UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO unesp PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS (BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR) ANÁLISE PEPTIDÔMICA DOS VENENOS DE VESPAS SOCIAIS NEOTROPICAIS NICOLI BARÃO BAPTISTA SAIDEMBERG Tese apresentada ao Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro/SP, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutora em Ciências Biológicas (área de concentração: Biologia Celular e Molecular). Fevereiro - 2011 NICOLI BARÃO BAPTISTA SAIDEMBERG ANÁLISE PEPTIDÔMICA DOS VENENOS DE VESPAS SOCIAIS NEOTROPICAIS ORIENTADOR: PROF. DR. MARIO SERGIO PALMA Tese apresentada ao Instituto de Biociências do Campus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutora em Ciências Biológicas (Área de Concentração: Biologia Celular e Molecular). RIO CLARO FEVEREIRO/2011 Baptista-Saidemberg, Nicoli Barão Análise peptidômica dos venenos de vespas sociais neotropicais / Nicoli Barão Baptista-Saidemberg. - Rio Claro : [s.n.], 2011 135 f. : il., figs., gráfs. Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Rio Claro Orientador: Mario Sergio Palma 1. Vespa. 2. Biologia estrutural e funcional. 3. Veneno de vespas. 4. Peptídeos. 5. Espectrometria de massas. 6. Atividades biológicas. I. Título. 595.798 B222a Ficha Catalográfica elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP “Um velho índio descreveu certa vez: - Dentro de mim, existem dois cachorros: um deles é cruel e mau, o outro, muito bom. Os dois estão sempre brigando. Quando perguntaram qual dos cachorros ganharia a briga, o sábio índio parou, refletiu e respondeu: - Aquele que eu alimento.” “Que Deus me conceda falar com inteligência E um pensar semelhante a este dom, Pois ele não só mostra o caminha da sabedoria, Mas também dirige os sábios; nas suas mãos estamos nós, as nossas palavras, Toda a inteligência e a perícia do agir.” (Apelo a inspiração divina – Sabedoria 7:15-21) Mandamentos para a toda a vida 1. Não faça aos outros o que não quer que façam com você 2. Em todas as coisas, faça de tudo para não provocar o mal 3. Trate os outros seres humanos, as outras criaturas e o mundo em geral com amor, honestidade, fidelidade e respeito 4. Não ignore o mal nem evite administrar a justiça, mas sempre esteja disposto a perdoar erros que tenham sido reconhecidos por livre e espontânea vontade e lamentados com honestidade 5. Viva a vida com um sentimento de alegria e deslumbramento 6. Sempre tente aprender algo de novo 7. Ponha todas as coisas à prova; sempre compare suas idéias com os fatos, e esteja disposto a descartar mesmo a crença mais cara se ela não se adequar a eles 8. Jamais se autocensure ou fuja da dissidência; sempre respeite o direito dos outros discordar de você 9. Crie opiniões independentes com base em seu próprio raciocínio e em sua experiência; não se permita ser dirigido pelos outros 10. Questione tudo Richard Dawkins 11. Enfim, Seja Feliz!! LIÇÕES PARA A VIDA... AGRADECIMENTOS Sempre gostei de ler, mas sem dúvidas foram nesses últimos quatro anos que mais me aprofundei no mundo literário, motivada por uma profunda sede de entender o mundo a minha volta, entender a natureza do SER humano... O que é o sucesso verdadeiro e como faço para alcançá-lo? Nesse período aprendi não só o que este projeto apresentará a quem se dispor a lê-lo como também aspectos importantes que levarei para toda minha vida: Percebi que, a não ser que façamos algo diferente, não importa quão formidável sejam nossos talentos, nossos comportamentos restringirão nosso desempenho. Sendo assim, quanto menos resistentes as mudanças, maior será nosso crescimento pessoal. Aprendi que devemos nos manter atentos às direções em que nos movemos, pois sempre nos será revelado o tamanho de nossa força e onde ela deve ser empregada. A partir daí, busquei conhecer meus pontos fortes, aumentando minha auto-estima e autoconfiança. Assumi também meus pontos fracos, e dia-a-dia, procuro minimizar suas conseqüências. A partir desse momento decidi ser melhor que ontem, ser reconhecida unicamente por mim mesma e definir minhas metas em curto, médio e longo prazo. Não me importa quantas vidas terei o prazer de viver, importa fazer diferença nessa vida. Tudo é belo demais para deixar de ser feliz! Trabalho com o que amo e o faço com paixão e determinação! Portanto, uma vez que todos nós influenciamos e exercemos efeitos sobre os outros, devemos nos esforçar para agir de forma positiva a fim de melhorar a nós mesmos e todos a nossa volta. A autoconfiança é importante, mas em excesso ela pode ser perigosa, impedindo nosso crescimento pessoal e dos que estão a nossa volta. Uma vez que o saber é ilimitado, a autoconfiança deve ser equilibrada com humildade. Por isso, nada de ser como Napoleão na campanha da Rússia! Em nossa caminhada muitas vezes desagradamos pessoas e nos frustramos por isso, principalmente quando valorizamos o que elas pensam a nosso respeito. Compreendi o quão difícil deve ser administrar situações de conflito em que pessoas causadoras de atrito acabem sendo mantidas em uma equipe, por se acreditar que delas seja possível tirar algo positivo. Podemos nunca entender os reais motivos para tais decisões, e uma vez que não podemos mudar o mundo, pelo menos devemos fazer nossa parte. Talvez a lição mais importante que aprendi é que devemos procurar focar os pontos positivos que cada um tem, investindo nesses aspectos... Isso vale pra mim mesma ao me olhar no espelho e, nesse momento, me sinto como Michelangelo quando esse disse: „Eu vi um anjo em um bloco de mármore e o esculpi para libertá-lo!‟ Por tudo isso, meus agradecimentos... Sempre, e em primeiro lugar, ao Deus do meu coração e da minha compreensão. "A fé é como o amor: não há nada que a force” (Arthur Schopenhauer) Novamente pela orientação do prof. Dr. Mario Sergio Palma, e pela liberdade que me foi dada para exercer minha criatividade em relação ao desenrolar deste trabalho. "Grandes líderes mudam de estilo para levantar a auto-estima de suas equipes. Se as pessoas acreditam nelas mesmas, é impressionante o que elas conseguem realizar" (Sam Walton) As vespas sociais Agelaia pallipes pallipes e Agelaia vcina, aos ratos Wistar e camundongos Swiss, utilizados neste trabalho: sem elas, este estudo não seria possível. "A natureza é grande nas coisas grandes e grandíssima nas pequeninas" (Saint-Pierre) Aos colaboradores deste trabalho: Dr. Daniel M. Saidemberg, pelo treinamento nas análises de ESI-MS e de ESI-MS/MS; Dra. Patrícia Brigatte, pelo treinamento nos ensaios farmacológicos; Dra. Rosane Aparecida Ribeiro, pelo treinamento nos ensaios fisiológicos; Dra. Helen A. Arcuri, pelo treinamento em análises de Modelagem e Dinâmica Molecular; CAPES, pelo fomento. "Com talento ganhamos partidas; com trabalho em equipe e inteligência ganhamos campeonatos" (Michael Jordan) Ao meu esposo Dr. Daniel M. Saidemberg além de companheiro de laboratório, meu melhor amigo e cúmplice, que soube me apoiar e me criticar nas horas certas, sempre ao meu lado me lembrando que o mais importante é ser uma pessoa melhor a cada dia! Ao meu filhote Iofi, meu cãozinho, também parte integral de nossa família; com suas estripulias faz com que as energias se renovem ao nosso redor! "A realização não vem com a conquista dos objetivos traçados, mas sim no caminho percorrido ate alcançá-lo” – “Tomando a decisão e realmente querendo, os próprios pés o conduzem para a realização”(Prof. Alan Henrique/Textos Judaicos) A Dra. Patrícia Brigatte, Edson da Silva e Danilo Mourelle, amigos do coração, que me ensinaram a cuidar melhor do biotério. A Dra. Lucilene D. dos Santos, BSc. José Roberto A. S. Pinto, BSc. Anally R. Menegasso, Marília Pieroni, Franciele Grego Esteves, Marília Pieroni e Ana Maria Caviquioli,Vanessa A. Alves e Sebastião G. Filho, agradeço pelas conversas, conselhos e momentos de descontração. Dra. Rosane A. Ribeiro, MSc. Priscila Muniz Ribeiro da Silva, MSc. Júnia Carolina Rebelo dos Santos Silva e MSc. Thiago Martins Batista, meus novos companheiros de laboratório, „workahollics‟ como eu, mas que também sabem se divertir e fazer dos momentos mais „apertados‟, momentos de muita alegria. Obrigada pela recepção! "O que une uma equipe é quando um cobre as fraquezas do outro" (Phil Jackson) A Dra. Bibiana M. de Souza, ao Dr. Paulo Cesar Gomes e BSc. Nathalia B. Dias, que me ensinaram como ser mais forte e enfrentar as adversidades naturais do ser humano. "Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina" (Cora Coralina) Enfim, aos meus pais, Luis e Maria, meus irmãos, Fellipe e Bruno: você‟s foram a base do que sou agora: obrigada! “O verdadeiro amor nunca se desgasta. Quanto mais se dá mais se tem” (Antoine de Saint-Exupéry) LISTA DAS ABREVIATURAS  Alfa  Beta ATP Adenosina Trifosfato BSA Soro Albumina Bovina Ca+2 Cálcio cAMP Adenosina Monofosfato Cíclico CCP4 Collaborative Computacional Project no 4 cmM Carbamidometilação C-18 Octadecil CP Peptídeo Quimioctático DTT Ditiotreitol EMP-AF Eumenine Mastoparano AF ESI Ionização por spray de elétrons Fmoc Fluorenyl-methoxy-carbonyl GDP Guanosina Difosfato GTP Guanosina Trifosfato HOBt Hidroxibenzotriazol HPLC Cromatografia Líquida de Alta Performance IAA Iodoacetamida K+ Potássio LC-IT-TOF-MS Sistema hifenado de cromatografía líquida com espectrómetro de massas do tipo Ion trap TOF (Tempo de Vôo) LDH Enzima lactato desidrogenase MCD Mast Cell degranulation MCM Mast Cell medium MeCN ou ACN Acetonitrila Mg+ Magnésio MP Mastoparano MS Espectrometria de massas MS/MS Espectrometria de massas seqüenciais (tandem) NNM N-metilmorfolina PLA2 Fosfolipase A2 PTH-Aminoácido Feniltiohidantoína - aminoácido PyBOP Benzotriazole-I-yl-oxy-trispyrrolidino-phosphoniumhexafluorofosfato SH Solução de p-nitrofenil-N-acetil-b-glucosaminidina em citrato de sódio TFA Ácido trifluoracético TFE Áido tetrafluoroetileno Tris Hidroximetilaminometano Triton X-100 t-octilfenoxipolietanol Ves-CP Peptídeos quimiotáticos de vespas LISTA DE TABELAS pgs TABELA 1 Sequência primária de cininas isoladas dos venenos de vespas 22 TABELA 2 Sequência primária dos peptídeos mastoparanos isolados dos venenos de vespas 24 TABELA 3 Peptídeos quimiotácticos isolado do veneno de vespas 31 TABELA 4 Peptídeos antibióticos isolados dos venenos de vespas 36 TABELA 5 Peptídeos com pontes dissultetos isolados do veneno de vespas 38 TABELA 6 Sequências dos peptídeos isolados e identificados para a síntese 42 TABELA 7 Etapas de cada ciclo da síntese de peptídeos 43 TABELA 8 Alinhamento entre os peptídeos Protonectina, Protonectina (1-6)-OH e Protonectina (7-12), todos isolados dos venenos de vespas do gênero Agelaia 72 TABELA 9 Alinhamento dos peptídeos com resíduos de cisteína isolados das vespas sociais Protonectaria silveirae, Protopolybia sedula, Synoeca cyanea, Polybia paulista, Protopolybia exígua e Agelaia pallipes pallipes, utilizando-se o programa MULTIALIGN (http://bioinfo.genotoul.fr/multalin/cgi-bin/multalin.pl) 75 TABELA 10 Sequências de aminoácidos de cada peptídeo purificado do veneno da vespa social A. p. Pallipes 79 TABELA 11 Códigos de acesso ao PDB dos moldes escolhidos; os valores de identidade e similaridade entre as sequências dos peptídeos do presente estudo e as sequências dos peptídeos utilizados como molde, assim como também o método de resolução de cada molde 82 TABELA 12 Análise da qualidade esterioquímica para os modelos dos peptídeos Agelaia MP-I e Agelaia MP-II 88 TABELA 13 Sequências de aminoácidos de cada peptídeo purificado do veneno da vespa social A. vicina 92 TABELA 14 Comparação entre as dose efeito dos peptídeos testados 100 LISTA DE FIGURAS Pgs FIGURA 1 Esquema mostrando o aumento de massa após cada evento de reação de redução e alquilaçao de uma molécula peptídica hipotética 45 FIGURA 2 Ilustração e imagem de uma câmara de quimiotaxia 52 FIGURA 3 Perfil cromatográfico do fracionamento do extrato do veneno da vespa social A. p. pallipes RP-LCMS (SHIMADZU, Kyoto) utilizando-se de uma coluna WATERS Acquity UPLC® BEH130 C-18 (2,1 x 100mm, 3,5 µM), e um fluxo constante de solventes de 0,2 ml/min. A eluição foi realizada inicialmente em condições isocráticas de 0 a 5 minutos com 5% (v/v) MeCN (contendo 0,1% (v/v) TFA), seguida por um gradiente linear de 5 a 60% (v/v) MeCN (contendo 0,1% (v/v) TFA) no intervalo de tempo entre 5,1 a 42,0 min a 28 ºC 59 FIGURA 4 A) Espectros de massas do tipo ESI-MS da fração App-5. B) Espectro de massas MS2 da fração 5, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos 62 FIGURA 5 A) Espectros de massas do tipo ESI-MS fração 6; B) Espectro de massas MS2 da fração 6, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos 63 FIGURA 6 A) Espectros de massas do tipo ESI-MS da fração 7; B) Espectro de massas MS2 da fração 7, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos 65 FIGURA 7 A) Espectros de massas do tipo ESI-MS da fração 8 em sua forma natura; B) espectro ESI-MS da fração 8 após redução e carboximetilação dos resíduos de cisteína; C) espectro MS3 deconvoluído da fração 8 reduzida e carboxyamidada, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos 67 FIGURA 8 A) Espectro ESI-MS da fração 9a na sua forma natural; B) espectro ESI-MS da fração 9a após redução e carboximetilação das pontes dissulfeto; C) espectro MS3 deconvoluído da fração 9 a reduzida e carboxyamidada, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação 69 FIGURA 9 A) Espectros de massas do tipo ESI-MS fração 9b. B) espectro de massas MS2 da fração 9b, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos 71 FIGURA 10 Espectros de massas do tipo ESI-MS da fração App-10. Espectro ESI-MS/MS da Pallipina-III, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos. Espectros de massas do tipo ESI-MS da fração App- 10a. A) ESI-MS da Pallipina-III natural e B) ESI-MS da Pallipina-III após redução e carboximetilação das pontes dissulfeto, mostrando que a diferença entre a massa do peptídeo natural apresentou um aumento de 116 unidades de massas, indicando a presença de 2 resíduos de cisteína na molécula 74 FIGURA 11 A) Espectro de massas do tipo ESI-MS da fração 11. B) espectro MS2 da fração 11, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em seuência de aminoácidos 76 FIGURA 12 A) Espectros de massas do tipo ESI-MS da fração 12; B) espectro MS2 da fração 12, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos 77 FIGURA 13 Perfil cromatográfico do fracionamento do veneno de A. p. pallipes, mostrando as identificações obtidas. Referências: Saidemberg 2009; Saidemberg et al 2010, Baptista-Saidemberg et al 2010 79 FIGURA 14 Esquema mostrando a distribuição anfifílica (helical well) dos peptídeos (A) Agelaia MP-I e (B) Agelaia MP-II. Legenda das cores: Em verde, resíduos hidrofílicos; em vermelho, resíduos positivamente carregados; em azul, resíduos negativamente carregados e em preto, resíduos hidrofóbicos 80 FIGURA 15 Imagens geradas pelo programa MolMol da estrutura secundária (em ribbon) dos peptídeos Agelaia MP-I, representado em duas faces (A); Agelaia MP-II (B) e Pallipina-I (C) 83 FIGURA 16 Imagens geradas pelo programa PyMol da conformação estrutural em ribbon e na forma de densidade superficial de carga, dos peptídeos Agelaia MP-I (A), Agelaia MP-II (B) e Pallipina-I (C). Legenda: em branco, resíduos de carga neutra; em azul resíduos de cargas positivas; em vermelho, resíduos de carga negativa 84 FIGURA 17 Diagrama de Ramachandran gerado pelo Procheck para o modelo para os peptídeos Agelaia MP-I (A), e Agelaia MP-II (B) 86 FIGURA 18 Diagrama de Ramachandran gerado pelo Procheck para o modelo para os peptídeos Pallipina-I 87 FIGURA 19 Perfil cromatográfico do fracionamento do extrato do veneno da vespa social A. vicina (TIC) RP-LCMS (SHIMADZU, Kyoto) utilizando-se de uma coluna WATERS Acquity UPLC® BEH130 C-18 (2,1 x 100mm, 3,5 µM), e um fluxo constante de solventes de 0,2 ml/min. A eluição foi realizada inicialmente em condições isocráticas de 0 a 5 minutos com 5% (v/v) MeCN (contendo 0,1% (v/v) TFA), seguida por um gradiente linear de 5 a 60% (v/v) MeCN (contendo 0,1% (v/v) TFA) no intervalo de tempo entre 5,1 a 42,0 min a 28 ºC 89 FIGURA 20 Espectros de massas do tipo ESI-MS fração 7. Espectro ESI-MS/MS da fração 7 isolada do veneno bruto da vespa social A. vicina, com a respectiva interpretação do padrão de fragmentação em sequência de aminoácidos 90 FIGURA 21 Espectros de massas do tipo ESI-MS fração 11 91 FIGURA 22 Espectros de massas do tipo ESI-MS fração 12 92 FIGURA 23 Perfil cromatográfico do fracionamento do veneno de A. vicina, mostrando as identificações obtidas 93 FIGURA 24 Ensaio de hemólise de eritrócitos de sangue de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Protonectina (1-5)-OH, Protonectina (1-6)-OH, Protonectina (1-6), Protonectina (7-12) e Protonectina incubados à 37º C 95 FIGURA 25 Ensaio de hemólise de eritrócitos de sangue de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Agelaia MP-I e Agelaia MP-II, incubados à 37º C 96 FIGURA 26 Ensaio de hemólise de eritrócitos de sangue de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Pallipina-II e Pallipina-III, incubados à 37º C 96 FIGURA 27 Ensaio de desgranulação de células provenientes do lavado peritoneal de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Protonectina (1-5)-OH, Protonectina (1-6)- 97 OH, Protonectina (1-6), Protonectina (7-12) e Protonectina FIGURA 28 Ensaio de desgranulação de células provenientes do lavado peritoneal de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Agelaia MP-I e Agelaia MP-II 98 FIGURA 29 Ensaio de desgranulação de células provenientes do lavado peritoneal de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Pallipina-II e Pallipina-III 99 FIGURA 30 Ensaio de quimiotaxia para leucócitos polimorfonucleares isolados de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Protonectina (1-5)-OH, Protonectina (1-5)-OH, Protonectina (1-6)-OH, Protonectina (1-6), Protonectina (7-12) e Protonectina 99 FIGURA 31 Ensaio de quimiotaxia para leucócitos polimorfonucleares isolados de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Agelaia MP-I e Agelaia MP-II 100 FIGURA 32 Ensaio de quimiotaxia para leucócitos polimorfonucleares isolados de ratos Wistar machos causados pelos peptídeos Pallipina-II e Pallipina-III 100 FIGURA 33 Efeito do peptideo Protonectina sobre a sensibilidade dolorosa avaliada através do teste do von Frey eletrônico e sobre o aumento da pata (edema). 102 FIGURA 33 Efeito do peptideo Protonectina (1-5) sobre a sensibilidade dolorosa avaliada através do teste do von Frey eletrônico e sobre o aumento da pata (edema) 103 FIGURA 34 Efeito do peptideo Protonectina (1-6) sobre a sensibilidade dolorosa avaliada através do teste do von Frey eletrônico e sobre o aumento da pata (edema). 104 FIGURA 35 Efeito do peptideo Palipina sobre a sensibilidade dolorosa avaliada através do teste do von Frey eletrônico e sobre o aumento da pata (edema) 106 FIGURA 36 Efeito do peptideo Palipina sobre a sensibilidade dolorosa avaliada através do teste do von Frey eletrônico e sobre o aumento da pata (edema) sobre o efeito algogênico da carragenina. 106 FIGURA 37 Secreção estática de insulina em resposta à concentrações crescentes de glicose na presença ou ausência de 10 M do peptídeo Agelaia MP-I. Dados representam a média  EPM, n = 8. *P < 0,05 vs CTL 108 FIGURA 38 Secreção estática de insulina frente à glicose 2,8 (G2.8) e 11,1 mM (G11.1) na presença de Agelaia MP-I 8 M , ouem sua ausência. Dados representam a média  EPM n = 8. *P < 0,05 vs CTL na mesma condição 109 FIGURA 39 Secreção estática de insulina em resposta à concentrações crescentes de glicose na presença ou ausência de 1 M do peptídeo Pallipina-I (cadeia aberta). Dados representam a média  EPM, n = 8. *P < 0,05 vs CTL 110 FIGURA 40 Secreção estática de insulina em resposta à concentrações crescentes de glicose na presença ou ausência de 1 M do peptídeo Pallipina-II. Dados representam a média  EPM, n = 8. *P < 0,05 vs CTL 111 FIGURA 41 Secreção estática de insulina em resposta à concentrações crescentes de glicose na presença ou ausência de 1 M do peptídeo Pallipina-III. Dados representam a média  EPM, n = 8. *P < 0,05 vs CTL 111 FIGURA 42 Esquema ilustrativo propondo possíveis mecanismos de ação dos peptídeos isolados dos venenos das vespas sociais Agelaia pallipes pallipes e Agelaia vicina 113 LISTA DE ESQUEMAS pgs ESQUEMA 1 Esquema exemplificando as reações de acetilação da (A) lisina e (B) posição N-terminal de um aminoácido hipotético 46 ESQUEMA 2 Esquema ilustrativo de como ocorre a quimiotaxia de células em uma câmara de quimiotaxia. Modificado de AKASHI et al 2005 52 TABELA DE COMPOSIÇÃO, MASSA MOLECULAR E TEMPO DE RETENÇÃO* DOS RESÍDUOS DE AMINOÁCIDOS * Obtido para PTH-aminoácidos em seqüenciador automático de fase gasosa PPSQ-21A (SHIMADZU): sistema de cromatografia líquida de alto desempenho (HPLC) calibrado com padrões de PTH-aminoácidos (WAKO CHEM), equipado com uma bomba modelo LC-10AS (SHIMADZU) e um detector de luz ultravioleta modelo SPD-10A, acoplados ao próprio seqüenciador. O controle do sistema e aquisição dos dados foi realizado através do software PPSQ-20 Data Processing e CLASS LC-10A. AMINOÁCIDO COMPOSIÇÃO TEMPO DE RETENÇÃO MASSA MÉDIA MASSA MONOISOTÓPICA ÍON IMONIUM Glicina, Gly, G C2H3NO 5.26 57,02146 57,02146 30 Alanina, Ala, A C3H5NO 6.65 71,03711 71,0371 44 Serina, Ser, S C3H5NO2 4.25 87,0782 87,03203 60 Prolina, Pro, P C5H7NO 12.22 97,1167 97,05276 70 Valina, Val, V C5H9NO 11.79 99,1326 99,06841 72 Treonina, Thr, T C4H7NO2 4.61 101,1051 101,04768 74 Cisteína, Cis, C C3H5NOS --- 103,1448 103,00919 76 Isoleucina, Ile, I C6H11NO 17.58 113,1595 113,08406 86 (72) Leucina, Leu, L C6H11NO 18.99 113,1595 113,08406 86 (72) Aspargina, Asn, N C4H6N2O2 3.84 114,1039 114,04293 87 (70) Ácido Aspártico, Asp, D C4H5NO3 2.45 115,0886 115,02694 88 Lisina, Lys, K C6H12N2O 17.03 128,1742 128,09496 101 (129, 112, 84, 70) Glutamina, Gln, Q C5H8N2O2 4.06 128,1308 128,05858 101 (129, 84) Ácido Glutâmico, Glu, E C5H7NO3 3.14 129,1155 129,04259 102 Metionina, Met, M C5H9NOS 11.44 131,1986 131,04049 104 (61) Histidina, His, H C6H7N3O 4.90 137,1412 137,05891 110 (166, 138, 123, 121, 82) Fenilalanina, Phe, F C9H9NO 16.49 147,1766 147,06841 120 (91) Arginina, Arg, R C6H12N4O 7.66 156,1876 156,10111 129 (112, 100, 87, 73, 70, 59) Tirosina, Tyr, Y C9H9NO2 14.43 186,2133 186,07931 159 Triptofano, Trp, W C11H10N2O 7.04 163,1760 163,06333 136 ÍNDICE NUM TÍTULOS PGS RESUMO 14 ABSTRACT 16 1 INTRODUÇÃO 18 2 OS CONSTITUINTES DOS VENENOS DE HIMENOPTEROS 21 2.1 Compostos Peptídicos 21 2.1.1 As Cininas 22 2.1.2 Os Mastoparanos 23 2.1.3 Os Peptídeos Quimiotácticos 30 2.1.4 Peptídeos Neuroativos 33 2.1.5 Peptídeos Antibióticos 35 2.1.6 Outras Atividades Encontradas 37 3 OBJETIVOS 40 4 MATERIAIS E MÉTODOS 41 4.1 Material biológico 41 4.2 Medodologias 41 4.2.1 Extração e Liofilização do veneno 41 4.2.2 Espectrometria de Massas ESI-MS 41 4.2.3 Síntese Manual de Peptídeos em Fase Sólida 42 4.2.4 Redução e Carbamidometilação dos Resíduos de Cisteína 43 4.2.5 Redução e Carboximetilação dos Resíduos de Cisteína 44 4.2.6 Acetilação dos Resíduos de Lisina 45 4.2.7 Modelagem Molecular por Homologia e Métodos de avaliação dos modelos estruturais 46 4.2.8 Atividades Funcionais 48 4.2.8.1 Atividade Hemolítica 48 4.2.8.2 Animais 49 4.2.8.3 Atividade Degranuladora de Leucócitos Provenientes do Lavado Peritoneal de Ratos Wistar Machos 50 4.2.8.4 Atividade Quimiotáctica para Leucócitos Polimorfonucleares (PMNL´s) 51 4.2.8.5 Atividades Farmacológicas de Dor e Inflamação 53 4.2.8.5.1 Von Frey Eletrônico 53 4.2.8.5.2 Edema de Pata 54 4.2.8.6 Atividades Fisiológicas de Metabolismo do Pâncreas Endócrino 54 4.2.8.6.1 Isolamento das Ilhotas Pancreáticas 54 4.2.8.6.2 Secreção Estática de Insulina 55 4.2.8.6.3 Dosagem da Secreção de Insulina 55 4.2.9 Análises Estatísticas 56 5 RESULTADOS 5.1 Resultados e Discussào Obtidos nas Análises do Veneno da Vespa Social Neotropical Agelaia pallipes pallipes 59 5.1.1 Separação dos Componentes Peptídicos 59 5.1.2 Fracionamento e Sequênciamento dos Peptídeos 60 5.1.3 Modelagem Molecular Por Homologia 79 5.2 Resultados e Discussào Obtidos nas Análises do Veneno da Vespa Social Neotropical Agelaia vicina 89 5.2.1 Fracionamento e Seqüenciamento das Frações Obtidas 89 5.3 RESULTADOS DE ATIVIDADES FUNCIONAIS 95 5.3.1 Atividade Hemolítica 95 5.3.2 Atividade Desgranuladora de Mastócitos Provenientes do Lavado Peritoneal de Ratos Wistar Machos 97 5.3.3 Atividade Quimiotáctica para Leucócitos Polimorfonucleares (PMNL´s) 98 5.3.4 Resultados dos Ensaios de Dor e Inflamação 101 5.3.5 Ensaios de Secreção de Insulina 106 6 CONCLUSÕES 115 7 REFERÊNCIAS 117 14 RESUMO Os peptídeos possuem um papel essencial para as funções fisiológicas de animais, plantas e de alguns microrganismos, e frequêntemente apresentam-se como candidatos a novas drogas na sua forma natural, servindo como modelos para o “desenho” de peptídeos modificados, para uma obtenção de perfis farmacológicos melhores. Neste contexto, os venenos das vespas sociais são interessantes sob o ponto de vista da pesquisa, uma vez que são ricos em peptídeos policatiônicos envolvidos com processos inflamatórios (lise de membranas, Desgranulação de mastócitos, quimiotaxia, entre outros processos), além de efeitos antibióticos contra bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Com base nisso, o objetivo deste trabalho foi realizar uma bioprospecção dos diferentes componentes peptídicos presentes nos venenos das vespas sociais Agelaia pallipes pallipes e Agelaia vicina, através da identificação e da caracterização estrutural e funcional dos componentes peptídicos mais abundantes destes venenos. Para isso, os venenos das vespas supracitadas foram extraidos em acetonitrila, fracionados por cromatografia de fase reversa e analisado por espectrometria de massas (ESI-MS e ESI-MSn). Todos os peptídeos caracterizados foram sintetizados manualmente por estratégia Fmoc, para a realização de ensaios farmacológicos e fisiológicos. Além de abrir novas vertentes de estudos estruturais e funcionais, o presente projeto alcançou os objetivos inicialmente almejados, identificando e caracterizando estruturalmente doze peptídeos presentes nos venenos das duas espécies de vespas. As denominações e atividades biológicas dessas moléculas foram: Protonectina apresentou-se lítico para hemáceas, degranulador de leucócitos, quimiotático, induziu o fenômeno de hiperalgesia e foi edematogênico; o peptídeo Protonectina (1-4)-OH apresentou-se hemolítico para eritrócitos e desgranulador de mastócitos; o peptídeo Protonectina (1-5)-OH apresentou-se como quimiotático para leucócitos e hiperalgésico; o peptídeo Protonectina (1-6)-OH apresentou-se como quimiotático; o peptídeo protonectina (1-6) apresentou-se como quimiotático e hiperalgésico; o peptídeo protonectina (7-12) apresentou-se como quimiotático; o peptídeo Agelaia MP-I apresentou-se lítico para hemáceas, desgranulador de leucócitos e estimulador da secreçao de insulina (a via de açao ainda não foi determinada); o peptídeo Agelaia MP-II apresentou efeitos líticos e desgranulador de mastócitos de ratos menos potente que o agelaia MP-I. O peptídeo Pallipina-II não apresentou nenhuma atividade detectável até o momento, enquanto que o peptídeo Pallipina-III apresentou-se como inibidor da secreçao de insulina (por mecanismo ainda não determinado). Dessa forma, 15 esses resultados mostram a relevância de se estudar produtos naturais oriundos de venenos animais, uma vez que novas moléculas foram descobertas a partir dos venenos das vespas estudadas, mostrando a riqueza e diversidade desses compostos. PALAVRAS CHAVE: Peptidômica, Veneno de Vespas, Peptídeos, Espectrometria de Massas 16 ABSTRACT Peptides have an important role on physiologic functions of animals, plants and microorganisms. These natural peptides frequently are candidates for new drugs natural, and are used as models for the construction of modificated peptides in order to improve their pharmacological activities. From academic point of view, social wasp venoms are interesting once they are rich in policationic and polifunctional peptides that are involved with inflammatory processes (membrane lyses, mast cell degranulation, chemotaxis, and other processes), antimicrobial effects against Gram-positive and Gram-negative bacterias. Therefore, the main objective of this study was to bioprospect a diversity of peptidic compounds from the venoms of the neotropical social wasps Agelaia pallipes pallipes and Agelaia vicina through peptidomic analysis, identifying and characterizing these molecules structurally and functionally. For that, the venom from both wasps was extracted in MeCN 50% (v/v), analyzed and sequenced by ESI-MS, ESI-MSn. All characterized peptides were manually synthesized by Fmoc strategy and used for pharmacological and phisiological activities. This work has reached the initially poposed objectives by the indentification and functional characterization of twelve peptides from the social wasps venoms studied. Of these identified molecules, nine were isolated from the social wasp A. p. pallipes venom (Protonectin (1-4)-OH, Protonectin (1-5)-OH, Protonectin (1-6)-OH, Protonectin (7-12); Agelaia MP-I, Agelaia MP-II, Pallipin-I, Pallipin-II, and Pallipin-III), and from the venom of the social wasp A. vicina, four peptides were characterized (Protonectin (7-9)-OH, Protonectin, Protonectin (1-6), and Agelaia MP-I). These results show that the venom of both wasps are very similar to each other, probably due to the kinship of such species. Functionally, the peptide protonectin is lytic to erythrocytes, leukocyte degranulator, PMNL chemotactic, hyperalgesic, and edematogenic; the peptide Protonectin (1-4)-OH is lytic to erythrocytes, and leukocyte degranulator; the peptide Protonectin (1-5) OH is chemotactic and hyperalgesic; the peptide Protonectin (1-6)-OH is only chemotactic; the peptide Protonectin (1-6) is chemotactic and hyperalgesic; the peptide Protonectin (7-12) is only chemotactic; the peptide Agelaia MP-I is lytic to erytrocytes, degranulator, and insulin secretion stimulator (the pathway is not yet determined); the peptide Agelaia MP-II is lytic to erythrocytes and degranulator but less potent than Agelaia MP-I; o peptide Pallipin-II did not show any activity to the present moment, but it is still under characterization, while the peptide Pallipin-III is an insulin secretion inhibitor (the pathway is not yet determined). Moreover, these results show the importance of natural product bioprospection from 17 animals venoms, once new molecules can be still found, showing the richness and diversity of these compounds. KEY WORDS: Peptidomics, Wasp Venom, Peptides, Mass Spectrometry 18 1 INTRODUÇÃO O termo “Peptidômica” foi introduzido em 2001 (Clynen et al 2001), e é definido como a tecnologia para a descrição qualitativa e quantitativa de peptídeos de uma determinada amostra biológica (Schulz-Knappe et al 2001), compreendendo o estudo de todos os peptídeos expressos por uma célula, órgão ou organismo (Clynen et al 2003). Os peptídeos são ferramentas de pesquisa indispensáveis em ciências da vida, sendo frequêntemente candidatos a novas drogas na sua forma natural ou para o “desenho” de peptídeos modificados, e mudanças mínimas em suas estruturas primárias podem alterar dramaticamente a afinidade e seletividade aos alvos (Adermann et al 2004). Os produtos naturais como os peptídeos são, frequêntemente, o ponto de partida para pesquisas de novas drogas (Kobayashi et al 1992). No ano de 2007, a NPS Pharmaceuticals, Inc. anunciou a venda dos “royalties” do hormônio paratireoideano Preotact® (PTH 1-84] por $50 milhões à Drug Royalty L.P. 3 (DRC) (http://www.npsp.com). O gigantesco potencial das moléculas presentes nos venenos de artrópodes já são explorado por várias empresas particulares, como no caso do acordo de 50 milhões de dólares americanos, firmado, em 1992, entre a Pfizer, Inc. e a Neurogen Corp. para a pesquisa de drogas para o tratamento da ansiedade. Além disso, a Pfizer, Inc. também firmou um acordo com a Natural Product Sciences, Inc. para a pesquisa de compostos baseados em venenos de aranhas, com o intuito de desenvolver drogas para terapia de desordens neuropsiquiátricas e derrames (Bernstein 1992). No ano seguinte, a NPS Pharmaceuticals Inc., assinou um contrato com uma agência científica de Madagascar para a investigação dos usos medicinais de compostos-líderes extraídos de toxinas encontradas em insetos venenosos e aracnídeos (Garcia 1993). E porque estudar os venenos de artrópodes? Os insetos, juntamente com os crustáceos, milípedes e outros artrópodes, compõem cerca de 70% das espécies existentes no planeta, sendo que os membros da Classe Insecta, sozinhos, possuem diversidade maior que qualquer outro animal terrestre já descrito até os dias hoje. Os insetos possuem uma incrível capacidade de adaptação podendo ser pestes de lavouras, “pestes urbanas” e vetores de doenças (Meinwald 2000). Entretanto, esses animais também são necessários na polinização de muitas espécies de valor econômico para a agricultura e exportação de produtos derivados da produção de mel, além de serem predadores naturais de outros insetos, fontes de veneno com valor terapêutico, entre outras características (Gillaspy 1982, In: Breed et al 1982). 19 Um dos maiores motivos para o sucesso deste grupo animal, além das características morfológicas, é o fato de possuírem um vasto arsenal químico existente em seus venenos e secreções corpóreas, que é utilizado na defesa contra predadores. Em geral, os insetos também possuem a capacidade de metabolizar compostos orgânicos oriundos de plantas, que são adquiridos por meio de sua dieta alimentar e tornam-se potencialmente úteis no mecanismo de defesa desses organismos (Meinwald 2000). Os insetos são, portanto, verdadeiros “químicos orgânicos” capazes de controlar os gastos energéticos relacionados à produção e utilização de suas secreções químicas utilizadas como ferramentas de caça e defesa, outra característica importante que também garantiu o sucesso desse grupo de animais (Wigger et al 2002, King 2004). Mas, mesmo convivendo com os seres humanos desde a época dos hebreus, gregos e egípcios (WILSON 1982 In: BREED et al 1982), somente dezenove séculos após o início da Era Cristã (ou Era Comum), os venenos desses animais despertaram o interesse de pesquisadores (Spradbery 1973). Mais de 200.000 espécies de vespas, abelhas e formigas formam a Ordem Hymenoptera (Edery et al 1978). E, dentre esses, as vespas sociais se destacam como importantes causadores de acidentes de envenenamento significativos. As diferentes espécies de vespas sociais reagem diferentemente aos acontecimentos ao redor de seus ninhos e tendem a atacar os intrusos que se aproximam (Edery et al 1978), injetando seu veneno por meio de ferroadas seguidas. Dessa forma, esses acidentes envolvem reações diversas, tais como: dores prolongadas, edema, eritema local, urticária, ulceração, aumento da permeabilidade dos vasos sanguíneos, tonturas, taquicardia, diarréia, perda dos reflexos, reações alérgicas e até mesmo anafilaxia (Habermann 1972, Edery et al 1978, Oliveira 2000, Lorenzi 2002, Park 2002). A dor pode continuar por várias horas e a ardência por alguns dias. Observou-se experimentalmente que a liberação de histamina a partir da desgranulação de mastócitos e de catecolaminas de células adrenais; pode-se ainda observar citólise, hemólise e quimiotaxia de macrófagos e de outros leucócitos polimorfonucleares para o local da ferroada (Habermann 1972, Edery et al 1978, Oliveira 2000, Lorenzi 2002, Park 2002). E, dentre os diversos compostos causadores de tantos sintomas diferentes, destacam-se os componentes peptídicos policatiônicos que apresentam diversas atividades como citólise, hemólise, desgranulação de mastócitos, quimiotaxia para leucócitos polimorfonucleares e antibiose (Nakajima 1986). As pesquisas realizadas até o momento sobre a estrutura, atividade biológica e 20 mecanismos de ação do veneno bruto e/ou toxinas isoladas dos venenos de Hymenoptera sociais, evidenciam a presença de efeitos importantes sob o ponto de vista médico, farmacológico, fisiológico e imunológico, desencadeados pelas toxinas de tais venenos (Oliveira 2000). A grande maioria das mortes causadas por ferroadas de Hymenoptera sociais está diretamente relacionada ao desencadeamento de reações imunológicas, porém algumas se devem à toxicidade direta do veneno (Castro e Palma 2009). Porém, mesmo conhecendo os venenos de Hymenopteros desde o século XIX e sabendo que um grande número de espécies de vespas sociais ocorre nas regiões tropicais e subtropicais do planeta, ainda é necessário um estudo mais aprofundado sobre a composição dos venenos destes insetos, especialmente os neotropicais (Palma e Braga 1994). Dessa forma, esse conhecimento toxinológico favorecerá, cada vez mais, o desenvolvimento de tratamentos apropriados para se administrar o cuidado apropriado com as vítimas de ferroadas por esses animais. Tendo isso em vista, o estudo dos venenos dos Hymenoptera, em especial, das vespas sociais neotropicais, se torna interessante sob o ponto de vista da grande variedade de moléculas peptídicas produzidas nos venenos desses animais. Além disso, a investigação desses componentes seguido do aprofundamento dos conhecimentos sobre a relação estrutura/função dos componentes já identificados, certamente contribuirá para a expansão de nossos conhecimentos sobre a bioquímica, fisiologia e farmacologia dos venenos de Hymenoptera sociais, permitindo um cuidado mais adequado às vítimas ferroadas por estes insetos. 21 2 OS CONSTITUINTES DOS VENENOS DE HYMENOPTERA Os constituintes dos venenos de Hymenoptera têm sido bem documentados para a maioria das vespas sociais endêmicas de clima frio (Nakajima et al 1986). Os mesmos contêm vários tipos de aminas biogênicas (<1kDa), peptídeos (1kDa à 10kDa) e proteínas (>10kDa), incluindo algumas hidrolases (como as fosfolipases, proteases, hialuronidases, fosfatases e nucleotidases) (Nakajima et al 1986, Mendes et al 2004b). Dentre essa grande diversidade de toxinas, os compostos peptídicos destacam-se pela grande variedade de funções descritas. Isso se deve provavelmente, ao tamanho intermediário dessas toxinas (em relação aos demais tipos de compostos encontrados nos venenos de vespas). Essas moléculas interagem com diversos tipos celulares e tecidos causando diversas reações tais como: dores prolongadas, aumento da pressão arterial, contração da musculatura, lise celular, desgranulação de mastócitos e outras células granulosas, quimiotaxia para leucócitos polimorfonucleares, atividades neurológicas, antibiose entre outras atividades. 2.1 Compostos Peptídicos Ainda hoje, trabalhos agrupam os peptídeos a partir de sua característica mais marcante, como será visto nos capítulos subseqüentes. Porém, como também será mostrado posteriormente, um mesmo peptídeo pode apresentar mais de um tipo de atividade biológica destes peptídeos. Isso é devido à composição dos resíduos de aminoácidos que compõem cada cadeia peptídica e, consequentemente, ao tipo de estrutura secundária assumido por essa molécula, uma vez que a grande maioria desses peptídeos é de natureza policatiônica. Ainda assim, apesar dessas considerações, decidiu-se manter a classificação tradicional, onde os compostos peptídicos são atualmente classificados como: (1) Cininas (Pisano 1968, Toki et al 1988); (2) Mastoparanos (Hirai et al 1978, Toki et al 1988); (3) Quimiotácticos (Toki et al 1988); (4) Neuroativos (Harvey et al 1993); (5) Antibióticos (Park et al 1995); (6) Outras atividades 22 2.1.1 As Cininas Diversas cininas de vespas sociais foram isoladas e caracterizadas bioquimicamente. No entanto, suas propriedades farmacológicas ainda não foram completamente investigadas devido às baixas concentrações destes peptídeos na grande maioria dos venenos das vespas sociais. Essas moléculas têm sido associadas com dores prolongadas, aumento da pressão arterial, e contração da musculatura lisa (Nakajima 1986). Na tabela 1 estão apresentadas cininas já identificadas nos venenos de vespas. TABELA 1: Sequência primária de cininas isoladas dos venenos de vespas. Espécie de Vespas Nomes dos Peptídeos Sequência Primária N-term Polistes Polistescinina-3 P E T N K K K L R G R P P G F S P F R NH2 Polistes Polistescinina-R A R R P P G F T P F R NH2 Polistes Polistescinina-J R R R P P G F S P F R NH2 Polistes Polistescinina-C S K R P P G F S P F R NH2 Polites Polistes-protonectina I L S A L L G L L K S L NH2 Protopolybia exigua Polybiacianina-I D K N K K P I R V G G R R P P G F T P E R OH Protopolybia exigua Polybiacianina-II D K N K K P I W M A G F P G F T P I R OH Vespa Vespacinina-M G R P X G F S P F R I D NH2 Vespa Vespacinina-X A R P P G F S P F R I V NH2 Vespa Vespacinina-A G R P P G F S P F R V I NH2 Vespa Vespacinina-T G R P X G F S P F R V V NH2 Chiphononix fulvognathus Thr6-Bradicinina R P P G F T P F R NH2 Chiphononix fulvognathus Fulvocinina S I V L R G K A P F R NH2 Chiphononix fulvognathus Cyphoscinina D T R P P G F T P F R NH2 Referencias: Kishimura et al 1976, Mendes e Palma 2006, Murata et al 2006, Nakajima et al 1986, Picolo et al 2004, Rocha e Silva et al 1949, Ueno et al 1977, Undenfriend et al 1967, Yasuhara et al 1977, Yasuhara et al 1983, Watanabe et al 1976. Algumas cininas possuem parte de suas sequências primárias altamente conservadas em relação à bradicinina (cuja sequência é RPPGFSPFR-OH), com algumas exceções, onde ocorre uma substituição dos resíduos de aminoácidos das posições três e seis na sequência da bradicinina (Nakajima 1986). Um exemplo ocorre no caso de dois peptídeos isolados e caracterizados do veneno da vespa social Protopolybia exígua. São eles a Protopolybiacinina-I, causadora da constrição de músculos do íleo, de maneira menos potente quando comparada com a bradicinina; indutora da desgranulação de mastócitos (sete vezes mais potente que a causada pela bradicinina) e responsável pela dor seguida da ativação direta de receptores B2; e a Protopolybiacinina-II, com função desgranuladora de mastócitos (dez vezes mais potente que a causada pela bradicinina), exercendo pequenos efeitos constritores sobre o 23 músculo íleo. Ambos os peptídeos possuem a sequência da bradicinina conservada “no interior” de cadeia polipeptídica, enquanto que os resíduos de aminoácidos das regiões N- e C-terminais estariam associados com a proteção da sequência principal, contra ação de proteases (Mendes e Palma 2006). Outras cininas são encontradas nos venenos de vespas do gênero Polistes, onde o resíduo de serina da posição seis é substituído pelo da treonina, apresentando uma grande semelhança com a plasmacinina de tartarugas (Dunn e Parks 1970). Griesbacher et al (1998) encontraram bradicina e Thr6-bradicinina nos venenos das vespas sociais Vespula vulgaris; Vespa analis e Vespa tropica (Gobbo et al 1995). A bradicinina também foi encontrada nos venenos de vespas solitárias Megacampsomeris prismática e a Thr6-bradicinina em Campsomeriella annulata annulata e Carinoscolia melanosoma fascinata (Konno et al 2002). Também existem cininas encontradas no veneno de vespas do gênero Vespa, denominados Vespacinina-M, Vespacinina-A, Vespacinina-X e Vespacinina-T, nas quais ocorre a substituição do resíduo de prolina da posição três por hidroxiprolina, sendo desta forma, análogas à bradicinina encontrada na pele do anfíbio Heleophryne depressa (Nakajima et al 1979). 2.1.2 Os Mastoparanos Os componentes peptídicos mais abundantes e mais estudados nos venenos das vespas são aqueles pertencentes à classe dos mastoparanos (Piek 1986). Trata-se de um peptídeo anfifílico com conformação em hélice- composto de 10 a 14 resíduos de aminoácidos sem nenhuma cisteína em sua sequência primária (Nakajima et al 1986; Mendes et al 2005). Os mastoparanos também possuem resíduos de lisina em suas cadeias que tem, como possível função, a facilitação da liberação de histamina de mastócitos (Higashima et al 1990). Na tabela 2 estão apresentados as sequências primárias de peptídeos mastoparanos isolados dos venenos de vespas. Esses peptídeos policatiônicos estão envolvidos na ocorrência de inflamações, incluindo lise de membranas celulares, desgranulação de mastócitos (sua principal característica funcional), liberação histamínica e conseqüente vasodilatação; indução de quimiotaxia de neutrófilos e células T helper, resultando no recrutamento de outros leucócitos para o local inflamado (Hancock e Diamond 2000). 24 TABELA 2: Sequência primária dos peptídeos mastoparanos isolados dos venenos de vespas. Espécie de Vespas Peptídeos Sequência Primária N-term Agelaia pallipes pallipes App-5 I N W K A I L E R I K M A NH2 App-7 I N W L K L G K A I I D A NH2 Protonectina I L G T I L L K G L NH2 Agelaia MP-I I N W L K L G K A I I D A L NH2 Anoplius samariensis* Anopline G L L K R I K T L L NH2 Anterchium flavomarginatum micado* EMP-AF I N L L K I A K G I I K S L NH2 EMP-AF 1 I N L L K I A K G I I K S L OH EMP-AF2 L K I A K G I I K S L OH EMP-AF3 L K I A K G I I S L OH Apoica pallens Apoica-MP I N W L K I A K K V A G M L NH2 Eumenes rubronotatus* EMP-ER L N L K G I F K K V A S L L T NH2 Orancistroceros drewseni* Od-6 G R I L S F I K G L A E H L NH2 Od-8 I L G I I W S L L K S L NH2 Parapolibia indica Parapolybia-MP I N W K K M A A T A L K M I NH2 Polistes jadwigae Polistes MP V D W K K I G Q H I L S V L NH2 Polistes dominulus Domilina A I N W K K I A E V G G K I L S S L NH2 Dominila B I N W K K I A E I G K Q V L S A L NH2 Polybia paulista Polybia-MPI I D W K K L L D A A K Q I L NH2 Polybia-MPII I N W L K L G K M V I D A L NH2 Polybia-MPIII I D W L K L G K M V M D V L NH2 Polybine I S A D I V K K L W D N P A L NH2 Polybine II S V D M V M K G I K L W P L NH2 Protonectarina syllveirae Protonectarina-MP I N W K A L L D A A K K V L NH2 Protopolybia exígua Protopolybia MPI I N W L K L G K V S A I L NH2 Protopolybia MPII I N W K A I I E A A K Q A L NH2 Protopolybia MPIII I N W L K L G K A V I D A L NH2 Rodopalia SP Rodopalia MP I N W A K L G K L A L Q A L NH2 Synoeca cyanea SC-4 I N W L K L G Z K I I S A L NH2 Vespa analis Mastoparano-A I K W A I L D A V K K V L NH2 Vespa basalis Mastoparano-B L K L K S I E S W A K K V L NH2 HP-1 L F R L I A K T L G S L M NH2 HP-2 L F R L L A N T L G K I L NH2 HP-3 I F G L L A K T L G N L F NH2 Vespa cabro Mastoparano-C I N W K A L L A V A K K I L NH2 Vespula lewisii Mastoparano I N L K A L A A L A K K I L NH2 Vespa mandarina Mastoparano-M I N L K A I A A L A K K L L NH2 Vespa orientalis HR-I I N L K A L A A L V K K V L NH2 HR-II F L P L I L G K L V K G L L NH2 Mastoparano-II I N L K A L L A V A K K I L NH2 Vespa tropica Mastoparano-T I N L K A I A A F A K K I L NH2 Vespa xanthoptera Mastoparano-X I N W K G I A A M A K K L L NH2 * Vespas solitárias Referências: Argiolas e Pisano 1984a, Chuang et al 1996, De Souza e Palma 2008, De Souza et al 2004, 2005, Dohtsu et al 1993, Hirai et al 1979a, 1979b, Ho e Hwang 1991, Ho et al 1998, Konno et al 1998, 2000, 2006, Mayo et al 2000, Mendes et al 2004, 2005, Murata et al 2008, Nakajima 1986, Nazimov et al 1980, Ribeiro et al 2004, Tuichibaev et al 1988, Turillazzi et al 2006, Yasuhara et al 1983. 25 Segundo Park et al (1995), esses peptídeos também apresentam várias atividades biológicas, podendo agir como um potente agente promotor de exocitose de diversas células de mamíferos, causar a secreção de histamina de mastócitos, mesmo em baixas concentrações (3x10-7 M) (Nakajima 1986), e de promover a liberação de serotonina à partir de plaquetas e de prolactina a partir da glândula pituitária anterior (Hirai et al 1979a, Kuroda et al 1980). Podem ainda, apresentar atividade hemolítica, como é o caso do Mastoparano-X, isolado do veneno de Vespa xanthoptera (em concentração de 4x10-6 M) (Hirai et al 1979b), e do Mastoparano-B, isolado do veneno da Vespa basalis (Ho e Hwang 1991). O Mastoparano-B presente no veneno de Vespa basalis participa das atividades hemolítica e de formação de edema, além de provocar falência cardiovascular, devido a uma excessiva liberação de íons potássio eritrocitários, induzida pela toxina (Ho et al 1994). Segundo Mousli et al (1990), os peptídeos desgranuladores de mastócitos são uma família de peptídeos anfifílicos policatiônicos, que também incluem neuropeptídeos, e hormônios. A interação destes peptídeos com os fosfolipídeos pode causar perturbações na organização estrutural das membranas, ou mesmo podem se ligar a receptores específicos acopladas às proteínas-G nas membranas plasmáticas, ativando o mecanismo de transdução de sinal, que envolve a troca GTP/GDP. Na presença de íons Mg+2, a subunidade  ligada ao GTP se dissociaria do complexo da subunidade ; uma dessas subunidades, ou ambas, reagiria com os efetores (canais iônicos ou enzimáticos). A hidrólise de GTP a GDP permitiria a recombinação de - GDP com , finalizando a ativação cíclica (Mousli et al 1990). Ainda segundo este autor, o primeiro contato entre o peptídeo e as membranas lipídicas parece estar relacionado com a presença de sítios positivos na molécula do peptídeo, que podem interagir com sítios negativos (como exemplo: ácido siálico) presentes na membrana dos mastócitos. Após esta ligação, o peptídeo interage com componentes da membrana, promovendo a ativação de proteínas G. No caso da liberação de histamina, o efeito do mastoparano é seguido de um aumento na concentração de íons Ca2+ citoplasmáticos, que por sua vez induzem um aumento de inositol 1, 4, 5-trifosfato (IP-3), um mensageiro secundário intracelular. Essa liberação de histamina induzida pelo mastoparano parece ser mediada por interações deste peptídeo com a subunidade β da proteína G (Habermann 1972). Segundo Ross e Higashijima (1994), esta ativação é causada por fosforilação, mediada pela conversão de GTP em GDP. 26 Experimentos realizados por Okumura et al (1981) mostraram que os mastoparanos interagem com membranas lipídicas artificiais compostas de lecitina e colesterol, aumentando a permeabilidade iônica e, deste modo, aumentando também a condutividade da membrana. Este aumento na permeabilidade dos canais iônicos pode ser a causa primária do efeito de liberação de mediadores da ativação celular, uma vez que os mesmos requerem um aumento no influxo de íons Ca2+ para promover a exocitose celular (Nakajima 1986). No ano de 1979, Hirai e colaboradores identificaram e caracterizaram o primeiro mastoparano a partir do veneno da vespa social Vespula lewisii. Este peptídeo, composto basicamente de lisina e aminoácidos hidrofóbicos, foi o primeiro exemplo de peptídeo desgranulador de mastócitos isolado do veneno de vespas. A sequência primária dos mastoparanos assemelha-se muito à da Bombinina, um peptídeo hemolítico isolado da pele do sapo Bombina variegata (Csordàs e Michl 1970). Mais tarde, em 1988, Higashima e colaboradores relacionaram a interação existente entre o Mastoparano isolado da V. lewisii e proteínas-G, onde descrevem que este se liga aos fosfolipídios de membrana, formando uma estrutura em hélice- com cargas positivas, de maneira ordenada na superfície da membrana, salientando a característica de acoplamento entre os mastoparanos e as proteínas-G. Mizuno et al (1998) demonstraram que o Mastoparano causa a liberação de histamina das células RBL-2H3, sem ser inibido pela toxina Pertussis, sugerindo a existência de um mecanismo de liberação de histamina, diferente da desgranulação mediada por receptores acoplados às proteínas-G para as células RBL-2H3. Neste caso, o Mastoparano aumentaria a permeabilidade da membrana das células RBL-2H3, induzindo o extravasamento da enzima Lactato Desidrogenase (LDH), ou seja, ele induz a liberação de histamina através da lise da membrana celular, e conseqüente ruptura dos grânulos dos mastócitos. O Mastoparano pode, ainda, ser considerado um peptídeo versátil, porém pouco seletivo, uma vez que ele é capaz de interagir com diversos componentes de membranas biológicas, sendo capaz de interagir com diversos tipos celulares como mastócitos (Hirai et al 1979), neutrófilos (Perianin e Anyderman 1989), células pituitárias (Kurihara et al 1986), adrenais (Wilson 1989), plaquetárias (Ozaki et al 1990), alveolares (Joyce-Brandy et al 1991), linhagens RINm5F (linhagens tumorais de células beta) (Hillaire-Buys et al 1992) e PC-12 (linhagens de células derivadas de um feocromocitoma da medula supra-renal) (Choi et al 1992), e células pancreáticas (Yokokawa et al 1989, Komatsu et al 1992, Jones 27 et al 1993), promovendo a secreção de seus conteúdos. Entre os mecanismos bioquímicos envolvidos na resposta secretória dessas células, o Mastoparano facilita a atividade fosfolipásica (PL) dos tipos A2 (Argiolas e Pisano 1983, Joyce-Brandy et al 1991, Komatsu et al 1992, Gil et al 1991) e C (Okano et al 1985, Mousli et al 1989, Perianin e Anyderman 1989, Choi et al 1992, Wallace e Cartert 1989, Gusovsky et al 1991). Esse peptídeo reduz a separação de polifosfoinositídeos pela supressão da PLC ou pela interação direta do peptídeo com os polifosfoinositideos (Nakahata et al 1989, Wojcikiewicz e Nahorski 1989, Eddlestone et al 1995). O Mastoparano também pode estimular (Weeler-Jones et al 1992) ou suprimir (Joyce-Brandy et al 1991, Nakahata1989) a atividade da adenilato ciclase uma vez que ele se liga à calmodulina (na proporção estequiométrica de 1:1) (Malencik e Anderson 1983, Barnette et al 1983). Outra ação referente a este peptídeo é a capacidade de aumentar a síntese de DNA, melhorando a troca de nucleotídeos de proteínas G heterotriméricas e de baixas massas moleculares (Gil et al 1991, Mousli et al 1989, Higashijima et al 1988, Higashijima e Ross 1991, Eddlestone et al 1995). Ainda, este peptídeo pode apresentar-se como lítico (Hirai et al 1979, Kuriaha et al 1986, Tanimura et al 1991, Katsu et al 1990). Especificamente no caso da secreção de células β, o Mastoparano é o mais estudado, sendo caracterizado como estimulador da secreção de insulina (Daniel et al 2002), uma vez que este promove o aumento da concentração de Ca2+ livre pela inibição dos canais de KATP (Eddlestone et al 1995). Konno et al (2000) isolaram o eumenine mastoparano-AE (EMP-AF) da vespa solitária Anterhynchium flavomarginatum micado, que difere dos demais mastoparanos descritos por ter os resíduos de lisina localizados nas posições 5, 8 e 12 ao invés das posições 4, 11 e 12 como ocorre nos demais. Este peptídeo foi considerado como o principal componente peptídico do veneno desta vespa, com atividade hemolítica e inflamatória proporcional à do Mastoparano, extraído do veneno da Vespula lewisii, e atividade mais intensa que o Anoplin (Konno et al 2000). Além da estrutura primária semelhante à dos mastoparanos isolados do veneno de vespas sociais, o EMP-AF possui ainda atividades biológicas similares às dos mastoparanos clássicos. Em seguida, Park e colaboradores (1994) publicaram um estudo sobre a interação do Mastoparano-B com fosfolipídios de membrana. Concluiu-se que a interação do resíduo de Lys2 no Mastoparano-B e o grupo acídico da cabeça lipídica possuem importante papel na estabilização da estrutura em -hélice. Estudos específicos realizados pelos autores supracitados evidenciaram que o Mastoparano-B induz a desestabilização da bicamada 28 lipídica; por meio da interação com fosfolipídios de membrana. Cerca de três ou quatro resíduos de Lisina são expostos à fase aquosa, enquanto a parte hidrofóbica da molécula penetra profundamente por entre as camadas lipídicas. Isso faz com que as moléculas de peptídeos se acumulem predominantemente na metade exterior da bicamada, causando a desestabilização das cadeias alquílicas nos lipídeos da bicamada em lipossomos neutros, permitindo que os peptídeos penetrem rapidamente por entre a membrana. Por outro lado, em lipossomos acídicos, a interação entre as cargas do peptídeo catiônico com o lipídio aniônico inibe a penetração profunda dos peptídeos para o outro lado da bicamada. Esses experimentos realizados (Park et al 1994), também mostraram que os mastoparanos (MP e MP-B) apresentam alta atividade antibióticas. O MP-B apresentou pronunciada atividade antibiótica, tanto contra bactérias Gram-positivas (como Staphylococcus aureus e Bacillus subtilies), quanto para bactérias Gram-negativas (como E. coli e Shigella sonnei). Já o MP apresentou atividade acentuada apenas contra as bactérias Gram-positivas. Segundo esses mesmos autores, essas características provavelmente devem-se as características anfifílicas dessas moléculas. Park et al (1994) demonstraram ainda, que a introdução de aminoácidos básicos, como Lys, na parte hidrofóbica da molécula promove aumento na atividade contra bactérias Gram-negativas, acompanhada de uma drástica redução na atividade contra as Gram-positivas. Por outro lado, quando resíduos de Lys são incorporados na porção hidrofílica da sequência peptídica, observa-se diminuição no efeito antibacteriano destes peptídeos. Dois anos mais tarde, Ho et al (1996) propuseram que, aparentemente, a Lys2 e o Trp9 são os resíduos críticos para a produção da atividade hemolítica do Mastoparano-B e essa única estrutura provavelmente pode ser importante para sua maior atividade hemolítica. O Mastoparano-B é liberador de histamina de mastócitos, potente agente hemolítico de células vermelhas, ativador da proteína-G, além de agir em sinergia com a “proteína letal” (outra proteína do veneno do vespão) (Higashijima et al 1988, Park et al 1995, Ho et al 1994, Ho et al 1996). Estudos anteriores, sobre a relação entre estrutura e atividade dos mastoparanos, revelaram o importante papel dos três primeiros resíduos de aminoácidos no influxo de Ca+2, na afinidade aos lipossomos ou na inibição da sensibilidade à calmodulina (Nakajima et al 1986). Wakamatsu et al (1983) descreveram que, pela análise de dicroísmo circular, a conformação das moléculas de Mastoparano-X, como ligantes de vesículas de fosfatidilcolina, é altamente -helicoidais. Entretanto, a conformação do mastoparano 29 associado às micelas de lisofosfatidilcolina não é exatamente a mesma que da molécula de mastoparano associado às vesículas de fosfatidilcolina. Visto que as atividades biológicas dos peptídeos estão correlacionadas com as conformações de suas moléculas, os autores propõem que é mais importante analisar a conformação dos peptídeos como ligantes da bicamada fosfolipídica, do que das micelas. Outro peptídeo extraído do veneno de vespa solitária é o Anopline, extraído do veneno de Anoplius samariensis (Konno et al 1998). Trata-se de um peptídeo rico em aminoácidos hidrofóbicos e básicos, também com sequência primária similar aos mastoparanos, principalmente a do Mastoparano-X e Crabrolina, são degranuladores de mastócitos, isolados do veneno de Vespa xanthoptera (Krishnakumari e Nagaraj 1997) e Vespa crabro (Argiolas e Pisano 1984a), respectivamente. Constatou-se que a atividade antibiótica do Anopline, contra bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, pode ser considerada de grande importância no processo de preservação das presas desses animais e contra infecções (Konno et al 2001). Argiolas e Pisano (1983) estudaram a semelhança entre a Melitina (peptídeo isolado do veneno de abelha) e o Mastoparano (peptídeo isolado do veneno de vespa), no sentido que ambos são capazes de estimular a fosfolipase A2. Enquanto a Melitina interage com os fosfolipídios de membrana, o Mastoparano interage com receptor de membrana acoplado ã proteína G, promovendo por sua vez a desgranulação de mastócitos. Esses grânulos liberam, entre outras substâncias, prostaglandinas e leucotrienos, que por sua vez, agiriam com os fosfolipídios de membrana em interação com as fosfolipases. Estes autores relataram em 1984(a), que o Mastoparano também é potente ativador de fosfolipase-A2 e -C, causando um aumento na produção de ácido araquidônico. Peptídeos similares, como a Crabrolina e os HR-I e HR-II, foram isolados de Vespa crabro e Vespa orientalis, respectivamente (Nakajima et al 1986). A Cabrolina, assim como o Mastoparano, é um estimulador da fosfolipase A2 e causa liberação de histamina de mastócitos peritoniais, porém seu modo de ação difere dos mastoparanos clássicos (Argiolas e Pisano 1984a). Os mastoparanos HR-I e o HR-II, isolados de Vespa orientalis (Tuichibaev et al 1988), ocorrem em concentrações muito menores que a Crabrolina, isolada do veneno de Vespa crabro (Argiolas e Pisano 1984b). Ambos também causam hemólise e liberação de histamina de mastócitos peritoniais. Neste mesmo ano, Argiolas e Pisano (1984b), também descreveram as Bombolitinas (I, II, III, IV e V), como sendo heptadecapeptídeos com aminoácidos 30 hidrofóbicos, que apresentam cargas positivas em pH neutro, sendo peptídeos aparentemente anfifílicos por possuírem segmentos em -hélice. Similares aos mastoparanos em sua sequência primária e semelhantes funcionalmente à Melitina e à Crabrolina por facilitarem a atividade da fosfolipase A2. No veneno da vespa social neotropical Protopolybia exígua (Saussure), Mendes e colaboradores (2005) descreveram três novos mastoparanos: o Protopolybia-MPI, hemolítico e causador de perturbações na membrana, enquanto que Protopolybia-MPII e a Protopolybia-MPIII, não apresentaram atividade hemolítica e parecem estar relacionados com a desgranulação de mastócitos ativada pela ligação destes peptídeos a receptores de membrana acoplados a proteínas-G (subunidade Gi), que por sua vez ativa uma cascata de eventos moleculares regulados por AMPc, resultando na desgranulação dos mastócitos. De Souza et al (2005) caracterizaram um novo mastoparano (Polybia-MPI) no veneno da vespa social Polybia paulista, que possui grande similaridade com a Protonectarina-MP, com reduzida atividade desgranuladora de mastócitos (quando comparada a Protonectarina-MP), causando lise em 50% dos mastócitos. Este peptídeo não induz atividade hemolítica sugerindo uma baixa interação com membranas de células eritrocitárias de ratos. 2.1.3 Os Peptídeos Quimiotácticos Os peptídeos quimiotáticos encontrados nos venenos de vespas são chamados de Ves-CPs ("peptídeos quimiotácticos de vespas"). Suas sequências primárias assemelham- se às dos mastoparanos, apresentando abundância de resíduos de aminoácidos hidrofóbicos. Com poucas exceções, possuem conformação em hélice anfipática, na qual todos os resíduos hidrofóbicos estão localizados em uma mesma porção da molécula, enquanto que resíduos básicos como Arg e Lys aparecem na porção oposta (Nakajima 1986). A tabela 3 lista os diversos peptídeos quimiotáticos dos venenos de vespas. Esses peptídeos induzem a quimiotaxia de leucócitos polimorfonucleares e foram inicialmente encontrados nos venenos das espécies Vespa tropica, V. mandarinia, V. analis, V. cabro, V. xanthoptera, V. orientalis, Paravespula lewisii, Icaria sp (NAGASHIMA et al., 1990). No entanto, outros peptídeos com essas características foram isolados dos venenos das vespas como a Agelaia pallipes pallipes, Protonectina silveirae, Polybia paulista, Vespa magnífica e Polistes rothneyi iwata (Tabela 3). 31 TABELA 3: Peptídeos quimiotácticos isolado do veneno de vespas. Espécie de Vespas Nomes dos Peptídeos Sequência Primária N-term Agelaia pallipes pallipes Protonectina I L G T I L G L L K G L NH2 Protonecina (1-6) I L G T I L NH2 Apoica pallens Apoica MP I N W L K I A K K V A G M L NH2 Icaria CP I-CP I V P F L G P L L G L L T NH2 Megabombus pensylvanicus Bombolitina-I I K I T T M L A K L G K V L A H V NH2 Bombolitina-II S K I T D I L A K L G K V L A H V NH2 Bombolitina-III I K I M D I L A K L G L V L A H V NH2 Bombolitina-IV I N I K D I L A K L V K V L G H V NH2 Bombolitina-V I N V L G I L G L L G K A L S H L NH2 Paravespula lewisii VesCP-L F L P I I A K L V S G L L NH2 Polistes Polistescinina-3 P E T N K K K L R G R P P G F S P F R NH2 Polistescinina-R A R R P P G F T P F R NH2 Polistescinina-J R R R P P G F S P F R NH2 Polistescinina-C S K R P P G F S P F R NH2 Polistes-Protonectina I L S A L L G L L K S L NH2 Polybia paulista Polybia-Protonectina I L G T I L G L L K S L NH2 Protonectarina sylveirae Protonectarina I A W K A L L D A A K K V L NH2 Polybia paulista Polybia-CP I L G T I L G L L K G L NH2 Protopolybia exígua Polibiacianina-I D K N K K P I R V G G R R P P G F T P F R OH Polibiacianina-II D K N K K P I W M A G F P G F T P I R OH Vespa analis VesCP-A F L P M I A K L L G G L L NH2 Vespa Cabro Cabrolina F L P L I L A K I V T A L NH2 Vespa Mandarina VesCP-M F L P I I G K L L S G L L NH2 Vespa orientalis HR-II F L P L I G G K L V K G L L NH2 Vespa tropica VesCP-T F L P I L G K I L G G L L NH2 Vespa xanthoptera VesCP-X F L P I I A K L L G G L L NH2 Vespa Bradicinina R P P G F S P F R OH Mastoparano I N L K A A L A K K I L NH2 Thr6-Bradicinina R P P G F T P F R NH2 Vespacinina-M G R P X G F S P F R I D NH2 Vespacinina-X A R P P G F S P F R I V NH2 Vespacinina-A G R P P G F S P F R V I NH2 Vespacinina-T G R P X G F S P F R V V NH2 Referências: Argiolas & Pisano 1984, 1985, Baptista-Saidemberg et al 2010; De Souza et al 2005, 2009, Dohtsu et al 1992, 1993, Kishimura et al 1976, Mendes et al 2004, Mendes e Palma 2006, Miroshnikov et al 1981, Murata et al 2006, Nakajima et al 1986, Rocha e Silva et al 1949, Ueno et al 1977, Undenfriend et al 1967, Yasuhata et al 1977, 1983, 1984a, 1984b, Watanabe et al 1976. Toki et al (1988) isolaram o peptídeo quimiotático “Peptídeo 43” do veneno da vespa Parapolybia indica, composto de treze resíduos de aminoácidos, rico em resíduos de aminoácidos hidrofóbicos como Leu ou Ile, com um único resíduo de Lys na 6ª posição, e se diferencia dos demais peptídeos quimiotácticos usuais que se iniciam com a sequência F-L-P e terminam com I-L-NH2 ou L-L-NH2. Essa sequência primária com poucas cargas positivas na sequência peptídica contrasta com aquela já conhecida para a 32 liberação de histamina de mastócitos (Nagashima et al 1990). De Souza et al (2004) caracterizaram dois novos peptídeos quimiotáticos do veneno da vespa social Polybia paulista, que apresentaram atividades hemolíticas, quimiotáticas para leucócitos polimorfonucleares e degranuladora de mastócitos bastante significativas, aparentemente, constituindo uma nova sub-classe destes peptídeos, envolvidos diretamente a ocorrência de processos inflamatórios. Também foi caracterizada estrutural e funcionalmente uma nova toxina peptídica isolada do veneno da vespa social Polybia paulista, Polybia-CP, que apresenta reduzida atividade desgranuladora e de lise de mastócitos, como é esperado para a maioria dos peptídeos quimiotáticos dos venenos de vespas. Este peptídeo também apresentou baixa atividade hemolítica em eritrócitos de ratos (De Souza et al 2005). Já no ano de 2006, Xu et al descreveram estruturalmente três novos peptídeos quimiotáticos do veneno da Vespa magnifica denominados 5e (que possui estrutura idêntica ao VESCP-X, encontrado anteriormente no veneno da Vespa xanthoptera), 5f e 5g. Mendes et al (2004b) descreveram que o peptídeo Protonectina, previamente observado no veneno da vespa Protonectarina sylverae por Dohtsu et al (1993), também foi encontrado no veneno da vespa Agelaia pallipes pallipes. Esse peptídeo apresentou atividade hemolítica, desgranuladora de mastócitos peritoniais de ratos e quimiotática para leucócitos polimorfonucleares (Mendes et al 2004a,b). Murata e colaboradores (2006) descreveram o peptídeo Polistes-Protonectina isolado do veneno da vespa Polistes rothneyi iwatai. Esse peptídeo é um análogo da Protonectina, encontrado nas vespas sociais Protonectarina sylveire e Agelaia pallipes pallipes. Em sua sequência primária, os resíduos de Gly encontrados na sequência original da Protonectina nas posições 3 e 11, foram substituídos por resíduos de Ser. Baptista-Saidemberg et al (2010) isolaram, do veneno da vespa social Agelaia pallipes pallipes, o peptídeo Protonectina (1-6), que, isoladamente, apresentou forte atividade quimiotática para leucócitos polimorfonucleares isolados de ratos. Nesse mesmo trabalho, descreveu-se que, em experimentos in vitro, esse peptídeo demonstrou-se capaz de interagir com o peptídeo Protonectina, provavelmente, formando uma supra-estrutura molecular que diminui os efeitos quimio-atraentes causados por ambos os peptídeos. Este resultado demonstra que, de alguma forma, os diferentes componentes presentes nos venenos das vespas sociais também poderiam agir em conjunto para o desenvolvimento dos diferentes sintomas apresentados pelas vitimas acidentadas pela ferroada por esses animais. 33 2.1.4 Peptídeos Neuroativos Um grande número de aranhas, escorpiões e vespas possuem uma grande variedade de substâncias neuroativas em seus venenos, capazes de interar com alvos distintos no sistema nervoso. Uma vez que essas moléculas peptídicas têm sido indicados como ferramentas para aumentar nosso conhecimento sobre os mecanismos moleculares da neurotransmissão (desde mecanismos das funções neuronais, como a elucidação de canais iônicos ou caracterização das funções dos receptores - Harvey et al 1993), as pesquisas com essas neurotoxinas podem também ser alvo no desenvolvimento de inseticidas naturais e drogas potenciais para o tratamento de neuropatologias (Belleboni et al 2004). Esses polipeptídeos podem, ainda, ser utilizados como ferramentas relacionados às neurociências, em estudos voltados a relação de como essas neurotoxinas interferem nos mecanismos neuronais com alta afinidade e seletividade. Análises realizadas por Mortari et al (2007) demonstram que essas neurotoxinas se ligam a receptores, tranportadores e canais iônicos de neurônios excitatórios e inibitórios no sistema nervoso central de insetos e mamíferos, garantindo a sobrevivência dos invertebrados venenosos. Devido às propriedades de seletividade e afinidade desses peptídeos (assim como das poliaminas), eles são úteis no „desenho‟ de novas drogas para o tratamento de desordens neuronais tais como a epilepsia, doença de Parkinson, doença de Huntington, doença de Alzheimer e isquemia global e retinal. Essas moléculas, adquiridas de diferentes venenos, tiveram suas propriedades caracterizadas para muitos subtipos de canais iônicos bem como para receptores de neurotransmissores (Mortari et al 2007). As Megascoliacininas, isoladas do veneno da vespa solitária Megascolia flavifrons, que bloqueiam receptores nicotínicos para acetilcolina (Yashuara et al 1987, Piek et al 1991, Piek 1991), enquanto que as Pompilodoxinas (α- e β- PMTX) isoladas do veneno da vespa solitária Anoplius samariensis (exceto para a PMTX, também isolada do veneno da vespa aranha Batozonellus malifrons), possuem ação na facilitação da transmissão neuromuscular de lagostas, porém a α-PMTX tem ação mais rápida que a β-PMTX. Neste último caso, as PMTX‟s diferem uma da outra pela presença de Arg-12 no lugar de Lys-12, na β-PMTX (Konno et al 1998). Sahara et al (2000) relataram que a β-PMTX causa atenuação do processo de inativação nos canais de sódio, sensíveis à TTX, de neurônios trigeminais de ratos. Em seguida, Kinoshita et al (2001) determinaram que a β-PMTX exibe uma sensibilidade 34 especifica à isoforma para canais de sódio, dependendo da presença ou ausência de um resíduo aniônico no sítio de ligação, oferecendo diversas vantagens para classificar e caracterizar várias isoformas de canais de sódio (Kinoshita et al 2001). Outros peptídeos com ação no sistema nervoso também foram isolados do veneno da vespa social Agelaia vicina: AvTx8 (Oliveira et al 2005a) e o AdAv3 (Oliveira et al 2005b). O peptídeo AvTx8 apresentou efeitos similares ao Baclofen® (droga já comercializada, utilizada no tratamento de ansiedade), o peptídeo AvTx8 foi microinjetado no SNpr (Sistema Nervoso Parassimpático) de Rattus novergicus (Wistar) antes das microinjeções salinas de dISC ou bicuculina, considerando que o veneno de vespa possui alguma influência na captação de neurotransmissors GABA e/ou glutamato. O bloqueio do receptor de GABA(A) resultou em um comportamento de fuga vigoroso expresso por corrida rápida, pulos e voltas quando comparado com o controle (Oliveira et al 2005a). Essas reações defensivas foram maximizadas após o agonismo intranigral de GABA(A) com muscimol, mas não após o agonismo in situ de GABA(B). As microinjeções nigrais de AvTx8 induziram efeitos similares ao baclofen, diminuindo a intensidade das reações comportamentais defensivas induzidas pelo bloqueio do receptor GABA(A) no mesencéfalo dorsal. Essas descobertas sugerem que AvTx8 possui alguns efeitos na neurotransmissão GABAérgica, aumentando a atividade das vias inibitórias nigro- coliculares, causando um efeito anti-pânico (antiaversivo). Dessa maneira, foi sugerido que a AvTx8 pode ser uma nova ferramenta farmacológica para o estudo das diferenças entre os dois tipos de receptores GABAérgicos e os mecanismos excitatórios mediados por aminoácidos no cérebro e no sistema nervoso (Oliveira et al 2005a). Cininas são polipeptídeos de 9-18 resíduos de aminoácidos contendo uma sequência do tipo Bradicinina, em alguns casos como parte da molécula. A sequência do tipo Bradicinina pode ser tanto bradicinina, Hyp3-bradicinina ou Thr6-bradicinina. As cininas são componentes neurotóxicos dos venenos de vespas e formigas, causando no sistema nervoso central de insetos um bloqueio pré-sinaptico da transmissão colinérgica por meio de uma depleção irreversível, provavelmente causada por uma inibição não competitiva da captação de colina (Piek 1991). As propriedades farmacológicas dos quatro análogos sintéticos da neurotoxina de vespa Vespulacinina 1 foram estudados através de uma série de preparações de músculo liso de mamíferos e da transmissão sináptica dos nervos cercais de baratas para um interneurônio gigante. Todos os análogos tiveram um efeito do tipo-bradicinina, extremamente baixo nos músculos lisos. Os análogos não glicosilados deste peptídeo e 35 os dois peptídeos monoglicosilados são aproximadamente tão ativos como a bradicina. Os derivados duplamentes glicosilados são aproximadamente cinco vezes mais potentes que a bradicinina e todos os análogos tiveram dois efeitos diferentes na transmissão sináptica no sistema nervoso de insetos: primeiro, um bloqueio direto e reversível na transmissão excitatória nicotínica com uma ativação concorrente do sistema inibitório GABAérgico e segundo, um bloqueio irreversível atrasado da transmissão, comparável ao bloqueio descrito anteriormente para a bradicinina e Thr6-bradicinina. Para a transmissão sináptica no SNC de insetos a cinina com duas glicosilações é aproximadamente cinco vezes mais potente do que a bradicinina (Piek et al 1993). A Orientotoxina (peptideo isolado da Vespa orientalis) foi descrito como sendo um novo composto pressináptico neurotóxico manifestando atividade lisofosfolipase e, espontaneamente, pode tanto bloquear e induzir a liberação de neurotransmissores do nervo pré-sinaptico membranar (Tuĭchibaev et al 1984). 2.1.5 Peptídeos Antibióticos No final de 1960, as necessidades médicas por novos antibióticos começaram a ser questionada e a indústria farmacêutica substituiu sua ênfase de antibactericidas a partir de um composto terapêutico líder para áreas de pesquisa de menor prioridade. Embora as doenças infecciosas, em particular àquelas causadas por bactérias, ainda estarem entre as maiores responsáveis pela mortalidade no mundo, o apoio industrial continuou a diminuir. A mudança dessa importante área de pesquisa antimicrobiana foi atribuída a uma combinação de fatores científicos, médicos, e mercadológicos. A diminuição na intensidade de descoberta de drogas antibióticas, juntamente com um crescente risco resultante de infecções causadas por patógenos bacterianos resistentes a drogas representam uma clara ameaça à saúde pública (Overbye e Barrett 2005). Muitos dos peptídeos encontrados nos venenos desses Hymenopteros possuem entre 13-26 resíduos de aminoácidos podendo, portanto, serem sintetizados quimicamente além de serem facilmente estudados em relação às correlações estrutura-função. E a descoberta de peptídeos como esses nos últimos anos, tem fornecido uma grande quantidade de moléculas que podem ser engenheiradas para obtenção de uma atividade específica (Krishnakumari e Nagaraj 1997). A tabela 4 ilustra peptídeos antimicrobianos isolados dos venenos de vespas. 36 TABELA 4: Peptídeos antibióticos isolados dos venenos de vespas. Vespas Peptídeos Sequência Primária Agelaia pallipes pallipes Protonectina I L G T I L G L L K G L Mastoparano Mastoparano B EMP-AF Vespa magnífica 5a L L G G L L Vespa magnífica 5b F L P I I A K Vespa magnífica 5c K L L G G L L Vespa magnífica 5d I N W K G I A A M K K Vespa magnífica 5e F L P I I A K L G G L L Vespa magnífica 5f F L P I P R P I L L G L L Vespa magnífica 5g F L I I R R P I V L G L L Vespa magnífica 12a I N W K G I A A M A K K L L Vespa magnífica 12b I N W K G I A A M K K L L Vespa magnífica 12c I N W G I A Vespa magnífica 12d I N W K G I A A M Vespa cabro Cabrolina F L P L I L K I V T A L Referências: Dohtsu et al 1993; Xu et al 2006; Konno et al 1998. O mastoparano B (MP-B), um peptídeo anfifílico em hélice-α isolado da vespa Vespa basalis, foi estudado em comparação ao mastoparano (MP) em relação à interação com a bicamada fosfolipídica e à atividade hemolítica e antimicrobiana. A estrutura anfifílica do MP-B tem mais resíduos de aminoácidos hidrofílicos na superfície hidrofílica do que o MP. Embora cada peptídeo tenha um efeito consideravelmente diferente na interação com bicamadas lipídicas (sua conformação na presença de lipídeos acídicos e neutros e habilidade de liberação de corantes de lipossomos encapsulados), no modo de interação total foi similar. MP-B causou uma mudança no formato de eritrócitos de discóide normal para uma forma crenada (chamada equinócitos). O MP revelou forte atividade inibitória contra bactérias Gram-positivas mas não contra bactérias Gram-negativas. Enquanto isso, MP-B demonstrou ser fortemente ativo tanto para bactérias Gram-positivas, como para bactérias Gram-negativas. Esses peptídeos apresentaram praticamente os mesmos resíduos de aminoácidos no lado hidrofóbico, e essa diferença na atividade biológica em membranas parece estar relacionada à superfície da área hidrofílica desses peptídeos (Park et al 1995). Nos estudos com as atividades antibacterianas e hemolíticas da Cabrolina, FLPLILRKIVTAL-NH2, um peptídeo com 13 resíduos de aminoácidos presente no veneno do vespão Vespa crabro e peptídeos correlacionados, demonstrou-se que apesar da conformação helicoidal ser necessária para a atividade hemolítica, este não é um pré- 37 requisito para a atividade antibacteriana (Konno et al 1998). Dos Santos Cabrera e colaboradores (2004) descreveram o EMP-AF como sendo capaz de penetrar através de lipossomos aniônicos, e em uma extensão menor nos lipossomos neutros. Demonstrou-se que a habilidade de permeação é bem correlacionada à quantidade de conformações de alfa-hélices assumidas pelos peptídeos nesses ambientes. Estes peptídeos também apresentaram um amplo espectro de atividades inibitórias contra bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. A permeabilidade de lipossomos e o efeito antibiótico apresentaram significante redução quando o C-terminal foi desaminado (tornando-se acídico). A remoção dos três primeiros resíduos de aminoácidos da região N-terminal fez com que o peptídeo se tornasse inativo, tanto em lipossomos como em bactérias. O peptídeo Mastoparano induz hipotermia em camundongos Swiss após 15 minutos de injeção intraperitoneal. Este efeito também é induzido por outros mastoparanos isolados dos venenos de outras espécies de vespas (Dudevani et al 1991). 2.1.6 Outras Atividades Encontradas Já está bem documentado que diversas toxinas presentes nos venenos de aranhas, escorpiões, serpentes e moluscos marinhos correspondem a peptídeos biologicamente ativos, dos quais, uma porcentagem significativa, é rica em pontes dissulfeto que estabilizam suas estruturas tri-dimensionais (Ueberheide et al 2009). A possível função biológica dessas moléculas esta na capacidade de interagirem especificamente com canais iônicos, sendo importantes ferramentas para se estudar esses canais (Ueberheide et al 2009). Atualmente, uma nova classe de peptídeos isolados dos venenos de vespas sociais que apresentam características estruturais semelhantes, tem recebido atenção. Trata-se dos peptídeos que apresentam dois resíduos de cisteína em sua estrutura. Dohtsu et al (1993) isolaram do veneno da vespa Protonectarina sylveirae, o peptídeo Silverina, que não apresentou homologia de sua sequência primária com nenhuma classe de peptídeo anteriormente caracterizada. Até o presente momento, é o único peptídeo no veneno de vespas sociais publicado, que apresenta ponte dissulfeto. O fato mais interessante deste peptídeo é que se trata de um potente indutor da liberação de histamina de mastócitos, mas que não causa hemólise e, provavelmente, o seu modo de ação difere daquele dos mastoparanos (Dohtsu et al 1993). Nos últimos anos, o laboratório de biologia estrutural e zooquímica do centro de 38 estudos de insetos sociais do instituto de biociências da UNESP de Rio Claro/SP, isolou e caracterizou diversos outros peptídeos formadores de ligação dissulfeto a partir dos venenos de algumas espécies de vespas sociais como mostrado na tabela 5. TABELA 5: Peptídeos com pontes dissultetos isolados do veneno de vespas. Peptídeos Sequência Primária e N-terminal Referências Silverina S K G K I C K I I G K I G K K P P F C P OH Dohtsu et al 1993 Sedulina S K G K I C K I I G A K I G K K P P C P OH * Exiguina S I K D K I C K I L U A K I G K K P P I C OH * Cyanina G L K D L C K I L E A K F G K K L P F C P OH * Pallipina S I K H K I C L I E R K I G I K L P F C OH Costa et al 1996 Polybina S I K D K I C K I I Q A Q C G K K L P F V NH2 de Souza 2002 Todos os peptídeos listadas acima apresentam uma ponte dissulfeto, entre os grupos tióis dos resíduos de cisteína; * Resultados ainda não publicados. Ainda segundo a tabela acima, percebe-se que, comparados com os demais tipos de toxinas peptídicas isoladas de Vespidae, trata-se de poucas sequências descritas até o momento. Quando alinhados, verifica-se que essas sequências são relativamente conservadas umas em relação às outras; que os resíduos de cisteína apresentam diferentes posições de 6 ou 7 e 14, 19, 20 ou 21; e, todos possuem C-terminal ácido, exceto o peptídeo Paulistina, que possui C-terminal amidado. Corsi (2001) em estudos relacinados com os mecanismos de secreção de insulina por células β pancreáticas, determinou que a Silverina, provoca significativa redução da secreção de insulina dessas células, sugerindo que a ação é independente do metabolismo celular. Provavelmente este peptídeo é capaz de modular a captação de íons cálcio, interagindo com o movimento desse íon para o interior das células beta, interferindo, dessa forma, na extrusão dos grânulos de insulina (Corsi 2001). Sabe-se que o peptídeo AvTx7, isolado do veneno da vespa Agelaia vicina, estimula a liberação do glutamato na presença de bloqueadores de canais de cálcio e sódio, sugerindo que esta ação não é mediada através desses canais. No entanto, esse peptídeo potencializa a liberação de glutamato na presença de bloqueadores de canais de potássio, indicando que essa toxina possa agir através desse tipo de canal sensível a drogas. Esses resultados sugerem que o AvTx7 poderia ser utilizado para o melhor entendimento do envolvimento dos canais de potássio na liberação de glutamato (Pizzo et al 2004). No entando, ainda não se determinou nenhuma atividade biológica e/ou farmacológica relacionada a essas moléculas, proporcionando uma nova linha de pesquisa 39 dentro dos estudos dos venenos produzidos pelas vespas sociais. 40 3 OBJETIVOS O objetivo maior deste trabalho é realizar bioprospecção dos diferentes componentes peptídicos, presentes nos venenos das vespas sociais Agelaia pallipes pallipes e Agelaia vicina através de estudos estruturais e funcionais de cada composto peptídico isolado: - Fracionar e purificar os peptídeos mais abundantes dos venenos das vespas supracitadas, identificando o maior número possível de novos peptídeos presentes nesses venenos; - Determinar as características estruturais de sequências primárias destas moléculas através de estratégias analíticas, como espectrometria de massas in tandem; - Modelagem molecular dos peptídeos (Agelaia MP-I, Agelaia MP-II e Pallipina-I) - Sintetizar manualmente os peptídeos identificados por estratégia Fmoc; - Determinar as atividades biológicas de cada um deles, através de ensaios: In vitro: hemólise, desgranulação de mastócitos provenientes do lavado peritonial de ratos e quimiotaxia para leucócitos polimorfonucleares In vivo: dor e inflamação, capacidade modulatória da secreção de insulina de células beta pancreáticas. 41 4 MATERIAIS E MÉTODOS 4.1 Material biológico Os ninhos das vespas sociais Agelaia pallipes pallipes e Agelaia vicina (Hymenoptera, Vespidae) utilizadas neste estudo foram coletados na região de Rio Claro/SP. Todas as coletas foram geo-referenciadas: S22°23´49.7´´; W047°32´54´´ para Agelaia pallipes pallipes e S22°25´25.4´´; W047°34´48.2´´para Agelaia vicina. 4.2 Medodologias 4.2.1 Extração e Liofilização do veneno Cerca de 2500 reservatórios de veneno de cada uma das espécies estudadas foram extraídos com auxílio de pinças. Estes reservatórios foram comprimidos com auxílio de um bastão de ponta arredondada na presença de solução de Acetonitrila (MeCN) (grau HPLC – adquirida da Mallinkrodt) 50% (v/v) em água ultrapura, a fim de extrair preferencialmente os componentes peptídicos, eliminando restos celulares e outros detritos que poderiam agir como contaminantes. Em seguida, o material solubilizado foi centrifugado à 8000 rpm por 15 minutos à temperatura ambiente, em micro centrífuga (Centrífuga Eppendorf - Centrifuge 5415D) de alta rotação. O sobrenadante foi coletado, congelado em freezer à –80°C e liofilizado (Liofilizador a vácuo da marca HETO - Drywinner 3) (Liofilizador à vácuo da marca HETO - Drywinner 3), até posterior análise. 4.2.2 Espectrometria de Massas ESI-MS As análises de ESI-MS e MSn dos peptídeos foram realizadas em um equipamento LC-MS-IT-TOF (SHIMADZU, Kyoto). O equipamento operou com voltagem de probe em 4.50 kV, temperatura de CDL de 200°C, temperature do bloco de aquecimento 200°C, fluxo de gás nebulizante de 1.5 L min−1, tempo de acumulação de íons no Ion Trap de 50 msec, faixa de massas do MS de m/z entre 100 a 3000, e do MSn de m/z entre 50 a 3000, parâmetros de CID: energia, 35%; gás de colisão, 20%. O equipamento foi ajustado por auto-tuning utilizando uma solução de Na-TFA, e apresentou os seguintes parâmetros: 42 Para o modo positivo (+), erro de 3,08 ppm e, resolução de 10,414; Para o modo negativo (-), erro de 2,69 ppm, e resolução de 13,212 . 4.2.3 Síntese Manual de Peptídeos em Fase Sólida A síntese dos peptídeos lineares foi realizada através do método manual em fase sólida (Merrifield 1986, Chan e Withe 2004), utilizando-se N-9-fluorenilmetoxicarbonil, também conhecida como estratégia Fmoc (Tabela 6), peptídeos esses que foram utilizados para a realização dos ensaios biológicos. TABELA 6: Sequencias dos peptídeos isolados e identificados para a síntese. Espécie Peptídeos C-Terminal A. vicina G L L OH A. p. pallipes I L G T OH A. p. pallipes I L G T I OH A. p. pallipes I L G T I L OH A. p. pallipes I L G T I L NH2 A. p. pallipes e A. vicina G L L K G L NH2 A. p. pallipes e A. vicina I L G T I L G L L K G L NH2 A. p. pallipes e A. vicina I N W K A I L Q R I K K M L NH2 A. p. pallipes I N W L K L G K A I I D A L NH2 A. p. pallipes G I I D D Q Q C K K K P G Q S S P V C S OH A. p. pallipes S I K H K I C K L L E R T L K L T T P F C NH2 A. p. pallipes S I K K H K C I A L L E R R G G S K L P F C NH2 Os peptídeos foram sintetizados utilizando-se 100 mg de resina NovaSyn TGR, com grau de substituição de 0,2 mmol e/g (sendo que o rendimento gira em torno de 30%, podendo diminuir a medida que aumenta o número de resíduos de aminoácidos na sequencia peptídica). Em cada ciclo da síntese foi adicionado Fmoc-aminoácido-OH (NOVABIOCHEM), contendo N-Hidroxibenzotriazol (HOBt.H2O, NOVABIOCHEM) e N-Metilmorfolina (NNM, ALDRICH) como agentes ativadores dos aminoácidos e Hexafluorofosfato Benzoitriazol-1- i1-oxi-tris-pirrolidino-fosfinio (PyBOP, NOVABIOCHEM) como agente acoplante, por um período de 30 minutos. Após cada ciclo de acoplamento foram realizadas cinco lavagens da resina com N-N-Dimetilformamida (DMF, SYNTH) e em seguida foi feita a desproteção utilizando Piperidina (FLUKA) 30% em DMF (Tabela 7). 43 TABELA 7: Etapas de cada ciclo da síntese de peptídeos. Etapas Reagentes No de Repetições Tempo Desproteção Piperidina/DMF (30:70) duas 4 minutos Lavagem da resina DMF cinco 45 segundos Ativação do aminoácido HOBt.H2O [0,5 mmol/DMF] uma 3 minutos Acoplamento 105 mg PyBOP/NMM 1mmol/DMF uma 30 minutos Lavagem da resina DMF cinco 45 segundos Todas as reações foram realizadas sob agitação mecânica em capela de segurança. Após a acoplagem do último resíduo de aminoácido, a resina foi lavada com metanol (MALLINCKRODT) e seca em liofilizador (HETO, modelo MLW – LGA 05). Após a secagem, foi feita a clivagem entre peptídeo/resina utilizando-se uma solução de ácido trifluoroacético (TFA) 82,5% (v/v) (MALLINCKRODT), Anisol 5% (v/v) (SIGMA), Etanoditiol 2,5% (v/v) (ALDRICH), Fenol 5% (m/v) e água ultrapurificada 5% (v/v), durante 2 horas sob agitação mecânica. Esta solução de TFA-Anisol-Etanoditiol-Fenol-Peptídeo foi filtrada para a retirada da resina e centrifugada em uma centrifuga refrigerada (EPPENDORF, modelo 5810R) por 15 minutos a 3000 rpm na presença de éter etílico (SYNTH) para promover a precipitação do peptídeo e uma primeira etapa de retirada dos solventes e subprodutos da síntese. O material sedimentado foi então re-suspendidoem água bidestilada (destilador MARCONI, modelo MA 078) e ultrapurificada (purificador NANOpure BARNSTEAD, modelo D4754) para então ser purificado atravéz de cromatografia líquida. O controle de qualidade foi feito em espectrômetro de massas ESI-MS e sequenciamento por Química Degradativa de Edman em um seqüenciador automático (SHIMADZU, modelo PPSQ-21A). O rendimento da síntese de cada peptídeo foi de aproximadamente 30 %. 4.2.4 Sequênciamento dos Peptídeos Sintéticos por Química Degradativa de Edman Os peptídeos sintetizados e purificados que apresentaram um único pico de massa molecular (m/z), em análises de espectrometria de massas, foram submetidos ao sequênciamento primário através da técnica de Química Degradativa de Edman para a confirmação das sequências primárias dos peptídeos. Foram colocadas amostras contendo 50-100 ug de peptídeo no seqüenciador. Estas análises foram realizados em um seqüenciador automático de fase gasosa PPSQ-21A (SHIMADZU), onde os resíduos de 44 aminoácidos ácidos foram identificados na forma de PTH-aminoácidos ácidos formados a partir de uma sequência de reações químicas. A reação de degradação de Edman ocorre no lado N-terminal da cadeia peptídica liberando um resíduo por ciclo reativo. Os resíduos (PTH-aminoácidos) foram identificados através de um sistema de cromatografia líquida de alto desempenho (HPLC) calibrado com padrões de PTH-aminoácidos (WAKO CHEM.), equipado com uma bomba modelo LC- 10AS (SHIMADZU) e um detector de luz ultravioleta modelo SPD-10A, acoplados ao próprio seqüenciador. O controle do sistema e aquisição dos dados foi realizado através do software PPSQ-20 Data Processing e CLASS LC-10A (SHIMADZU). 4.2.5 Redução e Carbamidometilação dos Resíduos de Cisteína A reação de redução consiste na diminuição do número de oxidação (NOX) de uma espécie química, ou seja, significa ganho de elétrons; enquanto que a de alquilação é a transferência de um grupo alquila de uma molécula para outra. Os resíduos de cisteína são muito reativos através de seus grupos tióis e rapidamente formam pontes dissulfeto. As reações de redução e carboximetilação ou carbamidometilação (RCM) são utilizadas para bloquear os resíduos de cisteína e prevenir que as pontes dissulfeto voltem a se formar. A reação é normalmente utilizada após as análises de sequenciamento de proteínas e peptídeos, suspeitos de apresentarem resíduos de cisteína em sua composição, tornando o seqüenciamento mais compreensível (Stark 1965; Lippincott e Apostol 1999). Proteínas e peptideos naturais podem apresentar em suas sequencias residuos de cisteína livres ou formando pontes dissulfeto. Nestes casos a redução e a RCM são indicadas para o sequenciamento e determinação da existência ou não, de pontes dissulfeto, que asseguram a estabilidade das estruturas secundária e/ou terciária, como mostra o esquema mostrado na figura 1 (Stark 1965, Lippincott e Apostol 1999). Para se realizar a reação de carboamidometilação, os peptídeos cíclicos foram fracionados e coletados como descrito anteriormente. Os peptídeos foram ressuspendidos em 100 µL de tampão bicarbonato de amônio 25 mM, pH 8,5 em uma concentração de 1 µg/µL. Uma solução de 50 mM de Ditiotreitol (DTT) (AMERSHAM BIOSCIENCE) foi preparada utilizando-se o mesmo tampão em que os peptídeos foram solubilizados. Uma alíquota de 25µL dessa solução de DTT foi adicionada à amostra. A solução resultante foi homogeneizada e mantida a 40°C por 30 minutos, e em seguida resfriada à temperatura ambiente. Apés esse procedimento, 25 µL de Iodoacetamida (IAA) 100 mM (AMERSHAM 45 BIOSCIENCE), também preparada em tampão bicarbonato de amônio, foi adicionada à mistura. A solução resultante foi deixada por uma hora em ambiente escuro à temperatura ambiente para que a reação de carbamidometilação pudesse ocorrer. FIGURA 1: Esquema mostrando o aumento de massa após cada evento de reação de redução e alquilaçao de uma molécula peptídica hipotética. 4.2.6 Acetilação dos Resíduos de Lisina Esta reação tem como função distinguir os resíduos isóbaros de Lys e Gln, sendo que o resíduo C-terminal com amina livre também sofre acetilação, reação esta, mostrada no esquema 1. Nesta reação, ocorre a introdução de um grupamento acetil em um composto orgânico, no lugar do hidrogênio. Para tanto, a amostra (1g/L) foi solubilizada em 5 mL Anidrido Acético (Merck Química Brasil, 98%), homogeneizada em vórtex e incubada por 45 minutos a 37º C sob leve agitação. Em seguida, analisou-se por ESI-MSn e MS2. O resultado da reação é o acréscimo de 42 unidades de massa a massa molecular do resíduo de Lys e/ou grupamento –NH2. 46 ESQUEMA 1: Esquema exemplificando as reações de acetilaçao da (A) lisina e (B) posição N-terminal de um aminoácido hipotético. 4.2.7 Modelagem Molecular por Homologia e Métodos de avaliação dos modelos estruturais Para a construção do modelo estrutural de cada um dos peptídeos identificados, utilizou-se a modelagem molecular por homologia, o qual é o principal método computacional utilizado para predizer estruturas terciárias de proteínas. Esta é uma técnica de desenvolvimento de modelos tridimensionais que parte de uma sequência primária conhecida de uma proteína cuja estrutura tridimensional ainda não foi determinada e, utiliza como molde uma ou mais sequências de proteínas cujas estruturas tridimensionais já foram resolvidas por técnicas experimentais e, que possuem alta similaridade com a proteína de interesse (Gibas et al., 2001). Consiste de quatro etapas principais (Sanchez et al 1997): 1) Busca e seleção do molde: consiste recebeu uma busca por proteínas que possuem suas estruturas tridimensionais resolvidas. Esta busca é realizada em bancos de dados de estruturas terciárias de proteínas, sendo que o principal deles é o Protein Data Bank (PDB - Berman, et al., 2000). 2) Alinhamento: depois de