1 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA GENOTIPAGEM DIEGO a (Dia) EM MACACOS-PREGO (Sapajus sp.) E MACACOS BUGIOS (Alouatta sp.) FABIANA GARCIA FAUSTINO Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Animais Selvagens da FMVZ- UNESP para a obtenção do título de Doutor. Orientadora: Profa. Associada Lucilene Silva Ruiz e Resende Co-orientadoras: Dra. Patrícia Carvalho Garcia e Dra. Carolina Bonet Bub Botucatu - SP 2022 2 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA GENOTIPAGEM DIEGO a (Dia) EM MACACOS-PREGO (Sapajus sp.) E MACACOS BUGIOS (Alouatta sp.) FABIANA GARCIA FAUSTINO Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Animais Selvagens da FMVZ- UNESP para a obtenção do título de Doutor. Orientadora: Profa. Associada Lucilene Silva Ruiz e Resende Co-orientadoras: Dra. Patrícia Carvalho Garcia e Dra. Carolina Bonet Bub Botucatu - SP 2022 i i MINIBIOGRAFIA DA AUTORA Nasceu na cidade de São Paulo, em setembro de 1990, filha de Moises Alves Faustino e Julia Sonia Garcia, casada com Durval Sampaio de Sousa Garms. Desde pequena sempre gostou de ler e estudar. Cursou o ensino fundamental no Colégio Salesiano de São Paulo, e concluiu o ensino médio no Colégio Bandeirantes. No final de 2007, após 3 anos de extrema dedicação aos estudos, foi aprovada para cursar medicina na Pontifícia Universidade Católica (PUC) de Sorocaba, tendo concluído a graduação em 2013. Durante a graduação, após estágios e trabalhos realizados na área de Hematologia, interessou-se cada vez mais por essa especialidade. No final do ano de 2013, foi aprovada para Residência Médica em Clínica Médica na Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB – UNESP), cursada de 2014 a 2016. De 2017 a 2019 especializou-se em Hematologia e Hemoterapia na FMB – UNESP. Em 2018, paralelamente à residência médica, iniciou Mestrado na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da UNESP-Botucatu, orientada pela Professora Lucilene Silva Ruiz e Resende, professora de Hematologia da FMB- UNESP, concluído em 2020. Aprovada em prova de Título de Especialista em Hematologia e Hemoterapia, pela Associação Médica Brasileira e pela Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular, em novembro de 2019. Atualmente é Hematologista e Hemoterapeuta no Hospital Estadual de Bauru e no Hospital da UNIMED de Bauru, e Preceptora de Hematologia no Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UNINOVE - Bauru. ii AUTORA: Fabiana Garcia Faustino 08 de agosto de 2022 DEFESA PÚBLICA DE TESE COMISSÃO EXAMINADORA Professora Associada Lucilene Silva Ruiz e Resende - Orientadora Departamento de Clínica Médica - FMB – UNESP Professora Doutora Adriana Camargo Ferrasi Departamento de Clínica Médica - FMB – UNESP Professor Associado Rogério Martins Amorim Departamento de Clínica Veterinária - FMVZ – UNESP Professora Adjunta Sheila Soares Silva Departamento de Clínica Médica – UFTM Professora Doutora Viviane Alessandra Capelluppi Tofano Departamento de Clínica Médica - Universidade de Marília – UNIMAR iii DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a todas as pessoas que me apoiaram durante esta importante etapa de minha carreira. Aos meus pais, que são meu alicerce e que sempre me incentivaram a estudar e a seguir em frente. Ao meu marido, por todo amor, apoio e compreensão em dias turbulentos. À minha orientadora, Professora Lucilene, pela sua parceria, dedicação e persistência, que foram imprescindíveis para a conclusão deste trabalho. iv AGRADECIMENTOS Desejo agradecer a todos aqueles que, de alguma forma, permitiram que este estudo se concretizasse. À minha Orientadora, Professora Lucilene Silva Ruiz e Resende, pela confiança no meu trabalho, pela paciência, empenho e total disponibilidade e interesse em transmitir sua sabedoria. Às minhas Co-orientadoras, Doutora Patrícia Carvalho Garcia e Doutora Carolina Bonet Bub, pela atenção, dedicação e apoio durante toda a execução do estudo. Aos Funcionários do Hemocentro de Botucatu, pela receptividade e acolhimento durante o período da pesquisa. Aos Professores, Residentes e Funcionários do CEMPAS e da Pós- Graduação da FMVZ-UNESP, pelo comprometimento e competência durante a coleta dos materiais a serem analisados, e pelo auxílio prestado sempre que necessitei. Ao Laboratório de Imunohematologia do Departamento de Hemoterapia e Terapia Celular do Hospital Israelita Albert Einstein pela viabilidade para realização dos testes moleculares do estudo. À empresa pH 7 Comércio e Representações Ltda. pela doação dos kits para os testes imunohematológicos e demais materiais de consumo utilizados nas v fenotipagens do estudo (manufaturados pela DiaMed Latino América SA, Lagoa Santa, MG, Brazil, a filial brasileira da Bio-Rad Laboratories, Inc., Hercules, CA, USA). Agradeço imensamente aos membros da banca examinadora, pelo interesse e disponibilidade. À minha família, pelo apoio incondicional durante toda a trajetória. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. vi LISTA DE TABELAS TABELA 1. Sequências dos primers foward e reverse utilizadas na amplificação da região que abriga a variação genética que caracteriza o alelo Diego (DI*) no gene SLC4A1 em Alouatta sp. e Sapajus sp. TABELA 2. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo. TABELA 3. Genotipagem do sistema Diego mostrando apenas o alelo correspondente ao antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo. TABELA 4. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo. TABELA 5. Genotipagem do sistema Diego mostrando apenas o alelo correspondente ao antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo. vii LISTA DE FIGURAS FIGURA 1. Mapeamento dos estudos que demonstraram ocorrência do alelo DI*A em 144 populações ameríndias das Américas do Norte Central e do Sul [BÉGAT et al., 2015]. FIGURA 2. Representação esquemática da banda 3 inserida na membrana eritrocitária, mostrando 7 alças extracelulares e 2 domínios nas suas extremidades: o N-terminal (NH2) e o C-terminal (COOH). A figura mostra a localização dos 22 antígenos do sistema Diego nas alças extracelulares (STORRY, 2017). FIGURA 3. Principais teorias para a ocupação humana do Continente Americano: rota 1 – via Estreito de Bering, que é frequentemente relacionada à chegada e dispersão do alelo DI*A nas Américas; rota 2 – via marítima – ocupação por povos polinésios que teriam chegado à América do Sul. (https://sala19.wordpress.com/tag/estreito-de-bering/). FIGURA 4. Representação esquemática de um gel de agarose mostrando o padrão de bandas para interpretação dos resultados da PCR-RFLP, para genotipagem dos antígenos Dia e Dib do sistema de grupo sanguíneo Diego em macacos. 1- marcador de peso molecular (50pb); 2- produto da PCR antes da restrição; 3- genótipo DI*B/*B caracterizado por 2 bandas (fragmentos de 70 e 79pb); 4- genótipo DI*A/DI*B caracterizado por 3 bandas (fragmentos de 149, 70 e 79bp); 5- genótipo DI*A/DI*A caracterizado por 1 banda (fragmento de 149pb). FIGURA 5. Macacos-prego (Sapajus sp.) adultos no seu recinto no CEMPAS. FIGURA 6. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo (aglutinação 3 em https://sala19.wordpress.com/tag/estreito-de-bering/ viii todos os animais; aglutinação 3 no controle positivo; aglutinação 0 no controle negativo). FIGURA 7. Eletroforese em gel de agarose a 4% após ensaio de restrição - genotipagem do sistema DI mostrando apenas o alelo DI*A que codifica para o antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo. À esquerda da linha vertical, observam-se as bandas-controles: marcador de peso molecular (50pb), PCR (antes do ensaio de restrição), alelos DI*B/*B (2 bandas justapostas) e DI*A/*A (1 banda), e branco. FIGURA 8. Macaco bugio ruivo (Alouatta fusca) adulto no seu recinto no CEMPAS. FIGURA 9. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo (aglutinação 3 em todos os animais; aglutinação 3 no controle positivo; aglutinação 0 no controle negativo). FIGURA 10. Eletroforese em gel de agarose a 4% após ensaio de restrição - genotipagem do sistema DI mostrando apenas o alelo DI*A que codifica para o antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo. À esquerda da linha tracejada, observam-se as bandas-controles: marcador de peso molecular (50pb), PCR (antes do ensaio de restrição), alelos DI*B/*B (2 bandas justapostas) e DI*A/*A (1 banda), e branco. ix LISTA DE ABREVIATURAS ABO – sistema de grupo sanguíneo ABO ISBT – International Society of Blood Transfusion DHP – doença hemolítica perinatal RHT – reação hemolítica transfusional Rh – sistema de grupo sanguíneo Rh MNS – sistema de grupo sanguíneo MNS P - sistema de grupo sanguíneo P Dia – antígeno Diego a do sistema de grupo sanguíneo Diego DI – Diego DI*A – alelo codificador do antígeno Dia DI*01 – mesmo significado de DI*A anti-Dia – anticorpo anti-Dia anti-Dib – anticorpo anti-Diego b Dib – antígeno Diego b do sistema de grupo sanguíneo Diego Wrb – antígeno Wright b do sistema de grupo sanguíneo Diego DISK – antígeno DISK do sistema de grupo sanguíneo Diego Wrb – antígeno Wright b do sistema de grupo sanguíneo Diego Wu - antígeno Wu do sistema de grupo sanguíneo Diego SLC4A1 - Solute Carrier Family 4, Anion Exchanger, member 1 AE1 – anion exchanger 1 AE2 – anion exchanger 2 AE3 – anion exchanger 3 Cl- - ânion cloreto x HCO3 - - ânion bicarbonato CO2 – gás carbônico NH2 – N-terminal ou amina-terminal COOH – C-terminal ou carboxi-terminal DNA – ácido desoxirribonucleico 2561 C>T – substituição de citosina por timina na posição do nucleotídeo 2561 Pro854Leu – substituição de prolina por leucina na posição do aminoácido 854 DI*B - alelo codificador do antígeno Dib DI*02 – mesmo significado de DI*B Di(a-b+) – ausência do antígeno Dia e presença do antígeno Dib DI:-1;2 – mesmo significado de Di(a-b+) DI*B/DI*B – alelos codificadores do fenótipo Di(a-b+) DI*02/DI*02 – mesmo significado de DI*B/DI*B Di(a+b+) – presença do antígeno Dia e do antígeno Dib DI:1;2 – mesmo significado de Di(a+b+) DI*A/DI*B – alelos codificadores do fenótipo Di(a+b+) DI*01/DI*02 - mesmo significado de DI*A/DI*B Di(a+b-) - presença do antígeno Dia e ausência do antígeno Dib DI:1;-2 – mesmo significado de Di(a+b-) DI*A/DI*A - alelos codificadores do fenótipo Di(a+b-) DI*01/DI*01 - mesmo significado de DI*A/DI*A Di(a-b-) - ausência do antígeno Dia e do antígeno Dib (fenótipo null) DI:-1;-2 - mesmo significado de Di(a-b-) sp. – espécie xi CPB/ICMBio – Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros/ Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade Kg – quilograma CEUA - Comitê de Ética no Uso de Animais UNESP - Universidade Estadual Paulista SISBIO - Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis SisGen - Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado CEMPAS – Centro de Medicina e Pesquisa de Animais Selvagens mG/Kg – miligramas por quilo K2EDTA – ácido etilenodiaminotetracético di-potássico mL – mililitros FMB – Faculdade de Medicina de Botucatu Bio-Rad Laboratories – Laboratório de produtos para diagnósticos clínicos e pesquisa das ciências da vida µL – microlitros LISS - Solução de Baixa Força Iônica ºC – graus Celsius rpm – rotações por minuto SA – Sociedade Anônima MG – Minas Gerais Inc. - Incorporated CA – Califórnia USA – United States of America xii EDTA - ácido etilenodiaminotetracético PCR – Polimerase Chain Reaction RFLP - Restriction Fragment Length Polymorphism T – Timina G – Guanina C – Citosina A - Adenina HCl – ácido clorídrico mM - milimol KCl – Cloreto de potássio U – unidades dNTP – deoxinucleotídeo tri-fosfato MgCl2 – cloreto de magnésio µM - micromol Ng – nanograma µL – microlitro pb – pares de base MspI – enzima de restrição C/CGG – sequência citosina/citosina, guanina, guanina TT – timina, timina CC – citosina, citosina CT – citosina, guanina M – masculino F - feminino xiii IMPACTO CIENTÍFICO Encontrou-se o genótipo DI*A/DI*A, que codifica para o antígeno Dia do sistema de grupo sanguíneo Diego, em macacos neotropicais de gêneros Alouatta sp. e Sapajus sp.. O achado é inédito em primatas não-humanos, não tendo sido encontrado na bibliografia consultada. O alelo DI*A é raro em caucasianos, africanos, aborígenes, e povos de ilhas do Pacífico Sul, bem como em seus descendentes, sendo prevalente em asiáticos e ameríndios, sobretudo em indígenas sul-americanos. O alelo DI*A é considerado marcador antropológico de origem mongol, dando suporte à teoria de povoamento do Continente Americano por povos asiáticos (mongóis), que teriam atravessado o Estreito de Bering da Sibéria para o Alasca entre 23.000 e 15.000 anos, e originado os ameríndios. Esse estudo documentou o fenótipo Dia e o genótipo DI*A/DI*A nos primatas não- humanos mencionados que, conforme a literatura, vêm habitando a América do Sul por milhões de anos, portanto, muito antes da chegada do homem moderno ao Novo Mundo. xiv SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT 1 INTRODUÇÃO . . . . . . . 01 2 OBJETIVOS . . . . . . . . 04 3 REVISÃO DA LITERATURA . . . . 06 4 MATERIAL E MÉTODOS . . . . . . 20 5 RESULTADOS . . . . . . . 28 6 DISCUSSÃO . . . . . . . 39 7 CONCLUSÕES . . . . . . . 48 8 REFERÊNCIAS . . . . . . . 50 9 ANEXOS . . . . . . . . 58 10 PUBLICAÇÕES . . . . . . . 72 PÁGINAS 1 RESUMO O alelo DI*A, que codifica para o antígeno eritrocitário Dia, ocorre em apenas 0.01% dos humanos em geral. Entretanto, é prevalente em asiáticos e em ameríndios, sobretudo em certas etnias indígenas sul-americanas. O antígeno Dia é causador de aloimunização em humanos, sendo também considerado marcador antropológico. Sua ocorrência em povos mongóis dá suporte à teoria de povoamento do Continente Americano por asiáticos, que teriam cruzado o Estreito de Bering da Sibéria para o Alasca, entre 23.000 e 15.000 anos, originando os ameríndios. O objetivo do estudo foi realizar a genotipagem DI*A, precedida por fenotipagem para o antígeno eritrocitário Dia, em 10 macacos-prego (Sapajus sp.) e em 6 macacos bugios (Alouatta sp.). A fenotipagem foi realizada pelo método de gel-centrifugação (DiaMed-ID Micro Typing System® - Bio-Rad Technique), sendo positiva para o antígeno Dia em todos os animais estudados. A técnica de RFLP (Restriction Fragment Length Polymorphism) foi utilizada para a genotipagem, tendo revelado o genótipo DI*A/DI*A nos 16 macacos. O presente estudo demonstrou o alelo DI*A, até então somente descrito em humanos, em primatas não-humanos neotropicais que antecederam o homem moderno, em milhões de anos, em terras sul-americanas. A ocorrência do alelo DI*A é achado inédito em macacos, não tendo sido encontrada na bibliografia consultada. Palavras-chaves: grupo sanguíneo, primatas neotropicais, ameríndios, asiáticos, antropologia 2 ABSTRACT The DI*A allele, which encodes for the Dia erythrocyte antigen, is uncommon and occurs in only 0.01% of humans. However, it is prevalent in Asian people and Amerindians, mainly in certain South American indigenous ethnicities. Beyond causing alloimmunization in humans, the Dia antigen is considered an anthropological marker. Its occurrence in mongol people supports the theory of American Continent colonization by Asians, who would have originated the Amerindians after crossing the Bering Strait from Siberia to Alaska about 23.000 to 15.000 years ago. The goal of this research was to perform the DI*A genotyping, which was preceded by Dia erythrocyte antigen phenotyping, in 10 Capuchin monkeys (Sapajus sp.) and in 6 Howler monkeys (Alouatta sp.). Phenotyping was performed by the gel-centrifugation method (DiaMed-ID Micro Typing System® - Bio-Rad Technique) revealing the Dia antigen in all studied monkeys. The technique of Restriction Fragment Length Polymorphism (RFLP) was used for genotyping, being that it demonstrated the DI*A/DI*A genotype in all 16 animals. This study revealed the DI*A allele, which has been considered an human marker by then, in non-human neotropical primates which have inhabited South American lands for millions of years before the modern human has done. This is an original finding in monkeys that has not been published so far. Key-words: blood group, neotropical primates, Amerindians, Asians, anthropology 1 INTRODUÇÃO 2 1 INTRODUÇÃO Desde a publicação dos antígenos do sistema ABO por Landsteiner, em 1901 (LANDSTEINER, 1901), a International Society of Blood Transfusion (ISBT) registrou 345 antígenos eritrocitários humanos, distribuídos em 43 sistemas de grupos sanguíneos (HYLAND e GASSNER, 2021). Doze desses sistemas possuem antígenos mais frequentemente envolvidos em aloimunizações, que podem ou não resultar em doença hemolítica perinatal (DHP) e/ou reações hemolíticas transfusionais (RHT) clinicamente significativas. São eles: ABO, Rh, Kell, Duffy, Kidd, Lewis, MNS, P, Lutheran, Dombrock, Cartwright e Diego, compreendendo mais de 30 antígenos eritrocitários, justificando a preocupação com tais fenótipos nos bancos de sangue, e a consequente pesquisa desses antígenos ao se investigar a origem de um ou mais anticorpos irregulares séricos positivos, em indivíduo aloimunizado (STORRY et al., 2013; GIRELLO e KÜHN, 2016). Dentre os sistemas sanguíneos citados, o antígeno Diego a (Dia) pertence ao sistema Diego (DI), sendo caracteristicamente um antígeno de baixa frequência em humanos em geral (REID e WESTHOFF, 2006), sobretudo em caucasianos e em afrodescendentes (FLÔRES et al., 2014). Entretanto, além de importância imunohematológica e clínica (FIGUEROA, 2013), a ele tem sido creditada importância étnico-antropológica, por apresentar maior incidência em ameríndios e asiáticos (FIGUEROA, 2013; JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; BÉGAT et al., 2015), dando suporte à teoria de colonização do Continente Americano por povos mongóis, que teriam cruzado o Estreito de Bering, vindo da Sibéria para o Alasca (BÉGAT et al., 2015). O antígeno Dia, assim como o seu alelo codificador DI*A ou DI*01 têm sido considerados marcadores de origem mongol (BÉGAT et al., 2015; SOYANO e SOYANO, 2014; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018). Em 2015, Bégat et al. (2015) afirmaram que, apesar do antígeno Dia ter sido descrito há 6 décadas em humanos, o mesmo vinha recebendo pouca atenção por parte de pesquisadores em geral, inclusive nas populações ameríndias onde é mais prevalente. 3 Que seja de nosso conhecimento, a presença do antígeno Dia ainda não foi investigada em glóbulos vermelhos de animais domésticos ou selvagens. Embora os primatas não-humanos tenham grande importância histórica na descoberta de vários grupos sanguíneos compartilhados com humanos, não encontramos estudos relativos ao sistema DI nesse grupo de animais, exceto por estudo prévio realizado pelo nosso grupo de pesquisa, que investigou a ocorrência de antígenos eritrocitários de importância transfusional em humanos, nos macacos-prego (Sapajus sp.) e nos macacos bugios (Alouatta sp.) [SILVA et al., 2017; RESENDE et al., 2018]. Naquele estudo, o antígeno eritrocitário Dia foi detectado nos 2 gêneros de macacos, por meio do anticorpo policlonal humano anti-Dia, com a técnica DiaMed-ID Micro Typing System® - Bio-Rad Technique [SILVA et al., 2017; RESENDE et al., 2018]. Considerando que tal achado foi surpreendente, uma vez que o antígeno Dia é conhecido como marcador antropológico, o presente estudo propôs a realização da genotipagem DI*A, em primatas daqueles mesmos 2 gêneros. 4 OBJETIVOS 5 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Realizar a genotipagem DI*A em macacos-prego (Sapajus sp.) e em macacos bugios (Alouatta sp.), sequencialmente à fenotipagem Dia nos mesmos animais. 6 REVISÃO DA LITERATURA 7 3 REVISÃO DA LITERATURA 3.1 Histórico da descoberta do sistema de grupo sanguíneo Diego (DI) e seus antígenos A descoberta do sistema de grupo sanguíneo DI tem sido, historicamente, atribuída aos hematologistas venezuelanos Miguel Layrisse e Tulio Arends, em 1955 (SOYANO e SOYANO, 2014; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018; BEIGUELMAN, 2003). O nome “Diego” com o qual o sistema foi batizado também tem sido relacionado a um certo “sobrenome Diego” da família venezuelana, na qual o antígeno Dia foi descrito (BEIGUELMAN, 2003; CARVALHO, 2018). Entretanto, os médicos venezuelanos Soyano e Soyano (2014), revisando a história do sistema DI por ocasião do 60o aniversário de seu descobrimento, afirmaram que antígeno Dia foi descoberto e publicado, respectivamente, em 1953 e em 1954, pelo hematologista russo-americano Philip Levine, da Ortho Research Foundation, em Raritan, NJ, EUA. (LEVINE et al., 1954). Os mesmos autores prestaram o devido reconhecimento ao obstetra Rafael Domínguez Sisco e ao pediatra Miguel Raga Mendoza, ambos venezuelanos, que suspeitaram da incompatibilidade sanguínea entre mãe (seria senhora Ca e, não, senhora Diego) e recém-nascido (Diego seria seu nome e, não, o seu sobrenome), que culminou em desfecho fatal no 3o dia de vida desse último (SOYANO e SOYANO, 2014). Teria sido o Dr. Mendoza (pediatra) quem encaminhou amostras sanguíneas de Diego e de seus pais para o Dr. Levine, nos EUA (SOYANO e SOYANO, 2014). Foi somente na gestação seguinte da senhora Ca (5ª gestação) que os médicos Miguel Layrisse e Tulio Arends teriam entrado no caso, tendo os mesmos desempenhado o não menos importante papel de estudar 4 gerações pregressas da família de Diego, percebendo a sua ascendência ameríndia. Esses 2 médicos, bem como outros ao redor do mundo, estudaram várias etnias ameríndias, caucasiana, africana/afrodescendentes, aborígene e de ilhas do Pacífico Sul, propondo que o antígeno Dia se tratava de um “fator indígena”, sendo documentado como o 10o grupo sanguíneo conhecido à época (SOYANO e SOYANO, 2014; LAYRISSE et al., 1955). Na sequência, descobriu-se que o antígeno Dia também incidia em 8 povos asiáticos, assumindo-se que o mesmo não se tratava de um fator indígena, mas de um fator mongol (SOYANO e SOYANO, 2014). Desde então, vários estudos têm analisado a frequência do antígeno Dia e/ou do alelo DI*A em diferentes populações do mundo, demonstrando maior prevalência dos mesmos em certos povos ameríndios ou asiáticos (GIRELLO e KÜHN, 2016; FLÔRES et al., 2014; FIGUEROA, 2013; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018; CARVALHO, 2018; RODRIGUES et al., 2021). As citações abaixo, que compreendem estudos realizados em povos específicos (doadores de sangue ou não), fornecem ampla ideia das variadas ocorrências do fenótipo Dia e/ou alelo DI*A, em diferentes etnias e localidades geográficas do planeta. Etnias caucasiana, africana, aborígene e de ilhas do Pacífico Sul: • população em geral – 0.01% (REID e WESTHOFF, 2006); • Europa/caucasianos, África/afrodescendentes americanos, e aborígenes (Austrália) – praticamente ausente (FLÔRES et al., 2014; BÉGAT et al., 2015; SOYANO e SOYANO, 2014; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018; SILVA et al., 2004); • 1:4.462 europeus, 1:1.374 aborígenes australianos, 1:827 afroamericanos, (GIRELLO e KÜHN, 2016); • polacos (Polônia) – 0.47% (SOYANO e SOYANO, 2014); • Papua Nova Guiné – ausente (SIMONS, 1957; LLERAS e SILVA, 1960); • Nova Bretanha – ausente (SIMONS, 1957; LLERAS e SILVA, 1960); • Indonésia, Nova Zelândia (indígenas Maoris), Polinésia, Bornéu (indígenas Dyak) – ausente (LLERAS e SILVA, 1960); • Havaí – praticamente ausente (DELANEY et al., 2015); • caucasianos (Ribeirão Preto – Brasil) – 3.6% (COZAC, 2004); • doadores de sangue (Ribeirão Preto – Brasil) – 3.1% (COZAC, 2004); 9 • afrodescendentes - (Ribeirão Preto – Brasil) – ausente (COZAC, 2004); • doadores de sangue (São Paulo – Brasil) – 3.6% com fenótipo Di(a+b+) (NOVARETTI et al., 2010); • doadores de sangue e pacientes (Ribeirão Preto – Brasil) - 0% DI*A/DI*A e 3.3% DI*A/DI*B (CARVALHO, 2018); • doadores de sangue caucasianos (sudoeste do Paraná – Brasil) – 2.2% (ZACARIAS et al., 2016); • doadores de sangue (sudoeste do Paraná – Brasil) – 0.4% DI*A/DI*A e 3.59% DI*A/DI*B (ZACARIAS et al., 2016); • doadores de sangue de 7 áreas distintas (SC – Brasil) – 1% a 6% (COSTA et al., 2016). Diferentes etnias indígenas (ou miscigenados) do Continente Americano: • Alasca e povo Tlingit – ausente (FIGUEROA, 2013; BÉGAT et al., 2015); • indígenas canadenses – 10.8% a 12% (LLERAS e SILVA, 1960); • indígenas norte-americanos – 10.8% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; LLERAS e SILVA, 1960); • indígenas americanos de origem mexicana – 10.2% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002); • indígenas mexicanos – 20.4% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002); • indígenas maias (Guatemala) – 25% (LLERAS e SILVA, 1960); • povos do Istmo do Panamá – baixa frequência a ausente (BÉGAT et al., 2015); • diferentes etnias indígenas (Venezuela) – 5.26% a 35.54% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; SOYANO e SOYANO, 2014); • residentes de Caracas (Venezuela) – 2.26% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; SOYANO e SOYANO, 2014); • residentes de Barcelona (Venezuela) – 3.28% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; SOYANO e SOYANO, 2014); • residentes do sul da Venezuela – baixa frequência a ausente (BÉGAT et al., 2015); 10 • indígenas do Platô Guiano – prevalente (BÉGAT et al., 2015); • indígenas colombianos – 42% (LLERAS e SILVA, 1960); • povos de diferentes províncias equatorianas (Equador) – 1% a 25% (GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018); • povos dos Andes Peruanos - prevalente (BÉGAT et al., 2015); • indígenas Kechua (Peru) – 25% (LLERAS e SILVA, 1960); • indígenas do Sudeste da Bacia Amazônica - prevalente (BÉGAT et al., 2015); • indígenas Parakanãs (PA - Brasil) – 75.7% (BALEOTTI JÚNIOR, 2002); • indígenas Carajás (MT – Brasil) – 35.1% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002); • indígenas Guaranis (MS – Brasil) – 6.8% (RODRIGUES et al., 2021); • indígenas de etnias não especificadas (RJ – Brasil) – 6.7% - (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002); • indígenas de etnias não especificadas - (Ribeirão Preto – Brasil) – 29.8% (COZAC, 2004); • indígenas Xavantes (PR – Brasil) – 27% a 36.3% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002); • indígenas Kaingangs (Região Sul – Brasil) – 46.8% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002); • indígenas Kaingangs (Brasil) – 11.8% a 56% (STORRY, 2017; GIRELLO e KÜHN, 2016; REID e WESTHOFF, 2006; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018; RODRIGUES et al., 2021); • Chaco, Cone Sul da América do Sul, Terra do Fogo – baixa frequência a ausente (BÉGAT et al., 2015). Etnias asiáticas: • asiáticos (sem especificação) – 6% a 15% (FLÔRES et al., 2014); • leste asiático – 1% a 5% (FIGUEROA, 2013); • Japão (diferentes regiões) – 2.3 a 12%% (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; SILVA et al., 2004); 11 • Coreia do Sul – 6.4 a 14.5% (FIGUEROA, 2013; SILVA et al., 2004); • Tibet – 8% (FIGUEROA, 2013); • China – 8.5% (SILVA et al., 2004); • Birmânia (Myanmar) – 10% (LLERAS e SILVA, 1960); • Sul da Tailândia (povo de origem muçulmana) – 0.47% (CHESOR et al., 2018); • Centro e Norte da Tailândia (povo de origem asiática) – frequência mais alta que no sul do país (CHESOR et al., 2018); • Malásia (povo de origem indiana) – 0.88% (CHESOR et al., 2018); • Malásia (povo de origem malaia) – 1.25% (CHESOR et al., 2018); • Malásia (povo de origem chinesa) – 4.01% (CHESOR et al., 2018); • Filipinos – baixa frequência (CHESOR et al., 2018); • asiáticos brasileiros – (Ribeirão Preto – Brasil) – 3.6% (COZAC, 2004); • descendentes de japoneses (Norte do PR – Brasil) – 4.3% (FLÔRES et al., 2014). A Figura 1 mostra a distribuição do alelo DI*A no Continente Americano (BÉGAT et al., 2015). 12 FIGURA 1. Mapeamento dos estudos que demonstraram ocorrência do alelo antígeno Dia e/ou DI*A em 144 populações ameríndias das Américas do Norte Central e do Sul [BÉGAT et al., 2015]. Thompson et al. (1967) identificaram um segundo anticorpo pertencente ao sistema DI, nomeado anti-Dib, em duas mexicanas ameríndias multíparas e previamente transfundidas. O antígeno correspondente, designado de Dib foi, então, identificado e reconhecido como par antitético do antígeno Dia, sendo codificado pelo alelo DI*B ou DI*02 (CARVALHO, 2018). Ao contrário do antígeno Dia, o antígeno Dib é encontrado em 99.9% da população em geral, e em 96% dos ameríndios (REID e WESTHOFF, 2006). 13 De 1955 a 1995, os únicos antígenos conhecidos no sistema DI, eram o Dia e o Dib. A partir de então outros 20 antígenos pertencentes a esse sistema de grupo sanguíneo foram, sucessivamente, sendo descobertos (FIGUEROA, 2013). 3.2 O sistema de grupo sanguíneo Diego (DI) e o antígeno Dia O sistema de grupo sanguíneo DI é composto por 22 antígenos, sendo 3 deles de alta prevalência em humanos: o Dib, o Wrb, e o DISK. Os outros 19 antígenos, inclusive o Dia, são de baixa prevalência (FIGUEROA, 2013). Existem 3 pares de antígenos antitéticos (Dia/Dib, Wra/Wrb e Wu/DISK) no sistema DI (FIGUEROA, 2013; CARVALHO, 2018), o que significa que são pares de antígenos diferentes produzidos por genes alelos, sendo a presença de um deles obrigatória, mesmo na ausência do outro. Os antígenos Dia e o Dib são os mais estudados do sistema DI (FIGUEROA, 2013; CARVALHO, 2018). Todos os antígenos do sistema de grupo sanguíneo DI são codificados por um único gene, o SLC4A1 (Solute Carrier Family 4, Anion Exchanger, member 1), situado na banda 17(q21.31) [STORRY, 2017]. Esse mesmo gene também codifica para a proteína Banda 3 da membrana eritrocitária (STORRY, 2017). A Banda 3 compõe a família de 3 transportadores de ânions transmembrana (anion exchanger – AE1, AE2, AE3), correspondendo ao membro AE1 nas células onde se faz presente (FIGUEROA, 2013). O número 3 de seu nome (Banda 3), entretanto, decorre do fato de ser a terceira banda observada na eletroforese de membrana eritrocitária em gel de poliacrilamida (SOYANO e SOYANO, 2014). É proteína integral que representa 25% - 30% do conteúdo proteico da membrana eritrocitária, sendo expressa somente nos glóbulos vermelhos e na porção basolateral das células intercaladas dos ductos coletores renais (SOYANO e SOYANO, 2014). A Banda 3 é composta por 911 aminoácidos, tendo peso molecular de 95 KD (MURADOR e DEFFUNE, 2007), participando principalmente na entrada de Cl- e saída de HCO3 - dos glóbulos vermelhos, com papel na manutenção do equilíbrio ácido-básico dessas células (SOYANO e SOYANO, 2014), na eliminação de CO2 pelos pulmões (via do 14 HCO3 -) [FIGUEROA, 2013; SOYANO e SOYANO, 2014; STORRY, 2017], e na secreção ácida renal (SOYANO e SOYANO, 2014). Também se relaciona com a manutenção da forma e integridade das hemácias através da ligação do seu domínio N-terminal citoplasmático ao citoesqueleto celular (SOYANO e SOYANO, 2014; STORRY, 2017; BONIFACIO e NOVARETTI, 2009), bem como com o aparecimento de antígenos senescentes nessa linhagem, que sinalizam aos histiócitos do sistema fagocítico mononuclear quando tais células devem sofrer hemocaterese (BONIFACIO e NOVARETTI, 2009). A Banda 3 é glicoproteína multipasso que apresenta domínios N-terminal e C-terminal intracitoplasmáticos, domínios transmembrana, além de 7 alças extracitoplasmáticas polimórficas onde se encontram os antígenos do sistema DI (FIGUEROA, 2013; STORRY, 2017). O cluster de diferenciação que designa a Banda 3 nos eritrócitos é o CD 233 (FIGUEROA, 2013). A Figura 2 mostra a Banda 3 na membrana eritrocitária e a localização dos 22 antígenos do sistema DI nas alças extracelulares. 15 FIGURA 2. Representação esquemática da banda 3 inserida na membrana eritrocitária, mostrando 7 alças extracelulares e 2 domínios nas suas extremidades intracelulares: o N-terminal (NH2) e o C-terminal (COOH). A figura identifica a localização dos 22 antígenos do sistema DI nas alças extracelulares, mostrando o par antitético Dia/Dib na 7a alça (STORRY, 2017). EXTRACELULAR INTRACELULAR MEMBRANA ERITROCITÁRIA 16 O gene SLC4A1 da Banda 3 consiste de 20 exons que abrangem mais de 18Kpb de DNA (FIGUEROA, 2013). Sabe-se que o exon 19, situado na sétima alça extracitoplasmática, codifica para o antígeno Dib de alta prevalência em humanos (SILVA et al., 2004). O antígeno Dia, por sua vez, resulta de mutação em ponto no nucleotídeo 2561 (C>T) do exon 19, cuja consequência é a substituição de um aminoácido na posição 854 do antígeno Dib na proteína Banda 3 (Pro854Leu). Portanto, o antígeno Dia é produto do alelo DI*A (ou DI*01), que se origina de mutação no alelo DI*B (ou DI*02) (FIGUEROA, 2013; BÉGAT et al., 2015). Em humanos, o polimorfismo Dia/Dib determina 3 fenótipos e genótipos possíveis (FLÔRES et al., 2004; CHESOR et al., 2018): • fenótipo Di(a-b+) ou DI:-1;2 cujos alelos codificadores são DI*B/DI*B ou DI*02/DI*02 • fenótipo Di(a+b+) ou DI:1;2 cujos alelos codificadores são DI*A/DI*B ou DI*01/DI*02 • fenótipo Di(a+b-) ou DI:1;-2 cujos alelos codificadores são DI*A/DI*A ou DI*01/DI*01 Assim como no antígeno Dia, todos os demais antígenos de baixa frequência do sistema de grupo sanguíneo DI são associados à substituição de um único aminoácido na proteína da Banda 3, na membrana eritrocitária (CARVALHO, 2018). Entretanto, o fenótipo Di(a-b-) ou DI:-1;-2 (fenótipo null), não é descrito em indivíduos saudáveis (BÉGAT et al., 2015; COZAC, 2004), o que reforça a importância do papel fisiológico da Banda 3 nas células onde é expressa (COZAC, 2004). 3.3 Importância clínica do polimorfismo Dia/Dib Conforme já mencionado, o alelo DI*B é de alta prevalência nas populações em geral (99.9%), inclusive em ameríndios e asiáticos. Por sua vez, o alelo DI*A é de baixa prevalência nas populações em geral (0.01%), exceto por maior prevalência em ameríndios e asiáticos (REID e WESTHOFF, 2006). 17 Considerando-se haver predisposição a casamentos intra-étnicos, migrações de diferentes povos pelo planeta, e ocorrência de miscigenações inter-raciais, um indivíduo Di(a-b+) pode ter contato com sangue de indivíduo Di(a+b+) ou Di(a+b- ) e sofrer aloimunização, principalmente, por meio de gestação e/ou transfusão sanguínea, produzindo anticorpos anti-Dia (FIGUEROA, 2015). Segundo Westhoff (2019), o sistema DI (antígeno Dia) consta entre os 6 sistemas sanguíneos que mais frequentemente causam aloimunizações em humanos. 3.4 Importância antropológica do polimorfismo Dia/Dib A conclusão de que alelo DI*A é um fator mongol, sobretudo de áreas continentais (leste e sudeste asiáticos), tem sido ligada a uma das teorias de colonização do Continente Americano: aquela que diz que povos asiáticos nômades teriam partido da Ásia continental para a Sibéria e, daí, rumado para o Alaska através do Estreito de Bering (Beríngia), entre 23.000 e 15.000 anos (BÉGAT et al., 2015; GRUGNI et al., 2019). A Figura 3 ilustra as 2 principais rotas propostas para a ocupação humana do Continente Americano. 18 FIGURA 3. Principais teorias para a ocupação humana do Continente Americano: rota 1 – via Estreito de Bering, que é frequentemente relacionada à chegada e dispersão do alelo DI*A nas Américas; rota 2 – via marítima – ocupação por povos polinésios que teriam chegado à América do Sul. (https://sala19.wordpress.com/tag/estreito-de-bering/). 3.5 Considerações sobre os macacos-prego (Sapajus sp.) Os macacos-prego são primatas neotropicais, pertencentes à família Cebidae, que contém os gêneros Saimiri sp., Cebus sp. e Sapajus sp. (CPB/ICMBio, 2013; BACALHAO et al., 2016). Habitam as Américas do Sul e Central. Pesam menos de 5Kg, são onívoros, e vivem em habitats diversificados. Os gêneros Cebus sp. e Sapajus sp. são conhecidos como macacos- prego. O gênero Sapajus sp. é constituído por 9 espécies (CPB/ICMBio, 2013; BACALHAO et al., 2016), que habitam os biomas Floresta Amazônica e Mata Atlântica. No presente estudo foi incluído o gênero Sapajus sp., com exemplares das espécies Sapajus apella e Sapajus nigritus) que estavam disponíveis no CEMPAS à época da coleta das amostras sanguíneas. https://sala19.wordpress.com/tag/estreito-de-bering/ 19 3.6 Considerações sobre os macacos bugios (Alouatta sp.) Os macacos bugios são primatas neotropicais, pertencentes à família Atelidae, e ao gênero Alouatta, que compreende 10 espécies (CPB/ICMBio, 2013). São encontrados desde o México até o sul da América do Sul. No Brasil, habitam o bioma Mata Atlântica. Seu peso varia de 5 a 12Kg, são arborícolas e predominantemente folívoros-frugívoros. A característica morfológica mais marcante do gênero é a presença do osso hioide bastante desenvolvido, que age como ressonador para o seu ronco, originando vocalização rouca, grave e de longo alcance, razão de ser também conhecido como macaco roncador. Popularmente é conhecido como bugio, roncador, uivador, barbado, guariba, carajá e congo, dependendo da região do país (GREGORIN et al., 2008). No presente estudo, foram incluídas as espécies Alouatta fusca que correspondem aos macacos bugios ruivos (CPB/ICMBio, 2013; GREGORIN et al., 2006), e os Alouatta caraya que correspondem aos macacos bugios pretos (CPB/ICMBio, 2013; GREGORIN et al., 2006), por estarem disponíveis no CEMPAS à época da coleta das amostras sanguíneas. 20 MATERIAL E MÉTODOS 21 4 MATERIAL E MÉTODOS 4.1 Casuística e ambiente de experimentação A metodologia adotada no desenvolvimento do presente trabalho foi aprovada pelo Comitê de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade Estadual Paulista (UNESP) - Botucatu, sob nº 0118/2020-CEUA em 12/08/2020 (Anexo I). O projeto também obteve autorização do Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade – SISBIO, divisão do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA, sob nº 75388-1, Código de Autenticação 0753880120200707 - em 07/07/2020 (Anexo II), para atividades com finalidade científica. O estudo foi cadastrado no Sistema Nacional de Gestão do Patrimônio Genético e do Conhecimento Tradicional Associado – SisGen, sob o nº AE3AE8C - em 04/09/2020 (Anexo III), e aderiu aos Princípios Éticos para o Tratamento de Primatas preconizados pela American Society of Primatologists. Foram estudados 10 Sapajus sp. (macacos-prego ou capuchinhos), correspondendo a 4 fêmeas e 6 machos (animais 1 a 10). Dois machos e 1 fêmea correspondiam a filhotes, respectivamente, de 3, 4 e 4 meses. Os Sapajus sp. compreenderam 6 Sapajus nigritus (3 adultas e seus filhotes) e 4 Sapajus apella (adultos). Estudaram-se também 6 Alouatta sp. (macacos bugios) adultos, correspondendo a 6 machos (animais 1 a 6). Quatro macacos bugios pertenciam à espécie Alouatta fusca – bugios ruivos, e 2 pertenciam à espécie Alouatta caraya – bugios pretos. Foram excluídos do estudo macacos não pertencentes aos gêneros Sapajus sp. e Alouatta sp., e macacos pertencentes aos gêneros Sapajus sp. e Alouatta sp. que não estavam saudáveis segundo avaliação clínico-laboratorial efetuada pelos médicos veterinários do CEMPAS, na ocasião da coleta das amostras sanguíneas. Não foi possível identificar a exata procedência dos 16 animais, porém, todos eram provenientes de diferentes regiões do Estado de São Paulo, oriundos de apreensão de tráfico ilegal de animais silvestres. Estavam mantidos sob 22 cuidados humanos, em recintos com dimensões especificadas pelo IBAMA dotados de áreas interna e externa (acesso à luz solar), no Centro de Estudo em Medicina e Pesquisa de Animais Selvagens – CEMPAS (Latitude: -22.8841808; Longitude -48.4441654), UNESP, Botucatu, SP. Eram alimentados com ração comercial para primatas, verduras e frutas, e recebiam água fresca ad libitum. 4.2 Contenção química dos animais Após 12 horas de jejum, os animais foram capturados em seus recintos com auxílio de um puçá. Receberam injeção intramuscular de cloridrato de quetamina a 10% (7mG/kg) e midazolam (0,5mG/kg), aplicada por anestesiologista veterinário, que também monitorizou clinicamente os animais durante os procedimentos de coleta sanguínea. As coletas das amostras foram realizadas por médico veterinário do CEMPAS. Em seguida, os referidos animais foram monitorados por anestesiologista veterinário durante a recuperação pós- anestésica, e retornaram aos recintos de origem no CEMPAS, onde foram monitorados clinicamente durante as 24 horas subsequentes à coleta. 4.3 Coleta das amostras de sangue periférico Após antissepsia, utilizando-se seringa e agulha estéreis descartáveis, foram coletados 4,0mL de sangue periférico da veia braquial ou jugular dos macacos (coletados 2,0mL de cada filhote). A amostra de sangue de cada animal foi dividida em 2 tubos-padrão de hemograma (2mL de sangue/tubo/animal adulto; 1mL de sangue/tubo/filhote) contendo o anticoagulante K2 EDTA. Os tubos devidamente identificados com as amostras de sangue foram colocados em caixa plástica resistente e apropriada, contendo o símbolo que caracteriza “Risco Biológico”. Uma amostra de cada animal (tubo com 2mL de sangue/animal adulto; tubo com 1mL de sangue/filhote) foi transportada até o Laboratório de Imunohematologia, da Divisão Hemocentro do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB) – UNESP, para pesquisa do antígeno eritrocitário Dia. A outra amostra de cada animal (tubo com 2mL de sangue/animal adulto; tubo com 1mL de sangue/filhote) foi enviada, de carro e 23 imediatamente após a coleta, para o Laboratório de Imunohematologia do Departamento de Hemoterapia e Terapia Celular do Hospital Israelita Albert Einstein – São Paulo, para a realização da genotipagem DI*A. 4.4 Fenotipagem eritrocitária para o antígeno Dia A pesquisa do antígeno eritrocitário Dia foi realizada pela técnica de gel- centrifugação (DiaMed-ID Micro Typing System® - Bio-Rad Technique) de forma similar à realizada para pesquisa do referido antígeno em eritrócitos humanos. A descrição dos procedimentos consta a seguir: 1 - Foi realizada a identificação dos microtubos nos cartões que receberiam as hemácias (números arábicos representando cada macaco, sequencialmente); 2 - O tubo original da coleta dos macacos (tubo de coleta com 2 mL de sangue em anticoagulante K2 EDTA), devidamente identificado no ato da coleta, foi centrifugado para a separação entre plasma e hemácias; 3 – Prepararam-se e identificaram-se outros tubos, sendo um para cada animal, colocando-se neles 19 gotas (950µL) de LISS (Solução de Baixa Força Iônica) para a diluição das hemácias; 4 - 10µl de hemácias (da amostra centrifugada de cada macaco, item 2) foram transferidas para nos respectivos tubos preparados no item 3 (tubos com LISS); 5 - 50µL da diluição de cada animal (item 4) foram colocados nos respectivos microtubos dos cartões (item 1), sendo adicionados aos mesmos 25µL do antissoro correspondente ao anticorpo Anti-Dia; 6 - Os cartões contendo os microtubos foram incubados a 37ºC por 15 minutos; 7 - Em seguida, foram centrifugados a 3400rpm durante 10 minutos, sendo a leitura efetuada e os resultados anotados. Os resultados foram interpretados para a técnica de gel-centrifigação (DiaMed-ID Micro Typing System®), segundo a qual o teste negativo revela 24 hemácias aglutinadas apenas no fundo do microtubo (aglutinação 0), e o teste positivo revela graus variáveis de aglutinação de hemácias, indo da superfície ao fundo do microtubo, sendo classificado num espectro de 1 (aglutinação próxima ao fundo do microtubo) a 4 (aglutinação concentrada na superfície do gel) [VIZZON e SILVA, 2015]. Todos os kits e reagentes usados no estudo, para fenotipagem eritrocitária Dia, encontravam-se dentro do prazo de validade e foram manufaturados pela DiaMed Latino América SA, Lagoa Santa, MG, Brazil, filial brasileira da Bio-Rad Laboratories, Inc., Hercules, CA, USA, sendo fornecidas sem nenhum custo, pela pH 7 Comércio e Representações de Produtos para Diagnósticos Ltda., representante da Bio-Rad Laboratories no Brasil. 4.5 Genotipagem do polimorfismo Diego (DI*A/*B) 4.5.a Extração do DNA O DNA genômico utilizado na genotipagem foi isolado a partir dos leucócitos procedentes das amostras de sangue periférico, coletadas em tubos com anticoagulante (EDTA). A extração do DNA foi realizada utilizando-se o Kit DNA QIAamp Mini Spin Column (Qiagen), segundo as especificações do fabricante. 4.5.b PCR-RFLP Para a detecção da variação genética (polimorfismo 2561C>T) no gene SLC4A1, característica do alelo DI*A, foi realizada a técnica de RFLP (do inglês, Restriction Fragment Length Polymorphism). Etapas da RFLP: 1. PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) Nessa etapa ocorreu a amplificação enzimática da região a ser estudada. Para isso, foram utilizados oligonucleotídeos iniciadores (primers) customizados 25 e desenhados (Thermo Fisher Scientific - BR) especificamente para as espécies a serem estudas (Tabela 1). TABELA 1. Sequências dos primers foward e reverse utilizadas na amplificação da região que abriga a variação genética característica o alelo DI*A no gene SLC4A1 em Alouatta sp. e Sapajus sp. Primers Sequência 5’ - 3’ Produto de Amplificação (pares de bases) Forward TTCCTGAAGATGAGCAGCAG 149 Reverse TGGCGCATGCACTTGTTCAC O protocolo de amplificação foi padronizado pelo Laboratório de Imunohematologia do Departamento de Hemoterapia e Terapia Celular do Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP, e está descrito a seguir: 1.1- A mistura de PCR foi composta pelos reagentes: tampão de PCR 1x (Tris- HCl20mM (pH 8,4), KCl 50mM), 1,25U de Platinum Taq DNA Polimerase (Invitrogen), 0,35mM deoxinucleotídeo tri-fosfato (dNTP), 5,8mM de MgCl2, 0,25μM de cada oligonucleotídeo iniciador e 100ng de DNA, totalizando 30μL de mistura para PCR; 1.2- Essa mistura foi submetida a desnaturação inicial a 95ºC por 15 minutos, seguido de 35 ciclos (desnaturação a 94ºC por 20 segundos, anelamento a 56ºC por 20 segundos, extensão a 72ºC por 20 segundos), e extensão final a 72ºC por 5 minutos; 1.3- A amplificação foi confirmada pela visualização das bandas de 149 pares de bases (pb) em gel de agarose concentrada a 4%. Após isso, seguiu-se para a etapa de RFLP. 26 2. RFLP (Restriction Fragment Length Polymorphism ou Polimorfismo dos Tamanhos dos Fragmentos de Restrição) 2.1- 10μL o produto da PCR foi submetido ao tratamento com a enzima de restrição MspI (Invitrogen) [ enzima que reconhece e corta o sítio caracterizado pela a sequência 5´...C/CGG...3´]; a reação transcorreu por 1 hora a 37ºC; 2.2- o produto da digestão foi novamente submetido à eletroforese em gel de agarose concentrada a 4%. Os resultados foram interpretados de acordo com o padrão de bandas obtidas no gel de eletroforese a 4%, após o ensaio de restrição, como ilustrado a seguir (Figura 4): a) presença de duas bandas (70 e 79pb) = genótipo CC = alelos DI*B/*B b) presença de três bandas (149, 70 e 79pb) = genótipo CT = alelos DI*A/*B c) presença de uma banda de 149pb = genótipo TT = alelos DI*A/*A 27 FIGURA 4. Representação esquemática de um gel de agarose mostrando o padrão de bandas para interpretação dos resultados da PCR-RFLP, na genotipagem do polimorfismo DI*A/DI*B do sistema de grupo sanguíneo Diego em macacos. 1- marcador de peso molecular (50pb); 2- produto da PCR antes da restrição; 3- genótipo DI*B/*B caracterizado por 2 bandas (fragmentos de 70 e 79pb); 4- genótipo DI*A/DI*B caracterizado por 3 bandas (fragmentos de 149, 70 e 79bp); 5- genótipo DI*A/DI*A caracterizado por 1 banda (fragmento de 149pb). 28 RESULTADOS 29 5 RESULTADOS 5.1 Macacos-prego (Sapajus sp.) A Figura 5 mostra 2 macacos-prego ou capuchinhos adultos no seu recinto no CEMPAS. FIGURA 5. Macacos-prego (Sapajus sp.) adultos no seu recinto no CEMPAS. 5 30 5.1.a Fenotipagem do sistema DI (antígeno Dia) nos macacos-prego Os 10 macacos-prego foram positivos para o antígeno eritrocitário Dia do sistema DI. Os achados da fenotipagem encontram-se na Tabela 2 e na Figura 6. Animal Gênero Sexo Intensidade da aglutinação para o Ag Dia do Sistema Diego§§ 1 Sapajus apella M 3 2 Sapajus apella M 3 3 Sapajus nigritus F 3 4 Sapajus apella M 3 5 Sapajus nigritus F 3 6 Sapajus nigritus F 3 7 Sapajus apella M 3 8§ Sapajus nigritus F 3 9§ Sapajus nigritus M 3 10§ Sapajus nigritus M 3 TABELA 2. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo. §Filhotes; §§Padrões de aglutinação (0 a 4) de acordo com Vizzon e Silva (2015). 31 5.1.b Genotipagem do sistema Diego (polimorfismo DI*A/*B) nos macacos- prego Os 10 macacos-prego revelaram homozigose DI*A/DI*A na genotipagem para o sistema DI. Os achados da genotipagem encontram-se na Tabela 3 e na Figura 7. FIGURA 6. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo (aglutinação 3 em todos os animais; aglutinação 3 no controle positivo; aglutinação 0 no controle negativo). Sapajus sp. 1 a 6 Sapajus sp. 7 a 10 Controles 6 32 Animal Espécie Sexo Genotipagem DI*A/*B do Sistema Diego 1 Sapajus apella M DI*A/*A 2 Sapajus apella M DI*A/*A 3 Sapajus nigritus F DI*A/*A 4 Sapajus apella M DI*A/*A 5 Sapajus nigritus F DI*A/*A 6 Sapajus nigritus F DI*A/*A 7 Sapajus apella M DI*A/*A 8§ Sapajus nigritus F DI*A/*A 9§ Sapajus nigritus M DI*A/*A 10§ Sapajus nigritus M DI*A/*A §Filhotes. TABELA 3. Genotipagem do sistema Diego mostrando apenas o alelo correspondente ao antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo. 33 FIGURA 7. Eletroforese em gel de agarose a 4% após ensaio de restrição - genotipagem para o sistema DI mostrando apenas o alelo DI*A que codifica para o antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 10 macacos-prego (Sapajus sp.) do estudo. À esquerda da linha vertical, observam-se as bandas-controles: marcador de peso molecular de 50pb, PCR (antes do ensaio de restrição), alelos DI*B/*B (2 bandas justapostas) e DI*A/*A (1 banda), e branco. . 7 34 5.2 Macacos bugios (Alouatta sp.) A Figura 8 mostra macaco-bugio ruivo adulto no seu recinto no CEMPAS. 5.2.a Fenotipagem do sistema DI (antígeno Dia) nos macacos bugios Os 6 macacos bugios foram positivos para o antígeno eritrocitário Dia do sistema DI. Os achados da fenotipagem encontram-se na Tabela 4 e na Figura 9. FIGURA 8. Macaco bugio ruivo (Alouatta fusca) adulto no seu recinto no CEMPAS. 8 35 Animal Espécie Sexo Intensidade da aglutinação para o Ag Dia do Sistema Diego§ 1 A. caraya M 3 2 A. fusca M 3 3 A. fusca M 3 4 A. caraya M 3 5 A. fusca M 3 6 A. fusca M 3 TABELA 4. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo. §Padrões de aglutinação (0 a 4) de acordo com Vizzon e Siva (2015). 36 5.2.b Genotipagem do sistema DI (polimorfismo DI*A/*B) nos macacos bugios Os 6 macacos bugios revelaram homozigoze DI*A/*A na genotipagem do sistema DI. Os achados da genotipagem encontram-se na Tabela 5 e na Figura 10. FIGURA 9. Fenotipagem eritrocitária do sistema DI mostrando positividade para o antígeno Dia nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo (aglutinação 3 em todos os animais; aglutinação 3 no controle positivo; aglutinação 0 no controle negativo). 9 Controles Alouatta sp. 1 a 6 37 Animal Espécie Sexo Genotipagem DI*A/*B do Sistema Diego 1 A. caraya M DI*A/*A 2 A. fusca M DI*A/*A 3 A. fusca M DI*A/*A 4 A. caraya M DI*A/*A 5 A. fusca M DI*A/*A 6 A. fusca M DI*A/*A TABELA 5. Genotipagem do sistema Diego mostrando apenas o alelo correspondente ao antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo. 38 FIGURA 10. Eletroforese em gel de agarose a 4% após ensaio de restrição - genotipagem do sistema DI mostrando apenas o alelo DI*A que codifica para o antígeno Dia (homozigose DI*A/*A) nos 6 macacos bugios (Alouatta sp.) do estudo. À esquerda da linha tracejada, observam-se as bandas-controles: marcador de peso molecular de 50pb, PCR (antes do ensaio de restrição), alelos DI*B/*B (2 bandas justapostas) e DI*A/*A (1 banda), e branco. 10 39 DISCUSSÃO 40 6 DISCUSSÃO Considerando-se que não existem, na literatura, informações suficientes para embasar discussão sobre o antígeno Dia (e/ou alelo DI*A) em macacos, a abordagem aqui realizada versará sobre a importância clínica do mesmo em humanos, seguida de discussão sobre a relevância antropológica a ele atribuída. Ao final dessa última, será realizada breve abordagem evolutiva dos primatas neotropicais na América do Sul, situando-os temporalmente em relação ao povoamento humano do Continente Americano. Desde as descobertas dos 2 primeiros antígenos do sistema de grupo sanguíneo DI (Dia e Dib), respectivamente, nas décadas de 1950 e 1960, o polimorfismo Dia/Dib tem sido objeto de recorrentes estudos até os dias atuais (LEVINE et al., 1954; LAYRISSE et al., 1955; RODRIGUES et al., 2021; DELANEY et al., 2015; NOVARETTI et al., 2010; ZACARIAS et al., 2016; COSTA et al., 2016; CHESOR et al., 2018; THOMPSON et al., 1967). Tanto o anticorpo anti-Dia quanto o anti-Dib são clinicamente relevantes (NOVARETTI et al., 2010). Exposição de indivíduo com fenótipo Di(a-b+) ao antígeno Dia, resultará na formação de anticorpos irregulares anti-Dia. O mesmo ocorrerá em indivíduo com fenótipo Dia(a+b-) que, exposto ao antígeno Dib, formará anticorpos anti-Dib. Esse tipo de aloimunização geralmente ocorre em gestações e em transfusões sanguíneas, sendo que o problema clínico advém nas subsequentes exposições aos referidos antígenos, na forma de DHP, ou como RHT imediatas ou tardias, de gravidade variável (GIRELLO e KÜHN, 2016; FLÔRES et al., 2014; FIGUEROA, 2013; CARVALHO, 2018). Aloimunização com anticorpo anti-Dia é mais comum que com anti-Dib, uma vez que o antígeno Dia ocorre em apenas 0.01% da população em geral (REID & WESTHOFF, 2006), sendo incomum em caucasianos, africanos/afrodescendentes, aborígenes e em outros povos de ilhas do Pacífico Sul (FLÔRES et al., 2014; SOYANO & SOYANO, 2014; SIMONS, 1957; LLERAS & SILVA, 1960; DELANEY et al., 2015). Entretanto, polimorfismo Dia/Dib é bem documentado em povos de origem mongol (REID e WESTHOFF, 2006). É relatado, ainda, que o 41 anticorpo anti-Dia pode surgir naturalmente, sem associação conhecida com evento aloimunizante (GIRELLO e KÜHN, 2016; SOYANO e SOYANO, 2014). O antígeno Dib, por sua vez, é de alta prevalência, sendo encontrado em 99.9% dos indivíduos da população em geral, e em 96% dos ameríndios (REID e WESTHOFF, 2006). Tais percentuais tendem a ser menores nas populações com alta prevalência do antígeno Dia (REID e WESTHOFF, 2006). A designação de marcador mongol ao antígeno Dia ocorreu logo após sua descoberta, quando se constatou que o mesmo apresentava alta incidência em asiáticos e ameríndios, particularmente, nesses últimos (SOYANO e SOYANO, 2014). Estudos mostraram que, mesmo dentre os povos mongóis, tanto na Ásia quanto no Continente Americano, sua frequência era muito variada (FLÔRES et al., 2014, FIGUEROA, 2013; JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; BÉGAT et al., 2015; et al., 2014; SOYANO e SOYANO, 2014; GÓNGORA e CHIRIBOGA- PONCE, 2018; NOVARETTI et al., 2010). Na atualidade, além da composição étnica de cada país, as viagens internacionais, migrações e miscigenações entre povos têm elevado a prevalência do antígeno Dia em doadores, e do anticorpo anti-Dia em receptores de sangue (GIRELLO e KÜHN, 2016). No Brasil, o antígeno Dia tem sido documentado em até 6% de doadores de sangue (COZAC, 2004; BALEOTTI JÚNIOR, 2002). Por outro lado, gestantes, sobretudo as multíparas (SOYANO e SOYANO, 2014; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018), e até 10% dos indivíduos politransfundidos (SILVA et al., 2004), podem apresentar pesquisa de anticorpos irregulares (PAI) positiva em decorrência de contato prévio com glóbulos vermelhos que apresentavam o antígeno Dia (FLÔRES et al., 2014; SOYANO e SOYANO, 2014; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018; SILVA et al., 2004). Tais achados justificam a real preocupação com os fenótipos Di(a+b+) ou Di(a+b-), sobretudo nos doadores, em bancos de sangue do país (COZAC, 2004; ZACARIAS et al., 2016). Entretanto, a fenotipagem para o sistema DI não é rotina nos bancos de sangue do Brasil. Na verdade, fenotipagem e/ou genotipagem relacionada ao polimorfismo Dia/Dib tem sido realizada principalmente no âmbito de pesquisas. Na prática transfusional, o habitual é que um laboratório de imunohematologia 42 se depare com indivíduos aloimunizados para o antígeno Dia, o que é descoberto apenas por meio da investigação de PAI positiva. Entretanto, estudos nacionais têm proposto métodos práticos de genotipagem de antígenos eritrocitários (NOVARETTI et al., 2010; GUELSIN et al., 2010), incluindo a dos alelos DI*A e DI*B (NOVARETTI et al., 2010) em pacientes candidatos à politransfusão (GUELSIN et al., 2010), para fins de cadastro de doadores de sangue fenotipados/genotipados (ZACARIAS et al., 2016), e para estudos epidemiológicos e antropológicos (NOVARETTI et al., 2010). Outra importância atribuída ao antígeno Dia é relacionada à antropologia. A partir da segunda metade dos anos 1950, uma série de estudos apontaram nessa direção. Conforme já mencionado, o antígeno Dib apresenta alta prevalência em todas as etnias (REID e WESTHOFF, 2006), enquanto o antígeno Dia é prevalente em etnias de origem mongol (asiáticos e ameríndios), sendo raro na população em geral, particularmente em caucasianos e africanos/afrodescendentes (REID e WESTHOFF, 2006; FLÔRES et al., 2014; SOYANO e SOYANO, 2014). Essa distribuição étnico-geográfica do antígeno Dia tem dado suporte à teoria de povoamento do Continente Americano por povos mongóis (BÉGAT et al., 2015) que, através do cruzamento do Estreito de Bering (antiga Beríngia), teriam partido da Sibéria rumo ao Alasca (BÉGAT et al., 2015; NIELSEN et al., 2017). A genética e a paleoantropologia modernas afirmam, baseada em estudos de fósseis encontrados na Etiópia (África), que a evidência mais antiga do homem moderno data de 190.000 a 150.000 anos (NIELSEN et al., 2017). Entretanto, há indícios de vários outros agrupamentos humanos pré-históricos “mais recentes” distribuídos pela África (NIELSEN et al., 2017). Desde os anos 1980, estudos genômicos realizados em fósseis sugerem que o povoamento mundial decorreu de evento conhecido como “a grande expansão humana” (do inglês, The Great Human Expansion Out of Africa), iniciada entre 100.000 e 50.000 anos (NIELSEN et al., 2017) ou entre 60.000 e 45.000 anos (HENN et al., 2012), a partir da região centro-africana (HENN et al., 2012). Daí, teriam ocorrido 2 rotas de dispersão: uma para o sul da África e outra para o Oriente 43 Médio (NIELSEN et al., 2017). Do Oriente Médio, um grupo seguiu para a Europa e oeste asiático e, outro, para o leste asiático (NIELSEN et al., 2017). Na rota para o leste asiático, os humanos teriam hibridizado com o homem de Neanderthal seguindo, pela via continental, para o seu destino (NIELSEN et al., 2017). Estudos atuais mostram que os povos do leste asiático apresentam cerca de 20% mais sequências gênicas de origem Neanderthal do que os europeus (NIELSEN et al., 2017). Depois de hibridizado com o homem de Neanderthal, parte desse povo teria sofrido subsequente hibridização com o homem Denisovano, formando um novo braço migratório que seguiu, pela costa asiática (ao sul), para a atual Oceania e ilhas adjacentes (Indonésia e Tasmânia) [NIELSEN et al., 2017]. Estudos mostram que indonésios possuem até 6% de genoma Denisovano-like, enquanto o percentual é de no máximo 0.3% no sudeste da Ásia continental (NIELSEN et al., 2017). Esse povo insular teria, posteriormente, seguido para as ilhas da Polinésia (NIELSEN et al., 2017), que incluem a Nova Zelândia, a Ilha de Páscoa e o Havaí. Pelo exposto, constata-se que os ancestrais dos povos da Ásia continental e daqueles que habitaram as ilhas do Pacífico Sul, ainda que possam ter sofrido alguma miscigenação entre si, parecem ter surgido de ramificações migratórias distintas, a partir do Oriente Médio (NIELSEN et al., 2017; HENN et al., 2012), tendo passado por hibridizações diferentes (NIELSEN et al., 2017). Esses dois braços de povoamento asiático são, historicamente, relacionados ao povoamento do Continente Americano que, por sua vez, também compreende duas teorias, ambas relacionadas à etnia mongol. A primeira supõe que povos mongóis da Ásia continental chegaram à América do Norte atravessando o Estreito de Bering, da Sibéria para o Alasca, entre 23.000 a 15.000 anos; esse então “homem americano” teria avançado pela costa do Oceano Pacífico, rumo à América Central, tendo cruzado o Istmo do Panamá, para chegar à América do Sul (NIELSEN et al., 2017; MANDRYK et al., 2001). A outra teoria diz que povos polinésios, de origem mongol, seguiram das ilhas do Pacífico Sul para a América do Sul, por via marítima, entre 5.000 e 3.000 anos atrás [NIELSEN et al., 2017; HENN et al., 2012]. 44 A teoria do cruzamento do Estreito de Bering foi formulada nos anos 1930 (MANDRYK et al., 2001) e, desde os anos 1950, vem sendo utilizada para justificar a alta prevalência do antígeno Dia em povos continentais do leste/sudeste asiático e em ameríndios, bem como sua quase inexistência em caucasianos, africanos, aborígenes (GIRELLO e KÜHN, 2016; FLÔRES et al., 2014; FIGUEROA, 2013; JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; BÉGAT et al., 2015; SOYANO e SOYANO, 2014; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018; CARVALHO, 2018; RODRIGUES et al., 2021), e povos das ilhas do Pacífico Sul (FLÔRES et al., 2014; SOYANO & SOYANO, 2014; SIMONS, 1957; LLERAS & SILVA, 1960; DELANEY et al., 2015; CHESOR et al., 2018). Os dois braços de povoamento asiático, a partir do Oriente Médio, e suas respectivas hibridizações com outros homens primitivos, poderiam perfeitamente justificar diferenças genéticas, incluindo as distintas prevalências do antígeno Dia, entre os povos da Ásia continental (leste e sudeste), e povos do sul da Ásia e ilhas do Pacífico Sul. Por outro lado, embora o antígeno Dia seja encontrado em indígenas de todo o Continente Americano, sua ocorrência aumenta em direção à América do Sul (BÉGAT et al., 2015), com as mais altas prevalências sendo observadas em algumas tribos indígenas brasileiras, como as de etnias Carajá (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002), Xavante (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002) e Kaingang (JUNQUEIRA e CASTILHO, 2002; GIRELLO e KÜHN, 2016; REID e WESTHOFF, 2006; GÓNGORA e CHIRIBOGA-PONCE, 2018; RODRIGUES et al., 2021) e Paracanã (BALEOTTI JÚNIOR, 2002), sendo praticamente inexistente em outras. Segundo Bégat et al. (2015) traços culturais, e capacidades de adaptação ambiental e sobrevivência seriam reflexo da diversidade genética dos ameríndios que se espalharam pelo Continente Americano. Assim, a distribuição do antígeno Dia não teria ocorrido de forma randomizada nas 3 Américas mas, sim, obedecendo um modelo de comigração genético-cultural, com maior ocorrência em algumas regiões geográficas e grupos étnicos (BÉGAT et al., 2015). Esses mesmos autores afirmaram que o grupo sanguíneo DI foi o primeiro e, provavelmente, o mais importante marcador a demonstrar um continuum biológico entre povos dos dois lados do Estreito de Bering (BÉGAT et al., 2015). 45 Pelo exposto, o antígeno Dia realmente parece relacionar-se com o povoamento americano via Estreito de Bering, demonstrando uma ligação sanguínea entre povos mongóis do leste e sudeste da Ásia continental e ameríndios contemporâneos. Ainda que tenha havido povoamento do Continente Americano, isolada ou concomitantemente, por polinésios vindos das ilhas do Pacífico Sul, torna-se difícil fazer a correlação desses povos com o antígeno Dia, uma vez que os mesmos têm se mostrado negativos para esse antígeno (CHESOR et al., 2018). Em relação aos primatas não-humanos, não se sabe precisar quando os mesmos chegaram à América do Sul. O fóssil de macaco mais antigo da América do Sul data de 26 milhões de anos, tendo sido encontrado na Colômbia (KIESLING et al., 2014). Entretanto, o proto-platyrrhini pode ter vindo da Ásia ou da África ainda na Pangea, ou da África, durante a Gondwana (KIESLING et al., 2014). A Gondwana foi um supercontinente meridional que compreendia a Antártida, a América do Sul, a África, a Índia, Madagascar e a Oceania, além de outros territórios menores. Opunha-se à Laurásia, situada no hemisfério norte, que compreendia a atual América do Norte e a Eurásia. Gondwana e Laurásia se formaram da ruptura da Pangea, que teve início há 200 milhões de anos (Período Triássico da Era Mesozoica). No Período Cretácio da mesma Era, as terras da Gondwana se separaram, tendo a América do Sul permanecido como um continente isolado por cerca de 60 milhões de anos. Posteriormente, no Neogeno (Mioceno + Plioceno) da Era Cenozoica, houve sua união com as Américas do Norte e Central, através do Istmo do Panamá (NATGEO, 2020). O assim formado Continente Americano permitiu o grande intercâmbio biológico americano (do inglês, Great American Biotec Interchange), com trânsito de animais por todo seu território. Dessa forma, primatas não-humanos que já habitavam a América do Sul durante sua fase de isolamento continental, dispersaram-se pelo neotrópico (da latitude 22º Norte à latitude 29º Sul), constituindo os macacos neotropicais, macacos do Novo Mundo, ou Platyrrhini (KIESLING et al., 2014). 46 É provável que todos os macacos neotropicais resultem de uma única linhagem ancestral, que começou a divergir e sofrer diversificação genética há cerca de 15 milhões de anos, originando as diferentes famílias, gêneros e espécies. No Mioceno (23 a 5 milhões de anos), a geografia da América do Sul, incluindo a da Amazônia, já era bem parecida com a atual, e praticamente todos os gêneros já haviam se constituído (KIESLING et al., 2014). Hoje, os macacos do Novo Mundo formam o mais diversificado grupo de primatas não-humanos existente. No Brasil, compreendem 5 famílias e 139 taxa (espécies e subespécies) [CPB/ICMBio, 2013]. Pelo exposto, pode-se constatar que os primatas neotropicais são muito mais antigos na América do Sul do que os humanos modernos. Ancestrais desses animais podem, inclusive, ter vindo de regiões como África e/ou Ásia, num passado longínquo, quando as terras do planeta ainda estavam unidas (Pangea) ou pouco divididas (Gondwana) [KIESLING et al., 2014]. O presente estudo demonstrou o fenótipo Dia e o genótipo DI*A/DI*A em 100% dos animais estudados de dois gêneros de macacos neotropicais, respectivamente, Alouatta sp. e Sapajus sp., o que é absolutamente incomum na população humana em geral. A presença do alelo DI*A nos asiáticos e ameríndios tem sido, de forma bastante plausível, relacionada à teoria de povoamento humano do Continente Americano pelo Estreito de Bering, entre 23.000 e 15.000 anos. Entretanto, o presente estudo mostrou que o alelo DI*A pode ter estado presente em primatas neotropicais que vêm habitando a América do Sul, por milhões de anos, antes da chegada do homem moderno. Na hierarquia evolutiva dos primatas, macacos do Novo Mundo podem ter compartilhado um longínquo ancestral com o gênero Homo (SCHNEIDER e SAMPAIO, 2013). Portanto, parece ser possível inferir que o alelo DI*A pudesse estar presente em tal ancestral compartilhado, tendo sido conservado nos primatas neotropicais, e tendo desaparecido na grande maioria dos humanos, exceto no povo que migrou para o leste e sudeste da Ásia, por via continental. Tais mongóis, portadores do alelo DI*A, teriam chegado ao Continente Americano, via Estreito de Bering, fechando o “circuito” do antígeno Dia na 47 América do Sul. Se esse raciocínio estiver correto, o alelo DI*A seria o selvagem, sendo o alelo DI*B o mutante, contrariamente ao que se acredita ocorrer nos seres humanos. Não foram encontrados estudos semelhantes a este em quaisquer macacos do globo terrestre. Entretanto, serão necessárias novas pesquisas, em outros gêneros e espécies de primatas não-humanos, que também incluam macacos do Velho Mundo e grandes macacos hominídeos, a fim de se procurar confirmar os achados aqui apresentados. Técnicas mais avançadas de biologia molecular, como o sequenciamento genético do gene relacionado ao sistema DI nos primatas não-humanos, seguramente, é uma ferramenta que poderá ajudar nesse propósito. Ao invés de explicações convincentes, os resultados do presente estudo suscitam um questionamento: se tais achados forem confirmados, porque um antígeno humano relacionado à etnia mongol (asiáticos e ameríndios) estaria presente, em homozigose e em aparente alta prevalência, em macacos no Novo Mundo? 48 CONCLUSÃO 49 7 CONCLUSÕES 1- O genótipo DI*A/DI*A foi encontrado nos dois gêneros de macacos deste estudo; 2- Esses achados são inéditos e não estão descritos na bibliografia consultada. 50 REFERÊNCIAS (Normas Vancouver) 51 8 REFERÊNCIAS Landsteiner K. Ueber Agglutinationserscheinungen normalen menschlichen Blutes. Wien Klin Wochenschr. 1901; 14:1132-34. Hyland C, Gassner C. How a new blood group is aknowledged. Transfus Today. 2021; 128:4-5. Storry JR, Castilho L, Daniels G, Flegel WA, Garratty G, de Haas M, Hyland C, Lomas-Francis C, Moulds JM, Nogues N, Olsson ML, Poole J, Reid ME, Rouger P, Van Der Schoot E, Scott M, Tani Y, Yu LC, Wendel S, Westhoff C, Yahalom V, Zelinski T. 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Faustino1, Lucilene S.R. Resende1, Patrícia C. Garcia2, Carolina B. Bub3, Carlos R. Teixeira4,5, Sheila C. Rahal4,5 1Services of Hematology, Internal Medicine Department, Botucatu Medical School, FMB- UNESP; 2Immunohematology Laboratory of the Blood Bank, Botucatu Medical School, FMB- UNESP, Brazil; 3Department of Hemotherapy and Cellular Therapy, Albert Einstein Israeli Hospital, São Paulo, Brazil; 4Center for the Study of Medicine and Wildlife Research and 5School of Veterinary Medicine and Zootechnics, FMVZ-UNESP, Botucatu, Brazil. All authors have contributed equally Correspondence: LSR Resende Hematology Service – Internal Medicine Department Botucatu Medical School São Paulo State University - UNESP 18618-687 Botucatu - SP Brazil Phone: +55 (14) 3880-1171 Email: lucilene.resende@unesp.br mailto:lucilene.resende@unesp.br 2 Abstract The DI*A allele and its Dia erythrocyte encoded antigen are considered human mongol markers that show a low prevalence in general population being frequent in certain Amerindians and Asian people. They have been related to the theory of American Continent peopling by Siberians who had crossed the Beringia to Alaska about 23 to 15 kyr ago. It was carried out an study investigating the occurrence of the DI*A/DI*B polymorphism in 2 genera of neotropical monkeys: Sapajus sp. and Alouatta sp. Sixteen animals were studied being 10 Sapajus sp. (Capuchins) and 6 Alouatta sp. (Howler monkeys) of both genders. All of them showed the Dia phenotype (DiaMed - ID Micro Typing System technique - Bio-Rad Laboratories) and genotype homozygosis for the DI*A allele (Polimerase Chain Reaction - Restriction Fragment Length Polymorphism technique, PCR-RFLP). Everything that has been published about the Dia antigen and/or the DI*A allele is concerned to different human ethnicities. As far as we know the occurrence of DI*A allele has never been reported in monkeys. Further researches are necessary to confirm the current study findings including more genera and species as much from neotropical monkeys as from the Old World ones and Apes. Aditionally, that specific monkey’s genetic sequencing should be used as a tool to help on that purpose. Key words: Diego blood group; phenotype; genotype; Sapajus sp.; Capuchin monkey; Alouatta sp.; Howler monkey. 3 Introduction The Diego (DI) system is one of 43 human blood groups which have been registered by the International Society of Blood Transfusion so far (ISBT) (1). That system is part of the erythrocyte Band 3 integral membrane protein being itself composed by 22 antigens. In humans, as much the DI antigens as the whole Band 3 protein are encoded by the same single gene SLC4A1 (Solute Carrier Family 4, Anion Exchanger, member 1), placed at the 17(q21.31) (2). So the band 3 is also called AE1 protein meaning the transmembrane anion exchanger 1 (3), being present only on eythrocyte and renal collecting duct cells membranes (4). Band 3 protein plays roles in the erythrocyte acid-base balance (4), in the elimination of CO2 from lungs (2,3,4) and in acid secretion by kidneys (4). Besides, it binds to the underlying cytoskeleton working on the red blood cell membrane shape and integrity (2,4,5). It’s known that the SLC4A1 gene has 20 exons containing more than 18Kpb (3). The exon 19 holds the DI*B or DI*2 allele that encodes for the highly prevalent Dib antigen which is found in about 99,9% of humans, mainly as the Di(a-b+) homozygous phenotype (6). The Dia antigen, in its turn, is a product of the 2561 (C>T) nucleotide single point mutation in the Dib gene, which origins the allele DI*A or DI*1. The mutated allele encodes for a protein with a proline amino acid at the position 854 instead of a leucin (Pro854Leu). Such a mutated protein is called Dia antigen (3). There are 2 possible phenotypes resulting from the DI*A allele presence: an heterozygous Di(a+b+) or another homozygous Di(a+b-) (3,7,8). DI*A allele is found in only 0,01% of humans in general (9), mostly in Caucasians, Africans/Adrodescendants, Aborigenes and other people from Pacific Islands (4,7,10,11,12). However, it is prevalent in Asians and Amerindians, occurring by up to 15% of the formers (3,6,7,13)) and by up to 75.7% of certain Brazilian indigenous people (2,9,14,15,16,17,18). The phenotype Di(a-b-) [null Dia/Dib] has never been described in health people so far (14). The Dia antigen has immunohematologic and, consequenttly, clinic relevance. Antibodies anti-Dia may lead to an hemolytic transfusion reaction (HTR) or to an hemolytic disease of the newborn (HDN) as consequence of alloimmunization after blood transfusions or pregnancies in people of Di(a-b+) phenotype (3). Moreover, an ethnic- anthropological relevance has also been referred to the Dia antigen since the 1950’s: it has been considered a mongol marker (3,4,13,14,17) that reinforces the theory of American Continent peopling by mongols (Asians), who would crossed the Strait of Bering coming from Siberia to Alaska about 23.000 to 15.000 years ago (14,19). Everything that has been published about the Dia antigen and/or the DI*A allele is concerned to different human ethnicities. As far as we know its occurrence has never been reported in both, domestic or wild animals. Although the non-human primates have had a great historical relevance in the discovery of several blood groups they share with humans, we failed in finding studies on DI blood system in those animals, except for a single previous research carried out by our own research group few years ago (20). Considering all 9 South American Capuchin monkeys enrolled in that study revealed the Dia phenotype (20), a so-called mongol anthropological marker on their erythrocyte membranes, the goal of the current study was to confirm that previous finding performing again the erythrocyte Dia antigen phenotyping together with a DI*A/DI*B polymorphism genotyping, this once, in 2 groups of New World monkeys legally living under human care: Sapajus sp. and Alouatta sp. 4 Materials and Methods This study adhered to the American Society of Primatologists Principles for the Ethical Treatment of Primates. Institutional and National protocols on animal care used in this study was approved by the Ethics Committee for Animal Research of the School of Veterinary Medicine and Zoothecnics of São Paulo State University (UNESP), and by the System of Authorization and Information on Biodiversity (SISBIO) of the Brazilian Environment and Renewable Natural Resources Institute (IBAMA) - authorization for activities with scientific purposes. It was also reported to the National System of Genetic Resources Management – Ministry of Environment – Brazil. After approval,10 Capuchin monkeys including 6 Sapajus nigritus and 4 Sapajus apella, and 6 Howler monkeys including 4 Alouatta fusca and 2 Alouatta caraya of both genders were studied. The animals were legally kept under human care at the Center for the Study of Wildlife Medicine and Research (CEMPAS), School of Veterinary Medicine and Zootechnics (FMVZ) [latitude: -22.8841808; longitude: -48.4441654], São Paulo State University (UNESP), Botucatu, SP, Brazil. Only three Capuchin monkeys were S. nigritus infants, respectively of 3, 4 and 4-month-old, all the others were adults. Only clinical and laboratory healthy monkeys were selected by the Veterinarians of CEMPAS to be included in the research. After capture in their cages and sedation, 4 mL (2mL from Capuchin infants) of whole blood samples were collected from the brachial vein being equally divided in 2 tubes with K2 EDTA anticoagulant. Tubes comprising the half samples from each monkey were taken to the Hospital Blood Bank Immunohematology Laboratory at Botucatu Medical School (FMB) on the same university campus for Dia antigen phenotyping. The used kits were composed of gel- test microtube cards containing the anti-Dia complementary antibody of human polyclonal origin for the studied Dia antigen (DiaMed - ID Micro Typing System method - Bio-Rad Laboratories). The kits were manufactured by DiaMed Latino América SA, Lagoa Santa, MG, Brazil, a Brazilian subsidiary of Bio-Rad Laboratories®, Inc., Hercules, CA, USA, and provided free of charge by pH 7 Comércio e Representações de Produtos para Diagnósticos Ltda., a representative company of Bio-Rad Laboratories in Brazil. Negative tests in gel-centrifugation standard methods showing erythrocytes agglutination only at the bottom of the microtube gel were classified as having agglutination 0 (21). On the other hand, positive tests revealing variable degrees of erythrocytes agglutination going from the bottom to surface of microtube gel were classified as having agglutination 1 to 4 (21). The additional samples tubes containing the other half of whole blood from each monkey were taken under appropriate conditions of transportation to the Immunohematology Laboratory of the Hemotherapy and Cellular Therapy Department of Albert Einstein Israeli Hospital, São Paulo City, SP, Brazil, for the DI*A/DI*B polymorphism genotyping. DNA extraction was performed from the whole blood leucocytes by DNA QIAamp Mini Spin Column Kit (Qiagen®, Chatsworth, CA, USA) according to manufacturer’s specifications. The technique of Restriction Fragment Length Polymorphism (RFLP) was applied for analysing the SLC4A1 gene point mutation 2561C>T that characterizes the DI*A allele of humans. The procedures were performed in 2 steps: a- Polimerase Chain Reaction (PCR): the used primers comprising 149pb were customised (Thermo Fisher Scientific, BR - Invitrogen Life Technologies®, Grand Island, NY, US) for the enrolled monkeys genera, being the amplification performed according to the Albert Einstein Israeli Hospital standard protocol, as follows: 30μL of PCR solution including PCR buffer 1x (Tris-HCl20mM pH 8.4 plus KCl 50mM), 1.25U of Platinum Taq 5 DNA Polimerase (Invitrogen Life Technologies®), 0.35mM of triphosphate deoxynucleotide (dNTP), 5.8mM of MgCl2, 0.25μM of each primer, and 100ng of DNA; the amplification consisted of an initial cycle of denaturation for 15 minutes at 95◦C, and of 35 cycles of 20 seconds at 94◦C (denaturation), 20 seconds at 56◦C (annealing), and 20 seconds at 72◦C (extension), followed by a final cycle of extension for 5 minutes at 72◦C; the amplification was confirmed by viewing bands of 149pb on a 4% agarose gel eletrophoresis; b- RFLP: 10μL of the PCR product were digested for 1 hour at 37°C by 10μL of the restriction enzyme Mspl/buffer mixture (Invitrogen Life Technologies®), following manufacturer’s instructions; the digestion product was re-submitted to a 4% agarose gel eletrophoresis, being that the genotyping were interpreted according to the obtained pattern of bands, as follows: presence of 2 bands of 70 and 79pb corresponded to the genotype CC (DI*B/DI*B); presence of 3 bands of 149, 70 and 79pb corresponded to the genotype CT (DI*A/DI*B); presence of 1 band of 149pb corresponded to the genotype TT (DI*A/DI*A). Results All sixteen monkeys were positive for the Dia phenotype being that the agglutination intensity was 3 for each one, according to Vizzon & Silva (2015) pattern (Figures 1A and 1B). All animals were also positive for only the DI*A alelle meaning their genotype were the homozygous DI*A/DI*A (Figures 2A and 2B). The results are summarized in the Tables 1 and 2. 6 Discussion This study revealed the Dia phenotype and the homozygous genotype DI*A/DI*A in all 16 studied neotropical monkeys of both genera. In opposition to humans in general, who mostly show the phenotype Di(a-b+) and the underlying DI*B/DI*B genotype, 100% of the studied monkeys revealed homozygous for the DI*A allele, meaning they probably present the phenotype Di(a+b-). The occurrence of the DI*A allele in the studied monkeys genera points to a similarity concerned the Diego blood group system between non-human neotropical primates and humans of mongol origin, as those from continental East and Southeast Asia (3,6,8,13), and Amerindians, mainly indigenous from South American regions (4,11,13,14,15,17). Since its discovery in the 1950’s, the Dia antigen has been known as a mongol marker of anthropological relevance, once its complementary antibody anti-Dia was firstly found in Amerindians and, then, in Asians and their descendants over the world. In contrast, the Dia antigen is almost or totally absent in Caucasians, Africans, Aborigenes, and in people from South Pacific Islands (4,7,10,11,12). These characteristics have been associating the DI*A allele and consequently the Dia antigen to the theory of American Continent peopling by Mongols who would crossed the Strait of Bering from Siberia to Alaska about 23.000 to 15.000 years ago (14,19). It has been accepted that those Mongols who were carrying the DI*A allele as the mutated counterpart of the alleged DI*B wild- type allele, arrived to North America consisting in the Amerindians ancestors (14,19). Later, those North Amerindians have crossed the Isthmus of Panama reaching the South America (14,19). During their lenghty journey down South America, as much geographical and climate factors, as genetic and cultural indigenous people characteristics, led different groups of them to settle in s