UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - UNESP Instituto de Geociências e Ciências Exatas Câmpus de Rio Claro AVALIAÇÃO GEOAMBIENTAL EM ÁREAS DE CERRADO NO TRIÂNGULO MINEIRO PARA IMPLANTAÇÃO DE PEQUENOS RESERVATÓRIOS SUPERFICIAIS DE ÁGUA: APLICAÇÃO NA FOLHA DE TUPACIGUARA, MG (1:100.000) Davi Alfredo Maranesi Orientador: Prof. Dr. José Humberto Barcelos Tese de Doutorado elaborada junto ao Curso de Pós-Graduação em Geociências– Área de Concentração em Geociências e Meio Ambiente para obtenção do Título de Doutor em Geociências e Meio Ambiente Rio Claro (SP) 2002 624.151 Maranesi, Davi Alfredo M311a Avaliação geoambiental em áreas de Cerrado no Triângu- lo Mineiro para implantação de pequenos reservatórios super- ficiais de água: aplicação na folha de Tupaciguara, MG (1:100.000) / Davi Alfredo Maranesi. – Rio Claro : [s.n.], 2002 141 f. : il. + 9 mapas Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Ins- tituto de Geociências e Ciências Exatas Orientador: José Humberto Barcelos 1. Geologia de engenharia. 2. Meio físico. 3. Mapeamen- to geotécnico. 4. Pequenas barragens. 5. Gestão de água. I. Título. Ficha Catalográfica elaborada pela STATI – Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP Comissão Examinadora Prof.Dr. José Humberto Barcelos (orientador) IGCE/UNESP/Rio Claro (SP) Prof.Dr. Cláudio Antonio de Mauro IGCE/UNESP/Rio Claro (SP) Prof.Dr. Silvio Carlos Bray IGCE/UNESP/Rio Claro (SP) Prof.Dr. Antonio Giacomini Ribeiro Universidade Federal de Uberlândia/Uberlândia (MG) Prof.Dr. Luiz Nishiyama Universidade Federal de Uberlândia/Uberlândia (MG) Davi Alfredo Maranesi aluno Rio Claro, 14 de Fevereiro de 2003 Resultado: Aprovado com distinções Aos meus pais, Henrique e Dirce. AGRADECIMENTOS Desejo expressar meus sinceros agradecimentos: à Universidade Federal de Uberlândia pela liberação integral das atividades docentes e apoio necessário ao desenvolvimento do presente trabalho; à Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, pela bolsa de estudo concedida; ao Prof. Dr. José Humberto Barcelos, pela orientação, incentivo e apoio nas várias etapas de desenvolvimento deste trabalho; ao Laboratório de Geotecnia da Faculdade de Engenharia Civil da Universidade Federal de Uberlândia, em especial à Profa Dra Maria Elisa B. Rezende e ao técnico Valdemiro Paulino Lima, pelo apoio na elaboração dos ensaios geotécnicos de laboratório nos materiais inconsolidados e na discussão dos resultados obtidos; aos colegas do Departamento de Geotecnia da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo, em especial ao Prof. Dr. Lázaro Valentim Zuquette, pelas valiosas sugestões apresentadas; aos colegas Prof. Dr. Luiz Nishiyama, Prof. Dr Antonio Giacomini Ribeiro e Prof. Dr. Adriano Rodrigues dos Santos, da Universidade Federal de Uberlândia, pelo incentivo e apoio constante nas várias etapas de desenvolvimento deste trabalho; ao Laboratório de Climatologia da Universidade Federal de Uberlândia pelo acesso propiciado aos dados climatológicos; ao Laboratório de Geoprocessamento da Universidade Federal de Uberlândia pelo uso de instalações e equipamentos; à CEMIG – Companhia Energética de Minas Gerais, nas pessoas dos colegas geólogos Marcos Luis Vasconcellos e Romildo Dias Moreira Filho, pela obtenção das fotografias aéreas utilizadas neste trabalho; à Fabiana Melo de Farias pelo apoio prestado na confecção dos mapas e cartas; à Tânia de Novais Silveira, pela revisão dos originais do trabalho; à Maria Enide, minha mulher, Pedro e Gabriela, meus filhos, pela compreensão, paciência, dedicação e amor, cedendo momentos de convívio e me motivando para completar este trabalho. S U M Á R I O Índice ...................................................................................................................................i Índice de Tabelas ...................................................................................................................... vi Índice de Figuras.......................................................................................................................vii Resumo Abstract 1- Introdução............................................................................................................................01 2- Revisão Bibliográfica ..........................................................................................................05 3- Estado da Arte: Situação atual de ocupação/Recomendações técnicas corretivas ..............26 4- Materiais e Métodos ............................................................................................................38 5- Características Básicas do Meio Físico ...............................................................................42 6- Mapas Básicos Fundamentais .............................................................................................64 7- Cartas Derivadas e Interpretativas.....................................................................................112 8- Conclusões e Recomendações ...........................................................................................127 9- Referências Bibliográficas ................................................................................................130 i ÍNDICE 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................................01 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ..........................................................................................05 2.1 Histórico ................................................................................................................05 2.2 Pequenos reservatórios/barragens..........................................................................07 2.3 Recursos hídricos/dimensionamento de reservatórios ...........................................08 2.4 Assoreamento em reservatórios .............................................................................13 2.5 Microcentrais hidrelétricas ....................................................................................18 2.6 Aplicação dos conhecimentos geológicos e do mapeamento geotécnico como ferramenta para avaliações ambientais ..................................................................21 2.7 Das leis vigentes/orgãos reguladores .....................................................................23 2.7.1 Generalidades ........................................................................................................23 2.7.2 Das águas ...............................................................................................................23 2.7.3 Do meio ambiente ..................................................................................................24 3 ESTADO DA ARTE: SITUAÇÃO ATUAL DE OCUPAÇÃO/RECOMENDAÇÕES TÉCNICAS CORRETIVAS ..................................26 3.1 Generalidades ........................................................................................................26 3.2 Impacto da ocupação nos vales com campos hidromórficos .................................26 3.3 Impacto da ocupação nos vales comuns com ou sem vegetação ciliar..................28 3.4 Técnicas construtivas praticadas............................................................................29 3.5 Projeto/técnicas construtivas adequadas ................................................................33 3.6 Jazidas ....................................................................................................................34 3.7 Condições de conservação e manutenção ..............................................................35 4 MATERIAIS E MÉTODOS..............................................................................................38 4.1 Materiais utilizados................................................................................................38 ii 4.2 Método ...................................................................................................................39 4.2.1 Levantamento e produção de informações ............................................................39 4.2.2 Elaboração dos mapas fundamentais básicos ........................................................39 4.2.3 Amostragem, ensaios de laboratório e leituras de vazões em canais fluviais .......40 4.2.4 Elaboração de cartas derivadas interpretativas ......................................................40 5 CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DO MEIO FÍSICO .....................................................42 5.1 Localização e vias de acesso..................................................................................42 5.2 Geologia Regional .................................................................................................43 5.2.1 Embasamento Arqueano ........................................................................................45 5.2.2 Grupo Araxá ..........................................................................................................45 5.2.3 Grupo Canastra ......................................................................................................46 5.2.4 Grupo São Bento....................................................................................................46 5.2.4.1 Formação Botucatu................................................................................................46 5.2.4.2 Formação Serra Geral............................................................................................47 5.2.5 Domos Básico-Alcalinos .......................................................................................48 5.2.6 Grupo Bauru ..........................................................................................................48 5.2.6.1 Formação Uberaba .................................................................................................49 5.2.6.2 Formação Adamantina ...........................................................................................49 5.2.6.3 Formação Marília...................................................................................................50 5.2.7 Sedimentos Cenozóicos .........................................................................................51 5.3 Geomorfologia Regional .......................................................................................53 5.4 Vegetação ..............................................................................................................54 5.5 Nascentes d' água e origem dos campos hidromórficos ........................................57 5.6 Análises climatológicas .........................................................................................60 6 MAPAS BÁSICOS FUNDAMENTAIS ...........................................................................64 iii 6.1 Mapa do substrato rochoso ....................................................................................64 6.1.2 Procedimento para a elaboração dos mapas do substrato rochoso e de materiais inconsolidados .......................................................................................................64 6.1.2.1 Caracterização do limite rocha x materiais inconsolidados...................................64 6.1.3 Unidades do substrato rochoso ..............................................................................67 6.1.3.1 Grupo Araxá ..........................................................................................................67 6.1.3.2 Formação Botucatu................................................................................................68 6.1.3.3 Formação Serra Geral............................................................................................69 6.1.3.4 Formação Marília...................................................................................................70 6.2 Mapa de landforms ................................................................................................72 6.2.1 Sistemática adotada ...............................................................................................72 6.2.2 Sistema A - Áreas de entalhamento fluvial acentuado, com alta freqüência de canais e talvegues, predominantemente de alta declividade..................................73 6.2.3 Sistema B - Áreas medianamente entalhadas, com média a alta freqüência de canais e talvegues predominantemente de média declividade...............................81 6.2.4 Sistema C - Áreas de topos aplanados, com relevo pouco entalhado, com média a baixa freqüência de canais e talvegues de baixa a média declividade ................85 6.3 Mapa de materiais inconsolidados .........................................................................89 6.3.1 Definição das unidades de materiais inconsolidados com base na avaliação de landforms...............................................................................................................89 6.3.2 Amostragem sobre materiais inconsolidados ........................................................91 6.3.3 Ensaios de laboratório sobre materiais inconsolidados .........................................92 6.3.4 Unidades de materiais inconsolidados ...................................................................93 6.3.4.1 Materiais inconsolidados residuais ........................................................................94 6.3.4.2 Materiais inconsolidados retrabalhados.................................................................98 6.3.4.3 Análise dos resultados dos ensaios de laboratório executados nos materiais inconsolidados .....................................................................................................103 6.4 Mapa de uso e ocupação atual do solo .................................................................105 6.4.1 Generalidades ......................................................................................................105 iv 6.4.2 Materiais e técnicas utilizadas .............................................................................105 6.4.3 Resultados obtidos ...............................................................................................106 6.5 Mapa da rede de drenagem, bacias de terceira ordem e balizamento de dados hidrológicos regionais e locais.............................................................................107 6.5.1 Generalidades ......................................................................................................107 6.5.2 Resultados obtidos ...............................................................................................109 6.5.3 Análise dos resultados .........................................................................................110 7 CARTAS DERIVADAS INTERPRETATIVAS ............................................................112 7.1 Generalidades ......................................................................................................112 7.2 Carta de declividade ............................................................................................112 7.3 Carta de declividade generalizada .......................................................................113 7.3.1 Resultados ............................................................................................................114 7.4 Carta de predisposição à erosão...........................................................................115 7.4.1 Generalidades ......................................................................................................115 7.4.2 Obtenção ..............................................................................................................115 7.4.3 Resultados ............................................................................................................119 7.4.4 Análise dos resultados .........................................................................................120 7.5 Carta de avaliação geoambiental do meio físico para implantação de pequenos reservatórios superficiais de água ........................................................................121 7.5.1 Procedimentos para elaboração ...........................................................................121 7.5.2 Resultados obtidos ...............................................................................................124 8 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES .......................................................................127 9 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................130 v Apêndice Resultados de ensaios de laboratório obtidos para os materiais inconsolidados Anexos 1- Mapa de documentação 2- Mapa do substrato rochoso 3- Mapa de landforms 4- Mapa de materiais inconsolidados 5- Mapa de uso e ocupação atual do solo 6- Mapa da rede de drenagem, bacias de terceira ordem e balizamento de dados hidrológicos regionais e locais 7- Carta de declividade generalizada 8- Carta de predisposição à erosão 9- Carta de avaliação geoambiental para implantação de pequenos reservatórios superficiais de água vi ÍNDICE DE TABELAS Tabela 01 Dimensionamento de vertedores para pequenas barragens ...................................32 Tabela 02 Distribuição municipal da área estudada ...............................................................43 Tabela 03 Dados climatológicos.............................................................................................61 Tabela 04 Resultados de evaporação obtidos no Tanque Classe A........................................63 Tabela 05 Graus de coerência para classificação geotécnica .................................................65 Tabela 06 Graus de alteração para classificação geotécnica ..................................................66 Tabela 07 Processos, atributos e suas características para definição das unidades dos materiais inconsolidados........................................................................................90 Tabela 08 Relação entre as unidades de terreno e os materiais inconsolidados .....................91 Tabela 09 Resultados de ensaios sobre o material da unidade RpMA ...................................94 Tabela 10 Resultados de ensaios sobre o material da unidade RMA .....................................95 Tabela 11 Resultados de ensaios sobre o material da unidade RSG ......................................96 Tabela 12 Resultados de ensaios sobre o material da unidade RGA......................................97 Tabela 13 Resultados de ensaios sobre o material da unidade Arg-A....................................98 Tabela 14 Resultados de ensaios sobre o material da unidade Arg-B....................................99 Tabela 15 Resultados de ensaios sobre o material da unidade Arg-C..................................100 Tabela 16 Resultados de ensaios sobre o material da unidade Arg-D..................................101 Tabela 17 Resultados de ensaios sobre o material da unidade Ar ........................................102 Tabela 18 Valores médios de rendimento específico (COPASA, 1993) ..............................108 Tabela 19 Atribuição de pontos para os atributos do meio físico para a confecção da carta de predisposição à erosão............................................................................118 vii ÍNDICE DE FIGURAS Figura 01 Esquema do ciclo hidrológico ................................................................................09 Figura 02 Modelo de descarga regularizada ...........................................................................11 Figura 03 Tipos de erosão.......................................................................................................14 Figura 04 Gráfico da velocidade crítica de erosão .................................................................15 Figura 05 Deposição esquemática de um sistema fluvial.......................................................17 Figura 06 Seqüência fundamental dos vários níveis de informações relativas ao meio ambiente.................................................................................................................23 Figura 07 Reservatório instalado em canal de drenagem com campo hidromórfico (Vereda) .................................................................................................................27 Figura 08 Reservatório instalado em canal de drenagem com campo hidromórfico (Vereda) .................................................................................................................27 Figura 09 Reservatório instalado em canal de drenagem comum ..........................................29 Figura 10 Excesso de fluxo d'água no talude de jusante da barragem....................................31 Figura 11 Vertedor "geminado" ao corpo da barragem..........................................................32 Figura 12 Processo erosivo instalado no talude de jusante da barragem................................36 Figura 13 Detalhe da Figura 12 ..............................................................................................36 Figura 14 Processo erosivo instalado no talude de montante da barragem............................37 Figura 15 Fluxograma dos documentos cartográficos produzidos .........................................41 Figura 16 Mapa de localização da área estudada....................................................................42 Figura 17 Coluna estratigráfica do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba ...............................52 Figura 18 Distribuição dos Cerrados no Brasil.......................................................................55 Figura 19 Formas de ocorrência da água subsuperficial na região de Uberlândia (MG) .......58 Figura 20 Balanço hídrico da área estudada ...........................................................................62 Figura 21 Micaxisto do Grupo Araxá .....................................................................................68 Figura 22 Basalto da Formação Serra Geral...........................................................................70 Figura 23 Arenito conglomerático da Formação Marília, medianamente coerente ...............71 viii Figura 24 Arenito conglomerático da Formação Marília, muito coerente .............................72 Figura 25 Área de entalhamento fluvial profundo (Sistema A) .............................................73 Figura 26 Perfil típico da Unidade A1 ....................................................................................75 Figura 27 Perfil formado na região de contato dos litotipos das Formações Marília e Serra Geral (Unidade A2) ...............................................................................................77 Figura 28 Perfil típico da Unidade A2 ....................................................................................77 Figura 29 Perfil típico da Unidade A3 ....................................................................................79 Figura 30 Perfil típico da Unidade A4 ....................................................................................80 Figura 31 Área medianamente entalhada (Sistema B) ...........................................................81 Figura 32 Superfície escarpada que configura a Unidade B2 .................................................84 Figura 33 Área com relevo pouco entalhado ..........................................................................86 Figura 34 Formas de desenvolvimento de processos erosivos .............................................116 Figura 35 Fluxograma para elaboração da carta de predisposição à erosão .........................117 Figura 36 Sistema de derivação de água proposto para implantação de reservatórios fora de áreas de preservação permanente (Vereda) .............................................122 Figura 37 Reservatório construído fora de áreas de preservação permanente (Vereda) ......125 Figura 38 Detalhe do canal lateral de derivação na entrada do reservatório ........................125 LISTA DE ABREVIAÇÕES E SIGLAS ABGE – Associação Brasileira de Geologia de Engenharia ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas ANEEL – Agência Nacional de Energia Elétrica CONAMA – Conselho Nacional do Meio Ambiente COPASA – Companhia de Saneamento de Minas Gerais CPFL – Companhia Paulista de Força e Luz (São Paulo) DAEE – Departamento de Águas e Energia Elétrica (São Paulo) DNAEE – Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica DNMET – Departamento Nacional de Meteorologia DNPM – Departamento Nacional de Produção Mineral EESC – Escola de Engenharia de São Carlos ELETROBRÁS – Centrais Elétricas Brasileiras EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária GCO – Geotechnical Control Office IAEG – International Association of Engineering Geology IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IEF – Instituto Estadual de Florestas (Minas Gerais) IGAM – Instituto Mineiro de Gestão das Águas IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo LCRH – Laboratório de Climatologia e Recursos Hídricos do Instituto de Geografia (Universidade Federal de Uberlândia-MG) NBR – Norma Brasileira Registrada RADAM – Radar da Amazônia (Projeto) SBG – Sociedade Brasileira de Geologia UFU – Universidade Federal de Uberlândia USAF – United States Air Force USP – Universidade de São Paulo LISTA DE UNIDADES UTILIZADAS kW – quilowatt MW - megawatt γ s= massa específ ica dos sól idos LL= limite de liquidez LP= limite de plasticidade Wot= umidade ótima γ d = massa específica seca máxima RESUMO A região ocupada pelo bioma Cerrado, no Triângulo Mineiro, a partir das últimas três décadas, vem experimentando um acelerado processo de expansão agrícola/pecuária. A crescente necessidade hídrica para este desenvolvimento implicou a construção de inúmeros pequenos reservatórios superficiais de água dentro dos canais de drenagem em bacias de até 3 ordem. Este tipo de ocupação antrópica, normalmente feita sem um conhecimento adequado tanto do meio físico como das técnicas construtivas, vem contribuindo para o surgimento de diversos problemas ambientais. Este trabalho apresenta o estudo sobre esta ocupação dentro deste bioma, realizado em uma superfície de 2918,89 km2, pertencente à folha de Tupaciguara-MG, em escala regional de 1:100.000. Inicialmente, foi produzido um levantamento de campo sobre os aspectos construtivos empregados para a confecção destes pequenos reservatórios. Em paralelo, foi desenvolvido um estudo sobre o conjunto de atributos do meio físico, adotando-se os procedimentos de mapeamento geotécnico e tendo como base a proposta metodológica de ZUQUETTE (1987 e 1993), representado em 6 documentos cartográficos básicos. A seguir, procedeu-se à análise e sistematização dos documentos cartográficos produzidos na fase anterior, resultando em dois novos documentos cartográficos (carta de declividade generalizada e carta de predisposição à erosão). A caracterização geotécnica dos materiais inconsolidados, realizada a partir de ensaios de laboratório, possibilitou a determinação da textura, massa específica dos sólidos, limites de consistência, compactação e permeabilidade. Finalmente, a análise conjunta de todos os documentos produzidos nas fases anteriores gerou a carta de avaliação geoambiental, que indica as potencialidades e as limitações para este tipo de ocupação no ambiente específico. Palavras-chave: meio físico; reservatório; mapeamento geotécnico; avaliação geoambiental ABSTRACT The region occupied by the environment of the “Brazilian Cerrado”, a typical vegetation from the west of Minas Gerais State which is called “Triângulo Mineiro”, since the last three decades, has been experiencing a quick process of agricultural and cattle raising expansion. The increasing hydric necessity for this developing led to the construction of many small superficial water dams inside the draining channels for bays until the 3rd order. This type of human occupation, usually done without an appropriate knowledge from either the physical medium or the constructive techniques, has been contributing for the appearance of several environmental problems. This work presents the studies about the occupation inside this environment, which is done over an area of 2918,89 km2, belonging to the chart of “Tupaciguara-MG”, using a regional scale of 1:100000. Initially, it was done a field research about constructive issues applied for the construction of these small dams. As a parallel work, it was developed a study about the set of features of the physical medium, using the procedures of geotechnical charting and based upon the methodological proposal of ZUQUETTE (1987 and 1993), presenting 6 basic cartographic documents. Afterwards, it was done the analysis and systematization of the cartographic documents developed on the former phase and the result was two new cartographic documents (general sloping chart and erosion tendency chart). The geotechnical description of the unconsolidated materials, which was done using laboratory tests, made possible the determination of the texture, specific solid masses, consistence limits, compactation and permeability. Finally, the analysis of all the documents together produced on the former phases generated the geoenvironmental evaluation chart that indicates the possibilities and limitations for this specific environmental occupation. Keywords: physical medium; dam; geotechnical charting; geoenvironmental evaluation 1 1- INTRODUÇÃO Durante um longo tempo da história humana os recursos hídricos foram utilizados praticamente para a dessedentação humana e de animais e para usos domésticos. Com o desenvolvimento da civilização, outros tipos de usos foram surgindo, destacando-se o consumo para infra-estrutura social, agricultura e processamento industrial e energético, tornando a água um recurso estratégico e escasso, sendo que essa escassez, eventualmente, pode estabelecer conflitos entre os usuários. O continente Sul-americano está situado no interior da maior concentração de águas oceânicas do planeta e, simultaneamente, frente a um sistema de circulação atmosférica favorável; produz, em conseqüência, disponibilidades hídricas superficiais bastante elevadas. Essa situação privilegiada é observada no território brasileiro, que apresenta áreas de escassez relativamente limitadas e pouco significativas, quando comparadas com os padrões mundiais. Muito embora esta situação seja benéfica para o Brasil, ficou registrada a falsa idéia de fartura e o equívoco de considerar a água como um recurso ilimitado e de baixo valor econômico. Entretanto, nos dias atuais, embora com algum atraso, ocorre uma percepção clara de que os recursos hídricos, quando disponíveis em quantidade e qualidade, devem ser objeto de planejamento econômico e social. Por outro lado, em locais onde as disponibilidades hídricas são escassas ou mal empregadas, essa deficiência compromete o bem estar e a segurança das sociedades envolvidas. Qualquer tipo de barramento transversal a um curso d’água superficial, genericamente chamado de barragem, provocará a formação de um lago ou reservatório na sua porção de montante. Reservatórios desempenham papel de extrema importância no projeto e operação de sistemas hídricos e, caso não cumpram seus objetivos de garantir descargas regularizadas compatíveis com o desenvolvimento dos outros componentes com os quais interagem, todos os recursos investidos em sua construção, além daqueles investidos em outros 2 componentes, deles dependentes, ficam comprometidos. O armazenamento de água em reservatórios superficiais tem por finalidade precípua acumular água ou formar reservas nos períodos de excesso de água ou estação úmida para fornecer reservas previamente formadas nos períodos de escassez ou de estação seca. Há milhares de anos o homem vem construindo barramentos em cursos d’água, visando à sua acumulação para uma série de finalidades, sendo que no decorrer desse tempo ocorreram inúmeros acidentes neste tipo de obra. A análise da experiência desses acidentes, somada ao conhecimento adquirido pelo homem para o seu desenvolvimento tecnológico, vem permitindo a evolução das técnicas de projeto, construção e de operação, principalmente para as grandes barragens. O Brasil, devido à grande experiência acumulada nessa área nos últimos 40 anos, faz parte do seleto grupo dos países mais desenvolvidos dentro da atividade de implementação de grandes barragens. Entretanto, a prática tem mostrado uma realidade totalmente diferente para os pequenos barramentos (barragens rurais), especialmente aqueles implantados em bacias de até 3 ordem. Neste caso o Brasil, assim como muitos países em desenvolvimento, apresentam uma carência muito grande de estudos do meio físico (atributos) para a implantação desse tipo de obra. Técnicas construtivas inadequadas, falta de investigação do subsolo, pouco conhecimento geotécnico dos materiais de construção empregados (ocasionando freqüentemente acidentes devido ao rompimento desses pequenos barramentos), degradação da qualidade da água pela decomposição da vegetação não retirada da área inundada, destruição de matas ciliares, ocupação de ambientes de Veredas, super-explotação de determinadas bacias, desenvolvimento de processos erosivos e assoreamento de reservatórios são alguns tipos de degradação ambiental ocasionados por esta ação antrópica desordenada. 3 O meio físico ou geoambiente, no qual estão incluídos solo, rocha, relevo, água, ar e suas diferentes combinações, pode ser considerado o suporte para todas as formas de vida sobre a superfície da Terra e, ao mesmo tempo, o cenário de todas as atividades humanas. O meio físico e o meio biótico coexistem em uma relação de interdependência, excetuando o homem como componente do meio biótico para formar um meio próprio, designado meio antrópico. A interferência do meio antrópico sobre os outros meios naturais, físico e biótico, rompe o estado de equilíbrio estabelecido ao longo da história evolutiva da superfície da crosta terrestre e por conseqüência o do planeta como um todo. Apesar de os processos geológicos externos atuarem naturalmente no planeta, quando acelerados pela ação antrópica seus efeitos são imediatos e, quase sempre, podem manifestar-se de maneira catastrófica. Esses desequilíbrios do meio físico ou do geoambiente são denominados problemas geoambientais. A área escolhida para o desenvolvimento do estudo apresentado, assim como quase toda a região do Triângulo Mineiro, está inserida no ambiente denominado Cerrado, que apresenta características topográficas, litológicas e de vegetação bastante peculiares e muito frágeis quando submetidas a atividades antrópicas desordenadas. Essa região, durante os últimos 30 anos, vem sofrendo intensas transformações, passando das tradicionais atividades de pecuária extensiva, agricultura itinerante e extrativismo para um acelerado processo de desenvolvimento da agropecuária, de monoculturas tecnicizadas, inicialmente com a implantação de reflorestamentos e mais recentemente com vários tipos de culturas, principalmente as de soja, café, feijão e milho. Particularmente o município de Monte Alegre de Minas, que tem parte de sua extensão territorial abrangida pela área de estudo, tem na cultura do abacaxi sua maior fonte de renda. A competitividade agrícola do Cerrado passa pelos processos de correção de acidez do solo, adubação e irrigação. A multiplicação de implantação de pequenos reservatórios superficiais de água, visando suprir as necessidades hídricas para este desenvolvimento, 4 vem provocando, ao longo deste curto espaço de tempo, transformações danosas ao meio físico do Cerrado no Triângulo Mineiro. Com esta premissa de racionalização do uso sustentável dos recursos hídricos superficiais em ambiente de Cerrado, este trabalho apresenta procedimentos metodológicos para a implantação de pequenos reservatórios superficiais de água, empregando os conhecimentos de geologia, geotecnia, do mapeamento geotécnico e a análise ambiental. Como estes reservatórios podem ter usos múltiplos, aponta os locais com condições favoráveis para a implantação de microcentrais hidrelétricas para suprir as necessidades das pequenas propriedades rurais, com capacidade de geração de até 100 kW. 5 2 - REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 Histórico De maneira genérica, a prática de construção de reservatórios superficiais de água sempre foi universal. Onde quer que o clima fosse alternadamente e por longos períodos seco e chuvoso, as barragens e reservatórios se tornavam uma necessidade, se o objetivo fosse o de cultivar o solo durante o ano todo. CULLEN (1964) descreve que os povos primitivos devem ter-se baseado no trabalho dos castores, certamente os primeiros construtores de barragens na natureza. Esses pequenos roedores, parentes dos ratos, camundongos e esquilos, aquáticos por natureza, disseminaram a sua técnica nos vários locais em que habitam no planeta. O propósito do castor, ao construir uma barragem, é criar um reservatório de água onde ele e sua família possam viver, longe de seus predadores. CULLEN (1964), SMITH (1971) e SCHNITTER (1994) relatam a história do desenvolvimento da técnica de construção de barragens ao longo da evolução humana, desde as civilizações antigas (Egito, Grécia, Turquia, Iraque e China), passando pelo império romano, mundo árabe, leste da Ásia medieval, Europa medieval e pós-medieval, até o século XX, com a construção das grandes barragens para geração de energia elétrica. A partir do momento em que a civilização humana passa de coletor para produtor do seu próprio alimento, percebe-se a necessidade da irrigação para o desenvolvimento da agricultura. Segundo BUTZER (1976), as primeiras evidências de barramentos para sistema de irrigação são do Egito, mais especificamente no vale do rio Nilo, há aproximadamente 3100 anos AC. Entretanto, as ruínas da mais antiga barragem, a Sadd-el-Kafara (em árabe: Sadd = fechado) foram descobertas, em 1885, pelo arqueólogo alemão Schweinfurth. Essa barragem foi construída no Egito, na ravina Garawi, próximo a Memphis, durante a 3a ou 4a dinastia, entre 2950 e 2750 anos a.C., no início da Idade da Pirâmide. A finalidade desse reservatório possivelmente tenha sido o abastecimento de água potável. Além do Egito, as regiões da Mesopotâmia e da China, que foram centros de civilizações altamente 6 desenvolvidas, milhares de anos antes de terem surgido a Europa e América, certamente abrigaram as primeiras experiências para a confecção de técnicas para barramentos de cursos d’água. Enquanto no Egito e na vizinha Mesopotâmia as barragens eram construídas para fins de irrigação e para formar reservatórios, na China o principal objetivo era o de evitar enchentes, muito embora também cuidassem de instalar sistemas de irrigação. A evolução da civilização humana ao longo do tempo, na necessidade de produzir seu alimento, indica que a idéia das barragens ocorre, simultânea e independentemente, em várias partes do mundo. No hemisfério Ocidental, por exemplo, antes do advento do homem branco, não existia comércio com as outras nações do mundo, mais antigas, e nem maneira de conhecer os seus segredos sobre construção de barragens. No entanto, canais de irrigação e reservatórios foram construídos pelos astecas no México e por outros povos do Novo Mundo. Os indígenas da árida região sudoeste dos Estados Unidos da América construíram pequenos diques para irrigação, há aproximadamente 1000 anos. Além das finalidades de irrigação, armazenamento de água e contenção de enchentes, aproximadamente dois séculos a.C. o homem aprendeu a captar a energia da água corrente, inicialmente para mover moinhos, que produziam a moagem dos cereais. A era dos pequenos diques de moinho tem grande importância na história tecnológica da humanidade, na medida em que marcou a transição entre o emprego da energia animal e da mecânica. Finalmente, no século XIX, o homem constata que a força dos rios podia ser captada para mover turbinas que iriam gerar eletricidade. O século XX marca o início da era da construção das grandes barragens para geração de energia elétrica. A crescente demanda populacional implica a maior produção de alimentos e esta produtividade agrícola depende fundamentalmente da irrigação. Portanto, durante a evolução da humanidade, mesmo com o advento da era das grandes barragens, as pequenas barragens continuam sendo 7 construídas predominantemente para armazenar água para a irrigação e dessedentação de animais, muito embora também sirvam para outras finalidades, como recreação, controle de enchentes, piscicultura, abastecimento de cidades e mesmo para geração de energia elétrica. 2.2 Pequenos Reservatórios/Barragens Publicações clássicas sobre o assunto, mesmo direcionadas para a construção de grandes barragens, tais como a de fundamentos de mecânica dos solos, de TAYLOR (1948); CASAGRANDE (1964), que trata da percolação de água através da barragem de terra; BOLTON (1979), que apresenta o guia de mecânica dos solos; FELL et al. (1992), geotecnia de barragens de terra, são considerados trabalhos fundamentais também para o aperfeiçoamento do desenvolvimento de projetos e métodos construtivos de pequenas barragens. O mesmo raciocínio se aplica ao trabalho de HOEK & BRAY (1974), um clássico sobre estabilidade de taludes em rocha. O BUREAU OF RECLAMATION (1972) publica normas, instruções e procedimentos para projetos de pequenas barragens (com altura menor que 15,00 metros). Essa obra completa uma publicação anterior, editada em 1938 pelo National Resources Committee. WINGETER (1966) e SOUZA (1971) tecem considerações sobre hidráulica e a parte sanitária de pequenas barragens. BROWN (1958) apresenta considerações sobre obras de terra e enrocamento e engenharia hidráulica para implantação de pequenas barragens hidrelétricas. HARRIS (1957) relata algumas formas de utilização da irrigação a partir de pequenos reservatórios. No interior da região Nordeste do Brasil, situada em regime de clima semi-árido, a construção de reservatórios de água tem importância vital. 8 Nesse sentido, FALCÃO & BORGES (1974) apresentam uma cartilha para a construção de pequenas barragens de terra. Ainda dentro deste enfoque, MOLLE & CADIER (1992) indicam inicialmente como construir e preservar um pequeno açude e posteriormente como aproveitar o açude, com usos domésticos, cultivos de vazante, piscicultura e irrigação. MIRANDA (1988) desenvolve pesquisa sobre a compactação de solos residuais provenientes de rochas gnáissicas utilizados para construção de pequenas barragens de terra no Nordeste brasileiro. MEDEIROS (1986) apresenta propostas para estudos geológico- geotécnicos de fundações de pequenas barragens na região do semi-árido. PARRA (1986) divulga um trabalho contendo informações sobre projeto de pequenas barragens de aterro. O DAEE (1992), em conjunto com a Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, oferece um curso sobre projeto de pequenas barragens (com até 20,0 metros de altura). BOWEN (1984) e BLYTH & FREITAS (1984) destacam a importância dos conhecimentos geológicos para o projeto e a construção de barragens e reservatórios. 2.3 Recursos Hídricos/Dimensionamento de Reservatórios O ciclo hidrológico, esquematicamente representado na Figura 01, engloba todas as formas de ocorrência e distribuição e os processos de circulação de água, em todas as fases e estágios. TUCCI et al. (1993) mencionam que o ciclo hidrológico só é fechado em nível global. Os volumes evaporados em um determinado local do planeta não precipitam necessariamente no mesmo local, porque há movimentos 9 contínuos, com dinâmicas diferentes, na atmosfera e também na superfície terrestre. Nuvens Nuvens Vapor de Água na Atmosfera P er co la çã o A sc en çã o C ap ila r Umidade do Solo Evapo-transpiração P re ci pi ta çã o so br e os o ce an os E va po ra çã o do s O ce an os R io s In fil tr aç ão Escoamento Superficial E va po ra çã o de r io s e la go s P re ci pi ta çã o so br e a te rr a T ra ns pi ra çã o Neve derretida Neve Evaporação Intercepção Evaporação da chuva LENÇOL SUBTERRÂNEO OCEANOS Figura 01 - Esquema do ciclo hidrológico (PINTO et al. 1976) Para PINTO et al. (1976), esse ciclo forçosamente incompleto não deve conduzir a uma idéia simplista do fenômeno, em realidade extremamente complexo. A “história” de cada gotícula de água pode variar consideravelmente, de acordo com as condições particulares com que se defronte em seu movimento. Em seu conjunto, entretanto, a contínua circulação que se processa às custas da energia solar mantém o balanço entre o volume de água na terra e a umidade atmosférica. 10 A complexidade desses fenômenos naturais evidencia as dificuldades que cercam a análise dos reservatórios. Devido ao caráter estocástico dos futuros deflúvios superficiais, as decisões a serem tomadas são feitas sob condições de incerteza, normalmente direcionando avaliações futuras em função de aspectos probabilísticos. RIPPL (1883) foi o primeiro a discutir o problema da definição do volume útil a ser previsto num reservatório, para que a vazão regularizada seja igual à média dos deflúvios afluentes. A verdadeira natureza probabilística do problema, pelo menos no tocante aos deflúvios afluentes, foi reconhecida por HAZEN (1914). Os trabalhos de SUDLER (1927), FELLER (1951), MORAN (1954) e HURST (1965) apud HERMANN (1971) são considerados de grande importância para o entendimento de assunto tão complexo. Como as futuras condições hidrológicas não são conhecidas exatamente, HERMANN (1971) sugere que o valor da descarga regularizada Dm, apontada no modelo apresentado na Figura 02, deve ser interpretado como uma meta a ser atingida, caso exista água armazenada em quantidade suficiente. Caso contrário, esse valor será o limite superior da descarga a ser efetivamente realizada. O conhecimento da vazão efetivamente descarregada só pode ser atingido no fim do período em consideração, após a observação do deflúvio afluente. A Figura 02 indica que no trecho AO, onde a água disponível não é suficiente para atingir a meta Dm, todo o volume disponível é descarregado. No intervalo AB a descarga efetiva coincide com a meta Dm. Além do ponto B, com o enchimento do reservatório, haverá extravasamento pelo vertedor. O problema do planejador é escolher os Dm de maneira a propiciar condições ótimas de funcionamento ao sistema. O mesmo autor indica que a condição física que deve ser integralmente satisfeita na análise de reservatórios é a equação das massas ou da continuidade, apresentada a seguir: Vm+1 = Vm + Im – Dm – Sm –Pm 11 onde: Vm = volume útil armazenado no começo do período m; Im = deflúvio afluente ao reservatório durante o período m; Dm = descarga regularizada durante o período m; Sm = volume extravasado durante o período m; Pm = perdas no reservatório durante o período m. Descarga regulari- zada 45° Dm 45° O A B Volume armazenado + Deflúvio afluente Figura 02 - Descarga regularizada efetiva durante o período m (HERMANN, 1971) ZAHED (1984) sugere algumas metodologias para o dimensionamento e operação de reservatórios. GENOVEZ (1987) desenvolve estudos sobre a regularização de vazões em pequenas bacias com dados esparsos. A COPASA (1993) apresenta estudo detalhado sobre os deflúvios superficiais para todo o estado de Minas Gerais. Esta publicação, baseada em dados históricos coletados no período compreendido entre os anos de 1939 a 1989, em postos hidrométricos instalados em vários pontos do Estado, permite um balizamento regional sobre os valores de deflúvios superficiais. Divulga ainda que, como regra geral, os reservatórios costumam ser projetados e construídos com o objetivo de garantir taxas de regularização situadas na 12 faixa de 65 a 85% da vazão média de longo termo. Excepcionalmente, podem ser cogitadas taxas de regularização mais elevadas, na faixa de 85 a 95%, sendo que, acima desse limite máximo, os volumes do reservatório sobem exageradamente e conduzem à inviabilidade do empreendimento. Por outro lado, na maioria das situações, taxas de regularização inferiores a 65% já situam as vazões regularizadas na mesma ordem de grandeza das ocorrências mínimas naturais e o empreendimento passa a funcionar, praticamente, a fio d’água. A evaporação laminar é outro importante fator a ser considerado no planejamento/dimensionamento de reservatórios. Entende-se por evaporação o processo pelo qual se dá a conversão da água líquida para vapor d’água. Segundo o DNMET (1977), a temperatura, a velocidade do vento e a umidade na superfície são os fatores que afetam a razão de evaporação de qualquer corpo da superfície, muito embora a variação desses valores com a altitude também seja importante. A evaporação nas superfícies líquidas é afetada também pelo estado da superfície adjacente, profundidade da lâmina d’água e pelo caráter da superfície. Impurezas e vegetação na água também afetam a evaporação. Por causa dessas variantes, o DNMET (1977) considera que a medida de evaporação é mais difícil de se determinar do que a da precipitação, pois valores fidedignos da perda de água da superfície da terra sobre áreas de extensão apreciável ainda não foram obtidos. O WMO – World Meteorological Organization (1966) apresenta amplo trabalho sobre métodos de medida e estimativa da evapotranspiração e da evaporação de reservatórios e canais navegáveis. PEDRO JUNIOR et al. (1987) apresentam as características do Evaporímetro de Piche e do Tanque de Evaporação Classe A, que são os dois instrumentos mais utilizados para medir a evaporação. RIBEIRO & MEDEIROS (2000), em estudo efetuado no ano de 1998, em reservatório superficial de água, no Ribeirão Pantaninho, localizado no município de Nova Ponte, no Triângulo Mineiro, apresentam valores de 13 evaporação variando de 1,4 a 1,6 mm/dia para os meses de maior estiagem (maio a setembro). 2.4 Assoreamento em reservatórios A modificação da velocidade de um curso d’água, provocada pela implantação do sistema barragem/reservatório, pode causar a intensificação da deposição de sedimentos e o conseqüente assoreamento destes locais. CRISTOFOLETTI (1981) salienta que, na dinâmica fluvial, o rio está constantemente em busca de seu perfil de equilíbrio. Com este tipo de ocupação o seu equilíbrio natural é quebrado e irá se estabelecer um novo tipo de equilíbrio. FORNASARI FILHO et al. (1995) apresentam correlação entre interações de obras de engenharia com alterações nos processos do meio físico. No caso de reservatórios, os autores relatam que, em função das oscilações do nível d’água nesses locais, pode ocorrer o fenômeno do assoreamento, sob a influência de solapamento das suas margens, erosão e escorregamentos. Os diferentes tipos de erosões causadas por diferentes agentes podem ser melhor entendidos pelo processo apresentado na Figura 03, proposta por LAL (1990) apud NISHIYAMA (1998). Segundo ANNANDALE (1987), os processos erosivos provocados pela água superficial, que terminam nos canais fluviais, são os mais importantes para os processos de sedimentação em reservatórios. O principal processo erosivo do solo é deflagrado pelas chuvas e compreende basicamente os seguintes mecanismos: impacto das chuvas, que provoca a desagregação das partículas; remoção e transporte pelo escoamento superficial; e deposição dos sedimentos produzidos, formando depósitos de assoreamento. 14 Causada pelo vento Causada por fluidos Causada pela gravidade Água Erosão Glacial Movimento de massa Erosão eólica Chuva Água de escoamento Oceano Avalanche Escorre- Soliflu- Ras- gamento xão tejo Erosão por impacto Erosão costeira das gotas Escoamento Escoamento superficial subsuperficial Erosão em condutos subterrâneos (“pipe”) Erosão em Erosão em Erosão em sulcos ravinas e canais boçorocas fluviais Figura 03 - Tipos de erosão, segundo LAL, 1990 apud NISHIYAMA,1998 (modificado) Medidas de velocidade do fluxo laminar, realizadas em estudoss experimentais de laboratório e de campo, variaram entre 1,5 e 4,0 cm.s-1 (YOUNG & WIERSMA, 1973) apud NISHIYAMA (1998), até 30 cm.s-1 (ELLISON, 1947) apud NISHIYAMA (1998). Velocidades superiores a 16 cm.s-1 seriam necessárias para destacar partículas de 0,3 milimetros de diâmetro (HJULSTR M, 1935), enquanto que velocidades abaixo de 2 cm.s-1 seriam suficientes apenas para transportar partículas em suspensão. A Figura 04 apresenta a posição do processo de erosão em relação aos processos de transporte e deposição. ANNANDALE (1987) considera de fundamental importância o conhecimento da dinâmica do rio e do seu entorno, pois antes da implementação de um reservatório o sistema como um todo tinha uma certa condição de estabilidade. Após a sua implantação a geometria do rio é mudada tanto a montante da barragem, com o aumento do nível de base e o conseqüente depósito progressivo dos sedimentos transportados, como a 15 jusante, pela falta de sedimentos. A diminuição de sedimentos a jusante da barragem também poderá acarretar modificações no comportamento fluvial. Figura 04 - Processos de erosão, transporte e deposição, em função do tamanho da partícula e velocidade do agente (HJULSTR M, 1935) apud ABGE (1998). Segundo a ABGE (1998), o fenômeno do assoreamento é regido pelos fatores clima, geologia, cobertura vegetal, declividade e uso do solo. Regiões de pluviosidade concentradas em períodos muito curtos, cobertura vegetal mínima, topografias acidentadas e rochas sedimentares arenosas ou formações aluvionares com areia e cascalho, associado a pequenos reservatórios em relação à bacia de contribuição, apresentam maior susceptibilidade ao desenvolvimento do fenômeno. São menos importantes em regiões de pluviosidade bem dividida, cobertura vegetal adequada e solos predominantemente argilosos, desde que não submetidos a práticas agrícolas impróprias, as quais, neste caso, passam a constituir o fator essencial. 16 Os sedimentos mais grosseiros, constituídos pelas frações silte, areia e cascalho, depositam-se a partir das cabeceiras do reservatório, à maneira de deltas. Já a porção mais fina silto-argilosa sedimenta-se mais perto da barragem ou é levada para jusante durante as grandes cheias. O mecanismo de formação de deltas tem conseqüências mais sensíveis, uma vez que pode reduzir o volume útil do reservatório. A Figura 05, apresentada por SHUMM (1977), mostra correlação entre o sistema de deposição de sedimentos em um sistema fluvial natural e os sedimentos depositados em um reservatório. Segundo este autor, os princípios que comandam o comportamento da Zona 3 de um rio são os mesmos daqueles em que os sedimentos são depositados em um reservatório. Dentro deste sistema proposto, quanto maior for a intervenção antrópica na zona de produção de sedimentos (desmatamentos, uso inadequado do solo, etc.), maior será a quantidade de produção de sedimentos a serem transportados. BREUSERS et al. (1982) divulgam taxas de carreamento de sedimentos da ordem de 500 a 2000 m3/km2/ano, para regiões desfavoráveis, o que corresponderia a taxas de assoreamento da ordem de 0,5 a 3,0% da capacidade do reservatório considerado, por ano. PONÇANO et al.(1982) mencionam, para a região Sul do Brasil, taxas da ordem de 1,5 e 0,8%, medidas num período de 9 anos, nos reservatórios de Capivari-Cachoeira e Passo Real, respectivamente, indicando condições bem mais favoráveis para estas áreas. BACCARO (1990) constata que, durante a ocupação do Cerrado no Triângulo Mineiro, as valas para divisão de propriedades, o carro de boi utilizado como meio de circulação e o pisoteio do gado contribuíram para provocar problemas atuais de ravinamentos, boçorocamentos, agravando-se os de assoreamento de represas, de empobrecimento dos solos e de diminuição da vazão dos mananciais. 17 Área fonte de sedimentos da Zona 1 bacia Produção controle de montante (clima, diastrofismo e uso do solo) Zona 2 - canal reto Transferência - fluxo meandrante - fluxo entrelaçado Área de deposição de sedimentos Zona 3 controle de jusante Deposição (deltas) (nível de base, diastrofismo) Figura 05 - Sistema fluvial (SHUMM, 1977) CHAMPS (1991) aborda os problemas de assoreamento da represa da Pampulha (MG) e as medidas adotadas para o seu controle. CASTRO (1991) apresenta estudos sobre o assoreamento dos reservatórios de Miguelão, Codorna e Ingleses, no rio do Peixe (MG). COIADO (1993) aborda os problemas de assoreamento e poluição ocorridos no reservatório de Cariobinha-SP (pequeno reservatório com aproveitamento hidrelétrico), desenvolvidos após a urbanização da bacia do Ribeirão Quilombo, nos anos 70, manancial que lhe é afluente. PAIVA (1993) através de pesquisas desenvolvidas na bacia hidrográfica do rio Taquaruçu de Minas (MG), estabelece diretrizes para a avaliação de causas e efeitos de assoreamento de reservatórios, particularmente do reservatório da Usina Hidrelétrica da Cia. Siderúrgica Belgo-Mineira. Procede 18 também à análise de algumas outras bacias hidrográficas da região, a qual tem reservatórios de barragens que estão sendo afetadas por problemas semelhantes. CAMPOS (1994) mostra os mecanismos de transporte de sedimentos em canais fluviais e a sua deposição em reservatórios que barram os escoamentos naturais. COIADO et al. (1994) apresentam estudos experimentais sobre a eficiência de retenção de sedimentos de um pequeno reservatório. OLIVEIRA (1994) aponta a influência de depósitos tecnogênicos com o assoreamento de reservatórios, exemplificando o caso do reservatório da Usina de Capivara. REIS (1995) apresenta metodologia para o estudo e mensuração do processo de assoreamento de reservatórios, utilizando o SIG. 2.5 Microcentrais Hidrelétricas Segundo a ELETROBRÁS/DNAEE (1985), as microcentrais hidrelétricas estão enquadradas dentro da faixa de potência de 1 a 100 kW. Os pequenos reservatórios de águas superficiais, abordados neste trabalho, indicam que a sua utilização para esta finalidade de geração de energia elétrica estaria dentro deste tipo de aproveitamento. A determinação da potência aproveitável é, na realidade, a determinação do potencial máximo que o local escolhido pode fornecer, com as suas características topográficas de desnível (queda natural) e hidrológicas de vazão disponível do curso d’água. Esse potencial em kW pode ser determinado através da seguinte fórmula (ELEBROBRÁS/DNAEE, 1985): 19 Potencial = 7,16 . H . Q onde: 7,16 = fator de capacidade (gravidade x rendimento da turbina x rendimento do gerador x rendimento de instalação) H = queda bruta = diferença de nível entre o nível d’água previsto para o reservatório e o nível d’água do rio no local da casa de máquinas Q = vazão disponível do curso d’água, em m3/s A partir da reestruturação do setor elétrico, configurada pela Lei n° 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, consubstanciada pelo decreto n° 2003, de 10 de setembro de 1996, que regulamentou a figura do autoprodutor e do produtor independente de energia, e a Lei n° 9.427, de 26 de dezembro de 1996, que instituiu a ANEEL, esta nova modalidade de produção de energia elétrica para potencial de até 1000 kW só necessita de um registro neste novo orgão para começar a operar. A lei nº 9.648, de 27/05/1998, autoriza a dispensa de licitações para empreendimentos de até 30 MW de potência instalada, para autoprodutor e produtor independente. Dentro deste contexto, a avaliação geoambiental produzida por este trabalho apresenta considerações sobre os locais com viabilidade de implantação para este tipo de ocupação. A viabilidade econômica destes empreendimentos está vinculada à carência energética e à distância das empresas distribuidoras convencionais. Estimativas de viabilidade econômica poderão ser obtidas nos manuais publicados pela ELETROBRÁS/DNAEE (1985) e ELETROBRÁS (1999). Na área de geração de energia elétrica, VARLET (1961 e 1966) apresenta considerações sobre usinas hidráulicas, barragens e reservatórios. 20 O trabalho de SCHREIBER (1978), embora direcionado às grandes usinas hidrelétricas, conceitualmente é considerado de grande importância também para o projeto e construção de pequenas centrais hidrelétricas. STEADMAN (1978) apresenta um capítulo direcionado à energia hidráulica de pequena escala. A ELETROBRÁS/DNAEE (1982; 1984 e 1985) publicam os manuais de pequenas, minis e micros centrais hidrelétricas, com faixas de potência de geração respectivamente de 1000 a 10000 kW, 100 a 1000 kW e 1 a 100 kW. No ano de 1999 este mesmo órgão (ELETROBRÁS, 1999) publica atualização destes manuais. Vários manuais estrangeiros, tais como: HAMM (1967); ALWARD et al. (1979); NOYES (1980); INVERSIN (1986) e HARVEY (1993) também complementam o assunto. Uma das antigas companhias elétricas estaduais de energia elétrica de São Paulo, a CPFL, no ano de 1987, promove um seminário sobre o futuro da energia, direcionado às pequenas centrais hidrelétricas. A ELETROBRÁS (1994) promove um curso sobre a problemática do desenvolvimento de pequenas centrais hidrelétricas – PCH no Brasil, para implantar o modelo “hidro-agro-energético”, baseado no modelo chinês. No ano de 1997 é criado o Centro Nacional de Referência em Pequenos Aproveitamentos Hidroenergéticos, que fica localizado na Escola Federal de Engenharia de Itajubá (MG). Esse Centro tem por finalidade promover a divulgação de referências, através de rede de informação, sobre: programas, projetos, pesquisas, desenvolvimentos científico e tecnológico de pequenos aproveitamentos hidroenergéticos e, também, promover a capacitação e a pesquisa nesta área de atuação. 21 JIANDONG et al. (1997) apresentam considerações sobre a experiência chinesa de técnicas para desenvolvimento de projetos, construções e estimativas econômicas e financeiras de miniusinas hidrelétricas. A China possui grande experiência no assunto, pois dispõe de 74.000 pequenas usinas, que geram 10 milhões de kW, os quais representam aproximadamente 30% da energia produzida no país. É promovido pelo Comitê Brasileiro de Grandes Barragens, no ano de 1998, na cidade de Poços de Caldas (MG), o 1º Simpósio Brasileiro de Pequenas e Médias Centrais Hidrelétricas. 2.6 Aplicação dos conhecimentos geológicos e do mapeamento geotécnico como ferramentas para avaliações ambientais. Segundo ZUQUETTE (1993), os conhecimentos geológicos são pertinentes ao meio físico (rochas, materiais inconsolidados, águas e relevo) e às suas relações com os tipos de ocupação e as condições sócio-econômicas. Estabelecem interfaces com diferentes campos de conhecimento tecnológico e científico, tais como: Engenharias (Civil, Sanitária, de Minas, Agrícola e Agronômica); Pedologia, Arquitetura e Biologia. Como ramo da ciência Geologia, aparece a vertente da Geologia Aplicada, onde se encontram a Geologia de Engenharia e a Geologia Ambiental, que constituem interfaces entre diferentes áreas do conhecimento e que, de certa forma, se sobrepõem. A IAEG (1990) define a Geologia de Engenharia como sendo a ciência que se dedica à investigação, ao estudo e à solução de problemas de engenharia e meio ambiente, decorrentes da interação entre os conhecimentos geológicos e as atividades humanas, bem como à previsão e ao desenvolvimento de medidas preventivas ou reparadoras de acidentes geológicos. 22 A Geologia Ambiental, segundo BATES & JACKSON (1980) apud ZUQUETTE (1993), aplica os conhecimentos e princípios geológicos para avaliar os problemas causados ao meio ambiente, decorrentes da exploração e ocupação humana. Objetiva a redução máxima do impacto ambiental negativo (estudo preventivo) relativo às construções civis, à disposição de rejeitos e resíduos, aos recursos hídricos e naturais, ao planejamento e ao desenvolvimento regional e urbano. O curso natural dos processos geológicos e biológicos pode ser acelerado pela atuação e/ou ocupação desordenada do homem aos meios físico e biótico. TER STEPANIAN (1988) apud NISHIYAMA (1998) denomina-os Processos Tecnogênicos, em contraposição aos processos em seu curso normal, denominados processos naturais. Assim sendo, a sustentabilidade do meio ambiente obrigatoriamente passa pela situação de equilíbrio entre os meios físico, biótico e antrópico. A Figura 06, desenvolvida por ZUQUETTE et al. (1997), apresenta a seqüência dos vários níveis de informações relativas ao meio ambiente, normalmente levantados em trabalhos de Mapeamento Geotécnico. As técnicas de produção de documentos cartográficos começaram a ser utilizadas a partir do início do século XX, mais precisamente no ano de 1913. Estes documentos, elaborados por Langen, tinham como objetivo orientar a construção e a expansão de cidades alemãs. Desde então, a produção desses documentos, denominada genericamente mapeamento geotécnico, vem sendo aplicada como um conjunto de procedimentos de seleção, levantamento, produção, análise, avaliação e representação de informações (atributos) do meio físico, visando subsidiar técnica e economicamente a ocupação ordenada e a avaliação geoambiental. 23 Uso relacionam inferidas estimativas Meio antrópico ocupações propriedades e medidas ensaios parâmetros estimadas laboratoriais e relativas in situ fauna meio biótico flora Meio Ambiente Componentes Atributos Propriedades Parâmetros rochas meio físico materiais comportamento inconsolidados informações informações relevo pragmáticas numéricas águas numéricas e clima gráficas Figura 06 - Seqüência fundamental dos vários níveis de informações relativas ao meio ambiente (ZUQUETTE et al. 1997) 2.7 Das leis vigentes/ órgãos reguladores 2.7.1 Generalidades A competência para legislar sobre a água/meio ambiente é privativa da União, em virtude do disposto no Art. 22, Inciso IV, da Constituição Federal de 1988. Entretanto, as demais questões relacionadas aos recursos hídricos e ao meio ambiente são de competência concorrente entre a União, os Estados e o Distrito Federal, nos termos do Art. 24, Inciso VI, da mesma Constituição. Desta forma, a União tem competência para estabelecer critérios de classificação das águas e as normas gerais de meio ambiente, e aos estados cabe suplementar essas normas, sem contrariá- las, nos termos do Art. 24, §§ 1º e 2º da Constituição Federal de 1988. 2.7.2 Das águas No estado de Minas Gerais, onde este trabalho foi desenvolvido, a outorga para pequenos volumes de água é fornecida pelo IGAM – Instituto 24 Mineiro de Gestão das Águas, órgão subordinado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Foi no uso de sua competência suplementar que o estado de Minas Gerais editou a Lei nº 11504, de 20 de junho de 1994, que dispunha sobre a Política Estadual de Recursos Hídricos. Entretanto, em 08 de janeiro de 1997, a União editou a Lei nº 9433, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Além de trazer inúmeras inovações em matéria de recursos hídricos, essa nova lei federal suspendeu a eficácia da Lei nº 11504/94 naquilo que lhe foi contrário, nos termos do Art. 24, § 4º, da Constituição Federal de 1988, fazendo-se necessária, então, a edição de uma nova lei estadual sobre recursos hídricos, a Lei nº 13199, de 29/01/99, atualmente em vigor. Uma das novidades desta nova lei federal é a instituição da cobrança pelo uso da água, tributo que será recolhido pela Agência Nacional de Recursos Hídricos, formada por número igual de membros do poder público e de usuários. Sua cobrança será feita pelos Comitês de Bacias Hidrográficas (CBH) e os Conselhos Federal e Estadual de Recursos Hídricos serão os responsáveis por autorizar o uso da água e empregar os recursos. Os padrões normativos utilizados para o estado de Minas Gerais estabelecem o limite máximo, para derivações a fio d’água, como 30% de Q1 0 , 7 (vazão mínima natural de dez anos de recorrência, com sete dias de duração). O Q1 0 , 7 visa manter o fluxo de 70% para a porção jusante do ponto de captação. 2.7.3 Do meio ambiente A Lei Florestal 14.309/02 de 19/06/2002, que dispõe sobre as políticas florestal e de proteção à biodiversidade no estado de Minas Gerais, determina que o IEF é o órgão responsável pela fiscalização de áreas rurais, inclusive para cuidar das áreas de preservação dos canais fluviais e de seus entornos. 25 As áreas de Veredas do Cerrado, por representarem importantes ecossistemas, sendo ambientes de fontes hídricas e refúgios da fauna- florística, foram reconhecidas pela resolução do CONAMA (Conselho Nacional do Meio Ambiente) no 4, de 18/09/1985, em seu artigo 2° , alínea “e “, que apresenta a seguinte definição para Vereda: “nome dado no Brasil Central para caracterizar todo espaço brejoso ou encharcado que contém nascentes ou cabeceiras de cursos d’água de rede de drenagem onde há ocorrência de solos hidromórficos com renques de buritis e outras formas de vegetação típica”. Esta resolução no 4 do CONAMA ainda determina, no seu artigo 3o, alínea “b”, inciso III, que entre outras áreas de preservação permanente, são Reserva Ecológica “as nascentes permanentes ou temporárias, incluindo os olhos d’água e veredas, seja qual for a situação topográfica, com uma faixa mínima de 50 (cinqüenta) metros a partir de sua margem, de maneira a proteger a bacia de drenagem”. Em 13/12/1986 o Governo do estado de Minas Gerais oficialmente passa a considerar essa comunidade vegetal como Ecossistemas de Preservação Permanente. 26 3- ESTADO DA ARTE: SITUAÇÃO ATUAL DE OCUPAÇÃO/RECOMENDAÇÕES TÉCNICAS CORRETIVAS 3.1 Generalidades A análise das fotografias aéreas da USAF, em escala de 1:60.000, que recobrem a folha de Tupaciguara, obtidas no ano de 1964, indica que naquela época não existia nenhum reservatório de água superficial implantado. Durante o período de execução deste trabalho foram inventariados 319 reservatórios superficiais de água. O mapa de uso e ocupação atual do solo, apresentado no ANEXO 05, contém a localização desses reservatórios. Deste total, 224 estão construídos em vales com campos hidromórficos, onde se desenvolve o ambiente de Vereda, e 95 em vales com fluxo d’água concentrado no fundo do canal (denominados, neste trabalho, vales comuns) com ou sem a presença de vegetação ciliar. Foram cadastrados, também, dois pequenos aproveitamentos hidrelétricos, que atualmente encontram-se desativados. Esta situação de intensa ocupação, observada na nossa área de estudo, neste curto espaço de tempo, parece refletir o que vem ocorrendo de maneira generalizada em toda a região de Cerrado do Triângulo Mineiro. 3.2 Impacto da ocupação nos vales com campos hidromórficos Nos locais dos vales com campos hidromórficos, onde se desenvolve o ambiente de Vereda, a instalação de reservatórios provoca danos a criadouros da fauna local, à medida que a vegetação é derrubada e/ou submersa, bem como ocorrem mudanças nas condições hídricas. Associado à perda da vegetação e a todas as mudanças decorrentes desta ação, o reservatório expõe uma área de maior exposição do espelho d’água, favorecendo o aumento da evaporação d’água com a conseqüente diminuição dos potenciais hídricos 27 disponíveis. As Figuras 07 e 08 exemplificam a situação de degradação instalada nesses ambientes, após a implantação de reservatórios. Figura 07- Ambiente tipo Vereda desenvolvida em campo hidromórfico, destruída devido à implantação de reservatório. Córrego São Bento, afluente da margem direita do rio Babilônia, ao sul da cidade de Monte Alegre de Minas (09/10/1999). Figura 08 - Idem. Em primeiro plano, corpo da barragem e ao fundo, após o término do reservatório, vegetação preservada. Córrego Dois Córregos, situado ao norte da cidade de Monte A. de Minas (9/9/99). 28 Outro fator preponderante, que ocorre no período de estiagem (maio a setembro), devido à diminuição dos recursos hídricos disponíveis, é que os reservatórios instalados dentro dos vales com vereda não permitem um fluxo de água regular para jusante do reservatório, provocando sérios prejuízos à vegetação e à fauna associadas também nesses locais. Além disso, os constantes rompimentos de barragens construídas em vales com Veredas, produtos de técnicas construtivas não adequadas e também associadas às pobres características geotécnicas de suporte e impermeabilização dos materiais inconsolidados ali presentes, produzem impactos ambientais significativos em porções consideráveis desse ambiente. 3.3 Impacto da ocupação dos vales comuns com ou sem vegetação ciliar A ocupação desses vales com a implantação de barragens normalmente é acompanhada de destruição da vegetação natural, denominada mata ciliar, sem o cuidado de sua recomposição ao longo do reservatório a ser instalado. Mesmo que ela já tenha sido removida antes da construção do reservatório, é fundamental que ela seja recomposta. A falta da recomposição deste tipo de vegetação natural também prejudica a fauna associada a ela e, ao longo do tempo, tende também a produzir a diminuição dos recursos hídricos. A ausência de vegetação no entorno do reservatório, devido às oscilações do nível d’água, também possibilita maior facilidade para o solapamento das suas margens e carreamento de partículas sólidas pela água da chuva para o seu interior, processos que aceleram o fenômeno do assoreamento. A Figura 09 exemplifica essa situação observada. Os córregos Água Branca e São Domingos, localizados na porção norte/nordeste da área estudada, abrigaram dois reservatórios cuja finalidade específica era a geração de energia hidrelétrica. A capacidade de geração instalada era de 18,9 kW para a usina instalada no córrego Água Branca e 6,3 kW para a do córrego São Domingos. Segundo informações dos moradores da região, tanto os reservatórios como as usinas foram desativados no início da década de 1970. 29 Figura 09 - Vegetação ciliar removida para instalação de reservatório. Não houve a sua recomposição posterior. Córrego Mateira, localizado a nordeste do entroncamento da BR-365 com a BR-452 (09/09/1999). 3.4 Técnicas construtivas praticadas Observações de campo minuciosas na área de estudo, associadas com informações obtidas através de consultas efetuadas com os sitiantes e fazendeiros que possuem reservatórios superficiais de água, comprovam que as técnicas para construção das barragens normalmente não obedecem aos procedimentos técnicos adequados. Investigação geológico-geotécnica, limpeza da fundação, controle do material a ser compactado e critérios e controle para a compactação desses materiais são procedimentos normalmente não efetuados. Nos locais de vales com Veredas, a limpeza de fundação é uma tarefa quase impossível de ser realizada adequadamente para as condições dos equipamentos disponíveis. Portanto, é comum a prática de implantar barragens sobre o material encharcado argiloso com muita matéria orgânica e restos vegetais, que comprovadamente possuem pouca capacidade de suporte e 30 impermeabilização. Neste ambiente, é praticamente impossível desviar a água para remover o material a seco. Nos vales comuns é possível que o curso d’água seja desviado para uma das margens, a fim de possibilitar a limpeza da fundação. Entretanto, normalmente esse procedimento também não é efetuado, com a barragem sendo implantada em locais sem nenhum tipo de limpeza de fundação. Deste procedimento, poderão ocorrer recalques indesejáveis no corpo da barragem e excesso de percolação de água pela fundação, que em curto prazo poderão provocar o seu colapso. Em nenhuma das barragens inventariadas constatou-se a presença de sistema de drenagem interna. A falta desse sistema, que tem a função principal de controlar e orientar a percolação através da fundação e do maciço, pode gerar gradientes hidráulicos de saída excessivos. Estes gradientes podem provocar o início de um processo de erosão interna regressiva ou “piping”, que pode resultar na ruptura da barragem. É muito comum, conforme ilustrado na Figura 10, fluxos de água excessivos no “pé” do talude de jusante das barragens, acompanhados da falta de dreno neste local, que provocam o carreamento de material saturado ou o seu desmoronamento. A falta de umidade adequada e a compactação dos materiais inconsolidados utilizados para a construção de aterros talvez sejam os fatores primordiais para os inúmeros insucessos verificados. A grande maioria das barragens não apresenta sistema de proteção, no talude de montante, contra os efeitos erosivos das ondas, na zona de oscilação do nível d’água do reservatório. Este é um fator que muito contribui para o início de desenvolvimento de processos erosivos no corpo da barragem, que podem precipitar o início do processo de sua ruptura. 31 Figura 10 – Notar no detalhe excessivo fluxo de água e falta de dreno no “pé” de jusante da barragem. A água deste reservatório é utilizada para a irrigação de cultura de laranja. Córrego Salvador, a oeste da cidade de Monte Alegre de Minas (25/09/1999). Outro sério problema construtivo praticado, que muito contribui para os inúmeros insucessos constatados, diz respeito à posição de instalação e dimensionamento do vertedor ou sangradouro do reservatório. Lembremos que esta estrutura é fundamental para a operação do reservatório, pois através dela é feito o escoamento do excesso de água, de maneira a permitir sua operação com segurança. Como nos campos hidromórficos não existem “ombreiras” para permitir a construção do vertedor ideal, localizado a certa distância do corpo da barragem, é regra geral nesses locais a construção de vertedor tipo “geminado”, construído ao lado do corpo da barragem (Figura 11). Esta prática deveria ser, mas nunca é, acompanhada da implementação de obras de proteção, para evitar que processos erosivos se desenvolvam nestes locais. Além disso, as suas condições de largura e profundidade ideais, que estão diretamente relacionadas com a área de captação das chuvas, quase nunca são respeitadas. De maneira geral, os vertedores devem ser largos e rasos, ao invés de estreitos e profundos. A Tabela 01, apresentada por FALCÃO & BORGES (1974), indica as condições recomendadas de largura e profundidade para os vertedores, em função da área de captação das chuvas. 32 Tabela 01- Dimensionamento de vertedouro para pequenas barragens (FALCÃO & BORGES, 1974) Área de captação (hectares) Profundidade do vertedouro (metros) 0,90 1,20 1,50 1,80 2,10 2,40 2,70 Largura do vertedouro (metros) 0 - 50 7,0 50 - 75 11,0 6,5 5,0 75 - 125 17,0 10,0 7,0 5,0 125 - 200 25,0 14,0 9,5 7,5 5,5 200 - 300 30,0 18,0 12,5 10,0 7,5 6,0 300 - 400 - 22,5 15,0 11,0 9,0 7,0 6,0 400 - 550 - 25,0 18,0 13,0 10,5 8,5 7,0 550 - 750 - - 24,0 17,0 13,0 10,5 8,5 750 - 1000 - - 28,0 20,0 15,0 12,5 10,0 Figura 11 - Sistema de vertedor ou sangradouro “geminado” ao corpo da barragem, utilizado em vales com campos hidromórficos. Córrego São Bento, situado ao sul da cidade de Monte Alegre de Minas (09/09/1999). 33 3.5 Projeto/técnicas construtivas adequadas Independentemente do tipo de reservatório possível de ser implantado, em função da avaliação geoambiental, o barramento construído para esta finalidade deverá ser estanque e estável, pelo menor custo possível. Alguns fatores são fundamentais para o desenvolvimento de um projeto adequado, dentre os quais destacam-se: • Pluviometria da região • Conformação da topografia do terreno natural • Sistema de desvio do rio ou captação de água do rio • Características geológico-geotécnicas dos materiais de fundação • Características geológico-geotécnicas dos materiais de empréstimo (jazidas) Associado a esses fatores, segundo PARRA (1986), deve-se considerar os seguintes aspectos durante a fase do projeto: • Estabilidade à erosão externa - proteção contra o galgamento - proteção do talude de montante - proteção do talude de jusante • Estabilidade à erosão interna - controle de percolação - controle de vazão - controle de tensões e deformações • Estabilidade ao escorregamento - definição da inclinação dos taludes - controle de pressões piezométricas Durante a fase construtiva, as camadas de material inconsolidado a serem compactadas, com espessuras superiores a 20 cm, devem ser obrigatoriamente evitadas. O constante umedecimento do material a ser 34 compactado, para proporcionar ao material características próximas da umidade ótima, sempre deve ser obrigatório em todas as camadas executadas. O material deve ser compactado, sempre que possível, com rolo compactador apropriado (pé de carneiro), puxado por trator. A compactação feita somente com o trânsito de equipamentos (caminhão, trator, etc.) é aceitável, porém deve ser evitada, pois normalmente não permite um controle de qualidade adequado. A definição dos taludes de uma barragem deve ser feita através de análises de estabilidade, conforme sequência sugerida por ÁVILA (1979) apud PARRA (1986). Entretanto, para barramentos da magnitude dos tratados neste trabalho e executados sobre fundações estáveis, pode-se dimensionar os taludes utilizando-se tabelas como as apresentadas por PARRA (1986), que correlacionam as condições de rebaixamento do nível d’água do reservatório com o tipo de solo existente. 3.6 Jazidas O termo jazida ou área de empréstimo serve para designar o local onde é retirado o volume de material inconsolidado a ser utilizado para construir a barragem que possibilitará a formação do reservatório de água. Na nossa área de trabalho foi observado que, na grande maioria dos casos, após a retirada do material necessário, esses locais são abandonados e não sofrem qualquer tipo de recomposição. Com este procedimento, é comum o desenvolvimento de processos erosivos e o conseqüente carregamento de partículas sólidas pelas águas fluviais para dentro dos canais de drenagem. Tanto em termos ambientais como financeiros, o próprio local a ser inundado pela construção do reservatório é o mais favorável para a implantação da jazida, pois não será necessária sua posterior recuperação. Se a área a ser inundada não possuir o material inconsolidado adequado para esta finalidade, é imprescindível que, antes do início da exploração da jazida, todo 35 o material inconsolidado superior rico em matéria orgânica (aproximadamente os 0,20 m superficiais) seja armazenado para posterior utilização na sua própria recomposição vegetal. 3.7 Condições de conservação e manutenção A falta da prática de conservação e manutenção das barragens também contribui sobremaneira para o aumento de acidentes e conseqüente diminuição do seu tempo de uso. Na área estudada, é pouco comum a sistemática de inspeções periódicas e rotineiras ao corpo da barragem. Este procedimento é fundamental para que não se permita o desenvolvimento de processos erosivos nos taludes de montante e jusante da barragem, principalmente os desprovidos de proteções (Figuras 12, 13 e 14). Além disso, essas inspeções visam impedir o desenvolvimento de vegetação arbustiva de porte médio e não possibilitar, em nenhuma hipótese, a instalação de formigueiros no corpo da barragem. Estes fatores certamente irão provocar o desenvolvimento de situações de alto risco à segurança da obra. A obstrução do vertedor com qualquer tipo de objeto, conforme mostrado na Figura 11, também é prática não recomendada, pois provocará a elevação do nível d’água do reservatório, pondo em perigo a segurança total da obra. A forte ocupação antrópica, com a retirada da mata natural, principalmente nos locais de presença dos materiais inconsolidados arenosos originados da Formação Marília, situação areal predominante na área de estudo, tem possibilitado uma alta susceptibilidade ao desenvolvimento de processos erosivos, os quais provocam o carreamento de partículas, que são depositadas nos reservatórios. Estudos e medidas mitigadoras para diminuir o assoreamento dos reservatórios são apresentados no item 7.4 deste trabalho. 36 Figura 12 - Vista de jusante de reservatório instalado no córrego Pequeno, afluente da margem direita do rio Babilônia. A vegetação do ambiente tipo Vereda foi totalmente removida para a sua instalação. Notar acelerado processo erosivo no talude de jusante da barragem pela falta de sua proteção/manutenção com capim ou grama nativa (25/10/1999). Figura 13 - Detalhe da Figura 12 (25/10/1999). 37 Figura 14 - Vista de montante do mesmo reservatório. Pela falta de proteção/manutenção, também no talude de montante desenvolve-se acelerado processo erosivo (25/10/1999). 38 4- MATERIAIS E MÉTODOS 4.1 Materiais utilizados Para a execução deste trabalho foram utilizados todos os recursos e materiais disponíveis da área, ou seja, trabalhos acadêmicos, diferentes tipos de mapas, fotografias aéreas, imagens de satélites e dados de investigações de superfície e subsuperfície. A área de estudo dispõe de dois levantamentos planialtimétricos: a folha topográfica de Tupaciguara (SE-22-Z-B-V), em escala 1:100.000, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE (1974), que serviu como base cartográfica para este trabalho, e 16 mapas em escala 1:25.000, editados e publicados pelo MINISTÉRIO DO EXÉRCITO (1984), que foram empregados para a elaboração da carta de declividade. Foram utilizadas fotografias aéreas na escala 1:60.000, obtidas pela United States Air Force – USAF (1964). O emprego das técnicas de fotointerpretação (SOARES & FIORI, 1975) foi indispensável para a obtenção de informações sobre o meio físico (atributos). Para a confecção do mapa de uso e ocupação do solo, além do levantamento de campo, foram utilizadas as imagens de satélite TM/LANDSAT WRS-221/073W-08/11/88-2B,3G,5R e WRS-221/073C- 19/07/92-2B,4G,5R. As amostras deformadas dos materiais inconsolidados foram obtidas com um trado cavadeira de quatro polegadas de diâmetro. Para a confecção e edição final dos mapas e cartas produzidos neste trabalho foi utilizado o programa AutoCAD-14. 39 4.2 Método A seqüência de atividades para execução do presente trabalho contou com seis fases, a saber: levantamento e produção de informações relativas aos atributos do meio físico; levantamento da forma de ocupação antrópica dos canais de drenagem; elaboração dos mapas fundamentais básicos; amostragem, ensaios de laboratório e leituras de vazões em canais fluviais; elaboração das cartas derivadas interpretativas e avaliação geoambiental para implantação de pequenos reservatórios superficiais de água, conforme apresentado no fluxograma da Figura 15. 4.2.1 Levantamento e produção de informações Procedeu-se à consulta de todas as informações anteriormente produzidas na região de influência deste trabalho, pertinentes às condições do meio físico. Em paralelo realizou-se a interpretação de fotografias aéreas e trabalhos de campo, procedimentos que possibilitaram a definição de atributos fundamentais que, relacionados com os materiais do substrato rochoso, materiais inconsolidados, águas superficiais e landforms, puderam ser utilizados na técnica de mapeamento geotécnico. Os trabalhos de campo também permitiram a identificação dos procedimentos empregados na ocupação antrópica dos vales fluviais, conforme registrado no capítulo 3 deste trabalho. 4.2.2 Elaboração dos mapas fundamentais básicos As informações obtidas na fase anterior, resultante de análise, avaliação e seleção dos atributos, geraram o seguinte conjunto de mapas fundamentais básicos: substrato rochoso, materiais inconsolidados, rede de drenagem e bacias de terceira ordem, landforms, declividade e uso e ocupação atual do solo. 40 O mapa de documentação (ANEXO 01), onde se encontram registrados todos os pontos de observação, amostragem e leitura de vazões de canais fluviais, também foi gerado nesta fase. 4.2.3 Amostragem, ensaios de laboratório e leituras de vazões em canais fluviais A amostragem e os ensaios de laboratório foram realizados sobre as unidades de materiais inconsolidados anteriormente definidos, com a finalidade de caracterização geotécnica de enfoque deste trabalho. As leituras de vazões em alguns canais fluviais tiveram por objetivo possibilitar uma comparação entre os deflúvios superficiais locais com os regionais, fornecidos pela COPASA (1993). Todos os aspectos relativos aos objetivos da amostragem, procedimentos e número de amostras coletadas, bem como das leituras de vazões encontram-se detalhados, respectivamente, nos sub- itens 6.3.2, 6.3.3 e 6.5.1, que tratam especificamente desses assuntos. 4.2.4 Elaboração das cartas derivadas interpretativas As cartas derivadas interpretativas geradas foram duas: declividade generalizada e predisposição à erosão. . Após análise dos atributos apresentados em todos os documentos cartográficos gerados anteriormente e do conjunto de informações que abrangem as leis estaduais e federais relativas ao meio ambiente, elaborou-se a carta de avaliação geoambiental, com a finalidade de indicar a ocupação racional do Cerrado para a implantação de pequenos reservatórios superficiais de água, conforme esquema apresentado na Figura 15. 41 L ev an ta m en to d as i n fo rm aç õ es p ro d u çã o d e in fo rm aç õ es M A P A S B Á S IC O S C A R T A S D E R IV A D A S E IN T E R P R E T A T IV A S C A R T A D E A V A L IA Ç Ã O G E O A M B IE N T A L F ig ur a 15 - F lu xo gr am a do s do cu m en to s ca rt og rá fi co s pr od uz id os pa ra a ob te nç ão da ca rt a de av al ia çã o ge oa m bi en ta l pa ra im pl an ta çã o de pe qu en o s re se rv at ór io s de ág ua na fo lh a de T up ac ig ua ra (M G ) m ap as to po gr áf ic o s le is am bi en ta is bi bl io gr áf ic as m ap as d iv er so s in te rp re ta çã o f ot og ra fi as a ér ea s im ag en s de s at él it e tr ab al ho s de c am po en sa io s de la bo ra tó ri o de cl iv id ad e su bs tr at o ro ch os o us o e oc up aç ão at ua l d o so lo m at er ia is in co ns ol id ad os R ed e de dr en ag em , b ac ia s de 3 a o rd em e .. . de cl iv id ad e ge ne ra liz ad a C ar ta d e pr ed is po si çã o à er os ão C ar ta d e av al ia çã o ge oa m bi en ta l p ar a a im pl an ta çã o de p eq ue no s re se rv at ór io s su pe rf ic ia is d e ág ua : a pl ic aç ão n a fo lh a de T up ac ig ua ra ( 1: 10 0. 00 0) en sa io s la nd fo rm s 42 5 - CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DO MEIO FÍSICO 5.1 Localização e vias de acesso A área estudada está localizada na região do Triângulo Mineiro, oeste do estado de Minas Gerais, entre as coordenadas geográficas de 18° 30’ e 19° 00’ de latitude sul, 48° 30’ e 49° 00’ a oeste do meridiano de Greenwich, ocupando uma superfície de 2918,89 km2 (Figura 16). Figura 16 – Localização da área estudada A folha de Tupaciguara é abrangida por quatro municípios, e a sua distribuição municipal está apresentada na Tabela 02. A área em referência é cortada pela rodovia federal BR-365 no sentido leste/oeste. A partir do entroncamento no Km 656 desta rodovia, nasce a 43 rodovia federal BR-452, que dá acesso à cidade de Tupaciguara e posteriormente à cidade de Itumbiara, já no estado de Goiás. Tabela 02- Distribuição municipal da área estudada Município Área (km2) Área (%) Araguari 69,60 2,38 Monte Alegre de Minas 1632,95 55,95 Tupaciguara 1021,70 35,00 Uberlândia 194,64 6,67 Total 2918,89 100,00 5.2 Geologia Regional Os primeiros reconhecimentos geológicos da região do Triângulo Mineiro foram publicados por DERBY (1886). Oito anos mais tarde, HUSSAK (1894) publicou o resultado de suas primeiras pesquisas na região, quando revelou a provável ocorrência de jacupiranguito na cidade goiana de Catalão. O interesse econômico despertado pela descoberta de paleoaluviões diamantíferos e por importantes ocorrências minerais associadas aos complexos alcalinos levou vários pesquisadores a trabalhar nesta região. Trabalhos como os de HUSSAK (1906), RIMANN (1917 e 1931), GUIMARÃES (1926, 1927, 1933 e 1947), BARBOSA (1934, 1936 e 1937), CAMPOS (1937) apud BARBOSA et al. (1970) contribuíram de maneira expressiva para o conhecimento geológico da região. Durante os anos de 1953 e 1954 a empresa PROSPEC S.A., trabalhando para o Conselho Nacional de Pesquisas, descobriu os domos alcalinos do Barreiro, Tapira, Salitre e Serra Negra. 44 Entretanto, entre todos os trabalhos voltados para a pesquisa mineral, apenas o de BARBOSA et al. (1970) apresenta uma visão do arcabouço geológico regional. Vários outros trabalhos, de natureza econômica ou acadêmica, posteriores ou contemporâneos ao citado, apresentam importante contribuição para o conhecimento geológico regional. Dentre outros mencionam-se os de ALMEIDA et al. (1980); BARCELOS & SUGUIO (1980); BARCELOS et al. (1981); BARCELOS (1984); BARCELOS et al. (1987); HASUY (1968 e 1969); SUGUIO (1980); HASUY & HARALYI (1991); FERREIRA JR. (1996); FULFARO & PERINOTTO (1996); FERNANDES (1998) e FERNANDES & COIMBRA (1998). O arcabouço geológico do Triângulo Mineiro pode ser dividido em três grandes unidades: a leste, no domínio da Bacia São Franciscana, ocorrem rochas metassedimentares neoproterozóicas do Grupo Bambuí e a oeste rochas magmáticas e sedimentares fanerozóicas da Bacia Sedimentar do Paraná. Essas duas unidades geológicas são separadas pelo Soerguimento do Alto Paranaíba, que afetou principalmente a porção sul da Faixa de Dobramentos Brasília, que é constituída por rochas metamórficas proterozóicas cortadas por intrusões alcalinas mesozóicas, orientadas grosseiramente na direção NW- SE (BARBOSA et al., 1970 e HASUY & HARALYI, 1991). Na maior parte da região do Triângulo Mineiro, as litologias sedimentares e as rochas basálticas da Bacia Sedimentar do Paraná recobrem unidades mais antigas, representadas pelas rochas metassedimentares de idade proterozóica dos Grupos Araxá e Canastra. Estas, por sua vez, estão sobrepostas sobre um embasamento ainda mais antigo, de idade arqueana. A coluna estratigráfica apresentada na Figura 17 resume o empilhamento das rochas presentes na região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. 45 5.2.1 Embasamento Arqueano BARBOSA et al. (1970) denominam “Complexo Granito-Gnáissico” o conjunto litológico formado por granitos e gnaisses, essencialmente de composição granodiorítica, com intercalações de anfibolito, como sendo o conjunto de rochas mais antigas da região. Em trabalhos posteriores, DNPM (1975) e RADAM (1983) apresentam outras denominações para esta unidade de idade arqueana, respectivamente identificadas como Pré-Cambriano Indiferenciado e Complexo Basal Goiano. Segundo BARBOSA et al. (1970), os afloramentos mais significativos desta unidade ocorrem entre as cidades de Monte Carmelo e Abadia dos Dourados e a sudeste da cidade goiana de Catalão, atravessando o rio Paranaíba até próximo de Estrela do Sul. Outras áreas de menor significado estão presentes no rio Araguari (próximo da cidade de Uberlândia) e na margem direita do rio Quebra Anzol, ao sul da localidade de Pedro do Bom Jardim. 5.2.2 Grupo Araxá O termo Grupo Araxá foi caracterizado por BARBOSA (1955) e representa os metassedimentos de fácies epidoto-anfibolito, consistindo essencialmente de micaxistos e quartzitos com intercalações de anfibolito. Segundo BARBOSA et al. (1970), os xistos típicos desse grupo, encontrados em torno da cidade de Araxá, são constituídos de duas micas, comumente com predomínio da muscovita, além de minerais acessórios como granada, rutilo, zircão, turmalina e estaurolita. Na região do Triângulo Mineiro, a unidade encontra-se recoberta por litologias sedimentares e magmatitos básicos da Bacia Sedimentar do Paraná. Seu afloramento está condicionado às áreas de profundo entalhe fluvial, produzido pelos rios Paranaíba, Araguari e Quebra Anzol.