Revista EDICIC, v.1, n.1, p.262-276, Ene./Mar. 2011. Disponible en: .
MEMÓRIA ORGANIZACIONAL, MEMÓRIA CORPORATIVA E
MEMÓRIA INSTITUCIONAL: DISCUSSÕES CONCEITUAIS E
TERMINOLÓGICAS
Letícia Gorri Molina1 e Marta Lígia Pomim Valentim2
1Doutoranda do PPGCI Unesp/Marília – Docente da Universidade Estadual de
Londrina (UEL) – Brasil
2Docente do PPGCI Unesp/Marília – Brasil
RESUMO
A proposta do presente trabalho é apresentar uma discussão conceitual e terminológica
relativa aos termos: memória organizacional, memória corporativa e memória institucional,
visto que é um assunto ainda pouco estudado e explorado na área acadêmica. O estudo é
de cunho teórico e o tipo de pesquisa é bibliográfico. Como fontes de pesquisa, foram
utilizados livros, bibliotecas digitais de teses e dissertações no âmbito do país e o Portal de
Periódicos da CAPES. Este estudo está em andamento e faz parte da pesquisa de
doutorado “Memória organizacional e a constituição de bases de conhecimento”. Como
resultado parcial, observa-se que a questão da “memória” é estudada por diferentes áreas
do conhecimento, como: Psicologia, Neurociências, História entre outras; os conceitos de
memória organizacional e memória corporativa são estudados pela área da Administração e
Sistemas de Informação; o conceito de memória institucional é mais estudado pela área de
Comunicação Empresarial enfocando a história da empresa. Além disso, observa-se o uso
de outro termo, memória social, utilizado pelas áreas de Ciência da Informação e História.
Palavras-Chave: Memória Organizacional; Memória Institucional; Memória Corporativa;
Gestão da Informação; Gestão do Conhecimento.
ABSTRACT
The proposal of present paper is to present a conceptual and terminological discussion
relative to the terms: organizational memory, corporate memory and institutional memory that
is a subject still little studied and explored in the academic area. The study is theoretical
focus and the research kind is bibliographical. As research sources were utilized: books,
digital libraries of theses and dissertations in the scope of the country and CAPES Journals
Portal. This study is in course and is part of doctorate research "Organizational memory and
the knowledge bases constitution". As the partial results, observes that the question about
"memory" is studied by different areas of knowledge: Psychology, Neurosciences, History
and others; the concepts about organizational memory and corporate memory are studied by
Administration and Information Systems areas; the concept of institutional memory is more
studied by Business Communication area focusing the company history. Beyond that,
observes the use of another term, social memory, utilized by Information Science and History
areas.
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Keywords: Organizational Memory; Institutional Memory; Corporate Memory; Information
Management; Knowledge Management.
1 INTRODUÇÃO
Compreender a informação como recurso imprescindível é condição sine qua
non à sobrevivência da sociedade. Caso isso não ocorra, o desperdício e a
inadequação dos recursos tecnológicos, acúmulo de informações armazenadas em
meios inadequados e incompatíveis, desconhecimento dos acervos de informação e
sua consequente subutilização são inevitáveis.
O conceito de informação, se relacionado ao fenômeno da memória, pode ser
entendido como estímulos, impressões que integram o quadro mais geral das
lembranças que compõem o acervo de experiências dos indivíduos (THIESEN,
2006). Nesse contexto, os fenômenos da memória, tanto nos seus aspectos
biológicos como nos psicológicos, nada mais são do que os resultados de sistemas
dinâmicos de organização e apenas existem na medida em que a organização os
mantém ou os reconstitui (LE GOFF, 2003).
Dessa forma, é que a memória – e suas várias possibilidades de guardar o
passado – passa a ser um saber constituído de vários povos. Saber criado e
socialmente construído. Quando se reconhece o papel dos sujeitos no processo
cumulativo de transformação, a mensagem socialmente transmitida ganha status de
memória (SHIKIDA; MOURA, 2007).
2 CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO E MEMÓRIA
A Ciência da Informação (CI), no seu desenvolvimento, tem recebido
influências de diferentes áreas do conhecimento, como a Filosofia, Biologia,
Psicologia, Matemática entre outras. Assim, essas diferentes visões teóricas se
refletem através de diversas definições e significações do seu objeto de estudo, a
“informação”.
Em meados do Século XX, a CI era orientada por um paradigma físico,
considerando a informação como um signo físico, disseminado por sinais elétricos,
“[...] implica numa analogia entre a veiculação física de um sinal e a transmissão de
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uma mensagem, cujos aspectos semânticos e pragmáticos intimamente
relacionados ao uso diário do termo informação são explicitamente descartados por
Shannon” (CAPURRO, 2003, p.7).
Esse paradigma foi substituído pelo paradigma cognitivo, considerando a
busca da informação como um processo cognitivo e de suprimento das
necessidades do sujeito. “[...] trata de ver de que forma os processos informativos
transformam ou não o sujeito, entendido em primeiro lugar como sujeito
cognoscente possuidor de “modelos mentais” do “mundo exterior” que são
transformados durante o processo informacional” (CAPURRO, 2003, p.8). Nesse
momento, são inseridas teorias sobre os modelos mentais existentes no sujeito
cognoscente, e que pertencem à estrutura cerebral de todo ser humano.
O terceiro paradigma é o social, que considera a informação inserida nas
relações sociais estabelecidas entre os grupos sociais e a sociedade moderna.
Nesse contexto, “[...] o objeto da ciência da informação é o estudo das relações
entre os discursos, áreas de conhecimento e documentos em relação às possíveis
perspectivas ou pontos de acesso de distintas comunidades de usuários”
(HJØRLAND apud CAPURRO, 2003, p.10).
É neste contexto, o das relações sociais estabelecidas entre os grupos sociais
e a sociedade moderna, que devemos analisar e estudar a conservação da memória
que, em sua forma oral, para sua representação em um registro escrito, significa ao
menos duas coisas: limita os danos que a morte, enquanto desaparecimento do
portador da memória provoca; e permite, ao mesmo tempo, que a quantidade de
informação armazenada aumente, não somente individualmente, mas em formas
compartilhadas com outras memórias (CRIPPA, 2010, p.83).
Dessa forma, “[...] é a partir das narrativas que a humanidade pode apropriar-
se de infinitas informações que lhe possibilita, responder de maneira diversa as suas
demandas cotidianas, construir e constituir conhecimento para gerações futuras,
fazendo-se presente e útil dentro do mundo [...] Quando se reconhece o papel dos
sujeitos no processo cumulativo de transformação, a mensagem socialmente
transmitida ganha status de memória” (SHIKIDA; MOURA, 2010).
Corroborando com esta ideia, Azevedo Netto (2007, p.6) defende que “[...] a
informação [pode ser] considerada aquela que diz respeito a uma produção de
significados socialmente aceitos. É aquele fenômeno em que há não só a produção
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de um bem simbólico, mas também sua disseminação e consumo, que implica na
sua própria reprodução, já que a dimensão espacial é extremamente dinâmica,
dentro da sua re-contextualização”.
Para Lévy (1993, p.77), a sociedade oral primária, aquela que remete ao
papel da palavra, antes da adoção da escrita, “[...] quase todo o edifício cultural está
fundado sobre as lembranças dos indivíduos. A inteligência, nestas sociedades,
encontra-se muitas vezes identificada com a memória, sobretudo a auditiva”.
Le Goff (2003, p.427-428) explica que
O aparecimento da escrita está ligado a uma profunda transformação
da memória coletiva, lhe permitindo um duplo progresso, ou seja, o
desenvolvimento de duas formas de memória: 1. a comemoração -
celebração através de um monumento comemorativo de um
acontecimento memorável; 2. documento escrito num suporte
especialmente destinado à escrita.
Percebe-se que o homem durante a sua evolução, e consequentemente da
sociedade, tem desenvolvido técnicas que o ajude a se comunicar de forma
consistente, além de possibilitar diferentes formas de registro do seu conhecimento.
Inicialmente, transmitia-se a informação de forma oral; porém, com o passar do
tempo, diferentes formas de escrita foram sendo criadas, conforme sua evolução e a
sociedade a qual ele pertencia. No decorrer da história humana, a informação foi
registrada em pedras, mármores, na argila, no papiro, no pergaminho e, finalmente,
no papel.
Porém, Lévy (1993, p.91-92) alerta para que
As tecnologias intelectuais [como a escrita] ocupam o lugar de
auxiliares cognitivos dos processos controlados, aqueles que
envolvem a atenção consciente e dispõem de tão poucos recursos
no sistema cognitivo humano. Desta forma, [...] servem como
paliativo para certas fraquezas dos processos automáticos como as
heurísticas de raciocínio e os mecanismos esquematizantes da
memória de longo prazo.
Nessa perspectiva, o fato da memória humana não conseguir registrar com
exatidão toda informação e conhecimento constituídos, o uso da escrita possibilita o
registro de parte desse conteúdo, sendo que outra parte será perdida, esquecida.
Deixará de fazer parte da memória daquele indivíduo ou sociedade.
Dodebei (2010), em seus estudos relativos à memória, verifica que “[...] é
somente a partir do século XX que o mundo é visto como um espaço informacional e
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memorial, em que os aspectos materiais e imateriais dos objetos criados pelas
sociedades entram em disputa”.
Dessa forma, Crippa (2010, p.81) considera que a memória permite o resgate
de algo pertencente ao passado, comparando-os com os dados do presente,
proporcionando a preservação de determinadas informações, essenciais para a
experiência individual e o conhecimento de natureza científica, filosófica ou técnica.
A memória é considerada o único instrumento através do qual ideias e palavras
podem ser reunidas, fugindo, assim, ao império do imediato: imprime as direções do
tempo e permite uma continuidade social. Sem ela, desapareceriam os elos sociais,
assim como a própria noção de sociedade, as identidades individuais e coletivas, a
possibilidade da construção do conhecimento, ou seja, pode ser considerada uma
ferramenta para a construção de uma determinada sociedade, assim como de
transmissão cultural.
Nesse contexto, a autora acima citada defende que
A divisão que se estabelece na distribuição e atribuição de formas de
conhecimento diversas reflete as formas de organização da memória
do conhecimento de uma época específica, ligada ao
desenvolvimento do pensamento científico e às ambições das
instituições públicas decorrentes da configuração do Estado Moderno
[...] (CRIPPA, 2010, p.102).
Lévy (1993, p.78) defende que
[...] da mesma forma que o raciocínio espontâneo não tem muito a
ver com uma “razão” hipotética fixada em sua essência, nossa
memória não se parece em nada com um equipamento de
armazenamento e recuperação fiel das informações. E, antes de
mais nada, de acordo com a psicologia cognitiva contemporânea,
não há apenas uma, mas diversas memórias, funcionalmente
distintas […] A memória de curto prazo, ou memória de trabalho,
mobiliza a atenção […] A memória de longo prazo […] é armazenada
em uma única e imensa rede associativa, cujos elementos difeririam
somente quanto a seu conteúdo informacional e quanto à força e
número das associações que os conectam.
Para este autor, a memória humana possibilita o armazenamento e
recuperação de informações, porém, não de forma exata, assim como não pode ser
comparada a um sistema baseado em tecnologia, visto que podem ocorrer algumas
falhas neste processo de armazenamento e recuperação pelo fato do cérebro
humano ter seu funcionamento de forma complexa. Além disso, o homem possui
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diferentes formas de memória: auditiva, visual, sensorial, emocional, etc., estudadas
pela Psicologia e pela Neurociência.
Segundo Almeida (2006, p.2), a memória pode ser considerada uma função
que beneficia os seres humanos, pois permite a utilização de experiências passadas
na solução de novos problemas; proporciona lembranças sobre experiências
pessoais, possibilitando formas de antecipar eventos. Para tanto, ela se fundamenta
em habilidades de aquisição, de armazenamento, de recuperação e de uso de
informação.
Para Le Goff (2003, p.427),
Nas sociedades sem escrita, a memória coletiva parece ordenar-se
nem torno de três grandes interesses: a idade coletiva do grupo, que
se funda em certos mitos, mais precisamente em mitos de origem; o
prestígio das famílias dominantes, que se exprime pelas
genealogias; e o saber técnico, que se transmite por fórmulas
práticas fortemente ligadas à magia religiosa.
Santos (2003, p.19) alerta que a grande ameaça do mundo moderno é a
perda da memória como aprendizado, inserida no mundo da informação. Com a
substituição do operário de fábrica, o trabalho se reduziu a simples atos mecânicos e
repetitivos, não sendo necessário o uso do aprendizado, acumulado por toda uma
vida, para o desenvolvimento das atividades laborais. Além disso, a passagem da
sociedade oral para a escrita faz com que parte da transmissão de conhecimento e
valores entre as gerações sejam perdidas. Isto porque na sociedade oral havia toda
a estruturação de rituais para a transmissão do conhecimento. Com o surgimento da
escrita, a memória transmitida por textos, objetos, pedras, edifícios e máquinas,
embora dêem a impressão, não possibilitam a preservação total do passado,
reproduzindo somente parte do que foi vivenciado.
3 A MEMÓRIA SOB DIFERENTES ENFOQUES
O estudo da memória tem sido realizado por diversas áreas do conhecimento,
como: Psicologia, Neurociência, História, Arqueologia, Administração, Sistemas de
Informação, Comunicação e Ciência da Informação. Cada qual, com sua visão
específica.
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Segundo um estudo de Erll e Nünning (2008, p.1) constata-se que nas últimas
duas décadas, a relação entre cultura e memória tem sido discutidas em várias
partes do mundo, de forma interdisciplinar, envolvendo diversos campos de
pesquisa como as áreas de História, Sociologia, Arte, Literatura e Mídias, Filosofia,
Teologia, Psicologia e Neurociência, reunindo os campos das humanidades, estudos
sociais e ciências naturais.
Dodebei (2010, p.71) relata que “[...] a memória compreendida sob a
dimensão cultural pode abarcar fronteiras de outras disciplinas que têm o passado
como material de estudo, como a História, a Arqueologia, a Ciência da Informação”.
Santos (2003, p.25-26) defende que nós somos formados pela memória que
temos; que ela não é só pensamento, imaginação e construção social. Nossa
memória é formada por uma determinada experiência de vida capaz de transformar
outras experiências, quando em contato com resíduos deixados anteriormente. A
memória vai além da mente humana, do corpo, do aparelho sensitivo e motor, do
tempo físico; sendo objetivada em representações, rituais, textos e comemorações.
Esta visão, defendida por Santos, corrobora com o fato de várias áreas do
conhecimento humano estudarem a memória, cada qual com sua percepção e
especificidades. O mesmo autor relata que
Nas reflexões filosóficas, a memória apareceu durante muitos
séculos associada à noção de tempo. Mas a memória não se refere
apenas ao passado. A memória excede o escopo da reflexão
humana, como excede a noção que temos de passado e presente,
uma vez que ela tanto faz parte da existência humana, e enquanto
tal não pode ter uma única definição, como faz parte do próprio
cosmos (SANTOS, 2003, p.28).
Podemos considerar que a memória está intimamente ligada ao futuro, pois é
a partir de que temos internalizado como sujeitos cognoscentes, que nos
estruturamos como indivíduos sociais e construímos nosso presente, e
consequentemente, influímos em nosso futuro. Não existe futuro sem passado.
Para Le Goff (2003, p.422) “[...] o estudo da memória social é um dos meios
fundamentais de abordar os problemas do tempo e da história, relativamente aos
quais a memória está ora em retraimento, ora em transbordamento”.
O termo memória empresarial é estudado pela área de Comunicação,
constituindo-se numa área de atuação específica e importante no universo
empresarial, ainda que se assista a várias distorções de seus princípios
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fundamentais, em particular no Brasil. Essas distorções se relacionam a projetos
que, apesar de se auto-intitularem “históricos”, não se valem da metodologia de
análise da ciência, seja em relação à multiplicidade de fontes de pesquisa, seja ao
compromisso com sua legitimidade (TOTINI; GAGETE, 2004, p.117).
No Brasil, o estudo da memória empresarial partiu da iniciativa de
acadêmicos, a partir da Década de 1960, interessados na reflexão sobre a estrutura
e a evolução industrial brasileira, buscando compreender a relação entre os
aspectos econômicos, a ideologia, e a estrutura paternalista dessas empresas
(TOTINI; GAGETE, 2004, p.117).
As autoras acima citadas (2004, p.120) ainda relatam que
Nos últimos anos [...] diversas empresas e instituições tem se valido
de projetos de memória empresarial como ferramenta de gestão
estratégica, quer no que se refere ao auto-conhecimento necessário
às tomadas de decisão do presente e ao planejamento do futuro,
quer na construção de políticas de relacionamento com seus
stakeholders.
Em relação ao termo Memória Institucional (MI), temos os estudos de Icléia
Thiesen Costa (1997) que define memória como um elemento primordial no
funcionamento das instituições, porquanto é através da memória que as instituições
se reproduzem na sociedade a qual está inserida, retendo somente as informações
que interessem ao seu funcionamento. Nesse contexto, as informações podem ser
buscadas tanto interna quanto externamente às instituições. Além disso, a MI está
em permanente elaboração e evolução, visto que é resultante da função do tempo,
ou seja, a MI engloba a instituição como um todo, sendo formada com o passar do
tempo. A autora também defende que os indivíduos é que fazem a memória das
instituições, sendo ela o reflexo dessa trajetória social e histórica.
O que se observa atualmente em relação à geração e acúmulo de grandes
massas documentais e informacionais, é que o acesso e o uso desses conteúdos,
que são gerados pelas organizações, têm sido dificultados pela falta da estruturação
e utilização de sistemas informáticos eficientes que possibilitem ao colaborador da
organização ter, de fato, um conjunto de recursos que facilitem o acesso a esses
conteúdos.
Nesse contexto, Crippa (2010, p.105) afirma que
As direções mais atuais da Memória estão, hoje, profundamente
ligados às técnicas de cálculo e manipulação da Informação, através
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do uso de máquinas e instrumentos cada vez mais complexos. As
técnicas e tecnologias moldam nossa relação com a memória, que
se transforma no tempo. A noção de memória, tanto individual como
coletiva, tende a se identificar com uma visão estritamente
tecnológica, tornando comum o hábito de considerar que todo
conhecimento necessário está registrado em algum suporte externo.
Dessa forma, Le Goff (2003, p.462) apresenta a função da memória situando-
a da seguinte forma em um computador que compreende: meios de entrada;
elementos dados de memória, constituídos por dispositivos magnéticos que
conservam as informações registradas; meios de cálculo rápido; meios de controle;
meios de saída. Com a utilização de processos que visem localizar, representar,
disponibilizar, medir e evoluir os conhecimentos estratégicos da corporação de
maneira sistemática e organizada, podemos entender que esse processo é viável,
necessário e capaz de trazer resultados eficientes (SIQUEIRA, 2005).
Nesse ambiente em que as tecnologias são desenvolvidas a todo instante, as
formas de comunicação são diversas, a transmissão da informação ocorre cada vez
mais rapidamente e em maior quantidade. Assim, a informação e o conhecimento
são gerados de forma diferente, do que era há alguns anos, porquanto as
tecnologias da informação e comunicação, ainda não haviam sido desenvolvidas.
A inteligência do ser humano tende a se expandir frente a um ambiente
adequado, quanto mais é estimulada e quanto mais os indivíduos compartilham seus
conhecimentos, novos conhecimentos serão gerados. O indivíduo irá se desenvolver
intelectualmente e gerar mais conhecimento, a partir do que ele internalizou e do
que ele recebeu/trocou no momento do compartilhamento.
Macedo (2003) defende que,
[...] na consecução do trabalho diário, são realizadas […] atividades,
que resultam na produção de informação e conhecimento e num
incontável número de documentos que se dispersam na organização.
O conhecimento institucionalmente organizado compõe uma base
importante para a tomada de decisões, refletida na forma de ações
político-econômicas e administrativas.
Segundo Davenport e Prusak (2003, p.83), para que a informação e o
conhecimento sejam adequadamente organizados, visando seu futuro acesso e
transferência para os usuários e para a organização, ele deve sofrer um processo de
codificação, que de acordo com os autores, significa tornar o conhecimento
acessível aos usuários que dele necessitam.
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A codificação – não aquela utilizada de forma computacional – transforma o
conhecimento, tornando-o inteligível e organizado, convertendo-o em formatos
acessíveis e aplicáveis. Isto é, organizando-o em bases informatizadas, por meio de
uma linguagem comum a todos os usuários que o acessarão, possibilitam o seu
acesso com maior eficiência e qualidade.
De acordo com Spiller e Pontes (2007, p.99), “[...] as experiências pelas quais
passa uma organização são acumuladas, ao longo dos anos, nas suas pessoas,
cultura, processos e em seus documentos, e esse conjunto de conhecimentos forma
a sua memória”.
Nesse ambiente, as empresas tem sentido a necessidade de desenvolverem
mecanismos, com base nas novas Tecnologias de Informação e Comunicação
(TICs), que as auxiliem na resolução de algumas situações como, por exemplo, a
grande produção de informação, e consequentemente de conhecimento; a crescente
necessidade de sua preservação, localização, análise, tratamento e disseminação, a
serem disponibilizadas virtualmente.
Dessa forma, Crippa (2010, p.83) afirma que,
Hoje em dia, quando se pensa nos suportes de registro digitais,
Memória é uma palavra-chave na organização dos estoques de
informação e de sua recuperação. Uma memória virtual, feita de
impulsos eletrônicos e bytes, que deslocam seu significado de
maneira definitiva para o exterior, para a máquina enquanto memória
tecnológica e produtiva.
Assim, as TICs podem e devem ser vistas como um recurso importante para a
coleta, tratamento e disseminação de dados e informação, assim como para a
geração de novos conhecimentos por parte dos integrantes de uma determinada
comunidade de especialidade.
Segundo Simão (2010) o termo Memória Organizacional (MO) é utilizado em
inglês, como: corporate memory ou organizational memory, ou seja, Memória
Corporativa e Memória Organizacional são utilizadas como sinônimos. Para este
autor, a Memória Organizacional deve “[...] permitir responder às principais questões
que se faça sobre a organização, seu ambiente, seus processos e produtos”.
Lehner e Maier (2000) confirmam, através dos seus estudos, que existem
várias expressões utilizadas como sinônimos para MO: base de conhecimento
empresarial, memória de grupo, mente de grupo, memória coletiva, inteligência
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coletiva, inteligência corporativa, base de conhecimento compartilhado, repositório
corporativo, banco de dados de know-how, portanto, diferentes termos
compreendidos com o mesmo significado.
Laspisa (2007, p.37) define MO como
[...] conhecimento corporativo que representa experiências prévias
que são arquivadas e compartilhadas pelos usuários. [...] constituída
por um conhecimento explícito [...] e conhecimento tácito [...] e
abrange aspectos funcionais, técnicos e sociais de trabalho, o
trabalhador e o ambiente de trabalho.
Menezes (2006, p.31) define MO como “[...] acervo de informação,
conhecimentos e práticas, agregados e retidos pela organização ao longo de sua
existência, utilizados para o suporte às suas atividades, seus processos decisórios e
para a preservação do seu capital intelectual, potencializando a gestão do
conhecimento”.
Segundo Laudon e Laudon (2004, p.325-326), MO “[...] é a aprendizagem
armazenada a partir do histórico de uma organização, e que pode ser utilizada para
a tomada de decisões ou outras finalidades”. Como exemplos de repositórios,
podem ser citados os manuais corporativos e relatórios de diversos tipos, sendo
normalmente definidos em relação aos conteúdos que apresentam e aos processos
ligados à memória organizacional (MORESI, 2006, p.288-289).
Abecker et al. (1998) defende que a MO é uma ferramenta que, além de ser
um repositório de informação, também possibilita à organização o compartilhamento
e reuso do conhecimento corporativo, individual e de aprendizagem das rotinas
diárias da organização.
Esses bancos de conhecimento têm como objetivos a preservação, o
gerenciamento e a disseminação do conhecimento produzido internamente à
organização. Eles possibilitam a inserção de conteúdos informacionais, para que
sejam preservados enquanto conhecimento e disseminados aos diversos usuários
da instituição. Assim como evitar que haja retrabalho em relação à estruturação de
documentos, que já existem e estão ao acesso de todos.
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4 METODOLOGIA
De acordo com Oliveira (2007, p.33) o conhecimento pode ser construído
através do diálogo estabelecido entre os autores escolhidos e definidos para a
elaboração do referencial teórico, oferecendo uma sustentação teórica que
possibilitará o desenvolvimento do tema de pesquisa, ou seja, o levantamento
bibliográfico definido para o projeto tem o objetivo de subsidiar a elaboração de
conhecimento, que dará embasamento para a análise, reflexão e discussão dos
objetos e fenômenos da pesquisa.
A discussão dos termos memória organizacional, memória corporativa e
memória institucional está em andamento, visto que faz parte da pesquisa de
doutorado “Memória organizacional e a constituição de bases de conhecimento”. O
levantamento dos termos apresentados e discutidos permitirá uma melhor
compreensão dos conceitos utilizados pelas várias áreas do conhecimento científico,
propiciando um enriquecimento no embasamento teórico da pesquisa em questão.
O trabalho foi realizado com o uso da pesquisa bibliográfica, que segundo
Santos (2003, p.173), é feita com base em documentos já elaborados, tais como
livros, dicionários, enciclopédias, periódicos, jornais e revistas, além de publicações
como comunicação e artigos científicos, resenha e ensaios críticos. Oliveira (2007,
p.69) defende que a principal finalidade da pesquisa bibliográfica é levar o “[...]
pesquisador(a) a entrar em contato direto com obras, artigos ou documentos que
tratem do tema em estudo”.
Foram pesquisadas as seguintes fontes de informação: livros, bibliotecas
digitais de teses e dissertações no âmbito do país e o Portal de Periódicos da
CAPES.
5 CONSIDERAÇÕES
Como mencionado anteriormente, a discussão dos termos apresentados no
presente trabalho não está finalizada, porém percebe-se que várias áreas do
conhecimento científico estudam as questões relacionadas à memória, cada qual
com suas características e especificidades.
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Isso ocorre pelo fato de o homem ser formado não somente por sua condição
bio-física-eletro-química, mas também por sua história e cultura, isto é, o tempo e o
espaço também fazem parte dessa formação.
O estudo do termo memória iniciou-se na área de Ciências Sociais, focando
as relações sociais e o desenvolvimento da sociedade, além dos aspectos culturais
de cada sociedade. Nesse contexto, também se encontra o termo Memória Coletiva,
estudada por Maurice Halbwachs.
Com o levantamento e análise do material bibliográfico, observou-se também
que os termos Memória Organizacional e Memória Corporativa são estudados pelas
áreas da Administração e de Sistemas de Informação (Ciência da Computação) e
são utilizados como sinônimos. Outros termos também são utilizados: base de
conhecimento empresarial, memória de grupo, mente de grupo, memória coletiva,
inteligência coletiva, inteligência corporativa, base de conhecimento compartilhado,
repositório corporativo, banco de dados de know-how.
O conceito de Memória Institucional é estudado por Icléia Thiesen Costa.
Inicialmente, a autora faz uma diferenciação entre organização e instituição, para
depois definir o termo Memória Institucional. Ela defende que a MI está em
constante desenvolvimento e estruturação, engloba a instituição como um todo,
sendo formada com o passar do tempo. Além disso, também defende que a MO faz
parte da MI, ou seja, a MI é maior do que a MO.
A área de Comunicação Empresarial também estuda a Memória Institucional,
porém enfoca a Memória Empresarial da organização, destacando a reflexão entre
os aspectos econômicos, ideológicos e estruturais das empresas.
Outro termo também encontrado, relativo aos estudos da memória, foi
Memória Social, hoje estudado pelas áreas da Ciência da Informação e História.
O que se percebe que esta é uma área de pesquisa científica de grande
importância. De acordo com os estudos analisados, na sociedade oral, os
conhecimentos eram passados, de geração a geração, na forma de rituais; na idade
média, na forma de comemorações e construção de monumentos. Essas formas de
transmissão do conhecimento, e consequente registro da memória, exigiam maior
envolvimento do homem, o que poderia possibilitar melhor registro dos
acontecimentos da época. Hoje, com o surgimento das TICs, a geração de
informação e construção do conhecimento é muito grande, e o homem pode não
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conseguir gerenciar todo este conteúdo. Além disso, o registro deste conteúdo pode
ser dificultado pela falta de estruturação de tecnologias adequadas e apropriadas a
registrar toda informação e conhecimento construído socialmente.
REFERÊNCIAS
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Graduação em Ciência da Informação – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
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