Campus de São José do Rio Preto ELLEN SILVA LAGO VANZELA ESTUDOS BIOQUÍMICOS, FÍSICO-QUÍMICOS E TECNOLÓGICOS DE UVAS PAULISTAS Orientador: Prof. Dr. Roberto da Silva Universidade Estadual Paulista – UNESP, São José do Rio Preto, SP, Brasil Co-orientador: Prof. Dr. Isidro Hermosín Gutiérrez Universidad de Castilla-La Mancha – UCLM, Ciudad Real, Espanha São José do Rio Preto, SP, Brasil Maio/2011 ii ELLEN SILVA LAGO VANZELA Estudos bioquímicos, físico-químicos e tecnológicos de uvas paulistas Tese apresentada para obtenção do título de Doutor em Engenharia e Ciência de Alimentos, área de Ciência e Tecnologia de Alimentos junto ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciência de Alimentos do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de São José do Rio Preto, SP, Brasil Banca Examinadora _______________________________________ Prof. Dr. Roberto da Silva, UNESP – São José do Rio Preto, SP Professor Titular Doutor Orientador _______________________________________ Prof. Dr. José Antônio Gomes Vieira Professor Assistente Doutor UNESP – São José do Rio Preto, SP _______________________________________ Profa. Dra. Neuza Jorge Professora Adjunto Doutora UNESP – São José do Rio Preto, SP _______________________________________ Profa. Dra. Helena Teixeira Godoy Professora Associada Doutora UNICAMP – Campinas, SP _______________________________________ Prof. Dr. Afonso Mota Ramos Professor Associado III Doutor UFV – Viçosa, MG São José do Rio Preto, 27 de maio de 2011 iii Lago-Vanzela, Ellen Silva. Estudos bioquímicos, físico-químicos e tecnológicos de uvas paulistas / Ellen Silva Lago Vanzela. - São José do Rio Preto : [s.n.], 2011. 211 f.: il. ; 30 cm. Orientador: Roberto da Silva Co-orientador: Isidro Hermosín Gutiérrez Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas 1. Tecnologia de alimentos. 2. Uva – Bioquímica. 3. Uva – Físico- química. 4. Uva – Tecnologia. 5. Uva – São Paulo (Estado). I. Da- Silva, Roberto. II. Hermosín-Gutiérrez, Isidro. III. Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas. IV. Título. CDU - 634.8 Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do IBILCE Campus de São José do Rio Preto - UNESP iv v AGRADECIMENTOS A Deus, luz de minha vida, presença constante em todos os momentos de dificuldades e de vitórias em minha vida A Nossa Senhora, que sempre intercedeu junto ao Pai por todas minhas preces Ao meu amado esposo José Paulo, pelo apoio, confiança e por adaptar o percurso de sua vida em função das minhas oportunidades Aos meus pais Yara e José e às minhas irmãs Cintia e Thais, pelo apoio, amor e incentivo. Vocês foram fundamentais para conclusão deste trabalho Aos meus cunhados Carlos e Adenis por todo apoio e caronas Aos meus sobrinhos Gabriel, Carlos, Isabella, Júlia, Pedro, Enzo e Henri bem como aos meus primos Caio e Vitor que alegram-me e fazem a vida parecer mais simples Aos meus sogros João e Dulce bem como a minha prima Vandice por todo apoio e cuidados com o Fidel Aos meus tios Joana, Maurício, Ana e Dorival por todo apoio Ao meu primo Paulo por todo apoio durante meu período de estágio no exterior e pela colaboração para a construção das figuras da Tese A todos os componentes do “Beco” pela descontração nas tardes de domingo. Aos meus queridos amigos Natália, Milla, Fabiana, Andréia, Carolina, Dani, Márcia e Marcelo, pela amizade, tolerância e por toda a ajuda. Muitos de vocês já fazem falta no laboratório. Às minhas amigas Márcia, Ana Lúcia, Tássia, Ariane, Gisele, Cristiane, Larissa, Bárbara, Amanda e Carolina, pelas conversas diárias e pelos bons momentos compartilhados que sempre me confortaram principalmente nos momentos finais para conclusão da Tese. A todos os amigos de laboratório e da UNESP pela amizade, pelo incentivo e pelos bons momentos compartilhados Ao Prof. Dr. Roberto da Silva, pela orientação, amizade, confiança e oportunidades. Um grande exemplo de pesquisador a ser seguido...quem sabe um dia chego lá..... A Profa. Eleni Gomes, pelo apoio e por todo esforço em elevar a qualidade da pesquisa desenvolvida no Laboratório de Microbiologia e Bioquímica Aplicada Al Prof. Dr. Isidro Hermosín Gutiérrez por la oportunidad, la paciencia, apoyo y orientación. Su conocimiento y la enseñanza contribuyeron en gran medida para la calidad de mi trabajo Ao Prof. Dr. Maurício Boscolo por todo apoio. vi A la Profa. Dora por la ayuda y a Beatriz y principalmente a Noélia por toda la ayuda, amistad y por los momentos compartidos Al Prof. Dr. Esteban García Romero del Instituto de la Vid y el Vino de Castilla-La Mancha por el gran apoyo y contribuición A los profesores y a todos las personas que trabajan en la Universidad de Castilla-La Mancha por los buenos momentos compartidos durante mi estancia en España A la Profa. Dra. María Arévalo Villena por su confianza y apoyo, así como a su madre Maria Asunción y María Luisa por los grandes momentos compartidos. Mis tias.......muy guapas Às alunas de iniciação científica Fernanda, Sara, Camila e Patrícia, pela troca de experiências e conhecimentos Ao técnico do Departamento de Engenharia de Alimentos Ginaldo Vieira dos Santos pela amizade e colaboração, bem como aos técnicos Newton e João Jesuíno por toda ajuda durante o desenvolvimento do meu trabalho Aos pesquisadores da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA Uva e Vinho, Bento Gonçalves) Dr. Umberto Almeida Camargo e Dra. Rosemeire de Lellis Naves pela parceria e colaboração Aos produtores de Jales Sebatião e Neusa Santin pela parceria e troca de conhecimentos, bem como Antônio Gomes Vieira pelo apoio e carinho. Precisamos hoje e sempre no mundo de pessoas verdadeiramente a todos os produtores de uvas que auxiliaram para o desenvolvimento deste trabalho A Empresa Novozyme pela doação dos preparados enzimáticos utilizados. Ao Prof. Dr. José Antônio Gomes Vieira, pelo apoio e carinho. Precisamos hoje e sempre no mundo de pessoas verdadeiramente dignas e bondosas assim. Ao Prof. Dr. Hamilton Cabral, pela participação na banca de qualificação. Aos membros da banca, pela contribuição para melhoria da qualidade deste trabalho À UNESP, pela oportunidade de realização do curso de doutorado e a Universidad de Castilla-La Mancha pela realização do estágio À CAPES, pela bolsa de doutorado no país e pela bolsa de estágio no exterior. MUITO OBRIGADA MUCHAS GRACIAS vii RESUMO GERAL O conhecimento qualitativo e quantitativo dos compostos bioativos presentes nas uvas produzidas no Estado de São Paulo é de fundamental importância para elevar a qualidade dos produtos a um patamar internacional. A composição fenólica detalhada (antocianinas, flavonóis, derivados dos ácidos hidroxicinâmicos, estilbenos e flavan-3-óis) das partes comestíveis (polpa e casca) das uvas de mesa apirênicas (BRS Clara e BRS Morena) e da uva Bordô, produzidas na região do Noroeste Paulista, foi identificada e quantificada utilizando cromatografia líquida de alta eficiência com detectores de arranjo de diodos acoplada à espectrometria de massas por sistema de ionização por eletronebulização (CLAE-DAD-IES- EM/EM). Este trabalho também determinou o teor de fenólicos totais e a capacidade antioxidante destas uvas, bem como objetivou estudar as polifenol oxidases (PPO) endógenas associadas aos processos de deterioração das uvas de mesa apirênicas e, avaliar o efeito da pectinase produzida pelo fungo Thermomucor indicae-seudaticae N31 sobre o teor de compostos fenólicos na extração de suco de uva Bordô. O conteúdo de fenólicos totais da uva Bordô foi de 1130 mg/kg (como equivalentes de ácido gálico, GAE), principalmente situados nas cascas, onde também encontrou-se alto teor de antocianinas, em grande parte, como 3,5- diglicosídeos, de flavonóis e de derivados de ácido hidroxicinâmico (HCAD). A miricetina 3- glicosídeo apresentou-se como componente principal dos flavonóis enquanto os HCAD derivaram principalmente do ácido caféico. O teor de flavan-3-óis da casca apresentou-se um pouco mais baixo que o normalmente relatado em variedades Vitis vinifera. A uva Bordô pode ser considerada uma fonte importante de resveratrol e de outros compostos com capacidade antioxidante (37,6 mmol/kg, como equivalentes de Trolox). Já a composição fenólica qualitativa das uvas BRS Clara e BRS Morena não diferiu muito da relatada por variedades Vitis vinifera, com teores importantes dos compostos analisados nas cascas de ambas as uvas. Diferenças qualitativas e quantitativas entre os compostos presentes nas cascas e na polpa da uva BRS Morena, principalmente com relação ao perfil de antocianinas e flavonóis, foram encontradas. Em contraste, o perfil de flavonóis encontrado para as cascas e polpa da uva BRS Clara são muito similares e com altos conteúdos quando comparado aos apresentados por diversas castas de uva verde ou branca. Os altos conteúdos de fenólicos totais das uvas BRS Morena e BRS Clara (1008 e 577 mg GAE/kg, respectivamente) também suportaram os seus altos valores de capacidade antioxidante (39,62 e 15,93 mmol/kg como equivalentes de Trolox, respectivamente). A BRS Morena pode ser considerada ainda uma importante fonte de resveratrol. viii A PPO ativa e latente presente nas uvas BRS Clara e BRS Morena foram extraídas usando detergente Triton-X-100 (ativa) e Triton-X-114 (latente), e suas atividades de catecolase foram caracterizadas. As PPO extraídas com Triton-X-110 exibiram máxima atividade a pH 6,0 e na temperatura de 25°C. Acima de 30°C, um declínio gradual das atividades foi notado, com completa inativação a 60°C. As PPO extraídas com Triton-X-114 foram ativadas com 0,2% de SDS, e exibiram máximas atividades a pH 5,5 e na temperatura de 30°C, sendo estáveis até temperatura de 60°C. O efeito de preparado enzimático pectinolítico produzido pelo fungo Thermomucor indicae-seudaticae N31 sobre o teor de fenólicos totais, teor de metanol e cor de sucos de uvas foi estudado. A introdução de tratamento enzimático a etapa de maceração das uvas Bordô, durante 1 hora, resultou em sucos com boas características cromáticas e teor de fenólicos superiores (1637, 21 mg GAE/L) aos encontrados em suco elaborado de forma convencional (1422,59 mg GAE/L) e, muito próximo ao apresentado por suco obtido por tratamento enzimático das uvas com preparado comercial (1682,10 mg GAE/L). Além disso, os teores de metanol dos sucos elaborados foram inferiores a 200 mg/L. Estes resultados incentivam novos estudos que viabilizem a obtenção de preparado enzimático produzido por este fungo passível de ser oferecido comercialmente às indústrias processadoras de uva. ix ABSTRACT The qualitative and quantitative knowledge of the bioactive compounds present in grapes produced in the State of Sao Paulo is very important to the process of raising the quality of the state’s products to an international level. The detailed phenolic composition (anthocyanins, flavonols, hydroxycinnamic acid derivatives, stilbenes and flavan-3-ols) of the edible parts (flesh and skin) of the Bordô grape and seedless table grapes (BRS Morena and BRS Clara), produced in the Northwest region of State, was identified using high performance liquid chromatography with a diode array detector coupled with mass spectrometry through an electrospray ionization system (HPLC-DAD-ESI-MS/MS). This study also determined total phenolic content and antioxidant capacity of these grapes, as well as the endogenous polyphenol oxidases (PPO) associated with the processes of decay of seedless table grapes. This study also evaluated the effect of pectinase produced by the fungus Thermomucor indicae-seudaticae N31 on the total phenolic content during the extraction of grape juices from the Bordô. Total phenolic content of the Bordô grape was 1130 mg/kg (as gallic acid equivalents - GAE), and was mainly located in the skins, where there was also high content of anthocyanins, which were largely found as 3,5-diglucosides, as well as of the flavonols and hydroxycinnamic acid derivatives (HCAD). Myricetin 3-glucoside was found to be the main compound of the flavonols, while the HCAD mainly derived from caffeic acid. The flavan-3-ol contents of the skins were lower than those that are usually reported for V. vinifera grape varieties. The Bordô grape can be considered an important source of resveratrol and other compounds with antioxidant capacity (37.6 mmol/kg, as Trolox equivalents). The qualitative phenolic composition of BRS Clara and BRS Morena grapes did not differ from those found in cases of Vitis vinifera grape varieties, with significant levels of analyzed compounds mainly in skins for both grape varieties. Qualitative differences between the phenolic compounds present in the skin and flesh of the BRS Morena grape, especially with regard to the anthocyanin and flavonol profiles, were found. In contrast, the flavonol profiles found in the skin and flesh of the BRS Clara grape were very similar, and their contents were considered high when compared to the contents provided by different varieties of green or white grapes. The high contents of phenolic compounds in BRS Morena and BRS Clara grapes (1008 and 577 mg GAE/kg, respectively) were consistent with the equally high antioxidant capacity values (39.62 and 15.93 mmol/kg, as Trolox equivalents, respectively). The BRS Morena grape can also be considered an important source of resveratrol. x Active and latent PPO from BRS Clara and BRS Morena seedless grapes were extracted using the nonionic detergents Triton-X-100 (active) and Triton-X-114 (latent), and their catecholase activities were characterized. The PPO extracted using Triton-X-110 exhibited maximum activities at pH 6.0 and at 25°C. Above 30°C, a gradual decline in activities was noted, with complete inactivation at 60°C. The PPO from grapes extracted with Triton-X-114 was activated with 0.2% SDS, and exhibited maximum activities at pH 5.5 and at 30°C. It was stable until the temperature reached 60°C. The effect of pectinolytic enzyme preparation produced by the fungus Thermomucor referrals seudaticae-N31 on the content of total phenolics, on the content of methanol and on the color of grape juice was studied. The introduction of enzyme treatment through a step that involves soaking for 1 hour resulted in products with good color characteristics and higher phenolic content (1637.21 mg GAE/L) than those found in conventionally prepared juice (1422.59 mg GAE/L) and that were very similar to those presented by the juice obtained through the enzymatic treatment of commercially prepared grapes (1682.10 mg GAE/L). Furthermore, the concentrations of methanol in the juice that was produced were less than 200 mg/L. These results encourage further studies that will enable enzyme preparation produced by this fungus that can be offered commercially to grape-processing industries. xi LISTA DE FIGURAS CAPÍTULO 1. COMPOSTOS FENÓLICOS EM UVAS E VINHOS: PROPRIEDADES QUÍMICAS E FUNÇÕES BIOLÓGICAS (PARTE I) Figura 1. Organização estrutural do cacho da uva (GOMES, 2006)............................ 32 Figura 2. Organização estrutural da baga de uva.......................................................... 33 Figura 3. Estrutura básica dos flavonóides: 2-fenilbenzopirano (A) e 2- fenilbenzopirona (B) (HUBER, 2007)........................................................................... 36 Figura 4. Estrutura de algumas antocianinas derivadas da uva..................................... 38 Figura 5. Espectros de absorção de diferentes antocianinas en meio ácido (pH < 2): (A) 3-monoglicosídeos (comprimento de absorção de onda aumenta com o aumento dos substituintes do anel B) (CASTILLO-MUNOZ et al., 2009a); (B) monoglicosídeo (glc) x diglicosídeo (diglc), 3-monoglicosídeo (linha grande tracejada) e 3,5-diglicosídeo (linha sólida); diglicosídeos acetilados (3-acglc-5glc) x cumarilados (3-acglc-5-glc), malvidina-3-acetilglicosídeo-5-glicosídeo (linha pequena tracejada) e malvidina-3-(p-cumaril)-glicosídeo-5-glicosídeo (linha pontilhada)..................................................................................................................... 40 Figura 6. Espectro UV-vis de flavonóis........................................................................ 43 Figura 7. Estrutura dos flavonóis encontrados em uvas Vitis vinifera: (A) Flavonol- 3-O-glicosídeo, (B) Flavonol-3-O-galactosídeo, (C) Flavonol-O-glucuronídeo, (D) Quercetina-3-O-(“6-ranmosil)-glicosídeo (rutina) (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009b)............................................................................................................................ 44 Figura 8. Exemplos de procianidina dímeras (Tipo A e Tipo B) e trímera (Tipo C). 46 Figura 9. Procianidinas poliméricas predominantes nas uvas.................................... 47 Figura 10. Estruturas químicas de piranoantocianinas de vinho derivadas da malvidina-3-glicosídeo: (A) piranoantocianinas do tipo vitisina (R1 = COOH, Vitisina A; R1 = H, Vitisina B); (B) piranoantocianinas do tipo hidroxifenil (R2 = R3 = H, malvidina-3-glicosídeo-4-vinilfenol; R2 = H e R3 = OH, malvidina-3- glicosídeo-4-vinilcatecol ou Pinotina A; R2 = H e R3 = OCH3, malvidina-3- glicosídeo-4-vinilguaiacol) (RENTZSCH; SCHWARZ; WINTERHALTER, 2007)... 49 Figura 11. Trans-resveratrol e seus derivados (POUR NIKFARDJAM; LÁSZLO; DIETRICH, 2006)......................................................................................................... 51 xii Figura 12. Homólogos do resveratrol: piceatanol e seu 3-O-glicosídeo (astringina)... 51 Figura 13. Derivado 2-C-glicosídeo do trans-resveratrol............................................. 51 Figura 14. Derivados dímeros do resveratrol. Especificamente para o palidol são conhecidos os derivados 3-glicosídeo (R= glicosil; R’ = H) e 3,3’-diglicosídeo (R = R’ = glicosil).................................................................................................................. 52 Figura 15. Tetrâmero do resveratrol (hopeafenol)........................................................ 52 Figura 16. Características estruturais básicas de um flavonóide com propriedades bioativas (adaptada de BEER et al., 2002). I, estrutura 3’,4’-catecol; II, dupla ligação (C2-C3) conjugada com a função 4-oxo; III, grupos hidroxilas na posição 3 e 5 com função oxo...................................................................................................................... 55 CAPÍTULO 2. COMPOSTOS FENÓLICOS EM UVAS E VINHOS: PROPRIEDADES QUÍMICAS E BIOQUÍMICAS E QUALIDADE TECNOLÓGICA (PARTE II) Figura 1. Localização dos compostos fenólicos e das enzimas oxidativas (PPO e POD) em uma típica célula de planta............................................................................. 73 Figura 2. Mecanismo de catálise da catecolase e da cresolase..................................... 75 Figura 3. Mecanismo de oxidação enzimática dos flavonóides de uva (adaptada de POURCEL et al., 2007)................................................................................................. 77 Figura 4. Esquema de oxidação enzimático do ácido caftárico presente nos vinhos.... 80 Figura 5. Mecanismo de oxidação química do vinho catalizada por metais (adaptada de Elias et al., 2007)....................................................................................................... 84 Figura 6. Mecanismo proposto para formação da Vitisina A (FULCRAND et al., 1998).............................................................................................................................. 87 CAPÍTULO 3. PHENOLIC COMPOSITION OF THE EDIBLE PARTS (FLESH AND SKIN) OF BORDÔ GRAPE (V. LABRUSCA) USING HPLC-DAD-ESI-MS/MS Figure 1. Bordô grape (Vitis labrusca)………………………………………………. 100 Figure 2. General structures of the phenolic compound classes identified in Bordô grapes: anthocyanidin 3,5-diglucosides (A); anthocyanidin 3-glucosides (B); flavan- 3-ol monomers (C); flavan-3-ol dimmers or B-type procyanidins (D); flavonol 3- 106 xiii glycosides (E); hydroxycinnamic acid derivatives (F); and resveratrol-type stilbenes (G)…………………………………………………………………………………….. Figure 3. Bordô grape anthocyanins: DAD-chromatogram at 520 nm (A); extracted ion chromatograms (EIC) in positive ionization mode at the m/z values corresponding to the different anthocyanidin-type product ions (+EPI, MS/MS conditions): malvidin (B), peonidin (D), delphinidin (E), cyanidin (F), and petunidin (G); EIC of +EPI at the m/z values of the expected same molecular ion (+EMS, MS conditions) corresponding to the cis and trans isomers of mv-3-cmglc-5-glc (C). For peak assignation see Table 1…………………………………………………………. 107 Figure 4. HPLC-DAD chromatogram (detection at 360 nm) of grape skin (A) and flesh (B) flavonols of Bordô grape. For peak assignation see Table 2......................... 115 Figure 5. Bordô grape flavonols. Extracted ion chromatograms (EIC) in negative ionization mode at the m/z values corresponding to the expected molecular ions (- EMS, MS conditions) corresponding to: 3-galactoside and 3-glucoside of myricetin (A); myricetin 3-glucuronide and laricitrin 3-glucoside (B); syringetin 3-glucoside (C); rutin or quercetin 3-rutinoside (D); 3-galactoside and 3-glucoside of quercetin (E); quercetin 3-glucuronide and isorhamnetin 3-glucoside (F); and kaempferol 3- glucoside (G). Peak numbers as in Table 2................................................................... 118 Figure 6. Bordô grape hydroxycinnamic acid derivatives. DAD-Chromatogram at 320 nm of grape flesh extract (A), and extracted ion chromatograms (EIC) in negative ionization mode at the m/z values corresponding to the expected product ions (-EPI, MS/MS conditions) corresponding to the different hydroxycinnamic-type derivatives: caffeic-type derivatives, common product ion at m/z 179 (B); p- coumaric-type derivatives, common product ion at m/z 163 (C); ferulic-type derivatives, common product ion at m/z 193 (D). Peak numbers as in Table 3……… 120 Figure 7. Bordô grape resveratrol derivatives. DAD-Chromatogram at 320 nm of grape skin extract (A), and extracted ion chromatograms (EIC) in negative ionization mode at the m/z values (227) corresponding to the expected product ions (-EPI, MS/MS conditions) corresponding to the different resveratrol derivatives (B). Peak numbers as in Table 3………………………………………………………………… 123 xiv CAPÍTULO 4. PHENOLIC COMPOSITION OF THE BRAZILIAN SEEDLESS TABLE GRAPE VARIETIES BRS CLARA AND BRS MORENA Figure 1. Brazilian seedless grapes: BRS Morena (A) e BRS Clara (B) ………........ 132 Figure 2. Anthocyanin chromatographic profile (DAD at 520 nm) of BRS Morena grape skin (A) and flesh (B). Peak numbering as in Table 1………………………… 142 Figure 3. Flavonol chromatographic profile (DAD at 360 nm) of BRS Morena grape skin (A) and flesh (B) and BRS Clara grape skin (C) and flesh (D). Peak numbering as in Table 2…………………………………………………….……………………. 148 CAPÍTULO 5. ISOLATION AND CHARACTERIZATION OF LATENT AND ACTIVE POLYPHENOLOXIDASE IN BRS CLARA (CNPUV 154-147 X CENTENNIAL SEEDLESS) AND BRS MORENA (MARROO SEEDLESS X CENTENNIAL SEEDLESS) SEEDLESS TABLE GRAPES Figure 1. Steps for obtaining PPO in latent from the BRS Morena grape using two- phase aqueous micellar systems with Triton-X-114 as a surfactant………………….. 166 Figure 2. Grape PPO extraction. (Positive control: sodium phosphate buffer; ascorbic acid; EDTA, PVP, NaCl and Triton-X-100). Negative control: 0.2-M sodium phosphate buffer (pH 6.5). (Other points on the y-axis represent the extracting solutions described without the indicated reagent)………………………... 170 Figure 3. Solubilization of the grape BRS Morena with the detergent Triton-X-114 followed by temperature-induced phase separation: supernatant (A); detergent-rich phase (B); clear, detergent-poor supernatant phase (C)………………………………. 172 Figure 4. Effect of SDS concentration on PPO activities of BRS Clara (•) and BRS Morena (♦)………………………………………………………………...………….. 173 Figure 5. Effect of pH on PPO activity of BRS Clara (a) and BRS Morena (b) grapes in a 0.2-M sodium acetate buffer (pH 3.0 – 5.5) and a 0.2-M sodium phosphate buffer (pH 6.0 – 8.0) with 0.25 % SDS (•) and without 0.25 % SDS (♦). Degree of activation at different pHs (ο)....................................................................... 174 Figure 6. Electrophoresis in polyacrylamide gel containing SDS (SDS-PAGE) at 12% concentration. Column 1: molecular weight markers: galactosidase, 116 kDa, BSA, 66.2 kDa, ovalbumin, 45 kDa, lactate dehydrogenase, 35 kDa; Bsp981 Reaser, 176 xv 25 kDa, -lactoglobulin, 18.4 kDa; Columns 2 and 4: enzymatic extracts of BRS Morena and BRS Clara obtained with Triton-X-100; Columns 3 and 5: enzynmatic extracts of BRS Morena and BRS Clara obtained with Triton-X-114; Columns 6 and 7: Native-PAGE, for the enzymatic extract of BRS Morena and BRS Clara obtained with Triton-X-114. Arrows indicate PPO enzymes of the grapes................................. Figure 7. Effect of pH on activity (•) and stability (♦) of BRS Clara PPO extracted using Triton-X-100 (A) and Triton-X-114 (B)…………………………………..…… 177 Figure 8. Effect of pH on activity (•) and stability (♦) of BRS Morena PPO extracted using Triton-X-100 (A) and Triton-X-114 (B)……………………………... 178 Figure 9. Effect of temperature on activity (•) and stability (♦) of BRS Clara PPO extracted using Triton-X-100 (A) and Triton-X-114 (B)……………………………... 179 Figure 10. Effect of temperature on activity (•) and stability (♦) of BRS Morena PPO extracted using Triton-X-100 (A) and Triton-X-114 (B)……………………….. 180 CAPÍTULO 6. EFEITO DE PECTINASE DE THERMOMUCOR INDICAE- SEUDATICAE N31 SOBRE O TEOR DE FENÓLICOS TOTAIS NA EXTRAÇÃO DO SUCO Figura 1. Comparação entre a atividade residual de PPO ( ) e POD (•) de uva Bordô usando diferentes tempos de branqueamento a vapor......................................... 189 Figura 2. Teor de fenólicos totais e de metanol dos sucos elaborados com uva branqueada e uvas branqueadas tratadas enzimaticamente com os preparados enzimáticos PEC-N31 e Vinozym Ventage FCE, por diferentes tempos...................... 192 Figura 3. Índice de cor e coloração T dos sucos elaborados com uva branqueada (controle, sem adição de enzimas) e uvas branqueadas tratadas enzimaticamente com os preparados enzimáticos PEC-N31 e Vinozym Ventage FCE, por diferentes tempos............................................................................................................................ 193 xvi LISTA DE TABELAS CAPÍTULO 1. COMPOSTOS FENÓLICOS EM UVAS E VINHOS: PROPRIEDADES QUÍMICAS E FUNÇÕES BIOLÓGICAS (PARTE I) Tabela 1. Antocianidinas (forma de cátion flavílio) mais comuns presentes nas uvas. 37 Tabela 2. Estrutura dos flavonóis encontrados nas uvas............................................... 42 Tabela 3. Exemplos de flavan-3-óis presentes nas uvas: C: (+)-catequina; E: (-)- epicatequina; ECG: (-)-galato-3-epicatequina; GC: (+)-galocatequina; EGC: (-)- epigalocatequina; GCG: (+)-galato-3-galocatequina; EGCG: (-)-galato-3- epigalocatequina. *G: ácido gálico................................................................................ Tabela 4. Padrão de substituição dos ácidos fenólicos................................................. 45 48 CAPÍTULO 3. PHENOLIC COMPOSITION OF THE EDIBLE PARTS (FLESH AND SKIN) OF BORDÔ GRAPE (V. LABRUSCA) USING HPLC-DAD-ESI-MS/MS Table 1. Chromatographic, UV-vis and mass spectral characteristics of the anthocyanins identified in Bordô grape by HPLC-DAD-ESI-MS/MS (positive ionization mode), and molar proportions (mean value ± standard deviation, n = 3). Peak numbers as in Figure 1…………………………………………………………. 108 Table 2. Chromatographic, UV-vis and mass spectral characteristics of the flavonols identified in Bordô grape by HPLC-DAD-ESI-MS/MS (negative ionization mode), and molar proportions (mean value ± standard deviation) of each individual flavonol in both parts of fruit (skin and flesh). Peak numbers as in Figure 2…………………. 114 Table 3. Chromatographic, UV-vis and mass spectral characteristics of the hydroxycinnamic acid derivatives (HCAD) and stilbenes (resveratrol and is 3- glucoside, piceid) identified in Bordô grape by HPLC-DAD-ESI-MS/MS (negative ionization mode), molar proportions of each individual HCAD, total content of HCAD, and stilbene concentrations (mg/kg) in both parts of fruit (skin and flesh; mean value ± standard deviation). Peak numbers as in Figure 6…………………….. 121 Table 4. Monomeric flavan-3-ol and dimmer B-type procyanidin content (MV ± SD, mg/kg grape) and proanthocyanidin characterization (molar % of each of the extension and terminal units of monomeric flavan-3-ols) of Bordô grape skin……… 124 xvii CAPÍTULO 4. PHENOLIC COMPOSITION OF THE BRAZILIAN SEEDLESS TABLE GRAPE VARIETIES BRS CLARA AND BRS MORENA Table 1. Data for the identification of the anthocyanins in the BRS Morena grape using HPLC-DAD-ESI-MS/MS (positive ionization mode), and molar proportions (mean value ± standard deviation, n = 3) of each anthocyanin in the two parts of grape. Peak numbers as in Figure 1………………………………………………….. 143 Table 2. Data for the identification of the flavonols in the BRS Morena and BRS Clara grapes using HPLC-ESI-MS/MS (negative ionization mode), and molar proportions (mean value ± standard deviation) of each flavonol in both parts of grape (skin and flesh). Peak numbers as in Figure 3……………………..................... 147 Table 3. Data for the identification of the hydroxycinnamic acid derivatives (HCAD) and stilbenes (resveratrol and is 3-glucoside, piceid) in the BRS Morena and BRS Clara grapes using HPLC-ESI-MS/MS (negative ionization mode), and molar proportions of each HCAD, total content of HCAD, and stilbene concentrations (mg/kg) in both parts of the grapes (skin and flesh; mean value ± standard deviation)……………………………………………………………………. 150 Table 4. Monomeric flavan-3-ol and dimmer B-type procyanidin content (MV ± SD, mg/kg grape) in the skin of BRS Morena and BRS Clara grapes………………... 152 Table 5. Structural characterization of the skin proanthocyanidins (MV ± SD: mDP, mean degree of polymerization; % galloylation, % of 3-gallate units; % prodelphinidin, % of epigallocatechin units; and % of each of the flavan-3-ol monomers as extension and terminal units) of BRS Morena and BRS Clara grapes… 153 Table 6. Total phenolic content (mg/kg, as gallic acid equivalents) and antioxidant capacity (mmol/kg, as Trolox equivalents) of BRS Morena and BRS Clara grape skin and flesh…………….…………………………………………….……………... 155 CAPÍTULO 5. ISOLATION AND CHARACTERIZATION OF LATENT AND ACTIVE POLYPHENOLOXIDASE IN BRS CLARA (CNPUV 154-147 X CENTENNIAL SEEDLESS) AND BRS MORENA (MARROO SEEDLESS X CENTENNIAL SEEDLESS) SEEDLESS TABLE GRAPES Table 1. Fractionations of total PPO enzymes from BRS Morena and BRS Clara*.... 172 xviii Table 2. Comparison between the activities of membrane-bound PPO grapes (BRS and BRS Morena Clara) and the percentage of phenolics*…………………………... 175 CAPÍTULO 6. EFEITO DE PECTINASE DE THERMOMUCOR INDICAE- SEUDATICAE N31 SOBRE O TEOR DE FENÓLICOS TOTAIS NA EXTRAÇÃO DO SUCO Tabela 1. Características químicas e bioquímicas parcial da uva Bordô*.................... 196 Tabela 2. Características cromáticas dos mostos das uvas in natura e previamente branqueadas por diferentes tempos................................................................................ 198 Tabela 3. Atividade enzimática das principais enzimas pectinolíticas*....................... 199 Tabela 4. Análises físico-químicas dos sucos de uva*................................................. 202 xix LISTA DE ABREVIATURAS cy cianidina dp delfinidina mv malvidina pg pelargonidina pn peonidina pt petunidina glc glicosídio diglc diglicosídio acglc acetil-glicosídeo cmglc cumaril-glicosídeo K kaempferol Q quercetina I isoramnetina M miricetina L laricitrina S siringetina C (+)-catequina E (-)-epicatequina ECG (-)-galato-3-epicatequina GC (+)-galocatequina EGC (-)-epigalocatequina GCG (+)-galato-3-galocatequina EGCG (-)-galato-3-epigalocatequina PPO polifenoloxidase POD peroxidase SDS detergente iônico dodecil sulfato de sódio L-DOPA L-3,4-dihidroxifenilalanina GRP grape reaction product GSH glutationa reduzida SO2 dióxido de enxofre xx SUMÁRIO INTRODUÇÃO GERAL................................................................................................ 25 CAPÍTULO 1. COMPOSTOS FENÓLICOS EM UVAS E VINHOS: PROPRIEDADES QUÍMICAS E FUNÇÕES BIOLÓGICAS (PARTE I)................ 27 RESUMO............................................................................................................................. 28 ABSTRACT......................................................................................................................... 28 1. INTRODUÇÃO............................................................................................................... 29 2. PANORAMA DA PRODUÇÃO DE UVAS E DERIVADOS NO BRASIL................. 29 3. ASPECTOS GERAIS DAS UVAS, SUCOS E VINHOS............................................... 31 3.1 Uvas...................................................................................................................... 31 3.2 Vinhos................................................................................................................... 33 3.3 Sucos..................................................................................................................... 34 4. ESTRUTURA QUÍMICA DOS PRINCIPAIS COMPOSTOS FENÓLICOS PRESENTES NAS UVAS E PRODUTOS DERIVADOS................................................. 36 4.1 Flavonóides........................................................................................................... 36 4.1.1 Antocianinas.............................................................................................. 36 4.1.2 Flavonóis................................................................................................... 42 4.1.3 Flavan-3-óis.............................................................................................. 44 4.2 Não Flavonóides................................................................................................... 48 4.2.1 Ácidos fenólicos........................................................................................ 48 4.2.2 Estilbenos.................................................................................................. 50 5. COMPOSTOS FENÓLICOS: ESTRUTURA QUÍMICA E SUA RELAÇÃO COM A ATIVIDADE BIOLÓGICA................................................................................................. 53 6. CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS FUTURAS........................................................... 57 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................. 58 CAPÍTULO 2. COMPOSTOS FENÓLICOS EM UVAS E VINHOS: PROPRIEDADES QUÍMICAS E BIOQUÍMICAS E QUALIDADE TECNOLÓGICA (PARTE II).......................................................................................... 70 RESUMO............................................................................................................................. 71 ABSTRACT......................................................................................................................... 71 xxi 1. INTRODUÇÃO............................................................................................................... 72 2. OXIDAÇÃO ENZIMÁTICA DOS COMPOSTOS FENÓLICOS PRESENTES NAS UVAS IN NATURA.............................................................................................................. 72 3. REAÇÕES QUÍMICAS E ENZIMÁTICAS NOS PRODUTOS DERIVADOS DA UVA (SUCOS E VINHOS)................................................................................................ 79 3.1. Oxidação de origem enzimática.......................................................................... 79 3.2. Reações de hidrólise enzimática.......................................................................... 82 3.3. Oxidação de origem não enzimática.................................................................... 84 3.4. Evolução da cor do vinho.................................................................................... 85 4. CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS FUTURAS.......................................................... 87 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................ 88 CAPÍTULO 3. PHENOLIC COMPOSITION OF THE EDIBLE PARTS (FLESH AND SKIN) OF BORDÔ GRAPE (V. LABRUSCA) USING HPLC-DAD-ESI- MS/MS…………………………………………...……………………………………...... 96 ABSTRACT………………………………………………………………………….…… 97 1. INTRODUCTION……………………………………………………………………... 98 2. MATERIALS AND METHODS……………………………….……………………… 99 2.1 Chemicals…………………………………………………………..…………… 99 2.2 Grapes……………………………………………….……………….…………. 100 2.3 Sample preparation………………………………………………….………….. 101 2.4 Total phenolic content and antioxidant capacity…………………………….…. 102 2.5 HPLC-DAD-ESI-MS/MS Identification of Bordô grape phenolic compounds... 102 2.6 HPLC-DAD Quantification of Bordô grape phenolic compounds……………... 104 2.7 Identification and quantification of Bordô grape skin flavan-3-ols using Multiple Reaction Monitoring HPLC-ESI-MS/MS……..………………………….. 104 3. RESULTS AND DISCUSSION……………………………………..………………… 105 3.1 Anthocyanins……………………………………………………………….…... 105 3.2 Flavonols………………………………………………………………….……. 113 3.3 Hydroxycinnamic acid derivatives (HCAD) and stilbenes……………….……. 119 3.4 Flavan-3-ols……………………………………………………………….……. 123 3.5 Total phenolic content and antioxidant capacity………………………….……. 125 4. CONCLUSION………………………………………………………………...….…… 126 xxii 5. ACKNOWLEDGMENTS..……………………...………………………………..…… 127 6. REFERENCES…………………………………………………………………….…... 127 CAPÍTULO 4. PHENOLIC COMPOSITION OF THE BRAZILIAN SEEDLESS TABLE GRAPE VARIETIES BRS CLARA AND BRS MORENA……………........ 132 ABSTRACT………………………………………………………………………………. 133 1. INTRODUCTION…………………………………………………………………...… 134 2. MATERIALS AND METHODS………………………...………………………..…… 135 2.1 Chemicals…………………………………………………………………..…… 135 2.2 Grapes……………………………………………………………………….….. 135 2.3 Sample preparation………………………………………………………….….. 136 2.4 Total phenolic content and antioxidant capacity………………………….……. 137 2.5 HPLC-DAD-ESI-MS/MS identification of the grapes’ phenolic compounds.… 138 2.6 HPLC-DAD quantification of grape phenolic compounds…………………….. 139 2.7 Identification and quantification of grape skin flavan-3-ols using Multiple Reaction Monitoring HPLC-ESI-MS/MS……………………………………...…... 139 3. RESULTS AND DISCUSSION……………………………………..………………… 141 3.1 Anthocyanins……………………………………………………….....………... 141 3.2 Flavonols…………………………………………………………….….………. 145 3.3 Hydroxycinnamic acid derivatives (HCAD) and stilbenes……….…….………. 149 3.4 Flavan-3-ols……………………………………………………….….……….. 152 3.5 Total phenolic content and antioxidant capacity……………….….…….……… 154 4. CONCLUSION………………………………………………………………………… 156 5. ACKNOWLEDGMENTS..…..……………...………………………………………… 156 6. REFERENCES………………...……………………………………………………….. 156 CAPÍTULO 5. ISOLATION AND CHARACTERIZATION OF LATENT AND ACTIVE POLYPHENOLOXIDASE IN BRS CLARA (CNPUV 154-147 X CENTENNIAL SEEDLESS) AND BRS MORENA (MARROO SEEDLESS X CENTENNIAL SEEDLESS) SEEDLESS TABLE GRAPES………………………... 161 ABSTRACT…………………………………………………………………………..…... 162 1. INTRODUCTION………………………………………………………...…………… 163 2. MATERIALS AND METHODS………………………………………………………. 164 xxiii 2.1 Grapes.................................................................................................................... 164 2.2 Study of enzymatic extraction protocol………………………………………..... 165 2.2.1 Extraction of PPO from grapes in their active form…………………..... 165 2.2.2 Extraction of PPO from grapes in their latent form…………………..… 166 2.3 Enzyme activities.......................................................................................... 166 2.4 Determination of total proteins.............................................................................. 167 2.5 Determination of phenolic compounds present in the enzyme extract……..…… 167 2.6 SDS-Polyacrylamide gel electrophoresis.............................................................. 167 2.7 Native-Page gel electrophoresis………………………………..……………….. 168 2.8 Effects of pH and temperature on enzyme activity……………..………………. 168 2.9 Effects of pH and temperature on enzyme stability……………..……………… 168 3. RESULTS AND DISCUSSION…………………………………………………...…… 169 3.1 Study of enzymatic extraction protocol for the PPO enzymes of the grapes… 169 3.2 PPO physical-chemical characterization............................................................... 176 4. CONCLUSION................................................................................................................. 180 5. ACKNOWLEDGMENTS................................................................................................ 181 6. REFERENCES................................................................................................................. 181 CAPÍTULO 6. EFEITO DE PECTINASE DE THERMOMUCOR INDICAE- SEUDATICAE N31 SOBRE O TEOR DE FENÓLICOS TOTAIS NA EXTRAÇÃO DO SUCO............................................................................................................................ 186 RESUMO.............................................................................................................................. 187 ABSTRACT.......................................................................................................................... 187 1. INTRODUÇÃO................................................................................................................ 188 2. MATERIAIS E MÉTODOS............................................................................................. 189 2.1 Produção do preparado enzimático experimental................................................ 189 2.2 Atividade das principais pectinases presentes no preparado enzimático PEC- N31.............................................................................................................................. 189 2.3 Análises físico-químicas e bioquímicas parciais da matéria-prima....................... 190 2.3.1 Análises físico-químicas............................................................................ 191 2.3.2 Análises bioquímicas................................................................................. 191 xxiv 2.4 Branqueamento a vapor das uvas................................................................. 192 2.4.1 Análises de cor.......................................................................................... 193 2.4.2 Determinação do teor de metanol............................................................ 193 2.5 Elaboração dos sucos............................................................................................ 194 2.6 Efeito do preparado enzimático PEC-N31 sobre o teor de fenólicos totais, teor de metanol e cor durante extração de suco.................................................................. 194 2.7 Análises físico-químicas dos sucos produzidos.................................................... 195 2.8 Análise estatística.................................................................................................. 195 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO..................................................................................... 195 3.1 Caracterização físico-química e bioquímica parcial da uva.................................. 195 3.2 Branqueamento das uvas como pré-tratamento para elaboração de suco............. 196 3.3 Efeito do preparado enzimático PEC-N31 sobre os compostos fenólicos durante extração do suco.................................................................................... 198 3.4 Padrões de identidade e qualidade dos sucos............................................... 202 4. CONCLUSÃO................................................................................................................. 202 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................. 203 CONCLUSÕES GERAIS.................................................................................................. 207 ANEXO. Especificação do preparado enzimático comercial Vinozym Vintage FCE........ 208 25 1. INTRODUÇÃO GERAL Os compostos fenólicos são uma classe de compostos naturais amplamente distribuídos em todas as plantas, onde desempenham importantes atividades fisiológicas. Nas frutas e produtos derivados, estes compostos estão diretamente envolvidos nas características sensoriais como cor, sabor, amargor e sensação de adstringência e são reconhecidos como componentes promotores da saúde humana. As uvas e os produtos derivados, especialmente sucos e vinhos tintos, são considerados uma das mais importantes formas de incorporar polifenóis na dieta. A grande diversidade entre as variedades resulta em uvas e produtos com diferentes características, tanto de sabor quanto de coloração, o que certamente está associado com o conteúdo e o perfil dos polifenólicos. A maior parte dos dados disponíveis na literatura sobre a composição fenólica nestes produtos é proveniente dos tradicionais países produtores de vinhos da Europa no qual são admitidos apenas produtos originários de uvas viníferas (Vitis vinifera). Em contraste, cultivares de uvas americanas e híbridas, às vezes complexas, envolvendo várias espécies americanas e também Vitis vinifera representam mais do que 85% do volume de uvas processadas no Brasil. No estado de São Paulo, a expressiva produção de uvas (177.538 toneladas/ano) destina-se basicamente ao consumo in natura. Observa-se, contudo, que nos últimos quatro anos ocorreu uma queda na produção (aproximadamente 8%) devido tanto a fatores climáticos desfavoráveis, a crise econômica mundial em 2009, como pelo plantio de novas cultivares menos produtivas, como as uvas sem sementes (apirênicas), que vem despertando o interesse dos consumidores. Além disso, houve um aumento na área plantada com uvas destinadas ao processamento, decorrente de um esforço conjunto de várias instituições que objetivam revitalizar a vitivinicultura no Estado. Essa iniciativa é muito importante para o crescimento econômico do Estado, uma vez que mais de 50% do consumo de vinho do Brasil está em São Paulo e a demanda por sucos de uva integral tem aumentado substancialmente, tanto no mercado interno quanto externo, devido ao apelo de produto saudável. Esta atividade econômica tem gerado muitos empregos e garantido a sustentabilidade tanto de pequenas propriedades quanto de grandes empreendimentos focados na produção de vinhos e sucos de uvas integrais. O conhecimento qualitativo e quantitativo dos compostos bioativos presentes nas uvas brasileiras é de fundamental importância para colocar a qualidade dos produtos em um patamar internacional. Além disso, o avanço do conhecimento das técnicas de processamento 26 associado ao atendimento das demandas do mercado por novos produtos que agreguem às características nutricionais básicas, com fatores de benefícios à saúde, pode contribuir para o crescimento deste setor. O laboratório de Bioquímica e Microbiologia Aplicada IBILCE- UNESP, de São José do Rio Preto, SP, sob coordenação do Prof. Roberto da Silva e da Profa. Dra. Eleni Gomes, juntamente com grupo de pesquisa coordenado pelo Prof. Dr. Isidro Hermosín Gutiérrez da Universidade de Castilla La Mancha – UCLM (Ciudad Real, Espanha), que é um renomado especialista na área de enologia e com expressiva experiência em análise de compostos fenólicos presentes em uvas e vinhos, estão empenhados em auxiliar neste sentido. Assim, este estudo objetivou a caracterização fenólica de uvas de mesa apirênicas e destinada ao processamento, cultivadas na região do Noroeste Paulista. Além disso, foram realizados estudos sobre as características das polifenol oxidases endógenas associadas aos processos de deterioração das uvas de mesa apirênicas; bem como foi avaliado o efeito de pectinase de Thermomucor indicae-seudaticae N31 sobre o teor de compostos fenólicos na extração de suco de uva integral. Os resultados obtidos foram organizados em seis capítulos para melhor distribuição e entendimento dos assuntos abordados. No Capítulo 1, é apresentada uma revisão sobre as características químicas dos compostos bioativos presentes nas uvas e nos produtos derivados, bem como um entendimento atual sobre a influência destas estruturas sobre a habilidade dos mesmos em promover a saúde. No Capítulo 2, uma discussão dos principais processos bioquímicos e químicos de uvas e produtos derivados foi apresentada. A caracterização fenólica da uva Bordô (Vitis labrusca) bem como das uvas apirênicas BRS Clara (CNPUV 154-147 x Centennial Seedless) e BRS Morena (Marroo Seedless x Centennial Seedless) foram apresentadas nos Capítulos 3 e 4, respectivamente. Como os compostos fenólicos são muito suscetíveis a processos oxidativos enzimáticos que alteram as características nutricionais e organolépticas das frutas, as caracterizações bioquímicas parciais das polifenol oxidases presentes nas uvas apirênicas foram caracterizadas na forma ativa e latente no Capítulo 5. Finalmente, para melhoria dos sucos elaborados com a uva Bordô quanto ao aspecto nutricional, um tratamento térmico associado a outro enzimático também foi realizado no Capítulo 6. O efeito de pectinase produzida pelo fungo Thermomucor indicae-seudaticae N31 sobre o teor de compostos fenólicos na extração do suco foi testado. CAPÍTULO 1 COMPOSTOS FENÓLICOS EM UVAS E VINHOS: PROPRIEDADES QUÍMICAS E FUNÇÕES BIOLÓGICAS (PARTE I) 28 COMPOSTOS FENÓLICOS EM UVAS E VINHOS: PROPRIEDADES QUÍMICAS E FUNÇÕES BIOLÓGICAS (PARTE I) Ellen Silva LAGO-VANZELA a, Eleni GOMES b; Isidro HERMOSÍN-GUTIÉRREZc; Roberto DA-SILVAd aLaboratório de Bioquímica e Microbiologia Aplicada, bDepartamento de Biologia; dDepartamento de Química e Ciências Ambientais, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, 15054-000, São José do Rio Preto, SP, Brasil. cInstituto Regional de Investigación Científica Aplicada, Escuela Universitaria de Ingeniería Técnica Agrícola, Universidad de Castilla-La Mancha, 13071 Ciudad Real, Spain. RESUMO A uva é uma das frutas mais consumidas no mundo, tanto na forma in natura, como na forma processada e também se destaca como fonte de compostos fenólicos antioxidantes importantes em termos de saúde humana. Levando em consideração inúmeros estudos que especulam a relação entre a estrutura química e sua capacidade antioxidante, este artigo revisa as características químicas dos compostos bioativos e apresenta um entendimento da influência destas estruturas sobre a habilidade em agir como seqüestrante de radicais livres, quelante de íons metálicos e efeito atenuante em espécies reativas de oxigênio e nitrogênio, associadas com patologias crônicas e degenerativas. ABSTRACT The grape is one of the most widely consumed fruits in the world, both in natura, and in processed forms. It also stands out as a source of antioxidant phenolic compounds that are important to human health. After taking into account numerous studies that examine the relationship between chemical structures and antioxidant capacity, this article reviews the chemical characteristics of bioactive compounds and presents findings on the way in which these structures act as free radical scavengers and redox active metal chelators, as well as their abilities to attenuate the effects of reactive oxygen and nitrogen species, which are associated with chronic and degenerative diseases. 29 1. INTRODUÇÃO Estudos epidemiológicos e estudos de intervenção apontaram uma relação inversa entre a ingestão de frutas e hortaliças, com a incidência de doenças degenerativas, como o câncer e as doenças cardiovasculares. Há fortes evidências de que a ação sinergística de diversos constituintes bioativos presentes nestes alimentos, tais como vitamina C, vitamina E, carotenóides e flavonóides, seja responsável por estes benefícios a saúde. Está bem estabelecido e amplamente aceito que o consumo de uvas e produtos derivados constitui uma das mais importantes formas de incoporar flavonóides, e outros compostos não flavonóides, à dieta humana. Resultados de pesquisas sugerem que muitos destes compostos são ótimos antioxidantes capazes de seqüestrar radicais livres, quelar íons metálicos com atividade redox e atenuar outros processos envolvidos com espécies reativas de oxigênio e nitrogênio, associadas com patologias crônicas e degenerativas. Nos últimos 20 anos um número considerável de estudos in vitro gerou informações consistentes de que a atividade antioxidante de vários compostos fenólicos originários das plantas (flavonóides e não flavonóides) bem como seus metabólitos depende, a princípio, do arranjo de grupos funcionais sobre a estrutura nuclear. As evidências suportam que o número, posição e tipo de substituintes da molécula são determinantes na capacidade antioxidante de um composto. A constatação in vivo das atividades biológicas benéficas à saúde requer ainda extensivos estudos, uma vez que estes compostos são, muitas vezes, metabolizados em grande extensão in vivo não correspondendo fielmente às formas bioativas encontradas inicialmente nas plantas. Nessa perspectiva, este artigo revisa as características químicas dos compostos bioativos presentes nas uvas e apresenta um entendimento atual, porém não conclusivo, sobre a influência destas estruturas sobre a habilidade dos mesmos em promover a saúde. 2. PANORAMA DA PRODUÇÃO DE UVAS E DERIVADOS NO BRASIL A videira é uma planta pertencente à família das Vitaceae, gênero Vitis e subgênero Euvitis, que correspondente a maior parte das vinhas cultivadas no mundo. Dentre elas destacam-se o ramo Euro-Asiático que contém a Vitis vinifera L., conhecida como produtora de uvas finas, e o ramo Americano que constitui a base para a obtenção de porta-enxertos utilizados na viticultura (BOULTON et al., 1995). 30 Esta cultura corresponde a uma das mais antigas do mundo e foi introduzida no Brasil no século XVI no atual estado de São Paulo. No Rio Grande do Sul, os primeiros vinhedos de Vitis vinifera foram implantados pela missão jesuítica no século XVII e as uvas americanas somente foram introduzidas nas primeiras décadas do século XIX. Neste período, surgiram as doenças fúngicas que dizimaram a viticultura colonial. Apenas cultivares resistentes às doenças, com destaque para a Isabel (Vitis labrusca), passaram a ser plantadas nas diversas regiões do país e tornaram-se a base do desenvolvimento da viticultura comercial nos estados de São Paulo e Rio Grande do Sul (CATALUÑA, 1998; PROTAS; CAMARGO; MELO, 2008). Este panorama modificou-se somente a partir do início do século XX com a reintrodução de variedades viníferas que então se difundiram principalmente na região Sul do país (CATALUÑA, 1998; PROTAS; CAMARGO; MELO, 2008). Nas outras regiões, principalmente as de clima tropical, a viticultura foi efetivamente desenvolvida a partir da década de 1960 com o plantio de vinhedos comerciais de uva de mesa (CAMARGO, 2003). Estes fatos históricos associados à extensa área de vinhedos no país resultaram em uma viticultura muito diversificada e complexa, no qual se pode encontrar vários centros produtivos de uva, cada um com sua realidade climática, fundiária, tecnológica, humana e mercadológica (PROTAS; CAMARGO; MELO, 2008). Aproximadamente 50% da produção de uva no país são destinadas ao processamento na forma de sucos e vinhos, com plantio em regiões emergentes do Brasil, que abrangem desde o Rio Grande do Sul até aS regiões Sudeste e Nordeste, passando por pólos de importância crescente nos Estados de Minas Gerais, São Paulo, Mato Grosso e Goiás. Os sucos de frutas tem sido incorporados ao cotidiano das pessoas devido em grande parte a redução de preço e praticidade de consumo (MAIA et al., 2009), o que constitui um nicho de mercado economicamente importante para a viticultura nacional (BARBOSA, 2010). Devido à crescente importância atribuída aos flavonóides nos últimos anos, decorrente de suas ações relacionadas à prevenção de doenças degenerativas, maior apelo comercial tem sido dado aos sucos integrais naturais (IBRAVIN, 2010). Os avanços agrícolas associados à divulgação dos efeitos benéficos atribuídos ao consumo comedido de vinho também têm resultado em um maior interesse do consumidor brasileiro pelo produto. Em decorrência, o setor vitivinícola tem grande potencial de crescimento, mas deve-se observar que o país apresenta uma característica atípica em relação aos países tradicionalmente produtores de vinhos da Europa como França, Itália, Espanha, Portugal e Alemanha. Nestes, o cultivo de uva é praticamente restrito às uvas Vitis vinifera, uma vez que 31 a legislação européia apenas permite a elaboração de vinhos a partir desta espécie e/ou de seus hídridos primários (cruzamento entre Vitis viniferas) (CATALUÑA, 1998). No Brasil, a maior parte dos vinhos produzidos é originária de uvas americanas (como Vitis labrusca e Vitis bourquina) e híbridas complexas. Não sendo de longa maturação, estes produtos apresentam preços acessíveis e atendem ao paladar de consumidores específicos de cada região (GUERRA et al., 2009). Todavia, vinhos finos de Vitis vinifera, elaborados a partir de viníferas tintas Cabernet Sauvignon, Merlot, Cabernet Franc e Tannat e, de viníferas brancas Moscato, Riesling Itálico, Trebbiano e Chardonnay, já estão sendo produzidos por vinícolas brasileiras e começam a ganhar espaço no mercado internacional. O Instituto Brasileiro de Vinho (IBRAVIN) projeta que a participação dos vinhos finos em relação ao total dos vinhos produzidos no país deve passar dos atuais 18% para 80% até 2025, sendo as uvas híbridas, ou americanas, destinadas mais a produção de vinho de mesa e sucos (BARBOSA, 2010). Além disso, o Brasil vem se destacando mundialmente como produtor, consumidor e exportador de espumantes. Ao contrário do segmento de vinhos finos, no qual os estrangeiros representam 80% das vendas, nos espumantes o domínio é nacional, com apenas 20% do mercado representado pelos importados. Além das uvas viníferas, como Shiraz e Cabernet Sauvignon, produtores estão elaborando este produto a partir da uva Niágara, o que possibilita agregar valor e diversificar a renda. O crescente interesse dos brasileiros pela bebida faz as vinícolas nacionais investirem para atender ao consumo potencial. O IBRAVIN estima um crescimento de 15% ao ano, com um movimento de mais de 20 milhões de garrafas anualmente (FREITAS, 2011). Para tanto, o investimento em recursos tecnológicos, com foco na melhoria da qualidade do produto, é imprescindível para favorecer a competitividade e sustentabilidade do setor vitivinícola brasileiro (BARBOSA, 2010). 3. ASPECTOS GERAIS DAS UVAS, SUCOS E VINHOS 3.1 Uvas A uva constitui-se de uma parte herbácea chamada de engaço cuja extremidade é chamada de pedicelo (canal de transporte de elementos nutritivos) e outra parte carnosa denominada de baga, que está ligada ao engaço pelo pedicelo. O feixe que fica preso ao pedicelo, quando se destaca a baga, é chamado de pincel (Figura 1) (BOULTON, 1995). 32 Figura 1. Organização estrutural do cacho da uva (GOMES, 2006). O engaço é rico em água, resinas, minerais e taninos adstringentes e, devido a esta composição, é normalmente separado da baga antes do processamento da fruta para não causar excesso de adstringência e sabor desagradável ao produto final. Embora a proporção de componentes da baga possa variar dependendo da variedade da uva, grau de maturação e produtividade por planta, em geral apresenta a seguinte composição (% em peso úmido): 70 a 85, de água; 12 a 15, açúcares redutores; 0,4 a 1,3, ácidos orgânicos; 0,3 a 0,5, substâncias minerais; 0,03 a 0,17 compostos nitrogenados e outros componentes que aparecem em quantidades mínimas. Em uvas pirênicas, as sementes ocupam geralmente de 4 a 13% do peso total da baga e, de acordo com a fecundação, são encontradas em número variável (1 a 4). A polpa representa, em média, de 74 a 88% do peso úmido total da baga, contribuindo significativamente para o rendimento do mosto, enquanto a casca corresponde de 8 a 13% do peso úmido total (BOULTON, 1995). A casca é o envoltório protetor composto por três camadas sobrepostas: a camada externa (cutícula ou epiderme), a epiderme intermediária, com uma ou duas camadas e a camada interna, a hipoderme (Figura 2). A epiderme é formada por uma camada de ácidos graxos hidroxilados chamada cutina que por sua vez é recoberta com uma camada fina de ceras hidrofóbicas, a pruína. A camada de pruína tem a função de proteger as células da baga contra os efeitos do calor e umidade, e também de evitar a penetração de microrganismos no interior da baga. A hipoderme é a região da casca onde se encontram a maioria dos compostos fenólicos das uvas tintas (LECAS; BRILLOUET, 1994). A síntese e distribuição dos compostos fenólicos de cada espécie vegetal são determinadas por sistemas intrínsecos de enzimas geneticamente controlados (KUHNAU, 1976). Por outro lado, as quantidades encontradas são fortemente influenciadas por fatores extrínsecos como estação do ano (clima), incidência de radiação UV, composição do solo. 33 Figura 2. Organização estrutural da baga de uva. Em geral, os compostos fenólicos encontrados nas uvas podem ser divididos em dois grandes grupos: • flavonóides: localizados principalmente na casca, mas também na polpa, entre os quais destacam-se as antocianinas, os flavonóis e os flavan-3-óis; • não flavonóides: encontrados principalmente na casca e semente, compreendendo os ácidos fenólicos, benzóicos e cinâmicos, além de outros derivados fenólicos, como os estilbenos, com destaque para o resveratrol (JACKSON, 1994). De acordo com a coloração, as bagas podem ser denominadas: brancas ou verdes, rosadas e tintas ou negras, com grandes variações de tons. Entre os compostos que contribuem para a coloração das uvas estão os flavonóides, metabólitos secundários sintetizados pelas plantas (POURCEL et al., 2007). 3.2 Vinhos A legislação brasileira vigente define que “vinho de mesa de viníferas” é o produto elaborado exclusivamente com uvas das variedades Vitis vinífera enquanto o “vinho de mesa de americanas” ou “vinho comum” é definido como o produto elaborado com uvas do grupo das uvas americanas e/ou híbridas, podendo conter em sua composição, vinhos de variedades viníferas. É considerada uma bebida obtida da fermentação alcoólica completa ou parcial da uva fresca, esmagada ou não, ou do mosto de uvas sãs, frescas e maduras, com um conteúdo de álcool adquirido de no mínimo 7% em volume (v/v a 20ºC) e outros produtos da fermentação alcoólica (BRASIL, 1988). 34 O componente majoritário do vinho é a água com 75 a 90% e esta variação de 15% deve-se pelos compostos que constitui a chamada fração minoritária do vinho, entre os quais se incluem os compostos fenólicos, ácidos orgânicos, alcoóis superiores, sais minerais, ésteres, glicerol, aminoácidos, entre outros. Embora estes compostos estejam presentes em baixas concentrações são capazes de conferir aos vinhos características muito importantes e diferenciadas de um produto para outro. O segundo maior constituinte é o álcool etílico que, de acordo com o tipo de vinho, varia entre 8 e 13%, podendo as vezes ser maior. O terceiro componente no vinho seco é o açúcar. O seu conteúdo em peso seco no vinho tipo seco é geralmente menor que 2 g/L enquanto em vinho botrytizado doce, por exemplo, o açúcar pode chegar a cerca de 200 g/L, em virtude do uso de vindimas intencionalmente tardias, tal como a Sauternes da França. Neste caso, um ciclo climático apropriado, suficientemente úmido seguido por um período seco, propicia a infecção das uvas (conhecida como podridrão nobre) por um fungo denominado Botrytis cinérea, que dá nome ao vinho. O Botrytis torna a casca da uva permeável para que ocorra a rápida perda de água e, em consequência, haja uma concentração do açúcar em aproximadamente 30% ou mais. O processamento destas bagas intencionalmente murchas resulta na produção de vinhos mais doces após a fermentação (BOULTON et al., 1995). Os compostos fenólicos responsáveis em grande parte pela coloração dos vinhos ocorrem nos tintos em teores significativamente maiores (1000-4000 mg/L) que nos brancos (200-300 mg/L). Nos vinhos tintos, os compostos predominantes são os ácidos fenólicos, resveratrol, flavonóis, flavanóis, procianidinas (taninos) e antocianinas (500-900 mg/L) (DREOSTI, 2000; HOLLMAN; ARTS, 2000; ROBARDS; ANTOLOVICH, 1997). Estes compostos além de contribuírem para a qualidade organoléptica dos vinhos (cor, aroma e sabor) e participarem dos fenômenos de turvamento, constituem o principal reservatório de substâncias autooxidáveis que protegem os vinhos contra fenômenos de oxidação (PERES, 2007). 3.3 Sucos A lei brasileira define suco de uva como uma bebida não fermentada, não alcoólica, obtida da parte comestível da uva sã, fresca e madura que resulta em produto com coloração, aroma e sabor característicos da fruta de origem, podendo ainda ser classificado da seguinte forma (BRASIL, 1997): • suco integral: comercializado na sua concentração natural e sem adição de açúcar; • suco desidratado: produto sob o estado sólido, obtido pela desidratação do suco integral; 35 • suco reconstituído: produto obtido pela diluição do suco concentrado ou desidratado, até a concentração original do suco integral ou ao teor de sólidos solúveis totais mínimo estabelecido nos respectivos padrões de identidade e qualidade (BRASIL, 2000). Além destes, o mercado atual conta com as classes de sucos convencionais e orgânicos. A composição química dos sucos depende inicialmente da variedade de uva utilizada no processo, bem como de sua forma de cultivo e do seu adequado estádio de maturação, que deve apresentar uma relação equilibrada entre açúcar, expresso em sólidos solúveis totais, e acidez, expressa em ácido tartárico. Além disso, as uvas devem apresentar um bom rendimento em mosto, aroma e sabor agradáveis, bem como alto teor de compostos fenólicos (MARZAROTTO, 2005). Os sucos de uva produzidos em países com tradição na fabricação de vinho são elaborados com uvas Vitis vinifera. Estas uvas normalmente perdem o frescor e passam a apresentar gosto de cozido e falta de aroma quando exposta a tratamentos térmicos. As variedades de Vitis labrusca e seus híbridos constituem a base da produção de suco de uva no Brasil devido as suas ótimas características organolépticas. Estas variedades apresentam a vantagem de manter seu refrescante sabor mesmo quando exposta ao calor durante as etapas de processamento (MARZAROTTO, 2005). As principais variedades utilizadas na produção de suco no Brasil são Concord, Isabel, Niágara, Bordô e Jacquez e esta escolha é marcadamente influenciada pelo hábito e paladar particular de cada região do país (RIZZON; MANFROI; MENEGUZZO, 1998; RIZZON; MIELE, 1995). O suco de uva é considerado uma fonte importante de compostos fenólicos e as discrepantes variações nos teores de compostos fenólicos presentes nos sucos disponíveis no mercado também são decorrentes das diferenças inerentes de cada espécie e dos diferentes tratamentos a que são submetidos durante a produção do suco. Dentre os tratamentos destacam-se o tipo de extração, o tempo de contato entre o mosto e as partes sólidas da uva (casca e sementes), o tipo e intensidade da prensagem, o tratamento térmico, o tratamento enzimático, a adição de dióxido de enxofre e/ou a de ácido tartárico (MALACRIDA; MOTA, 2005). Para obtenção de um produto de qualidade, atualmente produtores artesanais e industriais buscam otimizar os processos tecnológicos de forma a extrair os compostos característico do suco, com o mínimo de prejuízos aos compostos bioativos de interesse, e assegurar a conservação do suco até o momento do consumo sem a necessidade da adição de conservantes (RIZZON; MENEGUZZO, 2007). Nestes produtos, sua preservação fundamenta-se no princípio de esterilização a alta temperatura e tempo curto associado a um envase asséptico. Entretanto, o uso combinado de métodos físicos e químicos é também permitido como alternativa de conservação dos sucos (BRASIL, 1997). Os agentes químicos 36 mais utilizados para esta finalidade são o ácido sórbico e o dióxido de enxofre proveniente da dissociação do bissulfito ou metabissulfito de sódio ou potássio (MAIA et al., 2009). 4. ESTRUTURA QUÍMICA DOS PRINCIPAIS COMPOSTOS FENÓLICOS PRESENTES NAS UVAS E PRODUTOS DERIVADOS 4.1 Flavonóides A estrutura dos flavonóides é baseada no esqueleto de 15 carbonos, caracterizado por dois anéis aromáticos interligados por uma cadeia de três átomos de carbono, que formam um heterociclo oxigenado (C6-C3-C6). Dependendo do estado de oxidação do anel central C os flavonóides podem ser do tipo 2-fenilbenzopirano (Figura 3A) ou do tipo 2-fenilbenzopirona (Figura 3B) (ANDERSEN; JORDHEIM, 2006). Em condições ácidas, duas bandas de absorção são características dos flavonóides: a primeira (Banda I) com máximo de absorção entre 300 e 550 nm, presumidamente resultante do anel B da molécula e a segunda (Banda II) com máximo de absorção entre 240 e 285, supostamente resultante do anel A da molécula (ROBARDS; ANTOLOVICH, 1997). Figura 3. Estrutura básica dos flavonóides: 2-fenilbenzopirano (A) e 2-fenilbenzopirona (B) (HUBER, 2007). 4.1.1 Antocianinas As antocianinas estão presentes principalmente nas cascas e nas três ou quatro primeiras camadas das células hipodérmicas, em escala subcelular, nos vacúolos celulares das uvas de castas tintas (BROUILLARD, 1982; PINELO; ARNOUS; MEYER, 2006) e, em menor proporção, na polpa de algumas variedades (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009b; SANTIAGO et al., 2008). A estrutura básica destes compostos é a aglicona, denominada antocianidina, e constitui-se de dois anéis fenólicos A e B e um anel pirano heterocíclico C (Tabela 1). Esta estrutura forma o cromóforo de absorção de luz que confere a coloração 37 atrativa às uvas, com nuanças de cores entre vermelho e azul (HARBORNE; WILLIAMS, 1995). Na literatura já foram mencionadas 23 antocianidinas que diferem entre si pelo número e posição dos grupos hidroxilas e/ou metoxilas, porém apenas seis delas são mais frequentemente encontradas nos alimentos: cianidina, peonidina, delfinidina, petunidina, malvidina e pelargonidina (CASTAÑEDA-OVANDO et al., 2009). Tabela 1. Antocianidinas (forma de cátion flavílio) mais comuns presentes nas uvas. Nas uvas há predominância das cinco primeiras antocianidinas citadas, porém, em algumas uvas de variedades não viníferas (WANG; RACE; SHRIKHANDE, 2003) e na variedade Garnacha Tintorera (Vitis Vinifera) (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009b) também foram encontradas pequenas quantidades de antocianinas derivadas da pelargonidina. Embora esta antocianina não seja predominante em uvas, é frequentemente encontrada em outras frutas tais como morango (CRESPO et al., 2010), açaí e acerola (ROSSO et al., 2008). A deficiência eletrônica do cátion flavílio produz a elevada reatividade das agliconas livres, de tal maneira que na natureza encontram-se unidas a uma ou mais moléculas de açúcar (glicose, arabinose, ramnose, galactose, etc ou di- e trissacarídeos constituídos por estes açúcares) por meio de uniões hemiacetálicas (BROUILLARD, 1982). De acordo com o número de açúcares ligados a antocianidina, as antocianinas formadas podem ser classificadas como mono-, di- e triglicosídeos (MAZZA; MINIATI, 1993). A glicose é o açúcar majoritário unido às antocianidinas das uvas e as posições mais frequentes de união entre estas moléculas são a C-3 do anel C e a C-5 do anel A (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009b) e, com raras exceções, estão ligados a posição C-7 do anel A (Figura 4) (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2010b). A presença de açúcares ligados às posições 3, 7 e 5’ do anel B das antocianidinas é Estrutura básica da aglicona Antocianidinas Grupos substituintes Cianidina (Cy) Delfinidina (Dp) Malvidina (Mv) Pelargonidina (Pg) Peonidina (Pn) Petunidina (Pt) R1 = OH; R2 = H R1 = R2 = OH R1 = OCH3; R2 = OCH3 R1 = R2 = H R1 = OCH3; R2 = H R1 = OH; R2 = OCH3 38 mais raro devido a impedimentos estéricos dificultarem a glicosilação nestas posições (BROUILLARD, 1982). Em muitos casos, os açúcares das antocianinas estão esterificados com ácidos orgânicos, os quais estão, normalmente, ligados ao carbono 6 da molécula de açúcar (BROUILLARD, 1982). Dentre os ácidos orgânicos mais comumente encontrados estão o ácido acético, ácido p-cumárico, ácido caféico, entre outros. Assim sendo, as antocianinas não esterificadas são denominadas antocianinas não aciladas, enquanto as esterificadas com um ou mais ácidos fenólicos são denominados antocianinas monoaciladas e poliaciladas, respectivamente, podendo apresentar denominações diferenciadas de acordo com o ácido ligado à molécula de açúcar (Figura 4) (ANDERSEN; JORDHEIM, 2006). Figura 4. Estrutura de algumas antocianinas derivadas da uva. Nas antocianinas, o comprimento de onda de absorção no espectro de luz visível é alterado pelo número de substituintes presentes no anel B e, em menor proporção, pelo tipo dos mesmos. Desta maneira, à medida que aumenta o número de substituintes no anel B, há um deslocamento da Banda I para comprimentos de onda entre 8 a 12 nm maiores. Como forma de exemplificação, as antocianidinas trisubstituídas (Delfinidina - Dp, Petunidina - Pt e 39 Malvidina - Mv) originam antocianinas com máximo de absorção na região do visível a valores aproximadamente 10 nm maiores do que as correspondentes antocianinas com antocianidinas disubstituídas (Cianidina - Cy e Peonidina - Pn) (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2010b). Os monoglicosídeos que não contêm substituição (Pelargonidina - Pg) apresentam o menor comprimento de onda (502 nm) (Figura 5A). Estas alterações nos comprimentos de onda explicam as modificações na cor da molécula. Em geral, o aumento da hidroxilação induz a um deslocamento da cor vermelha para a azul (Pelargonidina Cianidina Delfinidina), que é comprovado por um deslocamento batocrômico no comprimento de onda máximo de absorção do espectro do pigmento. Por outro lado, o aumento do grau de metoxilação (Peonidina Petunidina Malvidina) reverte esta tendência, conduzindo a colorações tendendo ao vermelho ou violeta (CARREÑO; MARTÍNEZ, 1995; FREITAS; MATEUS, 2006). O grau e posição da glicosilação no anel B também exercem profunda influência na coloração das antocianinas. A coloração é alterada devido a um deslocamento hipsocrômico do máximo de absorção visível de aproximadamente 10 nm com relação à aglicona correspondente. No entanto, este deslocamento é maior quando há a transformação da aglicona em monoglicosídeo do que quando há a transformação de mono- para diglicosídeo e assim sucessivamente. A posição da glicosilação também afeta outras zonas do espectro no visível de tal maneira que auxilia na identificação das antocianinas mono- e diglicosiladas: as antocianinas 3-monoglicosídeos apresentam um ombro na região de 440 nm característico que está ausente nas 3,5-diglicosídeos (Figura 5B). Por outro lado, o tipo de açúcar normalmente não interfere no espectro UV-Vis das antocianinas (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2010b; DURST; WROLSTAD, 2010). A esterificação dos açúcares também influencia marcadamente na cor das antocianinas. Delgado-Vargas; Jiménez; Paredes-López (2000) demonstraram que em pH acima de 4, a acilação pode produzir uma banda de absorção no ultra-violeta maior que a observada nas antocianinas não aciladas, nas mesmas condições de pH, na região entre 310 e 320 nm (BAUBLIS; SPOMER; BERBER-JIMENEZ, 1995). No entanto, deve-se ressaltar que os derivados acetilados das antocianinas apresentam espectros UV-vis em meio ácido (pH < 2, predominando a forma de cátion flavílio) praticamente iguais aos derivados não acetilados (malvidina-3-glicosídeo (mv-3-glc) e malvidina-3,5-diglicosídeo (mv-3,5diglc), respectivamente, Figura 5B) das antocianinas. Em contrapartida, as antocianinas cumariladas e cafeiladas podem apresentar um novo ombro ou máximo de absorvância correspondente ao resíduo de cumaril ou cafeil (Figura 5B). 40 Figura 5. Espectros de absorção de diferentes antocianinas en meio ácido (pH < 2): (A) 3- monoglicosídeos (comprimento de absorção de onda aumenta com o aumento dos substituintes do anel B) (CASTILLO-MUNOZ et al., 2009a); (B) monoglicosídeo (glc) x diglicosídeo (diglc), 3-monoglicosídeo (linha grande tracejada) e 3,5-diglicosídeo (linha sólida); diglicosídeos acetilados (3-acglc-5glc) x cumarilados (3-acglc-5-glc), malvidina-3- acetilglicosídeo-5-glicosídeo (linha pequena tracejada) e malvidina-3-(p-cumaril)-glicosídeo- 5-glicosídeo (linha pontilhada). 41 No caso das antocianinas cumariladas, o resíduo cumaril pode estar nas configurações isoméricas trans (majoritária) ou cis (minoritária), o que origina algumas alterações no espectro UV-vis, sobretudo no ombro UV devido ao resíduo de cumaril, tal como a diminuição no valor de comprimento de onda no caso dos isômeros cis (NIXDORF; HERMOSÍN-GUTIÉRREZ, 2010). Deve-se ressaltar que as diferentes cores exibidas pelas uvas dependem não somente das diferenças estruturais mas do pH do fluído vacuolar da célula vegetal (MOSKOWITZ; HRAZDINA, 1981) ou meio onde estão presentes, da concentração das antocianinas, da presença de outros pigmentos, bem como de outros fatores como temperatura, luz, presença de copigmentos, íons metálicos, enzimas, ácido ascórbico e açúcares (DELGADO-VARGAS; JIMÉNEZ; PAREDES-LOPEZ, 2003). Alguns estudos sugerem que a copigmentação das antocianinas com outros compostos (copigmentos) seja um dos principais mecanismos de estabilização da cor nas plantas, incluindo as frutas (CASTAÑEDA-OVANDO et al., 2009). Diversas pesquisas são focadas na determinação da composição e do conteúdo de antocianinas presentes nas uvas (ABE et al., 2007; CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009b; GOMÉZ-PLAZA et al., 2008; GUERRERO et al., 2009; HERMOSÍN-GUTIÉRREZ; GARCÍA-ROMERO, 2004; KIRALP; TOPPARE, 2006; LIANG et al., 2008; POMAR; NOVO; MASA, 2005) e nos vinhos (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009b; HERMOSÍN- GUTIÉRREZ; LORENZO; ESPINOSA, 2005; HERMOSÍN-GUTIÉRREZ; GARCÍA- ROMERO, 2004; NIXDORF; HERMOSÍN-GUTIÉRREZ, 2010). Diferenças qualitativas marcantes entre as antocianinas das uvas de Vitis vinifera e as uvas americanas e híbridas são relatadas na literatura. Nas uvas de Vitis vinifera e nos vinhos correspondentes são identificadas predominantemente as antocianinas monoglicosiladas, enquanto a presença de antocianinas diglicosiladas é característica dominante das espécies americanas e híbridas (BAUBLIS; SPOMER; BERBER-JIMENEZ, 1995; HRAZDINA, 1975). Baseados nestes dados e com uso de equipamentos avançados, foi possível detectar adulterações (utilização de uvas americanas ou híbridas) em vinhos europeus, que são produzidos exclusivamente por Vitis vinifera. Isto se deve ao fato de que os pigmentos das uvas são transferidos parcialmente para os vinhos durante sua elaboração e, consequentemente, todo vinho varietal apresenta um perfil de antocianinas típico e característico derivado da fruta original que torna-se sua ‘impressão digital’ (AROZARENA et al., 2000; BERENTE et al., 2000; GARCÍA-BENEYTEZ; REVILLA; CABELLO, 2002; NIXDORF; HERMOSÍN-GUTIÉRREZ, 2010). 42 4.1.2 Flavonóis A estrutura básica destes compostos é semelhante a das antocianidinas (C6-C3-C6), porém com a presença característica dos grupos carbonílico e hidroxílico no anel C. Castillo- Muñoz et al. (2007) demonstraram que a ocorrência de flavonóis nas cultivares de castas tintas é representada por seis estruturas (kaempferol, quercetina, isoramnetina, miricetina, laricitrina e siringetina) glicosiladas (Tabela 2). Tabela 2. Estrutura dos flavonóis encontrados nas uvas. Estrutura básica da aglicona Flavonóis agliconas Grupos substituintes Kaempferol (K) Quercetina (Q) Isoramnetina (I) Miricetina (M) Laricitrina (L) Siringetina (S) R1 = R2 = H R1 = OH; R2 = H R1 = OCH3; R2 = H R1 = R2 = OH R1 = OCH3; R2 = OH R1 = R2 = OCH3 Embora alguns trabalhos descrevam que a presença de flavonóis do tipo isoramnetina e miricetina seja exclusiva de uvas tintas, a ocorrência destes compostos, isolados ou em conjunto, já foi descrita em uvas brancas por alguns autores (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2010a; HERMOSÍN-GUTIÉRREZ et al., 2010; MATTIVI et al., 2006; RODRÍGUEZ- MONTEALEGRE et al., 2006). Além disso, alguns estudos demonstraram a presença de miricetina em cultivares de uvas brancas não viníferas (Vitis rotundifolia) bem como nos vinhos elaborados a partir delas (PASTRANA-BONILLA et al., 2003; TALCOTT; LEE, 2002). De forma geral, o flavonol predominante nas cultivares de Vitis vinifera é A quecetina e miricetina enquanto que nas cultivares de Vitis labrusca é a quercetina (JACKSON, 1994). Incolores ou de coloração amarela clara, os flavonóis se acumulam nas cascas de uvas de castas tintas e brancas (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009a, 2010a) e apresentam a função de proteção contra à radiação UV, devido a sua forte absorbância nesta faixa específica de comprimento de onda (250-400 nm) (Figura 6). Como sua síntese é estimulada pela luz, muitas vezes, a diferença de composição entre cachos de uma mesma variedade de uva é devido aos frutos expostos a maior quantidade de luz tenderam a uma síntese mais pronunciada destes compostos (PRICE et al., 1995). Estes compostos são encontrados nas uvas apenas na forma de 3-O-glicosídeos, enquanto que as correspondentes agliconas livres 43 podem ser encontradas em vinhos, como resultado da hidrólise ácida que ocorre durante a elaboração e envelhecimento dos vinhos. O grau de hidrólise pode ser dependente da estrutura do flavonol e também do tipo de açúcar unido a aglicona. A glicose é o açúcar mais comum ligado à posição C-3 do anel C da aglicona, mas galactose e ácido glucurônico também têm sido relatados (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2007, 2009a). Além disso, quercetina tem sido sugerida ocorrer nas uvas como 3-O-(6 -ramnosil)-glicosídeo (denominado rutina), 3-O- glicosilgalactose e 3-O-glicosilxilosídeo (CHEYNIER; MOUTOUNET; SARNI- MANCHADO, 2003). Figura 6. Espectro UV-vis de flavonóis. Recentemente foi demonstrado que as formas glicosiladas dos flavonóis de uvas Vitis vinifera correspondem a série completa dos 3-O-glicosídeos, 3-O-galactosídeos e 3-O- glucuronídeos de kaempferol, quercetina, isoramnetina, miricetina, laricitrina e siringetina no caso de variedades tintas (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009a), e somente de kaempferol, quercetina e isoramnetina no caso das variedades brancas (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2010a) (Figura 7). Em ambos os casos, a rutina, um flavonol glicosídeo que já foi sugerido como maioritário em uvas e vinhos, é na realidade um flavonol muito minoritário na uva que, além disso, mostra uma tendência muito forte a hidrolizar-se, gerando quercetina livre nos vinhos (JEFFERY; PARKER; SMITH, 2008). De forma geral, os flavonóis contribuem diretamente para a cor dos vinhos brancos e, em vinhos tintos, apesar de sua coloração ser mascarada pelas antocianinas, estão fortemente envolvidos nos fenômenos de copigmentação (BOULTON, 2001; SCHWARZ et al., 2005). 44 Além disso, contribuem para a capacidade antioxidante das frutas, incluindo as uvas e seus produtos derivados (BURDA; OLEZSEK, 2001). Alguns estudos recentes estão contribuindo significativamente para o conhecimento sobre estes compostos nas uvas (CASTILLO- MUÑOZ et al., 2007, 2009a, 2010a) bem como em outras frutas (HOFFMANN-RIBANI; HUBER; RODRIGUEZ-AMAYA et al., 2009). Figura 7. Estrutura dos flavonóis encontrados em uvas Vitis vinifera: (A) Flavonol-3-O- glicosídeo, (B) Flavonol-3-O-galactosídeo, (C) Flavonol-O-glucuronídeo, (D) Quercetina-3- O-(“6-ranmosil)-glicosídeo (rutina) (CASTILLO-MUÑOZ et al., 2009b). 4.1.3 Flavan-3-óis Os flavan-3-óis são compostos encontrados em maior quantidade nas sementes e nos engaços das uvas e apresentam como unidades fundamentais as estruturas monoméricas de 2- fenilbenzopiranos (C6-C3-C6). A (+)-catequina e seu isômero (-)-epicatequina são os principais flavan-3-óis monoméricos presentes nas uvas (HASLAM, 1980), podendo estar em parte esterificados pelo ácido gálico (C7H6O5), normalmente ao nível do carbono 3 (Tabela 3) 45 (RICARDO-DA-SILVA et al., 1991). Estes compostos são responsáveis, em grande parte, pelo sabor e adstringência de vinhos e sucos (ABE et al., 2007). Tabela 3. Exemplos de flavan-3-óis presentes nas uvas: C: (+)-catequina; E: (-)-epicatequina; ECG: (-)-galato-3-epicatequina; GC: (+)-galocatequina; EGC: (-)-epigalocatequina; GCG: (+)-galato-3-galocatequina; EGCG: (-)-galato-3-epigalocatequina. *G: ácido gálico. Estrutura básica da aglicona Flavanóis agliconas Grupos substituintes* C E ECG GC EGC GCG EGCG R = H; R1 = OH; R2 = H R = H; R1 = H; R2 = OH R = H; R1 = H; R2 = O-G R = OH; R1 = OH; R2 = H R = OH; R1 = H; R2 = OH R = OH; R1 = H; R2 = O-G R = OH; R1 = O-G; R2 = H A associação de várias unidades monoméricas de catequinas ou epicatequinas são denominadas proantocianidinas ou taninos condensados. Dependendo do número de vezes que esta unidade básica se repete, as proantocianidinas podem ser dímeras, trímeras, oligoméricas (até 5 unidades) ou poliméricas (acima de 5 unidades). As variações estruturais ocorrem devido ao número de monômeros ligados, posição de ocorrência das ligações, padrão de oxigenação nos anéis A e B da unidade e estereoquímica dos substituintes do anel C (TERRIER; PONCET-LEGRAND; CHEYNIER, 2009). As proantocianidinas podem liberar antocianidinas quando aquecidas em meio fortemente ácido e alcoólico, mediante a ruptura das ligações entre as unidades monoméricas (PORTER, 1992; RIBÉREAU-GAYON et al., 2003). Dependendo das antocianidinas liberadas, no caso da uva especialmente cianidina e em menor proporção delfinidina, as moléculas precursoras recebem o nome de procianidinas (constituídas de (+)-catequina e (-)- epicatequina) e prodelfinidinas (constituídas de (+)-galocatequina e (-)-epigalocatequina), respectivamente. As procianidinas são os flavan-3-óis predominantes nas sementes das uvas (PRIEUR et al., 1994), enquanto nas cascas são encontradas tanto procianidinas como prodelfinidinas (SOUQUET et al., 1996). As procianidinas dímeras são classificadas de acordo com o seu tipo de ligação interflavanólica e dividem-se em dois grupos: A e B. As do 46 tipo A (C30H24O12) possuem uniões interflavanos C4-C8 ou C4-C6 e uma ligação éter entre os carbonos C-5 ou C-7 da unidade terminal (anel A) com o carbono C-2 da unidade superior (anel C) (Figura 8). Figura 8. Exemplos de procianidina dímeras (Tipo A e Tipo B) e trímera (Tipo C). As procianidinas do tipo B (C30H26O12) são resultantes da condensação das unidades flavan-3-óis através de uma ligação entre o carbono 4 do monômero superior (anel C) com o carbono 6 ou 8 da unidade inferior (anel A). Os compostos formados pelas ligações C4-C8 compõem a série das procianidinas B1, B2, B3 e B4, enquanto os compostos formados pelas ligações C4-C6 compõem a série das procianidinas B5, B6, B7 e B8 (Figura 8). Já as procianidinas trímeras são classificadas em tipo C (resultante de uniões interflavanos correspondentes ao tipo B dos dímeros) (Figura 8) e tipo D (que possuem uma ligação interflavano do tipo B e outra do tipo A) (RIBÉREAU-GAYON et al., 2003). 47 As formas poliméricas (Figura 9) são os flavan-3-óis principais nas uvas e são constituídos por um número elevado de unidades monoméricas, unidas tanto na posição terminal quanto na posição superior. A quantidade, estrutura e grau de polimerização das proantocianidinas presentes nas uvas diferem de acordo com sua localização nas diferentes partes das uvas (MONAGAS; BARTOLOMÉ; GÓMEZ-CORDOVÉS, 2005). Os taninos estão normalmente associados à evolução da cor e a qualidade organoléptica dos sucos e vinhos, principalmente com relação à adstringência e o amargor (HASLAM, 1974; RICARDO-DA-SILVA et al., 1991). A capacidade de interagir com as proteínas salivares, formando complexos estáveis que provocam a diminuição da lubrificação do palato, causa a sensação de secura e constrição, que é conhecida como adstringência (BATE-SMITH, 1973; HASLAM; LILLEY, 1988). Figura 9. Procianidinas poliméricas predominantes nas uvas. Diversas reações químicas ocorrem entre as antocianinas e taninos extraídos durante a maceração, estabilização e evolução dos vinhos, formando um grande número de compostos incolores ou coloridos. As reações mais importantes são a condensação indireta flavanol- antocianina, a polimerização indireta flavanol-flavanol, ambas intermediadas por acetaldeído, a condensação direta flavanol-antocianina, a oxidação não enzimática dos flavan-3-óis e a degradação das antocianinas, resultando na formação de novos pigmentos com propriedades cromáticas diferentes dos compostos originais da fruta que influenciam marcadamente na qualidade dos sucos e vinhos (DALLAS; RICARDO-DA-SILVA; LAUREANO, 1996 a, b). 48 4.2 Não Flavonóides 4.2.1 Ácidos fenólicos Os ácidos fenólicos principalmente presentes nas uvas são os ácidos hidroxibenzóicos (C6-C1) e os ácidos hidroxicinâmicos (C6-C3), sendo os primeiros encontrados nas cascas e representados geralmente pelo ácido gálico, formando ésteres (galatos) com os flavan-3-óis; e os segundos, predominantemente encontrados na forma de ésteres tartáricos, tais como o ácido caftárico e ácido cutárico, tanto na casca como na polpa da uva (Tabela 4) (BEER et al., 2002; JACKSON, 1994). Os ácidos hidroxicinâmicos são considerados o maior constituinte da polpa (RIBÉREAU-GAYON et al., 2003) e embora sejam encontrados em baixas concentrações, representam um dos principais compostos fenólicos presentes em uvas brancas (SINGLETON, 1992). Tabela 4. Padrão de substituição dos ácidos fenólicos. Compostos Substituintes Ácido hidroxibenzóico 2 3 4 5 6 Ácido gálico H OH OH OH H Ácido hidroxicinâmico 2 3 4 5 6 ácido p-cumárico H H OH H H ácido caféico H OH OH H H ácido ferrúlico H O-CH3 OH H H ácido sinápico H O- CH3 OH O- CH3 H Durante o processo de vinificação, os ésteres tartáricos dos ácidos hidroxicinâmicos podem sofrer hidrólise, liberando os ácidos hidroxicinâmicos de tal maneira que nos vinhos são encontrados tanto as formas livres como as combinadas. Assim, o teor destes compostos vai depender tanto do tipo da uva quanto do processo de hidrólise destes ésteres (RITCHEY; WATERHOUSE, 1999). A princípio, estes compostos não conferem ao vinho nenhum sabor 49 ou odor. No entanto, são precursores de compostos fenólicos voláteis que afetam o sabor e odor dos vinhos. Durante a fermentação, a ação enzimática do tipo descarboxilase de algumas leveduras presentes nas uvas pode converter os ácidos p-cumárico e ferrúlico em 4-vinilfenol e 4-vinilguaiacol, respectivamente (EDLIN et al., 1998; SALAMEH et al., 2008). Estes compostos, por sua vez, podem ser reduzidos a derivados de etil (etilfenol e etilguaiacol) por vinilredutases presentes em certas leveduras como Brettanomyces (DIAS et al., 2003) ou por algumas bactérias lácticas normalmente do gênero Lactobacillus. A presença de etilfenóis nos vinhos é responsável por grande perda econômica uma vez que confere aos produtos aroma ruim, conhecido pelos especialistas como aroma de couro, animal ou suor de cavalo (CHATONNET; DUBOURDIEU; BOIDRON, 1995). Por outro lado, os ácidos hidroxicinâmicos, especialmente os ácidos p-cumárico e o caféico, estão envolvidos no processo de acilação dos substituintes glicosídicos das antocianinas (RIBÉREAU-GAYON et al., 2003) e, juntamente com seus derivados 4- vinilfenóis, podem reagir com antocianinas, originando compostos do tipo piranoantocianinas. Estes compostos contêm duplas ligações polarizáveis, isto é, com substituintes de diferentes polaridades em ambos os extremos da dupla ligação, propiciando estas reações. A primeira estrutura de piranoantocianina identificada foi a vitisina A (Figura 10A) procedente da reação entre a malvidina-3-glicosídeo com o ácido pirúvico (um metabólito secundário das leveduras) através da forma enólica deste último e, posterior, descarboxilação (RENTZSCH; SCHWARZ; WINTERHALTER, 2007). Figura 10. Estruturas químicas de piranoantocianinas de vinho derivadas da malvidina-3- glicosídeo: (A) piranoantocianinas do tipo vitisina (R1 = COOH, vitisina A; R1 = H, vitisina B); (B) piranoantocianinas do tipo hidroxifenil (R2 = R3 = H, malvidina-3-glicosídeo-4- vinilfenol; R2 = H e R3 = OH, malvidina-3-glicosídeo-4-vinilcatecol ou pinotina A; R2 = H e R3 = OCH3, malvidina-3-glicosídeo-4-vinilguaiacol) (RENTZSCH; SCHWARZ; WINTERHALTER, 2007). 50 As estruturas das piranoantocianinas são diversificadas e vários caminhos têm sido propostos para sua formação (RENTZSCH; SCHWARZ; WINTERHALTER, 2007). Na Figura 10B estão ilustrados outras piranoantocianinas relevantes que são formadas a partir da reação de antocianinas com os ácidos hidroxicinâmicos (piranoantocianinas do tipo hidroxifenil). Estas reações estão envolvidas no processo de estabilização da cor durante o envelhecimento do vinho (RENTZSCH et al., 2010). 4.2.2 Estilbenos Dentre os principais compostos pertencentes a esta classe dos não flavonóides destacam-se o resveratrol (trans-3,5,4’–trihidroxiestilbeno), o piceid (trans-3,5,4’- trihidroxiestilbeno-3-O-β-D-glicosídio) e a astringina (3’-hidróxi-trans-3,5,4’- trihidroxistilbeno-3- O -β-D- glicosídio) (FLANZY, 2000). O resveratrol contém um esqueleto baseado na estrutura do 1,2-difeniletileno e, como fitoalexinas (metabólitos secundários antimicrobianos), pode ser sintetizado principalmente nas cascas das uvas como resposta ao stress causado por infecção microbiana, dano mecânico ou irradiação por luz ultravioleta (BRAVO, 1996). Desta maneira, pode ser encontrado em uvas (CANTOS et al., 2001; GONZÁLEZ-BARRIO et al., 2006), sucos (ROMERO-PÉREZ et al., 1999; SAUTTER et al., 2005; SOLEAS et al., 1995a, b; YASUI et al., 1997) e vinhos (MORENO-LABANDA et al., 2004; SIEMANN; CREASY, 1992). Este composto existe na forma natural como isômero trans, embora possa hidrolisar-se (sob luz ultravioleta) a seu correspondente isômero cis. Na uva, o resveratrol se encontra unido a uma molécula de glicose através de um grupo fenol na posição 3. O 3-O-glicósideo de resveratrol também é conhecido pelos nomes piceid e polidatina, e também pode apresentar-se nas formas cis e trans (Figura 11) (LASTRA; VILLEGAS, 2007). Existe também um composto denominado piceatanol que é um homólogo superior do resveratrol, com um grupo OH a mais na posição 3’ e o seu 3-O-glicosídeo é chamado de astringina (Figura 12). A presença de um grupo OH adicional faz com que estes compostos (piceatanol e astringina) apresentem máximos de absorção UV a 302 e 321 nm, respectivamente (PÜSSA et al., 2006), enquanto que o resveratrol os apresentam a 306 e 316 nm. Outro derivado glicosilado do resveratrol encontrado em vinhos Reisling é o trans- resveratrol-2-C-glicosídeo (BADERSCHNEIDER; WINTERHALTER, 2000), que se diferencia do piceid pela posição do glicosídeo na posição C-2 (Figura 13). 51 Figura 11. Trans-resveratrol e seus derivados (POUR-NIKFARDJAM; LÁSZLO; DIETRICH). Figura 12. Homólogos do resveratrol: piceatanol e seu 3-O-glicosídeo (astringina). Figura 13. Derivado 2-C-glicosídeo do trans-resveratrol. 52 Por último, o resveratrol apresenta a capacidade de formar oligômeros (AMIRA- GUEBAILIA et al., 2009; BADERSCHNEIDER; WINTERHALTER, 2000; PÜSSA et al., 2006; VITRAC et al., 2001), e já foram relatados na literatura alguns dímeros (palidol, viniferina, partenocissina) (Figura 14), e mais recentemente um tetrâmero (hopeafenol) (Figura 15). Figura 14. Derivados dímeros do resveratrol. Especificamente para o palidol são conhecidos os derivados 3-glicosídeo (R= glicosil; R’ = H) e 3,3’-diglicosídeo (R = R’ = glicosil). Figura 15. Tetrâmero do resveratrol (hopeafenol). Alguns estudos sugerem que as técnicas de vinificação influenciam significativamente nos teores de resveratrol e seus derivados encontrados nos vinhos (BAVARESCO et al., 2000; MORENO-LABANDA et al., 2004), com maiores teores encontrados particularmente em produtos submetidos a maiores tempos de maceração das cascas (MATTIVI, RENIERO; KORHAMMER, 1995). Em contrapartida, operações como clarificação e filtração podem levar a um decréscimo dos níveis de resveratrol e piceid em sucos e vinhos (LAMUELA- RAVENTÓS et al., 1995; VRHOVSEK; WENDELIN, EDER, 1997). Além disso, alguns vinhos elaborados a partir de uvas botrytizadas apresentam menores teores de resveratrol 53 quando comparados com os elaborados a partir de uvas “normais”. Neste caso, o mesmo fungo (Botrytis cinérea) que ataca a uva é responsável por desenvolver gostos e aromas diferenciados aos vinhos por produzir a enzima lacase que oxida o resveratrol (ADRIAN et al., 1998). No entanto, a razão maior para o interesse dos pesquisadores pelo resveratrol está relacionada com seus benefícios para a saúde humana (BAUR; SINCLAIR, 2006; BRAVO, 1996; ESPÍN; GARCÍA-CONESA; TOMÁS-BARBERÁN, 2007; LASTRA; VILLEGAS, 2007; STIVALA et al., 2001). Há evidências crescentes de que este composto possa prevenir ou retardar o aparecimento de câncer, doenças cardíacas, diabetes, inflamação patológica, infecção viral, entre outros (BAUR; SINCLAIR, 2006). Deve-se levar em conta que os estudos sobre as propriedades bioativas do resveratrol foram realizados fundam