Cristiane Maria Montanari Figueira Avaliação da relação entre disfunções temporomandibulares e prevalência de depressão psicológica Cristiane Maria Montanari Figueira Avaliação da relação entre disfunções temporomandibulares e prevalência de depressão psicológica Dissertação apresentada à Faculdade de Odontologia de Araraquara, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do título de Mestre em Reabilitação Oral. Orientadora: Profa Dra Cinara Maria Camparis Araraquara 2001 Figueira, Cristiane Maria Montanari Avaliação da relação entre disfunções temporomandibulares e prevalência de depressão psicológica. / Cristiane Maria Montanari Figueira. Araraquara: [s.n.], 2001. 131 f. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Odontologia – Universidade Estadual Paulista. . Orientador: Profa. Dra. Cinara Maria Camparis. 1. Síndrome de articulação temporomandibular 2. Depressão 3. Psicologia I. Título. Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Maria José Peron CRB 8/2743 Serviço de Biblioteca e Documentação da Faculdade de Odontologia de Araraquara / UNESP Cristiane Maria Montanari Figueira Avaliação da relação entre disfunções temporomandibulares e prevalência de depressão psicológica Comissão examinadora Presidente: Prof.a Dr.a Cinara Maria Camparis 1o Examinador: Prof. Dr. Paulo César Rodrigues Conti 2o Examinador: Prof. Dr. João Neudenir Arioli Filho DADOS CURRICULARES CRISTIANE MARIA MONTANARI FIGUEIRA NASCIMENTO 30 de junho de 1972 Santa Cruz do Rio Pardo/SP FILIAÇÃO Osvaldo Antonio Figueira Valdiléia Inês Montanari Figueira 1991/1994 Curso de Graduação Faculdade de Odontologia de Bauru – USP 1995 Estágio no Setor de Prótese Hospital de Reabilitação de Bauru – USP 1996/1997 Curso de Especialização em Reabilitação Oral Hospital de Reabilitação de Bauru – USP 1998/2001 Curso de Pós-Graduação em Reabilitação Oral Nível de Mestrado Faculdade de Odontologia de Araraquara – UNESP 2001 Professora das disciplinas de Oclusão e de Escultura Dental Faculdade de Odontologia de Blumenau Fundação Universidade Regional de Blumenau - FURB 2001 Professora das disciplinas de Prótese Total e de Prótese Parcial Removível Faculdade de Odontologia de Maringá Centro de Ensino Superior de Maringá - CESUMAR Dedicatória À Deus “Na infinidade da vida onde estou, tudo é perfeito, pleno e completo. Cada um de nós, eu inclusive, experimenta a riqueza e a plenitude da vida de maneiras para nós significativas. Agora olho para o passado com amor e escolho aprender com as velhas experiências. Não existe nem o certo nem o errado, nem o bem , nem o mal. O passado está terminado. Existe apenas a experiência do momento. Eu me amo por Ele ter me trazido através deste passado até o presente. Compartilho o que e quem sou, pois sei que somos um só em espírito. Tudo está bem em meu mundo.” Zulma Reyo Àquele a quem devo a minha existência, o Amor incondicional, o perdão pelas minhas fraquezas, o consolo e a força para não desistir nas horas difíceis e a esperança eterna por nosso reencontro... Dedico este trabalho e minha vida. AGRADECIMENTOS ESPECIAIS Aos meus pais Osvaldo e Valdiléia Que me deram a vida e o exemplo das grandes virtudes através de sua integridade e honestidade... que me incentivaram, desde os primeiros passos ao amor pelos livros ... que compreenderam e toleraram minha ausência nesses dez anos... e que tantas vezes abriram mãos de seus próprios sonhos para que os meus se realizassem... Minha eterna gratidão e amor ! Aos meus irmãos Fernando e Fábio Pelo amor, carinho, apoio e cumplicidade, que nos tem mantido unidos, mesmo quando estamos distantes ! À minha Didi Karuna Por ter me acolhido por tantas e tantas vidas, por abrir meus olhos e meu coração para a Luz e por me conduzir no caminho do amor, do perdão e da verdade ! Às irmãs de coração Meg, Beta, Carol, Val, Nina e Evê Por dividirem cada alegria e vitória, pela fidelidade, amor e por estarem sempre presentes nos momentos mais difíceis ! À Ricardo Por encher minha vida de cores e alegrias; por incentivar cada momento da conclusão deste trabalho e por partilhar desta fase do meu Caminho ! À minha orientadora e amiga Cinara Por ter aceitado a difícil tarefa de orientar sua “desorientada”... pelo exemplo de força e coragem e pelo incentivo para reagir quando as coisas não saem como prevemos... por estar sempre aberta a ouvir, mesmo quando discordamos ... pelas oportunidades que me proporcionou e pelo apoio constante no ingresso ao magistério... pela elegância e delicadeza ao criticar... pela humanidade em compreender os limites do ser humano... e especialmente pelo carinho e amizade que se fortaleceram a cada dia de nossa convivência ! Meu muito obrigada e minha admiração ! AGRADECIMENTOS Aos amigos, Fabrício, Felipe, Gu, Fabiano, Juliana, Mariana, Fabinho, Dedê, Vanessa, Suse, Ivânia, Emília, Alessandro, Domício e Marcinha obrigada pela generosidade de estarem presentes no meu caminho sempre no momento oportuno, pelas alegrias compartilhadas e pela amizade especial. Aos colegas de curso Adriana Beloti, Hercules, Renato, Guiga, Adriana Fonte, Ivone e Debora, que pela proximidade da convivência deixaram algo mais na minha vida. À Família Ramacciotti, Que me recebeu com carinho e me apoiou durante minha permanência em Araraquara. À Família Resende, Em especial ao Daniel e à Gimol pelos anos de convivência que foram fundamentais no meu crescimento, meu carinho e gratidão ! À equipe do Parque Ecológico Visão Futuro Em especial, à Didi Susan Andrews por acreditar e contribuir para construir a cada dia uma humanidade melhor e pelos ensinamentos que marcaram minha vida para sempre ! Namaskar! Aos pacientes Que vieram procurar ajuda e na verdade me ajudaram; buscavam compreensão para suas dores e muito mais me ensinaram sobre minhas próprias feridas. Que Deus os abençoe ! À Faculdade de Odontologia de Araraquara Representada por seu diretor Prof. Dr. Ricardo Abi Rached, pela oportunidade da realização deste curso que foi decisivo para meu progresso e aperfeiçoamento. Aos Professores João Arioli, Regina, Guedes, Caco, Sergio Russi, Serginho, Carlos Cruz, Gelson, Renatinha, Geraldo, Marcão, Kiko, Eunice, Ana Lúcia, Ana Cláudia e Carlos Vergani pelos ensinamentos que permitiram tanto um crescimento científico, como o meu amadurecimento pessoal. Aos Funcionários do Departamento de Prótese Marta, Lúcia, Malú, Adelaide, Adelaidinha, Inês, Dulce, Cida, Cláudio, Junior, João Vitto, Zé Carlinhos, Ângela, Manuel, Moacir pela convivência agradável. Aos funcionários do Setor de Emergência Olga, Bernadete, Mário, D. Maria, Marisa, Ageu pela acolhida carinhosa durante minha permanência no setor e pelo auxílio fundamental na triagem dos pacientes. Aos doutores Bernard Rangè e Clarice Gorestein pelas preciosas orientações e conhecimentos ofertados que nortearam este trabalho e pela disponibilidade e simpatia em me atender mesmo sem nos conhecermos ! À Sra Maria Lúcia Montoro, Pelo carinho e esmero na revisão gramatical deste trabalho. Aos Estatísticos, Prof. Romeu Magnani e Prof. José Roberto Pereira Lauris pelo apoio no tratamento estatístico dos resultados. Aos funcionários da Biblioteca M. Helena, Zezé, Sílvia, Adriano, Inês e Odete pelo auxílio em todas as dúvidas. Às funcionárias do Setor de Pós graduação Mara e Vera pela boa vontade e competência em ajudar-nos em todos os momentos. Aos funcionários da clínica de pós-graduação Conceição, Pedro, Luis, Pelícola, D. Maria, Belinha e Maria Inês pela paciência e compreensão pelos nossos “pequenos” atrasos. À FAPESP, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo pela concessão da bolsa de Mestrado processo no 98/03867-3. “A vida é essencialmente um processo de adaptação às circunstâncias em que subsistimos. O segredo da saúde está no ajustamento às condições do mundo, que está permanentemente se modificando. O preço da dificuldade de adaptação está na doença. Não resolve simplesmente descansarmos se não cuidamos da forma como vivemos e sentimos os desgastes. A tensão de um dia processa-se por toda noite. Devemos nos lembrar disso não somente ao planejar nosso dia, mas ao planejarmos nossas vidas.” Liliana Seger Jacob SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS Resumo 1. INTRODUÇÃO........................................................................01 2. REVISÃO DA LITERATURA...............................................16 3. PROPOSIÇÃO..........................................................................48 4. MATERIAL E MÉTODO........................................................50 5. RESULTADO..........................................................................60 6. DISCUSSÃO............................................................................69 7. CONCLUSÃO..........................................................................95 Referências Bibliográficas.............................................................98 Anexos.........................................................................................113 Abstract........................................................................................129 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Porcentagens de pacientes com indicativo de ausência ou presença de depressão nos grupos estudados 67 Figura 2 - Porcentagens de pacientes com indicativo de ausência ou presença de depressão quando se agrupam os grupos intermediários 68 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Número de pacientes classificados em cada grupo, de acordo com o gênero e renda 62 Tabela 2 - Estatísticas referentes à idade dos pacientes nos grupos estudados 63 Tabela 3 - Sumário da análise de variância relativa à comparação das médias de idade dos pacientes entre os grupos estudados 63 Tabela 4 - Estatísticas resumo dos escores de depressão em cada grupo estudado 64 Tabela 5 - Sumário da análise de variância relativa à comparação dos escores médios de depressão entre os grupos estudados 65 Tabela 6 - Distribuição das proporções (em porcentagens) de pacientes com indicativo de ausência ou presença de depressão em relação aos totais de pacientes em cada grupo. 66 FIGUEIRA, C.M.M. Avaliação da relação entre disfunções temporomandibulares e prevalência de depressão psicológica. Araraquara, 2001. 131 p. Dissertação (Mestrado em Reabilitação Oral) – Faculdade de Odontologia, Campus de Araraquara, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. RESUMO A participação de fatores psicológicos, como a depressão, na etiologia das disfunções temporomandibulares (DTMs) vem sendo bastante considerada. Vários pesquisadores têm afirmado que pacientes com DTM, especialmente os casos considerados crônicos, relatam muitos dos sintomas de depressão psicológica. Com objetivo de explorar a possível relação entre o agravamento de sintomas de DTM e o aumento da prevalência de depressão psicológica, foram selecionados pacientes com e sem DTM, empregando-se um questionário anamnésico auto-aplicável (Indice Anamnésico de Fonseca), classificando quanto ao grau da disfunção 34 pacientes como "sem DTM" (Grupo I - controle), 49 como "DTM leve" (Grupo II), 69 como "DTM moderada" (Grupo III) e 37 como "DTM severa" (Grupo IV). A depressão foi avaliada por escores obtidos com aplicação do Inventário de Depressão de Beck. O teste do qui- quadrado apontou a existência de associação estatisticamente significante entre DTM e depressão psicológica quando os resultados do grupo “sem DTM” (Grupo I) foram comparados com o grupo com “DTM severa” (Grupo IV). A metodologia utilizada, contudo, não foi capaz de estabelecer relação de causa/efeito entre as variáveis estudadas. Palavras-chave: disfunção temporomandibular, depressão, psicologia. Introdução 2 as condições patológicas que afetam a região orofacial, algumas estão associadas a dores persistentes e potencialmente debilitantes, sendo de maior prevalência as dores orofaciais de origem musculoesquelética, dentre as quais destacam-se as disfunções temporomandibulares como as mais comuns. O conceito mais aceito atualmente na literatura define disfunção temporomandibular (DTM) como “um termo coletivo que D 3 abrange vários problemas clínicos que envolvem a musculatura mastigatória, a articulação temporomandibular (ATM) e estruturas associadas ou ambas”.58 Existem inúmeras sinonímias descritas na literatura, sendo também bastante empregado o termo disfunção craniomandibular (DCM). 58 Embora consideradas por muito tempo como uma síndrome, atualmente as DTMs são reconhecidas como uma coletânea de disfunções do sistema mastigatório, que apresentam sinais e sintomas comuns, sendo os mais freqüentes: dor localizada na musculatura mastigatória, na ATM e/ou área pré-auricular, limitação e/ou assimetria dos movimentos mandibulares e sons articulares (estalos ou crepitações).71,72 Estudos epidemiológicos populacionais transversais indicam uma alta prevalência variando de 40% a 60%.72 Apesar da grande porcentagem da população apresentar algum sinal e/ou sintoma, apenas 3% a 5% necessitam ou procuram por tratamento. 71 Historicamente, as disfunções temporomandibulares encontram seus primeiros relatos no Antigo Egito e nos trabalhos de Hipócrates (séc. V a.C.), que descrevem técnicas de redução de deslocamento mandibular muito similares às atualmente empregadas.58 O início do século XX abriga os registros dos primeiros estudos científicos de diversos autores como Annandale, Lanz, Pringle, Wakeley e Prentiss.19 4 Somente anos mais tarde, a literatura consagraria como referência clássica o trabalho de Costen, um otorrinolaringologista que, em 1934, organizou a primeira descrição das DTMs considerando uma série de sintomas que incluíam: redução na audição, sensação de entupimento dos ouvidos, dor auricular, zumbidos, queimação na garganta e língua, dor de cabeça e trismo, que foram denominados por muito tempo como “Síndrome de Costen”.20 Mais especificamente, Costen forneceu a base para a formulação da primeira teoria que iria explicar a etiologia das DTMs, pela qual o fator etiológico principal eram as alterações oclusais. A “Teoria do Deslocamento Mecânico”, como ficou conhecida, postulava que a perda dos dentes posteriores ou as interferências oclusais levavam ao desvio da relação cêntrica para uma posição não ideal e não estável para os côndilos, gerando alterações articulares que provocavam, em última instância, irritação do nervo corda do tímpano, produzindo os sintomas citados.20 Apesar da hipótese de Costen ter sido refutada pelos trabalhos de diversos anatomistas, a maior parte dos clínicos continuou a aceitar por muitas décadas que a oclusão era a causa principal das DTMs.88 A associação entre oclusão e DTM começou a ser questionada apenas na década de 50. Neste período, a expansão dos estudos da Fisiologia foi o impulso para o surgimento da Teoria Neuromuscular. Defendida por Schwartz, enfatizava a musculatura mastigatória como o fator etiológico principal na gênese da 5 sintomatologia. Esse novo conceito marcou a mudança de uma abordagem estrutural mecanicista para uma visão mais fisiológica e funcional do problema.23,84 A década de 60 foi marcada pela sofisticação das pesquisas no campo da neurofisiologia. Em 1969, Laskin publicou a terceira teoria etiológica, a “Teoria Psicofisiológica”, pela qual o espasmo muscular era considerado o principal fator responsável pelos sintomas, sendo gerado por hábitos orais crônicos realizados como mecanismo de liberação inconsciente de tensões emocionais.53 Houve grande evolução nos conhecimentos a respeito dos mecanismos da dor, aliada aos estudos da neurofisiologia e da neurofarmacologia, no final da década de 80.87 As novas descobertas que formularam os conceitos de convergência neuronal, modulação da dor (Teoria do Portão de Melzack & Wall) e neuroplasticidade demonstraram a influência do sistema nervoso simpático em dores persistentes e proporcionaram a base para a compreensão da complexidade e multidimensionalidade da experiência dolorosa.93 A dor passou a ser aceita como uma experiência sensorial e emocional desagradável, podendo, portanto, estar presente mesmo na ausência de dano tecidual observável.70 As similaridades entre as várias outras condições dolorosas crônicas e as DTMs, aliadas ao fracasso das teorias até então 6 propostas para a explicação de sua etiologia, propiciaram um movimento de abordagem das DTMs sob uma óptica multifatorial. O modelo etiológico multifatorial aceita a participação de vários fatores etiológicos na determinação das DTMs. Propõe que cada paciente seja analisado como um sistema dinâmico e individual, no qual existem fatores atuando constantemente para a adaptação do organismo (ortofunção) e a preservação da homeostasia (equilíbrio/saúde) contra fatores que provocam sua hiperfunção. Quando a capacidade de adaptação é superada, o desequilíbrio permite a instalação da patologia (patofunção). Por esse enfoque, a questão principal não é somente a determinação do fator etiológico, mas também a percepção de quanto cada fator contribuiu na quebra da homeostasia.43, 75 Atualmente, não foi possível ainda a identificação de uma causa comum para as DTMs, bem como a descrição de sua etiopatologia. Inúmeros fatores que podem afetar o equilíbrio dinâmico do sistema mastigatório são aceitos como associados à etiologia, sendo denominados fatores predisponentes quando aumentam o risco, fatores desencadeadores quando se relacionam com a instalação das DTMs, fatores perpetuantes quando impedem o retorno à normalidade, ou fatores agravantes quando aumentam a progressão da doença. Diferentes fatores podem atuar em diferentes circunstâncias desempenhando um ou vários desses papéis, desencadeando quadros diferentes em cada indivíduo. Os mais citados 7 na literatura enquadram-se entre os fatores anatômicos, oclusais, sistêmicos, locais, macrotraumas, microtraumas (gerados por hábitos parafuncionais e posturais), psicológicos e sociais.71 Dentre os fatores psicológicos, que são o objeto de estudo deste trabalho, encontram-se os fatores cognitivos, comportamentais e afetivos ou emocionais. Fatores cognitivos Cognição pode ser definida como um termo genérico que envolve a qualidade de conhecimento, o que inclui a percepção, o reconhecimento, a concepção, o julgamento, a compreensão, o raciocínio e a imaginação.93 Os aspectos cognitivos relacionam-se, portanto, com a atenção/importância dada ao problema, às experiências anteriores, às crenças e a outras dimensões de avaliações. Existem muitas teorias da escola cognitiva que podem ser aplicadas às disfunções dolorosas, tais como conceitos de estressores, avaliadores (percepção de conseqüências) e mecanismos de enfrentamento. Tem sido demonstrado que a crença sobre a origem da dor, seja ela fundamentada ou não, influencia a quantidade de dor e sofrimento afetando a percepção, a tolerância, a resposta emocional e o comportamento de dor.17, 70, 86 Em outras palavras, a posição cognitiva prioriza o pensamento como o centro do processo, acreditando-se que o 8 comportamento reacional e a resposta psicofisiológica são sua conseqüência. Os fatores cognitivos estariam ligados também à capacidade que alguns indivíduos desenvolvem de tolerar, minimizar ou reduzir sua dor.43, 79 Fatores comportamentais A essência da linha comportamental é baseada na teoria do aprendizado, relacionando as atitudes do indivíduo com as expectativas que o ambiente impõe sobre o mesmo. A abordagem comportamental não se concentra na explicação da etiologia, mas na compreensão de como o aprendizado pode perpetuar, exacerbar ou manter os sintomas dolorosos através de reforços ou recompensas, enquanto o comportamento saudável é desestimulado, proibido ou punido.43 O comportamento de dor refere-se às formas pelas quais os diferentes indivíduos expressam sua sensação dolorosa. Essa expressão pode ocorrer por vias verbais ou não verbais, e sobre a forma de manifestação podem atuar fatores culturais, incluindo os familiares, sociais e ambientais, tanto no reforço quanto na repressão do comportamento.93 As expressões do comportamento de dor podem ser usadas para chamar a atenção e o zelo dos familiares e evitar responsabilidades. A obtenção desses benefícios, chamados ganhos 9 secundários, pode reforçar a perpetuação do problema, evidenciando que a compreensão de aspectos comportamentais é importante no controle de pacientes sofrendo de alterações dolorosas, especialmente quando se tornam crônicas e/ou resistentes a qualquer tipo de terapia empregada. Fatores afetivos ou emocionais Há muita dificuldade na avaliação da dimensão afetiva da dor, pois isso inclui a subjetividade da experiência, os processos emocionais e as diferenças individuais na percepção. Os fatores emocionais mais freqüentemente associados a quadros dolorosos são o estresse, a ansiedade, o medo e a depressão, mas também é possível incluir a raiva, a agressão, a culpa e a subserviência. O conceito de estresse foi introduzido por Hans Selye em 1936, expressando o processo de adaptação realizado pelo organismo ao enfrentar situações percebidas como ameaçadoras à sua vida e ao seu equilíbrio interior.25 Os agentes estimulantes ou as situações excitadoras do organismo são chamados estressores, podendo ser de origem psicológica ou fisiológica, intrínseca ou extrínseca. As fontes externas são representadas pelos fatos do cotidiano ocorridos no meio em que o indivíduo vive. As causas internas referem-se aos processos cognitivos, à personalidade e à forma particular de reagir a eventos da vida. Na verdade, a ocorrência do estresse não requer necessariamente a 10 existência de perigo real. Desse modo, até mesmo as situações agradáveis podem ser causas de estresse.25 A relação entre estresse e ansiedade é muito grande. A rigor, o estresse nada mais é que o componente físico da ansiedade. Assim como no estresse, a ansiedade torna-se inadequada quando deixa de desempenhar um papel de aviso sobre perigo iminente ou de estímulo para as atividades do indivíduo, passando a prejudicar acentuadamente seu desempenho.25 A distinção entre ansiedade e medo é dificultada pela estreita relação entre esses estados emocionais. No campo das alterações biológicas, tanto o medo como a ansiedade são condições estressantes. Em geral, considera-se como medo a sensação provocada por um estímulo ou situação bem definida, enquanto a ansiedade teria causas inespecíficas, provavelmente intrapsíquicas, ocorrendo em circunstâncias em que o perigo é potencial.39 A relação entre estresse, ansiedade, tensão e disfunções musculoesqueléticas tem sido bastante observada; porém, o mecanismo que une esses fatores ainda não foi descrito.04 A riqueza da experiência humana está indubitavelmente na mescla de sentimentos e emoções. Sem o jogo livre das emoções, não haveria a excitação das descobertas, a diversão com o humor e o entusiasmo.09 Todo ser humano apresenta flutuações de humor em resposta aos eventos da vida cotidiana. Em algumas pessoas, no entanto, 11 essas respostas assumem um caráter inadequado em termos de severidade ou persistência, caracterizando a ocorrência de um distúrbio de humor. O mais comum desses distúrbios é denominado genericamente de depressão.39 No caso da depressão, essa mudança de estado de ânimo consiste no surgimento de um sentimento generalizado de tristeza, cujo grau pode variar desde um desalento até o mais intenso desespero.25 Embora a capacidade de vivenciar sentimentos positivos esteja impedida, a experiência de emoções desagradáveis é possível em níveis extremos.09 O termo “depressão” foi empregado pela primeira vez por Kraepelim, o pai da Psiquiatria Moderna, em 1896.02 Atualmente, pode ser usado para descrever tanto um estado emocional como um grupo de transtornos específicos.67 A tendência atual na classificação dos distúrbios de humor é o abandono de termos empregados indiscriminadamente no passado e a adoção dos critérios do Manual Estatístico e Diagnóstico (DSM) da Associação Norte Americana de Psiquiatria.28, 39, 46, 67 A depressão é caracterizada por uma gama de sintomas que podem incluir humor deprimido, perda de interesse ou prazer e astenia. A pessoa deprimida também sente-se isolada, rejeitada e não amada. Estes sintomas podem ser acompanhados secundariamente por concentração e atenção reduzidas, autoestima e autoconfiança diminuídas, idéias de culpa e inutilidade, visões desoladas e pessimistas 12 do futuro, idéias ou atos autolesivos ou de suicídio, redução da motivação, tendência à generalização de atitudes negativas, exagero na severidade dos problemas, falta de reatividade emocional, sentimentos de tristeza e desesperança.39, 46, 67 O quadro geralmente é acompanhado de alterações físicas como fadiga, prejuízo do sistema imunológico (predispondo a infecções), distúrbios do sono, retardo ou agitação psicomotora, alterações de apetite, problemas digestivos, alterações marcantes de peso e perda da libido.39, 46, 67 Sintomas psicóticos como idéias delirantes, alucinações auditivas e olfativas, retardo psicomotor grave (estupor psíquico) também podem estar presentes em alguns casos. A depressão nem sempre vem acompanhada dos sintomas descritos. Muitas vezes, apresenta apenas sintomas somáticos, dificultando seu diagnóstico. Pode surgir como primeiro sinal de doença física, ser secundária à alteração física, ou ser mascarada por queixa de doença física, mimetizando qualquer outra doença orgânica.28, 98 A depressão pode ainda ocorrer concomitantemente à ansiedade, especialmente na fase inicial quando o padrão de sintomas está se formando. Com o passar do tempo, o nível da ansiedade é reduzido e o da depressão aumenta.46 Os distúrbios de humor vêm sendo considerados como importante problema de saúde pública devido à alta prevalência, que pode variar de 3% a 26%, e à falta de evidência de redução desses 13 índices apesar dos avanços nas modalidades terapêuticas.02, 09, 25,28, 39, 46 A séria morbidez desse distúrbio é representada pela elevação nas taxas de suicídio nos últimos anos. Talvez por afligir tantas pessoas, a depressão tenha atraído muita atenção, e uma ampla variedade de teorias foi oferecida para explicá-la. Em cada cultura, encontram-se esforços para determinar as causas da depressão. Essas tentativas vão desde a formulação da Hipótese Humoral de Hipócrates (séc. V a.C.), passando pelos calendários preditivos dos astecas, chegando às refinadas teorias de nosso século sobre o funcionamento do sistema nervoso. Entre as mais citadas, destacam-se as teorias psicodinâmica, comportamental, cognitiva, biológica e humanístico-existencial.01, 02, 09, 28, 39, 46, 78, 83, 89 A participação da depressão na gênese de diversas síndromes dolorosas crônicas é reforçada por dados que evidenciaram transtornos psiquiátricos em aproximadamente 86% dos pacientes com dores crônicas, sem lesão física significativa.98 Especialistas da área defendem que a depressão é mais freqüentemente uma conseqüência da vivência da dor. Porém, outros autores especulam que a depressão pode ser causa, concomitante ou conseqüente à dor, e que cada paciente necessita de avaliação individual para determinar o seu papel no quadro clínico. Além disso, sabe-se que a dor crônica em ausência de lesão é comumente uma variação na expressão da depressão.43 Existe ainda a 14 hipótese de que depressão e dor comungam dos mesmos mecanismos patogênicos.98 Ainda não está claro se os fatores emocionais poderiam ser conceitualmente causadores ou conseqüentes aos quadros dolorosos. Parece que as dores de duração muito breve estariam mais relacionadas com medo e estresse, as dores agudas de maior duração seriam acompanhadas por medo e ansiedade, enquanto as dores crônicas seriam mais ligadas à depressão, privação social, irritabilidade e neuroses de ordem somática.93, 15 Vários instrumentos de avaliação têm sido desenvolvidos para investigar aspectos físicos ou psicológicos das DTMs. Muitos conceitos foram propostos para formular teorias embasadas na busca de um sítio do sistema estomatognático responsável pelos múltiplos sinais e sintomas relatados na literatura. Ao mesmo tempo, estudos a respeito de parâmetros psicológicos em pacientes com DTM têm produzido dados diversos e conflitantes, em parte como resultado de diferenças na seleção da amostra, na metodologia e na análise de dados e, em parte, por causa de diferenças interindividuais relacionadas não somente às dimensões sensoriais (limiar de tolerância), como também cognitivas, emocionais, comportamentais e ambientais.94 Não tem sido possível evidenciar um tipo específico de personalidade envolvido na etiologia das DTMs, mas os resultados de pesquisas sobre componentes emocionais da DTM têm demonstrado 15 níveis elevados de ansiedade e depressão nesses pacientes. Há algum indício que testes psicológicos possam distribuir esses pacientes em subgrupos que podem ser identificados de acordo com fatores psicocomportamentais.94 Com base nas evidências atuais da literatura, não é claro o papel dos fatores psicológicos na etiologia, na decisão de procura pelo tratamento, no diagnóstico e na solução das DTMs. Portanto, julgamos oportuna a realização de estudos para verificar a presença de fatores psicológicos como, a depressão, em relação às DTMs. Revisão da literatura 17 s relações entre a atividade de músculos faciais, os padrões de comportamento e os estados emocionais são conhecidas há muito tempo. Em um trabalho audacioso, realizado muitos anos antes de Freud começar a desvendar o inconsciente e a fundamentar a psicanálise, Darwin (1872) apud Boadella10 e Kydd52 descreveu com detalhes as evidências da participação dos músculos faciais esqueléticos em padrões de comportamentos que acompanham estados emocionais e mentais como ansiedade, mágoa, depressão, alegria, A 18 determinação, surpresa, raiva, medo e aversão. Infelizmente, esse trabalho passou desapercebido pela literatura odontológica. As previsões de Freud de que a psicanálise descobriria suas funções orgânicas cumpriram-se com Reich (1933) apud Boadella,10 um dos primeiros estudiosos de estrutura de referência psicanalítica a iniciar o movimento que originou a medicina psicossomática. Sua abordagem unificadora da parte biológica à psicológica (mente-corpo), sem supremacia de uma em relação à outra, não foi bem compreendida na época, quando o estudo sistemático do caráter do homem havia apenas começado e a mente ainda era considerada um compartimento separado do corpo. Os primeiros apontamentos de uma possível participação de fatores psicológicos na etiologia das DTMs surgiram com os trabalhos de Moulton (1955),66 uma psiquiatra colaboradora da equipe do Dr. Schwartz. A base filosófica de seus trabalhos fundamenta-se em conceitos psicanalíticos clássicos, que consideram a cavidade oral como a primeira área de satisfação e prazer do ser humano. Avaliando através de entrevista psiquiátrica 35 pacientes diagnosticados com DTM, 25 deles com queixas dolorosas, considerou que o grupo todo apresentava-se ansioso e com tendência a expressar sua ansiedade em sintomas físicos. Durante sua avaliação, poucos pacientes puderam ser considerados doentes mentais, mas 20 deles eram notadamente ansiosos ou tensos. Dos restantes, 11 puderam ser considerados psicóticos ou pré-psicóticos (6 esquizofrênicos, 4 suicidas e 1 depressivo). Sintomas depressivos foram 19 diagnosticados em 10 pacientes. Apenas 4 pacientes foram considerados normais. Diante dessas observações, concluiu que a tensão emocional construída durante toda a vida poderia configurar sintomas na região oral, especialmente em momentos críticos. Na opinião da autora, o tratamento odontológico pode agravar mais a situação, focalizando os problemas na região oral, provocando um quadro de fuga ou substituição aos problemas da vida. Schwartz (1955),84 em um estudo com 500 pacientes, reconheceu a importância do conteúdo psicológico do paciente na etiologia dos sintomas de DTM. Sua abordagem criticava severamente o modelo da etiologia oclusal e priorizava o papel dos espasmos musculares, mas também considerava a participação de fatores predisponentes constitucionais (fisiológicos) e temperamentais (psicológicos), fatores contribuintes (oclusais), fatores precipitantes (alongamento muscular ou alterações oclusais) e fatores agravantes (diagnósticos alarmantes) operando em um mecanismo basicamente tensional e autoperpetuante. Aspectos psicossomáticos da DTM foram investigados por Kydd (1959)52 durante a avaliação de 30 pacientes portadores desse distúrbio através de exames eletromiográfico, oclusal e psicológico. A avaliação emocional incluiu a coleta da história escrita sobre a origem e progressão da dor, a identificação de incidentes estressantes relatados em entrevista e aplicação dos testes psicológicos: “Cornell Medical Index”, “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI) e “Edwards Personality Profile”, evidenciando perturbações 20 psicológicas em 23 (76%) dos pacientes, nos quais houve relação entre a exacerbação dos sintomas e reações de conflito. Eletromiograficamente, 29 dos 30 pacientes mostraram desaparecimento dos potenciais de ação quando colocados em situação de conforto e relaxamento muscular. Foi possível observar remissão espontânea dos sintomas em 2 pacientes sem nenhuma intervenção terapêutica. Ante essas observações, o autor argumentou que atribuir a melhora do paciente à terapia empregada é, em parte, enganoso e afirmou que o efeito placebo de qualquer forma de tratamento deve ser considerado, especialmente em pessoas mais sugestionáveis. Apesar de aceitar a participação dos músculos esqueléticos na etiologia das DTM, defendeu que a abordagem das DTMs deve assumir uma postura holística na avaliação e no tratamento, que as terapias mais radicais devem ser evitadas e que, ignorar qualquer dos fatores, seja de natureza oclusal, física ou emocional, aumenta as chances de fracasso na conduta do paciente. Beck et al. (1961)08 descreveram o Inventário de Depressão de Beck - BDI - um instrumento designado para medir as manifestações comportamentais da depressão buscando preencher a necessidade de estabelecimento de um sistema apropriado de diagnóstico da depressão, isento da subjetividade da avaliação clínica. Após a publicação de vários trabalhos, Moulton (1966)65 lamentou que ainda haja pouca compreensão e aceitação no que diz respeito à participação de fatores psicológicos em sintomas orais ou dentais, já que há muito tempo é 21 aceito o fato de que emoções fortes podem causar a ruptura total da função corporal, considerando que, por uma descarga do sistema nervoso autônomo, são produzidos sintomas físicos como alterações de freqüência cardíaca, desmaios, diarréia, vômito e perda do controle da musculatura estriada. A autora discutiu ainda os mecanismos de percepção e reação à dor. Defendeu que a dor na DTM é provocada por espasmos musculares devido a hábitos parafuncionais prolongados e que, ao cronificar-se, poderia levar a um ciclo vicioso em que mais espasmo acarretaria mais dor, interrompendo o padrão normal de contração e relaxamento muscular. Apoiados na hipótese que considera a cavidade oral como uma parte do corpo dotada de significado psicológico relevante, Brody & Nesbitt (1967)11 avaliaram os efeitos da terapia emocional de suporte em um grupo de 25 pacientes com queixas funcionais orais compatíveis com queimação oral, DTM, trismo e reações de conversão histérica e alucinatória. Observaram a melhora de 6 pacientes e a remissão completa dos sintomas em 2 pacientes, o que os levou a concluir que os fatores emocionais parecem ter uma participação importante na sintomatologia, atuando mais fortemente nos pacientes que melhoraram, e que devem existir outros mecanismos ainda não identificados usados pelos outros pacientes que não responderam à terapia. Ao avaliar o padrão de personalidade de pacientes com DTM aplicando o “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI) e a reação desses pacientes a estímulos experimentais de estresse, Lupton (1969)55 22 considerou que há relação entre os fatores psicológicos e a DTM, visto que o tratamento dos fatores psicológicos resultou em alívio dos sintomas físicos. Ao explorar o envolvimento de fatores emocionais nas dores faciais, Burton (1969)14 ressaltou que o conhecimento da classificação e das características dos sintomas dolorosos, fenômenos psiquiátricos e neurológicos é de fundamental importância para o cirurgião-dentista por ser este o primeiro profissional procurado para avaliação e tratamento da dor facial. Destacou ainda três meios possíveis pelos quais os aspectos psicológicos podem ser responsáveis por provocar dor: magnificando ou perpetuando a dor física através de fatores como personalidade, ambiente, compensações, depressão e ansiedade entre outros; provocando ou mantendo a dor num ciclo vicioso que relaciona contração muscular, tensão emocional e dor; ou considerando a própria dor como constituindo-se um sintoma de uma síndrome clínica tal qual a depressão, conversão histérica, hipocondríase, psicossomatização ou desilusão somática. As afirmações da literatura sugerindo que a dor facial prolongada possa ser um sintoma de um estado depressivo sub-clínico motivaram Fine (1971)27 a estudar o estado psicológico de 50 pacientes com DTM, comparando- os a 50 pacientes com dores odontogênicas. A avaliação psiquiátrica detalhada dos pacientes com DTM revelou 76% de sintomas de alterações psicológicas, enquanto o grupo controle apresentou somente 20%. Os sintomas típicos de depressão moderada e severa associados a altos graus de ansiedade foram os mais comuns, representando aproximadamente 73% dos diagnósticos no grupo 23 com DTM, fazendo com que o autor sugerisse, a partir deste fato, que à lista de sinais e sintomas de DTM fossem adicionados os sintomas somáticos que freqüentemente predominam em pacientes acometidos de depressão. Gessel & Kanter (1973)37 avaliaram as respostas ao relaxamento muscular por biofeedback eletromiográfico de 70 pacientes do gênero feminino com DTM. As pacientes sem melhora após as sessões de relaxamento receberam antidepressivos tricíclicos. De acordo com os resultados obtidos no tratamento, foi possível dividir as pacientes em grupos, evidenciando que as terapias empregadas fracassaram proporcionalmente à medida que ocorreu aumento da tensão muscular e da depressão, assim como redução na capacidade de aprendizado de relaxamento e no controle dos sintomas. Em um trabalho de revisão, Harris (1974)45 considerou que, se estímulos emocionais inquestionavelmente geram alterações somáticas como vasodilatação, alteração do tônus muscular e da movimentação intestinal, além de várias atividades hormonais e enzimáticas, é grande a possibilidade da participação de fatores como estresse, ansiedade e depressão em síndromes dolorosas faciais. Salientou ainda a necessidade de diagnóstico psiquiátrico para esses pacientes antes que venham a sofrer intervenções terapêuticas desnecessárias. Com o objetivo de verificar as diferenças psicológicas dos subgrupos de pacientes com DTM, Schwartz (1974)85 avaliou através do 24 “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI) 42 pacientes do gênero feminino com DTM, as quais não responderam ao tratamento. Os resultados demonstraram elevações nas escalas da chamada “tríade neurótica”: hipocondríase, depressão e histeria. A configuração completa da escala diagnosticou excessivo envolvimento somático, agitação e depressão. Uma comparação com dados de pacientes com DTM tratados com sucesso, colhidos preliminarmente para outro estudo, revelaram similaridades entre ambos os grupos. Porém, o grupo de pacientes com insucesso no tratamento demonstrou maiores desvios nos valores, apresentando-se mais agitado e depressivo. Assim como em outras condições de dor crônica, é possível que esses fatores psicológicos possam alterar a resposta à terapia convencional em certos pacientes. Ao explorar a psicodinâmica em um grupo de 23 pacientes com DTM, classificados como psiconeuróticos na avaliação emocional, utilizando o “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI), Pomp (1974)76 observou a remissão total dos sintomas em 15 pacientes durante a psicoterapia breve e em 2 pacientes logo após o término da psicoterapia. O desaparecimento dos sintomas coincidiu com a liberação de uma forte emoção negativa, o reconhecimento e a mudança da auto-imagem, o desenvolvimento de um sentimento de competência ou com a mudança específica no ambiente. Os resultados possibilitaram concluir que os fatores emocionais desempenham papel no aparecimento, na progressão e na remissão dos sintomas de DTM; que os pacientes que não respondem a terapias convencionais poderiam beneficiar-se com uma psicoterapia breve, 25 direcionada para o aprendizado de estratégias para lidar melhor com os problemas diários da vida; e que um treinamento especial do dentista em Psicologia poderia proporcionar uma conduta mais adequada a esses pacientes. A avaliação de 232 pacientes com DTM, realizada por Nally & Moore (1975),66 revelou uma grande proporção de problemas emocionais. O histórico de trauma esteve precedendo a sintomatologia em apenas 25% dos pacientes, enquanto 57% relataram histórico de estresse. É interessante também observar que, nos homens, a relação entre DTM e trauma foi mais forte, numa freqüência de 48% e que para as mulheres, o estresse foi mais importante, estando presente em 63% dos casos. Ao ponderarem sobre a participação de fatores oclusais, ambientais e comportamentais na etiologia das DTMs, os autores concluíram que tanto ansiedade quanto depressão devem ser consideradas na avaliação do paciente com DTM. Durante a avaliação de pacientes com DTM crônica aplicando o “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI), Marbach & Dworkin (1975)60 encontraram um quadro psicológico que incluía depressão, isolamento, negação e conflito pânico-agressivo. A melhora dos pacientes após 12 sessões semanais de psicoterapia, levou os autores a declarar que pacientes crônicos são melhor servidos por terapias conservadoras e reversíveis. Com o objetivo de investigar os efeitos do biofeedback no relaxamento dos músculos mastigatórios, a influência de fatores psicológicos nos 26 resultados do tratamento e a importância da depressão para o paciente com DTM, Gessel (1975)36 avaliou 23 pacientes com DTM durante o tratamento. Os 8 pacientes que não responderam à terapia foram medicados com antidepressivo tricíclico (Amitriptilina), o que resultou na melhora dos sintomas dolorosos. Esses resultados levaram o autor a concluir que a depressão, embora raramente considerada, é um fator importante para o paciente com DTM. Rugh & Solberg (1976),81 em um extenso estudo sobre as implicações psicológicas nas DTMs, puderam chegar às seguintes conclusões: (1) embora os fatores psicológicos tenham um importante papel na etiologia das DTMs, uma abordagem mais confiável seria considerar a etiologia de natureza multifatorial; (2) os fatores psicológicos operantes nas DTMs não podem ser entendidos dentro de uma única linha de pensamento, devendo-se considerar em conjunto os fatores emocionais, comportamentais e sociais; (3) fatores emocionais (ansiedade, medo, frustração e raiva) desempenham um papel significativo na etiologia das DTMs, gerando tensão muscular e hábitos parafuncionais, e embora pareça improvável que a atividade muscular emocionalmente induzida seja um fator necessário, é provável que seja suficiente para causar a DTM; (4) a avaliação do paciente deveria incluir uma determinação dos fatores emocionais como ansiedade e depressão. Rieder (1977)77 comparou e avaliou a eficácia de três diferentes métodos de aquisição de dados usados no exame de pacientes com DTM - questionário, história oral e exame clínico - para detecção de sinais e sintomas da 27 disfunção. Após discutir as vantagens e limitações de cada um, concluiu que a combinação dos três métodos de diagnóstico deve ser recomendada como parte da rotina de exame do paciente com DTM. Com objetivo de explorar a incidência e a gravidade de depressão em pacientes com DTM, Olson & Schwartz (1977)74 avaliaram 134 pacientes com DTM utilizando o “Zung Self Rating Depression Scale” e o “Multiple Affect Adjective Checklist” (MAACL). A média de depressão foi 59,13, sendo comparável à de pacientes de clínica geral, cujos escores foram de 59,98. Estes dados indicaram que a depressão parece não ser maior em pacientes com DTM quando comparados com os de pacientes de clínica médica geral. Num trabalho em conjunto com pesquisadores de muitos países, Hahn (1979)44 examinou 220 pacientes portadores de DTM e 317 controles utilizando o “Freiburger Personality Inventory”, um instrumento preparado por psicólogos para avaliar o grau de ansiedade, agressividade, depressão, frustração, sociabilidade, extroversão e introversão e estabilidade emocional entre outros. Apesar da metodologia não ter possibilitado comparação estatística, os pacientes com DTM mostraram-se mais ansiosos, agressivos, emocionalmente imaturos, deprimidos, não sociáveis, introvertidos e emocionalmente instáveis em comparação aos pacientes controle. Segundo o autor, a superposição de elementos psicológicos aos oclusais e a presença de distúrbios como a depressão indicam a necessidade de conjugar ao tratamento odontológico uma abordagem psicoterapêutica. 28 Em um interessante estudo retrospectivo de 6 anos, Kaban & Belfer (1981)48 utilizaram avaliação psiquiátrica e o “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI) para investigar sintomas de depressão, alterações no humor, estresse, ansiedade e perdas recentes em 400 pacientes com DTM e dor facial. Aproximadamente 6,25% apresentaram alguma psicopatologia primária, dentre as quais a mais freqüente foi a depressão aguda, especialmente nos pacientes com idade inferior a 16 anos. Ao verificarem que a dor facial ou a DTM podem ser os primeiros sintomas que antecedem uma psicopatologia e que, para alguns pacientes, a psicopatologia ocorre em reação aos sintomas físicos, defenderam que o diagnóstico da psicopatologia e seu tratamento adequado devem ser incluídos no programa de manejo das DTMs. Algumas evidências que levariam a suspeitar de psicopatologias poderiam incluir instabilidades emocionais, incapacidade de manter o tratamento, sintomas variáveis ou flutuantes sem a presença de eventos físicos concomitantes, ansiedade desproporcional aos sintomas e evidências de ganho secundário. Para investigar a existência de diferenças psicológicas entre pacientes com dor funcional e pacientes com dor orgânica, Marbach & Lund (1981)59 avaliaram os índices de depressão com a escala do “Institute of Personality and Ability Testing”, a anedonia (falta de capacidade de sentir prazer) através de um inventário elaborado com 66 itens, a ansiedade-estado e a ansiedade-traço com “Spielberg State-Traid Anxiety Inventory” e os auto-relatos de dor em 500 pacientes com dores faciais, subdivididos em três categorias de 29 diagnóstico: síndrome da dor e disfunção miofascial, artrite da ATM e neuralgia trigeminal primária. Os dados foram comparados com três grupos controle: indivíduos assintomáticos, pacientes com artrite sistêmica e pacientes com distúrbios neurológicos sistêmicos. Concluíram que os três grupos de dor facial mostraram homogeneidade no estado psicológico a despeito dos diferentes diagnósticos e que não se apresentaram mais depressivos que os grupos controle. O fato de existirem algumas relações entre os fatores psicológicos e as DTMs é conhecido, mas a natureza dessas relações necessita consideráveis discussões e esclarecimentos, pois os indivíduos nem sempre são igualmente afetados. Com essa finalidade, Greene et al. (1982)40 revisaram e analisaram criticamente o papel do estresse, da ansiedade e da depressão na etiologia, na progressão, na perpetuação e no tratamento das DTMs. Os autores não conseguiram explicar a etiologia das DTMs pela atuação dos fatores psicológicos, mas salientaram que os profissionais devem estar atentos a fatores como efeito placebo e regressão espontânea devido às características auto-limitantes e cíclicas das DTMs. Warman et al. (1983)100 resumiram as hipóteses psicológicas mais importantes na etiologia das DTMs. Os autores não encontraram dados que comprovassem um perfil psicológico claro para pacientes com DTM, embora a depressão e a ansiedade tenham demostrado correlações com esse distúrbio. É possível tanto que o sofrimento possa ser a causa das alterações do humor, assim como o estado emocional poderia levar à doença. Por outro lado, estudos sobre 30 dor experimental têm demonstrado que tanto a redução da ansiedade leva à diminuição da dor como o contrário também pode ocorrer. Sugeriram ainda que futuras investigações sejam feitas sobre tolerância de dor. Citaram que mesmo os estudos cientificamente bem realizados não poderiam ter seus resultados generalizados por não haver critérios padronizados de diagnóstico estabelecidos na literatura. As respostas ao BDI pareceram não ser essencialmente afetadas pelo método de administração ou pelo gênero do examinador quando comparadas por Bryson & Pilon (1984)12 em condições que variavam desde o absoluto anonimato até o contato face a face com o examinador, durante a aplicação do inventário. Estudos de Beck & Steer (1984)05 procuraram comparar a validade das versões de 1961 e 1979 do Inventário de Depressão de Beck – BDI – em populações de pacientes e não pacientes. A correlação entre os dois instrumentos foi alta, o que levou os autores a concluir que ambas as versões são equivalentes. As contradições produzidas pelas pesquisas sobre a possibilidade de existirem características de personalidade comuns aos pacientes com DTM motivaram Moss & Adams (1984)63 a avaliarem dez pacientes com dor unilateral há seis meses e sons na ATM, dez pacientes sem dor e com sons articulares e dez pacientes assintomáticos utilizando o “Minnesota Multiphasic Personality 31 Inventory” (MMPI), o “Spielberg State-Trait Anxiety Inventory” (STAI) e o “Beck Depression Inventory” (BDI). Os grupos estudados não diferiram entre si em relação às variáveis personalidade, ansiedade e depressão. Porém, os próprios autores admitiram que o pequeno número de pacientes em cada grupo pode ter induzido erros estatísticos e que o fracasso em relacionar os fatores psicológicos com DTM pode ter ocorrido em virtude da abordagem aos pacientes ter sido realizada quando já estavam sem dor. Em uma revisão crítica a respeito dos fatores etiológicos das DTMs, Fricton (1985)30 avaliou a atuação individual dos fatores comportamentais, sociais, emocionais, cognitivos, biológicos e ambientais. Em relação aos fatores emocionais, considerou que a ansiedade, a raiva, a depressão e a frustração são sentimentos muito comuns em pacientes com dor crônica, mas acreditam que esses fatores não devem ser causa direta da dor, podendo ser conseqüência de uma condição dolorosa persistente ou poderiam ocorrer previamente à DTM e tornar mais difícil a tolerância da dor. A relação entre depressão e síndromes dolorosas orofaciais recebeu destaque, enfatizada por estudos que demonstraram altos índices de queixas dolorosas entre pacientes deprimidos, assim como elevados escores de depressão em pacientes com dor crônica. A maior parte dos estudos sobre fatores psicológicos em DTM tem voltado esforços para identificar traços específicos de personalidade, normalmente através de análise das respostas a um questionário. Uma grande variedade de características de personalidade indicam que um perfil psicológico homogêneo de 32 pacientes com DTM seria impossível de ser estabelecido e que múltiplos fatores parecem estar envolvidos. A despeito das evidências da participação de fatores psicossociais aumentarem, estes aspectos continuam sendo freqüentemente negligenciados pelos cirurgiões-dentistas. Speculand & Goss (1985)91 chamaram a atenção para esse fato numa interessante abordagem da literatura, indicando como as informações sobre a atuação desses fatores podem ser facilmente aplicadas na rotina clínica. Suas observações encontraram maior frequência de ansiedade que de depressão, sendo esta mais comum nos pacientes que não respondem ao tratamento. Grzesiak (1988),41 em um artigo a respeito dos mecanismos de atuação dos fatores psicológicos nas dores orofaciais, descreveu os parâmetros de dor aguda e crônica e sua relação com estados emocionais como ansiedade e depressão. Discutiu também as hipóteses de formação de sintomas dos distúrbios orofaciais dolorosos sob a filosofia das escolas psicanalítica, comportamental , cognitiva, cognitivo-comportamental e psicobiológica. Todas as correntes filosóficas apresentam explicações para a manutenção ou exacerbação da dor, porém apenas o modelo psicobiológico provê um suporte para justificar a origem de sintomas somáticos relacionados a estados emocionais. Na segunda parte de seu artigo, Grzesiak (1988)42 fez uma revisão da participação dos fatores psicológicos em cada uma das dores orofaciais crônicas, dentre elas a DTM, concluindo que a falta de padronização da amostra e 33 da metodologia científica torna quase impossível a comparação de dados nos estudos dos fatores psicológicos nas DTMs. Buscando identificar as características emocionais, Lee & Lee (1989)54 aplicaram o “Symptom Checklist-90-Revision” (SCL-90-R) em 219 pacientes com DTM, os quais foram divididos em subgrupos de acordo com o gênero, a idade, a duração dos sintomas, a presença ou ausência de dor e o nível educacional. A comparação dos resultados demonstrou valores médios mais elevados de depressão nas mulheres, com idade igual ou superior a 30 anos, com sintomatologia há mais de 6 meses e com presença de dor. Concluíram que estudos mais detalhados devem ser realizados sobre essas diferenças demográficas e que é desejável que a avaliação do paciente com DTM inclua aspectos emocionais e psicológicos para um diagnóstico e tratamento mais adequados. As DTMs têm seu comportamento constantemente comparado a outros distúrbios dolorosos crônicos. Com o objetivo de determinar se as características comportamentais e psicológicas dos pacientes com DTM são similares a outras condições crônicas, Mckinney et al. (1990)57 aplicaram o “Chronic Pain Battery” (CPB), um questionário multidimensional, para avaliar importantes variáveis em 78 pacientes com DTM e 98 pacientes portadores de outras doenças crônicas. Os pacientes com DTM apresentaram sofrimento doloroso em menor intensidade e maior tolerância à dor. Ambos os grupos apresentaram resultados estatisticamente semelhantes quanto aos níveis de 34 depressão, ansiedade e somatização, podendo ser comparados e abordados da mesma forma. O modelo biopsicossocial foi destacado por Grzesiak (1991)43 como a melhor hipótese para a compreensão da participação dos fatores psicológicos na etiologia das DTMs e das síndromes dolorosas crônicas, especialmente as faciais. Sugeriu que esses pacientes seriam melhor compreendidos sob uma perspectiva que integrasse fatores biomédicos, psicológicos e socioculturais atuando como predisponentes, desencadeadores ou bloqueadores na determinação do evento. A participação da depressão é considerada sob vários aspectos, seja como fator desencadeador, exacerbador ou apenas como um evento coincidente com as DTMs. A revisão literária realizada pelo autor denotou ser mais comum aceitar-se a depressão como conseqüência de condições dolorosas crônicas, embora outras opiniões defendam que a dor pode ser um sintoma somático da depressão, ponto de vista reforçado por achados significantes sobre depressão maior em pacientes com dores crônicas, especialmente as manifestadas em múltiplos sítios. Diante do empasse, recomendou que cada paciente deve ter uma avaliação individualizada para definir o papel da depressão no seu quadro clínico. A hipótese de que o paciente com DTM apresenta maiores níveis de sintomas depressivos e problemas somáticos em decorrência de estresse foi testada por Wright et al. (1991),101 que aplicaram a “Hassles Scales” para o estresse, o “Beck Depression Inventory” (BDI) para depressão e o “Symptoms 35 Checklist” para distúrbios de somatização. Os resultados da avaliação de 37 pacientes com DTM foram comparados aos de 30 pacientes oriundos de clínica geral, demonstrando um nível mais elevado de depressão nos pacientes com DTM, embora apenas numa minoria a intensidade tenha sido clinicamente significante, levando-os a declarar que fatores psicológicos podem ser somatizados como sintomas de DTM. A crítica ao uso de questionários para seleção de pacientes nos estudos que relacionam dor facial e depressão levaram Gallagher et al. (1991)33 a examinarem clinicamente 136 pacientes que participaram previamente de um estudo sobre DTM. Após a divisão dos pacientes em grupos de portadores e não- portadores de depressão utilizando critérios rígidos de inclusão do DSM III-R (SCID), a presença de dor foi avaliada pela “Escala Visual Analítica” (VAS). Os resultados evidenciaram relação entre depressão e DTM, porém a metodologia não possibilitou diferir se a depressão estava relacionada à causa ou conseqüência da depressão ou se ambas são manifestações simultâneas da mesma condição. Stockstill & Callahan (1991)92 compararam a presença de eventos estressantes, ansiedade e depressão em pacientes com DTM e assintomáticos através de uma ficha de avaliação, enviada pelo correio, contendo as escalas “Social Readjustment Rating Scale” (SRRS), “Taylor Manifest Anxiety Sacale” e “Depressed Mood Scale” (CES-D). Os dados dos 75 pacientes que retornaram a avaliação foram cruzados com as respostas de 89 indivíduos assintomáticos, 36 usados como controle, revelando não haver diferenças significantes entre os grupos estudados. Diversos estudos tem usado uma variedade de métodos de avaliação que incluem inventários psicológicos na tentativa de caracterizar o paciente com DTM. Nesta linha de pesquisa, Zach & Andreasen (1991),102 aplicando o “Crown Crisp Experimental Index” (CCEI), classificaram os perfis psicológicos de 98 pacientes com sinais e sintomas de DTM e compararam com os do grupo controle assintomático. Os pacientes com DTM mostraram-se significantemente diferentes dos do grupo controle nos perfis de somatização e histeria. O nível de depressão, apesar de sensivelmente maior para os pacientes com DTM, não diferiu significantemente do controle. Mccreary et al. (1991)56 examinaram a natureza e a extensão de diferenças psicológicas entre subgrupos diagnósticos de DTM. O nível de dor e de alterações psicológicas de 112 pacientes com DTM foram medidos usando a “Escala Visual de Dor” (VAS), o “McGill Pain Questionnaire” (MPQ), o “Beck Depression Inventory” (BDI), o “Spielberg State-Trait Anxiety Scale” (STAI) e o “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI). Os pacientes com mialgia apresentaram os maiores escores de dor e de alterações psicológicas, enquanto pacientes com alterações articulares apresentaram os menores escores. Os pacientes com mialgia combinada às disfunções articulares mostraram escores intermediários. Quando os níveis de dor eram controlados, as diferenças entre os 37 grupos para as medidas de ansiedade e depressão eram atenuadas, enquanto para os valores de distúrbios somáticos as diferenças permaneciam significantes. Para avaliar o papel da depressão na resposta ao tratamento, Tversky et al. (1991)97 avaliaram 60 pacientes com DTM. Foram identificados 45 pacientes com depressão e 15 pacientes sem depressão. O grupo de pacientes sem depressão foi tratado com placas oclusais. Os pacientes com depressão foram divididos aleatoriamente em três grupos de tratamento: placas oclusais (subgrupo 1), antidepressivos (subgrupo 2) e associação de placas com antidepressivos (subgrupo 3). Os melhores resultados foram obtidos com o grupo da conjugação de placa e antidepressivos, sendo estatisticamente semelhantes aos do grupo sem depressão tratado com placas oclusais. Os autores concluíram que a resposta mais favorável foi obtida quando o estado psicológico foi considerado e tratado adequadamente e que a atenção focada apenas nos sintomas físicos pode ser a causa de tantos fracassos terapêuticos. O estudo do perfil psicológico de 30 pacientes do gênero feminino com DTM avaliada através do “Minnesota Multiphasic Personality Inventory” (MMPI) por Jacob (1992)47 demonstrou elevações estatisticamente significantes na escala de depressão dessas pacientes quando comparadas a 20 pacientes assintomáticas. A autora esclareceu que elevações moderadas na escala de depressão sugerem que as pacientes estão atentas a seus problemas e possuem alguma motivação para mudar esse estado. Porém, quando a escala está bastante elevada, como neste estudo, permite concluir que as pacientes possuem 38 pouca capacidade de reação à terapia. Neste caso, a depressão seria uma reação ao estresse em pacientes com falta de confiança em si mesmas, introvertidas e com estreiteza de interesses, sendo observada a expressão desses conflitos por canais somáticos. Não pôde ser encontrada, entretanto, uma associação entre distúrbios psiquiátricos e DTM. Fonseca (1992),29 utilizando uma amostra de 100 pacientes com queixas compatíveis com DTM, aplicou um índice anamnésico simplificado e o índice clínico de Helkimo. Observou, com a análise estatística, a correlação entre os dados obtidos pelos dois índices e o seu grau de confiabilidade e concluiu que essa correlação entre a anamnese e o exame clínico possibilita a triagem dos pacientes apenas pela anamnese. Kinney et al. (1992)49 pesquisaram a presença de distúrbios psicológicos maiores em um grupo de 50 pacientes com DTM crônica empregando os critérios do DSM-III. Encontraram diagnóstico positivo em 86% da amostra, tendo-se que, dentre os distúrbios psicológicos identificados, 74% correspondiam a depressões maiores encontradas em 30% da população estudada. Como não foi possível estabelecer relação de causa/efeito entre depressão e DTM crônica, os autores sugeriram acompanhamentos psicológicos longitudinais em populações com DTM aguda para melhor compreender como e quando esses pacientes podem apresentar distúrbios psicológicos no curso das síndromes dolorosas. 39 Com o objetivo de comprovar a atuação das modalidades terapêuticas “biofeedback” e placa oclusal sobre os sintomas de dor e depressão em pacientes com DTM, Turk et al. (1993)96 utilizaram o “Pain Severity Scale” (PSS), o “Center for Epidemiologic Studies – Depression” (CES-D), o “Profile Mood States” (POMS) e o “Beck Depression Inventory” (BDI) para avaliar as variações na dor e depressão em três momentos: pré-tratamento, após o protocolo de tratamento proposto por seis semanas e no controle de seis meses. Os resultados demonstraram um comportamento semelhante da dor e da depressão durante o estudo, tendo a placa oclusal promovido um resultado inicial melhor, o “biofeedback” possibilitado uma melhora mais lenta, porém mais constante, e a associação entre os dois tratamentos resultado num maior benefício terapêutico após seis meses. Os autores concluíram que, para as dores crônicas, parece haver importância em se considerar tanto os fatores físicos como os psicológicos e que a depressão desempenha um papel importante na DTM, devendo ser abordadas e tratadas conjuntamente. Analisando a evolução de diferentes conceitos de classificação para fins clínicos e de pesquisa Clark et al. (1993)18 revisaram a literatura enfocando especialmente a validade de diferentes questionários e procedimentos de exame que tem sido empregados na avaliação do paciente com DTM. Encontraram muitos destes instrumentos sem validação e criticaram a falta de padronização metodológica, defendendo o desenvolvimento de um sistema de classificação melhor definido para estes pacientes. 40 Ao examinar as DTMs por uma perspectiva biopsicossocial, com o objetivo de discutir as implicações de conceituar as DTMs como uma condição dolorosa crônica, Dworkin (1993)26 ressaltou a importância da avaliação da dor, da depressão e da somatização concomitantemente ao exame físico. Discutiu ainda que pacientes com disfunção leve mostram valores de depressão e somatização semelhantes aos da população normal, enquanto pacientes mais acometidos apresentam valores significantemente mais altos nas medidas de depressão e sintomas físicos, sugerindo uma relação mais forte da sintomatologia com somatização e depressão do que com a magnitude da dor. Dahström (1993),21 revisando os métodos e resultados da aplicação de testes psicométricos empregados no estudo de fatores psicológicos em DTM, encontrou resultados ambíguos e dificuldade para comparação de trabalhos disponíveis na literatura. Os vários instrumentos psicométricos descritos não conseguiram evidenciar um perfil psicológico único, mas demonstravam que pacientes com DTM de origem muscular têm maiores dificuldades psicológicas e que existem pequenas elevações nos valores de ansiedade, depressão, estresse e somatização nos pacientes com DTM, não havendo, porém, possibilidade de atribuir relação de causa ou efeito aos mesmos. A identificação de fatores como estresse, ansiedade e depressão em subgrupos de pacientes com DTM estimulou Rugh et al. (1993)82 a revisar os estados de métodos e instrumentos mais designados para o diagnóstico. Dentre os instrumentos utilizados na avaliação da depressão, os autores destacaram o 41 “Beck Depression Inventory” (BDI) e o “Zung Self-rating Depression Scale” como os mais sensíveis e específicos. A simplificação da avaliação dos fatores psicológicos também foi defendida e, em vista de alguns estudos considerarem que a avaliação do cirurgião-dentista é superestimada, concluíram que são necessários o desenvolvimento e a validação de instrumentos breves que usem como parâmetros métodos de decisão clínica. Em um estudo elaborado para avaliar subgrupos de pacientes com DTM, De Leeuw et al. (1994)24 enviaram por correspondência uma bateria de questionários designados a medir estressores externos, como reações emocionais (ansiedade e depressão) e perfis de personalidade. Os questionários de 127 pacientes com DTM e de 158 indivíduos assintomáticos retornaram preenchidos. Os pacientes com DTM foram subdivididos em grupos diagnósticos de disfunção muscular, articular e combinação de muscular e articular. Os resultados demonstraram que todos os subgrupos com componente muscular apresentaram maiores valores de ansiedade e depressão. Novy et al. (1995)68 utilizaram procedimentos estatísticos de análise fatorial para mensurar a dimensão de avaliação do Inventário de Depressão de Beck quando aplicado em populações com dores crônicas. Os resultados dessas análises, baseados na aplicação em uma amostra de 247 pacientes com dor crônica, esclareceram quais constituintes da depressão são medidos pelo instrumento e confirmaram a adequacidade do modelo, o que 42 implica em pesquisas clínicas e epidemiológicas mais refinadas para os pacientes de dor crônica. Suvinen & Reade (1995),93 em um trabalho de extensa revisão da literatura sobre fatores psicofisiológicos, descreveram os modelos teóricos existentes para compreensão de como cada fator psicológico poderia relacionar- se à etiologia das DTMs. A depressão teve seu papel de destaque entre fatores afetivo-motivacionais. Os autores concluíram que a pesquisa na área das síndromes dolorosas é muito complexa por permitir apenas o uso de medidas subjetivas. Além disso, encontraram muitas perspectivas de análise, vários tipos de instrumentos psicométricos e múltiplos tratamentos estatísticos aplicados nessas pesquisas. Sugeriram que os próximos estudos apresentem uma padronização desses critérios, utilizem amostras numerosas com grupo controle clínico e descrevam claramente seus critérios de inclusão e exclusão para permitir comparações. A preocupação com os critérios de avaliação também esteve presente nos estudos de Korszun et al. (1996).50 Utilizando critérios definidos pelo DSM IV para uma amostra de 72 pacientes com dor crônica orofacial, oriundos de uma clínica multidisciplinar, encontraram uma alta prevalência de depressão e DTM, mas sem sucesso em evidenciar diferenças entre os pacientes com DTM e demais dores crônicas. 43 Gatchel et al. (1996)35 compararam as avaliações psicológicas de 50 pacientes com DTM crônica e 51 pacientes com DTM aguda realizadas com a entrevista clínica estruturada SCID-I e SCID-II. A maior porcentagem de distúrbios afetivos (depressão) foi encontrada entre os pacientes com DTM crônica (78%). Os pacientes com DTM aguda apresentaram 45% de distúrbios afetivos, enquanto para a população geral têm sido sugeridos índices de 5% a 26%. A depressão ligada a sentimentos de baixa auto-estima, baixa energia, à preocupação e à qualidade do sono foi indicativo do sucesso ou fracasso da terapia nos trabalhos de Fricton & Olsen (1996)31 ao avaliarem 94 pacientes com DTM crônica, antes e após o tratamento realizado. Os fatores psicológicos, particularmente relacionados à depressão, mostraram-se fortemente responsáveis pela recidiva dos sintomas, de tal forma que as terapias para DTM centradas apenas em aspectos físicos foram avaliadas como inadequadas pelos autores, que consideraram os sintomas de depressão como mediadores da resposta dos pacientes com dor crônica. O curso dos sintomas de DTM foi avaliado por Wänman (1996)99 em um estudo epidemiológico populacional longitudinal. Foram examinados 285 indivíduos aos 17 anos de idade, que foram acompanhados por 2 anos, sendo 215 reavaliados 10 anos mais tarde, aos 28 anos. Embora não tenham sido observadas grandes diferenças na prevalência de sintomas de uma análise longitudinal e a flutuação de sintomas tenha ocorrido em indivíduos de ambos os gêneros durante o período do estudo, o comportamento da DTM diferiu muito 44 entre homens e mulheres numa perspectiva transversal. Os sintomas relatados na juventude não se agravaram; ao contrário, amenizaram-se 10 anos mais tarde para os homens. Já para as mulheres, foram encontrados sintomas mais severos e intensos durante o período de acompanhamento. Morris et al. (1997)62 identificaram alta prevalência de distúrbios mentais (33%) em 97 pacientes com DTM avaliados por exame clínico e por entrevista psiquiátrica realizada com uma bateria de 6 questionários: “General Health Questionnaire” (GHQ), “Hospital Anxiety and Depression Scale” (HADS), “Ilness Attituds Scale” (IAS), “Somatic Symptom Checklist” (SSC), “Numeric Analogue Pain Scale” (NAPS) e “Social Adjustment Self Rating Questionnaire” (SAS-RQ). Os diagnósticos psiquiátricos, de acordo com critérios do DSM-III-R, evidenciaram 14% de distúrbios somatoformes, 10% de distúrbios depressivos e 5% de distúrbios de ansiedade, levando os autores a concluir que tanto a ansiedade quanto a depressão podem levar à redução no limiar de dor. Turk (1997)95 confirmou a importância de fatores psicossociais na etiologia e perpetuação das DTMs. Os resultados dos estudos revisados levaram- no a sugerir que o paciente crônico deveria receber um manejo mais amplo, que não fosse baseado apenas no aspecto físico, ou ainda que, na ausência de identificação de uma causa suficiente, a etiologia não fosse focada apenas numa visão psicogênica. Ao considerar todos os fatores, o autor acredita que a avaliação torna-se mais completa, o diagnóstico mais específico, o tratamento mais 45 adequado, culminando em resultados terapêuticos que devem ser mantidos por maior prazo. Em uma revisão sobre os aspectos que relacionam a dor com depressão, Oliveira (1998)73 destacou que, quando o aparelho mental falha, os estados psicológicos podem se expressar no corpo usando caminhos patológicos existentes ou criando dores para as quais não se encontra etiologia física e que um bom exemplo da conjunção da dor física com a depressiva são as encontradas na DTM. De seu ponto de vista, defende que a dor física é um caminho encontrado inconscientemente pelo indivíduo para não provocar a destruição do ego, desencadeando uma desorganização mental. Okeson (1998),70 revisando os mecanismos relacionados com a experiência de dor, afirmou que todas as dores, agudas ou crônicas, somáticas ou neuropáticas, são influenciadas por fatores psicológicos representados por complexas interações entre os centros superiores (tálamo, córtex e estruturas límbicas). As estruturas límbicas são responsáveis pela avaliação emocional do indivíduo, podendo influenciar em grande parte a experiência dolorosa, o que ajudaria explicar porque o fenômeno doloroso é tão particular para cada indivíduo. Com o objetivo de estudar o perfil psicológico de pacientes com DTM, Sirirungrojying et al. (1998)90 empregaram o “Symptom Checklist” (SCL-90) em 62 pacientes sintomáticos e compararam as respostas obtidas com as de 67 pacientes de clínica geral e de 70 indivíduos assintomáticos. Os resultados 46 demonstraram níveis de depressão e ansiedade significantemente maiores para pacientes com DTM em relação aos demais grupos. Gorenstein & Andrade (1998)38 estudaram as propriedades psicométricas da versão em português do BDI em diferentes amostras. Encontraram uma alta consistência interna, confirmando a validade do instrumento e demonstrando que o mesmo apresenta capacidade de discriminar bem a sintomatologia depressiva e de medir aspectos específicos da depressão nas diversas populações. A alta relação entre DTM, fibromialgia e síndrome da fadiga crônica encontrada no exame de 92 pacientes tratados em um centro reumatológico levou Korszun et al. (1998)51 a discutir a respeito de uma hipótese etiológica que englobasse fatores comuns a essas alterações. A presença do estresse e da depressão, constantemente associados a essas três entidades, direcionou os autores ao estudo do sistema nervoso autônomo, especialmente aos distúrbios do eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), o que explicaria, inclusive, a maior vulnerabilidade do gênero feminino a essas doenças. As conclusões deste estudo ressaltaram a importância do papel do cirurgião-dentista no diagnóstico precoce, na classificação adequada e na abordagem multidisciplinar de condições dolorosas crônicas. Calil & Pires (1998)16 abordaram diversos aspectos importantes, como as vantagens, as desvantagens, as indicações de emprego e o fundamento 47 teórico utilizado na construção das escalas de avaliação de depressão mais empregadas na literatura, destacando as características que qualificam o Inventário de Depressão de Beck. A necessidade de padronização tornou o emprego de questionários uma prática necessária em Psicologia e Psiquiatria, para evitar diferenças nos critérios de diagnóstico. Porém, Menezes (1998)61 ressaltou a importância do conhecimento prévio da validade e da confiabilidade dos instrumentos selecionados, para que se possa interpretar corretamente os resultados dos estudos. Proposição 49 om base na literatura apresentada, é propósito deste trabalho verificar a existência de relação entre a presença e severidade da DTM e a prevalência de depressão psicológica. C Material e método 51 mostra A amostra do trabalho foi selecionada entre aproximadamente 400 pacientes que se apresentaram na Faculdade de Odontologia de Araraquara – UNESP buscando o Setor de Triagem com queixa compatível com DTM. Para o grupo controle, foram avaliados 50 pacientes que estavam em tratamento odontológico geral nas diversas clínicas da Faculdade e que não apresentavam sinais e sintomas de DTM. A 52 Consentimento para participação Os procedimentos metodológicos foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Odontologia de Araraquara – UNESP (Anexo A), encontrando-se de acordo com os conceitos atuais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos. O termo de consentimento (Anexos B e C) foi elaborado com a finalidade de esclarecer o paciente sobre sua condição de participante da pesquisa, o que possibilita a sua colaboração espontânea no trabalho ou a recusa de participação, sem impedir ou prejudicar seu acesso ao tratamento. Os pacientes participantes na pesquisa forneceram informações referentes à sua identificação, endereço, idade, gênero, grau de escolaridade, profissão e renda e foram submetidos à avaliação em relação ao grau de DTM e nível de depressão psicológica. Avaliação do grau de DTM O índice anamnésico proposto por Fonseca (1992)29 foi utilizado para avaliar o grau de DTM dos pacientes (Anexo D). Embora não exista consenso a respeito dos instrumentos disponíveis para diagnóstico de DTM, o Índice Anamnésico de Fonseca foi selecionado para ser utilizado neste estudo, pois segundo o autor, demonstra uma correlação estatisticamente significante com a anamnese e o exame físico e possibilita a graduação da severidade da DTM em Leve, Moderada e Severa. 53 Esse índice é composto por 10 questões, com três possibilidades de resposta: SIM, equivalendo a 10 pontos; ÀS VEZES, que corresponde a 5 pontos; NÃO, que equivale a 0 pontos. A questão de número 10, referente ao grau de tensão emocional do paciente, é considerada através de uma escala analógica que varia de 0 a 10. A somatória das respostas forneceu um escore numérico, que corresponde ao grau de DTM para cada paciente avaliado, o que permitiu classificá-los nos grupos estudados, conforme o quadro abaixo: Grupos estudados Índice Anamnésico Grau de DTM Grupo I (controle) 0 - 19 Sem DTM Grupo II 20 – 44 DTM Leve Grupo III 45 – 69 DTM Moderada Grupo IV 70 - 100 DTM Severa Critérios de inclusão e exclusão Foram aceitos pacientes dos gêneros masculino e feminino, para todos os grupos estudados, com idade entre 19 a 60 anos. Os pacientes abordados que não concordaram em participar da pesquisa tiveram sua vontade respeitada. O contato com os pacientes que participaram do grupo controle (Grupo I) foi realizado nas clínicas de tratamento odontológico 54 geral, sendo incluídos no estudo aqueles que não apresentavam queixa dolorosa de nenhuma natureza e que não apresentavam sinais e sintomas de DTM, ou seja, possuíam índice anamnésico menor ou igual a 19. Dentre os 50 voluntários avaliados, preencheram os requisitos 34 pacientes, aceitos para composição do Grupo I. Os pacientes com DTM (Grupos II, III, IV) puderam ser incluídos nos grupos estudados quando a sintomatologia dolorosa estava presente há mais de 6 meses17, 26, 42, 43 e relacionava-se claramente aos demais sinais e sintomas de DTM. Foram dispensados os pacientes cujo diagnóstico era duvidoso, que não apresentavam DTM segundo o Índice Anamnésico, que se utilizavam de medicação sintomática ou psicotrópica e com histórico de tratamento prévio. Outros motivos para a não aceitação de pacientes foram: deficiências auditivas, dificuldades de leitura ou quaisquer outros motivos adversos que impossibilitassem a aplicação da metodologia deste trabalho. Dos 400 pacientes que procuraram a Faculdade com queixa compatível com DTM, 155 foram selecionados e assim classificados: 49 pacientes com “DTM LEVE” foram incluídos no Grupo II, 69 pacientes com “DTM MODERADA” compuseram o Grupo III e 37 pacientes com “DTM SEVERA” foram selecionados para o Grupo IV. 55 Avaliação do nível de depressão O Inventário de Depressão de Beck (BDI) (Anexo E), descrito por Beck et al.(1979),08 é um dos testes psicológicos mais utilizados em trabalhos de pesquisa com pacientes com DTM.16, 38, 61 É composto de 21 categorias de sintomas e atitudes, em que cada categoria descreve uma manifestação específica do comportamento depressivo em uma série gradual de 4 estados a serem escolhidos por uma auto- avaliação. Os estados são graduados de forma a refletir os níveis de severidade dos sintomas do neutro para o mais grave. Valores numéricos de 0 a 3 são designados a cada estado para denotar o nível de depressão. As categorias de sintomas/atitudes relacionadas no inventário são: humor, pessimismo, sentimento de insucesso, falta de satisfação, sentimentos de culpa, sentimentos de punição, auto-ódio, auto-acusação, sentimentos suicidas, choro, irritabilidade, afastamento social, indecisão, auto-imagem, capacidade de trabalho, distúrbios no sono, cansaço, perda de apetite, somatização de preocupações e perda de libido. O BDI permite escores de 0 a 63 pontos. Há várias propostas de diferentes pontos de corte para distinguir os níveis de depressão utilizando o BDI.38 A escolha do ponto de corte adequado depende da natureza da amostra e dos objetivos do estudo.06 Para amostras de pacientes com transtorno afetivo diagnosticado por 56 profissionais da área, guias gerais têm sugerido que escores entre 0 a 9 sejam considerados compatíveis com condição de “sem depressão”; escores entre 10 a 18 sugerem “depressão leve a moderada”; escores entre 19 a 29 indicam “depressão moderada a severa” e escores entre 30 a 63 indicam “depressão extremamente severa”.68 Neste estudo, cuja amostra não havia sido clinicamente examinada por profissional da área de psicologia, as diretrizes recomendam que escores acima de 15 sejam considerados como “indicativos de depressão”. O termo “depressão” deve ser evitado para este padrão amostral, sendo apenas utilizado para indivíduos com escores acima de 20, preferencialmente com diagnóstico clínico realizado concomitantemente. O Inventário originalmente proposto por Beck et al. (1961)9 foi elaborado para ser aplicado por um profissional treinado. A versão revisada, publicada por Beck et al. (1979),08 pode ser empregada na rotina clínica por dispensar a presença de um profissional da área de psicologia, apresentando confiabilidade comparável à do original quando aplicado em populações de pacientes psiquiátricos acompanhados de profissional.05 Estudos sobre o instrumento indicam alto grau de sensibilidade e especificidade, o que o torna capaz de discriminar efetivamente os grupos de pacientes com variáveis graus de depressão. É também capaz de refletir alterações na intensidade da depressão em intervalos de tempo.13, 22, 38 57 Condições de aplicação dos testes A metodologia foi aplicada por um único examinador calibrado. Os pacientes foram entrevistados individualmente, em consulta previamente agendada, com duração aproximada de uma hora. Com o objetivo de obter uma maior colaboração dos pacientes, o ambiente selecionado para as consultas foi uma sala de aula, evitando o ambiente clínico e o uniforme branco, que poderiam causar um maior constrangimento a alguns pacientes. A recepção do paciente é muito importante. Como o contato com o examinador ficou limitado a uma consulta, procurou-se estabelecer uma postura de cordialidade e simpatia necessária para a conquista da confiança dos pacientes, fazendo com que eles se sentissem seguros para expor seus relatos com espontaneidade e veracidade. Os sinais e sintomas de DTM podem oscilar de tempos em tempos devido ao caráter cíclico da doença.71 Para possibilitar a relação adequada dos sintomas do paciente com seu estado emocional, a aplicação do BDI foi realizada no mesmo momento da avaliação do grau de DTM. Para bloquear qualquer interferência de mecanismos placebos, a aplicação do BDI precedeu o índice anamnésico e não foram fornecidas explicações sobre o problema ao paciente, assim como aconselhamento até o final da aplicação dos testes, com o objetivo de não 58 influenciar o estado emocional e, assim, obter maior fidelidade nos dados coletados.03 A metodologia foi aplicada individualmente. Apesar de ambos os testes serem projetados para auto-aplicação, os pacientes, enquanto realizavam a leitura silenciosa da ficha de avaliação, foram auxiliados pelo examinador, que fez a leitura em voz alta, havendo oportunidade para perguntas quando necessário. Após aplicação dos testes, os pacientes receberam aconselhamento e foram encaminhados para tratamento nas clínicas de Oclusão e Desordens Temporomandibulares da Faculdade de Odontologia de Araraquara-UNESP. Metodologia estatística Em todas as análises deste trabalho, a hipótese nula, que considera as variáveis iguais, foi confrontada com a hipótese alternativa de que pelo menos um dos resultados difere dos demais. A probabilidade de rejeitar a hipótese nula quando esta deveria ser aceita é chamada de nível de significância. Aceitou-se um nível de significância de 5%, rejeitando-se a hipótese nula quando o valor de probabilidade (valor p) foi menor ou igual a 0,05. A análise de variância foi empregada em dois momentos diferentes: para a comparação de médias de idades e também dos escores médios de depressão, avaliando se houve diferença significativa 59 entre essas médias ou se a diferença observada deve-se meramente a uma casualidade amostral. O Teste de Tukey foi usado para comparar as médias duas a duas e para identificar quais delas foram diferentes quando a análise de variância acusava que, ao menos, uma média diferia das demais. A associação entre as variáveis níveis de DTM e presença ou ausência de depressão foi avaliada utilizando-se o teste do qui-quadrado. Resultado 61 aracterísticas da amostra Na Tabela 1 estão expostos alguns dados que descrevem as características dos pacientes avaliados. São apresentados, para cada grupo, o número de pacientes e, entre parênteses, as porcentagens em relação ao total de pacientes, correspondentes às variáveis: gênero e C 62 renda em salários mínimos (SM). Os pacientes que não declararam a renda foram enquadrados na categoria ND. Tabela 1 - Número de pacientes classificados em cada grupo, de acordo com o gênero e renda Variável Grupo I (ausente) Grupo II (leve) Grupo III (moderada) Grupo IV (severa) Pacientes 34 (18,0%) 49 (25,9%) 69 (36,5%) 37 (19,6%) Gênero feminino 28 (82,3%) 39 (79,5%) 64 (92,7%) 37 (100%) masculino 6 (17,7%) 10 (20,5%) 5 (7,3%) 0 (0,0%) Renda ND* 16 (8,5%) 24 (12,7%) 34 (18,0%) 20 (10,6%) 1 a 3 SM** 12 (6,3%) 17 (9,0%) 21 (11,1%) 14 (7,4%) 4 a 5 SM 4 (2,1%) 4 (2,1%) 10 (5,3%) 2 (1,1%) 5 ou mais SM 2 (1,1%) 4 (2,1%) 4 (2,1%) 1 (0,5%) * Não Declarada ** Salários Mínimos Em relação à idade dos pacientes em cada grupo, as estatísticas calculadas foram: valores mínimo e máximo, variações mediana e média e desvio padrão. Na Tabela 2 observa-se que em todos os níveis de DTM a variação da idade foi semelhante; as medianas e as médias estão próximas dentro de cada grupo e também entre os grupos, e os desvios padrão mostraram-se praticamente equivalentes. 63 Tabela 2 - Estatísticas referentes à idade dos pacientes nos grupos estudados Estatística Grupo I (ausente) Grupo II (leve) Grupo III (moderada) Grupo IV (severa) Observações 34 49 69 37 Mínimo 19 19 18 18 Máximo 57 60 59 58 Mediana 37,5 36,0 33,0 35,0 Média 36,9 37,3 35,3 35,2 Desvio padrão 10,0 12,7 11,7 11,0 O resultado da análise de variância sugere que os quatro grupos de pacientes formados de acordo com o grau de DTM são homogêneos em relação à idade, como pode ser verificado pela Tabela 3. Tabela 3 - Sumário da análise de variância relativa à comparação das médias de idade dos pacientes entre os grupos estudados Fonte de Variação Graus de liberdade Quadrado médio F valor-p Níveis de DTM Resíduo 3 185 58,66 133,63 0,44 0,7524 64 Relação entre DTM e depressão psicológica Na Tabela 4 são apresentadas estatísticas resumo referentes aos escores de depressão em cada nível de DTM. Observa-se uma concordância razoável entre a mediana e a média. Além disso, os desvios padrão não são muito discrepantes, permitindo o emprego da análise de variância para a comparação das médias de depressão relativas aos níveis de DTM. Um sumário desta análise é apresentada na Tabela 5, indicando uma forte evidência de que pelo menos uma média de escore de depressão é diferente das demais. Tabela 4 - Estatísticas resumo dos escores de depressão em cada grupo estudado Estatísticas DTM Grupo I Grupo II Grupo III Grupo IV Observações 34 49 69 37 Depressão ausente 27 (14,3%) 28 (14,8%) 43 (22,8%) 13 (6,9%) presente 7 (3,7%) 21 (11,1%) 26 (13,8%) 24 (12,7%) média 11,1 A 15,0 A 13,7 A 20,7 B mediana 10,5 12,0 12,0 19,0 d. padrão 7,0 10,3 8,7 11,6 65 Tabela 5 - Sumário da análise de variância relativa à comparação dos escores médios de depressão entre os grupos estudados Fonte de Variação Graus de liberdade Quadrado médio F valor-p Níveis de DTM Resíduo 3 185 606,09 90,49 6,70 0,0003 As médias foram submetidas à comparação duas a duas pelo teste de Tukey, ao nível de 5% de significância. O resultado deste teste é apresentado na linha de médias da Tabela 4, onde letras iguais indicam que não há diferença significativa entre as médias ao nível de significância adotado. Portanto, as médias dos escores de depressão parecem indicar que somente o grupo IV diferiu de maneira estatisticamente significante dos demais grupos estudados. Outra alternativa para estudar a relação entre os níveis de DTM e a depressão psicológica é analisar as proporções de pacientes com indicativo de ausência ou presença de depressão em relação ao total de pacientes em cada nível de DTM. Essas proporções, em porcentagens, estão expostas na Tabela 6. As quantidades entre parênteses representam a proporção de pacientes que deveria ser esperada se não houvesse relação entre os níveis de DTM e a depressão. 66 Tabela 6 - Distribuição das proporções (em porcentagens) de pacientes com indicativo de ausência ou presença de depressão em relação aos totais de pacientes em cada grupo. Variável DTM Depressão Grupo I Grupo II Grupo III Grupo IV ausente 79,4 (58,7) 57,1 (58,7) 62,3 (58,7) 35,1 (58,7) presente 20,6 (41,3) 42,9 (41,3) 37,7 (41,3) 64,9 (41,3) A avaliação da associação entre os níveis de DTM e a depressão, através dessas proporções, pode ser efetuada empregando- se a estatística qui-quadrado. Foi obtido um valor de qui-quadrado igual a 14,92 ao qual corresponde um valor-p igual a 0,0019, que é significativo ao nível de 5% ou menor. Portanto, há uma dependência ou associação estatisticamente forte entre as duas variáveis em estudo, isto é, entre os níveis de DTM e a depressão psicológica. O qui-quadrado se baseia na discrepância entre as proporções observadas e as proporções esperadas. Então, pela Tabela 6, observa-se que os Grupos II e III contribuem pouco no valor do qui- quadrado, pois as proporções observadas e esperadas de pacientes com indicativo de ausência de depressão são próximas, o mesmo ocorrendo com as proporções de pacientes com indicativo de presença de depressão. São os Grupos I e IV que contribuem efetivamente para a 67 associação entre as duas variáveis. Portanto, parece haver uma maior concentração de pacientes com presença de depressão no Grupo IV e uma concentração menor no Grupo I. O gráfico da Figura 1 ilustra bem como as variáveis DTM e depressão estão associadas. A associação entre DTM e depressão não fica bem caracterizada nos grupos intermediários. Do Grupo I para o Grupo IV há um aumento significativo de pacientes com presença de depressão e, conseqüentemente, uma diminuição significativa de pacientes com ausência de depressão. Este resultado é análogo àquele que se obteve com a análise das médias demonstrada no início deste item. Aí também não ficou bem caracterizada a relação dos níveis intermediários de DTM na depressão. 0 20 40 60 80 100 0 1 2 3 Nível de DCM % Ausente Presente Figura 1 - Porcentagens de pacientes com indicativo de ausência ou presença de depressão nos grupos estudados Grupos estudados I II III IV 68 Em virtude da pequena contribuição dos grupos intermediários de DTM no valor do qui-quadrado, eles puderam ser combinados em um único nível, resultando um qui-quadrado igual a 14,60, ao qual corresponde um valor-p igual a 0,0022. Esses valores, como era de se esperar, são próximos dos obtidos em quatro grupos. Porém, a dependência em estudo ficou bem caracterizada, como pode ser observado pela Figura 2. Está claro que existe uma relação de dependência entre ausência de depressão quando a DTM é ausente e presença de depressão quando a severidade de DTM é maior, havendo pequenas diferenças entre os grupos intermediários quanto à depressão. 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 0 1+2 3 Nível de DCM % Ausente Presente Figura 2 - Porcentagens de pacientes com indicativo de ausência ou presença de depressão quando se agrupam os grupos intermediários Grupos estudados I II + III IV Discussão 70 aracterísticas da amostra A distribuição da amostra entre os grupos estudados, como se pode observar na Tabela 1, não foi simétrica. A despeito dos esforços realizados para que todos os grupos apresentassem números amostrais equivalentes, houve maior dificuldade para encontrar pacientes classificados para os grupos I (34 pacientes sem DTM), II (49 pacientes com DTM leve) e C 71 IV (37 pacientes com DTM severa), enquanto uma maior proporção de pacientes pôde ser classificada para o Grupo III (69 pacientes com DTM moderada). A diminuição de pacientes dos grupos numericamente maiores para que houvesse uma distribuição simétrica provocaria uma redução amostral que poderia dificultar a análise estatística. Por outro lado, a ampliação dos grupos com menor número exigiria um tempo maior que o previsto no planejamento inicial, visto que dependeria do acaso conseguir-se pacientes em número suficiente para equipará-los. A pesquisa clínica tem particularidades que a difere dos estudos laboratoriais. Existem muitas variáveis atuando sobre o evento estudado, e a maior parte delas não pode ser isolada. Além disso, o estudo clínico não permite a mesma possibilidade de repetições, havendo a necessidade da presença e da colaboração do paciente. Algumas dificuldades encontradas neste tipo de pesquisa, como o tempo despendido para a localização e agendamento dos pacientes, a conciliação de horários e disponibilidade do espaço físico, o não comparecimento do paciente à consulta, o não consentimento à participação na pesquisa e a dispensa de pacientes por não preencherem os requisitos de inclusão, são fatores que podem dificultar um trabalho desta natureza. A proporção entre pacientes pertencentes ao gênero feminino e pacientes de gênero masculino foi de 4,6:1 no grupo controle 72 (Grupo I). Para os grupos com DTM, essa proporção subiu para 6,6:1. Esses resultados concordam com outros parâmetros encontrados em pesquisas epidemiológicas, em que o proporcionamento observado está na faixa de 1,7:1 a 9:1.26,54, 90, 99 Vale acrescentar que essa proporção diferiu entre os grupos com DTM, variando de 3,9:1 (Grupo II) para 12,8:1 (Grupo III), evidenciando o aumento da prevalência de pacientes do gênero feminino conforme a DTM foi mais severa. O