LEANDRO PERES MARCOMINI AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL DO CEMITÉRIO JARDIM DOS LÍRIOS DO MUNICÍPIO DE BAURU-SP BAURU 2012 2 LEANDRO PERES MARCOMINI AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL DO CEMITÉRIO JARDIM DOS LÍRIOS DO MUNICÍPIO DE BAURU-SP Dissertação apresentada ao Curso de Pós- Graduação Stricto Sensu em Engenharia de Produção da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP Campus de Bauru (SP), como registro para a obtenção do título de mestre. Orientadora: Profª. Drª. Rosani de Castro. Área de concentração: Gestão Ambiental. BAURU 2012 3 Marcomini, Leandro Peres. Avaliação de Impacto Ambiental do Cemitério Jardim dos Lírios do Município de Bauru-SP / Leandro Peres Marcomini. Bauru 2012. 174 fls. Orientador: Dra Rosani de Castro Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Engenharia, Bauru, 2012. 1. Avaliação de Impacto Ambiental. 2. Licenciamento Ambiental. 3. Legislação Ambiental. 4. Cemitério Parque. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Engenharia. 4 5 AGRADECIMENTOS A Deus Pai pela vida, caminhos, forças e bênçãos. Ao meu pai de amor e sangue, Dovair, que existo e vivo graças aos seus sacerdócios, carinhos, amizade, bondade e exemplos de fé e sensibilidade nos ensinamentos e que sempre me compreendeu e me guiou na busca da independência e realização profissional. Aos meus avós Álvaro e Adélia, que de uma forma amorosa me ensinaram com simplicidade e alegria “coisas” jamais imagináveis e palpáveis, e que até no leito do enterro de ambos, com muita dor, fui capaz de perceber o quão sofrido foi depositá-los. Ao meu irmão Evandro, que confiou no caminho que estava reservado a ele e hoje compartilha comigo alegrias, sofrimentos, desafios e barreiras e que, de forma recíproca, estabelece laços de fortalecimento e fé por um caminho que um dia há de chegar. À minha namorada Deborah, companheira fiel e amiga dedicada, que me apoiou incondicionalmente na elaboração deste trabalho, e que sempre compreendeu minhas ausências e turbulências e que, com sinceridade e gratidão, agradeço o amor, respeito, alegrias, momentos, paciência e todo apoio sentimental que, com certeza, foi essencial para concretização deste sonhado projeto. À orientadora Profª. Drª. Rosani de Castro pela orientação do presente trabalho e pela convivência durante estes anos que, mesmo com todos os encargos acumulados na função de docente, sempre cobrou resultados, presenças e dedicações na pesquisa. Aos professores Dr. Alberto Pacheco e Dr. Jorge Hamada, pela contribuição valiosa feita durante o exame de qualificação deste trabalho. A todos os professores do Departamento de Engenharia de Produção, em especial aos professores Dr. Adilson Renófio e Dr. Otávio José de Oliveira, que se dedicaram em sala de aula em mediar o conhecimento e que tiveram paciência em compreender as limitações deste discente, além da valiosa conquista da amizade. Dedico e agradeço com imensidão a Professora Rosane Batistelle, que, além da docência aplicada, me direcionou com sabedoria para a linha de pesquisa que pulsava em meu coração, mas que havia receios e segredos diante de um mundo de pesquisa desconhecido. Em especial, aos meus amigos Rogério Colnaghi e Lúcia Helena Costa, do Grupo Terra Branca, que me confiaram o acompanhamento do árduo e desafiante 6 licenciamento do cemitério Parque Jardim dos Lírios e que sempre forneceram livros, fotos, artigos, documentos, com toda confiança profissional, e, mesmo com todas as turbulências, distâncias, responsabilidades e conquistas, o desafio cemiterial nos fortaleceu na pesquisa de novas soluções sustentáveis neste ramo que nos envolve e que para muitos causa medo e estranheza. A todos os funcionários cemiteriais, sejam eles “coveiros”, pedreiros, atendentes, faxineiros de todos cemiterios visitados e que muito auxiliaram nas informações valiosas para a pesquisa, e ainda, aos funcionários públicos da EMDURB de Bauru, em especial ao Ewerton, Fernanda e Paulo André, que contribuíram para meu conhecimento e para o desenvolvimento deste trabalho. A todos os amigos e amigas de sala (Marinêz, Zé, Rafael, Marcão, Tatiene, Carlinha, Carreão, Adão, Alexandre, Vinicius, Rita, Karla, Jesus, Maria Fernanda e outros), do departamento da Produção (Ana Paula, Xandão, Marcelo), do departamento da Pós (Célia, Gustavo e Rafael) pela convivência nas nossas horas vividas no Campus e por todas as colaborações e ajudas dedicadas. Obrigado pela paciência, companheirismo e amizade. Agradeço de coração todo empenho a irmã-amiga Andressa Tiossi que se esforçou com dedicação e afinco na revisão final deste trabalho. Por último, o meu imenso agradecimento a todos aqueles que, direta ou indiretamente, me auxiliaram, fortaleceram, incentivaram e que também, de alguma forma, torceram para a concretização deste projeto, que envolve não somente a certeza da morte, mas a possibilidade da evolução do ramo funerário e cemiterial, evitando que o homem continue a poluir mesmo com a fim da vida. 7 "Muitas pessoas em vida esquecem que a morte, além de um fenômeno, é nossa única certeza [...] e neste esquecimento humilham, deturpam, invejam, maltratam, discriminam e ofendem, [...] e com esta certeza do “fim” serão apenas dispostos em lóculos, buracos, jazigos, caixões, ou, quem sabe, cremados [...] e o que restará? Sementes do mal que foram plantadas e frutos podres consequentemente colhidos em sua passagem [...] e ao léu péssimas lembranças de uma história que se passou, não marcou e que apenas sangrou." (MARCOMINI, L. P.). 8 MARCOMINI, Leandro P. Avaliação de impacto ambiental do cemitério Jardim dos Lírios do município de Bauru-SP. 2012. 174 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Faculdade de Engenharia - UNESP, Bauru (SP), 2012. RESUMO A problemática envolvendo cemitério segue muito além do que a sociedade ocidental pensa, e normalmente, as atividades cemiteriais são vistas como algo marcante e perturbador. Notadamente ao longo dos tempos, muitos cemitérios, principalmente os públicos, não se atentaram para as preocupações ambientais, nem tampouco conheciam o risco de contaminação, podendo afetar o meio ambiente e a saúde pública com suas alterações físicas, químicas e biológicas nas águas subterrâneas e superficiais e no solo. Os cemitérios mal implantados podem constituir-se numa potencial fonte de poluição, sendo diversas problemáticas envolvidas, aos quais citamos como exemplos os extravasamentos dos líquidos coliquativos ou conhecidos como necrochorume, as erosões internas das quadras e jazigos, a falta de espaço físico urbano, as construções insustentáveis de jazigos, as enchentes ocorridas no interior dos cemitérios, a questão dos resíduos produzidos nestes empreendimentos, o aumento significativo dos furtos e violações de jazigos, além dos altos custos de um enterro, dentre outros. Diante deste cenário atual, o presente trabalho apresenta e analisa os estudos prévios demonstrados no Relatório Ambiental Preliminar (RAP) ao qual subsidiou a avaliação de impacto ambiental para conquista do licenciamento ambiental para o Cemitério Parque Jardim dos Lírios. E com isso, atentou-se para as mudanças em relação ao tratamento destes empreendimentos, seja na avaliação dos impactos ambientais, seja na adequação do plano diretor municipal, seja nas inovações da construção cemiterial, seja nas operações e gestão ambiental destas atividades. Apresenta-se ainda, as legislações aplicáveis e adequáveis ao caso, as Resoluções CONAMA nº 335 de 2003; nº 368 de 2006 e nº 402 de 2008, e que historicamente tornaram-se as primeiras normatizações específicas ao caso, além de outras leis ambientais vigentes que estão correlacionadas. Para implantação desse empreendimento cemiterial foi constituída uma equipe multidisciplinar habilitada com a condução dos estudos técnicos necessários de preservação e proteção ambiental, comprometendo-se com os parâmetros e diretrizes legais federais, estaduais e municipais. E, diante do atendimento às legislações ambientais e obtenção da Licença de Operação concedida pela CETESB, o Cemitério Parque Jardim dos Lírios, possui mais de 300 corpos em sua primeira quadra de sepultamentos, e diversas composteiras de resíduos gerados internamente para futuro reaproveitamento como adubo orgânico. O empreendimento Jardim dos Lírios com localização privilegiada é considerado na região de Bauru, um dos mais modernos com relação à localização, estrutura dos jazigos, conservação de áreas verdes, gestão ambiental de resíduos, beleza cênica, e tendo como escopo principal o respeito ao meio ambiente e a dignidade da pessoa humana. Palavras-chave: Avaliação de Impacto Ambiental, Licenciamento Ambiental, Cemitério Jardim. 9 MARCOMINI, Leandro P. Evaluation of Environmental Impact of the cemetery garden “jardim dos lírios” of the city of Bauru-SP. 2012. 174 f. Dissertation (Master in Production Engineering) - College of Engineering - UNESP, Bauru (SP), 2012. ABSTRACT The problematic involving cemetery goes far beyond what the western society thinks, and ordinarily, the cemeterial activities are seen as something remarkable and troublesome. Notably over time, many cemeteries, mainly the public, did not pay attention to the environmental concerns, nor even knew the risk of infection, being able to affect the environment and the public health with its physical, chemical and biological changes in the superficial, groundwater and in the ground. The cemeteries poorly implemented might become a potential source of pollution, being several problems involved, which we quoted as examples the leakages of colligative liquids or known as necrochorume, the internal erosions of the blocks and graves, the lack of physical urban space, the unsustainable buildings of graves, the floods that occurred into the cemeteries, the matter of waste produced in these ventures, the significant increase of thefts and violations of the graves, besides the high cost of a funeral, among others. Before this current scenario, the present project introduces and analyzes the previous studies shown in the Preliminary Environmental Report (PER) which subsidized the evaluation of environmental impact to the conquer of the environmental permit to the cemetery “Parque Jardim dos Lírios”. And thus, it was observed that the changes related to the treatment of these ventures, in the evaluation of environmental impacts, in the adequacy of the municipal master plan, in the innovation of the cemetery construction, in the operations and environmental management of these activities. It also has, the suitable and applicable laws to the case, the Resolutions CONAMA ≠335 from 2003; ≠368 from 2006 and ≠402 from 2008, and which historically became the first specific normalizations to the case, besides another existing environmental laws which are correlated. For implementation of this cemeterial venture an enabled multidisciplinary team was formed with the conduct of necessary technical studies of environmental preservation and protection, pledging with the federal state local legal parameters and guidelines. And before the meeting the environmental laws and obtaining the operating license granted by CETESB, the Cemetery “Parque Jardim dos Lírios”, has more than 300 bodies on the first block of burial and several residue composters internally generated to the future reuse as organic fertilizer. The venture “Jardim dos Lírios” with a prime location is considered in Bauru region, one of the most modern ones related to the location, structure of the graves, preservation of green areas, environmental management of waste, scenic beauty, and having as main scope the respect for the environment and the human dignity. Keywords: Evaluation of Environmental Impact, Environmental Permit, Garden Cemetery. 10 LISTA DE FIGURAS Figura 01 - Cópia de Carta IBGE - Folha Topográfica Figura 02 - Imagem Aérea da Área do Empreendimento Figura 03 - Área Sul – Fábrica de Licor Figura 04 - Área Sul – Rodovia Comandante João Ribeiro de Barros Figura 05 - Área Norte – Propriedade Rural Figura 06 - Área Leste – Antiga Estação CESP Figura 07 - Área Leste – Antiga Estação CESP Figura 08 - Área Oeste – Fachada do Instituto Penal Agrícola Figura 09 - Mapa Geológico do Estado de São Paulo – Região de Bauru Figura 10 - Caracterização Geológica – Base Georreferencial Figura 11 - Caracterização Geológica Regional Figura 12 - Caracterização Pedológica da Área do Empreendimento Figura 13 - Mapa de Avaliação de Riscos de Erosão Figura 14 - Cópia da Foto Aérea em escala 1:10.000, Sobre a Área do Empreendimento Figura 15 - Caracterização do Bioma da Área do Empreendimento Figura 16 - Pastagem e domínio de Bracchiaria Figura 17 - Árvores Nativas Isoladas Figura 18 - Foto Aérea – Caracterização do Entorno Figura 19 - Foto Aérea da Ocupação/Uso do Solo do Entorno Figura 20 - Acesso da Rodovia SP 294 a “Nações Norte” Figura 21 - Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista Figura 22 - Instituto Penal Agrícola Figura 23 – Vista Parcial Externa da Empresa Mercúrio Figura 24 – Vista Parcial Externa da Empresa Liquidigás Figura 25 – Vista Parcial Externa da Empresa Volkswagen Caminhões Figura 26 - Companhia Siderúrgica Belgo Mineira Figura 27 - Companhia Siderúrgica Belgo Mineira Figura 28 - Cópia das Plantas de Perfis de Terreno do Empreendimento Figura 29 - Área do Sepultamento – Cemitério Parque Figura 30 - Cemitério Parque com Área Verde 11 Figura 31 - Área Verde e Praças Figura 32 - Base dos Jazigos com concreto/Ferragens Figura 33 - Construção das Paredes com Blocos de Concreto Figura 34 - Estrutura do Jazigo Construído Figura 35 - Construção da Quadra Figura 36 - Construção dos Jazigos Figura 37 - Área Paisagística Figura 38 - Fachada da Área Administrativa Figura 39 - Construção da primeira quadra do sepultamento Figura 40 - Remoção de Terra para Preparação do Jazigo Figura 41 - Preparação do Jazigo para Sepultamento Figura 42 - Jazigo Pronto para Sepultamento Figura 43 - Chegada do Corpo com o Cortejo Figura 44 - Sepultamento Finalizado Figura 45 - Sepultamento Finalizado e Gramado Sobreposto Figura 46 - Mapa dos Cemitérios Públicos e Privados de Bauru Figura 47 - Cemitério Instituto “Lauro de Souza Lima” Figura 48 - Cemitério Instituto “Lauro de Souza Lima” Figura 49 - Cemitério Jardim do Ypê – Proximidade dos Jazigos com Curso D’água Figura 50 - Cemitério de Balbinos – Sepultamento Diretamente no Solo Figura 51 - Cemitério Duartina – Proximidade com Curso D’Água Figura 52 - Cemitério de Jacuba – Derramamento de Líquido Viscoso Figura 53 - Cemitério de Valinhos – Inundação na Quadra Figura 54 - Cemitério Redentor – Bauru – Processo Erosivo do Jazigo Figura 55 - Cemitério Cristo Rei – Bauru – Aterramento para Conter Erosão Figura 56 - Deposição Irregular de Resíduos Sólidos do Cemitério Redentor - Bauru Figura 57 - Deposição Irregular de Resíduos Sólidos do Cemitério Cristo Rei - Bauru Figura 58 - Deposição Irregular de Resíduos Sólidos do Cemitério Redentor - Bauru Figura 59 - Composteira Orgânica Primária do Cemitério Jardim dos Lírios Figura 60 - Composteiras Orgânicas Secundárias do Cemitério Jardim dos Lírios Figura 61 - Protótipo da Urna Plástica Figura 62 - Dimensão do Corpo Dentro da Urna Plástica 12 LISTA DE QUADROS Quadro 01 - Esquema do Princípio de Análise de Risco adaptado Quadro 02 - Caracterização do Meio Físico, Biológico e Antrópico Quadro 03 - Demonstração de Unidades Geotécnicas Quadro 04 - Legenda do Mapa Pedológico Quadro 05 - Legendas do Mapeamento de Risco de Erosão Quadro 06 - Demonstrativo da Pluviosidade Média e Temperatura Média Quadro 07 - Legendas da Caracterização do Bioma Quadro 08 - Identificação da Fauna Silvestre no Local Quadro 09 - Caracterização dos Bairros do Entorno do Empreendimento Quadro 10 - Classificação da Permeabilidade de Acordo com a Granulometria dos Sedimentos 13 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas APA Área de Proteção Ambiental APR Análise Preliminar de Risco ART Anotação de Responsabilidade Técnica CBRN Coordenadoria da Biodiversidade dos Recursos Naturais CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental CONAMA Conselho Nacional do Meio Ambiente DAIA Departamento de Avaliação de Impacto Ambiental DAEE Departamento de Água e Energia Elétrica EIA Estudo de Impacto Ambiental EMDURB Empresa Municipal de Desenvolvimento Urbano e Rural EVA Estudo de Viabilidade Ambiental FAFA Filtro Anaeróbico de Fluxo Ascendente GPS Sistema de Posicionamento Global IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Natural IPT Instituto de Pesquisas Tecnológicas LP Licença Prévia LI Licença de Instalação LO Licença de Operação MMA Ministério do Meio Ambiente NBR Norma Brasileira Regulamentadora ONGs Organizações Não – Governamentais PBA Projeto Básico Ambiental PCA Plano de Controle Ambiental PDDI Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado de Bauru PMB Prefeitura Municipal de Bauru PNUMA Programa das Nações para o Meio Ambiente PNMA Política Nacional do Meio Ambiental PRAD Plano de Recuperação de Áreas Degradadas RAIA Relatório de Avaliação de Impacto Ambiental 14 RCA Relatório de Controle Ambiental RIMA Relatório de Impacto Ambiental RAP Relatório Ambiental Prévio/Preliminar SISNAMA Sistema Nacional do Meio Ambiente SIGRH Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo SMA Secretaria Estadual de Meio Ambiente SNUC Sistema Nacional de Unidades de Conservação UGRHI Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos WWF World Wide Fund for Nature 15 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO...................................................................................................... 2 OBJETIVOS......................................................................................................... 2.1 Objetivo geral.............................................................................................. 2.2 Objetivos específicos ................................................................................ 3 JUSTIFICATIVA................................................................................................... 4 REVISÃO DA LITERATURA................................................................................ 4.1 O Fato “Morte” e Consequências Ambientais......................................... 4.1.1 Processo de Decomposição dos Corpos....................................... 4.1.2 Fenômenos Transformativos-Destrutivos..................................... 4.1.3 Período de Coloração…………………………………………………... 4.1.4 Período Gasoso………………………………………………………….. 4.1.5 Período Coliquativo…………………………………………………….. 4.1.6 Período de Esqueletização……………………………………………... 4.2 Caracterização dos Cemitérios.................................................................. 4.3 Licenciamento Ambiental.......................................................................... 4.3.1 Definição............................................................................................ 4.3.2 Etapas do Licenciamento................................................................. 4.4 Avaliação de Impacto Ambiental e Legislações Ambientais Aplicáveis 4.4.1 Estudo Impacto Ambiental-Relatório Impacto Ambiental (EIA- RIMA) e Legislação Disciplinadora........................................................... 4.4.2 Relatório Ambiental Preliminar (RAP).............................................. 4.4.2.1 Regulamentação..................................................................... 4.4.2.2 Elaboração e Equipe Multidisciplinar................................... 4.4.2.3 Publicidade e Participação Pública...................................... 4.5 Órgão Ambiental Competente para o Licenciamento.............................. 4.6 Legislações Aplicáveis ao Licenciamento de Empreendimentos Funerários……………………………………………………………………………… 4.6.1 Legislação Federal............................................................................. 4.6.2 Legislação Estadual........................................................................... 4.6.3 Legislação Municipal......................................................................... 4.7 Gestão Ambiental dos Resíduos Sólidos.................................................. 4.8 Análise dos Impactos Ambientais Cemiteriais......................................... 18 19 19 20 20 26 26 31 31 31 32 32 33 33 37 37 40 42 45 47 47 51 52 52 56 56 56 58 60 65 16 4.8.1 Considerações................................................................................... 4.8.2 Indicadores de Contaminação......................................................... 4.8.3 Impactos Ambientais na Fase da Operação………………………… 5 METODOLOGIA DA PESQUISA.......................................................................... 5.1 Abordagem Metodológica.......................................................................... 5.2 Caracterização do Empreendimento Cemitério Parque Jardim dos Lírios.................................................................................................................. 5.2.1 Histórico do Empreendimento Jardim dos Lírios........................... 5.2.2 Atividades Desenvolvidas pela Necrópole...................................... 5.2.3 Área do Empreendimento para Instalação do Cemitério Parque... 5.3 Aspectos Técnicos dos Estudos de Impacto Ambiental........................ 5.4 Diagnóstico Ambiental da Área de Influência.......................................... 5.5 Estudos Prévios dos Aspectos Ambientais Físicos................................ 5.6 Estudos Prévios dos Aspectos Ambientais Biológicos.......................... 5.7 Estudos do Meio Antrópico....................................................................... 5.8 Impactos Ambientais da Fase de Construção, Implantação e Operação 5.9 Caracterização e Análise dos Cemitérios Públicos de Bauru e de Outros Municípios............................................................................................ 5.9.1 Análise da Situação Cemiterial de Bauru...................................... 5.9.2 Análise dos Cemitérios Particulares.............................................. 5.9.3 Análise de Outros Cemitérios Municipais..................................... 6 RESULTADOS...................................................................................................... 6.1 Caracterização do Empreendimento Cemitério Parque Jardim dos Lírios................................................................................................................... 6.2 Fase de Instalação do Cemitério Parque................................................... 6.3 Fase de Construção e Implantação........................................................... 6.4 Métodos de Sepultamento.......................................................................... 6.5 Caracterização das Atividades Desenvolvidas pelo Empreendimento.. 6.6 Análise da Gestão Ambiental dos Resíduos Sólidos Cemiteriais........... 7 CONCLUSÃO......................................................................................................... 8 Sugestão para Pesquisas Futuras...................................................................... 66 68 70 71 71 73 73 74 75 76 77 80 92 95 102 108 109 111 113 116 116 117 117 122 124 127 133 135 17 REFERÊNCIAS.......................................................................................................... ANEXOS.................................................................................................................... Anexo A – Resolução CONAMA n. 335/03........................................................ Anexo B – Resolução CONAMA n. 368/06....................................................... Anexo C – Resolução CONAMA n. 402/08....................................................... Anexo D – Resolução CONAMA n. 001/86....................................................... Anexo E – Resolução CONAMA n. 001/A/86................................................... Anexo F – Resolução CONAMA n. 237/97....................................................... Anexo G – Constituição da República Federativa do Brasil/1988................. Anexo H – Norma Técnica – L1.040 – CETESB............................................... Anexo I – Declaração do Grupo Terra Branca.................................................. 137 145 145 149 151 152 156 157 166 167 174 18 1 INTRODUÇÃO Os problemas ambientais têm caráter universal, atingindo a todos, independente da classe social. Ainda que muitas vezes os impactos sejam sentidos com maior peso pelas classes pobres, problemas como poluição da água e do ar, rompimento da camada de ozônio e contaminação de alimentos, por exemplo, não distinguem grupos sociais. Nas duas últimas décadas, essas questões têm exercido uma maior influência nos custos econômicos, e a proteção do meio ambiente têm se tornado um importante campo de atuação para governos, indústrias, grupos sociais e indivíduos. A produção sustentável e o desenvolvimento de produto são desafios das indústrias no século XXI, à luz da crescente pressão ambiental. As operações industriais, neste mesmo período, experimentaram mudanças radicais com implicações significativas, principalmente com a introdução das normas de gestão pela qualidade ambiental, a exemplo da Norma Brasileira Regulamentadora (NBR) ISO 14000 - 2004. A década de 1970 foi denominada de “década da regulamentação e do controle ambiental”. Surgiram no Brasil as primeiras instituições de controle do meio ambiente, como resultado da Conferência de Estocolmo sobre o Meio Ambiente, em 1972. Consequentemente, a expressão “Desenvolvimento Sustentável” surge pela primeira vez em 1980, no documento denominado World Wildlife Fund (hoje, World Wide Fund For Nature-WWF) por solicitação do PNUMA. De acordo com Barbieri (2009) uma estratégia mundial para a conservação da natureza deve alcançar os seguintes objetivos: (1) manter os processos ecológicos essenciais necessários à sobrevivência e ao desenvolvimento do ser humano; (2) preservar a diversidade genética; e (3) assegurar o aproveitamento sustentável das espécies e dos ecossistemas. Em 1981 foi promulgado um dos principais documentos referentes ao ambiente: a Lei de Política Nacional de Meio Ambiente (conhecida como PNMA), Lei nº 6.938/81, e posteriormente alterada pela Lei nº 10.165, de 27 de dezembro de 2.000. Antes dela, as diretrizes legais eram setorizadas, ligadas a um aspecto do ambiente, como preservação de florestas, proteção de fauna, conservação dos recursos hídricos ou poluentes. Essa referida lei criou ainda o SISNAMA (Sistema Nacional de Meio Ambiente) e o CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente) e 19 formulou diretrizes de avaliação de impactos, planejamento e gerenciamento de zoneamentos ambientais, usando como unidades de planejamento as bacias hidrográficas (SANTOS, 2006). Com o advento do princípio do desenvolvimento sustentável (RIO-92), faz-se necessário a manutenção das bases vitais da produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens e entre estes e o meio, para que as futuras gerações também tenham oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à nossa disposição (FIORILLO e DIAFÉRIA, 1999). A Avaliação de Impacto Ambiental (AIA) é considerada uma das ferramentas que visam assegurar o desenvolvimento sustentável, como instrumento efetivo da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81), conforme já citado. O capitalismo econômico incentivou a proliferação de áreas para aterros, o aumento de áreas degradadas e o crescente descarte de esgotos nos corpos hídricos. A evolução para um mundo com cidades silenciosas, com fábricas sem a geração de resíduos e com a qualidade de vida mais elevada, estimula a busca de alternativas que possibilitem equilibrar a atividade produtiva e econômica, dentro da dimensão ambiental. As empresas, cuja atividade industrial é de alto impacto ambiental, constituem-se em crescente preocupação da sociedade e dos órgãos reguladores ambientais, devido ao elevado grau de risco à saúde das populações e de poluição ambiental. 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral No ramo funerário e cemiterial é extensa a influência no impacto ambiental que os cadáveres têm quando dispostos irregularmente em um cemitério sem os devidos estudos de impacto ambiental (EIA). Observando o cenário histórico brasileiro acerca do tema, é alarmante a forma como as necrópoles, principalmente as públicas, foram e vêm sendo construídas, ampliadas e gerenciadas, tanto em seu aspecto ambiental quanto social. 20 Neste contexto e baseado na avaliação de impacto ambiental e estudos ambientais prévios, este trabalho tem por objetivo apresentar as análises técnicas dos diversos critérios e requisitos, através de um Relatório Ambiental Preliminar (RAP), integrado no sistema de avaliação de impacto ambiental (AIA), nas suas especificidades de licenciamento ambiental, quando de sua criação (Licença Prévia), instalação (Licença Instalação) e operação (Licença Operação) em cemitérios parques, no caso específico Jardim dos Lírios no município de Bauru (SP). Busca- se, ainda, interpretar e comparar a realidade de alguns cemitérios públicos/privados, sob o enfoque da gestão ambiental e do respeito às legislações ambientais vigentes que envolvem cemitérios e o atendimento aos requisitos necessários e obrigatórios para obtenção do licenciamento ambiental de empreendimentos cemiteriais. 2.2 Objetivos específicos a) Verificar o cumprimento das legislações que estabelecem o licenciamento ambiental, avaliações de impacto ambiental e empreendimentos cemiteriais, definidos, respectivamente, nas resoluções CONAMA nº 001/86, nº 237/97, nº 335/03, nº 368/06 e nº 402/08 (grifo nosso), como ferramenta de controle prévio nas atividades com potencialidade de poluição. b) Demonstrar os estudos prévios e análises definidos no relatório ambiental preliminar (RAP) na área de empreendimento e no seu entorno, que viabilizaram o licenciamento ambiental. c) Caracterizar as inovações na construção das quadras do cemitério Parque Jardim dos Lírios e das estruturas dos jazigos, evitando assim a proliferação do produto da coliquação no solo e aquífero freático. d) Comparar os estudos realizados, o processo de licenciamento, os métodos de sepultamento e a gestão cemiterial do Cemitério Jardim dos Lírios com alguns cemitérios públicos/privados existentes. e) Apresentar um novo conceito cemiterial acerca de sua existência, localização, funcionamento e vivência dos usuários. 3 JUSTIFICATIVA 21 A presente pesquisa tem como escopo demonstrar diversos estudos e análises apresentados no Relatório Ambiental Preliminar (RAP) para obtenção do licenciamento ambiental junto a CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), na implantação de cemitério parque denominado Jardim dos Lírios, pertencente ao Grupo Funerário Terra Branca, localizado em Bauru, Estado de São Paulo. Os referidos estudos do RAP foram realizados junto ao projeto de construção, implantação e operação do Cemitério Jardim dos Lírios e deram suporte para elaboração deste trabalho e das análises comparativas apresentadas em consonância com as legislações ambientais vigentes que regulamentam os empreendimentos cemiteriais no país. Gomides (2002) explica que a importância do conhecimento e da pesquisa é um ponto de fundamental prevalência, sendo peça essencial neste processo a dificuldade de se iniciar no caminho da pesquisa científica, de conhecer seus passos, entender os quesitos válidos e necessários, além de ter sabedoria para superar as armadilhas que aparecem no decorrer do caminho. Por que formular um problema? Gil (1991) estabelece que podem existir várias condições para a formulação de problemas. Entre elas podemos citar: a) De ordem prática – formula-se o problema e tem-se uma resposta para subsidiar determinada ação. b) De ordem intelectual – conhecimento sobre determinado objeto com pouco estudo efetuado. Atualmente o Brasil possui poucos estudos voltados à sustentabilidade cemiterial. Além disso, muitos cemitérios contribuíram e contribuem para a intensa poluição freática, além de outros diversos impactos diretos e indiretos, ocasionados pela sua criação e implantação em áreas com declividade acentuada, pela proximidade dos centros urbanos, pelas frágeis construções de jazigos, pelos procedimentos de sepultamento ultrapassados, pela ausência de gestão ambiental dos resíduos, dentre outros. As resoluções CONAMA não conseguiram poder efetivo de adequação de todos os cemitérios irregulares, nem tampouco os órgãos fiscalizadores estiveram preparados para enfrentar tais problemáticas cemiteriais que assombram os “vivos”, restando, assim, em parte, a aceitação das degradações cemiteriais, e em outra, 22 alguns ajustamentos de condutas possíveis e suportáveis pelos municípios. E, diante desse quadro geral, pergunta-se: Qual é o local adequado para implantação de cemitérios, sejam eles, verticais, horizontais, parques ou de animais? Qual modelo de construção dos jazigos cemiteriais deve ser adotado? Qual é o panorama atual dos cemitérios públicos e privados que existem e que foram criados sem o devido licenciamento ambiental regular? Que tipo de gerenciamento ambiental deve ser aplicado na gestão dos diversos aspectos ambientais dos empreendimentos funerários? Para Silva (2001), hipóteses são suposições colocadas como respostas plausíveis e provisórias para o problema de pesquisa. As hipóteses são provisórias porque poderão ser confirmadas ou refutadas com o desenvolvimento da pesquisa. Um mesmo problema pode ter muitas hipóteses, que são soluções possíveis para a sua resolução. As hipóteses irão orientar o planejamento dos procedimentos metodológicos necessários à execução da sua pesquisa. A preocupação predominante dos ambientalistas é sempre manter os cemitérios fora das cidades. O crescente desenvolvimento desordenado e desenfreado das cidades não tem possibilitado a concretização desse desejo e necessidade. Os cemitérios são construídos fora das cidades, mas, em poucos anos, já se encontram em seu interior, e neste sentido as populações podem ser afetadas direta e/ou indiretamente pelos impactos das necrópoles. Além disso, a morte ocasiona uma série de consequências na sociedade, dentre as quais podemos citar a decomposição dos corpos, ao qual tem sido um problema obscuro para o homem. Baseado nestas principais premissas, as legislações vigentes, os órgãos ambientais públicos, os instrumentos da política nacional de meio ambiente formam mecanismos de prevenção e controle das poluições ambientais, e neste estudo especifico, a poluição cemiterial. Em Bauru, a existência dos cemitérios públicos e particulares antigos denotam acentuada discrepância com as normatizações das resoluções CONAMA sobre a matéria cemiterial, além de outras que envolvem áreas de preservação permanente, gestão ambiental de resíduos e conservação de áreas verdes. Antigamente estas construções fugiam de qualquer cumprimento de estudos prévios, pois jamais se imaginaria o potencial de poluição dos cemitérios. Jamais se 23 imaginaria ainda o poder potencial de poluição de um corpo pós-morte, e que, em processo de decomposição, seu líquido coliquativo fosse capaz de poluir solo e aquífero freático. Cabe salientar que, de acordo com a Resolução CONAMA n. 402/2008, o prazo para esses cemitérios antigos (públicos e particulares) se adequarem encerrou-se no ano de 2010. O esforço pela preservação do meio ambiente manifesta-se por um amplo leque de atividades, desde a luta contra grandes fontes poluidoras até hábitos ou práticas irresponsáveis que possam ter potencial de prejudicar espécies sensíveis da fauna e flora. Outro lado dessa preocupação ambiental refere-se à atuação cada vez mais intensa dos órgãos oficiais de controle e prevenção da poluição. No Estado de São Paulo, notícias de contaminação de águas subterrâneas por cemitérios ganharam repercussão na imprensa, porém, basearam-se em trabalhos executados em locais com visíveis desacordos com princípios de saneamento ambiental. A exemplo disso pode ser citado o estudo realizado no cemitério público “Cemitério Vila Nova Cachoeirinha”, localizado no bairro Nova Cachoeirinha, município de São Paulo. De acordo com Matos e Pacheco (2000): “[...] o trabalho avaliou a ocorrência e o transporte de microrganismos no aquífero freático do cemitério de Vila Nova Cachoeirinha, localizado em terrenos pré-cambrianos, zona norte do município de São Paulo. A metodologia aplicada foi dividida em etapas de laboratório e de campo. No laboratório, foram montadas colunas de solo do cemitério, aos quais traçadores químico e biológico foram injetados nas colunas e o seu fluxo monitorado no efluente. Em campo, foram realizadas investigações a fim de caracterizar o aquífero freático. O monitoramento da qualidade das águas foi realizado para estudar a ocorrência e o transporte de elementos químicos, bactérias e vírus nas águas subterrâneas. As amostras de água do aquífero freático do cemitério de Vila Nova Cachoeirinha apresentaram, principalmente, bactérias heterotróficas, bactérias proteolíticas e clostrídios sulfito-redutores. Também foram encontrados enterovírus e adenovírus nas amostras. As principais fontes de contaminação das águas subterrâneas no cemitério são as sepulturas com menos de um ano, localizadas nas cotas mais baixas, próximas ao nível freático.” A decomposição de um cadáver dá origem a um líquido conhecido como necrochorume – composto viscoso de cor acinzentada, eliminado durante o primeiro ou ate o segundo ano após o sepultamento, sendo formado por 60% de água, 30% de sais minerais e 10% de substâncias orgânicas, em que duas delas são altamente tóxicas: a putrescina e a cadaverina. Esse líquido é facilmente “dissolvido” em água, representando um meio ideal para a proliferação de doenças infectocontagiosas. Assim, as preocupações com a implantação, localização e operação de cemitérios 24 se fazem necessárias para que não ocorram problemas sérios de contaminação de mananciais de abastecimento, evitando assim efeitos nocivos à população. Conforme os estudos de Anjos (2007), do ponto de vista científico há um desconhecimento muito grande por parte da população sobre a influência ambiental que os cadáveres têm quando dispostos em um cemitério. Observando o cenário brasileiro, é alarmante a forma como as necrópoles vêm sendo gerenciadas. Os cemitérios parques podem ser uma das soluções para o problema, através da construção de jazigos com estruturas de concreto e/ou materiais vedantes em toda parte interna, o que evita que o produto da coliquação (necrochorume) se espalhe pelo aquífero freático, e ainda, que essas estruturas possam realizar a condução e troca gasosa, tais como o sulfídrico, mercaptano, dióxido de carbono, metano, amoníaco e fosfina. Apresenta-se, ainda, como uma nova opção urbanística, podendo ser uma solução para a dinâmica evolutiva dos centros urbanos de alta densidade demográfica (superpopulação). Em Curitiba, Estado do Paraná, o cemitério São Pedro recebeu certificação ISO 14.000, o que significa adoção de gestão empresarial sem agressão ambiental. Construído de acordo com normas ambientais – certamente locais – o cemitério tem um sistema de drenagem que impede que o necrochorume contamine os rios da região. Há necessidade e obrigatoriedade dos licenciamentos ambientais dos cemitérios já existentes (adequação) e dos que virão a existir, face às legislações ambientais vigentes, diante de todo o quadro de degradação ocasionado pelos cemitérios antigos e/ou irregulares, sejam públicos ou privados, além do maior controle estatal sobre estes empreendimentos cemiteriais. E, para frear os empreendimentos cemiteriais modernos, faz-se necessário os estudos preventivos para subsidiar esses órgãos públicos na avaliação dos impactos ambientais e possível aprovação. Neste contexto, a década de 1970 foi marcada por ser a “década da regulamentação e do controle ambiental”. Surgiram no Brasil as primeiras instituições de controle do meio ambiente, como resultado da Conferência de Estocolmo sobre o Meio Ambiente, em 1972. Na década de 1980, a Lei nº 6.938/81 definiu os objetivos e instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente – PNMA, e criou o Sistema Nacional de Meio 25 Ambiente SISNAMA. Neste sistema, destaca-se a criação do Conselho Nacional do Meio Ambiente, CONAMA, formado por representantes da administração pública e da sociedade civil, com as funções de assessorar, estudar e propor diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente. Ressalta-se que os instrumentos da PNMA resultaram na criação do Sistema de Licenciamento de atividades poluidoras e degradadoras do meio ambiente. Esse licenciamento e realizado, desde então, pelas instituições ambientais federais, estaduais e municipais. Neste sentido, o licenciamento ambiental tem por finalidade promover o controle ambiental prévio desses empreendimentos e atividades (art. 9º, inciso IV, da lei nº 6.938/81). A Resolução CONAMA nº 237/97 definiu como impacto ambiental regional todo e qualquer impacto que afete diretamente, no topo ou em parte, o território de dois ou mais Estados. Branco (1987) conceitua impacto ambiental como “uma poderosa influência exercida sobre o meio ambiente, provocando o desequilíbrio do ecossistema natural”. O que caracteriza o impacto ambiental não é qualquer alteração nas propriedades do ambiente, mas as alterações que provoquem o desequilíbrio das relações constitutivas do ambiente, tais como as alterações que excedam a capacidade de absorção do ambiente considerado. Fiorillo (2001) expõe que o estudo de impacto ambiental (EIA), que é subsídio para o licenciamento, deve, em sua execução de estudos técnicos e científicos, ser elaborado por equipe multidisciplinar, destinada a analisar sistematicamente as consequências ambientais decorrentes do planejamento, da ampliação, da operação, da implantação e, quando for o caso, da desativação de um determinado empreendimento ou atividade, por meio da identificação prévia dos impactos, e prodinosticar os efeitos a partir da teoria ecológica vigente e da avaliação, análise ou valoração dos impactos ambientais, sejam positivos ou adversos. Há de se pensar no enfrentamento dos mais diversos impactos que estes empreendimentos, espaços públicos ou privados, nos causam. Principais para uns e não para outros, seriam os impactos ambientais, podendo ser camuflados diante de tantos outros causados, como por exemplo, os impactos legais, sociais (carentes e indigentes), físicos (falta de espaço), imobiliários (especulação, desvalorização), impactos de vizinhança (implantação), comercial (concorrência entre as funerárias), 26 relacionados à violência (crimes e roubos), à saúde pública (disseminação de doenças), dentre outros diversos aspectos de influência direta e indireta dos cemitérios nas cidades. 4 REVISÃO DA LITERATURA 4.1 O Fato “Morte” e consequências ambientais Segundo o historiador Ariès (2003), havia, no início da Idade Média, uma familiaridade com a morte, que era um acontecimento público. Ao pressenti-la, o moribundo se recolhia ao seu quarto, acompanhado por parentes, amigos e vizinhos. O doente cumpria um ritual: pedia perdão por suas culpas, legava seus bens e esperava a morte chegar. Não havia um caráter dramático ou gestos de emoção excessivos. Em sua obra “História da morte no ocidente”, Ariès (2003) ainda esclarece que o corpo era enterrado nos pátios das igrejas, os quais também eram palco de festas populares e feiras. Mortos e vivos coexistiam no mesmo espaço. As sepulturas, anônimas até o século XII, passaram a ser identificadas por inscrições, efígies e retratos: era importante preservar a identidade mesmo após a morte. A arte funerária evoluiu muito do século XIV ao XVIII. A partir do século XVIII, conta Ariès (2003): “[...] a morte tomou um sentido dramático, exaltado. Passou a ser encarada como uma transgressão que roubava o homem de seu cotidiano e sua família. Inaugurava-se o culto aos cemitérios (grifo nosso). O luto era exagerado: o personagem principal era então a família, e não mais o morto. Não se temia mais a própria morte, mas a do outro. A partir da segunda metade do século 19, a morte se transformou em tabu: os parentes do moribundo passaram a tentar poupá-lo, esconder a gravidade do seu estado.” A partir do ano 1930, a medicina mudou a representação social da morte: já não se morre em casa, entre parentes, mas no hospital, sozinho. Os avanços da ciência permitem prolongar a vida ou abreviá-la. Pacientes podem ser condenados a meses ou anos de vida vegetativa, ligados a tubos e aparelhos. 27 Marlet (1987) traz uma conceituação jurídica de morte ou morte clínica, implicando que o indivíduo (sujeito de direitos e obrigações) deixa de existir como unidade social, pouco importando que em seu corpo existam formas residuais de vida. Esta foi a posição oficial adotada no Congresso Mundial de Médicos, em 1968, quando se afirmou que “o interesse clínico não reside no mantimento de células isoladas, senão da pessoa”. A morte, além dos mistérios que desperta no homem, ocasiona uma série de consequências na sociedade, dentre as quais pode ser citada a decomposição dos corpos, que tem sido um problema obscuro para o homem, problema este que o acompanha desde tempos imemoriais. Com a morte, todo o corpo perde sua vitalidade, sofrendo, com o passar das horas, um processo degenerativo de suas células que o leva a desintegração. Um complexo de reações químicas desordenadas e uma presença ofensiva de micróbios e insetos sobre o cadáver são os responsáveis por esse quadro entristecedor. Silva (2000) estabelece que: “[...] com o fim da vida, o corpo do homem entra em processo irreversível de decomposição contínua pelo efeito de atuação de forças físico-químicas, oriundas da degeneração dos órgãos, tecidos e células. Algumas dessas são essenciais e outras acidentais. Umas inerentes ao próprio cadáver, outras exteriores. Se, de regra, as causas desse processo são micróbios, no qual estes são os principais agentes responsáveis por esse quadro, podendo ser aeróbicos ou anaeróbicos (os primeiros só vivem e atuam onde existe ar, os segundos, na ausência destes). Vezes há em que ela decorre de insetos. Excepcionalmente, entretanto, a destruição do corpo pode decorrer da ação de aves, mamíferos e até de peixes. No processo putrefativo, o oxigênio aparece como agente decisivo e indispensável na formação desse quadro. Dependendo da sua presença no ambiente, mais rápido será o processo de decomposição. Quanto menor, maior será o tempo putrefativo.” Delmonte (1995) estabelece que existe uma confusão entre os conceitos de "podre" e "estragado". A matéria podre, resultado da putrefação, é fenômeno fundamental à vida, é natural, não agride o ambiente, não provoca, nem transmite doenças, ao contrário, como é descrito a seguir, faz parte da história alimentar do homem moderno e é fundamental aos ciclos vitais. A matéria contaminada por microorganismos, sejam eles patogênicos ou não, pode ocasionar doenças. 28 Em seus ensinamentos Delmonte (1995) considera ainda que a putrefação é um conjunto de cadeia de reações químicas complexas, muitas delas semelhantes àquelas que ocorrem em vida, no citoplasma e nas mitocôndrias, em algumas etapas inversas às da fotossíntese. A putrefação é um fenômeno complexo, fundamental à vida e à sua manutenção. Dificilmente considera-se o significado de podre diferente do significado de estragado, principalmente quanto à discussão e abordagem de assuntos relativos ao impacto ambiental ou quanto à fundamentação para elaboração da legislação. O processo putrefativo ocorre em progressão, como dito, atingindo primeiro os tecidos moles, mais tarde os fibrosos e, depois, os ossos. A evolução deste processo é variável, dependendo de fatores internos (características próprias de cada cadáver, como idade, causa da morte, gorduras) e externos (calor, frio, estado atmosférico, condições da sepultura, porosidade e composição química do terreno, presença de água, umidade). Desse processo complexo de decomposição cadavérica advêm emanações variadas, como ácido carbônico, ácido sulfídrico, ácido acético, ácido nítrico, óxido de carbono, hidrogênio carbonado, hidrogênio fosforado, nitrogênio e amoníaco. Desprende-se também um vapor aquoso com matérias orgânicas corruptas, cujas partículas são designadas por miasmas cadavéricos ou pútridos, que, além do cheiro insuportável, produzem efeitos perigosos (SILVA, 2000). Das fermentações microbianas putrefativas resultam substâncias tóxicas, chamadas ptomaínas (de ptoma, cadáver). Essa matéria resulta de grande risco de contaminação e, ainda, a exalação de um cheiro mais acentuado no início da putrefação do que na fase da fusão dos tecidos. Com isso, surge um estado denominado “terriço animal”, de cor negra ou cinzento-escura e de estado untuoso, em que ainda se encontram alguns princípios orgânicos e inorgânicos não voláteis (PACHECO, 2002). Apenas uma pequena parcela da população conhece o poder que os mortos têm de serem capazes de se tornarem perigosos poluentes. O processo de decomposição de um corpo, que ao todo leva em média dois anos e meio, dá origem ao líquido chamado necrochorume, ou líquido da coliquação, conforme denominação dada pela Resolução CONAMA nº 335. Este composto é eliminado durante o primeiro ano após o sepultamento. Trata-se de um escoamento viscoso, com a 29 coloração acinzentada, que com a chuva pode atingir o aquífero freático, ou seja, a água subterrânea de pequena profundidade. De acordo com Silva (2000), em 600 cemitérios do País constatou-se que cerca de 75% deles poluem o meio ambiente. Ora por não tomarem o devido cuidado com o sepultamento dos cadáveres, ora pela localização topográfica de terrenos que são inapropriados para tal. Aponta-se, por exemplo, o limite de dois metros acima do aquífero freático para o sepultamento de um morto. A interação dos cadáveres com o meio geológico, os processos de putrefação e decomposição dos corpos, os processos transformativos que chegam a um estado de mineralização das partes orgânicas, a atuação de microorganismos, a ocorrência de poluição e contaminação do solo e das águas subterrâneas pelos efluentes cadavéricos são os fatores potencialmente poluidores (PACHECO et al., 1993; CETESB, 1999). Segundo Pacheco (2002), o necrochorume é formado por 60% de água, 30% de sais minerais e 10% de substâncias orgânicas, duas delas altamente tóxicas: a putresina e a cadaverina. Na grande São Paulo há situações constatadas de vetores transmissores da poliomielite e da hepatite e as pessoas que não tem acesso à rede pública de abastecimento de água e utilizam poços é que são principalmente afetadas. É muito importante destacar que a posição geográfica das necrópoles é fundamental, assim como sua operação e funcionamento. Se ocorrer uma inadequação desses processos, a necrópole, em meios urbanos, pode provocar a contaminação de mananciais hídricos por microrganismos que proliferam neste processo de decomposição cadavérica. Se o aquífero freático for contaminado na área interna do cemitério, esta contaminação poderá fluir para regiões próximas, aumentando o risco de saúde nas pessoas que venham a utilizar desta água, captada através de poços rasos. De acordo com Matos (2001), as amostras de água do aquífero freático do cemitério de Vila Nova Cachoeirinha (SP) apresentaram, principalmente, bactérias heterotróficas (53 x 103 UFC/ml), bactérias proteolíticas (31 NMP/100 ml) e clostrídios sulfitorredutores (45 NMP/100 ml). Também foram encontrados enterovírus e adenovírus nas amostras. As principais fontes de contaminação das águas subterrâneas no cemitério são as sepulturas com menos de um ano, 30 localizadas nas cotas mais baixas, próximas ao nível freático. Nestes locais, é maior a ocorrência de bactérias em geral e, assim, há um grande consumo do oxigênio existente nas águas. As sepulturas ainda provocam um acréscimo na quantidade de sais minerais, aumentando a condutividade elétrica destas águas. As bactérias são transportadas há poucos metros, diminuindo sua concentração com o aumento da distância à fonte de contaminação. Os vírus parecem ter uma mobilidade maior que as bactérias, podendo atingir algumas dezenas de metros no aquífero freático do cemitério de Vila Nova Cachoeirinha. Os vírus foram transportados, no mínimo, 3,2 metros na zona não saturada até alcançar o aquífero. Os cemitérios públicos, em suas totalidades, podem apresentar problemas de contaminação das águas subterrâneas, ou seja, problemas hidrogeoambientais, ocasionados pelo necrochorume. O sinal de alerta tem sido dado pelo geólogo paulista Lezíro Marques Silva (2000), que pesquisa o assunto desde 1970. Para sua pesquisa, o professor percorreu 600 cemitérios municipais e particulares em todo o Brasil, encontrando um quadro, no mínimo, preocupante. Segundo ele, cerca de 75% dos cemitérios públicos apresentam problemas de contaminação e, no caso dos particulares, o índice é de 25%. O autor complementa que não registrou qualquer preocupação das autoridades com essa questão. Segundo o pesquisador, o cadáver de um adulto pesando em média 70 quilos, produz cerca de 30 litros de necrochorume em seu processo de decomposição. Esse líquido, como citado anteriormente, é composto, dentre outros componentes, por substâncias bastante tóxicas, como a putresina e a cadaverina, capazes de proliferar substâncias responsáveis pela transmissão de doenças infectocontagiosas, como a hepatite e a poliomielite. Em razão dessas características peculiares, esses microorganismos podem proliferar num raio superior a 400 metros do cemitério. Silva (2000) explica ainda que o necrochorume é facilmente absorvido pela água e, por isso, a contaminação é problemática, principalmente, nos locais onde o abastecimento se dá por poços ou cisternas. Além da contaminação, a má localização dos cemitérios é outro fator de dificuldade, pois o estado inalterado de alguns corpos, a exemplo da ocorrência da saponificação (fenômeno conservador), conhecida como adipocera (gordura de aspecto céreo), ocorre quando o corpo não se decompõe e é sepultado em ambiente úmido, pantanoso. Pacheco (2000) define 31 que o solo argiloso, impermeável ou pouco permeável, quando saturado de água, facilita a saponificação, sendo este tipo de solo não recomendado para sepultamentos. Em geral, a formação da adipocera leva cinco a seis meses após a morte e o corpo saponificado fica com aspecto untoso. Este fenômeno é comum nos cemitérios brasileiros e tem como causa a invasão das sepulturas por águas subterrâneas e superficiais e, enquanto persistir a causa, o corpo ficará saponificado. Outro fenômeno é a mumificação, que ocorre quando o cadáver sofre uma desidratação rápida e intensa e o corpo não entra em decomposição, uma vez que a fauna cadavérica não resiste, ficando a pele com aspecto de couro, devido ao enterro desses corpos em terrenos secos, quentes e arejados. 4.1.1 Processo de Decomposição dos Corpos Há variantes que interferem na decomposição da matéria orgânica, concorrendo para sua evolução ou retardo. Podem ser de natureza intrínseca, pertinente ao corpo, como constituição física, idade e causa mortis, ou extrínsecas, ligadas ao ambiente em que está o corpo inserido, como temperatura, umidade, natureza do solo e ventilação. 4.1.2 Fenômenos Transformativos-Destrutivos Nos processos transformativos ocorrem reações físico-químicas motivadas pela ação dos microorganismos aeróbicos e facultativos, que resultam na decomposição e estabilização dos componentes orgânicos. Nas condições normais, a decomposição de cadáveres efetua-se em quatro fases distintas que, na prática, podem se processar simultaneamente em várias áreas do corpo: período de coloração, período gasoso, período coliquativo ou humoroso, e período de esqueletização. As características de cada uma dessas fases serão abordadas a seguir de modo sucinto, dando o enfoque por tópicos de interesse do estudo. 4.1.3 Período de Coloração 32 A putrefação se inicia com a manifestação das bactérias intestinais (enterobactérias) do tipo saprófitas em meio anaeróbico. Exterioriza-se através de manchas verdes a altura da fossa ilíaca, onde se acumulam gases, no começo, se difundindo posteriormente pelo abdômen, tórax, cabeça e membros, formando sulfometaglobulina. O ceco, porção inicial do intestino, é onde ocorre o maior acúmulo de gases que, por estar muito próxima da parede abdominal da fossa ilíaca direta, determina o aparecimento da chamada “mancha verde abdominal”. O tempo de aparecimento das manchas está condicionado a uma série de fatores relacionados ao próprio corpo e ao meio externo. Este primeiro período pode durar cerca de 7 dias, sendo mais lento nos cadáveres inumados do que nos conservados ao ar livre. Os fatores intrínsecos (pertinentes ao próprio corpo, tais como idade, constituição física e causa mortis) e extrínsecos (pertinentes ao ambiente onde o corpo está depositado, como temperatura, umidade, aeração, constituição mineralógica e permeabilidade do solo), influenciam no tempo necessário para o surgimento da referida mancha. 4.1.4 Período Gasoso Nesta fase, os gases originados na cavidade abdominal começam a se difundir por todo o corpo, originando a formação de bolhas cheias de líquido nos tegumentos e um enfisema putrefativo facilmente visível. Em decorrência do acúmulo de gases, o corpo vai se avolumando, ficando com aspecto de gigantismo devido a forte pressão dos gases putrefativos. O sangue, já alterado, é profelido para a periferia do corpo, ficando os vasos desenhados nos tegumentos. Por fim, dada as forças dos gases, pode-se desencadear o fenômeno de ruptura das paredes abdominais. 4.1.5 Período Coliquativo Denominado também de fase humorosa, o período coliquativo é caracterizado pela dissolução pútrida, com a formação de um líquido denso e escuro, o 33 necrochorume, também conhecido como líquido da coliquação. As partes moles tem seu volume reduzido devido à desintegração dos tecidos. Os gases se exalam, ficando o corpo reduzido a uma massa de odor fétido, perdendo pouco a pouco a sua forma. Nesse período, além dos microorganismos putrefativos, quando o corpo se encontra ao ar livre ou inumados em contato com o solo, há grande participação de larvas de insetos em quantidade na concorrência à destruição do cadáver. Este período normalmente tem a duração de 6 a 8 meses após o sepultamento, numa faixa de temperatura entre 18 e 25°C, a depender das condições de resistência do corpo e da agressividade do meio externo. A ação continuada das bactérias, insetos e ácaros, em conjunto com as condições ambientais, reduz consequentemente o volume e conduz a matéria orgânica ao estado pulverulento, deixando livre o esqueleto. 4.1.6 Período de Esqueletização Neste período, o residual de matéria orgânica dos ossos costuma liberar o fósforo sob a forma de fosfina, que reage com o oxigênio atmosférico, dando origem a um fenômeno luminoso de curtíssima duração e de observação fortuita, conhecida como “fogo fátuo”. Cabelos e ossos podem resistir por muitos anos. Os ossos podem resistir por dezenas de anos, perdendo a sua estrutura e resistência com a extinção da osseína, ficando presente apenas a porção mineral, representada pelo carbonato de cálcio (CaCO3), tornando-se friáveis, frágeis, quebradiços e mais leves. Em geral, ao ser desmontado o esqueleto, a massa cadavérica é reduzida a 18 a 20 kg, decorridos dois anos e meio a três anos do sepultamento. Esse período pode durar de vários meses a vários anos dependendo das condições do meio. Quando da ocorrência de fenômenos conservativos (saponificação ou mumificação), não se completará a destruição do corpo e a esqueletização não é atendida. 4.2 Caracterizações dos Cemitérios 34 Para conceituar cemitério, é necessário que, preliminarmente, se apresente a origem da palavra. Cemitério, tanto pode ter vindo do latim coemeterium, que deriva, por sua vez, de cinisterium (cinos: doce; renor: mansão), como do grego Kouméterion, de Kaimâo, que significa ‘eu durmo’ (em sentido literal, denota dormitório e, em sentido analógico, denota lugar de repouso). O vocábulo alemão friedholfs coincide com a ideia primitiva, campo de paz ou lugar de sono (SILVA, 2000). Em sentido estrito, cemitério é o local em que é dada a sepultura, por inumação, por enterramento direto no solo. Assim, podemos dizer que cemitério é, de acordo com Silva (2000): “[...] o local apropriado, com destinação específica, formada por duas ou mais sepulturas ou sepulcros, onde são ou foram inumados mortos. Juridicamente, cemitério é o bem imóvel, público ou privado, de uso especial, fiscalizado pelo poder público municipal, no qual, mediante negócio jurídico de concessão ou locação, são sepultados os mortos.” Em conceituações analógicas, necrópole, terra santa, campo-santo, não são coisas diversas. Trata-se de expressões sinônimas para indicar a mesma realidade: o cemitério (o local dos mortos). Etimologicamente, a palavra cemitério vem do grego Kaimâo, que significa dormir. Assim, a palavra, primitivamente, significava o lugar onde se dormia, e só nos primeiros séculos de nossa era é que passou a ter o sentido de necrópole, de campo-santo, campo de descanso eterno etc. Como se pode inferir das palavras bíblicas, nos cemitérios dormem os mortos até serem acordados pelas “trombetas do juízo universal”, quando se levantarão incorruptos. Em outras passagens, pode-se entender a morte como sinônimo de sono. Entretanto, nem sempre a morte é vista desta forma na Bíblia. No antigo Testamento, pelo contrário, ela é tida como a desgraça dos homens, dando-se mais atenção à vida do que o mistério do além- túmulo (SILVA, 2000). De acordo com estudos de Dias (1963), em Roma, assim como na Grécia, o enterro dos mortos era um dever sagrado. Os romanos praticaram, simultaneamente, os dois grandes ritos funerários: a cremação e a inumação. A cremação é, desde as origens, o rito mais frequente. A Lei Romana interditava os sepultamentos no interior das cidades (salvo no caso de pessoas singulares). 35 Segundo Machado (2006), os cemitérios podem ser enquadrados no denominado meio ambiente artificial, que é aquele resultante da intervenção humana, a exemplo das praças, ruas, edifícios. Mas, obviamente, tanto o meio ambiente artificial como o cultural e o do trabalho têm sua origem no próprio meio ambiente natural. Este último, portanto, sofre as consequências negativas das ações ou empreendimentos humanos, em nome de um propagado desenvolvimento socioeconômico ou mesmo para satisfazer as necessidades biológicas, psicológicas ou transcendentais da sociedade. O enterramento dos mortos é exemplo típico dessas "necessidades" sociais, que existem desde a mais primitiva organização grupal. Uma sepultura isolada não caracteriza um cemitério. Para isso, é necessário que haja várias sepulturas mais ou menos aproximadas ou reunidas, constituindo um todo. Desta forma, o jazigo ou o mausoléu que a família manda erigir em sua propriedade também não constitui cemitério. Com o desenvolvimento das metrópoles e cidades, a urbanização foi se envolvendo ao redor dos cemitérios, e essas sepulturas de periferia logo se tornaram partes urbanas, isto é, os mortos, que haviam sido expulsos da cidade, estavam novamente inseridos na cidade, por culpa do próprio homem, que resolveu instalar- se tão próximo. Assim tem sido até os dias de hoje. Nem se poderia pensar de outra forma, sob pena de esquecermos as origens das cidades. Parece-nos que elas só tiveram origem a partir do culto aos mortos, isto é, a cidade dos vivos só tem existência depois do surgimento da cidade dos mortos. A necrópole, então, precede a metrópole (SILVA, 2000). Normalmente, os cemitérios são construídos próximos às comunidades, não somente por circunstâncias culturais e religiosas, mas também por questões socioeconômicas de valorização de áreas envoltórias de cemitérios, de pressões demográficas e de capitalização da urbanização (UÇISIK e RUSHBROOK, 1998; REZENDE, 2004) Com isso, os cemitérios não são uma decorrência das cidades, mas a sua razão. Estas últimas surgiram e aparecem ao lado dos cemitérios e só mais tarde é que se determinará a criação de cemitérios recentes mais afastados das cidades. Depois estarão novamente dentro das mesmas pelo desenvolvimento metropolitano e daí a tentará a sua retirada e o processo se repete continuamente. 36 A preocupação predominante dos ambientalistas é sempre em manter os cemitérios fora das cidades. O êxodo rural e o crescente desenvolvimento desordenado e desenfreado das cidades, entretanto, não têm possibilitado a concretização desse desejo e necessidade. Como considerado, os cemitérios são construídos fora das cidades, mas, em poucos anos, já se encontram em seu interior. Apresenta-se como exemplos os Cemitérios da Saudade e Redentor, ambos localizados no município de Bauru, que foram totalmente afunilados pela urbanização. O último é vítima constante de vários furtos, destruição e abandono pela Prefeitura Municipal, ratificando um grande desrespeito para com os mortos e suas famílias. A problemática da localização dos cemitérios continua a desafiar a competência dos administradores públicos e prolonga-se no tempo sem solução. O aumento vertiginoso da população urbana aproxima cada vez mais os mortos dos centros urbanos. Segundo relata a Resolução CONAMA n. 335/2003, existem quatro tipos de cemitérios: os horizontais, os parques ou jardins, os verticais e os de animais. De acordo com a citada Resolução, o cemitério vertical é um edifício de um ou mais pavimentos dotados de compartimentos destinados a sepultamentos. A falta de espaço nas cidades obrigou os cemitérios a se instalarem em regiões cada vez mais distantes. Os cemitérios verticais surgiram como uma solução para este problema e são uma tendência em várias cidades dos Estados Unidos, Canadá e Europa. Mantendo os costumes tradicionais, o sepultamento é feito em jazigos horizontais, estanques de concreto armado e, no Brasil, já são encontrados em São Paulo, Santos, Porto Alegre, Curitiba e Bauru (MATOS, 2001) Os cemitérios horizontais são os mais tradicionais e ficam localizados em áreas descobertas, com construções tumulares. Este tipo de cemitério é a maioria em nosso país. Cemitérios do tipo parque ou jardim, de acordo com a mesma resolução, são aqueles predominantemente recobertos por jardins, isentos de construções tumulares, e no qual as sepulturas são identificadas por uma lápide ao nível do chão. É o principal foco de análise deste estudo. A inovação da Resolução CONAMA foi a caracterização e regulamentação dos cemitérios de animais, que jamais teve normatização ao longo da história, e que 37 preconiza que animais de diversos portes devem ser enterrados em cemitérios licenciáveis, evitando, assim, a contaminação do solo e aquífero freático. É obrigatório, neste caso, que clínicas veterinárias, possuidores de animais e órgãos públicos gestores façam o destino correto dos animais mortos. 4.3 Licenciamento Ambiental 4.3.1 Definição Como determina o art. 9º, IV, da lei 6.938/81 Política Nacional do Meio Ambiente, o licenciamento ambiental é um instrumento de caráter preventivo de tutela do meio ambiente. Fiorillo (2001) explica que o licenciamento ambiental não é ato administrativo simples, mas um encadeamento de atos administrativos, o que lhe atribui a condição de procedimento administrativo. Alem disso, é importante frisar que a licença administrativa constitui ato vinculado, o que denuncia uma grande distinção em relação à licença ambiental, porquanto esta é, como regra, ato discricionário. Kirchhoff (2004) explica que o Licenciamento Ambiental é instrumento que se mostra com estreita ligação com processos de avaliação de impacto ambiental, e somente deve ser concedido após a certeza da conciliação entre a atividade e a qualidade ambiental. A Constituição Federal de 1988, ao contrário das anteriores, demonstra séria preocupação ambiental e é muito bem sintetizada em seu art. 225, em que cita que “Todos tem direito ao Meio Ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial a sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. Quanto aos aspectos relacionados ao homem, estes dependem de valores coletivos, evolutivos no tempo e no espaço, que definem diferentes paradigmas da relação homem/natureza. De certo modo, há equivalência entre os conceitos de ecodesenvolvimento e de desenvolvimento sustentável, sendo este último o mais novo paradigma de gestão ambiental (SILVA, 2000). 38 Lopes (2006) estabelece que o CONAMA instituiu uma política nacional de avaliação de impactos ambientais, exigindo estudos e audiências públicas para o licenciamento de atividades potencialmente poluidoras. Os EIA-RIMA são introduzidos na mecânica do licenciamento, com toda a classificação de atividades ou empreendimentos sujeitos ao licenciamento ambiental (extração mineral, indústrias, obras, serviços, transporte, atividades agropecuárias, uso de recursos naturais). Milaré (2005) apresenta licenciamento ambiental como todo procedimento administrativo que é caracterizado como uma sucessão itinerária e encadeada de atos administrativos, que tendem a um resultado conclusivo, sendo um importante instrumento de gestão do ambiente, ao qual a administração pública busca exercer o necessário controle sobre as atividades humanas. Neste sentido, o licenciamento ambiental tem por finalidade promover o controle ambiental prévio desses empreendimentos e atividades, conforme preconiza o art. 9º, inciso IV, da lei n. 6.938/81 da PNMA. Ao conceituar a complexidade das atividades efetiva ou potencialmente poluidoras como um dos instrumentos da PNMA, a Lei n. 6.938/81, em seu art. 10, determinou: “[...] que a construção ou instalação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como as capazes de, sob qualquer forma, causar degradação ambiental dependerão de prévio licenciamento ambiental por parte do órgão estadual competente, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.” Devido à complexidade intrínseca do meio biofísico, as diferentes formas do homem em compreendê-lo e utilizá-lo, bem como as incertezas inerentes às inter- relações do homem com este meio, resultam a dificuldade, entre outras, de se fazer julgamentos sobre desempenhos ambientais de atividades humanas. O processo de licenciamento ambiental, em qualquer das etapas, será inteiramente custeado pelo empreendedor (MILARÉ, 2005), que deverá ressarcir o órgão licenciador de todos os custos envolvidos no processo. 39 Na esfera da legislação ambiental estabeleceram-se os regulamentos que configuram o Sistema de licenciamento e o Controle das Atividades Poluidoras, completados pelas normas e padrões de qualidade ambiental. Os estudos a serem apresentados no procedimento de licenciamento ambiental têm basicamente as seguintes características: • descrever a ação proposta e as alternativas ao empreendimento; • prever a natureza e a magnitude dos efeitos ambientais; • identificar as preocupações humanas relevantes; • listar os indicadores de impacto a serem utilizados e, para cada um, definir sua magnitude; • a partir dos valores previstos, determinar os valores de cada indicador de impacto ambiental. A Resolução CONAMA nº 237/97 definiu como impacto ambiental regional todo e qualquer impacto que afete diretamente, no topo ou em parte, o território de dois ou mais Estados. A Lei de Crimes Ambientais nº 9.605/98, em consonância com a Constituição Federal de 1988, estabelece a obrigatoriedade do licenciamento ambiental das atividades degradadoras da qualidade ambiental e, estabelece ainda, que as atividades e condutas consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão aos infratores, pessoas físicas ou jurídicas, sanções penais, administrativas e independentes da obrigação de reparar os danos causados. De acordo com a Lei nº 9.985/2000, Lei do SNUC, nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental, assim definido pelo órgão ambiental competente, com fundamento em estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental, o empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção da unidade de conservação do grupo de proteção integral, de acordo com o disposto no regulamento desta lei. A Resolução CONAMA nº 237/97 tratou de definir, no seu art. 1º, I, licenciamento ambiental como: “[...] o procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradações ambientais, considerando as 40 disposições legais e regulamentares, e as normas técnicas aplicáveis ao caso.” A mesma resolução também definiu licença ambiental (art.1º, II) ao preceituar que “é o ato administrativo pelo qual o órgão ambiental competente estabelece as condições, restrições e medidas de controle ambiental que deverão ser obedecidas pelo empreendedor, pessoa física ou jurídica, para localizar, instalar, ampliar e operar empreendimentos ou atividades utilizadoras dos recursos ambientais consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou aquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental”. Como prática do poder de polícia administrativa, o licenciamento não deve ser considerado como obstáculo ao desenvolvimento, mas sim como instrumento da PNMA, efetivo que estipula condicionantes e diretrizes ambientais com características essencialmente preventivas. 4.3.2 Etapas do Licenciamento Milaré (2005) discorre que o licenciamento ambiental é o complexo de etapas e procedimentos que compõe o procedimento administrativo, o qual objetiva a concessão de licença ambiental. Dessa forma, não é possível identificar isoladamente a licença ambiental, pois a conectividade entre elas é fator fundamental para controle do órgão ambiental e verificação das condicionantes impostas e exigidas. O licenciamento ambiental é realizado em três etapas distintas e insuprimíveis: a) outorga da licença prévia, b) outorga da licença de instalação, e c) outorga de licença de operação. Ressalta-se que entre uma etapa e outra pode fazer necessário o EIA-RIMA e a audiência pública. De acordo com Fiorillo (2001) a licença prévia vem enunciada no art. 8º, I, da Resolução CONAMA nº 237/97 como aquela concedida na fase preliminar do planejamento da atividade ou empreendimento, aprovando a sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de implementação. Marçal (2011) explica que, neste caso, comparecendo o empreendedor pessoalmente ou através de notificação, deve-se dar aquiescência àquele dos documentos 41 necessários à instrução do processo, concedendo-lhe um prazo para apresentação destes, que deverá ser razoável, tendo em vista a necessidade de realização de alguns estudos. É importante verificar que a licença prévia tem prazo de validade de até cinco anos, conforme dispõe o art. 18, I, desta mesma Resolução. Oliveira (1998) estabelece que a contagem do prazo para análise do requerimento da licença somente se inicia depois da aceitação dos documentos apresentados e, caso seja convocada audiência pública, depois da realização desta. A licença de instalação, obrigatoriamente precedida pela licença prévia, é aquela que autoriza a instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados, incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da qual constitui motivo determinante, conforme preceitua o art. 8º, II, da Resolução CONAMA nº 237/97 (MILARÉ, 2005, p.535). Assim como a licença prévia, a licença de instalação também possui prazo de validade, que não poderá superar seis anos, conforme dispõe o art. 18, II, da referida Resolução. A Licença Prévia e a Licença de Instalação poderão ter os prazos de validade prorrogados, desde que não ultrapassem os prazos máximos estabelecidos acima. A licença de operação, também chamada de licença de funcionamento, sucede a licença de instalação e tem por finalidade autorizar a operação da atividade ou empreendimento, após a verificação do efetivo cumprimento do que consta das licenças anteriores, com as medidas de controle ambiental e condicionantes determinados para a operação, conforme dispõe o art. 8º, III, da Resolução CONAMA nº 237/97. Marçal (2003) afirma que na terceira etapa o órgão ambiental deverá avaliar os documentos, projetos e estudos, realizando as vistorias técnicas, quando necessárias. Após esta avaliação, deve solicitar esclarecimentos e complementações. Embora a Resolução diga que tais pedidos devam ser feitos uma única vez, permite a reiteração do mesmo, caso não tenham sido satisfatórios. O escopo é evitar a promulgação de pedidos, devendo o procedimento respeitar as fases e os prazos concedidos. O referido autor esclarece ainda que, para renovação da licença de operação deve o empreendedor requerer com antecedência mínima de 120 dias da expiração de seu prazo de validade, fixado na respectiva licença, 42 ficando este automaticamente prorrogado até a manifestação definitiva do órgão ambiental competente. 4.4 Avaliação de Impacto Ambiental Na década de 1980, a lei federal brasileira nº 6.938/81 definiu os objetivos e instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA) e criou o Sistema Nacional de Meio Ambiente (SISNAMA). Neste sistema, destaca-se a criação do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), formado por representantes da administração pública e da sociedade civil, com as funções de assessorar, estudar e propor diretrizes de políticas governamentais para o meio ambiente. Ressalta-se que os instrumentos da PNMA (Política Nacional de Meio Ambiente) resultaram na criação do Sistema de Licenciamento de atividades poluidoras e degradadoras do meio ambiente. Esse licenciamento é realizado, desde então, pelas instituições ambientais federais, estaduais e municipais. Neste sentido, o licenciamento ambiental tem por finalidade promover o controle ambiental prévio desses empreendimentos e atividades (inciso IV, art. 9º, da lei 6.938/81). A Comissão Europeia em tempos criticou que, alguns Estados-Membros têm tido a oportunidade de reforçar a coerência e reduzir a duplicação de documentação e avaliação por meio de uma coordenação mais estreita da Avaliação de Impacto Ambiental (EIA) e da Avaliação de Habitats (HA) (Comissão Europeia, 2003). Além disso, a Comissão sugere um “procedimento combinado” para os planos e programas que estão sujeitos a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) e Avaliação de Habitats (HA). O objetivo principal é identificar as sobreposições das avaliações para mostrar que é possível harmonizar as suas necessidades e transferi-los para uma avaliação abrangente sobre o meio ambiente. Além disso, visa demonstrar que a integração global é possível de forma sistemática na incorporação dessa avaliação integrada nos processos de licenciamento ambiental, enfocando principalmente regulamentos jurídicos alemães e que são baseados no quadro europeu (WEINGARTEN, 2009). As análises de Weingarten (2009) direcionam para o quadro regulamentar, seguido por algumas questões práticas sobre uma elaboração conjunta de avaliações ambientais, sendo que os resultados da análise definem o grau de integração. A investigação centra-se no seguinte ambiente de avaliações: a 43 Avaliação de Impacto Ambiental (EIA, EIA Diretiva 85/337/CEE), a Avaliação de Habitats (HA, estabelecidas pela Diretiva de Habitats 92/43/CEE) e a Avaliação Ambiental Estratégica (AAE, a Diretiva AAE 2001/42/CE). As avaliações ambientais na Alemanha visam à determinação de seguintes fatores que são suscetíveis de ter um significativo efeito sobre o meio ambiente. Na Alemanha, existem exigências adicionais impostas pelo Princípio da Mitigação de Impactos (IMP). O instrumento para a avaliação de impacto ambiental está em vigor desde 1976. Seu principal objetivo é garantir que natureza e paisagem desempenhem as suas funções essenciais, através da eliminação ou mitigação dos impactos inevitáveis (KOPPEL et al., 2004). Ele solicita a implementação de medidas de compensação caso o impacto não possa ser evitado em primeira instância ou mitigado, uma vez que ocorreu (RUNDCRANTZ, 2006). O IMP é obrigatório para a maioria dos projetos que necessitam de autorização, resultando em uma aplicação ampla e de metodologias experimentadas e testadas. A avaliação da significância deve ser realizada separadamente para cada avaliação. Todas as avaliações exigem a definição de medidas para neutralizar os impactos negativos. A prevenção de impactos em “A Lei de Conservação Alemã da Natureza” é o principal objetivo da conservação da natureza e da paisagem (WEINGARTEN, 2009). Idêntico modelo preventivo ambiental foi adotado no Kuwait, quando aprovada a AIA em 1982, após o reconhecimento a nível nacional na década de 70 da importância da proteção ao meio ambiente e da conservação dos recursos naturais. De acordo com o artigo 8º da lei nº 21/1995 sobre a criação do Poder Público Ambiental do Kuwait, o EIA (Estudo de Impacto Ambiental) é definido como um esquema metodológico para prever o impacto de desenvolvimento para a sociedade e os seres humanos. A definição adotada no Kuwait condiz com o objetivo da avaliação ambiental em geral, para avaliar, prever e controlar os potenciais impactos das políticas, programas, projetos, além de propor medidas para a prevenção ou atenuação dos seus impactos ambientais adversos. Considera ainda, como uma prática participativa utilizada para detectar e avaliar as prováveis consequências ambientais das propostas de desenvolvimento para facilitar a tomada de decisões informadas e desenvolvimento sustentável (AL-DAMKHI et al., 2008). Segundo Bennet e Gibbeson (2010), na Inglaterra os cemitérios são extensos, sendo de propriedade municipal ou privada. Eles são uma inovação do século XIX, 44 construídos a partir do início de 1800, com uma resposta à grave falta de capacidade de sepultamento no rápido crescimento dos centros urbanos após a revolução industrial, sendo literalmente encarados como "cidades dos mortos". Porém, no século XX, o estilo dos cemitérios ingleses deslocou para os jardins memoriais, ordenando linhas de lápides memoriais. As autoridades locais, na qualidade de poder público, têm poderes expressos e responsabilidades em relação à utilização e gestão dos seus cemitérios públicos. A ordem aborda a gestão da estrutura dos cemitérios, o acesso do público e a utilização destes locais. O despacho obriga as autoridades locais a manter os seus cemitérios em bom estado de conservação e reparação. Na Itália, conforme Santarsiero et al. (2000), a gestão e construção de cemitérios é uma questão local para as autoridades, mas a autoridade central dá as linhas principais. A corrente legislativa da Itália prevê que as autarquias locais devem planejar seus próprios cemitérios municipais e crematórios. Assim, um cemitério municipal inclui crematório, espaços cercados, túmulos, serviços mortuários etc. e devem ter tal capacidade dos locais de sepultamento para enfrentar a demanda da população. E ainda, a gestão dos cemitérios foi equilibrada no início do século e, de acordo com a legislação em vigor na Itália (decreto nº 285, de 1990), o corpo do falecido pode ser eliminado por enterramento ou cremado. Naturalmente, tais sobras são eliminadas por inumação ou cremação, em conformidade com a vontade da pessoa falecida. Segundo Milaré (2005), dentre os instrumentos de gestão ambiental, a Política Nacional de Meio Ambiente, instituída pela lei federal nº 6.938/81, elegeu como ações preventivas afetas ao Estado a avaliação de impactos ambientais (AIA) e o licenciamento para a instalação de obras ou atividades potencialmente poluidoras. Ainda, segundo o autor, a AIA foi introduzida no Brasil, inspirada no direito americano (National Environmental Policy Act – NEPA – de 1969), através da lei federal nº 6.803/80, que dispõe sobre as diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição. No Brasil, o primeiro e efetivo passo encetado pelo CONAMA na formulação do regramento legal da AIA foi dado com a edição da Resolução nº 001/86. O segundo passo legislativo visando à implementação da AIA como instrumento 45 preventivo ambiental foi materializado com a edição da Resolução CONAMA nº 006/87, dirigindo especificamente ao licenciamento ambiental de obras de grande porte, especialmente aquelas nas quais a União tenha interesse relevante, a qual se pode ter como exemplo a geração de energia elétrica. Milaré (2005) define que essa caminhada legislativa foi coroada e definida pela Resolução CONAMA nº 237/97, dando maior organicidade e uniformidade ao sistema de licenciamento ambiental vigente no país. O art. 1º, inciso III deixa claro que a AIA, que ela chama de “Estudos Ambientais”, é gênero, de que são espécies todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos ambientais apresentados como subsídio para análise da licença ambiental, tais como relatório ambiental, plano e projeto de controle ambiental, relatório ambiental preliminar, diagnóstico ambiental, plano de manejo, plano de recuperação de área degradada e análise preliminar de risco. Para o efetivo licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como, as obras que de qualquer forma possam causar degradação ambiental, é exigida a elaboração de estudos ambientais como subsídio para o licenciamento. 4.4.1 Estudo Impacto Ambiental – Relatório Impacto Ambiental (EIA-RIMA) e Legislação Disciplinadora Como modalidade de Avaliação de Impacto Ambiental, o Estudo de Impacto Ambiental é considerado um dos mais notáveis instrumentos de compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade do meio ambiente (MILARÉ, 2005) e deve ser elaborado e apresentado antes da instalação de obra ou de atividade potencialmente poluidora, nos termos do art. 225, § 1º, IV da CF/88. Está previsto na Resolução CONAMA nº 001/86 a exigência de realização do EIA e seu respectivo RIMA, que já no seu art. 2º traz elencadas as atividades que estão sujeitas a elaboração do estudo e do relatório. As expressões EIA-RIMA, apesar de muitos entenderem como sinônimas, representam documentos totalmente distintos. O estudo é de maior abrangência que 46 o relatório, abrangendo levantamento da literatura científica e legal pertinente, trabalhos de campo, análises de relatório e dados e a própria redação do relatório, ao qual tem caráter iminentemente conclusivo dos estudos. Segundo Fiorillo (2001), a existência do EIA/RIMA está consubstanciada no princípio da prevenção do dano ambiental, constituindo um dos mais importantes instrumentos de proteção do meio ambiente. De acordo com Milaré (2005), para bem cumprir seu desiderato básico – a prevenção da danosidade ambiental – se sujeita o EIA a três condicionantes básicos: a transparência administrativa, a consulta aos interessados e a motivação da decisão ambiental. O estudo de impacto ambiental deve, antecipadamente, quantificar o quanto possível é o impacto ambiental, e insere-se como ferramenta de análise de estudos ambientais. Além disso, esse estudo é um instrumento do processo de licenciamento ambiental e obedece as seguintes diretrizes gerais: a) contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização de projeto, confrontando-as com a hipótese de não execução do projeto; b) identificar e avaliar sistematicamente os impactos ambientais gerados nas fases de implantação e operação da atividade; c) definir os limites da área geográfica a ser direta ou indiretamente afetada pelos impactos, denominada área de influência do projeto, considerando, em todos os casos, a bacia hidrográfica na qual se localiza. O órgão ambiental que determinar a execução do estudo de impacto ambiental fixará as diretrizes adicionais que, pelas peculiaridades do projeto e características ambientais da área, forem julgadas necessárias, incluindo os prazos para conclusão e análise dos estudos. Deverá ser incluído também o diagnóstico ambiental da área de influência e estudos sobre o meio socioeconômico uso e ocupação do solo, os usos da água e a socioeconômica, as relações de dependência entre a sociedade local, os recursos ambientais e a potencial utilização futura desses recursos naturais. A total abrangência do estudo de impacto ambiental (EIA) deve ser bastante dinamizada, não se limitando ao exame das consequências de determinada obra sobre o meio físico e biológico no local de sua implantação. Ao contrário, o EIA estende-se à área de influência do projeto e deve contemplar todas as alternativas tecnológicas e de localização do mesmo, confrontando-o com a hipótese de sua não execução. 47 O Relatório Ambiental Preliminar (RAP) é o documento que apresenta, de forma resumida e em linguagem acessível, os resultados do EIA, esclarecendo todos os elementos da proposta do projeto em estudo. Além desses, outros estudos ainda são utilizados em processos de licenciamento ambiental, sendo conceitualmente definidos como todos e quaisquer estudos relativos aos aspectos ambientais relacionados à localização, instalação, operação ou ampliação de uma atividade ou empreendimento apresentado como subsídio para a análise da licença requerida. Vale lembrar que cabe ao proponente do projeto o dever de pagar as custas e taxas do EIA/RIMA, sendo que o art. 8º da Resolução exemplificativamente demonstra os tipos de atividades que deverão ser feitas pela equipe e pagas pelo proponente do projeto: Art. 11 - Os estudos necessários ao processo de licenciamento deverão ser realizados por profissionais legalmente habilitados, a expensas do empreendedor. Parágrafo único – O empreendedor e os profissionais que subscrevem os estudos previstos no caput deste artigo serão responsáveis pelas informações apresentadas, sujeitando-se às sanções administrativas, civis e penais. Art. 12 – O órgão ambiental competente definirá, se necessário, procedimentos específicos para as licenças ambientais, observadas a natureza, características e peculiaridades da atividade ou empreendimento e, ainda, a compatibilização do processo de licenciamento com as etapas de planejamento, implantação e operação. Art. 17 – O arquivamento do processo de licenciamento não impedirá a apresentação de novo requerimento de licença, que deverá obedecer aos procedimentos estabelecidos no artigo 10, mediante novo pagamento de custo de análise. 4.4.2 Relatório Ambiental Preliminar (RAP) 4.4.2.1 Regulamentação O RAP previsto na Resolução SMA (Secretaria do Meio Ambiente) nº 42/94, em seu art. 3º faz a função do RAIA – Relatório de Avaliação de Impacto Ambiental. Kirchhoff (2004) ensina que no Estado de São Paulo é usado o Relatório Ambiental 48 Preliminar (RAP) como forma de se analisar a viabilidade ambiental de empreendimentos com potencial de poluição. Este é o primeiro documento a ser apresentado para o Licenciamento Ambiental. Sua função é instrumentalizar a decisão de exigência do Estudo de Impacto Ambiental (EIA), para a obtenção de Licença Prévia, ou de avaliar o empreendimento quando este for dispensado do EIA. Em caso de exigência, juntamente com outros instrumentos, subsidiária a definição do Termo de Referência para o EIA. Quando ocorre a dispensa do EIA, a avaliação do empreendimento é feita baseada no conteúdo do RAP, adicionado a outros elementos, tais como análises diversas da área, objeto da licença. O RAP deve abordar a interação entre elementos dos meios físicos, biológico e sócio-econômico, buscando a elaboração de um diagnóstico integrado da área de influência do empreendimento. O RAP deve possibilitar a avaliação dos impactos resultantes da implantação do empreendimento e a definição das medidas mitigadoras e compensatórias de controle ambiental, necessário para a sua viabilização ambiental. Cabe ressaltar também que, dependendo da especificidade do empreendimento, poderão ser solicitadas, a qualquer tempo, informações complementares. Discrimina-se a seguir, alguns itens importantes a serem inseridos no RAP, como: a) Objeto do licenciamento – indicar natureza e porte do empreendimento, projeto ou atividade, objeto de licenciamento. b) Justificativa do empreendimento – justificar o empreendimento proposto em função da demanda a ser atendida, demonstrando, quando couber, a inserção do mesmo no planejamento regional e do setor. c) Caracterização do empreendimento – apresentar informações que permitam avaliar e localizar o projeto proposto, devendo ser contemplados os seguintes itens: I) localizar o empreendimento, considerando o(s) município(s) atingido(s), bacia hidrográfica enquadrando os corpos d’água e sua respectiva classe de uso e coordenadas geográficas. Estas informações deverão ser plotadas em carta topográfica oficial, original ou reprodução, mantendo as informações da base em escala mínima 1:50.000; II) descrever o empreendimento proposto, apresentando suas características técnicas. Estas 49 informações deverão ser apresentadas em planta planialtimétrica em escala compatível; III) descrever as obras, apresentando as ações inerentes à implantação e decorrentes da natureza do empreendimento. Estas informações deverão ser apresentadas em planta planialtimétrica em escala compatível; IV) estimar a mão de obra necessária para sua implantação e operação; V) estimar o custo total do empreendimento; VI) apresentar o cronograma de implantação. d) Diagnóstico ambiental preliminar da área de influência – as informações a serem abordadas neste item devem propiciar o diagnóstico da área de influência do empreendimento, refletindo as condições atuais dos meios físicos, biológico e socioeconômico. Devem ser inter-relacionadas, resultando em um diagnóstico que permita a avaliação dos impactos resultantes da implantação do empreendimento. Para tanto, deverão ser apresentadas as informações básicas relacionadas a seguir, devendo as mesmas, quando couber, serem apresentadas em planta planialtimétrica em escala compatível, também através de fotos datadas, com legendas explicativas da área do empreendimento e do seu entorno: I) delimitar a área de influência do empreendimento; II) demonstrar a compatibilidade do empreendimento com a legislação envolvida: Municipal, Estadual e Federal, em especial as Áreas de Interesse Ambiental, mapeando as restrições à ocupação; III) caracterizar uso e ocupação do solo atual; IV) caracterizar a infra-estrutura existente; V) caracterizar as atividades sócio-econômicas; VI) caracterizar áreas de vegetação nativa e/ou de interesse específico para a fauna; VII) caracterizar a área quanto a sua suscetibilidade à ocorrência de processos de dinâmica superficiais, com base em dados geológicos e geotécnicos; VIII) apresentar estudos ou levantamentos que comprovem a existência ou inexistência de indícios, informações ou evidências de sítios arqueológicos na região ou área diretamente afetada pelo empreendimento/atividade. Estes estudos deverão ser elaborados por profissional habilitado. Quando o estudo arqueológico constatar indícios, informações ou evidências da existência de sítio arqueológico ou pré-histórico, na protocolização do RAP deverá ser apresentado, junto com a documentação, o protocolo do IPHAN, 50 comprovando a entrega do Diagnóstico Arqueológico, conforme a Resolução SMA 34/03 – art. 1º, § único. e) Identificação dos impactos ambientais – identificar os principais impactos que poderão ocorrer em função das diversas ações previstas para a implantação e operação d