VITOR FELIPE BATTAGLINI TOXOPLASMOSE CANINA: UMA REVISÃO Botucatu 2023 VITOR FELIPE BATTAGLINI TOXOPLASMOSE CANINA: UMA REVISÃO Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado à Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade “ Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Botucatu- SP, para obtenção grau de médico veterinário. Área de Concentração: Clínica Médica Orientadora: Profa. Dra. Maria Lucia G. Lourenço Coordenadora de Estágios : Profa. Dra. Luciane Dos Reis Mesquita Botucatu 2023 FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO TÉC. AQUIS. TRATAMENTO DA INFORM. DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - CÂMPUS DE BOTUCATU - UNESP BIBLIOTECÁRIA RESPONSÁVEL: MARIA CAROLINA A. CRUZ E SANTOS-CRB 8/10188 Battaglini, Vitor Felipe. Toxoplasmose canina : uma revisão / Vitor Felipe Battaglini. - Botucatu, 2023 Trabalho de conclusão de curso (bacharelado - Medicina Veterinária) - Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia Orientador: Maria Lúcia Gomes Lourenço Capes: 50501003 1. Cães. 2. Prevenção. 3. Sinais e Sintomas. 4. Toxoplasma gondii. 5. Toxoplasmose em animais. Palavras-chave: Cães; Prevenção; Sinais clínicos; Toxoplasma gondii; Toxoplasmose Canina. BATTAGLINI, VITOR. Toxoplasmose canina: Uma Revisão. Botucatu, 2023. 20p. Trabalho de Conclusão de Curso de graduação (Área de Concentração: Clínica Médica) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Universidade“ Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Botucatu- SP RESUMO A toxoplasmose é uma doença parasitária causada pelo protozoário Toxoplasma gondii altamente frequente em nosso meio que pode afetar cães e outros animais homeotérmicos. A formação de oocistos ocorre somente nos felídeos, seus hospedeiros definitivos. Embora os cães sejam hospedeiros intermediários, eles desempenham um papel importante na disseminação do parasita e são considerados animais sentinelas para estudos epidemiológicos. A infecção ocorre principalmente pela ingestão de carne crua ou mal cozida contendo cistos do parasita ou pela ingestão de oocistos, presentes na água e alimentos. Além disso, há transmissão congênita. Nos cães, geralmente, a doença apresenta sinais subclínicos, e em alguns casos pode apresentar sinais inespecíficos tais como: febre, anorexia e dispneia, ou sinais mais específicos com envolvimento neural, respiratório ou ocular. Os sinais clínicos variam de acordo com a virulência da cepa, da dose infectante e da qualidade da resposta imunitária do indivíduo infectado, sendo também considerada uma doença oportunista e zoonótica. Testes sorológicos para detectar anticorpos específicos são comuns, podendo-se complementar com a detecção direta do parasita por meio de biópsias de órgãos ou análises moleculares. O tratamento da toxoplasmose em cães envolve medicamentos antiprotozoários, como a pirimetamina e a sulfadiazina. O tratamento é mais eficaz quando a doença é diagnosticada precocemente, mas a cura completa nem sempre é obtida. A prevenção da toxoplasmose canina é baseada em medidas para se evitar a exposição ao T. gondii. Palavras-chave: Toxoplasmose Canina, Toxoplasma gondii, cães , Sinais clínicos, Prevenção. BATTAGLINI, VITOR . Canine toxoplasmosis: A review. Botucatu, 2023. 20p. Completion of course work (Area of Cincarceration: Medical Clinic) - Faculty of Veterinary Medicine and Animal Science of the “Júlio de Mesquita Filho” University, Campus of Botucatu- SP ABSTRACT Toxoplasmosis is a parasitic disease caused by the protozoan Toxoplasma gondii, which is highly prevalent in our environment and can affect dogs and other homeothermic animals. The formation of oocysts occurs only in felids, its definitive hosts. Although dogs are intermediate hosts, they play an important role in the spread of the parasite and are considered sentinel animals for epidemiological studies. Infection occurs mainly through the ingestion of raw or undercooked meat containing cysts of the parasite or through the ingestion of oocysts present in water and food. There is also congenital transmission. In dogs, the disease usually presents subclinical signs, and in some cases it can present non-specific signs such as fever, anorexia and dyspnea, or more specific signs with neural, respiratory or ocular involvement. The clinical signs vary according to the virulence of the strain, the infecting dose and the quality of the immune response of the infected individual, and it is also considered an opportunistic and zoonotic disease. Serological tests to detect specific antibodies are common, and can be complemented by direct detection of the parasite using organ biopsies or molecular analysis. Treatment of toxoplasmosis in dogs involves antiprotozoal drugs such as pyrimethamine and sulfadiazine. Treatment is more effective when the disease is diagnosed early, but a complete cure is not always achieved. Prevention of to canine toxoplasmosis is based on measures to avoid exposure to T. gondii. Keywords: Canine Toxoplasmosis, Toxoplasma gondii, dogs, Clinical Signs, Prevention. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO…………………………………………………. 7 2 REVISÃO DE LITERATURA…………………………………. 9 2.1 CICLO BIOLÓGICO .………………………………………….. 9 2.2 EPIDEMIOLOGIA…………………………………………….. 11 2.3 PATOGENIA E SINAIS CLÍNICOS…………………………... 12 2.4 DIAGNÓSTICO…………………………………………………. 14 2.5 TRATAMENTO………………………………………………… 15 2.6 PREVENÇÃO E CONTROLE…………………………………. 16 3 CONCLUSÃO…………………………………………………... 16 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS…………………………. 17 7 1 INTRODUÇÃO A toxoplasmose é uma doença parasitária e com potencial zoonótico, amplamente disseminada pelo mundo. É causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, que infecta os animais homeotérmicos, tendo os felídeos como seus hospedeiros definitivos, e demais mamíferos como hospedeiros intermediários, incluindo-se as aves e os humanos. Neste contexto os felídeos também podem se comportar como hospedeiros intermediários (GENNARI & CALERO-BERNAL, 2019). O T. gondii se apresenta sob duas formas evolutivas, os taquizoítos, que geralmente ocorrem na infecção aguda, de multiplicação rápida nas células do hospedeiro, sendo responsáveis pela infecção transplacentária. Os bradizoítos, que se multiplicam de forma mais lenta, e que como mecanismo de defesa, desenvolvem cápsulas de tecido fibrelástico, protegidos na forma de cistos teciduais, da ação dos anticorpos, indicando a fase crônica da infecção. Já a formação de oocistos, ocorre somente nos hospedeiros definitivos (MILLER;FRENKEL;DUBEY, 1972), os felídeos, devido a reprodução sexuada no trato gastrointestinal. Estes oocistos são eliminados pelas fezes e no meio ambiente ocorre a esporulação, tornado-os infectantes (OLIVEIRA et al., 2009). A transmissão pode ocorrer nas três formas: ingestão de oocistos, presentes na água e alimentos, incluindo-se os hortifrutigranjeiros; a partir do consumo de carnes cruas ou mal cozidas, contendo os cistos teciduais, e ainda, a transmissão transplacentária, sendo este o maior problema de saúde pública relacionado a toxoplasmose humana, por ocasionar lesões em variados graus de severidade, podendo até ser fatal (VERONESI; FOCACCIA,2021). A redução da resposta imunológica aumenta a vulnerabilidade do organismo à disseminação do T. gondii, devido à sua natureza oportunista como parasita. De maneira análoga, a ocorrência da toxoplasmose está frequentemente associada a condições de saúde que comprometem o sistema imunológico, tais como a 8 ehrlichiose e a cinomose nos cães (MORETTI et al ., 2002) ou em pacientes com HIV / AIDS que não estão em profilaxia adequada, tornando a infecção mais comum do sistema nervoso central (SNC) (AYOADE;CHANDRANESAN, 2020). Os cães contribuem na disseminação mecânica de oocistos, pelo hábito de rolar na areia, que podem ter oocistos esporulados do agente, carreando-os no pelame, podendo servir como fontes de infeção principalmente para humanos. Além desse aspecto são considerados como animais sentinelas, uma vez que frequentam o mesmo ambiente e estão expostos a risco de infecções similares ao do ser humano. A soropositividade ao T .gondii em cães é relativamente alta em nosso país variando de acordo com a região, é possível observar nos diferentes estudos, resultados diferentes quanto aos títulos de anticorpos, encontrando-se em algumas situações animais com títulos elevados de anticorpos da classe IgG anti- toxoplasma, que é a imunoglobulina pesquisada com maior frequência, já que indica resposta a uma infecção crônica (ROBERT-GANGNEUX;GUEGAN, 2021). . Por ser uma doença, geralmente, de baixa patogenicidade com sinais sub- clínicos ou específicos e sem alterações bioquímicas e hematológicas características, seu diagnóstico é frequentemente negligenciado ou não reconhecido pelos clínicos contribuindo ainda mais para a ausência de respostas (BATISTA, 2022 ;LEAL & COELHO,2014). Esta revisão tem como foco a toxoplasmose em cães, concentrando-se na propagação da doença, em seus sinais clínicos, além de explorar abordagens diagnósticas, opções terapêuticas, métodos preventivos e estratégias de controle para essa enfermidade. O objetivo é garantir que a toxoplasmose seja devidamente considerada no diagnóstico diferencial, evitando que escape à atenção do raciocínio clínico. 9 2 REVISÃO DE LITERATURA T. gondii foi identificado pela primeira vez em 1908 por Splendore na cidade de São Paulo e no mesmo ano, os pesquisadores Nicolle e Manceaux, do Instituto Pasteur de Tunis, descobriram o parasito em um roedor africano usado nas pesquisas de Leishmaniose, o Ctenodactylus gondi. Em 1909 foi denominado Toxoplasma gondii em função do seu formato em arco (do grego, toxon: arco; plasma: forma) e em homenagem ao roedor no qual foi encontrado. Seu ciclo só foi complemento elucidado na década de 70, já a toxoplasmose canina foi descrita pela primeira vez, na Itália, por Mello (1910). Desde então, a toxoplasmose clínica e subclínica tem sido descrita nesta espécie animal. Atualmente estima-se que 70 a 95% da população humana tenha entrado em contato com o agente (SILVA; SILVA, 2016), tendo os cães importante papel na transmissão para o homem. 2.1 CICLO BIOLÓGICO O ciclo de vida do T. gondii é classificado como heteroxeno facultativo, compreendendo duas etapas distintas: a fase enteroepitelial e a extra-intestinal. A etapa enteroepitelial ocorre exclusivamente em felídeos, que são hospedeiros definitivos. Nesses animais, a reprodução sexuada ocorre nos enterócitos, resultando na formação de gametas masculinos e femininos. Após a fusão desses gametas, são gerados zigotos que, subsequentemente, desenvolvem-se em oocistos, os quais são eliminados no meio ambiente por meio das fezes. Durante um período que varia de sete a 21 dias (BÓBIC et al.,1996), quantidades significativa de oocistos não esporulados são liberados. Nos ambientes, sob condições ideais de temperatura e umidade, os oocistos passam pelo processo de esporulação, formando dois esporocistos, cada um contendo quatro esporozoítos, estes infecciosos. Esse processo de esporulação pode ocorrer em um intervalo de um a 21 dias (DUBEY, 1993). Os oocistos esporulados possuem uma notável 10 resistência podendo permanecer viáveis por até 18 meses em condições ambientais adversas, além de demonstrarem resistência à maioria dos desinfetantes rotineiramente utilizados. A fase extra-intestinal do ciclo ocorre em hospedeiros homeotérmicos. Nessa etapa, ocorre a multiplicação assexuada do parasita, resultando em duas formas evolutivas distintas do T. gondii: os taquizoítos e os bradizoítos, os quais são associados, respectivamente, às fases aguda e crônica da infecção (SILVA; SILVA, 2016). O taquizoíto é o método de multiplicação rápida do parasita. Ele penetra ativamente em qualquer célula com núcleo e se reproduz por endodiogenia no interior do recém-formado vacúolo parasitóforo. A célula hospedeira fica repleta de taquizoítos e acaba se rompendo, liberando-os no espaço extracelular, onde, uma vez libertos, invadem novas células. Podem ser encontrados em vários fluidos corporais, como sangue, urina, saliva, leite e líquido cefalorraquidiano (BATISTA, 2022) e é nessa fase que os sintomas clínicos se tornam evidentes (LAPPIN, 2023). Após a resposta do sistema imunológico do hospedeiro contra os taquizoítos, os parasitas passam a se multiplicar de maneira mais lenta e, como mecanismo de defesa, desenvolvem uma cápsula de tecido fibroelástico, transformando-se em bradizoítos. Esse processo indica a fase crônica da infecção devido à ação dos anticorpos. Os cistos formados pelos bradizoítos não causam danos significativos e são encontrados principalmente nos músculos cardíacos e esqueléticos, tecido nervoso e retina (AZEVEDO, 2017). A imunidade do hospedeiro, a espécie do hospedeiro e a virulência do T. gondii são fatores que influenciam a localização, disseminação e duração das formas císticas dentro do corpo do hospedeiro. Os cistos são eliminados em temperaturas de 58°C por 10 minutos, 61°C por 4 minutos ou em temperaturas mais elevadas. A -13°C, se degradam rapidamente, enquanto podem permanecer viáveis por mais de três semanas a -3°C, como observado por Dubey (1996). Em casos de imunossupressão causada por medicamentos ou doenças que levam à imunodeficiência, pode ocorrer uma reativação da infecção. Nesses cenários, os 11 bradizoítos ativos dentro dos cistos se transformam novamente em taquizoítos, reiniciando o ciclo (VIDOTTO et al .,2023). Há também possibilidade de transmissão de taquizoítos na transfusão de sangue, nos transplantes de tecidos, nos espermatozoides e no leite não pasteurizado. Moscas e baratas são vetores eficientes para animais domésticos atuando na transmissão mecânica de oocistos (DUBEY & LAPPIN, 2015). 2.2 EPIDEMIOLOGIA Os cães podem atuar como vetores mecânicos de oocistos, pelo hábito da xenosmofilia, o fato de rolar na areia pode trazer oocistos esporulados do agente, carreando-os no pelame, servindo como fontes de infeção principalmente para humanos, e especificamente para crianças, pelo hábito de abraçar esses animais (ETHEREDGE et al.,2004; SCHARES et al., 2005). Além desse aspecto são considerados como animais sentinelas, uma vez que frequentam o mesmo ambiente e estão expostos riscos de infecção similares ao do ser humano. Desta forma é possível prever a dispersão do agente em diferentes locais, considerando- se esta espécie importante em estudos soroepidemiológicos (ULLMANN et al.,2008; CUNHA et al., 2016). A soropositividade ao T .gondii em cães é relativamente alta em nosso país, variando entre 20,8% (ROMANELLI et al., 2007) até 76,4% (CAÑÓN-FRANCO et al., 2004) de acordo com a região, verificou-se cães soropositivos até em comunidades afastadas como os quilombolas (PANAZZOLA et al ., 2023) e as indígenas (DOLINE et al., 2023). Existem alguns fatores de risco, que contribuem para as taxas de infeção, são eles: a idade, o acesso dos animais à rua, cães alimentados com carne crua ou em constante contato com pequenos animais, tais como aves ou roedores (SILVA et al.,2010; LANGONI et al.,2013). 12 2.3 PATOGENIA E SINAIS CLÍNICOS Após a ingestão de oocistos esporulados sua parede de tecido é dissolvido por enzimas digestivas no estômago e do intestino delgado, liberando os esporozoítos, que invadem as células epiteliais do intestino delgado e, provocando forte resposta inflamatória com infiltrado de neutrófilos, macrófagos, células dendríticas e linfócitos. Nesta fase precoce, os neutrófilos são essenciais, assim como os linfócitos natural killers (NK) (VIDOTTO et al .,2023). A infecção a partir do intestino dissemina-se por vias hematógena e linfática para outros órgãos e tecidos. Os principais locais afetados são: fígado, coração, pulmão, cérebro, retina e placenta-feto. Após a adesão do parasito na membrana celular ocorre a liberação ordenada das proteínas das organelas apicais do parasito, que facilitarão a invasão da célula com a formação de um vacúolo parasitóforo, o qual não se une ao lisossomo, possibilitando sua multiplicação no interior desse vacúolo (CARVALHO & MELO, 2006). As secreções das três organelas do complexo apical são ordenadas em um processo sequencial, ocorrendo primeiro a liberação dos conteúdos das micronemas e roptrias, e, posteriormente, dos grânulos densos. Acredita-se que os micronemas sejam importantes no processo de adesão do parasito à membrana celular, as roptrias descarregam suas proteínas, que estão associadas à formação do vacúolo parasitóforo, e, por último, ocorrem as secreções dos grânulos densos, as quais estão relacionadas com a sobrevivência intracelular do parasito. A capacidade de sobrevivência do hospedeiro está relacionada com a habilidade da indução de forte imunidade mediada por células T. Tanto as células CD4+ Th1 quanto as células CD8+ citotóxicas são fundamentais neste processo (ROBERTS et al., 2007), pois elas produzem interferon gama (IFN-γ), citocina mediadora da resistência ao T. gondii. A IFN-γ induz a liberação de óxido nítrico e a modificação do pH; estes fatores são importantes indutores da transformação de taquizoíto para bradizoíto e para a 13 consequente inibição da replicação do parasito. Enquanto o desenvolvimento de resposta imune humoral é importante para eliminar os parasitos encontrados fora das células. Nos hospedeiros saudáveis as infecções adquiridas em geral são assintomáticas, autolimitantes e persistem por uma a 12 semanas (DUBEY & LAPPIN, 2015). Na maioria das ocorrências, a toxoplasmose em cães saudáveis é autolimitante devido à eficácia do sistema imunológico. Ocasionando sinais leves e inespecíficos como dispneia, anemia, anorexia, ataxia e diarreia. No entanto, o T. gondii é um agente oportunista bem conhecido e frequentemente se associa a condições de imunossupressão, seja por doenças ou uso de medicamentos. Doenças notáveis incluem erliquiose, cinomose, leishmaniose visceral e patologias que induzem estresse, como a displasia coxo-femoral (AHMED et al., 1983; SAKAMOTO et al., 2013). A imunossupressão, muitas vezes desencadeada por quimioterapia, pode resultar em infecções clínicas por T. gondii, com ocorrência de manifestações cutâneas, o mesmo ocorre com o uso de corticoides (OLIVEIRA et al., 2014). Em cães com menos de um ano, a doença pode ser mais grave devido ao sistema imunológico menos ativo ou deficiente. Durante a gestação, os taquizoítos pode levar à parasitemia, causando placentite e disseminando-se para o feto, resultando em lesões graves, como aborto, morte fetal e animais natimortos (BRESCIANI,2009). O protozoário se dissemina pelo corpo, levando a necrose focal em diversos órgãos. No pulmão, isso pode resultar em pneumonia. Como sinais neurológicos, destacam-se a ataxia, convulsões, tremores, déficits dos nervos cranianos, paresia e paralisia. Lesões musculares podem causar miosite e até insuficiência cardíaca devido ao envolvimento miocárdico (LAPPIN, 2023). Além disso, lesões oculares podem abranger uveíte anterior, iridociclite, hiperplasia do epitélio ciliar, retinite, coroidite, miosite extra-ocular, esclerite e neurite óptica (ABREU et al., 2002). Danos em linfonodos e baço podem levar a imunossupressão. As lesões hepáticas, associadas aos órgãos linfoides, podem resultar em hipoproteinemia, 14 hipoglobulinemia, aumento das enzimas séricas como alanina aminotransferase (ALT) e fosfatase alcalina (FA), elevação dos níveis de bilirrubina, icterícia e efusão peritoneal. As alterações hematológicas são inespecíficas, podendo incluir anemia regenerativa, leucocitose com neutrofilia, linfocitose, monocitose e eosinofilia (LEAL & COELHO, 2014) , 2.4 DIAGNÓSTICO O diagnóstico laboratorial da toxoplasmose adquire grande importância na medida em que a doença pode se manifestar sob as mais variadas formas e situações, com quadros clínicos que facilmente podem ser confundidos com outras doenças infecciosas, destaca-se como diagnóstico diferencial, a neosporose, principalmente nos pacientes que apresentam distúrbios respiratórios, neuromusculares e gastrintestinais (MINEO et al. 2001; PLUGGE et al. 2011). Quando se trata de métodos diagnósticos práticos, simples e economicamente viáveis, é importante destacar que a reação de imunofluorescência indireta (RIFI) é a abordagem sorológica mais amplamente empregada para o diagnóstico. No entanto, existem também outras opções, tais como: aglutinação modificada, ELISA e aglutinação direta (MAD). Uma elevação do título de quatro a oito vezes, observada em amostras de soro coletadas com intervalo de 15 a 21 dias no teste de imunofluorescência indireta, é indicativo de infecção ativa (SILVA; SILVA, 2016). O exame histopatológico (HI) para diagnóstico da toxoplasmose deve estar associado a outros testes. As amostras podem ser processadas histologicamente com hematoxilina e eosina, ácido periódico de Schiff, imunofluorescência indireta ou, imuno-histoquímica. O bioensaio é uma ferramenta valiosa para a detecção do parasito (ABREU et al.,2002), especialmente quando complementado por métodos sorológicos. Tanto o bioensaio quanto o diagnóstico histopatológico são frequentemente empregados para confirmar casos de toxoplasmose em situações de mortes, natimortos, abortos e monitoramento de experimentos com animais. 15 O diagnóstico por PCR para a toxoplasmose ainda apresenta desafios relacionados à sensibilidade e especificidade, incluindo a sequência alvo no DNA do parasito, os pares de iniciadores de amplificação utilizados, as condições de armazenamento das amostras e dos reagentes, bem como a possível interferência de medicamentos anti- T. gondii. Um resultado negativo na PCR não descarta necessariamente a infecção, destacando a importância de complementar com outros métodos diagnósticos, especialmente sorologia (VIDOTTO et al ., 2023). 2.5 TRATAMENTO A sulfonamida, sulfametoxazol, pirimetamina, clindamicina e azitromicina são os quimioterápicos frequentemente empregados no tratamento das toxoplasmoses canina. Sendo a clindamicina: na dose de 40 mg/kg, VO, a cada 12 horas, 10 a 14 dias o fármaco de escolha. Importante notar que, em grande parte, esses medicamentos são administrados em doses próximas às tóxicas para assegurar sua eficácia durante a fase aguda da infecção, já que não são capazes de eliminar os cistos teciduais. Dentre as opções de combinação, é comum a associação de sulfonamidas com trimetoprim, com esperada melhora clínica em alguns dias. A seguir, são apresentadas algumas das combinações possíveis (VIDOTTO et al ., 2023). Trimetoprima + sulfadiazina, 15 mg/kg, via oral, de 12 em 12 h, 28 dias Sulfadiazina (30 a 60 mg/kg) + pirimetamina (0,5 a 1 mg/kg) em 24 h Trimetoprima + sulfametoxazol, 15 mg/kg, via oral, de 12 em 12 h Sulfonamidas (30 mg/kg) + pirimetamina (0,25 a 0,5 mg/kg), via oral, de 12 em 12 h, 28 dias Azitromicina (10 mg/kg) + pirimetamina (0,5 a 1 mg/kg), via oral, em 24 h Ácido folínico: 0,5 a 5 mg/kg/dia, via oral, até 15 mg/dia (até completar tratamento). Sendo empregado para prevenção das complicações hematológicas ocasionadas pelo tratamento com pirimetamina. 16 O uso de azitromicina 10-12,5mg/kg a cada 24 h com atovaquone 13,3mg/kg a cada oito horas durante 10 dias, reduziu significativamente o número de cistos após a doença aguda, assim como o número de cistos em doença crônica (GORMLEY et al ., 1998) É imprescindível, caso o animal necessite, o tratamento suporte como a reposição do equilíbrio hidroeletrolítico e energético, oxigenioterapia, entre outros. 2.6 PREVENÇÃO E CONTROLE As medidas de prevenção e controle envolvem ações básicas, porém extremamente efetivas, destacam-se: disponibilizar somente carne cozida ou alimentos processados, evitar a coprofagia, um constante controle de roedores e de hospedeiros paratênicos como baratas ou moscas, manter instalações apropriadas e promover a educação sanitária, regulamentar a reprodução de animais errantes, evitar o contato com solo ou areia possivelmente contaminados por fezes de felinos e, no caso de coexistência com gatos, garantir que esses animais permaneçam dentro de casa, com higienização diária da caixa de areia. Além de um rápido diagnóstico e tratamento do paciente (BRESCIANI, 2008 ; LAPPIN, 2023). 3 CONCLUSÃO Por ser um parasita extremamente presente no nosso meio e por muitas vezes negligenciado, torna-se necessário sempre incluir toxoplasmose no diagnóstico diferencial e alertar a população sobre seus riscos e de como evitá-la. Lembrando que o T. gondii pode infectar qualquer célula nucleada do corpo, o que lhe proporciona uma ampla camada de sinais clínicos e que em associação com outras doenças, como cinomose, seu diagnóstico e seu tratamento tornam-se ainda mais essenciais, visto que há elevada letalidade na presença simultânea destes dois agentes em cães. 17 4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS -ABREU, C. B et al. Toxoplasmose ocular em cães jovens inoculados com Toxoplasma gondii. Ciência Rural, Santa Maria, v.32, n.5, p.807-812, 2002. -AHMED BA et al. Relationship of Toxoplasma infections to other diseases. Veterinary Parasitology, 12, p199-203, 1983. -AYOADE, F.; JOEL CHANDRANESAN, A. S. 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