado e tem papel fundamental na sustentação da estrutura do poço. Já o dimensionamento do revestimento é feito levando em consideração aspectos ligados à resistência mecânica, a produtividade do poço, a profundidade da zona de produção, a temperatura esperada, o tipo de completação a ser realizado, e ainda precisa levar em consideração as dimensões do equipamento de bombeamento, de modo a permitir a extração do recurso (CULVER, 1991; FINGER; BLANKENSHIP, 2010). Segundo Santos, Monteiro e Guimarães (2016), as principais funções dos revestimentos são: prevenir o desmoronamento das paredes do poço, dando sustentação e evitando o colapso; evitar a contaminação da água potável nas proximidades da superfície; permitir o retorno do fluido para a superfície; impedir a migração de fluidos das formações para o interior do poço; sustentar equipamentos de segurança localizados na cabeça do poço; sustentar outra coluna de revestimento em alguns casos; alojar equipamentos de elevação artificial (bombas); confinar a produção ao interior do poço; e prevenir o resfriamento do recurso em alguns casos. Para isso é necessário que o revestimento seja capaz de suportar desgastes, corrosão e atrito em função da fricção e da vibração (GUPTA; ROY, 2006). 2.4.5 Cimentação A cimentação consiste no bombeamento de uma pasta de cimento com água e aditivos pelo interior do poço de modo que essa pasta preencha o espaço anular entre o revestimento e a formação rochosa perfurada, para isolar o poço e garantir sua sustentação (SOUZA; VELOSO, 2017). Existem dois tipos principais de cimentação: a cimentação primária e a cimentação secundária. A cimentação primária é realizada logo após a descida do revestimento no comprimento perfurado e é considerada como a principal, ou seja, a responsável por alocar a pasta de cimento em uma posição do espaço anular. Dentre as principais funções da cimentação pode-se mencionar o isolamento entre do poço e as formações, garantir rigidez estrutural, impedir desmoronamento da formação, proteger aquíferos e zonas de água doce, além de proteger a coluna de revestimento de fluidos corrosivos (MALOUF, 2013). A cimentação secundária tem a principal função de corrigir a 40 cimentação primária para tamponar as zonas permeáveis, identificadas por perfis acústicos corridos por dentro do revestimento (ROCHA; ALENCAR; BARROS, 2017; THOMAS, 2001). A cimentação secundária pode ser feita através do squeeze do cimento, que seria a injeção forçada do cimento sob pressão para corrigir localmente a cimentação primária, através do tampão de cimento, mais usado para isolar zonas inferiores, e através da recimentação (SOUZA; VELOSO, 2017). Os cimentos empregados na cimentação são produzidos a partir de uma mistura de calcário e argila que contém alguns aditivos, a depender das condições em que será empregado, como sulfato de cálcio na forma de gesso. O cimento Portland é o mais comum de ser empregado em diferentes tipos de poços perfurados, sendo compostos, além dos componentes originais, por cal, sílica, alumina e óxido de ferro, gerando elementos químicos como aluminato tricálcico, ferro-aluminato tetra-cálcico, silicato tricálcico e silicato dicálcico, os quais garantem suas principais características. Por envolver proporções diferentes desses componentes em algumas ocasiões, o cimento Portland utilizado para poços petrolíferos foi classificado pela API em classes de A a J com base em sua composição química e nas características que apresenta (THOMAS, 2001). Por conta dessas diferentes características, diferentes classes de cimento podem ser empregadas em diferentes tipos de poços perfurados. O Quadro 1 descreve as características de cada uma das classes API de cimento Portland. Quadro 1 – Classes API de cimento Portland Classe Características A Utilizada em superfícies até 1830 m e não tem propriedades específicas B Utilizada em superfície até uma profundidade de 1830m e tem elevada resistência ao sulfato C Utilizada da superfície até uma profundidade de até 1830m possibilitando pega rápida e grande resistência compressiva D Utilizada entre 1830m e 3050m sobre condições moderadas de temperaturas e altas pressões, além de apresentar boa resistência ao sulfato E Utilizada entre 3050m e 4270m e em poços de elevada temperatura e pressão F Utilizada entre 4270m e 4880m em condições extremas de temperatura e pressão, além de apresentar alta resistência a sulfatos. G e H até 2440m usados com aditivos, aceleradores ou retardadores podendo ser empregadas em quaisquer condições mencionadas acima J Profundidades entre 3669m e 4880m sendo utilizadas em condições de temperatura e pressão extremamente elevadas Fonte: Adaptado de Thomas (2001) 41 Para outras aplicações, há uma classificação reconhecida pela ABNT que separa os cimentos Portland em 8 tipos diferentes com base em sua composição percentual e, consequentemente, com base em suas propriedades. 2.4.6 Completação Após a realização da cimentação, são executados alguns testes de perfilagem, tais como potencial espontâneo, raios gama, neutrônico, indução, sônico e de densidade, para verificar se o poço apresenta boas condições para ser explorado, ou se deve ser realizado o procedimento de abandono (SILVA, 2017). Se o poço se apresentar como disponível para exploração, é necessária a realização do procedimento de completação. Segundo Cavalcante (2016), a completação consiste no processo realizado para deixar o poço em condições de operar seguramente durante toda sua vida produtiva, ou seja, consiste em equipar o poço para deixá-lo em condições de produção de modo a promover a conexão entre a formação e o interior do poço, permitindo a entrada de fluidos de maneira controlada. A completação pode ser classificada de acordo com o revestimento de produção em: completação a poço aberto, completação com liner rasgado ou canhoneado e completação com revestimento canhoneado. A completação a poço aberto consiste na produção com a zona produtora totalmente aberta, sem nenhum tipo de revestimento para regular a entrada de recursos para o interior do poço. Nesse tipo de completação, o revestimento de produção não alcança a zona produtora, de modo que a perfuração prossegue pela zona produtora sem a realização de revestimento. A completação com liner rasgado ou canhoneado consiste no posicionamento de um liner, que é uma espécie de tubulação de diâmetro inferior ao do revestimento de produção, na zona de produção, de modo que o acesso do fluido ao interior do poço depende diretamente dele. O liner pode apresentar rasgos em sua extensão antes de ser posicionado na zona produtora (completação com liner rasgado), funcionando como um filtro, ou pode ter seu espaço anular cimentado e, posteriormente, passar por um processo de canhoneamento (perfuração da estrutura por meio de cargas explosivas). A completação com revestimento canhoneado consiste na perfuração do poço por completo, atravessando a zona produtora, e a descida do próprio revestimento de produção até o fundo do poço, sendo o espaço anular entre este e a formação posteriormente cimentado. Através de cargas explosivas, o revestimento e a camada de cimento que o envolve são canhoneados, isto é, perfurados nos intervalos de interesse, 42 colocando o reservatório em contato com o interior do poço (THOMAS, 2001). A Figura 9 ilustra a estrutura de cada um desses tipos de completação. Figura 9 – Tipos de completação: (a) Completação a poço aberto; (b) Completação com liner rasgado; (c) Completação com revestimento canhoneado Fonte: Thomas (2001) É válido ressaltar que o procedimento de completação não se limita apenas à realização da conexão do interior do poço com a formação que está sendo explorada. Os procedimentos mais complexos de completação envolvem ainda procedimentos como: instalação de equipamentos de superfície, os quais permitem a instalação de equipamentos de segurança e de equipamentos que permitem a extração dos recursos; condicionamento do poço, para retirar resquícios da cimentação e inserir o fluido de completação; avaliação da qualidade da cimentação primária; canhoneio do revestimento ou do liner, caso sejam esses os tipos de completação selecionados; e a instalação da coluna de produção acima da zona de interesse, que consiste em um conjunto de tubos metálicos descidos pelo interior do revestimento com a função de conduzir fluidos produzidos para a superfície, permitir a instalação de equipamentos para a elevação artificial e permitir a circulação de fluidos (SILVA, 2016). Além disso, em algumas situações, é necessária a instalação de equipamentos de controle da produção compostos por um conjunto de válvulas (BAKER, 1979). 2.4.7 Sistemas de elevação A extração dos recursos do fundo do poço e condução para a superfície pode se dar através de duas formas: naturalmente ou artificialmente (KAYA; MERTOGLU, 2005). Nos 43 casos em que a pressão no reservatório é suficientemente elevada a ponto de vencer os diferenciais de pressão existentes ao longo da coluna até alcançar a superfície, a elevação do recurso é dita como natural. No entanto, quando a pressão no reservatório não é suficiente para vencer a pressão no poço e os diferenciais de pressão ao longo da coluna, são necessários equipamentos ou métodos de suplementação de energia para que a elevação até a superfície se torne possível. Tais métodos são conhecidos como métodos de elevação artificial (FREITAS; SOUZA, 2021). Dentre as diversas técnicas e operações existentes para tornar a taxa de produção do poço viável economicamente, as mais difundidas na exploração de recursos naturais subterrâneos são as técnicas de bombeamento. Tais técnicas fazem uso de diferentes tipos de sistemas de bombeamento, os quais transformam movimentos rotativos de um motor, seja ele elétrico ou de combustão interna, em energia para a movimentação do fluido, de modo a aumentar a pressão disponível para a elevação do fluido (SENAI CIMATEC, 2021). Os sistemas de bombeamento utilizados podem variar de acordo com os recursos que estão sendo extraídos, as condições encontradas nos reservatórios e a profundidade perfurada, sendo necessário, em alguns casos, a realização de testes de bombeamento para verificar a performance do poço e quantificar propriedades dos reservatórios (SOULSBY, 2010). 44 3 METODOLOGIA A metodologia utilizada para o desenvolvimento do trabalho foi dividida em duas partes: métodos para a realização da análise comparativa das técnicas de perfuração e métodos para a realização da análise comparativa de custos dos processos exploratórios. 3.1 MÉTODOS PARA A ANÁLISE COMPARATIVA DE TÉCNICAS DE PERFURAÇÃO Para a realização da análise comparativa das técnicas de perfuração, foi realizada uma revisão bibliográfica detalhada primeiramente acerca das características particulares de cada um dos recursos, levando em consideração aspectos como composição química e física dos recursos, processo de formação no meio ambiente, características das regiões de armazenamento e meios de exploração de cada um dos recursos. Em seguida, com base nas informações coletadas a partir da análise das características particulares de cada um dos recursos e de informações coletadas a partir da revisão de fontes bibliográficas relacionadas diretamente ao processo de perfuração e extração de cada um destes, buscou-se não apenas traçar comparações acerca das particularidades de cada um dos processos, mas também explicações acerca de tais particularidades fundamentadas na natureza química e física dos recursos e nas características geológicas dos locais onde são armazenados. Dentre os principais aspectos relacionados à perfuração, foi dado um enfoque em aspectos como os métodos de estudo da geologia, design e estruturação dos poços, os métodos de perfuração mais empregados, a estrutura de perfuração utilizada, os tipos de brocas mais empregados, as características dos fluidos de perfuração, os materiais do revestimento, funções específicas da cimentação, completação e os métodos de elevação. Dentre as fontes consultadas para a realização do trabalho estão inclusos livros, artigos publicados em revistas, trabalhos acadêmicos relacionados tanto a composição e propriedades dos recursos, quanto às particularidades dos processos de extração, além de bases de dados, pesquisas, levantamentos e manuais de perfuração. Também foram coletadas informações cedidas em palestras ministradas em eventos e em aulas disponíveis em plataformas digitais. 45 3.2 MÉTODOS PARA A ANÁLISE COMPARATIVA DE CUSTOS Para a realização da análise de custos, em virtude da dificuldade existente na coleta de dados referentes a custos de perfuração de poços para a exploração de certos recursos, foi necessário recorrer a modelos matemáticos existentes na literatura. No caso dos custos de poços perfurados para a extração de água, a ideia inicial era a realização da coleta de dados a partir do contato com uma empresa especializada na área de perfuração de poços tubulares profundos. Seriam solicitadas informações como a cidade, o bairro, o ano em que o poço foi perfurado, o diâmetro do poço, a profundidade do poço, a taxa de penetração média, a vazão nominal, custos de estudo da geologia, custo de instalação das estruturas de perfuração (preparação do local, transporte dos equipamentos e montagem da estrutura), custos de revestimento, cimentação e completação, custo de instalação do sistema hidraúlico (quadro elétrico, tubulação e bomba) e custos adicionais de 16 poços perfurados em diferentes locais. No entanto, como não foi possível realizar o contato com a empresa, tal análise foi descartada. Para a análise de custos de perfuração de poços geotérmicos e petrolíferos, foram buscadas informações estruturais de poços em bases de dados disponíveis para acesso na internet e, a partir destas, foram selecionados 16 poços perfurados para a extração de petróleo e gás natural e 16 poços perfurados para a extração de energia geotérmica. A partir de estudos realizados por Lukawski et al. (2014), onde foram desenvolvidos experimentalmente modelos matemáticos que fornecem uma previsão média de custos de perfuração e completação de poços, foram obtidas equações capazes de estimar custos da construção de poços de produção com base em sua profundidade. Para estimar os custos de perfuração e completação de poços para a exploração de petróleo e gás, os autores desenvolveram a equação (1): 𝐶𝑇𝑂𝐺 = 1,65 𝑥 10−5 𝑥 (𝑃𝑀)1,607 (1) Onde, CTOG se refere ao custo total do poço em milhões de dólares americanos e PM se refere à profundidade medida em metros. Já para estimar os custos de perfuração e completação de poços para a exploração de energia geotérmica, os autores desenvolveram a equação (2): 𝐶𝑇𝐺 = 1,72 𝑥 10−7 𝑥 (𝑃𝑀)2 + 2,3 𝑥 10−3 𝑥 𝑃𝑀 − 0,62 (2) Onde, CTG se refere ao custo total para a construção do poço em milhões de dólares 46 americanos e PM a profundidade medida em metros. As equações matemáticas explicitadas pelas equações (1) e (2) foram desenvolvidas para custos referentes ao ano de 2009. Portanto, para poços perfurados em anos anteriores, foi necessário utilizar um índice de custo que permitisse uma atualização desses valores para o ano de 2009. No presente trabalho, o índice utilizado foi o Cornell Energy Institute Index (CEI Index), o qual é válido apenas para poços petrolíferos, de modo, que para os poços geotérmicos, por conta da inexistência de um índice de custo apropriado, não foram feitas correções. É válido ressaltar também que esse método, por falta de dados disponíveis, não leva em consideração fatores relacionados à complexidade da perfuração em função das formações rochosas, apenas a profundidade perfurada. Ademais, é necessário mencionar que a análise se limitou a poços verticais, onshore e de produção, pois, levando em consideração os três recursos estudados, são os poços mais comumente encontrados. 47 4 ANÁLISES COMPARATIVAS 4.1 COMPARAÇÃO DE CARACTERÍSTICAS DOS RECURSOS Após o estudo das características individuais da água subterrânea, da energia geotérmica, do petróleo e do gás natural, foi confeccionado o Quadro 2, que tem o intuito de servir como base para a comparação das propriedades. Quadro 2 – Estudo comparativo de propriedades Água Subterrânea Geotermia Petróleo e Gás Composição Moléculas de H2O com solutos orgânicos ou inorgânicos dissolvidos Energia na forma de calor. Líquido geotérmico com mesma composição da água subterrânea, elevada concentração de sal e de sulfeto Cadeias de hidrocarbonetos com compostos oxigenados, hidrogenados, sulfurados e outros componentes associados Formação Meteórica, conata ou juvenil, armazenando- se em camadas rochosas do subsolo Fluxo de calor, proveniente do núcleo, pelas camadas da terra Degradação de matéria orgânica por bactérias anaeróbias Armazenamento Aquíferos, aquífugos, aquícludes e aquitardes Reservatórios geotérmicos formados por fonte de calor, rochas permeáveis e líquido Jazidas, formadas por rocha geradora, rocha reservatório e rocha selante, localizadas em bacias sedimentares Meios de exploração Perfuração do subsolo através de máquinas perfuratrizes Exploração de gêiseres e hot springs, ou perfuração do subsolo através de máquinas perfuratrizes Perfuração do subsolo através de máquinas perfuratrizes Fonte: Elaborado pelo autor 4.1.1 Composição As águas subterrâneas são consideradas como a parcela da hidrosfera que ocorre abaixo da superfície terrestre, podendo ser armazenadas em elevadas profundidades (BOVOLATO, 2007). Por conta de circularem em regiões do subsolo e apresentarem uma natureza polar, o que as torna excelentes solventes para moléculas iônicas e polares, naturalmente apresentam certas moléculas e íons dissolvidos em sua estrutura. Os solutos dissolvidos na água subterrânea podem ser classificados como naturais, que são os 48 presentes na estrutura da água subterrânea sem qualquer influência de atividades humanas, ou como não naturais, que são os introduzidos por atividades humanas. Dentro do grupo dos naturais há uma subdivisão em solutos orgânicos, que possuem uma estrutura de átomos de carbono unidos entre si e com outros elementos químicos, e inorgânicos, representados pelos sólidos totais dissolvidos e pelos íons. Dentre os solutos inorgânicos mais comuns estão o cálcio, magnésio, sódio, bicarbonato, cloreto, sulfato dentre outros, sendo que sua concentração irá depender diretamente do local onde a água está armazenada. Já os compostos orgânicos, presentes em baixas concentrações nas águas subterrâneas, são representados por substâncias húmicas, que consistem em moléculas originadas da degradação microbiológica da matéria orgânica, como por exemplo os ácidos húmicos (FITTS, 2015). A energia geotérmica, segundo o próprio nome já indica, é classificada como calor proveniente do núcleo da terra, que é irradiado e conduzido para as camadas mais superficiais da terra por processos de transferência de calor (FITTS, 2015; ZOET et al., 2011). Desse modo, para que possa ser explorada, é essencial a existência de fluidos circulantes no subsolo ou de fluidos injetados no subsolo, os quais são aquecidos ou vaporizados e, em seguida, extraídos para serem aproveitados. Embora a geotermia em si deva ser tratada como energia na forma de calor, os líquidos que permitem a exploração dessa energia são os que influenciam mais diretamente no processo de perfuração. De forma generalizada, a composição dos líquidos geotérmicos é a mesma da água subterrânea. Porém, por conta de seu armazenamento, apresentam elevada concentração salina, elevada concentração de sulfeto e elevada concentração de moléculas de carbono, o que confere a estes um caráter corrosivo que deve ser considerado. O petróleo e o gás natural, de acordo com a ASTM (2011), são definidos como misturas de ocorrência natural composta principalmente por hidrocarbonetos associados a derivados orgânicos sulfurados, nitrogenados, oxigenados e outros elementos. O petróleo, além de ser classificado com base no tipo de hidrocarboneto predominante em sua estrutura (parafina, nafteno ou compostos aromáticos), apresenta em sua estrutura traços de componentes como o enxofre, nitrogênio, oxigênio, alguns sais e metais (ferro, níquel e vanádio). De modo geral, apresentam uma densidade menor que a da água, sendo essa densidade expressa através de uma relação entre óleo e água conhecida como °API, e uma viscosidade maior além de serem imiscíveis em água (SELLEY; SONNENBERG, 2016). A Tabela 1 mostra a composição percentual do petróleo em seu estado mais comumente encontrado. 49 Tabela 1 – Composição percentual do petróleo Elemento Porcentagem mássica (%) Carbono 83,0 a 87,0 Hidrogênio 10,0 a 14,0 Enxofre 0,05 a 6,0 Nitrogênio 0,1 a 2,0 Oxigênio 0,05 a 1,5 Metais (Fe, Ni, V, etc.) < 0,3 Fonte: Adaptado de Speight (2001) Já o gás natural, apesar de ser usualmente apresentado juntamente do petróleo por serem compostos de mesma natureza, pode apresentar uma composição um pouco diferente. São compostos principalmente por hidrocarbonetos da família das parafinas, tais como o metano, butano, etano e propano. Os outros gases que compõem a estrutura dos gases naturais são o hélio, o argônio, radônio, hidrogênio, dióxido de carbono e gás sulfídrico. Em termos de propriedades, é quimicamente não reativo, moderadamente solúvel em água e é mais leve que o ar, podendo ser seco ou úmido, a depender da presença de vapor líquido na sua composição, e básico ou ácido, a depender da presença ou ausência de gás sulfídrico (SELLEY; SONNENBERG, 2016). 4.1.2 Formação “As águas subterrâneas representam a parcela da hidrosfera que ocorre na subsuperfície da Terra. Elas têm três origens principais: meteórica, conata e juvenil.” (BOVOLATO, 2007, p. 26). A origem meteórica se refere à infiltração das águas que precipitam naturalmente na forma de chuva, neve ou neblina, como etapa do ciclo hidrológico natural. As águas de origem conata são as águas presentes em sedimentos desde a formação dos depósitos, sendo caracterizadas como águas de formação. Já as águas de origem juvenil, são geradas a partir de processos magmáticos, integrando o mecanismo de circulação de água que ocorre no interior da terra (FETTER, 1988). Embora existam esses três mecanismos de formação das águas subterrâneas, o ciclo hidrológico, definido por Carvalho e Silva (2006, p. 11) como “fenômeno global de circulação fechada da água entre a superfície terrestre e a atmosfera, impulsionado fundamentalmente pela energia solar associada à gravidade e à rotação terrestre”, é o principal responsável pela recarga de água no subsolo, sendo essencial para que ela esteja disponível para exploração e uso por parte 50 da população. Outro fator importante de ser mencionado é que o processo de formação em si não é o principal responsável pela determinação da composição química final das águas subterrâneas, mas sim o solo em que são formadas ou armazenadas e as atividades humanas desenvolvidas nesses locais. Já a energia geotérmica, como mencionado anteriormente, é proveniente do calor presente no núcleo da terra, o qual, através de mecanismos de transferência de calor, alcança águas subterrâneas armazenadas em reservatórios próximos à superfície, de modo a aumentar sua temperatura e, por vezes, provocar uma alteração em seu estado físico (ANJOS, 2018; BLODGETT; SLACK, 2009). No entanto, apesar de estar disponível em todas as regiões do mundo independente das condições climáticas, a formação de recursos de elevado conteúdo energético, que possibilita a produção de energia elétrica, depende das condições geológicas e geográficas da região. Segundo Assumpção e Neto (2000), a terra é formada por um conjunto de placas tectônicas que mantém a superfície isolada da parte interior composta por magma e rochas derretidas. No entanto, por conta do movimento da crosta terrestre, nas regiões localizadas sobre bordas de placas tectônicas e em regiões vulcânicas ocorre o fenômeno das intrusões magmáticas (penetração direta do magma para camadas superficiais), as quais aumentam consideravelmente o fluxo natural de calor em regiões mais próximas da superfície e aumentam o conteúdo energético da região. Portanto, quanto mais próximo de regiões de transição de placas tectônicas e de regiões vulcânicas, maior será o potencial geotérmico do local analisado (CONFESSOR et al., 2020). O petróleo e o gás natural, por sua vez, têm sua origem estudada por diversos cientistas ao redor do mundo. A teoria mais aceita afirma que o petróleo e o gás natural se formaram a partir da degradação de matéria orgânica, representada por restos de animais e vegetais, microfauna, plânctons e outras substâncias orgânicas, depositada junto a sedimentos de baixa permeabilidade, realizada pela ação degradante de microbactérias anaeróbias presentes nessas regiões (FARAH, 2013). Considerando o processo como um todo, os detritos orgânicos se transformam em compostos químicos por meio da ação de bactérias anaeróbias associada com a temperatura e pressão das camadas rochosas, dando origem ao querogênio em um processo conhecido como diagênese. Esses compostos continuam sofrendo ação das bactérias anaeróbias, dando origem a um composto de consistência pastosa. Através de reações termoquímicas que dependem da elevação da temperatura e pressão na rocha geradora e da presença de minerais que fazem a catalisação da reação, esse composto, formado por uma cadeia de hidrocarbonetos, se torna óleo condensado e gás úmido, em uma etapa conhecida como catagênese. A metagênese, etapa 51 final do processo, seria a transformação do composto em gás seco e resíduos carbonosos (GARCIA BAUTISTA, 2008; GAUTO et al., 2016; PGT, 2010). O gás e o líquido gerados no processo migram das rochas sedimentares onde foram formadas, conhecidas como rochas geradoras, para camadas superiores do solo devido às forças geológicas existentes, até encontrarem camadas rochosas impermeáveis, conhecidas como rochas reservatório. Essas são responsáveis por armazenar o petróleo na região e impedir sua saída para a superfície (FARAH, 2013). 4.1.3 Armazenamento As águas subterrâneas, ao penetrarem camadas rochosas que compõem o solo, ficam, na grande maioria das vezes, armazenadas em aquíferos. Os aquíferos, segundo Iritani e Ezaki (2008, p. 19), são “formações geológicas permeáveis capazes de armazenar e transmitir água em quantidades que possam ser aproveitadas como fonte de abastecimento para diferentes usos”. Levando em consideração a porosidade das rochas armazenadoras, os aquíferos podem ser classificados em: granulares, que são representados por rochas sedimentares e inconsolidadas, onde a água flui e fica armazenada entre os grãos minerais existentes; fissurais, formados por rochas maciças e compactas que não apresentam espaços vazios entre minerais, de modo que a água fica armazenada em fraturas ou fissuras; e cársticos, formados por rochas carbonáticas que se dissolvem quanto em contato com águas subterrâneas contendo elevado teor de dióxido de carbono, de modo a formar canais e cavidades por onde a água flui (IRITANI; EZAKI, 2008). Segundo Bovolato (2007), algumas unidades rochosas que compõem aquíferos são areias inconsolidadas, arenitos, calcários, dolomitos, basaltos, rochas metamórficas fraturadas, dentre outras, demonstrando que os locais de armazenamento das águas subterrâneas podem apresentar composição extremamente variada. Além dos aquíferos, as águas subterrâneas também podem ser armazenadas em formações que não apresentam permeabilidade suficiente para transmitir água, de modo a serem muito difícil de serem exploradas. Dentre elas vale mencionar os aquitardes, que são camadas de baixa permeabilidade que podem armazenar água subterrânea ou transmitir para aquíferos adjacentes, os aquícludes, que apresentam baixa permeabilidade, mas participam do fluxo de água subterrânea de certa maneira, e os aquífugos, que são impermeáveis e não transmitem nenhuma quantidade de água (FETTER, 1988). Por conta da baixa permeabilidade dessas formações, a exploração de água subterrânea nelas 52 armazenada não é economicamente favorável, de modo que o foco das explorações são os aquíferos. Para a existência de um reservatório geotérmico, três elementos são fundamentais: fonte de calor, permeabilidade e água disponível. A água precipitada naturalmente como parte do ciclo hidrológico, ou inserida através de poços de injeção, atinge camadas mais profundas do subsolo através da permeabilidade deste, de modo a ficar armazenada em poros de certas rochas. O calor naturalmente gerado no núcleo da terra aquece a água armazenada em rochas fazendo com que ela se mantenha na forma de água aquecida ou na forma de vapor. Esse recurso aquecido fica preso nessas rochas por camadas rochosas impermeáveis que a envolvem, dando origem aos reservatórios geotérmicos (BLODGETT; SLACK, 2009). Por estarem, na grande maioria das vezes, associados a regiões vulcânicas, onde as fontes de calor natural apresentam maior conteúdo energético, os reservatórios geotérmicos são formados por rochas magmáticas de elevada dureza, abrasivas, consolidadas e com elevada quantidade de fraturas, além de manterem os recursos sempre em elevada temperatura e pressão. Dois exemplos de rochas encontradas em reservatórios geotérmicos são granito e basalto (PURBA et al., 2022). Já o petróleo e o gás natural são expulsos da rocha geradora por diferença de pressão e encontram regiões impermeáveis onde são retidos (rochas reservatório). Os locais de armazenamento do petróleo e do gás são em bacias sedimentares, definidas como depressões do terreno onde se formam as rochas sedimentares, formadas a partir de fenômenos como intemperismo, erosão e transporte de fragmentos extraídos de outras rochas (MENDES et al., 2016). Ali, rochas sedimentares, como as siliclásticas, as evaporíticas e as carbonáticas, se depositam ao longo dos anos e armazenam petróleo e gás natural em seus poros (GAUTO et al., 2016). As formações sedimentares geralmente apresentam grande permeabilidade, estrutura granular e podem ser tanto não consolidadas quanto consolidadas. Alguns exemplos de rochas que compõem bacias sedimentares são calcários, arenitos, siltitos, dentre outros (GIAMPÁ; GONÇALES, 2013). Vale mencionar que o gás natural pode ser encontrado acompanhado do petróleo em alguns reservatórios, mas também praticamente sem petróleo associado, dando origem aos reservatórios naturais (TEIXIERA, 2015). 4.1.4 Meios de exploração Embora existam evidentes diferenças em termos de composição química, formação e 53 em alguns aspectos do armazenamento, tanto a água subterrânea quanto a energia geotérmica, o petróleo e o gás natural são recursos que apresentam uma característica em comum: todos podem ser encontrados no subsolo. Com exceção de alguns reservatórios geotérmicos que associam elevado potencial geotérmico e elevada pressão com escassez de rochas impermeáveis para retenção do recurso, originando erupções de vapor e água quente para a superfície (gêiseres e hot springs), o acesso aos recursos estudados para aproveitamento nos mais diversos setores da sociedade depende da perfuração de poços para que possa ocorrer. Por serem recursos que naturalmente apresentam diferenças como foi observado, os processos de perfuração de poços e de extração dos recursos, embora apresentem uma mesma lógica sequencial ilustrada pela Figura 4, apresentam algumas particularidades técnicas de modo a se adaptarem ao tipo de solo perfurado e ao recurso extraído. Tais particularidades se referem não apenas as técnicas de perfuração utilizadas, mas também nos equipamentos empregados na perfuração, nos materiais empregados no revestimento e cimentação, nos fluid