Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA NECROSE ASSÉPTICA DA CABEÇA DO FÊMUR. PEDRO LUIS TREVIZAN JUSTOLIN Botucatu 2009 Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. PEDRO LUIS TREVIZAN JUSTOLIN NECROSE ASSÉPTICA DA CABEÇA DO FÊMUR Trabalho de Conclusão de Curso em Medicina Veterinária Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia Universidade “Júlio de Mesquita Filho” Campus de Botucatu, SP. Área de Cirurgia de Pequenos Animais Preceptor: Profa. Dra. Sheila Canevese Rahal Botucatu 2009 Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. Agradeço aos meus pais e a minha irmã, que sempre apoiaram minhas decisões e escolha profissional, além de terem preenchido minha vida com momentos repletos de alegria e companheirismo. Agradeço especialmente à Profa. Dra. Sheila Canevese Rahal, por orientar os meus estágios e este trabalho; aos professores da FMVZ (UNESP-Botucatu), por me encorajarem e me inspirarem nesta área; e aos meus colegas de turma, por estarem comigo realizando este sonho de se formar em Medicina Veterinária. Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. RESUMO A doença de Legg-Calvé-Perthes é uma necrose asséptica não inflamatória da cabeça do fêmur, que ocorre em animais e seres humanos jovens, antes do fechamento fisário da cabeça do fêmur. Tanto na Medicina Humana quanto na Medicina Veterinária não se sabe ao certo a causa da doença. Vários fatores foram apresentados na literatura como prováveis responsáveis dessa afecção, tais como: anormalidades de coagulação, alteração do fluxo sangüíneo arterial, obstrução da drenagem venosa da epífise e colo femoral, trauma, desenvolvimento, hiper-atividade da criança, influências genéticas e fatores nutricionais. Na anamnese os cães apresentam, claudicação com sustentação de peso que piora em 6 a 8 semanas. Alguns clientes relatam o início agudo da claudicação. Outros sinais clínicos podem incluir irritabilidade, diminuição do apetite e mastigação da pele sobre o quadril afetado. No exame físico a manipulação da articulação coxofemoral desencadeia dor. Limitação da amplitude de movimentos, atrofia muscular e crepitação podem estar presentes na doença avançada. Em humanos os sinais clínicos são semelhantes, porém como a evolução é mais lenta o diagnóstico pode ser feito mais precocemente. Na medicina veterinária o diagnostico é realizado basicamente pela anamnese, sinais clínicos, exames físicos, e complementares (radiografia). Os diagnósticos diferenciais compreendem: trauma fiseal e luxação de patela medial. Na medicina humana os casos também são diagnosticados com sucesso; entretanto, existem exames complementares que na Medicina Veterinária são menos acessíveis: a ressonância nuclear magnética, que demonstra com clareza a necrose antes da radiografia; e a cintilografia, considerado o principal meio para diagnóstico precoce. O tratamento atual da necrose asséptica da cabeça do fêmur nos animais é cirúrgico, no pré-operatório a atividade é limitada até a realização da cirurgia. A excisão da cabeça e colo femoral é considerada o tratamento de escolha em cães, induzindo a uma pseudoartrose funcional. Já em humanos, existem outros tipos de tratamento, tanto conservador como cirúrgico. O prognóstico para o uso normal do membro é de bom a excelente, após excisão da cabeça e colo femorais em função do pequeno tamanho dos cães afetados. Palavras chaves: Legg-Perthes, necrose, cães, fêmur. Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. ABSTRACT Legg-Calvé-Perthes disease is a non-inflammatory aseptic necrosis of the head of the femur that is found in both young animals and humans before the gap in the femur head closes. In the fields of both human and veterinary medicine the cause of this condition is not known for certain. Various factors have been put forward in the literature as being responsible for the incidence of this condition such as: abnormalities in coagulation, changes in blood flow in the arteries, a septic obstruction in the draining of the epiphysis or the upper parts of the femur, trauma, growth cycle, hyperactivity in a child, genetic influences and dietary factors. Case histories in dogs show that the first stages of the condition progress slowly but that limping or putting weight on the limb worsens at 6 to 8 weeks. Some owners talk about a sharp onset in clinical lameness. Other clinical symptoms may include irritability, loss of appetite and knawing at the hair surrounding the affected hip. In the course of physical examination manipulating the hip joint will cause pain to the animal. The advanced stages of the disease may result in restricted amplitude of movement, muscular atrophy and fracturing. In humans the clinical signs are similar, although progression of the disease is slower so that it can be diagnosed at an earlier stage. In veterinary medicine the diagnosis is, in the main, based on case history, clinical symptoms, physical examination and certain related procedures such as radiography. The various diagnoses include physical trauma and dislocation of the medial patella. In human medicine many people have been correctly diagnosed. Whatsmore, there is a range of related procedures that are virtually not available to veterinary medicine such as magnetic nuclear resonance, that show up necroses with great clarity before radiography and cintilography do, and is considered the primary means of early diagnosis. Currently, the standard treatment for aseptic necrosis of the femur head in animals is surgery and between the pre-operative period and surgery activity is restricted. Excising the head and upper part of the femur is deemed to be the treatment of choice in dogs, so as to create a functioning pseudoarthrosis. In the case of human patients, there are alternative treatments both non-invasive and surgical. The prognosis for normal use of the limb is good to excellent following excision of the femur head and the upper parts of the femur given the small size of the dogs affected. Key Words : Legg-Perthes, necrosis, dogs, femur Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO..........................................................................................8 2 OBJETIVOS...............................................................................................8 3 REVISÃO DA LITERATURA...................................................................9 3.1 Causas e fatores de risco..........................................................................9 3.2 Fisiopatologia...........................................................................................9 3.3 Predisposição..........................................................................................10 3.4 Sinais clínicos.........................................................................................11 3.5 Diagnóstico............................................................................................11 3.6 Tratamento.............................................................................................13 3.7 Pós-operatório........................................................................................17 3.8 Prognóstico.............................................................................................17 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................17 5 REFERÊNCIAS...........................................................................................18 Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. LISTA DE FIGURAS: Figura 1- A cabeça do fêmur do cão contém duas grandes áreas de radioluscência com esclerose circundante (setas). Existe achatamento do peso de suporte de superfície da cabeça femoral, e os espaços estão ampliados. Presença de formação de osteófitos no colo do fêmur...............................................................................12 Figura 2- Aparelho gessado do tipo broomstick. A abdução e a rotação interna são recuperadas por meio da regulagem do comprimento da haste e pelo aumento gradativo da rotação interna do membro inferior...................................................15 Figura 3- A: radiografia de menino de seis anos de idade com doença de Legg- Calvé-Perthes, subluxado no quadril direito. B: Osteotomia varizante e de rotação do fêmur.................................................................................................................16 Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. 1. INTRODUÇÃO A doença de Legg-Calvé-Perthes é uma necrose asséptica não inflamatória da cabeça do fêmur, que ocorre em pacientes jovens, antes do fechamento fisário da cabeça do fêmur. De modo seqüencial observa-se necrose, reabsorção óssea, deposição de osso novo e finalmente remodelação até a maturidade. Os estágios de reabsorção e deposição ocorrem simultaneamente, alterando a resistência mecânica do núcleo epifisiário, tornando-o suscetível a deformidades. (SONI et al., 2004). A necrose asséptica da cabeça do fêmur mantém-se como um dos assuntos mais controvertidos na Ortopedia. A dificuldade em obter um consenso quanto ao tratamento reside na multiplicidade de formas como a doença se apresenta, desde extremamente benignas a outras que resultam em deformidades importantes do quadril. Tanto na Medicina Humana quanto na Medicina Veterinária não se sabe ao certo a causa da doença (GAMBARDELLA, 1993). Reconhecer precocemente as diversas formas de apresentação, determinando seu prognóstico e, com isto, selecionar maneiras de atuar na modificação da história natural da doença, parece ser o maior desafio na seleção do tratamento. Nos animais existem poucas possibilidades, preconizando a ostectomia de cabeça e colo femorais (GAMBARDELLA, 1993; PIERMATTEI e FLO, 1997), já em humanos, existem outros tratamentos cirúrgicos e não cirúrgico. 2. OBJETIVOS Visto a necrose asséptica da cabeça do fêmur ter índice representativo em cães jovens e de pequeno porte, provocando dor e incomodo ao animal e ao proprietário, se não tratada adequadamente, a presente revisão tem por objetivo discutir causas, patofisiologia, sinais clínicos, predisposição, diagnóstico e Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. tratamento da afecção. 3. REVISÃO DA LITERATURA 3.1 Causas e fatores de risco A doença de Legg-Calvé-Perthes é produzida por avascularização da cabeça femoral. A razão para esta diminuição do suprimento sangüíneo da cabeça femoral, entretanto, ainda não foi determinada (TACHDJIAN, 1995). Para Soni et al. (2004) a verdadeira causa da doença de Legg-Calvé-Perthes permanece indefinida. Vários fatores foram apresentados na literatura como prováveis responsáveis deste episódio tanto em humanos como em animais, tais como: anormalidades de coagulação, alteração do fluxo sangüíneo arterial (infartos ósseos múltiplos), obstrução da drenagem venosa da epífise e colo femoral, trauma, retardo no desenvolvimento, hiper-atividade da criança, influências genéticas (GAMBARDELLA, 1993; DENNY e BUTTERWORTH, 2000) e fatores nutricionais. Já para Hebert (2004) de todas as teorias (até agora não confirmadas em humanos) sobre a causa da doença, parece que a maior comprovação que se tem é quanto à relação com a isquemia do núcleo de ossificação da cabeça do fêmur e o hormônio do crescimento, tendo em vista a baixa estatura das crianças com a enfermidade. 3.2 Fisiopatologia A vascularização da cabeça do fêmur em cães jovens com as fises femorais proximais abertas é derivada, exclusivamente, dos vasos epifisários; os vasos metafisários não atravessam a fise, portanto, não contribuem para a vascularização Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. da cabeça do fêmur. Os vasos epifisários correm pela periferia dos ossos, ao longo da superfície do colo femoral, atravessam a placa de crescimento e penetram o osso para nutrir a epífise femoral. A sinovite ou uma posição anormal prolongada do membro pode aumentar a pressão intra-articular, levando ao quadro de isquemia das veias mais frágeis e à inibição do fluxo sanguíneo (DENNY e BUTTERWORTH, 2000; JOHNSON e HULSE, 2002). Após a morte celular, inicia-se um processo reparador. O conteúdo ósseo é enfraquecido mecanicamente durante o período de revascularização e as forças de sustentação de peso fisiológico normais podem causar o colapso e a fragmentação da epífise femoral. Quando isso ocorre, a incongruência entre a epífise femoral e o acetábulo resulta em Doença Articular Degenerativa (DAD). A fragmentação (fraturas) da epífise femoral e a osteoartrite causam dor, resultando em claudicação (JOHNSON e HULSE, 2002). 3.3 Predisposição A Legg-Calvé-Perthes afeta cães jovens, de raças pequenas, pesando menos de 10 kg. As raças comumente afetadas são pinschers, terries e poodles (DENNY e BUTTERWORTH, 2000), de 3 a 11 meses de idade. Normalmente é unilateral, mas pode ser bilateral em 12 a 17% dos animais afetados. As alterações radiográficas iniciais consistem em áreas irregulares de lise na cabeça do fêmur e um alargamento do espaço articular, seguido por arrasamento e colapso da cabeça femoral (STURION e STURION, 2000; FOSSUM, 2005). Em humanos sua incidência é de cinco meninos para uma menina. Existe uma predominância em crianças de raça branca, e, em 20% dos casos, há relação familiar. Pode afetar os dois lados em 20% dos pacientes. Existe predisposição em crianças nascidas com baixo peso, e a idade óssea é retardada em quase 90% dos casos. Tanto meninos como meninas têm uma tendência para baixa estatura (HEBERT, 2004). Para Tachdjian (1995) o início clínico da doença de Legg- Calvé-Perthes ocorre em uma faixa etária muito estreita, cerca de 80% dos Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. pacientes entre 4 e 9 anos de idade, com uma média de 6 anos e uma extensão que vai de cerca de 2 anos de idade até 13 anos. A idade do início é mais precoce nas mulheres. Em cerca de 10% dos casos o envolvimento é bilateral. 3.4 Sinais clínicos Na anamnese os cães apresentam, claudicação com sustentação de peso que piora em 6 a 8 semanas. A claudicação pode progredir para um estado de incapacidade de sustentar peso. Alguns clientes relatam o início agudo da claudicação clínica. Outros sinais clínicos podem incluir irritabilidade, diminuição do apetite e mastigação da pele sobre o quadril afetado (PIERMATTEI e FLO, 1997; JOHNSON e HULSE, 2002). No exame físico a manipulação da articulação coxofemoral desencadeia dor nos animais afetados. Limitação da amplitude de movimentos, atrofia muscular e crepitação podem estar presentes na doença avançada (GAMBARDELLA, 1993). Em humanos os sinais clínicos são semelhantes, porém a evolução é mais lenta, com isso o diagnóstico pode ser feito mais precocemente. 3.5 Diagnóstico Na medicina veterinária o diagnóstico é realizado basicamente pela anamnese, sinais clínicos, exames físicos, e complementares (radiografia). No exame físico os cães com Legg-Calvé-Perthes apresentam crepitação, dor e arco de movimento restrito na manipulação da articulação coxofemoral. A atrofia da musculatura glútea e do quadríceps é evidente em casos mais avançados (PIERMATTEI e FLO, 1997; DENNY e BUTTERWORTH, 2000; JOHNSON e HULSE, 2002). Na radiografia simples ventrodorsal da pelve observa-se deformidade da cabeça femoral, encurtamento do colo, áreas de diminuição da densidade óssea epifisária (DENNY e BUTTERWORTH, 2000; JOHNSON e Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. HULSE, 2002), aumento do espaço articular e presença de osteófitos periarticulares (DENNY e BUTTERWORTH, 2000) (Fig. 1). Os diagnósticos diferenciais compreendem trauma fiseal e luxação de patela medial. Na medicina humana os casos também são diagnosticados com sucesso por meio de exames físicos e radiográficos. Mas segundo Soni et al. (2004), a Ressonância nuclear magnética demonstra com clareza a necrose antes da radiografia e cintilografia, sendo considerado o principal meio para diagnóstico precoce. A radiografia sempre foi o exame clássico para confirmar o diagnóstico, embora falhe em mostrar a fase inicial da doença. A cintilografia, capaz de evidenciar precocemente a área isquêmica, parece ser útil em duas circunstâncias especiais: a primeira, nos casos de sinovite aguda, na qual os sintomas perduram por duas a três semanas; a segunda, para demonstrar o grau de envolvimento da epífise e sua revascularização (DANIGELIS et al. 1975). Deve-se fazer o diagnóstico diferencial para: Artrite séptica atípica, Doença de Gaucher, hipotiroidismo, displasia epifisária múltipla, anemia falciforme, displasia espondiloepifisária, variante da Síndrome de Stickler, Sinovite transitória (SNIDER 2000). Os sinais radiográficos mais precoces da Doença de Legg-Calvé-Perthes em medicina humana são a diminuição da altura do núcleo epifisiário com consequente aumento indireto do espaço articular e a fratura subcondral, melhor Fig. 1- A cabeça do fêmur do cão contém duas grandes áreas de radioluscência com esclerose circundante (setas). Existe achatamento do peso de suporte de superfície da cabeça femoral, e os espaços estão ampliados. Presença de formação de osteófitos no colo do fêmur. Fonte: Textbook of Veterinary Diagnostic Radiology Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. vista na incidência de Lauenstein. É importante avaliar na evolução radiográfica a extensão do comprimento do núcleo epifisiário, presença de envolvimento metafisário, bem como sinais de "cabeça em risco". (SONI et al., 2004). Para Hebert (2004) no início da doença, pode-se notar uma erosão pequena e limitada na periferia do núcleo cefálico ossificado, inclusive com pequena irregularidade. Porém, inicialmente, percebe-se apenas osteoporose em comparação com o outro quadril e afastamento da cabeça do fêmur em relação ao acetábulo. A imagem radiográfica é característica porque o núcleo cefálico se fragmenta progressivamente. Primeiramente a epífise se danifica, se tornando, posteriormente, irregular e até fragmentada. Na sequência, aparecem os geodos isquêmicos. A metáfise frequentemente está afetada pelo processo. Quando a fragmentação alcança seu grau mais avançado e chega ao aspecto mais clássico de coxa plana, a cabeça do fêmur está aplanada, achatada. Depois vem a fase de reparação, de reorganização do núcleo ósseo cefálico. Ele se recupera progressivamente em sua forma, com contorno e circunferência, ainda que a altura continue diminuída. Dessa forma, sucedem-se destruição e reconstrução para alcançar um equilíbrio articular satisfatório e congruente que permita um futuro mecânico o mais adequado possível. 3.6 Tratamento O tratamento conservativo da doença baseia-se na administração de medicações antiinflamatórias e analgésicas para alívio da dor, além de repouso, restrição de exercícios e boa alimentação (GAMBARDELLA, 1993). Glueck et al. (2002) trataram cães com alterações trombofilicas- hipofibrinolíticas e osteonecrose graus I e II com 60mg por dia de enoxaparina durante 12 semanas. Após 105 semanas de avaliação, concluíram que quando o tratamento inicia-se nos primeiros estágios da doença, a osteonecrose pode ser seguramente controlada ou até mesmo revertida, evitando uma intervenção cirúrgica. Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. O tratamento atual da necrose asséptica da cabeça do fêmur nos cães é cirúrgico e no pré-operatório a atividade é limitada até a realização da cirurgia. A excisão da cabeça e colo femoral é considerada o tratamento de escolha, a fim de aliviar a dor e eliminar a claudicação, induzindo a uma pseudoartrose funcional (DENNY e BUTTERWORTH, 2000). É recomendado o uso da interposição de tecido mole entre o colo femoral e o acetábulo (BERZON et al., 1980). Também pode ser realizado o desprendimento de um pedículo do músculo bíceps femoral, a ser passado ao redor do colo femoral e suturado aos músculos glúteo e vasto lateral (LIPPINCOTT, 1984). A artroplastia total da articulação coxo-femoral foi desenvolvida para tratar problemas irreversíveis da articulação coxo-femoral. É atualmente utilizada em cães com displasia coxofemoral, luxação crônica após falha de demais procedimentos indicados, fraturas de cabeça e colo femorais, necrose asséptica da cabeça e colo femorais com resultado satisfatório de 92 a 98% (DE YOUNG et al., 1992). Após as cirurgias da articulação coxo-femoral, além do repouso, está recomendada a manutenção de um peso corporal adequado durante a recuperação (BRINKER et al., 1999). Em cães com doença de Legg-Perthes, a cápsula articular apresenta-se espessada e mais vascular que a normal. A cabeça e o colo femoral, muitas vezes, parecem deformados. O osso pode estar mole e fragmentar-se quando são excisados cabeça e colo femorais, requerendo o uso de ruginas para remover pequenos fragmentos (GAMBARDELLA, 1993; PIERMATTEI e FLO, 1997). Gangji et al. (2004) utilizaram implante de células mononucleares autólogas de medula óssea em pacientes humanos portadores de osteonecrose da cabeça femoral estágios I ou II, de acordo com o sistema da Association Research Circulation Osseous. Foi observado que após 24 meses, houve redução significante da dor e dos sintomas articulares. Em humanos o tratamento preconizado por Hebert (2004) em pacientes na fase inicial da doença, sem limitação da abdução e rotação interna e sem sinais radiológicos de subluxação, consiste em manter o paciente em observação e com restrição da atividade física (corrida, saltos ou qualquer outro tipo de impacto). O apoio é permitido com o acompanhamento radiográfico. Se o quadril persistir com Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. mobilidade normal e cabeça congruente, segue-se com a conduta estabelecida. Nos pacientes com limitação da abdução e rotação interna, quadril subluxado evidenciado pela radiografia, é indicado a centralização do quadril. Inicialmente, realiza-se o processo de recuperação da abdução e rotação interna. Isso pode ser conseguido de diferentes maneiras, seja pela tração percutânea e mobilização por algumas semanas, seja ambulatorialmente pelo uso de gesso tipo broomstick (CATTERALL, 1982) com o paciente retornando ao ambulatório a cada três dias para aumentar o grau de abdução e rotação interna. (Fig. 2) Uma vez recuperadas totalmente a abdução e a rotação interna, efetua-se a centralização por meio da cirurgia. Nas crianças abaixo de oito anos tem-se usado a osteotomia varizante e de rotação do fêmur (Fig. 3) (LLOYD-ROBERTS et al., 1976; AXER, 1965; BERTOL e BORGES, 1995; COATES et al., 1990). Ela alivia o estresse sobre a articulação, facilitando a remodelagem da cabeça. No entanto, apresenta a desvantagem de provocar encurtamento. Fig.2- Aparelho gessado do tipo broomstick. A abdução e a rotação interna são recuperadas por meio da regulagem do comprimento da haste e pelo aumento gradativo da rotação interna do membro inferior. Fonte: R evista brasileira de ortopedia e traum atologia. Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. A cirurgia tipo “shelf” tem sido recomendada para crianças acima de oito anos de idade, com o objetivo de aumentar a cobertura da cabeça sobretudo nos grupos 3 e 4 de Catterall, e tem mostrando bons resultados (WILLETT et al., 1992). Quando a subluxação é importante, associa-se a osteotomia femoral varizante e de rotação. Quanto mais baixa a idade do paciente melhor tem sido o prognóstico a longo prazo. A idade de seis a oito anos parece ser o divisor das águas (MCANDREW e WEINSTEIN, 1984; STULBERG et al., 1981). Isso é atribuído à perda do potencial de remodelagem do acetábulo com o crescimento (SKAGGS e TOLO, 1996). Considerando-se a história natural, está comprovado que 57% dos casos têm boa evolução sem nenhuma forma de tratamento (CATTERRAL, 1971). Em torno de 20% dos resultados não são bons, independentemente de tratamento ou não. Cabe então ao ortopedista identificar os restantes 20% que se beneficiarão com o tratamento. Independentemente do método utilizado, conservador ou cirúrgico, os dois princípios fundamentais para o tratamento da doença são manter a epífise femoral centrada no acetábulo e preservar a mobilidade do quadril (SONI et al., 2004). 3.7 Pós-operatório Fig. 3- A: Radiografia de menino de seis anos de idade com doença de Legg-Calvé-Perthes, com subluxação no quadril direito. B: Osteotomia varizante e de rotação do fêmur. Fonte: R evista brasileira de ortopedia e traum atologia. B Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. Após a intervenção cirúrgica, o principal objetivo é encorajar o animal a apoiar o membro operado a fim de promover rápida remodelação óssea, aumentar o suporte de tecidos moles, aliviar a dor e minimizar as erosões da cartilagem articular. Isso pode ser alcançado com caminhadas curtas e frequentes na coleira, natação, redução do peso e alimentação balanceada (JONES, 1985). Flexão e extensão passivas da articulação coxofemoral deverão ser realizadas duas vezes ao logo do dia, desde que o animal as tolere. A fisioterapia deverá ser indicada com pequenos movimentos e amplitude, aumentando gradativamente durante 5 a 10 minutos. (STURION e STURION, 2000; FOSSUM, 2005). 3.8 Prognóstico O prognóstico para o uso normal do membro é bom a excelente após excisão da cabeça e colo femorais, decorrente do pequeno tamanho dos cães afetados. Deve-se esperar claudicação contínua em animais que não se submeteram à cirurgia (STURION e STURION, 2000; FOSSUM, 2005). 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS É notório que a necrose asséptica da cabeça do fêmur é fácil de ser diagnosticada, porém para um melhor prognóstico e eventualmente evitar a cirurgia é mister que o diagnóstico seja realizado precocemente, o que na Medicina Veterinária é muitas de difícil ocorrência. Observa-se também que nos animais a evolução da doença é mais rápida e os sinais ficam mais acentuados. O tratamento da moléstia de Legg-Calvé-Perthes visa obter uma cabeça femoral congruente e com a forma mais esférica possível. Assim, a excisão da cabeça e colo femorais, tratamento quase singular na necrose asséptica da cabeça do fêmur em cães, permite melhor recuperação em relação aos tratamentos conservadores. Necrose asséptica da cabeça do fêmur - monografia. Entretanto, alguns animais submetidos ao procedimento cirúrgico podem apresentar leve claudicação devido ao encurtamento do membro e discreta atrofia muscular, porém a dor é ausente. Uma outra possibilidade a ser avaliada é o uso de implantes de células mononucleares autólogas de medula óssea. 5. REFERÊNCIAS AXER, A. Subtrochanteric osteotomy in the treatment of Perthes disease. J. Bone Joint Surg. Br., v.47, p.489-499, 1965. BERTOL, P.; BORGES, J.L. Osteotomia derrotatória varizante do fêmur no tratamento da moléstia de Legg-Calvé-Perthes. Rev. Bras. Ortop., v.30, p.1-6, 1995. BERZON, J.L.; HOWARD, P.E.; COVELL, S.J.; TROTTER, E.J.; DUELAND, R. A retrospective study of the efficacy of femoral and neck excisions in 94 dogs and cats. Vet. Surg., v.9, p.88-92, 1980. BRINKER, W. O.; PIERMATTEI, D. L.; FLO, G. L. Tratamento das luxações coxofemorais. In:___. Manual de ortopedia e tratamento das fraturas dos pequenos animais. São Paulo: Manole, 1999. cap.15, p.394-406. CATTERALL, A. The natural history of Perthes disease. J. Bone Joint Surg. Br., v.53, p.37-53, 1971. CATTERALL, A. Legg-Calvé-Perthes disease. In:__. Current problems in orthopaedics. 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