Perfil de expressão de genes associados aos telômeros em carcinoma pulmonar de células não pequenas (NSCLC) Camila Baldin Storti BOTUCATU-SP 2018 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Júlio de Mesquita Filho” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS DE BOTUCATU Perfil de expressão de genes associados aos telômeros em carcinoma pulmonar de células não pequenas (NSCLC) Camila Baldin Storti Orientadora: Profa. Dra. Maria Isabel Nogueira Cano Coorientadora: Profa. Dra. Patrícia Pintor dos Reis Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências, Campus de Botucatu, UNESP, para obtenção do título de Mestre no Programa de Pós- Graduação em Ciências Biológicas (Genética). BOTUCATU-SP 2018 Dedicatória Dedico este trabalho à minha família, em especial aos meus pais (Leonildo e Eliana), minha irmã Luana e meus avós maternos (Arnold e Ermelinda). Sempre me apoiaram e são meus maiores exemplos. AGRADECIMENTOS Agradeço a todos que contribuíram diretamente ou indiretamente à realização deste trabalho, em especial: À minha família, a base de tudo, por todo carinho e suporte. Sem vocês nada disto seria possível. À Profa. Dra. Maria Isabel Nogueira Cano, pela orientação, ensinamentos, confiança e pelas oportunidades ao longo desses anos. E por toda contribuição em minha formação cientifica. À Profa. Dra. Patrícia Pintor dos Reis pela coorientação. Por ter aceitado a colaboração e ter aberto as portas de seu laboratório para que eu fizesse os experimentos, e por todos ensinamentos e suporte ao longo deste trabalho. Aos colegas do laboratório de telômeros, aos atuais alunos e aqueles que por ali passaram ao longo dos cinco anos em que fiz parte do laboratório. Obrigada por todos ensinamentos, trocas de experiência e por toda contribuição em minha formação cientifica. À toda equipe do laboratório Neogene, obrigada por todo auxílio, ensinamentos e principalmente por terem feito eu me sentir à vontade no laboratório. Agradeço a professora Sandra Drigo por toda atenção dedicada. Ao Dr. Márcio de Carvalho que foi fundamental para execução deste trabalho. Agradeço por toda atenção e empenho em me ensinar as técnicas e encontrar soluções para os problemas que surgiram ao longo deste trabalho. E por todas discussões cientificas que muito contribuíram para minha formação. Ao Dr. Rogério de Oliveira pelas análises de bioestatística, por toda disponibilidade e atenção. E principalmente pelas inúmeras reuniões que muito contribuíram para o desenvolvimento deste trabalho e para meu desenvolvimento científico. Ao Dr. Elton Vasconcelos pelas análises de bioinformática, por toda disponibilidade, paciência e ensinamentos. À todos meus amigos, obrigada por todas conversas, trocas de experiência, desabafos e companheirismo. Vocês tornaram essa caminhada mais amena. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) À Pós-graduação em Genética do Instituto de Biociências de Botucatu -UNESP, por todo auxilio. À FUNDAÇÃO DE AMPARO A PESQUISA DO ESTADO DE SÃO PAULO (FAPESP) pelo auxílio financeiro e concessão de minha bolsa de mestrado, processo: 2016/06936-6. EPÍGRAFE DA ETERNA PROCURA ‘’Só o desejo inquieto, que não passa, Faz o encanto da coisa desejada... E terminamos desdenhando a caça Pela doida aventura da caçada ‘’ Mario Quintana RESUMO O câncer de pulmão é o câncer que apresenta maior mortalidade no mundo: >1,6 milhões de óbitos por ano segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), sendo o câncer de pulmão de células não pequenas (NSCLC) o tipo mais frequente (~ 85%) de carcinoma pulmonar. O NSCLC apresenta dois subtipos histológicos principais: adenocarcinoma (LUAD) e carcinoma de células escamosas (LUSC). Pesquisas têm sido realizadas objetivando identificar biomarcadores moleculares úteis como alvo terapêuticos em NSCLC e os telômeros têm sido considerado alvos promissores para terapias antitumoral, devido ao seu papel crucial na integridade, estabilidade e manutenção genômica. Telômeros humanos consistem em DNA repetitivo rico em G associado a proteínas do complexo shelterin e mantido pela ação da telomerase. Estudos recentes mostraram que a expressão de TERT (subunidade catalítica da telomerase) e de alguns componentes do complexo shelterin estão alterados em câncer de pulmão. No entanto, a correlação entre alterações na função telomérica e o desenvolvimento e progressão de NSCLC não foi elucidada. Portanto, o objetivo do presente estudo foi verificar alterações na expressão de genes associados aos telômeros, incluindo os ncRNAs associados à regulação e manutenção dos telômeros em NSCLC, no intuito de identificar novos biomarcadores associados ao desenvolvimento e progressão do NSCLC. Para tanto, foram realizadas análises de expressão de 50 genes associados aos telômeros em amostras de tecido tumoral e tecido pulmonar normal, adjacente ao tumor, de pacientes com NSCLC, utilizando 1) RT-qPCR para análise de expressão em amostras de 28 pacientes, tratados do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina de Botucatu, 2) Análise de transcritoma utilizando dados de RNA-Seq de amostras de 27 pacientes tratados no Hospital A. C. Camargo e 3) Análise de transcritoma utilizando dados de RNA- Seq, disponíveis no banco de dados The Cancer Genome Atlas (TCGA) e obtidos de amostras de 85 pacientes. Adicionalmente foram analisadas as diferenças entre o perfil de expressão dos genes avaliados em amostras do subtipo LUSC e LUAD. Os resultados revelaram que genes envolvidos com a manutenção dos telômeros estão significativamente, p ≤ 0,05, desregulados nos tumores NSCLC avaliados. Com destaque para os genes TERT, RAD51, DNMT3B, DKC1 e BRCA2 que foram identificados com expressão aumentada nas células tumorais de NSCLC em relação as normais, na maioria das análises. E para os genes SUV39H1, RUVBL1 e DNMT3A que apresentaram aumento de expressão significativo apenas nas amostras do subtipo LUSC. Os ncRNA TERC e TERRA apresentaram expressão elevada nas amostras de NSCLC, destacando a alta expressão de TERC associada ao subtipo LUSC. Somado a estas análises foi calculado o perfil de restrição telomérico (TRF) de amostras tumorais (n=11) e normais adjacentes ao tumor (n=4) de pacientes com NSCLC, e os TRFs de leucócitos de pacientes com NSCLC (n= 14) em comparação com os de doadores saudáveis (n=13). Os telômeros de leucócitos de pacientes com NSCLC estavam menores que os de indivíduos saudáveis (p≤ 0,05) e os telômeros diminuíam conforme a idade do paciente (correlação de Spearman, p= 0,00 e r= -0,644). Porém, não foi encontrada diferença significativa entre os valores de TRF dos tecidos tumorais e normais de pacientes com NSCLC, tal como não foi identificado correlação entre o tamanho de TRF e a idade destes indivíduos, provavelmente devido ao baixo número amostral. Os resultados sugerem que os genes que codificam proteínas e ncRNAs envolvidos com a manutenção dos telômeros podem estar envolvidos na oncogênese de NSCLC e que dentre eles podem haver potenciais biomarcadores para NSCLC, sobretudo do subtipo LUSC, visto a expressão aumentada de alguns genes, SUV39H1, RUVBL1, DNMT3A e TERC, estarem exclusivamente associadas a amostras tumorais deste subtipo. Palavras chaves: Câncer de pulmão de células não pequenas (NSCLC), telômeros, biomarcadores moleculares, genes associados aos telômeros. ABSTRACT According to the World Health Organization, lung cancer has a high mortality rate associated with >1.6 million deaths per year, being Non-small cell lung cancer (NSCLC) the most frequent type (~ 85%) of lung carcinoma. Lung adenocarcinoma (LUAD) and lung squamous cell carcinoma (LUSC) are the two major histological subtypes of NSCLC. Research efforts have been made to identify molecular biomarkers useful as therapeutic targets in NSCLC and telomere have been considered very promising targets for anticancer therapies due to their crucial role in genome integrity maintenance and stability. Human telomeres consist of repetitive G-rich DNA associated with proteins of the shelterin complex, maintained by the action of telomerase. Recent studies showed that expression of TERT (telomerase reverse transcriptase component) and of some of the shelterin components are altered in lung cancer. However, the mechanisms of telomere deregulation associated with NSCLC development and progression have not been elucidated. Therefore, our aim was to study expression changes affecting telomere- associated genes and ncRNAs associated with telomere regulation and maintenance in NSCLC. Such alterations may represent novel biomarkers associated with NSCLC development and progression. For this purpose, expression analyzes of 50 telomere- associated genes were performed in samples of tumor tissue and normal lung tissue, adjacent to the tumor, from patients with NSCLC. The following techniques were used: 1) RT-qPCR for analysis of expression in samples obtained from 28 patients who underwent surgical treatment at Botucatu Clinical Hospital; 2) Transcriptome analysis using RNA-Seq data from samples obtained from 27 patients treated at AC Camargo Hospital 3) Transcriptome analysis using RNA-Seq data, available in the The Cancer Genome Atlas database (TCGA) and obtained from samples of 85 patients. In addition, the differences between the expression profile of the telomere-associated genes in LUSC and LUAD subtype samples were analyzed. The results revealed that many genes involved in telomeres maintenance are significantly, ≤ 0.05, deregulated in the NSCLC tumors. Genes enconding TERT, RAD51, DNMT3B, DKC1 and BRCA2 were overexpressed in NSCLC tumor cells compared to the normal lung tissue. SUV39H1, RUVBL1 and DNMT3A genes were overexpressed only in LUSC subtype samples. The ncRNAs TERC and TERRA also showed increased expression in NSCLC samples, with emphasis to the high expression level of TERC associated with the LUSC subtype In addition, telomere restriction fragment (TRF) was estimated for tumor tissue (n=11) and normal lung tissue (n=4) samples obtained from patients with NSCLC. TRFs from leukocytes obtained from patients with NSCLC (n= 14) were also compared with TRFs obtained from healthy donors (n = 13). The results showed that telomeres of leukocytes obtained from NSCLC patients were shorter than those of healthy donors (p≤0.05) and it decreases according to patient's age (Spearman's correlation, p= 0.00 and r= -0,644). However, no significant difference was found between the TRF obtained from tumor and normal lung tissues of patients with NSCLC, as no correlation was found when comparing TRFs and the age of these individuals, probably due to the low sample size. The results suggest that genes encoding proteins and ncRNAs involved in the maintenance of telomeres may be involved in the oncogenesis of NSCLC, especially the LUSC subtype, since the increased expression of some genes, SUV39H1, RUVBL1, DNMT3A and TERC, are exclusively associated with tumor samples of this subtype. Key words: Non-Small Cell Lung Cancer (NSCLC), telomeres, molecular biomarkers, telomere-associated genes. ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 - Estrutura telomérica e ação conjunta dos complexos shelterin e CST na manutenção telomérica _________________________________________________ 20 Figura 2 - Mecanismos de reparo a danos no DNA por junção de pontas não homólogas ___________________________________________________________________ 22 Figura 3 - Os três tipos de reparo por recombinação homóloga nos telômeros ______ 24 Figura 4 - Papel dos telômeros durante a carcinogênese _______________________ 26 Figura 5 - Representação esquemática dos métodos utilizados nesse trabalho para análise de expressão gênica de genes associados aos telômeros em amostras tumorais e normais adjacentes ao tumor de pacientes com NSCLC ______________________________ 41 Figura 6 - Gráficos representativos da expressão gênica relativa (log10) em tumor vs normal ______________________________________________________________ 46 Figura 7 - Gráficos representativos da expressão gênica relativa (log10) dos RNAs teloméricos não codantes em tumor vs normal ______________________________ 56 Figura 8 - Gráficos representativos da expressão relativa (log10) dos genes teloméricos nos diferentes grupos histológicos de NSCLC: LUAD e LUSC _________________ 60 Figura 9 - Gráficos representativos da expressão gênica relativa (log10) de RNAs teloméricos não codantes nos diferentes grupos histológicos de NSCLC: LUAD e LUSC ___________________________________________________________________ 68 Figura 10 - Heatmap do perfil de expressão gênica em tumores dos subtipos LUSC e LUAD ______________________________________________________________ 70 Figura 11 - Rede de interação de proteínas envolvidas com a manutenção dos telômeros ___________________________________________________________________ 71 Figura 12 - Gráfico do tipo Heatmap. Mostrando a diferença do perfil de expressão dos genes associados aos telômeros em amostras do subtipo LUSC e LUAD, cujos dados de trascritoma foram retirados do TCGA _____________________________________ 81 Figura 13 - Sobreposições dos genes com expressão aumentada (FC ≥1, p ≤ 0,05 e FDR≤ 0,05) em LUAD e LUSC, dados obtidos do TCGA ___________________________ 82 Figura 14 - Perfil de TRF de tecidos tumorais e normais adjacentes ao tumor, de pacientes com NSCLC _________________________________________________________ 84 Figura 15 - Correlação entre o TRF de células tumorais (NSCLC) e normais adjacentes e a idade dos pacientes __________________________________________________ 86 Figura 16 - Perfil de TRF da fração leucocitária de pacientes com NSCLC ________ 87 Figura 17 - Correlação entre o TRF de leucócitos de pacientes com NSCLC e de doadores saudáveis e a idade dos indivíduos ________________________________________ 88 ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 - Vias celulares que possuem a atividade afetada por alterações somáticas em pacientes com câncer de pulmão _________________________________________ 17 Tabela 2 - Lista dos genes e sequências dos iniciadores utilizados no ensaio de RT-qPCR ___________________________________________________________________ 37 Tabela 3 - Perfil clínico e histopatológico dos casos incluídos no estudo de expressão gênica via RT-qPCR ___________________________________________________ 43 Tabela 4 - Expressão relativa de genes envolvidos com a maquinaria telomérica em amostras de NSCLC ___________________________________________________ 45 Tabela 5 - Expressão relativa de RNAs teloméricos não codantes em amostras de NSCLC ___________________________________________________________________ 55 Tabela 6 - Expressão relativa de genes envolvidos com os telômeros em adenocarcinoma pulmonar (LUAD) ____________________________________________________ 58 Tabela 7 - Expressão relativa de genes envolvidos com os telômeros em carcinoma pulmonar de células escamosas (LUSC) ___________________________________ 59 Tabela 8 - Expressão relativa de RNAs teloméricos não codantes em adenocarcinoma pulmonar (LUAD) ____________________________________________________ 67 Tabela 9 - Expressão relativa de RNAs teloméricos não codantes em carcinoma pulmonar de células escamosas (LUSC)____________________________________________ 67 Tabela 10- Perfil clínico e histopatológico dos pacientes do Hospital AC. Camargo diagnosticados com LUAD _____________________________________________ 72 Tabela 11 - Genes associados aos telômeros com expressão desregulada em pacientes com LUAD, análise de transcritoma utilizando dados de RNA- Seq _____________ 72 Tabela 12 - Características dos pacientes com NSCLC, cujos dados de transcritoma foram retirados do banco de dados público: The Cancer Genome Atlas (TCGA) _________ 75 Tabela 13 - Genes associados aos telômeros com expressão desregulada em pacientes com subtipo tumoral LUSC, cujos dados foram extraídos do TCGA _____________ 76 Tabela 14 - Genes associados aos telômeros com expressão desregulada em pacientes com subtipo tumoral LUAD, cujos dados foram extraídos do TCGA _____________ 79 ÍNDICE DE QUADROS Quadro 1 - Genes envolvidos com a manutenção telomérica que estão diferencialmente expressos em NSCLC __________________________________________________ 90 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA ...................................................................... 14 1.1 Características biológicas e genéticas do câncer .................................................. 14 1.2 Câncer de Pulmão ................................................................................................... 15 1.2.1 Alterações genéticas e moleculares em NSCLC ................................................... 15 1.3 Telômeros e Características Gerais ...................................................................... 19 1.4 Telômeros e câncer ................................................................................................. 25 1.4.1 Câncer e o complexo Shelterin .............................................................................. 27 1.4.2 Câncer e proteínas teloméricas não Shelterins ...................................................... 28 1.4.3 Telômeros e câncer de pulmão .............................................................................. 29 2 OBJETIVO GERAL DA PROPOSTA .................................................................... 33 2.1 Objetivos específicos ............................................................................................... 33 3 MATERIAIS E MÉTODOS ..................................................................................... 34 3.1 Dados das amostras ................................................................................................ 34 3.2 Metodologia de extração de RNA.......................................................................... 35 3.3 Metodologia de extração de DNA.......................................................................... 35 3.4 Metodologia de validação de alterações na expressão de genes associados a maquinaria telomérica: PCR quantitativa em tempo real ....................................... 35 3.5 Análises estatísticas dos dados (RT-qPCR) .......................................................... 37 3.6. Análise bioinformática dos dados de RNA-Seq .................................................. 38 3.7. Metodologia para medir o perfil de restrição do comprimento telomérico (Southern blot telomérico) ........................................................................................... 39 4 DELINEAMENTO EXPERIMENTAL .................................................................. 40 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................... 42 5.1 Investigação de alterações na expressão de genes codificantes de proteínas teloméricas em amostras de indivíduos diagnosticados com NSCLC ..................... 42 5.1.1 Investigação de alterações na expressão de RNAs teloméricos não codantes em amostras de indivíduos diagnosticados com NSCLC ..................................................... 54 5.2 Investigação de alterações na expressão de genes codificantes de proteínas teloméricas nos subtipos histológicos de NSCLC: LUAD e LUSC .......................... 57 5.2.1 Investigação de alterações na expressão de RNAs teloméricos não codantes nos subtipos histológicos de NSCLC: LUAD e LUSC ........................................................ 67 5.2.2 Diferenças nos perfis de expressão dos genes associados aos telômeros em amostras de pacientes com LUSC e LUAD................................................................................... 69 5.3 Análise da expressão de genes associados a maquinaria telomérica em amostras tumorais de pacientes diagnosticados com NSCLC, por análise de transcritoma utilizando dados de bibliotecas RNA-Seq ................................................................... 71 5.4 Análise da expressão de genes associados a maquinaria telomérica em amostras tumorais de pacientes com LUAD, por análise de transcritoma utilizando dados de RNA- Seq ....................................................................................................................... 71 5.5 Análise da expressão de genes associados a maquinaria telomérica utilizando dados do The Cancer Genome Atlas (TCGA) ............................................................. 75 5.5.1 Análise da expressão de genes associados a maquinaria telomérica utilizando dados do TCGA- LUSC ............................................................................................................ 76 5.5.2 Análise de expressão de genes associados a maquinaria telomérica utilizando dados do TCGA- LUAD ........................................................................................................... 79 5.6 Análise do perfil de restrição telomérico em amostras de pacientes diagnosticados com NSCLC ........................................................................................ 83 6 CONCLUSÃO ............................................................................................................ 89 7 REFERÊNCIAS....................................................................................................... 922 8 ANEXOS ................................................................................................................... 108 14 1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA 1.1 Características biológicas e genéticas do câncer O câncer compreende mais de 100 doenças que se originam a partir da divisão celular anormal (HANAHAN; WEINBERG, 2000, 2011). Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), o câncer é uma das principais causas de morbidade e mortalidade, com aproximadamente 14 milhões de novos casos e mais de 8 milhões de óbitos por ano, no mundo (STEWART; WILD, 2014). O câncer é uma doença genética associada ao acúmulo de mutações somáticas, as quais interferem em vias moleculares que regulam o crescimento e diferenciação celulares, apoptose, reparo do DNA, entre outras (HANAHAN; WEINBERG, 2000, 2011; GRIFFITS, 2008; ALBERTS et al., 2011). As alterações genéticas e epigenéticas que levam ao desenvolvimento e progressão tumoral fornecem vantagens competitivas às células devido à aquisição de propriedades celulares de crescimento mesmo na presença de danos ao DNA e na ausência de sinais reguladores da divisão celular ou pela capacidade de secretar fatores de crescimento pela célula tumoral, capacidade de estimular mecanismos de angiogênese, aquisição de imortalidade celular e reativação da telomerase, esta última propriedade ocorrendo em pelo menos 85% dos tumores (ALBERTS, 2011). A homeostasia dos tecidos e do organismo pode ser rompida quando uma célula sofre alterações genéticas, que lhe confere imortalização e capacidade de proliferação indeterminada, resultando na expansão clonal observada no desenvolvimento do câncer ( HANAHAN; WEINBERG, 2000, 2011; ALBERTS et al., 2011). As alterações observadas em células tumorais resultam da interação entre fatores genéticos, epigenéticos e exposição a fatores ambientais, dos quais muitos foram classificados pela Agência Internacional para Pesquisa sobre o Câncer (IARC, 2017). O consumo de tabaco e álcool, dieta rica em gordura e sedentarismo são alguns dos principais fatores de risco associados ao desenvolvimento do câncer. Alguns vírus também estão associados ao câncer, como os vírus da Hepatite B (HBV) e hepatite C (VHC), associados ao desenvolvimento de hepatocarcinoma, e do papiloma humano (HPV), associado aos carcinomas do colo do útero e orofaringe (“WHO | Cancer”, 2017). 15 1.2 Câncer de Pulmão O câncer de pulmão é líder em mortalidade por câncer no mundo, sendo que o número de óbitos ultrapassa aquele dos cânceres de mama, cólon e próstata, combinados. De acordo com a OMS, o carcinoma pulmonar causa mais de 1,6 milhões de óbitos por ano no mundo e apresenta um aumento de 2% por ano em sua incidência mundial (JEMAL et al., 2011; SIEGEL; NAISHADHAM; JEMAL, 2012; “WHO | Cancer”, 2017). Esses dados indicam que os carcinomas pulmonares continuarão a representar um importante problema de saúde pública mundial. O tabagismo é o principal fator de risco (aproximadamente 85% dos casos) para o desenvolvimento de câncer de pulmão (THUN et al., 2008; LONGO et al., 2011; “Lung Carcinoma - Pulmonary Disorders - MSD Manual Professional Edition”, 2016). Fatores ambientais como exposição ao amianto, gás radônio e poluição do ar também são reconhecidos fatores de risco. Os carcinomas pulmonares são classificados em dois tipos principais: células não pequenas (Non-Small Cell Lung Carcinoma - NSCLC) que compreende aproximadamente 85% dos casos e células pequenas (Small Cell Lung Cancer - SCLC), representando aproximadamente 15% dos casos. Os tipos NSCLC e SCLC são diferentes molecularmente, contendo várias alterações genéticas associadas aos subtipos específicos e outras comuns aos dois subtipos, entretanto, observadas em diferentes frequências. O NSCLC pode ser dividido histologicamente em três subtipos principais: adenocarcinoma (Lung Adenocarcinoma- LUAD), carcinoma de células escamosas (Lung Squamous Cell Carcinoma- LUSC) e carcinoma de células grandes (Large-Cell Carcinoma- LCC). O subtipo histológico LUAD é o mais comum (aproximadamente 40% dos casos) (BREATHNACH et al., 2001; SHTIVELMAN et al., 2014). 1.2.1 Alterações genéticas e moleculares em NSCLC A ativação de oncogenes ocorre na grande maioria, senão em todos os tumores do tipo NSCLC. As principais alterações observadas são mutações, amplificações gênicas ou rearranjos de DNA, as quais levam à ativação e aumento da expressão de oncogenes. Oncogenes comumente ativos em NSCLC, do subtipo histológico LUAD, compreendem mutações nos genes EGFR (epidermal growth factor receptor), ERBB2 (erb-b2 receptor tyrosine kinase 2), MYC (myelocytomatosis oncogene), KRAS (Kirsten rat sarcoma viral oncogene homolog), MET (mesenchymal-epithelial transition fator), CCND1 (cyclin D1), CDK4 (cyclin-dependent kinase 4), fusão EML4-ALK (echinoderm 16 microtubule associated protein like 4 – anaplastic lymphoma kinase) e BCL2 (B-cell CLL/lymphoma 2). Mutações em KRAS são encontradas em aproximadamente 20% dos casos de LUAD (LARSEN; MINNA, 2011). A perda da função de genes supressores tumorais é também um importante fator que culmina no desenvolvimento do câncer de pulmão. Supressores tumorais comumente inativados são: TP53 (Tumor Protein P53), RB1 (Retinoblastoma 1), STK11 (Serine/threonine kinase 11), CDKN2A (cyclin dependent kinase inhibitor 2A), FHIT (fragile histidine triad), RASSF1A (Ras-association domain family 1, isoform A) e PTEN (phosphatase and tensin homolog) (LARSEN; MINNA, 2011). TP53 (17p13) é um importante supressor tumoral, mutações somáticas nesse gene ocorrem em cerca de 50% dos casos de NSCLC (LARSEN; MINNA, 2011; SHTIVELMAN et al., 2014). A Tabela 1 contém a lista das principais vias moleculares e genes envolvidos nos subtipos de cânceres de pulmão. 17 Tabela 1 - Vias celulares que possuem a atividade afetada por alterações somáticas em pacientes com câncer de pulmão Nota: Os genes envolvidos em cada tipo de câncer de pulmão são listados na ordem de frequência de alterações encontradas. AKT1-3: AKT serine/threonine kinase 1-3, ALK: anaplastic lymphoma kinase, ARID1A: AT-rich interaction domain 1A, ASCL4: achaete-scute family bHLH transcription factor 4, BRAF: B-Raf proto-oncogene, serine/threonine kinase, CCNE1: cyclin E1, CDKNA2: cyclin dependent kinase inhibitor 2A, CREBBP: CREB binding protein, CUL3: cullin 3, DDR2: discoidin domain receptor tyrosine kinase 2, EGFR: epidermal growth factor receptor, EP300: E1A binding protein p300, EPHA7: EPH receptor A7, ERBB2-3: erb-b2 receptor tyrosine kinase 2-3, FGFR1-3: fibroblast growth factor receptor 1-3, FOXP1: forkhead box P1, HRAS: HRas proto-oncogene, GTPase, KEAP1: kelch like ECH associated protein KRAS: KRAS proto-oncogene, GTPase, LKB1 (STK11): serine/threonine kinase 11, LKB1/MPK: serine/threonine kinase 11/ protein kinase AMP-activated catalytic subunit alpha 1, LUAD: Lung Adenocarcinoma, LUSC: Lung Squamous Cell Carcinoma, MDM2: MDM2 proto-oncogene, MET: mesenchymal-epithelial transition factor, MLL: KMT2A lysine methyltransferase 2A, MLL2: lysine methyltransferase 2D, MYC: myelocytomatosis oncogene, MYCL: MYCL proto-oncogene, bHLH transcription factor, MYCN: MYCN proto-oncogene, bHLH transcription factor, NF1: neurofibromin 1, NKX2.1/TTF1 NK2: homeobox 1 /transcription termination factor 1, NOTCH1: notch 1, NRAS: NRas proto-oncogene, GTPase, NRF2: nuclear factor, erythroid 2 like 2, PI3K/AKT: phosphatidylinositol-4,5- bisphosphate 3-kinase catalytic/ AKT serine/threonine kinase, PIK3CA: phosphatidylinositol-4,5- bisphosphate 3-kinase catalytic subunit alpha, PTEN: phosphatase and tensin homolog, RAS/RAF: Ras proto-oncogene, GTPase/Raf proto-oncogene, serine/threonine kinase, Raf-1: Raf-1 proto-oncogene, serine/threonine kinase, RASA1: RAS p21 protein activator 1, RB1: Retinoblastoma 1, RB1/CDKNA2: Retinoblastoma 1/cyclin dependent kinase inhibitor 2A, RET: Ret proto-oncogene, ROS: c-ros gene, RTK: receptor tyrosine kinases, SCLC: Small Cell Lung Cancer, SETD2:SET domain containing 2, SLIT2: slit guidance ligand 2, SMARCA4: SWI/SNF related, matrix associated, actin dependent regulator of chromatin, subfamily a, member 4, SOX2: SRY (sex determining region Y)-box 2, TP53: tumor protein p53, TP63: tumor protein p63, TSC1-2: TSC complex subunit 1-2. Tabela retirada e modificada de Shtivelman et al. (2014). 18 Mutações em EGFR e fusões envolvendo ALK (anaplastic lymphoma kinase) e outros receptores de tirosina- quinases (receptor tyrosine kinases- RTKs) tem sido associadas ao desenvolvimento de LUAD. Entre outros genes alterados em LUAD, estão KRAS, BRAF (B-Raf Proto-Oncogene, Serine/Threonine Kinase), ERBB2, PI3KC (phosphoinositide 3-kinase, catalytic) e translocações envolvendo RET (Ret proto- oncogene) e ROS (c-ros gene), assim como RTK/MET, ativado principalmente em tumores que desenvolvem resistência a terapias direcionadas. Os tumores do subtipo LUSC raramente têm mutações em EGFR ou fusões ALK, ao invés, apresentam alterações em outros RTKs. Por exemplo mutações em DDR2 (discoidin domain receptor tyrosine kinase 2) e amplificações/mutações em FGFR (fibroblast growth factor receptor) (SHTIVELMAN et al., 2014). Um estudo abrangente utilizando sequenciamento de nova geração (Next Generation Sequencing- NGS) foi realizado, em 2012, na tentativa de identificar mutações e alterações em LUAD. Para tanto, foram analisados o genoma e o exoma de 183 amostras, os quais apresentaram taxa média de 12 mutações somáticas exônicas por megabase (Mb). Entretanto foram encontradas diferenças em tumores de não fumantes (média de 2,9 mutações por Mb) e fumantes (12,9 mutações por Mb). Adicionalmente, foi observado um grande número de mutações que envolviam desregulação epigenética ou alterações na expressão do transcritoma codificador (IMIELINSKI et al., 2012; SHTIVELMAN et al., 2014). Outro estudo utilizando sequenciamento de alto desempenho analisou 178 carcinomas pulmonares (LUSC) e identificou uma média de 360 mutações exônicas, 323 alterações de número de cópias, 165 rearranjos genômicos e uma taxa média de 8,1 mutações somáticas de por Mb. Em geral o espectro de alterações somáticas em LUSC foi similar a LUAD, com exceção de amplificação genômica em 3q. Portanto, nesse estudo foi encontrada uma alteração molecular específica em LUSC, caracterizada pela amplificação do gene SOX2 (SRY sex determining region Y-box 2), mutações em NFE2L2 (nuclear factor, erythroid 2 like 2) e KEAP1 (kelch like ECH associated protein 1), alterações na via PI3K (phosphatidylinositol 3-kinase), amplificação de FGFR1 (fibroblast growth factor receptor 1), e mutações de DDR2 que não são encontradas ou são relativamente raras em LUAD (CANCER GENOME ATLAS RESEARCH N, 2012; SHTIVELMAN et al., 2014). 19 1.3 Telômeros e Características Gerais Telômeros são complexos nucleoprotéicos localizados nas extremidades dos cromossomos eucarióticos (CHAN; BLACKBURN, 2004). São responsáveis pela estabilidade genômica, pois impedem que os terminais cromossômicos sejam reconhecidos, pela maquinaria de reparo do DNA, como quebras de DNA na forma de dupla fita e evitam a fusão dos terminais (CELLI; DE LANGE, 2005; VERDUN; KARLSEDER, 2007) . Consistem de repetições conservadas e não codantes do tipo: 5’- TTAGGG-3’ (exemplo em humanos) (MOYZIS et al., 1988), cuja extensão varia de centenas a milhares de pares de base. Em humanos o tamanho dos telômeros varia de 5.000 a 15.000 pares de base (LIU et al., 2002; AVIV; LEVY; MANGEL, 2003). O DNA telomérico é constituído de uma região dupla fita e outra simples fita, sendo uma fita rica em guaninas (fita-G) e a outra rica em citosina (fita-C). A fita rica em G, forma uma protrusão de fita simples na extremidade 3' nomeada "3' G-overhang", que se associa a proteínas que regulam a atividade da telomerase, enzima responsável pela replicação dos telômeros (COLLINS, 2006). Os telômeros podem assumir diferentes conformações como a de t-loop (invasão da fita simples rica em G, na fita dupla, formando uma estrutura semelhante à de um laço) ou G-quadruplexes, na qual as guaninas da fita simples rica em G interagem formando uma estrutura de quarteto (G4 DNA). Tanto o t-loop quanto o G-quadruplex são mantidos por ação de proteínas da maquinaria telomérica e tem função de proteção ao telômero, evitando a ação da maquinaria de reparo, e de controle do acesso da telomerase ao DNA telomérico (GILSON; GÉLI, 2007). Na maioria dos eucariotos os telômeros são mantidos por ação da telomerase, uma ribonucleoproteína (RNP) com função de transcriptase reversa especializada, composta por dois principais componentes: a proteína telomerase transcriptase reversa (TERT) e o RNA não codificador (conhecido como TERC, “telomerase RNA component”), que é parte essencial da enzima. TERC é um RNA longo não codificador que contém uma pequena sequência que serve como molde para a telomerase replicar os telômeros (GILSON; GÉLI, 2007; LONDOÑO-VALLEJO; WELLINGER, 2012). O complexo mínimo formado por TERT e TERC é suficiente para a replicação telomérica "in vitro", contudo "in vivo" o complexo ribonucleoproteico da telomerase necessita da ação de proteínas reguladoras essenciais para a manutenção telomérica (GILSON; GÉLI, 2007; LONDOÑO-VALLEJO; WELLINGER, 2012). 20 Nos telômeros de mamíferos estão associadas proteínas que formam um complexo multiprotéico denominado de shelterin composto pelas proteínas TRF1 (telomeric repeat binding factor 1), TRF2 (telomeric repeat binding factor 2), TIN2 (TRF1-interacting protein 2), POT1 (protection of telomeres protein 1) , TPP1 (TIN2- and POT1-interacting protein) e RAP1(repressor/ activator protein 1) (DE LANGE, 2005; MARTÍNEZ; BLASCO, 2010, 2011), as quais exercem um papel fundamental na proteção e manutenção do tamanho dos telômeros (LIU et al., 2004; DE LANGE, 2005). As proteínas TPP1 e POT1 são fundamentais no processo pois formam um complexo com o DNA telomérico via TIN2 e TRF1/2 que regula o acesso da telomerase aos telômeros. Essa regulação parece estar diretamente associada a interação de TPP1 com outro complexo importante para a manutenção telomérica, o complexo CST. Ele é composto pelas proteínas CTC1 (CST telomere replication complex component 1), STN1 (STN1, CST complex subunit) e TEN1 (TEN1, CST complex subunit) em humanos, as quais são estruturalmente semelhantes ao complexo heterotrimétrico RPA (Replication Protein A). Junto ao complexo shelterin, as proteínas do complexo CST são responsáveis pela manutenção e estabilidade telomérica (Figura 1) (GIARDINI et al., 2014). Figura 1 - Estrutura telomérica e ação conjunta dos complexos shelterin e CST na manutenção telomérica Nota: Nos terminais dos cromossomos, a telomerase pode ser recrutada pela interação com TPP1/POT1. A elongação telomérica é finalizada pela telomerase quando o complexo CST se liga ao 3' G-overhang recém- sintetizado. O compelxo CST também interage com a DNA polα-primase para promover a síntese da fita C (linha pontilhada). O complexo CST inibe o acesso da RPA aos telômeros pela sua alta afinidade com DNA de simples fita rico em G evitando que os telômeros sejam confundidos com DNA danificado pela maquinaria de reparo. Figura retirada de GIARDINI et al. (2014). 21 No entanto, a função do complexo shelterin pode ser comprometida, ou até mesmo perdida, em células pré-senescentes que atingem comprimentos teloméricos criticamente curtos ou quando ocorrem alterações genéticas em seus componentes, o que resulta em desproteção telomérica e ativação de mecanismos de reparo ao DNA, podendo culminar em apoptose celular, senescência ou instabilidade genômica. Os telômeros ficam expostos a sinais de reparo ao DNA como as vias das quinases ATM (Ataxia telangiectasia mutated) e ATR (ATM- and Rad3-related), e ação de mecanismos de reparo como: junção de pontas não homólogas (c-NHEJ, classical non-homologous end joining e alt-NHEJ, alternative non-homologous end joining) e recombinação homóloga (HR, homologous recombination) (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016). Geralmente, as células detectam quebras no DNA pela ação de duas vias moleculares, conduzidas pelas quinases de sinalização ATM e ATR, que são ativadas em resposta a formação de quebras de fita dupla de DNA (DSBs- double-strand breaks) e quebras de fita única do DNA, respectivamente. Sinais de reparo disparam a parada do ciclo celular, que permite que as células reparem suas quebras ou entrem em senescência ou apoptose (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016). Há pouco tempo, mostrou-se que as vias de ATM e ATR também estão relacionadas com a regulação da telomerase. Uma via envolvendo ATM e ATR é mediada pela fosforilação do componente shelterin TRF1 resultando na sua remoção dos telômeros e na estagnação da forquilha de replicação nessa região e recrutamento da telomerase. Uma segunda via envolve ATM e ATR facilitando a montagem da telomerase. Esses dados revelam que os telômeros também estão envolvidos com a habilidade de explorar aspectos de vias de sinalização de danos ao DNA para regular a presença da telomerase nos telômeros. Maior compreensão da regulação da montagem da telomerase e acesso desta aos telômeros podem fornecer informações valiosas no processo de desenvolvimento de terapias mais precisas para pacientes com câncer (TONG et al., 2015). O reparo de quebras de DNA dupla fita nos telômeros pode envolver vias de recombinação homóloga ou não homóloga. O mecanismo de recombinação não homóloga ocorre ou pela via clássica c-NHEJ ou pela via alternativa alt-NHEJ. C-NHEJ promove pequenas alterações de sequências nas junções onde ocorre o reparo, enquanto que a via alt-NHEJ provoca deleções e/ou inserções nas regiões de reparo. C-NHEJ é ativada ao longo do ciclo celular, quando o heterodimero Ku70- Ku80 se liga as pontas quebradas de DNA, Ku então recruta a DNA-PKcs quinases (DNA-dependent protein kinase catalytic subunit) que promovem a fosforilação nas enzimas: Artemis (terminal 22 end-processing enzyme) responsável pela clivagem das protrusões de fita simples, DNA ligase 4 e da proteína XRCC4 (X-ray repair cross complementing 4) que catalisa a junção das pontas de DNA (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016), mecanismo representado na Figura 2. A via alt-NHEJ, atua, principalmente, nas fases S e G1 do ciclo celular, é dependente do sinal da PARP1 (poly (ADP-ribose) polymerase 1) e da ressecção da fita de DNA 5ʹ–3ʹ pelo complexo MRN (MRE11–RAD50–NBS1) e pela proteína: CtIP (CtBP-interacting protein). Durante o reparo ocorre um pareamento de bases nas pontas quebradas, conduzindo a junção das extremidades opostas de DSBs. O anelamento das pontas são substrato para a síntese de DNA pela Pol θ (Polimerase θ), permitindo a junção das pontas de DNA, pela LIG3(ligase 3) (Figura 2) (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016). Figura 2 - Mecanismos de reparo a danos no DNA por junção de pontas não homólogas Nota: A via C-NHEJ é ativada pela ação do complexo Ku70/80 que recruta a quinase DNA-PKcs que promove fosforilação nas enzimas: Artemis responsável pela clivagem das protrusões de fita simples, DNA ligase 4 e da proteína XRCC4 que catalisa a junção das pontas de DNA. A via alt-NHEJ é dependente do sinal da PARP1 e da ressecção da fita de DNA 5ʹ–3ʹ pelo complexo MRN (MRE11–RAD50–NBS1) e pela proteína CtIP. Ocorre um pareamento de bases nas pontas quebradas, conduzindo a junção das extremidades opostas de DSBs. O anelamento das pontas é substrato para a síntese de DNA pela Pol θ, permitindo a junção das pontas de DNA, pela LIG3. Figura retirada de Lazzerini-Denchi e Sfeir (2016). O reparo por recombinação homóloga nos telômeros ocorre de três formas: troca de fragmentos entre cromátides irmãs (telomere sister chromatid exchange T-SCE), recombinação homóloga de t-loop (telomere loop) e alongamento alternativo dos telômeros (alternative lengthening of telomeres - ALT) – Figura 3 (LAZZERINI- DENCHI; SFEIR, 2016). 23 Mecanismos T-SCE podem ser danosos quando provocam trocas desiguais entre cromátides irmãs, gerando células filhas com telômeros criticamente curtos. Componentes shelterin e o complexo Ku atuam inibindo essa via. Por exemplo, POT1 neutraliza a ação de fatores de recombinação homóloga (RPA e subsequentemente RAD51 recombinase). RAP1 e TRF2 estabilizam a junção do DNA telomérico simples e dupla fita, bloqueando a recombinação (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016). A configuração t-loop dos telômeros precisa ser desfeita para que ocorra replicação, caso contrário essa estrutura pode sofrer excisão por meio de recombinação homóloga, envolvendo a ação das proteínas de reparo: XRCC3 (X-ray repair cross complementing 3), NBS1 (Nibirin) e SLX4 (SLX4 structure-specific endonuclease subunit). TRF2, promove a formação de t-loop e protege essa estrutura de sofrer recombinação homóloga aberrante, recrutando RTEL1 (regulator of telomere elongation helicase 1) para desmanchar a conformação t-loop na fase S do ciclo celular. Deleção de RTEL1 ou inibição da interação dessa proteína com TRF2 permite que SLX4 atue para a excisão de t-loop, resultando na formação de círculos dupla fita de DNA telomérico (t – circles) e rápida perda telomérica. TRF2 também protege a estrutura t -loop da clivagem de XRCC3 e NBS1 (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016). O mecanismo de alongamento alternativo dos telômeros, ALT, ocorre em um subconjunto de tumores (10-15%) que não possuem atividade da telomerase. A recombinação ocorre entre telômeros de diferentes cromossomos, levando ao aparecimento de telômeros altamente heterogêneos em comprimento e com repetições não-canônicas, devido a ocorrência de recombinação entre regiões subteloméricas. Telômeros ALT são associados aos corpos ALT (associated promyelocytic leukamia nuclear bodies -APBs), tem expressão aumentada do lncTERRA (Telomere Repeat containing RNA) e elevados níveis de recombinações T-SCE com atuação de fatores da maquinaria de recombinação homóloga: RAD51, MRN, RAD9, RAD17, RPA e outros. Porém, os motivos e fatores que desencadeiam esse mecanismo alternativo permanecem desconhecidos. A chaperona ATRX (ATRX, chromatin remodeler) pode ter um papel chave nesse processo, pois é encontrada mutada na maioria das células e tumores ALT, e a reintrodução de ATRX em células ALT suprime a formação de T-SCE, APBs, c-circles e a recombinação inter-cromossômica telomérica (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016). 24 Figura 3 - Os três tipos de reparo por recombinação homóloga nos telômeros Nota: A) Mecanismo T- SCE: trocas de fragmentos teloméricos entre cromátides irmãs é inibida por RAP1, POT1 e o complexo Ku70-Ku80. B) Recombinação homóloga envolvendo a conformação t-loop é bloqueada pela ação de TRF2, que recruta RTEL1 para desfazer a conformação t-loop, protegendo os telômeros da clivagem de SLX4. Em adição, TRF2 protege os telômeros com conformação t–loop de sofrem recombinação homóloga aberrante, inibindo a ação de XRCC3 e NBS1. C) Telômeros formam a estrutura estável G4 quadruplex, que impedem a progressão da forquilha de replicação. ATRX desmancha essa conformação permitindo a deposição da histona H3.3, e auxiliando na progressão da replicação. A atividade de ATRX nos telômeros inibe as características de ALT: T-SCEs, formação de telômeros em círculos, recombinação intercromossomal e formação de APBs. Figura retirada de Lazzerini-Denchi e Sfeir (2016). O envolvimento de uma nova via no controle dos telômeros foi proposta, esta é feita por longos RNAs não codificadores transcritos a partir das regiões subtelomérica/telomérica. Em humanos, os RNAs conhecidos como Telomere Repeat containing RNA, TERRA (AZZALIN et al., 2007), são transcritos pela RNAPII (RNA polimerase II) a partir da região subtelomérica da fita telomérica rica em C, seguido de repetições teloméricas que seguem em direção ao término do cromossomo (AZZALIN et al., 2007; SCHOEFTNER; BLASCO, 2008; NERGADZE et al., 2009; PFEIFFER; LINGNER, 2012). Ainda não está bem definido o que regula o número de transcritos TERRA nas células. E no caso de células tumorais depende da fase de desenvolvimento do tumor e também da estrutura da cromatina telomérica (ARORA; BRUN; AZZALIN, 2012). O que já é bem reconhecido é que o TERRA está envolvido na regulação do comprimento e replicação do telômero, pela modulação das ações da exonuclease 1 e da telomerase, resposta a danos no DNA telomérico e mudanças na composição da cromatina telomérica durante o ciclo celular. 25 1.4 Telômeros e câncer A desproteção telomérica pode ser desastrosa para a sobrevivência da célula, gerando instabilidade genômica (CESARE et al., 2013) que pode acarretar no desenvolvimento de doenças em mamíferos (JACOBS, 2013). Desta forma, a pesquisa com telômeros tem despertado grande interesse em áreas como desenvolvimento, senescência celular e câncer (ZHANG, 2007). Devido à importância da telomerase na manutenção da integridade dos telômeros, sua atividade é extensamente regulada em alguns organismos, principalmente em mamíferos nos quais a atividade desta enzima é muito baixa ou indetectável em células somáticas (ULANER et al., 1998; DJOJOSUBROTO et al., 2003; BLASCO, 2005; SCHAETZLEIN; RUDOLPH, 2005). A telomerase é expressa somente durante o início da embriogênese e sua atividade é largamente reprimida a partir do período neonatal, exceto em células germinativas e em órgãos altamente proliferativos como a pele, fígado, intestino e medula óssea que contêm subpopulações de células tronco/progenitoras (HIYAMA et al., 1995; CHIU et al., 1996; HÄRLE-BACHOR; BOUKAMP, 1996; ULANER et al., 1998; SAVAGE, 2014). Em células somáticas humanas, durante cada divisão celular, os telômeros encurtam devido à incompleta replicação dos terminais de cromossomos pela DNA polimerase e também pela inibição da atividade da telomerase nessas células (WATSON, 1972; OLOVNIKOV, 1973; AUBERT; LANSDORP, 2008). Quando os telômeros tornam-se criticamente pequenos, uma resposta celular é desencadeada sinalizando para a interrupção do ciclo celular e entrada em senescência, indicando que as células alcançaram a máxima capacidade de proliferação (limite de Hayflick) (HAYFLICK, 1965). Em humanos, as células que conseguem escapar dessa crise natural já perderam a função de genes que são checkpoints críticos do ciclo celular tais como: TP53, p16INK4a (cyclin-dependent kinase-4 inhibitor) e pRB (RB transcriptional corepressor 1) e da maquinaria de reparo a danos no DNA (WRIGHT; PEREIRA-SMITH; SHAY, 1989). Essas células acumularam mutações e múltiplas anormalidades cromossômicas e conseguem reativar um mecanismo para a manutenção dos telômeros (ou pela reativação da telomerase que ocorre em 85-90% dos tumores, ou pelo mecanismo ALT, presente em 10-15% dos tumores telomerase negativos). Desta maneira, as células que escaparam dos processos de crise e senescência, considerados checkpoints para a supressão tumoral, 26 agora são consideradas imortais o que pode culminar com o processo de carcinogênese em humanos (KIM et al., 1994; MEYERSON et al., 1997; GIARDINI et al., 2014). A Figura 4 exemplifica o papel dos telômeros durante a carcinogênese. A ativação da telomerase é a via mais comum para a imortalização e transformação celular. Sua expressão é detectada em aproximadamente 85-90% dos tumores malignos ( KIM et al., 1994; HANAHAN; WEINBERG, 2000). Esse fato confere a telomerase um alto potencial como biomarcador e alvo para o desenvolvimento de mecanismos baseados em diagnóstico, prognóstico e terapias para pacientes com câncer (SHAY; WRIGHT, 2011). O restante dos tumores apresenta o mecanismo alternativo para a manutenção telomérica, ALT (BRYAN et al., 1997). Figura 4 - Papel dos telômeros durante a carcinogênese Nota: Encurtamento dos telômeros em tecidos envelhecidos ou cronicamente danificados causa uma disfunção telomérica e aumenta o risco de início da tumorogênese. Para prevenir a ativação de mecanismos de “checkpoints” devido à presença de DNA danificado e para tornar-se imortalizada, células tumorais precisam estabilizar seus telômeros ou pela ativação da telomerase ou pelo mecanismo ALT. Figura retirada e modificada de Sunami et al. (2014). Vários estudos mostram que a deleção genética ou a inibição da telomerase levam a uma significante supressão da capacidade de formação tumoral e uma atenuação do crescimento de células neoplásicas em modelos in vivo (GONZÁLEZ-SUÁREZ et al., 2000; RUDOLPH et al., 2001; FARAZI et al., 2003; LECHEL et al., 2007). A inibição da telomerase usando camundongos knockout telomerase deficientes (-/-), contudo, mostrou atividade anti-tumoral somente depois de várias gerações quando estes apresentaram os telômeros com um tamanho crítico. Esse efeito anti-tumoral foi anulado 27 na ausência de expressão do gene supressor tumoral TP53 (CHIN et al., 1999; GREENBERG et al., 1999). Adicionalmente, pesquisas mostram que a expressão aumentada de TERT pode aumentar o tempo de vida desses animais, em casos que também há uma superexpressão de genes supressores tumorais, indicando que em mamíferos, TERT deve ter um papel antienvelhecimento (TOMÁS-LOBA et al., 2008). 1.4.1 Câncer e o complexo Shelterin O complexo proteico shelterin é a chave para a homeostase telomérica em mamíferos e outros vertebrados, orquestrando a ação da telomerase nos telômeros. Mutações em alguns componentes do complexo shelterin vêm sendo encontradas em várias doenças do envelhecimento, incluindo o câncer (ARMANIOS; BLACKBURN, 2012). Variantes de POT1 que prejudicam a proteção telomérica, aparecem associadas com melanoma familiar, glioma familiar e leucemia linfocítica crônica (RAMSAY et al., 2013; ROBLES-ESPINOZA et al., 2014; SHI et al., 2014; BAINBRIDGE et al., 2015; MARTÍNEZ; BLASCO, 2015). Todas as variantes de POT1 que foram encontradas, conferem um efeito de alongamento aos telômeros, sugerindo que o alongamento em combinação com aberrações induzidas por essas mutações pode favorecer a incidência tumoral (MARTÍNEZ; BLASCO, 2015). Ensaios com células tumorais humanas e células tronco embrionárias, têm demonstrado que o recrutamento da telomerase para os telômeros depende de uma região de superfície da proteína TPP1, região nomeada de TEL patch (para TPP1 glutamate (E) and leucine (L)-rich patch) (NANDAKUMAR et al., 2012; SEXTON; YOUMANS; COLLINS, 2012; ZHONG et al., 2012; SEXTON et al., 2014). Em um estudo no qual induziu-se mutações em TEL patch em células Hela, verificou-se que há uma redução da proliferação das células tumorais e a indução de morte celular (NAKASHIMA et al., 2013). Outros estudos destacam a função de TRF2, como essencial para a proteção telomérica já que a inibição de TRF2 pode induzir encurtamento telomérico (KARLSEDER et al., 1999; LECHEL et al., 2005). Uma pesquisa recente demonstrou que a proteína TRF1 também pode ser usada como alvo para desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas contra o câncer. Nesse estudo foi demonstrado que a inibição de TRF1, reduz efetivamente o tamanho e o grau de malignidade de carcinoma de pulmão 28 em ratos deficientes para p53 e k-Ras, com aumento da sobrevida do animal. Esse efeito de supressor tumoral de TRF1 ocorre já na primeira geração do animal e é independente do tamanho telomérico, sendo que a longo prazo não afeta a viabilidade e sobrevivência. Assim, telômeros desprotegidos pela inibição de TRF1, podem representar uma nova e potente estratégia terapêutica para tratar o câncer de pulmão induzido pela via do oncogene k-Ras (GARCÍA-BECCARIA et al., 2015). 1.4.2 Câncer e proteínas teloméricas não Shelterins A manutenção da arquitetura telomérica envolve uma rede altamente regulada de interação proteína-proteína, proteína-DNA e proteína-RNA, e o comprometimento dessa rede pode levar a disfunção telomérica e evolução celular para um estado maligno (O’SULLIVAN; KARLSEDER, 2010). Envolvidas nestes mecanismos estão as proteínas do complexo shelterins e as proteínas que não fazem parte desse complexo: como os fatores de reparo ao DNA MRE11/NBS1/RAD50 (complexo MNR) e proteínas de replicação RPA1 que previnem o telômero de sofrer degradação e facilitam a elongação telomérica (GILSON; GÉLI, 2007). Em adição, outros fatores são necessários para a correta atividade da telomerase, incluindo a proteína Disquerina (DKC1), componente do complexo telomerase e responsável por estabilizar a ligação de TERT/TERC (ALAWI; LIN, 2011). Mutações em DKC1 estão relacionadas a disqueratose congênita (DC), doença caracterizada por múltiplas anormalidades na pele e medula óssea. Os pacientes com DC possuem telômeros excessivamente curtos e reduzida atividade de telomerase. Contudo, o gene DKC1 não é encontrada mutado, mas sim com expressão elevada em cânceres esporádicos, porém a relação desse fato com o desenvolvimento tumoral permanece desconhecido (KIRWAN; DOKAL, 2008; MASON; BESSLER, 2011). Em outro estudo, foram encontrados os genes DKC1, RAD50, MRE11, NBS1 e RPA1 com expressão elevada em células do plasma (células mononucleadas) de pacientes com Mieloma Múltiplo (MM) em comparação com células de pacientes com Gamopatia Monoclonal de Significado Indeterminado (GMSI), uma forma pré-maligna de MM (PANERO et al., 2015). Adicionalmente foi relacionado uma alta expressão de TERT com alta expressão de DKC1 nas células de pacientes MM (PANERO et al., 2015). Já pesquisas que envolvem Leucemia Linfocítica Crônica mostram resultados controversos: um estudo encontrou altos níveis de expressão de RPA1, mas baixos níveis de DKC1, MRE11 e RAD50 (PONCET et al., 2008), porém outro observou alta expressão de 29 MRE11, RAD50 e RPA1 (HOXHA et al., 2014). Em adição, elevada expressão de DKC1 foi detectada em diferentes tipos de tecido tumorais: carcinoma hepatocelular (LIU et al., 2012), próstata (SIERON et al., 2009), cólon (WITKOWSHA et al.; 2010) e mama (MONTANARO et al., 2008), sugerindo um papel crítico desse gene na tumorigênese (PANERO et al., 2015). É sugerido que a alta expressão desses genes, ocorre em resultado do aumento da necessidade de reparo no DNA, contudo até o momento poucos estudos foram desenvolvidos nessa área (PANERO et al., 2015). 1.4.3 Telômeros e câncer de pulmão Os telômeros e proteínas associadas têm um papel fundamental no desenvolvimento do câncer, envolvendo principalmente a imortalização celular, o que torna essa estrutura um importante alvo para o delineamento de novas modalidades terapêuticas (SUN et al., 2015). A atividade de telomerase em tecidos tumorais foi relatada em diferentes tipos de cânceres (NAKANO; WATNEY; MCDOUGALL, 1998; CHANG et al., 1999; TAKAGI et al., 1999; ZHANG et al., 1999). Ensaios como TRAP (Telomeric Repeat Amplification Protocol), têm sido usados para avaliar a atividade da enzima em câncer de pulmão SCLC e na maioria dos NSCLC. Em relação aos NSCLC, a atividade de telomerase foi relatada em: 69-92% dos casos de LUAD, 60-91% de LUSC e 67-100% de LCC (CHANG et al., 1999; WEI; DEVILBISS; LIU, 2015). Outros estudos têm mostrado que além da atividade enzimática foi possível detectar aumento no nível de expressão de TERT em NSCLC (COUNTER et al., 1998; HSU et al., 2003; WU et al., 2003a; BRENNAN; HAINAUT; BOFFETTA, 2011; WEI; DEVILBISS; LIU, 2015). A inibição da telomerase tem sido proposta como alvo terapêutico em NSCLC (RUDEN; PURI, 2013), baseando-se no fato de que essa inibição levaria ao encurtamento telomérico, senescência ou apoptose das células em tecidos tumorais (SHAY; WRIGHT, 1996; OUELLETTE; WRIGHT; SHAY, 2011). Alguns desses estudos utilizam oligonucleotídeos antisensos que se ligam ao componente RNA da telomerase (OUELLETTE; WRIGHT; SHAY, 2011) tal como o Imetelstat (MOLCKOVSKY; SIU, 2008) e imunoterapia utilizando a vacina baseada em telomerase GV1001, a qual mostrou aumento de sobrevida de pacientes com NSCLC com doença avançada e não elegíveis para cirurgia, os quais receberam quimioterapia ou radioterapia como tratamento de primeira linha. Neste caso, a sobrevida foi somente observada em pacientes que desenvolveram células T de memória 30 com resposta específica a GV1001 e perfis de citocinas IFNγ (alto)/IL-10 (baixo)/IL- 4 (baixo) (SHTIVELMAN et al., 2014). Estudos de associação genômica global (Genome-Wide Association Studies- GWASs) identificaram polimorfismos relacionados aos genes TERT e CLPTM1L (cleft lip and palate transmembrane protein 1-like protein), na região cromossômica 5p15.33, associados com o aumento do risco de câncer de pulmão. Entre eles estão os: polimorfismos de nucleotídeo único (single nucleotide polymorphisms-SNP) rs2736100 (associado ao aumento do risco de NSCLC mais alto em populações do leste asiático do que em caucasianos) e rs401681 e rs402710 (associados com risco de câncer de pulmão tanto em populações do leste asiático quanto em caucasianos). Estes estudos evidenciam que o risco de câncer de pulmão associado com diferentes polimorfismos no locus 5p15.33 varia conforme a etnia (WEI; DEVILBISS; LIU, 2015). Mas apesar desses polimorfismos terem sido identificados em genes associados à telomerase em câncer de pulmão, não há dados de aplicação clínica desses resultados em estratégias de prevenção do carcinoma pulmonar. Outros estudos procuram correlação entre atividade da telomerase e o estágio de desenvolvimento do tumor. Grande parte das pesquisas mostraram que o aumento da atividade da telomerase nas células tumorais está associada a estágio avançados do tumor (IIIB e IV) (MARCHETTI et al., 1999; TAGA et al., 1999; GONZÁLEZ-QUEVEDO et al., 2002; FUJITA et al., 2003; HSU et al., 2004; CHEN et al., 2006; ZHU et al., 2006; TARGOWSKI et al., 2008; BRENNAN; HAINAUT; BOFFETTA, 2011) e / ou reduzida sobrevida dos pacientes (MARCHETTI et al., 1999; TAGA et al., 1999; GONZÁLEZ- QUEVEDO et al., 2002; FUJITA et al., 2003; WU et al., 2003a; CHEN et al., 2006; ZHU et al., 2006; FRÍAS et al., 2008; TARGOWSKI et al., 2008). No entanto, outros grupos não encontraram nenhuma relação entre atividade da telomerase no tecido tumoral e estágio de desenvolvimento do tumor no pulmão ou sobrevida do paciente (HIRASHIMA et al., 2000; HSU et al., 2004). Os dados contraditórios encontrados na literatura podem ser devido ao pequeno número de amostras analisadas e à heterogeneidade tumoral. Portanto, ainda não é possível determinar se há uma associação entre a atividade da telomerase e o estadiamento tumoral ou sobrevida de pacientes com câncer de pulmão (GANSNER; ROSAS, 2013) Outro estudo verificou a concordância na expressão de genes associados à telomerase e a maquinaria telomérica em pacientes com câncer de pulmão NSCLC. Nesse estudo foram analisadas 78 amostras: 42 do subtipo LUSC e 36 do subtipo LUAD. Os 31 genes analisados foram: TERT, TERC, TP1 (telomerase-associated protein), MYC (gene que codifica o fator de transcrição que regula expressão do gene TERT), TRF1, e TRF2. Identificou-se que a atividade da telomerase estava presente em 60.3% dos pacientes e a expressão dos genes TERT, TERC, TP1, Myc, TRF1 e TRF2 foram observadas em 66,6, 92,3, 100, 91,0, 74,4 e 83,3% dos tecidos tumorais, respectivamente. Alta atividade de telomerase foi encontrada em pacientes em estágios avançados da doença. Além disso, tecidos tumorais positivos para as proteínas TERT e TRF1, também apresentavam alta expressão do gene TERT, embora não tenha sido encontrada correlação entre a expressão dos genes e a atividade da enzima. Entretanto a expressão do gene TERT parece estar associada à expressão dos genes TRF1, TRF2 e MYC. Embora estes resultados sejam importantes, ainda são preliminares para se entender os mecanismos de controle da manutenção telomérica em NSCLC (HSU et al., 2003). O mesmo grupo também investigou se há correlação na razão entre o comprimento do fragmento de restrição telomérica t/n-TRFLR (tumour-to-normal telomere restriction fragment length ratio) de tecidos tumorais e histologicamente normais, e a atividade da telomerase sobre a influência de TRF1 e TRF2, proteínas do complexo shelterin. Nesse estudo foram analisados 79 pacientes com NSCLC. Observou-se que os TRFLR eram mais curtos nos tecidos tumorais e naqueles telomerase positivos, e que um menor t/n- TRFLR (≤75%) estava associado com uma alta expressão de TRF1 e TRF2, mas não a expressão dos genes MYC, TERT, ou TERC e a atividade de telomerase. Sugerindo uma estreita associação entre o encurtamento telomérico e a expressão dos genes TRF1/TRF2 (HSU et al., 2007a). Em contraste, um estudo com pacientes NSCLC demonstrou baixo nível de expressão de TRF1 nos tecidos tumorais, porém sem alteração na expressão de TRF2, POT1 e RAP1. Contudo, os autores mostram que a expressão aumentada de RAP1 nas células tumorais está associada com uma maior sobrevida dos pacientes (LIN et al., 2006). ANTONIOU et al. (2013) avaliou diferenças nos níveis de expressão dos genes TERT e TERC em tecidos de pacientes com NSCLC e em fluido broncoalveolar de pacientes com fibrose idiopática pulmonar (IPF), pois há indicações de vias patogênicas comuns nessas doenças. Foi demonstrado que tanto a expressão de TERT e TERC estavam diminuídas em tecidos de pacientes com IPF em comparação com pacientes com NSCLC. Esses resultados, portanto, não suportam a hipótese de uma via comum para a telomerase nessas doenças, mas revelam perfis de ativação de telomerase distintos. 32 Tendo como base estudos que divergem quanto à correlação entre a média do tamanho dos telômeros e o risco de câncer de pulmão: dois estudos retrospectivos de caso controle (WU et al., 2003b; JANG et al., 2008) mostraram que o encurtamento dos telômeros em leucócitos está significativamente associado, p ≤ 0,05, com um aumento de 2 a 3 vezes do risco de desenvolvimento de câncer de pulmão. Adicionalmente, um grupo de pesquisa nos EUA (SUN et al., 2015), avaliou a associação entre a variação do tamanho telomérico (telomere lenght variation- TLV), média do comprimento telomérico (telomere length-TL) em linfócitos e o risco de desenvolver câncer de pulmão (NSCLC) em pacientes da região de Baltimore. Esses pesquisadores mostraram que a TLV estava significativamente associada, p≤ 0,05, com o risco de câncer e essa associação foi modulada pela idade. Salientou-se que a combinação de TLV e a média do comprimento telomérico melhora a estratificação para o risco de câncer de pulmão. Na faixa etária mais jovem, indivíduos que tinham telômeros curtos e alta TLV tiveram 8 vezes maior risco de desenvolver câncer de pulmão do que aqueles que têm telômeros mais longos e baixo TLV. Se confirmado por estudos futuros, TLV e a média do comprimento dos telômeros em linfócitos podem ser incorporados em um painel de biomarcadores para avaliação de risco de câncer de pulmão (SUN et al., 2015). Em contraste, estudos estimaram o comprimento telomérico em leucócitos (Leucocyte Telomere Length- LTL) de pacientes com câncer de pulmão em um grupo de homens fumantes na Finlândia e verificou-se que longos LTL estão diretamente associados com aumento do risco de desenvolver câncer de pulmão (SHEN et al., 2011). Outro estudo com a população Chinesa mostrou resultado similar (LAN et al., 2013; WEI; DEVILBISS; LIU, 2015). Em vista do exposto, esse estudo propõe verificar alterações na expressão de genes associados com a maquinaria telomérica (exemplo: TERT, TER e componentes do complexo shelterin) e no tamanho dos telômeros em amostras de tecido tumoral e tecido pulmonar normal de pacientes com NSCLC dos subtipos histológicos LUAD e LUSC. 33 2 OBJETIVO GERAL DA PROPOSTA Investigar alterações de expressão em genes associados aos telômeros e avaliar o tamanho telomérico em amostras de NSCLC dos subtipos adenocarcinoma (LUAD) e carcinoma de células escamosas (LUSC). 2.1 Objetivos específicos 1. Analisar a expressão de genes associados com a maquinaria telomérica, utilizando RT-qPCR, em amostras de tecido tumoral e tecido histologicamente normal adjacente de pacientes com NSCLC. 2. Analisar a expressão de genes associados com a maquinaria telomérica utilizando dados de RNA-Seq obtidos de tecido tumoral e tecido histologicamente normal adjacente de pacientes com NSCLC. 3. Investigar o perfil de expressão de genes associados aos telômeros utilizando dados de RNA-Seq, disponíveis no banco de dados público TCGA (The Cancer Genome Atlas), e obtidos de amostras de pacientes com NSCLC. 4. Avaliar o perfil de restrição de comprimento telomérico (TRF) em amostras tumorais e normais adjacentes ao tumor de pacientes diagnosticados com NSCLC. 5. Avaliar os TRFs de leucócitos de pacientes diagnosticados com NSCLC em comparação com amostras de doadores saudáveis. 34 3 MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 Dados das amostras Esse trabalho foi conduzido utilizando amostras (tecido e sangue) previamente coletadas e armazenadas pela equipe de pesquisa da Profa. Dra. Patrícia Pintor dos Reis (Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP). O estudo coordenado pela Dra. Patrícia, no qual as amostras foram coletadas, foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu (CAEE 34958514.0.0000.5411). Os pacientes e participantes elegíveis para a pesquisa assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido anteriormente à coleta de amostras. Os critérios de inclusão foram: pacientes com diagnóstico de carcinoma pulmonar, submetidos à cirurgia, não sendo tratados previamente com quimioterapia ou radioterapia, tumores de qualquer localização anatômica nos pulmões e de qualquer estadiamento e grau histológico. Os critérios de exclusão foram: pacientes com doença metastática secundária nos pulmões e pacientes com comorbidades tais como diabetes ou em grave estado de saúde apresentando caquexia. As amostras utilizadas nos ensaios de RT-qPCR e Southern Blot são de tecido tumoral e histologicamente normal, adjacente ao tumor de pacientes diagnosticados com NSCLC dos subtipos LUAD e LUSC - Anexo 1. Nesses ensaios, as amostras utilizadas são de pacientes tratados no Hospital de Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (HCB – FMB, UNESP). Os ensaios de Southern Blot foram realizados também com amostras de sangue periférico (leucócitos) - Anexo 3. Para esse ensaio também foram incluídas análises com amostras obtidas de indivíduos controle (saudáveis, sem doença) - Anexo 4. A análise de transcritoma utilizou dados de RNA-Seq gerados em amostras de pacientes tratados no Hospital do A. C. Camargo, SP – Anexo 2. Foram analisados também os dados do transcritoma de amostras de tumores e tecidos normais adjacentes de pacientes com câncer de pulmão, disponíveis no banco de dados público: The Cancer Genome Atlas (TCGA). Os métodos utilizados nesta pesquisa encontram-se resumidos na Figura 5 (item 4). 35 3.2 Metodologia de extração de RNA As amostras de tecido tumoral e normal adjacente ao tumor foram cortadas (50- 100mg), maceradas em nitrogênio líquido e imersas em 1 mL de trizol e incubadas temperatura ambiente por 5 minutos. A seguir, foi adicionado 200 µL de clorofórmio em cada amostra, as quais foram agitadas vigorosamente por 15 segundos e submetidas à centrifugação a 12.000 rpm, por 15 min, a 4ºC. A fase aquosa (sobrenadante) resultante da centrifugação foi removida cuidadosamente e colocada em um novo tubo eppendorf, seguida da adição de 500 µL de isopropanol. A amostra em isopropanol foi colocada na coluna de purificação do RNeasy Qiagen kit e seguida a extração do RNA, segundo o protocolo do fabricante. As amostras foram submetidas à purificação utilizando o RNAse- free DNAse set (Qiagen), otimizado para uso com o RNeasy Qiagen kit, para digestão de DNA que possa estar presente na amostra de RNA. O protocolo seguiu as instruções do fabricante, com adição de 70 µL de tampão RDD (RNAse-free buffer) mais 10 µL de enzima DNAse I a cada amostra. Após a extração, as amostras foram quantificadas em espectofotômetro (NanoDrop 8000, Thermo Scientific), e a qualidade do RNA avaliada utilizando Bionalyzer (Agilent). 3.3 Metodologia de extração de DNA A extração de DNA foi realizada nas amostras de tecidos (tumoral e normal adjacente) e de buffy coat obtidas de pacientes com NSCLC, com o objetivo de quantificar alterações teloméricas específicas. Nas amostras o DNA foi extraído utilizando o Kit DNeasy blood & Tissue (Qiagen). Esses métodos de extração são baseados na obtenção e purificação do DNA em membranas de sílica. Os protocolos foram realizados segundo as instruções do fabricante. As amostras de DNA foram avaliadas quanto à quantidade e qualidade utilizando o espectofotômetro (NanoDrop 8000, Thermo Scientific). 3.4 Metodologia de validação de alterações na expressão de genes associados a maquinaria telomérica: PCR quantitativa em tempo real A metodologia de análise da expressão gênica pela PCR quantitativa em tempo real (RT-qPCR) envolve uma etapa inicial de Transcrição Reversa (RT) para conversão 36 de mRNA em cDNA seguida da amplificação pela PCR quantitativa. Para a RT, utilizamos o High Capacity cDNA Reverse Transcription Kit (Thermo Fisher Scientific). Resumidamente, 1000ng de RNA foram adicionados à reação de 2X RT Master Mix (20µL de volume por reação) que contém 2µL de 10X RT Buffer, 0,8 ul de 25X dNTP Mix (100Mm), 2ul de 10X RT Random Primers, 1ul de MultiScribe™ Reverse Transcriptase e Nuclease- free water (quantidade suficiente para completar 20 ul de reação), fornecidos pelo Kit. A reação foi incubada em termociclador nas seguintes condições: 10 minutos a 25ºC, 120 minutos a 37ºC, 5 minutos a 85ºC. Após o término da reação, as amostras de cDNA foram imediatamente congeladas e mantidas em freezer a - 20ºC. Controles negativos foram incluídos em cada reação de síntese de cDNA para garantir a ausência de contaminação. O RNA Universal Reference (Agilent Technologies) foi utilizado como controle positivo em todas as reações. Para a PCR quantitativa, o protocolo utilizou mix de reação no total de 9 ul, contendo: 300nM de cada primer, 3,15 µL de Power SYBR Green mix (Applied Biosystems) e ddH2O livre de DNase/RNase (Sigma) em quantidade suficiente para completar 9 ul de reação. A cada mix de reação (9ul) foram adicionados 1ul (5ng) do cDNA sintetizado de acordo com o protocolo de transcrição reversa. O equipamento utilizado foi o QuantStudio 12K (Life Technologies). Curvas de dissociação foram incluídas em todas as amplificações para assegurar a produção de produtos específicos. Os valores de Ct (threshold cycle), que constitui o número de ciclos na PCR quantitativa correspondente à amplificação estatisticamente significativa foram utilizados na análise dos dados, pelo método DeltaDelta Ct (LIVAK; SCHMITTGEN, 2001). Nessa análise, o fator de normalização foi obtido através da média geométrica dos valores de Ct dos controles endógenos: os genes B2M e RPS13. Os genes endógenos foram previamente analisados em outros estudos (BOUTROS et al., 2009; LOCKWOOD et al., 2010; ZHU et al., 2010; HAI et al., 2012) e por análises utilizando os programas LinReg PCR e DataAssist™ que mostraram que os genes B2M e RPS13 eram os mais estáveis para as análises com amostras de tecido pulmonar tumoral e tecido pulmonar normal, adjacente ao tumor. Abaixo, segue a Tabela 2 com as sequências dos iniciadores utilizados para as análises desta etapa do projeto. 37 Tabela 2 - Lista dos genes e sequências dos iniciadores utilizados no ensaio de RT-qPCR Nota: Em negrito a sequência dos iniciadores, utilizados como endógenos. F: Forward (senso); R: Reverse (reverso ou anti-senso) A sequência dos iniciadores TERRA 1q2q10q13q e TERRA 15q foram retiradas de SCHEIBE, et al. (2013) e a sequência do iniciador TERRA 20q foi cedida pelo pesquisador Dr. Claus Azzalin -Instituto de Medicina Molecular, Lisboa, Portugal. As demais sequências foram desenhadas utilizando o software Primer Express Software v3.0. 3.5 Análises estatísticas dos dados (RT-qPCR) Para a análise de expressão gênica utilizando RT-qPCR, foram utilizadas amostras de tumores e tecidos pulmonares histologicamente normais de 28 pacientes com NSCLC (28 amostras tumorais e 15 normais adjacentes), tratados no HCB - FMB - UNESP. Utilizou-se o teste não paramétrico de Wilcoxon-Mann-Whitney para comparar os dados não pareados da expressão de genes, envolvidos com a maquinaria telomérica nos dois grupos (tumor vs. normal). Diferenças estatisticamente significativas foram consideradas quando o valor p do teste estatístico é inferior ao nível de significância de 5% (p<0,05). Os gráficos foram elaborados utilizando o software Prism versão 6.0 para Windows. A análise estatística foi realizada pelo software Minitab versão 16 para Windows. As Gene (símbolo) Primer Forward (5’→3’) Primer Reverse (5’→3’) TERRA1q2q10q13q GAATCCTGCGCACCGAGAT CTGCACTTGAACCCTGCAATAC TERRA15q CAGCGAGATTCTCCCAAGCTAAG AACCCTAACCACATGAGCAACG TERRA20q GCAGCTTTCTCAGCACAC TTTGTTCACTGTCGATGCG HSP90AA1 CACTTGGCAGTGAAGCATTTTT GGGACAAATAGAAGGGCTCTGA TRF1 CGGCTGGATGCTCGATTT GCCGTCGCGGAAAGCT TRF2 CTGAGGCAGCCTTTGCAAA GGAGAGCTTGAGTAGGAAGAACCA POT1 TGTTCAGCCAATGCAGTATTTTG GCTCCGTCCACTTCTGCTTT TERT CTGCGGCCGATTGTGAA TTTTCTCTGCGGAACGTTCTG TERC GCGCCGTGCTTTTGCT TTTTCCGCCCGCTGAA PINX1 AACGTCGGCGGAAGCA CATTACTCCAGGCAGTGTTCTGA RTEL1 CACTGCAAAGCCAGAGGACTT TGTGAGAAGCGCTGCTTGTG TEN1 GGAGGTTAGTGCAGGCCAAGT AGGCACAACCTGCCAAATGT ATRX CCCATGAGTGAAAGCAAGTTGA ATGAGTGTGCAAGGAAGTCATGA DAXX CGACGTCACCTCGATCTCATC CGCCTGGCCTATAGTCATCTG STAG2 ACCATTAGACAAGCGGCTGAA TGCTGTAAGCACCCTTTTTCCT SMG6 CAGCAAAGAGGAGCCAATCC TCCGGTCATCCGTCAACAG MRE11 TGGCAACCTCAACATTTCAATT TGCCCCTGTGGGATCGT SUV39H1 GGAGCCACGGCAGAATCTC TTTCTAAGTCCTTGTGGAACTGCTT RUVBL2 TGGACATCGAGAGCTTCTCCTT GGACAGGCGCCATGTCA RUVBL1 ATCGCTCCCATCGTCATCTT CCTCAGTGCCTCTGATGACACA BRCA2 GCATGCAAATGATCCCAAGTG GCAGTGTACGGCCCTGAAGT TINF2 CTGTGGATTTGGCCTCGAA GCCAGAAAGGGTTCCCCATA RPA3 CCGGCATGCTAGCTCAATTC CTTTTCCAGCCTCCCTACGA DNMT3B CCCATGCAACGATCTCTCAA CCGGCCTGTACCCTCATACA DNMT3A CCTGTGGGAGCCTCAATGTTA CTTGCAGTTTTGGCACATTCC TNKS2 GAAAAAGGAGGTTCCAGGAGTAGAT CCATTAGGTGCTCAAGTCCAAGA RAD51 TTTGGCCCACAACCCATT TCTTCACATCGTTGGCATTTATG DKC1 GCCACTCGCTTGGTGAAGTC CCGGACAATCCCCACATACT B2M GTCTCGCTCCGTGGCCTTA TGAAACCCAGACACATAGCAATTC RPS13 CCAGTCGGCTTTACCCTATCG TGTGCAACACCATGTGAATCTC 38 análises estatísticas foram realizadas em colaboração com o Dr. Rogério Oliveira, Departamento de Bioestatística-Instituto de Biociências de Botucatu- UNESP. 3.6. Análise bioinformática dos dados de RNA-Seq Os dados de RNA-Seq foram gerados utilizando a plataforma Illumina® (Illumina, San Diego, CA, EUA). Foram gerados perfis do transcriptoma codante de um total de amostras de 7 pacientes (7 tumores do subtipo LUAD e 7 tecidos pulmonares normais, adjacente ao tumor dos mesmos pacientes) -Anexo 2. Utilizou-se o protocolo do kit TruSeq Total RNA Library (Illumina, EUA) para extração e montagem das bibliotecas. A qualidade das mesmas foi confirmada usando o equipamento Bioanalyzer (Agilent Technologies, Santa Clara, CA, USA). As bibliotecas de cDNA foram sequenciadas no padrão paired-end por meio do equipamento HiScan SQ (Illumina), gerando 50 milhões de pares de reads(de aproximadamente 101 pares de bases cada) por amostra. A qualidade das sequências foi avaliada utilizando o programa FastQC (bioinformatics.babraham.ac.uk/projects/fastqc/). Utilizou-se a ferramenta FASTX Clipper do pacote FASTX-Toolkit: (extr://hannonlab.cshl.edu/fastx_toolkit/commandline.html#fastx_clipper_usage) para a remoção de sequências de adaptadores, primers, artefatos e contaminantes, possivelmente gerados no sequenciamento. Os arquivos fastq foram filtrados baseados na qualidade dos reads (Phred Quality Score Q ≥ 30) (BABRAHAM INSTITUTE, 2013). O mapeamento dos reads filtrados foi efetuado com o software TopHat2 v2.1.0 (KIM et al., 2013). Tanto o genoma humano de referência utilizado, GRCh38.dna.toplevel indexado com o software Bowtie2 v2.2.1 (LANGMEAD; SALZBERG, 2012), quanto o arquivo de anotação gênica mais recente (versão GRCh38.86) no formato GTF (Gene Transfer Format) foram baixados a partir do Ensembl (extr://www.ensembl.org/extra.html). A contagem bruta dos reads para cada gene foi realizada por meio do software Htseq v0.6.1 (ANDERS; PYL; HUBER, 2015) e a análise de expressão diferencial foi executada usando o pacote de ferramentas estatísticas edgeR:Bioconductor v3.18.1. (função exactTest) (ROBINSON; MCCARTHY; SMYTH, 2009). Adicionalmente, dados públicos de RNA-Seq (42 e 43 amostras pareadas para LUSC e LUAD, respectivamente) foram obtidos a partir do The Cancer Genome Atlas project (TCGA), sendo o download de arquivos no formato htseq feito através do portal https://gdc-portal.nci.nih.gov/ (THE CANCER GENOME ATLAS, 2017). As análises de file:///C:/Users/camil/Dropbox/Dissertação%20Mestrado%202018/Camila%20-%20Maria%20Isabel/Dissertacao%20Camila/C:/Downloads/%252500xtr:/hannonlab file:///C:/Downloads/%2500xtr:/www https://gdc-portal.nci.nih.gov/ 39 expressão diferencial dos dados do TCGA foram realizadas seguindo o mesmo método mencionado no parágrafo anterior (EdgeR - exactTest) (ROBINSON; MCCARTHY; SMYTH, 2009), considerando p ≤ 0,05. As análises de bioinformática foram realizadas em colaboração com o Dr. Elton Rosas de Vasconcelos, pesquisador na “Western University of Health Sciences’’ (Pomona, CA, USA). 3.7. Metodologia para medir o perfil de restrição do comprimento telomérico (Southern blot telomérico) O DNA genômico de leucócitos (pacientes portadores de NSCLC e indivíduos saudáveis) e de tecido tumoral e normal adjacente de pacientes com NSCLC, foi extraído utilizando- se o kit DNeasy® Blood & Tissue (Qiagen). Para análise do TRF utilizou-se o kit TeloTAGGG Telomere Length Assay (Roche) seguindo as recomendações do fabricante. O DNA genômico foi digerido com as enzimas HinfI e RsaI para a obtenção dos fragmentos teloméricos. Seguido a digestão, os fragmentos de DNA foram separados por eletroforese em gel 1% durante 4,5h. O gel foi desnaturado, neutralizado e as amostras transferidas para membrana de nylon por Southern blotting e hibridizadas por sonda especifica (TTAGGG)3 para região telomérica. Os fragmentos teloméricos foram detectados por quimiluminescência. E os TRFs calculados de acordo com a seguinte formula: TFR̅̅ ̅̅ ̅ = ∑(𝑂𝐷𝑖) ∑ (𝑂𝐷𝑖) (𝐿𝑖)⁄⁄ ODi corresponde ao sinal de quimiluminescência e Li o tamanho do fragmento na posição dada. Utilizou-se o teste não paramétrico de Wilcoxon-Mann-Whitney para comparar os dados não pareados de TRF, entre os grupos tumor vs. normal. Correlação de Spearman foi calculada para estudar a possível relação linear das variáveis de TRF e idade do paciente doador. Diferenças estatisticamente significativas foram consideradas quando o valor p do teste estatístico é inferior ao nível de significância de 5% (p<0,05). 40 4 DELINEAMENTO EXPERIMENTAL A Figura 5 resume os métodos utilizados para a análise de expressão de genes associados aos telômeros. A análise foi conduzida utilizando amostras de tecidos tumorais e tecido pulmonar normal, adjacente ao tumor de pacientes diagnosticados com NSCLC. Foram utilizadas as técnicas de: 1) RT-qPCR para análise de expressão em amostras de 28 pacientes (28 amostras tumorais e 15 amostras de tecidos normais adjacentes) com NSCLC, tratados no Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina de Botucatu. 2) Análise de transcritoma utilizando dados de RNA-Seq de amostras tumorais de 7 pacientes com NSCLC (7 amostras tumorais e 7amostras de tecidos pulmorares normais, dos mesmos pacientes) tratados no Hospital A. C. Camargo. 3) Análise de transcritoma utilizando dados de RNA- Seq de amostras tumorais provindas de 85 pacientes diagnosticados com NSCLC, cujos dados estavam disponíveis no banco de dados público TCGA (The Cancer Genome Atlas), sendo que 42 pacientes foram diagnosticados com NSCLC do subtipo LUSC (42 amostras tumorais e 42 amostras de tecidos normais adjacentes) e 43 pacientes com NSCLC do subtipo LUAD (43 amostras tumorais e 43 amostras de tecidos normais adjacentes). 41 Figura 5 - Representação esquemática dos métodos utilizados nesse trabalho para análise de expressão gênica de genes associados aos telômeros em amostras tumorais e normais adjacentes ao tumor de pacientes com NSCLC Somados a estes experimentos foram realizadas análises do perfil de restrição telomérico (TRF), por Southern blot telomérico, de amostras tumorais (n=11) e normais adjacentes (n=4) de pacientes diagnosticados com NSCLC. Similarmente foram analisados os TRFs de DNA genômico extraído de leucócitos de pacientes diagnosticados com NSCLC (n= 14) e de doadores saudáveis (n=13). 42 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1 Investigação de alterações na expressão de genes codificantes de proteínas teloméricas em amostras de indivíduos diagnosticados com NSCLC Com o objetivo de verificar se genes envolvidos com a manutenção telomérica estão diferencialmente expressos em amostras NSCLC, foram feitas análises de expressão gênica utilizando a metodologia da RT-qPCR. Nessas análises, foram utilizadas amostras tumorais (n=28) e histologicamente normais, adjacentes ao tumor dos mesmos pacientes (n=15). Foram excluídas das análises 13 amostras histologicamente normais, sendo que o critério para exclusão foi: amostras que apresentaram alta expressão de TERT e amostras com baixa integridade do RNA. Está bem fundamentado na literatura que a maioria das células somáticas apresenta atividade baixa ou nula da telomerase, justificando a baixa ou nenhuma expressão do gene que codifica o componente TERT (ULANER et al., 1998; DJOJOSUBROTO et al., 2003; SCHAETZLEIN; RUDOLPH, 2005; BLASCO, 2005; SAVAGE, 2014). Apesar dessas amostras se apresentarem normais histologicamente, constituem tecidos adjacentes ao tumor, sendo assim possível que contenham alterações moleculares associadas ao processo de imortalização celular, como a reativação da atividade de telomerase aqui representada pela expressão do gene TERT (KIM et al., 1994; HANAHAN; WEINBERG, 2000). A maioria dos pacientes, cujas amostras foram analisadas nesse estudo, é do sexo masculino (68%) e tabagista (96%). Sendo que 46% dos pacientes apresentaram idade maior que 65 anos ao diagnóstico. Considerando–se os subtipos histológicos de NSCLC, 16 amostras eram de tumores LUSC, 10 de LUAD, 1 LCC e 1 amostra de tumor misto (LUAD e LUSC). A Tabela 3 apresenta o perfil clínico e histopatológico dos pacientes. 43 Tabela 3 - Perfil clínico e histopatológico dos casos incluídos no estudo de expressão gênica via RT- qPCR Nota: Outros: 1 amostra tumoral mista (LUAD e LUSC) e outra amostra tumor LCC. Nesta etapa do estudo, foram analisados os perfis de expressão de 24 genes que codificam proteínas de suma importância para a manutenção telomérica, como: componentes do complexo shelterin, TERF1 (TRF1), TERF2 (TRF2), TINF2 (TIN2) e POT1 (DE LANGE, 2005) e do complexo CST: TEN1 (GAO et al., 2007; CHEN; LINGNER, 2013). Esses complexos exercem papel fundamental na manutenção, estabilidade telomérica e regulação do acesso da telomerase aos telômeros (DE LANGE, 2005; CHEN; LINGNER, 2013). Adicionalmente, foi analisado a expressão do gene que codifica TNKS2 (Tankyrase 2), proteína que auxilia na regulação do tamanho telomérico pela interação com TRF1(HSIAO; SMITH, 2008). Foi analisada também a expressão de genes que codificam proteínas que são fundamentais na regulação e biogênese do complexo telomerase: TERT, a subunidade catalítica da telomerase (GILSON; GÉLI, 2007); componentes do complexo telomerase: a proteína DKC1, responsável pela estabilização da junção de TERT/ TERC (ALAWI; LIN, 2011), e a proteína EST1A, codificada pelo gene SMG6 e envolvida no processo de replicação telomérica (COLLINS, 2006). Assim como RUVBL1 (Pontin) e RUVBL2 (Reptin) que estão envolvidas na biogênese do complexo telomerase (VENTEICHER et al., 2008) e HSP90AA1, chaperona que atua na regulação da atividade, estabilidade e localização do complexo telomerase (COLLINS, 2006). Ademais, foi avaliada a expressão de PinX1, proteína com papel de inibidor natural da telomerase (SOOHOO et al., 2011). Pacientes (n) 28 % Tipo Histológico Carcinoma de células escamosas 16 57% Adenocarcinoma 10 36% Outros 2 7% Sexo Feminino 9 32% Masculino 19 68% Idade ≤ 65 anos 15 54% > 65 anos 13 46% Tabagismo Sim 27 96% Não 1 4% 44 Foi quantificada a expressão dos genes DNMT3B e DNMT3A, envolvidos em processos de metilação de regiões subteloméricas e regulação do tamanho dos telômeros (GONZALO et al., 2006). Assim como o gene que codifica a proteína SUV39H1, envolvida na regulação epigenética dos telômeros, exercendo função na organização da heterocromatina, estabilidade genômica e regulação do tamanho telomérico (GARCÍA- CAO et al., 2003). Investigou- se também proteínas com papel de reparo a danos nos telômeros como MRE11, RAD51, RPA3 e BRCA2, ATRX (Alpha Thalassemia/Mental Retardation Syndrome X-Linked), DAXX (Death-Domain Associated Protein) (BADIE et al., 2010; LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016) e RTEL1 envolvida também com a estabilidade, proteção e elongação dos telômeros (LAZZERINI-DENCHI; SFEIR, 2016). Estudos mostraram que há associação entre mutações de perda de função nos genes ATRX e DAXX e a presença de mecanismos ALT (KILLELA et al., 2013). Adicionalmente, foi analisada a expressão de STAG2 que codifica a proteína SA2, responsável pela coesão dos centrômeros. Geralmente esse gene é encontrado inativo em células tumorais humanas, porém tumores que contém STAG2 ativo podem apresentar mecanismos semelhantes a ALT, com altas taxas de recombinação homóloga por trocas de fragmentos entre cromátides irmãs. Ao contrário das células ALT, os tumores que expressam STAG2 são telomerase positivo (DANILOSKI; SMITH, 2017). A análise do perfil de expressão dos genes ATRX, DAXX e STAG2 nas amostras dos pacientes NSCLC pode ser indicativo do mecanismo utilizado pelas células tumorais para a manutenção telomérica. O teste não paramétrico de Wilcoxon-Mann-Whitney foi utilizado para cada um dos genes para testar as hipóteses estatísticas de que as medianas observadas nos grupos são iguais ou diferentes para as amostras tumorais e normais. As análises estatísticas não pareadas entre os grupos amostrais (tumor e normal) revelaram, conforme verificado na Tabela 4 e Figura 6 abaixo, diferenças estatisticamente significativas (p ≤ 0,05) na expressão de 12 genes analisados, sendo que estes apresentaram expressão aumentada nas células tumorais em relação às normais. Os genes com expressão aumentada foram: TERT (p= 0,000), RAD51 (p= 0,000), DNMT3B (p= 0,000), RPA3 (p= 0,000), BRCA2 (p=0,001), SUV39H1 (p= 0,001), DKC1 (p= 0,001), RUVBL1 (p= 0,004), RUVBL2 (p= 0,005), POT1 (p= 0,012), DNMT3A (p= 0,015) e MRE11 (p= 0,034). As tabelas e gráficos estão organizados na ordem do menor para o maior valor de p. 45 Tabela 4 - Expressão relativa de genes envolvidos com a maquinaria telomérica em amostras de NSCLC Nota: Teste não paramétrico de Wilcoxon-Mann-Whitney (tumoral vs. normal). p<0,05. Nos gráficos, Figura 6, podemos verificar os valores observados de expressão relativa para cada amostra analisada. Gene (símbolo) Gene ID Gene (nome) Amostra (n) Mediana Valor de p TERT 7015 Telomerase reverse transcriptase Normal (15) 1,054 0,000 Tumoral (28) 170,626 RAD51 5888 RAD51 recombinase Normal (15) 1,051 0,000 Tumoral (28) 11,982 DNMT3B 1789 DNA methyltransferase 3 beta Normal (15) 0,999 0,000 Tumoral (28) 9,188 RPA3 6119 Replication protein A3 Normal (15) 0,979 0,000 Tumoral (28) 4,013 BRCA2 675 BRCA2, DNA repair associated Normal (15) 1,005 0,001 Tumoral (28) 4,457 SUV39H1  6839 Suppressor of variegation 3-9 homolog 1 Normal (15) 0,991 0,001 Tumoral (28) 3,522 DKC1 1736 Dyskerin pseudouridine synthase 1 Normal (15) 0,895 0,001 Tumoral (28) 2,891 RUVBL1 (Pontin) 8607 RuvB like AAA ATPase 1 Normal (15) 1,024 0,004 Tumoral (28) 3,093 RUVBL2 10856 RuvB like AAA ATPase 2 Normal (15) 0,855 0,005 Tumoral (28) 2,133 POT1 25913 Protection of telomeres 1 Normal (15) 0,916 0,012 Tumoral (28) 1,618 DNMT3A 1788 DNA methyltransferase 3 alpha Normal (15) 0,904 0,015 Tumoral (28) 2,471 MRE11 4361 MRE11 homolog, double strand break repair nuclease Normal (15) 1,100 0,034 Tumoral (28) 2,252 DAXX 1616 Death domain associated protein Normal (15) 0,887 0,063 Tumoral (28) 2,007 TERF2 (TRF2) 7014 Telomeric repeat binding factor 2 Normal (15) 0,932 0,070 Tumoral (28) 1,414 HSP90AA1 3320 Heat shock protein 90 alpha family class A member 1 Normal (15) 0,960 0,083 Tumoral (28) 1,514 STAG2 10735 Stromal antigen 2 Normal (15) 0,727 0,273 Tumoral (28) 1,328 TNKS2 80351 Tankyrase 2 Normal (15) 1,061 0,285 Tumoral (28) 1,356 RTEL1 51750 Regulator of telomere elongation helicase 1 Normal (15) 0,956 0,516 Tumoral (28) 1,219 PINX1 54984 PIN2/TERF1-interacting telomerase inhibitor 1 Normal (15) 0,945 0,533 Tumoral (28) 1,028 TERF1 (TRF1) 7013 Telomeric repeat binding factor 1 Normal (15) 1,246 0,610 Tumoral (28) 1,001 TINF2 26277 TERF1 interacting nuclear factor 2 Normal (15) 0,977 0,646 Tumoral (28) 0,957 TEN1 100134934 TEN1, CST complex subunit Normal (15) 1,092 0,760 Tumoral (28) 0,920 SMG6 (Est1) 23293 SMG6, nonsense mediated mRNA decay factor Normal (15) 0,977 0,799 Tumoral (28) 0,971 ATRX (RAD54) 546 ATRX, chromatin remodeler Normal (15) 0,929 0,959 Tumoral (28) 0,860 46 Figura 6 - Gráficos representativos da expressão gênica relativa (log10) em tumor vs normal “continua” 47 “continuação” “continua” 48 “continuação” “continua” 49 “continuação” Nota: Gráficos de pontos, ilustrando os valores observados de expressão gênica relativa (log10- eixo y) em amostras tumorais (n=28) vs normais (n=15) (eixo x). A barra representa o ponto de equilíbrio da dispersão dos valores observados. (p<0,05, Wilcoxon-Mann-Whitney, GraphPadPrism software versão 6). Os dados apresentados revelaram que nas amostras de NSCLC, o gene TERT, que codifica o componente catalítico da telomerase, está altamente expresso em relação as 50 amostras de tecido pulmonar normal. Estes resultados são condizentes com os dados da literatura que demonstram que 85 a 90% dos tumores malignos expressam e reativam a telomerase (KIM et al., 1994; HANAHAN; WEINBERG, 2000), incluindo o NSCLC (COUNTER et al., 1998; HSU et al., 2003; WU et al., 2003a; BRENNAN; HAINAUT; BOFFETTA, 2011; OSAKI et al., 2013; WEI; DEVILBISS; LIU, 2015). Destaca- se neste estudo a expressão aumentada do gene DKC1 em amostras de NSCLC. DKC1 é um importante componente do complexo telomerase. A expressão aumentada de DKC1 já foi verificada em diferentes tipos de tecido tumorais: carcinoma hepatocelular (LIU et al., 2012), próstata (SIERON et al., 2009), cólon (WITKOWSKA et al., 2010) e mama (MONTANARO et al., 2008), sugerindo que esta proteína possui um papel crítico na tumorigênese (PANERO et al., 2015). E Fernandez-Garcia et al. (2013) verificou que a expressão do gene DKC1 estava elevada em várias linhagens celulares de câncer de pulmão (A549, H23, H157, H1299, H460 e H727). Adicionalmente usando modelo in vitro, o estudo identificou que células com aumento exógeno de expressão de DKC1 possuíam uma maior taxa de sobrevivência em relação as células utilizadas como controle (sem expressão exógena de DKC1), quando tratadas com MST 312, droga inibidora da atividade de telomerase, sugerindo que alto nível de expressão de DKC1 confere resistência ao encurtamento telomérico causado pela inibição da atividade de telomerase. A depleção de DKC1 resultou em morte da cultura celular quando tratada com MST 312, sugerindo que a expressão de DKC1 pode ter um papel crucial para a sobrevivência de células de câncer de pulmão mediante terapias moleculares que tem como alvo os componentes envolvidos com a manutenção dos telômeros (FERNANDEZ- GARCIA et al., 2013). Os resultados obtidos na presente pesquisa e no estudo relatado por Fernandez-Garcia et al. (2013) mostraram que DKC1 pode ter importância na manutenção telomérica em NSCLC. Foi verificado também que os genes RUVBL1(Pontin) e RUVBL2 (Repetin) apresentaram expressão elevada em NSCLC, nesta pesquisa. As ATPases RUVBL1 e RUVBL2 estão envolvidas em vários processos celulares, como: regulação do processo de transcrição, remodelamento da cromatina, mecanismos de reparo ao DNA, regulação do ciclo celular e biogênese do complexo telomerase (VENTEICHER et al., 2008; MAO; HOURY, 2017;). E pesquisas tem evidenciado um papel importante dessas proteínas no processo de oncogênese, sendo encontradas com expressão aumentada em vários tipos de cânceres, como: carcinoma hepatocelular (HAURIE et al., 2009; BERASAIN, 2010; RAYMOND et al., 2015; BREIG et al., 2017), colo retal (LAUSCHER et al., 2007, 2012; 51 MILONE et al., 2016), gástrico (LI et al., 2010; CUI et al., 2016), rins (REN et al., 2013; ZHANG et al., 2015) e leucemia mielóide (OSAKI et al., 2013; BREIG et al., 2014). E vários estudos, assim como o presente, tem demostrado expressão dessas ATPases em câncer de pulmão, tanto do tipo histológico NSCLC (DEHAN et al., 2007; YUAN et al., 2016; VELMURUGAN et al., 2017), quanto SCLC (OCAK et al., 2014; URIBARRI et al., 2014). Consequentemente, essas ATPases vêm sendo apontadas como importantes biomarcadores para diagnóstico e prognósticos de vários tipos de cânceres incluindo o de pulmão (MAO; HOURY, 2017). No presente estudo a expressão aumentada da shelterin POT1, verificada nas amostras de NSCLC, reforça a concepção que nas células tumorais os mecanismos de manutenção telomérica são acionados na tentativa de recuperar a estabilidade genômica perdida pelas células, pois POT1 é de fundamental importância para a proteção telomérica e recrutamento da enzima telomerase nos telômeros. Contudo, esse resultado contrapõe estudo anterior descrito por Lin et al. (2006) no qual não foi detectada alteração na expressão de POT1 em pacientes NSCLC. Portadores de câncer de pulmão apresentam haplótipos SNPs em POT1 que vem sendo associados com o risco de desenvolvimento da doença. O SNP rs10244817, por exemplo, foi encontrado em pacientes NSCLC chineses (HOSGOOD et al., 2009) e o SNP rs116895242 está associado ao câncer de pulmão em pessoas de origem européia, porém o efeito dessas mutações no comprometimento da estabilidade gênica permanece desconhecido (KARAMI et al., 2016). A expressão elevada de POT1 é encontrada em outros tipos de cânceres, como por exemplo, no Mieloma Múltiplo (MM) e ela é associada a um prognóstico pobre dos pacientes. Em outros cânceres como Melanoma familiar, Glioma familiar e Leucemia Linfócitica Crônica são encontradas variantes de POT1 que prejudicam a proteção telomérica e que conferem um efeito de alongamento aos telômeros, efeito este que em combinação com aberrações induzidas por essas mutações favorece