unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” Faculdade de Ciências e Letras Campus de Araraquara – SP Joana Junqueira Borges O legado da tradição clássica no século XIX: Castilho José, tradutor de Catulo Araraquara – SP 2010 JOANA JUNQUEIRA BORGES O legado da tradição clássica no século XIX: Castilho José, tradutor de Catulo Trabalho de Conclusão de curso apresentado à Faculdade de Ciências e Letras- UNESP/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Letras. Orientador: Prof. Dr. Brunno Vinicius Gonçalves Vieira Araraquara - SP 2010 Borges, Joana Junqueira O legado da tradição clássica no século XIX: Castilho José, tradutor de Catulo / Joana Junqueira Borges – 2010 48 f. ; 30 cm Monografia de conclusão de curso (Graduação em Letras) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Letras, Campus de Araraquara Orientador: Brunno Vinicius Gonçalves Vieira 1. Noronha, José Feliciano de Castilho Barreto e. 2. Catulo, Caio Valerio. 3. Teoria da tradução. 4. História da tradução. I. Título. JOANA JUNQUEIRA BORGES O legado da tradição clássica no século XIX: Castilho José, tradutor de Catulo Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Ciências e Letras – UNESP/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Bacharel. Orientador: Prof. Dr. Brunno Vinicius Gonçalves Vieira Data de aprovação: ___/___/____ MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA: Presidente e Orientador: Prof. Dr. Brunno Vinicius Gonçalves Vieira Universidade Estadual Paulista Membro Titular: Prof. Dr. João Batista Toledo Prado Universidade Estadual Paulista Membro Titular: Prof. Ms. Guilherme Gontijo Flores Universidade Federal do Paraná Local: Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciências e Letras UNESP – Campus de Araraquara Dedico este trabalho aos meus avós paternos Miguel e Francisca e maternos Antônio Augusto e Maria do Carmo que, mesmo distantes ou ausentes estiveram comigo e me incentivaram, fazendo com que seus valores e confiança, me permitissem chegar até aqui. Muito obrigado por me acompanharem! AGRADECIMENTOS Aos meus pais Murilo e Ana Lúcia, que mais do que apoio financeiro e emocional torcem, incentivam e acreditam no meu trabalho. Aos meus irmãos Lorena e Thalles, pelo carinho, pelos risos e momentos de distração e diversão. À toda a família, avós, tios e primos pela convivência, apoio e companheirismo. À família de amigos Edimar, Silvio, Mariá, Jamil, Mônica, Nivaldo, João, Silvinho, Pedro, Fábio, Jaime, Gil, Mariana, Chico, Ricardo Molina e Helena Britto pelas batucadas e cantorias. Ao Tio Ivan e à Tia Lígia, não só pelo apoio financeiro e credibilidade que me depositaram, mas por me permitirem, através da Bia, fazer parte da família linda que eles construíram. À Bia, Mirele, Ana e Laura por serem minhas amigas. À Iris, Liana e Patrícia que se tornaram a minha família de longe de casa. E à Julia, Viviane e Poliana que me ensinaram a andar sozinha quando cheguei a Araraquara. Aos meus amigos, os de longe e de perto, os de lá e de cá um agradecimento especial pelas risadas e momentos que sempre me serviram de incentivo e apoio. Ao meu orientador Prof. Dr. Brunno Vinicius Gonçalves Vieira, pela paciência ao me ensinar a me conduzir na realização do trabalho que realizamos hoje, sem nos esquecer de que ainda há muito a fazer. Ao Prof. Dr. João Batista Toledo Prado, por ter conseguido, do seu jeitinho especial, fazer com que o latim não desistisse de mim. RESUMO Buscando contribuir com a pesquisa de traduções lusófonas dos clássicos greco-romanos e com a recepção desses textos em nossas letras, o presente trabalho procura inventariar, estudar e divulgar a obra tradutória de José Feliciano de Castilho, um distinto luso-brasileiro que viveu no Rio de Janeiro de 1847 até sua morte em 1879. Com foco as traduções de poéticas de Catulo, este trabalho mostra nossa tentativa de aliar a formação em língua latina e a abordagem em história da tradução. Palavras chave: Castilho José, Catulo, Teoria da Tradução, História da Tradução. ABSTRACT Seeking to contribute to the research of classical Greek and Roman translations into Portuguese and to the reception of these texts in Brazilian literature, this study intends to inventory, study and promote the work of translation of José Feliciano de Castilho, a distinguished Luso-Brazilian who has lived in Rio de Janeiro from 1847 until his death in 1879. Focusing on the poetic translations of Catullus, this study shows our intent to put together the learning of Latin language and approaches of history of translation. Keywords: José Feliciano de Castilho, Catullus, Translation Teory, Translation History. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................................9 2. MATERIAL E MÉTODOS..................................................................................................12 3. CATULO E SUAS TRADUÇÕES NO SÉC. XIX..............................................................14 4. ANÁLISES...........................................................................................................................17 4.1 Catulo II.........................................................................................................................17 4.2 Catulo V.........................................................................................................................22 4.3 Catulo LXX...................................................................................................................29 4.4 Catulo LXXXV.............................................................................................................34 5. CONCLUSÕES....................................................................................................................36 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................38 9 1. Introdução José Feliciano de Castilho (1810-1879), conhecido como Castilho José, era irmão de Antônio Feliciano de Castilho, influente poeta do Romantismo em Portugal. Castilho José viveu no Brasil de 1847 até sua morte e participou ativamente da cena literária brasileira de então, chegando a participar do círculo literário de D. Pedro II. Em 1858 e 1862 Antônio Feliciano de Castilho publicou no Brasil, respectivamente, as versões portuguesas dos Amores e da Arte de Amar de Ovídio. Castilho José fez notas às traduções desses livros, que ele intitulou Grinalda Ovidiana e Grinalda da Arte de Amar, nas quais se encontram traduções de poetas latinos como Catulo, Propércio, Tibulo, Marcial, Sêneca, Lucano, etc. É relevante, nesse sentido, a leitura dessas traduções por autores brasileiros coetâneos, dentre os quais citamos Machado de Assis1 e Joaquim Manoel de Macedo (1879), entre outros que tiveram acesso às traduções dos irmãos Castilho. Há, inclusive, testemunhos de saraus literários nas dependências do Colégio D. Pedro II com a presença do monarca, nos quais se reuniam alguns dos mais destacados literatos, por vezes, para declamar traduções e estudos de literatura clássica (FLEIUSS, 1928, p. 896-7; PARANAPIACABA, 1906, p. 39 e ss.). Buscando contribuir com a pesquisa de traduções lusófonas dos clássicos greco- romanos e com a recepção desses textos em nossas letras, a presente monografia, resultante do projeto José Feliciano de Castilho e a tradição clássica no séc. XIX: as traduções dos poemas latinos encontrados na Grinalda Ovidiana2 procurou concentrar-se na (re)edição e análise das traduções do poeta latino Catulo constantes nesse comentário de Ovídio. Para uma análise mais completa, foi imprescindível também um embasamento que, em nosso caso, se deu de acordo com teorias da literatura e de tradução, como as de Haroldo de Campos, Berman e Peter Burke. Partimos da premissa de que a tradução é a busca por um 1 Há na Biblioteca de Machado de Assis um exemplar da Arte de Amar com dedicatória dos irmãos Castilho (MASSA, 2001, p. 40). 2 O projeto mencionado contou com apoio financeiro da FAPESP. (Processo: 2009/11040-8) 10 equivalente na língua do texto de chegada, considerando o contexto histórico e as teorias de literatura em voga na época em que foi realizada a tradução, ou seja, um texto traduzido no Romantismo trará marcas dessa escola literária, além de marcas de estilo e características do tradutor, levando-se em conta que os textos de partida estudados nesse projeto são textos latinos e, portanto, muito distantes historicamente tanto dos textos de Castilho José quanto de nossa época, é preciso que tais diferenças históricas e lingüísticas sejam levadas em consideração. A importância das contribuições da História da Tradução para as práticas tradutórias atuais tem sido evocada recentemente pela crítica. Segundo Berman (2002), para traduzir e para a evolução da tradução, é fundamental a constituição de uma história da tradução. Para ele, uma teoria moderna da tradução parte da premissa de refletir e de recriar a partir de traduções e transcrições já existentes. Em Burke (2009), destaca-se a relevância do estudo das práticas tradutórias antigas, atentando para as especificidades de seu contexto de produção e divulgação. São perspectivas como essas que embasam nosso trabalho com Castilho José. Em A tradução literária no Brasil, José Paulo Paes (1990) já aponta para a dificuldade de se construir uma história da tradução literária, por falta de documentos e de bibliotecas que possam nos dar embasamento para tais estudos, ora, temos em mãos um acervo considerável de poemas latinos traduzidos por Castilho José (para se ter uma ideia o projeto de mestrado apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Estudos Literáios, propõe um estudo nosso de 50 epigramas de Marcial nas notas da Grinalda da Arte de Amar), de modo que só pelo volume de sua produção já seria importante analisar e trazer à tona a produção desse tradutor. Pretendemos, neste trabalho, compilar a quase totalidade dos poemas de Catulo presentes na Grinalda Ovidiana, possibilitando, além de uma história da tradução do legado clássico, material, teorias e práticas para futuras traduções latino-portuguesas. Um exemplo recente da potencialidade dessas traduções antigas pode-se ver nas versões homéricas de 11 Haroldo de Campos que partem de uma reescritura e retradução de Odorico Mendes, cuja obra tradutória vem sendo reeditada recentemente. O próprio Haroldo de Campos, como teórico da tradução, afirma que o que lemos hoje são “sucessivas leituras sobrepostas ao longo dos séculos a alguma transcrição do poema a qual é centena de anos mais recente do que o original irremediavelmente perdido” (1984, p.240), podemos entender então, a tradução como um processo de releitura e reescritura3, uma vez que nem as traduções para o português, nem a versão latina que temos acesso, são reproduções exatas do texto latino. Partindo dessa afirmação, podemos perceber então, a importância do contato com as diversas traduções para uma retomada histórica dos textos, em especial, dos que remetem à Antiguidade Clássica. Vale ainda dizer que não entramos no mérito de dizermos se tal tradução é boa, ou se é melhor ou pior do que outras, fazemos sim, uma análise do quanto essa tradução é parafrástica ou literal, examinando elementos de que o tradutor se valeu a partir do texto de partida e verificando os traços de estética literária em voga na época de Castilho José. Além do estudo detido dessas traduções pretendemos obter também parâmetros para estudos de tradução lusófona nesse momento histórico do século XIX. Tendo sido Castilho José uma figura importante na cena literária lusófona desse período, tanto no Brasil quanto em Portugal, ao considerarmos sua vasta obra tradutória e filológica, não nos resta dúvida sobre a importância do estudo de seu legado e sobre a necessidade do seu resgate para os tradutores de obras greco-romanas. 3 A dinâmica do processo de reescritura e retradução são preocupações atuais que podem ser verificadas em publicações recentes (FALEIROS, 2008; LEFEVERE, 2007), tais leituras serão mais desenvolvidas no nosso projeto de mestrado.. 12 2. Material e métodos A pesquisa teve natureza empírica de caráter exploratório, pois deu continuidade à formação em Língua Latina, bem como forneceu subsídios no campo linguístico e literário que nos permitiram elaborar e comentar traduções de textos latinos sob a supervisão do orientador. O trabalho teve como ponto de partida a coleta e transcrição das traduções castilhianas. Realizou-se o estudo dos poemas de Catulo encontrados na Grinalda Ovidiana4, que perfazem um corpus de cinco textos. Os poemas de Catulo se encontram nas páginas 131, 373-75, 632, 636 e 766. Feita a reprodução diplomática6 do texto, nosso trabalho se desenvolveu de acordo com as 5 etapas que se seguem: a) Estudo do contexto em que a tradução é evocada: Qual a justificativa de Castilho José citar a tradução? O que vem antes e o que vem depois? Larbaud, falando sobre as escolhas semânticas do tradutor, adverte-nos sobre a importância do contexto no estabelecimento do sentido em tradução: [A tradução] trata das palavras de um autor, impregnadas e carregadas do espírito dele, modificadas quase imperceptivelmente, mas muito profundamente, quanto à sua significação bruta, pelas intenções e diligências desse autor, às quais só temos acesso graças a uma compreensão íntima de todo o contexto, e por contexto entendemos primeiro toda a parte da obra que foi escrita antes dessa palavra e, as seguir, toda a parte que foi escrita depois e que pode nos explicar retrospectivamente a intenção contida na palavra que estamos pesando (LARBAUD, 2001, p.78). b) Transcrição do texto latino da versão de Castilho José (quando não fornecido, pesquisá-lo em edições de obras latinas coetâneas, tais como as publicadas pela 4 A edição da Grinalda Ovidiana a ser utilizada é: OVÍDIO. Os amores de P. Ovídio Nasão. Paráfrase por Antonio Feliciano de Castilho, seguida pela Grinalda Ovidiana, por José Feliciano de Castilho. Rio de Janeiro: Bernardo Xavier Pinto de Sousa, 1858. 11 Volumes. Disponível on line no site da Biblioteca Nacional de Portugal http://purl.pt/6255, acesso em 23.04.2009. 5 Os versos dessas páginas correspondem à tradução de Castilho José ao carme LXVII de Catulo, que não foi incluído na presente monografia devido à sua extensão. 6 reprodução diplomática é a cópia tipográfica do texto como se fosse completa e perfeita cópia do mesmo, na grafia, nas abreviações, nas ligaduras, em todos os seus sinais e lacunas inclusive nos erros e nas passagens estropiadas” (SPINA, 1994, p. 84-5). 13 coleção Panckoucke cf. CATULLE, 1837 e MARTIAL, 1835) e elaboração de uma tradução de serviço por parte do pesquisador iniciante. Entende-se por tradução de serviço: a que, considerada a enorme distância em que o tradutor moderno se encontra da vida quotidiana e coloquial do idioma do qual deve traduzir, o obriga ao trabalho, frase a frase, em que, por isso mesmo, o resultado da tarefa de traduzir não se distingue muito da análise ou descrição do sistema gramatical. […] As exigências quanto a esse tipo de tradução não vão além dos conhecimentos subministrados pelos gramáticos e gramáticas da tradição e pelas outras obras de referência, no que concerne ao léxico, ou antes, às definições léxicas ali consagradas (LIMA, 2003, p.14) c) Atualização de grafia e acentuação da tradução castilhiana, segundo o Vocabulário ortográfico da Língua Portuguesa (SANDRONI, 2009) e os Índices de nomes próprios gregos e latinos (PRIETO; PRIETO; PENA, 199_). Os critérios de estabelecimento do texto em português serão pautados naqueles fixados pela “Comissão Machado de Assis” na “Introdução crítico-filológica” da edição crítica das Memórias póstumas de Brás Cubas de Machado de Assis (cf. ASSIS, 1960, 45-102). d) Notas de esclarecimento de termos específicos da Cultura Romana, baseadas em repertórios tais como o Dicionário de Mitologia (GRIMAL, 1966) e o Dicionário Oxford de Literatura Clássica (HARVEY, 1987). e) Notas sobre as escolhas tradutórias de Castilho José: versificação; rima; questões estilísticas da tradução; acréscimos do tradutor; mudanças ou inserções de sentido em relação ao original latino. Para a elaboração dessas notas foram essenciais alguns manuais contemporâneos a Castilho José, tais como a Arte de traduzir de Latim ao Português (ALBUQUERQUE, 1818), de e Tratado de metrificação portuguesa (CASTILHO, 1874). 14 3. Catulo e suas traduções do séc. XIX Para apresentação desta monografia, segue-se, então, uma breve notícia sobre Catulo e sua obra que serve aqui de breve introdução à transcrição e análise das traduções de seus poemas, que constituem a parte principal do presente trabalho. Caio Valério Catulo, poeta latino que nasceu entre 87 e 84 e morreu entre 57 e 54 a. C., era natural de Verona, cidade localizada ao norte da Itália, que está presente em vários de seus poemas, mas se estabeleceu em Roma. Catulo fez parte do círculo de poetas que Cícero denominou poetae noui ou neóteroi, “poetas novos” e sua importância, segundo Oliva Neto que traduziu e anotou na década de 1990 o Livro de Catulo, foi introduzir em Roma a expressão latina da poética helenística (OLIVA NETO, 1996, p. 18). A poesia de Catulo é programaticamente delicada e alegadamente despretensiosa. Seu conteúdo aborda temas em nada austeros. Seus poemas são em sua maioria breves, com uso de linguagem delicada como testemunham o extenso emprego de diminutivos e a coloquialidade com que o eu-lírico se expressa. Já no poema I, o eu-lírico considera sua obra um libellus (livrinho) que abriga nugas (bagatelas, coisas sem nenhum valor), denominações que se remetem ao tamanho e ao conteúdo do livro, mas que indicam também o projeto poético com que Catulo pensou seu trabalho. Catulo utiliza em seus poemas uma crítica acirrada aos políticos corruptos, aos ladrões de seus pertences, aos ambiciosos, destilando um veneno poderoso em seus escritos. Mas foi pelos versos em que canta seu amor a Lésbia que Catulo se tornou célebre. É muito discutida a existência ou não de tal mulher, se era homenagem à poetisa Safo que era da ilha de Lesbos, se era pseudônimo de Clódia, ou até mesmo se, de fato, houve envolvimento de uma mulher real com Catulo. Temos que admitir, entretanto, que a articulada sinceridade do eu-lírico – por exemplo quando ele conversa consigo próprio – e a vívida história de amor transmitida em seus poemas sustentaram interpretações biográficas para sua obra. 15 Por outro lado, há estudos atuais que evidenciam, mostram e tentam provar que os poetas da Antiguidade não escreviam somente o que viviam. E convenhamos, mesmo no caso afirmativo não teríamos como saber se viveram o que escreveram. Castilho José trata dessa questão biográfica de modo muito avançado para o seu tempo quando discute o episódio de Corina de Ovídio (tal episódio será abordado neste trabalho mais adiante), assim como nosso comentador já antecipava, contemporaneamente analisamos Lésbia como uma personagem criada pelo autor, levando em conta os lugares-comuns da elegia erótica. Chegaram aos nossos dias pouco mais de cem poemas de Catulo, 116 para sermos mais exatos. Oliva Neto segue a tradição que divide o livro de Catulo segundo a metrificação e propõe a seguinte repartição: do carme 1 ao 60 composições de metro variado; do 61 ao 68 temos os poemas mais trabalhados, longos e eruditos, chamados de carmina longiora ou docta e do 65ao 116 são todos em dístico elegíaco. Dos cinco poemas de Catulo encontrados na Grinalda Ovidiana7 (dos quais quatro serão abordados no presente trabalho) o II e o V encontram-se entre as composições de metro variado. Incluem-se também na seção de dísticos elegíacos, assim como o LXX e o LXXXV. Resta-nos a dúvida sobre qual a verdadeira motivação dessa variada seleção do tradutor português, o mais provável é que ele tenha escolhido esses poemas conforme seus comentários aos versos dos Amores suscitavam. Verificamos algumas versões da obra de Catulo no séc. XIX. Temos desse período traduções de autores românticos, tais como Almeida Garrett, que traduziu os poemas V, VII, X e XIII por volta de 1824. Nessa tradição romântica se pode incluir também o Curioso Obscuro, pseudônimo de Aires Gouveia, que traduziu os poemas V e VII (GOUVEIA, 1913). A eles agora cabe acrescentar José Feliciano de Castilho, que verteu à nossa língua os poemas II, V, LXVII, LXX e LXXXV. 7 Como já dissemos, excluímos do córpus desta monografia o poema LXVII por questões do limite de páginas desta monografia. Trata-se um poema relativamente longo em dísticos elegíacos, que pode ser inserido entre os carmina longiora ou docta. 16 As traduções de Catulo encontram-se nas notas de Castilho José às traduções de Castilho Antônio dos Amores de Ovídio. Em tais notas, percebe-se que, quando Castilho José insere alguma tradução que não é de sua autoria, adota o costume de citar o nome do autor da versão, de maneira que até onde conseguimos apurar, é de autoria de Castilho José as versões portuguesas de Catulo presentes na Grinalda Ovidiana. Ora, muitos dos poemas latinos cuja tradução é atribuída atualmente a Castilho Antônio foram na verdade vertidos por Castilho José. Na antologia Poesia da coleção “Clássicos Jackson” – muito trivial nos sebos de hoje, mas sinal de prestígio na década de sessenta -, uma obscura, senão ambígua, delimitação de autoria feita por Mesquita entre aquelas traduções atribuídas a “A. F. de Castilho” e a “Castilho” – isto é, José Feliciano de Castilho - levou a uma confusão de nomes que favorece o primeiro. É importante que se diga, entretanto, que os poemas de Catulo e Marcial estampados naquela antologia têm como fonte a “Grinalda Ovidiana” e seu tradutor é de fato Castilho José. (VIEIRA, 2009, p. 77-78) Dos poemas traduzidos por Almeida Garrett, o V e o VII são poemas de temática amorosa, o que ocorre também com a seleção de Aires Gouveia. Dos cinco traduzidos por Castilho José apenas o LXVII é de invectiva. Verificamos, então, no caso do nosso tradutor, também uma predominância dos poemas de temática amorosa, o que pode ser explicado pelo gosto romântico vigente em tal época. Essas traduções pretendem, na maioria das vezes, inserir esquemas de rimas e metros, de estilo e de tema românticos, há, por exemplo, nas versões uma tendência a enfatizar o uso da função emotiva da linguagem através de exclamações e interjeições, procedimento este muito utilizado por Castilho José. A seguir, apresentaremos os poemas de Catulo. 4. Análises 4.1 Catulo II 4.1.1 Estudo do contexto em que a tradução é evocada Castilho José verte para o português os versos do poema II de Catulo ao anotar a tradução da sexta canção do livro II dos Amores de Ovídio. A canção trazida para o português por Antônio Feliciano de Castilho, intitulada de “A morte do papagaio”, traz à tona 17 comentários de outros autores que dedicaram seus versos à perda de animais de estimação e sobre o costume de possuir papagaios, que eram raros e muito estimados. 4.1.2 Texto latino: reprodução fac-similar (CATULLE, 1837, p.4) 4.1.3 Tradução escolar Passarinho, delícias da minha menina com quem ela costuma brincar e quem ela costuma ter junto ao seio, a quem, enquanto ele se aproxima, ela costuma dar a ponta do dedo e a quem ela costuma incitar agudas bicadas: quando ao meu desejo abundante agrada brincar com não sei o que de precioso (Como consolozinho de sua dor: creio, para então o pesado ardor acalmar) Que eu possa brincar contigo, da mesma maneira que ela, [que eu possa] aliviar as tristes inquietações do espírito tão agradável a mim, quanto para a menina veloz que contam ter sido a maçã dourada que desatou o cinto há muito ligado. 4.1.4 Tradução de Castilho José 4.1.4.1 Transcrição diplomática da tradução Gracioso passarinho, Delicias da minha amada; Tu que tens parte em seos brincos, Em seo regaço pousada; Que o dedinho lhe- provocas, E a quem ella, com prazer, O dedinho logo entrega, Excidando- te a morder! 18 Quando está de mim saudosa, E então lhe- dá na vontade Buscar em brincos mais ternos Allívio á dura saudade. Por calmar, segundo eu cuido, De seo peito o amante ardor, E dar um consolosinho Solitaria á sua dor, Comtigo brinca. Esses brincos Não os- podêr eu brincar! Ai! tivesse- te eu como ella, Que me- rira do penar! O bem, o bem passarinho, Que eu te- havia de querer! O tal fructo douradinho Que á moça de bom correr O virgineo esquivo cinto Se diz ter soltado emfim, Certo não lhe- era mais grato Do que o tu fôras a mim! 4.1.4.2 Texto atualizado e anotado Gracioso passarinho, 1 Delícias da minha amada;8 Tu que tens parte em seus brincos,9 Em seu regaço pousada;10 Que o dedinho lhe provocas, 5 E a quem ela, com prazer, O dedinho logo entrega, Excitando-te a morder!11 Quando está de mim saudosa, E então lhe dá na vontade 10 Buscar em brincos mais ternos12 Alívio à dura saudade. Por acalmar, segundo eu cuido,13 De seu peito o amante ardor E dar um consolozinho 15 Solitária à sua dor, Contigo brinca. Esses brincos Não os poder eu brincar! Ai! Tivesse-te eu como ela, Que me rira do penar!14 20 8 Delícias: coisa deliciosa ou que dá prazer. (AULETE, 2007, doravante CA) 9 Brincos: ação ou resultado de brincar, brincadeira. (CA) 10 Regaço: colo. 11 Excitar: no texto impresso lemos “excidar” e entendemos ser a troca do t por d um evidente erro tipográfico. 12 Terno: afetuoso. (CA) 13 Cuidar: imaginar, julgar, supor. (CA) 14 Que me rira do penar: “que eu me riria do sofrimento”. Atentemos para o uso da forma do pretérito mais-que- perfeito (rira) com valor de futuro do pretérito. 19 O bem, o bem, passarinho, Que eu te haveria de querer! O tal fruto douradinho15 Que à moça de bom correr16 O virgíneo esquivo cinto17 25 Se diz ter soltado enfim,18 Certo não lhe era mais grato Do que o tu foras a mim!19 4.1.5 Comentários O TC é composto de versos em redondilhas maiores. Aqui, como costuma fazer, Castilho José adota as quadras populares e o esquema de rimas que comumente é usado em tais versos, ou seja, rima o segundo com o quarto verso consecutivamente. Segundo o Tratado de versificação de Castilho Antônio: “(quadras) são estrofes de quatro versos, cujo quarto rima com o segundo, ficando soltos o primeiro e o terceiro.” (CASTILHO, 1874, p. 132) É curioso que, embora o tradutor se sirva de quadras, ele não as separa como faz quando traduz dísticos. Podemos conjecturar, já que isso ocorre com esse poema e com o 5 – é verdade que lá com outros esquemas estróficos –, se não seria o caso de uma particularidade métrica para verter um poema todo em hendecassílabos falécios, ou seja, todo escrito em uma única espécie de metro. 15 O tal fruto douradinho: menção ao pomo dourado de Atalanta. Cf. nota 18. 16 Moça de bom correr: “da moça veloz”. Refere-se à Atalanta. Há duas, como dito por CJ, uma arcádica e outra beócia. CJ opta pela versão arcádica na Grinalda Ovidiana, “Parece ser aquela, filha de Jasião. Louca pelo exercício da caça, passava nele os dias. Pretendeu conservar sua virgindade; mas obrigando-a seu pai a escolher esposo, pôs como condição o perseguir, armada, os seus pretendentes até um alvo, para dar a morte ao que surpreendesse, ou a mão ao que vencesse na carreira. Milânion não receou a sorte de tantos que o haviam precedido, e Vênus lhe deu uns pomos de ouro, que o pretendente ia lançando no caminho; Atalanta ia se abaixando para os levantar, e Milânion a venceu e desposou.”(OVÍDIO, 1858, p. 426-427). Oliva Neto opta pelo mito beócio, onde o pretendente é Hipômenes.(CATULO, 1996, p. 184 doravante ON) 17 O virgíneo esquivo cinto: “fugidio cinto virginal”. Esquivo: que evita o trato, a convivência, fugidio. (CA) Cinto: faixa presa à cintura das virgens e solta pelo marido no leito nupcial. (ON) 18 Se diz ter soltado enfim: “(fruto douradinho), que contam soltou enfim o cinto virginal”. Como o tradutor usa de inversões que deixam obscura a tradução da passagem convém fornecer uma paráfrase: “O tal fruto douradinho que se diz ter soltado enfim o virgíneo esquivo cinto à (da) moça de bom correr”. 19Do que o tu foras a mim!: “Do que tu o serias a mim”. Atentemos para o uso da forma do pretérito mais-que- perfeito (foras) com valor de futuro do pretérito. 20 Posteriormente verificaremos traduções em que Castilho José se vale de mais acréscimos e de mais liberdade tradutória do que neste carme de Catulo. Os acréscimos aqui parecem incidir principalmente para corroborar o esquema de rimas e metro proposto. Considerando que o TP tem 13 versos e o TC 28, verificamos que para cada verso latino, Castilho José realiza dois versos portugueses, verificaremos posteriormente que o autor normalmente adota tal método para traduzir versos latinos; na maioria das vezes, o dístico elegíaco é vertido como quadra popular. Percebemos isso de modo bem claro ao verificarmos que Castilho José verte os dois primeiros versos do TC para “Gracioso passarinho,/ Delícias da minha amada;” isso equivale ao primeiro verso latino Passer, deliciae meae puellae, "Passarinho, delícias da minha menina", tal artifício é adotado em grande parte do poema. Verificamos também que as palavras que Castilho José utiliza para verter o poema de Catulo não se afastam muito em sentido do TP, como por exemplo: puellae, que vertemos literalmente por “menina”, pode ser encontrada no dicionário de Faria por “amada”, e verificamos que essa escolha se deve à rima de “amada” com “pousada”. Podemos dizer que tal alteração não muda totalmente o sentido do texto. Castilho José verte o verbo no infinitivo ludere, "brincar", pelo substantivo “brincos”, preservando o sentido, isso ocorre também com o verbo no infinitivo incitare por “excitando- te”, onde a escolha do poeta português, não é a primeira acepção, mas uma das alternativas do sentido figurado do verbo no dicionário, e quando traduz desiderio meo por “de mim saudosa”, que novamente não é a primeira acepção do verbo, mas que pode ser encontrada em Saraiva e interpretada dessa maneira. Percebemos alguns acréscimos em virtude de rimas e de métrica, como o adjetivo “gracioso” que Castilho José inicia o poema, o acréscimo se deve ao fator métrico, para que o verso Passer, deliciae mea pullae, “Passarinho, delícias da minha menina” pudesse ser vertido em dois versos de sete sílabas. Como ainda em “com prazer”, que não está presente no 21 TP e que é empregado com o intuito maior de rimar o segundo com o quarto verso “morder”, mas ainda assim, preserva o sentido e podemos dizer que reafirma o prazer da menina ao brincar com o pássaro. Nessa mesma categoria de acréscimos, incluímos a dupla utilização de “dedinho” (no TP digitum, “dedo”, não aparece no diminutivo, podemos nos questionar se Castilho José tendo conhecimento dos diminutivos em Catulo, optou por preferir esse diminutivo), que nos parece ter sido aplicada por questões métricas e para que fosse possível arrematar a quadra. Ao trabalhar com o verso solatiolum sui doloris, “consolozinho de sua dor”, o autor vale-se da repetição do sentido desse verso em três versos. Primeiramente, no verso 12, com “Alívio à dura saudade”, onde traduz doloris por “saudade” e solatiolum por “alívio”. Posteriormente, no verso 15 e 16, digamos que ele é um pouco mais literal, já que verte doloris por “dor” e solatiolum por “consolozinho”. Por essas versões, percebemos que Castilho José preserva novamente a marca do diminutivo, assim como em “fruto douradinho” (v. 23 do TC) deixando o poema mais delicado e mantendo ainda a linguagem poética de Catulo. Percebemos que no primeiro verso da terceira quadra o autor opta por “saudade” para que rime com “vontade”, no segundo verso percebemos que para a métrica o autor verte o único verso do TP em dois versos heptassílabos, como de costume. A repetição não tem valor meramente métrico e de rima, mas também para reforço de sentido. Nem sempre o acréscimo e a interpretação do autor são próximos do sentido e do significado do TP, por exemplo, em gravis acquiescat ardor, “o pesado ardor acalmar”, Castilho José verte gravis por “amante”. Analisando a tradução no sentido de que o “pesado ardor” é causado pelo “amante” verificamos que a interpretação do tradutor português, aqui, foi mais livre do que no conjunto da tradução. Outro momento em que o Castilho José se vale de uma tradução bastante parafrástica é ao verter os versos Tecum ludere, sicut ipsa, possem,/ Et tristis animi levare curas por 22 “Contigo brinca. Esses brincos/ Não os poder eu brincar!/ Ai! Tivesse-te eu como ela/ Que me rira do penar!”. Nota-se que ele se vale mais do sentido apreendido no TP do que de elementos sintáticos, apesar de tais elementos não serem completamente ausentes (o tradutor utiliza-se de “contigo”, do verbo “brincar” no infinitivo que estão presentes no TP dessa maneira), verificamos que essas utilizações não buscam a literalidade mas a paráfrase como um todo. 4.2 Catulo V 4.2.1 Estudo do contexto em que a tradução é evocada Castilho José faz para quinta canção do livro II, intitulada “A Corina, infiel num banquete”, uma extensa análise, na qual opina sobre onde cairia melhor inserir esse poema. Sua sugestão é que ele deveria seguir a quarta canção do livro I, onde o ‘poeta’ provoca uma dama igualmente em uma cena de banquete.. O comentador cita Tibulo, trata sobre o ciúme, e insere notas a versos específicos do poema vertido por Castilho Antônio, além de outras traduções, como uma francesa, uma portuguesa de Sr. F. G. Braga, evidenciando a importância dos versos de Catulo para o Romantismo. Ao comentar o verso 99, “Destes beijos matou-me a doçura”, Castilho José discorre sobre a recorrência do tema dos beijos, citando autores como Doras, João Secundo, Álvares de Azevedo, entre os quais insere também Catulo. Segundo o comentador, “a moda de os cantar, posto que seja muito menos antiga que a de os dar e receber, tem entretanto por si a nobreza da antiguidade” e como exemplo disso traduz o que chama de “um dos mais galantes carmes de Catulo” (OVÍDIO, 1858, p. 632). 4.2.2 Texto latino: reprodução fac-similar (CATULLE, 1837, p. 8) 23 4.2.3 Tradução escolar Para Lésbia Vivamos; minha Lésbia, e amemos, e os rumores dos velhos mais severos todos estimemos o valor de um asse. Sóis podem morrer e voltar: por nós uma vez que morreu a [nossa] breve luz, uma noite perpétua deve ser dormida. Dá-me mil beijos, depois cem; depois outros mil, depois um segundo cento; depois sem parar outros mil, depois cem: depois, quando muitos milhares tivermos feito, misturá-los-emos, para não sabermos, ou para que nenhum mau possa ter inveja, quando souber que foram tantos os beijos. 4.2.4 Tradução de Castilho José 4.2.4.1 Transcrição diplomática da tradução CARME 5 p. 632 VIVAMUS, MEA LESBIA. Vivamos, Lesbia querida! Gozemos nossos amores! Não faças caso dos velhos; Deixa gritar os censores. Os soes podem morrer, E aos depois renascer; p. 633 Porém nós, em se-apagando 24 A luz da curta vida, Uma só noite eterna durmiremos, Minha Lesbia querida! Dá-me mil bejos! E’ pouco; vem! Dá-me ainda cem! Lesbia gentil Dá-me outros mil! Farta de bejos meo amor violento, Dá-me outro cento... Mais mil, querida Lesbia encantadora; Mais outro cento agora. Vae-m’os dando aos centenares; Não cesses, Lesbia, não rias; Vae-m’os dando aos milhares... Toda a conta por fim perturbaremos Com bejos apressados, Com bejos não contados, Que nem nós lhes-possamos O número dizer, Nem qualquer inimigo Nos-possa inveja ter, Sabendo a quanto monta A nossa bella conta! 4.2.4.2 Texto atualizado e anotado Carme 5 VIVAMUS, MEA LESBIA. Vivamos, Lésbia querida! Gozemos nossos amores! Não faças caso dos velhos; Deixa gritar os censores.20 5 Os sóis podem morrer, E ao depois renascer; Porém nós, em se apagando A luz da curta vida, Uma só noite eterna dormiremos, 10 Minha Lésbia querida! Dá- me mil beijos! É pouco; vem! Dá-me ainda cem! Lésbia gentil 15 Dá-me outros mil! Farta de beijos meu amor violento,21 20 Censor: na Roma antiga, magistrado que fazia o censo populacional, arrecadava os impostos e respondia pelos bons costumes. (CA) 21 Violento: intenso. (CA) 25 Dá-me outro cento... Mais mil, querida Lésbia encantadora; Mais outro cento agora. 20 Vai mos dando aos centenares; Não cesses, Lésbia, não rias; Vai mos dando aos milhares... Toda a conta por fim perturbaremos Com beijos apressados, 25 Com beijos não contados, Que nem nós lhes possamos O número dizer,22 Nem qualquer inimigo Nos possa inveja ter, 30 Sabendo a quanto monta A nossa bela conta! 4.2.5 Comentários Diferentemente dos outros poemas analisados nesse corpus o V foi vertido por Castilho José com uma métrica variada e não apenas em redondilhas maiores, como encontram-se os versos iniciais “Vivamos, Lesbia querida!”; encontramos ainda versos com seis sílabas poéticas como “Os sóis podem morrer”; versos decassílabos com em “Uma só noite eterna dormiremos”; e ainda de quatro sílabas métricas como “Dá-me mil beijos!”. Percebemos nesse TC, diferentemente das outras traduções cuja a proporção é em média de um verso latino para dois versos portugueses, um considerável acréscimo no número de versos, já que o TP apresenta 13 versos e o TC 32 versos. Talvez isso se dê pelo fato de Castilho José escolher versos menores (de 6 e 4 sílabas) para traduzir o metro do TP que é o endecassílabo falécio, verso que geralmente contabiliza 10 sílabas poéticas. Sabemos que a comparação entre os sistemas métricos português e latino é sempre aproximativa, já que são línguas bem distintas com diferentes modos de contabilizar sílabas (o latino é cronemático, isto é, depende da duração das vogais, enquanto o português contabiliza as sílabas poéticas). 22 “Conhecer o número exato do que se possuía, lembra Gubernatis,aumentava o risco de atrair o mau-olhado, sabedoria popular que um provérbio francês ainda conserva: ‘Brébis comptées, Le loup les mange’ (Ovelhas contadas, o lobo as come)”. (CATULO, 1991, p. 87) 26 À primeira vista, não verificamos uma homogeneidade na ocorrência de rimas, embora seja perceptível a presença delas dada a musicalidade do poema. Numa leitura mais atenta, encontra-se um complexo jogo de metros, estrofes e rimas. De início nos deparamos com uma quadra popular, com o segundo verso rimando com o quarto, “amores” e “censores”, o que pode dar a falsa impressão de que tal forma será adotada em todo o poema. Mas a esse se seguem dois versos de 6 sílabas com rimas emparelhadas, “morrer” e “renascer”, intercalando a rima de dois versos de 6 sílabas, “vida” e “querida” encontramos um verso solto de 7 sílabas “Porém nós, em se apagando”, e outro decassílabo “Uma só noite eterna dormiremos”. A seguir verificamos uma estrofe com cinco versos, sendo um deles solto “Dá- me mil beijos” seguido pela quadra composta de versos tetrassilábicos com rima emparelhada: “vem” rimado com “cem”, “gentil” com “mil”. Castilho José faz então uso de dois dísticos, compostos por um verso de 10 e outro de 4 sílabas poéticas, sendo tais versos rimados entre si “violento” e “cento” e “encantadora” e “agora”. O tradutor acrescenta, na sequência, uma estrofe com três versos, sendo dois versos de 7 sílabas seguidos por um de 6 na qual o primeiro verso “centenares” rima com o último “milhares”. Após se valer de mais um verso decassílabo solto, o tradutor português verte os quatro versos finais do TP em uma estrofe de oito versos de 6 sílabas, composto por um dístico (cf. aqueles terminados em “apressados” e “contados”) seguido por uma sextina, onde tem-se um verso solto “Que nem nós lhes possamos”, dois versos com rima intercalada “dizer” e “ter”, estes intercalados por outro verso solto “Nem qualquer inimigo” e, por fim, dois versos com rimas emparelhadas “monta” e “conta”. 27 Evidencia-se então, que apesar da naturalidade e fluência do TC, Castilho José faz um intricado sistema de metro e rima em sua versão, o que não é comum nesse autor como será percebido nos poemas analisados no presente trabalho. O TC apresenta uma função mais emotiva do que a demonstrada em nossa tradução escolar, o que representa a tradição romântica em que Castilho José se insere. A emoção presente no TC ao falar dos beijos, expressa pela pontuação exclamativa e pela manutenção da amplificação na contabilidade dos beijos (“Dá-me mil beijos!/É pouco; vem!/ Dá-me ainda cem!”). Mesmo essas expressões estando presentes no TP, elas parecem mais evidentes e marcadas no TC, no caso da contabilidade ela toma uma estrofe central no TC. Para que o trato com o intricado sistema métrico e rítmico do TC tivesse o efeito esperado, Castilho José lança mão de acréscimos e paráfrases, algumas mais evidentes, outras nem tanto. Vamos analisá-las um pouco a seguir. Podemos dizer, por exemplo, que o adjetivo “querida” dado à Lésbia no primeiro verso tem relação com o poema de temática amorosa e procura exaltá-la, mas sem tal acréscimo Castilho José não teria alcançado o número de versos desejado na quadra. Em seguida o autor é bastante parafrástico, chegando a excluir o valor monetário presente no TP para falar do descaso dos amantes em relação aos censores “Deixa gritar os censores”, e os próprios “censores” são fruto da interpretação de Castilho José para senum severiorum “velhos mais severos”. Em seguida, o poeta português é mais literal do que nos primeiros versos. Verte soles por “sóis”, ou seja, não excluí a idéia de que os sóis nascem e voltam e nós, ao contrário, uma vez que dormirmos, não mais acordaremos. Para que haja rima entre o nono e o décimo primeiro verso, Castilho José repete o verso inicial “Minha Lésbia querida”, procedimento que não tem paralelo no TP. Podemos 28 supor que essa repetição é proposital no sentido de marcar o início da segunda parte do poema. Seguindo a leitura do poema, percebemos que as estrofes marcadas pela pontuação exclamativa e pela contabilidade de beijos foram meticulosamente trabalhadas por Castilho José em seus acréscimos e paráfrases para que o metro e a rima contribuíssem para esse papel exortativo. O eu-lírico pede beijos à amada e diferentemente do TP que expressa o desejo através da repetição dos advérbios deind(e) por 6 vezes em 4 versos, o tradutor explora a combinação de rimas e metros para alcançar tal efeito. Os acréscimos nesse momento são para que se consiga formar a quintilha, rimando “vem” e “cem” e “gentil” com “mil”. Insere-se o verso solto “Farta de beijos meu amor violento” que rima com “cento” do verso seguinte, assim como “encantadora” com “agora”. O pedido dos beijos no TP é feito seis vezes, no TC sete vezes, os comentários que Castilho José insere entre os versos como “Não cesses, Lésbia, não rias” nos dá a impressão de que no TC o eu-lírico insite mais pelos beijos da amada. Então, ao terminar a conta, ele volta a falar dos beijos, o que reforça ainda mais sua insistência. 29 4.3 Catulo LXX 4.3.1 Estudo do contexto em que a tradução é evocada No Artigo III da Grinalda Ovidiana em que se encontra a tradução do poema 70 de Catulo, Castilho José discute a existência da mulher de nome Corina, presente nos poemas de Ovídio de maneira bastante plural. Ora Corina é apresentada como donzela virginal, ora como prostituta, ora ele quer arrancar-lhe os cabelos, ora invoca Vênus para tê-la. No livro I na terceira canção, o poeta(cabe frisar que Castilho José não se decide pela visão biográfica ou ficcional da obra de Ovídio de modo que colocamos “poeta” como é feito por ele) faz pedidos à Vênus para que Corina o ame ou ao menos se deixe amar, demostrando não haver muitas esperanças no relacionamento; podemos definir essa situação como o “início do amor”. Mas, logo na quinta canção nos é apresentado o amor em sua consumação. Na canção VII a intimidade entre o poeta e Corina é tanta que chega a haver cenas de “palpavel affecto”. Na canção XIV Corina nos é apresentada como uma pessoa já idosa, maltratada pelo tempo; e depois, na canção III do livro III sua beleza se preserva intacta, sem ser atingida pelas punições dos deuses. No livro II na segunda canção o poeta nos dá a entender novamente cenas de “início de amor”, ilustrando o primeiro encontro com a amada. Além dessa não-linearidade, que nos é facilmente detectada, no relacionamento do poeta com Corina, Castilho José chama a nossa atenção para o fato da divergência de comportamento do marido de Corina, que na canção IV do livro II é apresentado como “severo, exigente, brutal” e na canção XIX do mesmo livro é, ao contrário, um marido “suave e complacente”. Non potest idem simul esse et non esse, “não pode uma mesma pessoa ao mesmo tempo ser e não ser”, frisa o autor. Para Castilho José os sentimentos divergentes do poeta em relação à Corina ressaltam a possibilidade dela ser a representação de várias mulheres, que poderiam ou não terem sido amadas por Ovídio. Ele chega a repreender a ordem dos poemas de Ovídio, por se 30 apresentarem em uma sequência que não corresponderia à lógica de um relacionamento amoroso, chegando ao ponto de tomar essa característica como defeito artístico, o que o leva a propor uma ordem dos poemas mais plausível com a verossimilhança da obra. Mas o próprio Ovídio parece explicitar o caráter fantasioso do relacionamento, fato notado pelo próprio Castilho José que transcreve em latim a seguinte passagem dos Tristia: ad leve rursus opus, juvenilia camina, veni, et falso movi pectus amore meum. […] sic ego delicias, et mollia carmina feci, strinxerit ut nomen fabula nulla meum. nec quisquam est adeo media de plebe maritus, ut dubius vitio sit pater ille meo.[…] magnaque pars operum mendax et ficta meorum plus sibi permisit compositore suo. (Tristia, II, 1, 339-40.349-52.355-6 ) moverat ingenium totam cantata per urbem nomine non vero dicta Corinna mihi (Tristia, IV, 10, 59-60) De novo à produção ligeira, aos versos juvenis, voltei E com um amor enganoso perturbei meu coração.[…] Eu compus frivolidades e versos licenciosos Sem que nenhum boato maculasse minha reputação. E não há nenhum marido, nem dentre o povo, que tenha Dúvida de sua paternidade por minha culpa[…] Grande parte de minhas obras é fantasiosa e fictícia E se permitiu mais que ao seu autor. (Tristia, II, 1, 339-40.349-52.355-6 ) Movera-me o engenho aquela mulher, cantada por toda a Cidade, Que chamei pelo falso nome de Corina (Tristia, IV, 10, 59-60)23 Porém, Castilho José acaba não se decidindo se acredita ser pura ficção e questiona o fato de as produções poéticas de Ovídio serem “simplices partos de poetica imaginação”, 23 Trad. Patrícia Prata cf. PRATA (2007). 31 ainda que, ao final do artigo III, evoque também a possibilidade de Corina ser um nome para várias ou se representa, como um mito, a mulher amada. Temos hoje, vários estudos e análises que tratam sobre os lugares-comuns nos poemas da Antiguidade Clássica24. Para a contemporaneidade é preciso analisar Corina como uma personagem do eu-lírico, levando em consideração que os poetas romanos seguiam certos lugares-comuns literários, tradicionais desde os gregos. Ovídio não escapa a esses lugares-comuns e é também pelo hábil emprego dessa tradição poética que foi considerado poeta em seu tempo. Seu ingênio (ingenium) reside nos diversos artifícios no trabalho com os lugares-comuns na elegia erótica. Pela ótica atual não caberia a discussão feita por Castilho José sobre a existência ou não de Corina, pois não interessa se Corina é uma ou se é várias ou até mesmo se ela de fato existiu, mas sim o conteúdo do poema, seus aspectos formais, como Ovídio se remete à tradição poética anterior. Castilho José compara Ovídio com outros poetas elegíacos tais como Galo, Propércio, Catulo e Tibulo, destacando que em todos eles há o uso de um nome “poético” para designar as amantes. Ele apresenta, então, dois poemas de Catulo sobre sua amada, Lésbia, em um deles Catulo a ofende (exprimindo-se sobre ela de um modo que Castilho José não se atreve a colocar em tradução) e em outro, que é o que iremos analisar, ele se expressa “com alguma delicadesa”. 4.4.2 Texto latino: reprodução fac-similar (CATULLE, 1837, p. 168) 24 Achcar (1994) faz um bom relato dessa tradição. 32 4.3.3 Tradução escolar Minha mulher diz preferir se casar com ninguém a não ser comigo, Nem se por ventura o próprio Júpiter lhe pedisse. Diz: mas o que a mulher diz ao amante desejoso, Convém escrever no vento e na impetuosa água. 4.3.4 Tradução de Castilho José 4.3.4.1 Transcrição diplomática da tradução CORINNA OU AMORES Diz-me aquella por quem morro Que me-adora, e a mim só quer; Que até Jove escusaria Pedil-a para mulher; Dil’o, sim, mas em taes dictos Ninguem faça fundamento; São phrases que n’agua escreve, Phrases que fogem no vento. 4.3.4.2 Texto atualizado e anotado Diz-me aquela por quem morro Que me adora, e a mim só quer; Que até Jove25 escusaria26 Pedi-la para mulher; Di-lo, sim, mas em tais ditos 5 Ninguém faça fundamento;27 São frases que n’água escreve, Frases que fogem no vento. 25 Cf. nota 28 e 68. 26 Escusaria: pouparia, evitaria, dispensaria (M). 27 Ninguém faça fundamento: ‘ninguém acredite’ 33 4.3.5 Comentário à tradução O poema de Catulo traduzido por Castilho José é um epigrama em dísticos elegíacos, composto pela alternância entre hexâmetros e pentâmetros. Nesse caso, Castilho José opta por traduzir o LXX em redondilhas maiores, oferecendo uma quadra em português para cada dístico latino, o que dobra o número de versos em português. O tradutor rima o segundo com o quarto verso da quadra, adotando um esquema de rimas comum às quadras populares. No âmbito do conteúdo, há alterações significativas na tradução de Castilho José, mas há também elementos que foram mantidos de forma engenhosa para que não se perdesse a identidade com o original como, por exemplo, a repetição do verbo “dizer” uma vez no primeiro verso da primeira estrofe (primeiro no TP) e duas vezes no primeiro verso da segunda estrofe (terceiro no TP), essa ênfase pode ser interpretada em ambos os casos como um reforço à idéia do falar exagerado e mentiroso da mulher àqueles que a amam, explicando o porquê de não poderem ser escritas suas palavras. Castilho José no TC reforça ainda mais o cuidado em relação ao falatório feminino com o acréscimo “Ninguém faça fundamento” no segundo verso da segunda estrofe. Há em Castilho José um sentimentalismo que não é característico de Catulo, esse exagero é percebido no comportamento do eu-lírico, que declara ser capaz de morrer pela mulher amada, elemento esse que não está presente no TP, em que Catulo limita-se a sugerir o amor da amada por ele, e não o contrário. O exagero de Castilho José estende-se ao não atrevimento de Jove a pedi-la para esposa, subentende-se, de tão grande que é o amor desta pelo eu-lírico: “Que até Jove escusaria/ Pedi-la para mulher”. No TP é a amada que negaria Júpiter Nulli se dicit mulier mea nubere malle/ […] non si se Jupiter ipse petat, “Minha mulher diz preferir se casar com ninguém […]/ Nem se porventura o próprio Júpiter lhe pedisse”. Pode-se pensar que o eu- 34 lírico, conhecendo o comportamento do deus28 pudesse supor que Jove proporia casamento a Lésbia se assim desejasse. Nesse caso, o exagero no TC serve para intensificar a noção do tamanho do amor de Lésbia por Catulo. A troca de Júpiter por Jove no terceiro verso em Castilho José é providencial para a métrica que foi adotada pelo autor. Essa mudança, no entanto, assim como os acréscimos feitos por Castilho José, não alteram significativamente o teor do poema. 4.4 Catulo LXXXV 4.4.1 Estudo do contexto em que a tradução é evocada Logo no título do poema de Castilho Antônio percebemos relação, tanto com o original de Catulo quanto com a tradução de Castilho José. Castilho Antônio intitula seus versos (inspirados em Ovídio) de “Aversão e amor”, Catulo inicia o seu com o também paradoxo “Odi et amo” . Castilho José se vale de diversos poetas para contextualizar a idéia de Ovídio, trancrevendo alguns versos em que o eu-lírico se tornou “escravo de amor” e através do poema procura rebelar-se; como Miguel Anjo Buonarotti29, cujos versos o autor cita em italiano mesmo, sem tradução. Cita então, alguns versos de Marcial e Propércio, bem como um poema de Catulo que ele traduz para ilustrar a referência ao amor e ao ódio (encontrada em III, XI, 81). Além de mencionar outro verso correlato de Ovídio presente em III, XVI, 91 traduzido por Castilho Antônio assim: “Então amo, então detesto”. Essas referências ovidianas lembram a Castilho José estes “mimosos versos de Catullo” com os quais iremos trabalhar agora. 28 O histórico de relações extraconjugais do marido de Juno é vasto. Entre suas conquistas contam-se Alcmena, Antíope, Dânae, Europa, Io, Leda e Sêmele (HARVEY, 1987, p. 520). 29 Miguel Angelo Buonarotti: Michelangelo di Lodovico Buonarroti Simoni, o Michelangelo, pintor, escultor, poeta e arquiteto italiano. 35 4.4.2 Texto latino: reprodução fac-similar (CATULLE, 1837, p. 182) 4.4.3 Tradução escolar Sobre seu amor Eu odeio e amo. Por que eu faço isso? Talvez tu me perguntes. Não sei, mas sinto acontecer e me torturo. 4.4.4 Tradução de Castilho José 4.4.4.1 Transcrição diplomática da tradução O AMOR E O ODIO Amo e odeio ao mesmo tempo. Como pode ser?(perguntas) Duas cousas tão oppostas Ao mesmo tempo tão junctas? Como pode ser ignoro; Sei que o-sinto, a causa és tu, E sei que é tão cru tormento, Que o não pode haver mais cru. 4.4.4.2 Texto atualizado e anotado O AMOR E O ÓDIO Amo e odeio ao mesmo tempo. Como pode ser? − Perguntas. Duas coisas tão opostas Ao mesmo tempo tão juntas? Como pode ser ignoro; 5 Sei que o sinto,30 a causa és tu, E sei que é tão cru tormento, Que o não pode haver mais cru.31 30 Sei que o sinto: “sei que sinto isso (i. é: amo e odeio)”. 31 Que o não pode haver mais cru: “que não pode haver tormento mais duro”. 36 4.4.5 Comentários O TC é composto em quadras rimadas valendo-se de redondilhas maiores. O tradutor rima o segundo com o quarto verso da quadra, adotando um esquema de rimas comum às quadras populares. É digno de atenção a quantidade de acréscimos de que se vale Castilho José, cabe prestar atenção ainda para o fato de Catulo ter escrito seus versos em um único dístico, e o autor da Grinalda se valer de oito versos em redondilhas maiores. Castilho José se vale nesse poema de muitos acréscimos. Alguns que intentam reforçar a idéia inicial de Catulo, como, por exemplo, “ao mesmo tempo” e “Ao mesmo tempo tão juntas?”, no primeiro e no quarto versos da primeira quadra, que têm a intenção de reafirmar que o amor e o ódio acontecem simultaneamente. Pode-se entender também que os dois últimos versos da primeira estrofe “Duas coisas tão opostas/Ao mesmo tempo tão juntas?” expandem o pronome anafórico id, “isso”, do TP que remete ao fato do poeta amar e odiar como um ato único. Se observarmos que o poeta português se vale do adjetivo “cru” para definir tormento, e considerarmos sua significação como “não preparado”, “tosco”, “duro” ( MORAIS), podemos dizer então que, sendo “tormento cru” a versão de Castilho José para excrucior, o autor opta por traduzir o verbo pelo sintagma que tanto no sentido quanto no som retoma o excrucior. Assim o substantivo “tormento” recupera o sentido de excrucior “torturar-se, excruciar-se” e o adjetivo “cru” dá um equivalente sonoro à segunda sílaba de exCRUcior. 5. Conclusões Segundo Haroldo de Campos, o que lemos hoje são “sucessivas leituras sobrepostas ao longo dos séculos a alguma transcrição do poema a qual é centena de anos mais recente do que o original irremediavelmente perdido” (1984, p.240), ou seja, devemos entender a tradução como um processo de releitura e reescritura já que nem as traduções para o 37 português, nem a versão latina de 1835 utilizada aqui, são reproduções exatas do texto latino, mas fazem parte de um longo exercício de interpretação do poema. Segundo pudemos depreender a partir dos poemas estudados, há uma preocupação em cativar o leitor, em obedecer a regras vigentes, como o tom popular das quadras rimadas, a escolha vocabular e a temática dos poemas adotados como exemplo. De um modo geral, percebemos que o tradutor Castilho José preocupava-se em traduzir a essência da poesia latina, vertia para o português o que apreendia e, então, reescrevia o texto de partida em palavras, metáforas e figuras ligadas à tradição literária de sua época. A busca de Castilho José, pelo que pudemos constatar a partir dos textos de Catulo traduzidos, não é pela lealdade ao texto latino, ou pela latinização do texto português, mas sim de um equivalente em nossa língua para que o leitor do século XIX captasse a essência do texto latino inserido em seu contexto literário, histórico e social. Nesse sentido, o trabalho com os textos de Castilho José reafirma a noção de que a tradução se faz quando traduzimos não só o conteúdo do texto, mas quando se consegue incluir nessa tradução a literatura de uma época. Haroldo de Campos cita Antônio Feliciando de Castilho que diz “o tradutor é de algum modo um novo criador” (1998, p.250), essa idéia se reflete na produção tradutória de Castilho José que busca e preza por um equivalente na língua portuguesa, de modo que o seu texto de chegada possua características muito particulares de seu estilo e, como não poderia deixar de ser, do estilo de seu tempo. Esse inventário das traduções de Castilho José permite que se preserve o legado clássico e que se reconstrua uma trajetória de sua tradução/recepção no século XIX. A obra desse poeta-tradutor, tão reverenciada por autores importantes como Machado de Assis e Joaquim Manoel de Macedo, já há tempos merecia esse reconhecimento. 38 6. Referências bibliográficas 6.1 Corpus: obras de Castilho José já localizadas CASTILHO, J. F. A Pharsalia de Lucano: livro VII, A Batalha da Pharsalia. Archivo Pitoresco, Lisboa, vol. VII:198-200; 206-7; 214-6; 222-4; 231-2, 1864 ______. “Cesar no Egypto: excerpto da traducção inedita da Pharsalia de Lucano” – Principio do livro 10.º. Revista contemporanea de Portugal e Brazil, quarto ano, Vol. IV: 289-96, 467-72, 1862. ______. Poema de Lucano, traduzido em português: Pharsalia, canto 6.º. Diário do Rio de Janeiro, ano XLIV, n. 297:. 2; n. 299: 2, 1864. ______. Pharsalia: canto 1.º. Diário official do Império do Brasil, ano de 1864, n. 256: 3; n. 257: 3; n. 260: 3-4. ______. Sobre o Moretum. Revista Contemporânea de Portugal e Brazil, segundo ano, abril de 1860. p. 349-364. ÍRIS. Periódico de Religião, Belas-Artes, Ciências, Letras, História, Poesia, Romance, Notícias e Variedades. Redigido por José Feliciano de Castilho Barreto e Noronha. Periodicidade quinzenal. Volumes disponíveis na Biblioteca Nacional: Ano 1, n.1 (15 de fevereiro de 1848)-anno 2, n.27 (30 de junho de 1849) num total de 27 fasc. Imprenta: Rio de Janeiro, RJ : Typ. do Iris.32 OVÍDIO. Arte de amar de Publio Ovidio Nasão. Tradução de A. F. de Castilho seguidas de comentários de J. F. de Castilho. Rio de Janeiro: Laemmert, 1862. 3 Tomos. ______. Os amores de P. Ovidio Nasão. Paráfrase por Antonio Feliciano de Castilho, seguida pela Grinalda Ovidiana, por José Feliciano de Castilho. Rio de Janeiro: Bernardo Xavier Pinto de Sousa, 1858. 11 Volumes. ______. Os fastos de P. Ovidio Nasão: com tradução em verso português de A. F. de Castilho seguida de copiosas anotações por quase todos os escritores contemporâneos. Lisboa: Academia Real das Ciências, 1862. 2 Volumes. 7.2 Obras de referência, estudos sobre tradução e sobre Castilho José ALBUQUERQUE, S. J. G. e. Arte de traduzir de Latim ao Português. Lisboa: Impressão Régia, 1818. 32 Essas informações são uma reprodução da descrição encontrada no catálogo on line da Biblioteca Nacional. Cf. http://catalogos.bn.br/scripts/odwp022k.dll?SHOWINDEX=periodicosraros_pr:periodicosraros:ti:T: Acesso em junho de 2008. 39 ASSIS, M. de Contos esquecidos. Org. Magalhães Júnior. Rio de Janeiro: Ediouro, 1966. ______. Memórias póstumas de Brás Cubas. Edição crítica a cargo da Comissão Machado de Assis. Rio de Janeiro: MEC/INL, 1960. AULETE, Caldas. Aulete Digital – Dicionário contemporâneo da língua portuguesa: Dicionário Caldas Aulete, Lexikon, 2007. Acessado em 8 de outubro de 2009. Disponível: http://www.auletedigital.com.br/ BELLO, O. Imprensa nacional (Officina official) 1808-1908: apontamentos históricos. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1908. BERMAN, A. A prova do estrangeiro. Trad. M. E. P. Chanut. Bauru,SP: EDUSC, 2002. BORNECQUE, H.; MORNET, D. Roma e os romanos. Trad. de Alceu Dias Lima. São Paulo: EPU/EDUSP, 1976. BOSI, A. História concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 1997. BURKE, P. Culturas da tradução nos primórdios da Europa Moderna. 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FARIA, E. Dicionário Escolar Latino-Português. Rio, MEC, 1964. 40 HOMERO. Odisséia. Trad. de Odorico Mendes e ed. de A. M. Rodrigues. São Paulo : Ars Poetica/EDUSP, 1992. p. 11-4. JOSÉ FELICIANO DE CASTILHO BARRETO E NORONHA. In: SILVA, I. F. da. Diccionario bibliographico portuguez. Lisboa: Imprensa nacional, 1860. Tomo IV. p.316- 20. GRIMAL, P. Dicionário de mitologia grega e romana. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1966. LARBAUD, V. Sob a invocação de São Jerônimo: ensaios sobre a arte e técnicas de tradução. São Paulo: Mandarim, 2001. LIMA, A. D. possíveis correspondências expressivas entre latim e português: reflexões na Área de Tradução. Itinerários, Araraquara, n. especial, 13-22, 2003. MACEDO, J. M. de Discurso. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Vol. 42(59):307-314, 1879. MARTIAL. Epigrammes de M. Val. Martial. Ed. V. Verger, N. A. Dubois et J. Mangeart. Paris: Panckoucke, 1835. MENEZES, R. de. Dicionário literário brasileiro. 2.a. ed. 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História da literatura brasileira. Rio de Janeiro: José Olympio, 1954. Tomo V. SANDRONI, C. Vocabulário ortográfico da Língua Portuguesa. 5.a ed. Rio de Janeiro: Global Editora, 2009. SARAIVA, F. R. S. Novíssimo dicionário latino-português. Belo Horizonte; Rio de Janeiro: Livraria Garnier, 2000. 7. ANEXOS 43 7.1 Anexo 1 AVALIAÇÃO FINAL DE MONOGRAFIA BACHARELADO EM LETRAS Ao Conselho do Depto de Lingüística, Seção de Graduação e Egrégia Congregação da FCL-UNESP-CAr Eu, Prof. Dr. Brunno Vinicius Gonçalves Vieira, na qualidade de Orientador de Monografia de Conclusão de Curso, venho pela presente comunicar que a Banca de Acompanhamento (Examinadora), composta pelos professores doutores João Batista Toledo Prado, Guilherme Gontijo Flores e por mim mesmo, reunida em 13/12/2010, atribuiu a nota 9,8 (nove inteiros e oito décimos) à Monografia de Conclusão de Curso intitulada “O legado da tradição clássica no século XIX: Castilho José, tradutor de Catulo”, realizada pela bacharelanda JOANA JUNQUEIRA BORGES, RA 1286650. Araraquara, 13 de dezembro de 2010. Assinatura do(a) Orientador(a):_____________________________________ Assinatura do 1º membro da Banca: _________________________________ Assinatura do 2º membro da Banca: _________________________________ Ciente ____/____/______ Assinatura do Aluno:_________________________ Homologado em _____________ Coord. do CCLetras ________________________ 44 FORMULÁRIO PARA AVALIAÇÃO DE MONOGRAFIA BACHARELADO EM LETRAS PARECER I. Considerar: 1. o desenvolvimento da pesquisa quanto (i) ao(s) seu(s) objetivo(s), (ii) à adequação da fundamentação teórica, (iii) à suficiência do corpus examinado, (iv) à revisão da bibliografia sobre o tema, (v) ao apoio bibliográfico e (vi) à expressividade dos resultados alcançados; 2. a apresentação do texto quanto (i) à construção dos argumentos, (ii) à distribuição das informações pelas partes do texto (introdução, texto principal, conclusões, referências e, eventualmente, apêndices), (iii) à clareza da exposição, (iv) à correção gramatical e (v) à formatação do texto, em conformidade com normas da ABNT. A desafiadora proposta de Iniciação Científica que consistiu na tradução de textos da Literatura Latina e na sua análise a partir das versões poéticas de José Feliciano de Castilho tem aqui nesta monografia, intitulada “O legado da tradição clássica no século XIX: Castilho José, tradutor de Catulo”, seu corolário. Joana Junqueira Borges comprovou com este trabalho de conclusão o zelo e a diligência que sempre demonstrou durante nossos encontros e no cumprimento das leituras e tarefas programadas. A clareza e desenvoltura demonstradas por Joana Junqueira Borges no seu texto comprovam a adequação do trabalho proposto ao nível acadêmico da discente, bem como testemunham o desenvolvimento conquistado por ela no decorrer de nosso trabalho. II. Observações adicionais: Não há III. Avaliação (nota de 0 a 10,0). Nota: 10,0 (DEZ) Local e data: Araraquara, 13 de dezembro de 2010 Nome do parecerista: Prof. Dr. Brunno Vinicius Gonçalves Vieira 45 FORMULÁRIO PARA AVALIAÇÃO DE MONOGRAFIA BACHARELADO EM LETRAS PARECER I. Considerar: 1. o desenvolvimento da pesquisa quanto (i) ao(s) seu(s) objetivo(s), (ii) à adequação da fundamentação teórica, (iii) à suficiência do corpus examinado, (iv) à revisão da bibliografia sobre o tema, (v) ao apoio bibliográfico e (vi) à expressividade dos resultados alcançados; 2. a apresentação do texto quanto (i) à construção dos argumentos, (ii) à distribuição das informações pelas partes do texto (introdução, texto principal, conclusões, referências e, eventualmente, apêndices), (iii) à clareza da exposição, (iv) à correção gramatical e (v) à formatação do texto, em conformidade com normas da ABNT. O trabalho apresentado consiste numa profícua investigação da atividade tradutória de José Feliciano de Castilho, que viveu na cidade do Rio de Janeiro, no século XIX, e esteve em atividade durante seus segundo e terceiro quartéis, e concentrou-se nas traduções poéticas, por ele produzidas, de poemas de Catulo, poeta latino do século I a.C., período conhecido por Século de Augusto. O trabalho parte de uma contextualização histórica do autor- tradutor, para, em seguida, confrontar posturas tradutórias modernas, seja as de Haroldo de Campos, seja as de Peter Burke, seja, ainda, as de José Paulo Paes, embora se deixe entrever também a inegável influência das idéias do poeta e critico Joseph Brodsky, ainda que não nomeado. Os cinco poemas de Catulo traduzidos por José de Castilho foram coletados na Grinalda Ovidiana, coleção de notas às traduções de Arte de Amar e Amores, preparadas por seu irmão, Antônio Feliciano de Castilho, e foram apresentados na Monografia, de acordo com uma ordem que previu, para cada poema estudado, a apresentação do texto latino, uma tradução de serviço, uma transcrição diplomática da tradução de José de Castilho, uma atualização ortográfica dessa mesma tradução, aparelhada de notas e, finalmente, comentários aos procedimentos tradutórios do autor-tradutor. Louve-se, aí, além dos excelentes comentários aos procedimentos e escolhas tradutórias, também o cuidadoso trabalho de transcrição e a copiosidade das notas preparadas para auxílio dos contextos específicos dos poemas encontrados na pesquisa. A Monografia serve-se também de uma bibliografia não apenas adequada à pesquisa realizada, mas também quase exaustiva, em particular no que toca ao regate de fontes para as obras e os autores estudados. Trata-se, enfim – nunca é demais insistir – de um excelente trabalho na linha de História e Critica da Tradução. II. Observações adicionais: Não há 46 III. Avaliação (nota de 0 a 10,0). Nota: 10,0 (DEZ) Local e data: Araraquara, 13 de dezembro de 2010 Nome do parecerista: Prof. Dr. João Batista Toledo Prado 47 FORMULÁRIO PARA AVALIAÇÃO DE MONOGRAFIA BACHARELADO EM LETRAS PARECER I. Considerar: 1. o desenvolvimento da pesquisa quanto (i) ao(s) seu(s) objetivo(s), (ii) à adequação da fundamentação teórica, (iii) à suficiência do corpus examinado, (iv) à revisão da bibliografia sobre o tema, (v) ao apoio bibliográfico e (vi) à expressividade dos resultados alcançados; 2. a apresentação do texto quanto (i) à construção dos argumentos, (ii) à distribuição das informações pelas partes do texto (introdução, texto principal, conclusões, referências e, eventualmente, apêndices), (iii) à clareza da exposição, (iv) à correção gramatical e (v) à formatação do texto, em conformidade com normas da ABNT. Na monografia intitulada “O legado da tradição clássica no século XIX: Castilho José, tradutor de Catulo”, a discente Joana Junqueira Borges faz um breve estudo sobre a biografia e a obra do autor dentro do contexto imperial do Brasil no século XIX, além de apresentar as traduções de Catulo feitas por Castilho José em uma versão diplomática seguida de outra atualizada. Para a feitura dos comentários, vemos também suas traduções de serviço, em que podemos notar um apuro com a língua latina e intuir parte de sua interpretação dos textos. Trata-se, efetivamente, de um trabalho cuidado, resultado de um estudo minucioso do período e marcado por um viés de crítica tradutória (que, creio, poderíamos chamar historicista) mais interessado em revelar o tempo dentro da tradução, bem com o típico jogo literário da época, do que em simplesmente cair no julgamento de gosto. O trabalho como um todo demonstra esse apuro prático do estudo; e, se há algo que falte, ou que talvez passe demasiadamente apressado no decorrer da monografia, é sua parte teórica nos estudos de tradução, ainda que a aluna afirme que tais estudos farão parte de sua pesquisa de mestrado. Resta apenas insistir no fato de esta monografia ser exemplar na sua construção enquanto gênero acadêmico: delimitação de corpus; subdivisões em itens; análise atinente à forma e ao conteúdo e coerência quanto ao método e à prática propostos desde o início. No mais, apenas pequenos deslizes, que podem ser corrigidos sem maiores problemas. II. Observações adicionais: Não há. 48 III. Avaliação (nota de 0 a 10,0). Nota: 9,5 Local e data: Curitiba, 13 de dezembro de 2010. Nome do parecerista: Prof. Guilherme Gontijo Flores CAPA FOLHA DE ROSTO FICHA CATALOGRÁFICA BANCA EXAMINADORA DEDICATÓRIA AGRADECIMENTOS RESUMO ABSTRACT SUMÁRIO 1. Introdução 2. Material e métodos 3. Catulo e suas traduções do séc. XIX 4. Análises 5. Conclusões 6. Referências bibliográficas 7. ANEXOS