Jessica Akemi Seto Trabalho de Conclusão de Curso ARAÇATUBA Novembro de 2016 ii Jessica Akemi Seto Trabalho de Conclusão de Curso Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Medicina Veterinária apresentado à Faculdade de Medicina Veterinária, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, câmpus de Araçatuba, para obtenção do grau de Médico Veterinário. Orientador: Prof.˚ Ass. Dr. Paulo Sérgio Patto dos Santos ARAÇATUBA Novembro de 2016 iii ENCAMINHAMENTO Encaminhamos o presente Trabalho de Conclusão de Curso, para que a Comissão de Estágios tome as providências cabíveis. ____________________________________ Jessica Akemi Seto Estagiária ____________________________________ Prof.˚ Ass. Dr. Paulo Sérgio Patto dos Santos Supervisor ARAÇATUBA Novembro de 2016 SUMÁRIO – RELATÓRIO DE ESTÁGIO CURRICULAR iv 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 1 1.1 HOSPITAL VETERINÁRIO ANHEMBI MORUMBI ...................................... 1 1.2 HOSPITAL VETERINÁRIO PÚBLICO ......................................................... 4 2. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS ....................................... 8 2.1 TABELA 01. CASOS CLÍNICOS HOSPITAL ANHEMBI MORUMBI ........... 8 2.2 TABELA 02. CASOS CLÍNICOS HOSPITAL PÚBLICO ............................ 10 3. RELATO DE CASOS CLÍNICOS ..................................................................... 13 3.1 CASO CLÍNICO 1 ...................................................................................... 13 3.2 CASO CLÍNICO 2 ...................................................................................... 21 3.3 CADO CLÍNICO 3 ...................................................................................... 29 3.4 CASO CLÍNICO 4 ...................................................................................... 36 3.5 CASO CLÍNICO 5 ...................................................................................... 43 4. RECOMENDAÇÕES E CONCLUSÃO ............................................................ 48 SUMÁRIO – TRABALHO CIENTÍFICO 5. RESUMO ......................................................................................................... 51 6. INTRODUÇÃO ................................................................................................ 52 6.1 ESTENOSE PULMONAR .......................................................................... 52 6.2 VALVULOPLASTIA POR BALÃO .............................................................. 54 6.3 VALVULOPLASTIA POR PATCH-GRAFT ................................................ 55 7. MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................... 57 8. RESULTADOS E DISCUSSÃO ....................................................................... 58 9. CONCLUSÃO .................................................................................................. 64 10. REFERÊNCIAS ............................................................................................... 66 v Relatório de Estágio Curricular Obrigatório Estagiária: Jessica Akemi Seto Orientador: Prof.˚ Ass. Dr. Paulo Sérgio Patto dos Santos ARAÇATUBA Novembro de 2016 vi LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ALT – alanina aminotransferase ANCLIVEPA – Associação de Clínicos Veterinários de Pequenos Animais ANR – até novas recomendações AST - aspartato transaminase BID – a cada 12 horas bpm – batimentos por minuto C.H.C.M – Concentração de Hemoglobina Corpuscular Média cm – centímetro CTM – cirurgia de tecidos moles DPS – desvio portossistêmico DV – dorsoventral EH – encefalopatia hepática EIC – espaço intercostal FA – fosfatase alcalina FC – frequência cardíaca FR – frequência respiratória g/dl – gramas por decilitro GGT – gamaglutamiltransferase H.C.M – Hemoglobina Corpuscular Média HV – hospital veterinário ICC – insuficiência cárdica congestiva Kg – quilograma L – litro LLD – laterolateral direita LLE – laterolateral esquerda mEq/l – milequivalente por litro mg/kg – miligrama por quilograma ml – mililitro mmHg – milímetro de mercúrio mm3 – milímetro cúbico MPA – medicação pré-anestésica mpm – movimentos por minuto vii PDA – persistências do ducto arterioso pg - picograma pH – potencial hidrogeniônico SID – a cada 24 horas TFG – taxa de filtração glomerular TID – a cada 8 horas TPC – tempo de preenchimento capilar UAM – Universidade Anhembi Morumbi U.I/l – unidade internacional por litro UTI – Unidade de Terapia Intensiva V.C.M – Volume Corpuscular Média VD – Ventro dorsal ˚C – grau Celsius µmol/l – micromoles por litro % - porcentagem 1 1. INTRODUÇÃO O curso de Medicina Veterinária oferece amplo conhecimento prático e teórico nas diversas disciplinas ao longo da graduação, sendo de extrema relevância para que desenvolvamos raciocínio crítico e clínico na tomada de decisões, e assim possamos chegar à um correto diagnóstico e tratá-los da forma mais eficaz possível. Com isso, o objetivo do estágio curricular é de conhecer a rotina dos diferentes hospitais, desenvolver aptidão, assim como aprimorar o raciocínio lógico e rápido, além de melhorar a comunicação em um ambiente de trabalho como também com os tutores. 1.1 HOSPITAL VETERINÁRIO ANHEMBI MORUMBI O Hospital Veterinário (HV) da Universidade Anhembi Morumbi inaugurado em setembro de 2002, localiza-se na cidade de São Paulo, SP (Figura 1A). O HV concede atendimento para animais de pequeno porte, grande porte e animais silvestres, sendo uma fonte de grande aprendizado prático para graduandos, residentes, pós-graduandos como também para professores e veterinários contratados. Os serviços de especialidades oferecidos nas áreas de cardiologia, odontologia, oncologia, ortopedia, neurologia, dermatologia e fisioterapia são atendidos por professores especializados da Universidade Anhembi Morumbi (UAM) onde geralmente são encaminhados pelos residentes do próprio hospital ou por outras clínicas e/ou hospitais da cidade. O hospital também conta com os setores de clínica médica, clínica cirúrgica, laboratório de patologia clínica onde são realizados exames de sangue (hemograma, bioquímico e eletrólitos), exames parasitológicos, citologia, avaliação de líquor, análise de cálculos, testes sorológicos e entre outros, e o setor de diagnóstico por imagem equipados com aparelho de radiografia digital, ultrassonografia, ecodopplercardiografia e eletrocardiografia. O HV integra uma equipe composta por docentes, alunos, pós-graduandos, residentes, veterinários contratados, técnicos veterinários, psicólogos e enfermeiros. O atendimento acontece das 8 às 21 horas de segunda à sexta-feira, sendo que a triagem encerra-se às 18 horas. O HV possui uma ampla área para a recepção dos animais (Figura 1B) interligada à uma sala de triagem. Todos os animais são atendidos por meio de senha, passando primeiramente pela triagem onde o residente realiza a primeira avaliação do animal, sendo posteriormente encaminhado para o interior do HV no setor correspondente à afecção (clínica ou 2 cirurgia de pequenos animais), onde os alunos realizam a segunda avaliação sendo supervisionados pelos residentes ou docentes. Os retornos com hora marcada são atendidos preferencialmente, os casos novos e os que não possuem hora marcada são identificados como encaixe, onde são atendidos sucessivamente. O hospital é composto por seis consultórios (Figura 1C), onde são atendidos animais dos setores de clínica médica e cirúrgica, uma ala ampla para atendimentos emergenciais e consultas (Figura 1D), uma sala destinada aos felinos, uma sala para pacientes oncológicos (Figura 1E), uma farmácia, uma sala para doação de sangue e uma sala de enfermagem, onde são realizadas receitas, avaliação de swab otológico e/ou raspado de pele através do microscópio óptico e acesso aos resultados de exames por meio de um sistema computadorizado com acesso restrito por meio de senha, o qual obtive acesso. O setor de clínica cirúrgica de pequenos animais conta com três residentes atendendo de segunda à sexta-feira, e um veterinário contratado onde realiza atendimento todas às terças-feiras, os demais dias este auxilia nas cirurgias. Animais que necessitam de alguma intervenção cirúrgica, são encaminhados para uma sala destinada ao preparo destes (Figura 1F), onde é realizada pelos anestesistas ou estagiários o exame físico geral, tricotomia da região que será operada, MPA e cateterização venosa. Para a recuperação anestésica, os animais são encaminhados para a UTI (Figura 1G) onde são monitorados pelos enfermeiros até a sua alta. O centro cirúrgico possui três salas (Figura 1H), uma para procedimentos odontológicos, outra para cirurgias ortopédicas e a última para cirurgias em tecidos moles. Os procedimentos cirúrgicos são realizados pelos residentes, e quando necessário, auxiliados pelos professores e/ou veterinários contratados para procedimentos mais laboriosos. As cirurgias são acompanhadas pelos alunos que possuem a oportunidade de auxiliá-las. No atendimento, o animal é encaminhado para a sala de consulta onde o aluno realiza a anamnese completa, exame físico geral e específico e em seguida, o caso é discutido com o residente ou docente responsável pelo atendimento, sobre os principais achados na anamnese, exame físico, prováveis diagnósticos e conduta diagnóstica. A partir disso, o aluno informa ao tutor o que foi discutido e o procedimento que será feito com o animal. Os materiais necessários para a coleta de exames complementares e limpeza de feridas são retirados na farmácia do hospital, os materiais coletados (sangue, urina, líquor, citologia, entre outros) são 3 encaminhados para o laboratório de patologia clínica do hospital, localizado no segundo andar. Os resultados de exames de sangue são enviados para o sistema do hospital no mesmo dia da requisição, demais exames possuem prazo de sete dias, porém exames de histopatologia e imunohistoquímica são enviados para laboratórios externos com prazo de 15 a 20 dias para a aquisição dos mesmos. Exames de radiografia e ultrassonografia fast podem ser realizados no mesmo dia, no entanto, exames de ultrassonografia, ecodopplercardiograma e eletrocardiograma devem ser agendados. Ao final da consulta, é informado ao tutor a conduta terapêutica a ser seguida e agendado o retorno para a reavaliação do animal ou para a cirurgia, caso esta seja necessária. Toda anamnese, exames complementares, pedidos, resultados, tratamento, diagnóstico e retorno devem ser anotados no prontuário do animal pelo aluno, sendo verificadas posteriormente pelo residente. A B C D E F 4 Figura 1. (A) Entrada do Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi. (B) Recepção do HV. (C) Consultório do HV. (D) Ala de fluidoterapia e mesas para consultas do HV. (E) Sala de oncologia. (F) Sala de preparo do animal para a cirurgia. (G) Unidade de terapia intensiva do HV. (H) Centro cirúrgico do HV (Arquivo pessoal, 2016). O objetivo de adquirir novos conhecimentos teórico e prático, aprimorar as habilidades hospitalares, e poder acompanhar diversas técnicas cirúrgicas novas, foram alcançadas. O estágio foi de grande proveito, pois contava com excelentes profissionais no qual se dedicavam a repassar seus conhecimentos a diante. 1.2 HOSPITAL VETERINÁRIO PÚBLICO ZONA LESTE – ANCLIVEPA O Hospital Veterinário Público é um convênio da prefeitura do Município de São Paulo com a ANCLIVEPA, sendo o primeiro hospital do Brasil a ser custeado totalmente pela prefeitura. A primeira unidade foi inaugurada na zona leste, em julho G H E F 5 de 2012. O HV destina-se atender exclusivamente aos munícipes da Cidade de São Paulo e, prioritariamente, àqueles assistidos por programas sociais, tais como: renda mínima, bolsa família, renda cidadã ou outro programa equivalente. Tutores que não estão inscritos em nenhum programa social mas que não possuem condições de pagar por uma consulta particular, passam por uma entrevista realizada pelos assistentes sociais que decidirão se há legítima necessidade de usufruírem do serviço. Devido à grande demanda, o atendimento tem prioridade para animais em situações de emergência e urgência e as vagas para cirurgias são limitadas, havendo em média 15 animais operados por dia, sendo assim, a grande maioria dos animais são encaminhados para outras clínicas que possuem convênio com o hospital. O HV conta com uma equipe de médicos veterinários, aprimorandos, pós- graduandos, estagiários, técnicos, enfermeiras e assistentes sociais. Os serviços de especialidades oferecidos são: cirurgias ortopédicas, cirurgias de tecidos moles, oftalmologia, clínica médica, endocrinologia, dermatologia, neurologia, cardiologia, oncologia e infecciosas. O hospital também possui um setor de diagnóstico por imagem, com aparelho de ultrassonografia portátil e radiografia digitalizada. Além disso, o hospital oferece serviços de internação e terapia intensiva. O atendimento inicia-se às seis horas e encerra até todos os animais serem atendidos, a triagem termina às dezesseis horas. Aos sábados o atendimento é exclusivo para casos de emergências, com início às sete horas e término ao meio dia. O setor de atendimento veterinário é composto por uma recepção (Figura 2A), dez consultórios (Figura 2B), uma sala de terapia intensiva, uma sala para emergências, uma sala de radiologia, uma para ultrassonografia, um depósito para os medicamentos e uma ala para procedimentos de enfermagem, como: limpeza de feridas, curativos/bandagens, acesso venoso e coleta de sangue. A ala de internação, centro cirúrgico, sala de esterilização e consultórios, que são destinados para os casos cirúrgicos de tecidos moles, se localizam no segundo andar do hospital. Animais que necessitam de procedimentos cirúrgicos, são encaminhados para a sala de preparo (Figura 2C), onde é realizada o acesso venoso e tricotomia da região que será operada. O centro cirúrgico é composto por três salas (Figura 2D), a qual uma é destinada para procedimentos ortopédicos e as 6 outras duas para cirurgias de tecidos moles. Os procedimentos cirúrgicos são realizados pelos médicos veterinários juntamente com os aprimorandos, estes seguem uma escala de modo que ao final do mês todos passam pelos setores de cirurgia ortopédica e cirurgia de tecidos moles nas unidades da zona leste e zona norte. Na área de clínica cirúrgica de pequenos animais, os estagiários são distribuídos em dois grupos, um grupo para o acompanhamento de cirurgias de tecidos moles e o outro para o de cirurgias ortopédicas, os quais possuem a oportunidade de auxiliar nas cirurgias. O atendimento dos animais acontece por meio de senhas, e a triagem é realizada pelos recepcionistas do hospital, que encaminham os animais para os setores especializados frente a queixa principal. A anamnese, exame físico geral e exame físico especifico são realizados pelos médicos veterinários e aprimorandos, sendo acompanhados pelos estagiários. Quando são necessários exames complementares, curativos, medicações ou encaminhamento para outros setores, o cadastro do animal é direcionado para as chamadas “esteiras”, por meio de um sistema computadorizado que interliga os diversos setores como: raio-x, ultrassom, ortopedia, clínica médica, cirurgia de tecidos moles (CTM), enfermagem, entre outros. Na “esteira” do ultrassom, além dos exames de imagem, os animais são encaminhados para a coleta de urina por cistocentese, caso seja necessário este tipo de exame. Na “esteira” da enfermagem são realizados os curativos/bandagens, coletas de sangue para exames de hemograma e bioquímico, sedação, entre outros procedimentos necessários, como enema, abdominocentese e sondagem uretral. Cada vez que o animal é encaminhado para uma “esteira” diferente, estes devem aguardar na recepção até que sejam chamados novamente pela mesma senha. Após obter o diagnóstico ou um provável diagnóstico, o tutor juntamente com o animal é chamado de volta ao consultório, no qual o médico veterinário elucida os principais achados no exame físico e exames complementares e informa qual a conduta terapêutica a ser seguida. C D A A B A 7 Figura 2. (A) Recepção do Hospital Veterinário Público. (B) Consultório do HV. (C) Sala de preparo do animal para o procedimento cirúrgico e recuperação anestésica pós-cirúrgico. (D) Centro cirúrgico do HV (Arquivo pessoal, 2016). O estágio atingiu parcialmente o objetivo de ampliar os conhecimentos adquiridos na graduação e pô-los em prática, porém a realização do estágio foi essencial para conhecer a intensa rotina de um hospital público e as condutas de diferentes médicos veterinários, onde equipamentos e materiais não são acessíveis para auxiliar numa boa avaliação do paciente. A D C B 8 2. DESCRIÇÃO DAS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS 2.1 Tabela 01. Número de casos acompanhados e/ou procedimentos no setor de Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais do Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, São Paulo no período de 01 de julho à 31 de agosto de 2016. DIAGNÓSTICO CANINA FELINA TOTAL MACHO FÊMEA MACHO FÊMEA Enfermidades Oncológicas Adenoma 1 1 Adenoma sebáceo 1 1 Carcinoma apócrino 1 1 Carcinoma de células de transição 1 1 Carcinoma de células escamosas 3 3 Carcinoma de células inflamatórias 2 2 Carcinoma epidermóide 1 1 Carcinoma espinocelular 1 1 Carcinoma hepatóide 1 1 Carcinoma mamário 7 1 8 Fibrossarcoma 1 1 Hemangiopericitoma 1 1 2 Hemangiossarcoma esplênico 1 1 2 Linfoma alimentar 1 1 Linfoma multicêntrico 2 2 Lipoma 2 1 3 Mastocitoma 3 8 11 Melanoma 2 1 3 Neoformação em pálpebra à esclarecer 1 1 Neoformação em testículo à esclarecer 1 1 Neoformação peripeniana à esclarecer 2 2 Neurofibrossarcoma 1 1 Osteossarcoma 1 1 2 Sarcoma 1 1 SUBTOTAL 14 33 0 6 53 Continua 9 DIAGNÓSTICO CANINA FELINA TOTAL MACHO FÊMEA MACHO FÊMEA Sistema Genitourinário Cálculo ureteral 1 1 Cálculo uretral 1 1 2 Cálculo vesical 1 1 1 2 5 Hidronefrose 1 1 2 Hiperplasia fibroadenomatosa mamária felina 1 1 Obstrução uretral 1 1 Orquiectomia 4 4 *OSH eletiva 7 7 *OSH terapêutica 7 7 Ruptura de bexiga 2 2 Ureter ectópico 1 1 2 SUBTOTAL 10 16 3 5 36 Sistema Locomotor Displasia coxofemural 1 1 Fratura de rádio ulna 1 1 Fratura do colo femural 1 1 Luxação coxofemural 2 2 Luxação de patela 1 1 Osteomielite 1 1 Ruptura de ligamento cruzado cranial 2 1 3 SUBTOTAL 6 3 1 0 10 Sistema Cardiovascular **PDA 1 1 2 Pericardite idiopática 1 1 SUBTOTAL 1 2 0 0 3 Sistema Respiratório Paralisia de laringe 1 1 SUBTOTAL 1 0 0 0 1 Sistema Digestório Corpo estranho intestinal 2 1 3 Shunt portossistêmico extrahepático 1 1 SUBTOTAL 3 0 0 1 4 *OSH = Ováriosalpingohisterectomia **PDA = Persistência do ducto arterioso Continua 10 DIAGNÓSTICO CANINA FELINA TOTAL MACHO FÊMEA MACHO FÊMEA Sistema Oftalmológico Protusão da glândula da 3˚pálpebra 1 1 Úlcera de córnea 1 1 SUBTOTAL 0 2 0 0 2 Outros Abscesso 1 1 Fratura de unha 1 1 Hérnia diafragmática 1 1 Hérnia inguinal 1 1 Otohematoma 1 1 SUBTOTAL 1 2 1 1 5 TOTAL DE CASOS 36 58 5 13 112 2.2 Tabela 02. Número de casos acompanhados no setor de Clínica Cirúrgica de Pequenos Animais do Hospital Veterinário Público Zona Leste – ANCLIVEPA, São Paulo no período de 01 de setembro à 31 de outubro de 2016. DIAGNÓSTICO CANINA FELINA TOTAL MACHO FÊMEA MACHO FÊMEA Sistema Locomotor Displasia coxofemural 9 9 Doença do disco intervertebral 5 3 8 Fratura acetabular 1 1 Fratura de colo femural 8 4 5 3 20 Fratura de falange 2 2 Fratura de fêmur 12 7 1 1 21 Fratura de ílio 3 5 1 9 Fratura de pelve 8 5 13 Fratura de rádio ulna 5 5 1 11 Fratura de tíbia e fíbula 4 3 6 2 15 Fratura de úmero 2 1 3 Luxação coxofemural 4 6 1 1 12 Luxação tíbio társica 1 2 3 Necrose asséptica da cabeça do fêmur 1 1 Osteossarcoma 6 1 1 8 SUBTOTAL 70 36 20 10 136 Continua 11 DIAGNÓSTICO CANINA FELINA TOTAL MACHO FÊMEA MACHO FÊMEA Sistema Genitourinário Cálculo vesical 7 1 3 11 Hiperplasia prostática benigna 8 8 Morte e retenção fetal 27 25 52 Mucometra 1 1 Obstrução ureteral 1 1 Obstrução uretral 5 46 51 Piometra 54 7 61 Prolapso vaginal 3 3 Sofrimento fetal 23 27 50 SUBTOTAL 20 109 47 62 238 Enfermidades Oncológicas Adenoma em tireóide 1 1 Carcinoma de células de transição 3 1 4 Hemangiossarcoma 1 3 4 Neoplasia cutânea 5 3 8 Neoplasia gástrica 3 3 Neoplasia perineal 7 7 Neoplasia em próstata 1 1 Neoplasia em tireóide 1 1 Sarcoma 2 1 3 Sarcoma de aplicação 1 2 3 Tumor venéreo transmissível 6 6 SUBTOTAL 23 15 1 2 41 Sistema Digestório Corpo estranho 6 6 Corpo estranho linear 3 1 13 17 Fístula retovaginal 1 1 Prolapso de reto 2 3 4 9 Shunt portossistêmico extrahepático 1 1 SUBTOTAL 9 5 3 17 34 Sistema Respiratório Paralisia de laringe 1 1 Ruptura diafragmática 6 2 5 3 16 Ruptura de traquéia 1 1 2 SUBTOTAL 8 3 5 3 19 Continua 12 DIAGNÓSTICO CANINA FELINA TOTAL MACHO FÊMEA MACHO FÊMEA Enfermidades endócrinas Hiperplasia fibroadenomatasa mamária felina 4 4 SUBTOTAL 0 0 0 4 4 Outros Abscesso 1 1 Eventração 11 7 5 3 26 Evisceração 1 2 3 Ferida lacerativa 6 4 1 11 Hérnia inguinal 4 1 5 Hérnia inguinoescrotal 1 1 Hérnia perineal 9 9 Reação ao fio de sutura 2 2 SUBTOTAL 30 18 6 4 58 TOTAL DE CASOS 160 186 82 102 530 13 3. RELATO DE CASOS CLÍNICOS 3.1 CASO CLÍNICO 1 Resenha Nome do animal: Kevin Sexo: Macho Espécie: Canino Raça: Pug Idade: 9 meses Peso: 7,5 Kg Anamnese – Queixa Principal O animal foi trazido/encaminhado ao Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi no dia 08 de julho de 2016, sendo relatado episódios de tremores involuntários de cabeça há três meses, tornando-se cada vez mais frequente, a cada dois dias. Ressalta que o episódio permanece o dia inteiro e durante as crises apresenta incontinência urinária. Após a crise o animal fica alheio, com andar compulsivo, se esconde e apresenta-se muito cansado, declara também polidipsia (5 L/dia), poliúria e êmese. No último quadro, animal apresentou tosse frequente após beber água e relata abaixamento de cabeça quando está dormindo. O paciente, primeiramente, foi levado à uma clínica veterinária particular onde foi prescrito relaxante muscular para as crises, relatando discreta melhora do quadro, e ranitidina e ondasetrona para os episódios de êmese. Exame Físico Geral TPC: 2 segundos Temperatura retal: 38,1˚C Mucosas: normocoradas Hidratação: 100% Pulso: forte e rítmico Linfonodos: não reativos Nível de consciência: alerta FC: 80 bpm – bulhas cardíacas normorítmicas e normofônicas FR: taquipnéico – campos pulmonares limpos Sem sensibilidade dolorosa à palpação abdominal 14 Exames Complementares Devido ao quadro de convulsão focal simples, as principais suspeitas foram de shunt portossistêmico e hidrocefalia. Exames complementares como hemograma completo (Tabela 3), glicemia, bioquímica sérica e ácidos biliares (Tabela 4), ultrassonografia e tomografia hepática foram solicitados para direcionar o diagnóstico de shunt portossistêmico. No entanto, por questões financeiras, não foi possível obter o exame de tomografia. Tabela 3. Valores de hemograma completo de Kevin, acompanhado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, 2016. Eritograma Resultado Referência Unidade Eritrócitos 5,9 5,5 - 8,5 milhões/mm3 Hemoglobina 13,6 12,0 - 18,0 g/dl Hematócrito 41 37 - 55 % V.C.M. 69,5 60,0 - 77,0 u3 H.C.M. 23,1 19,5 - 24,5 pg C.H.C.M. 33,2 31,0 - 36,0 g/dl Proteina Total 6,4 5,5 - 7,7 g/dl Plaquetas 230 200 - 500 103/mm3 Leucograma Leucócitos 22,00 6,0 - 17,0 mil/mm3 Segmentados 87,00 55 - 80 % Linfócitos 13,00 13 - 40 % Monócitos 9,00 1 - 6 % Eosinófilos 11,00 1 - 9 % valores em negrito estão fora dos valores de referência Tabela 4. Valores de bioquímica sérica de Kevin, acompanhado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, 2016. Bioquímico Resultado Referência Unidade Albumina 2,8 2,3 - 3,8 g/dl ALT 334 7,0 - 92 U.I./L Creatinina 0,8 0,5 - 1,6 mg/dl Fosfatase alcalina 250 10 - 96 U.I./L Uréia 25 10 - 60 mg/dl Outros Ácidos biliares (Jejum) 118,4 0 - 13,0 µmol/L Ácidos biliares (após alimentação) 193,4 0 - 30,0 µmol/L valores em negrito estão fora dos valores de referência Na ultrassonografia, o fígado apresentou dimensões diminuídas em relação aos limites do gradil costal (microhepatia) e redução do calibre da veia porta, 15 observou-se também presença de um único vaso de trajeto anômalo, calibroso e aspecto tortuoso, ligando o trajeto da veia porta (na região da drenagem da veia gastroduodenal) e da veia cava caudal em região portal em abdome cranial direito. Tratamento O tratamento instituído foi clínico associado ao cirúrgico pelo uso do anel constritor ameróide. Para a melhora do quadro de encefalopatia hepática, foi prescrito por 15 dias antes da cirurgia: fenobarbital (2mg/kg, BID, ANR), prednisolona (1mg/kg, SID, ANR), benzoilmetronidazol (7mg/kg, BID, 15 dias), omeprazol (1mg/kg, SID, 15 dias), lactulona (1mL/4,5kg, BID, ANR), e como coadjuvante, a ração Royal Canin Hepatic, Discussão A condução do caso baseou-se, principalmente, na resenha do animal, no histórico e nos sinais clínicos. A queixa principal de convulsão focal, poliúria e polidipsia, fez com que o diagnóstico voltasse para as enfermidades congênitas que levassem à um distúrbio neurológico associado ou não à um distúrbio do trato urinário. Partindo destas premissas, foi estabelecido avaliar primeiramente o estado geral do Kevin por meio de exames de sangue. Nestes, foi observado aumento significativo de ALT, o que pode ser sugestivo de uma diminuição da taxa de perfusão hepática, o que acarreta em hipóxia dos hepatócitos e consequentemente ruptura destas células acarretando a liberação desta enzima para a circulação sistêmica (GUILFORD, 1996). O aumento de fosfatase alcalina, observado no exame, sugere elevação de sua síntese ou diminuição da enzima degradadora (GUILFORD, 1996), a síntese pode estar aumentada quando há lesões de vias biliares, desordens hepática e/ou ósseas. Também foi verificado intensa leucocitose por neutrofilia, monocitose e eosinofilia, indicando infecção sistêmica. Este achado pode ser explicado devido a uma falha no sistema mononuclear fagocitário hepático ou à infecções de trato urinário (SASSAKI, 2001). Com base nos achados dos exames de sangue, houve a suspeita de shunt portossistêmico, sendo a concentração sérica de ácidos biliares o teste laboratorial mais sensível para esta desordem. Os valores de ácidos biliares pré-prandiais e pós- prandiais do Kevin, foram significativamente altos em relação aos valores de 16 referência, isto porque, os ácidos biliares são desviados do fígado e levados para a circulação sistêmica, provocando elevação sérica de sua concentração. Os testes laboratoriais são de grande auxilio para se afirmar, com mais certeza, a presença de shunts portossistêmico, porém o diagnóstico definitivo se dá por meio de exames de imagem (FOSSUM, 2014). O exame de ultrassonografia abdominal foi solicitado em busca de alterações no tamanho do fígado, no parênquima hepático, presença de vasos anômalos, como também, alterações na arquitetura renal e a presença de urólitos em bexiga e rins. Neste exame observou- se microhepatia e presença de um único vaso de trajeto anômalo, ligando a veia porta com a veia cava caudal. Com estes resultados pode-se fechar o diagnóstico de shunt portossistêmico congênito extra hepático. O desvio portossistêmico (DPS) ou shunt portossistêmico são comunicações vasculares anômalas macroscópicas entre a circulação sistêmica com a circulação portal, que permite que o sangue portal chegue ao sistema circulatório sem antes passar pelo fígado (SANTOS, 2014). Os shunts são classificados em intra ou extra hepáticos, congênito ou adquirido, e as comunicações podem ser únicas, duplas ou múltiplas, sendo a última mais comumente vista em shunts extra hepáticos adquiridos. Ainda pode haver anormalidades concomitantes como atresia completa ou hipoplasia da veia portal (FOSSUM, 2014; SANTOS, 2014). O DPS congênito ocorre como resultado da persistência de ductos arteriosos, que em condições de normalidade fecham depois do nascimento (SANTOS, 2014). A idade é um fator importante no diagnóstico, devido aos sinais aparecerem comumente em animais jovens, por volta dos seis meses de idade, condizete com a idade de Kevin (BIRCHARD et al, 2006). A anomalia vascular hepática possui caráter genético e hereditário, entretanto não há recomendações consistentes que impeçam a reprodução desses animais. Os DPS congênitos extra-hepáticos, se originam da veia porta, veia gástrica esquerda ou da veia esplênica e se conectam à veia cava caudal (mais comum), à veia ázigos ou a outros vasos sistêmicos como a torácica interna, a renal e a cólica (menos frequentes) (FOSSUM, 2014). Um shunt portossistêmico extra-hepático é considerado congênito quando uma veia ou raramente duas veias anormais estão presentes sem sinais de hipertensão portal concomitantes (SANTOS, 2014), no caso em questão não foram obtidos informações hemodinâmicas da veia porta e suas tributárias, por isso não se pode afirmar com certeza a ausência de hipertensão 17 portal, porém a ausência de sinais clínicos condizentes com hipertensão e a idade do Kevin, possuem indícios de ser de origem congênita. As raças de pequeno porte são as mais predispostas, como o Schnauzer, Yorkshire, Poodle, Pug, Maltês, Shitzu e Dauchshund (GODOY & SACCO, 2008), o que inclui o animal do caso relatado. Devido ao desvio de sangue venoso da circulação portal para a circulação sistêmica, as substâncias hepatotróficas oriundas do pâncreas e dos intestinos são levadas diretamente para e circulação sistêmica, sem passar pelo fígado. Esse decréscimo do fluxo sanguíneo, no qual estão presentes estas substâncias, irão resultar em atrofia e subsequente disfunção do fígado. O mesmo ocorre com as substâncias tóxicas oriundas da absorção intestinal, onde essas substâncias que seriam encaminhadas para o sistema porta para serem metabolizadas, ficam circulantes e funcionam como falsos neurotransmissores causando sinais neurológicos associados à encefalopatia hepática (EH), que são agravados principalmente com a ingestão de alimentos ricos em proteína, uma vez que a amônia circulante, é produto de degradação proteica bacteriana intestinal (FOSSUM, 2014). Os sinais clínicos são variáveis, e envolvem o sistema nervoso central, trato gastrointestinal e urinário. Os animais acometidos, normalmente são avaliados devido ao retardo no crescimento, pequena estatura corporal e perda de peso (SANTOS, 2014). Os sinais neurológicos devido à EH incluem vocalização, letargia, depressão, ataxia, andar em círculos e compulsivos, head preassing, postura de cabeça baixa, convulsão, coma, entre outros. Estes sinais tendem a surgir e desaparecer, sendo explicado pela ingestão e absorção de produtos menos neurotóxicos (NETO & BRACCIALLI, 2009). Sinais de disfunção hepática podem estar presentes juntamente com os sinais de EH, tais sinais são: anorexia ou polifagia, parorexia, diarréia ou constipação e êmese (NETO & BRACCIALLI, 2009). Alguns animais são apresentados para avaliação com disfunções urinárias como: hematúria, disúria, polaquiúria, estrangúria, poliúria, polidipsia e obstrução uretral. A urolitíase é encontrada em mais de 50% dos cães com DPS e ocorre devido ao aumento da concentração de amônia nos rins, levando a formação de urólitos de biurato de amônio causando inflamação do trato urinário (NETO & BRACCIALLI, 2009). 18 Infecções urinárias estão presentes quando há bacteremia e estas acontecem devido a falha no sistema mononuclear fagocitário hepático (SASSAKI, 2001). Quando há hipertensão portal, sinais como dor, distensão abdominal do íleo ou ascite, diminuição da pressão venosa central, tempo de preenchimento capilar prolongado, mucosas pálidas e pulsos periféricos fracos estão presentes (SANTOS, 2014). Apesar do Kevin possuir seis sinais clínicos citados acima, nenhum deles indicava hipertensão portal, o que levava a um bom prognóstico. O diagnóstico sugestivo se baseia na anamnese, exame físico e nos sinais clínicos acima descritos. Exames laboratoriais como hemograma e bioquímico são muito inespecíficos, necessitando de testes de função hepática para se afirmar com mais certeza a presença de DPS. Os testes que podem ser feitos são, a dosagem sérica de ácidos biliares e o teste de tolerância a amônia, porém estes testes não são rotineiros devido ao custo e a dificuldade de serem realizados na clínica (ALAMINO, 2014), por isso o melhor método de diagnóstico é o de imagem. A tomografia hepática é o exame de eleição, pois permite a aquisição de uma imagem tridimensional de modo simples, seguro, não invasivo, confiável e preciso, fornecendo um mapa tridimensional da circulação hepática (ALAMINO, 2014). No caso de Kevin não pode ser realizado o exame de tomografia pois se trata de um exame dispendioso, por isso optou-se pelo exame de ultrassonografia. A ultrassonografia é uma técnica rápida, atualmente disponível na prática veterinária, que pode ser realizada sem sedação ou anestesia, mas que é altamente dependente da experiência do operador, justificando a sua utilização para pesquisa de DPS na rotina veterinária (ALAMINO, 2014). Por meio da ultrassonografia é visibilizada micro-hepatia subjetiva, hipervascularidade de vasos hepáticos, desvio e dilatação de vasos hepáticos e estruturas vasculares portais alteradas (SANTOS, 2014). Os rins e a bexiga também devem ser rotineiramente examinados para detectar cálculos de urato, porém estes não foram observados nos exames de Kevin. Outros exames de imagem também, podem ser realizados, como a radiografia, portovenografia (portografia mesentérica cranial e esplenoportografia) e a cintilografia coloretal. O tratamento definitivo do shunt portossistêmico extra hepático congênito é cirúrgico, e consiste em ocluir o vaso anômalo. No entanto animais que possuem hipertensão portal, a cirurgia é contra indicada. 19 Antes de submeter o animal ao procedimento cirúrgico é necessário controlar os sintomas de EH, por isso o tratamento clínico é feito por alguns dias até que o animal tenha condições de ser submetido a um protocolo anestésico e à cirurgia (NETO & BRACCIALLI, 2009), no caso de Kevin o tratamento da EH foi feito durante 15 dias. O tratamento clínico consiste em fluidoterapia com dextrose 2,5% ou 5% para correção dos desequilíbrios hidroeletrolíticos e ácidos-básicos e manutenção da glicose sanguínea; com o propósito de diminuir a hiperamonemia e a formação de uratos de amônia tem-se utilizado dietas hipoprotéicas e probióticos como a lactulose, que alteram a metabolização dos aminoácidos, ao agir sobre o funcionamento das bactérias intestinais, pois acidifica o meio, o qual capta amônia e desestimula sua produção, com o mesmo objetivo pode ser utilizado antibióticos como o metronidazol e a neomicina (SANTOS, 2014); para os episódios de êmese utiliza-se a metoclopramida juntamente com ranitidina ou cimetidina para diminuir a secreção gástrica. Pacientes com convulsões requerem o uso de benzodiazepínicos ou fenobarbital (BONELI, 2008). Existem várias técnicas cirúrgicas de correção do DPS que incluem: faixa de celofane, constritor ameróide, ligação parcial, ligação completa, espirais trombogênicos intravasculares e oclusores hidráulicos de silicone. O constritor ameróide, utilizado no Kevin, tem como vantagens o tempo cirúrgico, que é significativamente reduzido comparado com outras técnicas. Não é necessário medir a pressão da veia porta durante o procedimento e reduz teoricamente os riscos de hipertensão pois permite que a vasculatura hipoplásica da circulação porta possua tempo para se adaptar ao aumento de fluxo sanguíneo, o que torna a melhor técnica para a correção do DPS. O anel consiste basicamente por uma substância ameróide, que é um material caseínico hidroscópico desidratado, envolto por um aro de aço inoxidável onde possui uma fenda que permite colocá-lo ao redor do vaso, esta substância quando hidratada por fluidos corporais expande internamente, diminui seu lúmen e acarreta constrição gradual do vaso (BONELI, 2008). Reações de tecido fibroso ao constritor ameróide e trombose são também considerados auxiliares na oclusão do vaso sanguíneo. Embora diversos fatores alterem a velocidade de fechamento, o padrão de expansão mais rápido ocorre entre o 3˚ e o 14˚ dia após a implantação e lento nos próximos 60 dias (BONELI, 2008). Complicações pós-cirúrgicas que podem ocorrer, porém não frequentes, cita-se: hipertensão portal, sendo necessária outra cirurgia para a 20 retirada do anel constritor; trombose portal; sinais neurológicos e ascite (BONELI, 2008). Basicamente a técnica consiste na identificação do DPS e no posicionamento do anel ao redor do vaso anômalo (Figura 3A e B). Há estudos que revelam que, de dois a quatro meses após a cirurgia, o fígado do animal se regenera, podendo ter um aumento de 43 a 62%. Figura 3. (A) Imagem fotográfica ilustrando Shunt portossistêmico identificado com pinça, localizado entre a veia porta e a veia cava caudal. (B) Posicionamento do anel constritor ameróide (seta) (Imagens gentilmente cedidas pela Dr. Adriana Tomoko Nishiya). Após o procedimento cirúrgico o animal foi encaminhado para a UTI para a recuperação anestésica recebendo alta no mesmo dia da cirurgia. As medicações foram mantidas, sendo adicionadas Tramadol (3 mg/kg, TID, 7 dias) e Dipirona (25 mg/kg, BID, 7 dias). O retorno foi marcado para a reavaliação do animal e controle dos exames. O último retorno acompanhado foi no dia 26 de agosto, onde a tutora relata bom estado geral do Kevin e ausência de todos os sinais clínicos apresentados inicialmente. Como o hemograma e o teste de ácidos biliares não se normalizaram, foi pedido acompanhamento dos exames até a melhora destes. A A B 21 Conclusão Kevin foi um caso clássico de shunt portossistêmico, pois concordava com a literatura quanto a resenha, sinais clínicos e alterações de exames complementares. O caso foi conduzido corretamente e a escolha do tratamento foi essencial para a sobrevida e qualidade de vida do animal. 3.2 CASO CLÍNICO 2 Resenha Nome do Animal: Jolie Sexo: fêmea Espécie: canina Raça: Labrador Retriever Idade: 11 anos Peso: 33 Kg Anamnese – Queixa Principal Animal chegou ao Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi no dia 3 de agosto de 2016 com histórico de cansaço fácil e tosse há três meses. A paciente foi levada ao veterinário da cidade no dia 15 de fevereiro o qual diagnosticou por meio do ecodopplercardiograma, insuficiência da valva atrioventricular esquerda e direita de grau importante, com remodelamento de átrio e ventrículo esquerdo e hipertensão da artéria pulmonar há aproximadamente seis meses. O veterinário de origem solicitou os exames de radiografia torácica, ultrassonografia abdominal e perfil hematológico (Tabelas 5 e 6). No exame radiográfico, observou-se dimensões aumentadas de silhueta cárdica, deslocamento dorsal de porção torácica de traquéia, aumento da radiopacidade pulmonar, de padrão misto (intersticial e bronquial) de distribuição difusa, predominantemente na região perihilar compatível com edema pulmonar, e hepatomegalia. No exame ultrassonográfico, além da hepatomegalia foi observada a presença de líquido livre abdominal. A tutora relata que já havia drenado líquido do pericárdio (aproximadamente 1000 ml) três vezes, e a última drenagem ocorreu após o animal apresentar síncope. O veterinário iniciou o tratamento com maleato de enalapril, pimobendan, espironolactona, prednisona, furosemida e ranitidina, e encaminhou a paciente ao 22 Hospital Veterinário Anhembi Morumbi para a realização do procedimento cirúrgico de pericardiectomia. Tabela 5. Valores de hemograma completo de Jolie, acompanhado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, 2016. Eritograma Valores Referência Unidade Eritrócitos 5,67 5,7 - 7,4 milhões/mm3 Hemoglobina 12,80 14,0 - 18,0 g/dl Hematócrito 37,70 38 - 47 % V.C.M. 66,49 63 - 77 u3 H.C.M 22,60 21,0 - 26,0 pg C.H.C.M. 34,00 31 - 36 g/dl Indice de reticulócitos 0,50 Anemia arregenerativa Leucograma Leucócitos 13,16 6,0 - 16,0 mil/mm3 Segmentados 78,00 55 - 80 % Eosinófilos 2,00 1 - 9 % Basófilo 0,00 0 - 1 % Linfócitos 13,00 13 - 40 % Monócitos 7,00 1 - 6 % Plaquetas 500,00 200 - 500 103/mm3 Proteina Total 5,20 6 - 8 g/dl valores em negrito estão fora dos valores de referência Tabela 6. Valores de bioquímica sérica de Jolie, acompanhado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, 2016. Bioquímico Valores Referência Unidade Bilirrubina Total 0,05 0,1 - 0,7 mg/dl Bilirrubina Direta 0,05 0,06 - 0,30 mg/dl Bilirrubina Indireta 0,00 0,01 - 0,50 mg/dl Colesterol 176,00 116 - 300 mg/dl Creatinina 1,49 0,8 - 1,4 mg/dl GGT 3,00 1,2 - 6,4 U.I./L Glicose 184,00 60 - 118 mg/dl Potássio 4,90 4 - 5,4 mEq/l Proteína Total 5,17 5,3 - 7,7 g/dl Albumina 2,16 2,3 - 3,8 g/dl Globulina 3,01 2,4 - 4,8 g/dl AST 31,00 10 - 88 U.I./L ALT 82,00 7 - 92 U.I./L Uréia 31,00 15 - 40 mg/dl Triglicérides 152,00 15 - 150 mg/dl Cloretos 103,00 108 - 128 mEq/l Fósforo 6,28 2,6 - 5,8 mEq/l Sódio 137,00 143 - 168 mEq/l valores em negrito estão fora dos valores de referência 23 Exame Físico Geral TPC: 2 segundos Temperatura retal: 37,6˚C Mucosas: normocoradas Hidratação: 100% Pulso: forte e rítmico Linfonodos: não reativos Nível de consciência: alerta FC: 120 bpm – hipofonese FR: taquipnéico – com presença de estertor pulmonar Sem sensibilidade dolorosa à palpação abdominal Exames Complementares Apesar do histórico do animal e da insuficiência das valvas atrioventriculares terem sido previamente diagnosticadas com o exame de ecodopplercardiografia pelo veterinário de origem, a paciente foi submetida a um novo exame radiográfico a fim de avaliar a existência de efusão pleural e edema pulmonar. O mesmo revelou ínfima quantidade de conteúdo de densidade água (cinza claro) no espaço pleural, revelando efusão pleural, discreta opacificação pulmonar com padrão bronquial e intersticial nos lobos pulmonares caudais, silhueta cárdica com dimensões aumentadas e aspecto globoso e deslocamento de traquéia dorsolateral direito (Figura 4A e B). 24 Figura 4. (A) Imagem radiografia da região torácica, projeção VD, ilustrando silhueta cardíaca com dimensões aumentadas e aspecto globoso. (B) Projeção torácica LLE, mostrando efusão pleural (seta grossa), opacificação pulmonar (padrão bronquial e intersticial), deslocamento dorsal discreto de traquéia (seta fina) e presença de discreta quantidade de conteúdo de radiopacidade ar no trajeto esofágico cervical e torácico (aerofagia) (seta comprida) (Radiografias gentilmente cedidas pelo departamento de diagnóstico por imagem do Hospital Anhembi Morumbi). Tratamento A escolha terapêutica foi a cirúrgica, realizando a técnica de pericardiectomia subtotal com o objetivo de propiciar alívio clínico a longo prazo para a paciente com histórico e efusão pericárdica recidivante. Discussão Doenças cardíacas de origem pericárdica correspondem em aproximadamente 1% de todas as doenças cardíacas de cães e gatos, sendo que efusões pericárdicas representam mais de 90% de todos os distúrbios pericárdicos (SOUZA, 2012). As efusões pericárdicas podem ser classificadas conforme a análise do líquido acumulado, transudado, transudado modificado ou exsudado, ou conforme a A B 25 sua etiologia, congênita ou adquirida, sendo que as adquiridas podem ser devido à neoplasias (hemangiossarcoma, quemodectoma, linfossarcoma, mesotelioma, entre outras), infecções, traumatismo, rupturas, insuficiência cardíaca congestiva (ICC), hipoalbuminemia, toxemias ou ser idiopáticas (WARE, 2006). As etiologias idiopática e neoplásica perfazem 90% das efusões pericárdicas em pequenos animais, e em geral cães de grande porte e de meia idade são mais predispostos a ter efusão pericárdica idiopática (SOUZA, 2012). No caso da Jolie, nota-se a presença de sinais clínicos de ICC, e no exame ecocardiográfico conclui a presença de insuficiência de mitral e tricúspide de grau importante, porém não foi visualizado nenhuma massa cardíaca ou pericárdica indicando efusão de origem neoplásica, e segundo Miller (2002) a ICC e a hipoalbuminemia encontrada no exame, não justificam a grande quantidade de fluido pericárdico (1000 ml) e as recidivas frequentes. Isto fez com que o raciocínio voltasse para a efusão pericárdica idiopática associada à cardiopatia de origem valvar. A efusão pericárdica idiopática é uma condição benigna e esta é considerada quando não há evidências de neoplasia, traumas e infecções (WARE, 2006). Segundo Ware (2006), este tipo de efusão é comum a presença de inflamação discreta, podendo ocorrer fibrose pericárdica e epicárdica. Conforme ocorre o acúmulo de fluido no saco pericárdico, este fluido comprime externamente o coração o que limita progressivamente o enchimento, acarretando diminuição do débito cardíaco, aumento subsequênte na pressão venosa, congestão sistêmica e edema; o volume sistólico fica diminuído, resultando em fadiga, fraqueza, azotemia e pulso arterial diminuído. Normalmente o animal apresenta sinais de ICC direita inicialmente, pois a parede do ventrículo direito é mais delgada e mais susceptível à compressão (WARE, 2001). Em contrapartida, a formação de efusão pericárdica de forma rápida, pode causar um tamponamento cardíaco agudo e severo, conduzindo ao aparecimento de choque cardiogênico sem sinais de insuficiência cardíaca, sendo esta uma situação de emergência com risco de morte (SOUZA, 2012). O diagnóstico de efusão pericárdica é conduzido pela resenha, anamnese, sinais clínicos e exame físico. Os sinais clínicos são manifestados pelos sinais de ICC direita, onde os animais podem apresentar, dispnéia, taquipnéia, intolerância ao exercício, cianose, tosse, síncope, letargia, e em casos crônicos, hepatomegalia e 26 ascite. No exame físico, o pulso paradoxal pode estar presente, porém este é de difícil percepção pela palpação do pulso femoral sendo visto mais comumente no exame eletrocardiográfico, no caso da Jolie não foi observado devido a não realização deste exame. Sons cardíacos e respiratórios abafados e taquicardia sinusal são os sinais mais comuns em cães com efusão pericárdica, podendo haver presença de sopro cardíaco caso haja doença valvular concomitante (MILLER, 2002). Exames de radiografia torácica e ecocardiografia podem ser requeridos para confirmar o diagnóstico de efusão pericárdica. Porém o exame de escolha é a ecocardiografia, método não invasivo e mais sensível e especifico para detectar e quantificar efusões pericárdicas do que a radiografia. O líquido pericárdico aparece como uma imagem anecóica entre o pericárdio parietal e o epicárdio, e ainda pode haver colapso de átrio e ventrículo direito evidenciando elevação acentuada da pressão intrapericárdica (MILLER, 2002). O exame de fluido pode ser realizado, porém não é possível diferenciar efusão neoplásica de efusão idiopática a não ser que estejam presentes células tumorais. No entanto, o quemodectoma e o hemangiossarcoma muitas vezes não liberam células para a efusão (SOUZA, 2012). Neste caso não foi realizada a análise do fluido, não permitindo a sua classificação quanto ao tipo de celularidade. É importante diferenciar efusão pericárdica de outras causas de insuficiência cardíaca direita, pois o tratamento de ICC direita podem piorar os sinais de tamponamento cardíaco, como os vasodilatadores e diuréticos que diminuem o débito cardíaco exacerbando a hipotensão e o choque (WARE, 2001). Caso a efusão pericárdica seja devido à ICC direita a pericardiocentese resolve na maioria das vezes, os sinais clínicos (WERE, 2006). A pericardiocentese, é o primeiro procedimento que deve ser feito nestes animais, pois permite alívio imediato da compressão cardíaca, melhora o débito cardíaco e diminui os sinais clínicos associados (SOUZA, 2012). Cães com efusão pericárdica idiopática são inicialmente tratados de forma conservadora, com pericardiocentese (MILLER, 2002). A efusão recidivante, que não responde a várias pericardiocenteses, geralmente é tratada cirurgicamente (WARE, 2001; MILLER, 2002). Aparentemente não há consequências graves após a remoção cirúrgica do pericárdio, sendo esta a forma de tratamento mais difundida em casos de efusão pericárdica recidivante (MILLER, 2002). As técnicas utilizadas 27 são: pericardiectomia subtotal, pericardiectomia total e pericardiectomia toracoscópica. A técnica utilizada no caso foi a pericardiectomia subtotal, tendo como acesso cirúrgico entre o 4˚ e 5˚ EIC direito. Após abrir o tórax (Figura 5A), foi realizada uma pequena incisão para a drenagem do fluido, sendo posteriormente, feita uma incisão em forma de “T” no pericárdio a partir da base cardíaca, ventralmente ao nervo frênico, até o ápice. A incisão da base cardíaca é extendida por toda a circunferência do coração e então incisa-se o ligamento pericardiofrênico. Deve-se verificar o pericárdio remanescente, assegurando de que não há hemorragias. O pericárdio foi encaminhado para a análise histológica, e o resultado foi de processo inflamatório (Figura 5B). Figura 5. (A) Imagem fotográfica ilustrando o acesso da cavidade torácica mostrando coração com formato globoso (seta) com presença de líquido em saco pericárdico. (B) Retalho de pericárdio retirado, com aspecto espessado, densamente fibrótico e inelástico (Imagens gentilmente cedidas pela Dra. Adriana Tomoko Nishiya). Após o procedimento cirúrgico, o animal foi encaminhado para a UTI onde teve boa recuperação anestésica. No mesmo dia, foi feita uma carta de A B 28 encaminhamento para a internação em clínica particular, para que houvesse monitoração, controle álgico e demais procedimentos que julgassem necessários por 24 a 48 horas, sendo prescritos para casa Cefalexina (30 mg/kg, BID, 10 dias), Ranitidina (2 mg/kg, BID, 10 dias), Prednisona (1 mg/kg, SID, 5 dias), Tramadol (3 mg/kg, TID, 7 dias), Dipirona (25 mg/kg, TID, 7 dias) e manutenção dos medicamentos previamente prescritos. O último retorno acompanhado foi no dia 23 de agosto, sendo relatado taquipnéia, abaulamento de abdômen e letargia. Refere boa cicatrização no local da incisão, negando outras alterações. Foram solicitados exames de sangue, radiografia torácica, ecodopplercardiograma e ultrassonografia para acompanhamento. Na radiografia, foi verificada ínfima quantidade de conteúdo de radiopacidade água no espaço pleural (efusão pleural), opacificação pulmonar de padrão bronquial e intersticial tendendo a nodular e silhueta cardíaca parcialmente caracterizada, apresentando discreto aumento global (Figura 6A e B). Figura 6. (A) Imagem radiografia torácica, projeção DV, ilustrando opacificação pulmonar (intersticial e bronquial) e silhueta cardíaca parcialmente caracterizada. (B) Projeção LLE mostrando espaço pleural com ínfima quantidade de líquido (Radiografias gentilmente cedidas pelo departamento de diagnóstico por imagem do Hospital Anhembi Morumbi). A B 29 O exame ecodopplercardiográfico mostraram insuficiência de valva mitral moderada e insuficiência de valva tricúspide discreta, sem evidências de repercussão hemodinâmica em câmaras esquerda e direita respectivamente. Pode- se concluir que houve grande melhora no quadro clínico comparada ao exame realizado no dia 15 de fevereiro. Cães com efusão pericárdica idiopática, tem um bom prognóstico após o tratamento por pericardiectomia. Recidivas de líquido pericárdico podem ocorrer como complicações pós-operatórias (FOSSUM, 2014). No caso da Jolie, a suspeita foi de efusão pericárdica idiopática pois não houve indícios de infecção, trauma, neoplasias e hipoalbuminemia que causassem grande acúmulo de líquido no saco pericárdico. Foi demostrado no exame ecocardiográfico a ICC esquerda e direita grave, no entanto os sintomas de ICC direita indicam ser secundários à ICC esquerda, o que contrapõe a idéia de que a efusão pericárdica tenha levado à ICC direita pois, quando há tamponamento cardíaco, o acometimento primeiramente ocorre do lado direito devido ao menor espessura da parede ventricular. Um ponto que contra indica a efusão pericárdica ser secundária à ICC é de que segundo os autores (MILLER, 2002; WERE, 2006), com o tratamento da ICC por meio de medicamentos e pericardiocentese há resolução da efusão não ocorrendo recidivas, além de o volume do fluido do pericárdico de origem cardíaca serem pequenos, não causando tamponamento cardíaco significativo. Foi marcado retorno para que se pudesse investigar o quadro de anemia. Conclusão Doenças que acometem primariamente o pericárdio são raras na rotina do médico veterinário, porém quando conduzidas corretamente o diagnóstico é possível. No entanto nem sempre é possível identificar a causa desta afecção, o que nos leva a discutir o tratamento mais adequado, no sentido de fornecer qualidade de vida e sobrevida ao paciente. Neste caso, a escolha terapêutica foi essencial para a qualidade de vida do animal. 3.3 CASO CLÍNICO 3 Resenha Nome do Animal: Nick Sexo: macho 30 Espécie: canino Raça: Spitz Alemão Idade: 8 meses Peso: 4,5 Kg Anamnese – Queixa Principal Animal chegou ao Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi no dia 28 de julho de 2016 sendo relatado que este foi levado ao veterinário particular para realizar o procedimento de castração, no entanto, no momento do exame foi verificado sopro grau IV sendo encaminhado para realizar o exame de ecodopplercardiograma, eletrocardiograma e hemograma completo (Tabela 7). À anamnese não foram relatadas outras alterações sistêmicas. Tabela 7. Valores de hemograma completo de Nick, acompanhado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, 2016. Eritograma Valores Referência Unidade Eritrócitos 6,02 6,0 - 7,0 milhões/mm3 Hemoglobina 14,00 14,0 - 17,0 g/dl Hematócrito 40,52 40 - 47 % V.C.M. 67,31 65 - 78 u3 H.C.M 23,26 21,0 - 25,0 pg C.H.C.M. 34,55 30 - 35 g/dl Proteína Plasmática Total 6,80 5,0 - 7,0 g/dl Leucograma Leucócitos 8,90 8,0 - 16,0 mil/mm3 Segmentados 64,00 55 - 70 % Eosinófilos 5,00 1 - 6 % Basófilo 0,00 0 - 1 % Linfócitos 31,00 20 - 40 % Monócitos 0,00 2 - 8 % Plaquetas 345,00 170 - 430 103/mm3 valores em negrito estão fora dos valores de referência A avaliação ecodopplercardiograma mostrou fluxo turbulento e contínuo em tronco pulmonar, com direção esquerda-direita e gradiente de pressão de aproximadamente 89 mmHg. Observou-se persistência do ducto arterioso (PDA), medindo aproximadamente 0,30 cm em sua inserção na artéria pulmonar e 0,46 cm em sua inserção da artéria aórtica. Demais estruturas se encontravam dentro da normalidade. No eletrocardiograma foi revelado arritmia sinusal com marca-passo 31 migratório. Devido aos resultados dos exames, o animal foi diagnosticado com PDA e encaminhado para o Hospital Veterinário Anhembi Morumbi para a correção cirúrgica desta cardiomiopatia congênita. Exame Físico Geral TPC: 1 segundo Temperatura retal: 38,6˚C Mucosas: normocoradas Hidratação: 100% Pulso: forte e rítmico Linfonodos: não reativos Nível de consciência: alerta Sem sensibilidade dolorosa à palpação abdominal FC: 140 bpm – sopro continuo em foco pulmonar grau IV FR: 80 mpm – campos pulmonares limpos Tratamento O tratamento recomendado foi cirúrgico pela técnica cirúrgica de dupla ligadura, sendo explicado para a tutora todos os risco da cirurgia porém com grande chance de sucesso. A cirurgia foi agendada para o dia 5 de agosto de 2016. Discussão De acordo com a anamnese e achados clínicos de exame físico, a principal suspeita diagnóstica era PDA. O exame de ecodopplercardiograma é o exame padrão para diagnosticar diversas anormalidades cardiogênicas devido ao exame fornecer informações estruturais e funcionais, detectando assim a localização da origem do sopro. Neste contexto, o exame de escolha para o Nick foi o ecodopplercardiograma, sendo confirmatório para PDA (FOSSUM, 2014). A PDA é o primeiro defeito cardíaco congênito mais comum em cães, sendo observado mais comumente em cães fêmeas e de raças puras, como o Maltês, Lulu da Pomerânia, Yorkshire Terrier, Poodle, Pastor de Shetland, Springer Spaniel Inglês, Keeshonden, e Bichon Frise, o que inclui o animal do caso relatado (FOSSUM, 2014). A maioria dos defeitos cardíacos congênitos possui uma base 32 genética, por isso, é aconselhável a não reprodução desses animais que podem ser assintomáticos e desenvolver insuficiência cardíaca súbita (GOODWIN, 2002). O ducto arterioso é um vaso sanguíneo fetal, curto e de grande calibre, derivado do sexto arco aórtico e se estende da bifurcação da artéria pulmonar até a aorta descendente. Este possui como função, levar sangue oxigenado vindo da placenta para a aorta, sendo desviado dos pulmões do feto (BUCHANAN, 2001). Após o parto, a diferença de pressão, o aumento da oxigenação e inibição das prostaglandinas, fazem com que ocorra expansão pulmonar e fechamento deste vaso até os dez dias de idade do filhote, porém a permanência deste ducto além deste período caracteriza-se a PDA (CANAVARI, 2015). A permanência do ducto faz com que a diferença de pressão ocasione um desvio da esquerda para a direita, ou seja, um fluxo sanguíneo fluindo da aorta para a artéria pulmonar resultando em sopro cardíaco contínuo e sobrecarga do átrio e ventrículo esquerdos, o que produz dilatação ventricular com hipertrofia excêntrica, aumento da contratilidade do miocárdio e da frequência cardíaca como mecanismos compensatórios, podendo levar à insuficiência e dilatação da valva mitral, aumentando ainda mais a sobrecarga ventricular. Esta severa sobrecarga resulta em edema pulmonar e em possível fibrilação atrial (ORTON, 1997; BACKER & MAVROUDIS, 2003; SISSON et al., 2004). Caso não haja correção cirúrgica da PDA os animais podem desenvolver hipertensão pulmonar, revertendo a direção do fluxo através do desvio. A PDA com fluxo reverso, ou seja, da artéria pulmonar para a aorta é menos comum, porém mais grave, onde se observa um quadro de cianose diferencial, dispnéia, apatia, síncope e convulsões (FOSSUM, 2014). Nestes casos não é recomendado a correção cirúrgica, pois o ducto funciona como uma válvula de escape para o ventrículo direito. No caso do Nick não houve reversão do fluxo sanguíneo, podendo ser confirmado pelo exame de ecodopplercardiograma, nos sinais clínicos (ausência de cianose e sincope) e nos exames de sangue (ausência de policitemia), sendo um fator prognóstico positivo para o paciente. A maioria dos animais com desvio da esquerda para direita são assintomáticos e possuem discreta intolerância ao exercício, porém podem apresentar tosse e dispnéia devido ao edema pulmonar, sendo que os sinais clínicos variam de acordo com o grau de fluxo (FOSSUM, 2014). O achado de exame físico desta cardiomiopatia congênita é o sopro continuo “de maquinaria” na base 33 esquerda do coração ou na região axilar esquerda e o pulso femoral é forte ou hipercinético (pulso em martelo d’agua) (CANAVARI, 2015). Os achados de exame físico característicos, fazem com que o diagnóstico de PDA seja simples e direto na maioria dos animais acometidos. Quando o sopro continuo “de maquinaria” não é audível, exames de imagem podem ser requeridos, como: radiografias torácicas, ecodopplercardiograma e angiografia (FOSSUM, 2014). O ecodopplercardiograma é o exame de escolha dos veterinários, pois além de diferenciar outras anormalidades congênitas, fornecem informações estruturais e funcionais, detectando assim a localização da origem do sopro (FOSSUM, 2014). Para o diagnóstico de PDA neste exame, pode ser percebido o aumento atrial esquerdo, dilatação e hipertrofia ventriculares esquerdas, dilatação de artéria pulmonar, aumento na velocidade de ejeção aórtica e um padrão de fluxo Doppler turbulento reverso, ou seja, fluxo contínuo e retrógrado na artéria pulmonar, além de aumento discreto à moderado na velocidade do fluxo da aorta e dilatação do anel mitral, devido à uma insuficiência secundária à uma sobrecarga de volume do lado esquerdo (PARRA, 2008). Em todos os animais, independentemente do porte e da idade, a correção cirúrgica é feita assim que o problema é descoberto, a não ser que possuam alguma outra alteração que contra-indique o procedimento (FOSSUM, 2014). Caso os animais apresentem edema pulmonar devem ser tratados com furosemida por 24 a 48 horas antes da cirurgia. As arritmias supraventriculares devem ser controlados por meio de ß – bloqueadores ou bloqueadores de canais de cálcio (Atenolol ou Amlodipina) (ASSUMPÇÃO, 2012). No caso de Nick, não foi necessário prescrever tais medicamentos antes da cirurgia, pois este não apresentava alterações nos exames e se apresentava estável. O tratamento consiste na oclusão do ducto arterioso patente, existindo duas técnicas cirúrgicas que podem ser aplicadas para a correção da PDA, sendo a mais clássica a toracotomia com posterior ligadura do ducto, a qual foi a técnica de escolha realizado no caso. Um método alternativo e menos invasivo é a embolização espiralada da PDA, realizada por meio da oclusão percutânea do ducto utilizando-se um dispositivo trombogênico (molas transversais ou Plugs vasculares Amplatzer) (JOHNSON, 2007; MILLER et al., 2006). As técnicas menos invasivas, mostraram ocluir efetivamente uma ampla variedade de ductos de formas e tamanhos diferentes, com resultados melhores que a ligadura cirúrgica (FOSSUM, 2014), 34 porém é necessário materiais e equipamentos específicos para tais técnicas, se tornando um tratamento mais custoso. A técnica clássica, é realizada por toracotomia através do quarto espaço intercostal esquerdo. Logo após, os pulmões são rebatidos e o ducto pode ser observado ventralmente à aorta e dorsalmente à artéria pulmonar, exatamente no local onde o nervo vago esquerdo é encontrado (EYSTER, 1998). O ducto é então dissecado e isolado por meio de uma pinça curva, sendo passado dois fios por de baixo deste (Figura 7A), no momento da dissecção deve-se tomar cuidado para não rompê-lo. A técnica é finalizada dando um nó no fio mais próximo à aorta e em seguida no fio próximo à artéria pulmonar (Figura 7B), no momento da oclusão pode ocorrer bradicardia, sendo disponibilizado um anticolinérgico caso a frequência cardíaca caia para menos que 60 bpm (FOSSUM, 2014). As complicações são ruptura do ducto e shunt residual. Dependendo da idade do animal e da gravidade da cardiomegalia, os pacientes podem apresentar-se clinicamente normais no período pós-cirúrgico e o tamanho do coração tende a normalizar. Se a válvula mitral for estruturalmente normal, a regurgitação mitral e o consequênte sopro sistólico se resolvem após a ligadura ou oclusão do ducto (EYSTER, 1998; WARE, 2006). No entanto, alguns animais podem não apresentar reversão das alterações estruturais cardíacas após o procedimento de interrupção do fluxo pelo ducto, pois a sobrecarga de volume nas câmaras cardíacas ocorreu por um período prolongado (ISHIKAWA et al., 2013). A 35 Figura 7. (A) Imagem fotográfica ilustrando a localização e posicionamento de duas ligaduras ao redor do ducto arterioso (seta) de Nick. (B) Ducto arterioso ocluído (seta) por meio da técnica de ligadura circunferencial, técnica clássica (Imagens gentilmente cedidas pela Dra. Adriana Tomoko Nishiya). Durante o procedimento cirúrgico não houve intercorrências, animal manteve a pressão arterial dentro da normalidade e apresentou boa recuperação anestésica. No mesmo dia, Nick foi encaminhado para clínica particular para internação sendo prescrito: Amoxicilina com Clavulanato (22 mg/kg, BID, 7 dias), Dipirona (25 mg/kg, TID, 5 dias), Tramadol (3 mg/kg, TID, 5 dias), Ranitidina (2 mg/kg, BID, 7 dias) e Prednisona (0,5 mg/kg, SID, 5 dias). O último retorno acompanhado foi no dia 25 de agosto, onde a tutora relata bom estado geral do animal e processo de cicatrização adequado (Figura 8), sendo realizado o exame ecodopplecardiografia para acompanhamento. No exame foi observado fluxo sistólico turbulento no interior de tronco pulmonar, com direção esquerda-direita, e gradiente de pressão de aproximadamente 151 mmHg, indicativo de fluxo residual pós-cirúrgico. Na literatura, esta complicação é considerada rara devido à aderência que forma no local (FOSSUM, 2014). A B A 36 Figura 8 – Imagem fotográfica ilustrando a ferida em processo de cicatrização após 20 dias de pós- operatório (Arquivo pessoal, 2016) Conclusão O caso foi conduzido de maneira correta, porém devido à grande dor pós- operatória poderia ter sido realizado a colocação de um tubo de analgesia e dreno torácico para eventual formação de pneumotórax. Quanto ao shunt residual, indicaria o acompanhamento por meio do exame de ecodopplercardiograma, pois a oclusão do ducto pode ocorrer posteriormente, por meio das formações de aderências no local. 3.4 CASO CLÍNICO 4 Resenha Nome do Animal: Penélope Sexo: fêmea Espécie: felino Raça: SRD Idade: 1 ano e 6 meses Peso: 3,5 Kg Anamnese – Queixa Principal No dia 13 de julho de 2016, animal veio ao Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi com histórico de hematúria há uma semana, oligúria, oligodipsia e hiporexia. Tutora relata ter levado o animal para clínica particular onde este solicitou ultrassonografia abdominal, hemograma completo 37 (Tabela 8) e bioquímico (Tabela 9). À anamnese não foram relatadas outras alterações sistêmicas. Tabela 8. Valores de hemograma completo de Penélope, acompanhado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, 2016. Eritograma Valores Referência Unidade Eritrócitos 7,89 5,0 - 9,5 milhões/mm3 Hemoglobina 14,90 14,0 - 16,0 g/dl Hematócrito 35,10 28 - 45 % V.C.M. 44,48 63 - 77 u3 H.C.M 15,81 15 - 17 pg C.H.C.M. 31,05 31 - 36 g/dl Leucograma Leucócitos 7,1 6,0 - 17,0 mil/mm3 Segmentados 85,00 55 - 80 % Eosinófilos 0,00 1 - 9 % Linfócitos 15,09 13 - 40 % Monócitos 0,00 1 - 6 % Plaquetas 434,00 300 - 800 103/mm3 Proteina Total 7,10 6,0 - 8,8 g/dl valores em negrito estão fora dos valores de referência Tabela 9. Valores de bioquímico sérica de Penélope, acompanhado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi, 2016. Bioquímico Valores Referência Unidade Creatinina 8,39 0,8 - 1,4 mg/dl Fosfatase Alcalina 21,00 1,2 - 6,4 U.I./L GGT 4,30 1,2 - 6,4 U.I./L ALT 105,00 7 - 92 U.I./L Uréia 94,00 15 - 40 mg/dl valores em negrito estão fora dos valores de referência Na ultrassonografia observou-se os rins direito e esquerdo medindo respectivamente em torno de 4,2 cm e 3,4 cm, apresentando contornos regulares, ambos com arquitetura interna alterada com perda da definição córtico-medular devido à discreto e moderado quadro de hidronefrose, em rim direito e esquerdo, respectivamente (sugere-se processo obstrutivo), ambos com ecogenicidade das corticais preservadas. Observou-se dilatação proximal de ureter direito, medindo em torno de 0,5 cm de diâmetro, destacando-se imagem amorfa, hiperecogênica, produtora de sombra acústica posterior, medindo em torno de 0,5 cm onde estima- se estar obstruindo parcialmente o lúmen ureteral (sugere-se hidroureter associado 38 a presença de urólitos). No ureter esquerdo, observou dilatação medindo em tono de 0,2 a 0,4 cm de diâmetro, extendendo-se com aspecto tortuoso desde a pelve renal até a região abdominal mesogástrica, destacando-se imagem arredondada, hiperecóica produtora de sombra acústica posterior, medindo em torno de 0,5 cm e que parece obstruir todo o lúmen ureteral. Devido aos resultados dos exames, a Penélope foi diagnosticada com hidronefrose bilateral e cálculo ureteral bilateral sendo encaminhada para o Hospital Veterinário Anhembi Morumbi para o tratamento cirúrgico. Exame Físico Geral TPC: 3 segundos Temperatura retal: 39,2˚C Mucosas: hipocoradas – ocular e oral Hidratação: 75% Pulso: forte e rítmico Linfonodos: não reativos Nível de consciência: alerta Sem sensibilidade dolorosa à palpação abdominal FC: 170 bpm – bulhas cardíacas normorítmicas e normofonéticas FR: 48 mpm – campos pulmonares limpos Exames Complementares Para o acompanhamento da função renal e melhora do quadro clínico da Penélope foi necessário realizar o exame de bioquímica sérica e fluidoterapia intravenosa por seis dias, com o objetivo de reestabelecer o equilíbrio hidroeletrolítico. Tratamento O tratamento instituído foi a correção cirúrgica pela técnica de ureterotomia bilateral devido a presença de cálculo ureteral bilateral e colocação de cateter duplo “J” unilateral. 39 Discussão Os urólitos são concreções policristalinas macroscópicas composta por cristalóides orgânicos ou inorgânicos e uma pequena quantidade de matriz orgânica (BIRCHARD & SHERDING, 2006). Os urólitos ureterais são denominados de ureterolitíases e resultam, normalmente, da migração dos urólitos renais (FERNANDES, 2015), podendo estes levar à hidronefrose, devido a obstrução do ureter, dificultando o transporte da urina dos rins até à bexiga. Os urólitos a base de oxalato de cálcio, tem grande incidência de ureterolitíases nesta espécie, porém a formação destes não é completamente entendida (FERNANDES, 2015). Em estudos feitos em seres humanos, acredita-se que a formação de urólitos de oxalato de cálcio não estão relacionados com a estase urinária, infecção, ou outra causa primária de urolitíase, mas sim ter início à uma lesão na papila renal (FERNANDES, 2015). No entanto, segundo Fernandes (2015), até hoje não existem trabalhos explicando a sua etiopatogenia em cães e gatos. Existem diversos fatores metabólicos que aumentam o risco de formação de urólitos de oxalato de cálcio, como a presença hipercalcemia, acidemia, hiperoxalúria, hiperconcentração e baixo pH urinário, e doença renal crônica prévia. Muitos destes fatores estão associados à dieta do animal, contudo não é claro o papel destes fatores especificamente na formação de ureterolitíases ou se secundariamente causam alguma lesão renal (FERNANDES, 2015). Penélope tinha uma alimentação adequada baseada em uma dieta específica para a espécie e até então, não havia histórico de doença renal crônica. A análise do urólito, revelou composição à base de oxalato de cálcio. Os urólitos em felinos, mais frequentemente submetidos a análise, são de oxalato de cálcio e estruvita (FERNANDES, 2015). No entanto, há uma grande variação na prevalência dos tipos de mineral que acometem os felinos, o que faz com que não seja possível pressupor o tipo de mineral por meio da espécie, raça, gênero e idade (FERNANDES, 2015). A obstrução ureteral unilateral completa, causa um aumento da pressão ureteral o que resulta no aumento quase imediato da pressão tubular proximal, afetando as forças de filtração renal e o fluxo sanguíneo. Devido a estas forças, o gradiente de pressão hidrostático na rede de capilares glomerulares diminui, resultando num declínio da taxa de filtração glomerular (TFG). Após 24 horas, a 40 diminuição da TFG no rim obstruído induz um aumento compensatório da TFG no rim contralateral (FERNANDES, 2015). No entando, no caso da Penélope a obstrução ocorreu em ambos os ureteres, fazendo com que a lesão renal estabeleça em ambos os rins. Os sinais clínicos que suspeitam de litíases de trato urinário superior em gatos são a hematúria persistente ou intermitente, não associada a sinais do trato urinário inferior, como as disúria, polaquiúria e estrangúria. Dependendo do grau de obstrução ureteral, os animais podem desenvolver sinais clínicos associados à azotemia, se tornando letárgicos, com redução de apetite, êmese e perda de peso, como também podem tornar-se anúricos, oligúricos ou poliúricos (FERNANDES, 2015). A cólica nefrótica que conduz a um diagnóstico precoce no Homem é raramente descrita nos animais (ADIN et al., 2003). Uma dor abdominal na zona de projeção dos rins poderá ser perceptível no exame físico do animal ou ser descrita pelo proprietário. O exame físico pode ainda revelar alterações do tamanho e forma dos rins (FERNANDES, 2015). Além do exame clinico completo, o diagnóstico definitivo é baseado nos exames de imagem, como a radiografia ou ultrassonografia abdominal, o que permite a detecção dos urólitos e por vezes do seu número, forma e localização. Um diagnóstico e tratamento precoce de obstrução é essencial para limitar o grau de irreversibilidade da lesão do rim afetado (FERNANDES, 2015). Os achados laboratoriais associados a ureterolitíase dependem essencialmente do grau de comprometimento da função renal, da presença ou não de infeção e ainda do seu caráter obstrutivo (FERNANDES, 2015). Os achados encontrados são a azotemia, anemia, leucocitose nos casos onde há desenvolvimento de pielonefrite, hiperfosfatemia, hipercalemia e acidose metabólica (FERNANDES, 2015). O tratamento médico com o objetivo de restaurar o volume de fluidos, corrigir os desequilíbrios eletrolíticos e ácido-base, administrar antiespasmóticos para promover o relaxamento do ureter, antiinflamatório, diuréticos e antibióticos, não são efetivos para solucionar a causa, sendo apenas usados como tratamento de suporte. Sendo assim, a escolha terapêutica é a cirúrgica com o objetivo de remover os urólitos. As técnicas utilizadas para a remoção cirúrgica de ureterolitíases incluem a ureterotomia, neoureterocistotomia e a litotripsia (FERNANDES, 2015). No caso da 41 Penélope, optou-se pela técnica de ureterotomia com posterior colocação de um stent ureteral com formato duplo pidtail (ou duplo J) (Figura 9A). A técnica consistiu basicamente em uma incisão longitudinal no ureter esquerdo próximo ao cálculo, sendo então removido (Figura 9B), foi então avaliado por meio da palpação a existência de cálculo em ureter direito, porém não foi encontrado, sendo decidido de que o stent seria apenas posicionado do lado que foi retirado o cálculo. O objetivo do stent ureteral é diminuir o risco de estenose ureteral e uroabdómen após a urereterotomia. Além de direcionar a urina da pelve renal para o interior da bexiga contornando a obstrução ureteral e promover a dilatação ureteral passiva prevenindo a migração de nefrólitos que resultariam em futura obstrução ureteral (FERNANDES, 2015). O stent ureteral utilizado em gatos é do tipo “duplo pigtail”, desenhado de forma a formar um “caracol” na pelve renal e outro na bexiga para impedir a sua migração, apresenta ainda conformação multifenestrado para permitir o fluxo de urina através e em torno do stent (FERNANDES, 2015), podendo estes permanecer por anos. No entanto, a estenose encontrada no terço distal era tão intensa, que não foi possível passar o stent através do ureter, sendo necessário o emprego da técnica de ureterectomia parcial, removendo a parte estenosada, e posteriormente foi realizada a ureteroneocistostomia, sendo possível nesta situação, a introdução do cateter duplo “J” através do óstio ureteral (Figura 9C). A C B 42 Figura 9. (A) Demonstração do cateter duplo “J”. (B) Ureterotomia e retirada do cálculo em ureter esquerdo (seta). (C) Posicionamento do cateter duplo “J” em ureter esquerdo via cistotomia acessando à junção ureterovesical (Arquivo pessoal, 2016). Segundo Fernandes (2015), as complicações dos stents são raras, sendo relatadas polaquiúria (17%), migração do stent (5%), ureterite (3%), crescimento de tecido no stent (7%), hematúria crônica (10%), refluxo ureterovesical (1%) e infecções do trato urinário (20%). Como a Penélope ainda apresentava alterações metabólicas demostradas nos exames, a internação foi necessária para manter o estado de hidratação e prevenir prováveis distúrbios metabólicos e ácido-básicos. O uso de antibióticos, como a ciprofloxacina (10 mg/kg, SID, 10 dias), foi utilizado com o objetivo de evitar infecções do tratado urinário pois estas podem estar presentes devido à lesões teciduais induzidas pelos urólitos. O uso de antiespasmódico, como escopolamina (25 mg/kg, BID, 7 dias) teve como objetivo relaxar a musculatura do trato urinário e os analgésicos, como o cloridrato de tramadal (3 mg/kg, BID, 7 dias), para o alívio da dor pós-operatória. Penélope retornou no dia 29 de julho se apresentado com bom estado geral e melhora dos sinais clínicos. O tutor foi orientado quanto a monitoração do animal, com ênfase ao início dos sinais clínicos, podendo esses serem relacionados à A C B 43 cirurgia ou a recidiva da urolitíase, também foi explicado a importância do manejo nutricional e ambiental, que apesar de não haver evidências na literatura de que estes sejam um fator contribuinte para a formação de cálculos de oxalato de cálcio, são fatores que podem prevenir outros tipos de cálculos. O acompanhamento do animal para a avaliação da função renal, foi marcada de quinze em quinze dias. Conclusão O caso foi conduzido corretamente, porém a falta do exame de urina avaliando a densidade e o pH, poderiam ter sido realizadas, uma vez que urinas concentradas e com pH ácido podem contribuir com a formação de urólitos de oxalato de cálcio. 3.5 CASO CLÍNICO 5 Resenha Nome do Animal: Cherry Sexo: fêmea Espécie: canino Raça: Teckel Idade: 13 anos Peso: 5,0 Kg Anamnese – Queixa principal Animal veio ao Hospital Veterinário Público no dia 7 de outubro, com histórico de briga há quatro dias, sendo observado dispnéia, cianose, sialorréia, dificuldade ao locomover-se, prostação, hiporexia, inchaço progressivo em subcutâneo (enfisema subcutâneo) (Figura 10) e hematoma em região cervical ventral. Cherry já havia sido tratada em clínica particular com cefalexina, dipirona e cetoprofeno, não apresentando melhora dos sinais clínicos. 44 Figura 10. Imagem fotográfica ilustrando enfisema subcutâneo generalizado (Arquivo pessoal, 2016). Exame Físico Geral TPC: 3 segundos Temperatura retal: 38,6˚C Mucosas: normocoradas Hidratação: 100% Pulso: forte e rítmico Linfonodos: não reativos Nível de consciência: alerta FC: 110 bpm – bulhas cardíacas normorítmicas e normofonéticas FR: taquipneico – não foi possível realizar a auscultação Sem sensibilidade dolorosa à palpação abdominal Presença de crepitação à palpação por toda a região corporal Exames Complementares Devido ao histórico de briga, hematoma cervical e enfisema subcutâneo generalizado a principal suspeita era ruptura de traqueia. Com o objetivo de confirmar o diagnóstico, foi solicitado radiografia torácica e cervical, exames de sangue não foram solicitados devido à dificuldade do acesso (enfisema subcutâneo). Na radiografia observou-se grande quantidade de conteúdo gasoso (radiolucente) em subcutâneo na região cervical e torácica com o lúmen e trajeto traqueal preservados, o que não exclui a possibilidade de ruptura de traquéia, e pneumomediastino. As demais estruturas estavam dentro do padrão de normalidade. 45 Tratamento A escolha terapêutica foi cirúrgica, pelo o uso da técnica de traqueorrafia. O procedimento foi realizado no mesmo dia e a Cherry sofreu drenagem subcutânea prévia com uso de agulha 40x12 tendo como objetivo, diminuir o enfisema subcutâneo. A técnica cirúrgica consiste em incisar a pele e o tecido subcutâneo ao longo da linha média cervical ventral, a partir da laringe até o manúbrio. Em seguida, afasta-se os músculos esterno-hioideo e estenocefálico lateralmente para exposição da traquéia cervical, deve-se tomar cuidado para não lesionar os nervos laríngeos recorrentes, a artéria carótida, a veia jugular, o tronco vago simpático, os vasos tireoidianos ou o esôfago (FOSSUM, 2014). Foi observada presença de uma única laceração em região caudo-ventral de aproximadamente dois centímetros. A traqueorrafia foi feita com padrão de sutura ponto simples isolado utilizando fio Vicryl 3-0 através do ligamento anular e o fechamento da região cervical foi realizado em dois planos: subcutâneo com padrão de sutura Cushing, utilizando fio Nylon 3-0 e pele com padrão Wolf, utilizando o mesmo tipo de fio. Sendo posteriormente realizado bandagens compressivas. Após a cirurgia, animal foi encaminhado para internação onde foi realizado fluidoterapia intravenosa por três dias, sendo prescrito Amoxicilina com Clavulanato (25 mg/kg, BID, 7 dias), Tramadol (2 mg/kg, BID, 5 dias) e Meloxicam (0,1 mg/kg, SID, 3 dias). Após a resolução do enfisema subcutâneo e melhora do quadro clínico geral foi realizado exames de sangue (Tabelas 10 e 11) para avaliação do estado geral, sendo que Cherry recebeu alta retornando após sete dias para retirada dos pontos. 46 Tabela 10. Valores de hemograma completo de Cherry, acompanhado no Hospital Veterinário Público, 2016. Eritograma Resultado Referência Unidade Eritrócitos 7,2 5,5 - 8,5 milhões/mm3 Hemoglobina 17,7 12,0 - 18,0 g/dl Hematócrito 55 37 - 55 % V.C.M. 77,7 60,0 - 77,0 u3 H.C.M. 24,6 19,5 - 24,5 pg C.H.C.M. 31,7 31,0 - 36,0 g/dl Plaquetas 545 200 - 500 103/mm3 Leucograma Leucócitos 26,00 6,0 - 17,0 mil/mm3 Segmentados 85,00 55 - 80 % Linfócitos 13,00 13 - 40 % Monócitos 2,00 1 - 6 % valores em negrito estão fora dos valores de referência Tabela 11. Valores de bioquímica sérica de Cherry, acompanhado no Hospital Veterinário Público, 2016. Bioquímico Resultado Referência Unidade Albumina 2,8 2,3 - 3,8 g/dl ALT 61 7,0 - 92 U.I./L Creatinina 0,5 0,5 - 1,6 mg/dl Fosfatase alcalina 93 10 - 96 U.I./L Uréia 45 15 - 40 mg/dl valores em negrito estão fora dos valores de referência Discussão Lesões traumáticas em região de traqueia não são muito comuns em pequenos animais mas podem ser o resultado de mordidas em região cervical, tiros, acidentes automobilísticos, lavagens transtraqueal, superinflação do cuff contido na sonda endotraqueal, após broncoscopias, durante ou após cirurgias de traqueia, durante a punção da veia jugular ou tramas penetrantes. Feridas não perfurantes de traqueia podem ser devido a coleiras enforcadoras ou a contusões traumáticas nesta região (KIRPENSTEIJN, 2006). Os sinais clínicos incluem, dispneia, tosse, enfisema subcutâneo progressivo, sialorréia, cianose e presença de feridas. Dependendo da localização do trauma pode ocorrer enfisema mediastinal, pneumotórax ou pneumoretroperitoneo. Em casos de trauma traqueal cervical o enfisema subcutâneo pode envolver apenas a região peritraqueal como também envolver toda a área subcutânea do corpo do animal, o que foi observado neste caso. Alguns animais não apresentam sinais 47 respiratórios, podendo apenas apresentar enfisema subcutâneo leve (KIRPENSTEIJN, 2006). Apesar do histórico e dos achados do exame físico serem bastante sugestivos de ruptura de traqueia, as radiografias são essenciais e devem ser feitas nas regiões onde há suspeita do trauma para determinar a localização e a extensão da lesão traqueal além de avaliar a presença de peneumomediastino, peneumotorax, contusões pulmonares, fraturas de costelas e outras complicações que podem estar em conjunto com trauma traqueal e/ou torácico. A localização exata da ruptura geralmente não é possível devido à grande quantidade de enfisema (radiolucente), obscurecendo detalhes na radiografia, porém nos casos de avulsão traqueal, observa-se separação dos anéis traqueais (KIRPENSTEIJN, 2006). Em casos de dispneia grave, o animal deve ser estabilizado com a inserção de um tubo endotraqueal, pois nestes casos o risco de parada cardíaca é alta. Caso o enfisema esteja regredindo e sem sinais de “sofrimento” pulmonar, geralmente é recomendado o tratamento de suporte, ou seja, oxigênioterapia, bandagens compressivas, sem restringir mecanicamente a respiração e repouso. Em lesões de traqueia consideradas pequenas, opta-se pela cicatrização por segunda intensão, onde o fechamento completo ocorre por volta dos trinta dias. O pneumotórax pode ser corrigido por meio da toracocentese e colocação de um dreno torácico (KIRPENSTEIJN, 2006). No caso da Cherry o tratamento foi cirúrgico, pois este é recomendado quando há grande liberação de ar a partir da traqueia e quando há comprometimento do padrão respiratório, indicando descompensação. Duas técnicas podem ser utilizadas: a técnica de traqueorrafia, descrita anteriormente e a ressecção e anastomose traqueal. A remoção de um seguimento traqueal pode ser necessária quando a laceração traqueal é grave ou avulsão traqueal esta presente, podendo ser removido aproximadamente 20 a 50% da traqueia de um cão adulto (aproximadamente 8 a 10 anéis) porém, muitas vezes, opta-se pela cicatrização por primeira ou segunda intensão devido as complicações de: estenose; edema de glote devido a manipulação prolongada; deiscência dos pontos; infecções; fístulas traqueoesofágicas; necrose devido à tensão ou a lesão do suprimento vascular da traquéia e recuperação pós-operatório prolongada (FOSSUM, 2014). A resolução do enfisema subcutâneo ocorre em torno de sete a dez dias, caso não ocorra melhora o recomendado é realizar novamente a cirurgia para 48 explorar a região acometida (BRIGHT, 2011). Radiografias podem ser feitas para acompanhar a resolução do enfisema. O prognóstico para feridas penetrantes, diagnosticadas precocemente são bons, assumindo que não há dano à outras estruturas, porém dependendo da técnica utilizada e da extensão do dano, pode ocorrer algum grau de estenose, caso o grau de estenose seja grave, deve ser feita traqueostomia permanente (BRIGHT, 2011). Cherry voltou ao Hospital Veterinário Público no dia 17 de outubro, sendo relatado pelo tutor melhora completa dos sinais clínicos e resolução do processo de cicatrização. Conclusão Apesar de casos de ruptura de traqueia serem menos frequentes, os animais com esta afecção são facilmente diagnosticados, sendo tratados de maneira rápida. O caso foi conduzido de maneira correta em relação ao diagnóstico e tratamento, tendo bom resultado pós-cirúrgico e melhora significativa do padrão respiratório. 4. RECOMENDAÇÕES E CONCLUSÕES O estágio curricular foi realizado em dois locais, ambos no setor de clínica cirúrgica de pequenos animais. O primeiro no período de julho à agosto de 2016 no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi - HOVET e o segundo no período de setembro à outubro de 2016 no Hospital Público Zona Leste - ANCLIVEPA. O estágio realizado no Hospital Veterinário da Universidade Anhembi Morumbi ofereceu grande aprendizado teórico, prático e pessoal uma vez que os estagiários eram submetidos à uma intensa rotina, com grande contato com os proprietários e por serem considerados de extrema ajuda nos atendimentos dos animais como também nas intervenções cirúrgicas, havendo total liberdade para atuar e praticar, porém sempre sob supervisão. O ponto positivo foi que, apesar da rotina ser grande, os estagiários sempre tinham contato com os residentes e docentes para eventuais perguntas, esclarecimentos e discussão de casos, sendo que estes davam total atenção e não mediam esforços para o entendimento do aluno. A elevada rotina do Hospital permitiu que diversas cirurgias, técnicas cirúrgicas e afecções ainda não vistas na graduação fossem acompanhadas e 49 acrescentadas ao conhecimento dos estagiários. Portanto este estágio ofereceu crescimento tanto profissional como pessoal, sendo de grande proveito. O estágio realizado em um hospital público, foi uma escolha importante, uma vez que permitiu ao estagiário vivenciar a rotina de um médico veterinário onde os recursos diagnósticos são escassos. Um pontos negativo foi a intensa rotina, fazendo com que na grande maioria das vezes o exame físico geral e a anamnese completa não fossem realizados a contento, sendo perguntado apenas aspectos sobre a queixa principal. Outro ponto importante se relaciona ao fato da maioria dos proprietários serem carentes, portanto alguns exames, como ecocardiograma, eletrocardiograma, citologia, histopatologia e eletrólitos não eram realizados, dificultando uma avaliação mais rígida dos pacientes submetidos à procedimentos cirúrgicos. Por outro lado, a grande rotina fez com que o estagiário acompanhasse diversas cirurgias, principalmente as cirurgias ortopédicas. Ambos os locais apresentaram uma rotina intensa, com variados casos, onde foi possível participar ativamente de todas as áreas de interesse, proporcionando acompanhar a vivência de um profissional da área atendendo todas as expectativas do graduando. Foi uma experiência e um grande aprendizado, que certamente possibilitou a complementação teórico prático de conhecimentos adquiridos na graduação. Outra etapa foi concluída e com isso a convicção de realizar meu trabalho como médico veterinário consolidou-se ainda mais. 50 TÉCNICA DE VALVULOPLASTIA POR BALÃO VERSUS VALVULOPLASTIA POR PACTH-GRAFT NO TRATAMENTO DA ESTENOSE PULMONAR EM CÃES: REVISÃO SISTEMÁTICA Trabalho Científico, como parte do Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação apresentado à Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, campus de Araçatuba, para obtenção do grau de Médico Veterinário. Aluna: Jessica Akemi Seto Supervisor: Prof.˚ Ass. Dr. Paulo Sérgio Patto dos Santos Araçatuba – São Paulo 2016 51 TÉCNICA DE VALVULOPLASTIA POR BALÃO VERSUS VALVULOPLASTIA POR PACTH-GRAFT NO TRATAMENTO DA ESTENOSE PULMONAR EM CÃES: REVISÃO SISTEMÁTICA Jessica Akemi Seto; Paulo Sérgio Patto dos Santos 5. RESUMO A estenose pulmonar (EP) é a terceira doença cardíaca congênita (DCC) mais diagnosticada no cão, caracterizada por uma obstrução do fluxo sanguíneo proveniente do ventrículo direito (VD). Possui caráter hereditário, porém pode ocorrer de forma espontânea. A maioria dos cães são assintomáticos, mas podem apresentar sinais de intolerância ao exercício, síncope e ascite. O diagnóstico é feito pela ecocardiografia o qual permite detectar a estenose, classificá-la e determinar a gravidade da doença. Quando a EP é considerada de grau moderado a severo, o tratamento recomendado é a correção devido ao risco de morte súbita. A correção da estenose pode ser feita pelas técnicas de valvuloplastia por patch grafting, valvulectomia via arteriotomia pulmonar, colocação de stents intravasculares no trato de saída do ventrículo direito (TSVD) e cateter com balão de corte, como também por técnicas minimamente invasivas, denominadas de valvuloplastia por balão (VB). A escolha da técnica correta irá influenciar diretamente no sucesso do procedimento assim como o prognóstico do paciente. O objetivo da revisão sistemática é comparar a eficácia de duas técnicas para a EP, valvuloplastia por balão e valvuloplastia por patch grafting, observando qual técnica apresentou melhores valores de gradiente de pressão (GP), melhora dos sintomas e menores complicações. Foram analisados dez artigos pesquisados nas bases de dado Wiley Online Library, PubMed e Google Acadêmico, sendo complementado com uso de livros. A técnica de patch grafting foi o que resultou em menores valores de GP, entretanto apresentou complicações mais graves e maior mortalidade. Verifica-se também que ambas obtiveram sucesso em reduzir os sintomas dando melhor qualidade de vida para o animal. Conclui-se que a técnica cirúrgica de patch grafting constitui uma alternativa com bons resultados, e é uma opção para aqueles animais em que a VB não é recomendada. PALAVRAS-CHAVE: Estenose pulmonar. Valvuloplastia por balão. Valvuloplastia por patch-graft. Canino. 52 6. INTRODUÇÃO 6.1 ESTENOSE PULMONAR A estenose pulmonar (EP) é a terceira doença cardíaca congênita (DCC) mais observada em cães, após a persistência do ducto arterioso (PDA) e estenose subaórtica (ESA) (FOSSUM et al., 2013; SERRANO, 2012). A EP consiste no estreitamento da artéria pulmonar, valva pulmonar ou da via de saída do ventrículo direito (VSVD) (FOSSUM, 2013). A malformação primária da válvula pulmonar é o defeito mais frequentemente observado (SERRANO, 2012). A estenose valvular pode ser classificada em tipo A e B. A tipo A ocorre quando os folhetos valvulares estão leve ou moderadamente espessados, com separação incompleta ou fusão destes, assumindo uma forma de cúpula em sístole (DUARTE, 2015), o diâmetro anular apresenta-se normal e a relação anel aórtico/anel pulmonar menor que 1,2 (FOSSUM et al, 2013). Enquanto que no tipo B consiste em folhetos valvulares evidentemente espessados, deformados e imóveis, com hipoplasia do anel valvular, mas sem fusão comissural (BUSSADORI et al., 2001) e relação anel aórtico/anel pulmonar maior que 1,2 (FOSSUM et al., 2013). Segundo Oliveira et al. (2011), a EP do tipo A é mais comum, correspondendo a aproximadamente 70% dos casos. Esta classificação é importante para o método de escolha na correção cirúrgica. Uma obstrução ao fluxo de saída proveniente do ventrículo direito aumenta a resistência à sua saída, causando um aumento proporcional na pressão sistólica ventricular (DUARTE, 2015), este aumento durante a sístole predispõe à hipertrofia concêntrica, sendo esta proporcional à severidade da obstrução (KIENLE & THOMAS, 2002; OYAMA et al., 2013). Em alguns cães, à medida que essa se desenvolve, surge também uma hipertrofia secundária na região infundibular da VSVD (DUARTE, 2015), este estreitamento é maior durante a sístole, produzindo uma obstrução dinâmica que contribui para a estenose fixa (FOSSUM et al., 2013), deste modo a obstrução dinâmica pode ir agravando a estenose fixa. A maioria dos cães com menos de um ano de idade são assintomáticos. Cães com obstruções severas podem apresentar intolerância ao exercício, síncope ou distensão abdominal devido à ascite (FOSSUM et al., 2013), a cianose pode estar presente quando há doenças cardíacas concomitantes, como a Tetralogia de Fallot ou PDA. O principal sinal clínico é um sopro sistólico de ejeção, o qual é melhor auscultado sobre a base cardíaca esquerda (DUARTE, 2015; SERRANO, 2012). É 53 possível emitir um diagnóstico provável mediante a predisposição racial, a história clínica, os achados ao exame físico e avaliações eletrocardiográficas ou radiográficas, sendo confirmado por avaliação ecocardiográfica, a qual permite também avaliar a gravidade da doença, identificar algum defeito concomitante e decidir qual o tratamento a ser adotado (ESTRADA et al., 2006). O Doppler espectral permite determinar o gradiente de pressão (GP), sendo possível classificar a severidade da doença (SERRANO, 2012), dividindo-se em estenose média onde os GP variam entre 20 a 49 mmHg; moderada em que os GP variam entre 50 a 80 mmHg; e severa em que o GP é maior que 80 mmHg (BUSSADORI et al. 2001; DUARTE, 2015; FOSSUM et al. 2013). Os animais com EP de gravidade leve a moderada, sem sinais clínicos, geralmente, não requerem tratamento (DUARTE, 2015). O tratamento médico convencional (digitálicos, diuréticos e beta-bloqueadores) pode ser empregado para animais sintomáticos e possível insuficiência cardíaca congestiva direita (ICCD). A utilização destes medicamentos é questionável em termos de benefício (DINIS, 2008; ESTRADA et al., 2006). A cirurgia é recomendada quando o GP é elevado, quando a hipertrofia ventricular direita é considerável ou há outras alterações secundárias significativas em animais assintomáticos, ou ainda se existirem sinais clínicos (FOSSUM et al., 2013; STAUDTE et al., 2004). Não existe ainda na literatura um valor exato de GP a partir do qual é recomendada a cirurgia, as opiniões variam entre 50 e 80 mmHg, sendo, por isso, fundamental a avaliação dos outros parâmetros já mencionados (ESTRADA, et al. 2006; STAUDTE et al., 2004). Duarte (2015), cita uma técnica não cirúrgica, denominada valvuloplastia por balão e seis técnicas cirúrgicas, que são: valvuloplastia por patch grafting, valvuloplastia fechada por dilatação por acesso transventricul