II Congresso Nacional de Formação de Professores XII Congresso Estadual Paulista sobre Formação de Educadores DOS QUATRO AOS CINCO MESES. DE GESELL A VIGOTSKI: AS LIMITAÇÕES DA TEORIA MATURACIONISTA. Mara Alice Ribeiro, Irineu Aliprando Viotto Filho Eixo 2 - Projetos e práticas de formação continuada - Relato de Pesquisa - Apresentação Oral DOS QUATRO AOS CINCO MESES. DE GESELL A VIGOTSKI: AS LIMITAÇÕES DA TEORIA MATURACIONISTA. O artigo apresenta os resultados de uma Pesquisa realizada com oito bebês de idade de quatro a cinco meses, matriculados em berçários públicos de um município paulista. Utilizou-se para a coleta de dados, um questionário estruturado fechado, que é um instrumento avaliativo do desenvolvimento global daqueles bebês e crianças pequenas, do Programa de Estimulação Precoce, baseado na teoria maturacionista. Nossa pesquisa objetivou levantar quais comportamentos são ou não realizados por aqueles bebês, exprimindo se a presença ou ausência são consequências da maturação biológica ou da mediação humana e para a análise destes dados, nos utilizamos dos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural. Decorrentes daquela teoria esperava-se que tais comportamentos estivessem espontaneamente presentes por consequência natural da maturação fisiológica, o que não se verificou; se não estão presentes há que se pensar que não são naturais, pelo contrário, precisam ser ensinados para serem aprendidos, apropriados. Os resultados nos mostram, por exemplo, que o índice de ausência dos comportamentos “rir e balbuciar” é tão alto que não nos permitem duvidar que esta atividade mental humana é um produto da história social, em outras palavras, as crianças não nascem sabendo rir ou balbuciar, pelo contrário, precisam de estimulação e mediação humana para que estes comportamentos sejam por elas expressos. Daí a importância de, conforme nos ensina Vigotski, aproveitar o momento em que estas e outras funções psíquicas superiores ainda não estão plenamente desenvolvidas para influenciar e potencializar seu desenvolvimento. Palavras-chave: DESENVOLVIMENTO INFANTIL. TEORIA HISTÓRICO- CULTURAL. TERAPIA OCUPACIONAL. 5405 1 DOS QUATRO AOS CINCO MESES. DE GESELL A VIGOTSKI: AS LIMITAÇÕES DA TEORIA MATURACIONISTA. Mara Alice Ribeiro. Prefeitura de Araçatuba; Irineu A. Tuim Viotto Filho. UNESP. INTRODUÇÃO Trata o presente artigo de um Relato de Pesquisa realizada com oito bebês1 Frequentam esses berçários, bebês cuja condição concreta de vida é precária e, diante dessa realidade, concordarmos com Kulmann Jr. (2004,apud RUIZ, 2009) quando afirma que a creche e, por extensão, o berçário, foi “[...] configurado como uma proposta educacional voltada para atender as necessidades das famílias das classes populares, especificamente das suas crianças [...]”. de quatro a cinco meses de idade, matriculados em berçários públicos de um município do oeste paulista. Foi objeto de estudo da pesquisa os resultados de um instrumento avaliativo, baseado na teoria maturacionista de Arnold Gesell, denominado de Tabela para Observação do Desenvolvimento Infantil cujo objetivo limitava-se a levantar quais comportamentos são ou não realizados por bebês da faixa etária anunciada. Nosso objetivo principal foi desvelar o princípio maturacionista da Teoria de Gesell e discutir a natureza do citado instrumento de avaliação e, simultaneamente, avançar ao maturacionismo presente nas creches e berçários e, por incorporação, propor uma leitura histórico-cultural para a compreensão do processo de desenvolvimento dos bebês. É importante esclarecer que nestes berçários é oferecido o Programa de Estimulação Precoce, cujo objetivo é a promoção de atividades e intervenções que previnam ou diminuam os efeitos desfavoráveis do processo evolutivo por isso, todos os bebês, após avaliados, foram classificados segundo os parâmetro presentes na Tabela para Observação do Desenvolvimento Infantil, instrumento utilizado pelos terapeutas ocupacionais para identificar possíveis atrasos no Desenvolvimento Neuro Psico Motor desses sujeitos. Esta “Tabela” ao considerar o desenvolvimento neuro psico motor de determinada faixa etária, utiliza escalas de desenvolvimento maturacional específicas das áreas físico-motora, de conduta adaptativa, linguagem e 5406 2 conduta pessoal-social. Em nossa concepção, tais escalas esboçam um parâmetro, um padrão de normalidade a ser considerado na avaliação, porém não devem ser utilizadas para vaticinar “atrasos” no desenvolvimento infantil pois conferimos destaque especial aos determinantes sociais presentes nos processos de aprendizagem e desenvolvimento dos seres humanos, embora saibamos que características biológicas não podem ser desconsideradas. A reflexão sobre processos de desenvolvimento humano requer contínuo esforço para superar concepções organicistas, pois sabemos que o ser humano não se limita a ser um organismo mas sim, um complexo biológico, histórico, social e cultural e desta forma deve ser considerado desde seu nascimento. Dos autores que temos estudado, enfatizaremos Vigotski (1984, 1995, 2010, 2012), Leontiev (1978, 1987, 2012), Luria (2010, 2012) principalmente, pois os mesmos têm oferecido possibilidades teórico-metodológicas para discutirmos o problema levantado nessa pesquisa, qual seja, que os padrões de comportamentos propostos na Tabela para Observação do Desenvolvimento Infantil, baseada em princípios maturacionistas, não condizem com os comportamentos observados nos sujeitos com os quais temos contato nos berçários, considerando nosso trabalho na área da terapia ocupacional. Considerando os pressupostos da Teoria Histórico-Cultural, podemos afirmar que os comportamentos dos bebês e crianças pequenas observadas não são inatos, contrariando a lógica maturacionista, sobretudo porque a criança se desenvolve na relação com um adulto, seja sua mãe, a cuidadora, a professora ou a terapeuta ocupacional. Isso implica afirmar que a criança precisa de um ser humano mais desenvolvido que ela para sobreviver e se desenvolver e que seus recursos biológicos não garantem sua sobrevivência. Para a realização desse trabalho de pesquisa, definimos como objetivo geral discutir, com base nos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural, os processos de aprendizagem e desenvolvimento dos bebês que frequentam os berçários públicos municipais de uma cidade do oeste paulista, considerando os dados levantados em 2012, por professores e terapeuta ocupacional, do Programa de Estimulação Precoce. Definimos como objetivos específicos da pesquisa a verificação dos comportamentos presentes e de comportamentos ausentes nos sujeitos pesquisados. Discutir se a preesença ou ausência de determinados comportamentos decorrem da maturação biológica ou da mediação humana, 5407 3 procurando discutir a relação entre desenvolvimento biológico dos bebês e condições de ensino-aprendizagem social dos mesmos no berçário. Os procedimentos metodológicos da pesquisa possibilitaram uma análise do instrumento de triagem utilizado nos berçários intitulado “Tabela para Observação do Desenvolvimento Infantil”, ao qual nos referiremos como “Tabela”, cujo objetivo é identificar aspectos do desenvolvimento neuropsicomotor dos bebês e das crianças pequenas. Foram objeto de análise os dados dos sujeitos matriculados em berçários durante o ano letivo de 2012 e, diante desses dados, realizamos discussão de natureza quali-quantitativa. Na primeira etapa de nossa pesquisa, levantamos os resultados de 8 (oito) “Tabelas” e em seguida, estes dados foram tabulados e organizados com a finalidade de termos uma amostra quantitativa da totalidade dos aspectos avaliados. Posteriormente, esses dados foram analisados à luz da Teoria Histórico-Cultural com a finalidade de realizar crítica às concepções maturacionistas de desenvolvimento infantil e defender uma concepção histórico-cultural nos berçários e creches, enfatizando o papel do terapeuta ocupacional como educador nesse processo. Diante dos dados coletados e procurando realizar uma análise histórico- cultural da questão, considerando que a Teoria Histórico-Cultural de desenvolvimento humano nos possibilita refletir criticamente sobre os processos de desenvolvimento infantil, com objetivo de superarmos a visão maturacionista presente nos ambientes de creches e berçários, como temos constatado, sobretudo porque sabemos que para assegurar os interesses da classe dominante, o Estado, um de seus representantes, tenta amenizar paliativamente as demandas sociais, situação que encontramos no interior das creches e berçários. Podemos pensar que as pressões da classe dominada forjam a classe dominante a propor algumas políticas públicas, e o jogo de força dos “opostos” presente na relação entre essas classes, ao mesmo tempo em que mantém, também modifica a estrutura da sociedade capitalista. Um exemplo disso seriam vagas disponibilizadas para a educação infantil e principalmente, para a creche que, enquanto direito constitucional da criança, não lhe é garantido, pois não se disponibilizam as vagas necessárias para esses sujeitos. A estratégia ideológica do Estado, portanto, é “distribuir” vagas apenas para algumas mães que trabalham daí, o direito da criança de frequentar a instituição fica subordinado à sorte, aos “apadrinhamentos”, à 5408 4 vontade (ou falta de) do gestor, às condições físico-estruturais da unidade escolar e ao (des)compromisso político do administrador municipal, que sabemos, por encontrar-se no poder, atua na direção da manutenção da estrutura social. Seria a ampliação do tempo da licença maternidade uma forma ideológica de aliviar as pressões em virtude da falta de vagas nas creches e berçários? Precisamos pensar críticamente sobre essa questão pois, como afirmamos, o Estado encontra estratégias ideológicas para manter a situação social sob seu controle e faz isso através da ideologia que, segundo Marx & Engels (2006) muito mais encobre a realidade no lugar de desvelá-la, no sentido de iludir as pessoas e camuflar as contradições sociais, comprometendo, inclusive, o processo de humanização das pessoas, as quais desenvolvem uma consciência ilusória, abstrata e alienada da realidade. Saviani destaca que o objetivo da educação também é a humanização e que o “trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada individuo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens” (SAVIANI, 2008, p.13) e por isso defendemos que o trabalho desenvolvido pelos Terapeutas Ocupacionais seja um trabalho educativo, pois esses profissionais podem criar em seus atendimentos e nas relações com estes bebês possibilidades para que se apropriem dos objetos culturais na construção de sua natureza humana histórico-social. Sabemos, a partir das reflexões de Leontiev, citado por Duarte, que a “(...) a apropriação da cultura pela criança é mediatizada pelos adultos que já se apropriaram da mesma cultura, isto é, o processo de apropriação é um processo mediatizado, um processo que exige a interação entre adultos e crianças” (DUARTE, 2000, p.83), consequentemente, esta interação é essencial e determinante na vida e desenvolvimento das crianças. Aprendemos com Vigotski (2012, p.41) que “Aprendizagem e desenvolvimento não entram em contacto pela primeira vez na idade escolar, portanto, mas estão ligados entre si desde os primeiros dias de vida da criança [...]”, ou seja, a apropriação cultural se inicia na mais tenra idade e por isso, as crianças pequenas, mesmo antes de frequentarem a escola, já adquiriram uma determinada gama de hábitos e de experiências sociais que possibilitam variadas aptidões e conhecimentos e ainda que “[...] a aprendizagem da criança começa muito antes da aprendizagem escolar. A aprendizagem escolar nunca parte do zero. 5409 5 Podemos afirmar que toda a aprendizagem da criança na escola tem uma pré-história. [...] não podemos negar que a aprendizagem escolar nunca começa no vácuo, mas é precedida sempre de uma etapa perfeitamente definida de desenvolvimento, alcançado pela criança antes de entrar para a escola”. (LEONTIEV, 2012a, p.32-33, grifos do autor). Luria (2012b) ratifica o pensamento acima e traz outros esclarecimentos: Quando uma criança entra na escola, já está equipada, já possui suas próprias habilidades culturais. Mas este equipamento é primitivo e arcaico; ele não foi forjado pela influência sistemática do ambiente pedagógico, mas pelas próprias tentativas primitivas feitas pela criança para lidar, por si mesma, com tarefas culturais. (VIGOTSKII, 2012, p.101, grifos nosso) Os esclarecimentos feitos acima, a nosso ver, são o ponto chave da luta pela garantia de acesso à escola de bebês e crianças pequenas à classe de berçário e corrobora essa afirmação Vygotsky (2012, p.34) quando enfatiza que “Pela sua importância, este processo de aprendizagem, que se produz antes que a criança entre na escola, difere de modo essencial do domínio de noções que se adquirem durante o ensino escolar”. (grifos nosso). Reconhecendo que a educação tem um valor decisivo na vida das pessoas e, na educação infantil “primeira etapa da educação básica”, a porta de entrada para a escolarização da criança pequena, defendemos a necessidade desses sujeitos, em idade escolar de berçário, sobretudo crianças oriundas das camadas populares, receberem um ensino e atendimento público e gratuito, coerente com as características desta etapa de desenvolvimento. Para Vigotski (1995), ao contrário de Gesell, o desenvolvimento nem é natural, já que se encontra intimamente ligado às condições objetivas da organização social e nem gradual, “[...] o desenvolvimento não se produz pela via de mudanças graduais, lentas, por uma acumulação de pequenas peculiaridades que produzem em seu conjunto e ao final alguma mudança importante [...]” (VIGOTSKI, 1995, p.156). Segundo compreensão de Elkonin (1987), o desenvolvimento da criança é a transição contínua de uma escala evolutiva a outra, daí a alteração na estrutura de sua personalidade. Logo, estudar o desenvolvimento humano infantil denota “[...] estudar a passagem da criança de um período evolutivo a outro e a mudança de sua personalidade dentro de cada período evolutivo que tem lugar em condições histórico-sociais concretas”. (ELKONIN, 1987, p. 106). 5410 6 Considerando as afirmações de Leontiev (1987), a criança no curso de seu desenvolvimento penetra ativamente no mundo das relações humanas que a rodeia, assimilando as funções sociais das pessoas, as normas e regras de comportamento socialmente elaboradas. Consequentemente, tentando a satisfação de suas necessidades, os seres humanos se relacionam com a realidade objetiva, por meio da atividade social. No sentido de melhor captar e dominar esta realidade, os processos mentais se tornam mais complexos, o que Vigotski (1984, p.61) denomina de funções psicológicas superiores. Em decorrência assegura, além disso, que no nascimento nosso organismo nos possibilita apenas as funções psicológicas primárias, entretanto, em um processo extremamente rápido, o indivíduo vai apropriando-se de novas atividades e formas de relacionar-se com o mundo, desenvolvendo modelos culturais de comportamento, ou seja, objetivando-as. Compreendemos que as características biológicas asseguradas pela evolução da espécie humana e as características produzidas pela história particular de cada indivíduo, decorrentes das apropriações do patrimônio material e intelectual historicamente construído, tornam-se essenciais para o processo de desenvolvimento de cada sujeito particular. Os adultos não são iguais, nem as crianças e esta diferença entre os seres humanos se funda nas concretas condições de vida dos sujeitos e na diversidade histórico- cultural vivida por cada ser humano. Considerando tais reflexões, realizamos severa crítica às escalas maturacionais de desenvolvimento, muito presentes no interior das creches e berçários, pois não podemos esperar que as crianças de uma mesma idade apresentem, naturalmente, os mesmos comportamentos, visto que as condições objetivas de vida de cada um dos indivíduos são diferentes. Portanto, também serão diferentes suas apropriações e, consequentemente, a estrutura e dinâmica de suas funções psicológicas superiores, dentre outras características eminentemente humanas desses sujeitos. Referindo-se às influências das condições objetivas sobre o desenvolvimento Leontiev (2012b) afirma que “As condições históricas concretas exercem influência tanto sobre o conteúdo concreto de um estágio individual do desenvolvimento, como sobre o curso total do processo de desenvolvimento psíquico como um todo” e LURIA (2012a, p. 27) ao discutir os processos superiores do psiquismo humano afirma que “[...] à medida que os processos superiores tomam forma, a estrutura total do comportamento se modifica”. Essas afirmações nos ajudam a compreender o quanto o processo de 5411 7 desenvolvimento de cada ser humano, desde o seu nascimento, está imerso numa situação objetiva de vida e, portanto, histórico-cultural e que todo o seu desenvolvimento, em qualquer estágio de sua vida, depende das apropriações realizadas no seu ambiente social. Paralelamente Leontiev (2012b) consigna a existência de uma periodicidade no desenvolvimento da psique infantil, expressa no conteúdo dos estágios e que este conteúdo depende primariamente das condições reais de vida nas quais ocorre o desenvolvimento. Neste sentido, Vigotskii (2012, p.65) expressa que “As condições históricas concretas exercem influência tanto sobre o conteúdo concreto de um estágio individual do desenvolvimento, como sobre o curso total do processo de desenvolvimento psíquico como um todo”. Luria (2012a) assevera que: Desde o nascimento, as crianças estão em constante interação com os adultos, que ativamente procuram incorporá-la à sua cultura e à reserva de significados e de modos de fazer as coisas que se acumulam historicamente. No começo, as respostas que as crianças dão ao mundo são dominadas pelos processos naturais, especialmente aqueles proporcionados por sua herança biológica. Mas através da constante mediação dos adultos, processos psicológicos instrumentais mais complexos começam a tomar forma. Inicialmente, esses processos só podem funcionar durante a interação das crianças com os adultos. (VIGOTSKII, 2012, p. 27) Daí considerar-se a importância da mediação dos adultos desde cedo, no caso, dos profissionais da educação, inclusive dos terapeutas ocupacionais, ao desenvolverem seus trabalhos nas creches e berçários, tendo em vista a conexão entre os estímulos oferecidos e mediados para a formação dos processos psicológicos superiores das crianças, ou seja, para a efetivação no ambiente escolar do berçário o processo da natureza social à natureza psicológica garantindo aos bebês que frequentam o berçário. Os resultados quantitativos dos dados documentais dos bebês, após sua organização e tabulação, exprimem não só os seus desenvolvimentos, mas apresentam algumas respostas tão uniformes que não nos permitem duvidar que a atividade mental humana é produto da história social. Em relação aos sujeitos de 4 a 5 meses, a avaliação presente na “Tabela” propõe a observação, nesta ordem, dos comportamentos abaixo indicados: 1. Sustenta a cabeça quando colocada de bruços. 2. Fica sentada com apoio. 5412 8 3. Ri alto. 4. Quando deitada, movimenta bastante braços e pernas. 5. Vira de um lado para o outro. 6. Segura objetos e leva-os à boca. 7. Balbucia “da”, “ma”... 8. Presta atenção quando se conversa com ela. De acordo com a “Tabela”, podemos inferir que tais comportamentos contemplam as escalas de desenvolvimento maturacional visto que os mesmos são das áreas físico-motora (comportamentos 1, 2, 4, 5), de conduta pessoal-social (comportamentos 3, 8), de linguagem (comportamento 7) e de conduta adaptativa (comportamento 6). Dos oito comportamentos observáveis quatro são da área físico-motora; percebemos um grande enfoque nesta área e isto provavelmente aconteça porque, segundo a concepção maturacionista, o desenvolvimento é determinado pela maturação, portanto sua base é o biológico e o físico. No gráfico abaixo apresentamos percentualmente os comportamentos não apresentados por aqueles bebês: 2 3 4 5 7 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% po rc en ta ge m comportamentos Comportamentos pesquisados e porcentagem de não apresentação: 4 a 5 meses A teoria maturacionista define que “normalmente”, nesta etapa de 4 a 5 meses, entre outros comportamentos, os bebês “riem alto e balbuciam”. Identificamos percentuais relativamente altos entre os bebês observados que não apresentam tais comportamentos: 89% dos bebês não têm o comportamento “rir alto” e aproximadamente 80% “não balbucia”. O alto índice de ausência destes comportamentos nos mostra que eles não são 5413 9 inatos e nem geneticamente determinados, pelo contrário, prescindem de estimulação e mediação humana para se tornarem respostas positivas. Por isso devemos, segundo uma compreensão histórico-cultural de desenvolvimento, nos aproveitar deste momento em que estas funções psíquicas ainda não estão plenamente desenvolvidas, para influenciar e potencializar o seu desenvolvimento. Vigotski (2010, p.130) apresenta-nos resultados de investigações que “[...] mostraram igualmente que as risadas, o balbucio, os gestos e os movimentos são meios de contato social a partir dos primeiros meses de vida da criança”, daí questionamos o porquê da ausência massiva destes comportamentos: será que os adultos que convivem com estes bebês encontram-se alegres, sorriem e falam com eles? Se a resposta for negativa, é preocupante pensarmos no que nos assegura Luria (2012a) de que a nossa natureza social, torna-se nossa natureza psicológica: [...]. Mas à medida que as crianças crescem, os processos que eram inicialmente partilhados com os adultos acabam por ser executados dentro das próprias crianças. Isto é, as respostas mediadoras ao mundo transformam-se em um processo interpsíquico. É através desta interiorização dos meios de operação das informações, meios estes historicamente determinados e culturalmente organizados, que a natureza social das pessoas tornou-se igualmente sua natureza psicológica. (VIGOTSKII, 2012, p. 27) Luria (2010, p. 23) esclarece que “A partir do nascimento, as crianças vivem num mundo de coisas, produtos históricos do trabalho social [...] e desenvolvem relações com objetos através da ajuda de adultos.” Isto se mostrou presente também em nossos estudos quando constatamos que a totalidade dos bebês segura objetos e os leva à boca (comportamento 6) ou seja, expressam um conhecimento apropriado. Concordamos com Mello (2009) que ao discutir a importância da apropriação da linguagem escrita pela criança e fazemos uma analogia com a importância de qualquer linguagem a ser apropriada pela criança, desde a linguagem oral até a linguagem escrita, gestual, corporal, dentre outras, pois, segundo a autora: [...] o conhecimento será apropriado apenas se a criança puder interpretá-lo e expressá-lo na forma de uma linguagem que torne objetiva esta sua compreensão [...]. É um processo de diálogo que se estabelece entre a criança e a cultura, processo este que, na escola, é mediado pela professora, [e demais funcionários], pelas 5414 10 outras crianças e pelos objetos da cultura presentes no espaço da escola. (MELLO, 2009, p. 29-30) Outros comportamentos também estão presentes em todos os bebês sujeitos da pesquisa, quer sejam os comportamentos 1 (Sustenta a cabeça quando colocada de bruços) e 8 (Presta atenção quando se conversa com ela). Embora pareçam distintos entre si, sabemos que os bebês de bruços somente conseguirão observar as coisas e prestar atenção às pessoas ao seu redor se conseguirem sustentar a cabeça e por outro lado a atenção seletiva (se de bruços) acaba influenciando positivamente outro comportamento, ou seja, a sustentação da cabeça. Os comportamentos 4 (Quando deitada, movimenta bastante braços e pernas) e 5 (Vira de um lado para o outro) tiveram percentuais de ausência próximos, 55% e 42% respectivamente; tidos basicamente como comportamentos motores, retratam que na média, a metade das crianças não se movimenta. Isto também é preocupante, pois sabemos que se inicialmente os comportamentos tem uma base reflexa (e não sendo estes bebês deficientes) e depois volitiva e social, nos interrogamos sobre quais tem sido as dimensões determinadas (espaço físico, como o berço, por exemplo) para estes bebês? E tal inquietação se acentua quando sabemos que a falta desta comunicação tridimensional proporcionada pelos movimentos corporais implica tanto na impossibilidade de esboçar o “grafismo sem letras”, que segundo Faria e Mello (2012) é uma das linguagem expressivas da criança onde ela não usa palavra ou a escrita, portanto sem letras, como de explorar o meio social que lhe permitisse criar necessidades que favorecessem suas apropriações e objetivações. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa e os estudos que temos realizado a partir dos pressupostos da Teoria Histórico-Cultural e da Pedagogia Histórico-Crítica, nos possibilita discordar da teoria maturacionista sobre o desenvolvimento humano e afirmar a importância e necessidade de avançar numa direção histórico-cultural de compreensão do desenvolvimento dos bebês nos berçários e creches. Remetendo-nos às reflexões de Luria (2010) concluímos que, embora o comportamento humano se construa sobre uma base reflexa, a ela não se restringe, pois o homem consegue construir conexões indiretas em meio à estimulação que recebe e às respostas que expressa, através de muitas ligações de mediação. Isto possibilita ao homem, através de seu 5415 11 comportamento, modificar o ambiente e essa modificação, ao mesmo tempo, estimula e favorece seu comportamento futuro, dialeticamente e é justamente nessa direção que temos compreendido os bebês com os quais convivemos e trabalhamos. REFERÊNCIAS DUARTE, N. A anatomia do homem é a chave da anatomia do macaco. In: DUARTE, N. Educação & Sociedade, nº. 71, julho/2000. ELKONIN, D. B. Sobre el problema de la periodización del desarrollo psíquico en la infancia. In: DAVIDOV, V; SHUARE, M. (Org.). La Psicologia Evolutiva y Pedagógica en la URSS: antologia. Moscou: Editorial Progresso, 1987, p. 104-124. FARIA, A. L. G. de; MELLO, S. A. (Orgs.). 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