PEDRO HENRIQUE RODRIGUES DE OLIVEIRA OS DISTRITOS INDUSTRIAIS DE ARARAS (SP): ANÁLISE DOS FATORES LOCACIONAIS E DAS POLÍTICAS ATRATIVAS MUNICIPAIS RIO CLARO - SP 2024 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Júlio de Mesquita Filho” Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro PEDRO HENRIQUE RODRIGUES DE OLIVEIRA OS DISTRITOS INDUSTRIAIS DE ARARAS (SP): ANÁLISE DOS FATORES LOCACIONAIS E DAS POLÍTICAS ATRATIVAS MUNICIPAIS Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas do Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Auro Aparecido Mendes Rio Claro - SP 2024 Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Dados fornecidos pelo autor(a). O48d Oliveira, Pedro Henrique Rodrigues Os distritos industriais de Araras (SP) : análise dos fatores locacionais e das políticas atrativas municipais / Pedro Henrique Rodrigues Oliveira. -- Rio Claro, 2024 117 f. : tabs., fotos, mapas Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista (UNESP), Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Rio Claro Orientador: Auro Aparecido Mendes 1. Fatores locacionais. 2. Distritos industriais. 3. Políticas públicas. I. Título. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Júlio de Mesquita Filho” Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro PEDRO HENRIQUE RODRIGUES DE OLIVEIRA OS DISTRITOS INDUSTRIAIS DE ARARAS (SP): ANÁLISE DOS FATORES LOCACIONAIS E DAS POLÍTICAS ATRATIVAS MUNICIPAIS Dissertação de Mestrado apresentada ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas do Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Geografia. Comissão Examinadora Prof. Dr. AURO APARECIDO MENDES IGCE / UNESP/RIO CLARO (SP) Prof. Dr. SAMUEL FREDERICO IGCE / UNESP/RIO CLARO (SP) Prof. Dr. SAULO TERUO TAKAMI ESTRATÉGIA CONCURSOS S/A / SÃO PAULO Conceito: Aprovado. Rio Claro (SP), 11 de setembro de 2024. AGRADECIMENTOS A conclusão deste trabalho, que neste momento torna-se realidade, foi desafiadora em virtude dos acontecimentos diários da vida. No decorrer do caminho muitas pessoas me ajudaram a atingir este objetivo, pois entendo que sozinho não chegamos a lugar algum. Desta forma, agradeço todos os gestos de apoio, cada pessoa que demonstrou empatia e consideração, pois todas as maneiras de compreensão foram bem-vindas. Em primeiro lugar meu obrigado ao Prof. Dr. Auro Aparecido Mendes, por acreditar na pesquisa, pela inspiração em cada aula, seja na orientação, para adequar o texto, e, acima de tudo, por conversas agradáveis. Agradeço igualmente a meus pais, Wanderley Germano e Yones Rodrigues, pelo exemplo de dedicação e por ensinar-me a não desistir pelo que realmente faz sentido. Gratidão também ao meu irmão Paulo Victor, que por diversas vezes soube entender o momento que eu estava vivenciando. À Ana Eliza, que, mais que uma namorada, iluminou minhas escolhas e trouxe soluções, meu muito obrigado! Além dos muitos amigos que fizemos no decorrer da trajetória, devo agradecer a Cleiton Santos, por conseguir ampliar a visão da localidade de estudo com ótimas imagens de drone, e a Renato Silveira, pela elaboração dos mapas. Aos empresários dos distritos industriais que responderam ao questionário, sobretudo, à Prefeitura do Município de Araras, que sempre me atendeu prontamente, meus agradecimentos. Agradeço à Secretaria Municipal de Planejamento, Gestão e Mobilidade de Araras e ao secretário Felipe. Na mesma secretaria, estendo meu obrigado a Adriana, pela atenção ao disponibilizar documentos relevantes. Tenho que agradecer à Prof (a). Dra. Silvia Selingard-Sampaio, por ministrar aulas memoráveis e pelas lindas palavras de carinho na dedicatória de seu livro a mim presenteado. HINO DA CIDADE DE ARARAS Incrustrada na Pátria altaneira, Como joia de raro esplendor Tu traduzes, Araras faceira A bonança, o progresso, o valor... As canções do trabalho pujante Desde o tempo dos velhos barões Te fizeram tão grande e vibrante Que transbordam dos bons corações. Ó Cidade Encantamento, Jovem, bela, varonil Ó Cidade Encantamento, Esperança do Brasil Das primeiras tu fostes na história A romper os grilhões dos escravos E te encheste de paz e de glória Orgulhosa de filhos tão bravos... Sob manto da Virgem Maria O teu povo é ordeiro e cristão, Cada prece do teu dia a dia E mais doce e sublime oração. Quando a árvore amiga plantaste, Numa festa jamais esquecida, A ternura que então revelaste É por todos agora seguida. Cada cana de açúcar de pé Se traduz em riqueza nos lares Mas plantastes também o café E as laranjas dourando os pomares As indústrias, escolas, usinas, Prenunciam radioso futuro E o vigor dos teus jovens destinas Ao timão do teu barco seguro. Minha terra, feliz paraíso, Neste ardente lampejo de afeto O teu solo desejo por piso E o teu céu sempre azul como teto. Autor: Ideney Gonçalves de Oliveira. RESUMO A escolha locacional da indústria tem provocado diversos debates e reflexões entre os pesquisadores desse segmento. O que se destaca são: a falta de espaço adequado para as unidades produtivas ampliarem suas infraestruturas, o alto valor dos lotes disponíveis na cidade e por estarem localizados nas áreas centrais, o grande fluxo de veículos causando congestionamentos e, principalmente, a carência de benefícios para as empresas estabelecerem suas plantas nos distritos industriais. Assim sendo, as periferias imediatas das grandes regiões metropolitanas acabam se tornando o maior alvo das indústrias, cujas transferências podem ocorrer de maneira espontânea ou planejada. Por essa razão, as políticas públicas são fundamentais e as parcerias privadas necessárias para o desenvolvimento da região e dos municípios. A pesquisa realizada teve por objetivo analisar as políticas públicas adotadas para a implantação de 6 Distritos Industriais no município de Araras, no interior do Estado de São Paulo, e como o empreendedor tem encontrado na cidade uma atmosfera empresarial e alternativas para o desenvolvimento do seu negócio, gerando oportunidade de emprego para a população. Nesses locais, tanto o capital local, como o nacional e o estrangeiro encontram um ambiente propício para a reprodução constante de seus diversos empreendimentos, seja pela boa infraestrutura locacional, urbana e industrial, quanto pelas vantagens da localização privilegiada às margens da Rodovia Anhanguera, assim como outros modais importantes de fácil acesso na região, que facilitam o transporte e armazenagem de produtos, o que vai de encontro aos interesses do grande capital tecnológico. Portanto, procuramos aqui demonstrar a relevância dos distritos industriais, pois até os dias de hoje continuam sendo uma estratégia eficiente para o progresso municipal, gerando emprego com carteira assinada, renda e desenvolvimento para o território. Palavras-chave: Fatores locacionais; Distrito Industrial; Políticas Públicas. ABSTRACT The location choice of the industry aiming to establish itself in urban outskirts has provoked several debates and reflections, among researchers in this segment what stands out are: the lack of adequate space for production units to expand their infrastructures, the high value of the lots available in the city and because they are located in central areas, the large flow of vehicles causing congestion and, mainly, the lack of benefits for companies to establish their plants in industrial districts. Therefore, industries seek incentives for their transfer, whose immediate peripheries of large metropolitan regions end up becoming the biggest target, which can occur spontaneously or planned. For this reason, public policies are fundamental and private partnerships are necessary for the development of the region and municipalities. The research carried out aimed to analyze the public policies adopted for the implementation of the 6 Industrial Districts in the municipality of Araras, in the interior of the State of São Paulo and, how the entrepreneur has found in the city a business atmosphere and alternatives for the development of his business, generating employment opportunities for the population. In this sense, local, national and foreign capital finds a favorable environment in the municipality of Araras to attach diverse enterprises, both in terms of locational, urban and industrial infrastructure, as well as seeking the advantages of the privileged location on the banks of the Anhanguera Highway, among other important modes. easily accessible in the region, possibilities that aim to facilitate the transport and storage of products, the interest of large technological capital is to be able to find equally assertive conditions for its constant reproduction within today's companies. Therefore, we seek to demonstrate the relevance of industrial districts, as to this day, they continue to be an efficient strategy for municipal progress, generating formal employment, income and development for the territory. Keywords: Locational Factors; Industrial District; Public Policies. LISTA DE ILUSTRAÇÕES E TABELAS Figura 1: Localização do município de Araras no estado de São Paulo .................. 35 Figura 2: Delimitação do município de Araras/SP .................................................... 60 Figura 3: Perímetro urbano de Araras/SP ............................................................... 61 Figura 4: Localização dos Distritos Industriais l, ll, lll, Vl no perímetro urbano de Araras/SP ................................................................................................................. 62 Figura 5: Localização do Distrito Industrial lV no perímetro urbano do município de Araras/SP ................................................................................................................. 63 Figura 6: Localização do Distrito Industrial V no perímetro urbano do município de Araras/SP ................................................................................................................. 64 Quadro 1: Rodovias de grande fluxo da região metropolitana de Campinas .......... 50 Quadro 2: Rodovias Federais de grande relevância no Estado de São Paulo ........ 51 Quadro 3: Rodovias rumo ao porto de Santos e litoral do Estado de São Paulo .... 52 Quadro 4. Proporção de amostras para cada Distrito Industrial no município de Araras/SP, em 2024 ................................................................................................. 83 Quadro 5. Proporção de amostras referentes ao distrito industrial I no município de Araras/SP, em 2024 ................................................................................................. 91 Quadro 6. Proporção de amostras referentes ao distrito industrial II no município de Araras/SP, em 2024 ................................................................................................. 92 Quadro 7. Proporção de amostras referentes ao distrito industrial III no município de Araras/SP, em 2024 ................................................................................................. 93 Quadro 8. Proporção de amostras referentes ao distrito industrial IV no município de Araras/SP, em 2024 ................................................................................................. 93 Quadro 9. Proporção de amostras referentes ao distrito industrial V no município de Araras/SP, em 2024 ................................................................................................. 94 Quadro 10. Proporção de amostras referentes às indústrias que mantêm relações dentro dos distritos industriais no município de Araras/SP ....................................... 95 Quadro 11. Proporção de amostras referentes às indústrias que mantêm relações fora dos distritos industriais no município de Araras/SP ........................................... 96 Quadro 12. Proporção de amostras referentes às indústrias que mantêm relações com o mercado consumidor ..................................................................................... 96 Mapa 1: Rodovias de grande fluxo da região metropolitana de Campinas .............. 53 Mapa 2: Rodovias federais de grande relevância no Estado de São Paulo ............. 54 Foto 1: Banco do Povo e Sala do Empreendedor em Araras/SP ............................ 58 Foto 2: Núcleo de Desenvolvimento Empresarial - Incubadora de Araras/SP ......... 59 Foto 3: Entrada da cidade de Araras/SP e o Distrito Industrial I .............................. 65 Foto 4: Distrito Industrial I ........................................................................................ 65 Foto 5: Distrito Industrial I ........................................................................................ 66 Foto 6: Distrito Industrial II ....................................................................................... 66 Foto 7: Distrito Industrial II ....................................................................................... 67 Foto 8: Distrito Industrial II ....................................................................................... 67 Foto 9: Distrito Industrial III ...................................................................................... 68 Foto 10: Distrito Industrial III .................................................................................... 68 Foto 11: Distrito Industrial III .................................................................................... 69 Foto 12: Distrito Industrial III .................................................................................... 69 Foto 13: Distrito Industrial IV ................................................................................... 70 Foto 14: Distrito Industrial IV ................................................................................... 70 Foto 15: Distrito Industrial IV ................................................................................... 71 Foto 16: Distrito Industrial IV ................................................................................... 71 Foto 17: Distrito Industrial IV ................................................................................... 72 Foto 18: Distrito Industrial IV ................................................................................... 72 Foto 19: Distrito Industrial V .................................................................................... 73 Foto 20: Distrito Industrial V .................................................................................... 73 Foto 21: Distrito Industrial V .................................................................................... 74 Foto 22: Distrito Industrial V .................................................................................... 74 Foto 23: Terreno para a instalação do Distrito Industrial VI ..................................... 75 Foto 24: Futuro Distrito Industrial VI ao lado do Distrito Industrial III ....................... 75 Foto 25: Localização do Distrito Industrial VI e Parque Tecnológico - entroncamento das rodovias Anhanguera (SP-330) e Wilson Finardi (SP-191), no início do trecho Araras/Rio Claro (SP) ............................................................................................... 76 Gráfico 1: Fatores de atração industrial para o município de Araras/SP ................. 87 Gráfico 2: Fatores de atração industrial para o município de Araras/SP ................. 88 Gráfico 3: Fatores de atração industrial para o município de Araras/SP ................. 88 Gráfico 4: Fatores de atração industrial para o município de Araras/SP ................. 89 Gráfico 5: Fatores de atração industrial para o município de Araras/SP ................. 89 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................... 11 1.1 Método ............................................................................................................. 15 2. EMBASAMENTO TEÓRICO ................................................................................. 21 2.1 Distritos Industriais: conceitos e características ............................................... 21 3. A INDUSTRIALIZAÇÃO NO MUNICÍPIO DE ARARAS (SP); ASPECTOS HISTÓRICOS E GEOGRÁFICOS ............................................................................. 33 3.1 Caracterização Geográfica do Município de Araras. ........................................ 33 3.2 Contexto histórico de Araras. ........................................................................... 37 4. OS DISTRITOS INDUSTRIAIS DE ARARAS (SP): FATORES LOCACIONAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS MUNICIPAIS ....................................................................... 46 4.1 Distribuição Geográfica dos Distritos Industriais e as Políticas Públicas de Araras .................................................................................................................... 55 4.2 A localização do futuro Distrito Industrial VI e a revitalização do Parque Tecnológico em Araras. ......................................................................................... 76 5. ANÁLISE LOCACIONAL DOS DISTRITOS INDUSTRIAIS PESQUISADOS ........ 82 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 100 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 108 ANEXOS ................................................................................................................. 115 11 1. INTRODUÇÃO Nos últimos anos, tem-se observado um crescimento significativo da literatura especializada na temática das aglomerações industriais no território brasileiro, sendo a localização das unidades produtivas o que mais vem chamando a atenção das investigações científicas. Conforme Singer (1977, p. 63), suas referências de análises vão em direção de uma relativa “saturação industrial” da capital paulista, tratando das antigas fábricas, que foram instaladas anteriormente em áreas estratégicas, para se chegar às unidades produtivas recentes, as quais têm procurado se estabelecer nas proximidades ou cidades vizinhas das respectivas regiões centrais. Isto acontece pelo fato de que, por um longo período, a concentração industrial proporcionou um estrangulamento dos meios de produção nessas regiões centrais, estimulando as indústrias a se deslocarem para uma periferia imediata e, mais tarde, para regiões interioranas. Segundo Mendes (2020, p.122), é prudente inferir que ao longo dos anos de 1970 ocorreu uma desconcentração relativa das indústrias da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), com iniciativas governamentais que promoveram políticas com este escopo. Desta forma, historicamente, em um raio de 200 km a partir do entorno Metropolitano do Estado de São Paulo, tem surgido a maior concentração industrial desse transbordamento, acompanhando as Rodovias Anhanguera e Washington Luís, liderada notoriamente por alguns municípios, dentre os quais se destacam: Campinas, Sorocaba, Vale do Paraíba e Litoral Paulista (Mendes, 1991, p.38; Takami, 2013, p. 25). Esta expansão tentacular resulta, em última análise, do próprio crescimento da indústria do Grande São Paulo, sendo o mecanismo impulsionador constituído pela elevação relativa dos preços do solo nas áreas mais centrais do aglomerado urbano. Na medida que este processo se desenrola, a economia industrial se espraia, lançando novos tentáculos em todas as direções (Singer, 1977, p. 69). Para Oliveira (1976, p. 22), nesse contexto as grandes regiões metropolitanas se veem obrigadas a fornecer infraestruturas em ritmos acelerados e a custos altíssimos, em decorrência da dispersão industrial nas áreas centrais, provocando “deseconomias” externas. Com isso, surgem problemas como o escoamento das 12 mercadorias e o congestionamento do tráfego urbano; a elevação do custo da mão de obra e dos terrenos nessas localidades; poluição nas imediações; o surgimento de favelas em torno das unidades fabris e a falta de planejamento, questões importantes que acabam impedindo novos investimentos de capital nas regiões metropolitanas. Assim sendo, os distritos industriais se destacam como áreas propícias para atração desses estabelecimentos fabris que se veem deslocados. Nos distritos industriais, o objetivo é dinamizar e flexibilizar os meios de produção ali inseridos, servindo muitas vezes como instrumentos de correção das externalidades negativas, medidas estas adotadas por vários países (Oliveira, 1976, p. 23). Há que se considerar, obviamente, a importância dos distritos industriais no desenvolvimento econômico local e regional, ao se verificar o efeito multiplicador do emprego industrial, e, consequentemente, a elevação da renda per capita do município. Ressalta-se também o efeito multiplicador dos distritos industriais nos estabelecimentos comerciais e de serviços, a partir do aumento dos gastos da população, ou ainda, do aumento de parcerias públicas e privadas devido a sua influência no planejamento regional e urbano. Tal fato, é perceptível pela arrecadação dos municípios, a qual tem um acréscimo e, consequentemente, acaba oferecendo outros benefícios à população. Nos países desenvolvidos, os distritos industriais têm crescente interesse do Estado para fins de desconcentração das indústrias, concentradas nas grandes cidades e áreas metropolitanas. Nos países subdesenvolvidos, os distritos industriais são utilizados como ferramenta promotora da industrialização no território, entretanto, servindo também para grandes cidades e áreas metropolitanas com as mesmas finalidades dos países desenvolvidos (Oliveira, 1976, p. 22-23). As externalidades positivas se fazem presente nos distritos industriais, cujos espaços adquirem vantagens de infraestruturas comuns, como acesso a bancos e restaurantes, fornecimento de energia, rede de água e esgoto, telefonia, internet de qualidade, dentre outras que se fazem necessárias. Além disso, os distritos industriais são favorecidos pelas economias de aglomeração; a existência de incentivos fiscais para atração de indústrias nessas localidades; o valor do metro quadrado abaixo das áreas centrais e metropolitanas, possibilitando futuramente a expansão das unidades fabris; o estabelecimento de sinergias entre as empresas ali concentradas e, por fim, 13 a proximidade com os fornecedores e prestadores de serviços, viabilizando e otimizando o processo produtivo em geral (Takami, 2013, p. 25). Para Brandão (2007, p. 46), quando se procuram analisar, através do poder público, as externalidades positivas, suas contribuições seguem na direção de desobstruir entraves microeconômicos e institucionais, com um caráter regulatório, ou melhor, visando desregular ações de melhoria jurídica e do sistema normativo, operando para diminuir os erros do mercado. O autor acrescenta ainda a importância de articular parcerias com o setor privado. No entanto, deve-se lembrar que nem todos os encargos são virtuosidades microeconômicas, as relações estabelecidas pelos setores macroeconômicos precisam ser lembradas, como, por exemplo, o câmbio, juros, fisco, relações de salário, questões monetárias, que também fazem parte do lugar e das relações industriais. O autor menciona também os recursos tangíveis (suporte de crédito, infraestruturas, dentre outros), e em seguida exalta os recursos intangíveis (convenções sociais, “expressas” em regras que são próprias do lugar, ou seja, costumes, afetividade, entre outras), que, possuindo ou não relações mercantis, geram competências contextualizadas próprias daquele espaço. Desenvolvem-se em determinado lugar, podendo ser por conhecimentos tácitos e trocas de informações informais no caso da industrialização, gerando um ambiente virtuoso de cooperação bem característico (Brandão, 2007, p. 46). A produção do espaço, seja o da rede urbana, seja o intraurbano, não é o resultado da “mão invisível de mercado”, nem de um Estado hegeliano, visto como entidade supraorgânica, ou de um capital abstrato que emerge de fora das relações sociais. É consequência da ação de agentes sociais concretos, históricos, dotados de interesses, estratégias e práticas espaciais próprias, portadores de contradições e geradores de conflitos entre eles mesmos e com outros segmentos da sociedade (Corrêa, 2011, p. 43). As preocupações emergem quando as empresas precisam escolher sua localização, sendo imensurável a valorização de uma “atmosfera” de cooperação ou de uma “atmosfera” industrializante. O Estado quase não interfere nessa circunstância. No plano do Estado, as externalidades positivas, principalmente nos países subdesenvolvidos, se estabelecem com políticas econômicas e com a legislação norteando a direção e o compasso do desenvolvimento territorial. Segundo 14 Couto e Ckagnazaroff (2017, p. 85-88), a aplicação de recursos do governo não vem a título gratuito, posteriormente a iniciativa privada tem que apresentar compensações para o município, como, por exemplo, gerar vagas de emprego para diminuir as desigualdades sociais no território, entre outras. Conforme os autores, a cada dia que se passa os empresários têm observado os incentivos fiscais não como único fator de atração locacional; fatores relacionados com a qualidade de vida, o bom relacionamento com o poder público, ambiente amigável, cidade afetuosa e bonita, são elementos que a industrialização moderna está buscando para sua instalação, atualmente. Ainda conforme Couto e Ckagnazaroff (2017, p. 87), planejar as políticas públicas é indispensável, pois as externalidades negativas causam aumento do custo de produção e as externalidades positivas causam decréscimo desse custo produtivo nas áreas urbanas principalmente. Assim, fica evidente quais desses percursos levariam a um processo econômico instável, as externalidades negativas, uma vez que os custos dos produtos sofrem interferência do meio em que eles são produzidos, em decorrência da ineficiência locacional. Ao analisar essa temática, iremos apontar a importância dos Distritos Industriais para o desenvolvimento local, sua influência no processo de dinamizar o mercado interno, se as empresas concentradas têm gerado postos de trabalho no município de Araras/SP, se as políticas atrativas municipais foram determinantes para atrair as indústrias para essas áreas específicas, e, por fim, como os Distritos Industriais de Araras estão promovendo o desenvolvimento econômico estabelecido na sua extensão conceitual, não apenas favorecendo o crescimento econômico do município, mas também a qualidade de vida e bem-estar dos seus habitantes. A pesquisa realizada teve por fito demonstrar que os Distritos Industriais (DIs) continuam sendo, contemporaneamente, importantes para atração de investimentos fabris nacionais e estrangeiros. O objetivo geral da pesquisa consistiu em analisar os fatores locacionais responsáveis pela implantação dos 6 Distritos Industriais em Araras (SP). A análise dos ramos industriais implantados nos 6 Distritos Industriais, a quantidade de mão de obra ocupada, a origem dos capitais investidos, as datas de instalação das indústrias nos Distritos Industriais, dentre outros aspectos, constituíram 15 os objetivos específicos. Assim sendo, procurou-se responder às seguintes questões: - Quando foram criados os Distritos Industriais (D.Is) em Araras? - Quais fatores explicam a existência de 6 Distritos Industriais? - Quais as principais características desses Distritos Industriais? - Quais são os principais ramos industriais instalados em cada um deles? - Quais são as indústrias de capitais estrangeiros, nacionais e locais instaladas em cada um dos Distritos Industriais? - Quantos empregos foram gerados pelos Distritos Industriais de Araras? - Quais foram as políticas públicas atrativas municipais empregadas na implantação desses Distritos Industriais? - Quais as vantagens e desvantagens locacionais dos D.Is? No que se refere aos procedimentos metodológicos, foram adotados os seguintes: 1) Levantamentos bibliográficos específicos sobre Distritos Industriais, visando compreender suas principais características e tipologias; 2) Caracterização econômica do Município de Araras, com o objetivo de entender a implantação dos 6 DIs ; 3) Entrevistas semiestruturadas com os gestores dos 6 DIs, objetivando identificar a importância dos fatores locacionais, os ramos industriais instalados em cada DI, mão de obra, origem dos capitais investidos, dentre outras informações; 4) Entrevista semiestruturada com o Secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico, com o objetivo de compreender as políticas públicas adotadas na implantação dos Distritos Industriais; 5) Mapeamentos dos Distritos Industriais; 6) Análise dos dados e informações. 1.1 Método O método empregado na pesquisa desenvolvida se fundamenta em Santos (1996), que destaca a importância da forma-função-processos e como essa relação 16 influencia dialeticamente no espaço. Procura-se, dessa forma, compreender as múltiplas imbricações entre espaço e tempo e entre as diferentes escalas espaciais; bem como os fatores que engendram profundas transformações nos processos produtivos e no desenvolvimento territorial. Esse processo acaba se intensificando com a compressão espaço-temporal, ou seja, o encurtamento do ciclo do capital. Neste sentido, as políticas públicas são fundamentais para reger e organizar o espaço de relações, visando mitigar os conflitos e as contradições. Considerando que o espaço geográfico e os objetos nele inseridos se colocam como forma-conteúdo, as tensões que nele ocorrem envolvem conflitos e contradições. Latour (1991, p.174) observa que a sociedade “moderna” valoriza demais os objetos e pondera que o artefato simétrico da natureza é o que sobra quando arrancamos dela todos os objetos. O autor também critica a separação entre o mundo natural e o social provocado pela modernidade. Santos (2011, p.96) faz alusão a “todo e qualquer período histórico se afirmar com um elenco correspondente de técnicas que o caracterizam e com uma família correspondente de objetos [...]”. Ao longo do tempo novos sistemas de objetos surgem, de um tempo a outro, promovendo uma renovação que acontece paralelamente com novos sistemas de técnicas. Assim, enquanto alguns objetos têm necessidade de se transformarem para atender às novas funções, velhos objetos continuam existindo e alterando-se de função. Para o autor, “a ideia de forma- conteúdo une o processo e o resultado, a função e a forma, o passado e o futuro, o objeto e o sujeito, o natural e o social [...]”, e assim verifica-se na sociedade uma intencionalidade sobre a materialidade, campo fértil para o desenvolvimento e para a reprodução do sistema capitalista (Santos, 2011, p. 103). As formas espaciais são o aspecto visível de alguma coisa, cabe à sociedade trazer significado à realidade física, atribuindo-lhe um conteúdo, estimulando sua existência através de forma-conteúdo, ou seja, não existe dialética possível entre forma enquanto forma. Santos (2011, p. 109) coloca que “a sociedade se geografiza por meio dessas formas, atribuindo-lhes uma função que, ao longo da história, vai mudando. O espaço é a síntese, sempre provisória, entre o conteúdo social e as formas espaciais”. O processo pode ser compreendido como uma ação contínua, visando um conceito de tempo e mudança, buscando evolução em direção de um resultado totalizador, seja qual for. Segundo Spinoza (1930, p. 61),"[...] não existe 17 senão uma totalidade, que existe por si mesma e é um suporte para todos os outros atributos". Para que o processo se torne um todo, antes é preciso reconhecer as partes, o todo sempre se alterando em outro todo, num processo de fragmentação, cisão e de recomposição (Santos, 2011, p. 120). A totalidade estruturada é, ao mesmo tempo, uma totalidade "perfeita", acabada, um resultado e uma totalidade in-fieri, em movimento, um processo. Em outras palavras, devemos distinguir a totalidade produzida e a totalidade em produção, mas as duas convivem, no mesmo momento e nos mesmos lugares. Para a análise geográfica, essa convergência e essa distinção são fundamentais ao encontro de um método (Santos, 2011, p. 119). Retomando as considerações, é imprescindível fazer uma breve relação dos fatores que envolvem os aspectos de transportes, o progresso da tecnologia nos meios de comunicação, intensificando assim uma série de conjunturas produtivas e sociais no final do século XX e início do século XXI. Novamente, citando Santos (2011, p. 61), tem-se que “[...] os elementos fixos em cada lugar, permitem ações que modificam o próprio lugar, fluxos novos ou renovados que recriam as condições ambientais e as condições sociais, e redefinem cada lugar”. Assim, por meio dos fixos e dos fluxos pode-se detectar a realidade geográfica, por suas metamorfoses materiais e imateriais no espaço e no território, com os fixos cada vez mais se agigantando e se artificializando (indústrias, prédios, usinas, rodovias, entre outros) e os fluxos se diversificando, buscando evolução para um ideal de fluidez (mensagens, dados, dinheiro, dentre outros). Na realidade atual, o sistema de produção se vê cada vez mais inserido na fluidez indispensável da lógica do mercado, inovando em ritmo selvagem, com fôlego suficiente proporcionado pela lógica mundial capitalista. Para Berthelot (1994, p. 12), “os progressos das telecomunicações e dos métodos de gestão da informação, de um lado, e a onda das 'desregulamentações', de outro, permitiram a um pequeno número de empresas aliarem-se entre si e operarem em nível mundial [...]”. Em todos esses processos refletiu, obviamente, a importância das técnicas para delimitar um período, permitindo enxergar situações do que é antigo e atual no espaço social. Assim, constata-se que o território e seus usos podem ser vistos como continuidade ou com suas partes fragmentadas. Para Santos e Silveira (2001, p.11), 18 outro modo de pensar é “[...] na divisão territorial do trabalho e em círculos de cooperação, o que, ao mesmo tempo, permite pensar o território como ator não apenas como um palco, isto é, o território no seu papel ativo”. Nesse sentido o território, no decorrer dos períodos históricos, torna-se usado pela sociedade, mas como ator ganha usos atuais e sobrevém às questões de ordem local, regional, nacional e até global. Devido à dificuldade de se aplicarem novas racionalidades ao território, em decorrência de fatores já cristalizados, ou seja, seus usos antigos, cada região não recebe de maneira homogênea as modernidades. Nesse momento faz-se necessário caracterizar o território no seu sentido mais restrito, o de Estado, denominação política dada ao espaço de um país. Na criação de muitos Distritos Industriais, no Brasil especialmente, o Estado pode ser visto como promotor de infraestruturas, aquelas de ordem material, sistemas de engenharia, por exemplo, além de ser responsável por aplicar o arcabouço normativo e a legislação civil. O dinamismo da economia e da população, por outro lado, acaba sendo, de certo modo, responsável pela distribuição da agricultura, da indústria e dos serviços. Observa-se, nesse sentido, as formas geográficas de ordem material e o papel das formas sociais, jurídicas e políticas (Arroyo, 2004, p. 49; Santos e Silveira, 2006, p. 21). E se, além disso, pensamos na legitimidade desse poder e, portanto, na ideia de soberania, estamos cada vez mais próximos de sua dimensão jurídica. Por sua vez, a dimensão político-jurídica do território está associada à existência do "Estado" como a instituição que detém o poder de soberania, ou seja, controle exclusivo de um âmbito geográfico definido. Chegamos, assim, à ideia de território do Estado ou de Estado territorial (Arroyo, 2004, p 49). Desta forma, é imprescindível abordar as contradições que são promovidas pelo capitalismo industrial, em destaque as diferenças de oportunidades, acessos, consumo, salário, entre tantas outras, que visam realçar uma classe social em detrimento de outra. Tais contradições se mostram, ainda mais, na relação do proprietário dos meios de produção, o empregador, o que exerce a dominação, com o outro, literalmente, o trabalhador, aquele que vende sua mão de obra, ou seja, o dominado. Essa é a circunstância perfeita para a geração da mais-valia, ou seja, para obtenção do lucro e reprodução do capital. 19 Para Japiassú e Marcondes (2006, p.133), o materialismo histórico, em conformidade com os pensadores Karl Marx e Friedrich Engels, é uma doutrina cujas forças materiais (aquelas de ordem econômica) são efetivadas e consolidadas pela sociedade burguesa e capitalista, que ao longo do tempo manipula, domina e, acima de tudo, dá forma às forças espirituais (pensamentos, ideias, políticas, religião, arte etc.). Segundo Harvey (2005, p. 43), a teoria de Karl Marx, do crescimento sob o capitalismo, tem em sua conjuntura a acumulação de capital no centro de todos os processos e das coisas. Na verdade, coloca que a acumulação é o motor que acaba ganhando potência com o aumento da produção capitalista. O sistema sobre os moldes capitalistas é muito dinâmico, expansionista, acontecendo de forma inevitável, buscando produzir permanentemente aspectos revolucionários das técnicas do território, engendrando incessantemente a reforma do mundo em que vivemos. Assim sendo, todas as engrenagens para que esse “motor” funcione de maneira vigorosa, se não for o lucro o melhor combustível, nada mais prevalece, e os detentores do capital utilizam-se de diversas estratégias como, por exemplo, os velhos fatores tradicionais, como a boa localização, proximidade da matéria-prima, as vantagens que os espaços podem oferecer à sociedade, para obterem mais capital (Takami, 2013, p. 21). Para Lencioni (2007), a relação do consumo produtivo tem forte influência da reprodução dos meios de produção, como, por exemplo, o consumo das infraestruturas necessárias, as estradas de rodagem, o consumo da energia, que são fundamentais e indispensáveis para propulsar o desenvolvimento das máquinas e das indústrias, respectivamente. O consumo das forças de trabalho, seja em grupo ou individual, faz parte de todo o processo, como, por exemplo, escolas, hospitais, bancos e restaurantes, toda uma infraestrutura para atender essa outra vertente. No entanto, conforme a autora, as duas mantêm forte associação com o processo de produção e circulação do capital, além de serem dependentes uma da outra. Posto isto, as aglomerações industriais, sob a forma de distritos industriais, podem tornar-se uma saída estruturante, quando bem planejadas e executadas, visando diminuir as imbricações que continuam ocorrendo no espaço e no território, 20 contribuindo para a sociedade, visando à natureza e ao planejamento do uso do solo urbano. E ainda mais, apontando caminhos sobre qual seria a função do Estado em estabelecer condições de preservação da natureza e do meio sustentável, promovendo a geração de renda para o município, sem deixar de produzir oportunidade de emprego para a população. É desse modo que os distritos industriais são fundamentais para o planejamento fabril mundial, o setor produtivo depende de uma rede de interdependências, em diversas escalas, ou seja, sendo estabelecidas da local e no intercâmbio global, em cada território, no entanto, características diferentes são adotadas para atender as necessidades da aglomeração empresarial. 21 2. EMBASAMENTO TEÓRICO 2.1 Distritos Industriais: conceitos e características O termo Distritos Industriais, na sua formulação científica, foi empregado de forma pioneira por Marshall (1966), o qual menciona o desenvolvimento de indústrias organizadas sobre o mesmo setor produtivo e concentradas no espaço e no território, ganhando expressividade na demanda local por produtos especializados e, além disso, tendo importante relação com os meios de comunicação cada vez mais desenvolvidos. Becattini (1991) caracteriza os distritos industriais italianos, geralmente, em pequenas e médias empresas, concentradas num determinado espaço geográfico, dispondo de uma especializada e elevada divisão do trabalho fabril. Outros autores propõem revisões estabelecendo singularidades próprias sobre os distritos, cada um buscando a realidade e as características de seu país de origem. Segundo Becattini (1994, p. 20), “[...] o distrito industrial é uma entidade socioterritorial caracterizada pela presença ativa de uma comunidade de pessoas e de uma população de empresas num determinado espaço geográfico e histórico”. Desta forma, uma das características predominantes dos distritos industriais italianos está na relação estrita que a comunidade local estabelece com as empresas, ou seja, só é possível com uma construção histórica e natural dos habitantes dessas localidades. Nesse sentido, tende a predominar um sistema de valorização cultural dentro dos distritos industriais, onde os fornecedores e os clientes formam uma rede privilegiada e permanente de relações, ao mesmo tempo em que a alma empresarial continua agindo, com a incorporação de inovações tecnológicas, informações privilegiadas, conhecimentos tácitos, dentre outras perspectivas próprias desse tipo de aglomeração industrial (Takami, 2013, p. 37; Finatti, 2017, p.43-44). Na abordagem de Markusen (1995, p.18),“[...] os encadeamentos (linkages) ou a cooperação com firmas de fora do distrito são praticamente inexistentes”. Conforme a autora, os distritos industriais Marshallianos apresentam aspectos de passividade das empresas ali instaladas com firmas de fora do distrito industrial; em outras palavras, a cooperação consciente entre cada um dos agentes não é um fator necessário e determinante. Entretanto, os distritos industriais à Italiana apresentam, 22 de maneira indispensável, as relações de solidariedade, cooperação e o intercâmbio entre as empresas competidoras/colaboradoras, ocasionando assim vínculos e sinergias para frente e para trás (Finatti, 2017, p.44). Em 1961, a Organização das Nações Unidas (ONU) promoveu um encontro, visando tratar da importância dos distritos industriais para o desenvolvimento territorial. No encontro, denominado Seminário de Madras, que ocorreu na Índia, diversos países compareceram para tratar do assunto referente aos distritos industriais, entre os quais: China, Malásia, França, Índia, Indonésia, Irã, Japão, Estados Unidos e a antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Toda essa organização teve como objetivo principal buscar promover capacitação no intuito de implementar distritos industriais nesses países participantes, nos quais havia necessidade da rápida industrialização para o desenvolvimento econômico e mundial. Deste modo, grande parte dos países reconheceu a importância dos distritos industriais para o desenvolvimento territorial. Em primeiro lugar, por seu efeito modernizador e de alta produtividade para os setores da economia, reduzindo os custos de produção e melhorando a qualidade dos produtos; em segundo lugar, por serem esses empreendimentos instalados em áreas planejadas, com toda a infraestrutura, reduzindo as externalidades negativas (Hoenicke, 2007, p. 21). Através desse encontro foram disponibilizados relatórios que demonstraram um panorama geral dos primeiros distritos industriais no mundo. Desta forma, cabe destacar:  Trafford Park (Inglaterra – Manchester, 1896)  Clearing Industrial District (Estados Unidos – Chicago, 1899)  Zona Industrial de Nápoles (Itália – Nápoles, 1904)  Distrito Industrial Central (URSS – Don e Dnieper, 1922) Alguns anos depois, em 1966, foi registrado no Brasil um evento semelhante a esse promovido pela Organização das Nações Unidas (ONU), buscando estabelecer perspectivas sobre os estudos pioneiros visando aos distritos industriais. No Brasil, os créditos ficaram por conta da Comissão Interestadual da Bacia Paraná-Uruguai (CIBPU, 1966). Cabe aqui fazer algumas ressaltas sobre o modelo inicial de distritos industriais, buscando particularidades no modelo que se constituiu no Brasil. Nesse 23 contexto, dispondo ainda do relatório produzido pela CIBPU (1966), o governo brasileiro, no planejamento de áreas industriais, tendencialmente atribuiu essa tarefa para as secretarias estaduais, e, posteriormente, passou o encargo para as administrações municipais promoverem essa tarefa de organizar e sistematizar os distritos industriais no território (Takami, 2013, p. 39; Finatti, 2017, p.45). Depois dessa contextualização, faz-se necessário fazer uma breve caracterização das experiências de implantações de distritos industriais em alguns países desenvolvidos e, posteriormente, nos países subdesenvolvidos. O processo de instalação dos distritos industriais nos países desenvolvidos tem uma série de particularidades quanto ao seu empreendimento, ou seja, visa à obtenção de lucro por parte das instituições privadas, como, por exemplo, o suporte das engenharias, o mercado imobiliário que se faz presente, sistemas bancários com a opção de financiamento, entre outras. Ocorrem ainda novas possibilidades e benefícios socioeconômicos que certas regiões estabelecem com o território e a descentralização das antigas áreas industriais aparecem no meio desse entrançado de relações com o espaço. Desta forma, observa-se nos países desenvolvidos, com certa frequência, quando abordamos os distritos industriais, que os lotes adquiridos para a construção de fábricas já vêm com toda a infraestrutura anexada, visando à especulação imobiliária nas proximidades. Assim, sendo investido grande volume de capital público ou privado na compra dessas terras, para aluguéis ou vendas futuras, visando atender à produção industrial (Oliveira, 1976, p. 29). Conforme Oliveira (1976, p. 29), em termos gerais “[...] a localização de distritos industriais nos países desenvolvidos tem sido bastante diversificada, ou seja, áreas metropolitanas, cidades grandes ou pequenas, centros industriais e até mesmo áreas rurais têm sido escolhidas para sua implantação”. Para a autora, a instalação de distritos industriais nos Estados Unidos, em relação ao apoio e intervenção direta do Governo Federal, praticamente não existiu. Entretanto, veio a ocorrer a interferência de políticas de dispersão das áreas industriais no território nacional, provocando assim o deslocamento das unidades fabris. Reportando diretamente à realidade dos Estados Unidos, as regiões de maior concentração industrial estão nas antigas áreas industrializadas e com cidades conurbadas do Nordeste. Contudo, quando se 24 investigam as regiões que recentemente foram industrializadas (Califórnia e a Região Sul), estas estão associadas ao desenvolvimento de distritos industriais. Nos distritos industriais dos Estados Unidos, uma grande parte é administrada por grupos privados que oferecem uma maior liberdade para a aquisição de terrenos, pois mesmo as indústrias pequenas querem comprar lotes maiores, seja por conta da preferência atual por linhas horizontais de produção, seja visando expansões futuras dessas empresas produtivas. Todas essas questões que se relacionam aos distritos industriais são apresentadas por conta da escassez de terra para o uso industrial, provocando a competição desses lotes com as áreas residenciais. O interesse do empresário é de implantar sua unidade produtiva em uma área melhorada, com proximidade à cidade, sendo ofertados diversos serviços de engenharia, financeiros, redes rodoviárias de qualidade, entre outras oportunidades disponíveis que podem surgir com a instalação do distrito industrial. Geralmente os distritos industriais nos Estados Unidos seguem um modelo para as áreas metropolitanas, próximas dos grandes fluxos industriais, não precisando de maneira necessária dos incentivos adicionais para o seu estabelecimento. Porém, nas cidades menores e menos desenvolvidas, longe dos fluxos industriais, esses distritos têm necessidade de fazer uso dos incentivos governamentais. As doações de terrenos, compra a preço facilitado, empréstimo a baixa taxa de juros, isenção de impostos, além de outras formas de assistências, são maneiras encontradas para atrair o capital industrial para essas localidades. Todas essas questões podem esbarrar nas velhas questões básicas e históricas de localização, pois o empresário busca sua produção muitas vezes de olho no mercado, na abundância de matéria- prima e de mão de obra, considerando então os outros incentivos menos relevantes (Oliveira, 1976, p. 30-31). Os distritos industriais que foram estabelecidos no Reino Unido, antes da II Guerra Mundial, possuem uma outra configuração, com o Governo promovendo total assistência, investindo nesses empreendimentos com o objetivo de reabilitar áreas enfraquecidas economicamente, em localidades em que o desemprego era muito alto. Logo, foram criadas Comissões Estaduais que não buscavam interesses lucrativos, e cujo intuito consistia na elaboração de medidas e na construção de fábricas. Num primeiro momento a demanda serviu para atender diversos tipos de indústrias, que 25 tinham a possibilidade de alugar esses espaços ou até mesmo se isentarem temporariamente dos aluguéis, além de receberem outros incentivos fiscais. Desse modo, estes distritos industriais obtiveram excelentes resultados. Acredita-se que a ação do poder público na construção e na oferta de indústrias prontas facilitou o seu alto desempenho, transformando áreas com pouca produtividade e baixíssima renda para os trabalhadores em localidades que promoveram uma reabilitação socioeconômica da população ali inserida. Após a II Guerra Mundial, entretanto, o governo do Reino Unido implementou uma política de localização industrial introduzindo a impossibilidade de instalações de distritos industriais que voltassem a ocupar áreas já densamente industrializadas. Esta política seria usada como medida de correção, visando evitar a concentração industrial em zonas centrais, como ocorrera no passado. Em função disso, nenhuma fábrica poderia ser construída sem o certificado entregue pela Câmara de Comércio, sendo antes verificado aonde o desenvolvimento industrial iria se localizar e se atenderia à “distribuição apropriada da indústria”, como exigência fundamental (Oliveira, 1976, p. 31). Segundo Oliveira (1976, p. 31), na verdade esta medida não visava uma distribuição apropriada da indústria em uma localidade oficialmente definida, e sim, foi uma forma encontrada para impedir a instalação de indústrias em áreas densamente povoadas ou industrializadas. Para isso, os incentivos visando à concentração dos estabelecimentos industriais buscavam as Áreas em Desenvolvimento, as Áreas de Desemprego e as Cidades Novas. Em termos gerais, as Áreas em Desenvolvimento eram localidades definidas conforme o tamanho da população, os recursos próprios existentes e o comércio ofertado. Em cada uma dessas Áreas de Desenvolvimento a Câmara de Comércio adquiria terras com a finalidade de vender para uma companhia comercial, com a intenção de melhorar os lotes e fornecer infraestruturas necessárias, e, quando possível, ofertava fábricas prontas a preço de custo. As Áreas de Desemprego, por sua vez, seriam cidades ou zonas rurais que apresentassem altas taxas de pessoas desocupadas, ou seja, fora do mercado de trabalho. Entretanto, segundo os empresários, a mão de obra não apresentava qualificação suficiente para a indústria, e desse modo, mesmo com os diversos 26 incentivos do governo, os proprietários dos meios de produção relutavam para fixar suas plantas produtivas nessas localidades. As Cidades Novas, na sua grande maioria, foram estabelecidas nas margens dos grandes centros urbanos, com o objetivo de atrair as indústrias e a população para essas periferias imediatas. O forte apoio do governo e a instalação de distritos industriais foram medidas adotadas. Para Oliveira (1976, p. 32), o certificado de desenvolvimento industrial garantiu o controle da localização industrial no período pós-guerra, tanto nessa época, quanto na anterior, e os distritos industriais como importante instrumento de política econômica para o Reino Unido. O aglomerado de empresas do tipo Distrito Industrial Italiano, por sua vez, trata- se de ótimas organizações industriais, geralmente empresas de pequeno e médio porte, com uma elevada divisão do trabalho entre os próprios grupos setoriais, fator que tem dado a esse modelo, desde 1957, uma grande expressividade. Antes desse período, 9 distritos industriais se localizavam no país, sendo que sete se concentravam no norte da Itália, por ser uma região melhor desenvolvida economicamente. A grande parte dos distritos industriais italianos empregava em média cem funcionários, caracterizando o predomínio de indústrias leves; entretanto, um quarto desse total empregava funcionários das chamadas fábricas de grande porte, entre quinhentos e até mil assalariados, sendo grande parte impulsionada pelas metalúrgicas ali concentradas (Oliveira, 1976, p. 32; Takami, 2013, p.38). Notoriamente, para que o sucesso continuasse acontecendo dentro dos estabelecimentos industriais nesses distritos, as vantagens naturais foram superiores em relação aos incentivos oferecidos pelo governo. Desta forma, os distritos industriais na Itália foram dotados de vantagens próprias, como a disponibilidade de matéria-prima, o mercado, facilidades de transportes, dentre outros aspectos particulares e difíceis de ocorrerem de forma forçada. Após 1957, o governo Italiano decidiu promover a industrialização no Sul do país, onde as disparidades regionais só aumentavam. Por essa razão, medidas para corrigir essas diferenças foram adotadas, ou seja, foram implantadas áreas aptas para exercer funções como centros propulsores de um crescimento econômico. Os investimentos em infraestruturas diversas, nessas áreas propulsoras, eram de extrema importância para facilitar a instalação de novas indústrias e o 27 estabelecimento de distritos industriais, e se esperava um efeito polarizador sobre outros ramos econômicos. No entanto, apesar de todos os esforços e incentivos fiscais, as novas indústrias continuavam preferindo a região Norte da Itália, devido a alguns problemas estruturais da região Sul, como o excesso de força de trabalho agrícola, desemprego sazonal, o subdesenvolvimento econômico gerado, dentre outros impasses que existiam nas áreas economicamente desalentadas. Apesar da tendência de declínio da industrialização no Sul, esses esforços, mesmo que pequenos, teriam que continuar, estimulados pelo Conselho de Ministros. No primeiro momento, o controle dessas áreas ficaria com o Governo, e posteriormente seriam vendidas a investimentos privados, para que assim o governo recuperasse os recursos investidos, com o intuito de reaplicar em outras áreas correlatas. O Distrito Industrial de Biella está localizado na Itália da área têxtil, lá residem aproximadamente 200 mil habitantes, possuindo 5 mil estabelecimentos, dos quais 3 mil são da área têxtil, empregando 35 mil pessoas. Nessa mesma década de 1990, para a confecção de tecido as indústrias fabricavam os maquinários e equipamentos para o setor, empregando em média 2500 trabalhadores. Além de Biella, existem outras cidades no Norte da Itália com Distritos Industriais, especializadas em diferentes produtos (Galvão, 2000, p 11). As experiências de distritos industriais implantados nos países subdesenvolvidos tiveram objetivos variados, como, por exemplo, no México e Porto Rico. Enquanto o primeiro visava descongestionar os grandes centros, o segundo, buscava os investimentos estrangeiros para seu território. Desta forma, os distritos industriais de Porto Rico caracterizavam-se por atrair o capital do exterior para desenvolver suas indústrias locais, conseguindo estabelecer alianças econômicas, políticas e geográficas com os Estados Unidos, rendendo o livre acesso da produção porto-riquenha ao mercado norte americano. Um órgão do governo supervisionava e orientava o programa de industrialização do país, ficando este sob o encargo da Administração do Desenvolvimento Econômico. Outras subdivisões foram criadas e o papel mais importante ficou atribuído à Companhia de Desenvolvimento de Porto Rico (PRIDCO), numa participação efetivamente direcionada para a construção e financiamento de distritos industriais (Oliveira, 1976, p. 36; Takami, 2013, p.41). O programa de construção de distritos industriais em Porto Rico iniciou-se na década de 1950, após algumas tentativas frustradas do governo de implantar e 28 desenvolver a indústria em setores produtivos, como papel, vidro, cimento, entre outros. Os incentivos para atrair o capital estrangeiro tornaram-se determinantes na questão da tributação de impostos, pois as empresas eram isentas desse compromisso, tendo reduzidos totalmente os custos locais e os impostos de renda federal, por um período de tempo. Ainda conforme Oliveira (1976, p. 37), entre 1950 e 1960 foram estabelecidas quinhentas e sessenta e quatro novas indústrias, a grande maioria filiais de indústrias dos Estados Unidos. Nos grandes centros urbanos e industriais do México, os órgãos públicos adotaram medidas para descongestionar essas localidades “problemáticas”, e, não por acaso, o objetivo seria Monterrey e Cidade do México. Deste modo, incentivar o desenvolvimento da indústria local tornou-se obrigação e papel primordial do governo, que procurou implementar em três cidades rurais (Bernardino, Irapuato e Lagunera) os esforços de expansão econômica. No estado de Hidalgo, a cidade industrial de Bernardino foi construída a 104 km de distância da Cidade do México, e para conseguir atrair as indústrias o governo investiu em obras de habitação, escolas, estradas, entre outras infraestruturas públicas. Ainda mais determinante na atração das economias externas foram os 25 anos de isenção do imposto de renda para estas indústrias, sendo quinze anos de abatimento de 80% no imposto predial, possibilitando assim uma compensação das desvantagens locacionais (Oliveira, 1976, p. 37) Na esfera concreta, apesar de todos os incentivos governamentais, a cidade de Bernardino obteve um fracasso na atração de investimentos industriais. Por um lado, os investidores não se sentiram confortáveis devido à péssima localização em comparação com a oferta de matéria-prima e de mercado, e por outro, a precariedade de serviços de comunicações que não atendiam às necessidades industriais. No entanto, resultados positivos foram estabelecidos na cidade de Irapuato, no Estado de Guanajuato, a 355 km da Cidade do México, e na cidade de Lagunera, no Estado de Durango, a 1.100 km da Capital. Ambas as cidades, Irapuato e Lagunera, contavam com boas estradas de rodagem e de ferro, dispondo de generosa mão de obra e facilidades de matéria-prima, mercado e consumo (Oliveira, 1976, p. 38; Takami, 2013, p. 42). Nos países da América do Sul, como, por exemplo, Argentina e Brasil, os distritos industriais vêm apresentando insuficiência de planejamento e, principalmente 29 de sustentabilidade, sendo muitas vezes sua implantação facilitada às indústrias poluentes e indesejadas pelos países desenvolvidos. As novas Tecnologias de Comunicação e Informação (TCI) possibilitaram uma nova configuração na produção industrial no mundo todo, e por isso empresas que não operam sobre essas bases são expulsas para as periferias. Muitas empresas com tecnologias obsoletas, oriundas dos Estados Unidos e Europa, anexam suas plantas produtivas nos países da América Latina, Ásia e África. Além disso, nesses países diversos incentivos são ofertados, como matéria-prima, mão de obra barata, doação de terrenos, entre outros. Isenções de impostos também são concedidas, fazendo parte das exigências. As concentrações industriais no Brasil surgiram de maneira espontânea, sendo que não há registro, num primeiro momento, de políticas incentivando a dispersão geográfica dessas unidades produtivas. Para Oliveira (1976, p. 38), o objetivo dos investidores se direcionava para o mercado ou para as matérias-primas, respeitando a particularidade de cada indústria, visando sempre a maximização dos lucros obtidos. Assim, os detentores do capital procuravam implantar suas empresas nas áreas que reuniam uma maior possibilidade de vantagens, dispondo de mão de obra abundante, facilidade de matéria-prima, ótimos terrenos, fornecimento de água e energia, qualidade no transporte, entre outros benefícios locacionais. Em virtude disso, as indústrias foram se concentrando nas proximidades dos grandes centros urbanos e nas áreas metropolitanas, num processo acumulativo e desordenado. Apesar dos grandes investimentos proporcionados pelas indústrias, faltava às cidades adotarem instrumentos planejadores, ordenando assim o desenvolvimento urbano e industrial. Conforme Prado (2004, p. 264), os grandes lucros da lavoura, particularmente do café, foram aplicados na industrialização, efetivamente, após 1910, e ela se desenvolveu com rapidez, de modo essencialmente individual e restrito, por conta própria e independente. Dessa maneira, tiveram grandes prosperidades nas atividades financeiras, quando o crédito e a especulação aumentaram no mesmo ritmo. Cano (1977, p.27) destaca que o café havia possibilitado de forma efetiva o processo de acumulação de capital, durante todos os anos anteriores à crise de 1929, ou seja, estabelecendo assim o desenvolvimento industrial sobre esses ganhos e a concentração dessas unidades em torno do Rio de Janeiro e, principalmente, em São Paulo. Com o surto Industrial após 1950 e a participação de capitais estrangeiros 30 disponíveis a investir no Brasil, foi se intensificando a concentração industrial no Sudeste, de maneira ainda mais acentuada no Estado de São Paulo. Desta forma, uma das soluções encontradas para solucionar esse problema da concentração industrial, sendo a mesma adotada em outros países da América do Norte e Europa, foi a implantação de distritos industriais. Assim sendo, os distritos industriais, no caso brasileiro, têm apresentado algumas funcionalidades, especialmente a de descongestionar e ordenar o desenvolvimento industrial de grandes áreas metropolitanas. O modelo tem servido como base para outras grandes cidades, como Belo Horizonte, Curitiba e Recife, funcionando como forma de expandir a industrialização para as localidades atrasadas economicamente, áreas que podem ser previamente preparadas e assim criadas condições para a instalação de distritos industriais onde, certamente, as empresas não iriam se localizar de maneira espontânea (Oliveira, 1976, p. 39). No entanto, não há uma política nacional ou regional de instalação de distritos industriais, cabendo aos estados e municípios promoverem a movimentação para conseguir organizar e administrar essas demandas. Este fato acaba levando à proliferação de distritos industriais que são construídos, muitas vezes, sem apresentar um planejamento adequado e sem que tenham uma visão regional mais ampla, levando a erros básicos de localização, comprometendo assim todo o resultado que se espera alcançar (Oliveira, 1976, p. 39; Takami, 2013, p.43). O primeiro distrito industrial, no Brasil, foi construído em 1941, localizado no Estado de Minas Gerais, na cidade de Contagem, denominado de “Cidade Industrial de Contagem”. O grande objetivo do governo mineiro era incentivar a industrialização por meio de algumas vantagens para aquisição de terrenos, mas, além disso, outros pontos chamaram atenção, como o fornecimento de matéria-prima de origem mineral e a oferta de mão de obra abundante. O relatório da Comissão Interestadual da Bacia Paraná-Uruguai (CIBPU, 1966) aponta que a iniciativa dos distritos industriais de Contagem (MG) obteve pleno êxito, pois atraiu 106 empresas até o ano de publicação dos resultados no relatório (Takami, 2013, p. 43; Finatti, 2017, p.45). Continuando a apresentar os fatores históricos condicionantes para o desenvolvimento dos Distritos Industriais nos dias atuais, no território brasileiro, constatamos que foi no Estado do Rio Grande do Sul que surgiu a segunda 31 aglomeração industrial, denominada “Cidade Industrial do Delta”. Embora continuassem ocorrendo medidas com o intuito de atrair unidades fabris e incentivo das políticas estaduais, após algumas tentativas o resultado não foi o esperado pela organização governamental, atingindo êxito somente na década de 1960, com o projeto Distrito Industrial de Porto Alegre. Alguns fatores foram determinantes para que essa iniciativa obtivesse êxito: o estabelecimento do projeto se encontra em uma área com total acesso às residências, indústrias, escolas técnicas e os lotes disponibilizam duas frentes, uma delas voltada diretamente para a rodovia e a segunda para a ferrovia, facilitando as opções de transporte e se ajustando conforme as necessidades do perfil produtivo das empresas (Finatti, 2017, p.46). Conforme Galvão (2000, p.20), no estado do Espírito Santo foram implantadas mais de 700 unidades produtivas de granito e mármore, sendo que aproximadamente 500 delas estão localizadas no Distrito Industrial de Cachoeiro do Itapemirim (ES). Houve na década de 1950 jazidas e rochas ornamentais encontradas para fomentar tal ramo industrial, proporcionando desenvolvimento para as cidades vizinhas. Os Distritos Industriais estabelecidos no Nordeste têm apresentado modulações variáveis e dinâmicas, encaixando-se conforme a racionalidade das indústrias que são características na região. É importante lembrar, contudo, que os benefícios e incentivos proporcionados pela Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) desperta atenção dos empresários, pois gera uma outra visão adicional, por se tratar de um projeto relevante dos órgãos governamentais. O exemplo do Estado da Bahia, dispondo desde 1965 do Centro Industrial de Aratu, gerando mais de 4.500 novas oportunidades de trabalho nos primeiros 5 anos, e do Polo Petroquímico de Camaçari, impulsionando o desenvolvimento e o progresso da população e dos municípios, soma como impacto positivo. No Estado da Paraíba, têm-se intensificados empreendimentos nos Distritos Industriais de Campina Grande e João Pessoa, cujas empresas foram atraídas levando em consideração os incentivos oferecidos pelos estados do Nordeste, por conta da SUDENE. Paralelamente, outra motivação é a grande quantidade de mão de obra disponível, embora ainda precisando ser preparada para certas funcionalidades que demandam uma qualificação necessária. No estado de Alagoas, a área industrial 32 denominada Luís Cavalcanti obteve sucesso com diversas indústrias instaladas, de pequeno e médio porte (Oliveira, 1976, p. 40). Nessa mesma conjuntura, na década de 1970 o Distrito Industrial do município de Rio Claro foi inaugurado, no interior do estado de São Paulo, a aproximadamente 170 km da capital e fazendo limítrofe com a cidade vizinha de Araras, a qual é tema central da referida dissertação. Em 1960, Rio Claro contava com pequenas indústrias e após esse período o desenvolvimento chegou graças à entrada de capital estrangeiro na região, ampliando o investimento no setor, em outras palavras, modificando para médio ou grande porte. A área disponibilizada pela Prefeitura de Rio Claro para executar as obras do Distrito Industrial foi de dois milhões de metros quadrados, na zona norte da cidade, dentro do perímetro urbano do município (Oliveira; Mendes, 1999, p.60). Essas iniciativas apresentadas de maneira pontual sobre os Distritos Industriais são importantes para conseguirmos estabelecer relações, embora as formulações descritas por Marshall ou Becattini sejam bem particulares das suas realidades industriais. Em compensação, os padrões podem se repetir com maior frequência visando às iniciativas de Distritos Industriais implementadas nos Estados Unidos e Inglaterra, inclusive direcionadas para o caso brasileiro, resguardando a particularidade própria de cada localidade. Eis que a organização e estabelecimento dos Distritos Industriais engendram fatores históricos, econômicos e políticos, e no Brasil a dinâmica tomou uma maior ascensão após a Segunda Guerra Mundial. 33 3. A INDUSTRIALIZAÇÃO NO MUNICÍPIO DE ARARAS (SP); ASPECTOS HISTÓRICOS E GEOGRÁFICOS Neste capítulo, será realizada uma breve explanação das questões históricas e geográficas do município de Araras/SP, visando realçar as diversas modificações dos setores econômicos, em especial do setor industrial. Assim sendo, pretende-se apresentar uma cidade cujos habitantes vivem uma atmosfera industrializante, ou seja, com empresas que surgem sob uma ótica familiar e um conhecimento tácito, fazendo relações com o mercado local, regional, nacional e internacional. 3.1 Caracterização Geográfica do Município de Araras. O município de Araras está localizado no centro leste do estado de São Paulo, a aproximadamente 170 km da capital paulista, conforme dados e informações disponibilizados no site do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), e com uma população estimada em 2021 de 136.739 habitantes. A sua área total de 644, 8 Km² está posicionada 22°35` latitude Sul (S) e 47°38` longitude Oeste (W), fazendo limite com as cidades de Rio Claro, Leme, Conchal, Limeira, Cordeirópolis, Santa Gertrudes, Engenheiro Coelho, Mogi – Guaçu e Corumbataí (EMPLASA, 2015). As rodovias Anhanguera SP-330, de grande fluxo no interior do estado de São Paulo, e Wilson Finardi SP-191, que interliga Araras com os municípios vizinhos de Conchal a Leste e Rio Claro a Oeste, faz com que o município tenha acesso rápido por transportes rodoviários. Para o Plano de Desenvolvimento Urbano Integrado (PDUI) da Região Metropolitana de Piracicaba (RMP), tornado um marco legal em 2015, pelo Estatuto da Metrópole (Lei Federal 13.089/15), a malha rodoviária tem significativa importância para a integração dos municípios, visando conectar centros de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), Ciência e tecnologia (C&T), empresas nacionais e multinacionais, entre outras vertentes que promovem o desenvolvimento municipal. Segundo a Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), a cidade de Araras encontra-se na Região Administrativa de Campinas, integrando os 24 munícipios da Região Metropolitana de Piracicaba (RMP), tendo sua inserção 34 aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP) e institucionalizada em 24 de agosto de 2021, pela lei Complementar Estadual de número 1.360. Os municípios que compõem atualmente a Região Metropolitana de Piracicaba (RMP) são: Águas de São Pedro, Analândia, Araras, Capivari, Charqueada, Conchal, Cordeirópolis, Corumbataí, Elias Fausto, Ipeúna, Iracemápolis, Leme, Limeira, Mombuca, Piracicaba, Pirassununga, Rafard, Rio Claro, Rio das Pedras, Saltinho, Santa Cruz da Conceição, Santa Gertrudes, Santa Maria da Serra e São Pedro, e juntos reúnem 1.501.903 habitantes, segundo as estimativas da Fundação SEADE, em 2020. O município de Araras dispõe de 95,3% de urbanização (SEADE, 2022), a rede de esgoto e água tratada atende 98,6% das famílias residentes e as vias públicas têm 84,2% de arborização (IBGE, 2010). Quando abordamos de forma suscita, tem-se que os trabalhadores de Araras ganham em média 2,6 salários mínimos, ficando na posição 117 entre 645 municípios do estado de São Paulo (IBGE, 2021). Em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), em 2020 ele foi de aproximadamente R$ 6 bilhões, com PIB per capita de R$ 49.402,00 no mesmo período. Isto só é possível no município de Araras levando em consideração os setores econômicos (agricultura, indústria, serviços, tecnologia e pesquisa). O setor terciário engloba as concentrações comerciais, sistemas financeiros e de serviços em geral, representando a maior parcela do PIB da cidade atualmente. O setor secundário tem grande influência dos produtos alimentícios, borracha e material plástico, indústrias de máquinas e equipamentos, assumindo a segunda importância de geração de renda para o município. No setor primário, a produção agropecuária é impulsionada em grande parte pela cultura da cana-de-açúcar, em seguida leite e laranja, e também a criação de rebanho bovino e suíno, respectivamente. E por último, o setor quaternário, que impulsiona a economia criativa, pois visa abranger trabalhos ligados à troca de informações, às atividades na área da educação, bem como à alta tecnologia, sendo de extrema relevância para a cidade de Araras e região (SEADE, 2020). 35 Figura 1: Localização do município de Araras no estado de São Paulo Fonte: M. M. Torres, S. R. Christofoletti, D. S. Sardinha e L. H. Godoy (2018, p.41). 36 A cidade de Araras tem por objetivo a erradicação completa do analfabetismo, tendo uma taxa de alfabetização que supera os 93%, situação essa possível com o apoio de iniciativas públicas e filantrópicas (IBGE, 2010). Em relação à educação, a taxa de escolarização de 6 a 14 anos de idade é de 97,5%, com uma nota de 6,5 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDBE), anos iniciais do ensino fundamental da rede pública. Segundo o site da Câmara Municipal de Araras, o ensino profissionalizante conta com uma unidade do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), a Escola Técnica de Comércio (ETCA) e a Escola Técnica Estadual (ETE), esta vinculada ao Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza (CEETEPS). Os habitantes de Araras dispõem de 2 centros de ensino superior privados de renome, o centro Universitário Hermínio Ometto (Uniararas) e o centro Universitário Dr. Edmundo Ulson (Unar), além de um campus da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). ´[ ...] a parceria entre universidades, institutos de pesquisa e empresa garante a continuidade da formação de bons profissionais, o desenvolvimento de tecnologia de ponta, reciclagem e atualizações permanentes dos profissionais engajados nas empresas. Considerando a existência desse “meio técnico-científico- informacional”, surgem novas formas espaciais, entre elas os condomínios industriais e empresariais (Mendes, 2015 p. 193, 194). Ainda sobre as instituições de ensino de nível superior, os municípios em um raio de 80 quilômetros de Araras oferecem excelentes possibilidades, como a Universidade de Campinas (UNICAMP), com campus em Campinas, Limeira e Piracicaba; a Universidade de São Paulo (USP), com campus em São Carlos e Pirassununga; o principal campus da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar); a Universidade Estadual Paulista (UNESP), com campus em Rio Claro, Araraquara, Pirassununga, entre outros centros de P&D e também da C&T. Assim sendo, o município de Araras engloba economicamente e espacialmente a região mais importante do interior do estado de São Paulo, melhor dizendo, aquela que se desenvolve no eixo das Rodovias Anhanguera e Bandeirantes. 37 3.2 Contexto histórico de Araras. Para organizar e sistematizar dados e informações da evolução social, econômica e industrial de Araras, fez-se necessário uma profunda leitura e análise de autores que, ao longo do tempo, não mensuraram esforços para garantir a qualidade das pesquisas realizadas. Entretanto, não existem em abundância referências bibliográficas específicas sobre o assunto abordado. Desta forma, deve-se buscar uma compreensão dentro de perspectivas ativas, adaptáveis e mutáveis dos processos que envolvem o território, compreendendo-se que nessa condição a associação entre a história e a geografia torna-se íntima e indispensável. Para Marc Bloch (2001, p. 54), por trás dos grandes vestígios sensíveis da paisagem [os artefatos ou as máquinas], por trás dos escritos aparentemente mais insípidos e as instituições aparentemente mais desligadas daqueles que as criaram, são os homens que a história quer capturar [...] Portanto, o elo, a ligação, entre a história de Araras e a análise geográfica do território em questão revela-se numa perspectiva ou dialética das relações sociais e espaciais ao longo do tempo, tomando-se camadas sucessivas de elementos que foram herdados de tempos passados e remontando os fenômenos do presente. As origens agrícolas de Araras No século XVIII, com a circulação de fazendeiros e comerciantes rumo à região mineira, nas proximidades do núcleo demográfico de Mogi-Guaçu, começava o povoamento do atual município de Araras. Em 1727, legitimado pelo Escrivão da Comarca de São Paulo, Manoel de Miranda Freire recebeu uma sesmaria de aproximadamente 4.050 alqueiras, cerca de 10.000,00 hectares, às margens do Ribeirão das Araras. Essas terras adquiridas ocupavam áreas de fazendas conhecidas na região, como, por exemplo, Santa Cruz, Araras, Graminha e Santa Terezinha, sendo as duas últimas localizadas no município de Leme. Na sequência, novas sesmarias foram sendo atribuídas aos fazendeiros da época, visando à produção de cana-de-açúcar e de cereais (Diniz, 1968). 38 Em 1818, três indivíduos receberam cada um uma sesmaria no vale do Ribeirão das Araras, Francisco de Góes Maciel, Vicente Pires de Andrade e Manoel da Rosa Maciel, terras estas que mais tarde deram origem ao município de Araras (Mathiesen, 2003). No século XIX, a produção da cana-de-açúcar não estava nos planos do mercado daquele período, o incentivo nesse setor encontrava-se abaixo dos anos anteriores, indicando declínio no interior do Estado de São Paulo. O elemento central foi a mudança de capital direcionada para o cultivo do café, produção valorizada pela famosa terra roxa da região, com investimento pesado visando às exportações. Em 1848, conforme referências consultadas, José de Lacerda Guimarães, futuramente Barão de Arary, deu início à implantação do café em sua propriedade, antes ocupada pelo cultivo canavieiro. Com a alteração para a cafeicultura, as técnicas foram aproveitadas e as plantações foram direcionadas para as terras mais férteis (Diniz, 1968). No dia 19 de maio de 1865, a cidade de Araras iniciou-se com os irmãos Bento de Lacerda Guimarães (futuro Barão de Araras) e José de Lacerda Guimarães (Barão de Arary), que dispuseram o terreno para a criação do patrimônio. Inicialmente, Araras obteve diversos nomes: Samambaia, Sítio Bom Sucesso, Sítio dos Araras, Capela Nova dos Araras, e, por fim, Capela de Nossa Senhora do Patrocínio. Em 1871 o povoado de Nossa Senhora do Patrocínio foi elevado à categoria de vila, transformando-se em município. Alguns anos depois, em 1879, Araras adquiriu a categoria de cidade, despertando a atenção de admiradores da época, não só pela qualidade das terras, como também pela chegada da estrada de ferro, pelos trilhos da Companhia Paulista, proveniente do ramal da estação de Cordeiro (Diniz, 1968; Zambarda, 2001). Segundo Caldeira (1929, p.68), o grande momento de destaque da cafeicultura que ocorreu no interior do Estado de São Paulo, assim como no município de Araras, com a produção em alta, fez com que muitos imigrantes europeus procurassem a cidade em busca de emprego, e no intervalo de 1890 até 1900 a população dobrou. No período em evidência, é interessante mencionar que ocorreu a Abolição da Escravatura e, em seguida, o Brasil tornou-se República, em 15 de novembro de 1889. Desta forma, o cultivo do café foi um marco para a ascensão e crescimento do mercado interno paulista, pois uma parte de seus lucros foi revertida para o 39 desenvolvimento industrial e do setor de serviços, consequentemente (Diniz, 1968; Zambarda, 2001). A virada para o século XX trouxe diversas instabilidades e crises no mercado da época, tanto no Brasil quanto no mundo, alterando o progresso contínuo da produção de café no município de Araras. A primeira Guerra Mundial, de 1914 até 1918, a crise de 1929 e a diminuição natural da fertilidade do solo ocasionaram gradativamente a queda de produção na cafeicultura, consequentemente outras atividades mais lucrativas foram tomando a dianteira em nível regional. As crises e conflitos não diminuíram a produção da cafeicultura de forma repentina e inesperada, como veio a acontecer em outros estados. No município de Araras o cultivo do café tomou novos rumos, indo de 172.000 arrobas em 1929 para 320.000 em 1930, atingindo o apogeu em 1932, com 349.707 arrobas (Caldeira, 1929; Diniz, 1968). Entretanto, após todos esses anos que antecederam 1932, apresentando constante sucesso no cultivo do café, nos anos seguintes a produção começou a apresentar obstáculos, consequentemente, interferindo de maneira negativa nos salários dos trabalhadores rurais, e muitos preferiram sair do município de Araras em busca de melhores vantagens. Desse modo, o êxodo rural intenso na cidade de Araras foi inevitável, pois. com os fazendeiros vendendo suas terras para pagar dívidas, a diminuição de seus habitantes ocorreu de maneira progressiva e indesejada, passando de 25.613 habitantes em 1920 para 25.000 em 1931, 24.234 habitantes em 1936, e para 22.614 em 1940. A situação veio a melhorar a partir de 1940, tendo um restabelecimento populacional em 1950 por influência da expansão do cultivo da cana-de-açúcar, com o município de Araras contabilizando 28.599 habitantes (Caldeira, 1929; Diniz, 1968; Zambarda, 2001). Diniz (1968, p.50) acrescenta que “possivelmente foi em consequência do grande volume de dívidas dos proprietários rurais e da perda de eficiência das suas fazendas que a fragmentação continuou [...]”. Segundo ainda o autor, as fazendas empobrecidas passaram a ser loteadas pelo próprio município de Araras, proporcionando facilidades para os compradores pagarem na data prevista. As fazendas dispunham, algumas vezes, de áreas com cafezais com boa qualidade produtiva. Os primeiros proprietários desses loteamentos investiram na policultura, obtiveram retornos favoráveis, e alguns até enriqueceram. Finalmente sucumbiu assim a referência básica da reprodução capitalista sobre as lavouras de café, dando 40 fôlego suficiente para a eclosão das iniciativas industriais e das grandes áreas urbanas em todo o Estado de São Paulo. Entre os três principais plantios do desenvolvimento da policultura dos anos de 1930 no município de Araras, a produção de mandioca aparece como a cultura mais importante nesse período. Devido à limitação da importação do trigo de outros países, o mercado interno empregou a farinha de mandioca junto à farinha de trigo para a produção de pão. Sendo assim, a cidade de Araras alcançou a terceira posição na produção da farinha de mandioca do Estado de São Paulo, sendo o primeiro na fabricação do polvilho. O sucesso atingido nesse segmento produtivo está expresso em números de estabelecimentos; em 1910 eram 17 fábricas, passando em 1933, para 82 unidades (Caldeira, 1929; Diniz, 1968). A cultura da laranja participou do progresso da policultura e da diversidade produtiva da cidade de Araras, tendo seu espaço, principalmente, pela facilidade de adaptação em qualquer solo e por ser de fácil manejo, desenvolvendo-se perto de centros urbanos, terras de “pior qualidade”. Em 1937, dados da citricultura mostravam que, na produção da laranja, o município de Araras ocupava o sétimo lugar entre os produtores do Estado de São Paulo. Comercializada a fruta, nesse primeiro momento, no seu estado natural, sem processamento industrial, tempos depois o suco de laranja iria impulsar muitas fábricas na região (Caldeira, 1929). Outra cultura que se desenvolveu bastante nesse período foi a do algodão. Isto ocorreu porque o governo americano implementou medidas protecionistas em sua produção favorecendo, consequentemente, a entrada do algodão paulista no mercado internacional da época. No município de Araras a produção passou de 38.667 arrobas, em 1920, para 100.000 arrobas em 1935, aumentando para 390.400 arrobas em 1938 e 423.000 arrobas em 1940, conquistando assim o auge nesse último período caracterizado (Diniz, 1968; Zambarda, 2001). Hoje, no município ararense, é possível constatar a existência de um conjunto de atividades agrícolas e agroindustriais – as culturas de cana, de café, de mandioca, de laranja, a pecuária, a produção de aguardente, de açúcar e de álcool, de laticínios, de farinha de mandioca – implantadas em outras épocas, há décadas, ou mesmo há mais de um século. Elas constituiriam as “camadas”, ou a distribuição de atividades econômicas resultantes da evolução de novas formas de divisão do trabalho e de demanda dos mercados. Surgidas em épocas sucessivas, ficam “superpostas”, e combinadas entre si, de uma forma que é peculiar a Araras (Zambarda, 2001, p. 74). 41 O desenvolvimento industrial de Araras A produção da cana-de-açúcar no município de Araras esteve em posição secundária por um longo período, durante toda época gloriosa das grandes fazendas de café e, posteriormente, da expansão da policultura, focalizada no cultivo da mandioca, laranja e algodão. Os engenhos e alambiques pouco produtivos estavam ultrapassados e antigos, visando à produção de aguardente, principalmente para o comércio local. Mas em 1930 a produção obteve um crescimento, foram produzidos 32.400 litros em 1932, 47.000 litros em 1936 e 52.000 litros em 1938 (Diniz, 1968). A criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA), em 1933, colocou o Estado de São Paulo em primeiro lugar nesse setor, posição que os Estados do Nordeste ocuparam por bastante tempo. Isso aconteceu graças aos grandes investimentos no cultivo da cana-de-açúcar no interior do estado paulista, momento em que os engenhos obsoletos foram substituídos por usinas modernas e tecnológicas, estimuladas pela expansão do consumo interno, proveniente do Centro-Sul do país, assim como, anos depois, em 1950, pela sua crescente exportação para outros mercados mundiais (Diniz, 1968; Zambarda, 2001). Desta forma, foi dentro desse contexto histórico e geográfico que o município de Araras instalou a agroindústria e, consequentemente, desenvolveu o setor canavieiro, assim como ocorreu em outras cidades da região, como Piracicaba, Limeira, Rio Claro, Pirassununga, Leme, entre outros municípios. No período de 1940 a 1950 a produção da cana-de-açúcar transformou a paisagem do campo por inteiro, visando ao desenvolvimento do setor nos moldes industriais, e com isto houve um forte progresso na contratação de assalariados e diaristas, alterando por completo a estrutura agrária da época. A cidade de Araras, devido à cultura canavieira, retomou o controle da produção agrícola e as antigas fazendas cafeicultoras conseguiram respirar aliviadas, escapando da crise (Diniz, 1968; Ferreira, 1983; Zambarda, 2001). A respeito dessa industrialização no município de Araras, as análises das referências bibliográficas trouxeram algumas dificuldades, devido a um pequeno número de pesquisas vinculadas ao tema. Na realidade, o que existe são apenas 42 dados e informações dispersos na literatura especializada, e por essa razão foram de extrema relevância as investigações feitas por Caldeira (1929), Diniz (1968) e Zambarda, (2001). As primeiras indústrias instaladas no município de Araras tiveram relação com os imigrantes estrangeiros. Em 1893 ocorreu a fundação do “Pastifício Venâncio Padula”, criado pelo imigrante Italiano que deu nome ao estabelecimento. Segundo as fontes consultadas, logo depois, em 1895, o suíço Frederico Rüegger inaugurou a Metalúrgica Rüegger, transformando a pequena caldeiraria e oficina mecânica em um novo empreendimento, anexando a elas a fundição de ferro e bronze. Em 1902, Frederico Fachini iniciou a instalação do “Engenho Brasil”, integrando serraria e engenho de arroz, em uma área que ocupava 4.800 metros quadrados. Em 1924, Frederico Fachini e seu irmão aumentaram suas atividades, inaugurando a Serraria Fachini, em uma área de 24.200 metros quadrados, dispondo de equipamentos e máquinas modernas (Caldeira, 1929; Zambarda, 2001). No ano de 1909, Victorio Mazon fundou as “Oficinas Mazon”, fabricando diversos produtos, entre os quais, o moinho de fubá. O estabelecimento funcionava com 16 trabalhadores. Em 1914, iniciaram-se as “Oficinas Irmãos Faggion”, que se especializaram na carpintaria e ferraria na fabricação de carroças e veículos trolleys. Em 1919, Orazio Maselli instalou a indústria de massa denominada de “Grande Pastifício Maselli”, utilizando de vários maquinários nacionais e italianos em sua produção. Em 1925, os organizadores J. Ribeiro & Campos fundaram a fábrica de farinha de milho “São João”, dispondo de máquinas conectadas à eletricidade para a fabricação de farinha de milho, farinha de mandioca, entre outros produtos semelhantes (Caldeira, 1929; Zambarda, 2001). É possível identificar outras fábricas instaladas no município de Araras, embora sem datas referentes a sua abertura, como, por exemplo, a fábrica de oca do Cel. André Ulson Júnior, a Cerâmica Michielin & Cia. Ltda, várias indústrias têxteis, a Marmoraria Carrara, a Selaria e Colchoaria Buzolin e vários estabelecimentos de beneficiamento de mandioca. Cabe ressaltar que, em 1929, as estimativas populacionais da cidade de Araras apontavam cerca de 25.000 habitantes. Desse modo, os estabelecimentos produtivos existentes nesse período eram bem significativos em relação ao aglomerado de 43 pessoas que viviam ali nas áreas urbanas e rurais. No entanto, deve-se considerar que diversas unidades de fábricas, naquela época, resumiam-se a pequenas empresas, com poucos funcionários, podendo ser supridas por mão de obra familiar, funcionando em barracões incorporados às residências ou no fundo de quintais, como, por exemplo, pequenas oficinas dispondo de trabalho artesanal, adquiridas de maneira tácita, podendo se utilizar das máquinas em certos momentos, quando necessário (Zambarda, 2001). Na cidade de Araras, em 1921, a instalação de uma fábrica de grande relevância para a América do Sul atraiu os holofotes para a região, quando uma unidade produtiva da multinacional suíça Nestlé deu início a uma nova etapa de desenvolvimento para o município. Um ano antes da instalação da primeira fábrica dessa grande marca suíça no território brasileiro, em 1920, a empresa veio a adquirir a “Leiteria Nouguès & Lacerda Ltda”, na cidade de Araras, mostrando assim que o seu interesse na região era certo, em razão do meio favorável e das vantagens próprias do lugar. Em relação às vantagens comparativas que são particulares do município de Araras e que proporcionaram o interesse da multinacional Nestlé em fixar ali sua planta produtiva, o sistema ferroviário foi um deles, pois desde 1876 conectava Cordeirópolis, Araras, Pirassununga até Porto Ferreira, contribuindo para a circulação de matérias-primas, principalmente leite e açúcar, naquele momento. O “Laboratório Zurita”, incentivando a pesquisa e a ciência na região, que prestava serviços para a “Leiteria Nouguès & Lacerda Ltda”, também obteve caráter de importância em relação às vantagens locais (Zambarda, 2001, p. 79; Toledo, 2004, p.68). Portanto, desde sua fundação o município de Araras se estabeleceu como um lugar receptivo em relação às modernidades, como, por exemplo, a iluminação pública, datada de 1889, e a metalúrgica visando à manipulação de ferro e bronze, desde 1895. A escola de trabalhadores rurais em Araras, fundada em 1902, disponibilizava aulas de botânica, adubação, zootecnia, entre outras temáticas do campo. Segundo Toledo (2004, p.68), esse momento de modernidades que Araras estava vivenciando proporcionou a produção de máquinas em geral e a instalação de indústrias de motores elétricos, no período de 1937 até 1953, sendo que neste último ano a existência de uma termoelétrica trouxe ainda mais desenvolvimento para o município. 44 Para Diniz (1968, p. 165), a unidade produtiva da Nestlé na cidade de Araras não buscava exclusivamente o aproveitamento do leite local, o interesse da multinacional era na captação do leite regional, promovendo uma rede privilegiada de fornecedores. A presente pesquisa, na qual os distritos industriais do município Ararense, no estado de São Paulo, se encontram em evidência, destaca que a multinacional suíça Nestlé visava desenvolver sua produção de maneira descentralizada, investindo em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de maneira coordenada, algo totalmente inovador para a época, propondo uma atmosfera de firmas criativas. A Nestlé se instalou no bairro Jardim Belvedere, atraindo diversas empresas satélites, ajudando no fornecimento de novas matérias-primas e impulsionando a marca a desenvolver novos produtos, incluindo o achocolatado Nescau, café solúvel Nescafé e a produção da sua própria linha de embalagem metálica. Em 1982, a Nestlé reafirmou a viabilidade econômica da localização e estabeleceu a segunda unidade produtiva no município de Araras, sendo a única cidade do Brasil que comporta duas fábricas em seus limites. A multinacional Nestlé totaliza 31 unidades de produção no território brasileiro, atualmente, localizadas nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Goiás, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Espírito Santo. Para concluir, o último período caracterizado destaca a importância da multinacional suíça Nestlé como alavanca de atração de pequenas e médias empresas para o município de Araras, no qual os bairros Jardim Belvedere e Jardim Sobradinho obtiveram maior concentração dessas unidades satélites. Assim sendo, ficou bem estabelecido que a cidade de Araras sempre investiu no desenvolvimento industrial e no progresso do campo, principalmente como alternativas visando sua economia interna e diversificada. Foi no período de 1980 e 1990 que o município Ararense aproveitou a flexibilização da localização industrial, em função da excelente localização, atrelada às inovações tecnológicas e isenções fiscais, para conseguir atingir o capital estrangeiro ou nacional com esses benefícios relevantes, fazendo com que as fixações de unidades produtivas dentro de seus domínios fossem identificadas progressivamente. As empresas que sucessivamente foram se instalando na cidade de Araras, abrindo espaço para o desenvolvimento de diversas infraestruturas, para, em seguida, 45 promoverem a inauguração de Distritos Industriais, inclusive, desempenham papel importante para toda a região. É nesse contexto que as fábricas, aglomeradas, se estabelecem às margens da Rodovia Anhanguera (SP-330), no entroncamento da Rodovia Wilson Finardi (SP- 191), no início do trecho Araras/Rio Claro. A partir daí, as plantas produtivas passam a empregar grande parte da mão de obra do município Ararense, em boa quantidade pela iniciativa da administração pública que procura agilidade e flexibilidade nas tratativas, no intuito de atender ao empreendedor com políticas eficiente. Atualmente, condições que interferem nos meios de produção não se restringem aos clássicos fatores de atração do capital industrial, elementos recentes aparecem para viabilizar a modernização das empresas e do trabalhador. 46 4. OS DISTRITOS INDUSTRIAIS DE ARARAS (SP): FATORES LOCACIONAIS E POLÍTICAS PÚBLICAS MUNICIPAIS Conseguir relacionar o propósito de analisar a temática estudada com a metodologia escolhida, abordar a industrialização de maneira aglomerada, sob a forma de Distritos Industriais, no estado de São Paulo, tratar a complexidade da realidade em suas múltiplas definições, não é tarefa fácil, pois sua dinâmica ganha novos significados e contornos conforme o tempo, os diversos usos e contextos no território. Selingardi-Sampaio (2009, p. 399) denomina essa complexidade das unidades produtivas no espaço geográfico, no plano conceitual, de Multicomplexo Territorial Industrial (Metropolitano/Urbano) Paulista, usualmente identificado pela sigla MCTIP. Para a autora, estamos tratando de um constructo, ou seja, construção intelectual de maneira construtiva, formativa, longe de ser um “espelho da realidade”, historicamente interativa, articulada e atuante em várias escalas, da local à global (Massey, 2001, p.10). É por isso que, visando uma melhor compreensão, a industrialização paulistana é concebida como uma forma-conteúdo, a concretude que se materializa no território, desde que as relações socioeconômicas, empresarias, institucionais, pessoais, entre outras, são reconhecidas nos municípios e nas cidades. Assim sendo, conjuntamente ao espaço da industrialização é preciso analisar o forte acúmulo de diversas práticas, cristalizadas em camadas que, em tempos diversos, foram se sucedendo continuamente em novas ações e determinações, e que fizeram com que esse território fosse se artificializando e se afirmando como permanência histórica e simbólica (Selingardi-Sampaio, 2009, p. 400). No período de 1970 as transformações e ino