1 Assinaturas tafonômicas de gastrópodes atuais do litoral de Rio de Janeiro e São Paulo: biodiversidade e implicações ambientais. MARIA CLARA DA SILVA PINTO SÃO VICENTE –SP 2017 2 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Júlio de Mesquita Filho” CAMPUS DO LITORAL PAULISTA Assinaturas tafonômicas de gastrópodes atuais do litoral de Rio de Janeiro e São Paulo: biodiversidade e implicações ambientais. MARIA CLARA DA SILVA PINTO ORIENTADOR: RENATO PIRANI GHILARD COORIENTADOR: FERNANDO ERTHAL Dissertação apresentada ao Campus Litoral Paulista, UNESP, para obtenção do título de Mestre no Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade Aquática. SÃO VICENTE – SP 2017 3 560.981 Pinto, Maria Clara da Silva P658 Assinaturas tafonômicas de gastrópodes atuais do litoral de Rio de Janeiro e São Paulo: biodiversidade e implicações ambientais / Maria Clara da Silva Pinto. - São Vicente, 2017 90 p.: il, figs., gráfs. Dissertação (Mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Campus do Litoral Paulista - Instituto de Biociências. Orientador: Renato Pirani Ghilard Co-orientador: Fernando Erthal 1. Paleoecologia. 2. Tafonomia. 3. Gastropodes. 4. Ecossistema costeiro - Brasil. I. Título. Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca da UNESP Campus do Litoral Paulista Maria da Conceição Gomes da Silva CRB-8 4863 4 5 6 AGRADECIMENTOS Gostaria de agradecer às diversas pessoas e instituições que contribuíram de alguma forma para a realização desta dissertação de mestrado. Agradeço ao Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade Aquática da UNESP de São Vicente por viabilizar o trabalho e meu crescimento acadêmico e pessoal; aos Professores Drs. Francisco Sekiguchi Buchmann e Luiz Eduardo Anelli pelas críticas e incentivo à melhoria da construção deste trabalho. Ao Prof. Dr. Renato Pirani Ghilard (Lapalma) pela orientação, pelas oportunidades e condições oferecidas para a realização desse projeto, por toda paciência, positividade, amizade, sugestões, incentivos, pelo caráter e pela fé. Obrigada de coração, Professor. Ao Lapalma (Unesp, Bauru, SP) e toda sua equipe, por proporcionar tão bons momentos e pelo uso de suas instalações durante a realização de pesquisas em tafonomia. Ao Fábio pela ajuda na elaboração dos mapas, ao Felipe e aos estagiários Fernanda, Suzane, Geovane, Yasmin e Bianca pela valiosa colaboração. Ao Professor Dr. Luiz Ricardo Lopes de Simone pela colaboração nas interpretações e correções taxonômicas. Ao Professor Dr. Fernando Erthal, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e à querida Profa. Dra. Sabrina Coelho Rodrigues, da Universidade Federal de Uberlândia por toda assessoria, dedicação, didática e incentivo para a melhoria desse trabalho. Ao Prof. Rogério Caetano da Costa e ao pessoal do Labcam (Unesp, Bauru, SP) pelo material biótico e abiótico, coletado em suas atividades de campo. Às secretárias Hana e Fabiana (CLP, Campus da Unesp de São Vicente) e às secretárias Letícia e Nicole (Departamento de Biologia da Unesp de Bauru) por toda ajuda, atenção e paciência nos momentos burocráticos. E à querida Conceição do CLP por toda a ajuda! Mas gostaria de agradecer, em especial, aos meus amigos, aos meus familiares, minha prima Flávia, minhas irmãs e meus pais, Maria Amélia e Gilberto. 7 Vocês não imaginam a gratidão que sinto aqui no peito. Agradeço por todo apoio, suporte, compreensão e por todo amor. Um agradecimento especial às minhas tias e madrinhas maravilhosas Ana Maria Terruel e Márcia Faria pelo incentivo imenso. Sem todos vocês esse trabalho não seria possível, pois pensei em desistir várias vezes devido ao indeferimento da bolsa FAPESP que, mesmo avaliando o projeto como excelente, me foi negada. Conciliar as jornadas de trabalho com a pesquisa e a busca pelo sustento é uma tarefa árdua demais para quem deseja aprender e fazer algo bem feito. Não é à toa que a taxa de pós-graduandos com depressão seja enorme, onde aproximadamente 89% dos estudantes apresentam sintomas de ansiedade, 64% de angústia, 63% de desânimo e 61% com dificuldades de concentração (http://www.anpg.org.br/estresse-e-depressao-na-pos-graduacao-uma- realidade-que-a-academia-insiste-em-nao-ver/). Confesso ter passado por isso tudo e digo que não foi fácil não. Por isso tudo, agradeço de coração a cada uma das pessoas que me ajudaram nessa empreitada e divido com elas o orgulho que sinto por tê-la concluído. http://www.anpg.org.br/estresse-e-depressao-na-pos-graduacao-uma-realidade-que-a-academia-insiste-em-nao-ver/ http://www.anpg.org.br/estresse-e-depressao-na-pos-graduacao-uma-realidade-que-a-academia-insiste-em-nao-ver/ 8 RESUMO Estudos actuopaleontológicos sobre os danos que o ambiente e outros organismos causam nas conchas de gastrópodes, tanto fósseis como atuais no Brasil, são incipientes e há pouca produção na área. Este trabalho estudou as frequências de cinco assinaturas tafonômicas, tais como abrasão, fragmentação, bioerosão, incrustação e dissolução observadas em 895 bioclastos coletados em três localidades da costa litorânea brasileira: Macaé-RJ, com sua linha de costa aberta, desprotegida e adjacente à área de ressurgência de Cabo Frio-RJ; Ubatuba-SP, com linha de costa recortada, caracterizada por pouca energia; e Cananéia-SP no extremo sul paulista, com sua linha de costa aberta e influência estuarina. As coletas bióticas a abióticas, realizadas em parceria com o LabCam (Unesp/Bauru), aconteceram mensalmente, de junho de 2013 a julho de 2014, com a utilização de barco camaroeiro e rede de arrasto em profundidades de 5 a 15 metros. A Olivancillaria urceus e a Buccinanops gradatus se destacaram pela quantidade entre as 16 espécies identificadas nas três localidades. Demarcaram-se padrões de assinaturas tafonômicas em dois diferentes grupos (subambientes), relacionados principalmente com a estabilidade da concha/sedimento. Esta estabilidade mostrou relação com a profundidade, recorte da costa e distância geográfica de ilhas, área de ressurgência e correntes. Esta observação permitirá estabelecer termos comparativos para o estudo de concentrações fossilíferas, melhorando o entendimento de sua gênese e contribuindo, assim, para o aprimoramento da interpretação paleoecológica. PALAVRAS-CHAVES: Tafonomia de gastrópodes. Assinaturas tafonômicas. Actuopaleontologia. 9 ABSTRACT Actuopaleontological studies on the damages that the environment and other organisms cause in the shells of gastropods (fossils and present), in Brazil, are incipient and there is little production in this area. The frequencies of five taphonomic signatures (abrasion, fragmentation, bioerosion, incrustation and dissolution) were observed in 895 bioclasts collected at three points of the Brazilian coastal coast: Macaé-RJ with its coastline open, unprotected and adjacent to the Cabo Frio-RJ resurgence area; Ubatuba with a shortened coastline, thus, with low energy characteristics; and Cananéia-SP in the south of São Paulo State, with an open coastline and estuarine influence. Collecting biotic and abiotic material was conducted in partnership with LabCam (Unesp/Bauru ) once in a month from June 2013 to July 2014, with the use of shrimp and trawls at depths of 5 to 15 meters. Olivancillaria urceus and Buccinanops gradatus were most frequent among the 16 species identified in the three localities. Taphonomic signatures and pattern were established in two different groups (sub-environment), related mainly to shell stability, which in turn were related to depth and shape of the coast, distance to islands, upwelling areas and sea currents. The results obtained will allow us to establish comparisons with fossiliferous concentrations and have a better understanding of their genesis, that is, to contribute to a better paleoecological interpretation. Key-words: Taphonomy of gastropods. Taphonomic signatures. Actuopaleontology. http://scholar.google.com.br/scholar?q=Taphonomy+of+gastropods&hl=pt-BR&as_sdt=0&as_vis=1&oi=scholart&sa=X&ved=0ahUKEwi36vCd3_DWAhXMGJAKHU6IB6wQgQMIJTAA 10 LISTA DE SIGLAS ACAS: Águas Centrais do Atlântico Sul FAPESP: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo GPS: Global Positioning System ISA: Interface Sedimento-Água LAPALMA: Laboratório de Paleontologia de Macroinvertebrados LABCAM: Laboratório de Camarões de Água doce e Marinho SRTM: Shuttle Radar Topography Mission UPGMA: Unweighted Pair Group Method using Arithmetic averages ZTA: Zona Tafonomicamente Ativa LISTA DE FIGURAS Figura 1. Diagrama com as relações entre os fatores ambientais, a estrutura espacial e a variação tafonômica............................................................................................14 Figura 2. Esquema de divisões de uma praia arenosa.............................................18 Figura 3. Esquema de distribuição da macrofauna bentônica x energia..................23 Figura 4. Localização aproximada dos pontos de coleta nas três localidades.........32 Figura 5. Topografia digital das três localidades.......................................................33 Figura 6. Localização aproximada dos pontos de coleta de Macaé..........................33 Figura 7. Carta batimétrica da área de Macaé..........................................................34 Figura 8. Topografia digital de Macaé........................................................................35 Figura 9. Localização aproximada dos pontos de coleta da Baia de Ubatuba..........36 Figura 10. Carta batimétrica da área de Ubatuba.....................................................37 Figura 11. Topografia digital de Ubatuba...................................................................38 Figura 12. Distribuição do diâmetro médio dos grãos e matéria orgânica dos sedimentos de Ubatuba.............................................................................................39 Figura 13. Localização aproximada dos pontos de coleta de Cananéia...................40 Figura 14. Carta batimétrica da área de Cananéia....................................................41 Figura 15. Topografia digital de Cananéia..................................................................42 11 Figura 16. Escala de cor demonstrando os fluxos de maré do complexo estuarino Cananéia-Iguape........................................................................................................43 Figura 17. As médias de temperatura em °C e salinidade, durante o período estudado, de Macaé, Ubatuba e Cananéia................................................................51 Figura 18. Fotografias das 16 espécies encontradas nas coletas.............................56 Figura 19. Frequências das assinaturas tafonômicas em cada região......................58 Figura 20. Frequência das assinaturas abrasão e fragmentação de Macaé.............59 Figura 21. Frequência das assinaturas abrasão e fragmentação de Ubatuba..........59 Figura 22. Frequência das assinaturas abrasão e fragmentação de Cananéia........60 Figura 23. Frequências das assinaturas incrustação e bioerosão de Macaé............62 Figura 24. Frequências das assinaturas incrustação e bioerosão de Ubatuba.........64 Figura 25. Frequências das assinaturas incrustação e bioerosão de Cananéia.......66 Figura 26. Frequências das assinaturas tafonômicas usadas neste estudo nas estações de coleta de Cananéia................................................................................69 Figura 27. Frequências da assinatura de origem química (dissolução) nas três regiões de coleta (Macaé, Ubatuba e Cananéia).......................................................69 Figura 28. Dendograma separando os pontos por similaridade das características tafonômicas................................................................................................................70 LISTA DE QUADROS Quadro 1. Metodologia usada na identificação das assinaturas tafonômicas...........47 Quadro 2. Metodologia usada na identificação das assinaturas tafonômicas...........48 Quadro 3. Metodologia usada na identificação das assinaturas tafonômicas...........49 Quadro 4. Quadro taxonômico (divisões e subdivisões das espécies amostradas)..54 Quadro 5. Espécies e as quantidades encontradas nos momentos da coleta em seus respectivos pontos......................................................................................................55 12 SUMÁRIO I. Agradecimentos...................................................................................................06 II. Resumo................................................................................................................08 III. Abstract................................................................................................................09 IV. Lista de siglas......................................................................................................10 V. Lista de figuras.....................................................................................................10 VI. Lista de quadros...................................................................................................11 1. Introdução ............................................................................................................. 13 1.1 Fundamentação Teórica. ................................................................................. 15 1.1.1 Costa sudeste. .......................................................................................... 15 1.1.2 A energia do meio...................................................................................... 16 1.1.3 Sedimento ................................................................................................. 20 1.1.4 Biologia ..................................................................................................... 22 1.1.5 Tafonomia .................................................................................................. 24 1.2 Justificativa ...................................................................................................... 29 2. Objetivos ............................................................................................................... 30 3.1 Caracterização da área de estudo ................................................................... 31 3.1.1 Macaé ....................................................................................................... 33 3.1.2 Ubatuba ..................................................................................................... 36 3.1.3 Cananéia ................................................................................................... 40 3.2 Amostragens do material biológico .................................................................. 43 3.3. Amostragens dos fatores ambientais .............................................................. 44 3.4. Amostragens das assinaturas tafonômicas ..................................................... 45 4. Resultados e discussão... ...................................................................................... 47 4.1. Variáveis abióticas .......................................................................................... 50 4.2. Biologia...... ..................................................................................................... 52 4.3. Análise tafonômica básica .............................................................................. 56 5. Conclusões ............................................................................................................ 71 6. Referências bibliográficas ..................................................................................... 74 Anexos: ..................................................................................................................... 81 13 1. INTRODUÇÃO Este trabalho apresenta um estudo comparativo entre cinco assinaturas tafonômicas em conchas de gastrópodes de três localidades diferentes da costa sudeste brasileira, especificamente, Macaé (RJ), Ubatuba e Cananéia (SP), visando contribuir para a melhoria das interpretações paleoambientais e paleoecológicas em novas pesquisas da área. Tafonomia é o estudo de o quanto a fossilização afeta a quantidade e qualidade da informação biológica presente nos restos bioclásticos. Um dos seus grandes objetivos é quantificar a influência do ambiente sobre o grau de destruição dos respectivos restos fósseis. Por isso, inclusive, a tafonomia é um dos principais aspectos quantitativos da paleontologia e, portanto, tem valor fundamental em análises paleoecológicas (Erthal, 2012). As informações ambientais que são obtidas com base no contexto geológico (sedimentar) podem ser bastante reveladoras. Contudo, a quantificação mais aproximada possível da relação entre o ambiente e a tafonomia só pode ser realizada com o estudo de restos biológicos em acumulações modernas (Erthal, 2012). A actuopaleontologia é uma vertente da paleontologia que supre essa demanda e se caracteriza pelo estudo e compreensão das ocorrências geológicas do passado através de comparações atualísticas com materiais, padrões e fatores recentes. Tais estudos, principalmente na área tafonômica, trouxeram novos questionamentos metodológicos, com importantes implicações no uso dos dados, não apenas na geologia e paleontologia, mas também na ecologia e biologia (Kowalewski e Hoffmeister, 2003). Uma das principais ferramentas da actuopaleontologia são as chamadas assinaturas tafonômicas que são características específicas impressas nos bioclastos pela ação dos processos sedimentares. Assim, as assinaturas tafonômicas são as marcas das deteriorações associadas ao material biogênico coletado e são facilmente quantificáveis e observáveis em conchas, ossos etc. (Kowalewski e Hofmeister, 2003). As assinaturas tafonômicas são geralmente utilizadas para fazer correlações entre o ambiente e o perfil de dano tafonômico. Os padrões de bioerosão e incrustação, por exemplo, podem indicar ambientes 14 específicos, bem como limites de variação de temperatura, salinidade, aporte fluvial, taxas de sedimentação (Erthal et al., 2016) distância geográfica, profundidade,... (figura 1) (Legendre e Fortin, 1989). Figura 1. Mostrando um diagrama com as relações entre os fatores ambientais, a estrutura espacial e a variação tafonômica. Modificado de Legendre e Fortin (1989). O reconhecimento das assinaturas tafonômicas, portanto, torna-se útil para com o avanço da pesquisa actuopaleontológica e evidencia um fino vínculo da paleontologia com a geologia sedimentar (Kowalewski, 1999; Holz e Simões, 2002). Ademais, o tipo de dano tafonômico está relacionado à origem desse processo, que pode ser de origem física (e.g., fragmentação e abrasão), origem química (e.g., dissolução) e de origem biológica (e.g., bioerosão e incrustação) (Smith e Nelson, 2003). Dessa forma, a actuopaleontologia compreende qualificar e quantificar a transformação das concentrações de conchas recentes durante padrões temporais que poderão, potencialmente, transformá-las em concentrações fósseis (Brett e Baird, 1986). A melhor maneira de interpretar a paleobiologia e os paleoambientes e trazer assim, maior fidedignidade a essas interpretações é compreender melhor esses processos (Kowalewski, 1999). Um dos grupos de bioclastos mais utilizados em estudos actuopaleontológicos é o de conchas calcárias do filo dos moluscos que, quando presentes no ambiente, preservam-se resultando em potencial registro fossilífero. O filo dos moluscos tem um amplo registro estratigráfico que é útil aos estudos evolutivos por conservar uma 15 extensa cronologia evolutiva. Assim como nas pesquisas actuopaleontológicas com bioclastos de moluscos bivalves, que se destacam, pois abordam características morfo-anatômicas, fisiológicas e interações ecológicas deste grupo taxonômico (Brett e Baird, 1986). 1.1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA: 1.1.1 Costa sudeste: O litoral da região de Cabo Frio (RJ) até Cabo de Santa Marta, ao sul de Santa Catarina, é caracterizado pela presença de praias arenosas e pontais rochosos descontínuos. Estes costões rochosos da Serra do Mar delimitam as planícies costeiras que são constituídas por rochas de embasamento cristalino. Com largura variando entre 50 e 230 km, o litoral sudeste possui sedimentação predominante terrígena e com grande retrabalhamento dos sedimentos nas transgressões e regressões do mar. A maioria das drenagens não flui para o oceano e sim para o continente. Isto dá a esse litoral pouca influência de aporte fluvial. Sendo os maiores rios, dentro desta área, o Ribeira de Iguape e o Itajaí-Açú (Muehe, 1996). A morfogênese da costa sudeste deriva do período de ocorrência dos grandes falhamentos na região, responsáveis pela formação das principais escarpas de falhas do Planalto Atlântico, ocorridas entre o fim do Cretáceo e o Eoceno. A evolução geológica do litoral sudeste foi determinada pelo soerguimento da Serra do Mar relativo às reativações tectônicas do final do Cretáceo, gerando os grandes falhamentos exposto por Ab’Saber (1955), e às variações do nível do mar durante o Quaternário. Ambos os fenômenos influenciaram na geomorfologia do litoral e da sua plataforma adjacente em diferentes escalas temporais (Muehe, 1996). A plataforma continental limita-se desde a sua faixa mais rasa circundante ao continente, com formato de terraço ou tabuleiro, até o limite externo da plataforma, chamado de “quebra da plataforma”, região onde há uma intensa inclinação da mesma. Sua superfície é quase toda horizontal e com relevo que dificilmente ultrapassa a 20m de profundidade e a sua batimetria média de quebra é de 16 aproximadamente 130m. O relevo de seu fundo marinho é influenciado pelas ações hidrodinâmicas atuantes. Nos substratos arenosos são comuns marcas de ondulações, já nos fundos constituídos por lama as ondulações têm pequena amplitude e maior comprimento de onda (Coutinho et al., 2015). 1.1.2 A energia do meio: Em relação ao limite do perfil ativo da orla de uma praia, há uma classificação, um critério hidrodinâmico, ou seja, é a intensidade que uma praia está exposta às ondas de tempestade. Existem as praias protegidas da ação das ondas por cordões litorâneos, promontórios, quebra-mares, pontais, ilhas, molhes, outros obstáculos tanto naturais quanto artificiais, e desta maneira são caracterizadas como praias de baixa energia; e há as praias expostas, que são aquelas que não possuem essas barreiras de proteção, sendo caracterizadas como praias de alta energia (Calliari et al., 2003). Ondas Praias são locais onde há a acumulação do sedimento que é depositado pela ação das ondas. Além dos processos de ação das ondas, há a ação dos ventos, das marés, a influência de drenagens fluviais, características sedimentares, e o histórico geológico da região podem influenciar na formação e na dinâmica dos sistemas praiais (Muehe, 1996). As ondas são importantes para a dinâmica costeira. Seja movimentando o sedimento diretamente ou por meio das correntes. O vento é um dos principais agentes formadores dessas ondas. Nessas movimentações acontece a transferência da energia da atmosfera para o oceano, por meio de atrito entre o vento e a superfície do mar, até atingir a zona da costa, formando o processo de arrebentação e quebra que constituem a principal forma de dissipação de energia na costa. Assim, condicionando a morfologia e os processos costeiros (Komar, 1998). O início da zona de surfe é o ponto onde as ondas se quebram ou a profundidade de fechamento interno, este é o limite entre a face do litoral e a costa 17 afora, ou seja, o local onde a ação das ondas começa a remobilizar o sedimento (Hallermeir, 1981). O regime da zona de arrebentação, assim como o da zona de surfe, dependem do “clima” de ondas de águas profundas do local e, do grau de modificação que essas ondas sofrem (diminuição ou aumento) antes de atingir a quebra. O clima de ondas é o principal responsável pelo transporte de energia nos sentidos longitudinal e transversal à linha da costa. É a energia das ondas, a intensidade e a recorrência de tempestades que definem a dinâmica dos processos de erosão e acúmulo na interface entre continente e oceano. Baixos valores apontam baixa hidrodinâmica; valores altos, ao contrário, indicam praias com alta hidrodinâmica, ou seja, altamente suscetíveis a episódios de erosão-acreção (Muehe, 1996). São as ondas de tempestade, com alturas mais elevadas, as principais responsáveis pelas modificações morfológicas da praia. As características das ondas, como: o tamanho da pista, que é a distância sobre a água que o vento sopra, a altura, o período e a energia que são diretamente proporcionais à velocidade e a duração do vento que as originaram. Ou seja, quanto mais forte e por mais tempo o vento soprar, maiores serão as ondas originadas por ele (Komar, 1998). Quanto maior a intensidade e a duração do vento, tanto maiores serão as ondas dele resultantes. Assim, a maior movimentação do sedimento e a rapidez das correntes longitudinais são influenciadas pelo tamanho dessas ondas. A sua quebra na praia desencadeia correntes na costa, causando o transporte sedimentar na zona de surfe, ou de arrebentação. Estas correntes geradas pela quebra das ondas direcionam a movimentação desses sedimentos do ambiente praial e desenham a topografia costeira (Komar, 1998). As praias sujeitas a maior energia de onda, são chamadas de refletivas. São mais expostas, com inclinação elevada e são compostas de sedimentos mais grossos e cascalho e com ausência de silte. São intensamente oxigenadas devido a sua alta energia, porém com pouca diversidade biológica relacionada à baixa estabilidade do sedimento e da baixa concentração de nutrientes nos espaços intersticiais (Komar, 1998; Muehe, 1996). 18 Em contrapartida, há as praias chamadas de dissipativas, que possuem na face praial ondas com baixa energia, que se dissipam ao longo da extensa região de quebramento de ondas. São praias mais protegidas, de baixa drenagem e com pouca declividade (planas). Compostas de areia fina e grande abundância de animais que vivem enterrados ou sobre este sedimento, como moluscos e poliquetos (Komar, 1998; Muehe, 1996). E por fim, as praias intermediárias, que são pouco inclinadas, com areia fina a média e incluem todas as outras praias, entre os extremos dissipativos e refletivos. São praias identificadas pela presença de correntes de retorno (Komar, 1998; Muehe, 1996). Assim, observa-se a influência direta da dinâmica oceânica nas características morfológicas das praias. Independentemente de sua classificação, a praia divide-se de acordo com a figura 2: Figura 2. Esquema de divisões de uma praia arenosa. Adaptado de Muehe, 1996. A antepraia está dividida entre a Zona de Surfe e Zona de Arrebentação como a figura 2. Ela sofre a ação de ondas de águas rasas e é delimitada pela profundidade de fechamento interna (ondas de tempo bom), de 5 a 10m, e pela profundidade de fechamento externo (ondas de tempestade) que vai de 40 a 50m (Hoefel, 1998). O clima de ondas da costa brasileira é determinado, principalmente, pelos 19 ventos originados no Atlântico sul. Do litoral de Cabo Frio-RJ ao Chuí-RS, as ondas mais frequentes são desencadeadas pelos ventos alísios, ondas de nordeste, porém, para essa região do litoral, os ventos que formam as ondas que geram maior transporte sedimentar derivam dos sistemas frontais dos quadrantes sul e sudeste, com período de 10 a 16 s e altura de 1 a 4 metros em média. Exceto em eventos meteorológicos intensos, a ação das ondas sobre o fundo do mar está restrita a isóbata máxima de 50 m, estando à zona de surfe limitada as isóbatas de 5 a 6 m (Tessler e Goya, 2005). Marés e correntes As correntes de marés transportam, significativamente, os sedimentos nos locais onde a variação da maré é expressiva. A região sudeste brasileira está sujeita a um regime de micromarés com amplitude menor que 2 metros. Assim, a maré da região sudeste fica restrita às áreas próximas a desembocaduras, causando pouca interferência na plataforma continental (Tessler e Goya, 2005). Em regiões do litoral, características de correntes de fundo equivalem sempre à soma de um conjunto de fatores como ondas, correntes de origens diferentes, entre outros, dificultando a identificação da relevância de cada um desses fatores (Tessler e Goya, 2005). A costa paulista apresenta regime de micromarés do tipo semidiurno com desigualdades diurnas. Esse tipo de regime de maré exerce pouca influência como processo físico nas praias ou mudanças de correntes. Os canais de maré (inlets) são uma abertura na linha da costa que conecta corpos d’água do continente, como estuários e lagunas, com o oceano, por exemplo, as grandes desembocaduras fluviais. Esses canais exercem grande influência hidrodinâmica e morfológica ao local, pois neles ocorrem trocas de nutrientes, mistura de águas, organismos planctônicos, sedimentos e poluentes (Souza e Kjerve, 1997). As correntes de contorno que atuam na região sudeste são: a Corrente do Brasil (CB), originada ao sul, 10º S, e flui para o sudoeste pela borda da margem continental atlântica, onde transporta a Água Tropical, caracterizada como uma massa de água quente e salina, com temperatura > 20ºC e salinidade > 36; a Águas Centrais do Atlântico Sul (ACAS), com temperatura baixa (<18ºC) e alta salinidade > 20 35,5) (Mahiques et al., 1999; Miranda, 1985); e por último, a Água Costeira com temperaturas quentes (>20ºC) e baixa salinidade (<36) devido à diluição da água do mar pela água doce estuarina (Matsuura, 1986). O deslocamento das águas costeiras apresenta grande relevância para o transporte de terrígenos em suspensão para as porções mais profundas da plataforma (Mahiques et al., 1999). A Águas Centrais do Atlântico Sul (ACAS) com suas baixas temperaturas, salinidade alta e riqueza em nutrientes, é originada entre as latitudes de 25ºS e 45ºS, a partir da confluência das águas tropicais (corrente do Brasil) com águas subantárticas (corrente das Malvinas/Falkland). Sua intensidade e consequente influência variam em diferentes épocas do ano (Castro Filho et al., 1987). Ocorre na área de ressurgência de Cabo Frio, costa oeste do Oceano Atlântico, área com grande importância para o enriquecimento biológico. Os processos físicos, de forma geral, podem influenciar a produtividade primária, nas variações da disponibilidade de alimento e, com isso, perturbar o crescimento e a sobrevivência dos organismos. Esta ressurgência torna mais forte durante a primavera e o verão. Esta sazonalidade está relacionada com a penetração das ACAS na região costeira e nas proximidades dela (Franchito et al., 2008). A ACAS influência intensamente a região de Macaé, área próxima à ressurgência em Cabo Frio (RJ), diminuindo a temperatura, aumentando produtividade primária local e trazendo nutrientes à zona eufótica como P e N (Valentin, 1984). Já a influência da ACAS na região de Ubatuba, um pouco mais ao sul, é menor, porém ativa, e ocorre, em geral, na primavera e no verão, modificando as características ambientais como diminuição da temperatura e o aumento salinidade (Castro-Filho et al., 1987). 1.1.3 Sedimento: O efeito hidrodinâmico mais expressivo responsável pelos transportes sedimentares de fundo, tanto na região costeira como na plataforma adjacente, é o da ação das ondas (Furtado e Mahiques, 1990). 21 Na linha de praia quando a energia de arrebentação é alta há a suspensão e movimentação dos sedimentos finos, o que possibilita a areia de granulometria média, grossa e cascalho a se depositarem na praia e ante-praia. Em direção ao mar aberto a energia decresce e o tamanho do grão diminui, como a areia lamosa, lama arenosa e lama. Ou seja, há um decréscimo do tamanho do grão à medida que a profundidade aumenta. O movimento dos sedimentos arenosos em ambientes marinhos rasos é gerado, em especial, pela relação do sistema de ondas, correntes de origens diferentes e ventos locais (Oliveira e Muehe, 2013). As baías, as enseadas e os estuários do litoral norte de São Paulo até Cananéia, o estuário de Santos e o complexo estuarino-lagunar de Cananéia-Iguape são importantes detentores de grande parte dos sedimentos erodidos da Serra do Mar. Esta é tão próxima ao litoral nessas regiões que sofre constante e intenso intemperismo e erosão (Oliveira e Muehe, 2013). Um tipo determinado de sedimento é formado por partículas de tamanhos diferentes e que podem ter diferentes origens, como por exemplo: a litorânea, que é originada pela ação erosiva do mar sobre as suas formações geológicas da costa; terrígena, que são partículas do continente erodidas pelo vento, aportes de rios e por geleiras; e autóctones que são constituídas a partir de restos de animais e carapaças de organismos originadas no oceano (Soares-Gomes e Figueiredo, 2002). De acordo com o tamanho, forma e densidade do grão pode haver uma diferente taxa de sedimentação (Soares-Gomes e Figueiredo, 2002). Em um depósito sedimentar o tamanho médio das partículas contidas nele é proporcional à quantidade de energia exercida no momento da deposição. Ou seja, em condição de alta energia, há grande turbulência, onde os grãos finos são mantidos em suspensão e essa alta energia ressuspende as partículas que se depositam momentaneamente. Essa agitação de maneira constante no fundo separa os grãos menores e os remobiliza para águas mais calmas, que no geral, são mais profundas do que as águas mais turbulentas encontradas no raso. Dessa maneira, é a areia grossa, e não a areia média e a fina, que se deposita sobre condições mais energéticas. Já em ambientes de baixa energia, com correntes e águas calmas, não recebem material sedimentar mais grosso, pois suas correntes fracas não 22 conseguem transportar esse material para outros locais, acumulando-se apenas sedimentos mais finos, como a lama. Assim, de maneira geral, os sedimentos finos acumulam-se em condições de baixa energia, e sedimentos grossos acumulam-se sob alta energia (Soares-Gomes e Figueiredo, 2002). Para sedimentos não coesos e arenosos, quanto maior for a sua densidade e a profundidade do canal, maior será a velocidade crítica de transporte necessária para movê-lo. Ou seja, uma corrente de fundo muito variável, por exemplo, tem pouco tempo para a seleção dos grãos até que os mesmos sejam soterrados. Isso pode resultar em depósitos sedimentares mal selecionados e heterogêneos, assim como a mistura de areia e cascalho. Logo, quanto mais intenso e rápido for o transporte desses sedimentos, mais baixa é a seleção desses grãos, pois há uma grande variação de tamanhos na mesma acumulação, caracterizando-os, assim, como de uma alta taxa de sedimentação (Soares-Gomes e Figueiredo, 2002). Já uma baixa taxa de sedimentação oferece uma maior chance e tempo para a água selecionar os grãos de acordo com seu tamanho, forma e densidade. O que pode resultar em grãos bem selecionados em depósitos distintos de lama e de areia. Pois um sedimento bem selecionado é quando em cada um desses depósitos a variação do tamanho dos grãos é pequena e uniforme (Soares-Gomes e Figueiredo, 2002). Para os substratos com material coesivo, fundos argilosos, ou com sedimento mal selecionados devido a mistura dos grãos, em diferentes proporções, com sedimentos arenosos e pelíticos, a velocidade necessária para o início do transporte, muitas vezes, é mais alta do que as para remover os grãos constituídos por material mais homogêneo ou mais grosso (Soares-Gomes e Figueiredo, 2002). Quando o sedimento é composto predominantemente por lama há um aumento na dificuldade de enterramento dos bioclastos (Mantelatto e Christofoletti, 2001). 1.1.4 Biologia: Quanto mais rasas as batimetrias, mais facilmente o sedimento é removido pelo efeito do arrasto causado pelas ondas, caracterizando, assim, a profundidade 23 como uma variável controladora da perturbação/estabilidade do sedimento. Da mesma maneira, a profundidade também controla a estrutura populacional dos moluscos (Absalão, 1991). Os estudos em praias arenosas são incipientes, antes acreditavam-se que nesses ambientes havia pouca vida, pois seus organismos são predominantemente infaunais, ou seja, vivem enterrados nos sedimentos. Além disso, são pequenos e com coloração pouco exuberantes. Esses animais somente se desenterram em eventos de submersão para se alimentar e reproduzir, tornando difícil a sua visualização (Absalão, 1991). Figura 3. Esquema de distribuição da macrofauna bentônica em função da energia (Levinton, 1995). Em praias arenosas a macrofauna bentônica apresenta a sua distribuição em relação à energia atuante sobre o fundo. Como no esquema da figura 3, onde se relaciona a energia sendo inversamente proporcional à diversidade e a biomassa. Na zona de surfe a diversidade e biomassa são menores devido à alta energia do ambiente. Essa energia aumenta costa afora e diminui costa adentro. Quanto maior a energia mais próximo à zona de arrebentação, maior é a dificuldade da manutenção da macrofauna bentônica. Assim, as ondas são fonte de estresse e um 24 fator controlador, nas praias arenosas, da distribuição desses organismos (Absalão, 1991). 1.1.5 Tafonomia: Fatores abióticos: Há uma tendência das amostras que apresentam relação espacial positiva, ou seja, próximas geograficamente entre si, assim como em mesmas profundidades a apresentarem perfil tafonômico semelhante. Os fatores ambientais têm a possibilidade de apresentar uma estrutura espacial e/ou batimétrica. E essa estruturação pode depender do sedimento, da temperatura, da salinidade etc. A bioerosão é influenciada pela luminosidade, que depende da profundidade. Os danos de origem física são proporcionais à energia ambiental, quanto mais raso, maiores danos são esperados. Por isso os bioclastos de diferentes localidades diferem-se em relação aos seus danos tafonômicos (Erthal et al., 2016). Várias assinaturas tafonômicas mostram evidentes distinções entre as diferentes áreas, mas a temperatura não se mostrou um fator influente para isso (Erthal et al., 2016). Já a profundidade, em pequena escala, tem sido um fator ambientalmente importante para os danos tafonômicos em moluscos marinhos, diferente do que ampla escala. Para as assinaturas de origem biológica, como bioerosão e incrustação, os aspectos sedimentares são importantes na variação dessas para amplas escalas (Erthal et al., 2016). Nos ambientes mais salinos e com índices elevados de carbonato, há o aumento das frequências da bioerosão e fragmentação. Caracterizando a salinidade e o carbonato como fatores importantes para a preservação dos bioclastos de moluscos. O fator salinidade é um dos principais sobre a variação tafonômica em amostras de baixas latitudes. A salinidade pode refletir a influência da água doce, de origem fluvial (Erthal et al., 2016). De maneira geral, os processos dos danos químicos são diferentes de onde há condição ambiental para a ação dos agentes físicos (Rodrigues, 2006). Há na 25 literatura exemplificações de generalizações tafonômicas, e entre a comunidade científica da área, só aumenta a convicção em se tratando de Tafonomia cada caso é um caso (Holz e Simões, 2002; Rodrigues, 2006). As assinaturas tafonômicas em moluscos e outros tipos de bioclastos são desencadeados por processos sedimentares, químicos ou biológicos, como a energia do meio, a profundidade, as taxas de sedimentação, a produtividade primária, por aspectos químicos, e as taxas de bioerosão e incrustação (Behrensmeyer e Kidwell, 1985). Danos como fragmentação, dissolução e abrasão, associados à origem física, geralmente possuem como agente atuante a granulometria, a composição sedimentar e fatores sedimentares. A profundidade, a topografia, temperatura, salinidade e vários tipos de correnteza interferem na distribuição e na característica dos sedimentos (Erthal et al., 2016). As diferenças tafonômicas entre ambientes e entre aspectos sedimentares existem, pois cada ambiente, em teoria, possui um processo tafonômico distinto, como exemplo, um ambiente de baixa energia ter uma alta frequência de bioerosão e/ou incrustação, e nas conchas de ambientes mais energéticos há maiores frequências de abrasão (Parsons-Hubbard, 2005). A ZTA é um intervalo físico logo abaixo da interface sedimento-água (ISA) que é área entre a coluna d’água e o sedimento. Na ZTA ocorrem os processos de alteração dos restos biológicos. É um intervalo tafonomicamente dinâmico, agressivo e se relaciona a variáveis de complexa mensuração na natureza (Erthal et al., 2016). Em ambientes de baixa batimetria, com águas mais agitadas o retrabalhamento é intenso e a abrasão é mais frequente. Ali a bioerosão é menos frequente. A bioerosão também se caracteriza pelo tempo de exposição dos bioclastos na interface água/sedimento (ISA). Já nas conchas com dissolução os danos são mais frequentes quando elas estão incorporadas ao substrato. Nos ambientes de enseadas, caracterizados por possuir pouca energia, os danos de bioerosão são mais expressivos. Estes se forem amostrados em águas agitadas, por exemplo, possivelmente adquiririam esse dano anteriormente, em outro ambiente ou em épocas diferentes, caracterizando, assim, como uma mistura geográfica e mistura temporal respectivamente (Rodrigues et al., 2002). Desta forma, a 26 quantidade de tempo de exposição na interface água/sedimento (ISA) das conchas de moluscos com hábitos infaunais pode mostrar padrões de danos tafonômicos semelhantes aos observados para os de epifauna (Lazo, 2004). Contudo, não existe uma relação linear entre danos tafonômicos e a qualidade temporal das conchas. Assim, os bioclastos com grande intensidade de danos não são, obrigatoriamente, mais velhos que as conchas com poucos danos, ou seja, mais preservadas. Processos de origem física: Fragmentação Identificar a fragmentação pode ser considerada uma tarefa fácil, já interpretar a sua origem não é. Isso decorre do fato de sua origem poder ser tanto de processos ecológicos quanto tafonômicos, ou ainda de diversas combinações de processos. A fragmentação pode variar em relação ao tipo de ambiente. Em ambientes mais energéticos, com predomínio de ondas e correntes, a fragmentação pode ser o reflexo de distintos sistemas hidrodinâmicos. Pode ser um dano desencadeado por eventos meteorológicos, como tempestades, indicando o ambiente de deposição e não o seu ambiente de origem (Kowalewski et al., 1999). Abrasão A abrasão está relacionada à perda de relevo e também do brilho (lustre) original. Caracterizando-se como uma assinatura indicativa do tempo em que o bioclasto permaneceu exposto à zona de surfe. Lembrando que essa zona é onde a água e o sedimento são mais movimentados (Aguirre e Farinatti, 1999). As frequências da abrasão são proporcionais às altas taxas de sedimentação (sedimentos mais grossos) (Smith e Nelson, 2003). Processos de origem biológica: As assinaturas tafonômicos de origem biológica variam entre a alteração destrutiva (bioerosão) e processos construtivos (incrustação) (Smith e Nelson, 2003). As concentrações de amostras caracterizadas com bioerosão e incrustação são comumente encontradas em locais de baixa energia e/ou em águas com 27 maiores batimetrias e com baixa taxa de sedimentação. Já acúmulos amostrais encontrados em ambiente de alta energia, em águas rasas, alta taxa de sedimentação, caracterizam-se por altos índices de abrasão e fragmentação (Brett e Baird, 1986). Os principais organismos bioeroditores, como as esponjas, e os incrustantes, como os briozoários, são típicos de ambientes marinhos, o que não ocorre em ambientes lagunares, que consequentemente possuem baixas frequências de bioerosão e incrustação (Parsons-Hubbard, 2005). Bioerosão Organismos incrustantes e bioeroditores são encontrados mais comumente em ambientes marinhos com águas mais quentes, com maior luminosidade e com maior produtividade primária. São estimulados por nutrientes e crescem mais rápido em água mais produtiva e bioerodem mais material. Ou seja, a bioerosão é dependente direta da produtividade primária marinha. Quanto maior a produtividade marinha, maior a bioerosão. Além disso, as taxas de bioerosão também são controladas direta ou indiretamente pela taxa de soterramento (taxa de sedimentação) e profundidade da coluna d’água (Santos e Majoral, 2008). A produtividade marinha está relacionada à habilidade dos seres fotoautotróficos de realizarem fotossíntese, que é o processo com a capacidade de transformar a matéria inorgânica como a energia solar, o gás carbônico e a água em moléculas orgânicas ricas em energia. Como está ligada à luminosidade, à medida que a profundidade aumenta, há menor absorção de energia luminosa. Há uma profundidade na qual a taxa de fotossíntese se iguala a taxa respiratória que é chamada de profundidade de compensação. Essa profundidade varia ao redor da Terra, pois é dependente da luminosidade da água. Quanto mais clara a água, maior é a penetração luminosa e maior a profundidade de compensação. Geralmente, em águas costeiras com muitas partículas de matéria orgânica essa profundidade atinge águas mais rasas (Soares-Gomes e Figueiredo, 2002). Esta produção primária é sustentada por nutrientes trazidos para um ecossistema por sistemas de circulação da água, como a ressurgência (Soares- Gomes e Figueiredo, 2002). 28 Os organismos causadores da bioerosão podem ser algas, fungos, bivalves, poliquetos, gastrópodes, cirripédios e principalmente as esponjas (Cliona sp) (Young e Nelson, 1985). Em águas temperadas a bioerosão pode influenciar na fragmentação, no transporte e no retrabalhamento, facilitando assim a dissolução. A baixa frequência ou ausência da bioerosão pode ser desencadeada também pelo baixo tempo de exposição na ZTA (zona tipicamente ativa), isto é, a pouca ou nula exposição dos bioclastos na ISA, na interface água-sedimento (Young e Nelson, 1985). Incrustação A incrustação é a consequência da fixação de um organismo (epibionte) sobre outro organismo (hospedeiro). É um fenômeno bastante comum e esses organismos incrustantes, no ambiente marinho, também produzem carbonato. São representados, em sua maioria, por epibiontes suspensívoros ou filtradores, como foraminíferos, briozoários, cracas, moluscos sésseis e vermes. Os braquiópodes e as conchas de moluscos são exemplos mais comuns de hospedeiros vulneráveis à incrustação (Smith e Nelson 2003). O retrabalhamento sedimentar pode, esporadicamente, soterrar e reexpor as conchas na interface sedimento-água, assim, tanto a bioerosão quanto a incrustação podem ser de natureza episódica e intervalada. Além do que, a incrustação e a bioerosão não ocorrem abaixo desta interface sedimento-água (ISA) (Smith e Nelson 2003). Em águas ricas em nutrientes, tanto os agentes incrustantes quanto os bioerodidores, de maneira geral, são muito bem-sucedidos (Santos e Mayoral, 2008; Smith e Nelson, 2003). Processo de origem química: Dissolução Fatores relacionados à composição do sedimento de fundo e à química da água do mar, como um pH ácido e/ou a concentração de carbonato de cálcio podem influenciar na dissolução das conchas carbonáticas. Os fatores, temperatura e salinidade, também participam na modulação da solubilidade do material carbonático 29 (Alexanderson, 1979; Aller, 1982). A dissolução é o dano tafonômico mais importante em ambientes lagunares. Dessa maneira, é possível supor que em áreas marinhas próximas a áreas de estuários e desembocaduras de rios, potencialmente ocorra uma frequente dissolução. Ela é intensificada em função da presença da vegetação local e das raízes, onde há muita oxidação da matéria orgânica, da pluviosidade constante e da influência dulcícola. Pois nesses ambientes a acidez da água é aumentada devido à alta taxa de produção de CO2 produzida pela grande quantidade de organismos heterótrofos. Isto ocorre, pois há menor atividade fotossintética (Marshall et al., 2008). Quando há o desequilíbrio químico entre o carbonato de cálcio na água do mar e no esqueleto dos organismos marinhos isso resulta na dissolução desse material bioclástico. Esta assinatura é mais intensa quando a concha está próxima à interface sedimento-água (ISA), onde a água de poro, ou percolante (porewater) está insaturada em CaCO3 (Alexanderson, 1979). 1.2 JUSTIFICATIVA O litoral da costa sudeste brasileira mostra-se um excelente observatório de estudos actuopaleontológicos em virtude das suas diferentes morfologias costeiras. Para uma melhor interpretação dos processos de formação das concentrações de bioclastos em diferentes ambientes são fundamentais os estudos de dados comparativos desses distintos sublocais (Rodrigues, 2006; Rodrigues et al., 2009; Marcondes, 2013). Há estudos em actuopaleontologia com moluscos bivalves e braquiópodes marinhos realizados no litoral norte do estado de São Paulo (Rodrigues, 2006; Rodrigues et al., 2009) e no litoral paranaense (Marcondes, 2013). Contudo, há poucos trabalhos de cunho actuopaleontológicos com bioclastos de conchas de gastrópodes. A análise proposta aqui incrementa os estudos de tafonomia de moluscos existentes e contribui para um melhor conhecimento da distribuição das assinaturas tafonômicas em regiões distintas do litoral brasileiro. 30 2. OBJETIVOS 1) Identificar taxonomicamente as espécies dos diferentes pontos de coleta e relacioná-las, se possível, às particularidades de suas diferenças ambientais; 2) Analisar os possíveis fatores que causam a abundância e a riqueza dessas espécies nestes locais; 3) Realizar a descrição e comparação tafonômica de concentrações de gastrópodes (Mollusca) em três morfologias costeiras distintas; 4) Estabelecer uma padronização comparativa em relação as assinaturas tafonômicas, os seus possíveis danos e suas causas; 5) Reconhecer quais dessas assinaturas serão passíveis de utilização na identificação das variações ambientais e, desse modo, úteis nas análises comparativas paleoambientais e paleoecológicas. 31 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO As áreas foram demarcadas com GPS (Global Positioning System) Garmin Etrex 20, com uma margem de erro de aproximadamente 200m (tabela 1). Tabela 1. Coordenadas geográficas aproximadas dos pontos de coleta das três localidades. localidade pontos latitude longitude Macaé ponto 1 22°22'43" S 41°44’15" O ponto 2 22°20’57" S 41°43’38" O ponto 3 22°19’16" S 41°39’45" O ponto 4 22°25’13" S 41°44’19" O Ubatuba ponto 1 23°26’31" S 45°01’39" O ponto 2 23°25’37" S 45°01’21" O ponto 3 23°26’30" S 45°03’12" O ponto 4 23°26’10" S 45°02’07" O Cananéia ponto 1 25°04'57" S 47°50'08" O ponto 2 25°08'12" S 47°49'33" O ponto 3 25°06'39" S 47°53'02" O ponto 4 25°04'05" S 47°52'20" O Para cada região de estudo (figura 4), pontos diferentes foram analisados. As localizações das áreas e dos locais aproximados de coleta estão representadas na tabela 1, sendo os transectos delimitados de acordo com a batimetria em cada área de estudo que variaram de 5 a 15m e sempre paralelo à costa. 32 Figura 4. Localização aproximada dos pontos de coleta nas três localidades. Todas as topografias digitais das três localidades (figura 5, 8, 11 e 15) foram processadas no programa GlobalMapper a partir dos dados do SRTM - NASA (Shuttle Radar Topography Mission). Podemos observar nas topografias (na mesma escala) como a morfologia da costa de Ubatuba é diferenciada em relação à Macaé e Cananéia, sendo a primeira muito mais recortada, assim como demonstra a figura 5. Figura 5. Topografia digital das três localidades. 33 3.1.1 Macaé Em Macaé foram quatro pontos amostrais nesta área costeira (figura 6), onde os pontos (1 a 2) são localizados nas isóbatas 5 a 10 metros e os pontos 3 e 4 nas isóbatas de 10 a 15 metros. Figura 6. Localização aproximada dos pontos de coleta de Macaé. Está localizada no litoral sul do estado do Rio de Janeiro. Possui uma área com configuração francamente aberta (figura 8). Em seu entorno, há o arquipélago de Santana formado pelas Ilhas de Santana, do Francês, Ponta das Cavalas, Ilhote Sul e diversos rochedos e lajes. Está localizada próxima a área de ressurgência oceânica de Cabo Frio o que a promove maior aporte de nutrientes. É também influenciada pelas águas do delta do rio Paraíba do Sul localizado pouco mais ao norte (Sancinetti, 2011). De maneira geral, a morfologia costeira caracteriza-se por uma grande energia de ondas e isto se relaciona a um perfil de comportamento erosivo. Com praias sujeitas a maior energia de onda, são caracterizadas refletivas, são compostas de sedimentos mais grossos e cascalho e com ausência de silte. São intensamente oxigenadas devido a sua alta energia (Oliveira e Muehe, 2013). Desde Cabo Frio até a cidade de Macaé a orientação geográfica de nordeste para sudoeste reflete numa maior exposição às ondas de tempo bom, provindas de leste. Essas ondas de leste desencadeadas por tempestades atingem diretamente 34 algumas áreas, como a praia dos Cavaleiros, principal praia da cidade, onde é comum a destruição do calçadão por essas ondas (Oliveira e Muehe, 2013). Figura 7. Carta batimétrica da área de Macaé (recortadas das cartas náuticas da Marinha do Brasil) - B1500 - Cabo de São Tomé ao Rio de Janeiro. Com batimetrias bastante regulares. A região de Macaé sofre grande influência da ACAS em relação à Ubatuba e posteriormente Cananéia. Isso acontece pela proximidade geográfica com a região de Cabo Frio-RJ. Esta influência da ressurgência costeira têm como consequência 35 baixas temperaturas, alta salinidade e grande quantidade de nutrientes durante todo o ano, com maior intensidade no verão (Valentin, 1984). No litoral fluminense o vento nordeste é dominante durante o verão. Ele afasta a água costeira da costa em direção ao alto mar, o que favorece a entrada da ACAS na costa. No inverno, é o vento sudoeste que predomina, aproximando as águas costeiras pro litoral, onde assume a sua posição de origem na plataforma continental e afastando a ACAS (Emilsson, 1961). Figura 8. Topografia digital de Macaé. Mostrando a sua configuração aberta. No ambiente praial, é comum, quando a energia de arrebentação é alta, estar relacionada ao depósito de sedimentos mais grossos, como a areia média, grossa e cascalho. E quanto mais fundo, em direção ao mar aberto, essa energia diminui, assim como o tamanho do grão, como a areia lamosa, lama arenosa e lama. Ou seja, há um decréscimo em relação ao tamanho do grão à medida que a profundidade aumenta (Oliveira e Muehe, 2013) (figura 7). Mas, em Macaé, há um predomínio de areia (siliclástica), com sedimentos terrígenos com pequenos intervalos de areias ou lamas, por quase toda a plataforma interna e média (águas mais rasas). E em contrapartida, em maiores profundidades indo para o mar aberto até a borda da plataforma, com sedimentos mais grossos, como areia grossa e cascalho (carbonáticos), com menor influência do aporte terrígeno (Figueiredo Jr. e Madureira, 2004). 36 3.1.2 Ubatuba Em Ubatuba foram quatro pontos amostrais nesta área costeira, onde os pontos (1, 2 e 4) são localizados nas isóbatas 10 a 15 metros e o ponto 3 na isóbata de 5 a 10 metros (figura 9). Figura 9. Localização aproximada dos pontos de coleta da Baia de Ubatuba. Na direção norte, desde a Ilha de São Sebastião até Ubatuba, tanto a linha costeira quanto a plataforma continental são bastante recortadas. As isóbatas da região possuem variação no espaçamento, o que gera um estreitamento e aumento da declividade na plataforma, com canais e vales submarinos que cortam a plataforma continental (figura 10). Estas características do relevo submarino favorecem a deposição de lamas já na plataforma continental interna (Muehe, 1996). 37 Figura 10. Carta batimétrica da área de Ubatuba (recortadas das cartas náuticas da Marinha do Brasil) - B1635 - Enseada de Ubatuba. Com grande variação batimétrica. A enseada de Ubatuba, situada no litoral norte do Estado de São Paulo é caracterizada por um relevo recortado (figura 11), devido à proximidade com a Serra do Mar, com pequenos maciços isolados e promontórios dos esporões terminais, ou seja, uma área fechada com pouca movimentação energética (Ab’Saber, 1955). Isso resulta em uma ausência, quase que total, de planícies costeiras, mas com a presença de inúmeras enseadas e praias de pequenas dimensões. Grande parte destas praias pode ser classificada como protegidas (dissipativas) ou intermediárias devido a esta proteção física da atuação dos trens de ondas mais energéticas, consequentemente o seu fundo é revolvido esporadicamente (Mahiques et al., 1999; Rocha, 2008; Rodrigues, 2006). Com área total de 8 km2 e largura total de 4,5 km aproximadamente, há quatro pequenos rios (Indaiá, Grande, Lagoa e Acaraú) que escoam à costa ao redor da enseada, carregando nutrientes e diminuindo a salinidade desta, junto às desembocaduras (Mahiques et al., 1999) 38 Figura 11. Topografia digital de Ubatuba. Mostrando uma linha de costa bastante recortada. A região central é formada por duas baías com características distintas entre si. A primeira, a baía de Toninhas, mais ao sul do setor, com mais energia quando comparada com a baía de Ubatuba, devido à sua configuração de entrada, com uma larga abertura. E também é influenciada pelos trens de ondas provenientes de SW-S (Mahiques et al., 1999). A segunda é a baía de Ubatuba, onde houve as coletas em si, com sua face voltada para o leste e uma constrição do seu litoral o que leva a difração de ondas. Caracterizando-se, assim, como uma baía de baixa energia (dissipativas) (Rocha, 2008). Com a penetração da ACAS sobre a plataforma continental interna durante o verão ocorre uma movimentação junto ao fundo, em direção à costa, enquanto que as águas costeiras, menos densas, são deslocadas em direção ao oceano. No verão, inicia-se uma intensa estação chuvosa no sudeste brasileiro, contribuindo para o aumento do aporte de terrígenos nas águas costeiras (Castro-Filho et al., 1987; Emilson, 1961; Silveira et al., 2000). Mas mesmo no inverno, ocorre uma acentuada pluviosidade (efeito orográfico), devido à proximidade da Serra do Mar em relação à costa (Sant’ana Neto, 1994). Esta dinâmica das massas de água na região, sobretudo no verão, gera uma termoclina sazonal. Há nesta região e em toda a costa paulista a prevalência do regime de micromarés, com amplitudes inferiores a dois metros (Tessler e Goya, 2005). 39 O sedimento da plataforma continental desta região é caracterizado, predominantemente, por areias finas e muito finas, com segmentos de lama e de areia muito grossa, e baixa ocorrência de pelitos, indicando pequeno aporte de sedimentos modernos para a área (Muehe, 1996) (figura 12). Figura 12. Distribuição do diâmetro médio dos grãos e matéria orgânica dos sedimentos de Ubatuba. Extraído de Soares- Gomes e Vanin, 2003. Nesse relevo, com grande número de enseadas e praias (microambientes), há a fixação e o desenvolvimento de numerosas espécies marinhas (Negreiros- Fransozo et al., 1991). A temperatura é considerada um dos parâmetros determinantes na distribuição temporal dos organismos (Costa e Fransozo, 2004). O clima da região é de transição entre o subtropical e tropical sendo úmido, com grande influência das massas equatoriais e tropicais e com baixa participação das polares. A batimetria média da enseada é próxima a 9,3 metros. As médias dos parâmetros da água são: temperatura de 23,8°C, salinidade 33,2‰ e oxigênio dissolvido de 5,11 mg.l-1 (Mantelatto e Fransozo, 1999). 40 3.1.3 Cananéia Os pontos amostrais na área costeira marinha de Cananéia: 1 a 2 são localizados nas isóbatas 10 a 15 metros e os pontos 3 e 4 nas isóbatas 5 a 10m (figura 13). Figura 13. Localização aproximada dos pontos de coleta de Cananéia. O complexo estuarino-lagunar de Cananéia-Iguape é localizado no extremo sul do litoral paulista (25°S, 48°W), tendo o município de Iguape mais ao norte, e ao sul as ilhas de Cananéia e do Cardoso, ao leste a Ilha Comprida e a oeste a Serra do Mar. O complexo liga-se ao oceano, por meio das Barras de Icapara, Cananéia e de Ararapira (Mendonça e Katsuragawa, 2001). Dessas ligações do sistema estuarino, a Barra de Cananéia é o principal acesso ao mar do complexo Cananéia- Iguape, com a maior abertura, trocando, assim, os maiores volumes de água entre a região lagunar e o mar. E, por isso, é utilizada, tradicionalmente, nas atividades de navegações da região (Miyao, 1977). O vento influencia muito no fluxo das águas neste ambiente marinho, um complexo estuarino-lagunar, que é um ecossistema formado por uma drenagem complexa, devido à ação constante das ondas de maré, que penetram pelas barras do rio Ribeira do Iguape, um dos rios mais importantes no litoral paulista e por vários outros riachos que também deságuam na região e que vão diluindo gradativamente a água marinha, tornando-a menos salobra (Mendonça, 2007). Além de ser irrigado por centenas de pequenos rios, há também abundantes precipitações na região, em 41 especial no verão, dando lugar a uma mistura de águas continentais e marinhas com salinidades que flutuam sazonalmente no decorrer do ano (Mishima, 1985). Figura 14. Carta batimétrica da área de Cananéia (recortadas das cartas náuticas da Marinha do Brasil) - B1700 - São Sebastião a Bom Abrigo. Com variação batimétrica regular. Caracteriza-se por ser uma área amplamente aberta ao oceano e sem recortes e formada por um conjunto de meandros provido de um canal de circulação com batimetria superior a quatro metros, crescente desde a foz de Cananéia até mais ao nordeste da Ilha de Cananéia (figura 13 e 14) (Tesser e Souza, 1998). A área da desembocadura de Cananéia é formada por maciços alcalinos do Morro de São João em Cananéia e do Morrete em Ilha Comprida, o que propicia a essa região a acumulação de sedimentos. Há nessa área da desembocadura os 42 maiores valores das velocidades de corrente durante a maré vazante (1,2 m/s), também apresenta maiores diferenças nos perfis batimétricos (figura 15), feições de fundo nas áreas mais internas com megaondulações e na área mais externa, próxima ao mar aberto, com ondas de areia (Tesser e Souza, 1998). Figura 15.Topografia digital de Cananéia. Quanto ao transporte de sedimentos há uma diminuição na intensidade do fluxo para a porção mais interna do estuário. Tanto na maré vazante, quanto na maré enchente há correntes de fundo com sentidos inversos (ao mesmo tempo). O papel erosivo das marés é mais intenso na maré vazante (Tessler e Souza, 1998). As correntes são predominantes, mas as ondas também influenciam no transporte de sedimento mesmo com a Ilha do Bom Abrigo criando um efeito de proteção natural para as ondas advindas do S e SE na área de desembocadura de Cananéia. Na margem da Ilha do Cardoso a tendência à ação erosiva da porção marinha está relacionada, principalmente, a ação das ondas. Estas têm origem nos ciclones extratropicais que aumentam a energia das ondas que chegam à costa (Tessler e Souza, 1998). Com praias do tipo dissipativas em sua maioria, e também do tipo intermediárias. Sua faixa intermarés, a zona de arrebentação e a plataforma rasa 43 possuem grande semelhança entre si em relação à sedimentação, com mais de 80% de areias finas e muito finas (Tessler e Goya, 2005; Herrera, 2017). A proximidade da Ilha do Bom Abrigo e da Desembocadura de Cananéia funciona como uma armadilha sedimentar (figura 14), formando bancos de sedimentos (deltas) desencadeados pela maré vazante. Esta é dominante no sistema em relação à maré enchente, pois seus bancos sedimentares são menos pronunciados (Miyao, 1977; Bergamo, 2000). A ação da maré é a principal responsável pelas misturas e pelas trocas que se efetuam entre o oceano e o estuário, atuando como um agente efetivo no transporte de sedimentos e na renovação das águas estuarinas (figura 16) (Miyao e Harari, 1989). Figura 16. Escala de cor demonstrando os fluxos de maré sobre o fundo a partir da morfologia das feições, vistas com as setas brancas, estabelecido por Tessler e Souza,1998. Tirado de Paolo e Mahiques, 2008. 3.2 AMOSTRAGENS DO MATERIAL BIOLÓGICO As coletas foram realizadas em três localidades da costa sudeste brasileira: em Macaé-RJ, Ubatuba-SP e Cananéia-SP (tabela 1 e figura 4). Estas coletas foram feitas mensalmente nas três localidades pelo Laboratório de Camarões de Água Doce (LABCAM), da Universidade Estadual Paulista (UNESP) de Bauru, no período 44 de junho de 2013 a julho de 2014. Os meses faltantes (tabela 2) das coletas não ocorreram devido a más condições climáticas, não permitindo a realização da coleta do material biótico e abiótico. A coleta de dados bióticos e abióticos foi executada em parceria com o LABCAM, laboratório de Camarão marinho e de água doce, da UNESP de Bauru, com a coordenação do prof. Dr. Rogério Caetano da Costa. As coletas ocorreram por meio de um barco camaroeiro, junto com a pesca de camarão, caracterizando estas amostras de gastrópodes como fauna acompanhante (Slavin, 1983). O barco foi equipado com duas redes de arrasto do tipo “otter-trawl”, tendo as seguintes medidas: 4m de largura de boca, 10m de comprimento e malhas com 20 mm de distância entrenós nas mangas e corpo da rede e 18 mm de distância entrenós no ensacador. Nos pontos de coleta, o esforço amostral foi de 30 minutos/arrasto (área amostral aproximadamente 10.000 m2). Após o término da amostragem de cada ponto, os exemplares foram triados, ensacados, etiquetados e armazenados em caixas térmicas com gelo picado. Posteriormente, esse material foi levado ao laboratório onde foi congelado. Finalmente, os bioclastos foram descongelados, quantificados, pesados, mensurados, identificados quanto às espécies, fotografados e analisada a assinatura tafonômica de cada indivíduo. A identificação taxonômica seguiu os autores Thomé et al. (2004), Thomé et al. (2010), Rios (2009), Conquiliogistas do Brasil (site) e contou com a colaboração do Prof. Doutor Luiz Ricardo Lopes Simone, do Museu de Zoologia da USP de São Paulo. Procedeu-se a limpeza da concha com auxílio de pinças e espátulas odontológicas e com água corrente para que não houvesse restos de matéria orgânica e ao mesmo tempo não interferisse nas características externas. 3.3. AMOSTRAGENS DOS FATORES AMBIENTAIS Em cada ponto, mensalmente, foram monitoradas a temperatura de fundo com termômetro de mercúrio ºC e a salinidade (refratômetro óptico portátil Refracto 45 30PX) da água de fundo, averiguadas por meio de uma garrafa de Van Dorn. As amostragens dos fatores ambientais coletados como: profundidade, temperatura e salinidade de fundo foram averiguadas por meio do equipamento Eureca em parceria com o laboratório Labcam. As informações da pluviosidade dos pontos do estado de São Paulo foram averiguadas mensalmente através dos dados do centro integrado de informações agrometeorológicas (http://www.ciiagro.sp.gov.br/). 3.4. AMOSTRAGENS DAS ASSINATURAS TAFONÔMICAS A análise tafonômica foi feita através da presença ou ausência das seguintes assinaturas tafonômicas: abrasão, dissolução, fragmentação, incrustação e bioerosão (quadro 1, 2 e 3). As assinaturas observadas e descritas, seguiram os protocolos de análise de Rodrigues (2006), Rodrigues et al. (2009), Simões et al. (2009), Rodrigues e Simões (2010) e Erthal (2012). Cada concha foi analisada a olho nu. Abrasão foi considerada presente nos bioclastos que tiveram a perda de relevos das conchas, por vezes expondo as camadas mais internas das conchas, como um ralado. A dissolução foi reconhecida a partir da gredosidade das conchas, incluindo perda de cor (esbranquiçado) e aspecto granular. A fragmentação foi considerada presente para as quebras, fraturas e perdas da ornamentação. A bioerosão foi diagnosticada considerando-se microperfurações e raspagens de origem biológica, pela ação de esponjas. Já a incrustação foi reconhecida pela presença de epibiontes, tais como algas, cracas, briozoários e bivalves (quadro 2). Para fins estatísticos, as assinaturas tafonômicas foram contadas como 0 (zero) quando ausente o dano, isto é, a concha se apresenta em estado natural; e 1 (um), quando presente algum dano, isto é, a condição da concha é alterada (anexos). Realizou-se também análise de agrupamento para comparar as localidades quanto ao tipo de assinaturas das conchas. A matriz original com as contagens de indivíduos foi convertida em uma matriz de dissimilaridade usando o índice de Bray- http://www.ciiagro.sp.gov.br/ 46 Curtis. Para a construção do dendrograma foi utilizado o método de ligação pela média do grupo (UPGMA). A análise de agrupamento foi realizada no programa R (R Core Team, 2016). R Core Team 2016. R: A language and environment for statistical computing. R Foundation for Statistical Computing, Vienna, Austria. URL https://www.R-project.org/. O índice de dissimilaridade de Bray-Curtis foi utilizado para produzir a matriz de distâncias. Esse coeficiente é indicado para dados de abundância. Em seguida foi utilizado o método de ligação pela média do grupo (UPGMA) para produzir o dendrograma. https://www.r-project.org/ 47 Q u a d ro 1 . Q u a d ro in d ic a n d o a m e to d o lo g ia u s a d a n a id e n tific a ç ã o d a s a s s in a tu ra s ta fo n ô m ic a s u tiliz a d a s (a d a p ta d o d e K id w e ll, 1 9 9 1 ; E rth a l, 2 0 1 2 ; P a rs o n s -H u b b a rd , 2 0 0 5 ; Z u c h in , 2 0 0 3 ). 48 Q u a d ro 2 . Q u a d ro in d ic a n d o a m e to d o lo g ia u s a d a n a id e n tific a ç ã o d a s a s s in a tu ra s ta fo n ô m ic a s u tiliz a d a s (a d a p ta d o d e K id w e ll, 1 9 9 1 ; E rth a l, 2 0 1 2 ; P a rs o n s -H u b b a rd , 2 0 0 5 ; Z u c h in , 2 0 0 3 ). 49 Quadro 3. Quadro indicando a metodologia usada na identificação das assinaturas tafonômicas utilizadas (adaptado de Kidwell, 1991; Erthal, 2012; Parsons-Hubbard, 2005; Zuchin, 2003). 50 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1. VARIÁVEIS ABIÓTICAS A tabela abaixo mostra os dados abióticos obtidos para cada ponto de coleta em sua respectiva região (Macaé, Ubatuba e Cananéia), sendo eles o mês/ano da coleta, o ponto de coleta, profundidade em metros, temperatura de fundo em ºC e salinidade de fundo. Tabela 2. Fatores abióticos (temperatura e salinidade) em suas respectivas datas, pontos e profundidades de coleta. . 51 Figura 17. As médias de temperatura em °C e salinidade, durante o período estudado, de Macaé, Ubatuba e Cananéia. Durante o período de coleta, os valores de temperatura de Macaé foram mais baixos, se comparados a Ubatuba, com amplitudes de 18 ºC em dezembro de 2013 e junho de 2014 a 23,5 °C em maio de 2014 e com temperaturas médias de 20,7 ºC. Já Ubatuba apresentou mínima de 17º C em fevereiro de 2014 e máxima de 27 ºC em dezembro de 2013 e valor médio de 21,8 ºC. A região de Cananéia mostrou os menores valores de temperatura de água de fundo, com mínima de 17,2 ºC em julho de 2013 e máxima de 26,6 °C em dezembro de 2013, e com o valor médio da temperatura de 20,2 °C (tabela 2 e figura 17). Em relação à temperatura da água na região de Cananéia, há variação com um claro padrão de sazonalidade com águas mais quentes no verão e mais frias no inverno, típicas de regiões subtropicais. O que diferencia Cananéia das outras duas regiões (Macaé e Ubatuba) é que, durante a primavera e o verão, ocorre a diminuição da temperatura da água, assim como a elevação da salinidade, e isso se deve provavelmente à proximidade geográfica da área de ressurgência de Cabo Frio-RJ e, portanto mais fortemente influenciadas pela ACAS, uma massa de água fria (Valentin, 1984; Carvalho-Batista, 2013; Mantelatto e Fransozo, 1999; Herrera, 2017). Desse modo, a salinidade da região de Macaé mostrou os maiores valores dentro do período de coleta, com média de 36 e amplitude de 34 a 40. Em Ubatuba, a salinidade foi intermediária, com média de 35 e amplitude de 32 a 37. Já Cananéia, os menores valores de salinidade, com 32 de média e amplitude de 17 a 35 (tabela 2). Essa salinidade inferior de Cananéia provavelmente ocorre em consequência da alta precipitação, além do aporte de água continental no complexo 52 estuarino, que ocorre principalmente pela descarga do rio Ribeira de Iguape. A salinidade pode refletir a influência da água doce, de origem fluvial (Erthal et al., 2016). Além disso, a localidade teve valores pluviométricos altos de janeiro a março (CIIAGRO – http://www.ciiagro.sp.gov.br). Ao longo do período de estudo observaram-se claras diferenças entre as condições ambientais das três áreas de estudo, sendo que em Macaé verificaram-se os menores valores de temperatura, apesar da sua menor latitude, e salinidade mais elevada sob forte influencia dos eventos de ressurgência, induzidos tanto pelos ventos, quanto pelo relevo da costa (Valentin, 1974). 4.2. BIOLOGIA Foram capturados 895 espécimes, dentre os quais 16 espécies foram identificadas (quadro 4). Ubatuba apresentou maior abundância e, consequentemente, maior quantidade de amostras, com 431 indivíduos. Ubatuba apresentou também maior riqueza biológica, isto é, a maior quantidade de espécies foi notada em Ubatuba (12 espécies); seguido de Cananéia com 221 organismos e 8 espécies; e Macaé com 243 amostras e 6 espécies (quadro 5). A maior ocorrência desses organismos em Ubatuba provavelmente está relacionada com as temperaturas mais elevadas em relação às outras localidades, com médias de 25 ºC e salinidade intermediária, próxima a 35 (figura 17). A distribuição da macrofauna bentônica está relacionada à energia do ambiente (Levinton, 1995). Quanto maior a energia, ou seja, quanto mais próximo à zona de arrebentação, maior é a dificuldade da manutenção desta macrofauna. Assim, as ondas são fontes de estresse e um fator controlador, nas praias arenosas, da distribuição desses organismos (Absalão, 1991). O que corrobora com os dados de maior riqueza e abundância em Ubatuba, que possui características de baixa energia, devido a sua linha de costa protegida e praias dissipativas (Komar, 1998; Muehe, 1996). Desse modo, para as três regiões estudadas, Macaé, Ubatuba e Cananéia, verificou-se que as maiores quantidades de amostras estavam nos pontos com maiores profundidades, entre 10 e 15m, mais distantes da antepraia superior, onde http://www.ciiagro.sp.gov.br/ 53 em ondas de tempo bom, atingem de 5 a 10m de profundidade (Hoefel, 1998). Esse padrão está de acordo com a proposta de que os mais altos índices de ocorrência das espécies sejam encontrados em habitats com menor energia e fora da área de surfe, estando esta área limitada às isóbatas de 5 a 6 m (Tessler e Goya, 2005). Assim, a profundidade mostrou-se uma variável controladora da estrutura populacional, assim como a perturbação ou estabilidade do sedimento (Absalão, 1991). Neste trabalho, a espécie Olivancillaria urceus destacou-se como abundante nos três pontos. Foi encontrada em todas as profundidades, desde 5 até 15m, nas três localidades de coleta. Em Ubatuba, com maior abundância: 225 indivíduos, seguido por Cananéia com 198 e por último, Macaé, com apenas 30 indivíduos (quadro 3). Foram amostradas dentro de uma amplitude de temperaturas entre 17 °C e 26,5 °C e salinidade entre 26 e 39 (tabela 1). Com destaque aos pontos: ponto 1 e 2 (Ubatuba), com 93 e 105 indivíduos respectivamente; e ponto 1 de Cananéia com 93 indivíduos, todos eles dentro dos pontos com profundidades entre 10 a 15 m (quadro 3). A faixa de temperatura e salinidade preferencial da espécie Olivancillaria urceus variou de 17 a 25ºC e salinidade de 32 a 36 (tabela 1). Como já citado, a presença da O. urceus, em Macaé, foi bem menor, com apenas 30 amostras, sendo que a salinidade máxima chegou a 40, com média de 36, ficando acima de Ubatuba, com média de 35 e Cananéia, com 32 (tabela 1). Assim, em Macaé houve baixo número de coleta de O. urceus nos pontos 1 e 2, e nos pontos 3 e 4 foram ausentes ou inexpressivos (quadro 3). Isso demonstra uma provável sensibilidade dessa espécie à salinidade. Além da salinidade, que é influenciada pela proximidade da área de ressurgência da ACAS, outra possível causa da menor presença dessa espécie nesta região é a característica de ser um ambiente com alta energia, por ser um ambiente aberto e desprotegido, onde as ondas são fonte de estresse ambiental, e um fator controlador nas praias arenosas, da distribuição desses organismos (Absalão, 1991). Outra possível razão, também relacionada à alta energia deste ambiente, seria a maior taxa de sedimentação, proporcionando menor estabilidade à concha. 54 Quadro 4. Quadro taxonômico (divisões e subdivisões das espécies amostradas). Outra espécie que se destacou em termos de abundância é Buccinanops gradatus, pertencente à mesma ordem (Neogastropoda) que O. urceus (quadro acima). As amostras de Buccinanops gradatus também foram encontradas em todas as profundidades, 5 m a 15 m, nas três localidades: em Macaé com 196 indivíduos; Ubatuba com 124; e por último, Cananéia com apenas 02 indivíduos (quadro 3). As quantidades foram mais elevadas nas profundidades de 10 a 15 m (quadro 3). Como já tratado, Macaé mostrou-se mais salina, dentro dos períodos de coleta, do que as outras duas regiões (figura 17). Isto sugere que a espécie B. gradatus tem preferência por ambientes com maior salinidade (Macaé, seguida de Ubatuba), mostrando maior sensibilidade a graus de salinidade inferiores, como em Cananéia, conforme observado anteriormente (figura 17). Na relação gêneros e relevância (gêneros/tipos), temos: 467 das conchas coletadas são do gênero Olivancillaria, incluindo as espécies Aragonia steeriae, Olivancillaria urceus e Olivancillaria vesica; 328 são do gênero Buccinanops, que inclui Buccinanops gradatus e Buccinanops monilifer; e 100 são dos gêneros restantes, como Bulla occidentalis, Cymatium parthenopeum, Fusinus marmoratus, Hastula cinerea, Polinices hepaticus, Semincassis granulata, Siratus senegalensis, Stramonita brasiliensis, Strombus pugilis, Tonna galea, e Zidona dufresneyi. Todas essas 16 espécies e seus respectivos gêneros são mostradas no quadro taxonômico (quadro 4), suas respectivas quantidades e pontos amostrados estão no quadro 5 e 55 suas fotografias na figura 18. Quadro 5. Quadro mostrando as espécies e as quantidades encontradas nos momentos da coleta em seus respectivos pontos. 56 57 Figura 18. Fotografias das 16 espécies encontradas nos momentos da coleta. 58 4.3. ANÁLISE TAFONÔMICA BÁSICA No geral, a assinatura tafonômica que aparece em altas taxas, em todos os pontos de coleta de Macaé 94% (ntotal=243), Ubatuba 79% (ntotal=431) e Cananéia 78% (ntotal=221) é a fragmentação, conforme ilustrado na figura 19. Figura 19. Frequências das assinaturas tafonômicas em cada região. 4.3.1 Frequências das assinaturas de origem física A frequência na distribuição da assinatura tafonômica “fragmentação” é alta nas três localidades, sendo os maiores índices observados em Macaé, com 94% (n=243) dos bioclastos fragmentados (figura 19). Conforme já apresentado, Macaé representa uma localidade altamente energética, a exemplo de suas praias refletivas (Oliveira e Muehe, 2013). Nesse caso, altos índices de fragmentação podem estar relacionados às condições de um ambiente de alta energia, com altas taxas de sedimentação, nos quais os danos por abrasão e fragmentação são intensos (Brett e Baird, 1986; Smith e Nelson, 2003). Em Macaé, a fragmentação corresponde à 59 assinatura tafonômica de maior ocorrência, mesmo se considerando a análise por ponto de coleta, isto é, nos pontos de 1 a 4 (figura 20). Figura 20. Frequências das assinaturas abrasão e fragmentação nos pontos de coleta de Macaé. O índice de abrasão de Macaé foi de 14% (n=243) dos bioclastos amostrados. Os pontos 3 e 4 tiveram destaques tanto na fragmentação quanto na abrasão, com índices de 15% (n=86) e 18% (n=105) respectivamente, mesmo estando nas batimetrias mais profundas, de 10 a 15m (figura 20). Porém, nos pontos mais rasos, ponto 1 e 2, com profundidades de 5m a 10m, onde se esperavam mais comumente maiores frequências de abrasão (Brett e Baird, 1986; Smith e Nelson, 2003), esses danos foram ausentes. Figura 21. Frequências das assinaturas abrasão e fragmentação nos pontos de coleta de Ubatuba. 60 Ubatuba apresentou taxas insignificativas de abrasão (1%, n=431) provavelmente por apresentar um ambiente de costa recortada, protegida, com características de baixa energia e praia dissipativas. Tal padrão está de acordo com as feições geomorfológicas dessa localidade. Porém, observaram-se altas taxas de fragmentação (79%, n=431). Já a menor frequência (44%, n=57) deste dano ocorreu no ponto mais raso (ponto 3), de 5 a 10m, próximo às águas mais rasas e com tendência a maior energia, onde mais comumente ocorre esse dano (figura 21) (Brett e Baird, 1986; Smith e Nelson, 2003). Embora em condições altamente energéticas sejam esperados danos tais como abrasão e fragmentação (Brett e Baird, 1986; Smith e Nelson, 2003), deve-se lembrar que a fragmentação relaciona-se não apenas à atuação de processos físicos, mas também químicos e biológicos (Zuchin et al, 2003). Figura 22. Frequências das assinaturas abrasão e fragmentação nos pontos de coleta de Cananéia. Cananéia é a localidade que apresenta os maiores índices de abrasão, com 26% dos bioclastos (n=221) apresentando essa assinatura. Inclusive, a assinatura abrasão mostra-se mais expressiva ao se considerar os índices por ponto de coleta, à exceção do ponto 2 (7%, n=15; veja discussão mais adiante). Os índices mais altos, como nos pontos 3 (40%, n=43), 4 (31%, n=54) e ponto 1 (23%, n=109) (figura 22), têm como provável causa a influência do rio Ribeira do Iguape sobre a 61 hidrodinâmica dessa região estuarina. As ondas influenciam no transporte hidrodinâmico, mas em Cananéia são as correntes que predominam, apesar de a Ilha do Bom Abrigo criar uma barreira geográfica para as ondas incidentes de S e SE na área de desembocadura de Cananéia (Tessler e Souza, 1998). Assim, é a ação da maré, nesta região, o agente mais efetivo no transporte de sedimentos, na mistura das águas e nutrientes (Miyao e Harari, 1989). Os maiores índices de abrasão de Cananéia ocorreram nos pontos 3 e 4 (40% com n=43 e 31% com n=54 respectivamente), ambos localizados nas batimetrias mais rasas, de 5 a 10m (figura 22). Esses dois pontos são os mais próximos às águas mais rasas e mais energéticas. É nesse ambiente que se apresentam, comumente, índices mais altos de abrasão e fragmentação (Marcondes, 2013; Brett e Baird, 1986; Smith e Nelson, 2003). Além disso, o ponto 3 provavelmente possui bioclastos com maiores danos de abrasão por estar mais próximo da margem da Ilha do Cardoso, onde há maior tendência à ação erosiva da porção marinha, decorrente, principalmente, da ação das ondas. Estas têm origem nos ciclones extratropicais que aumentam a energia das ondas que chegam à costa (Tessler e Souza, 1998). O ponto 2 possui baixo índice de abrasão (7%, n=15) (figura 22), também merece destaque e será discutido mais adiante. Em Cananéia a fragmentação dos bioclastos também foi alta, com 78% (n=221). É o ponto 1, com 87% e n=109, que possui a maior frequência, mesmo sendo um ponto mais fundo (de 10 a 15m), assim como o ponto 2 (67%, n=15) de batimetria igual. Os pontos nas batimetrias mais rasas, de 5 a 10m (figura 22) também apresentam índices de fragmentação altos. A fragmentação mostrou-se uma assinatura tafonômica de origem complexa, pois pode ser decorrente de processos físicos que auxiliam na destruição dos bioclastos, como a ação de ondas e correntes, ou mesmo de processos biogênicos, como a bioerosão, ou químicos, como a dissolução (Zuchin et al., 2003). Outros autores, ao estudarem acumulações de braquiópodes e moluscos bivalves em Ubatuba e Pinciguaba e no Estuário de Paranaguá (Rodrigues, 2006; Marcondes, 2013) chamaram a atenção para o fato de a fragmentação não ser uma assinatura tafonômica ambientalmente sensitiva, embora muito presente nas concentrações 62 estudadas. Ou seja, identificar a causa da fragmentação com base nos padrões de quebra é problemático, pois as causas são diversas e variáveis na natureza (Zuchin et al, 2003). Os gastrópodes aqui estudados parecem corresponder a mais um exemplo da origem multivariada da referida assinatura tafonômica. Indicando que a fragmentação provavelmente não responde diretamente aos diferentes regimes energéticos e de sedimentação, observados tanto em Macaé, Ubatuba e Cananéia. A análise estatística de agrupamento das assinaturas gerou um dendrograma (figura 28). Preferiu-se, inicialmente, retirar a assinatura fragmentação da matriz que gerou a análise uma vez que a mesma não se mostrava ambientalmente sensitiva. O dendograma assim obtido mostrou-se consistente e seus resultados são robustos, apresentando os pontos de coleta de Cananéia próximos aos pontos 1 e 2 de Macaé, enquanto que os pontos 3 e 4 de Macaé estão mais próximos de todos os pontos de Ubatuba (figura 28). Contudo, esse padrão de agrupamento também é observado nas análises contendo a assinatura fragmentação. Esse resultado colabora ao entendimento de que a assinatura fragmentação não é ambientalmente sensitiva, e sua gênese é de difícil interpretação. 4.3.2 Frequências das assinaturas de origem biológica Figura 23. Frequências das assinaturas de origem biológica (incrustação e bioerosão) nos pontos de coleta de Macaé. Outro padrão peculiar é encontrado em Macaé onde o relevo fisiográfico tem 63 poucos recortes, caracterizando-se como aberto de alta energia (praias refletivas) (Oliveira e Muehe, 2013). Nessas condições, não se espera observar concentrações elevadas de danos de origem biológica, pois estes são mais presentes em ambientes de baixa energia e/ou águas mais profundas particularmente marcadas por baixa taxa de sedimentação (Brett e Baird, 1986). Todavia, altos índices de incrustação aparecem em Macaé com 67% (n=243). Os pontos com batimetrias mais rasas, de 5 a 10m, apresentaram as frequências mais baixas desse dano, com ponto 1 apresentando 14% (n=21) e ponto 2 demonstrando 19% (n=31). Já nos bioclastos amostrados nas batimetrias mais profundas, de 10 a 15m, as frequências foram mais elevadas (ponto 3 com 79%, n=86 e ponto 4 com 82%, n=105) já que, provavelmente, há um menor estresse ambiental (menor energia) (figura 23). Além disso, o ponto 4 está mais próximo geograficamente às Ilhas de Santana, o que provavelmente deve favorecer a sua maior incidência de incrustação, promovendo um “efeito ilha” (Rodrigues, 2016). Desse modo, a alta frequência de conchas incrustadas em Macaé, apesar de suas características mais energéticas, provavelmente se deve a proximidade geográfica, e assim intensa influência da área de ressurgência da ACAS em Cabo Frio, diminuindo a temperatura mas aumentando a produtividade primária local (Valentin, 1984) refletindo a ação dos organismos incrustantes (Santos e Majoral, 2008). Já os danos por bioerosão são muito baixos nesta região, com apenas 1% (n=243) de bioclastos bioerodidos (fig. 23). Tal fato sugere que os agentes bioeroditores provavelmente sejam mais sensíveis à alta energia ambiental e alta taxa de sedimentação (Brett e Baird, 1986). Isso pode ser mais bem compreendido se considerado que a bioerosão pode ocorrer após a morte do bioclasto bioerodido e, se o mesmo estiver submetido a condições ambientais de alta energia, haverá substrato instável, pouco favorável à bioerosão. Além disso, essa baixa frequência ou ausência de bioerosão pode estar relacionada a pouca exposição dos bioclastos na ISA (interface água-sedimento), ou seja, o nível entre a coluna d’água e o sedimento (Young e Nelson, 1985). 64 Figura 24. Frequências das assinaturas de origem biológica (incrustação e bioerosão) nos pontos de coleta de Ubatuba. Entretanto, em Ubatuba, a incrustação tem maior frequência, com 69% (n=431), seguido de Macaé (67% e n=243) e Cananéia (17%, n=221) nos bioclastos estudados (figura 19). Na região de coleta de Ubatuba, os danos de origem biológica, tal como a incrustação, são mais presentes, pois é um ambiente de baixa energia e/ou em águas mais profundas que estão relacionadas particularmente por baixa taxa de sedimentação (Brett e Baird, 1986), onde se atribui às enseadas ambientes pouco energéticos (Rodrigues et al., 2002). Tal fato corrobora com os maiores índices encontrados nas batimetrias mais fundas, de 10 a 15m, nos pontos: 1 (69% e n=151), 2 (67% e n=155), e 3 (87% e n=68) e com menor índice, 54% (n=57), no ponto 3 na batimetria de 5 a 10m (figura 24). Este último está mais próximo das águas rasas, e isso provavelmente seja o motivo da menor frequência deste ponto. Essas frequências elevadas de incrustação em Ubatuba, atingindo, no mínimo, mais da metade das conchas em todos os quatro pontos de coleta, o que não ocorreu nas outras localidades, provavelmente se relaciona aos organismos incrustantes serem mais comuns em ambientes marinhos com águas mais quentes e com alta produtividade primária (Santos e Majoral, 2008). Tal fato corrobora com os altos índices de incrustação em Ubatuba, já que esta localidade mostrou temperaturas mais elevadas que as outras duas regiões (figura 17). E notavelmente, Ubatuba assim como Macaé recebem grande influência das correntes de ressurgência da ACAS. Pois, a ACAS, além de aumentar a disponibilidade de 65 nutrientes e a oxigenação dessas águas, aumenta a produtividade primária e favorece, assim, o estabelecimento dos epibiontes (incrustantes) (Silva, 1968). Assim, a distância geográfica desta área de ressurgência parece também influenciar nos danos de origem biológica. Desta forma, a baixa energia associada as maiores temperaturas de Ubatuba (fig.17), provavelmente se vinculam com a maior riqueza e abundância de espécies nesta região (quadro 5), já citado anteriormente, assim como, a maior frequência dos danos de origem biológica desta região (figura 24). A frequência de bioerosão de Ubatuba foi a única significativa dentre as demais regiões, com 12% (n=431) das conchas bioerodidas. O ponto com maior frequência dessa assinatura é o ponto 4 (35% e n=68), seguido do ponto 1 (11% e n=151), ponto 2 (6% e n=155) e ponto 3 (2% e n=57) (figura 24). Assim como na incrustação, as maiores frequências estão associadas à batimetrias de 10 a 15m, mais fundas e mais distantes das águas rasas e mais agitadas, pois baixa energia influencia neste dano (Brett e Baird, 1986). Bioclastos nas acumulações nesses ambientes podem representar substratos mais estáveis, o que seria mais favorável aos bioerodidores. Outra relação associada à bioerosão é a água mais quente de Ubatuba (figura 17). Bioerosão é estimulada por nutrientes e se desenvolve mais rápido em águas mais produtivas, o que colabora e aumenta esse tipo de dano nas conchas (Santos e Majoral, 2008). A bioerosão é dependente direta da produtividade primária marinha, ou seja, quanto maior a produtividade marinha, maior a bioerosão. Além disso, as taxas de bioerosão também são controladas direta ou indiretamente pela taxa de soterramento (taxa de sedimentação) e profundidade da coluna d’água (Santos e Majoral, 2008). Isto sugestiona a correlação de que os bioclastos bioerodidos nesta região de coleta possivelmente passaram mais tempo expostos na interface água-sedimento (ISA) e pouco tempo soterrados (Young e Nelson, 1985). 66 Figura 25. Frequências das assinaturas de origem biológica (incrustação e bioerosão) nos pontos de coleta de Cananéia. Em Cananéia as frequências das assinaturas de origem biológica foram baixas dentre as três regiões de coleta. Com apenas 17% (n=221) dos bioclastos coletados incrustados e 1% (n=221) bioerodidos (figura 25). Esses danos, causados por organismos bioerodidores, como esponjas, e incrustantes, como os briozoários, que são organismos típicos de ambientes marinhos. Assim, esses danos são pouco vistos ou não ocorrem em ambientes lagunares ou com influência de água doce, o que, consequentemente, corrobora com estas baixas frequências de bioerosão e incrustação (Parsons-Hubbard, 2005). Ritter et al. (2013), por exemplo, relatam em estudos com moluscos bivalves do complexo lagunar Tramandaí, a ausência de sinais de ação biológica nas conchas. Os autores concluem que as assinaturas tafonômicas de ambientes estuarinos/lagunares são produzidas principalmente por dissolução e não por ações biológicas (Ritter et al., 2013). O mesmo padrão é descrito em estudos na região do estuário de Paranaguá, onde também se observaram baixas frequências de danos biológicos (Marcondes, 2013). Assim, a região de coleta em Cananéia, sendo uma região estuarina, portanto, um ambiente transicional, com influência fluvial e pluvial, apresentou baixas frequências desses danos tafonômicos. Esses resultados demonstram uma possível sensibilidade das assinaturas de origem biológica (incrustação e bioerosão) ao fator salinidade, uma 67 vez que essa localidade apresentou valores bastante inferiores de salinidade dentre as três regiões (figura 17). No ponto 2, a elevada frequência de incrustação (73% e n=15) (fig. 25) possivelmente se deve proximidade geográfica à Ilha do Bom Abrigo, que deve servir de proteção, como uma barreira física, à ação hidrodinâmica entre o rio Cananéia e a maré, tornando este ambiente menos energético em relação aos outros pontos (Tessler e Souza, 1998), o que também explicaria o baixo índice de abrasão, como já discutido mais acima. Além disso, a proximidade do ponto 2 a esta ilha parece favorecer os organismos epibiontes (incrustantes) devido ao enriquecimento de nutrientes da ilha, ou seja, “efeito ilha” (Rodrigues, 2006). Assim, estes apontamentos podem estar relacionados ao baixo índice de abrasão, alta incrustação e dissolução alta, (esta será vista mais à frente), do ponto 2 de Cananéia. Conforme pode ser visualizado na figura 26, à exceção da fragmentação, os índices de todas as assinaturas tafonômicas estudadas para o ponto 2 de Cananeia são distintos dos demais pontos dessa mesma localidade. Figura 26. Frequência das assinaturas tafonômicas usadas neste estudo nas estações de coleta de Cananéia. 68 Dessa maneira, os organismos incrustantes parecem indicar ambientes específicos, limites de variação de temperatura, salinidade, aporte fluvial, taxas de sedimentação (Erthal et al., 2016). Já a baixa frequência ou ausência de bioerosão em Cananéia pode estar relacionada com o baixo tempo de exposição do bioclasto na ISA, na interface água- sedimento (Young e Nelson, 1985). Ainda, baixos índices de bioerosão podem estar relacionados à maior instabilidade dos bioclastos junto à ISA, uma vez que essas localidades correspondem a ambientes mais energéticos. Além do mais, em ambientes de águas mais quentes (tropicais), os danos causados por bioerosão são mais comuns do que em ambientes mais frios, como os polares, que são bastante raras (Simões e Kowalewski, 2007). Isto corrobora com as menores frequências de bioerosão tanto em Macaé, quanto em Cananéia, onde a temperatura média dentro do período de coleta se mostraram inferiores em relação a Ubatuba (figura 17). Ubatuba com suas águas mais quentes e uma frequência de bioerosão mais significativa (figura 24). 4.3.3 Frequências das assinaturas de origem química Em se tratando de dissolução, Macaé apresenta os índices mais altos (35%, n=243) entre seus bioclastos. O ponto 3 (41% e n=86) e ponto 4 (41% e n=105) destacam-se com as maiores frequências, e ambos estão em batimetrias maiores, de 10 a 15m (figura 27). Esses dois pontos estão mais distantes das águas mais rasas e mais energéticas, além disso, o ponto 4 está também mais protegido devido à proximidade do arquipélago de Santana, sendo influenciado pelo “efeito ilha”, que possivelmente colabora na estabilidade da concha/sedimento (Rodrigues, 2016). Tal fato sugere que nesses pontos com altas frequências de dissolução, as conchas sofreram mais danos por estarem incorporadas ao substrato, onde a água de poro, ou ág