Lucas Rodrigo dos Santos Estudo do complexo de espécies Scinax hayii (Barbour, 1909) e Scinax dolloi (Werner, 1903) (Anura, Hylidae) ao longo da Mata Atlântica, Brasil São José do Rio Preto 2020 Câmpus de São José do Rio Preto Lucas Rodrigo dos Santos Estudo do complexo de espécies Scinax hayii (Barbour, 1909) e Scinax dolloi (Werner, 1903) (Anura, Hylidae) ao longo da Mata Atlântica, Brasil Tese apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Biologia Animal, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de São José do Rio Preto. Financiadora: CAPES Orientador: Prof. Dr. Itamar Alves Martins São José do Rio Preto 2020 Lucas Rodrigo dos Santos Estudo do complexo de espécies Scinax hayii (Barbour, 1909) e Scinax dolloi (Werner, 1903) (Anura, Hylidae) ao longo da Mata Atlântica, Brasil Tese apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Biologia Animal, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de São José do Rio Preto. Financiadora: CAPES Comissão Examinadora Prof. Dr. Itamar Alves Martins Departamento de Biologia/ Universidade de Taubaté Orientador Prof(a). Dr(a). Délio Pontes Baêta da Costa Departamento de Vertebrados/Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro Prof(a). Dr(a). Luciana Barreto Nascimento Departamento de Ciências Biológicas/Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Prof(a). Dr(a). Renato Neves Feio Departamento de Biologia Animal/Universidade Federal de Viçosa Prof(a). Dr(a). Renato Christensen Nali Departamento de Zoologia/Universidade Federal de Juiz de Fora Taubaté 30 de abril de 2020 AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, Itamar Alves Martins pela minha formação profissional. Por toda sua amizade e atenção nesses 11 anos de convivência no Laboratório de zoologia da Universidade de Taubaté. Agradeço pelas lições de vida, por me animar todas as vezes que o caminho parecia estar difícil e por ser exemplo de pessoa e profissional. À minha esposa e companheira Tatiana Santos por todo cuidado e carinho; por sempre se fazer presente e compreender minha ausência. Aos meus pais João e Eliana pelo tempo cedido à minha criação e por acreditarem em mim em todos os momentos. À professora Dra. Mariana L. Lyra pela recepção, ensinamentos e toda ajuda com as análises moleculares executadas no projeto. Ao Instituto Básico de Biociências da Universidade de Taubaté e ao Laboratório de Zoologia por toda estrutura cedida para a realização do projeto. Aos professores Dr. Valter Cobo e Dra. Cecília Toledo pela contribuição e sugestões no exame de qualificação. Aos colegas do Laboratório de Zoologia (Guilherme, Nicolas, Leonardo, Juliano, Lu, Maysa, Paulo, Lucas e Du) pela ajuda em coletas, em laboratório e pelas discussões sobre ciências e o cotidiano. Aos professores Valter Cobo e Marisa Cardoso pelos ensinamentos e convivência no Laboratório de Zoologia da UNITAU. Ao Ibilce e aos funcionários da Seção de Pós-graduação pela sua eficiência e prontidão para esclarecimentos e ajuda nos trâmites. À Carol Manzano pelos cantos cedidos de Scinax da população da Serra do Japi. Aos professores Dr. Célio F. B. Haddad, Dr. José P. Pombal Jr. pelo empréstimo de espécimes depositados nas coleções sob seus cuidados. Ao professor Dr. Tiago S. Soares pela ajuda em campo no Espírito Santo e pelos exemplares cedidos de Santa Teresa. Aos membros da comissão avaliadora de defesa que aceitaram contribuir para a versão final deste manuscrito. Ao SISBIO pela licença de coleta concedida nº 55374-(1-5). À FAPESP pelo fomento cedido ao projeto Número de Processo 2018/00694-6. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. RESUMO A escassez de informações, juntamente com a morfologia conservada, dificulta a caracterização e identificação de complexo de espécies do gênero Scinax como em Scinax hayii e Scinax dolloi. Este estudo utilizou a taxonomia integrativa, usando como base a morfologia, morfometria, bioacústica e análises moleculares do gene COI (DNA Barcoding) para investigar e caracterizar variações populacionais entre populações de S. hayii e S. dolloi amostradas na região sudeste do Brasil, nos domínios da Mata Atlântica, buscando elucidar possíveis problemas taxonômicos e determinar a distribuição de cada espécie. Análises do canto de anúncio em populações de S. hayii revela uma variação gradativa entre as populações da Serra do Mar e litoral tendo as populações do litoral paulista, canto distinto dos topótipos e de outras populações da Serra do Mar. As análises morfológicas e morfométricas aliadas ao gene COI, revelam que S. hayii possui estruturação geográfica e, apesar de possuir populações polimórficas, esse gene ao longo da distribuição de S. hayii tem características conservadas. Semelhanças nos parâmetros bioacústicos e moleculares mostram que a população de Castelo no Espírito Santo é similar a topótipos de S. dolloi. Diferenças no canto de anúncio, comprimento rostro-cloacal e no gene COI sugerem que populações localizadas no bloco sul da Serra da Mantiqueira representam uma nova espécie. Palavras-chave: Scinaxinae; Taxonomia; Bioacústica; Morfometria; Gene COI. ABSTRACT Scarce information combined with conserved morphology hinder the characterization and identification of Scinax complex species, such as S. hayii and S. dolloi. We used integrative taxonomy, based on morphology, morphometry, bioacoustics and molecular analyzes (COI gene) in order to investigate and characterize population variations between S. hayii and S. dolloi populations, sampled in Southeastern Brazil, in the Forest Atlantic domains, seeking to elucidate possible taxonomic problems and also to determine the distribution of both species. Advertisement call analysis in S. hayii reveals a gradual variation between Serra do Mar mountais and litoral populations. Coastal populations have different calls compared to topotypes and other populations distributed in the mountains. Morphometric and morpholical analyzes combined with COI gene reveal that S. hayii has a geographic structure, even having polymorphic populations, COI gene throughout the distribution of S. hayii shows conserved characteristics. Similarities in bioacoustic and molecular parameters show that Castelo’s population in Espírito Santo state is similar to topotypes of S. dolloi. Differences in advertisement call, snout vent lenght and COI gene suggest that populations in the Southern Serra da Mantiqueira represent a new specie. Keywords: Scinaxinae; Taxonomy; Bioacustic; Morfometry; Gene COI. LISTA DE ILUSTRAÇÕES CAPÍTULO 1 Figura 1 – Populações amostradas de Scinax hayii e Scinax dolloi utilizadas na análise comparativa do canto de anúncio. Siglas dos estados brasileiros (UF): São Paulo (SP), Minas Gerais (MG), Rio de Janeiro (RJ) e Espírito Santo (ES). Populações amostradas: Castelo (CAS) no Espírito Santo. Na Serra do Mar: Petrópolis (PET) localidade tipo de Scinax hayii, Bananal (BAN), São Luiz do Paraitinga (SLP), Mogi das Cruzes (MOG), e São Bernardo do Campo (SBC). Populações litorâneas: Mangaratiba (MAN), Paraty (PAR), Ubatuba (UBA), Ilhabela (ILB) e Peruíbe (PER). Na Serra da Mantiqueira: Maringá (MAR) localidade tipo de S. dolloi, Itamonte (ITA), Campos do Jordão (CAJ), Santo Antonio do Pinhal (SAP), Camanducaia (CAM) e Jundiaí (JUN). 32 Figura 2 – Oscilograma (acima) e espectrograma (abaixo) do canto de anúncio de diferentes populações de Scinax hayii. Tempartura do ar no momento da gravação: Petrópolis (RJ) 17ºC, Bananal (SP) 17ºC, São Luiz do Paraitinga (SP) 18ºC, Mangaratiba (RJ) 22ºC, Paraty (RJ) 23ºC, Ubatuba (SP) 28ºC, Mogi dasCruzes (SP) 17ºC, São Bernarndo do Campo (SP) 17ºC, Ilhabela (SP) 21ºC, Peruíbe (SP) 21ºC, Castelo (ES) 19ºC. 37 Figura 3 – Oscilograma (acima) e espectrograma (abaixo) do canto de anúncio de Scinax dolloi registrado em diferentes localidades. Temperatura do ar: Maringá (RJ) ̶ localidade tipo ̶ 17ºC; Itamonte (MG) 12ºC; Campos do Jordão (SP) 17ºC; Santo Antônio do Pinhal (SP) 16ºC; Camanducaia (MG) 17ºC; Jundiaí (SP) 17ºC. 38 Figura 4 – Análise de componentes principais utilizando os parâmetros bioacústicos frequência dominante, duração da nota, número de pulsos e taxa de repetição dos pulsos em onze populações de Scinax hayii. O componente principal 1 (eixo x) é responsável por 52,9% e o componente 2 (eixo y) 27,5% da variação entre as populações. 40 Figura 5 – Boxplot dos parâmetros acústicos (A) duração da nota (ms), (B) frequência dominante (Hz), (C) número de pulsos por nota e (D) taxa de repetição dos pulsos (pulsos por segundo) em populações de Scinax hayii. Box representam 1º e 3º quartis, linha central representa a mediana; linhas verticais representam valores de amplitude (mínimos e máximos) amostrados. Populações litorâneas estão destacadas com asterisco (*). 40 Figura 6 – Análise de componentes principais em populações de Scinax dolloi (Maringá, Itatiaia, RJ localidade tipo; Itamonte e Camanducaia no estado de Minas Gerais; Campos do Jordão, Santo Antônio do Pinhal, Jundiaí e Bananal no estado de São Paulo; Castelo, Espírito Santo) utilizando os parâmetros bioacústicos frequência dominante, duração da nota, número de pulsos e taxa de repetição. O componente principal 1 representado no eixo x é responsável por 99,5% da variação encontrada, já o componente 2 (eixo y) representa 0,48% da variação encontrada. 46 Figura 7 – Boxplot dos parâmetros acústicos (A) frequência dominante (Hz= Hertz), (B) duração da nota (ms= milissegundos), (C) número de pulsos por nota e (D) taxa de repetição dos pulsos (pulsos/segundo) em populações de Scinax dolloi e Scinax hayii de Bananal (SP) e Castelo (ES). Box representam 1º e 3º quartis, linha central representa a mediana; linhas horizontais representam valores de amplitude amostrados (mínimos e máximos). 46 CAPÍTULO 2 Figura 1 – Distribuição geográfica das populações utilizadas nas análises morfométricas e morfológicas de Scinax hayii e Scinax dolloi. Populações amostradas no estado do Espírito Santo (ES): municípios de Castelo (CAS) e Santa Teresa (SAT); no estado do Rio de Janeiro (RJ): municípios Petrópolis (PET), Maringá, Itatiaia, (MAR), Itatiaia, Parque Nacional do Itatiaia parte baixa (IPB), Mangaratiba (MAN) e Paraty (PAR); no estado de Minas Gerais (MG): Itamonte (ITA), Cristina (CRI) e Camanducaia (CAM); no estado de São Paulo: muncípios São Luiz do Paraitinga (SLP), Ubatuba (UBA), Ilhabela (ILB), Santa Isabel (SAI), Mogi das Cruzes (MOG), Santo André (SAA), São Bernardo do Campo (SBC), Juquitiba (JUQ), Peruíbe (PER), Queluz (QUE), Piquete (PIQ), Campos do Jordão (CAJ) e Santo Antonio do Pinhal (SAP). 66 Figura 2 – Caracteres morfométricos analisados. (A) vista dorsal, comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento da cabeça (CC); (B) vista ventral, largura da cabeça (LC), comprimento do braço (CB), comprimento do antebraço (CAB), comprimento da mão (CM), diâmetro do disco adesivo do dedo 3 da mão (DD3), comprimento do fêmur, comprimento da tíbia (CT), comprimento do tarso (CTAR), comprimento do pé (CP) diâmetro do disco adesivo do dedo 4 do pé (DD4); (C) vista dorsal da cabeça, distância interorbital (DIO), distância inter-nasal (DIN), distância narina-focinho (DNF); (D) vista lateral da cabeça, diâmetro do olho (DO), diâmetro do tímpano (DT), distância olho-narina (DON). Adaptado de Pugliese (2002). 67 Figura 3 – Machos Scinax hayii coletados em Petrópolis, Rio de Janeiro (localidade tipo) exemplares CFBH 13935 (A – E; CRC= 42,5 mm) e CCLZU 3179 (G e H; CRC= 41,3 mm). Vista lateral (A), vista ventral da mão (B), vista ventral do pé (C), vista dorsal (D), vista ventral (E), vista dorsal mostrando coloração na face posterior das coxas (F e G), vista lateral do indivíduo (H). De A a F indivíduos fixados; em G e H animal em vida. 75 Figura 4 – Macho de S. hayii (CCLZU 3166, CRC= 41,3 mm, fotos A, B, C, E e F) coletado em São Luiz do Paraitinga, São Paulo. Vistas da lateral da cabeça (A), mão (B), pé (C), região lateral e ventral evidenciando as manchas nos flancos (D), vista dorsal (E), ventral (F), vista dorsal evidenciando a face posterior das coxas com manchas típicas de Scinax (G) vista lateral do indivíduo (H). Exemplares não coletados nas imagens D, G e H. 80 Figura 5 – Macho de Scinax hayii coletado em Mangaratiba, Rio de Janeiro (CCLZU 3466, CRC= 42,1 mm). Vistas da lateral da cabeça (A), mão (B), pé (C), região lateral evidenciando as manchas nos flancos (D), vista dorsal (E), ventral (F), vista dorsal evidenciando a face posterior das coxas com manchas típicas de Scinax (G) vista dorsal do indivíduo (H). 81 Figura 6 – Machos de Scinax hayii coletados em Mogi das Cruzes, São Paulo, apresentando padrão de coloração dorsal com faixas e manchas (CCLZU 3429, CRC= 35,9 mm; imagens A, B e E; e CCLZU 3430, CRC= 39,4 mm, imagens C e D). Vistas lateral do corpo (A), ventral (B), dorsal (C), face posterior da coxa (D), e vista dorsal (E). 82 Figura 7 – Macho de Scinax hayii coletado em São Bernardo do Campo, São Paulo. Indivíduo com padrão de manchas no dorso (CCLZU 3425, CRC= 37,2 mm). Vista lateral (A), ventral (B), dorsal (C e E), face posterior da coxa (D). Imagem D indivíduo não coletado. 83 Figura 8 – Padrões de manchas na superfície dorsal, e na face posterior da coxa registrados em machos de Scinax hayii, nas populações de Santa Isabel (A) (da esquerda para a direita: CCLZU 3301, CRC= 36,2 mm; CFBH 40168, CRC= 36,9; CFBH 40169, CRC= 38,3 mm), Santo André (B) (da esquerda para a direita: CFBH 29303, CRC= 37,3 mm; CFBH 29304, CRC= 34,4 mm; CFBH 29308, CRC= 39,1) e Juquitiba (C) (da esquerda para a direita: CCLZU 3314, CRC= 38,4 mm; CCLZU 3317, CRC= 37,8; CCLZU 3318, CRC= 39 mm) no estado de São Paulo. 84 Figura 9 – Padrão de coloração dorsal uniforme e manchas em regiões escondidas (fêmur, tíbias e flancos) em exemplares de Scinax hayii coletados na planície litorânea em (A) Paraty, RJ (CCLZU 3407, CRC= 35,7 mm), (B) Ubatuba, SP, (CCLZU 3185, CRC= 38,5 mm), e (C) Ilhabela, SP (CCLZU 3331, CRC= 36,9 mm). 85 Figura 10 – Machos de Scinax hayii coletados em Peruíbe, São Paulo (A, B e F CCLZU 3241, CRC= 36,8 mm; C, D e E CCLZU 3239, CRC= 37,9 mm). Vista lateral evidenciando o padrão de coloração dorsal com manchas (A e B), padrão de coloração na região posterior da coxa (C e D), vista ventral (E), vista lateral evidenciando padrão de coloração com manchas na região dos flancos. 86 Figura 11 – Machos Scinax hayii registrados em Castelo, Espírito Santo. Vista lateral evidenciando a coloração dos flancos (A), vista lateral superior (B), vista ventral (C), face posterior da coxa evidenciando a ausência do padrão de manchas reticulares típicas de Scinax (D, E e F), e vista lateral de espécime apresentando padrão de coloração dorsal com manchas (G). Imagens A, C, F e G exemplar CCLZU 3422 (CRC= 34,3 mm), B e E CCLZU 3419 (CRC= 35,4 mm), em D CCLZU 3421 (CRC= 33,3). 87 Figura 12 – Caracteres selecionados para a análise de componentes principais e seus valores de importância para o componente principal 1. O comprimento rostro-cloacal é o principal parâmetro responsável pela variação populacional em morfometria nas populações de Scinax hayii (73% de influência sobre o componente principal 1). 89 Figura 13 – Analise de componentes principais utilizando 6 caracteres morfométricos e 14 populações de Scinax hayii. O componente principal 1 é responsável por 86,8% da variação encontrada, já o componente principal 2 (eixo y) corresponde a 5,6%. Os caracteres representados por eixos na figura (biplot) são: (CRC) comprimento rostro-cloacal, (CT) comprimento da tíbia, (CF) comprimento do fêmur, (CP) comprimento do pé, (LC) largura da cabeça e (CC) comprimento da cabeça. 91 Figura 14 – Box e jitter plot utilizando o caractere comprimento rostro-cloacal (CRC) medido em milímetros (mm), em populações de Scinax hayii. Box representam o primeiro e terceiro quartil, linha central representa a mediana; linhas verticais representam a amplitude. Pontos representam valores de cada indivíduo amostrado. 92 Figura 15 – Macho de Scinax dolloi coletado em Maringá, Itatiaia, Rio de Janeiro (A – E CCLZU 3288, CRC= 35,3 mm; indivíduo não coletado em F; em G CCLZU 3286, CRC= 33,6 mm) . Vistas lateral da cabeça (A), pé (B), mão (C); vistas dorsal (D, F e G) e ventral (E). Animal fixado de A até E. 101 Figura 16 – Padrões de coloração dorsal em machos de Scinax dolloi. Exemplares coletados no Brejo da Lapa, Itamonte, MG. (A) vista dorsal (CFBH 40171, CRC= 38,6 mm), (B) vista lateral evidenciando padrão e coloração e aspecto granular do dorso (CFBH 40173, CRC= 33,9 mm) (C) vista posterior evidenciando padrão de coloração na face posterior do fêmur e flancos; Imagens D – F, espécimes coletados em Cristina, MG. CCLZU 2231, CRC= 34,8 mm (D), CCLZU 2119, CRC= 38,2 mm (E), CCLZU 2956, CRC= 39,4 mm (F); Exemplares coletados em Piquete, CCLZU 2795, CRC= 38 mm (G), CCLZU 2881, CRC= 39,3 mm (H), CCLZU 2882, CRC= 39,6 mm (I). De A a C animais em vida, de D a I animais fixados. 107 Figura 17 – Padrão de coloração dorsal em machos fixados de Scinax dolloi. Indivíduos com padrão vestigial para padrão evidente (da esquerda para a direita). Itatiaia (parte baixa): CCLZU 2726, CRC= 39 mm (A), CCLZU 2724, CRC= 37 mm (B), CCLZU 2687, CRC= 34,6 mm (C); Queluz: CCLZU 1328, CRC= 39,7 mm (D), CCLZU 1727, CRC= 39,5 mm (E); Santo Antônio do Pinhal: CCLZU 3181, CRC= 38,5 mm (F), CCLZU 1107, CRC= 37,7 mm (G), CCLZU 3180, CRC= 38,6 mm (H). 108 Figura 18 – Padrão de manchas na superfície dorsal de Scinax dolloi de Campos do Jordão (A – C) e Camanducaia (G – I). Padrão de coloração na face posterior da coxa vestigial, ou pouco evidente em Campos do Jordão (D) e Camanducaia (E e F). CCLZU 2334 (fêmea), CRC= 40,2 mm (A), CFBH 40180, CRC= 38,5 mm (B), CCLZU 3310, CRC= 38,6 mm (C), (D) exemplar não coletado; CCLZU 3478, CRC= 36,8 mm (E e H), CCLZU3473, CRC= 36,4 mm (F e I), CCLZU 3475, CRC= 34 mm (G). Em D, E e F animais em vida. 109 Figura 19 – Importância dos caracteres morfométricos utilizados na análise de componentes principais em populações de Scinax doloi e S. hayii de Castelo e Santa Teresa (Espírito Santo). Caracteres foram selecionados por representarem a maior variação encontrada entre as populações. 112 Figura 20 – Análise de componentes principais em onze populações de Scinax dolloi, incluindo S. hayii de Castelo e Santa Teresa, utilizando seis caracteres morfométricos. O eixo x (componente principal 1) explica 78,9% da variação encontrada e o eixo y (componente principal 2) 11,5%. Caracteres representados nos eixos centrais da figura são: Comprimento rostro-cloacal (CRC), comprimento do pé (CP), comprimento da tíbia (CT), comprimento do fêmur (CF), largura da cabeça (LC) e comprimento do braço (CB). 113 Figura 21 – Box e jitter plot utilizando o parâmetro comprimento rostro-cloacal populações de Scinax dolloi, incluindo populações de Castelo e Santa Teresa (ES) identificados como Scinax hayii. Box representam primeiro e terceiro quartis; linha central representa a mediana; linhas verticais apresentam valores de amplitude; pontos representam valores de cada exemplar mensurado. 114 Figura 22 – Árvore de máxima verossimilhança dos fragmentos mitocondriais sequenciados do gene Citocromo c Oxidase I (COI) de espécies de Scinax (S. dolloi, S. duartei, S. granulatus, S. hayii e S. perereca). Os números próximos aos nós indicam os valores de suporte dos agrupamentos em função do bootstrap. (T) indica topótipos. 120 Figura 23 – Distribuição geográfica de Scinax dolloi, Scinax hayii e Scinax perereca, utilizadas na análise molecular do gene COI. Estados brasileiros (UF): ES, Espírito Santo; MG, Minas Gerais; SP, São Paulo; RJ, Rio de Janeiro; PR, Paraná; SC, Santa Catarina; RS, Rio Grande do Sul. 122 LISTA DE TABELAS CAPÍTULO 1 Tabela 1 – Parâmetros espectrais e temporais do canto de anúncio de populações de Scinax hayii, Scinax dolloi. Topótipos estão destacadas. Os resultados são apresentados na forma de amplitude, média seguida de desvio padrão e coeficiente de variação (%). Faixa de frequência (FF), Frequência mínima (FMIN), Frequência máxima (FMAX), Frequência dominante (FD), duração da nota (DN), número de pulsos por nota (NP), duração dos pulsos (DP), intervalo entre pulsos (IEP), taxa de repetição das notas (TRN) e taxa de repetição dos pulsos (TRP). 34 Tabela 2 – Matriz de importância dos parâmetros bioacústicos utilizados na análise de componentes principais de populações de Scinax hayii. Componente principal (PC). 42 Tabela 3 – Valores do teste de Dunn utilizado para comparações par a par entre as populações de Scinax hayii. Em A comparações entre frequência dominante, B duração da nota, C número de pulsos e D taxa de repetição dos pulsos. Valores de p significativo (<0,05) são destacados em cinza. 43 Tabela 4 – Matriz de importância dos parâmetros acústicos utilizados na análise de componentes principais em populações de Scinax dolloi, e S. hayii de Bananal (SP) e Castelo (ES). Componente principal (PC). 48 Tabela 5 – Valores do teste de Dunn utilizado para comparações par a par entre as populações de Scinax dolloi. Em A comparações entre frequência dominante, B duração da nota, C número de pulsos e D taxa de repetição dos pulsos. Valores de p significativo (<0,05) são destacados em cinza. 49 CAPÍTULO 2 Tabela 1 – Matriz de importância dos caracteres morfométricos utilizados na análise de componentes principais. (PC) componente principal. (CRC) comprimento rostro-cloacal, (CT) comprimento da tíbia, (CF) comprimento do fêmur, (CP) comprimento do pé, (LC) largura da cabeça e (CC) comprimento da cabeça. 90 Tabela 2 – Medidas morfométricas (em milímetros) de 18 caracteres analisados em populações identificadas como Scinax hayii. Os valores são referentes aos machos analisados. Resultados são apresentados na forma de amplitude e média seguida de desvio padrão. Parâmetros analisados: comprimento rostro-cloacal (CRC), comprimento da cabeça (CC), largura da cabeça (LC), diâmetro do olho (DO), distância interorbital (DIO), distância olho-narina (DON), distância narina-focinho (DNF), distância inter-nasal (DIN), diâmetro do tímpano (DT), comprimento do fêmur (CF), comprimento da tíbia (CT), comprimento do pé (CP), comprimento do tarso (CTAR), comprimento da mão (CM), comprimento do braço (CB), comprimento do antebraço (CAB), diâmetro do disco adesivo do dedo 3 da mão (DD3), diâmetro do disco adesivo do dedo 4 do pé (DD4). 93 Tabela 3 – Teste de Dunn utilizando o comprimento rostro-cloacal para comparar 14 populações identificadas como Scinax hayii. Valores estatisticamente significativos (p < 0,05) estão destacados em cinza. 96 Tabela 4 – Matriz de importância dos utilizados na análise de componentes principais em populações de S. dolloi incluindo populações de S. hayii do Espírito Santo (Castelo e Santa Teresa). (PC) componente principal. Caracteres: comprimento rostro-cloacal (CRC), comprimento do pé (CP), comprimento da tíbia (CT), comprimento do fêmur (CF), largura da cabeça (LC) e comprimento do braço (CB). 111 Tabela 5 – Parâmetros morfométricos de 18 caracteres de nove populações de Scinax dolloi na Serra da Mantiqueira. Valores são apresentados em milímetros, na forma de amplitude e média seguida de desvio padrão. Parâmetros analisados: comprimento rostro-cloacal (CRC), comprimento da cabeça (CC), largura da cabeça (LC), diâmetro do olho (DO), distância interorbital (DIO), distância olho-narina (DON), distância narina-focinho (DNF), distância inter-nasal (DIN), diâmetro do tímpano (DT), comprimento do fêmur (CF), comprimento da tíbia (CT), comprimento do pé (CP), comprimento do tarso (CTAR), comprimento da mão (CM), comprimento do braço (CB), comprimento do antebraço (CAB), diâmetro do disco adesivo do dedo 3 da mão (DD3), diâmetro do disco adesivo do dedo 4 do pé (DD4). 115 Tabela 6 – Teste de Dunn aplicado entre as populações de Scinax dolloi amostradas na Serra da Mantiqueira e populações identificadas como S. hayii de Castelo e Santa Teresa, Espírito Santo, utilizando o parâmetro rostro-cloacal (CRC). Valores de p significativos (p<0,05) são destacados em cinza. 117 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 19 2 OBJETIVOS 22 REFERÊNCIAS 23 3 CAPÍTULO 1: VARIAÇÕES POPULACIONAIS NO CANTO DE ANÚNCIO DE SCINAX HAYII (BARBOUR, 1909) E SCINAX DOLLOI (WERNER, 1903) 26 4 RESUMO 26 5 INTRODUÇÃO 27 6 MATERIAL E MÉTODOS 29 6.1 Populações amostradas 29 6.2 Análise de vocalização 30 7 RESULTADOS 33 7.1 Descrição do canto de anúncio de Scinax hayii e Scinax dolloi 33 7.1.1 Comparações bioacústicas em populações de Scinax hayii 39 7.1.2 Comparações bioacústicas em populações de Scinax dolloi na Serra da Mantiqueira 45 8 DISCUSSÃO 51 REFERÊNCIAS 57 APÊNDICE A - ARQUIVOS SONOROS ANALISADOS 60 9 CAPÍTULO 2: ANÁLISES MORFOMÉTRICAS, MORFOLÓGICAS E MOLECULARES EM POPULAÇÕES DE SCIANX HAYII (BARBOUR, 1909) E SCINAX DOLLOI (WERNER, 1903) (ANURA, HYLIDAE) 61 10 RESUMO 61 11 INTRODUÇÃO 62 12 MATERIAL E MÉTODOS 65 12.1 Análise morfométrica 65 12.2 Análise morfológica 66 12.3 Análise molecular 67 12.4 Análise estatística 69 12.4.1 Morfometria 69 12.4.2 Análise Molecular 70 13 RESULTADOS 71 13.1 Redescrição de Scinax hayii 71 13.1.1 Variações populacionais em Scinax hayii 76 13.1.2 Comparações morfométricas 88 13.2 Redescrição de Scinax dolloi 97 13.2.1 Variações populacionais em Scinax dolloi 102 13.2.2 Comparações morfométricas 110 13.3 Análise Molecular 118 14 DISCUSSÃO 123 15 CONCLUSÃO 132 REFERÊNCIAS 134 APÊNDICE A – LISTA DE ESPÉCIMES ANALISADOS 139 APÊNDICE B – LISTA DE TECIDOS ANALISADOS DE SCINAX 139 APÊNDICE C –TRABALHOS PÚBLICADOS PROVENIENTES DO PROJETO 145 ANEXO A – GEOMORFOLOGIA DO ESTADO DE SÃO PAULO 168 19 1 INTRODUÇÃO A subfamília Scinaxinae foi proposta por Duellman et al. (2016) e apresenta atualmente 140 espécies (veja FROST, 2020) distribuídas em quatro gêneros. O gênero Ololygon Fitzinger, 1843, possui 50 espécies e foi revalidado para comportar as espécies anteriormente alocadas no grupo Scinax catharinae (sensu FAIVOVICH, 2002). O gênero Julianus apresenta três espécies atualmente, sendo proposto por Duellman, Marion e Hedges (2016) para alocar as espécies do grupo Scinax uruguayus que anteriormente estavam alocadas no grupo Scinax ruber (sensu FAIVOVICH et al., 2005). O gênero Scinax Wagler, 1830, é o gênero mais especioso da subfamília Scinaxinae contendo até o presente momento 72 espécies (FROST, 2020). Todas as espécies que estavam até então alocadas no clado Scinax ruber de espécies por Faivovich (2002) (exceto grupo S. uruguayus) continuaram usando o epíteto genérico Scinax (DUELLMAN et al., 2016). O quarto gênero pertencente à família Scinaxinae é o gênero Sphaenorhynchus Tschudi, 1838, que é considerado um táxon irmão, mas com baixo valor de suporte (apenas 49%), segundo análise molecular feita por Duellman et al. (2016). Atualmente o gênero Sphaenorhynchus apresenta 15 espécies (ARAUJO-VIEIRA et al., 2019; FROST, 2020). Faivovich et al. (2018) discutem a preblemática em reconhecer Scinaxinae como subfamília devido ao baixo valor de suporte (<50%) e suas instáveis relações, propondo a tribo Scinaxini para Scinax (incluindo Julianus e Ololygon) e a tribuo Sphaenorhynchini para o gênero Sphaenorhynchus. Apesar de ser o gênero mais especioso, o número de espécies para Scinax ainda é subestimado e novas espécies vêm sendo descritas nos últimos anos (Scinax haddadorum Araujo-Vieira, Valdujo, e Faivovich, 2016; Scinax rossaferesae Conte, Araujo-Vieira, Crivellari, e Berneck, 2016; Scinax onca Ferrão, Moravec, Fraga, Pinheiro de Almeida, Kaefer, e Lima, 2017; Scinax caprarius Acosta-Galvis, 2018; Scinax ruberoculatus Ferrão, Fraga, 20 Moravec, Kaefer, e Lima, 2018; Scinax strussmannae Ferrão, Fraga, Moravec, Kaefer e Lima, 2018; Scinax tsachila Ron, Duellman, Caminer e Pazmiño, 2018). Alguns grupos de espécies do gênero Scinax apresentam morfologia conservada sendo comum duas ou mais espécies serem denominados sob apenas um nome (chamadas espécies morfologicamente crípticas) (LUTZ, 1973; NUNES et al., 2012; RON et al., 2018). Estudos taxonômicos envolvendo esses chamados complexos de espécies morfologicamente crípticas têm apresentado sucesso no desmembramento e nominação das novas espécies bem como aumentado a perspectiva sobre o conhecimento da diversidade de espécies de anuros (NUNES et al., 2012; FERRÃO et al., 2017; RON et al., 2018). Todavia, a dificuldade no uso da morfologia para o desmembramento das espécies crípticas, levou a ascensão da taxonomia integrativa (PADIAL et al., 2010). Esta utiliza vários caracteres como o canto, ecologia, comportamento e principalmente análises moleculares, que tem sido a vanguarda em reconhecer novas unidades taxonômicas, usando diferenciação do DNA para identificar novas espécies em unidades morfológicas semelhantes (VENCES et al., 2005; FOUQUET et al., 2007; RON et al., 2018;). Em 1909 em seu artigo intitulado “Some new South American cold-blooded vertebrates”, o naturalista Thomas Barbour (1884—1946) descreveu uma espécie do gênero Hyla nomeando-a como Hyla hayii em homenagem a Clarence L. Hay, “um entusiasmado ajudante em muitas excursões de coleta” (em tradução livre). Essa descrição foi baseada em um exemplar (MCZ 2513 Harvard University) coletado em Petrópolis, Rio de Janeiro (localidade tipo) (BARBOUR, 1909). Segundo Frost (2020) S. hayii possui distribuição no sudeste e sul do Brasil ocorrendo na Serra do Mar, do estado do Espírito Santo até o estado de Santa Catarina. A ocorrência da 21 espécie na Serra da Mantiqueira também é relatada (HADDAD e SAZIMA, 1992; POMBAL et al., 1995, MAGRINI et al., 2011). Após a descrição da espécie Scinax perereca Pombal, Haddad e Kasahara, 1995, na localidade de Ribeirão Branco (região sul do estado de São Paulo), arbitrariamente as populações registradas partindo da localidade tipo de S. perereca até a região sul do Brasil passaram a ser referidas como Scinax perereca. Fato confirmado posteriormente por Silva (2017) que, em sua dissertação, revisando populações de S. perereca confirmou as semelhanças morfológicas, moleculares e bioacústicas das populações da região sul do Brasil em relação à localidade tipo Ribeirão Branco. Ao longo de sua distribuição, diversas populações de Scinax hayii foram registradas e autores começaram a identificar e apontar diferenças existentes em seus caracteres morfológicos, morfométricos e bioacústicos (COCHRAN, 1955; LUTZ, 1973; HEYER et al., 1990; CARDOSO e ANDRADE, 1991; HADDAD e SAZIMA, 1992; POMBAL et al., 1995, MAGRINI et al., 2011; SANTOS e MARTINS, 2017). Devido as variações apontadas Haddad e Sazima (1992), Pombal et al. (1995 a, b) e Santos e Martins (2017) sugerem que Scinax hayii representa um complexo de espécies. Scinax dolloi foi descrita por Werner (1903) baseado em duas fêmeas, estas depositadas no Institut Royal dês Sciences Naturalles em Brexelas na Bélgica (IRSNB 6481). Em sua descrição original a localidade tipo designada por Werner foi “Brazil in unknow location” em tradução livre significa Brasil em uma região desconhecida. Lang (1990) citou dois sintipos de “Hyla dolloi” coletados por Van Den Driesse em 30 de julho de 1897, para a localidade de “Haut Maringa Brésil” (Alto Maringá Brasil). Com base nessa informação houve uma interpretação geral assumindo a localidade tipo de Scinax dolloi como o Município de Maringá, no estado do Paraná, sul do Brasil. Entretanto o município de Maringá foi criado apenas em 22 1947, 44 anos após a descrição da espécie (Veja o histórico completo em CARAMASCHI et al., 2013). Caramaschi et al. (2013) reavaliaram a interpretação da localidade tipo de S. dolloi, e designaram a Vila de Maringá, município de Itatiaia, Rio de Janeiro, como a localidade tipo da espécie. Entretanto, a vila de Maringá está localizada na Serra da Mantiqueira na fronteira entre os estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Seus territórios permeiam por dois municípios, Itatiaia (Rio de Janeiro) e Bocaina de Minas (Minas Gerais), sendo que neste segundo se localiza as coordenadas geográficas apresentadas por Caramaschi et al. (2013) e designadas como localidade tipo. Lutz (1973) considerou S. dolloi com uma “doubtful species”, devido a inexistência de espécimes coletados para identificação. Duellman (em FROST, 1985, 2020) relata que não há nenhuma população associada a esta espécie devido à falta de exemplares coletados. Baseando- se nos síntipos, Faivovich et al. (2005) relatam que S. dolloi é morfologicamente próxima de S. hayii e S. perereca. Contudo, a falta de espécimes coletados e a escassez de informações biológicas a respeito da espécie tornam a diagnose confusa e o status taxonômico de Scinax dolloi incerto. 2 OBJETIVOS O presente estudo teve como objetivo investigar e caracterizar as variações morfológicas, morfométricas, bioacústicas e moleculares em diferentes populações de Scinax hayii e S. dolloi e suas possíveis implicações taxonômicas e ecológicas ao longo da Mata Atlântica, determinando também a distribuição geográfica de cada espécie. 23 REFERÊNCIAS ACOSTA-GALVIS, A. R. Una nueva rana de huesos verdes del género Scinax (Anura: Hylidae) asociada a los bosques subandinos de la cuenca del río Magdalena, Colombia. Biota Colombiana, n., 19 (Supl. 1) p. 131–159. 2018. ARAUJO-VIEIRA, K.; VALDUJO, P. H.; FAIVOVICH, J. A new species of Scinax Wagler (Anura: Hylidae) from Mato Grosso, Brazil. Zootaxa. n. 4061, p. 261–273. 2016. ARAUJO-VIEIRA, K.; BLOTTO, B. L.; CARAMASCHI, U.; HADDAD, C. F. B. 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As populações de Scinax hayii mostraram uma variação gradual, sendo possível distinguir as populações de regiões de elevadas altitudes, daquelas de planície litorânea que apresentam cantos com maior frequência dominante, taxa de repetição dos pulsos, e menor duração das notas. As populações de S. dolloi apresentaram dois grupos acusticamente diferentes pelos parâmetros taxa de repetição dos pulsos e duração da nota, sendo um, formado pelos topotipos (Maringá e Itamonte) incluindo Castelo (ES), e o segundo formado por populações ao sul da Serra da Mantiqueira (Campos do Jordão até Jundiaí). A população de Castelo possui todos os parâmetros comparados do canto semelhantes ao canto dos topótipos. A população de Bananal (Serra da Bocaina) apresenta canto de anúncio semelhante aos amostrados para as populações do bloco sul da Serra da Mantiqueira (Campos do Jordão até Jundiaí). Palavras-chave: Bioacústica; discriminação acústica; variação geográfica. 27 5 INTRODUÇÃO O canto de anúncio apresenta em seus parâmetros espectrais e temporais informações importantes para o reconhecimento específico, também servindo como mecanismo de isolamento reprodutivo (GERHARDT, 1994, MARTINS e JIM, 2004). Por esses motivos, o canto de anúncio em anuros tem sido usado como uma eficaz ferramenta para resolução de problemas taxonômicos e identificação de novas espécies (NUNES et al., 2012; PANSONATO et al., 2014; CONTE et al., 2016). Populações de espécies de anuros com ampla distribuição geográfica geralmente apresentam variação no canto de anúncio (GERHARDT, 1994; HEYER e REID, 2002; FARIA et al., 2013). Segundo o Modelo de isolamento por distância, proposto por Wright (1943), populações mais próximas apresentam diferenças fenotípicas e genéticas menores em relação às populações mais distantes, criando gradientes em diversos caracteres. Além do isolamento por distância, barreiras físicas, fisiológicas, processos estocásticos, ecologia e pressão seletiva, são outros fatores que, ao longo do tempo, podem levar ao surgimento de novas espécies (BLAIR 1958, LEMMON et al., 2007). Scinax hayii, foi descrita por Barbour (1909) tendo sua localidade tipo o município de Petrópolis, Rio de Janeiro. Apresenta ampla distribuição geográfica no sudeste do Brasil (FROST, 2020), ocorrendo do Espírito Santo até o estado de Santa Catarina, ocupando ambientes na Serra do Mar e planície litorânea. Silva (2017) relata que populações do sul do estado de São Paulo (partindo de Ribeirão Branco, localidade tipo de Scinax perereca Pombal, Haddad e Kasahara, 1995) até o sul do Brasil se tratam de Scinax perereca. Cardoso e Andrade (1991), Haddad e Sazima (1992), Pombal et al. (1995) e Magrini et al. (2011) relatam a ocorrência de Scinax hayii para a Serra da Mantiqueira, grupo de cadeias montanhosas que se estende pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais. Entretanto, Santos (2015) 28 relata que populações identificadas como S. hayii localizadas na Serra da Mantiqueira (Campos do Jordão e Santo Antonio do Pinhal) diferem em morfologia, morfometria e no canto de anúncio dos topotipos de Scinax hayii. Caramaschi et al. (2013) reavaliaram a localidade tipo de S. dolloi, designando a Vila de Maringá, muncípio de Itatiaia, na região da Serra da Mantiqueira no estado do Rio de Janeiro, como localidade tipo de S. dolloi. Populações registradas na Serra da Mantiqueira apresentam morfologia semelhante a descrição de S. dolloi, e devido às diferenças registradas por Santos (2015) entre populações de S. hayii e da Serra da Mantiqueira, estas últimas passaram a ser identificadas como S. dolloi. O primeiro relato da vocalização de S. hayii foi feito por Cochran (1955) utilizando uma onomatopeia (descrito pela autora como um rouco kraw, kraw, kraw), para representar o canto produzido por exemplares do Alto da Serra, Paranapiacaba, São Paulo. Em outros estudos, pesquisadores descreveram o canto de S. hayii dentro da sua distribuição, nos estados de São Paulo e Minas Gerais (Boracéia,SP, HEYER et al., 1990 ; Poços de Caldas, MG, CARDOSO e ANDRADE 1991; Jundiaí, SP, POMBAL et al., 1995; Atibaia, SP e Itapeva, MG, MAGRINI et al., 2011). Em virtude das variações morfológicas e bioacústicas registradas ao longo de sua distribuição (COCHRAN, 1955; LUTZ, 1973; HEYER et al., 1990; CARDOSO e ANDRADE, 1991), Haddad e Sazima (1992) e Pombal et al. (1995) sugeriram que Scinax hayii representasse um complexo de espécies, entretanto, a ausência da descrição do canto de anúncio de exemplares da localidade tipo, dificultavam o estabelecimento de um padrão confiável para a espécie. Santos e Martins (2017) descreveram vocalizações de topotipos de Scinax hayii, e baseados nas análises bioacústicas, reforçaram a hipótese de S. hayii representar um complexo de espécies. 29 O objetivo deste estudo foi (i) caracterizar e descrever os parâmetros espectrais e temporais do canto de anúncio de populações de Scinax hayii ao longo de sua distribuição geográfica, comparando variações no canto de anúncio; (ii) descrever o canto de anúncio de topótipos de Scinax dolloi e comparar com populações distribuídas na Serra da Mantiqueira 6 MATERIAL E MÉTODOS 6.1 Populações amostradas As vocalizações de Scinax hayii utilizadas são provenientes das seguintes populações: No estado do Rio de Janeiro, muncípios de Petrópolis (localidade tipo) (dois indivíduos), Mangaratiba (sete indivíduos) e Paraty (oito indivíduos); no estado de São Paulo, municípios de Bananal (quatro indivíduos), São Luiz do Paraitinga (oito indivíduos), Ubatuba (sete indivíduos), Ilhabela (quatro indivíduos), Mogi das Cruzes (oito indivíduos), São Bernardo do Campo (sete indivíduos) e Peruíbe (cinco indivíduos); no estado do Espírito Santo, município de Castelo (oito indivíduos). Devido à pouca informação, Scinax dolloi atualmente é utilizado apenas para populações da localidade tipo, Vila de Maringá situada entre os municípios de Itatiaia, Rio de Janeiro e Bocaina de Minas, Minas Gerais. Populações da Serra da Mantiqueira, apresentam morfologia semelhante a S. dolloi (observações pessoais), como não são semelhantes bioacústica e morfologicamente a S. hayii (SANTOS, 2015), neste estudo são comparadas com S. dolloi para verificar se pertencem a esta espécie. Além da localidade tipo de S. dolloi (Maringá, RJ), na Serra da Mantiqueira foram amostradas as seguintes populações: no estado de Minas Gerais, municípios de Itamonte (Brejo da Lapa, Parque Nacional do Itatiaia) (três indivíduos) e Camanducaia ( no distrito de Monte 30 Verde) (quatro indivíduos); no estado de São Paulo, municípios de Campos do Jordão (dez indivíduos), Santo Antônio do Pinhal (cinco indivíduos) e Jundiaí, (sete indivíduos). Todos as populações de S. hayii e S. dolloi analisadas são apresentadas em um mapa de distribuição (Figura 1). 6.2 Análise de vocalização Vocalizações foram gravadas em campo utilizando gravadores digitais Marantz PMD- 671 ou Tascam Dr100-Mk1 com taxa de amostragem de 44.100 Hz, 16-bit, conectados a microfone direcional Sennheiser K6/ME66. As análises bioacústicas foram realizadas no software Raven 1.4 (Bioacoustics Research Program 2011) com as seguintes configurações: window type Hann, 256 samples, 3 dB filter bandwidth 248 Hz, overlap 50%, Hop size 128 samples, 256 samples DFT size, grid spacing 172 Hz. Todas vocalizações foram analisadas utilizando as mesmas configurações. Foram analisados 10 parâmetros do canto de anúncio: Faixa de frequência (região entre a frequência mínima e frequência máxima), frequência dominante, duração da nota, número de pulsos por nota, duração do pulso, intervalo entre pulsos, taxa de repetição dos pulsos (calculado pelo número de pulsos dividido pela duração da nota) e taxa de repetição das notas. Terminologia dos parâmetros acústicos está de acordo com Köhler et al. (2017). Voucher das gravações utilizadas podem ser encontradas no APÊNDICE A. Foi utilizado coeficiente de variação interpopulacional, adaptado de Gerhardt (1991), tendo a seguinte definição: <10% parâmetro estático (pouca variação); >10% parâmetro dinâmico (variável). As análises comparativas foram feitas no programa Past 3.2.6 (Paleontological Statistics) sendo divididas em dois grupos: (i) Scinax hayii: populações da Serra do Mar, planície litorânea, população de Bananal, e população Castelo (Espírito Santo) identificadas atualmente como S. hayii; e (ii) Scinax dolloi: topótipos (Maringá), populações da Serra da 31 Mantiqueira (Campos do Jordão, Santo Antonio do Pinhal, Camanducaia e Jundiaí), população de Castelo (ES) atualmente identificada como S. hayii, e a população de Bananal. A população de Castelo, Espírito Santo, atualmente identificada como S. hayii, por possuir poucos dados sobre sua biologia, foi incluída nas análises comparativas com S. hayii e posteriormente com S. dolloi, para verificar qual espécie pertence esta população. A população de Bananal localiza-se na Serra da Bocaina (trecho da Serra do Mar), porém, apresenta grande quantidade de espécies co-ocorrendo nesta e na Serra da Mantiqueira (veja JUARES 2011; GAREY et al., 2014). Portanto, a população de Bananal, além de ser comparada com S. hayii, também foi incluída nas análises com S. dolloi, e demais populações da Serra da Mantiqueira com a finalidade de verificar se esta população pode ser S. dolloi ou não. Foram realizadas análises de componentes principais para a criação de novas variáveis (componentes principais) e visualização da variação acústica entre as populações. Foi utilizado a opção matriz de correlação por utilizar características mensuradas em diferentes medidas e índice de Jolliffe cut-off de 0,7 (componentes principais com valor menor que 0,7 foram considerados pouco influentes no resultado encontrado). A primeira análise de componentes principais utilizou todos os parâmetros obtidos e identificou os que mais explicam a variação encontrada entre as populações. Posteriormente, foram realizadas novas análises excluindo os parâmetros pouco influentes. A taxa de repetição das notas foi excluída por ser um parâmetro dinâmico e dependente de fatores como temperatura, interação social e densidade populacional (veja KÖHLER et al., 2017). Foi utilizado a representação boxplot, dos parâmetros utilizados na análise de componentes principais, para visualização de como os parâmetros do canto se apresentam nas diferentes populações. A visualização dos gráficos de boxplot permite identificar padrões e sobreposição na amplitude das populações analisadas.Para comparar os 32 Fonte: elaborado pelo autor. parâmetros acústicos em estatística univariada, foi utilizado o teste de Kruskal-Wallis para verificar a existência de diferença nas medianas em ao menos uma das populações e, posteriormente, para comparar todas as populações, par a par, foi utilizado o teste de Dunn. Figura 1 ̶ Populações amostradas de Scinax hayii e Scinax dolloi utilizadas na análise comparativa do canto de anúncio. Siglas dos estados brasileiros (UF): São Paulo (SP), Minas Gerais (MG), Rio de Janeiro (RJ) e Espírito Santo (ES). Populações amostradas: Castelo (CAS) no Espírito Santo. Na Serra do Mar: Petrópolis (PET) localidade tipo de Scinax hayii, Bananal (BAN), São Luiz do Paraitinga (SLP), Mogi das Cruzes (MOG), e São Bernardo do Campo (SBC). Populações litorâneas: Mangaratiba (MAN), Paraty (PAR), Ubatuba (UBA), Ilhabela (ILB) e Peruíbe (PER). Na Serra da Mantiqueira: Maringá (MAR) localidade tipo de S. dolloi, Itamonte (ITA), Campos do Jordão (CAJ), Santo Antonio do Pinhal (SAP), Camanducaia (CAM) e Jundiaí (JUN). 33 7 RESULTADOS 7.1 Descrição do canto de anúncio de Scinax hayii e Scinax dolloi O canto de anúncio de Scinax hayii e Scinax dolloii consiste de uma nota formada por uma sequência de definidos pulsos. As notas comumente apresentam modulação ascendente, tendo os pulsos iniciais menor faixa de frequência. Os pulsos são separados por curtos intervalos, algumas vezes chegando a serem justapostos. A frequência dominante em algumas populações pode ser encontrada em duas faixas (não concomitantes), na maioria das vezes, é registrada na faixa mais baixa (1ª faixa) (cerca de 70% das notas). A nota é a unidade central do canto de anúncio podendo ser emitida uma única vez, ou em séries compostas por números irregulares e intervalos sem padrão definido. Os resultados das análises (valores dos parâmetros do canto) são apresentados na Tabela 1, na forma de amplitude (mínimo – máximo), média seguida de desvio padrão e coeficiente de variação (%). Espectrogramas e oscilogramas do canto de anúncio das populações de Scinax hayii e S. dolloi amostradas encontram-se na Figura 2 e Figura 3 respectivamente. 34 Tabela 1 ̶ Parâmetros espectrais e temporais do canto de anúncio de populações de Scinax hayii, Scinax dolloi. Topótipos estão destacadas. Os resultados são apresentados na forma de amplitude, média seguida de desvio padrão e coeficiente de variação (%). Faixa de frequência (FF), Frequência mínima (FMIN), Frequência máxima (FMAX), Frequência dominante (FD), duração da nota (DN), número de pulsos por nota (NP), duração dos pulsos (DP), intervalo entre pulsos (IEP), taxa de repetição das notas (TRN) e taxa de repetição dos pulsos (TRP). Localidade (n=cantos analisados) FF (Hz) FMIN (Hz) FMAX (Hz) FD (Hz) DN (ms) NP DP (ms) IEP (ms) TRN (notas/minuto) TRP (pulsos/segundo) Scinax hayii Petrópolis (n=212) 1095 – 4033 1095 – 1227 ( 1161 ± 27) 2% 3331 – 4033 (3662 ± 125) 3% 1ª 1149 – 2102 (1455 ± 219) 15% 2ª 2956 – 3235 (3124 ± 99) 3% 163 – 310 (263 ± 20) 7% 13 – 19 ( 16 ± 1) 7% 7 – 16 (13 ± 1,3) 10% 1 – 7 (3 ± 1,3) 45% 15 – 59 (23 ± 11) 49% 0,055–0,068 (0,061±0,001) 2% Scinax hayii São Luiz do Paraitinga (n=158) 1131 – 4383 876 – 1315 (1131 ± 118) 10% 2542 – 4383 (3597 ± 380) 11% 1ª 1068 – 2195 (1510 ± 247) 16% 2ª 2885 – 2981 (2933 ± 68) 2% 195 – 451 (282 ± 47) 17% 14 – 27 (18 ± 2) 11% 8 – 15 (12 ± 2) 15% 1 – 5 (3 ± 1) 37% 15 – 29 (21 ± 4) 21% 0,059 – 0,076 (0,066 ± 0,006) 10% Scinax hayii Bananal (n=40) 869 – 4491 869 – 1183 (1019 ± 83) 9% 3658 – 4491 (4033±155) 4% 1842 – 3307 (2910± 710) 23% 200 – 260 (229 ± 26) 11% 14 – 16 (15 ± 1) 9% 8 – 14 (12 ± 2) 15% 2– 6 (4 ± 1) 30% 52– 80 (65 ± 8) 13% 0,064 – 0,067 (0,065 ± 0,002) 4% 35 Tabela 1 ̶ Continuação. Scinax hayii Mogi das Cruzes (n=80) 897–4392 897–1179 (1046 ± 61) 6% 3454 – 4392 (3931 ± 213) 5% 1378 – 1550 (1400 ± 57) 4% 223 – 373 (306 ± 37) 12% 13 – 22 (18 ± 2) 12% 9 – 14 (11 ± 2) 13% 3 – 9 (5 ± 2) 32% 27 – 48 (33 ± 7) 20% 0,056 – 0,064 (0,059 ± 0,001) 2% Scinax hayii São Bernardo do Campo (n=70) 818 – 4424 818 – 1042 (969 ± 40) 4% 3309 – 4424 (4082 ± 216) 5% 1378–1550 (1427±79) 6% 196 – 311 (257±26) 10% 14–20 (17±2) 9% 7–16 (12±2) 12% 1–5 (3±1) 27% 7–24 (15±5) 33% 0,063–0,079 (0,067±0,004) 6% Scinax hayii Mangaratiba (n=70) 1097– 4895 1097–1372 (1225 ± 62) 5% 3926 – 4925 (4337 ± 219) 5% 1378–1727 (1586± 83) 5% 149 –223 (193 19) 9% 12–17 (15±2) 10% 7–14 (11±2) 14% 1–5 (3±1) 44% 15–60 (34±14) 42% 0,071–0,081 (0,077±0,002) 3% Scinax hayii Paraty (n=80) 1115 – 5301 1115 – 1506 (1337 ± 80) 6% 3968 – 5301 (4658 ± 293) 6% 1608 – 1895 (1724 ± 58) 3% 153 – 258 (201 ± 22) 11% 13 – 21 (17 ± 2) 10% 7 – 15 (10 ± 2) 16% 0 – 5 (2 ± 1) 58% 13 – 30 (20 ± 5) 26% 0,077–0,088 (0,084±0,002) 3% Scinax hayii Ubatuba (n=90) 1358 – 5786 1358 – 1665 (1576 ± 76) 5% 4427 – 5786 (4894 ± 301) 6% 1ª 1657 – 2189 (1801 ± 106) 6% 2ª 3172 – 4188 (3388 ± 228) 7% 127 – 192 (158 ± 15) 10% 12 – 17 (14 ± 1) 10% 6 – 11 (8 ± 1) 13% 1 – 4 (2 ± 1) 41% 10 –37 (22 ± 8) 37% 0,087 – 0,092 (0,090 ± 0,001) 2% Scinax hayii Ilhabela (n=128) 1142 – 5224 1142–1505 (1361± 57) 4% 4371–5524 ( 4815±195) 4% 1580–1975 (1799 ±107) 6% 144 – 217 (183 ±14) 8% 12–19 (16± 1) 8% 5–12 (8± 2) 22% 0–5 (3± 1) 49% 13–32 (19± 6) 34% 0,081–0,093 (0,087 ±0,001) 2% Scinax hayii Peruíbe (n=116) 1214 –4759 1214 – 1457 (1318 ± 63) 5% 4176 –4759 (4440 ± 146) 3% 1617 – 1832 (1714 ± 38) 2% 138 –235 ( 184± 21) 11% 12– 20 (16 ±2) 12% 6 –13 (10 ±2) 17% 0 – 5 (2 ± 1) 53% 18– 35 (27 ±7) 25% 0,081– 0,089 (0,085 ±0,001) 2% Scinax hayii Castelo (n=80) 905–4869 905 – 1221 (1052 ± 83) 8% 3372 – 4869 (3947 ± 363) 9% 1205 –1378 (1369 ± 38) 3% 196 – 331 (258 ± 35) 13% 12±1,8 (9–15) 14% 15±2 (11–18) 12% 7 ± 2 (3 – 10) 29% 20 –44 (36± 9) 25% 0,47±0,001 (0,044–0,049) 3% 36 Tabela 1 ̶ Continuação. Scinax dolloi Maringá (n=115) 836 – 5589 836 – 1188 (1014 ± 73) 7% 3785 – 5589 (4646 ± 414) 9% 1358 – 1448 (1390 ± 30) 2% 212 – 343 (277 ± 27) 9% 10 – 14 (12 ± 1) 7% 11 – 23 (18 ± 3) 17% 1 – 7 (4 ± 2) 47% 24 – 52 (39 ± 11) 29% 0.038 – 0.051 (0.044 ± 0.003) 8% Scinax dolloi Itamonte (n=103) 671 – 4601 671 –910 (789± 67) 9% 3634– 4601 (4062 ±180) 4% 1ª 1011 – 1294 (1159±68) 6% 2ª 2522 – 2741 (2605± 66) 3% 251– 420 (345± 43) 13% 10– 15 (13 ±1) 9% 13 –23 (20± 2) 12% 2 –9 (5 ±2) 36% 33– 40 (37± 3) 8% 0,035 –0,041 (0,038 ±0,001) 5% Scinax dolloi Campos do Jordão (n=170) 701 – 4252 701 – 1139 (998 ± 108) 11% 3024 – 4252 (3427 ± 266) 8% 1ª 979 – 2542 (1433 ± 418) 29% 2ª 2518 – 3082 (2853 ± 146) 5% 211 – 447 (299 ± 49) 16% 11 – 21 (15 ± 2) 13% 8 – 23 (15 ± 3) 18% 1 – 10 (4 ± 1) 39% 35 – 70 (50 ± 10) 21% 0,040 – 0,071 (0,52 ± 0,004) 9% Scinax dolloi Santo Antônio do Pinhal (n=62) 659 – 3991 659 – 1110 (892 ± 135) 15% 3024 – 3991 (3428 ± 256) 8% 1ª 1237 – 1895 (1639 ± 318) 19% 2ª 2240 – 3044 (2524 ± 276) 10% 199 – 403 (277 ±46) 17% 12 – 21 (16 ± 2) 12% 7 – 14 (12 ± 1) 12% 3 – 10 (5 ± 1) 26% 36 – 72 (53 ± 11) 21% 0,052 – 0,061 (0,057 ± 0,003) 6% Scinax dolloi Camanducaia (n=40) 760 – 3970 760 – 991 (872 ± 68) 8% 3022 – 3970 (3580 ± 269) 8% 2584 – 2930 (2831 ± 125) 4% 200 – 390 (303 ± 59) 20% 11 – 18 (14 ± 2) 15% 9 – 19 (14 ± 2) 16% 2 –13 (6 ± 3) 48% 30 – 48 (38 ± 6) 15% 0,041 – 0,055 (0,047 ± 0,004) 9% Scinax dolloi Jundiaí (n=72) 600 – 4966 600 – 1202 (887 ± 118) 13% 3842 – 4966 (4327 ± 249) 6% 1313 – 3750 (2591 ± 920) 36% 154 – 403 (248 ± 54) 22% 12 – 22 (16 ± 2) 15% 8 – 15 (12 ± 2) 15% 2 – 8 (5 ±2) 29% 18 – 39 (28 ± 7) 26% 0,055 – 0,079 (0,067 ± 0,006) 10% Fonte: Elaborado pelo autor. 37 Figura 2 ̶ Oscilograma (acima) e espectrograma (abaixo) do canto de anúncio de diferentes populações de Scinax hayii. Tempartura do ar no momento da gravação: Petrópolis (RJ) 17ºC, Bananal (SP) 17ºC, São Luiz do Paraitinga (SP) 18ºC, Mangaratiba (RJ) 22ºC, Paraty (RJ) 23ºC, Ubatuba (SP) 28ºC, Mogi dasCruzes (SP) 17ºC, São Bernarndo do Campo (SP) 17ºC, Ilhabela (SP) 21ºC, Peruíbe (SP) 21ºC, Castelo (ES) 19ºC. Fonte: Elaborado pelo autor. 38 Figura 3 ̶ Oscilograma (acima) e espectrograma (abaixo) do canto de anúncio de Scinax dolloi registrado em diferentes localidades. Temperatura do ar: Maringá (RJ) ̶ localidade tipo ̶ 17ºC; Itamonte (MG) 12ºC; Campos do Jordão (SP) 17ºC; Santo Antônio do Pinhal (SP) 16ºC; Camanducaia (MG) 17ºC; Jundiaí (SP) 17ºC. Fonte: Elaborado pelo autor. 39 7.1.1 Comparações bioacústicas em populações de Scinax hayii Foi realizada uma análise de componentes principais (ACP) utilizando frequência dominante, duração da nota, número de pulsos por nota e taxa de repetição dos pulsos para comparar as populações. Os parâmetros frequência mínima, frequência máxima, duração dos pulsos e intervalo entre pulsos foram excluídos desta análise pois apresentaram índice de Jolliffe cut-off menor que 0,7. Os dois principais componentes somados explicam 80,4% da variação entre as populações. O componente principal 1(eixo x) representa 52,9% da variação encontrada, e o componente principal 2 (eixo y) foi responsável por 27,5% (Figura 4). No componente principal 1 a frequência dominante é o principal parâmetro acústico responsável pela variação encontrada entre as populações (correlation= 0,9989), seguida da duração da nota (- 0,3681), taxa de repetição dos pulsos de pulsos (0,3298) e o número de pulsos (-0,1185). Valores de importância “loadings” dos parâmetros utilizados e sua importância em cada componente principal da análise encontram-se na Tabela 2. O uso do boxplot (Figura 5) como estatística descritiva para os parâmetros utilizados na análise de componentes principais permitiu visualizar como a amplitude de valores de cada parâmetro estão apresentados nas diferentes populações, revelando um gradiente entre as populações da Serra do Mar e a planície litorânea. As populações da porção norte da Serra do Mar (Petrópolis e São Luiz do Paraitinga) apresentam maior duração da nota, menor frequência dominante, e menor taxa de repetição dos pulsos em relação as populações localizadas ao sul da Serra do Mar e também em comparação com as populações registradas na planície litorânea (do sul do Rio de Janeiro ao Sul do estado de São Paulo) (Figura 5). 40 As populações de Castelo, Espírito Santo e Bananal, São Paulo apesentaram maior divergência acústica entre as populações de Scinax hayii amostradas, evidenciados principalmente na frequência dominante e taxa de repetição dos pulsos (Figura 5A e D). Figura 4 ̶ Análise de componentes principais utilizando os parâmetros bioacústicos frequência dominante, duração da nota, número de pulsos e taxa de repetição dos pulsos em onze populações de Scinax hayii. O componente principal 1 (eixo x) é responsável por 52,9% e o componente 2 (eixo y) 27,5% da variação entre as populações. Fonte: Elaborado pelo autor. Figura 5. Boxplot dos parâmetros acústicos (A) duração da nota (ms), (B) frequência dominante (Hz), (C) número de pulsos por nota e (D) taxa de repetição dos pulsos (pulsos por segundo) em populações de Scinax hayii. Box representam 1º e 3º quartis, linha central 41 representa a mediana; linhas verticais representam valores de amplitude (mínimos e máximos) amostrados. Populações litorâneas estão destacadas com asterisco (*). Fonte: Elaborado pelo autor. 42 Tabela 2 ̶ Matriz de importância dos parâmetros bioacústicos utilizados na análise de componentes principais de populações de Scinax hayii. Componente principal (PC). Parâmetros PC1 PC2 PC3 PC4 Frequência dominante 0,9989 -0,005541 1,79E-06 1,53E-12 Duração da nota -0,3681 -0,9298 0,00078 1,65E-08 Pulsos por nota -0,1185 -0,4881 -0,8647 -5,68E-06 Taxa de repetição dos pulsos 0,3298 0,7241 -0,5747 0,1915 O teste de Kruskal-Wallis realizado para comparar os parâmetros nas diferentes populações revela que em todos os parâmetros analisados ao menos uma das populações possui diferença significativa em suas medianas (Frequência dominante H=57,35 e p= 0,000; duração da nota H=55,13 e p=0,000; número de pulsos H=48,28 e p= 0,000; taxa de repetição dos pulsos H=63,54 e p=0,000). O teste de Dun comparando a populações par a par mostra que as populações da Serra do Mar diferem significativamente em quase todas as populações da planície litorânea na frequência dominante, duração da nota e taxa de repetição dos pulsos. Valores do teste de Dunn aplicados para comparar as populações são apresentados na Tabela 3 A ̶ D. 43 Tabela 3 ̶ Valores do teste de Dunn utilizado para comparações par a par entre as populações de Scinax hayii. Em A comparações entre frequência dominante, B duração da nota, C número de pulsos e D taxa de repetição dos pulsos. Valores de p significativo (<0,05) são destacados em cinza. A Petrópolis S. L. do Paraitinga Mogi das Cruzes S. B. do Campo Mangaratiba Paraty Ubatuba Ilhabela Peruíbe Castelo Bananal Petrópolis S. L. do Paraitinga 0,5425 Mogi das Cruzes 0,5318 0,9795 S. B. do Campo 0,3495 0,6036 0,6211 Mangaratiba 0,06556 0,05454 0,05774 0,1742 Paraty 0,01327 0,003149 0,003421 0,01962 0,3522 Ubatuba 2,19E-03 0,000136 0,000151 0,001418 0,06691 0,336 Ilhabela 0,003028 0,000657 0,00071 0,003734 0,08167 0,3193 0,8583 Peruíbe 0,01304 0,005122 0,005491 0,02342 0,3048 0,8341 0,518 0,4647 Castelo 0,8296 0,5335 0,5168 0,2624 0,0116 0,00035 1,00E-05 9,03E-05 0,000822 Bananal 0,000765 7,10E-05 7,75E-05 0,000555 0,02178 0,1183 0,4644 0,624 0,2121 7,42E-06 B Petrópolis S. L. do Paraitinga Mogi das Cruzes S. B. do Campo Mangaratiba Paraty Ubatuba Ilhabela Peruíbe Castelo Bananal Petrópolis S. L. do Paraitinga 0,554 Mogi das Cruzes 0,743 0,146 S. B. do Campo 0,6234 0,8862 0,2071 Mangaratiba 0,03384 0,01715 0,000152 0,01443 Paraty 0,05298 0,03367 0,000346 0,02816 0,7402 Ubatuba 0,001161 3,65E-05 3,15E-08 3,54E-05 0,09112 0,03785 Ilhabela 0,01418 0,006838 9,95E-05 0,00577 0,5001 0,3319 0,4434 Peruíbe 0,01932 0,008988 0,000101 0,007585 0,6623 0,4535 0,2689 0,8035 Castelo 0,5757 0,9597 0,1605 0,9249 0,015 0,02966 2,95E-05 0,006034 0,007887 Bananal 0,3 0,4827 0,05888 0,4214 0,1997 0,3019 0,006467 0,08285 0,1142 0,4573 44 Tabela 3 ̶ continuação. C Petrópolis S. L. do Paraitinga Mogi das Cruzes S. B. do Campo Mangaratiba Paraty Ubatuba Ilhabela Peruíbe Castelo Bananal Petrópolis S. L. do Paraitinga 0,3155 Mogi das Cruzes 0,139 0,4518 S. B. do Campo 0,327 0,9882 0,4582 Mangaratiba 0,4585 0,007325 0,000653 0,009818 Paraty 0,4741 0,6489 0,2272 0,6708 0,02497 Ubatuba 0,2745 0,001254 7,71E-05 0,001875 0,598 0,00533 Ilhabela 0,8323 0,1106 0,02713 0,122 0,512 0,2211 0,269 Peruíbe 0,9398 0,1329 0,03056 0,147 0,3644 0,2698 0,165 0,8579 Castelo 0,07067 8,79E-06 2,02E-07 1,87E-05 0,1068 6,61E-05 0,2855 0,04194 0,01659 Bananal 0,5445 0,03133 0,005654 0,03652 0,9116 0,07489 0,5751 0,6292 0,4914 0,1398 D Petrópolis S. L. do Paraitinga Mogi das Cruzes S. B. do Campo Mangaratiba Paraty Ubatuba Ilhabela Peruíbe Castelo Bananal Petrópolis S. L. do Paraitinga 0,3967 Mogi das Cruzes 0,9236 0,1357 S. B. do Campo 0,3676 0,9194 0,123 Mangaratiba 0,1128 0,2452 0,00923 0,3043 Paraty 0,02516 0,02781 0,000223 0,04296 0,3355 Ubatuba 0,001662 0,000348 5,21E-07 0,000764 0,01937 0,1466 Ilhabela 0,01477 0,01859 0,000355 0,02669 0,1803 0,5772 0,513 Peruíbe 0,01668 0,01941 0,000266 0,02879 0,2118 0,6832 0,3757 0,8712 Castelo 0,5018 0,0163 0,3627 0,01544 0,000496 4,18E-06 3,68E-09 1,60E-05 8,82E-06 Bananal 0,5019 0,8851 0,283 0,8222 0,271 0,05229 0,001969 0,0305 0,03414 0,06924 Fonte: Elaborado pelo autor. 45 7.1.2 Comparações bioacústicas em populações de Scinax dolloi na Serra da Mantiqueira Os parâmetros utilizados para a realização da análise de componentes principais foram: frequência dominante (FD), duração da nota (DN), número de pulsos (NP) e taxa de repetição dos pulsos (PR). A frequência mínima e frequência máxima, apesar de algumas vezes representarem caracteres estáticos (veja Tabela 1), foram excluídas das análises devido pouca influência nas comparações (valor abaixo de 0,7 no índice Jolliffe cut-off). O componente principal 1 (eixo x) representa 99,5% da variação encontrada entre as populações de Scinax dolloi amostradas na Serra da Mantiqueira, S. hayii Bananal (Serra da Bocaina) e S. hayii Castelo (Espírito Santo) (Figura 6). Sendo o parâmetro frequência dominante o mais influente (correlation = 0,9999). O componente principal 2 (eixo y) é responsável por 0,48% da variação sendo a duração da nota o parâmetro com maior influência para esse componente (correlation = 0,975). Valores de importância dos parâmetros acústicos em cada componente principal são amostrados na Tabela 4. O uso do boxplot revela forte sobreposição entre as populações estudadas na Serra da Mantiqueira em relação a duração da nota. Analisando a frequência dominante, nota-se a formação de dois grupos com valores aproximados: um incluindo os topotipos (Maringá), e exemplares de Itamonte, Castelo, Campos do Jordão e Santo Antônio do Pinhal; outro incluindo populações de Jundiaí e Camanducaia, juntamente com Bananal (este localizado na Serra da Bocaina) (Figura 7A). A população de Jundiaí e Bananal apresentaram valores próximos nos parâmetros do canto de anúncio analisados. Além disso, em relação a populações distribuídas de norte a sul, as populações mais próximas apresentam maior semelhança nos parâmetros do canto, Maringá (localidade tipo) juntamente com Castelo, na região norte, e Jundiaí na porção sul, constituindo-se pontos opostos de uma clina com parâmetros bioacústicos divergentes (Figura 6 e Figura 7). A 46 população de Bananal, localizada na Serra da Bocaina apresentou sobreposição nos parâmetros do canto em relação aos valores amostrados para as populações da Serra da Mantiqueira. Figura 6 ̶ Análise de componentes principais em populações de Scinax dolloi (Maringá, Itatiaia, RJ localidade tipo; Itamonte e Camanducaia no estado de Minas Gerais; Campos do Jordão, Santo Antônio do Pinhal, Jundiaí e Bananal no estado de São Paulo; Castelo, Espírito Santo) utilizando os parâmetros bioacústicos frequência dominante, duração da nota, número de pulsos e taxa de repetição. O componente principal 1 representado no eixo x é responsável por 99,5% da variação encontrada, já o componente 2 (eixo y) representa 0,48% da variação encontrada. Fonte: Elaborado pelo autor. Figura 7 ̶ Boxplot dos parâmetros acústicos (A) frequência dominante (Hz= Hertz), (B) duração da nota (ms= milissegundos), (C) número de pulsos por nota e (D) taxa de repetição dos pulsos (pulsos/segundo) em populações de Scinax dolloi e Scinax hayii de Bananal (SP) e 47 Castelo (ES). Box representam 1º e 3º quartis, linha central representa a mediana; linhas horizontais representam valores de amplitude amostrados (mínimos e máximos). Fonte: Elaborado pelo autor. 48 Tabela 4 ̶ Matriz de importância dos parâmetros acústicos utilizados na análise de componentes principais em populações de Scinax dolloi, e S. hayii de Bananal (SP) e Castelo (ES). Componente principal (PC). PC1 PC2 PC3 PC4 Frequência dominante 0.9999 0.0010913 -3,82E-03 -4,43E-08 duração da nota -0.2195 0.97561 -0.00069139 7,70E-06 pulsos por nota 0.42376 0.47941 0.7685 -3,45E-02 taxa de repetição dos pulsos 0.60508 -0.51841 0.56162 0.22296 Fonte: Elaborado pelo autor. O teste de Kruskall-Wallis realizado mostra que há diferença significativa nos parâmetros acústicos comparados em pelo menos uma das populações estudadas (Frequência dominante H= 19,73 e p= 0,006; duração da nota H= 17,46 e p=0,01463; pulsos por nota H= 26,54 e p=0,0003; taxa de repetição dos pulsos H=36,03 e p= 7,15E-03). O teste de Dunn para a frequência dominante revela diferença significativa entre as populações de Maringá, Itamonte, Castelo e Santo Antônio do Pinhal para as populações de Camanducaia, Jundiaí, Bananal. Os cantos amostrados para Santo Antônio do Pinhal diferem significativamente dos topotipos de S. dolloi (Maringá e Itamonte) no número de pulsos por nota e na taxa de repetição dos pulsos (Veja tabela 5C e D). A população de Campos do Jordão apresentou diferença significativa em relação a população de Maringá no número de pulsos por nota, e em relação a taxa de repetição dos pulsos amostrados para a população de Itamonte (Veja Tabela 5C e D). A população de Bananal (localizada na Serra da Bocaina) possui maior semelhança com a população de Jundiaí não apresentando diferença significativa em nenhum dos parâmetros acústicos comparados. A população de Castelo, ES, não apresenta diferenças significativas com S. dolloi de Maringá em nenhum dos parâmetros acústicos analisados. Valores do teste de Dunn para comparações pareadas entre as populações amostradas são apresentados na Tabela 5. 49 Tabela 5 ̶ Valores do teste de Dunn utilizado para comparações par a par entre as populações de Scinax dolloi. Em A comparações entre frequência dominante, B duração da nota, C número de pulsos e D taxa de repetição dos pulsos. Valores de p significativo (<0,05) são destacados em cinza. A Maringá C._do_Jordão Itamonte S._A._Pinhal Camanducaia Jundiaí Bananal Castelo Maringá C._do_Jordão 0.5208 Itamonte 0.2508 0.0792 S._A._Pinhal 0.987 0.5086 0.2564 Camanducaia 0.03947 0.08145 0.004918 0.03804 Jundiaí 0.0448 0.09487 0.005041 0.04292 0.6947 Bananal 0.04787 0.09869 0.006055 0.04619 0.9398 0.7601 Castelo 0.8166 0.298 0.2896 0.8309 0.01278 0.009615 0.01637 B Maringá C. do Jordão Itamonte S. A. Pinhal Camanducaia Jundiaí Bananal Castelo Maringá C. do Jordão 0.5864 Itamonte 0.1781 0.2977 S. A. Pinhal 0.7062 0.3274 0.09429 Camanducaia 0.7432 0.8948 0.3173 0.4946 Jundiaí 0.1638 0.02387 0.00914 0.3245 0.09864 Bananal 0.05126 0.006647 0.002702 0.111 0.03077 0.4322 Castelo 0.189 0.02732 0.0105 0.3706 0.1137 0.8977 0.3615 50 Tabela 5 ̶ continuação. C Maringá C. do Jordão Itamonte S. A. Pinhal Camanducaia Jundiaí Bananal Castelo Maringá C. do Jordão 0.001597 Itamonte 0.5031 0.05963 S. A. Pinhal 0.00245 0.7326 0.0507 Camanducaia 0.08991 0.3176 0.3957 0.2459 Jundiaí 0.0003725 0.4713 0.02082 0.7744 0.1311 Bananal 0.02335 0.7255 0.1765 0.5562 0.5875 0.3693 Castelo 0.6271 0.002206 0.7541 0.004039 0.1599 0.0004806 0.04216 D Maringá C. do Jordão Itamonte S. A. Pinhal Camanducaia Jundiaí Bananal Castelo Maringá C. do Jordão 0.07932 Itamonte 0.4262 0.01914 S. A. Pinhal 0.01023 0.2261 0.002531 Camanducaia 0.5267 0.3646 0.1879 0.07377 Jundiaí 7,77E-02 0.006052 2,73E-02 0.2389 0.002578 Bananal 0.0007965 0.02936 0.00021 0.3509 0.009842 0.9189 Castelo 0.3724 0.34 0.1075 0.05035 0.8911 0.0004863 0.004458 Fonte: Elaborado pelo autor. 51 8 DISCUSSÃO Wright (1943) propôs um modelo de isolamento por distância, em que o aumento da distância entre as populações resulta em maior variação interpopulacional genética e fenotípica. Variações populacionais podem resultar de processos estocásticos que afetam a imigração e o fluxo gênico entre as populações (HUTCHINSON e TEMPLETON, 1999). Contudo, eventos históricos podem gerar barreiras geográficas, tal como montanhas e rios, levando ao isolamento de populações, fenômeno conhecido como “vicariant splitting” (GASCON, 1996; TODA et al., 1998). Nossos resultados revelam que existe variação latitudinal no canto de anúncio, entretanto a maior variação é altitudianal, onde populações do litoral apresentam canto diferente em relação aos amostrados para a Serra do Mar. Populações de Scinax hayii da Serra do Mar e planície apresentam um sistema gradual em que a frequência dominante e taxa de repetição dos pulsos aumentam seus valores com o aumento da latitude. A duração da nota apresenta situação contraria diminuindo seus valores de acordo com a mudança geográfica. As diferenças no canto de anúncio das populações do litoral em relação a Serra do Mar podem ser reflexo da adaptação ao ambiente, temperatura, que é maior em baixas altitudes e também ao tamanho corporal como ocorre em outras espécies (DUELLMAN e TRUEB, 1986; WELLS, 2007). Apesar da divergência no canto de anúncio, a geografia parece favorecer o fluxo gênico entre algumas das populações de serra e baixada. O litoral sul do Rio de Janeiro é a região onde a Serra do Mar mais se aproxima do oceano, e isso é mostrado na população de Mangaratiba que dentre as espécies analisadas do litoral é a que conserva mais semelhanças com as populações da Serra do Mar, não possuindo diferença significativa na frequência dominante em comparação com as populações de serra. As populações no litoral de São Paulo apresentam valores mais extremos diferindo das populações localizadas nas altitudes da serra. 52 Em comparação com topótipos de Scinax dolloi, a população de S. hayii, de Castelo, não apresentou diferenças significativas em nenhum dos parâmetros do canto comparados. Em comparação com espécimes de Itamonte, MG, os cantos de Castelo diferem significativamente apenas na duração da nota. A população de Castelo apresenta semelhança nos parâmetros frequência dominante e duração da nota com as populações da Serra do Mar de S. hayii. Contudo, há diferenças significativas no número de pulsos e na taxa de repetição dos pulsos que difere a população de Castelo de praticamente todas as populações de S. hayii amostradas (Veja tabela 3C e D). Faria et al. (2013) relata que o número de pulsos foi o principal parâmetro responsável pela variação encontrada para diferentes populações de Scinax squalirostris. O número de pulsos e taxa de repetição dos pulsos diferem a população de Castelo das populações da Serra do Mar e, em comparação com as populações do litoral, difere quanto a frequência dominante e duração da nota. Assim consideramos que a população de Castelo possa ser considerada uma unidade acústica distinta de Scinax hayii, mas semelhante a Scinax dolloi. Populações de S. dolloi também apresentam padrão de variação gradual nos caracteres acústicos. Populações consideradas como topotipos (Maringá e Itamonte, Brejo da Lapa, ambas na região de Itatiaia) apresentam vocalização semelhante, assim como a população de Castelo. As populações em direção sul apresentam variação graudal, com a população de Campos do Jordão apresentando valores mais próximos aos topótipos e Jundiaí com valores mais distintos. O padrão de clina também foi verificado por Hasegawa et al. (1999) para Glandirana rugosa (Temminck e Schlegel, 1838). Os autores verificaram que populações do norte do Japão apresentavam cantos de anúncio com menor duração e menor número de pulsos, sendo que estes parâmetros elevavam seus valores gradualmente nas populações amostradas ao sul. Os parâmetros taxa de repetição dos pulsos e frequência dominante não apresentaram variação significativa ao longo da distribuição para esta espécie. Assim Hasegawa et al. (1999) assumiram que parâmetros com grande variação refletem a consequência da distância entre as 53 populações, e também adaptação a fatores ambientais não identificados. A frequência dominante foi o parâmetro menos variável sendo uma característica convservada entre todas populações. Nossos resultados para S. dolloi mostram que a duração da nota é o parâmetro que se encontra mais conservado entre as populações da Mantiqueira. Para as populações de Scinax hayii todos os parâmetros analisados têm mostrado diferenças significativas entre várias das populações amostradas. Embora alguns parâmetros ainda não tenham diferenças significativas, os caracteres acústicos revelam que existe variação em todos parâmetros entre as populações. Diferenças significativas na frequência dominante, duração da nota e taxa de repetição dos pulsos sugerem a diferenciação entre populações da Serra do Mar com a planície litorânea. A ocorrência de espécies consideradas típicas da Serra da Mantiqueira na Serra da Bocaina parece ser comum. Mesmo que divididas geograficamente, algumas espécies com ocorrência na Serra da Mantiqueira têm sido registradas na Serra da Bocaina (veja JUARES, 2011 e GAREY et al., 2014). A população de Bananal quando comparada com as populações de S. hayii da Serra do Mar apresentou semelhança na duração da nota e taxa de repetição dos pulsos, porém diferiu significativamente na frequência dominante e número de pulso por nota (veja Tabela 3). Em comparação com populações da Serra da Mantiqueira, os parâmetros analisados não apresentaram nenhuma diferença significativa em relação a população de S. dolloi de Jundiaí. Portanto, a população de Bananal com base em análises bioacústicas pode ser tratar de uma população de Scinax dolloi ocorrendo fora dos domínios da Serra da Mantiqueira. Análises moleculares e morfológicas poderiam ajudar a elucidar essa problemática analisando se o padrão encontrado no canto se repete para o DNA. Mudanças nos parâmetros ao longo da distribuição geográfica refletem adaptações ao ambiente, pressões seletivas locais e seleção sexual (MÁRQUEZ e BOSCH, 1997; GERHARDT, 2013; WILKINS et al., 2013). Essas mudanças são comuns, entretanto é preciso 54 testar receptores para avaliar se as variações são ainda reconhecíveis para a espécie, ou causou um deslocamento que afeta o reconhecimento específico (GERHARDT 2013). Gerhardt (1991) propõe que caracteres que são estereotipados e sofrem pouca variação (entre machos ou entre estações reprodutivas) são chamados de estáticos, e promovem o reconhecimento específico, ao passo que caracteres que sofrem grande variação em séries de cantos, entre machos ou estações são chamados de dinâmicos e promovem a atratividade afetando o sucesso reprodutivo de machos. O dinamismo dos caracteres pode ser testado em indivíduos ao longo do tempo (mesmo indivíduo em dias diferentes), entre indivíduos e também entre populações. Neste estudo o coeficiente de variação intra-populacional mostrou que alguns caracteres podem apresentar padrão dinâmico em algumas populações e estático em outras como a duração do canto, o número de pulsos e a frequência dominante. Entretanto, eles se mostraram bons caracteres para a comparação entre populações. Apesar de se mostrarem variáveis entre indivíduos da mesma população (coeficiente de variação >10%) possuem valores estatisticamente diferentes entre populações. A taxa de repetição dos pulsos é o parâmetro que apresenta coeficiente de variação estático em todas as populações analisadas. Para a comparação entre populações de Scinax hayii e também de Scinax dolloi é um parâmetro essencial. Este apresenta características conservadas entre os indivíduos da mesma população (baixo coeficiente de variação intra-populacional), e pela sua divergência, explica a variação encontrada entre as populações. Partindo do princípio proposto por Popov e Shuvalov (1977) e Gehardt (1991) sobre a dinâmica de caracteres, a taxa de repetição de pulsos é um dos principais parâmetros que promove o reconhecimento específico para Scinax hayii e Scinax dolloi. Portanto, a utilização desse parâmetro para 55 comparação com outras espécies filogeneticamente próximas a S. hayii e S. dolloi, pode ajudar a elucidar questões de ordem taxonômica (KHÖLER et al., 2017). A frequência dominante em populações de Scinax hayii e S. dolloi pode ser encontrada em duas regiões da nota não concomitantemente (veja MAGRINI et al., 2011; SANTOS e MARTINS 2017). Até o presente momento não ficou claro o motivo de um mesmo indivíduo colocar a maior energia do canto em diferentes regiões da nota. Uma hipótese é que essa estratégia poderia ser resposta de interação entre indivíduos e densidade populacional (WELLS, 2007). Contudo, esta foi refutada devido ao padrão de duas faixas ocorrer em alta e baixa densidade. Nas gravações de campo efetuadas em Petrópolis, apenas dois indivíduos interagindo, emitiram cantos com a frequência dominante ocorrendo na maioria das vezes na primeira faixa, e outras vezes, na segunda faixa. Em outras gravações onde indivíduos estavam em coros com maior densidade (como as realizadas em Mogi das Cruzes, São Bernardo e Paraty), a frequência dominante foi registrada em apenas uma região (1ª faixa). Uma segunda hipótese é que os machos das espécies de Scinax, registrados neste estudo, alternam a região onde colocam a maior energia do canto como uma forma de aumentar a atratividade do seu canto para fêmeas. Nossos resultados de coeficiente de variação, indicam a frequência dominante como um parâmetro dinâmico que reflete a qualidade dos machos, bem como seu tamanho, e sofre seleção de fêmeas que procuram cantos atrativos selecionando valores extremos em comparação à média populacional (GERHARDT, 1991; MÁRQUEZ e BOSCH, 1997; GERHARDT, 2013). Seria conveniente para machos alterarem sua frequência dominante em resposta às fêmeas aumentado sua atratividade. Todavia todas essas afirmações ainda têm viés especulativo e outros testes (como os de playback) são necessários para entender a função dos parâmetros acústicos na comunicação intraespecífica e interespecífica. Análises bioacústicas realizadas em diferentes populações de S. hayii e S. dolloi revelam que o canto é um fenótipo variável, que sofre modificações ao longo da distribuição geográfica 56 da espécie. Populações mais próximas geralmente apresentam características semelhantes, ao passo que populações mais distantes sofrem efeito de isolamento por distância, além de provavelmente sofrerem adaptações ao meio abiótico e seleção sexual intra e interespecífica, causando deslocamento de alguns parâmetros do canto (como ocorre nas populações da planície litorânea). Os caracteres utilizados para a comparação das populações de S. hayii e S. dolloi são importantes para entender um pouco mais da história evolutiva dessas espécies bem como serem utilizados para identificação e diferenciação de táxons. As populações de S. hayii e S. dolloi necessitam de uma análise integrativa utilizando mais caracteres para avaliar se a variação acústica encontrada é refletida da mesma forma em outros caracteres como a morfologia e o DNA, representando unidades taxonômicas distintas. 57 REFERÊNCIAS BLAIR, W. F. Mating Call in the Speciation of Anuran Amphibians. 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