CORPOS HURBANOS (CORTAR) RUTE ALESSI TEDESCHI “A candeia do corpo é o olho. Sendo, pois, o teu olho simples, também todo o teu corpo será luminoso; mas, se for mau, também o teu corpo será tenebroso. Vê, pois, que a luz que em ti há não sejam trevas. Se, pois, todo o teu corpo é luminoso, não tendo em trevas parte alguma, todo será luminoso, como quando a candeia te ilumina com o seu resplendor.” Excerto retirado da Bíblia Sagrada, Evangelho de Lucas, capítulo 11. Versão Almeida Corrigida e Revisada Fiel. A cidade como as várias corporeidades do homem contemporâneo. O ser que se travesti, que experimenta o lugar e acaba fazendo de si mesmo o corpo de sua experiência. Então, vê-se logo a impossibilidade de que também o local não seja resultado das experimentações deste “corpo errante”* que se perde por querer e age como investigador da realidade do homem, do corpo , da arquitetura e da cidade contemporânea. NOTA: Conceito extraído do texto : “Corpografias urbanas”, de Fabiana Dutra Britto. UFBA. Re-desenho de silo e armazéns às margens do leito férreo da cidade de Presidente Prudente Centro de Artes Corporais UUNESP-FCT Arquitetura e Urbanismo Trabalho Final de Graduação III Orientador: Prof. Dr. Evandro Fiorin Co-orientadora: Prof. Dra. Marília Coelho RUTE ALESSI TEDESCHI Dezembro/2011 Aos meus pais, Nino e Alfa pelo apoio, amor, companhia e incentivo nos momentos difíceis. Vocês são meus alicerces, meus amores, motivo da minha gratidão à Deus todos os dias. Obrigada por sempre me lembrarem quem eu sou. A minha irmã, pelo amor, paciência e cuidado durante todos esses cinco anos. Dizer que você é minha metade é muito pouco para expressar o quanto faz parte de mim, o quanto te respeito e te amo. A Leandro, meu querido e extrovertido cunhado, que faz parte dessa metade também. Aos meus queridos amigos da faculdade, pelas risadas, choros discussões, reconciliações e abraços sempre ternos. Aos meus mais próximos Talita, Ana Beatriz, Fernanda, Munique, Patrícia, Milena e Lucas tão amados quanto irmãos. E a todos os outros, que por vezes distantes, fizeram desses cinco anos os melhores da minha vida. Aos meus amigos da caminhada da vida, que me ensinaram que “TUDO” não se resumia a um período, profissão ou legado. Vocês me ensinam o que vale a pena na vida, pois sabemos que lutamos por Alguém maior que todos nós. Aos meus amigos que estão longe, agradeço ao tempo dedicado às conversas, mesmo que por horas a fio. Vocês me ensinaram a amar à distância e a sofrer de saudades. Aos meus orientadores e professores, pela paciência, dedicação e incentivo. E acima de todas as coisas ao meu Eterno Amigo, Àquele que é o Criador de toda Arte a quem sempre serão dedicados meus aplausos, pois nEle se completam todas as coisas, inclusive tudo o que sou. Agradecimentos • APRESENTAÇÃO.................................................006 • JUSTIFICATIVA DO PROJETO.....................................008 • OBJETIVO GERAL...............................................009 • OBJETIVOS ESPECÍFICOS .......................................009 O CORPO NA HISTÓRIA DA CIDADE • O Homem: Vitruviano, Haussmaniano, Courbusiano e o contemporâneo- olhar, leitura, releitura e inovação..........011 • RECORTE ESPACIAL.............................................015 URBE FRANKENSTEIN: A cidade monstro • A CIDADE MONSTRO: a junção de diversos corpos................017 • CICATRIZ ....................................................019 • O CORPO QUE SE DELIMITA, O CORPO QUE SE ESTENDE .............020 EDIFÍCIO • PRESIDENTE PRUDENTE: leituras corpóreas .....................022 • SONHO x PRODUÇÃO x PROMOÇÃO .................................024 • FORMA (!) x CONTEÚDO (?) ....................................026 • A MARCA: Tatuagens x Grafite ................................027 • A MARCA: Piercing x Arquitetura efêmera .....................028 • O FEIO ......................................................030 • O CORAÇÃO ..................................................031 • A PRÓTESE ...................................................032 • A LÁGRIMA ...................................................033 • MARCAS DO TEMPO: ambiência urbana, memória resgatada e interferência contemporânea .................................034 • DISCUSSÃO: O corpo contemporâneo e o urbano .................036 Sumário 003 CORPO- Projeto • A FUNÇÃO: O olhar do arquiteto modernista e os silos e fábricas do século XIX..................................................039 • ESTUDO DE CASO: Performers House Folk High School- Silkeborg/Dinamarca a)Descrição da Arquitetura ..................................042 b)Plantas, Cortes e Fotografias .............................043 ÁREA DE INTERVENÇÃO • LEVANTAMENTO DO ENTORNO E MAPAS .............................047 • MAPA DE USO, OCUPAÇÃO E GABARITO............................048 • ESTUDO DO SENTIDO DAS VIAS ..................................051 • MAPA DE USO E OCUPAÇÃO DO SOLO ..............................052 • ESTUDO DA INSOLAÇÃO E VENTOS.................................053 • ESTUDO DA IMPLANTAÇÃO E EDIFICAÇÕES EXISTENTES...............055 • FOTOS: Edificação............................................058 • FOTOS: Entorno...............................................061 • DIRETRIZES PROJETUAIS........................................063 • PLANTA BAIXA DA ARQUITETURA ATUAL............................064 • FLUXOGRAMA/ORGANOGRAMA.......................................065 • PROGRAMA DE NECESSIDADES E PRÉ-DIMENSIONAMENTO...............066 PROJETO • MEMORIAL DESCRITIVO..........................................068 • APONTAMENTOS.................................................069 • PERSPECTIVAS.................................................070 ANEXOS • BREVE HISTÓRICO DAS ATIVIDADES a) História do Teatro........................................080 b) História da Dança.........................................081 c) História do Circo.........................................083 d) História da Performance...................................085 • MODELO DA QUESTIONÁRIO.......................................087 • LISTAGEM DAS LOCALIDADES LIGADAS A CULTURA NA CIDADE.........088 • REFERÊNCIAS..................................................089 004 O corpo é a habitação mais elementar do ser humano e a primeira arquitetura da qual realmente fazemos uso. Estudá-lo em uma análise ligada a cidade nos parece fundamental. Tanto o corpo como a arquitetura podem ser diretamente relacionados: ambos estão profundamente ligados ao caráter de habitação e apropriação de um lócus pela ação do individuo (tanto o espaço restrito ao corpo como aquele construído artificialmente) e de uma forma mais abrangente, tais papéis são simultaneamente vistos na cidade. A qualidade das interações entre o ambiente construído, vivenciado ou habitado e o ser humano (que por vezes estabelece-se como agente produtor do espaço) pode dessa forma, ser tratado de um ponto de vista genérico. Como cita CABRAL FILHO(2007), em artigo publicado no portal Vitrúvius: “Assim, a Arquitetura assume-se cada vez mais como um vazio relacional, onde a injunções do habitante enquanto um sujeito desejante passam a ser prioritárias... Se no início do século XX Le Corbusier, um dos expoentes da arquitetura moderna, propunha o passeio arquitetural como uma grande inovação, no qual o habitante desvelaria a arquitetura ao percorrê-la, vemos hoje arquiteturas onde o corpo não só desvela o espaço, mas na verdade altera as qualidades do próprio espaço quando nele se movimenta. Aqui o corpo não é mais apenas referência analógica para a construção da edificação, e nem é apenas o elemento que descobre a arquitetura, aqui o corpo com seu movimento passa efetivamente a construir a arquitetura, certamente uma arquitetura que se faz e se refaz na relação com o habitante.” Apresentação 006 Então, arquitetura, corpo e cidade estão intrinsecamente ligados e nos parece ser obvio o motivo de uma pesquisa que entrelace as áreas citadas. A necessidade de uma base teórica para a formulação de um projeto arquitetônico eficiente se dá à medida que se discute o assunto envolvido teoricamente, estabelece-se o recorte temporal e espacial para que a arquitetura se dê de forma consciente, articulada com o espaço urbano, sem perder as características artísticas e orgânicas provenientes da própria concepção da vida. Nossa proposta se volta, então, para a cidade de Presidente Prudente, importante pólo regional do oeste paulista escolhido como um universo laboratório, para a implementação de uma proposta de intervenção, dentro da compreensão de articulação acima observada sendo de caráter bastante profícuo. Bailarina de Tui-tui. Foto: acervo pessoal. Espetáculo “ Tribal” em apresentação no Teatro César Cava. Compania: Núcleo de Formação em Dança. Presidente Prudente–SP. Foto: acervo pessoal. Espetáculo “ Acordar” em apresentação no Teatro César Cava. Compania: Núcleo de Formação em Dança. Presidente Prudente–SP. Foto: acervo pessoal. 007 Justificativa do projeto A arte corporal é pouco difundida no Brasil, ainda que a cultura nacional esteja intrinsecamente ligada ao corpo, não existe uma forma eficaz aplicada à formação de profissionais das áreas nem mesmo há educação para criar um senso artístico crítico e geração de platéia. Com a falta de investimentos no fomento e formação de arte, os artistas acabam por optar pela privatização de seus atributos, o que por vezes os leva a não capacidade de administrar suas companhias sendo visto, assim, o fim de muitos projetos e carreiras. O trabalho aqui proposto busca a união dos diversos tipos de artes (já estabelecidos no recorte temático) em um só local onde serão desenvolvidos projetos que buscarão absorver as demandas de artistas em situação como a descrita no parágrafo acima. Além de possibilitar a formação técnica dos profissionais, o Centro de Artes Corporais será local de exposição dos próprios produtos gerados durante os processos desenvolvidos nas oficinas, já incentivando a formação de público para as determinadas artes, buscando dessa forma, tanto sanar parte da carência por espetáculos de tal cunho, tanto quanto se estabelecer como lócus cuja identidade seja o caráter polarizador de arte que existe na cidade de Presidente Prudente. Sabe-se que, por conta da ausência de um cadastro eficaz de artistas citadinos, ocorre também a conseqüente segmentação entre as diversas classes artísticas, o que por vezes, aliena os artistas em seu próprio estilo e os impede de trocarem experiências com intérpretes de outras áreas. Neste quesito, o projeto estabelecer- se-á como local de vivência e convivência entre os diferentes, privilegiando o conhecimento e/ou o descobrimento da multidisciplinaridade, que é o foco principal do projeto. Desse modo, busca-se com a proposta, uma arquitetura que privilegie os conceitos relacionados às artes que envolvem o corpo estabelecendo-se como um centro de estudos, desenvolvimento e formação de profissionais que abrangerá diversos públicos da cidade. Espetáculo Culto ao Corpo em apresentação no Teatro Ópera de Arame- Curitiba. Compania: Núcleo de Formação em Dança.Presidente Prudente–SP. Foto: acervo pessoal. 008 Objetivo Geral Formulação de um projeto arquitetônico que atenda as exigências da proposta ideológica, social e artística que envolve e aliança o plano como um todo. Intenciona-se com a pesquisa: • Levantamento teórico que subsidie a produção de um projeto arquitetônico executável a realidade da cidade de Presidente Prudente. • Levantamento, através das pesquisas de campo, do perfil dos artistas citadinos. • Análise dos estudos de caso para perceber possíveis aplicações no futuro projeto. • Análise das diretrizes urbanas para a melhor inserção da arquitetura efêmera cultural ao contexto citadino. • Estudar sobre artes corporais intenciona abrir o caminho para a discussão, sua ocorrência no mundo e no Brasil, bem como gerar pesquisa que subsidie um projeto arquitetônico para o determinado programa já pré-estabelecido: um centro que agregue diversos tipos de artes corporais. Interessa-nos avaliar quais as possíveis influências dos citados tipos de expressões artísticas sobre a população a quem o projeto se direciona, bem como a formação de público e de profissionais para as áreas capacitadas. Interessa-nos avaliar quais as possíveis influências dos citados tipos de expressões artísticas sobre a população a quem o projeto se direciona, bem como a formação de público e de profissionais para as áreas capacitadas. • A pesquisa teórica objetiva a caracterização teórica das artes elencadas (performance, teatro, circo e Dança), para gerar elementos que contribuam à proposição de diretrizes para alcançar os objetivos do projeto. • Concepção de um produto arquitetônico que abranja os conceitos que garantam a boa arquitetura, como de salubridade, conforto ambiental, permeabilidade, transposição dos limites sociais e inserção na realidade urbana. Objetivos Específicos 009 URBE, EDIFÍCIO, CORPO O Corpo na História da Cidade Corpo dando forma ao edifício e a urbe 010 “Uma corpografiaurbana é um tipo de cartografia realizada pelo e no corpo, ou seja, a memória urbana inscrita no corpo, o registro de sua experiência da cidade, uma espécie de grafia urbana, da própria cidade vivida, que fica inscrita mas também configura o corpo de quem a experimenta” (BRITO, 2008). NOTA: Excerto extraído do texto : “ Corpografias urbanas”, de Fabiana Dutra Britto. UFBA. Simetria latente, o corpo é a métrica perfeita de si mesmo. Os olhos que se voltam para o desenvolvimento das cidades desde os primeiros aglomerados greco-romanos escoravam- se sobre as características corpóreas para a formulação de um desenho citadino que fosse pertinente as necessidades de habitar e desenvolver-se em comunidade. O homem Vitruviano exemplifica o que seriam as bases do pensamento renascentista. Desde o final da idade média, com o surgimento dos conceitos iluministas e as influências artísticas advindas dos greco-romanos, a cidade parece ser pensada de forma ideal. No início do século XVI, como cita BENEVOLO(2009) em “História da Cidade”: “De fato, a arte ocupa um lugar central na cultura do tempo: é uma disciplina geral, capaz de conhecer e dominar todo o ambiente físico, evidenciando ao mesmo tempo a beleza e a verdade das coisas: define por antecipação o mundo ilimitado e mensurável que será percorrido pelos exploradores do século XVI...” (BENEVOLO,2009, p. 421). O Homem: Vitruviano, Haussmaniano, Courbusiano e o contemporâneo- olhar, leitura, releitura e inovação A arte desenvolve-se em torno de tais avanços, que influenciam-na profundamente, como por exemplo, na perspectiva, conferindo-lhe novos valores. O plano de cidade renascentista ergue-se sob o prisma das formas poligonais e estelares da cittá ideale além disso apóia-se na teoria do edifício que organiza-se em torno de um núcleo central, reforçando a idéia da perspectiva. Porém, na prática, é fato que muitas das cidades planejadas em torno deste prisma não foram executadas da forma originalmente desenhada. Fatores como falta de estabilidade política, meios financeiros que viabilizassem os governos renascentistas a executarem e os artistas que trabalhavam individualmente (longe de organizações que dariam continuidade ao plano inicial) enfraqueceram a idéia de produzir tal cidade, porém, em edifícios isolados, a proporção e regularidade foram instituídas. BENEVOLO(2009) ainda diz: “Os literatos e os pintores descrevem ou pintam a nova cidade que não se pode construir, e que permanece, justamente, um objetivo teórico, a cidade ideal.” (BENEVOLO,2009, p. 425). Filarete, cidade ideal radial estrelada (cerca de 1465). Foto: extraída do livro “Espaço, tempo e Arquitetura”, S. Giedion. O homem Vitruviano, Leonardo da Vincci. 011 A forma ideal renascentista, advinda da idéia das proporções corpóreas exploradas por Da Vinci, são retomadas e ampliadas na Paris do século XIX. As tentativas de modernizar e melhorar a qualidade das cidades industriais (cujas pragas e doenças matavam milhares de pessoas) resultaram em planos ideais e/ou intervenções setoriais de melhoria. A cidade dos monumentos perde-se em meio àquela dos casebres e indústrias, dando origem à cidade liberal. Quando, das revoluções decorre a burguesia dominante unida em um interesse aparentemente unânime, estabelece-se a cidade pós-liberal. Agora, os limites de público e privado são definidos criando o novo desenho da cidade, o centro se redefine como lócus do comércio, a periferia é precarizada pelo aumento do preço dos lotes. De 1851 a 1870 as intervenções em Paris (também decorrentes de Haussmann) geram: novas ruas nos conjuntos habitacionais, novos serviços públicos e fluência dos espaços, além do destaque a que se confere os monumentos históricos e grandes edifícios e o ato de remodelar a cidade às novas exigências pós revolução Industrial com o uso do automóvel. Tal cidade é a representação deste novo homem: ávido pela tecnologia, desenvolvimento. As ruas abrem-se como “veias” que permitem os fluxos contínuos, a velocidade dos posteriores automóveis. A cidade modernista surge então com tais decorrências. As diferentes alterações aqui transformam-se em desenhos urbanos que refletem a modernização de um tempo funcional. O homem, segundo Le Courbusier, precisa na cidade: habitar (a residência se torna elemento mais importante da cidade), trabalhar, cultivar o corpo e o espírito e circular. O poder público retoma o controle sobre o espaço da cidade. As zonas nas quais a cidade é dividida mostram a necessidade de se operar uma “máquina urbana” que apresente resultados e tenha alta “performance”. O estudo cuidadoso de Le Courbusier sobre o corpo em “O Modulor” é uma análise nova sobre a influência deste corpo que irá habitar a “máquina moderna de morar”. Delimitando o corpo habitante, seria possível preparar a unidade mínima da condição mais básica da vida humana: a residência. É o funcionamento que está em foco. À esquerda representação de Gustav Eiffel como sua prÓpria criação : a torre, elemento fundamental na caracterização da cidade industrial. Fonte: caricatura de JVPD. À direita, Paris de Haussmann e as ruas abertas na malha urbana, como “ veias” urbanas. Foto: extraída do livro “Espaço, tempo e Arquitetura”, S. Giedion. 012 No caso do cenário brasileiro, a cidade de Brasília desenvolvida pela parceria de Oscar Niemeyer e Lúcio Costa na década de 1960, remete aos moldes modernistas. Os desenhos de Niemeyer baseados no corpo da mulher sempre foram o mote inicial de suas criações cujas interpretações permitiam, por sua vez, leituras semióticas infinitas. No Plano Piloto concebido por Lúcio Costa a simplicidade foi o elemento principal: a organização se deu em torno de dois eixos em cruz. Costa disse que Brasília "nasceu do gesto primário de quem assinala um lugar ou dele toma posse: dois eixos cruzando-se em ângulo reto, ou seja, o próprio sinal-da-cruz". Na prática, as intervenções das imensas edificações e a implantação das super-quadras privilegiaram os prédios como monumentos do “olhar” não do sentir: as distâncias imensas só podem ser confortavelmente vivenciadas ao transitar por veículos automotores. Brasília, hoje, apesar dos imensos investimentos em planejamento, desenvolveu-se de forma desenfreada com diversos problemas de infra- estrutura urbana. O pipocar das cidades satélites criou um exemplo claro da apropriação contemporânea dessa “máquina de viver”. A cidade contemporânea, genericamente, torna-se o produto do acúmulo de tempos, idéias e planos anteriores, readequados as sucessivas inovações tecnológicas e À esquerda, desenhos de mulher, Niemeyer. Fonte: extraída do livro “A forma na Arquitetura”, Oscar Niemeyer. À direita, eixo monumental de Brasília (fotos da inauguração da cidade) com obras de Niemeyer. 013 À esquerda O modulor Fonte: extraída do livro “A arquitetura”, Le Courbusier. À direita, projeto de Le Coubusier para uma zona insalubre a ser saneada em Paris. Fonte: “História da cidade”, Leonardo Benevolo. intervenções humanas. Giedion, em seu livro “Espaço, tempo e arquitetura: o desenvolvimento de uma nova tradição”, relata da invenção, ou melhor, da adequação do conceito advindo da sociedade industrial de “integrar” que significa criar um todo a partir de partes diferentes. Giedion, diante do contexto atual, cita o homem como a parte principal que carece de integração pela sua latente necessidade de “humanizar –isto é, reabsorver emocionalmente – aquilo que foi criado pela inteligência. Todo o discurso sobre a organização e o planejamento será em vão, ao menos que criemos primeiro o homem inteiro, íntegro em seus métodos de pensar e sentir”(GIEDION,p.903). A posição enfática de Giedion sobre adequar a urbe contemporânea de forma a integrá-la leva-nos a questionar se verdadeiramente existe a necessidade (ou mesmo capacidade) por parte do planejamento urbano de integrar a cidade em um “corpo” único e indivisível. É fato que o homem, assim como a cidade numa escala mais ampla, são “corpos” divididos em mínimas e inúmeras partes complexamente distintas e que a todo momento estabelecem um jogo de relações, aproximação e distanciamento. O esfacelamento deste corpo (quer cidade, quer humano) pode, por vezes, ser lido como a cultura de uma época de individualismo e segregação. No entanto, parece-nos utópico o pensamento de um corpo provido de tantas facetas ser representativamente homogêneo. Tal discussão será amplamente apresentada neste trabalho, através de perpasses por análises que relacionarão corpo, arquitetura e cidade e apontarão uma das inúmeras análises passíveis de discussão a partir de leituras relevantes do sistema que preferimos chamar de “corpo hurbano”. A pós-modernidade de fato afasta-se da simetria prevista pelo homem vitruviano. A releitura contemporânea se dá no ponto em que não somos tão perfeitos, ajustados ou corretos. A urbe não é mais simétrica como no homem vitruviano de Leonardo da Vinci ou o modulor de Le Courbusier. A cidade hoje, é o reflexo do homem contemporâneo: em parte colada, deslocada, passado e futuro convivendo no mesmo espaço, observando assim, a latente necessidade de sentir e fazer-se sentir, criando sentidos. Espetáculo “texturas”. Cia. Mudança. Foto: acervo pessoal 014 Cidade de Presidente Prudente. Foto: acervo pessoal Recorte Espacial A cidade de Presidente Prudente estabelece-se como um pólo atrativo populacional por diversos fatores. O caráter de cidade média como centralidade que polariza serviços, bens, comércio, informação e capacidade de decisão (força política) torna-a espaço propício para a inserção da proposta arquitetônico-cultural pretendida por este trabalho, já que além de capacidade de absorção dos produtos por parte da população em franca expansão, também apresenta-se como centralidade conectora entre cidades menores da região e a metrópole, o que acaba por conferir a cidade prudentina maior capacidade de comunicação e atualização tanto do mercado quanto da produção cultural presente na realidade das metrópoles. Outro fator que se acha pertinente salientar, é sobre o caráter histórico cultural de Presidente Prudente. As políticas públicas de incentivo a cultura sempre seguiram o rigor que um anfiteatro locado no subsolo da Prefeitura Municipal. A perceptível potencialidade em instituir-se um projeto como este da presente monografia para a realidade regional é salientada pelo conceito arquitetônico que envolve o projeto: o caráter híbrido- conceitual da arquitetura proposta impera onde o espaço fixo (lócus das inter-relações artísticas) e o “espaço itinerante” (local da apropriação do corpo através dos produtos concebidos nas experimentações) rompe com a estrutura fixa e desloca-se da edificação rumo à itinerância urbana. A força motriz do projeto se dá exatamente na ausência de projetos de mesmo cunho na cidade e região. Pelo caráter do hibridismo com a arquitetura efêmera, o projeto permite a possibilidade de instalações em diversos pontos da malha citadina e desprestigia o caráter de benfeitoria bairrista, mas salienta a característica de benefício promotor da cidadania urbana. da característica coronelista da cidade, onde interesses de uma minoria portadora do poder direcionava os gastos com o setor cultural. Dentro deste contexto, os espaços de cultura ficaram reduzidos àqueles visados por tal minoria (ou seja, quem poderia pagar pelo uso destes, tal qual o caso do Teatro César Cava), bem como outros foram se desfazendo no tempo (tal qual o teatro Municipal “Procópio Ferreira”, que na verdade nada mais é Cidade de Presidente Prudente. Charge publicada no jornal “Oeste Notícias, 12/09/2010. 015 016 URBE, EDIFÍCIO, CORPO FRANKENSTEIN A CIDADE MONSTRO •A CIDADE MONSTRO: a junção de diversos corpos •CICATRIZ •O CORPO QUE SE DELIMITA, O CORPO QUE SE ESTENDE A CIDADE MONSTRO: a junção de diversos corpos O mito do Frankenstein remete-nos a idéia principal do que seja cidade contemporânea: a cidade monstro como a junção de diversos corpos. Características desse corpo, muitas vezes mutilado, separado, marcado serão discutidas a seguir. Aparentemente, vale a comparação com Frankenstein no que tange a diversidade de componentes e junções. A cidade, o corpo. Formados por diversos agentes que geram produtos que originam cidade, formas, conteúdos, cidadãos. As diversas cidades brasileiras apresentam-se também desta forma: corpos que se modificam a todo instante, repartem-se e se unem, partes por vezes amorfas, destoantes porém quando unidas formam significados que compõe a cidade. Presidente Prudente, localizada no interior do estado de São Paulo, foi fundada em 1917 e apresenta-se como universo de pesquisa sobre o qual preferimos nos debruçar. As junções de diversos elementos urbanos formados por classes e indivíduos diferentes trazem o corpo urbano que estaremos a seguir discutindo, formado do feio, do belo, do funcional, do inútil. Do completo, do incompleto e do “em formação”. A cidade desdobra-se sobre importante caráter histórico que será brevemente discutido a seguir, lembrando-nos a todo momento da valia da interação dos agentes produtores para a formação daquilo que chamamos de “corpos hurbanos”. Presidente Prudente e suas avenidas principais. Acervo pessoal. Poster de Frankenstein Feminino. Gravura de Bernie Wrightson. 017 caracterização deste “corpo urbano” que aqui se forma, desenvolve e apropria da topografia dando-lhe os novos usos e necessidades pertinentes. Hoje, contando com mais de 207.725 habitantes (estimativa Presidente Prudente, bem como outras cidades do interior paulista, contemplou um acelerado povoamento gerado pela instalação da Estrada de Ferro Sorocabana que ligava-a aos grandes centros para onde a produção de grãos era levada. As margens do leito férreo, a cidade se desenvolveu em dois grandes núcleos: o do Coronel Francisco de Paula Goulart (pioneiro explorador do comércio de grãos e com ideais de povoamento, que resultou na ampliação da cidade à direção oeste) e o do Coronel José Soares Marcondes (desenvolve-se em direção a zona leste da cidade e trabalha como um promotor da especulação das terras que comprava e revendia-as aos grandes cafeicultores, sendo o coração da urbe até os anos de 1950). As diferenças claras na intenção de fixar a população local, a queda na venda dos produtos agrários pela conjuntura mundial (fato que levou muitas empresas -estocadoras e beneficiadoras de café, algodão, amendoim- a “quebrarem”, saírem da cidade e deixarem verdadeiros monumentos industriais abandonados) e as dificuldades topográficas encontradas na área culminaram no esquecimento da Zona Leste e desenvolvimento dos outros setores da cidade. *NOTA: Para maiores informações sobre o projeto CURA vide “Habitação de interesse social jardim Francisco Belo Galindo em Presidente Prudente” de autoria de Fernando de Oliveira Amorim. Presidente Prudente: Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, 2008. As grandes avenidas, com o passar dos anos, ganharam prestígio e o comércio se desenvolveu em seus arredores vorazmente. Um fator interessante, que é possível conferir em diversas outras cidades brasileiras é que após um período de efervescência de um centro urbano consolidado, ocorre a mutação da visão do mesmo como lócus de comércio principal da cidade para a emancipação e surgimento dos subcentros localizados em outras áreas, mostrando as diversas transformações no espaço urbano ao longo das décadas. Intervenções urbanas como tentativa de reaver os espaços esquecidos/abandonados da Zona Leste e outras localidades degradadas foram contemplados em planos de melhoria urbana como o “CURA”* que geraram uma série de resultados positivos para a população. Todas estas alterações são também responsáveis pela Praça Matriz de Presidente Prudente. Foto: Revista Vitrine Arquitetura e Construção,Janeiro de 2011. populacional IBGE-2009), é um lócus sobre o qual tais estudos podem ser desenvolvidos. Praça em frente ao Prudenshopping. Fonte: Revista Vitrine Arquitetura e Construção, , Janeiro de 2011. 018 elemento de segregação espacial (como é o caso da Zona Leste onde a linha férrea funciona como fortalecedor do estigma da pobreza e falta de desenvolvimento encontrando suas raízes na ocupação histórica da cidade*). Além disso, vias como a Manoel Goulart são exemplos claros da ação dos agentes promotores da especulação imobiliária na urbe, elevando os preços dos lotes nestes locais e selecionando a classe adquirente, não só dos mesmos, mas daquilo que é fornecido e beneficiado por eles. A cicatriz gera a formulação de um corpo alterado. Insere-se no corpo humano como uma marca da cura. Na cidade, a cicatriz “habita” do mesmo modo: “cura” para a distância como a linha férrea e as grandes avenidas. No entanto, tais elementos também podem ser vistos como entrave e barreira promotora do distanciamento de realidades. Em Presidente Prudente, é fato que tais elementos funcionam da forma citada. Ao mesmo tempo que laboram como meio de conexão de distâncias (como a Avenida Manoel Goulart e Washington Luis) funcionam como *NOTA: Para maiores informações sobre a história da cidade de Presidente Prudente, consulte o texto de Diores Santos Abreu “Formação histórica de uma cidade pioneira paulista: Presidente Prudente”. Presidente Prudente : Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, 1972. 339 p. C I CATRIZ Foto: Silver Screen Collection Archive Photos/ Getty Images Foto: Renee Keith/ Getty Images Presidente Prudente, destaque linha férrea. Acervo pessoal. 019 Presidente Prudente, vide loteamentos distantes da malha consolidada. Fonte mapa e foto: Acervo pessoal. O corpo humano é delimitado por sua forma física que, de acordo com a compleição e treinamento, é capaz de adquirir diversas formas. A cidade se desenvolve da mesma forma: é delimitada por suas vias públicas, travessias, linhas férreas, elementos e relações que podemos conferir na cidade prudentina. Além disso, tanto o corpo humano quanto o urbano, na tentativa de transpor limites, expandindo-se vai além de suas fronteiras e formata-se de forma diferente a cada nova extensão. É o que conferimos na cidade de Presidente Prudente com a abertura de novos loteamentos afastados do centro já consolidado. Importa ressaltar que tais medidas fazem com que a cidade se expanda nem sempre garantindo qualidade de vida a população. O CORPO QUE SE DELIMITA, O C O R P O Q U E S E E S T E N D E . Estender: ir além do limite, criar novos limites. 020 Delimitar: Limitação do espaço de estar contido em algo, pertencer à. Presidente Prudente, destaque anel viário. Fonte mapa e foto: Acervo pessoal. Legenda -- Linha férrea + anel viário 021 URBE, EDIFÍCIO, CORPO PRESIDENTE PRUDENTE Leituras Corpóreas PRUDENSHOPPING MATARAZZO PARQUE DO POVO TEATRO CÉSAR CAVA TEATRO MUNICIPAL PRAÇA NOVE DE JULHO OFICINA CULTURAL Timochenco Wehbi SESC A seguir, faremos considerações sobre objetos e/ou espaços arquitetônicos que nos interessa estudar dentro da malha urbana de Presidente Prudente. Selecionamos os seguintes locais para tal discussão: PRUDENSHOPPING, CENTRO CULTURAL MATARAZZO, I.B.C., PARQUE DO POVO, TEATRO MUNICIPAL PROCÓPIO FERREIRA, PRAÇA NOVE DE JULHO, TEATRO CÉSAR CAVA, SESC E ÁREA DE INTERVENÇÃO (proposta). Estabeleceremos comparações conferindo identidade a tais lugares e almejando construir o chamado “corpo hurbano” dentro da realidade prudentina. Como já dissemos, Presidente Prudente desenvolveu-se especialmente vinculada a estrada de ferro. Com o desenvolvimento do setor agro- industrial pelo período técnico-cientifíco-informacional a urbe se desenvolve, especializa e redistribui bens, desenvolvendo-se como cidade média. Hoje, se define como lócus de relações próximas e contíguas estabelecendo-se como um conector entre áreas e regiões graças ao acesso gerado pelo desenvolvimento da comunicação e transportes, que a mobiliza como uma “rede” promotora de relações e inter-relações. Ou seja, o papel da cidade média como conectora e escoadora de produtos vindos de outras cidades que a esta se ligam se fortalece. Demarcação dos pontos culturais que iremos retratar neste trabalho. Presidente Prudente.Fonte: acervo pessoal. 022 Logo, a cidade média não é somente classificada pela quantidade demográfica (como era no passado): agora mais que nunca, as funções que desempenha, assim como sua área de influência, o caráter de ser intermediária e redistribuir os bens são fatores determinantes para a caracterização de uma cidade média. 023 A cidade como produto das relações comerciais e intervenções do mercado é uma análise imprescindível para a compreensão não somente da urbe mas também do corpo humano contemporâneo. O corpo produzido é marca de uma sociedade do consumo, que muitas vezes gera corpos e espaços formatados, impulsionando a população a obter produtos para transformar-se no ideal de consumo. Segundo FANI (2001), as mudanças ocorridas pós-globalização alteraram o homem e seu conceito de lugar e espaço, com pessoas interligadas diariamente ao mundo e o consumo sendo o centro de todas as necessidades humanas; com altos investimentos em propaganda e marketing; e a corrida desenfreada de apelos imobiliários, findando na especulação imobiliária e no distanciamento das camadas menos favorecidas ao acesso a esses modernos meios de consumo, como o caso dos grandes condomínios urbanísticos e dos shoppings centers como o Prudenshopping. “Na realidade o processo de reprodução do espaço, no mundo moderno, se submete cada vez mais ao jogo do mercado imobiliário. Nesse contexto o valor de troca impresso no espaço- mercadoria- se impõe ao uso do espaço ma medida em que os modos de apropriação passam a ser determinados, cada vez mais, pelo mercado” (FANI. p.175, 2001) Ainda é pertinente a discussão sobre a transformação do ambiente de consumo em local onde ocorre o convívio social. O shopping, muitas vezes funciona como o novo espaço da praça, onde ocorrem as interações sociais, mas com certas diferenças fundamentais. No texto “La ciudad de las Mercancias”, a autora diz que as galerias e os antigos Gisele Bündchen. Fotografia de Mario Testino publicada na revista Vanity Fair, maio 2009. Sonho x Produção x Promoção Damha I, Presidente Prudente.Fotografia: site Damha Urbanizadora 024 shoppings privilegiavam o uso comunitário do espaço. Hoje, o shopping se fecha em si mesmo, onde ocorrem possibilidade de encontros, gerando a inclusão imaginária, ou seja, pessoas que não apresentam capital para consumir bens de alto custo, consomem pequenas mercadorias e vêem vitrines, com o intuito de, de alguma forma, estar em conexão com esse mundo almejado, realidade que pode ser vista em Presidente Prudente ao visitar o Prudenshopping aos fins de semana. É importante ressaltar aqui, que as classes menos favorecidas que mais necessitam de local de convívio e lazer gratuitos, pois não tem condições sociais de “consumir” o espaço, são excluídos do espaço de lazer citadino ficando não somente a margem das questões sociais, mas também físicas. Outro interessante ponto a ressaltar é a formulação deste “corpo” da urbe que é incidido, permeado por edifícios que se dispõe como obras arquitetônicas claramente desenvolvidas por padrões estéticos preestabelecidos pelos poderes econômicos vigentes. Tanto as imagens formuladas pelas edificações como a dos próprios letreiros se confunde na tentativa de vender um produto. É o caso novamente do Prudenshopping, que apresenta letreiros imensos e arquitetura imponente de fachada para estabelecer-se dentro da urbe como marca fixa do lazer (lócus Prudenshopping e seus letreiros. Foto: Acervo pessoal. Gisele Bündchen . Fotografia para campanha publicitária da Dolce & Gabbana do perfume “The one”, 2006. Fotógrafo: Jean-Baptiste Mondino. Prudenshopping. Fotografia: acervo pessoal. propicio a diversos encontros sociais) e comércio em mesmo ambiente. Estão tão incorporados um ao outro que, como diriam os autores de “Aprendendo com Las Vegas”, 2003, p.100 “o edifício é o letreiro ou o letreiro é o edifício?”. 025 Forma (!) X Conteúdo (?) O Centro Cultural Matarazzo está localizado na Vila Marcondes, bairro da Zona Leste prudentina. O intuito do projeto era servir de abrigo para a Secretaria de Cultura e alguns projetos deste calibre que ali seriam desenvolvidos. No entanto, desde antes da ocupação do edifício, ao findar-se as obras de reforma, os artistas citadinos questionavam se o recurso público que foi despendido para a reforma não deveria ter sido aplicado em outras urgências, como Todas essas considerações favorecem a proposta que aqui se apresenta como veículo de promoção da vitalidade do chamado eixo cultural, que compreende no Centro Cultural Matarazzo, I.B.C., Teatro Municipal Procópio Ferreira e o Centro de Artes Corporais, projeto aqui proposto . NOTA: *Conclusões alcançadas a partir do Projeto de Pesquisa “Centro Cultural Matarazzo: A prática cultural como instrumento de mudança de uma realidade social” desenvolvido na disciplina de Sociologia Urbana, 2008, sob a supervisão da Professora Dra. Marília Coelho. “HAMLET: Se você é honesta e bonita, sua honestidade não deveria admitir qualquer intimidade com a beleza. OFÉLIA:Senhor, com quem a beleza poderia ter melhor comércio d o que com a virtude? HAMLET: O poder da beleza transforma a honestidade em meretriz mais depressa do que a força da honestidade faz a beleza se assemelhar a ela.” NOTA: Excerto extraído do romance de Shakespeare, Hamlet, 3 ATO na melhoria da formação de artistas profissionais. Além disso, outra questão levantada pela população e por diversas classes de profissionais foi a falta de projetos fixos e aliançados ao edifício que visem a formação continuada dos profissionais (cursos permanentes). Porém a crítica mais pertinente é se, de fato, existe o impacto que era esperado na área de inserção (atraindo a população residente e modificando a realidade local) e se as políticas públicas da cidade estão viabilizando e fornecendo respaldo para a formação, ensino e divulgação da cultura e arte em Presidente Prudente.* Fotografia de Mert Alas & Marcus Piggott para Campanha publicitária do outono/ inverno 2011 de Roberto Cavalli Centro Cultural Matarazzo. Foto: Acervo pessoal. . 026 A MARCA: Tatuagens x Grafite Instituto Instituto do Brasileiro do Café (I.B.C.), que após muitos anos abandonado e sujeito a degradação, passou, no ano de 2009, por uma revitalização no entorno e reforma no prédio que recebeu, ao invés de pintura exterior, um imenso painel de grafite. Hoje funciona como centro de Eventos para a cidade, onde ocorrem feiras (Feira do Livro, Salão do Automóvel, etc), festivais (FENTEPP) bem como até casamentos. podem ser vistos no “corpo” da cidade de Presidente Prudente em diversas áreas e locais. Não mais significam uma agressão a cidadania: agora, a chamada “grafitagem” serve a sociedade como promotora de direitos e é reconhecida como arte por lei que especifica a diferença entre pichação (depredação e desenho em local urbano sem autorização) e grafite (arte)*. É fato que muitos locais ligados a cultura na cidade de Presidente Prudente, apresentam grafite em seus muros ou paredes. No entanto, pela grande quantidade e expressividade podemos citar o caso do prédio do I.B.C. – Foto: acervo pessoal Foto: Arquivo pessoal. A Marca se insere como a expressão subjetiva resultante da leitura sobre um fenômeno, coisa, pessoa. É desenho, e portanto, ainda é estética, independente da opinião do gosto. É arte por ser a simples expressão de sentimentos humanos em relação a algo ou alguém e é desta forma que se insere no corpo e no contexto urbano. Tais elementos de representação NOTA: *Lei nº 12.408 aprovada em 25 de maio de 2011. Outros locais onde existe grafite na cidade: Esquerda, muro grafitado em frente ao prudenshopping e, a direita, Centro Cultural Matarazzo- Fotos: acervo pessoal. 027 A MARCA : Piercing x Arquitetura Efêmera A Marca como efemeridade. Marca o corpo e relaciona-se com a temporalidade, seja a idade, no caso do homem, seja na transitoriedade à que se sujeita o corpo urbano pela arquitetura efêmera. De qualquer forma, as marcas como intervenções no corpo contemporâneo (seja a escala urbana, a arquitetura como edificação ou o corpo humano) o delimitam, especificam e identificam. A itinerância da arquitetura muito age a favor da proposta de trabalho aqui apresentado. Como nos moldes do antigo circo, a não perenidade está presente na proposição arquitetônica há muitos anos: desde a antiguidade estudos mostram que as primeiras formas de habitação eram de caráter móvel devido o não conhecimento de técnicas agrícolas suficientes que privilegiassem o sedentarismo, sendo que mesmo nos dias atuais, é possível perceber em algumas culturas mais primitivas, ainda este tipo de condição habitável. Ao estabelecer ligações também com o comércio através das feiras de ambulantes Parque do povo recebendo instalação para abrigar show em maio de 2011. Foto: Acervo pessoal. durante a Idade Média, a arquitetura móvel, muitas vezes apresentava-se em forma de tendas que se inseriram dentro da cena artística já na caracterização do circo mambembe e das diversas apresentações que acabou por reunir em si mesmo, como a dança e o teatro. Em Presidente Prudente, tais manifestações culturais ligadas a arquitetura efêmera ocorrem, por vezes, no espaço do parque linear da cidade, o Parque do Povo, abrigando desde shows, apresentações de circo, teatro, dança e até orquestras como a OSESP desempenhando o papel de espaço cultural em local aberto com múltiplas finalidades que demanda arquiteturas de transitoriedade e rapidez na execução. É um importante marco na cidade, representando para a população lazer aliado a cultura e as interações sociais. OSESP- Apresentação no Parque do Povo de Presidente Prudente.Foto: Arquivo pessoal. NOTA: OSESP- Desde 2007 a Feeling Eventos monta estruturas para apresentações da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo que esteve em Presidente Prudente. Palco GeoSpace 18×23 alongado (9m de boca de cena), plataformas, barricadas e estrutura para som. 028 A proposta da arquitetura temporária assemelha-se muito a marca corpórea do piercing no que diz respeito a possibilidade de transição da mesma levando-a a outros locais que não os de origem (membros do corpo ou lócus da urbe, respectivamente). A diferença latente entre esta marca e a marca permanente confere a ambas especificidades que caracterizam o espaço onde se inserem como único: seja com o grafite nas paredes ou uma instalação efêmera, o lócus é modificado pela aplicação de tais elementos e adquire conceitos novos advindos dos mesmos criando não só a junção, mas a formação do novo corpo e de seus novos significados. NOTA: Serpentine Gallery trata-se de uma galeria de arte moderna e contemporânea localizada em Londres que abriga exposições de artes plásticas, Arquitetura, Educação e Programas Públicos atraindo mais de 800.000 visitantes em um ano e a entrada é gratuita. A nível nacional, a chamada arquitetura móvel está presente em alguns projetos como no da FLIP e no projeto Orquestra itinerante da OSESP. OSESP- Vistas da estrutura e fotos de instalações em Santos/SP (2007) e em São Luís/MA (2008). Fonte: Site Feeling Eventos. Piercing Captiva, um dos mais utilizados por causa de sua versatilidade. Fonte: Site Aura Prata e Pedras Acima: Tenda dos Autores. Paraty- RJ. Foto: Site da FLIP. Abaixo: Serpentine Pavilon Gallery. Foto: Site da Galeria. 029 Assim como na caracterização do corpo composto de partes distintas coladas e ajustadas, é fato que na construção de uma imagem da cidade a arquitetura chamada “feia” é parcela imprescindível. No livro “Aprendendo com Las Vegas” os autores discutem sobre a caracterização do que seria arquitetura feia e banal (a exemplo do “Patinho de Long Island” que “sugere significados mais ou menos concretos mediante a associação ou a experiência passada”) versus a arquitetura heróica e original (“emite sentidos abstratos reconhecidos no caráter fisionômico dos elementos”) diante da análise de apropriação do simbolismo. O simbolismo na cidade de Las Vegas vai além da forma ou do processo. É a imagem que está em discussão. Em Presidente Prudente, podemos experenciar algo que talvez seria próximo da realidade do “feio e banal”. O Teatro Municipal “Procópio Ferreira”, que se encontra locado sob a prefeitura da cidade, é um dos pontos principais onde ocorrem apresentações de cunho artístico. À direita, Teatro Municipal “Procópio Ferreira”, placa indicativa (maior símbolo que sua própria arquitetura) e a arte recentemente grafitada no muro (“marca”). Foto: Acervo pessoal. Acima, à esquerda “Decorated Shed” de VENTURI. Foto: Livro “ Aprendendo com Las Vegas”. O Feio A arquitetura não é imponente mas o conceito da atividade ali desenvolvida apresenta-se especificado no grande letreiro e trabalho (primitivo) luminotécnico instalados, que funcionam como texto explicativo do que o local se trata. Apresenta-se mergulhado sob um prédio de valor modernista (a Prefeitura Municipal, diga-se de passagem) situação na qual as características de sua arte (do teatro) não foram fundamentais para sua promoção, sendo importante ressaltar, no entanto, que se trata mesmo assim de um interessante exemplo de sala de espetáculos, algo mais modesto do que deveria ser um teatro municipal. Seria, provavelmente, o “galpão decorado” citado no livro “Aprendendo com Las Vegas” onde os autores exemplificam o simbolismo aparece nos ornamentos que se aplicam independentes sobre um galpão de construção regular, cujo interesse primordial é facilitar a venda do produto desejado. É fato que percebemos apropriações deste espaço formulando as chamadas “marcas” como é o caso do grafite apresentado na fotografia. O teatro estabelece-se no lócus do antigo porão da Prefeitura. Tem capacidade para apenas 286 pessoas, lotação esta não satisfatória para o contingente que a cidade demanda. L 27 030 O coração é o que faz o corpo humano funcionar, é a bomba que promove a vida do mesmo. Também, é parte inicial na configuração do embrião. Na cidade, o centro age da mesma forma: onde ocorrem as primeiras implantações de edifícios, comércio, atividades e ponto inicial da organização daquilo que chamamos de urbe. Lócus responsável pelas primeiras ocupações na cidade de Presidente Prudente, a Praça Nove de Julho, localizada no centro, é um marco histórico onde se concentraram as primeiras construções culturais como a Igreja Matriz, cinemas antigos e o primeiro coreto da cidade. Hoje, o coreto cedeu lugar a um teatro de arena e tem sido palco de diversas manifestações artístico- culturais de festivais a nível citadino e nacional, tendo servido de lócus que possibilita a interlocução aproximada de artistas e público, sendo importante fonte de divulgação da arte cênica. O Coração “BUTOH”. Apresentação na Praça 9 de Julho. Foto: Débora André “Coração”. Fonte: Postado no Blog “TERRAGIRA”. Núcleo de Formação em Dança- Aula aberta na Praça 9 de Julho. Foto: Marcelo Gretter 27 031 Universidade do Oeste Paulista Campus I) e funciona como anfiteatro da mesma. O teatro abriga a maior parte das apresentações que o correm na cidade em termos de teatro e dança, sendo dos pontos de Cultura, o mais nobre em aparelhamento técnico. No entanto, este espaço ainda apresenta-se como uma medida paliativa do que deveria ser um teatro que servisse a demanda da população, por ter dimensões reduzidas, por não apresentar toda a capacidade de um teatro real (não apresenta fosso, por exemplo) e o pequeno espaço físico que não permite futuras ampliações (por estar “encravado” à edificação da universidade, já que ocupa grande parte de um dos prédios do primeiro pavimento do campus I). A prótese é um “corpo imitação”. É a mímese daquilo que é real, desempenhando funções análogas porém de forma artificial. Na cidade, espaços que se inserem como intervenções que não são projetadas “naturalmente” (planejadas) para as devidas atividades, acabam por estabelecer-se como espaços deficitários cuja mobilidade é reduzida, como no caso da prótese no corpo humano onde isto ocorre com a mobilidade física. O Teatro Universitário César Cava insere-se, a exemplo do teatro municipal, incorporado a outra edificação (a A Prótese Prótese. Fonte: Site da SOGAB. Interior do Teatro César Cava. Foto: Chikasawa Ricardo Campus I Unoeste. Localização do Teatro César Cava. Foto: Acervo pessoal. Teatro césar Cava. Foto: Acervo pessoal. 27 Prótese. Fonte: Site da SOGAB. 032 A lágrima purifica e lubrifica os olhos, além de, por ser proveniente do âmago do ser, apresentar uma temperatura relativa ao mesmo. Quando transformada em choro, alivia as tensões* e dá a sensação de bem estar. De uma forma análoga, as fontes de água termal, por serem ricas em minerais e pela alta temperatura , são responsáveis pelo tratamento de inúmeros A Lágrima instalada a sede da unidade Sesc prudentina, porém desde a década de 1960, o mesmo já atuava na cidade nas áreas da saúde, ação comunitária e desenvolvimento sócio-cultural. Em 2009 ocorreu a doação definitiva do antigo balneário Thermas (quase 37 mil metros quadrados) para o Sesc. Hoje promove, constantemente, eventos culturais que atingem todas as classes socais e artísticas. É um importante agente promotor NOTA: *Informações da Revista Planeta, ed. 427. ** Informação da Revista Cidades do Brasil. medo, raiva, alegria ou tristeza que muitas vezes são expressos por lágrimas. Em Presidente Prudente, pode-se observar a ocorrência da arte como veículo condutor as emoções humanas e das águas termais curando o corpo, ambos os fenômenos simultaneamente: o Sesc Thermas de Presidente Prudente que está localizado no Jardim das Rosas, lócus do antigo thermas da cidade. Por muitos anos o local permaneceu abandonado, até que em 2007 foi desarranjos físico-corpóreos. Assim, estabelecendo um paralelo, a lágrima “cura” a alma enquanto a água termal, o corpo. A arte é capaz de fazer o homem se emocionar, é um poderoso condutor a locais do intelecto e da alma humana, despertando na mesma sensações, de espetáculos para o oeste paulista, formador de profissionais e também serve de palco para diversas atividades deste calibre. A lágrima limpa os olhos e as águas thermais curam o corpo assim como a arte deve agir com o senso crítico humano: deve fazer enxergar de forma mais clara a realidade que não nos parece tão óbvia, deixando-nos mais sensíveis à ela. L L Lágrima. Foto: acervo pessoal. Apresentação de Dança no Sesc Thermas. Foto: acervo pessoal. Planta baixa Sesc Thermas. Fonte: Benedito Roberto Manoel, gerente SESC PP . 27 033 AMBIÊNCIA URBANA, MEMÓRIA RESGATADA E INTERFERÊNCIA CONTEMPORÂNEA Cicatrizes, memórias. Marcas do tempo, desgaste. É imprescindível citar que diversos estudos e discussões tem sido feitos sobre as estradas de ferro que cortam o interior de nosso país. Tais discussões vão do valor histórico- cultural dos trilhos até ao pragmatismo do que fazer com os vestígios físicos deste passado contido nos caminhos percorridos pelas imensas máquinas. O povoamento dado na região de Presidente Prudente foi acelerado pela criação da Estrada de Ferro Sorocabana sendo a ligação entre o grande centro e os pequenos municípios que surgiriam. Além disso, as diversas construções de galpões decorrentes das empreitadas de empresas estrangeiras (como a Lottus, a Sanbra, e a Anderson Clayton) que se aventuravam pelo interior do país formando imensos silos de estocagem de grãos e Marcas do tempo algodão vieram também se instalar na cidade, garantindo novas relações sociais e, por conseguinte, novos signos no imaginário urbano. A representação da memória de um povo pode ser expressa nos signos que importam um passado vivido. Tal memória estabelece relações de lembranças afetivas entre transeuntes e moradores dos arredores com o local, que são identificadas através de tais signos. Tais conexões são discutidas por autores como Lefebvre (1991b, p.62) que defende a percepção de uma simbologia manifestada no ambiente urbano, possibilitando a decodificação de signos a partir da observação da oralidade dos citadinos, sua produção cultural, ações cotidianas e até mesmo, os valores que envolvem a crença coletiva e a tradição moral. “Em seu plano específico, a cidade pode se apoderar das significações existentes, políticas, religiosas, filosóficas. Apoderar-se delas para as dizer, para expô-las pela via – ou pela voz – dos edifícios, dos monumentos, e também pelas ruas e praças, pelos vazios, pela teatralização espontânea dos encontros que nela se desenrolam, sem esquecer as festas, as cerimônias (com seus lugares qualificados e apropriados). Ao lado da escrita, existe a fala do urbano, ainda mais importante; essas palavras expressam a vida e a morte, a alegria ou a desgraça. A cidade tem esta capacidade que faz dela um conjunto significante.” (LEFEVRE, 1991b, p. 62). Foto Depósitos da família Pontalti, o desgaste do tempo. Foto: acervo pessoal. As marcas do tempo. Fotos: arquivo pessoal 27 034 O que se pretende dizer é que, a memória urbana contida nos trilhos do trem, nos galpões, nos silos e nas antigas placas indicativas não deve ser desprezada, mas avalizada por projetos arquitetônicos que busquem a reintegração destes elementos num contexto contemporâneo, seguindo as exigências funcionais do mesmo, porém respeitando os valores e a memória contida na dualidade espaço- Tais resíduos urbanos vêm à tona como agentes de transformação da realidade. É impossível dizer que o lócus encontra-se, como na foto acima, estático no tempo, tais quais não são os mesmos os corpos humanos que o ocuparam no início. Existem pessoas que perambulam por este ambiente, que até por vezes sem percebê-lo, dele se apropriam. As interações no espaço esquecido contido na urbe, como é a proposta que aqui apresentamos, permite-nos pensar de modo difuso: baseado na reflexão contemporânea e sobre “seu” corpo resultante- quer seja cidade, quer seja homem- ambos sendo resultados do processo infinito de trocas. A construção desse pensamento, por vezes pode parecer complexa, no entanto, a intenção aqui proposta é a caracterização desta cidade, que a princípio por muitos é considerada sem identidade, procurando através de seus símbolos, sua história, características e lugar onde se insere, figuras que permitem não “engessá-la” ou conceituá-la, mas buscar atribuir-lhe sentidos e apreender suas peculiaridades. A cidade como o “efeito não esperado”, a cidade não vista, a cidade esquecida. Este é o tema sobre o qual se debruça este trabalho. A cidade, onde pelo olhar difuso, compreende-se a surpresa, forma-se e apreende-se o novo corpo: o “corpo hurbano”. “A memória, portanto, não pode ser entendida como relicário, mas, sim, como lugar do imaginário e de reconstrução da nossa condição de seres históricos. Aguçando o interesse pelo que foi, podemos construir a memória do que será.” (FILHO, 1996, p.107). tempo. Nas palavras do historiador Dante Donato Donatelli Filho(1996), do Departamento do Patrimônio Histórico, da Secretaria Municipal de Cultura de São Paulo: SANBRA. Fotos: arquivo pessoal. L L L Foto Depósitos da família Pontalti. Foto: acervo pessoal. 27 035 DISCUSSÃO: O corpo contemporâneo e o urbano A questão do corpo como um aparato dos signos que caracterizam o que se diz por contemporâneo é discutida no texto “O corpo revoltado em cena: o político e o sensível”, onde a partir do exemplo da revolta na dança e das multiplicidades existentes na arte contemporânea como um todo, o VIEIRA(2009) é capaz de delinear que, baseando-se no livro Homem Revoltado, Albert Camus diz que: “... revolta aqui não é manifestação contra a ordem estabelecida, mas sim, compreensão do dissenso como fonte criativa de produção de discurso (Vieira, 2009)”. Assim, diz-se do olhar que delimita os signos e significados sabendo deles retirar a semiótica a qual a lógica contemporânea (se esta existir) está subjugada. A expressão de corpo revoltado insere na cena o conceito de que decisões estão sendo tomadas a todo tempo e que não é necessário mais cumprir uma meta pré-estabelecida: abre-se novamente o caminho para a improvisação e para a proposta de que o lócus onde a arte se insere, também pode funcionar como um produtor de signos artísticos, assim como a arte pode funcionar como produtora de mudanças na realidade urbana. É também possível estabelecer relação entre tais aspectos urbanos e a transitoriedade espacial proposta na presente monografia quanto ao produto arquitetônico proposto. O caminho para o improviso, citado no parágrafo anterior, é fator que reforça ainda mais o conceito de “transitório”, onde o próprio ambiente estará fornecendo subsídios que possibilitarão somente em lócus a finalização completa do que compreende todo o projeto arquitetônico, já que as intervenções daqueles que utilizarão a arquitetura são de extrema importância para a produção do espaço arquitetônico e mais amplamente, do espaço urbano. A semiótica da qual se faz citação, estabelece relação com o texto “Corpo e cidade- ecos do situacionista e do flaneur nas corpografias do presente”, cujo autor GARCIA (200-?) diz que: “A arquitetura é o meio mais simples de articular tempo e espaço, de modular a realidade, de fazer sonhar” (JACQUES, 2003: 68). Tais palavras de ordem definem e justificam as ações de arquitetos, urbanistas e artistas que nos anos 1950 fundaram a Internacional Situacionista. O movimento, que teve Guy Derbord como um de seus principais colaboradores buscava - para além de suas reivindicações políticas contra a espetacularização do cotidiano - resgatar novas territorialidades e múltiplas formas de nomadismo. Contrários ao funcionalismo abstrato da urbanística propunham apropriações da cidade através de uma participação ativa de seus transeuntes, e com isso rompiam com o modelo euclidiano que concebia o espaço como um lugar ocupado pelo corpo .”(GARCIA,200-?) 27 036 Assim, neste excerto, GARCIA explicita que a participação popular é de extrema valia na formação daquilo que se chama arte, com o emprego de suas próprias características e as determinações de suas próprias movimentações corporais dentro do ambiente urbano. “A rua nasce como o homem, do soluço, do espasmo. Há suor humano na argamassa do seu calçamento[...] A rua sente nos nervos a miséria criação” (RIO, 2005). É possível, por fim, estabelecer uma relação entre arte e cidade, onde exprime-se não só a capacidade das trocas entre corpo e a cidade, mas relata-se que não há meio de estabelecer-se inerte à tais interações pois a cada instante ambos se transformam e são transformados mutuamente. Tais intercâmbios se reforçam ainda se aplicadas aos projetos arquitetônicos itinerantes que iluminados pelos conceitos de transitoriedade que estão presentes no corpo e por extensão, no urbano, geram maiores subsídios tanto para a pesquisa quanto para a formação de projetos de calibre arquitetônico temporário e permanente. Podemos findar a discussão com o trecho abaixo de autoria de GARCIA(200-?): “O mais relevante, nas perspectivas de intervenção urbana, seria olhar para a cidade como uma cartografia sobre a qual o corpo se justapõe, e provocar com esse olhar trocas de ações e novas orientações de movimentos. O corpo pode, dessa forma, orientar novas direções e filtrar acontecimentos numa dinâmica de sobreposição de signos e atos com a cidade. Exemplos dessa dinâmica estão presentes nos corpos suados e sacolejantes ao ritmo do hip hop, que passaram 24 horas dançando no viaduto mais sujo e esquecido de São Paulo. Esta intervenção foi realizada pela Cia. Bartolomeu de teatro e criou um foco de dança naquele local após a sua ação. Não havia nada demais nesta intervenção, a não ser a realização do que aqueles corpos percebiam como uma tendência do lugar, que se tornaram evidentes pela ação da dança, reorientando as direções daquele espaço.” (GARCIA,200-?) 27 037 URBE, EDIFÍCIO, CORPO O CORPO Introdução à discussão do Projeto 038 O olhar técnico do arquiteto, a pureza das formas, sentidos e conexões na cidade. A pureza da forma e dos volumes primários remete-nos ao pensamento de Le Courbusier que critica a arquitetura do século XX que prioriza a forma em detrimento da funcionalidade. Em seu livro “Por uma Arquitetura”, Courbusier diz: “Os arquitetos deste tempo, perdidos nos ‘esboços’ estéticos de seus planos, nos arabescos, nas pilastras ou nas cumeeiras de chumbo, não adquiriram a concepção dos volumes primários. Nunca ninguém lhes ensinou isso na Escola de Belas Artes. Sem perseguir uma idéia arquitetural, porém simplesmente guiados pelos efeitos de cálculo (derivados dos princípios que geram nosso universo) e a concepção de UM ÓRGÃO VIÁVEL, os ENGENHEIROS de hoje empregam elementos primários e, coordenando-os segundo regras, provocando em nós emoções arquiteturais, fazendo ressoar assim a obra humana com a ordem universal. Eis aqui silos e fábricas americanas magníficas PRIMÍCIAS de novos tempos. OS ENGENHEIROS AMERICANOS ESMAGAM COM SEUS CÁLCULOS A ARQUITETURA AGONIZANTE.” (COURBUSIER, 2004, p. 17). Ainda neste mesmo livro, Le Courbusier faz interessantes apontamentos sobre o olhar técnico diante das diversas transformações decorrentes no mundo moderno. “Nossa época fixa cada dia seu estilo. Nossos olhos infelizmente, não sabem discerni-lo ainda.” A FUNÇÃO: O olhar do arquiteto modernista e os silos e fábricas do século XIX A pureza das formas é perceptível na arquitetura que se apresenta decorrente das modificações que ocorreram com os consecutivos avanços pós Revolução Industrial. Hoje, alguns elementos urbanos resultantes desta época, porém, por perderem-se e distanciarem-se das novas necessidades do mundo contemporâneo, sujeitos a desenfreadas mudanças geradas pela abreviação do tempo, tornaram-se obsoletos e esquecidos sobre a malha urbana. Este trabalho apresenta-se como uma forma de readequar uma antiga área de Silos e elevadores para cereais. Foto: extraída do livro “Por uma Arquitetura”, Le Coubusier. Silos e elevadores de cereais. Foto: extraída do livro “Por uma Arquitetura”, Le Coubusier. Foto: extraída do livro “A arquitetura”, Le Courbusier. 27 039 infra-estrutura do corpo o faz viver, a Infra-estrutura da cidade a faz funcionar e, por sua vez, no nível da da edificação arquitetura também garante vitalidade, como sugere o trabalho de Ben Van Berkel, que veremos a seguir. Caminhando avante a discussão, a arquitetura contemporânea transpõe os limites formais reincorporando tais espaços ao novo olhar arquitetônico: um corpo que não rejeita as interferências, mas apropria-se delas de diversas formas e usa dessa diversidade para criar formas, símbolos e novas funções, propondo uma obra inacabada em constante transformação assim como a arte deve ser. No que tange o pensamento de Le Courbusier sobre o olhar que não está apto a discernir, é importante salientar que a teoria observação, a técnica e a vivência influem muito na caracterização de um corpo urbano mais coeso, funcional, saudável e, portanto, belo, mesmo que complexo em suas expressões e significados. armazéns de estocagem de grãos às margens do leito ferroviário da cidade de Presidente Prudente. Acredita-se que a pureza das formas, exaltada por Le Courbusier, apresenta-se na área em questão onde um olhar mais apurado do arquiteto pode capturar os diversos estágios de tempo que por ali perpassam, garantindo a sua readequação as necessidades atuais e reintegração ao cotidiano da urbe, propondo-lhe novos usos. O caráter simbólico da área em questão não é ressaltado somente pelo leito férreo aos arredores do silo (“a marca, a cicatriz” como já dissemos anteriormente) nem também apenas por se tratar de uma “marca do tempo” na urbe. As comparações vão além: o complexo de armazéns e silos funcionava como um lócus de trânsito, onde criava vitalidade que permeava a cidade. Era o lugar onde ocorriam as trocas, onde chegavam e partiam as principais matérias-primas que sustentavam a economia local. Era a força vital de abastecimento e circulação de produtos da urbe, sendo lócus de conexões:ligados ao “coração” da cidade –centro-, enquanto a linha era o “sistema circulatório”, os silos e armazéns eram Silo e armazéns do depósito Pontalti. Área de Intervenção. Foto: Acervo pessoal. Apesar da recorrente crítica dos arquitetos modernistas em relação as formas simbólicas na arquitetura, o livro “Aprendendo com Las Vegas” traz importante apontamento no que diz que Courbusier aclama mais o silo por suas formas do que por diretamente suas associações . Tal idéia remete-nos a entender que mesmo na arquitetura moderna, prevista como funcional e pura, também estabeleceu-se sobre símbolos, tornando a própria pureza das formas, seu símbolo formal. o local de estocagem, onde tudo era processado, armazenado, recebido e enviado. Os silos e armazéns faziam papel como o do sistema digestivo: processavam “os nutrientes” e armazenavam-nos para os usos necessários à manutenção da vida de todo o corpo. Tal ideia adéqua-se a proposta do trabalho aqui apresentado: a cultura é o alimento da alma, garantindo a identidade de um povo. Assim como a “Os arquitetos modernos substituíram um conjunto de símbolos (ecletismo histórico-romântico) por outro (processo industrial cubista), mas sem se darem conta disso.”(BROWN, IZENOUR, VENTURI, 2003, p.180). 27 040 URBE, EDIFÍCIO, CORPO ESTUDO DE CASO PERFORMERS HOUSE FOLK HIGH SCHOOL- SILKEBORG/DINAMARCA Descrição da Arquitetura Plantas, Cortes e Fotografias 041 A Performers House é um edifício que abriga uma versão moderna de escola secundária dinamarquesa: um centro que recebe não só alunos locais como também internacionais para os cursos de dança, música e teatro localizado em Silkeborg, as margens do rio Gudenaa. A obra, que foi concluída em 2007, gera conexões entre a escola e a cidade, servindo como um espaço de uso não só dos envolvidos no projeto, mas um lócus de convívio da comunidade, quer seja em seu café, quer seja assistindo apresentações artísticas desenvolvidas em todo o complexo. PERFORMERS HOUSE FOLK HIGH SCHOOL- Silkeborg/Dinamarca Fachada Edifício 2 Fachada Edifício 1 Detalhes-Aberturas Edifício 2 O edifício está localizado no coração da zona antiga e gera a revitalização da área que faz renascer a antiga fábrica de papel. A casa da caldeira, que foi reformada, agora acomoda um jardim de inverno, salas de ensino e de ensaio, enquanto o espaço adjacente (uma praça aberta) liga o edifício histórico, com sua contraparte moderna. Tal praça divide-se em espaços íntimos e espaços públicos onde se dão as interações entre escola e envolvente urbana. Há uma nova edificação que abriga a entrada principal, um palco de dança, escritórios, refeitório, um café para os estudantes, uma cozinha e alojamento. Apresenta-se entre novas praças que reforçam as ligações com a malha urbana. 27 042 Planta-baixa 2 Plantas, Cortes e Fotografias Planta-baixa 1 Fonte: fotos e plantas- arquivos da Performers House 27 Fonte: fotos e plantas- arquivos da Performers House 043 Planta de locação Fonte: fotos e plantas- arquivos da Performers House Vista A Vista B 27 Detalhes do interior. Fonte: arquivos da Performers House 044 Os painéis de aço perfurado cor vermelho-ferrugem desdobram-se não só como elemento estético que remete a condição fabril (de volumes simplificados) primária do edifício, mas também conferem a fachada as aberturas necessárias, gerando um efeito luminotécnico quando são acesas as luzes ao entardecer. A fachada envidraçada no piso térreo ganha destaque visual no conjunto conferindo ao mesmo leveza, sublimidade. Além disso, as seções de vidro podem ser abertas gerando uma espécie de praça de convívio. O lay-out não fixo de muitas das áreas do prédio, permite que o mesmo não limite os espaços às atividades o que confere a maximização da performance dos ambientes. Arquitetura SSchmidt Hammer Lassen architects Cliente Performers House Area 2,200 m² new build 1,500 m² refurbishment Preço aproximado € 5 million Prêmios 2007, Highly Commended in MIPIM AR Future Project Award Mixed-use 2008, Emirates Glass Leaf Reward, Grand prix award e vencedor da categoria de uso-misto 2009, recebe o Silkeborg Municipality Architectural Prize Construção 2005/2007 Projeto de engenharia The DAI Group A/S, Denmark 27 045 URBE, EDIFÍCIO, CORPO ÁREA DE INTERVENÇÃO Levantamento do Entorno e Mapas Estudo do sentido das vias Mapa de Uso e Ocupação do Solo Estudo da insolação e ventos Estudo da implantação das edificações existentes FOTOS: Edificação FOTOS: Entorno 046 Presidente Prudente, destaque para as principais avenidas e linha férrea, cicatrizes na malha urbana. Acervo pessoal. Para a preparação de um projeto arquitetônico, é imprescindível que haja um levantamento sobre as características do entorno da área escolhida. Para tanto, foram desenvolvidos diversos mapas, esquemas, croquis da área proposta. Apresenta-se primeiro, um mapa indicativo da posição e relação entre da Área de intervenção e as principais vias públicas da cidade de Presidente Prudente. Além da boa conexão com tais vias, o local encontra-se próximo ao anel viário da cidade (a Avenida Juscelino Kubitschek) garantindo a boa fluidez do tráfego local. Levantamento do Entorno e Mapas 27 047 A seguir, apresentam-se os mapas de uso e ocupação e de gabarito das áreas do entorno imediato à área de intervenção. Tais dados foram recolhidos por visitas in lócuo. Os usos comercial e residencial são predominantes, sendo justificáveis as ocorrências de imóveis na maioria de um e dois pavimentos. Abaixo, algumas perspectivas do entorno imediato à edificação, localizada em cor roxa. Mapas de Uso,Ocupação e Gabarito 27 À esquerda, Mapa de Uso e Ocupação, à direita, Mapa de Gabarito. Fonte: Acervo pessoal. Silo e galpões Pintauti, na cor roxa. Da esquerda para a direita: Vista sudeste e noroeste. Fonte: Acervo pessoal. 048 Gabarito do entorno imediato ao Silo e galpões Pintauti, indicados na cor roxa. Vista sul. Fonte: Acervo pessoal. 27 O destaque ao complexo é perceptível na paisagem urbana acima representada. Não somente pela altura de gabarito mas também pela monumentabilidade que exerce no contexto à que se insere. Em marrom, gabaritos de altura de 6 ou mais pavimentos. Em cor verde, de 3 a 5 pavimentos. Em cor bege,gabarito na altura de 2 pavimentos. Em branco, um pavimento. Em cor azul lote vazio. Vista leste. Fonte: Acervo pessoal. 049 Localização das áreas de inclusão/exclusão social e dos equipamentos de lazer e de cultura em Presidente Prudente - SP Abaixo, apresenta-se mapa com as localizações de pontos de lazer e cultura da cidade de Presidente Prudente e abaixo, mapa com o enfoque na Zona Leste da cidade, onde nossa proposta se insere. 27 Localização das áreas de inclusão/exclusão social e dos equipamentos de lazer e de cultura na Zona Leste de Presidente Prudente - SP 050 A permeabilidade do local é evidenciada nos mapas que vem a seguir e a ligação com algumas das mais importantes avenidas da cidade vem demonstrada mais uma vez. Tais fatores fazem com que não somente o tráfego de automóveis atenda as demandas do projeto, mas permite a sugestão de abertura de novos pontos de ônibus próximos ao local, bem como favorece os habitantes que chegam ao terminal de ônibus do centro advindos das outras regiões da cidade (o centro da cidade é próximo do local). Estudo do sentido das vias ÁREA DE IMPLANTAÇÃO LEGENDA NOTA: Todas as ruas que não apresentam flechas indicativas de sentido são mão- dupla. AVENIDAS E VIAS PRINCIPAIS SENTIDO DAS VIAS LINHA FERROVIÁRIA Mapa– Área de Implantação com sentido das vias- Presidente Prudente - SP 27 051 MMapa – Recorte do Mapa de Uso e Ocupação do Solo- Recorte Zona Leste de Presidente Prudente, Área de intervenção assinalada em vermelho- SP Segundo o Mapa de Uso e Ocupação do solo (visto na próxima página), o planejamento da cidade prudentina prevê a área em questão como ZR-2, ou seja, são permitidos os usos: residencial unifamiliar e multifamiliar (horizontal e vertical- dois pavimentos), comércio e serviço geral, comércio e serviço específico e indústria não- poluitiva, com taxa de ocupação máxima de 70%. Segundo CHAVES, PIMENTEL e MELO (2008) as edificações lindeiras às ferrovias, devem ser localizadas a distâncias maiores que 15 m (limiar da faixa de domínio). Todas essas recomendações são de grande importância para os processos de reforma, readequação e construção do equipamento proposto por este trabalho. Mapa de Uso e Ocupação do solo 27 052 O estudo da insolação e ventos mostra-nos o posicionamento dos prédios já existentes no local e permite-nos intervir levando em conta o conforto ambiental dos ambientes, pensando na disposição das atividades adequadas a cada necessidade. Primeiro, apresenta-se um mapa da variabilidade anual de frequência Estudo da insolação e ventos p p Variabilidade anual da freqüência dos ventos (%), por direção de Presidente Prudente (1990-1999). Fonte: OSVALDO (2002), modificada. 27 Foto: arquivo pessoal Foto: arquivo pessoal dos ventos de 1990 a 1999 em Presidente Prudente. Logo a seguir, aparece a planta baixa das edificações da área de intervenção com o estudo da insolação e ventos e, por último, um estudo da insolação na variação de estações (verão e inverno, respectivamente). Segundo o mapa da variabilidade anual de frequência dos ventos de 1990 a 1999, em Presidente Prudente, a maior parte de incidência de ventos é do sentido Sudeste e Nordeste, como mostra a representação acima. Planta-baixa da arquitetura atual 053 Fonte: fotos, arquivos pessoais. 12:30 a.m. 16:30 p.m. ESTUDO INSOLAÇÃO- Junho-inverno 12:30 p.m. 16:30 p.m. ESTUDO INSOLAÇÃO- Janeiro-verão 7:30 a.m. 7:30 a.m. 27 054 Estudo da implantação das edificações existentes A seguir, alguns croquis 3D das edificações existentes na Área de Intervenção, bem como vistas superiores. Vista Norte do complexo, vide linha férrea à esquerda. Fonte: acervo pessoal. Vista Sul aérea do complexo. Fonte: acervo pessoal. Vista Sul do complexo, vide linha férrea à direita. Fonte: acervo pessoal. 27 055 É interessante citar que a área apresenta quantidade significativa de árvores nativas. A noroeste, encontram-se imensos ficus macrophylla (de aproximadamente 15 metros de altura) que permanecem exuberantes. É pertinente dizer também, que apesar do leito férreo estar cercado de pragas, existem espécies interessantes a serem preservadas no local, como algumas jabuticabeiras. A – GALPÃO MAIOR GABARITO B- ESTRUTURA PROTOMODERNA C- GALPÃO MAIS EXTENSO D – CASA DE SERVIÇOS E – CASA DE SERVIÇOS 2 Caracterização das edificações, linha férrea em vermelho. Fonte: acervo pessoal. 27 056 Vista Noroeste do complexo. Fonte: acervo pessoal. Vista Sul do complexo, com parte do paisagismo existente e linha férrea à direita. Fonte: acervo pessoal. 057 FOTOS: Edificação Edifício C Edifícios A, B e C Edifício E Edifícios A, B e C 27 058 Silo- Estrutura interna (carregamento de prdutos do locatário) Edifício C Edifício A-Silo 27 Silo- Estrutura interna Silo- Elevador antigo 059 Fotos: arquivo pessoal Edifício C Edifício C 27 Edifício C 060 FOTOS: Entorno Vista noroeste Perspectiva da Rua Rua Dr. Hugo Lacorte Vitale. Foto: acervo pessoal Rua José Claro 27 061 Murta à Leste. Rua Dr. Hugo Lacorte Vitale Vista sudoeste 27 Entrada para os galpões Pontalti. 062 27 Diretrizes projetuais • Reforçar a ideia de eixo cultural: Teatro Municipal, Centro Cultural Matarazzo, I.B.C. e o objeto da proposta que aqui se insere. • Criar espaço central gera praça, resgatando o local original dos encontros, que foi substituído pelas grandes aglomerações, como os shoppings, já citados neste texto, atraindo a cidade para dentro da edificação e vice-versa, permitindo ainda a maior possibilidade de trocas entre habitantes, transeuntes e usuários da obra proposta, conferindo o jogo de permutar-se conceitos e formas , possibilitando não só caminhos para a experimentação artística, mas contribuindo para a formação da cidadania. • Leito férreo: cicatriz incorporada ao projeto e a cidade • Antigo armazém: o “velho” incorporado e o formal incorporado- O feio incorporado • Arquitetura de Ben Van Berkel: diagramas x conceito, simbologia complexa, hibridismo- os diversos corpos incorporados (os móveis e os aparentemente estáticos). • Deve-se perguntar mais “o que não esperar?” do que “ o que esperar?” deste objeto- Espaço como efeito colateral. • Hibridismo- paradigma da adequação da arquitetura moderna aos usos contemporâneos. • Proposta emancipatória- desviar-se de repetir mesmos erros- elemento coesivo e não excludente. Proposta do Eixo Cultural, envolvendo o Teatro Municipal, o I.B.C., o Matarazzo e a Área dos antigos depósitos Pontalti. 063 Planta-baixa da arquitetura atual 27 064 FFluxograma/Organograma 065 4 Adminis- tração Escritório 10 m2 Sala de reuniões 23 m2 Recepção 23 m2 Sanitários 2 WC (1 D.F e otro comum) 10m2 2 Pesquisa Discus- sões e debates Espaço de uso flexível experimentaç ão corporal Espaço amplo, divisível por sistema de biombos insonorizados. Dispõe de Ecrã plasma fixo e sistema de som e imagem que permite a instalação de equipamentos de acordo com as necessidades do evento.As paredes são revestidas a MDF. Janelas para o exterior têm cortina de "black out". “Caixa Preta” largura: 20 m comprimento: 20m altura:12m Biblioteca Mesas e cadeiras. Largura: 10m X Comprimento: 10m Pé direito: 4m 3 Serviços Sanitários 4 WC (1 D.F), 3 duche e 30 cacifos (feminino) 4 WC (1 D.F), 3 duche e 30cacifos (masculino) 48m2(F) + 48m2(M) Café, bar, lanchonete, convivência 118 m2 Programa de Necessidades e Pré-dimensionamento SÉRIE USO GERAL USO ESPECÍFICO DESCRIÇÃO SUBTOTAL CAPACID ADE ÁREA TOTAL 1 Sala de dança Piso esportivo vinílico, que reduz o choque de quedas com uma sub-camada em espuma de PVC e tratamento contra fungos e bactérias, além das barras e espelhos nas paredes. Largura: 10m X Comprimento: 10m Pé direito: 4m 25 Oficinas Cenicas Sala de teatro Vide sala de dança Largura: 8m X Comprimento: 8m Pé direito: 4m 30 Sala de circo Vide sala de dança Largura: 12m X Comprimento: 14m Pé direito: 8 m 30 066 PPROJETO 1-MEMORIAL DESCRITIVO 2-DESENHOS: •Plantas, •Cortes, •Elevações 3-PERSPECTIVAS 067 MEMORIAL DESCRITIVO A seguir, apresenta-se a relação de dispositivos utilizados no projeto para conforto ambiental, estrutura, vedação e pavimentação. CONFORTO TÉRMICO - Ventilação e refrigeração: • Containers (salas): geotermia e ar condicionado • Teatro caixa preta: ar condicionado (sistema enterrado com saídas locadas no solo) • Silo , áudio-visual e biblioteca: sistema E.T.F.E. • Posicionamento das aberturas Verticais (voltadas para SE e NE) CONFORTO ACÚSTICO • Containers: Dry-wall • Teatro Caixa-preta: Dry-wall CONFORTO LUMINOSO • Lâmpadas frias e iluminação natural por meio das aberturas e quando utiliza-se, pela transparência do E.T.F.E. ESTRUTURA • Silo e Teatro “caixa-preta”: aço • Containers: Aço galvanizado, • Pilares adicionais: em aço perfis “H” e “L” • Pilares existente: jardim de pilares (funciona como adorno) VEDAÇÃO • E.T.F.E(silo), Dry-wall(containers e teatro “caixa-preta”- também apresenta vedação externa de aço), Aço galvanizado (containers),alvenaria (café-restaurante protomoderno) PAVIMENTAÇÃO • Cimento queimado (silo, enfermaria, recepção, sala de professores, salas circo, pista de caminhada, rampas) • Concregrama(estacionamento) • Cimento queimado com tablado em madeira (salas dança e teatro) • Asfalto (entradas para automóveis) • Grama 068 APONTAMENTOS Com vistas a inserir os conceitos discutidos na monografia aqui descrita, listamos algumas das metáforas propostas para os pontos culturais da cidade de Presidente Prudente e as correspondemos aos pontos principais do projeto arquitetônico aqui defendido. Essas metáforas são resumidas e expostas novamente nas imagens que demonstram-se nas próximas páginas. O teatro caixa-preta abre-se para a linha férrea por suas portas de aço que permitem este cenário como pano de fundo para possíveis espetáculos e intervenções. A linha férrea por sua vez é transpassada por meio de plataformas de aço que podem ser utilizadas quando não há tráfego férreo, ou quando há, podem ser retiradas com facilidade, por poucas pessoas. As imagens utilizadas para a textura existente no silo e aqueles presentes nesta monografia são grafites de autoria de Michael Frank, um artista plástico do norte do Paraná que iniciou sua carreira na cidade de Presidente Prudente e que hoje desenvolve cada vez mais trabalhos de grande relevância para a paisagem visual urbana da cidade. O espaço físico do projeto, além das atividades que ali ocorrem, permitem a diversidade de encontros, funcionando também como praça. Aqui, o espaço urbano também é produzido e utilizado, sendo que as conexões com o centro se intensificam não somente pela localidade mas também pelas interações entre as atividades presentes na arquitetura e a urbe, resultando em decorrentes trocas. 069 MARCAS DO TEMPO: Antigo incorporado 070 A MARCA: Tatuagens x Grafite 071 PRÓTESE: Adaptações que dão certo 072 FORMA (!) x CONTEÚDO (?)- Forma com conteúdo 073 A MARCA: Piercing –idéia de mobilidade 074 O FEIO: (re)incorporado como belo 075 076 077 A LÁGRIMA: terapia, interação, intervenção. 078 AANEXOS BREVE HISTÓRICO DAS ATIVIDADES •História Do Teatro •História Da Dança •História Do Circo •História Da Performance MODELO DE QUESTIONÁRIO LISTA DAS LOCALIDADES E LIGADAS A CULTURA NA CIDADE REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 079 HHistória do Teatro A história do teatro ocidental remonta-nos aos idos do século IV AC, onde na Antiga Grécia faziam-se rituais de fertilidade ligados ao deus Dionísio. Com os filósofos gregos, desenvolveram-se as primitivas teorias do teatro ocidental. Aristóteles presenteia-nos com a Poética que define elementos significativos da obra teatral e conceitos como tragédia e khartasis. Os filósofos romanos Plauto e Terêncio se destacaram no desenvolver dos conceitos da comédia, baseados na cultura popular, bem como Cícero e Horácio deram suas valiosas contribuições. O período da Idade Média foi marcado pela transformação do teatro em interpretações de cunho moral, sendo até mesmo vigorada pela tradição dramática de Santo Agostinho e Tertuliano. O século XVIII, alumiado pelo Iluminismo, é a era da burguesia que lota os teatros a procura de uma identidade de classe: a razão, o auto-conhecimento tornam-se parte importante da arte cênica. Com o fim do século XIX, ideais sociais começam a permear as discussões sobre teatro, bem como ocorrem diversas mudanças no estilo de linguagem. Nomes como Constantin Stanislaviski (dramaturgo de cunho naturalista que chegou a desenvolver sua própria técnica de preparação cênica) e Georg Kaiser (representante do expressionismo que buscava exprimir os sentimentos mais complexos do ser), destacaram-se ainda no fim do século XIX até 1910. Profissionais comoMeyerhold, Samuel Becket e Bertold Bretch (representante do Teatro Épico que buscava através de suas peças politizadas mudar a realidade social) começam a significar mais do que dramaturgos: é um novo ideal de arte que se impõe dentro de um mundo moderno, com a transposição de ideias afetadas pelos ocorridos históricos como guerras, tecnologia e desenvolvimento que culminaram na atual conjuntura teatral. “Assim, a palavra teatro é comumente utilizada para designar uma edificação, um espaço onde tanto podem se apresentar várias formas de arte quanto uma determinada forma de arte (ROUBINE, 2003). Entretanto, teatro é também o drama, a encenação, que acontece frente ao público; e é ainda o conjunto de obras de um determinado dramaturgo (ex: o teatro de Nélson Rodrigues). Segundo Roubine (2003), desde o seu início, o fenômeno teatral compõe-se de uma tríade essencial: ator, texto e público; ainda que, ao longo da história, o papel de cada um desses elementos tenha sofrido alguns deslocamentos. Hoje, o texto pode ser substituído por um roteiro de ações dramáticas ou físicas, assim como o público pode interagir a ponto de modificar o rumo da cena. E o ator cada vez mais reivindica para si o papel de criador (COSTA, F.C., RAMOS, L.B., 2008).” No Brasil, há que se citar a textualidade iminente de Nélson Rodrigues como um dos principais responsáveis pela obra teatral de personagens de retrato fiel da psique humana, inserindo o dramaturgo num local privilegiado na cena contemporânea nacional. 67 080 HHistória da Dança A dança como expressão artística surge no Ocidente vinculada ao teatro, juntamente com os tributos feitos ao deus Dionísio na Grécia. Assim, a dança inicia-se primeiramente vinculada a religião, ao ser místico e dotando-se de caracteres ritualísticos, como uma busca de vinculação ao divino. Outra vertente dos primórdios do movimento eram as danças litúrgicas: expressão artística onde não havia somente a representação de uma história, mas havia também formação de platéia, público. Durante o período da Idade Média, a dança fazia parte das apresentações em festividades e feiras populares, juntamente com os primeiros artistas circenses, sendo muitas vezes perseguidos pela Igreja por seu conteúdo pagão anatematizados por concílios como o de Vanne(465) e o de Trento(1562), através do idealismo de que pela flagelação do corpo haver-se-ia de receber o bem na eternidade e que as vontades do mesmo deveriam ser dominadas e suprimidas. Isso leva a uma realidade de extrema pobreza e dificuldade para os artistas da época, que buscavam nos pequenos vilarejos refugio. Na Idade Moderna, com o advento do Renascimento, o desenvolvimento técnico-científico e urbano, a expansão marítima européia e a visão humanista, as artes em geral começam a sofrer os reflexos desta nova sociedade que também surgia. A dança começa a ser apreciada também pela burguesia, e divide-se em: danças populares (manifestações festivas) e balletos (dedicadas exclusivamente as elites burguesas através das onerosas ostentações dos figurinos, cenários e objetos cênicos), sendo este último estilo apresentando sua gênese na Itália, porém o tem seu auge no reinado de Luis XIV(1638-1715), conhecido como o “Rei Sol”, que chegou a fazer um espetáculo de 12 horas de dança na França. Com a expansão do balleto pela Europa, evolui-se para o BBalé chamado clássico, quando em 1700 Raol Feuillet realiza as primeiras tentativas de notação de dança, intencionando a sua padronização. Com expoentes ainda na França, Inglaterra e Itália estabelece- se o ballet clássico com a rigidez do academicismo imposto pelas novas companhias de dança, como o Ópera de Paris, sendo que também a partir do século XVIII a mulher começa a ganhar papel de destaque na dança, pois até então era uma arte exclusiva para o corpo masculino. Durante o século XIX, características como uso de sapatilhas de ponta e tutus (saia bufante) entram também em cena. Balé “ Cinderella”, Teatro Royal Opera House, Londres-Inglaterra. Foto: Acervo pessoal. 081 A partir do século XX, com o advento da Revolução Industrial e o ideário ascendente do homem moderno, são feitas contestações a rigidez do balé clássico, inclusive a massificação dos balés de repertório (balés constituídos de histórias repetidamente apresentadas, que não sofriam modificações quaisquer). As novas exigências do mundo moderno levaram a caracterização de novos tipos de dança, entre elas a ddança Expressionista e a chamada DDança Moderna. A dança expressionista teve seu principal fomento na Alemanha, e se tratava de uma arte nacionalista, de caráter cultural pessimista, que criticava tanto valores políticos quando sociais burgueses, sendo um dos principais predecessores o, já citado neste texto, Rudolph Laban, autor de livros sobre a temática corporal. Assim como a dança expressionista na Europa, o BButô ("Bu" significa dança, e "toh", passo) estabeleceu-se no Japão como expressão artística que fazia relação aos sentimentos gerados também pela revolta cultural: estabelece-se nas décadas de 1950 e 1960, período pós guerra cuja ideologia era marcada pela ruptura com as formas tradicionais de teatro e dança, bem como uma negação da influencia ocidental sobre a cultura japonesa. A dança que tem Tatsumi Hijikata como principal expoente, tem seu principal vislumbre sobre o grotesco e o corpo metamórfico. Por sua vez, a dança moderna tematizava o trabalho do corpo e seu conteúdo, a centralização da gravidade do tronco, a respiração e os movimentos de contração e extensão da coluna vertebral. Tal desempenho, além das propostas de transgressão da ordenação métrica da dança clássica, eram completamente opostos aqueles propostos pelo balé.Tem como principais expoentes Martha Graham(1894-1990) e Merce Cunningham (1919). No cenário brasileiro, em 1936, inicia-se o Corpo de Baile do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, que apresentava espetáculos próprios e também aqueles trazidos da Europa. A bailarina Nina Verchinina, durante a Segunda Guerra Mundial se instala no Brasil e inicia aulas de dança moderna nesta mesma companhia. Já em São Paulo, o crescimento da dança moderna se deu de forma expansiva com o Corpo de Baile do Teatro Municipal de São Paulo em 1940. Assim como a dança moderna, estilos de dança como o JJazz Dance (dança que se inicia na cultura afro-americana e toma por completo os palcos dos musicais) e o SStreet Dance (estilo nascido nas ruas e em festas que geravam disputas e jogos entre competidores), ambos iniciados nos Estados Unidos, alcançaram notoriedade mundial. Com o passar dos anos, a dança moderna cedeu lugar a um novo conceito: a dança contemporânea surge como tentativa de demonstrar as características do homem e da vida pós-moderna. Por se tratar de considerações complexas, a dança contemporânea preconiza a experimentação de novos movimentos, bem como a pesquisa de temas, filosofias, do próprio corpo como agente promotor e sofredor de movimentos, tanto involuntários quanto voluntários, para a captação e cognição destes. Tamanha pesquisa é responsável pela multidisciplinaridade artística conferida nos espetáculos de tal estilo de dança como poesia, teatro, música, circo, etc. Pode ser citado como nomes de relevância no Brasil o Grupo Corpo, a Compania Sociedade Masculina, o Ballet da Cidade de São Paulo, o Centro de Danças Débora Colker, entre outros. 67 082 Na antiguidade, as artes, profundamente ligadas ao religioso, privilegiavam a adoração aos deuses e o circo, que advêm do teatro, seguiu a regra. As origens do circo grego remontam os hipódromos, através das exposições das façanhas bélicas, exibindo seus escravos e os animais- “feras”- encontrados nas terras conquistadas. No caso romano, o circo- hipódromo, remontava-se as formas ideais, aos deuses e suas façanhas, restabelecendo o caráter religioso da arte antiga. Já nas olimpíadas da Grécia antiga,e por dissidência na Roma antiga mais especificamente, expunham-se os atletas quebrando novos recordes nos esportes e mostrando-se quase como os deuses: aperfeiçoando-se corporalmente. Porém faz-se a ressalva que tais encontros não se davam ao caráter artístico e distancia-se hoje das atrocidades feitas com animais. Na modernidade, desde 1758, sabe-se que na Inglaterra, já haviam espetáculos de homens que em pé, faziam proezas sobre cavalos. Astley, um suboficial da cavalaria inglesa, construiu um circo permanente em Londres, e lá expunha tais exímios cavaleiros, logicamente, cobrando por isso. Quando o sucesso do circo se espalhou pela Europa, Antonio Franconi (francês) insere nas demonstrações artísticas espetáculos populares, e inaugura o uso do palco para pantomima. Logo, a origem do espetáculo circense institucionalizado visto hoje em dia, não nasce como uma demonstração popular (apesar de que isso também ocorria, como foi dito, nas feiras do povo e influenciou posteriormente o espetáculo), mas brota direcionado para a aristocracia. Como pensava AUGUET(1974) e cita BOLOGNESI(2003): “Urbano por excelência, em sua origem o circo veio a ser uma maneira de expandir o encanto pela equitação para o novo público burguês”. HHistória do Circo Apresentação “Saltimbembe Mambembancos” Circo Rosa dos Ventos. Fonte: Site do mesmo. 68 083 Da aproximação com o espetáculo popular, vieram novas formas de expressão artística como a dança, o teatro mais propriamente dito e o clown (personagem criado por Grinaldi, que foi o precursor do palhaço moderno). Deve-se ressaltar que as diversas crises e revoluções dos séculos XVIII e XIX, como a Revolução Francesa e a Revolução Industrial, foram importantes para as mudanças na concepção do espetáculo, bem como sua influencia política por vezes que censurava ou liberalizava as apresentações teatrais, foi de importância definitiva para que as feiras populares perdessem gradativamente seu valor tendendo a desaparecerem, e para que tais artistas remanescentes fossem direcionados para o circo institucionalizado. A performance circense, que desde o começo está ligada a superação humana, ao idealismo das batalhas e heróis, à graça dos movimentos remetidos ao feminino versus a fera (mulher e as acrobacias com cavalos), bem como, à irreverência do clown mostrando as mazelas da alma humana e os sentimentos que envolvem o seu ser, começa a alcançar novos espaços no mundo. No Brasil, desde o século XVIII, existem referências de apresentações de artistas ambulantes na maioria ciganos que se apresentavam nas festas populares, retomando os costumes de seus predecessores nas antigas feiras burguesas medievais. Apenas no século XX é que se começa a inserir o uso de animais no picadeiro, mesclando as técnicas populares e a maestria do adestramento. Principalmente nas últimas três décadas do século citado, os ideais empresariais capitalistas de contrato de mão-de-obra especializada tem se firmado no circo, porém aqueles espetáculos de origem popular, de caráter mambembe e inovador ainda apresentam-se em pequenas companhias disseminadas pelo país, cuja importância é extremamente relevante para a propagação da arte principalmente longe dos grandes centros urbanos. Apresentação “Saltimbembe Mambembancos” Circo Rosa dos Ventos. Fonte: Site do mesmo. 69 084 HHistória da Performance A história do corpo em cena remete-se ao tempo quando o teatro ocidental se institui. Desde tais ocorrências, muito sobre a aparição em público tem sido desenvolvida quer seja na decorrência, do teatro, da dança ou do circo. No entanto, o conceito de performance como o corpo em exposição começa a ser utilizado durante o inicio do século XIX. Um d