UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS Trabalho de Conclusão de Curso Curso de Graduação em Geologia SUCESSÃO ESTRATIGRÁFICA DO ANDAR ALAGOAS NA SERRA DO TONÃ, BACIA DO TUCANO (BAHIA) Filipe Giovanini Varejão Prof. Dr. Mario Luis Assine Rio Claro (SP) 2013 i UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro FILIPE GIOVANINI VAREJÃO SUCESSÃO ESTRATIGRÁGICA DO ANDAR ALAGOAS NA SERRA DO TONÃ, BACIA DO TUCANO (BAHIA) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, para obtenção do grau de Geólogo. Rio Claro - SP 2013 ii FILIPE GIOVANINI VAREJÃO SUCESSÃO ESTRATIGRÁFICA DO ANDAR ALAGOAS NA SERRA DO TONÃ, BACIA DO TUCANO (BAHIA) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, para obtenção do grau de Geólogo. Comissão Examinadora Mario Luis Assine (orientador) José Alexandre de J. Perinotto Lucas Veríssimo Warren Rio Claro, 06 de novembro de 2013. ______________________ ______________________ Filipe Giovanini Varejão Mario Luis Assine iii Aos meus pais e à minha querida irmã. iv “Every day you may make progress. Every step may be fruitful. Yet there will stretch out before you an ever- lengthening, ever-ascending, ever improving path. You know you will never get to the end of the journey. But this, so far from discouraging, only adds to the joy and glory of the climb.” Winston Churchill v AGRADECIMENTOS Ao Programa de Formação de Recursos Humanos em Geociências e Ciências Ambientais Aplicadas ao Petróleo – PRH 05/UNESP, ao PFRH/Petrobrás e ao PRH/ANP – FINEP/MCT, pelo apoio acadêmico e financeiro, indispensáveis à realização deste trabalho de conclusão de curso. Ao convênio PETROBRÁS / UNESP / FUNDUNESP (0050.0023165.06.4 SAP nº 46.00321584 – CCP nº 1850/10), projeto “Análise Estratigráfica do Andar Alagoas nas Bacias do Araripe, Tucano/Jatobá, Paranaíba e Sanfranciscana” pela oportunidade de aprendizagem e apoio aos trabalhos desenvolvidos. Ao Prof. Dr. Mario Luis Assine pela atenção, paciência e constante aporte de ótimas ideias e sugestões durante a execução desse projeto, que agregaram valor ao produto final. E por estar sempre pensando à frente. Ao Prof. Dr. José Alexandre de J. Perinotto, que, em meio a tantas atribuições, sempre conseguiu achar tempo para ajudar da melhor forma possível. Agradeço em especial pela participação em etapas de campo e pelas sugestões no texto. Ao Prof. Dr. Virgínio Henrique de Miranda Lopes Neumann por me apresentar a serra do Tonã e pelas discussões e companheirismo em campo. Ao geólogo e grande amigo Bruno Cesar Araújo pelos campos, cervejas e por ter me ensinado muitas coisas úteis, essenciais para a realização deste trabalho. Aos sobreviventes da 30F (Victor Slywitch, Leandro Koga e Lee Balster) pelos cinco anos de convivência e paciência. À minha turma Álcool’n’Geo por serem aqueles com quem aprendi geologia e de quem sempre irei lembrar. Em fim, a todos que contribuíram de forma direta ou indireta para a realização deste trabalho. vi SUMÁRIO RESUMO.................................................................................................................................... x ABSTRACT................................................................................................................................. xi 1. INTRODUÇÃO........................................................................................................................ 1 2. BACIA DO TUCANO............................................................................................................... 3 2.1 FORMAÇÃO MARIZAL................................................................................................... 8 2.2 SEÇÃO ESTRATIGRÁFICA DA SERRA DO TONÃ........................................................... 10 3. OBJETIVOS.......................................................................................................................... 12 4. MÉTODOS E ATIVIDADES REALIZADAS.............................................................................. 13 5. RESULTADOS....................................................................................................................... 18 5.1 SEÇÕES-COLUNARES...................................................................................................... 18 5.1.1 Seção-colunar Salgado do Melão – parte inferior................................................... 20 5.1.2 Seção-colunar Salgado do Melão – parte superior................................................. 20 5.1.3 Seção-colunar Cachoeira Seca................................................................................ 25 5.2 FÁCIES SEDIMENTARES.................................................................................................. 27 5.3 PALEOCORRENTES......................................................................................................... 35 6. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS........................................................................................... 37 7. CONCLUSÕES....................................................................................................................... 45 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................. 46 vii ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 - Localização da área estudada................................................................................... 2 Figura 2 - Mapa geológico das Bacias Recôncavo-Tucano-Jatobá............................................ 4 Figura 3 - Carta estratigráfica da sub-bacia Tucano Norte e Bacia do Jatobá........................... 7 Figura 4 - Coluna estratigráfica da Bacia do Jatobá e sub-bacia Tucano Norte...................... 11 Figura 5 - Mapa de pontos realizados na região da Serra do Tonã......................................... 16 Figura 6 - Representação em mapa dos três intervalos estratigráficos e localização das três seções-colunares levantadas (imagem Landsat composição R5-G3-B2)......................... 19 Figura 7 - Localidade de Salgado do Melão, com a serra do Tonã ao fundo e a localização das seções inferior e superior.................................................................................................. 20 Figura 8 - Seção-colunar de Salgado do Melão - parte inferior.............................................. 21 Figura 9 - Fácies da seção-colunar Salgado do Melão – parte inferior................................... 22 Figura 10 - Seção-colunar de Salgado do Melão – parte superior.......................................... 23 Figura 11 - Fácies da seção-colunar Salgado do Melão – parte superior................................ 24 Figura 12 - Cachoeira Seca na encosta leste da Serra do Tonã............................................... 25 Figura 13 - Seção-colunar Cachoeira Seca.............................................................................. 26 Figura 14 - Brecha formada por clastos angulosos de calcário, sustentados por matriz calcítica fina................................................................................................................. 27 Figura 15 - Arenito com estratificação cruzada acanalada e tangencial na base.................. 28 Figura 16 - Arenito com estratificação cruzada planar........................................................... 29 Figura 17 - Arenito com laminação horizontal........................................................................ 30 Figura 18 - Fácies Sr................................................................................................................. 30 Figura 19 - Arenito com acamamento flaser.......................................................................... 31 Figura 20 - Arenito maciço...................................................................................................... 32 Figura 21 - Estratificação cruzada sigmoide............................................................................ 33 viii Figura 22 - Detalhe de uma estratificação cruzada sigmoide com alternância de ciclos mais lamosos com ciclos mais argilosos.................................................................................. 33 Figura 23 – Lamitos................................................................................................................. 34 Figura 24 - Fácies carbonáticas............................................................................................... 34 Figura 25 - Mapa de paleocorrentes do Andar Alagoas na sub-bacia Tucano Norte.............. 36 Figura 26 - Seção-colunar composta Salgado do Melão, construida pela superposição das seções levantadas na área................................................................................................ 38 Figura 27 - Perfil vertical representando o modelo de rios entrelaçados de Walker............. 39 Figura 28 - Seção tipo da Formação Serra do Tonã de Rolim (1984)...................................... 41 Figura 29 - Correlação da sucessão estratigráfica do Andar Alagoas na serra do Tonã com a seção do Rio da Batateira da Bacia do Araripe....................................................................... 43 Figura 30 - Paleocorrentes do Andar Alagoas nas bacias sedimentares fanerozóicas da Região Nordeste do Brasil....................................................................................................... 44 ix ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 - Código de fácies de depósitos aluviais................................................................... 14 Tabela 2 - Localização do ponto inicial (base) das seções levantadas.................................... 17 Tabela 3 - Código de fácies do Andar Alagoas na sub-bacia Tucano Norte............................ 29 x RESUMO Localizada no nordeste da Bahia, a serra do Tonã é uma chapada alongada na direção N-S e de topo plano, que se destaca na paisagem de relevo arrasado da Bacia do Tucano. A sucessão estratigráfica presente nessa região compõe a sequência pós-rifte da bacia, de idade aptiana. Por meio do levantamento de seções-colunares, da identificação das fácies sedimentares e da interpretação de imagem de satélite, foram reconhecidas três unidades estratigráficas contínuas na serra do Tonã, que se superpõem na vertical, correlacionadas ao registro aptiano da Bacia do Araripe: (1) unidade carbonática inferior, formada por calcários laminados e níveis brechados, com espessura média de 5 m, correlatos às Camadas Batateira; (2) unidade siliciclástica intermediária com aproximadamente 100 m de espessura, composta na parte inferior por arenitos com porções conglomeráticas, em ciclos de granodecrescência ascendente, que gradam para lamitos intercalados com arenitos na parte superior; estruturas sedimentares sugerem atuação de correntes de maré na porção superior da unidade; e (3) unidade carbonática superior, constituída de calcários laminados, com espessura variável entre 2 e 10 m, relacionados à base da Formação Santana, registro da implantação de um sistema subaquoso lacustre, possivelmente com influência marinha. A análise de paleocorrentes na seção siliciclástica intermediária indica área-fonte a norte e paleofluxos com rumo para sul, assim como os apresentados paras as fácies fluviais aptianas da Bacia do Araripe, mostrando que as duas bacias integravam uma mesma paleodrenagem continental. Palavras-chave: Formação Marizal. Formação Santana. Andar Alagoas. Serra do Tonã. Bacia do Tucano xi ABSTRACT STRATIGRAPHIC SUCCESSION OF ALAGOAS STAGE ON SERRA DO TONÃ, TUCANO BASIN (BAHIA). Located in northeast of Bahia, serra do Tonã is a NS elongated plateau that standsout in the flattened relief of Tucano Basin. The stratigraphic succession belongs to the Aptian post-rift sequence of this basin. Based on facies analysis, vertical stratigraphic profiles and satelite images interpretation, three stacked stratigraphic units were recognized: (1) lower carbonate unit, composed by laminated limestones and breccias, 5 m thick, correlated with Camadas Batateira of Arripe Basin; (2) intermediate siliciclastic unit, 100m thick and made of sandstones exhibiting finning upward cycles, overlaid by mudstones and sandstones wich sedimentary structures suggest action of tidal currents and (3) upper carbonate unit, composed by laminated limestones, 2-10 m thick, related with Santana Formation, that record lacustrine environment with possible marine influence. Paleocurrent analysis indicates proviniance from north and paleoflows towards south, similar to the Aptian fluvial facies of Araripe Basin, showing that both basins integrated the same continental paleodrainage. Key-words: Marizal Formation. Santana Formation. Alagoas Stage. Serra do Tonã. Tucano Basin. 1 1. INTRODUÇÃO O petróleo tem sido o principal fator estimulante das pesquisas em bacias sedimentares em todo o mundo, sendo que no Brasil o desenvolvimento do conhecimento nessa área muito se deve aos esforços da Petrobras. As bacias do Recôncavo, Tucano e Jatobá não foram exceção. A partir da descoberta de petróleo (poço produtor 1-L-3-BA), no município de Lobato (BA), em 1939, diversos estudos foram feitos. Foram descobertos 1 campo de óleo e 6 campos de gás na sub-bacia Tucano Sul, com total de 122 poços perfurados (BDEP/ANP). Perfurações nas sub- bacias do Tucano Central e Norte não revelaram acumulações de hidrocarbonetos, desestimulando a pesquisa na área pela indústria do petróleo. Em decorrência disso, o grau de conhecimento geológico ao longo do rifte Recôncavo-Tucano-Jatobá é bastante variável, principalmente no que diz respeito à fase pós-rifte. Persistem divergências quanto à litoestratigrafia, à paleogeografia e à evolução dessa sucessão. O presente trabalho apresenta novos dados e informações que permitam caracterizar de melhor forma as unidades da sequência pós-rifte da bacia do Tucano. Para tal, foi selecionada a região da serra do Tonã, onde está preservada sucessão siliciclástico-carbonática de idade aptiana, única na bacia e de importante representação em escala regional. Apesar de seu importante registro sedimentar, poucos são os autores que fazem menção à sucessão litoestratigráfica presente na serra do Tonã, não sendo ainda representada em cartas estratigráficas da bacia. Contudo, associações com essa sucessão foram feitas por Assine (1990), Bueno (1996), Neumann et al. (2009) e Lima et al. (2011), correlacionando-a com a Formação Santana das bacia do Araripe e Jatobá. A análise pormenorizada do registro aptiano completo da bacia do Tucano Norte, na serra do Tonã, e sua correlação com as unidades aptianas das bacias do Araripe e Jatobá é uma contribuição aos conhecimentos relacionados à evolução completa da seção pós-rifte e ao contexto paleogeográfico do nordeste brasileiro à época de deposição. 2 A serra do Tonã está situada na porção centro-oeste da sub-bacia Tucano Norte (Figura 1) e o principal acesso à área se dá por estrada de terra que liga os municípios de Paulo Afonso e Macururé. O clima na região é semiárido, com baixa pluviosidade anual, com média de precipitação de 583 mm/ano, e temperatura média de 26º C (Almeida-Filho et al., 2002) Figura 1 – Localização da área de estudada. 3 2. BACIA DO TUCANO A Bacia do Tucano faz parte do rifte intracontinental Recôncavo-Tucano- Jatobá (RTJ), originado a partir dos eventos tectônicos eocretáceos que culminaram na ruptura do Gondwana e consequente abertura do oceano Atlântico Sul (Magnavita et al., 2003; Costa et al., 2007). Segundo Szatmari & Milani (1999), durante a sedimentação dos andares Rio da Serra e Aratu, a zona de cisalhamento Pernambuco-Ibimirim apresentou-se como um anteparo reológico responsável pela transferência da distensão continental (direção EW) para a zona transformante Sergipe-Alagoas e, portanto, abortando o desenvolvimento do rifte. A evolução das bacias RTJ está relacionada ao desenvolvimento de meio- grábens assimétricos, com direção aproximadamente norte-sul (Karner et al., 1992) que resultaram em bacias separadas por altos do embasamento e falhas de transferência. O Alto de Aporá separa as bacias do Tucano e Recôncavo e, a falha do rio São Francisco, as bacias do Tucano e Jatobá (Figura 2). Com base em dados de refração e reflexão sísmica, Milani & Davison (1988) determinaram, para a Bacia do Tucano, espessura sedimentar máxima da ordem de 10 a 12 km, associados a uma anomalia de gravidade de -120 mGal. O relevo da bacia é tipicamente aplainado por erosão, com altitudes médias em torno de 400 m, sendo chamado regionalmente de “raso”. No entanto, em meio a esse “raso” encontram-se testemunhos de terrenos altos, entre 500 e 600 m, com superfície plana, denominados tabuleiros, sendo a serra do Tonã, localizada no noroeste da sub-bacia norte, a feição mais representativa. 4 Figura 2 - Mapa geológico das Bacias Recôncavo-Tucano-Jatobá (modificado de CPRM, 2007). 5 A Bacia do Tucano localiza-se no nordeste do Estado da Bahia, ocupando área de aproximadamente 30.500 km2 (Costa et al., 2007) e encontra-se segmentada em três sub-bacias: norte, central e sul. Os limites da sub-bacia Tucano Sul são marcados pela falha de Inhambupe, a leste; pelo Alto de Aporá, a sul; e pela zona de acomodação do rio Itapicuru, a norte. O limite ocidental é marcado ora por discordância, ora por meio de monoclinal falhado. A sub-bacia ocupa uma área triangular com aproximadamente 7.000 km² (Magnavita et al., 2003). A sub-bacia Tucano Central é a maior das sub-bacias, com aproximadamente 14.700 km², configurando-se como meio-gráben de assimetria acentuada. Sua borda oriental, onde situa-se o depocentro da sub-bacia, é marcada pela Falha de Adustina e pela ocorrência de depósitos de sistema de leques aluviais da Formação Salvador. A borda oeste é flexural, mas afetada por conjunto de falhamentos normais de pequeno rejeito (Santos & Reis et al., 2011). O limite entre as sub-bacias Norte e Central é definido pelo Alto do Vaza- Barris e pelas falhas de transferência de Caritá e de Jeremoabo, que constituem zona de acomodação determinante na inversão da assimetria dos meio-grábens, cujo depocentro se encontra próximo à borda leste, nas sub-bacias sul e central, transferindo-se para próximo da borda oeste na sub-bacia norte (Magnavita & Cupertino, 1987; Milani & Davison, 1988; Magnavita et al., 2003). Com cerca de 8.800 km², a sub-bacia Tucano Norte tem limite norte com a Bacia do Jatobá definido pela zona de falha do rio São Francisco (Magnavita et al., 2003). As bacias constituintes do rifte RTJ comportam, segundo Costa et al. (2007), pelo menos três supersequências, formadas em distintos eventos tectônicos: pré- rifte, rifte e pós-rifte (Figura 3). A supersequência pré-rifte data do Jurássico, sendo formada por arenitos continentais e folhelhos lacustres das formações Sergi e Aliança. A supersequência rifte teve início no Berriasiano, sendo formada por conglomerados associados a bordas de falhas da Formação Salvador, por folhelhos e turbiditos gerados em um lago profundo da Formação Candeias, por arenitos e folhelhos deltaicos da Formação Ilhas e por arenitos fluviais da Formação São Sebastião (Magnavita et al., 1994). 6 O Andar Alagoas na Bacia do Tucano é o registro da sedimentação da sequência pós-rifte, representada pela Formação Marizal. Esta fase se estende do Aptiano ao Eoalbiano, sendo separada na base e no topo por duas discordâncias, compreendendo uma sedimentação em bacia do tipo sag (Magnavita et al., 2003). Segundo Chang et al. (1992), o estágio pós-rifte mostra pulso de alta subsidência durante o Aptiano-Albiano logo após o final do estágio rifte, o que é compatível com o resfriamento termal da litosfera continental. A taxa de sedimentação diminui após o Albiano e alcança índices mínimos durante o Cretáceo Superior. O final do período de bacia “faminta” não é síncrono ao longo da margem leste brasileira, sendo essencialmente controlado pelo fornecimento de sedimentos a partir de tectônica local (Chang et al., 1988). A espessura dos sedimentos pós-rifte na Bacia do Tucano, é pouco representativa se comparada àquelas preservadas nas bacias marginais do Brasil, onde houve acúmulo e preservação da fase de margem passiva. Segundo Karner et al. (1992), a não preservação dos sedimentos pós-rifte sugere duas hipóteses: (1) a fase pós-rifte nunca foi depositada e assim a subsidência é limitada ao período ao qual a litosfera encontrava-se em fase de extensão; ou (2) foi depositada e subsequentemente erodida. Porém, a porosidade dos arenitos da fase pré-rifte (Formação Sergi) é considerada primária e apresenta valores de 10-20% em profundidades de 2.5-2.6 km (De Ros, 1986), o que mostra que, provavelmente, não tenha ocorrido deposição significativa nessa fase. Magnavita et al. (1994), aplicando modelo flexural cantilever (Kusznir & Egan, 1989), propuzeram sequência de eventos que teria ocorrido na fase pós-rifte das bacias Recôncavo-Tucano-Jatobá: (1) Soerguimento regional rápido gerando rebote elástico e discordância angular; (2) subsidência térmica pós-rifte durante 90 Ma (Aptiano ao Oligoceno), acumulando aproximadamente 1km de sedimentos; (3) soerguimento durante o Oligoceno, com a posterior erosão da maior parte do depósito pós-rifte e colocação da Formação Marizal aos níveis topográficos atuais. 7 Figura 3 – Carta estratigráfica da sub-bacia Tucano Norte e Bacia do Jatobá (Costa et al., 2007), com destaque para a fase pós-rifte. 8 2.1 FORMAÇÃO MARIZAL A Formação Marizal foi primeiramente descrita por Brazil (1947). Viana (1971) redefiniu a Formação Marizal, caracterizando-a pela presença de arenitos finos a grossos, conglomerados polimíticos e, subordinadamente, siltitos, folhelhos e calcários; reunindo as formações Marizal e Cícero Dantas, propostas por Brazil (1947). A espessura média dessa formação é de 150 m, atingindo até 300 m na sub- bacia Tucano Central. A deposição da Formação Marizal marca o início da fase pós-rifte das bacias Recôncavo-Tucano-Jatobá, no Eoaptiano, sobrepondo-se à sequência rifte através de discordância angular. Os depósitos aluviais da Formação Marizal recobrem cerca de 75% das bacias RTJ, muitas vezes ultrapassando o seu limite, recobrindo as ombreiras do rifte. Analisando paleocorrentes da Formação Marizal, na bacia Tucano- Recôncavo, Rolim & Mabesoone (1982) propuseram sedimentação em sistema fluvial que se iniciou durante a fase rifte, com os sedimentos da Formação São Sebastião e que, após ligeiro hiato sedimentar, continuou a se desenvolver durante a fase pós-rifte, com fluxo aproximadamente para sul. Segundo Magnavita et al. (1994), a Formação Marizal é formada por arenitos fluviais, conglomerados formados em leques aluviais e ocasionalmente por folhelhos lacustres de idade aptiana. Os sedimentos dessa unidade foram depositados sobre superfície de erosão ondulada, ocorrendo também além das bordas falhadas da bacia (onlap no embasamento). A Formação Marizal apresenta características semelhantes a algumas unidades presentes nas bacias intracontinentais do nordeste brasileiro, sendo uma delas a Formação Barbalha da Bacia do Araripe (Assine, 1994). Paleocorrentes medidas em ambas as formações indicam paleofluxos para sudeste, o que mostra que os eventos tectônicos da fase rifte não alteraram significativamente a paleodrenagem continental, mostrando que esta continuou a fluir em direção às bacias Recôncavo, Tucano e Jatobá e, possivelmente, Sergipe-Alagoas (Assine, 1994). 9 Estudando os sedimentos arenosos e conglomeráticos da Formação Marizal nos arredores de Camaçari e Dias Dávila, Lima & Vilas Boas (2000) reconheceram dois modelos de deposição: 1) rios cascalhosos, proximais, de baixa sinuosidade associados a fluxos de detritos; 2) rios rasos e largos, distais, de sinuosidade baixa a intermediária. Estudos de paleocorrentes nestes domínios indicaram vetores médios com sentido para sudeste, corroborando com os dados de Rolim (1984) que indicaram vetor médio de 167°. Costa et al. (2007) caracterizaram a Formação Marizal como pertencente a uma associação de fácies aluviais, representadas por conglomerados e arenitos neo-aptianos. Santos & Reis (2011), ao mapearem a Formação Marizal na região a sul da Falha de Jeremoabo (Bacia Tucano Central), descreveram áreas com desnível topográfico de até 200m na forma de relevo em mesas e tabuleiros chamados de “rasos”. Segundo os mesmo autores os arenitos mais comuns são médios, micáceos e apresentam estratificação cruzada acanalada e plano-paralela; os arenitos conglomeráticos são arenitos finos a grossos com clastos de tamanho seixo e bloco; os conglomerados são polimíticos sustentados por matriz areno-argilosa e por vezes pelos clastos. Ainda afirmaram que estratificações cruzadas acanaladas e imbricamento dos clastos indicam transporte de carga predominantemente para SSW. Os folhelhos e siltitos apresentam laminação plano-paralela em camadas tabulares e em lentes (Santos & Reis, 2011). Além dos sedimentos característicos de deposição em sistemas aluviais, Santos & Reis (2011) descreveram, na Formação Marizal, arenitos médios, foscos, com alta esfericidade e arredondamento, bem selecionados, com predomínio de dois tamanhos de grãos, com estratificação cruzada acanalada de médio a grande porte e camadas com granocrescência ascendente, característicos de deposição em ambiente eólico. 10 2.2 SEÇÃO ESTRATIGRÁFICA DA SERRA DO TONÃ Rolim (1984) descreveu o registro sedimentar da serra do Tonã, e propôs a elevação da Formação Marizal a Grupo, sugerindo duas novas unidades: Sequência Detrítica e Formação Serra do Tonã. A Sequência Detrítica caracteriza-se por arenitos médios e finos com matriz pelítica, incluindo-se os sedimentos clásticos da serra do Tonã, que apresentam organização estratiforme cíclica (granodecrescente ascendente) e estratificação cruzada de médio a pequeno porte. A sedimentação teria ocorrido em barras em pontal. A Formação Serra do Tonã foi caracterizada por calcários laminados de textura fina, ricos em óxido de ferro e por estrato pelítico margoso, ocorrendo sobrepostos aos arenitos fluviais da Sequência Detrítica. Em função da ausência de dolomitos e evaporitos associados a esta formação, Rolim (1984) sugere que houve precipitação química dos sedimentos carbonáticos, determinando ambiente lacustre para estes. Magnavita et al. (1994) indicaram que após o final da fase rifte, época da deposição dos carbonatos albianos da Bacia do Jatobá, a bacia encontrava-se provavelmente próxima ao nível do mar, sofrendo, dessa forma, influência do mesmo. Segundo o mesmo autor, após a deposição dos carbonatos, a área sofreu soerguimento de ao menos 600 m, seguida de erosão regional, a até 550 m acima do nível do mar, de idade desconhecida. A explicação mais plausível para a discordância pós-albiana é de que tenha ocorrido magmatismo tardio abaixo da placa, com evidências de magmatismo onshore - diques doleríticos a leste da Bacia do Tucano (Magnativa et al., 1994). Nas serras Negra e do Periquito foram descritos por Lima et al. (2011) litotipos flúvio-lacustres que se intercalam com carbonatos lacustres laminados, pelitos lacustres e calcários maciços fossilíferos. Esses litotipos apresentam prova da existência de um paleolago aptiano com características semelhantes aos de mesma litologia e idade das bacias Araripe e Tucano (Lima et al., 2011; Rocha, 2011) Em função da semelhança litológica, estratigráfica e das feições deposicionais, as sucessões estratigráficas da Serra do Tonã (Bacia do Tucano) e 11 das serras Negra e Periquito (Bacia do Jatobá), vem sendo comparadas à Formação Santana da Bacia do Araripe (Assine, 1990; Bueno, 1996; Neumann et al., 2009; Lima et al., 2011). Diferentemente da sequência pós-rifte da Bacia do Araripe, não existem registro de evaporitos na Bacia do Tucano (Rolim, 1984). A ausência de gipsita na Serra do Tonã indica condições menos restritas do ambiente deposicional em relação às condições reinantes na Formação Santana - Membro Ipubi (Bueno, 1996). Figura 4 – Coluna estratigráfica da Bacia do Jatobá e sub-bacia Tucano Norte (modificado de Lima et al., 2011), com destaque para a sequência pós-rifte. 12 3. OBJETIVOS Como apresentado anteriormente, o Andar Alagoas da Bacia Tucano foi ainda pouco estudado, carecendo de mais informações acerca de seu registro estratigráfico. Questões como relações de contato entre as unidades aflorantes e suas diferenças faciológicas ainda não estão satisfatoriamente respondidas. Para tentar sanar algumas das questões apresentadas, o presente trabalho tem por meta estabelecer e caracterizar a sucessão estratigráfica vertical de fácies do Andar Alagoas na sub-bacia do Tucano Norte, especificamente na serra do Tonã, onde se encontra aflorante a Formação Marizal e está preservada seção reliquiar da Formação Santana São objetivos específicos desta pesquisa: (a) descrição de fácies sedimentares das formações Marizal e Santana; (b) levantamento de seções estratigráficas verticais; (c) definição do padrão de paleocorrentes, interpretação do paleomergulho deposicional e definição das áreas-fonte; (d) interpretação dos paleoambientes deposicionais; e (e) discussão do contexto paleogeográfico regional. 13 4. MÉTODOS E ATIVIDADES REALIZADAS A análise de uma bacia sedimentar requer o conhecimento de diversas especialidades geológicas, sendo que entre elas, com destaque para a estratigrafia, a geologia estrutural e a sedimentologia. O entendimento do conceito de fácies é também muito importante nesse tipo de análise, pois a partir da identificação de associações de fácies é possível interpretar os processos responsáveis pela sedimentação dos litotipos, mostrando-se ferramenta importante em casos onde o registro sedimentar é incompleto (Miall, 2000). As litofácies são agrupadas em associações de fácies, em função de representarem diversos eventos deposicionais, ocorrendo em associação nos ambientes deposicionais. Esse fator representa a base do princípio de Walther que formula a famosa “lei de sucessão de fácies” ou “Lei de Walther” (Midleton, 1973). A importância dessa lei na análise de bacias é de que a relação lateral das fácies sedimentares pode ser prevista através do estudo das mesmas fácies empilhadas verticalmente. Segundo Reading (1986) o estudo da sucessão vertical de fácies permite organizar os elementos, através da descrição concisa de espessa pilha de sedimentos com estruturas complexas. Walker (1992) propôs que o modelo de fácies deve atender a quatro funções principais: (1) agir como uma norma para critérios de comparação; (2) constituir base e guia para observações futuras; (3) prever uma nova situação geológica; (4) servir como base para interpretação ambiental. O conhecimento da associação de fácies é essencial antes de se propor uma interpretação paleoambiental (Reading & Level, 1996). O modelo de fácies constitui ainda, ferramenta poderosa para a interpretação de sedimentos mal expostos, pois sugere uma observação crítica ou evidências para a interpretação do registro sedimentar (Miall, 2000). No presente trabalho foi utilizado o código de fácies (Tabela 1) originalmente proposto por Miall (1978) e enriquecido com modificações propostas por de Eyles et al. (1983) e por Miall (1996). Algumas das fáceis encontradas não estão presentes no código de fácies de Miall, assim, algumas das fácies usadas no trabalho foram adaptadas. 14 Tabela 1 – Código de fácies de depósitos aluviais (Miall, 2006). Código de Fácies Fácies Estrutura Sedimentar Gmm Conglomerado maciço, matriz sustentado Gradação fraca Gmg Conglomerado matriz-sustentado Gradação inversa a normal Gci Conglomerado clasto-sustentado Gradação inversa Gcm Conglomerado maciço, clasto- sustentado - Gh Conglomerado fracamente estratificado, clasto-suportado Acamamento horizontal, imbricação Gt Conglomerado estratificado Estratificação cruzada acanalada Gp Conglomerado estratificado Estratificação cruzada planar St Arenito fino a muito grosso, podendo ser seixoso Estratificação cruzada acanalada Sp Arenito fino a muito grosso, podendo ser seixoso Estratificação cruzada planar Sr Arenito muito fino a grosso Laminação cruzada ripple Sh Arenito muito fino a grosso podendo ser seixoso Laminação horizontal Sl Arenito muito fino a grosso, podendo ser seixoso Estratificação cruzada de baixo ângulo (<15º) Ss Arenito fino a muito grosso, podendo ser seixoso Incisões rasas Sm Arenito fino a grosso Maciço ou laminação esmaecida Fl Areia, silte e lama Laminação fina, ripples muito pequenos Fsm Silte e lama Maciço Fm Lama e silte Maciço, gretas de ressecamento A análise de paleocorrentes é uma ferramenta extremamente importante, com grande potencial para a reconstrução da história deposicional dos sedimentos, além de indicar o mergulho deposicional e a paleodrenagem continental à época da sedimentação. Para tal análise, procurou-se tomar, sempre que possível, uma quantidade mínima de 20 medidas por estação, número razoável de medidas segundo Miall (1984) para sedimentos de origem aluvial. As paleocorrentes foram medidas em fácies fluviais a partir do sentido de mergulho dos estratos frontais das 15 estratificações cruzadas, por se constituírem as feições indicativas de fluxo mais comumente encontradas na área. A pesquisa se iniciou pelo levantamento bibliográfico de material referente às bacias do Recôncavo, Tucano e Jatobá e do contexto da evolução do rifte, com atenção principal para a sequência pós-rifte da Bacia do Tucano Norte. Em função da origem flúvio-lacustre das unidades, também foi elaborada a consulta bibliográfica dos principais artigos e livros na área, bem como trabalhos de descrição de métodos de análise de bacia. Com o desenvolver da etapa de pesquisa bibliográfica, foi sendo montado banco de dados contendo todo o material consultado. Foram propostas duas etapas de campo, a primeira realizada no período de 16 a 22/11/2012 e a segunda realizada no período de 07 a 15/06/2013. Para o planejamento das campanhas de campo (acesso, locais para o levantamento de seções-colunares, etc.), foram interpretadas imagens Landsat e do Google Earth. A primeira campanha de campo teve o intuito de descrever fácies sedimentares, levantar seções estratigráficas verticais e estabelecer estações de paleocorrentes do Andar Alagoas, na região da serra do Tonã. A segunda etapa de campo foi realizada com o objetivo de levantar novas seções-colunares, completar as já existentes e rastrear os níveis de calcários presentes na região, buscando correlação nas seções levantadas. Os pontos descritos e as seções analisadas durante as etapas de campo realizadas na região da serra do Tonã estão indicadas na figura 5. A fim de realizar caracterização faciológica mais aprimorada e para estabelecer melhor as relações de contato entre as unidades estratigráficas, três seções-colunares foram levantadas em drenagens e morros próximos à localidade de Salgado do Melão (BA), com a descrição de fácies, medidas de paleocorrentes, coleta de amostras e documentação fotográfica. As coordenadas do ponto inicial de cada seção encontram-se na tabela 2. 16 Figura 5 – Mapa de pontos realizados na região da serra do Tonã. 17 O levantamento de seções-colunares é de grande importância para o trabalho, pois se trata de uma ferramenta importante para a elucidação de questões ainda não resolvidas na bacia, tais como, relações de contato e caracterização faciológica das unidades. No entanto, o levantamento de tais seções foi dificultado pela baixa quantidade de boas exposições e principalmente pela localização da área de estudos, com grande dificuldade de acesso. Os dados de paleocorrente levantados foram analisados estatisticamente utilizando-se softwares apropriados, sendo apresentados na forma de rosetas de isofrequência e inseridos nas seções-colunares e nos mapas. Tabela 2 – Localização do ponto inicial (base) das seções levantadas. (Coordenadas UTM Zona– 24S) Seção E (m) N (m) Z (m) Salgado do Melão – parte inferior 535.210 8.971.544 396 Salgado do Melão – parte superior 534.669 8.973.911 451 Cachoeira Seca 531.939 8.974.144 446 18 5. RESULTADOS A sub-bacia do Tucano Norte difere do restante da Bacia do Tucano por ter registro mais completo do Andar Alagoas, preservado na forma da serra do Tonã. Arenitos conglomeráticos ainda prevalecem no registro estratigráfico, contudo sedimentos mais finos estão presentes em maiores quantidades, principalmente no topo da sequência siliciclástica. O que chama mais atenção nesse registro é a presença de níveis de calcário na base e topo da serra do Tonã. A sucessão siliciclástico-carbonática presente na serra do Tonã é marcada pela presença de três intervalos estratigráficos (Figura 6) que se sucedem na vertical: (1) Seção Carbonática Inferior - camada inferior com aproximadamente 5 m de espessura, formada por calcários; (2) Seção Siliciclástica Intermediária – aproximadamente 100 m de empilhamento, constituído predominantemente por arenitos, com a presença de níveis conglomeráticos na parte inferior e de lamitos na superior; e (3) Seção Carbonática Superior - camada de topo constituída por calcários com espessura de aproximadamente 10 m. Esse registro sedimentar pode ser facilmente reconhecido nas encostas da serra e morros testemunho da região. 5.1 SEÇÕES-COLUNARES Três seçõs-colunares foram levantadas para auxiliar a visualização e o entendimento da relação das fácies sedimentares encontradas: (1) Salgado do Melão – parte inferior; (2) Salgado do Melão - parte superior; e (3) cachoeira seca. As seções-colunares de Salgado do Melão – partes superior e inferior (Figura 7) foram levantadas nas proximidades de Salgado do Melão (BA), borda leste da serra do Tonã. A porção inferior foi levantada ao longo de aproximadamente 1,5 km no leito do riacho do Tonã, complementando-se com os sedimentos encontrados no Morro do Cemitério, já a porção superior foi levantada na encosta da Serra do Tonã. 19 Figura 6 – Representação em mapa dos três intervalos estratigráficos e localização das três seções- colunares levantadas (imagem Landsat composição R5-G3-B2). 20 Figura 7 – Localidade de Salgado do Melão, com a serra do Tonã ao fundo e a localização das seções inferior e superior. 5.1.1 Seção-colunar Salgado do Melão – parte inferior A seção inferior (Figuras 8 e 9) inicia-se com camada de 5 m de calcário laminado, por vezes brechado, com a presença ondulações, acamamento irregular e níveis milimétricos fossilíferos ricos em ostracodes. Além disso, encontram-se bastante ferricritizados, o que lhes confere alta resistência ao intemperismo e erosão. Sobreposto aos calcários ocorre expressiva seção siliciclástica com aproximadamente 100 m de espessura. Formada na porção inferior por arenitos de cor creme, finos a muito grossos, com ciclos de granodecrescência ascendente, em sets decimétricos e métricos, tabulares e cuneiformes, com estratificação cruzada tangencial na base, acanalada e planar. 5.1.2 Seção-colunar Salgado do Melão – parte superior Na seção superior (Figura 10 e 11) estão registrados arenitos muito finos a grossos intercalados com níveis lamíticos de coloração cinza claro esverdeados intercalados, em ciclos de granocrescência ascendente. Os arenitos apresentam estratificação cruzada, laminação cruzada (ripples), acamamento flaser e ondulado, estratificação cruzada planar, e estratificação plano-paralela. É comum a presença de argila nos foresets das estratificações e laminações cruzadas. São também observadas deformações de argila na base de sets no topo da sequência, quase separando pequenos blocos de arenito. Sobrepondo a seção siliciclástica encontra- se camada de calcário laminado com 1 m de espessura. Conglomerado matriz- sustentado, com clastos de calcário, muitas vezes angulosos, assenta-se em discordância sobre o calcário do topo. 21 Figura 8 – Seção-colunar de Salgado do Melão - parte inferior. 22 Figura 9 – Fácies da seção-colunar Salgado do Melão – parte inferior (localização das fotos na seção- colunar da figura 8): (1) Calcário da base com laminação e ondulação no topo; (2) Arenitos com estratificação cruzada tangencial na base e acanalada; (3) Arenito com estratificação plano-paralela; (4) Arenito com estratificação incipiente e clastos de argila; (5) Arenito médio a grosso com estratificação cruzada tangencial na base, com concentração de grânulos na base do set; (6) Arenito com laminação cruzada e argila nos foresets. 23 Figura 10 – Seção-colunar de Salgado do Melão – parte superior. 24 Figura 11 – Fácies da seção-colunar Salgado do Melão – parte superior (localização das fotos na seção-colunar da figura 10): (1) Arenito com climbing ripples; (2) arenito com laminação cruzada; (3) arenito com estratificação cruzada planar; (4) Arenito com acamamento flaser; (5) Intercalação de lamito com pacotes de arenito; (6) Arenito com estrutura em chama no contato com lamito. 25 5.1.3 Seção-colunar Cachoeira Seca A seção-colunar da Cachoeira Seca localiza-se na encosta leste da Serra do Tonã, também próxima à localidade de Salgado do Melão (Figuras 12 e 13). Trata- se de sequência siliciclástica formada na parte inferior por arenitos finos a muito grossos com estratificação cruzada sigmoide com drapes de argila e estratificação cruzada tangencial na base, intercalada a lamitos. Figura 12 – Cachoeira Seca na encosta leste da Serra do Tonã. Na porção intermediária, a seção continua fina com a intercalação de lamito cinza esverdeado e arenito fino a muito fino, micáceo. A base das camadas de arenito apresentam contato brusco e topo gradacional. Na sequência, os arenitos são médios a grossos e apresentam estratificação cruzada planar, estratificação plano-paralela e maciça. No topo da seção estão registrados arenitos com estratificação cruzada sigmoide e acamamento flaser, intercalados a lamito avermelhado com aparente estrutura “boxwork”. Após o término do registro das fácies siliciclásticas, registra-se camada de calcário maciço, fino e brecha calcária com aproximadamente 4 m de espessura. 26 Figura 13 – Seção-colunar Cachoeira Seca. 27 Em todas as seções levantadas registrou-se a ocorrência de matacões e superfícies de conglomerado matriz e clasto sustentados, com clastos de calcário (Figura 14). Os clastos variam de 2 a até 60 cm e frequentemente são angulosos, formando brechas. Tal nível foi interpretado como oriundo de processos de fluxo de gravidade mais recentes (provavelmente cenozóicos), sendo, dessa forma, deixado a parte da descrição. Figura 14 – Brecha formada por clastos angulosos de calcário, sustentados por matriz calcítica fina (A,B). 5.2 FÁCIES SEDIMENTARES As fácies sedimentares identificadas das unidades do Andar Alagoas na região da serra do Tonã encontram-se listadas na Tabela 3. Foram identificados dois conjuntos de fácies, silicilástica e carbonática (figuras 15 a 24). A fácies St corresponde a arenitos de finos a muito grossos, muitas vezes contendo seixos e grânulos dispersos e também dispostos nos foresets (Figura 15 A, B), em sets decimétricos a métricos com estratificação cruzada acanalada e mais comumente tangencial na base. Trata-se da fácies mais abundante no registro siliciclástico da serra do Tonã. Clastos de argila também são observados associados a essa fácies. A fácies St é o resultado da migração de dunas de cristas sinuosa e liguoides, em fluxo unidirecional, sob regime de fluxo inferior. Os grãos são transportados, dessa forma, por arrasto, rolamento (areia mais grossa) e saltação (areia mais fina). 28 Tabela 3 – Código de fácies do Andar Alagoas na sub-bacia Tucano Norte. Código Fácies siliciclásticas Interpretação St Arenito, estratificação cruzada acanalada Dunas 3D de crista sinuosa a linguoide Sp Arenito, estratificação cruzada planar Dunas 2D de crista reta a linguoide Sh Arenito, laminação horizontal Fluxo em leito plano (regime de fluxo superior) Sr Arenito, laminação cruzada Ripples (regime de fluxo inferior) Sf Arenito, acamamento flaser Fluxo de regime inferior intercalado com períodos de baixa energia Sm Arenito maciço ou incipientemente laminado Depósitos de fluxo de sedimentos por gravidade Ssg Arenito, estratificação cruzada sigmoide Regime de fluxo inferior com tração juntamente com transporte em suspensão. M Lamito Depósitos formados em períodos de baixa energia por decantação Código Fácies carbonáticas CA l,b Calcário laminado, brechado Deposição química. Exposição subaérea Figura 15 – Arenito com estratificação cruzada acanalada e tangencial na base (fácies St). (A) Arenito com grânulos dispostos nos foresets; (B) Arenito em sets tabulares; (C) Arenito com estratificação cruzada; (D) estratificação cruzada tangencial na base com grânulos nos foresets. 29 Arenitos de fácies Sp são também bastante comuns (Figura 16). Os sets são de porte decimétrico a métrico, de geometria tabular a cuneiforme. O ângulo dos foresets é bastante variável, de poucos graus (baixo ângulo) a no máximo 30º (médio/ alto ângulo). Arenitos Sp são oriundos de fluxo unidirecional em condições de regime de fluxo inferior, com predomínio de processos trativos. No entanto, as dunas apresentam menor complexidade que as dunas das fácies St, apresentando cristas retas a linguóides (dunas 2D). Figura 16 – Arenito com estratificação cruzada planar (fácies Sp). (A) Sets cuneiformes de fácies Sp de baixo ângulo; (B) Sets cuneiformes decimétricos. A fácies Sh representa arenitos finos/muito finos, de cor creme, em sets centimétricos a decimétricos com estratificação plano-paralela (Figura 17). Em alguns casos ocorrem variações granulométricas nos sets, sendo comuns intercalações de arenito fino com muito fino ou então linhas de areia mais grossa concentrada entre a estratificação. Essa fácies é característica de regime de fluxo superior, com alta energia de corrente. A estratificação é formada em leito plano, onde os grãos são transportado por arrasto. 30 Figura 17 – Arenito com laminação horizontal (Sh). (A) Fácies Sh; (B) Intercalação de arenito fino e médio com laminação horizontal. Arenitos da fácies Sr ocorrem na porção superior da sucessão siliciclástica, geralmente associados a lamitos e arenitos com acamamento flaser (facies Sf). Os grãos variam de finos a médios, os sets são centimétricos e apresentam laminação cruzada (Figura 18 A), sendo comum a presença de micas nos foresets. Arenitos com laminação cruzada (fácies Sr) se desenvolvem em regime de fluxo inferior. As marcas onduladas são formadas na interface água-sedimento, em condições que se aproximam do regime de fluxo superior. Os sedimentos são transportados principalmente por tração, e se depositam com a desaceleração do fluxo. Figura 18 – Fácies Sr. (A) Marca ondulada vista em planta; (B) Climbing ripples com drapes de argila. 31 Arenitos com acamamento flaser (fácies Sf) são comuns no topo da sequência e corresponde a arenitos finos a médios, com laminação cruzada, e argila depositada na forma de calhas na porção côncava (para cima) da laminação (Figura 19). A origem da fácies Sr está relacionada com a alternância de corrente fluvial ou à ação de ondas com períodos de águas calmas. A areia pode ser transportada por tração ou suspensão, já a lama que se acumula em cima das dunas é produto da deposição em períodos onde o fluxo é muito baixo ou ausente. Quando a corrente volta a produzir estratificações, há remoção de boa parte da lama, restando apenas o que se depositou nas calhas da duna. Figura 19 – Arenito com acamamento flaser (A,B). Arenitos aparentemente maciços, sem estruturas visíveis (fácies Sm), são pouco comuns no registro siliciclático da Serra do Tonã. Podem ser observados ocasionalmente clastos de argila dispersos (Figura 20 B). De forma geral a fácies Sm é interpretada como produto da deposição rápida e enérgica. Processo posterior como escape de água, podem também destruir os vestígios de estratificação, deixando a rocha com aspecto maciço. 32 Figura 20 – Arenito maciço. (A) Fácies Sm; (B) Arenito maciço com clastos de argila. Arenitos com geometria sigmoide (fácies Ssg) são finos a grossos, dispostos em sets centimétricos a decimétricos com estratificação tangencial na base e no topo (Figura 21). Associados a essa fácies comumente observam-se drapes de argila recobrindo os corpos, além da ocorrência de argila nos foresets da estratificação. Os arenitos com estratificação cruzada sigmoide muitas vezes apresentam fases com mais argila e outras com mais areia, mostrando ciclicidade dos eventos (Figura 22). Nesses casos a estratificação pode ser interpretada como tidal bundles, gerados durante ciclos mensais de sizígia e quadratura, porem a contagem dessas fases não foi feita, não sendo possível atestar com certeza se são realmente tidal bundles. Em condições de fluxo transicional entre os campos de estabilidade da duna e o campo do regime de fluxo superior, a porção superior das dunas são comumente erodidas. As fácies Ssg sugerem que à medida que o regime de fluxo superior é alcançado, com aumento do poder da corrente, a estratificação cruzada das dunas se transforma de côncava para sigmoide, com topset, foreset e bottomset distintos. A presença da tangenciabilidade na porção superior indica que parte da carga sedimentar foi transportada por suspensão. 33 Figura 21 – Estratificação cruzada sigmoide (Ssg). (A) Barras amalgamadas com sets centimétricos a decimétricos de estratificação cruzada sigmoide; (B) Arenitos com estratificação cruzada sigmoide. Figura 22 – Detalhe de uma estratificação cruzada sigmoide com alternância de ciclos mais lamosos com ciclos mais argilosos. Lamitos de fácies M são bastante comuns na porção superior do registro siliciclástico (Figura 23). São geralmente laminados, arenosos, de cor cinza médio ou avermelhado. Fácies de lama são geradas com a deposição de material muito fino que antes se encontrava em suspensão. A deposição de espessos pacotes indica longo período de calmaria e alta carga de silte e argila em suspensão. Ocorrência isolada de lamito avermelhado dobrado e fraturado com estrutura similar a “boxwork”, com precipitação de material calcítico nas fraturas, foi observado, devendo ser oriundo de eventos posteriores à sedimentação. 34 Figura 23 – Lamitos (fácies M). (A) Lamito laminado; (B) Lamito deformado com aspecto de boxwork, fraturas preenchidas por material calcítico. A ocorrência dos calcários (fácies CA) é restrita a dois níveis, apresentando boa diversidade de estruturas. A forma mais comum do calcário é a laminada e brechada (Figura 24 A,D), porém também são observadas ondulações, formando estrutura similar a domos e vales vistos em planta (Figura 24 B). Dobras monoclinais também são observadas, além de laminação cruzada (Figura 24 C), este último característico de transporte sedimentar por corrente. Figura 24 – Fácies carbonáticas. (A) Calcário laminado; (B) Vista superior mostrando feições de domos e vales; (C) Calcário laminado com dobra monoclinal; (D) Calcário laminado com estratificação interna e calcário brechado. 35 5.3 PALEOCORRENTES As estações de paleocorrente estabelecidas ao longo da seção de Salgado do Melão estão representadas na figura 25. A porção inferior, que se iniciou em drenagem próxima a Salgado do Melão, finalizando-se no morro do cemitério, apresenta fácies características de sistema fluvial. Vetores médios, medidos em foresets de estratificações cruzadas, mostram valores com direção de fluxo para sul (Figura 8). Já a porção superior, na encosta sudeste da serra do Tonã, apresenta vetores que variam entre sudoeste, leste e sul-sudeste (Figura 10). No total foram realizadas 159 medidas, a roseta apresenta padrão unimodal, com média para sul (185º). Próximo à localidade de São Saité, a 15 km ao norte da serra do Tonã, encontra-se um morro testemunho com amplitude de quase 200 m. Afloram nessa localidade arenitos, lamitos e calcários que se assemelham aos descritos nas proximidades de Salgado do Melão. No local foram feitas 122 medidas de paleocorrente, mostrando pequena variação nos paleofluxos, com vetor médio no rumo leste-sudeste (107º). 36 Figura 25 – Mapa de paleocorrentes do Andar Alagoas na sub-bacia Tucano Norte. 37 6. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS O Andar Alagoas é o registro estratigráfico da fase pós-rifte das bacias da margem continental leste brasileira. Dépositos dessa idade estão também preservados no interior do continente, nas bacias do Recôncavo, Tucano, Jatobá, Araripe e Parnaíba. Na Bacia do Tucano, a serra do Tonã se destaca no relevo e preserva seção reliquiar do Andar Alagoas. Seção-colunar composta (Figura 26) foi elaborada a partir do empilhamento vertical das seções Salgado do Melão – parte inferior (Figura 8) e Salgado do Melão – parte superior (Figura 10). Com a composição das duas seções foi possível empilhar a sucessão estratigráfica completa do Andar Alagoas na região da serra do Tonã, que é composta da base para o topo: (1) Seção Carbonática Inferior - camada inferior com aproximadamente 5 m de espessura, formada por calcários; (2) Seção Siliciclástica Intermediária – sucessão com aproximadamente 100 m de empilhamento, constituída predominantemente na parte inferior por arenitos, com porções conglomeráticas e, na parte superior, por lamitos intercalados com arenitos; e (3) Seção Carbonática Superior - camada de topo constituída por calcários com espessura de aproximadamente 10 m. Os três níveis levantados em seção-colunar também foram detectados por mapeamento e análise de imagem de satélite, mostrando continuidade por toda a área da serra do Tonã (Figura 6). A sedimentação pós-rifte na região da serra do Tonã compreende arenitos, conglomerados e lamitos da Formação Marizal, considerados pela literatura como depositados em sistemas aluviais. A primeira evidência da implantação de corpo d’água, e parada na sedimentação siliciclástica, é marcada pela deposição de calcários laminados presentes na base da serra do Tonã. Estes calcários apresentam laminação ondulada, com níveis de brechas, pelóides e ostracodes. 38 Figura 26 – Seção-colunar composta Salgado do Melão, construida pela superposição das seções levantadas na área (figuras 8 e 10) 39 Aos calcários da base da serra sobrepõe-se nova sedimentação siliciclástica, com arenitos médios a grossos, em parte conglomeráticos, marcados pela alta incidência de arenitos com estratificação cruzada acanalada (fácies St) com porções mais conglomeráticas, compatível com o modelo de Schumm (1972) de rios entrelaçados. Padrão de afinamento textural para o topo é bastante frequente, com diversos ciclos de finnig upward. Em alguns casos é possível observar ciclos de arenitos St grossos na base, afinando para o topo e gradando para arenitos de fácies Sh. Esse padrão, mesmo que em parte incompleto, condiz com o empilhamento vertical (Figura 27) de rios entrelaçados de Walker (1979). Além desses fatores, uma das características fundamentais para a definição do sistema como fluvial entrelaçado é a escasses de lama no registro, presente principalmente na forma de clastos de argila, o que mostra que sedimentos finos foram depositados e expostos subaereamente, sendo posteriormente erodidos pelo canal e carregados novamente na forma de clastos. Figura 27 – Perfil vertical representando o modelo de rios entrelaçados de Walker (1979). 40 A parte superior da seção siliciclástica é caracterizada pelo aumento de sedimentos lamíticos com intercalações de pacotes de arenito espessando para o topo, sendo identificados ciclos com granocrescência ascendente. Os arenitos desse nível apresentam acamamento flaser, ripples e estratificação cruzada sigmoide. Os níveis de lama nos foresets das estratificações cruzadas sigmoides sugerem bundles de maré, no entanto, não foram encontrados pares que confirmassem ciclicidade de marés. Em função da associação desses elementos, é aqui levantada a hipótese de que haja influência de maré na deposição dos litotipos da parte superior, da serra do Tonã. A deposição de calcários laminados do topo da serra do Tonã representa a implantação de um sistema subaquoso na área. Marcas onduladas e laminações cruzadas foram observadas, indicando que processos trativos foram responsáveis por parte da deposição dos calcários. Níveis brechados sugerem exposição subaérea, com oscilações no nível do corpo d’água. Evidências de esteiras algálicas e de calcários microbiais estão presentes no registro, porém não foi feita nenhuma caracterização petrográfica desses calcários. Como tratado no Capítulo 2, Rolim (1984) propôs a elevação da Formação Marizal a grupo, embutindo nele duas novas unidades: (1) Sequência Detrítica Inferior – composta pela Formação Marizal de Viana (1971) e pela seção clástica aflorante na serra do Tonã, de caráter granodecrescente ascendente, formado por fácies de transição de canais anastomosados para rios meandrantes; e (2) Formação Serra do Tonã – composta pelos calcários laminados de topo da serra, interpretados como de origem lacustre e depositado por processos químicos (Figura 28). Comparando a seção-colunar composta de Salgado do Melão (Figura 27), com aproximadamente 100 m, com a seção levantada por Rolim (1984), com 39 m de empilhamento vertical (Figura 28), foi possível constatar que o registro superior do Andar Alagoas, sobreposto aos sedimentos aluviais tidos como Formação Marizal, é mais espesso e complexo do que o apontado pelo referido autor. 41 Figura 28 – Seção tipo da Formação Serra do Tonã de Rolim (1984). 42 Na Bacia do Araripe esta registrada sucessão estratigráfica do Andar Alagoas muito parecida com a da serra do Tonã, formada por calcários laminados das Camadas Batateira, sucedida verticalmente por arenitos e intercalação de lamitos com arenitos da Formação Barbalha (Chagas et al., 2007). O mesmo autor descreve sobre a Formação Barbalha, nível de calcário que marca a base da Formação Santana. Em função da semelhança litológica e cronológica do registro das duas bacias, é considerado, nesse trabalho, que os calcários da base da Serra do Tonã e a sucessão siliciclástica sobrejacente permaneçam englobados na Formação Marizal, e que os calcários do topo da serra sejam atribuídos aos mesmos processos de deposição da Formação Santana (Figura 29). Dados de paleocorrentes fluviais do Andar Alagoas das bacias do nordeste brasileiro indicam paleofluxos de sedimentos com rumo aproximadamente para sul/sudeste, ou seja, área fonte a norte/noroeste (Figura 30). Isto significa que as duas bacias integravam uma mesma paleodrenagem continental, não necessariamente formando sítios deposicionais integrados e contínuos. 43 Figura 29 – Correlação da sucessão estratigráfica do Andar Alagoas na serra do Tonã com a seção do Rio da Batateira da Bacia do Araripe descrita por Chagas et al. (2007). 44 Figura 30 – Paleocorrentes do Andar Alagoas nas bacias sedimentares fanerozóicas da Região Nordeste do Brasil (Modificado de Assine, 1990). 45 7. CONCLUSÕES (1) Com o levantamento de seções-colunares e descrição das fácies sedimentares preservadas na serra do Tonã, foi possível estabelecer sucessão estratigráfica com cerca de 110 m, pertencentes à parte superior do Andar Alagoas na área sobreposta aos arenitos da Formação Marizal; (2) Três unidades estratigráficas que se sucedem na vertical, relacionadas à seção de idade Alagoas da Bacia do Araripe, foram identificadas: (a) unidade carbonática inferior da serra do Tonã, de espessura média de aproximadamente 5 metros, com laminação ondulada, apresentando níveis brechados, correlata às Camadas Batateira; (b) unidade siliciclástica intermediária, composta por arenitos médios a muito grossos, com porções conglomeráticas na parte inferior, e por lamitos intercalados com pacotes de arenito na parte superior, associadas à porção superior da Formação Barbalha na Bacia do Araripe; e (c) unidade carbonática superior, formada por calcário laminado, com espessura variável entre 2 e 10 m, presentes no topo da chapada, classificados como pertencente à Formação Santana; (3) Os três níveis identificados nas seções-colunares apresentam continuidade por toda extensão da serra, sendo mapeados por interpretação de imagens de satélite e validação de campo; (4) A associação de fácies de arenitos com laminação cruzada (ripples e climbing ripples), com acamamento flaser e com estratificação cruzada sigmoide, são evidências de que correntes de maré tenham atuado na sedimentação da porção superior da seção siliciclástica da serra do Tonã; (5) Para a caracterização confiável do sistema deposicional responsável pela deposição das camadas de calcário da serra do Tonã, é necessária análise petrográfica para identificação de feições microscópicas e de microfósseis que possam indicar o paleoambiente; (6) Paleocorrentes medidas nos estratos cruzados de arenitos fluviais indicam paleofluxos com rumo para sul, ou seja, mostrando que a área fonte para os sedimentos da sucessão siliciclástica da serra do Tonã se encontrava a norte da área. 46 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida-Filho R., Miranda F.P., Yamakawa T., Bueno G.V., Moreira F.R., Camargo E.G., Bentz, C.M. 2002. 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