Trabalho de Conclusão de Curso Curso de Graduação em Geologia ESTUDO ESTRUTURAL E GEOELÉTRICO EM AQUÍFERO FRATURADO NA REGIÃO DE CAÇAPAVA DO SUL (RS) Discente: Mariana Vieira Galvão de Oliveira Orientador: Prof. Dr. César Augusto Moreira Rio Claro (SP) 2018 UNESP UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA "CAMPUS DE RIO CLARO" INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro MARIANA VIEIRA GALVÃO DE OLIVEIRA ESTUDO ESTRUTURAL E GEOELÉTRICO EM AQUÍFERO FRATURADO NA REGIÃO DE CAÇAPAVA DO SUL (RS) Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Câmpus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, para obtenção do grau de Geólogo. Rio Claro – SP 2018 O48e OLIVEIRA, MARIANA VIEIRA GALVAO DE ESTUDO ESTRUTURAL E GEOELÉTRICO EM AQUÍFERO FRATURADO NA REGIÃO DE CAÇAPAVA DO SUL (RS) / MARIANA VIEIRA GALVAO DE OLIVEIRA. -- Rio Claro, 2018 62 p. + 1 CD-ROM Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado - Geologia) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Rio Claro Orientador: César Augusto Moreira 1. Granito. 2. Aquifero Fraturado. 3. Análise Estrutural. 4. Tomografia de Resistividade Elétrica. 5. Modelamento 3D. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca do Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Rio Claro. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. RESUMO A complexidade estrutural inerente em aquíferos fraturados, que condicionam o fluxo subterrâneo em zonas restritas, resulta numa elevada taxa de insucesso em perfurações de poços produtores de água. A análise de feições geomorfológicas e investigações indiretas prévias permitem a seleção de alvos favoráveis para captação subterrânea, uma alternativa racional em vilarejos distantes dos centros urbanos. Este trabalho aborda o uso combinado de levantamentos estruturais regionais/locais, seguido pela aplicação do método geofísico da Eletrorresistividade, a partir de linhas de tomografia elétrica, para seleção de pontos favoráveis a perfuração num aquífero fraturado em granito, com vistas ao abastecimento de um pequeno vilarejo distante 6km a norte da cidade de Caçapava do Sul, extremo sul do Brasil. O controle estrutural existente no maciço granítico é expresso na geomorfologia regional e claramente condiciona a formação de vales e a orientação de drenagens. Baseado neste controle, foram realizadas 4 linhas de tomografia elétrica paralelas, numa área de interesse para captação de água subterrânea, seguido pela geração de modelos de inversão 2D e interpolação para análise em modelos pseudo 3D. O contato entre o solo superficial pouco espesso e o maciço granítico condiciona a existência de aquífero livre regional e a provável recarga do aquífero fraturado. Nos modelos de inversão 2D ocorrem variações bruscas de resistividade elétrica relacionadas a fraturas verticalizadas reconhecidas localmente, embora lateralmente desconexas. A análise de mapas a partir de 40m de profundidade permite o reconhecimento de três alinhamentos de baixa resistividade (em torno de 500.m) num contexto granítico onde predominam elevados valores (acima de 15000.m), cuja conexão tríplice define um sistema de junta de fraturas, padrão reconhecido em alinhamentos de drenagem e altamente favorável a captação subterrânea. Palavras-chave: granito, aquífero fraturado, análise estrutural, tomografia de resistividade elétrica, modelamento 3D ABSTRACT The inherent structural complexity of fractured rock aquifers, which controls the groundwater accumulation and flow in restricted zones, lead to a high number of non-producing dry wells. The analysis of geomorphological features and indirect investigations allows the identification of favorable targets for groundwater exploitation, representing a rational procedure in villages and small towns far away from urban centers. This work deals with regional and local structural surveys coupled with electrical resistivity tomography data in order to identify favorable targets for groundwater exploitation for urban consumption in a fractured granite located in a small village six kilometers north of Caçapava do Sul city, southern Brazil. The structural control is manifested in the regional landforms and clearly conditions the orientation of main drainages. Based on this structural control, four parallel electrical tomography survey lines were performed in an area of interest for groundwater exploitation, followed by the generation of 2D inversion models and interpolation for the analysis of pseudo 3D models. The contact between the very thin superficial soil (regolith) and the underlying granite massif determines the existence of a regional free aquifer and the probable recharge of the fractured rock aquifer. In the 2D inversion models, abrupt variations of electrical resistivity related to locally recognized vertical fractures occur, although they do not show lateral continuity (out of plane). The analysis of the geophysical maps from 40 meters depth allows the recognition of three alignments of low resistivity (around 500  m) within a granite context where high values predominate (above 15,000  m). These alignments show a triple fracture intersection pattern also recognized in satellite images, which are highly favorable for groundwater accumulation and exploitation. Keywords: fractured rock aquifer, structural analysis, fracture connectivity, electrical resistivity tomography, 3D modelling LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1: Foto área da localização de estudo em “destaque” ao norte de Caçapava do Sul.......9 Figura 2: Configuração das zonas não saturadas e saturada no subsolo...................................14 Figura 3: Tipos de aquíferos quanto a pressão..........................................................................16 Figura 4: Tipos de aquíferos quanto a porosidade...................................................................17 Figura 5: Tipos de fraturas........................................................................................................18 Figura 6: Modelos de propagação de fatura..............................................................................19 Figura 7: Províncias estruturais brasileiras com destaque compartimentação da Província Mantiqueira...............................................................................................................................20 Figura 8: Compartimentação do ESRG....................................................................................22 Figura 9: Mapa de detalhe do Terreno São Gabriel..................................................................25 Figura 10: Mapa geológico regional, com destaque para a área de estudo...............................28 Figura 11: Esquema representativo da corrente elétrica...........................................................36 Figura 12: Esquema das dimensões que influenciam a resistência...........................................37 Figura 13: (A) Condução Iônica nas rochas. (B) Condução eletrônica....................................48 Figura 14: Esquema da corrente fluindo de um eletrodo para o outro......................................39 Figura 15: Arranjo linear esquemático de medição da resistividade........................................39 Figura 16: Arranjo Schlumberger.............................................................................................41 Figura 17: Afloramentos de granitos na beira da rodovia. A) Fraturas de médio ângulo de mergulho; B) Fraturas verticais.................................................................................................42 Figura 18: Litossolo arenoso fraturado.....................................................................................42 Figura 19: Linhas de investigação............................................................................................43 Figura 20: Equipamento a direita usado para coleta de dados em campo................................44 Figura 21: Contexto geológico, morfológico e estrutural da região de estudos. A) Principais unidades geológicas regionais. B) Fraturamento regional descrito a partir de feições estruturais reconhecidas em imagem de satélite. C) Roseta com medidas estruturais..............46 Figura 22: Modelos de inversão de resistividade elétrica, com topografia e realce de estruturas verticalizadas possivelmente relacionadas a fraturas no maciço rochoso.................................48 Figura 23: Modelo pseudo 3D linhas de tomografia elétrica e mapas de resistividade elétrica para diversas profundidades (em metros), com realce de estruturas lineares...........................51 Figura 24: Orientação de rede de drenagem em sistema estrutural análogo ao reconhecido em modelamento geofísico, destaque de ponto de maior favorabilidade a perfuração de poço.....52 Sumário 1.INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 7 1.1 Objetivos ............................................................................................................................... 8 2. ÁREA DE ESTUDO .............................................................................................................. 9 3. ÁGUA ................................................................................................................................... 11 3.1 Água Subterrânea. .............................................................................................................. 12 3.2 Aquífero Fraturado ............................................................................................................. 18 4. GEOLOGIA REGIONAL .................................................................................................... 20 4.1 O Escudo Sul-Rio-Grandense ............................................................................................. 20 4.2 Terreno São Gabriel............................................................................................................ 24 4.3 Cinturão Metamórfico Vacacaí. ......................................................................................... 27 5. GEOLOGIA LOCAL ........................................................................................................... 30 5.1 Suíte Granítica Caçapava do Sul ........................................................................................ 30 5.2 Estrutural da SGCS ............................................................................................................. 31 5.3 Sistema Aquífero Embasamento Cristalino II .................................................................... 32 6. MATERIAIS E MÉTODOS ................................................................................................. 33 6.1 Análise estrutural preliminar por imagem de satélite. ........................................................ 33 6.2 Métodos Geofísicos ............................................................................................................ 34 6.2.1 Eletrorresistividade ......................................................................................................... 35 6.3. Aquisição e processamento de dados ............................................................................... 41 7. RESULTADOS E DISCUSSÃO ......................................................................................... 46 7.1. Modelos de inversão 2D. ................................................................................................... 47 7.2. Modelo de inversão 3D...................................................................................................... 50 7.3 Integração geofísica e estrutural ......................................................................................... 52 8. CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 53 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 54 7 1.INTRODUÇÃO A água é um dos compostos de maior distribuição e importância na crosta terrestre e cobre cerca de 70% da mesma. É o elemento essencial e indispensável à manutenção da vida, não apenas por suas características peculiares, mas pelo fato de que nenhum processo metabólico ocorre sem sua ação direta ou indireta. Nestas condições, é imprescindível que sua presença no ambiente esteja em quantidade e qualidade apropriadas para sua posterior utilização (REBOUÇAS, 2002). É considerada um recurso de domínio público, natural, limitado e dotado de valor econômico. Os usos pelas populações são diversos e englobam desde atender as necessidades pessoais até as atividades econômicas. (MORAES E JORDÃO, 2002). O aumento crescente na demanda por água pode gerar um número sem precedentes de conflitos entre países pelo controle de suas fontes. Com o crescimento populacional e disseminação da agricultura moderna, a água é consumida de forma cada vez mais ampla e intensificada. Por outro lado, a poluição e o uso não sustentável dos recursos naturais provocam a diminuição de sua disponibilidade em todo o globo (ANA,2005). Mais de dois terços da população mundial atualmente vivem em áreas que passam pela escassez de água por, pelo menos, um mês ao ano. Mais de 500 milhões de pessoas vivem em áreas onde o consumo de água excede os recursos hídricos localmente renováveis (PNUD, 2000). Uma alternativa para o déficit de águas superficiais de qualidade é a exploração de águas subterrâneas. O manancial subterrâneo constitui o maior volume de água doce que ocorre na Terra na forma líquida, da ordem de 10,3 milhões km³, enquanto os rios e lagos acumulam cerca de 104 mil km³ (FEITOSA et al., 2008). O aumento da demanda no Brasil por parte do crescimento populacional e industrial somado ao aumento crescente de águas superficiais contaminadas pelas mais diversas atividades humanas, mostra a captação de águas subterrâneas como uma alternativa no atendimento da demanda, principalmente em regiões desprovidas de fontes superficiais ou periféricas aos sistemas de distribuição convencionais. A abundância, qualidade e baixo custo de captação tornam esta fonte uma opção viável técnica e economicamente na maioria dos casos. O território brasileiro possui uma reserva de águas subterrâneas estimada em aproximadamente 112.000 km3 (REBOUÇAS, 1997; ANA, 2013). As águas subterrâneas são captadas de aquíferos através da perfuração de poços e extração por bombeamento até a superfície. Existem diversos tipos de aquíferos nos quais as águas subterrâneas estão armazenadas, com variações de porosidade e permeabilidade. Nas 8 áreas com domínio de rochas ígneas a infiltração, acumulação e circulação de água ocorre em fraturas e constituem aquíferos fraturados. Os aquíferos fraturados são sistemas complexos e um desafio para definição de locais favoráveis a perfuração de poços produtivos. Em função da complexidade estrutural intrínseca às rochas ígneas e metamórficas, os poços perfurados sem estudos prévios normalmente são secos ou com baixa vazão. Á dificuldade na locação de poços com vazões satisfatórias em aquíferos fraturados, justifica o emprego de tecnologias como sensoriamento remoto e geofísica para determinar pontos de maior favorabilidade. O uso da geofísica na investigação de sistemas aquíferos possibilita reduzir incertezas e definir alvos promissores para captação. A partir do contraste de propriedades físicas intrínsecas dos materiais geológicos é possível distinguir entre rocha seca e rocha com acumulo de águas Além de possuírem baixo custo relativo e a possibilidade de cobrir amplas áreas, os métodos geofísicos proporcionam geração de uma perspectiva das condições em subsuperfície, e diminuir as incertezas em projetos técnicos. Na região de estudo localizada na área rural do município de Caçapava do Sul (RS), a escassez de água ocorre de forma periódica. As rochas predominantes são cristalinas graníticas fraturadas onde, as respectivas acumulações são determinadas pelas direções preferenciais de fraturamento. Desta forma, este trabalho propõe o uso integrado de análise de imagens de satélite para mapeamento de descontinuidade estruturais, levantamento de fraturas em exposições rochosas, além de ensaios geofísicos por tomografia elétrica. 1.1 Objetivos Este trabalho objetiva detectar anomalias ou assinaturas geofísicas correlacionáveis a falhas/fraturas ou a outros pontos favoráveis à perfuração de poços para captação de água em aquífero fraturado contido em um granito, através da uma análise estrutural e levantamento geofísico de eletrorresistividade por meio de linhas de tomografia elétrica na área rural de Caçapava do Sul (RS). 9 2. ÁREA DE ESTUDO A área de estudo está localizada numa área rural no município de Caçapava do Sul (RS), distante aproximadamente 12 km da sede em sentido noroeste. Com relação a capital do Estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, está distante 259 km (Figura 1). Figura 1: Foto área da localização de estudo em “destaque” ao norte de Caçapava do Sul. Fonte: Modificado do Google Earth O município possui 34.634 habitantes distribuídos em uma área de 3.047,113 km², desta forma sua densidade demográfica corresponde a 11,06 hab/km². O IDH municipal é considerado alto de 0,704, e o PIB é de R$ 369.279.689.000, a economia é baseada na agricultura da soja, pecuária extensiva e serviços comerciais básicos (IBGE, 2010). Caçapava do Sul está situada a 444m acima do nível do mar. O clima vigente é o subtropical com temperatura média anual de 17°C e índice pluviométrico em torno de 1538 mm/ano (EMBRAPA, 2010). A Companhia Riograndense de Saneamento (CORSAN) é a empresa estatal estadual responsável pelo fornecimento de água no município, o que acarreta em um alto custo para o 10 setor público. A área urbana dos municípios sob sua administração é quase que totalmente servida por fornecimento intermitente de água potável, embora apresente índices abaixo de 30% de coleta e esgotamento sanitário. A área rural é predominantemente servida por captação superficial ou subterrânea (PMSB, 2013). 11 3. ÁGUA É a água substância mais abundante da natureza, e pode ser encontrada, naturalmente, em três estados físicos: sólido (gelo), líquido (água líquida) e gasoso (vapor). Ocorre em rios, lagos, oceanos, mares e calotas polares, é um recurso essencial à vida humana e ao equilíbrio dos ecossistemas. Apesar de haver um grande volume de água no planeta, há na realidade pouquíssima disponível para o consumo humano, após adequação de suas características, físicas, químicas e biológicas. O volume total de água no mundo é constante, a sua disponibilidade e qualidade é alterada cada vez mais com o passar dos anos (ANA, 2005). A distribuição de água é desigual no mundo o que causa problemas de disponibilidade nos países. A distribuição também não é homogênea durante o ano, em muitas regiões, o que gera desequilíbrio e desencadeia ações de gerenciamento diversificadas para enfrentar a escassez ou o excesso de água (TUNDISI,2003). O consumo de água potável aumenta ano a ano devido aos impactos ambientais causados pela superpopulação, atividades industriais entre outros. A qualidade da água é um aspecto indispensável, quando trata dos seus principais usos, em especial, para fins como o abastecimento humano. Este uso tem sofrido restrições significativas em função de prejuízos nos rios provenientes das ações naturais e antrópicas, as quais alteram os aspectos de qualidade e quantidade de água disponível para o uso humano (SOUZA et al., 2004). Caso a água fosse coerentemente utilizada e seu ciclo natural fosse respeitado, por sua capacidade de regeneração e reposição, ela não perderia qualidade e estaria disponível para consumo, sem necessidade de preocupação. A coleta e distribuição de água para abastecimento populacional no Brasil é baseada na captação de fontes superficiais, representada principalmente por rios e lagos, que envolvem tratamentos avançados para atendimento aos requisitos de potabilidade definidos por legislação federal. Questões relacionadas à expansão dos centros urbanos em diferentes regiões do país, eventos sazonais de estiagem prolongada e o predomínio de infraestrutura precária em termos de saneamento básico, representam as principais causas de desabastecimento ou fornecimento intermitente de água aos centros urbanos. Baseado em dados de 2014, o país possui em média 95% de domicílios com acesso a água e somente 56% atendidos por sistemas de esgotamento sanitário, com percentual de 42% para o caso da região Sul do Brasil (DIEESE, 2016). A coleta de esgoto e lançamento direto em 12 rios é a forma predominante de esgotamento sanitário em cidades de pequeno e médio porte no Brasil, com impactos ambientais diretos na flora e na fauna, além de restringir o uso deste recurso em atendimento às demandas de abastecimento público (SNIS, 2016). A universalização do sistema de abastecimento público de águas no país é uma realidade baseada em investimento público e em parcerias público-privada. Entretanto, uma questão de grande relevância é a perda média de 37% da água ao longo do sistema de distribuição, devido a extensão e complexidade da rede, falta de manutenção, idade do sistema, ligações clandestinas, dentre outros aspectos. Esta média é de 15% a 25% em países europeus e atinge no máximo 8% no Japão (DIEESE, 2016). O Brasil é um país rico em água doce, com 13% das reservas mundiais, 50% das reservas da América do Sul. Possui em suas terras o maior rio em termos de extensão e volume do mundo, o Rio Amazonas. 73% da água doce disponível é encontrada na Bacia Amazônica, a qual é habitada por apenas 5% da população, apenas 27% dos recursos estão disponíveis para as demais regiões, onde residem 95% da população do país (PNRH, 2010). Frente a falta de água potável em certas regiões brasileiras há uma maior utilização da água subterrânea nos diferentes setores, a tornando cada vez mais importante, visto que os recursos hídricos superficiais em algumas áreas são escassos e em outras estão no limite de capacidade de produção. O Estado do Rio Grande do Sul tem uma população em torno de 11 milhões de habitantes, dos quais cerca de 50% são abastecidos por água subterrânea (FREITAS, 2010). No Brasil, os aquíferos contribuem para que boa parte dos rios brasileiros sejam perenes, ou seja, não sequem no período da estiagem. A gestão das águas subterrâneas é de responsabilidade dos órgãos estaduais no Brasil. 3.1 Água Subterrânea. O uso das águas subterrâneas pela população remota dos tempos antigos, sua evolução acompanhou a evolução das sociedades humanas, porém seu aumento ocorreu devido ao melhoramento das técnicas de construção de poços e dos bombeamentos que permitiram a extração de maiores volumes a maiores profundidades. A distribuição das águas subterrâneas no globo ocorre de forma heterogênea, mas estão muitas vezes ligadas a áreas com grandes índices pluviométricos nos dias atuais ou em outras épocas geológicas. É etimado que há quase 100 vezes mais águas subterrâneas (10.360.230 km³) do que superficiais (92.168 km³), desta forma são uma importante reserva de água doce, 13 apesar de muitas vezes sua ocorrência em grandes profundidades impossibilitar sua extração e uso (SHIKWMANOV, 1998). Países como a Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, França, Holanda, Hungria, Itália, Marrocos, Rússia e Suíça atendem de 70 a 90% da demanda para o abastecimento público por meio da exploração de águas subterrâneas. Outros utilizam a água subterrânea no atendimento total (Dinamarca, Arábia Saudita, Malta) ou apenas como suplementação do abastecimento público e de atividades como irrigação, produção de energia, turismo, indústria, etc... (REBOUÇAS et al., 2002). No Brasil, as reservas de água subterrânea são estimadas em 112.000 km3 (112 trilhões de m³) e a contribuição multianual média à descarga dos rios é da ordem de 2.400 km³/ano. 39% das cidades brasileiras usam dessas águas para seu abastecimento de forma exclusiva ou complementar. Indústrias, propriedades rurais, escolas, hospitais e outros estabelecimentos utilizam, com frequência, água de poços profundos. O maior volume de água ainda é, todavia, destinado ao abastecimento público. Os estados com maior número de poços perfurados são: São Paulo, Bahia, Rio Grande do Sul, Ceará e Piauí (ANA, 2013). Com a necessidade cada vez maior de atender à crescente demanda por recursos hídricos, a exploração de águas subterrâneas está tornando uma alternativa bastante comum para o abastecimento, em virtude de sua abundância, qualidade e baixo custo relativo de captação, principalmente ao analisarmos os altos custos para tratamento das águas superficiais e sua escassez em algumas regiões (ANA, 2013). Ás águas subterrâneas ocupam diferentes tipos de reservatórios, reunidos em três sistemas: poroso, fissurado e cárstico. As águas subterrâneas são resultado do excedente das águas de chuvas que percorrem camadas abaixo da superfície do solo e preenchem os espaços vazios ou vazios intergranulares das rochas sedimentares, ou as fraturas, falhas e fissuras das rochas compactas. Dessa forma, os aquíferos são uma reserva de água embaixo do solo, abastecida pela chuva, e funciona como uma espécie de caixa d’água que alimenta os rios. A composição química das águas subterrâneas está diretamente relacionada à mineralogia e litotipos que compõem o aquífero (ANA, 2005). Ás águas subterrâneas também fazem parte do ciclo hidrológico, uma vez que após a precipitação parte das águas infiltra nos solos e percola no interior do subsolo. Na infiltração uma parte da água fica retida nas regiões mais próximas da superfície do solo, na zona não saturada. Outra parte da água infiltra nas camadas mais profundas do subsolo pela influência da gravidade, na zona saturada. O nível freático separa as duas zonas, ele varia de acordo com 14 a precipitação no local. Em regiões com grandes índices pluviométricos esse nível se aproxima mais da superfície do solo, podendo até gerar zonas pantanosas ou zonas de nascentes caso haja algum corte no terreno (Figura 2). Figura 2: Configuração das zonas não saturadas e saturada no subsolo. Fonte: Boscardin Borghetti et al. (2004). Zona Não Saturada: ou zona vadosa, é a parte do solo preenchida parcialmente por água distribuída uniformemente. Por ser próxima a superfície há uma maior perda de água para atmosfera a por diversos processos. Em alguns casos a quantidade de sais que se precipitam na superfície do solo após a evaporação dessa água, dá origem a solos salinizados ou a crostas ferruginosas (lateríticas). Zona Saturada: região onde os poros e fraturas das rochas são totalmente preenchidos por água. Ás águas infiltram até uma profundidade limite onde as rochas estão saturadas e não é possível haver mais penetração. A zona não saturada não precisa estar totalmente saturada para o seu excedente fluir em baixas velocidade para zona saturada, formando deste modo o manancial subterrâneo. Uma parcela dessa água irá desaguar na superfície dos terrenos, formando as fontes, olhos de água. A outra parcela desse fluxo subterrâneo forma o caudal basal que deságua nos rios, perenizando-os durante os períodos de estiagem, com uma contribuição multianual média da ordem de 13.000 km³/ano, ou desagua diretamente nos lagos e oceanos (REBOUÇAS, 1997) A água percola pelas rochas e é modifica através de uma série de processos de natureza físico, químico e biológico. A composição química da água subterrânea é o resultado 15 combinado da composição da água que adentra o solo e da evolução química influenciada diretamente pelas litologias atravessadas (SILVA, 2003). Um dos parâmetros que influencia no fluxo da água subterrânea é a permeabilidade, isto é, a capacidade do material em permitir o fluxo de água através dos poros, que depende do tamanho e volume dos poros interconectados, a forma, a distribuição e variação de granulometria dos grãos. Quanto mais homogêneos o tamanho e a distribuição destes, maior é a interconexão dos poros e consequentemente a capacidade do aquífero em transmitir água. Sedimentos argilosos, por exemplo, apesar de apresentarem elevada porosidade, possuem baixa permeabilidade, pois os poros são muito pequenos e a água fica presa por adsorção. Já os basaltos, embora não apresentem porosidade alguma, possuem abundantes fraturas abertas e interconectadas, os quais facilitam o fluxo da água (TEIXEIRA et al., 2003). Segundo Giampá & Gonçales (2006) as propriedades físicas que regem o sistema água/rocha como, porosidade específica (propriedade de estocagem) e permeabilidade (propriedade de transporte) são capazes de determinar as classes hidrogeológicas dos sedimentos ou rochas, que podem ser: (a) Aquífero – Camada ou corpo rochoso que apresenta os maiores valores de porosidade específica e permeabilidade, como sedimentos arenosos, rochas compactas muito fraturadas ou intemperizadas e sistemas cársticos bem desenvolvidos; (b) Aquitarde – Camada ou corpo rochoso que apresentam os valores de permeabilidade e porosidade específica baixos, assim como sedimentos argilosos, rochas compactadas pouco fraturadas ou intemperizados e sistemas cársticos pouco desenvolvidos; (c) Aquiclude – Camada ou corpo rochoso que apresentam os valores de permeabilidade e porosidade específica praticamente nula, como camadas de sedimentos essencialmente argilosos, rochas compactas muito pouco fraturadas ou carstificada; (d) Aquifuge – Camada ou corpo rochoso muito compacto que apresentam os valores de permeabilidade e porosidade específica também nula, tais como rochas cristalinas do embasamento (magmáticas e metamórficas) não fraturadas ou intemperizadas. Desta forma as formações geológicas no subsolo suficientemente permeáveis, que permitem o armazenamento em seus poros ou fraturas de água são chamadas de aquíferos. Estes podem ser classificados segundo suas características hidrodinâmicas ou em relação ao tipo de porosidade da rocha armazenadora (MMA, 2007). Um aquífero pode ter extensão de poucos 16 quilômetros quadrados a milhares de quilômetros quadrados, ou pode, também, apresentar espessuras de poucos metros a centenas de metros (REBOUÇAS et al., 2002). Os aquíferos podem ser classificados ainda de acordo com a pressão das águas nas suas superfícies limítrofes, com os principais sendo (Figura 3): (a) Aquífero livre: está localizado próximo a superfície, constituído por uma formação geológica permeável. Através da ação da pressão atmosférica a água infiltra e atravessa a zona não saturada e o recarrega diretamente, nesse caso a recarga é chamada de direta. Nele o nível de água varia segundo a quantidade de chuva. Por serem de mais fácil acesso são os mais explorados e vulneráveis a contaminação. Está submetido a ação da pressão atmosférica. (b) Aquífero confinado: é encontrado dentro de uma formação geológica permeável confinada entre camadas impermeáveis ou semipermeáveis, desta forma o mesmo está submetido a uma ação de pressão maior do que a da pressão atmosférica. Devido a sua maior pressão pode haver poços artesianos (jorrantes) para captação dessas águas. Sua recarga é indireta e ocorre, através das chuvas, em locais onde essa formação permeável aflora na superfície. (c) Aquífero suspenso: encontrado acima do nível regional freático, sobre uma camada restrita de baixa permeabilidade que não armazena ou transmite água. Figura 3: Tipos de aquíferos quanto a pressão. Fonte: Boscardin Borghetti et al. (2004). 17 De acordo com o tipo de rocha e sua porosidade onde a água é armazenada, os aquíferos podem ser classificados em (Figura 4): (a) Aquífero poroso ou granular: constituído por rochas sedimentares e/ou sedimentos inconsolidados. Nele a água é armazenada nos poros das formações geológicas. Apresenta grandes produtividades devido à alta porosidade e taxa de conectividade entre os poros, permitindo assim o fluxo. Devido ao seu grande volume de água armazenada e ao fato de ocorrem em grandes áreas são os mais importantes aquíferos. (b) Aquífero cárstico: o armazenamento e circulação da água ocorre em espaços gerados pela dissolução química de rochas carbonáticas. Estas aberturas podem ser de grandes dimensões, algumas vezes criando rios subterrâneos. São aquíferos heterogêneos e descontínuos. (c) Aquífero fissural (fraturado): encontrado em rochas ígneas e metamórficas, a quantidade de armazenar água está relacionada a presença de fraturas e fissuras no corpo rochoso. Quanto maior a quantidade de fraturas na rocha, preenchidas por água, maior a potencialidade do aquífero em fornecê-la. Seus poços costumam gerar pouca vazão, os mais produtivos são aqueles que interceptam fraturas capazes de conduzir água. Figura 4: Tipos de aquíferos quanto a porosidade. Fonte: Boscardin Borghetti et al. (2004). 18 3.2 Aquífero Fraturado No Brasil boa parte das investigações em aquífero fraturado são voltadas para à indicação de critérios para locação de poços e é baseada na confrontação entre a capacidade específica ou vazão de poços e uma série de fatores (tais como lineamentos, litologias, compartimento topográfico, etc.) que, tradicionalmente, são considerados influenciadoras sobre as produções. A quantidade, ou mesmo a existência, de fluxo de água subterrânea através de rocha sã de baixa porosidade primária vai depender da densidade, conectividade e abertura das fraturas presentes (DOMENICO & SCHWARTZ, 1990). É importante compreender para este estudo em questão como são formadas e propagadas as fissuras e fraturas nos corpos rochosos cristalinos, pois o alvo da pesquisa está localizado em uma área sobre o batólito granítico Caçapava do Sul. As fraturas, são as principais estruturas em corpos graníticos e podem ser desenvolvidas por movimentos tectônicos, alívio de pressão, carga e descarga de glaciação, encolhimento durante o resfriamento da massa rochosa, e as forças de compressão e de tensão causados por tensões tectônicas regionais. Em suma todos estes eventos são reflexo do limite de resistência do material, no campo de deformação rúptil. Fossen (2012) define 3 tipos de fraturas de acordo com os movimentos relativos dos blocos, de cisalhamento onde há um movimento paralelo à fratura, a extensional que apresenta extensão perpendicular às paredes, podendo ser junta que não possui deslocamento entre as paredes e fissura ou veios quando são preenchidos por gás, fluídos ou minerais (Figura 5). Figura 5: Tipos de fraturas. Fonte: Modificado de Fossen, 2012. A abertura das fraturas é determinada pelo mecanismo de sua propagação (LAWN & WILSHAW,1975) que pode ser de 3 tipos (Figura 6): 19 I - Por abertura (opening) ou separação normal dos planos de ruptura sob a ação de esforço de tração, deslizamento perpendicular à abertura. II - Por deslizamento paralelo à superfície das fraturas e à frente de propagação da ruptura. III - Por deslizamento paralelo à superfície das fraturas e perpendicular à frente de propagação da ruptura. Figura 6: Modelos de propagação de fratura. Fonte: Modificado de Lawn & Wilshaw, 1975. Para que ocorra sucesso na localização deste tipo de aquífero é necessário um estudo integrado dos condicionantes geológicos/estruturais (método direto) juntamente com aplicação de métodos geofísicos (método indireto) (FERNANDES, 2008). 20 4. GEOLOGIA REGIONAL 4.1 O Escudo Sul-Rio-Grandense O município de Caçapava do Sul se encontra inserido, em termos geológicos, no Escudo Sul-rio-grandense (ESRG), que abrange uma área de aproximadamente 65.000 km² (CHEMALE JR., 2000), e está localizado no Setor Sul da Província Mantiqueira (ALMEIDA & HASUI, 1984). No Estado do Rio Grande do Sul esta província é limitada a leste com a Província Costeira e a norte e oeste com a Província Paraná (CPRM, 2000). Província Mantiqueira consiste um sistema orogênico Neoproterozoico, desenvolvido em uma faixa de direção NE-SW, que vai desde o sul do Estado da Bahia até o Uruguai (Figura 7), totalizando 3000 km de comprimento (HEILBRON et al., 2004). Figura 7: Províncias estruturais brasileiras com destaque compartimentação da Província Mantiqueira. Fonte: Modificado de Heilbron et al. (2004) 21 O Escudo Sul-Rio-Grandense compreende unidades tectono-estratigráficas de idades Paleo, Meso e Neoproterozoicas, resultados de processos de geração e deformação de crosta continental, cuja contribuição maior ocorreu em dois ciclos orogênicos distintos, o Transamazônico (2,26-2,00 Ga) e o Brasiliano (900-535 Ma) (SOLIANI, 1986). O anteparo Arqueano contra o qual estabeleceu a colisão durante o primeiro ciclo orogênico não está registrado no Estado, porém para os processos orogênicos do Neoproterozoico temos como referencial um continente Paleoproterozoico, do qual seus fragmentos remanescentes configuram o atual Cráton Rio de La Plata (HARTMANN et al., 2007). Processos de tectônica transcorrente dominaram o ESRG a partir de 650 Ma, seguidos por granitogênese e formação de bacias pós-colisionais (MENEGAT et al., 1998). Presentemente é consensual que a evolução do escudo é resultante de colagem orogênica de ambientes geotectônicos distintos, constituídos de associações de rochas específicas, embora os modelos apresentados sejam divergentes quanto a seus aspectos genético-evolutivos (CPRM, 2000). Segundo Simões (2014) a estratigrafia e a divisão geotectônica do ESRG foram originadas a partir de trabalhos pioneiros como o de Carvalho (1932), que estabeleceu a sua primeira coluna litoestratigráfica, e Leinz et al. (1941) cujo Mapa Geológico Caçapava-Lavras representa um marco na cartografia geológica regional. Entre os trabalhos posteriores destaca os de Goñi et al. (1962), Jost & Villwock, (1966), Ribeiro et al. (1966) e Tessari e Picada (1966). A partir destes trabalhos, as compartimentações geotectônicas do ESRG foram apresentadas por Issler (1965, 1983) seguido por Picada (1971), Hasui et al. (1975), Ribeiro & Fantinel (1978), Fragoso-Cesar (1980, 1982), Jost & Bitencourt (1980) e Basei (1985). Após o trabalho de Soliani Jr. (1986), que apresentou um vasto acervo de dados geocronológicos, os modelos de estratigrafia e evolução das associações petrotectônicas foram sistematicamente desenvolvidos por Fernandes et al. (1992, 1995a), Fragoso-Cesar (1991) e Chemale Jr. et al. (1995); renovados a partir da aquisição de dados geofísicos por Fernandes et al., (1995b), Costa (1997) e Chemale Jr (2000). A geologia do Escudo Sul-Rio-Grandense consiste em um antigo núcleo cratônico denominado de Cráton Rio de La Plata, representado pelo Terreno Taquarembó (complexo granulitico paleoproterozoico retrabalhado parcialmente no neoproterozoico), envolto pelo Cinturão Dom Feliciano composto, de oeste para o leste, pelos Terrenos São Gabriel (assinatura juvenil, com associações 16 petrotectônicas de ambientes de margem passiva e de retro-arco, ofiolitos, arcos magmáticos vulcano-sedimentares e plutônicos derivado de um manto Neoproterozoico) e Tijucas (rochas paleoproterozoicas gnáissicas de composição tonalítica a diorítica e neoproterozoicas, metavulcânicas e metassedimentares resultantes da deposição em 22 crosta continental distendida ou de um arco magmático continental, com retrabalhamento de crosta continental Paleoproterozoica), e pelo Batólito Pelotas (complexo granítico e suítes intrusivas de idade brasiliana, entre 650-550 Ma, relacionadas à atuação de zonas de cisalhamento e com septos do embasamento) (Figura 8) ( SOLIANI JR., 1986; CHEMALE JR., 2000; HARTMANN et al., 2000, 2007; PHILIPP & MACHADO, 2005; PHILIPP et al., 2007). Figura 8: Compartimentação do ESRG. Fonte: Modificado de Hartmann et al. (2007). 23 O Terreno Taquarembó (2,55 - 2,0 Ga) está situado na porção sudoeste do ESRG estando limitado pelo lineamento Ibaré ao norte, pela anomalia magnética de Caçapava do Sul a leste e é recoberto pela Bacia do Paraná a oeste e sul. É caracterizado por fragmentos remanescentes do Cráton Rio de La Plata, parcialmente retrabalhados durantes a orogenia Brasiliana Pan-africana (HARTMANN et al., 1999, 2000, 2007; SOLIANI JR. et al.,2000). Registra do Paleoproterozóico o Complexo Granulítico Santa Maria Chico, ocorrendo neste complexo granulitos máficos e félsicos, mármores, gnaisses, paragnaisses, rochas calcissilicatadas com idade 2.5 a 2.1 Ga das rochas ígneas protólitas e 2.02 Ga para o metamorfismo gerador dos granulitos (HARTMANN et al, 2000) que representam um arco insular (PHILIPP et al, 2009). O Terreno São Gabriel (880 - 680 Ma) compreende a porção ocidental do Cinturão Dom Feliciano e possui forma alongada na direção N20 - 30ºE. É coberto a oeste e norte por unidades fanerozoicas da Bacia do Paraná, e limitada ao sul pela Zona de Cisalhamento Ibaré (ZCI) e a leste pela Zona de Cisalhamento Caçapava do Sul (ZCCS). É constituído por litologias de assinatura juvenil e associações petrotectônicas de arcos magmáticos, ofiolitos e ambientes de margem passiva e de retroarco (BABINSKI et al., 1996; LEITE et al., 1998). O Terreno Tijucas (800 - 620 Ma) possui forma alongada na direção N30- 40ºE. Está em contato tectônico com o Terreno São Gabriel a oeste ao longo da Zona de Cisalhamento de Caçapava do Sul. O contato a leste, com Batólito Pelotas, é marcado pela zona de cisalhamento de Dorsal do Canguçu (FERNANDES et al., 1992; PHILIPP et al., 2003) e a nordeste é afetado pela Zona de Cisalhamento do Passo do Marinheiro. É composto por rochas metavulcânicas e metassedimentares resultantes de deposição em crosta continental distendida e de arco magmático continental, com retrabalhamento de crosta continental paleoproterozoica (2,2 - 1,9 Ga, Gnaisse Encantadas) (JOST & BITENCOURT, 1980). O Cinturão (Terreno) Tijucas possui registro neoproterozóico representado pelo Complexo Porongos. O Complexo Porongos é um grupo de rochas sedimentares e vulcânicas metamorfizadas na fácies xisto verde a anfibolito com idade Neoproterozóico (HARTMANN et al., 2007) O Batólito Pelotas é formado por suítes e complexos graníticos do Brasiliano com septos do embasamento (HARTMANN et al., 2007). O A maior área deste batólito está ocupada por suítes graníticas de caráter pós-colisional com idades entre 650-550 Ma (BABINSKI et al., 1997; HARTMANN et al., 2000; PHILIPP et al., 2003; PHILIPP & MACHADO, 2005). Apesar da ocorrência de rochas básicas a intermediárias, os dados isotópicos indicam que os granitóides foram gerados essencialmente pelo retrabalhamento de uma crosta 24 Paleoproterozoica (2,3-2,0 Ga) e mais raramente Arqueana (LEITE et al., 2000; PHILIPP et al., 2003). A origem do grande volume magmático no Batólito Pelotas, aproximadamente 650 a 590 Ma, foi atribuída a um ambiente de arco magmático acima de zona de subducção do oceano Adamastor, com mergulho para oeste (FERNANDES et al., 1995). 4.2 Terreno São Gabriel O Terreno São Gabriel tem uma pequena extensão de exposição e guarda o registro mais completo do estágio de formação da crosta juvenil brasiliana em toda a Província Mantiqueira (HEILBRON et al., 2004). Teria sido formado pela acreção de rochas crustais juvenis do Complexo Cambaí e da sequência vulcano-sedimentar do Supergrupo Vacacaí durante a orogênese São Gabriel no ciclo brasiliano (CHEMALE JR et al., 1995). O Terreno São Gabriel está localizado na porção centro-oeste do Rio Grande do Sul, limitando à SW com o Terreno Taquarembó através do Lineamento de Ibaré (HARTMANN et al., 2007) e a leste com as unidades da Bacia do Camaquã através da Sutura de Caçapava (COSTA,1997). Constituido pelo: Complexo Cambaí, Palmas, Bossoroca, a Bacia do Camaquã e o Cinturão Metamórfico Vacacaí (Figura 9). Além de rochas plutônicas intrusivas, representadas por granitóides sin- transcorrentes, tardi a pós-tectônicos e pós-tectônicos em relação ao evento tectônico transcorrente (CPRM,2000). 25 Figura 9: Mapa de detalhe do Terreno São Gabriel. Fonte: Modificado de Chemale Jr., 2000. O Complexo Cambaí, é considerado por Hartmann et al. (2007), como composto por três associações magmáticas: (i) gnaisses dioríticos, tonalíticos e trondjemíticos; (ii) metatonalitos e metadioritos; e (iii) Suíte Lagoa da Meia Lua (tonalitos, granodioritos e dioritos) 26 com idades de zircão (TIMS e SHRIMP) em torno de 735-680 Ma (BABINSKI et al., 1996; HARTMANN et al., 2007) Koppe et al., (1985) definiram o Complexo Bossoroca como composto por uma associação de rochas metamáficas, meta-ultramáficas, metachert, formações ferríferas bandadas e o Gabro da Mata Grande (Sequência Arroio Lajeadinho) com rochas vulcanossedimentares (Sequência Campestre), metamorfisadas em condições de baixo grau. Idades de cristalização de metadacitos do Complexo Bossoroca estão disponíveis (U-Pb em zircão, TIMS e SHRIMP) e apresentam valores em torno de 750 Ma (MACHADO et al., 1990; REMUS et al., 1999). O Complexo Palma é constituído por rochas meta-vulcânicas máficas e ultramáficas, intercaladas com xistos e paragnaisses pelíticos e quartzíticos. Representa uma associação de bacia back-arc e ofiolitos relacionados com a tectônica de subducção geradora das rochas juvenis do Terreno São Gabriel (HARTMANN et al., 2007). A idade modelo TDM para os isótopos de Nd das rochas máficas e ultramáficas do Complexo Palma é Neoproterozóica, entre 1,3 e 0,6 Ga. A presença de um platô oceânico na Mina da Palma (LOPES & HARTMANN, 2003) indica idade de 704 + 2 Ma em zircão (SHRIMP), corroborando para a presença de ofiolitos associados à subducção formadora do Terreno São Gabriel. A Bacia do Camaquã, definida por Fragoso-Cesar et al. (2003) como Supergrupo Camaquã, é constituída por rochas sedimentares siliciclásticas e vulcanogênicas aflorantes em três sub-bacias alongadas no sentido NNE-SSW, denominadas Sub-Bacias Camaquã Ocidental, Camaquã Central e Camaquã Oriental. As sub-bacias são segmentadas pelos altos do embasamento denominados Altos de Caçapava do Sul e Serra das Encantadas. A estratigrafia das sub-bacias foi definida em cinco unidades do Supergrupo Camaquã da base para o topo: Grupo Maricá, Grupo Bom Jardim, Formação Acampamento Velho, Grupo Santa Bárbara e Grupo Guaritas. A bacia apresenta um registro estratigráfico de eventos deformacionais correlacionados com falhas direcionais e extensionais (ALMEDA, 2010). A Bacia do Camaquã é caracterizada por intercalação de eventos deposicionais sedimentares e vulcano-sedimentares, na qual os episódios vulcânicos dominaram normalmente na base das unidades, seguidos pela deposição de sedimentos predominantemente siliciclásticos, representando diversas unidades estratigráficas (LIMA et al., 2007). 27 4.3 Cinturão Metamórfico Vacacaí. O Cinturão Metamórfico Vacacaí (CMV) é uma importante faixa metavulcanossedimentar do Terreno São Gabriel, a qual bordeja toda a associação de rochas juvenis desta unidade, sendo constituída por metassedimentos, metavulcânicas e metaultramáficas com idade em torno de 760 a 730 Ma. Também ocorrem no Complexo Metamórfico Vacacaí rochas menos representativas, como gnaisses quartzofeldspáticos, meta- arenitos feldspáticos, metagrauvacas, mármores, quartzitos e rochas magnesianas metamorfizadas. Inseridos predominantemente nas bordas leste e sudeste do Complexo Granítico Caçapava do Sul, ocorrem mármores dolomíticos na forma de corpos lenticulares, acompanhados de rochas calcossilicatadas (BITENCOURT, 1983) A Sequência Metamórfica Vacacaí é limitada principalmente por coberturas Vulcano- sedimentares não metamórficas e é intrudida por granitóides sin-transcorrentes, tardi a pós- tectônicos e pós-tectônicos (CPRM 2000) como os granitoides do Complexo Granítico Caçapava do Sul (Figura 10). Chemale et al., (1995b) relacionaram a geração dessas rochas, da Seqüência Metamórfica Vacacaí, a um contexto de litosfera oceânica e relacionado a um sistema de arco de ilhas, formada provavelmente ao final do Mesoproterozóico ou início do Neoproterozóico, as quais foram intensamente deformadas durante o Ciclo Brasiliano, principalmente no Evento orogênico São Gabriel (750-700Ma) e posteriormente no Evento Dom Feliciano (600Ma). 28 Figura 10: Mapa geológico regional, com destaque para a área de estudo. Fonte: Dorneles (2013), modificado de CPRM (2000). 29 Bitencourt (1983) caracteriza nas rochas metamórficas da região de Caçapava do Sul dois eventos metamórficos regionais, acompanhados por duas fases deformacionais, havendo também uma terceira fase deformacional não metamórfica. A paragênese representativa do primeiro evento é compatível com a fáceis anfibolito; no segundo evento a mineralogia observada indica um retrometamorfismo em fácies xisto verde, que provavelmente foi a responsável pela deformação que propiciou a xistosidade regional. A estrutura antiforme foi gerada durante o terceiro evento deformacional, responsável pelo dobramento da foliação metamórfica. 30 5. GEOLOGIA LOCAL 5.1 Suíte Granítica Caçapava do Sul A área onde foi realizado os estudos geofísico se encontra sobre a Suíte Granítica Caçapava do Sul (CGCS). O CGCS está constituído por duas partes com características distintas: na porção norte, tem a forma de um diápiro subcircular, com um enraizamento profundo e no restante da área é apresentada como um corpo alongado, com direção N-S, com espessura crescente de leste para oeste (COSTA et al., 1995). O CGCS tem idade ígnea de 561 ± 6 Ma (LEITE et al., 1995). As rochas graníticas de Caçapava do Sul afloram em uma área de aproximadamente 250 km², em condições intrusivas em metamorfitos desenvolvidos sob condições de fácies anfibolito a xisto verde (HARTMANN et al., 1990). Os metamorfitos são constituídos principalmente por xistos pelíticos, filitos, mármores, rochas anfibolíticas e metavulcânicas pertencentes ao Complexo Metamórfico Vacacaí. Deste modo esses litotipos estão espacialmente associados às apófises graníticas sintranscorrentes, tardi- a pós-tectônicos da Suíte Granítica Caçapava do Sul. O contato das rochas graníticas com as encaixantes metamórficas é abrupto e marcado por foliação milonítica ao longo das bordas que é concordante com a foliação da sequência metamórfica que as envolvem (BITENCOURT, 1983). O conjunto apresenta uma constituição mineralógica principal caracterizada por proporções variadas de quartzo, feldspato alcalino e plagioclásio, com biotita presente em todas as fácies e hornblenda apenas nos tipos tonalíticos. Os minerais acessórios mais comuns identificados são zircão, allanita, apatita e minerais opacos, além de titanita e rutilo em menor frequência. Constituem como minerais resultantes do metamorfismo associado à fase de deformação transcorrente clorita, epidoto, muscovita, carbonato e opacos secundários. Os granitóides, predominantemente de granulação média a fina e frequentemente porfiroclásticos, apresentam foliação milonítica segundo NNE/SWS e mergulho vertical, definida por forte estiramento do quartzo e feldspato e orientação dos filossilicatos (PORCHER & LOPES, 2000). Pegmatitos, aplitos, e veios de quartzo com pirita e/ou hematita são comuns no lado leste do batólito, indicando alta atividade de fluído com relação ao estágio final de cristalização do granito (NARDI & BITTENCOURT, 1989). As rochas que compõem o complexo intrusivo CGCS levaram Nardi & Bitencourt (1989) à individualização de três litofácies principais, intimamente associadas, tanto em escala de 31 afloramento quanto em amostra de mão, que foram denominadas segundo o tipo dominante: 1) biotita-granitóides, cinzentos, com teores elevados de biotita e alanita como acessórios (porção centro-sul); 2) leucogranitóides, rosados, pobres em máficos, localmente com granada e/ou muscovita como acessórios (porção norte) e 3) granitóides transicionais, com características intermediárias entre os dois anteriores. Associados principalmente aos leucogranitóides, ocorrem microgranitos, aplitos e pegmatitos. Estudos geoquímicos indicaram que o granito é metaluminoso e possui afinidade cálcicoalcalina. Os solos correspondentes à área da suíte granítica são classificados em duas unidades: podzólico vermelho-amarelo eutrófico e podzólico vermelho-amarelo distrófico (IBGE, 2002). O granito Caçapava na região de estudos apresenta revelo com declividade suave com variações de altitude entre 420m e 350m. Contudo, seus limites com o Complexo Metamórfico Vacacaí apresentam declividade bastante acentuada, com variações bruscas de altitude. As rochas da suíte granítica afloram sob a forma de blocos ou em extensas superfícies em vales de drenagens, com acentuada foliação milonítica orientada segundo NNE/SWS e mergulho vertical, marcada pela orientação de minerais máficos e estiramento de cristais de quartzo e feldspato. Estreitas faixas de milonitos cinza-escuro alternadas com feições de textura protomilonítica, definem as zonas de maior deformação durante o resfriamento e cristalização, onde são reconhecidos profiroclastos de feldspato rotacionados e sombras de pressão. 5.2 Estrutural da SGCS Existem muitas teorias sobre a intrusão do corpo granítico e sua colocação no Complexo Metámorfico Vacacaí, pois sua caracterização estrutural é objeto de estudos há muito tempo. Bitencourt (1983) e Nardi & Bitencourt (1989) com base nas estruturas observadas, e nas relações destas com as encaixantes, interpretam o Complexo como um diápiro granítico. O evento intrusivo, para eles, ocorreu em uma zona de cisalhamento em fases tardias do Ciclo Brasiliano, marcando os últimos estágios tectônicos do Ciclo Brasiliano no Sul do Brasil, ligados à reativação de estruturas formadas durante o evento Dom Feliciano. Assim ainda sugerem que o complexo granítico seja uma intrusão concomitante com a segunda fase de metamorfismo e deformação regional das rochas metamórficas encaixantes. Costa et al., 1995 conclui que em função dos resultados da modelagem geofisica, sugeriu, para o complexo intrusivo, uma evolução e um posicionamento controlados por uma inflexão de uma zona de transcorrência com direção geral NE, com movimentação dextral. As principais feições estruturais que estão sobrepostas ao corpo granítico são sub- horizontais, com foliações de baixo ângulo e lineação mineral com baixo caimento para SSW. 32 O baixo ângulo da lineação e foliação existente é provavelmente relacionado à zona de cisalhamento transcorrente (COSTA et al., 1995) que afetou o Granito Caçapava. Bitencourt (1983) realizou análises estruturais nas regiões norte e sudeste da suíte granítica, permitindo o reconhecimento de três fases de deformação: 1ª fase marcada por porfiroblastos pré-cinemáticos em relação à xistosidade regional das encaixantes; 2ª fase relacionada à xistosidade regional que também afetou os granitos; e 3ª fase geradora de estrutura antiformal com posicionamento de suíte granítica em seu núcleo central. Apenas as duas últimas fases afetaram de forma significativa a suíte granítica, regionalmente definas como fases D3 e D4, resultado da vigência de esforços compressivos durante o resfriamento da intrusão. 5.3 Sistema Aquífero Embasamento Cristalino II A área de estudo está localizada na porção do estado do Rio Grande do Sul classificado como Sistema Aquífero Embasamento Cristalino II (MACHADO & FREITAS, 2005). Este sistema tem comportamento hidrodinâmico típico de aquífero fissural (fraturado). Nele os aquíferos são limitados, apresentam baixa possibilidade para água subterrânea, contidos em rochas com porosidade intergranular ou controlados por fraturas. Abrange todas as rochas graníticas, gnáissicas, andesíticas, xistos, filitos e calcários metamorfizados, localmente afetadas por fraturamentos e falhas. Locais com ausência de coberturas de sedimentos marinhos, apresentam águas com baixos teores de sais dissolvidos, em geral inferiores a 300mg/l, raramente ultrapassando 200mg/l. Já as áreas contidas em rochas graníticas podem ser enriquecidas em flúor (MACHADO & FREITAS, 2005). Geralmente, as vazões produzidas por poços são pequenas, e a água em função da falta de circulação e do tipo de rocha, é, na maioria das vezes, salinizada (PMSB, 2013). Segundo Machado & Freitas (2005), os poços normalmente apresentam capacidades específicas inferiores a 0,5 m3/h/m, ocorrendo também poços secos. Como a maioria das rochas ocorre sob a forma de grandes e extensos corpos maciços, há uma tendência para que este sistema seja o que tenha a menor possibilidade de acúmulo de água subterrânea dentre todos aqueles relacionados aos aquíferos fissurais no Estado do Rio Grande do Sul (PMSB, 2013). Além disso, as fraturas lhe conferem alta vulnerabilidade, porém, em geral, devido à sua localização, pequeno risco de contaminação (MACHADO & FREITAS, 2005). 33 6. MATERIAIS E MÉTODOS O objetivo da maioria das investigações hidrogeológicas de águas subterrâneas é voltada para localizar locais potenciais para perfuração de poços com vazões suficientes para uso doméstico, industrial e irrigação na agricultura. Além disso, investigações hidrogeológicas em rochas fraturadas são também escolhidas para a seleção de lugares adequados para eliminação de resíduos, incluindo resíduos radioativos, de energia geotérmica, rejeitos de minerações entre outros (SINGHAL & GUPTA, 2010). Nessas investigações a integração de dados de sensoriamento remoto e dados geofísicos podem ser altamente úteis na identificação de alvos regionais de exploração, como mostrado por Ranganai & Ebinger (2008). Os estudos da área foram divididos em três etapas: 1º - Caracterização da área e de sua potencialidade hidrogeológicas a partir de métodos indiretos como sensoriamento remoto e informações bibliográficas; 2º - Análise conjunta da estrutural da área através de determinação de atitude de lineamentos principais por imagens áreas e medidas de altitudes realizadas em campo; 3º - Levantamento geofísico na área determinada nas etapas anteriores. Essas três etapas possibilitaram compreender sobre a distribuição local das feições rúpteis que podem influenciar no acúmulo de água nas rochas da área (SINGHAL & GUPTA, 2010). 6.1 Análise estrutural preliminar por imagem de satélite. Interpretação geológica derivada de fotos aéreas / sensoriamento remoto tem sido extensivamente usado para fins de identificação de lineamentos ou zonas de fratura ao longo das quais fluem as águas subterrâneas e para investigações de relevo adequadas para prospecção de águas subterrâneas. Um dos motivos do uso cada vez maior de imagens áreas ocorre, pois, essa análise preliminar economiza tempo, pois é possível analisar grandes áreas. Outro motivo ocorre devido ao fato de poder analisar áreas inacessíveis (SINGHAL & GUPTA, 2010). Os estudos de lineamento são de suma importância para as investigações de águas subterrâneas em terrenos de rocha cristalina. A técnica de traçar fraturas e lineamentos locais através de fotografias aéreas para localização de zonas de maior permeabilidade em terrenos de rocha cristalina foram desenvolvidas por Lattman e Parizek (1964); também Parizek (1976), e a mesma técnica é agora usada com imagens de satélite. Essa técnica tem mostrado poços localizados perto de traços de fratura rendem muitas vezes mais água do que os poços longe 34 dos traços de fratura, e são mais consistentes em seu rendimento quando localizados em lineamentos (SINGHAL & GUPTA, 2010). Fraturas são muitas vezes detectadas em fotografias aéreas, pois, são reconhecidas por: mudanças lineares na topografia, padrões de drenagem ou padrões de vegetação, bem como por diferentes cores de rochas e solos (MILLER & MILLER, 1961; KRONBERG, 1985 e SABINS, 1996). Além disso, as rochas fraturadas mostram sinais de intemperismo e erosão (KNÖDEL et al., 2007). Antes de realizar o levantamento geofísico em campo é ideal estabelecer o melhor local para disposição das linhas geofísicas a serem realizadas em campo. Para decidir a área onde locar as linhas é necessário fazer uma interpretação preliminar com base no uso de imagens de satélite. Fotografias aéreas e imagens de satélite são muito usadas como primeiro reconhecimento em estudos geológicos e geomorfológicos. Esses dados são úteis para ser possível posicionar os levantamentos geofísicos ortogonalmente às estruturas de interesse previamente interpretadas (SINGHAL & GUPTA, 2010). Caso não haja informação preliminares de imagens aéreas, a melhor forma é posicionar a malha/perfis de forma a interceptar as estruturas quaisquer que sejam as suas direções. A disposição dos perfis pode ser triangular ou quadrangular, o que irá assegurar que as estruturas sejam detectadas independentemente das orientações das mesmas. 6.2 Métodos Geofísicos Os métodos geofísicos são utilizados para medir as propriedades físicas dos materiais em subsuperfície. Esse estudo é cada vez mais essencial para compreensão da subsuperfície do planeta, pois o mesmo faz uso de técnicas indiretas de investigação para prover observações sobre a subsuperfície através de medições realizadas em superfície. Essas observações são por meio da aquisição e interpretação de dados que permitem avaliar as condições geológicas locais por meio dos contrastes entre os materiais do meio e as propriedades físicas do alvo como: densidade, elasticidade, suscetibilidade, condutividade e resistividade elétrica, magnetismo e radioatividade (MILSOM & ERIKSEN, 2011). A geofísica aplicada a pesquisa de águas subterrâneas permite determinar áreas potencialmente favoráveis à captação, a escolha do método geofísico deve ser feita através da comparação dos custos, eficiência, profundidade de alcance e do objetivo proposto. Devido ao fato dos estudos de captação de água subterrânea geralmente serem desenvolvidos em pequenas áreas, há uma preferência pelo uso dos métodos elétricos, pois possuem uma maior precisão 35 para identificação de áreas favoráveis. Os métodos elétricos, como da eletrorresistividade, e eletromagnéticos, são usualmente adotados, pois satisfazem a condição básica para identificação de um aquífero, que é a presença de contraste, por exemplo, conseguem delimitar as zonas saturadas em água, vertical e horizontalmente (GIAMPÁ & GONÇALES, 2006; KEAREY et al., 2002). Os métodos eletromagnéticos são amplamente utilizados como ferramenta de prospecção de água em locais que apresentam potencialidade hídrica em aquíferos fissurais. Os métodos eletromagnéticos envolvem a propagação de campos eletromagnéticos de baixa frequência é baseada nos fenômenos físicos de eletricidade e magnetismo. O equipamento utilizado neste método é composto de duas bobinas, uma denominada transmissora e outra receptora. A bobina transmissora emite um campo magnético primário Hp, que induz, em subsuperfície, correntes elétricas, que geram um campo secundário Hs. A combinação destes dois campos é medida pela receptora. O equipamento é construído de forma a medir os campos magnéticos primário e secundário e utilizá-los de forma a permitir a leitura direta da condutividade do terreno (MUSSETT & KHAN, 2000). A eletrorresistividade é baseada na introdução de corrente elétrica de baixa frequência no solo, e no uso de equipamentos de alta sensibilidade para medição dos parâmetros associados ao fluxo de corrente, como a resistividade elétrica. A resistividade elétrica das rochas geralmente depende da quantidade de água subterrânea presente, dos minerais que as compõem e da quantidade de sais dissolvidos nela. (MUSSETT & KHAN,2000). Fraturas são estruturas favoráveis para locação de poços tabulares profundos, este fato ocorre, pois, a presença de fraturas facilita a infiltração de águas pelo maciço rochoso, desta forma o alterando e proporcionando uma redução nos valores de resistividade originais da rocha sã. Áreas fraturadas nos maciços rochosos cristalinos são zonas de baixa resistividades. O uso da eletrorresistividade em terrenos de rochas cristalinas fraturadas tem como objetivo a identificação de estruturas com potencial para armazenamento de águas subterrâneas. 6.2.1 Eletrorresistividade O método da eletrorresistividade é usado, sobretudo em estudos de águas subterrâneas. Segundo Kearey et al. (2002) este método é pautado na medida da intensidade de uma das propriedades físicas presente no material, a resistividade elétrica. Toda matéria é formada por moléculas, e está por sua vez são compostas por átomos. De modo geral os átomos possuem um núcleo carregado com cargas elétricas positivas e neutras 36 envolto por uma nuvem composta por cargas elétricas negativas. Essas cargas elétricas negativas são os elétrons, as cargas neutras são conhecidas como nêutrons e as cargas positivas são os prótons, na maioria das vezes essas cargas equilibram-se para dar uma neutralidade elétrica aos materiais, apenas quando há um desequilíbrio entre as mesmas o material passa a ter propriedades elétricas como carga elétrica. A eletrorresistividade busca medir o fluxo das cargas negativas através da determinação da resistividade elétrica do material. As cargas elétricas eletrizadas fluem no material dentro de um circuito elétrico, o fluxo é chamado de corrente elétrica. A corrente elétrica então nada mais é do que o fluxo ordenado de partículas portadoras de carga elétrica negativas quando existe uma diferença de potencial elétrico entre as extremidades de um corpo, chamado de condutor. A intensidade da corrente elétrica é medida em Amperes (A) e por convenção flui do pólo positivo para o pólo negativo. A diferença de potencial elétrico necessária para a existência da corrente é medida em Volts (V), (Figura 11). As cargas fluem, pois buscam restabelecer o equilíbrio desfeito pela ação de um campo elétrico ou outros meios. O método da eletrorresistividade introduz no solo correntes elétricas que desfazem esse equilíbrio vigente (MUSSET & KHAN, 2000). Figura 11: Esquema representativo da corrente elétrica. Fonte: Musset & Khan,2000. Segundo a Primeira Lei de Ohm a relação entre a intensidade da corrente elétrica (I) e a diferença de potencial elétrico (V) oferece o valor da resistência (R) que é medida em Ohms (Ω), segundo a equação 1.0: (MUSSET & KHAN,2000). R = V/I A resistência designa a capacidade de um condutor em se opor a passagem da corrente elétrica, e seu valor varia segundo as propriedades do corpo e sua forma. Um fio de cobre possui uma menor resistência do que um fio de chumbo com as mesmas dimensões, enquanto ao 37 pegarmos dois fios feitos do mesmo material, um fio longo e fino terá uma resistência maior do que um grosso e curto, assim cada condutor possui uma resistividade especifica. A resistividade (ρ) de cada condutor é estabelecida pela Segunda Lei de Ohm. Nela é considerado o comprimento (L), resistência (R) e área de seção transversal (A) de um condutor cilíndrico para obter o valor de resistividade em Ohm-metro (Ω.m) (Figura 12). Equação 2.0 : (EVERETT,2013). ρ = RA / L Figura 12: Esquema das dimensões que influenciam a resistência. Fonte: Musset & Khan,2000. O método da eletrorresistividade determina a resistividade (ρ) de corpos em subsuperfície, e as correntes elétricas tendem a fluir mais facilmente em corpos com menores valores de resistividade (EVERETT,2013). As resistividades da maioria dos tipos de rochas têm uma ampla faixa, o que dificulta a identificação de uma litologia através de sua resistividade medida (MUSSET & KHAN,200). A maioria dos minerais que formam rochas, como quartzo, feldspato, mica e olivina, são bons isolantes, mas as rochas têm poros e rachaduras que geralmente contêm água em suas superfícies ou as preenchendo. A resistividade da rocha depende principalmente de sua porosidade e da saturação dos poros com a água. A resistividade da água varia, pois, a água pura é um bom isolante, mas as águas presentes nas rochas contem sais dissolvidos geralmente derivados do intemperismo, e por isso apresentam resistividade mensurável variável (MUSSET & KHAN,2000). Os sais em água dissociam-se em íons positivos e negativos. O principal sal presente nas águas subterrâneas, é o cloreto de sódio, nesse sal é comum ocorrer dissociação do mesmo em íons de sódio, Na + e íons cloreto, Cl -, e estes movem na água em direções opostas gerando assim uma corrente. Essa dissolução é chamada de condução iônica e difere da condução 38 eletrônica, em que a corrente é devida apenas aos elétrons; condução eletrônica ocorre associada a metais e alguns minérios (Figura 13) (MUSSET & KHAN,2000). Figura 13: (A) Condução Iônica nas rochas. (B) Condução eletrônica. Fonte: Musset & Khan,2000. Em muitas rochas, a resistividade é aproximadamente igual à resistividade dos fluidos de poros dividida pela porosidade fracionária. Uma aproximação é fornecida pela Lei de Archie, que foi deduzida empiricamente como a equação 3.0: ρ = a.ρw/Pm Onde ρ é a resistividade em massa de um meio poroso saturado, P é a porosidade fracionária, ρw é a resistividade do fluido poroso, e m e a são quantidades empíricas determinadas pela geometria dos poros. O parâmetro m varia entre cerca de 1,2 e 1,8, de acordo com a forma dos grãos da matriz. (MILSOM & ERIKSEN, 2011). Para medir essa resistividade do meio da superfície o método da eletrorresistividade funciona introduzindo no solo correntes e medindo a tensão por meio de um par de eletrodos de potencial metais enfiados no chão, a corrente flui de um eletrodo para o outro (Figura 14). A corrente adentra e espalha no subsolo, indo tanto para baixo quanto para os lados, embora tenha uma concentração mais alta perto da superfície e dos eletrodos. Em terra uniforme, apenas cerca de 30% da corrente penetra abaixo de uma profundidade igual a separação dos eletrodos de corrente. A passagem da corrente elétrica pelo solo gera uma acumulação de ìons no entorno do eletrodo que pode afetar as leituras feitas pelo equipamento. Devido a este fato é necessário injetar uma corrente alternada que gera a dispersão desses ìons acumulados invertendo o fluxo de corrente algumas vezes por segundo (MUSSET & KHAN, 2000). 39 Figura 14: Esquema da corrente fluindo de um eletrodo para o outro. Fonte: Modificado de Musset & Khan,2000. Esses eletrodos A e B são conectados aos terminais de uma fonte, como uma bateria, responsável por gerar a corrente elétrica inserida no solo. A diferença de potencial (DDP) gerada é medida por outros pares de eletrodos de potencial (M e N) colocados na área do campo elétrico gerado pela passada da corrente no solo. Um único equipamento consegue fazer as leituras da intensidade da corrente (I) e da DDP (V), assim as medidas de resistividade são obtidas através da relação V/I estabelecida pela Lei de Ohm. (Figura 15). Esse equipamento necessita ter internamente um voltímetro de alta impedância, pois assim irá mal consumir corrente (MUSSET & KHAN, 2000). Figura 15: Arranjo linear esquemático de medição da resistividade. Fonte: Modificado de Musset & Khan,2000. A resistividade medida é conhecida como resistividade aparente (ρa), ela trata de uma média ponderada entre as resistividades verdadeiras medidas no meio geológico. Seu valor depende da relação V/I e do fator geométrico K relacionada ao tipo de arranjo e ao espaçamento 40 dos eletrodos. O espaçamento entre os eletrodos é diretamente proporcional a profundidade de investigação, e a resistividade aparente muda a medida que o arranjo dos eletrodos é expandido (MILSOM & ERIKSEN, 2011). Sua equação 4.0 é: ρa = K(V/I) Mostrados os parâmetros do método da eletrorresistividade, é necessário escolher a técnica de investigação mais adequada a ser utilizada. Essa escolha depende de dois fatores determinantes: características geológicas e objetivos da investigação. Os dois procedimentos principais que são empregados em levantamentos de resistividade, apresentando como diferença básica a disposição dos eletrodos na superfície do terreno, são: a sondagem elétrica vertical (SEV) e a tomografia elétrica (ERT). A sondagem elétrica vertical (SEV) investiga como a resistividade varia com a profundidade, assumindo camadas sem variação lateral apenas com estratificação horizontal. Aplicados quando é desejado uma informação pontual, observação da variação vertical de resistividade. (ORELLANA, 1972) A tomografia elétrica (ERT) é aplicada quando o alvo de interesse é o estudo da variação lateral da resistividade, e o alvo precisa possuir uma profundidade teoricamente constante. É realizado através do deslocamento do conjunto de eletrodos ao longo de uma ou mais linhas. (ORELLANA, 1972) Tanto no SEV quanto no ERT existe uma grande variedade de configurações de arranjos possíveis de eletrodos o que confere ao método grande versatilidade. Todavia em ambos os dispositivos para medidas de resistividade consistem de um sistema de quatro eletrodos, dois deles são usados para enviar uma corrente elétrica (I) ao solo (eletrodos A e B), e os outros dois (eletrodos M e N) usados para medir a diferença de potencial (∆V) entre eles. Devido ao fato da investigação do estudo em questão ser sobre fraturas capazes de serem reservatórios de águas subterrâneas foi escolhida a técnica da tomografia elétrica (ERT), pois a mesma é indicada para a investigação de camadas ou estruturas verticalizadas (diques, falhas e fraturas) que apresentam grande contraste de resistividade com as rochas encaixantes. Os arranjos dos eletrodos representam diversas formas de distribuição e movimentação dos eletrodos de corrente e potencial. O espaçamento dos eletrodos deve ser grande o suficiente para atingir a penetração no alvo, mas quanto maior o espaçamento, menor a resolução, tanto lateral quanto verticalmente, portanto, pode não ser possível detectar um corpo pequeno em profundidade (MUSSET & KHAN,2000). Arranjos diferentes dos eletrodos permitem que a resistividade aparente seja determinada em diferentes profundidades e posições laterais. Os mais utilizados são: Wenner, Dipolo-Dipolo e Schlumberger. 41 . Cada arranjo define um tipo de espaçamento, arranjo geométrico e movimentação durante a aquisição de dados entre os eletrodos. A escolha depende na facilidade operacional, resolução, profundidade de investigação e características do alvo. Algumas das características do alvo que influenciam na escolha é o tamanho, a profundidade e a resistividade do mesmo com seu entorno (MUSSET & KHAN, 2000). No estudo em questão de águas subterrâneas foi escolhido o arranjo Schlumberger No arranjo do tipo Schlumberger os eletrodos estão simetricamente posicionados em linha com o par de eletrodos de corrente (A e B) e o equipamento responsável pelo registro das medidas de resistividade obtidas. Os eletrodos de potencial (M e N) são colocados entre os de corrente (A e B) e distribuídos simetricamente em relação a um ponto central, a distância MN deve ser menor que a distância AB/2 (Figura 16). Apenas os eletrodos de corrente são movidos, os eletrodos potenciais ficam fixos. Dessa forma é um arranjo quadripolar, simétrico e linear (MUSSET & KHAN, 2000). Figura 16: Arranjo Schlumberger. Fonte: Modificado de Kearey et al. (2002). As leituras neste tipo de arranjo estão menos sujeitas às variações laterais do parâmetro físico medido, irregularidades do terreno e ruídos produzidos por fontes artificiais. Dessa maneira, os resultados apresentam maior precisão, resultando numa interpretação mais próxima da realidade (MUSSET & KHAN, 2000). 6.3. Aquisição e processamento de dados No campo, a primeira etapa de aquisição de dados foi constituída de um reconhecimento geológico preliminar, constando da identificação de exposições rochosas. Essa análise estrutural realizada em afloramentos de granitos encontrados nas proximidades da área de estudos foi de suma importância para definição as principais famílias de fraturas. Na rodovia 42 BR-392, que dá acesso à área, possui exposições de granito porfirítico leucocrático pouco intemperizados com grande quantidade de fraturas verticais. As estruturas, encontradas na beira da rodovia, são de fácil identificação de alto e médio ângulo de mergulho (45º a 90º) e com uma orientação predominante entre N270º e N280º (Figura 17). No local de estudo o granito é encontrado com graus variáveis de alteração e fraturamento, muitas vezes estando recobertos por litossolo arenoso fraturado (Figura 18). Figura 17: Afloramentos de granitos na beira da rodovia. A) Fraturas de médio ângulo de mergulho; B) Fraturas verticais. Fonte: Acervo de César Moreira. Figura 18: Litossolo arenoso fraturado. Fonte: Acervo pessoal. Após a retirada de medidas da maior quantidade possível de atitudes estruturais nos afloramentos das proximidades da área de estudo, foram realizados os ensaios geofísicos. A análise das medidas estruturais regionais e medidas em campo combinadas com a acessibilidade local foram os fatores determinantes para definir a quantidade e orientação das linhas dos ensaios geofísicos. 43 A aquisição dos dados geofísicos foi obtida por meio de leituras de resistividade elétrica com aplicação da técnica da Tomografia Elétrica de Resistividade (ETR) em arranjo Schlumberger. Foram programadas 4 linhas de investigação com comprimento de 420m cada uma e espaçamento entre eletrodos de 10m (Figura 19), dispostas paralelamente a uma distância de 60m a 80m entre si e orientadas na direção N282º, de maneira transversal às orientações das possíveis estruturas de fluxo de água subterrânea. Figura 19: Linhas de investigação. Fonte: Modificado do Google Earth. O equipamento utilizado foi o resistivímetro Terrameter LS (Figura 20), fabricado pela ABEM Instument (Suécia), que consiste em um único módulo de transmissão e recepção de sinais automatizado a partir de programação prévia, com potência de 250 W, resolução de 1μV e corrente máxima de 2,5 A. Este equipamento possibilita a realização de ensaios de potencial espontâneo (SP), eletrorresistividade (ER) e polarização induzida (IP) por meio de ciclos periódicos de transmissão e recepção de sinais de corrente alternada de baixa frequência, procedimento que permite a filtragem de ruídos durante a aquisição, cálculo automático da 44 resistência de contato e do desvio padrão do conjunto de medidas (ABEM, 2006). Eletrodos de metal foram utilizados durante esta etapa. Figura 20: Equipamento a direita usado para coleta de dados em campo. Fonte: Acervo pessoal. Os dados obtidos em campo foram processados e resultaram em modelos de inversão de seções de resistividade em termos de distância x profundidade, com ajuste topográfico realizado, escala gráfica logarítmica e intervalos de interpolação de valores em cores. Este programa calcula de forma interativa um modelo bidimensional de subsuperfície, a partir de dados de resistividade ou cargabilidade coletados durante a tomografia elétrica (GRIFFITHS & BARKER, 1993). Através de métodos matemáticos, a inversão procura obter um modelo de distribuição dos parâmetros medidos em subsuperfície semelhantes aos valores medidos em campo (FACHIN, 2007). O modelo 2D utilizado no programa divide a pseudo-seção em blocos retangulares, que serão suavizados pelo ajuste das medidas de campo, com a geração de modelos de inversão. O processo de inversão consiste na superposição de uma série de blocos retangulares, dispostos a partir da distribuição dos pontos dos dados na pseudo-seção, ou seja, seção obtida pelos dados de campo em profundidade teórica. (EDWARDS, 1997). Esta otimização procura reduzir a diferença entre os valores de resistividade aparente, calculados e medidos em campo, pelo ajuste da resistividade do modelo de blocos, cuja diferença é expressa pelo erro RMS (Root Mean Squared) e seu produto é representado sob forma de modelos de inversão (LOKE & BARKER, 1996). 45 Assim, as seções modeladas são resultantes de um processo automático de inversão 2D que buscam estabelecer um modelo que se ajusta a uma possível distribuição real dos valores de resistividade em subsuperfície. As eventuais distorções nas pseudo-seções inerentes aos arranjos de eletrodos são, teoricamente eliminadas pelos processos de inversão. Após essa inversão 2D o produto numérico dos dados de cada seção foi reunido em planilha única, que junta a posição das leituras ao longo das linhas (variável “x”), espaçamento entre linhas (variável “y”), profundidade modelada pela inversão (variável “z”) e o valor de resistividade elétrica (variável “R”). Esta planilha foi então exportada no formato xyz para geração dos modelos 3D de visualização. Através dessa planilha foi possível a geração de modelos 3D após a realização de etapas básicas adotadas muitas vezes em pesquisa mineral. O programa utilizado foi o Oasis Montaj Geosoft que fez a combinação e interpolação dos modelos 2D de inversão para gerar modelos 3D. Neste caso, o plano de amostragem é frequentemente definido a partir de critérios estatísticos, estruturais, litológicos, disposição espacial de uma acumulação mineral, entre outros (MOON et al., 2006). Um procedimento simples consiste em amostragens por um conjunto de furos perpendicular ao eixo principal da estrutura, sucedido por um conjunto paralelo de linhas de furo. A resolução da malha de amostragem é condicionada ao espaçamento entre: os furos, as linhas de furos e a quantidade de amostras coletadas por furo. Dessa forma, o resultado analítico das amostras é tabelado e modelado bidimensionalmente e posteriormente interpolado tridimensionalmente. Cada ponto do modelo 3D resultante é transformado num bloco, com dimensões condicionadas a critérios estatísticos e da malha amostral, ao qual é atribuído um teor baseado em análises químicas e um valor médio de densidade relativa à rocha hospedeira (MOON et al., 2006). Modelos geofísicos de visualização 3D derivados de seções 2D, também conhecidos com modelos quase-3D ou pseudo-3D, proporcionam uma compreensão bastante ampla da complexidade de estruturas geológicas modelamento de litotipos ou depósitos minerais (CHAMBERS et al., 2006; AIZEBEOKHAI et al., 2011; MOREIRA et al., 2016; VIEIRA et al., 2016; CÔRTES et al., 2016; MOREIRA et al., 2018). 46 7. RESULTADOS E DISCUSSÃO O reconhecimento geológico preliminar feito em campo permitiu identificar as atitudes das principais famílias de fraturas. A rodovia BR-392, que dá acesso à área, apresenta algumas exposições de rochas pouco intemperizadas em afloramentos de corte de estrada, com estruturas facilmente identificáveis de alto e médio ângulo de mergulho (42º a 90º) e orientação predominante entre N270o e N280o (Figura 21). Figura 21: Contexto geológico, morfológico e estrutural da região de estudos. A) Principais unidades geológicas regionais. B) Fraturamento regional descrito a partir de feições estruturais reconhecidas em imagem de satélite. C) Roseta com medidas estruturais. Fonte: Acervo pessoal 47 Desta forma os modelos de inversão refletem uma geologia representada por granitos inalterados, níveis argilosos saturados e prováveis descontinuidades. Após análise dos lineamentos feita através das imagens de satélite as linhas de tomografia elétrica foram planeadas e adquiridas paralelamente com o objetivo de identificação de estruturas lineares com continuidade lateral. 7.1. Modelos de inversão 2D. As medidas de resistividade normalmente são apresentadas e interpoladas sob a forma de modelos de inversão que dão uma representação visual do comportamento das resistividades em subsuperfície, sob a forma de uma seção com distância na superfície, profundidade e variação do parâmetro físico da resistividade. Os modelos de inversão de resistividade são gerados a partir dos dados geofísicos de tomografia elétrica obtidos em campo, estes dados são apresentados em escala única e logarítmica de valores, pois dessa maneira é possível realizar uma análise comparativa entre as seções obtidas pelo processamento geofísico realizado. No estudo em questão os valores de resistividade extremamente elevados são atribuídos a escala logarítmica e a faixa de variação de valores está entre 11.3.m e 51851. m. O parâmetro RMS (desvio médio quadrático) é relativamente alto em todas as seções e isto pode ser atribuído a grande variação de valores ou extremos ao redor da média, sendo que valores elevados de resistividade estão associados ao granito inalterado e os baixos aos solos argilosos saturados ou zonas condutivas com possível presença de água. Esses modelos de inversão gerados possuem uma camada superficial de ampla variação de espessura e com valores inferiores a 100.m, todavia possui uma profundidade limitada entre 0m e 40m. A partir de 40m começa uma superfície que possivelmente reflete a interface de solo, saprolito e rocha alterada com fraturas, em contato basal com o embasamento granítico inalterado (Figura 22). Essa grande variação de espessura nas camadas superficiais reflete uma ação não homogênea dos processos intempéricos agindo sobre o granito inalterada. O intemperismo é possivelmente mais atuante as áreas com facilidade de infiltração de água de chuva em zonas com maior fraturamento e consequente hidratação dos minerais como feldspatos e micas formando porções mais alteradas dentro do maciço rochoso. Essas áreas possuem baixa resistividade, pois a água enriquece o meio em íons em solução e partículas em suspensão e assim ocorre a diminuição das resistividades nestes locais. Desta forma, os substratos com um 48 eletrólito rico em íons e material particulado permitirão que a corrente elétrica se propague com maior facilidade, resultando em anomalias de baixas resistividades. As áreas de maior resistência as ações intemperíca são zonas de rocha maciça ou com predomínio de quartzo na matriz ou em veios e que possuem grandes valores de resistividade. Figura 22: Modelos de inversão de resistividade elétrica, com topografia e realce de estruturas verticalizadas possivelmente relacionadas a fraturas no maciço rochoso. Fonte: Acervo pessoal 49 Existência de zonas restritas com valores inferiores a 40.m pode ser indicativo de locais de maior permeabilidade e acumulações no nível freático raso, em rochas enriquecidas em argilominerais. Os intervalos com valores superiores a 1000.m representam o granito inalterado e são predominantes em todas as seções, embora a seção 3 apresente média de valores entre 1000.m e 5000.m, a menor faixa de variação dentre o conjunto das seções. As demais seções apresentam valores de resistividade predominantes entre 1000.m e 20.000.m, com áreas limitadas com valores superiores a 50.000.m. Esta ampla variação de valores no intervalo de rocha inalterada pode ser relacionada feições estruturais que permitem ou restringem o acesso a água proveniente do aquífero livre, ou seja, são relacionadas a variações no teor de umidade. Os valores de resistividade superiores a 20.000.m são atribuídos a escala logarítmica adotada durante o processamento dos dados, que objetivou tornar evidente o contraste de valores e o realce de feições lineares, possivelmente relacionadas a estruturas de fluxo em rocha inalterada, como falhas e fraturas. A interpretação das seções foi de suma importância para notar que a orientação e inclinação das fraturas realçadas nas seções são condizentes com o padrão estrutural encontrado durante a fase de reconhecimento geológico preliminar na região de estudos. As seções mostraram que na maioria das vezes as fraturas estão contidas em zonas altamente resistivas, exceto na seção 3, e possivelmente apresentam conexão com os materiais superficiais de intemperismo e consequentemente com o aquífero livre. Neste sentido, existe uma elevada probabilidade de fluxo em sistema fraturado na área em estudos. Entretanto uma análise das posições das fraturas projetadas nas seções indica fraturas independentes e de pequena continuidade lateral, algo que a princípio revela um baixíssimo potencial aquífero no local. A conectividade e continuidade lateral das estruturas é fundamental para recarga e fornecimento intermitente em captação por poços profundos. Mesmo no caso da seção 3, com a menor média de valores de resistividade e consequentemente mais promissora a captação de água no sistema fraturado. Numa tentativa de possibilitar uma análise da continuidade lateral e eventual conectividade das fraturas reconhecidas nas seções 2D, foram elaborados modelos de visualização 3D a partir da interpolação lateral dos produtos de inversão 2D, com geração de mapas de resistividade para diversas profundidades 50 7.2. Modelo de inversão 3D A partir da interpolação dos dados dos modelos de inversão 2D foram gerados blocos de visualização 3D com a topografia local ajustada (Figura 23). A análise dos modelos pseudo 3D revela o predomínio lateral de valores de resistividade abaixo de 150.m no mapa de cota altimétrica de 395m, este resultado baixo de resistividade medido pode indicar a presença de umidade nas camadas mais superficiais do solo, advinda da infiltração no solo pouco espesso de água meteórica. Esse mapa possui predominância das cores azul que são referentes aos baixos valores de resistividade, geralmente baixos valores de resistividades são encontrados na área de estudo sobre solos rasos com evidência de acumulação de água aquífero livre em sistema poroso. Como já explicado a água enriquece o meio em íons em solução e partículas em suspensão e assim ocorre a diminuição das resistividades nestes locais. Os mapas de cotas altimétricas 385m e 375m possuem valores de resistividade entre 50.m e 3000.m, um grande intervalo de valores, porém predomina o intervalo entre 400.m e 2000.m representado pelas tonalidades esverdeadas. Esses mapas não possuem ainda evidencias de feições lineares como fraturas ou falhas, e este fato deve ocorrer devido à natureza dos seus materiais constituintes. As áreas com feições esverdeadas são as associadas ao nível saprolitico. Nesse nível saprolitico eventuais descontinuidades estruturais contidas no granito são atenuadas ou destruídas durante a ação de processos intempéricos, que resulta em materiais relativamente homogêneos. Esse nível saprolitico é caracterizado por graus variáveis de alteração e teores de umidade. Existe uma relação direta entre teor de umidade e grau de alteração, ou seja, quanto mais preservado for a rocha maior será a resistividade devido a escassez ou ausência de umidade. Entre as cotas 385m a 365m ocorre um aumento constante da resistividade com o aumento da profundidade, evidencia do predomínio de rocha com o aumento da profundidade, realçado pela cor vermelha, entre 5000.m a 40000.m. Abaixo da cota 355m predominam altos valores de resistividade, cruzados por feições lineares de menor resistividade atribuídas a 3 planos de fratura individuais e com orientações distintas, mas conectados numa junta de fraturas (N104°, N205° e N325°), feição estrutural mais evidente nos mapas entre 345m e 305m (Figura 23). 51 Figura 23: Modelo pseudo 3D linhas de tomografia elétrica e mapas de resistividade elétrica para diversas profundidades (em metros), com realce de estruturas lineares. Fonte: Acervo pessoal. 52 7.3 Integração geofísica e estrutural A análise conjunta entre modelos de inversão 2D e de visualização 3D (pseudo 3D) permitem algumas considerações. A padrão de resistividade abaixo de 4500.m predominante na seção 3, é essencialmente relacionado a orientação desta linha sobre a ao longo de uma fratura possivelmente saturada, que resultou num padrão relativamente homogêneo e distintos da média de valores da demais seções no horizonte granítico, ou seja, acima de 15000.m e abaixo da cota 355m A existência de fraturas num maciço granítico ou de fraturas individuais com baixa resistividade não torna promissor um determinado local para captação subterrânea. A conectividade lateral de sistemas de fraturas no interior do maciço rochoso e conexões com aquíferos livres são condicionantes fundamentais a recarga, armazenamento e transmissão de água em aquíferos fraturados. Mesmo diante da ausência de evidências locais em superfície, sistemas de fraturas relevantes ao fluxo subterrâneo no interior de um maciço rochoso podem ser expressos em superfície numa escala regional, ou seja, um sistema de fraturas que controla o fluxo subterrâneo no interior de um maciço pode condicionar a rede de drenagem na superfície. Neste sentido, a análise regional de orientações de drenagens a partir do sistema de juntas descrito no modelamento geofísico 3D possibilitou o reconhecimento de sistemas estruturais análogos em superfície, responsáveis pela orientação de nascentes e sistemas de drenagem na região de estudos (Figura 24). Figura 24: Orientação de rede de drenagem em sistema estrutural análogo ao reconhecido em modelamento geofísico, destaque de ponto de maior favorabilidade a perfuração de poço. Fonte: Acervo pessoal. 53 8. CONCLUSÃO O amplo uso do método da Eletrorresistividade em estudos de aquíferos fraturados reside no grande contraste de resistividade elétrica entre zonas de fraturas saturadas e rochas cristalinas íntegras e secas. A técnica de Tomografia Elétrica de Resistividade (ETR) possibilita obter a variação lateral de resistividade no meio geológico ao longo de uma linha, sendo capaz de utilizar diversas formas de se distribuir e movimentar os eletrodos em campo. A técnica é particularmente relevante no reconhecimento de descontinuidades estruturais lineares que podem servir potencialmente como caminhos de fluxo subterrâneo. Contudo, este trabalho revela um caso em que a estruturas verticalizadas reconhecidas em modelos de inversão 2D, relacionado a fraturas descritas em exposições rochosas, a princípio seriam pouco favoráveis em termos hidrogeológico, devido a aparente ausência de conectividade lateral e consequente baixa transmissividade. A limitação no reconhecimento lateral de sistemas estruturais a partir de seções 2D foi superada pela interpolação e elaboração de mapas de resistividade elétrica para diversas profundidade, a partir de modelos pseudo 3D. A conectividade tridimensional do sistema é claramente expressa abaixo dos 40m de profundidade, onde ocorrem três lineamentos de baixa resistividade (em torno de 500.m) em contraste com valores dominantes (acima de 15000.m), relacionados respectivamente a fraturas saturadas e ao granito maciço inalterado, cujo cruzamento define um sistema de junta estrutural. Feições estruturais semelhantes são visíveis na rede de drenagem próxima a área de estudos e constitui conjuntos de nascentes, analogia que reflete um forte indicativo do potencial de produção aquífera do sistema estrutural reconhecido em profundidade. A junção de fraturas verticais a partir de 40m de profundidade configura o local de maior favorabilidade a perfuração de poço, principalmente diante da possibilidade de recarga por três sistemas de fluxo em fraturas distintas, a partir de um único ponto de captação. A baixa taxa de poços produtores na tentativa de captação subterrânea em maciços cristalinos pode ser aumentada de forma substancial, pelo uso integrado de procedimentos tradicionais de análise geomorfológica, como análises estruturais regionais e locais, aliados a procedimentos tecnológicos de investigação geológica, como ferramentas geofísicas, como mostrado no estudo em questão. 54 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABEM. Terrameter SAS 4000 / SAS 1000 - Instruction Manual, 136p., 2006. AIZEBEOKHAI, A P., OLAYINKA, A.I., SINGH, V.S.& UHUEGBU, C.C. 2011. Effectiveness of 3D geoelectrical resistivity imaging using parallel 2D profiles. International Journal of the Physical Sciences, 6: 5623-5647. ALMEIDA, F. F. M.; HASUÍ, Y. 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