Sâmira Ambar Lins Alterações Comportamentais, Psicológicas, de Higiene bucal e Presença de Microrganismos Superinfectantes e Viruses da Família Herpesviridae em Pacientes Mantidas em Programa de Desintoxicação para Dependentes Químicos ARAÇATUBA - SP 2009 Sâmira Ambar Lins Alterações Comportamentais, Psicológicas, de Higiene bucal e Presença de Microrganismos Superinfectantes e Viruses da Família Herpesviridae em Pacientes Mantidas em Programa de Desintoxicação para Dependentes Químicos Doutoranda: Sâmira Ambar Lins Orientador: Prof. Dr. Elerson Gaetti Jardim Júnior Faculdade de Odontologia de Araçatuba – UNESP ARAÇATUBA - SP 2009 Catalogação-na-Publicação Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação – FOA / UNESP Lins, Sâmira Ambar L759o Ocorrências de microrganismos superinfectantes e víruses da família herpesviridae em pacientes do gênero feminino mantidas em programas de desintoxicação para dependentes químicos / Sâmira Ambar Lins. - Araçatuba : [s.n.], 2009 f. : il. ; tab. + 1 CD-ROM Tese (Doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Odontologia, Araçatuba, 2009 Orientador: Prof. Elerson Gaetti Jardim Júnior 1. Transtornos relacionados ao uso de substâncias 2. Microbiologia 3. Bactérias 4. Vírus 5. Infecção Black D64 CDD 617.632 DEDICATÓRIA À pessoa mais brilhante, mais sábia e mais especial que conheci durante toda minha existência. Pelos ensinamentos de vida, pelo carinho, pelo apoio incondicional... Você foi um presente de “Deus” em minha vida. ”...Nem a morte, nem a vida ... ...Nem o presente, nem o porvir... ...Nada vai nos separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus Nosso Senhor... ”Romanos 8:38,39” A você, Mãezinha, minha eterna gratidão! AGRADECIMENTOS ESPECIAIS À Deus, razão essencial de minha existência. Ao meu esposo Paulo, meu amor, meu amigo, meu companheiro. Pela compreensão, pelo apoio e incentivo durante toda essa minha jornada. Aos meus filhos, Rômulo e Paulinha, pelo apoio, pelo carinho e principalmente por compreenderem minha ausência. Aos meus familiares, meus irmãos e meu paizinho querido, pela segurança que sempre me transmitiram e pelo apoio incondicional. Ao Prof. Dr. Elerson Gaetti Jardim Júnior, “meu mestre e meu irmão”, pelos ensinamentos, pela compreensão e pelo incentivo, contribuindo muito para meu crescimento científico, durante todo o processo de orientação. AGRADECIMENTOS À Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP, na pessoa de seu Diretor, Prof. Dr. Pedro Felício Estrada Bernabé, pela oportunidade de realização do Curso de Doutorado em Estomatologia. Ao Prof. Dr. Alvimar Lima de Castro, e toda a equipe da disciplina de Estomatologia da Faculdade de Odontologia de Araçatuba- UNESP, por todos os ensinamentos a mim transmitidos. À Profa. Dra. Christiane Marie Schweitzer, pela dedicação e empenho na realização da análise estatística deste trabalho. Á equipe da sessão de Pós Graduação Da Faculdade de Odontologia de Araçatuba - UNESP, Valéria de Queiróz Marcondes Zagatto, Marina Midori Sakamoto Kawagoe e Diogo Luís Reatto, pela atenção e demonstração de profissionalismo. Ao Centro de Recuperação de dependentes Químicos “Lar Madre Paulina”, por nos permitirem a realização deste projeto. Às pacientes envolvidas na pesquisa, pela participação e compreensão durante a realização deste trabalho, contribuindo assim com o desenvolvimento da ciência. Ao Prof. Henrique José Baldo de Toledo e às acadêmicas do Curso de Odontologia da FUNEC, Jéssica Bonfada, Rosi Mara Batista, Camila Almeida Nascimento e Vânia Kawano Muniz, por me auxiliarem neste trabalho, realizando o tratamento odontológico das pacientes envolvidas. À Funec, instituição onde tenho o prazer de coordenar o curso de Odontologia desde 200? , pela confiança em mim depositada durante todo esse período, acreditando no meu trabalho. Lins, SA. Alterações comportamentais, psicológicas, de higiene bucal e presença e microrganismos superinfectantes e víruses da família Herpesviridae em pacientes mantidas em programa de desintoxicação para dependentes químicos.[Tese]. Araçatuba: Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho- UNESP; 2009. RESUMO A dependência de drogas traz sérias conseqüências sistêmicas, econômicas e sociais. Assim, o presente estudo objetivou avaliar a ocorrência de enfermidades em pacientes do gênero feminino com dependência química e a possibilidade da cavidade bucal dessas pacientes se converter em reservatório de microrganismos oportunistas.. Para tanto, foram obtidos dados referentes às condições de saúde sistêmicas, socioeconômicas, consumo de medicamentos, uso de drogas lícitas ou ilícitas de 50 pacientes com dependência química mantidas internadas em clínica de desintoxicação, o mesmo ocorrendo com igual número de pacientes não dependentes. A seguir, foram realizados exames clínicos intra e extrabucais. Amostras de biofilme supra e subgengivais, saliva e das mucosas foram transferidas para água ultrapura. A ocorrência da família Enterobacteriaceae, Enterococcus sp., E. faecalis, E. faecium, Pseudomonas sp., P. aeruginosa e Candida spp., Helicobacter e H. pylori, bem como os viruses HSV-1, CMV e EBV-1 foi avaliada por PCR ou nested PCR. Verificou-se que 94% das pacientes do grupo teste eram usuárias de mais do que uma única droga, sendo o tabaco (92%), bebidas alcoólicas (68%), crack (66%) e cocaína (52%) as mais consumidas, quase sempre em múltiplas associações. Verificou-se maior freqüência de alterações comportamentais e/ou psicológicas no grupo teste, além de dores articulares, infecções oportunistas, cefaléia, fadiga, xerostomia, formigamento das extremidades, anemia, periodontite, perda de peso, retardo do processo de reparo, entre outras. Observou-se freqüência significavente mais elevada de Candida sp., C. albicans, família Enterobacteriaceae, Enterococcus sp., Helicobacter sp., H. pylori, vírus CMV e vírus EBV-1 na saliva das pacientes com dependência química, enquanto no biofilme supragengival verificou-se uma maior proporção de amostras positivas para Candida sp., C. albicans, família Enterobacteriaceae, Enterococcus sp., E. faecalis, Helicobacter sp., H. pylori, Pseudomonas sp., P. aeruginosa e vírus EBV-1. No biofilme subgengival das pacientes com dependência química, observou-se prevalência significante da família Enterobacteriaceae, Helicobacter sp., H. pylori, Pseudomonas sp., P. aeruginosa, bem como todos os viruses da família Herpesviridae testados. Nas amostras de mucosa, observou-se prevalência signigicante de Candida sp., C. albicans, Helicobacter sp., viruses CMV e EBV-1. A avaliação das pacientes dos dois grupos sugere que a dependência química de drogas, lícitas ou não, pode facilitar o contato com microrganismos e viruses oportunistas na cavidade bucal, bem como a colonização desses ambientes por esses agentes. Palavras-chave: Transtornos relacionados ao uso de substâncias; Microbiologia; Bactérias; Vírus; Infecção Lins, SA. Alterações comportamentais, psicológicas, de higiene bucal e presença de microrganismos superinfectantes e víruses da família Herpesviridae em pacientes mantidas em programa de desintoxicação para dependentes químicos.[Tese]. Araçatuba: Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho- UNESP; 2009. ABSTRACT Drug addiction frequently causes serious systemic, economic and social consequences. Thus, the present study aimed at evaluating the occurrence of illnesses in female chemically dependent patients as well as the possibility of their oral cavity becoming potential reservoir for opportunistic microorganisms. For this purpose, data regarding systemic health and socioeconomic status, medication consumption, legal or illegal drug use were obtained from 50 female chemically dependent patients undergoing inpatient detoxification treatment; while the same procedure was carried out with 50 non-addicted females. Subsequently, intra and extra-oral clinical tests were done. Samples from the supra- and subgingival biofilms, saliva and oral mucosa were transferred to ultrapure water. The occurrence of Enterobacteriaceae family, Enterococcus sp., E. faecalis, E. faecium, Pseudomonas sp., P. aeruginosa and Candida sp., Helicobacter and H. pylori, as well as viruses HSV-1, CMV and EBV-1 was evaluated by using PCR or nested PCR. It was verified that 94% of the patients from the chemically dependent group were multiple drug users, being tobacco (92%), alcohol (68%), crack (66%) and cocaine (52%) the most consumed ones. A higher frequency of behavioral and/or psychological alterations was verified in the chemically dependent group, besides articular pain, opportunistic infections, headaches, fatigue, xerostomy, tingling extremities, anemia, periodontitis, weight loss, delay in the repair process, among others. A higher frequency of Candida sp., C. albicans, Enterobacteriaceae family, Enterococcus sp., Helicobacter sp., H. pylori, CMV and EBV-1 viruses was observed in the saliva from the chemically dependent group; while in the supragingival biofilm a higher proportion of positive samples to Candida sp., C. albicans, Enterobacteriaceae family, Enterococcus sp., E. faecalis, Helicobacter sp., H. pylori, Pseudomonas sp., P. aeruginosa and EBV-1 virus was observed. In the subgingival biofilm from the chemically dependent group, a higher prevalence of Enterobacteriaceae family, Helicobacter sp., H. pylori, Pseudomonas sp., P. Aeruginosa was observed, and all viruses from Herpesviridae family were tested. Oral mucosa samples from the chemically dependent group showed a higher prevalence of Candida sp., C. albicans, Helicobacter sp., CMV and EBV-1 viruses. Evaluation of the patients from both groups suggests that chemical dependency, legal or not, may facilitate the contact of microorganisms and opportunistic viruses in the oral cavity, as well as the colonization of these areas by such pathogens. Key words: Disorders related to substance abuse; Microbiology; Bacteria; Virus; Infection. LISTA DE TABELAS Tabela 1: Iniciadores específicos utilizados nos ensaios de PCR para detecção de bactérias oportunistas e leveduras do gênero Cândida........................................28 e 29 Tabela 2: Iniciadores e temperatura de anelamento empregados no “nested” PCR para os viruses da família Herpesviridae. .............................................................................. 29 Tabela 3: Associações de drogas empregadas pelas pacientes com dependência química ...................................................................................................................... 33 Tabela 4: Aspectos comportamentais psicológicos de pacientes dependentes químicas internadas em programa de desintoxicação. .............................................................. 35 Tabela 5: Principais manifestações clínicas e queixas nas pacientes com dependência química e no grupo controle..................................................................................36 e 37 Tabela 6: Condições de higiene bucal entre dependentes químicas (N=44, pacientes portadoras de 20 ou mais dentes) e grupo controle (N=48, pacientes portadoras de 20 ou mais dentes) ................................................................................................................................... 38 Tabela 7: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas na saliva de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR ....................................................... 40 Tabela 8: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme supragengival de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR.................. 41 Tabela 9: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme subgengival de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR.................. 42 Tabela 10: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas na mucosa bucal de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR........................................... 43 Tabela 11: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas na saliva de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas.................................................................... 45 Tabela 12: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme supragengival de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas............................... 46 Tabela 13: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme subgengival de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas............................... 47 Tabela 14: Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas nas mucosas de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas............................................................... 48 LISTA DE ABREVIATURAS Mm = milímetro ml: = mililitro μl: = microlitro Min: = minuto s = segundo PCR: = Reação em cadeia da polimerase PSR = Periodontal Screening and Recording DNA = ácido desoxirribonucleico UV: = ultravioleta CMV = citomegalovírus EBV = Epstein-Barr vírus C. = Candida H. = Helicobacter P. = Pseudomonas E. = Enterococcus SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO..................................................................................................... 14 2. PROPOSIÇÃO ...................................................................................................... 19 3. MATERIAIS E MÉTODOS.................................................................................. 21 4. RESULTADOS ..................................................................................................... 32 5. DISCUSSÃO......................................................................................................... 50 6. CONCLUSÕES..................................................................................................... 73 7. REFERÊNCIAS .................................................................................................... 75 ANEXOS................................................................................................................... 87 13 INTRODUÇÃO 14 1. INTRODUÇÃO Nas últimas décadas observou-se um vertiginoso aumento no consumo de drogas com efeitos psicotrópicos, lícitas (ou “quase lícitas”, dependendo da faixa etária do consumidor), como tabaco ou álcool, ou ilícitas, como a cocaína, heroína, crack, solventes, êxtase (3-4 metilenodioximetanfetamina), dentre outros, tornando-se um sério problema de saúde pública no Brasil1 e no restante do mundo.2,3,4 As causas desse fenômeno são complexas e envolvem diversos aspectos sociais, educacionais, econômicos e de saúde pública. Embora a forma com que as diferentes sociedades vêm encarando o consumo de drogas ilícitas ou o abuso de drogas lícitas varie com o tempo e também dependa do tipo de droga, hoje se sabe que o comportamento pessoal e estilo de vida possuem múltiplas influências sobre as condições de saúde bucal e sistêmica dos pacientes5,6, muitas vezes pouco conhecidas dos próprios profissionais de saúde e normalmente negligenciadas por esses últimos 3,4,5. Além desse aspecto, a promoção da saúde, em seu sentido mais amplo, deve melhorar a qualidade de vida do indivíduo e de sua coletividade, estimulando a mudança de hábitos, como a redução e erradicação do tabagismo, do etilismo, bem como das drogas consideradas ilícitas, as quais estão associadas a devastadores efeitos colaterais que atingem múltiplos sistemas orgânicos, como o cardiovascular, imunológico, neuroendócrino entre outros,6,7,8,9,10 além de criar problemas sérios associados à criminalidade. Os efeitos do emprego dessas drogas podem ser ainda mais sérios em função de modificações químicas associadas ao preparo das mesmas, idade e gênero do paciente, bem como o uso concomitante de vários desses agentes, o que é freqüente em dependentes químicos 11, sendo que o abuso de drogas consideradas lícitas pode levar ao consumo de produtos ilícitos e à criminalidade para obtenção dessas últimas. Nesse particular, a literatura 15 evidencia que usuários de tabaco, particularmente jovens e adolescentes, e usuários de álcool, possuem um risco significativamente mais elevado de desenvolver dependência a outras drogas, como crack e cocaína8,12. Além desse aspecto, o consumo desses produtos vem sofrendo uma elevação mais pronunciada no gênero feminino,1,13 sendo que, nesse grupo, os efeitos dessas drogas ainda podem ser influenciados pelas condições hormonais das pacientes14,enquanto esses mesmos agentes podem interferir com a produção dos hormônios sexuais 15. O consumo de algumas drogas psicoativas ainda pode exacerbar os efeitos deletérios que o estresse exerce no sistema de defesa da paciente16,o qual afeta profundamente a resposta adaptativa, bem como a própria capacidade de reparo, abrindo caminho para a ocorrência de infecções oportunistas17, 18. Além desse aspecto, a cocaína, o tabaco, crack e mesmo o álcool produzem profunda vasoconstrição nas artérias coronárias, o que aumenta o risco de infarto do miocárdio e crises hipertensivas, sendo que na periferia corporal, essa vasoconstrição também reduziria a resistência a infecções, particularmente no periodonto, onde gengivites e periodontites severas vêm sendo relatadas. Essa vasoconstrição pode ser intensa a ponto de induzir necrose tecidual 19e profundo retardo do processo de reparo 20 . Nessa linha, no longo prazo, o consumo de drogas pode reduzir a capacidade cognitiva e a motivação para desempenhar as tarefas do cotidiano, como os hábitos de higiene oral, por exemplo. Além desse aspecto, o perfil emocional do paciente que faz uso de drogas alucinógenas como a maconha e o crack, está sujeito às alterações negativas, pois a dependência psíquica faz o usuário sentir vontade de utilizar o produto, enquanto que a dependência física e as crises de abstinência provocam irritação, insônia, perda do apetite, alterações no humor, na higiene bucal e dieta.21 Embora o cirurgião-dentista se depare com muitas das manifestações da dependência desses agentes químicos, os profissionais geralmente desconhecem as profundas 16 conseqüências desse fato no exercício profissional, como o aumento da susceptibilidade a infecções, xerostomia e hemorragias pós-operatórias, reduzida resposta ao uso de anestésicos locais, o que pode comprometer ainda mais os resultados do tratamento odontológico instituído ou mesmo expor, desnecessariamente, o paciente a riscos. 2,4 Dentre as manifestações bucais do uso dessas drogas destacam-se as doenças periodontais 2,3, as quais são enfermidades multifatoriais, mas cujos agentes etiológicos primários estão ligados ao biofilme microbiano, onde microrganismos específicos, quase sempre anaeróbios obrigatórios ou microaerófilos, desempenham diferentes papéis no processo de desenvolvimento do quadro inflamatório periodontal22, sendo que a distribuição de alguns desses microrganismos ainda possui marcada influência étnico-racial 23,24,25 ou reflete modificações hormonais .26 Além desses grupos microbianos que constituem a microbiota residente, diferentes microrganismos exógenos à cavidade bucal podem, em função de desequilíbrios imunológicos ou na microbiota autóctone bucal, se instalar no biofilme dental, ou mesmos nas superfícies mucosas, e acabar convertendo o ambiente oral em reservatório de espécies bacterianas de grande importância médica como Helicobacter pylori, associado às infecções gástricas, ou bactérias entéricas, freqüentemente encontradas em infecções graves em ambiente hospitalar e em pacientes profundamente debilitados.27,28 A ocorrência de surtos epidêmicos de infecções causadas por bactérias multirresistentes a antimicrobianos é um sinal de alerta de que a microbiota adquirida no vício pode se converter em sérios problemas para os familiares desses pacientes quando do seu retorno ao convívio familiar, onde pessoas mais idosas e crianças pequenas oferecem pouca resistência a esses agentes infecciosos29. Dentre esses microrganismos destacam-se os gêneros Enterococcus, Pseudomonas, Helicobacter, além dos bastonetes Gram negativos entéricos e viruses capazes de induzir imunossupressão. 17 PROPOSIÇÃO 18 2. PROPOSIÇÃO Em função da problemática do consumo de drogas lícitas e ilícitas, bem como o seu incremento entre jovens do gênero feminino, esse estudo teve como objetivos: a) verificar a existência de alterações comportamentais e psicológicas em pacientes do gênero feminino, dependentes de drogas lícitas (tabaco e álcool) e ilícitas (crack, êxtase, cocaína, heroína, LSD, maconha), mantidas em clínica de desintoxicação, em relação a um grupo controle de pacientes não dependentes de drogas; b) verificar as condições de saúde bucal e queixas de ordem sistêmica dessas pacientes em relação a um grupo controle de pacientes não dependentes de drogas; c) avaliar a ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de bactérias e leveduras oportunistas no biofilme subgengival, supragengival, mucosa bucal, além da contaminação presente na saliva dessas pacientes. 19 MATERIAIS E MÉTODOS 20 3. MATERIAIS E MÉTODOS Este estudo foi submetido à aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Fundação Municipal de Educação e Cultura de Santa Fé do Sul- FUNEC (Processo- 04/2007) e ao Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Araçatuba-UNESP (Processo FOA-1797/07) Todos os procedimentos clínicos e laboratoriais do presente estudo foram acompanhados por profissionais de saúde do Centro de Recuperação de Dependentes Químicos “Lar Madre Paulina” e das duas instituições de ensino superior. 3.1 População estudada A amostra estudada foi constituída de 50 pacientes do gênero feminino, com idade variando de 18 a 55 anos (29,88 ± 9,3 anos em média), mantidas em regime de internato, junto ao Centro de Recuperação de Dependentes Químicos “Lar Madre Paulina”, para desintoxicação. Foram incluídos na amostra as pacientes que autorizaram a participação na pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e estavam para iniciar o tratamento de desintoxicação. As pacientes que participaram do estudo tinham um registro sobre seu histórico de uso de drogas lícitas ou ilícitas, não utilizaram compostos antimicrobianos ou foram submetidas a tratamento odontológico nos seis meses que precederam o estudo, sendo que a grande maioria (76%) passou a utilizar medicação anti- hipertensiva (Captopril), uma vez que apresentavam quadro de hipertensão arterial, além de antidepressivos (Diazepan),a critério médico. Dessas pacientes, 19 apresentavam gengivite generalizada, 12 tinham periodontite crônica, 13 eram periodontalmente sadias, segundo os critérios de Armitage (2004), enquanto seis eram portadoras de prótese total. 21 Na constituição dos grupos, foram consideradas como portadoras de gengivite as pacientes que apresentavam inflamação gengival em pelo menos 30% dos sítios periodontais e não apresentavam evidências de perda óssea e de inserção conjuntiva. As pacientes com periodontite deveriam apresentar pelo menos três sítios periodontais, em dentes não contíguos, com evidências de perda óssea e de inserção conjuntiva, bem como inflamação gengival. Indivíduos sadios não podiam apresentar quaisquer dessas características, ou quando presentes, deveriam estar limitadas a um único sítio anatômico e mostrar relação clara com fatores locais, como restaurações, próteses fixas ou posicionamento dental no arco. No grupo teste, três pacientes portadoras do vírus HIV participaram do estudo. A seleção e acompanhamento das pacientes foram realizados por docentes da disciplina de Estomatologia das Faculdades Integradas de Santa Fé do Sul-FUNEC, além de médicos, psicólogos e assistentes sociais do centro de recuperação. Quanto ao grupo controle, o mesmo foi constituído de 50 pacientes do gênero feminino, na mesma faixa etária (31,3 ± 7,5 anos em média), não dependentes de drogas lícitas ou ilícitas, que não apresentavam patologias sistêmicas e não utilizavam medicamentos imunossupressores ou capazes de afetar a secreção de saliva, além de não terem utilizado drogas antimicrobianas, medicamentos psicoativos ou recebido tratamento odontológico nos seis meses anteriores ao início do estudo. Esse grupo foi submetido aos mesmos procedimentos clínicos e laboratoriais. A seleção das pacientes do grupo controle foi realizada através de um sistema de busca parametrizada desenvolvido pela Profa. Dra Christiane Marie Schweitzer do Centro de Matemática, Computação e Cognição da Universidade Federal do ABC-SP. Esse programa de busca priorizou aspectos de gênero, idade e condição sócio- econômica e cultural. Das pacientes do grupo controle, 11 eram portadoras de gengivite generalizada, uma apresentava periodontite, 36 eram periodontalmente sadias, segundo os mesmos critérios citados acima, enquanto duas eram portadoras de prótese total. 22 Formulários padronizados foram preenchidos, constando informações referentes à identificação, idade, condições de saúde sistêmica, consumo de tabaco, consumo de bebida alcoólica, uso de drogas ilícitas, período de abstinência, além do exame físico. O questionário foi aplicado por assistentes sociais das entidades envolvidas e as pacientes foram informados do sigilo que norteou a coleta desses dados. Informações técnicas referentes à dependência física e psicológica de drogas foram também fornecidas pelos profissionais de saúde do centro de reabilitação e médicos particulares das pacientes. Os dados obtidos a partir dos grupos experimentais foram inseridos em tabelas de contingenciamento relacionando as categorias estudadas e as freqüências relativas obtidas, condições de saúde geral e bucal dessas pacientes, uso das drogas e dados microbiológicos obtidos. 3.2 Exame clínico bucal Inicialmente precedeu-se a anamnese, em formulários padronizados, constando a identificação do paciente, idade, aspectos étnico-raciais, história da doença atual, história social, médica e familiar, realizando-se a seguir, os exames clínicos intra e extrabucais. No atendimento das pacientes, todas as lesões teciduais clinicamente detectáveis eram avaliadas considerando sua localização, formato, superfície, consistência, cor, base de implantação, sintomatologia, presença ou ausência de lesões ulceradas e encaminhadas para tratamento junto à Faculdade de Odontologia de Santa Fé do Sul (grupo teste) ou junto à Faculdade de Odontologia de Araçatuba-UNESP (grupo controle). 23 3.3 Exame clínico periodontal Com exceção das pacientes usuárias de prótese total (seis pacientes do grupo de dependentes químicos e duas pacientes do grupo controle), todas as pacientes examinadas apresentaram, pelo menos, 15 elementos dentais. Os exames clínicos periodontais foram realizados por um único examinador previamente treinado, utilizando-se os critérios do Periodontal Screening and Recording (PSR). O exame foi realizado com o uso de espelho bucal plano, pinça para algodão (DuflexR) e sondas periodontais milimetradas tipo Williams (TrinityR). A sonda era introduzida no sulco gengival, de maneira delicada, posicionada paralela ao longo eixo do dente e esta percorria todas as faces dos dentes presentes de cada indivíduo. A cavidade bucal do indivíduo era dividida em seis sextantes. O maior escore do PSR era registrado para cada um dos sextantes e que se ausente, era registrado com um X. Os escores variaram de 0 a 4. Código 0: ausência de bolsa periodontal, sem sangramento a sondagem, ausência de cálculo e excessos de margens restauradoras. Código 1: ausência de bolsa periodontal, embora com presença de sangramento a sondagem; sem cálculo e excessos nas margens das restaurações. Código 2: ausência da bolsa periodontal, sangramento a sondagem, presença de cálculo supra e/ou subgengival e/ou excessos nas margens de restaurações. Código 3: presença de bolsa de 3,5 a 5,5 mm, necessitando de um exame periodontal complementar apenas do sextante com periodontograma, radiografias, medidas de bolsa e nível de inserção e outros e de tratamento periodontal especializado do sextante. Código 4: presença de bolsa periodontal acima de 5,5mm, o qual, por ser considerado periodontite avançada, havia necessidade de se realizar um minucioso exame periodontal convencional de toda boca, medidas de bolsas e periodontograma. 30 A inserção do código (*) no sextante significava a presença de problemas como envolvimento de furca, mobilidade, problemas muco-gengivais (perda de gengiva inserida) e 24 retração gengival acima de 3,5mm. Os dados coletados eram registrados em ficha apropriada, segundo recomendação da American Dental Association e American Association of Periodontology. Os indivíduos diagnosticados com os códigos 3 e 4 receberam exame periodontal mais detalhado, no qual eram considerados o índice sangramento gengival31, presença de calculo supragengival, determinação da profundidade clínica de sondagem e o nível clínico de inserção, índice de higiene oral,32 sendo que esses últimos dados eram utilizados para categorizar as condições de higiene bucal. 3.4 Coleta dos espécimes clínicos A coleta dos espécimes clínicos foi realizada como descrito a seguir, em procedimentos que foram realizados das 8:30 às 10:30 horas, para minimizar os efeitos do ciclo circadiano sobre a secreção de saliva e sua composição. As coletas foram realizadas imediatamente antes do exame clínico das condições periodontais das pacientes e pelo menos duas horas após qualquer procedimento de higiene bucal, ingestão de alimento ou líquidos. A saliva não estimulada (1 mL) era coletada com auxílio de pipetas Pasteur plásticas esterilizadas e transferida para criotubos contendo água ultra-pura Milli Q, que eram armazenados a -196oC, por até 30 dias, para a extração do DNA bacteriano. As amostras do biofilme supragengival eram removidas com auxílio de curetas esterilizadas e transferidas para criotubos contendo água ultrapura Milli Q e mantidas nas mesmas condições acima descritas. Os espécimes do biofilme subgengival foram obtidos com o uso de cones de papel absorvente esterilizados, após a remoção do biofilme supragengival. A seguir, depois de permanecerem por 30 segundos no interior dos sulcos gengivais ou bolsas periodontais, os cones de papel eram transferidos para criotubos contendo água ultrapura e enviadas ao laboratório para o adequado processamento. Quando esse último não podia ser realizado 25 imediatamente, as amostras eram mantidas em nitrogênio líquido, para evitar possível degradação do DNA. A coleta dos espécimes clínicos da mucosa oral foi feita utilizando-se zaragatoas esterelizadas, que após serem friccionadas na mucosa, eram transferidas para criotubos contendo água ultrapura Milli Q e mantidas nas mesmas condições acima descritas 3.5 Extração do DNA alvo e determinação de sua concentração O DNA das amostras clínicas nos criotubos com água Milli Q era extraído através do “kit” QIAamp DNA (QIAGEN, Hilden, Alemanha). Cada amostra era adicionada a 20�L de proteinase K, seguida de 200�L do tampão AL, mantendo-se a mistura a 56oC, por 10 minutos, adicionando-se, a seguir, etanol absoluto (200 �L) e centrifugando-se o conjunto através do “QIAamp Column”, a 6000xg, por 1 minuto. A seguir, desprezava-se o filtrado e adicionavam-se 500 �L do tampão AW1 e repetia- se a centrifugação, desprezando-se, novamente, o filtrado. Imediatamente, 500 �L do tampão AW2 eram adicionados ao “QIAamp Column” e o conjunto era centrifugado a 14.000xg por 3 minutos. Desprezava-se o filtrado, enquanto 200 �L de tampão AE eram adicionados ao “QIAamp Column”, por 1 minuto, antes de submeter o conjunto à centrifugação final a 6000xg, por 1 minuto. O filtrado era mantido a -196oC. A concentração do DNA alvo, em cada amostra, era determinada em espectrofotômetro (Beckman, Modelo DU-640), com leitura da absorbância (A260 nm). 3.6 Detecção, por PCR, dos principais microrganismos oportunistas e viruses herpéticos (CMV, HSV-1 e EBV-1). A presença de leveduras do gênero Candida, bem como Enterobacteriaceae, Enterococcus sp., E. faecalis, E. faecium, Helicobacter sp., H. pylori, Pseudomonas sp., P. 26 aeruginosa bem como os viruses Epstein-Barr tipo 1, citomegalovirus e Herpes simples tipo 1 foi avaliada pela amplificação do DNA por PCR, empregando-se iniciadores e condições específicas para cada agente infeccioso33,34,35,36,37,38,39,40,41em termociclador Amplitherm (GeneAmp PCR System). Os iniciadores e a temperatura de anelamento dos mesmos são apresentados nas Tabelas 1 e 2. A detecção de Helicobacter sp., H. pylori e dos viruses da família Herpesviridae foi realizada através de “nested” PCR, onde 5μL do produto da amplificação inicial do DNA, utilizando-se iniciadores externos, eram submetidos a um segundo conjunto de ciclos de amplificação empregando-se iniciadores internos. Da mesma forma, as leveduras do gênero Candida foram detectadas por “semi-nested” PCR, onde 2μL do produto da amplificação inicial do DNA, com os iniciadores genéricos para Candida sp., eram submetidos à nova série de ciclos de amplificação empregando-se o iniciador reverso (5'-TCT TTT CCT CCG CTT ATT GAT ATG C-3') associado ao iniciador específico para cada espécie de levedura a ser detectada (Tabela 1), conforme descrito por Ahmad et al.38 As amplificações do DNA eram realizadas em volumes de 25 μl, contendo 2,5 μl de 10 X tampão PCR, 1,25 μl de MgCl2 (50 mM), 2,0 μl de dNTP (10 mM), 0,25 μl de Taq DNA polimerase (0,5 U), 1,0 μl de cada iniciador (0,4 μM), 7 μl de água ultrapura Milli-Q esterilizada e 10 μl de DNA (ng). A amplificação era realizada em aparelho de PCR programado para: 1 ciclo de 94oC (5 min.); de 30 a 36 ciclos de 94oC (1 min.), temperatura de anelamento de cada iniciador por 30 s.- 2 min., 72oC (1 min.) e 1 ciclo de 72oC (5 min.), para a extensão final da cadeia de DNA em amplificação. Em todas as reações foram utilizadas, como controle positivo, DNA de cepas de referência das bactérias e fungos estudados, enquanto DNA controle dos viruses EBV-1 e CMV foi fornecido pelo Laboratório de Virologia do Instituto de Ciências Biomédicas-USP. Os produtos da amplificação pelo PCR eram submetidos à eletroforese em gel de agarose a 27 1%, corados com brometo de etídio (0,5 μg/ml) e fotografados sobre transiluminador com luz UV com câmara Kodak (Eletrophoresis Documentation and Analyses System 120). Como padrão de peso molecular utilizou-se o marcador 1Kb DNA ladder (Gibco, SP). 28 Tabela 1. Iniciadores específicos utilizados nos ensaios de PCR para detecção de bactérias oportunistas e leveduras do gênero Candida. Iniciadores específicos Oligonucleotídeos Temperatura de anelamento Candida sp. 5'-TCG CAT CGA TGA AGA ACG CAG C-3' 5'-TCT TTT CCT CCG CTT ATT GAT ATG C-3' 60oC C. albicans 5'-ATT GCT TGC GGC GGT AAC GTC C-3' 5'-TCT TTT CCT CCG CTT ATT GAT ATG C-3' 60oC C. parapsilosis 5'-ACA AAC TCC AAA ACT TCT TCC A-3' 5'-TCT TTT CCT CCG CTT ATT GAT ATG C-3' 60oC C. tropicalis 5'-AAC GCT TAT TTT GCT AGT GGC C-3' 5'-TCT TTT CCT CCG CTT ATT GAT ATG C-3' 60oC C. glabrata 5'-TAG GTT TTA CCA ACT CGG TGT T-3' 5'-TCT TTT CCT CCG CTT ATT GAT ATG C-3' 60oC Enterobacteriaceae 5'-AAC CAG TTC CGC GTT GGC CTG G-3’ 5'-CCT GAA CAA CAC GCT CGG A-3’ 50oC Enterococcus spp. 5’- TAC TGA CAA ACC ATT CAT GAT G-3’ 5’- AAC TTC GTC ACC AAC GCG AAC -3’ 55oC E. faecalis 5’- ATC AAG TAC AGT TAG TCT-3’ 5’- ACG ATT CAA AGC TAA CTG-3’ 47oC Helicobacter sp. 5�-AGA GTT TGA TCM TGG CTC A-3� iniciador externo 5�-AAG GAG GTG ATC CAG CC-3� iniciador externo 5`-TGG CAA TCA GCG TCA GGT AAT G-3` iniciador interno 5`-GCT AAG AGA TCA GCC TAT GTC C-3` iniciador interno 50oC H. pylori 5`-CTG GAG AGA CTA AGC CCT CC-3` iniciador externo 5`-AGG ATC AAG GTT TAA GGA TT-3` iniciador externo 5`-CTG GAG AGA CTA AGC CCT CC-3` iniciador interno 5`-ATT ACT GAC GCT GAT TGT GC-3` iniciador interno 55oC 62oC Pseudomonas sp. 5’-GAC GGG TGA GTA ATG CCT A-3’ 5’-CAC TGG TGT TCC TTC CTA TA-3’ 54oC P. aeruginosa 5’-GGG GGA TCT TCG GAC CTC A-3’ 5’-TCC TTA GAG TGC CCA CCC G-3’ 58oC Universal 5’- AGA GTT TGA TCC TGG CTG AG-3’ 5’- ACG GCT ACC TTG TTA CGA CTT-3’ 55oC 29 Tabela 2. Iniciadores e temperatura de anelamento empregados no “nested” PCR para os viruses da família Herpesviridae. Iniciadores específicos Oligonucleotídeos Temperatura de anelamento Herpes virus tipo 1 5`-TAC ATC GGC GTC ATC TAC GGG G-3` inic. externo 5`-GGG CCA GGC GCT TGT TGG TGT A-3` inic. externo 5`-GCG TTT ATC AAC CGC ACC TCC-3` inic. interno 5`-CAG TTC GGC GGT GAG GAC AAA-3` inic. Interno Inic. Externo 57oC Inic. Interno 56oC Citomegalovírus 5`-GAG GAC AAC GAA ATC CTG TTG GGC A-3` inic. externo 5`-TCG ACG GTG GAG ATA CTG CTG AGG-3` inic. externo 5`-ACC ACC GCA CTG AGG AAT GTC AG-3` inic. interno 5`-TCA ATC ATG CGT TTG AAG AGG TA-3` inic. Interno Inic. Externo 56oC Inic. Interno 50oC Epstein-Barr tipo 1 5`-AGG GAT GCC TGG ACA CAA GA-3` inic. externo 5`-TGT GCT GGT GCT GCT GGT GG-3` inic. externo 5`-AAC TTC AAC CCA CAC CAT CA-3` inic. interno 5`-TTC TGG ACT ATC TGG ATC AT-3` inic. Interno Inic. Externo 56oC Inic. Interno 46oC ANÁLISE ESTATÍSTICA As diferenças na prevalência e participação dos microrganismos estudados foram analisadas através de teste de Análise de Variãncia de medidas repetidas para dados categóricos. O teste de Qui-Quadrado, teste exato de Fisher e teste de Mann-Whitney foram utilizados para avaliar a significância dessas possíveis associações. A análise foi realizada no Centro de Matemática Computação e Cognição da UFABC. O nível de significância adotado foi de 5%. 30 RESULTADOS 31 4. RESULTADOS Do grupo de pacientes dependentes químicas anáisado, 19 pacientes apresentavam gengivite generalizada, 12 tinham periodontite crônica, 13 eram periodontalmente sadias, segundo os critérios de Armitage (2004), enquanto seis eram portadoras de prótese total. Das pacientes do grupo controle, 11 eram portadoras de gengivite generalizada, uma apresentava periodontite, 36 eram periodontalmente sadias, segundo os mesmos critérios citados acima, enquanto duas eram portadoras de prótese total. Verificou-se que 94% das pacientes do grupo teste eram usuárias de mais do que uma única droga, sendo o tabaco (92%), bebidas alcoólicas (68%), crack (66%) e cocaína (52%) as mais consumidas, quase sempre em múltiplas associações. Os resultados apresentados na Tabela 3 evidenciam que o grupo de pacientes usuárias de drogas lícitas e ilícitas, mantidas no centro de desintoxicação, fazia uso de ampla variedade de associações de produtos, anteriormente à sua internação, sendo que apenas três (6%) das pacientes eram dependentes de uma única droga, no caso, o etanol, enquanto as demais internas utilizavam diversas drogas concomitantemente, mostrando padrões de dependência, sendo que o tabaco foi consumido por 92% das dependentes e o álcool foi utilizado por 68% delas. Além desses compostos ainda merece consideração o consumo de cocaína (52,0%), crack (66,0%), maconha (46,0%), ácido lisérgico (LSD; 24,0%) e êxtase (18,0%), sempre em associação com o consumo e dependência ao álcool e tabaco (Tabela 3). Além desses compostos, uma ampla gama de extratos de plantas alucinógenas e outros produtos de origem vegetal parece ser utilizada por 14% das pacientes, sendo que o consumo desses compostos se exacerbava na ausência dos demais produtos. As associações de drogas envolvendo álcool, tabaco, cocaína e crack se mostraram predominantes, mas sem significância estatística. 32 Tabela 3. Associações de drogas empregadas pelas pacientes com dependência química. Drogas e associações Ocorrência n(%) Tabaco + álcool 6 (12,0) Tabaco + álcool + maconha + cocaína + crack 6 (12,0) Tabaco + álcool + cocaína + crack 5 (10,0) Tabaco + álcool + crack 5 (10,0) Tabaco + crack 4 (8,0) Tabaco + álcool + maconha + cocaína + crack+ LSD+ outras 4 (8,0) Tabaco + álcool + maconha + cocaína + crack+ LSD+ êxtase+ outras 3 (6,0) Tabaco + maconha + crack 3 (6,0) Álcool 3 (6,0) Tabaco + cocaína 2 (4,0) Tabaco + êxtase + maconha + cocaína + LSD 2 (4,0) Tabaco + êxtase + maconha 2 (2,0) Tabaco + álcool + maconha + cocaína + crack+ LSD 1 (2,0) Tabaco + cocaína + crack + LSD + êxtase 1 (2,0) Tabaco + cocaína + maconha + crack + êxtase 1 (2,0) Tabaco + maconha + LSD 1 (2,0) Álcool + cocaína 1 (2,0) Dentre os sinais e sintomas com base comportamental ou neurológica, observados ou relatados, destaca-se a sensação de angústia, nervosismo, apreensão e irritabilidade, os quais estiveram presentes em frequência significativamente maior no grupo de dependentes químicos (Tabela 4), embora não se possa estabelecer uma correlação entre essas condições e os aspectos clínicos e microbiológicos observados. A ocorrência de epilepsia foi observada apenas em pacientes com dependência química, embora essa ocorrência não tenha atingido a significância estatística. Todas as manifestações ou distúrbios comportamentais e neurológicos observados ou relatados, com exceção do transtorno bipolar e da epilepsia, se mostraram estatisticamente associadas ao grupo de pacientes com dependência química (teste de Qui-quadrado, P < 0,001). 33 A avaliação clínica das pacientes com dependência química, bem como os dados obtidos na anamnese e do histórico médico das pacientes evidenciou que, no período imediatamente anterior à internação, todas apresentavam queixas de saúde, que variaram de ocorrência de herpes zoster em uma paciente, até dores articulares e baixa resistência a infecções, sendo que essa última condição foi considerada quando a paciente ou a equipe de saúde relatava infecções persistentes em intervenções cirúrgicas ou feridas traumáticas, ocorrência de infecções cutâneas, bucais e/ou respiratórias que se mostraram persistentes ou com relapses frequentes. A grande maioria dos dados obtidos se mostrou de difícil confirmação clínica, como a ocorrência de xerostomia leve, sintomas como dores articulares e nas costas, fadiga, cefaléia, mal-estar geral, zumbido e formigamento das extremidades, enquanto outros, como ocorrência de gengivite, periodontite, tosse, edema das extremidades, amigdalite, herpes simples e herpes zoster puderam ser confirmadas ao exame clínico intrabucal e exame físico. Uma terceira categoria de resultados pôde ser confirmada pela equipe médica responsável pelo acompanhamento das pacientes: dados relativos ao processo de reparo, infecções pregressas, hipertensão ou hipotensão arterial, alergias e inflamações articulares, sudorese noturna e histórico de perda de peso, úlcera, fraqueza muscular e distúrbios neurológicos e de comportamento, entre outros. 34 Tabela 4. Aspectos comportamentais psicológicos de pacientes dependentes químicas internadas em programa de desintoxicação. Ocorrência n(%) Manifestações neurológicas Dependentes químicos Grupo controle Comparações estatisticamente significativas (�) Angústia 29 (58,0) 4 (8,0) � Nervosismo 27 (54,0) 7 (14,0) � Prostração 15 (30,0) 2 (4,0) � Apreensão 13 (26,0) 4 (8,0) � Irritabilidade 12 (24,0) 3 (6,0) � Epilepsia 3 (6,0) 0 (0,0) - Transtorno bipolar 2 (4,0) 1 (2,0) - A ocorrência, ou o relato da ocorrência, de dores nas costas, infecções cutâneas e respiratórias, cefaléia, fadiga, dispnéia, poliúria, xerostomia, formigamento das extremidades, anemia, alergias, artrites, polidipsia, ocorrência de periodontite, perda de peso e retardo do processo de reparo foram estatisticamente mais freqüentes no grupo de pacientes com dependência química, quando comparados com o grupo controle (Tabela 5). Outras condições, como hepatites virais e ocorrência de asma, gengivite, amigadalites, sudorese, coagulopatias, entre outras, a despeito de uma maior ocorrência no grupo de dependentes químicas, não foram observadas diferenças significativas entre os dois grupos. As condições de higiene bucal são apresentadas na Tabela 6, sendo que não foram observadas diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos de pacientes, predominando pacientes com higiene oral moderada ou precária, enquanto a ocorrência de pacientes com higiene considerada boa foi restrita a menos de 20% do total de indivíduos de cada grupo, sendo que condições excelentes de higiene estiveram restritas a uma interna dependente química e quatro pacientes do grupo controle. Verificou-se que as pacientes com periodontite apresentavam maior idade do que as pacientes saudáveis ou com gengivite (teste de Mann-Whitney, P=0,005) e perda óssea (teste de Mann-Whitney, P < 0,001), 35 independentemente da presença ou ausência de dependência química. O consumo de bebidas alcoólicas, cocaína e crack mostraram relação com o grau de mobilidade dental (teste de Qui- quadrado, P < 0,001; teste exato de Fisher, P = 0,022). Tabela 5. Principais manifestações clínicas e queixas nas pacientes com dependência química e no grupo controle. Ocorrência n(%) Manifestações sistêmicas e bucais Dependentes químicos Grupo controle Comparações estatisticamente significativas (�) Hipertensão arterial3 38 (76,0) 1 (2,0) �1 Dores nas costas 26 (52,0) 8 (16,0) � Infecções freqüentes 25 (50,0) 2 (4,0) � Cefaléia freqüente 21 (42,0) 4 (8,0) � Gengivite 19 (38,0) 11 (22,0) -2 Fadiga 17 (34,0) 4 (8,0) � Dispnéia 16 (32,0) 2 (4,0) � Poliúria 16 (32,0) 2 (4,0) � Xerostomia 16 (32,0) 1 (2,0) � Formigamento das extremidades 14 (28,0) 2 (4,0) � Anemia 13 (26,0) 3 (6,0) � Periodontite 12 (24,0) 1 (2,0) � Alergias 11 (22,0) 3 (6,0) � Tosse renitente 11 (22,0) 2 (4,0) � Artrites 9 (18,0) 1 (2,0) � Edema das extremidades 9 (18,0) 3 (6,0) - Polidipsia 9 (18,0) 0 (0,0) � Perda de peso 9 (18,0) 0 (0,0) � Retardo do processo de reparo 8 (16,0) 1 (2,0) � Fragilidade vascular 7 (14,0) 0 (0,0) - Sudorese noturna 7 (14,0) 0 (0,0) - Amigdalites recorrentes 6 (12,0) 3 (6,0) - Coagulopatias 6 (12,0) 0 (0,0) - Herpes simples 6 (12,0) 5 (10,0) - 1Estatisticamente significante (P<0,05) 2Sem significância estatística 3Dados relativos à hipertensão arterial foram obtidos junto aos médicos responsáveis pelo acompanhamento da pacientes, visto que a maioria recebia medicação anti-hipertensiva. 36 Tabela 5. Continuação. Principais manifestações clínicas e queixas nas pacientes com dependência química e nas pacientes do grupo controle. Ocorrência n(%) Manifestações sistêmicas e bucais Dependentes químicos Grupo controle Comparações estatisticamente significativas (�) Polifagia 6 (12,0) 1 (2,0) -2 Zumbido e outras disfunções auditivas 6 (12,0) 0 (0,0) - Anorexia 5 (10,0) 2 (4,0) - Sialorréia 5 (10,0) 1 (2,0) - Ulcera gástrica ou gastrite 5 (10,0) 2 (4,0) - Asma brônquica 4 (8,0) 2(4,0) - Cegueira noturna 4 (8,0) 1 (2,0) - Dores pré-cordiais 4 (8,0) 0 (0,0) - Hipotensão arterial 4 (8,0) 7 (14,0) - Micoses freqüentes 4 (8,0) 0 (0,0) - Náuseas freqüentes 4 (8,0) 2 (4,0) - Nefropatia 4 (8,0) 0 (0,0) - Xeroftalmia 4 (8,0) 0 (0,0) - AIDS 3 (6,0) 0 (0,0) - Câncer 3 (6,0) 0 (0,0) - Diabete 3 (6,0) 1 (2,0) - Diarréia freqüente 3 (6,0) 1 (2,0) - Fotofobia 3 (6,0) 0 (0,0) - Hematomas 3 (6,0) 0 (0,0) - Hepatite B 3 (6,0) 0 (0,0) - Hepatite C 3 (6,0) 0 (0,0) - Hepatite A 2 (4,0) 1 (2,0) - Apendicite 2 (4,0) 1 (2,0) - Cianose 2 (4,0) 0 (0,0) - Hipertermia freqüente 2 (4,0) 1 (2,0) - Odinofagia 2 (4,0) 0 (0,0) - Hepatopatia 2 (4,0) 0 (0,0) - Sífilis 2 (4,0) 0 (0,0) - Doença de Chagas 1(2,0) 0 (0,0) - Herpes zoster 1 (2,0) 0 (0,0) - Indivíduos sem manifestações ou queixas 0 (0,0) 33 (66,0) �1 1Estatisticamente significante (P<0,05) 2Sem significância estatística 37 Tabela 6. Condições de higiene bucal entre dependentes químicas (N=44, portadoras de 15 ou mais dentes) e grupo controle (N=48, portadoras de 15 ou mais dentes). Ocorrência n(%) Condição de higiene observada Dependentes químicos Grupo controle Comparações estatisticamente significativas (�) Higiene excelente1 1 (2,27) 4 (8,33) - Higiene boa2 8 (18,18) 7 (14,58) - Higiene bucal moderada3 23 (52,27) 28 (58,33) - Higiene bucal precária4 12 (27,27) 9 (18,75) - 1Higiene excelente: ausência de placa visível e cálculo. 2Higiene boa: placa visível em até 30% dos sítios avaliados e ausência de cálculo. 3Higiene moderada: placa visível em mais de 30% dos sítios avaliados e ausência de cálculo 4Higiene precária: placa visível em mais de 30% dos sítios avaliados e presença de cálculo A freqüência de escovação na população estudada não se mostrou influenciada pela idade e consumo de drogas, mas como a freqüência de escovação era autodeclarada, não se pode deixar de considerar a possibilidade de que essa informação tenha sido influenciada por aspectos culturais, onde a paciente passa a declarar o que considera adequado e não o que de fato realiza. Para a maioria das bactérias oportunistas estudadas, como o gênero Pseudomonas, além de P. aeruginosa e da família Enterobacteriaceae, o habitat principal na cavidade bucal mostrou ser o biofilme supragengival e, em menor extensão, o biofilme subgengival, sendo que o inverso ocorre com Helicobacter sp. e H. pylori, onde o biofilme subgengival parece ter uma importância maior, mesmo que sem significância estatística. Para o gênero Enterococcus e E. faecalis, o biofilme supragengival e as mucosas foram mais relevantes, seguidos pelo biofilme subgengival. Os fungos do gênero Candida foram distribuídos de forma mais homogênea nas mucosas e no biofilme supragengival, enquanto as presenças de EBV-1 e CMV, na saliva, apresentaram correlação com a presença dos mesmos viruses no biofilme subgengival. 38 Os aspectos microbiológicos são apresentados na Tabelas 7 até a Tabela 14. A contaminação presente na saliva mostrou particularidades quanto à ocorrência dos microrganismos estudados, quando comparados os dois grupos, com maior freqüência de Candida sp. (P=0,033), C. albicans (P=0,039), família Enterobacteriaceae (P=0,022), Enterococcus sp. (P=0,046), Helicobacter sp. (P=0,033), H. pylori (P=0,045), vírus CMV (P=0,042) e vírus EBV-1 (P=0,019) na saliva das pacientes com dependência química em relação ao grupo controle, independentemente das condições de saúde periodontal da população alvo, refletindo em grande parte as características da microbiota associada aos biofilmes supragengival e subgengival, bem como a microbiota das mucosas. Para o biofilme supragengival, o grupo de pacientes com dependência química apresentou maior proporção de amostras positivas para Candida sp., C. albicans, família Enterobacteriaceae, Enterococcus sp., E. faecalis, Helicobacter sp., H. pylori, Pseudomonas sp., P. aeruginosa e vírus EBV-1. Para o biofilme subgengival, observou-se maior prevalência da família Enterobacteriaceae, Helicobacter sp., H. pylori, bem como todos os viruses da família Herpesviridae testados. Nas amostras de mucosa, observou-se maior prevalência de Candida sp., C. albicans, Helicobacter sp., viruses CMV e EBV-1. 39 Tabela 7. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas na saliva de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR. Grupos Microrganismos Dependentes Não Dependentes Comparações estatisticamente significativas (�) Candida sp. 21(42,0) 7 (14,0) � C. albicans 11 (22,0) 4 (8,0) �1 C. parapsilosis 3 (6,0) 0 (0,0) -2 C. tropicalis 4 (8,0) 1 (2,0) - C. glabrata 3 (6,0) 1 (2,0) - Enterobacteriaceae 22 (44,0) 6 (12,0) � Enterococcus sp. 16 (32,0) 9 (18,0) � E. faecalis 11 (22,0) 7 (14,0) - E. faecium 2 (4,0) 0 (0,0) - Helicobacter sp. 39 (78,0) 16 (32,0) � H. pylori 28 (56,0) 11 (22,0) � Pseudomonas sp. 12 (24,0) 5 (10,0) - P. aeruginosa 9 (18,0) 3 (6,0) - Viruses herpéticos Herpes virus tipo 1 8 (16,0) 1 (2,0) - Citomegalovírus 15 (30,0) 3 (6,0) � Epstein-Barr tipo 1 21 (42,0) 6 (12,0) � 1Estatisticamente significante (P<0,05) 2Sem significância estatística 40 Tabela 8. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme supragengival de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR. Grupos Microrganismo Dependentes Não Dependentes Comparações estatisticamente significativas (�) Candida sp. 23 (46,0) 9 (18,0) � C. albicans 18 (36,0) 5 (10,0) �1 C. parapsilosis 1 (2,0) 1 (0,0) -2 C. tropicalis 0 (0,0) 1 (2,0) - C. glabrata 2 (4,0) 1 (2,0) - Enterobacteriaceae 28 (56,0) 9 (18,0) � Enterococcus sp. 22 (44,0) 9 (18,0) � E. faecalis 19 (38,0) 7 (14,0) � E. faecium 1 (2,0) 0 (0,0) - Helicobacter sp. 23 (46,0) 12 (24,0) � H. pylori 20 (40,0) 11 (22,0) � Pseudomonas sp. 16 (32,0) 5 (10,0) � P. aeruginosa 13 (26,0) 3 (6,0) � Viruses herpéticos Herpes virus tipo 1 1 (2,0) 1 (2,0) - Citomegalovírus 8 (16,0) 6 (12,0) - Epstein-Barr tipo 1 19 (38,0) 5 (10,0) � 1Estatisticamente significante (P<0,05) 2Sem significância estatística 41 Tabela 9. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme subgengival de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR. Grupos Microrganismo Dependentes Não Dependentes Comparações estatisticamente significativas (�) Candida sp. 9 (18,0) 5 (10,0) - C. albicans 8 (16,0) 5 (10,0) - C. parapsilosis 0 (0,0) 0 (0,0) - C. tropicalis 0 (0,0) 0 (0,0) - C. glabrata 0 (0,0) 0 (0,0) - Enterobacteriaceae 21 (42,0) 5 (10,0) �1 Enterococcus sp. 10 (20,0) 6 (12,0) -2 E. faecalis 9 (18,0) 6 (12,0) - E. faecium 0 (0,0) 0 (0,0) - Helicobacter sp. 29 (58,0) 10 (20,0) � H. pylori 23 (46,0) 10 (20,0) � Pseudomonas sp. 7 (14,0) 3 (6,0) - P. aeruginosa 6 (12,0) 0 (0,0) - Viruses herpéticos - Herpes virus tipo 1 13 (26,0) 3 (6,0) � Citomegalovírus 24 (48,0) 11 (22,0) � Epstein-Barr tipo 1 30 (60,0) 9 (18,0) � 1Estatisticamente significante (P<0,05) 2Sem significância estatística 42 Tabela 10. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas na mucosa bucal de pacientes com dependência química ou do grupo controle, segundo dados obtidos por amplificação do DNA microbiano por PCR. Grupos Microrganismo Dependentes Não Dependentes Comparações estatisticamente significativas (�) Candida sp. 29 (58,0) 11 (22,0) � C. albicans 21(42,0) 8 (16,0) �1 C. parapsilosis 5 (10,0) 1 (2,0) -2 C. tropicalis 5 (10,0) 1 (2,0) - C. glabrata 8 (16,0) 3 (6,0) - Enterobacteriaceae 12 (24,0) 7 (14,0) - Enterococcus sp. 14 (28,0) 8 (16,0) - E. faecalis 13 (26,0) 8 (16,0) - E. faecium 4 (8,0) 0 (0,0) - Helicobacter sp. 19 (38,0) 11 (22,0) � H. pylori 16 (32,0) 11 (22,0) - Pseudomonas sp. 9 (18,0) 5 (10,0) - P. aeruginosa 9 (18,0) 5 (10,0) - Viruses herpéticos Herpes virus tipo 1 8 (16,0) 3 (6,0) - Citomegalovírus 10 (20,0) 6 (12,0) � Epstein-Barr tipo 1 17 (34,0) 6 (12,0) � 1 Estatisticamente significante (P<0,05) 2 Sem significância estatística Quando esses dados são analisados em relação à condição periodontal das pacientes examinadas, independentemente da existência ou não de dependência química, verifica-se que, nas amostras de saliva, C. albicans e os viruses CMV e EBV-1 foram mais freqüentes entre os portadores de sangramento gengival e gengivite, enquanto as amostras de saliva de pacientes com periodontite apresentaram maior freqüência de viruses herpéticos CMV e EBV-1 e a família Enterobacteriaceae. 43 A presença de C. albicans, nas amostras de saliva, independentemente da dependência química ou não, se mostrou ligada a gengivite severa (teste de Mann-Whitney, P=0,037), o mesmo ocorrendo com os viruses CMV e EBV-1. Em pacientes com periodontite, maior profundidade clínica de sondagem mostrou correlação com a família Enterobacteriaceae e os viruses herpéticos CMV e EBV-1, onde sua ocorrência foi significativamente mais elevada nas pacientes com periodontite. Quanto ao biofilme supragengival, observou-se apenas uma maior proporção de amostras positivas para bactérias da família Enterobacteriaceae e vírus CMV, enquanto no biofilme subgengival, além desses agentes também se verificou uma maior ocorrência de Enterobacteriaceae e vírus EBV-1 nos pacientes com periodontite, quando comparados com os pacientes com gengivite. Outros agentes infecciosos, como vírus CMV, foram mais freqüentes no biofilme subgengival de pacientes com periodontite quando comparados com as pacientes periodontalmente saudáveis. O vírus Herpes simples tipo 1 somente se mostrou mais freqüente no biofilme subgengival de pacientes com dependência química, mas isso ocorreu independentemente da condição periodontal das pacientes. A presença dos microrganismos-alvo na mucosa bucal das pacientes estudadas, independentemente de sua condição periodontal, é apresentada na Tabela 14. As mucosas se mostraram reservatórios de leveduras, bem como de microrganismos da família Enterobacteriaceae e do gênero Helicobacter, particularmente H. pylori. As condições periodontais não afetaram a ocorrência desses microrganismos nas superfícies de tecidos moles da cavidade bucal. 44 Tabela 11. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas na saliva de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas. Condição de saúde periodontal N(%) Microrganismo 1IPS 2IG 3IP Candida sp. 11 (22,45) 11 (36,67) 6 (46,15) C. albicans 2 (4,08) 7 (23,33) 6 (46,15) C. parapsilosis 0 (0,0) 2 (6,67) 1 (7,69) C. tropicalis 1 (2,04) 1 (3,33) 0 (0,0) C. glabrata 1 (2,04) 2 (6,67) 1 (7,69) Enterobacteriaceae 12 (24,49) 8 (26,67) 8 (61,54) Enterococcus sp. 10 (20,41) 9 (30,0) 6 (46,15) E. faecalis 8 (16,36) 6 (20,0) 4 (30,77) E. faecium 0 (0,0) 1 (3,33) 1 (7,69) Helicobacter sp. 29 (59,18) 18 (60,0) 8 (61,54) H. pylori 18 (36,73) 13 (43,33) 8 (61,54) Pseudomonas sp. 6 (12,24) 7 (23,33) 4 (30,77) P. aeruginosa 5 (10,2) 4 (13,33) 3 (23,08) Viruses herpéticos Herpes virus tipo 1 0 (0,0) 2 (6,67) 3 (23,08) Citomegalovírus 2 (4,08) 9 (30,0) 7 (53,85) Epstein-Barr tipo 1 7 (14,29) 11 (36,67) 9 (69,23) 1Indivíduos periodontalmente sadios N= 49 2Indivíduos com gengivite N= 30 3Indivíduos com periodontite N= 13 45 Tabela 12. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme supragengival de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas. Condição de saúde periodontal N(%) Microrganismo 1IPS 2IG 3IP Candida sp. 17 (34,69) 9 (30,0) 6 (46,15) C. albicans 12 (24,49) 7 (23,33) 4 (30,77) C. parapsilosis 0 (0,0) 1 (3,33) 1 (7,69) C. tropicalis 1 (2,04) 0 (0,0) 0 (0,0) C. glabrata 2 (4,08) 0 (0,0) 1 (7,69) Enterobacteriaceae 12 (24,49) 8 (26,67) 7 (53,85) Enterococcus sp. 18 (36,73) 7 (23,33) 5 (38,46) E. faecalis 14 (28,57) 6 (20,0) 5 (38,46) E. faecium 0 (0,0) 1 (3,33) 0 (0,0) Helicobacter sp. 27 (55,1) 11 (36,67) 7 (53,85) H. pylori 17 (34,69) 9 (30,0) 6 (46,15) Pseudomonas sp. 12 (24,49) 5 (16,67) 4 (30,77) P. aeruginosa 10 (20,41) 3 (10,0) 3 (23,08) Viruses herpéticos Herpes virus tipo 1 0 (0,0) 2 (6,67) 0 (0,0) Citomegalovírus 1 (2,04) 7 (23,33) 6 (46,15) Epstein-Barr tipo 1 4 (8,16) 15 (50,0) 5 (38,46) 1Indivíduos periodontalmente sadios N= 49 2Indivíduos com gengivite N= 30 3Indivíduos com periodontite N= 13 46 Tabela 13. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas no biofilme subgengival de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas. Condição de saúde periodontal N(%) Microrganismo 1IPS 2IG 3IP Candida sp. 10 (20,41) 2 (6,67) 2 (15,38) C. albicans 9 (18,37) 2 (6,67) 2 (15,38) C. parapsilosis 0 (0,0) 0 (0,0) 0 (0,0) C. tropicalis 0 (0,0) 0 (0,0) 0 (0,0) C. glabrata 0 (0,0) 0 (0,0) 0 (0,0) Enterobacteriaceae 11 (22,45) 8 (26,67) 7 (53,85) Enterococcus sp. 7 (14,29) 6 (20,0) 3 (23,08) E. faecalis 8 (16,33) 5 (16,67) 2 (15,38) E. faecium 0 (0,0) 0 (0,0) 0 (0,0) Helicobacter sp. 20 (40,82) 8 (26,67) 6 (46,15) H. pylori 16 (32,65) 8 (26,67) 5 (38,46) Pseudomonas sp. 6 (12,24) 2 (6,67) 2 (15,38) P. aeruginosa 4 (8,16) 1 (3,33) 1 (3,33) Viruses herpéticos Herpes virus tipo 1 8 (16,33) 5 (16,67) 3 (23,08) Citomegalovírus 9 (18,37) 17 (56,67) 9 (69,23) Epstein-Barr tipo 1 9 (18,37) 20 (66,67) 10 (76,92) 1Indivíduos periodontalmente sadios N= 49 2Indivíduos com gengivite N= 30 3Indivíduos com periodontite N= 13 47 Tabela 14. Ocorrência de viruses da família Herpesviridae e de microrganismos oportunistas nas mucosas de indivíduos com diferentes condições de saúde periodontal, independentemente da dependência de drogas lícitas ou ilícitas. Condição de saúde periodontal N(%) Microrganismo 1IPS 2IG 3IP Candida sp. 22 (44,9) 11 (36,67) 7 (53,85) C. albicans 15 (30,61) 8 (26,67) 6 (46,15) C. parapsilosis 5 (10,2) 1 (3,33) 0 (0,0) C. tropicalis 5 (10,2) 0 (0,0) 1 (7,69) C. glabrata 8 (16,33) 2 (6,67) 1 (7,69) Enterobacteriaceae 10 (20,41) 6 (20,0) 3 (23,08) Enterococcus sp. 9 (18,37) 8 (26,67) 5 (38,46) E. faecalis 9 (18,37) 8 (26,67) 4 (30,77) E. faecium 1 (2,04) 3 (10,0) 0 (0,0) Helicobacter sp. 18 (36,73) 8 (26,67) 4 (30,77) H. pylori 15 (30,61) 8 (26,67) 4 (30,77) Pseudomonas sp. 9 (18,37) 4 (13,33) 1 (7,69) P. aeruginosa 9 (18,37) 4 (13,33) 1 (7,69) Viruses herpéticos Herpes virus tipo 1 7 (14,29) 3 (10,0) 1 (7,69) Citomegalovírus 10 (20,41) 5 (16,67) 1 (7,69) Epstein-Barr tipo 1 11 (22,45) 9 (30,0) 3 (23,08) 1Indivíduos periodontalmente sadios N= 49 2Indivíduos com gengivite N= 30 3Indivíduos com periodontite N= 13 48 DISCUSSÃO 49 5. DISCUSSÃO O aumento generalizado no consumo de drogas, lícitas ou não, acaba por criar uma sociedade paralela, onde a própria dependente se refugia, quer pelos efeitos diretos da droga sobre sua sociabilidade, quer pela contravenção que incide sobre o consumo de drogas ilícitas, complementadas pelos efeitos sociais, psicológicos e familiares que, inegavelmente, estão ligados a essa dependência1. Como agravante, a maioria das usuárias de drogas é consumidora de vários compostos, concomitantemente, como também observado por Guindalini et al.11, mostrando que 96% das pacientes associavam o consumo freqüente de bebidas alcoólicas com duas ou mais drogas ilícitas, geralmente cocaína e crack, sendo que, em 92% dos casos, a associação envolvia mais de três drogas, enquanto 60% das pacientes em início de tratamento apresentavam dependência química a mais de cinco compostos diferentes. Dentro desses grupos de dependentes, por vezes o estresse da abstinência, bem como os efeitos diretos das próprias drogas ainda presentes ou seqüelas a elas associadas acabam por induzir quadros de alucinações, síndromes de perseguição, depressão profunda e angústia, como também observados no presente estudo6. No médio e longo prazos3, a manutenção dessas condições acaba por induzir uma progressiva perda da capacidade de reação frente a agentes infecciosos e outros fatores de agressão, em função, também, do efeito dessas drogas psicotrópicas sobre a regulação do sistema imunológico e o estresse ambiental42,43, freqüentemente associado ao processo de desintoxicação ou ligado aos problemas familiares e sociais nesses pacientes. A cocaína e seus derivados, como o crack, bem como outros compostos similares, exercem seus efeitos sobre o sistema nervoso central através do bloqueio da reabsorção pré- sináptica de neurotransmissores como a dopamina, norepinefrina, acetilcolina e serotonina, o que potencializa e prolonga a ação dessas catecolaminas ao nível de sistema nervoso periférico e, principalmente, sistema nervoso central, induzindo a estimulação exacerbada dos 50 centros nervosos associados ao prazer, no sistema límbico44. No que concerne à sensação de analgesia, a mesma de dá pelo bloqueio da repolarização das membranas neuronais nos nervos periféricos, enquanto que a elevação plasmática dos níveis de catecolaminas acaba levando à hipertensão, taquicardia e arritmias, produzindo um aumento de 24 vezes no risco de infarto do miocárdio, além do seu potente efeito vasoconstritor, sendo que esses efeitos são independentes da dosagem utilizada e da rota de administração44. Como um todo, os efeitos simpatomiméticos acabam por elevar o consumo de oxigênio do miocárdio, o que associado com a vasoconstrição periférica e das coronárias, ligada ao uso freqüente de cocaína, crack, maconha, tabaco e outros compostos, pode produzir necrose tecidual, o que é bastante freqüente na gengiva e no palato duro.6 No grupo de pacientes com dependência, o total de pessoas com histórico de cardiopatias ou hipertensão foi estatisticamente superior ao observado no grupo controle. Possívelmente estes quadros de hipertensão estejam ligados aos efeitos vasculares e neurológicos das drogas, porém, mesmo com o uso de anti-hipertensivos, 10% das pacientes não tiveram resposta favorável, sendo que estas eram dependentes de álcool e apresentavam uma média etária maior. O uso da medicação anti-hipertensiva pode ter contribuído com a xerostomia observada em algumas pacientes27. Assim, sintomas como euforia, irritabilidade, desorientação, ansiedade podem ser fruto de interferências de compostos como o crack e a cocaína sobre o sistema nervoso, o qual ainda aumenta o período de atividade dos demais neurotransmissores, podendo ainda levar a alucinações, hipertermia, taquicardia, aumento da taxa respiratória, insônia e, por fim depressão6. No presente estudo, esses sinais e sintomas puderam ser observados ou foram relatados por pacientes com diferentes tipos de dependências químicas, o que sugere que além do efeito da droga, o próprio ambiente de desintoxicação e a abstinência podem estar associados a essas reações. 51 Dentre as drogas ilícitas, destaca-se a maconha, a qual é considerada de baixa potencia pela população em geral, além de possuir uma campanha quase universal sobre seus possíveis efeitos terapêuticos e a favor da descriminalização do seu uso, mas seu consumo na forma de cigarros ou dispositivos similares leva a um envelhecimento precoce da pele, a qual pode adquirir cor cadavérica, além de possuir uma grande maioria dos carcinógenos também presentes no tabaco e produzir arteritis freqüentes em seus usuários44. Outro composto que vem ganhando importante penetração nas camadas mais jovens de usuários de drogas é o êxtase ou 3,4-metilenodioximetamfetamina (MDMA), originalmente um componente intermediário na síntese de hemostáticos, foi utilizado até 1985 como parte de psicoterapias e produz potente e duradoura euforia e desinibição. Sua síntese é realizada em laboratórios clandestinos, com a incorporação de resíduos de diversos compostos, como efedrina, pseudoefedrina, cafeína, aspirina, e paracetamol, produzindo grande atividade hepatotóxica, dependência, além de levar a depressão profunda, síndrome do pânico, agressividade e psicoses44. Algumas lesões bucais e cutâneas podem ser observadas em função de desequilíbrios no metabolismo dos hormônios esteróides, levando a um aumento na secreção de glândulas sebáceas. No presente estudo, nenhuma alteração ou enfermidade em particular pode ser relacionada com segurança ao consumo dessa droga. As maiores conseqüências bucais do emprego freqüente de êxtase, cocaína, crack e outros agentes, estão associadas com a vasoconstrição profunda e persistente que essas drogas induzem, particularmente no gênero feminino6, podendo levar à necrose tecidual19 e profundo retardo do processo de reparo20. Nesse sentido, a própria nicotina e outros compostos, presentes no tabaco, podem exacerbar os efeitos cardiovasculares da cocaína, uma vez que também possui potente atividade vasoconstritora e induz aumento da liberação e do tempo de atividade de mediadores adrenérgicos45, e como as duas drogas são utilizadas com freqüência simultaneamente, pode-se ter um efeito somatório de ambas. Por outro lado, essas drogas 52 podem mascarar parte dos efeitos vasculares dos processos inflamatórios periodontais, podendo contribuir para a aparente redução do sangramento à sondagem no grupo das dependentes químicas, embora esses dados não tenham sido quantificados mais adequadamente. Além desse aspecto, a nicotina poderia potencializar a perda óssea associada com as periodontites46, sendo que formas mais agressivas de periodontite e gengivite vêm sendo reconhecidas em pacientes com histórico de uso de tabaco e, mais recentemente, drogas ilícitas como o crack e a cocaína, sendo que a própria nicotina tem grande capacidade em aumentar o risco de infecções, como infecções respiratórias, gástricas, particularmente as associadas a H. pylori, meningite, tuberculose, infecções sexualmente transmissíveis, infecções em pacientes com fibrose cística e infecções pós-operatórias47. Possivelmente esse risco aumentado de infecções decorre, pelo menos parcialmente, do efeito dessas drogas psicotrópicas sobre o sistema imunológico, produzindo uma redução de reatividade imunológica, potencialização de reações de hipersensibilidade, levando a uma diminuição da resistência a infecções e da capacidade de reparo tecidual18. No caso do álcool, evidências mostram que seus efeitos deletérios se estendem ao sistema inato, além das alterações no sistema imune específico ou adaptativo18, sendo que um dos sítios mais afetados pela ingestão de álcool são as células dendríticas e demais células apresentadoras de antígeno48, além de produzir apoptose das células “natural killer”, redução da atividade citotóxica do sistema imunológico e modificação na expressão de citocinas e interleucinas, o que afetaria não apenas a resposta celular como também os mecanismos humorais de defesa9. Por outro lado, alguns desses compostos, como a nicotina, também são capazes de exacerbar algumas características associadas à virulência microbiana, como a capacidade de adesão, colonização e agressão dos patógenos47 . 53 Como agravante, no que concerne às condições de saúde bucal, deve-se considerar que o consumo de drogas, lícitas ou não, tende a reduzir a capacidade cognitiva e, principalmente, a motivação para desempenhar as tarefas do cotidiano, como a higiene oral, sendo que a depressão e demais sinais e sintomas dessas drogas acabam por afetar diretamente a capacidade de manter uma boa higiene e dieta equilibrada, podendo acarretar fenômenos de desnutrição, anemia, entre outros21, colocando em risco o próprio sentido do tratamento odontológico instituído. Entretanto, as condições de higiene dos dois grupos de pacientes não foram estatisticamente diferentes, no que pode ter refletido o fato de que as pacientes com dependência química apresentavam condições familiares e sociais que, na maioria dos casos, colaboraram com a decisão de entrar em um tratamento de desintoxicação, de forma que comparações entre essas pacientes e os resultados dos demais estudos sobre pacientes com dependência química devem levar essa inserção familiar e social. A grande maioria dos sinais e sintomas observados pode ser diagnosticada pelo cirurgião-dentista, o qual deve estar ciente dos riscos de realizar procedimentos invasivos nesses pacientes, em função de quadros de imunossupressão, depressão psicológica, angústia, entre outros, que podem interferir com o sucesso do tratamento. Das manifestações listadas na Tabela 5, várias são reconhecidamente fatores de grande importância no sucesso de tratamento odontológico, como as doenças periodontais, retardo no reparo tecidual, xerostomia e a própria anemia, que pode ou não estar associada à desnutrição. A literatura descreve um maior risco de doenças periodontais nas pacientes com dependência química, as quais ainda podem, em função de particularidades hormonais do gênero feminino, ser ainda mais predispostas à inflamação gengival e perda de inserção conjuntiva2,3,26. Os resultados aqui apresentados dão suporte à observação de que as periodontites de fato incidem com maior freqüência em pacientes com dependência química, mesmo que a perda óssea não seja muito pronunciada na maioria deles. 54 Em teoria, a vasoconstrição associada ao consumo do êxtase, cocaína, crack, tabaco e outras drogas, ao reduzir a perfusão sanguínea junto aos tecidos bucais, poderia criar condições redox e de reatividade tecidual mais favoráveis à implantação ou proliferação de microrganismos oportunistas. Além desse aspecto, compostos como a nicotina parecem induzir maior perda óssea independentemente dos níveis de acúmulo do biofilme microbiano49, o que sugere interferência na susceptibilidade tecidual às infecções ou na biologia tecidual, bem como possibilidade de infecções específicas se desenvolverem nesses sítios periodontais. Entretanto, a despeito de avaliação da literatura, não estão disponíveis dados sobre a microbiota bucal de pacientes com dependência química, a não ser os relativos à microbiota anaeróbia periodontal em pacientes tabagistas50,51,52,53,54,55. Contudo, esses poucos estudos com tabagistas não se referem a patógenos superinfectantes e oportunistas, como H. pylori, bastonetes e cocos entéricos, pseudomonados e leveduras, geralmente associados a infecções graves, particularmente em ambiente hospitalar, sendo que pouco se sabe sobre o efeito do uso combinado desses compostos sobre a possibilidade da cavidade bucal se converter em reservatório desses microrganismos56. Os resultados microbiológicos apresentados evidenciaram que as pacientes dependentes, independentemente de suas condições periodontais, são colonizadas com uma maior freqüência por alguns microrganismos freqüentemente associados a infecções graves. Nesse sentido, a maior freqüência de detecção de microrganismos entéricos, Helicobacter sp. e H. pylori, além dos viruses CMV e EBV na saliva das pacientes com dependência também pode refletir a exposição dessas pacientes aos patógenos ambientais, como microrganismos entéricos, ou mesmo devido ao maior contato com líquidos orgânicos de outros usuários de drogas, particularmente as drogas injetáveis, embora os viruses EBV e CMV57, além dos demais agentes infecciosos, possam ser transmitidos através da própria saliva. 55 A presença desses agentes infecciosos, em maior freqüência do que a observado no grupo controle, na saliva das pacientes dependentes possui outra implicação relevante: a possibilidade de disseminação desses microrganismos entre as dependentes que ainda não os albergavam, através de contatos, íntimos ou não, durante a convivência no programa de desintoxicação. Corroborando com esse conceito, surtos de infecções associadas a microrganismos multirresistentes a antimicrobianos em comunidades de usuários de drogas são descritos na literatura e constituem sério problema de saúde pública de controle bastante complexo, uma vez que a maioria desses pacientes se mantém à margem do sistema de saúde58. Nesse sentido, muitos desses agentes infecciosos parecem facilitar a replicação, ou multiplicação dos demais patógenos no ambiente bucal, como demonstrado para os viruses HIV e os viruses herpéticos, o que poderia colaborar para a disseminação não apenas dos microrganismos alvo do presente estudo, mas também de vários outros grupos microbianos presentes no próprio biofilme e mucosas bucais57,59. Recentemente verificou-se que a cocaína e seus derivados, como o crack, podem exacerbar a proliferação do vírus HIV em linfócitos T4, o que colaboraria diretamente para afetar a resposta imune do hospedeiro, produzindo profunda redução do total de linfócitos auxiliares funcionais60. Se considerarmos que, por mecanismos diversos, os viruses CMV e EBV também são capazes de interagir com células linfocitárias, é possível que a maior freqüência de detecção desses viruses nas pacientes com dependência química possa refletir, mesmo que parcialmente, esse efeito facilitador representado pelas drogas descritas acima, o que necessita ser avaliado através de ensaios experimentais, sendo que os próprios viruses herpéticos poderiam exacerbar, posteriormente, a colonização da cavidade bucal por microrganismos oportunistas. A saliva constitui o principal veículo para a transmissão e disseminação de microrganismos presentes na cavidade bucal, uma vez que mesmo aqueles grupos bacterianos 56 que não são considerados membros da microbiota residente oral, como as famílias Enterobacteriaceae e Pseudomonadaceae61,62,63,64, H. pylori5,65,66,67, E. faecalis68 e viruses herpéticos69,70 podem ser nela encontrados, sendo que esse fenômeno se exacerba com membros da microbiota residente, como o gênero Candida71 . Embora a participação de leveduras do gênero Candida na microbiota bucal de pacientes imunocomprometidos venha sendo continuamente estudada71, a literatura relativa aos efeitos de drogas lícitas ou ilícitas sobre esse importante conjunto de microrganismos se mostra bastante escassa, sendo restrita aos efeitos do tabagismo e etilismo. Essas leveduras fazem parte da microbiota bucal de 10-80% dos indivíduos sadios, mas normalmente suas populações são modestas se comparadas com outros microrganismos bucais. Entretanto, em pacientes com deficiências imunológicas ou na presença de outros fatores predisponentes, como diabetes, esses fungos podem proliferar e produzir quadros infecciosos graves, particularmente nas superfícies mucosas71,72. Dentre os fatores que mais exacerbam a colonização bucal por essas leveduras destacam-se o tabagismo e o alcoolismo, bem como a presença de próteses totais ou parciais71,73,74. Nesse sentido, todas as pacientes portadoras de prótese muco-suportada ou dento-muco suportada foram colonizadas por alguma espécie desse gênero. Dessa forma, é possível que a elevada freqüência de detecção desses fungos, particularmente nas pacientes com dependência química, venha a refletir os efeitos diretos das drogas sobre a mucosa e, muito possivelmente, sobre a resposta imune celular associada às superfícies mucosas. Além desse aspecto, não se pode negligenciar o fato de que a ocorrência de candidoses oportunistas em pacientes com imunossupressão e outras condições predisponentes é bastante freqüente e, por vezes, questão de tempo71. De maneira geral, essas enfermidades envolvem Candida albicans75,76 ,C. tropicalis, C. parapsilosis, C. glabrata e Candida krusei76, sendo freqüentes as infecções em que duas ou 57 mais espécies estão presentes71,76. O presente estudo mostrou que existe uma preponderância de C. albicans sobre as demais espécies em todas as amostras clínicas, tendo sido observada correlação estatisticamente significativa entre a ocorrência de leveduras e a presença de viruses herpéticos CMV e, especialmente, EBV. Nesse sentido, associações dessa mesma natureza somente foram observadas em pacientes HIV positivos portadores de gengivite necrosante77. Por outro lado, os dados do presente estudo não evidenciaram a presença de qualquer alteração periodontal necrosante, mesmo nas 3 pacientes HIV positivas que mostravam dependência química, tampouco verificou associação ecológica entre leveduras do gênero Candida e H. pylori, como relatado por Siavoshi et al78. A possível associação entre a ocorrência de EBV, CMV e Candida spp. nessas pacientes com dependência química pode estar ligada aos efeitos que esses viruses exercem sobre o sistema imunológico das mesmas, bem como a interação entre esses agentes infecciosos e o desenvolvimento de reações inflamatórias nos tecidos bucais, o que reconhecidamente favorece a proliferação de leveduras63,79. Essas considerações envolvem aspectos bastante complexos não apenas da interação do sistema parasita-hospedeiro, como ocorreria normalmente, mas também os efeitos que as drogas utilizadas possuem sobre os componentes desse sistema. Os dados de Gaetti-Jardim Jr. et al.63, com pacientes HIV-positivos sintomáticos, muitos dos quais usuários de drogas como cocaína e crack, sugeriram que a presença de C. albicans pode ter relação com a ocorrência de periodontite necrosante, enquanto os dados do presente estudo evidenciaram relação estatisticamente significativa entre ocorrência de C. albicans e o uso de drogas, e essa associação se mostrou mais relevante do que a existente entre as condições de saúde gengival e de higiene bucal, evidenciando que outros fatores possivelmente estão colaborando para uma maior prevalência de leveduras na cavidade bucal desses pacientes e que essa maior freqüência de detecção de fungos leveduriformes não é 58 apenas reflexo de higiene pessoal. Nesse particular, Gaetti-Jardim Jr. et al.63 e Gaetti-Jardim Jr. et al.64 consideraram a infecção com o vírus HIV, uso abusivo de antimicrobianos e drogas ilícitas como fatores adicionais para a colonização maciça por fungos na cavidade bucal. Contudo, essas leveduras, embora patogênicas, também acabam se convertendo em microrganismos indicadores de desequilíbrios na microbiota bucal. Outro grupo de patógenos oportunistas frequentemente associado a quadros de imunodepressão e consumo de drogas é representado pelos membros das famílias Enterobacteriaceae e Pseudomonadaceae56,63,64, particularmente em usuários de drogas80. Esses microrganismos apresentam elevada freqüência de resistência a drogas antimicrobianas e boa tolerância a condições ambientais desfavoráveis e sua presença na cavidade bucal81, normalmente transitória, pode se tornar estável em função dos desequilíbrios na microbiota residente 63 , quer pelo emprego de antimicrobianos, quer pela modificação da pressão seletiva associada ao sistema imunológico. Nesse sentido, Diz Dios et al.82 verificaram, através de cultura, que as enterobactérias podiam ser detectadas em 68% dos indivíduos HIV-positivos usuários de drogas ilícitas, notadamente cocaína, possivelmente em função dos diferentes tipos de imunossupressão que se estabeleciam nesses pacientes, sem que um fator principal viesse a ser responsabilizado. O mesmo ocorre no presente estudo, onde fatores locais como xerostomia, condições de saúde periodontal e higiene bucal estiveram associadas a ocorrência de infecções oportunistas, como também relatado por Dahlén56, além de retardo do processo de reparo e presença de microrganismos da família Enterobacteriaceae e, em menor extensão, Pseudomonadaceae. Esses microrganismos, em particular os pseudomonados, apresentam a capacidade de se perpetuarem em ambientes pobres em nutrientes e podem facilmente ser transmitidos entre diferentes indivíduos e para o ambiente externo, como em clínicas odontológicas83 ou mesmo efluentes hospitalares84, podendo ser adquiridos em ambiente de reclusão/internação, e 59 disseminados quando do retorno das pacientes ou internas ao seio familiar. Nesse particular, a despeito da elevada freqüência de detecção de enterobactérias nas pacientes com dependência química, independentemente da condição de saúde dos tecidos periodontais, pode-se verificar uma associação positiva com pacientes portadoras de periodontite e gengivite. Enterobacteriaceae e outros microrganismos entéricos, bem como os pseudomonados, não são considerados como parte relevante da microbiota bucal, mas desequilíbrios nessa mesma microbiota podem criar condições favoráveis para a implantação desses microrganismos no biofilme63,64. Além desse aspecto, falta de higiene, imperfeições no tratamento de água e esgoto podem colaborar para a presença desses microrganismos na cavidade bucal85. Esses microrganismos ainda podem se converter em reservatórios de genes de resistência a antimicrobianos, particularmente para os �-lactâmicos86,87, que podem ser disseminados para os demais microrganismos do biofilme81. Por outro lado, a literatura sobre a participação desses microrganismos no desenvolvimento das doenças periodontais63,88 e nas estomatites bucais89,90 ainda é precária. Embora o papel de microrganismos entéricos na etiologia de infecções da região de cabeça e pescoço seja documentado, o papel desempenhado pelos mesmos na etiologia das doenças periodontais permanece sem o adequado esclarecimento. Por outro lado, a colonização da orofaringe por membros da família Enterobacteriaceae parece ser o principal fator associado à pneumonia por aspiração em indivíduos idosos ou imunologicamente debilitados91,92, podendo representar risco de infecções sistêmicas90. No presente estudo, um dos fatores associado à colonização da cavidade bucal por Enterobacteriaceae foi a condição de higiene bucal, sendo mais freqüentes em pacientes com higiene precária, indivíduos com inflamação gengival, periodontite e consumo de drogas. A 60 literatura não apresenta dados convincentes sobre o papel desempenhado por bactérias entéricas na patogênese das infecções periodontais, particularmente em pacientes com alterações profundas em sua fisiologia associadas ao histórico de uso de drogas ilícitas por anos. Nesse sentido, Gaetti-Jardim Jr. et al.63 evidenciaram relação entre bastonetes entéricos e necrose dos tecidos periodontais em pacientes HIV-positivos, enquanto Napeñas et al.93, sugerem um papel relevante nos casos de mucosite radio-induzida, uma vez que esses microrganismos podem exacerbar as condições inflamatórias dos tecidos do hospedeiro, podendo levar à formação de úlceras pela liberação de enzimas proteolíticas81, sendo que seu lipopolissacarídeo é o que apresenta a maior e mais intensa gama de atividades biológicas dentre aqueles que foram caracterizados93. É possível que em pacientes com xerostomia, resposta imune alterada, menor capacidade de reparo tecidual, como ocorre com usuários de cocaína, álcool, tabaco e outros fármacos27,56, os microrganismos entéricos, que ganham o interior da cavidade bucal, através de água83,85 e alimentos contaminados, problemas de higiene pessoal, supressão da microbiota e auto- inoculação85,94, acabam não sendo eliminados e, subseqüentemente, podem corroborar para o quadro infeccioso periodontal, além de constituir fonte de infecção e disseminação de genes de resistência81, sendo que esses microrganismos são pouco sensíveis aos efeitos do tratamento periodontal95. Nesse particular, não se pode esquecer que o sistema de água do próprio consultório pode carrear esses microrganismos para o interior da cavidade bucal do paciente, sendo, esse fenômeno, responsabilidade do profissional83. Embora tenha sido observada uma maior ocorrência de pseudomonados no biofilme de pacientes com gengivite e periodontite, essa associação pode ser mais conseqüência das alterações periodontais causadas pela microbiota anaeróbia e não sua causa, visto que esses microrganismos, quando estão presentes, o fazem em baixas proporções no biofilme e, em função de seu metabolismo mais associado ao oxigênio molecular, as margens do sulco 61 gengival seriam as áreas mais freqüentemente colonizadas por esses bastonetes, onde os nutrientes exteriorizados através do fluído do sulco gengival ou oriundos da saliva/dieta podem chegar rapidamente e onde o oxigênio molecular está disponível em concentrações menos favoráveis aos anaeróbios obrigatórios. Na odontologia, o papel de microrganismos superinfectantes tem merecido destaque, particularmente quando esses microrganismos estão envolvidos em infecções refratárias às modalidades terapêuticas disponíveis, como ocorre com as infecções nosocomiais, endodônticas, periapicais e periodontais associadas ao gênero Enterococcus68. Dentre as espécies desse gênero, destaca-se E. faecalis pela sua resistência aos antimicrobianos e antibióticos, bem como pela sua prevalência na cavidade bucal23,65,88, bem como E. faecium, pela sua distribuição e relevância nas infecções nosocomiais96. Entretanto, pouco se conhece sobre a distribuição desses microrganismos em pacientes usuárias de drogas, não tendo sido observado nenhum estudo pertinente na literatura consultada. Os resultados das Tabelas 7, 8 e 9 sugerem que o habitat principal do gênero Enterococcus, na cavidade bucal, é o biofilme supragengival e as mucosas desses pacientes e não se pode esquecer que esse ambiente é fonte de recontaminação do sulco gengival e da saliva97. Esses cocos, em particular Enterococcus faecalis, e outros microrganismos entéricos têm sido associados à periodontite em pacientes grávidas98 e periodontite crônica em populações brasileiras65,88e outros povos latino-americanos25,62. Entretanto, os dados aqui apresentados não evidenciam qualquer correlação entre os parâmetros clínicos gengivais e periodontais e a ocorrência dos enterococos, independentemente do grupo experimental estudado. É possível que o papel periférico que esses microrganismos desempenham na gengivite e periodontite tenha sido ocupado por outros microrganismos entéricos ou mesmo por microrganismos bucais não avaliados no presente estudo. 62 Estudos mostram que Helicobacter pylori é a causa mais freqüente de gastrite e úlceras gástricas e possui forte relação com alguns tipos de câncer no estômago99,100, sendo freqüentemente encontrado em países em desenvolvimento101,102. A aquisição desse microrganismo se dá na infância, onde a transmissão intrafamilial é bastante relevante, possivelmente por contato oral-oral, gastro-oral e oro-fecal, sendo que a própria cavidade bucal poderia atuar como um reservatório do microrganismo103,104,105,106. Entretanto, a freqüência de detecção de H. pylori no presente estudo foi inferior à descrita na literatura104,106,107,108,109,110, em outras populações humanas, mas semelhantes aos resultados de Czesnikiewicz-Guzik et al.111, sendo que não foi observada qualquer relação entre a ocorrência desse microrganismo e as condições de saúde periodontal ou existência de quaisquer lesões bucais, como também observado por Berroteran et al.11 e Anand et al.106 . No presente estudo, o maior habitat na cavidade bucal para esses microrganismos foi o biofilme subgengival e, em menor extensão, o biofilme supragengival, enquanto que Czesnikiewicz-Guzik et al.111 evidenciaram que o biofilme supragengival é o grande responsável pela contaminação salivar e o maior reservatório desse bastonete na cavidade bucal, o que se torna mais relevante quando se verifica que a ocorrência desse microrganismo no biofilme pode constituir fonte para re-infecção da mucosa gástrica106, além de uma possível correlação com a ocorrência de halitose66. Contudo, existem discrepâncias entre a ocorrência desses microrganismos na cavidade bucal e o histórico de infecção gástrica108,111 , bem como freqüências bastante díspares desses microrganismos na saliva e no biofilme36. A relação entre o consumo de drogas lícitas e ilícitas e a freqüência de infecção gástrica por H. pylori permanece sem adequado esclarecimento e o mesmo ocorre com os dados relativos à cavidade bucal. Murray et al.112, no Reino Unido, evidenciaram uma baixa freqüência de infecção por esse microrganismo entre consumidores moderados de cerveja e vinho, sugerindo que a eliminação da infecção gástrica, em alguns adultos, poderia ser assim 63 potencializada pelo álcool ou algum componente das bebidas consumidas, como posteriormente confirmado por Kuepper-Nybelen et al.113, evidenciando que esses componentes de bebidas alcoólicas podiam potencializar a ação de drogas antimicrobianas sobre H. pylori, facilitando a erradicação desse microrganismo. Entretanto, Kuepper-Nybelen et al. 113 alertaram para o fato de que os indivíduos com consumo moderado de álcool eram os que apresentavam as condições socioeconômicas mais elevadas e a literatura evidencia uma maior prevalência de infecção por H. pylori em pacientes de baixa renda114, de forma que o efeito do álcool pode, na realidade, refletir as condições sociais das pacientes. Assim embora não exista uma uniformidade sobre a influência do álcool sobre H. pylori, evidências indicam que bebidas alcoólicas podem facilitar a erradicação desse microrganismo em regimes de tratamento intensivo com antiácidos associados com antimicrobianos, sendo que Baena et al.115 também responsabilizaram o etanol pela modificação na produção de muco protetor, aumentando-a, ao mesmo tempo em que o vinho apresentaria atividade antimicrobiana sobre esse microrganismo. Comparações sobre a freqüência de detecção desse microrganismo são problemáticas. Dois métodos são mais utilizados: a detecção de urease na saliva/biópsias e a detecção molecular por PCR, sendo que os dois métodos possuem limitações. Enquanto o teste da urease é pouco específico, uma vez que microrganismos bucais podem produzir ureases e, portanto, se comportar como H. pylori, criando resultados falso-positivos, a detecção por PCR, por ser muito sensível, também induz resultados falso positivos quando o paciente apresenta infecção gástrica e refluxo gastroesofageano, pela presença de poucas células bacterianas residuais na cavidade bucal116 . Assim, pelo menos para as pacientes com infecção gástrica por H. pylori, parte dos resultados positivos podem ser conseqüência de contaminação estomacal e não colonização da cavidade bucal, embora a presença de gastrite ou úlcera gástrica não tenha sido prevalente nas 64 pacientes estudadas, tendo sido relatada em 10% das pacientes com dependência química e 4% das pacientes do grupo controle. Entretanto, uma análise dos dados sobre a ocorrência desse microrganismo no pacientes com ou sem qualquer enfermidade gástrica não produziu qualquer modificação dos dados apresentados no presente estudo. As freqüências de detecção de Helicobacter sp. e H. pylori foram significativamente maiores no grupo das dependentes químicas e esses valores foram semelhantes aos descritos na literatura para populações sem dependência, mas com infecção gástrica67,107,117,118,enquanto a presença desses microrganismos no grupo sem dependência química foi significativamente menor do que ao reportado pela literatura para pacientes sem infecções gástricas. Estudos recentes com populações brasileiras, como o realizado por Souto & Colombo68, em pacientes com periodontite, mostrou resultados semelhantes aos obtidos para as pacientes do grupo controle e confirma a presença desse microrganismo na cavidade bucal e uma maior prevalência do sulco gengival em relação à saliva, como também pode foi observado no presente estudo. Nesse sentido, como o uso freqüente de drogas por vezes se mostra coletivo e esse microrganismo pode estar associado a uma possível transmissão por saliva107, é factível, se não provável, que o ambiente de uso desses compostos lícitos ou ilícitos poderia criar condições de contato entre portadores de H. pylori e indivíduos susceptíveis, sendo que a dependência criaria portas de entrada e colonização para esses patógenos, enquanto que a imunodepressão ligada a elas poderia facilitar o desenvolvimento de infecções gástricas119, embora no presente estudo não tenha sido observada significância estatística entre dependência de drogas e ocorrência de enfermidades gástricas. Nesse sentido, mesmo que o álcool seja capaz de demontrar um sinergismo com alguns antimicrobianos, na erradicação desses patógenos gástricos, como acima citado, o efeito de cocaína-crack e de outras drogas é ulcerogênico, embora o mecanismo envolvido em 65 tal fenômeno não seja esclarecido119, por vezes associado com nefropatias e hepatopatias, como observado em quatro pacientes com dependência química. Além desse aspecto, é possível que em pacientes com uso múltiplo de drogas e problemas de reparo tecidual, esses microrganismos venham a se manter no interior de bolsas periodontais mais profundas e mesmo em feridas cirúrgicas, uma vez que esse gênero se mostra bastante oportunista. Essa ação sinergística entre o emprego de drogas e a ocorrência desses patógenos pode, portanto, estar na causa do desconforto gástrico e mesmo perfurações na mucosa bucal, esofagiana e gástrica, freqüentemente observadas nesses pacientes. Dentre todos os agentes infecciosos capazes de produzir infecções, os viruses da família Herpesviridae estão entre os mais prev