UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - UNESP CÂMPUS DE JABOTICABAL HELMINTOS PARASITAS DE JAVALIS (Sus scrofa LINNAEUS, 1758) SELVAGENS NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. Ivan Moura Lapera Médico Veterinário 2020 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA - UNESP CÂMPUS DE JABOTICABAL HELMINTOS PARASITAS DE JAVALIS (Sus scrofa LINNAEUS, 1758) SELVAGENS NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. Ivan Moura Lapera Orientador: Prof. Dr. Estevam G. Lux Hoppe Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias - UNESP, Câmpus de Jaboticabal, como parte das exigências para a obtenção do título de Doutor em Medicina Veterinária, Área: Medicina Veterinária Preventiva 2020 L311h Lapera, Ivan Moura Helmintos parasitas de javalis (Sus scrofa Linnaeus, 1758) selvagens na região norte do Estado de São Paulo. / Ivan Moura Lapera. -- Jaboticabal, 2023 70 p. : tabs., fotos, mapas Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Jaboticabal Orientador: Estevam G. Lux Hoppe 1. Relação hospedeiro-parasito. 2. Suínos selvagens. 3. Animais exóticos. 4. Helmintologia. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Jaboticabal. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. DADOS CURRICULARES DO AUTOR IVAN MOURA LAPERA – Nascido em 29 de abril de 1989, no município de Ribeirão Preto, SP, filho de Eder Carone Lapera e Eliana Maria Moura Lapera. Concluiu o ensino médio no Colégio Santo André em 2006, na cidade de Jaboticabal, SP. Ingressou em fevereiro de 2007 no curso de graduação em Medicina Veterinária da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias FCAV/Unesp Jaboticabal, concluindo-o em 2011. Durante a graduação, foi bolsista FAPESP de Iniciação Científica e membro da Empresa Júnior Consultoria Agropecuária Júnior (CAPJr). Estagiou e trabalhou na empresa LBR – Lácteos Brasil, entre junho de 2011 e março de 2012. Entre 2012 e 2013, foi bolsista FAPESP de Treinamento Técnico – nível 3, desenvolvendo atividades na Fazenda Experimental da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios APTA – Ribeirão Preto/SP e na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/FMRP/USP. Ingressou no mestrado em Medicina Veterinária na FCAV/Unesp Jaboticabal em agosto de 2013, obtendo o título em janeiro de 2016. Em março de 2016, ingressou no curso de doutorado em Medicina Veterinária na mesma instituição. Entre março de 2016 e janeiro de 2018 foi Professor Auxiliar no Centro Universitário de Rio Preto (UNIRP), responsável pelas disciplinas “Parasitologia” e “Doenças Parasitárias”. Durante o primeiro semestre de 2018, atuou como Médico Veterinário na Coordenadoria de Agricultura da Prefeitura Municipal de Araraquara/SP, coordenando o grupo de trabalho para atualização do Serviço de Inspeção Municipal. Atualmente, é Auditor Fiscal Federal Agropecuário no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, atuando no Serviço de Inspeção Federal do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal. Dedico À memória de meus avós Córnelio de Macedo Moura e Edgard Lapera que sempre foram exemplos de homens dedicados e trabalhadores, aos quais me esforço para orgulhar todos os dias. À minha avó Elvira Carone Lapera, que partiu inesperadamente entre a defesa e a publicação desta tese. Sempre levarei comigo a saudade do teu cuidado e do teu riso fácil. À minha mãe Eliana Maria Moura Lapera, que se foi de maneira ainda mais abrupta neste mesmo intervalo. Que eu tenha a força e a sabedoria para seguir em frente mesmo com o enorme vazio da tua ausência. Obrigado pela intensidade imensurável do teu amor e da tua dedicação. AGRADECIMENTOS A Deus, por ter iluminado meu caminho e me dado força, paciência e sabedoria para alcançar meus objetivos. À toda minha família, pelo apoio, amor, carinho e incentivo para que eu realize todos os meus sonhos pessoais e profissionais. Em especial aos meus queridos pais Eder Carone Lapera e Eliana Maria Moura Lapera pelo amor incondicional, pela força nos momentos difíceis, pelo exemplo de pessoas honradas e trabalhadoras e pela dedicação e sacrifício para me formarem nos estudos e na vida, muitas vezes abdicando de seus próprios sonhos para que minha irmã e eu pudéssemos buscar os nossos. À minha irmã Bárbara Moura Lapera, minha parceira de longa data, por tanto amor e admiração que dedica a mim, quando na verdade ela que é e será meu exemplo hoje e sempre. À minha eterna namorada Camila da Costa Barros, pelo companheirismo, pela amizade, dedicação, carinho, conselhos, broncas, apoio e por tanto amor que dedica a mim. Que bom que graças à Unesp nossos caminhos se cruzaram e se tornaram um só. Às minhas amadas avó Elvira Carone Lapera e tia-avó Antonia Caroni, por estarem sempre nos apoiando, nos guiando e dando tanto carinho. Ao orientador, conselheiro e amigo Prof. Dr. Estevam G. Lux Hoppe, agradeço muito pela confiança durante os anos de pós-graduação, pela excelente orientação nos caminhos a seguir na tese e na vida, pelos conselhos e por me impulsionar para a vida profissional. Aos amigos José Hairton Tebaldi e Hermes Ascari pela companhia diária no laboratório, pela dedicação e pelo grande apoio no desenvolvimento deste trabalho e pelo acolhimento fazendo com o que ambiente de trabalho do laboratório seja sempre alegre e prazeroso. Aos amigos do Laboratório de Enfermidades Parasitárias (LabEPar) Bruno, Bruna, Gabi, Giovanna, Marcela, Dália, Duda, Carol, Carmen e Talita pela ótima convivência e troca de experiências nesses anos de trabalho. Aos membros das bancas de qualificação Profa. Dra. Karina Paes Bürguer e Profa. Dra. Karin Werther, e de defesa Prof. Dr. José Maurício Barbanti Duarte, Dra. Virgínia Santiago Silva, Profa. Dra. Daniela Pedrassani e Prof Dr. João Luís Garcia, por aceitarem o convite de analisar esse trabalho e fornecerem suas contribuições para melhorá-lo. A todos os funcionários, docentes e amigos do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva. A todos os meus grandes amigos de faculdade, do colégio e da vida, pelos momentos de distração, pelas conversas, pelas bebedeiras e pelos conselhos e trocas de experiência. Aos controladores de fauna exótica Mardqueu, Júlio e Estevão pela parceria e colaboração fundamental cedendo as amostras analisadas neste estudo. Por fim, um agradecimento mais do que especial à Faculdade de Ciência Agrárias e Veterinárias - Unesp Câmpus de Jaboticabal, e a todos os docentes, servidores e discentes integrantes de sua comunidade universitária que fazem desta faculdade uma segunda casa e uma instituição de ensino, extensão e pesquisa de excelência, reconhecida e admirada mundialmente. Agradeço a honra e a oportunidade de ter aprendido com professores conceituados, exemplares e dedicados, as oportunidades e experiências que esta faculdade me proporcionou e que me possibilitaram alcançar grandes realizações profissionais e pessoais. Essa Faculdade sempre foi uma extensão do quintal de casa desde os tempos de moleque, onde passei a maior parte de minha juventude e onde cresci e aprendi muito como profissional e como pessoa. Depois de 13 anos como aluno, encerra- se o meu vínculo formal com a instituição, mas o meu vínculo emocional, o meu carinho e eterna gratidão por esta casa seguirão por toda a vida. Que os tempos difíceis só a fortaleçam mais e que continue sendo esta fonte acolhedora de sabedoria e excelência como universidade pública, gratuita e de qualidade. i SUMÁRIO Página CERTIFICADO DA COMISSÃO DE ÉTICA NO USO DE ANIMAIS............ ii AUTORIZAÇÃO SISBIO.............................................................................. iii RESUMO..................................................................................................... vii ABSTRACT.................................................................................................. viii CAPÍTULO 1 - CONSIDERAÇÕES GERAIS 1 Introdução.................................................................................................... 1 Revisão Bibliográfica.................................................................................... 3 Referências.................................................................................................. 13 CAPÍTULO 2 - HELMINTOS PARASITAS DE JAVALIS (Sus scrofa LINNAEUS, 1758) SELVAGENS NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. 21 INTRODUÇÃO............................................................................................. 22 MATERIAL E MÉTODOS............................................................................ 25 Área de estudo.................................................................................. 25 Amostras biológicas........................................................................... 27 Diagnósticos parasitológicos............................................................. 28 Análise estatística.............................................................................. 29 Diagnóstico coproparasitológico........................................................ 29 Aspectos éticos e legais.................................................................... 29 RESULTADOS E DISCUSSÃO................................................................... 29 Comunidade parasitária.................................................................... 29 Relações parasita-hospedeiro........................................................... 37 Impacto sobre espécies nativas, animais domésticos e saúde pública............................................................................................... 43 REFERÊNCIAS........................................................................................... 47 CAPÍTULO 3 - CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................ 54 ii iii iv v vi vii HELMINTOS PARASITAS DE JAVALIS (Sus scrofa LINNAEUS, 1758) SELVAGENS NA REGIÃO NORTE DO ESTADO DE SÃO PAULO. RESUMO - Javalis são uma das principais espécies invasoras do planeta, causando impactos à biodiversidade nativa, danos ao ambiente, lavoura e pecuária e são um conhecido reservatório de doenças infecciosas e parasitárias importantes. Considerando-se o desconhecimento do status parasitológico de javalis selvagens no Brasil, o objetivo deste trabalho foi identificar e analisar as helmintoses de javalis (Sus scrofa) de vida livre da região norte do Estado de São Paulo, e avaliar possível interferência sobre a suinocultura local. Para tal, foram necropsiados 35 javalis de vida livre e 18 suínos domésticos, todos provenientes da região de Monte Azul Paulista/SP, área com alta densidade desses animais. Nas amostras de suínos domésticos, provenientes de estabelecimento de suinocultura tecnificada, não foram encontrados macroparasitas. A partir das amostras de javalis de vida livre foram coletados 13.262 espécimes de helmintos de dez espécies diferentes, sendo nove espécies pertencentes ao Phylum Nematoda: Globocephalus urosubulatus (94,3%), Metastrongylus salmi (82,9%), Stephanurus dentatus (71,4%), Strongyloides ransomi (59,3%), Ascarops strongylina (28,6%), Metastrongylus pudendotecus (11,4%), Trichuris suis (8,6%), Ascaris suum (2,9%) e Oesophagostomum dentatum (2,9%); e uma ao Phylum Acantocephala, Macracanthorhynchus hirudinaceus (5,7%). Em exames coproparasitológicos foram identificados ovos de 3 morfotipos diferentes, estrongilídeo, metastrongilídeo e Strongyloides, e a prevalência de parasitismo foi de 86% (19/22). Também foram observados oocistos de Eimeria spp. A contagem de ovos variou de 100 a 1800 ovos por grama de fezes. Os resultados permitem inferir que nematódeos dos gêneros Globocephalus, Metastrongylus, Stephanurus e Strongyloides são predominantes na comunidade parasitária de javalis selvagens da região norte do Estado de São Paulo. Na população estudada não houve influência do sexo nos indicadores de infecção. Apesar do potencial patogênico dos parasitas encontrados, os animais avaliados apresentavam bom escore corporal. Para a amostragem de suínos domésticos analisada, as práticas de biossegurança adotadas pelo estabelecimento de criação foram eficazes em prevenir possível introdução de parasitas a partir de javalis selvagens. Palavras-chave: espécies exóticas, espécies invasoras, diversidade parasitária, Suidae viii WILD BOAR (Sus scrofa LINNAEUS, 1758) HELMINTHS IN THE NORTHERN REGION OF THE STATE OF SÃO PAULO, BRAZIL ABSTRACT – Wild boars (Sus scrofa) are one of the most important invasive species worldwide. They impact biodiversity; damage the environment, farming, and livestock; and are a reservoir of important infectious and parasitic diseases. Considering the lack of knowledge of the parasitological status of wild boars in Brazil, the objective of this study was to identify and analyze helminths in free-living wild boars in the northern region of the State of São Paulo and evaluate a possible interference on local pig farming. For this purpose, 35 wild boars and 18 domestic pigs were necropsied, all from the region of Monte Azul Paulista, São Paulo, Brazil, which is an area with a high density of these animals. No macroparasites were observed in the domestic pigs from a technified pig farm. The free-living wild boars presented with 13,262 helminth specimens from ten different species, among which nine species were of the phylum Nematoda: Globocephalus urosubulatus (94.3%), Metastrongylus salmi (82.9%), Stephanurus dentatus (71.4%), Strongyloides ransomi (59.3%), Ascarops strongylina (28.6%), M. pudendotecus (11.4%), Trichuris suis (8.6%), Ascaris suum (2.9%), and Oesophagostomum dentatum (2.9%) and one was of the phylum Acanthocephala: Macracanthorhynchus hirudinaceus (5.7%). Coprological analysis identified eggs of three different morphotypes, Strongylidae, Metastrongylidae, and Strongyloides, and the prevalence of parasitism was 86% (19/22). Oocysts of Eimeria spp. were also observed. The egg count ranged from 100 to 1,800 eggs per gram of feces. The results show that nematodes of the genera Globocephalus, Metastrongylus, Stephanurus, and Strongyloides are predominant in the wild boar parasitic community in the northern region of the state of São Paulo. The population studied showed no influence of sex on infection indicators. Despite the pathogenic potential of these parasites, the animals evaluated had a good body score. The sample of domestic pigs analyzed showed that the biosafety practices used on the farm were effective in the prevention of the possible introduction of parasites from wild boars. Keywords: exotic species, invasive species, parasite diversity, Suidae 1 CAPÍTULO 1 – Considerações Gerais Introdução Historicamente, os animais selvagens são reconhecidos como potenciais fontes de doenças infecciosas e parasitárias emergentes para seres humanos e animais domésticos. A maioria dos estudos sobre doenças em animais selvagens têm como foco principal a ameaça que estas doenças representam para os sistemas agrícolas e para a saúde dos seres humanos (Mccallum e Dobson, 1995; Daszak et al., 2000). A introdução de espécies exóticas representa um importante risco para a saúde animal e humana. Associado à introdução de uma espécie exótica a um novo habitat podem ser introduzidos patógenos junto com a espécie translocada, que, ao serem transmitidos para espécies autóctones susceptíveis, se disseminam nesse novo ambiente, através do processo conhecido como “spill-over”. Adicionalmente, outro fenômeno importante relacionado às espécies invasoras é sua capacidade de atuarem como reservatórios para patógenos nativos, causando aumento de sua ocorrência e dispersão e, consequentemente, aumentando o risco de infecção para as espécies de hospedeiros nativas, processo denominado de “spill-back” (Kelly et al., 2009; Thompson, 2013). O impacto do “spill-over” de patógenos domésticos para animais selvagens é uma ameaça emergente ainda pouco compreendida, que tende a ser mais frequente no futuro. Com isso, poderão ser estabelecidos novos reservatórios “spill-back” para doenças economicamente importantes e de grande impacto na saúde pública e na conservação da vida selvagem (Holmes, 1996; Thompson et al., 2009, 2010). Frequentemente, a atividade antrópica é responsável por desencadear a ocorrência de zoonoses, seja passivamente, devido à ocupação de áreas suburbanas próximas a regiões de mata, à ausência de saneamento básico, à invasão de habitats dos animais selvagens, ou à mudanças climáticas; seja ativamente, através de caça, turismo, introdução de espécies e outras ações que afetam diretamente as populações de animais silvestres (Thompson, 2013). Estudos de doenças em animais selvagens 2 têm considerado o impacto que as doenças infecciosas podem ter sobre a dinâmica e sustentabilidade das populações de animais selvagens (Thompson et al., 2009). A invasão de espécies exóticas é considerada uma das maiores ameaças para a biodiversidade mundial, sendo apenas menos impactante que a destruição de hábitats naturais pela atividade humana (Clavero e Garcia-Berthou 2005; Simberloff et al., 2013; Luque et al., 2014). Uma espécie exótica é considerada invasora quando se adapta com sucesso ao novo ambiente, multiplicando-se, aumentando a competição por recursos naturais e território, predando espécies nativas, introduzindo novas doenças ou aumentando a ocorrência de patógenos pré-existentes e levando ao deslocamento e até extinção de espécies nativas (CBD, 2010). Os javalis, Sus scrofa, Linnaeus 1758, nativos do Paleoártico, foram um dos primeiros animais intencionalmente introduzidos ao redor do mundo para domesticação e criação comercial e, mais recentemente, para caça (Long, 2003; Clout e Rusell, 2008). Estes animais são encontrados em todos os continentes, exceto na Antártida, e o sucesso de sua adaptação a diferentes ambientes deve-se, principalmente, à alta prolificidade e à plasticidade alimentar da espécie (Long, 2003; Barrios-Garcia e Ballari, 2012). Estes mamíferos estão na lista das 100 espécies invasoras mais impactantes, principalmente por problemas econômicos como ataques a lavouras, sanitários por atuarem como reservatório de doenças humanas e de animais domésticos, e ambientais como alteração da vegetação e predação de espécies autóctones (Lowe et al., 2000). Considerando a relevância patogênica dos agentes etiológicos que podem ser propagados pelos javalis, a crescente dispersão da espécie pelo território brasileiro, o enorme impacto econômico e ambiental que eles representam e o desconhecimento do perfil epidemiológico das parasitoses em javalis de vida livre no Brasil, o objetivo deste estudo é ampliar o conhecimento científico sobre a importância dos javalis de vida livre na disseminação de doenças parasitárias. Adicionalmente, pretende-se avaliar o risco à saúde humana e animais domésticos associado ao papel dos javalis na disseminação de parasitas zoonóticos e de relevância econômica e contribuir na obtenção de informações epidemiológicas que ajudem a direcionar estratégias de controle de helmintos. 3 Revisão Bibliográfica O termo “javali” é utilizado de forma genérica para denominar todas as variações de cruzamentos entre javalis, porcos domésticos e porcos asselvajados que formam as populações ferais recentes de S. scrofa no Brasil. O comprimento do javali é de, aproximadamente, 1,3 metros e o peso de cerca de 80 kg. O adulto possui caninos grandes e pelos longos de cor preta e o jovem possui pelagem escura com listras longitudinais marrom-avermelhadas. Os híbridos com porcos domésticos podem pesar até 250 kg. No Brasil, a maioria dos animais observados apresenta esse porte avantajado em decorrência de cruzamentos intencionais com suínos domésticos. Aos 18 ou 19 meses de idade, o javali está apto a reproduzir-se e, com 5 ou 6 anos, atinge seu completo desenvolvimento. As fêmeas permanecem no cio durante 4 a 6 semanas e a gestação dura 4 meses. Fêmeas puras geram ninhadas de 4 a 6 filhotes uma vez ao ano, enquanto as miscigenadas com suínos domésticos podem parir de 12 a 15 filhotes por parto, até duas vezes ao ano (Keeling e Gonyou, 2001; Brasil, 2017). A organização social do javali é representada por grupos matriarcais compostos por uma fêmea dominante, outras fêmeas adultas, machos e fêmeas jovens e leitões. Os machos têm hábitos solitários, procurando as fêmeas apenas durante a fase reprodutiva, porém, ocasionalmente, podem se associar a fêmeas para formar grupos (Keeling e Gonyou, 2001). A atividade dos javalis concentra-se no período crepuscular e noturno, com os animais permanecendo durante o dia abrigados em mata fechada e no fim da tarde saindo à procura de alimento, que encontram, em maior quantidade, em áreas cultivadas. Em regiões onde a pressão de caça é elevada os javalis tendem a permanecer maior tempo escondidos em áreas de mata (Martins et al., 2019). Quanto à dieta, são omnívoros oportunistas, possuindo uma dieta altamente variável e adaptável, sendo capazes de se alimentar de todo tipo de matéria orgânica vegetal ou animal, conforme a disponibilidade (Ballari e Barrios-Garcia, 2014). Membros da ordem Artiodactyla e Subordem Suiformes, assim como os suínos, os chamados porcos-do-mato nativos do Neotrópico pertencem à família Tayassuidae, composta por três espécies: Pecari tajacu, popularmente cateto, Tayassu pecari, queixada, e Catagonus wagneri, tagua. Estima-se que a divergência 4 entre as famílias Suidae e Tayassuidade com o ancestral comum ocorreu há aproximadamente 35 milhões de anos (Sutherland-Smith, 2014). Os taiassuídeos apresentam os caninos superiores pequenos e retos e porte pequeno a intermediário. Facilmente adaptáveis a diferentes ambientes, estão presentes em diferentes biomas americanos, geralmente são onívoros com maior hábito frugívoro, alimentando-se de folhas, sementes, raízes, frutos, flores, insetos, ovos de pássaros, lagartos e pequenos mamíferos. Apresentam hábitos crepusculares a diurnos, um olfato extremamente sensível que auxilia na localização de alimentos escondidos sob a vegetação e utilizam o focinho e as presas para cavar e cortar raízes (Sutherland-Smith, 2014). A queixada, Tayassu pecari Link, 1795, é o maior dos taiassuídeos, atingindo 1,10 m de comprimento e até 40 kg. Apresenta pelagem das costas muito longa de coloração negro pardacenta. A grande quantidade de pelos brancos na mandíbula e focinho lhe confere o apelido de pecari do lábio branco (“white-lipped pecari”). Vive em grandes grupos, com dezenas ou até centenas de indivíduos de ambos os sexos e todas as idades, e em uma grande variedade de habitats. Com comportamento agressivo, os animais reverberam através de movimentos mandibulares um alto som bem característico da espécie, que deu origem ao nome popular de queixada (Keuroghlian et al., 2012). Os catetos, Pecari tajacu Linnaeus, 1758, apresentam atividade diurna e crepuscular, alimentando-se, geralmente, nas primeiras horas da noite. São de pequeno porte, com 45 cm de altura e até 30 kg. A pelagem varia de marrom a negra, salpicada de branca; possui uma crina de pelos mais longos que se estende até as ancas e possui um colar branco sobre o pescoço, disposta de forma oblíqua desde o dorso até os ombros, o que lhe confere o nome popular de pecari de colar (“collared peccary”). São animais altamente sociais, mas que formam bandos menores, geralmente, entre dois e 30 indivíduos. Os catetos possuem hábito mais forrageiro que as queixadas, que possuem estrutura mandibular mais densa capaz de se alimentar de elementos mais rígidos como sementes e outros animais (Desbiez et al., 2012). No Brasil, o primeiro relato de suínos ferais ocorreu no Pantanal, onde alguns indivíduos de porcos domésticos escaparam para a vida selvagem há mais de 200 5 anos. Com o tempo, esses indivíduos deram origem a uma população feral popularmente conhecida como "porco-monteiro" (Desbiez et al., 2011). O segundo relato refere-se à javalis que invadiram o sul do Rio Grande do Sul em 1989, vindos do Uruguai (Deberdt e Scherer, 2007). Nas décadas de 90 e 2000, a fuga de indivíduos de javalis puros, que foram importados do Canadá e da França para criações comerciais, contribuiu para agravar o problema. A criação de javalis, que na época se mostrava promissora, acabou sendo inviável economicamente para muitos produtores que acabaram realizando cruzamentos com porcos domésticos a fim de obter animais maiores e mais precoces. No entanto, muitas criações não tiveram sucesso e, intencionalmente ou não, javalis puros e cruzados com porcos domésticos acabaram soltos, tornando-se invasores (Pedrosa et al., 2015). Existem relatos de ocorrência de javalis selvagens em todas as regiões do Brasil, em mais de 1500 municípios. Considerando o número de munícipios com registro de ocorrência de javalis, o estado de São Paulo é o mais afetado (439), seguido por Paraná (207), Minas Gerais (198) e Rio Grande do Sul (178) e Santa Catarina (123), com destaque também para o Mato Grosso do Sul, em que já foi registrada a ocorrência de javalis em 71 (89,9%) dos 79 municípios do estado (Figura 1) (BRASIL, 2019). Salvador et al. (2019) relataram a ocorrência de javalis selvagens na região do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, demonstrando o potencial de dispersão da espécie para novas regiões do território nacional, provavelmente associado à translocação por ação humana. Este relato é preocupante do ponto de vista da saúde animal, considerando que a região é classificada como zona não livre de Peste Suína Clássica (OIE, 2020). Além disso, próximo às áreas de ocorrência dos javalis, foram encontrados indícios de predação de ninhos de tartarugas ameaçadas de extinção e estes animais também representam um risco para aves que nidificam no solo (Salvador et al., 2019). 6 Figura 1. Distribuição da ocorrência de javalis selvagens no Brasil (Adaptado de Brasil, 2019). Os javalis são classificados como engenheiros de ecossistemas, por seu hábito de chafurdamento e pisoteamento ter efeito marcante na estrutura do solo e, consequentemente, no ecossistema, alterando a disponibilidade de recursos e modificando características físicas e químicas do ambiente (Jones et al., 1994). Também são conhecidos por provocarem danos em diversas culturas vegetais, como sorgo, milho, sementes oleaginosas e cana de açúcar, e por predarem animais de produção, principalmente pequenos ruminantes recém-nascidos (Ballari e Barrios- Garcia, 2014). A intensidade de dano causado às atividades agropecuárias pode ser influenciada por diversos fatores, dentre eles, a densidade local de javalis, a disponibilidade de alimentos na natureza, a proximidade das áreas cultivadas às áreas de floresta e as condições climáticas estão entre os mais importantes (Mackin, 1970). Os javalis selvagens também estão associados à acidentes de trânsito e ataques a pessoas (Oliveira et al., 2018). Além do impacto direto provocado no ambiente invadido e nas espécies nativas, os javalis podem servir como reservatórios e dispersores de doenças, dificultando programas de erradicação de doenças em animais de produção, ou até 7 mesmo em humanos, nos locais que estejam presentes (Hone et al., 2002; Hutton et al., 2006). Em regiões onde é registrado como invasor, os javalis foram descritos como reservatório de doenças zoonóticas importantes, como brucelose, leptospirose, Escherichia coli patogênica (Browning, 2008), triquinelose (Pavlov et al., 1992; Ranque et al., 2000), infecção pelo vírus da encefalite japonesa (Bradshaw et al. 2007), hepatite E (Li et al., 2005), salmonelose, tuberculose, tularemia, Influenza A, estomatite vesicular e toxoplasmose (USDA-APHIS-WS, 2016) (Tabela 1). Tabela 1. Doenças que podem afetar javalis, sua importância para a saúde animal e humana e situação de ocorrência no Brasil. Doença Tipo de agente Saúde Animal Zoonose Ocorrência no Brasil* Brucelose bactéria sim sim sim Leptospirose bactéria sim sim sim E. coli patogênicas bactéria sim sim sim Salmonelose bactéria sim sim sim Tuberculose bactéria sim sim sim Hepatite E vírus sim sim sim Influenza A vírus sim sim sim Estomatite Vesicular vírus sim sim sim Febre Aftosa vírus sim não não Doença de Aujeszky vírus sim não sim Peste Suína Africana vírus sim não não Peste Suína Clássica vírus sim não sim (N e NE)** Diarreia Epidêmica dos Suínos vírus sim não não Síndrome Reprodutiva e Respiratória Suína vírus sim não não Toxoplasmose protozoário sim sim sim Triquinelose helminto sim sim sim Cisticersose suína helminto sim sim sim Equinococose/Hidatidose helminto sim sim sim * Refere-se ao diagnóstico do agente etiológico no país, e não necessariamente em javalis ferais; **Estados de AL, AP, AM, CE, MA, PA, PB, PE, PI, RN, RR são considerados como zona não-livre de Peste Suína Clássica. 8 Dentre as doenças relevantes para a saúde animal, existem relatos de ocorrência de brucelose, leptospirose, E. coli patogênicas, salmonelose, tuberculose, tularemia, peste suína africana, peste suína clássica, febre aftosa, hepatite E, Influenza A, Circovírus suíno, diarreia epidêmica suína, síndrome respiratória e reprodutiva suína, Doença de Aujeszky (pseudoraiva), estomatite vesicular, toxoplasmose e triquinelose (USDA-APHIS-WS, 2016) (Tabela 1). Estudos relativos à ocorrência de parasitas em javalis selvagens foram realizados em diversos países como Bélgica, Bulgária, Croácia, Espanha, Estônia, França, Itália, Polônia, Sérvia e Turquia, na Europa; Coréia do Sul, Japão e Irã, na Ásia; Marrocos, na África; e Argentina, Brasil, Chile, Estados Unidos da América (EUA) e Jamaica, na América (Tabela 2). Entretanto, no Brasil, com exceção de um relato de caso de esparganose em javalis selvagens (Silva et al., 2013), os demais estudos foram desenvolvidos em animais de criadouros (Mundim et al., 2004, Gomes et al., 2005; Silva e Müller, 2013ab). Considerando estudos realizados no Brasil, no Estado de São Paulo, Gomes et al. (2005) identificaram por necropsia parasitológica os nematódeos Ascarops strongylina, Physocephalus sexalatus, Ascaris suum, Strongyloides ransomi, Trichuris suis, Oesophagostomum dentatum, Metastrongylus salmi e Metastrongylus pudendotectus parasitando javalis de cativeiro, com os indicadores de infecção mais expressivos descritos obtidos para Trichuris suis e Metastrongylus salmi. Em criatórios comerciais do Sul do Brasil foram encontrados javalis parasitados por Ascaris suum, Trichostrongylus colubriformis, Oesophagostomum dentatum e Trichuris suis, sendo a primeira descrição de ocorrência de Trichostrongylus colubriformis em javalis (Silva e Müller, 2013a). Os mesmos autores também verificaram alta prevalência de parasitas pulmonares do gênero Metastrongylus (60%), sendo Metastrongylus apri o mais prevalente (52,5%) nos animais analisados (Silva e Müller, 2013b). Parasitas do gênero Metastrongylus (Nematoda: Metastrongylidae) são cosmopolitas, encontrados no trato respiratório de suínos domésticos e silvestres e considerados um dos fatores seletivos mais importantes em populações de javalis por aumentarem a mortalidade de animais jovens e adultos debilitados. Possuem ciclo 9 indireto, tendo as minhocas, importante item na dieta de javalis, como principal hospedeiro intermediário (Humbert e Henry, 1989; Nosal et al., 2010). Tabela 2. Helmintos parasitas de javalis selvagens, hábitat, hospedeiros susceptíveis e países com estudos relatando ocorrência. Parasita Hábitat Hospedeiros Zoonose Países Nematoda Capillaria spp. TGI Mamíferos e aves Sim Espanha7; Itália24 Capillaria garfiai L Suídeos Não Espanha10 Capillaria suis E Suídeos Não Japão36 Ascarops dentata E Suídeos Não EUA21 Ascarops strongylina ES, E Suídeos Não Bulgária29; Espanha7, 10, 13; EUA32; França 15; Irã9, 20; Japão36; Polônia27; Turquia37 Gnathostoma hispidum ES, E Suídeos Sim (raro) Croácia34; Sérvia41 Gnathostoma doloresi ES, E Suídeos Sim (raro) Japão36 Gongylonema pulchrum ES Mamíferos Sim Croácia34; Espanha10,13; EUA6, 14, 21, 32; Irã8, 9; Turquia37 Physocephalus sexalatus E Suídeos Não Bulgária29; Croácia34; Espanha7, 10, 13; EUA6, 14, 21, 32, 38; França15; Irã9; Japão36; Polônia27; Sérvia41; Turquia37 Hyostrongylus rubidus E Suídeos Não Croácia32; Espanha13; Itália24; Jamaica28; Turquia37 Globocephalus spp. E Suídeos Não Irã8; Sérvia41 Globocephalus longimucronatus E Suídeos Não Japão36 Globocephalus samoensis E Suídeos Não Coréia do Sul2; EUA21; Japão36 Globocephalus urusubulatus E Suídeos Não Bulgária29; Croácia34; Espanha10, 13; EUA6, 32; Irã9; Itália24; Jamaica28; Polônia27; Turquia37 Simondsia paradoxa E Suídeos Não Espanha10; Ascaris suum ID Suídeos Sim Bulgária29; Espanha7, 10, 13; Estônia17; EUA6, 14, 32; Irã8, 9; Itália4, 24, 31; Japão36; Polônia16, 27; Sérvia41 Strongyloides ransomi ID Suídeos Não Itália4, 24; Japão36; Polônia16; Sérvia41 Bourgelatia diducta IG Suídeos Não Coréia do Sul1; Japão36; Polônia27 Eucyathostomum spp. IG Suídeos Não EUA21 Morgascaridia kugii IG Suídeos Não Japão36 Oesophagostomum spp. IG Suídeos, ruminantes e primatas Não Espanha13; Sérvia41 Oesophagostomum dentatum IG Suídeos Não Bulgária29; Croácia34; Espanha10; EUA21, 38; Irã9; Itália24; Jamaica28; Japão36; Polônia16, 27 Oesophagostomum quadrispinulatum IG Suídeos Não Bulgária29; EUA21, 32 Oesophagostomum watanabei IG Suídeos Não Japão36 Trichuris suis IG Suídeos Não Bulgária29; Espanha10, 13; Estônia17; EUA14, 21; Irã8, 9, 40; Itália4, 24, 31; Japão36; Polônia16, 27; Sérvia41; Turquia37 10 Tabela 2. Helmintos parasitas de javalis selvagens, hábitat, hospedeiros susceptíveis e países com estudos relatando ocorrência (continuação). Parasita Hábitat Hospedeiros Zoonose Países Nematoda Metastrongylus spp. B Suídeos Sim (raro) Espanha7, 10, 13; EUA21; Itália4, 31; Irã20; Sérvia41 Metastrongylus asymmetricus B Suídeos Não França15; Japão25, 36 Metastrongylus apri B Suídeos Não Croácia34; Espanha12; EUA6, 21, 32; Irã9, 40; Itália24; Turquia37 Metastrongylus pudendotectus B Suídeos Não Bulgária29; Croácia34; Espanha12; Estônia17; EUA6, 14, 21, 32, 38; França15; Irã9, 40; Itália24; Japão25, 36; Marrocos3; Turquia37 Metastrongylus salmi B Suídeos Sim (raro) Bulgária29; Espanha12; Estônia17; EUA6, 38; França15; Irã9, 40; Japão25, 36; Marrocos3; Turquia37 Metastrongylus confusus B Suídeos Não França15; Marrocos3 Metastrongylus elongatus B Suídeos Não Bulgária29; Estônia17; EUA14; França15; Japão25, 36 Spirometra spp. M, P, TC Carnívoros Sim Brasil39, Polônia19 Trichinella spp. M, P, TC Mamíferos Sim Croácia34 Trichinella spiralis M, P, TC Mamíferos Sim Argentina5; Chile11; diversos países da América, Ásia e Europa33; Stephanurus dentatus R Suídeos Não Espanha23; EUA6, 14, 21, 32, 38; Japão36 Ceratospira ophthalmica O Suídeos Não EUA21 Acantocephala Macracanthorhynchus hirudinaceus ID Suídeos Sim (raro) Bulgária29; Croácia34; Espanha7, 10, 13; Irã8, 9, 20, 26, 35, 40; Itália24, 31; Jamaica28; Japão18; Marrocos3; Turquia37 Digenea Dicrocoelium dendriticum DB Suídeos, ruminantes, equinos, coelhos, cães e humanos Sim Estônia17; Irã9; Itália4; Turquia37 Echinochasmus perfoliatus ID Suídeos e carnívoros Sim Croácia34 Fasciola gigantica F Suídeos, ruminantes e humanos Sim Irã9 Fasciola hepatica F Mamíferos Sim Espanha22; Irã8 Fascioloides magna F Suídeos, ruminantes e equinos Não EUA38 Cestoda Cysticercus tenuicollis F, P Suídeos e ruminantes Não Croácia34; Espanha7; Estônia17; Irã9, 20, 40; Itália24, 30; Turquia37 Cysticercus cellulosae M, P, TC Suídeos e humanos Sim Irã9, 40 Echinococcus granulosus (imaturo) F, P Suídeos, ruminantes e humanos Sim Croácia34; Irã9; Itália30 Pseudanoplocephala nipponensis ID Suídeos Não Japão36 Legendas: TGI=trato gastrointestinal, L=língua, E=estômago, ES=esôfago, ID=intestino delgado, IG=intestino grosso, F=fígado, DB=ductos biliares, B=brônquios e bronquíolos, M=musculatura, P=pele, TC=tecido conjuntivo, R=rins, O=olhos. Referências: (1)Ahn et al., 2013; (2)Ahn et al., 2015; (3)Amayour et al., 2019; (4)Castagna et al., 2019; (5)Cohen et al., 2010; (6)Coombs e Springer, 1974; (7)De-la-Muela et al., 2001; (8)Dodangeh et al., 2018; (9)Eslami e Farsad-Hamdi, 1992; (10)Fernandez-de-Mera et al., 2003; (11)García et al., 2005; (12)García-González et al., 2013; (13)Gassó et al., 2015; (14)Henry e Conley, 1970; (15)Humbert e Henry, 1989; (16)Jankowska-Makosa et al., 2019; (17)Järvis et al., 2007; (18) Kamimura et al., 2018; (19)Kolodziej- Sobocinska et al., 2016; (20)Mansouri et al., 2016; (21)Mckenzie e Davidson, 1989; (22)Mezo et al., 2013; (23)Moratal et al., 2018; (24)Moretta et al., 2011; (25)Morita et al., 2007; (26)Mowlavi et al., 2006; (27)Nosal et al., 2020; (28)Okoro et al., 2016; (29)Panayotova-Pencheva e Dakota, 2018; (30)Paoletti et al., 2019; (31)Papini et al., 2018; (32)Pence et al., 1988; (33)Pozio, 2007; (34)Rajkovic-Janje et al., 2002; (35)Sarkari et al., 2016; (36)Sato et al., 2008; (37)Senlik et al., 2011; (38)Shender et al., 2002; (39)Silva et al., 2013; (40)Solaymani-Mohammadi et al., 2003; (41)Stojanov et al., 2018. 11 No sistema digestório, infecções graves por Globocephalus urosubulatus em leitões podem desencadear, além de perda de peso e emaciação, um quadro de anemia severa devido à hematofagia (Taylor et al., 2016; Seguel et al., 2017). Em adição, infecções por Strongyloides ransomi, em altas intensidades parasitárias, podem causar enterite catarral, com prejuízo à digestão e à absorção de nutrientes e, consequentemente, atraso no crescimento de leitões. Durante a fase de migração tecidual das fazes larvais, os animais podem apresentar tosse, dor abdominal e vômito. Além disso, a penetração de larvas infectantes de S. ransomi na pele pode causar reação eritematosa (Taylor, et al., 2016). Stephanurus dentatus é um importante parasita do sistema urinário de suídeos, que em sua fase adulta possui predileção pelo tecido perirrenal, podendo também se instalar nos rins e ureteres. Em geral, os vermes adultos não são patogênicos e em raros casos os ureteres podem apresentar espessamento e estenose e, como consequência, hidronefrose. É comum a ocorrência de migração errática, podendo-se encontrar larvas encapsuladas na maior parte dos órgãos e na cavidade abdominal. O principal efeito patogênico desta espécie se deve à migração tecidual das larvas L4, ocasionando lesões inflamatórias agudas, especialmente no fígado, podendo levar à formação de abscessos e extensa cirrose hepática. Raramente, podem ocorrer insuficiência hepática e morte. A infecção percutânea induz a formação de nódulos na pele, com edema e aumento de volume dos linfonodos superficiais (Henry & Conley, 1970; Sobestiansky et al., 1999; Taylor, et al., 2016). A triquinelose é uma doença zoonótica de distribuição mundial causada por helmintos do gênero Trichinella, que circulam entre suínos domésticos e animais selvagens, podendo infectar o homem através do consumo de carne crua ou malcozida albergando larvas de Trichinella spp. (Dupoy-Camet e Murrell, 2007). Diversos casos de triquinelose humana relacionados ao consumo de carne de javali já foram relatados na Itália (Pozio et al., 1993), França (Ranque et al., 2000), Espanha e Suíça (Gallardo et al., 2007), e em diversos outros países (Pozio, 2007). Na América do Sul, há relato de um caso de triquinelose humana associado ao consumo de javali asselvajado no Chile (García et al., 2005). E na Argentina, onde há uma situação de áreas livres e outras endêmicas para triquinelose, foram relatados casos de parasitismo em humanos e suínos domésticos em províncias antes consideradas 12 livres de circulação de Trichinella (Constantino et al., 2009) e, posteriormente, foram identificadas infecções em javalis selvagens (Cohen et al., 2010), demonstrando a importância de suínos domésticos e selvagens na epidemiologia da doença. Embora a triquinelose seja endêmica na Argentina, não existem relatos de infecção por T. spiralis em humanos ou animais de produção no Brasil (Evers, et al., 2012). Todos os suínos domésticos enviados a abatedouros sob Inspeção Federal são monitorados para Trichinella spp. e não há descrição de animais infectados pelo parasita (Souza et al., 2013). No entanto, há evidências de circulação silvestre do parasita, dada a detecção de anticorpos anti-Trichinella em javalis selvagens capturados entre 2012 e 2016 nos Estados de São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul e Santa Catarina (OIE, 2020). No início do ano de 2013, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) decretou a nocividade do javali em todo território nacional, bem como autorizou seu manejo através do controle populacional por abate, através da Instrução Normativa (IN) nº 03/2013. Os Estados do Rio Grande de Sul e Santa Catarina haviam adotado previamente medidas semelhantes para o controle populacional deste animal em seus territórios (Rosa et al., 2016). No ano de 2017, o governo federal brasileiro instituiu Plano Nacional de Prevenção, Controle e Monitoramento do Javali (Sus scrofa) no Brasil, elaborado com a participação de diversas entidades públicas e da sociedade civil, com o objetivo de conter a expansão territorial e demográfica da espécie no país e reduzir seus impactos, principalmente em áreas prioritárias de interesse ambiental, social e econômico Em 2019, a IN do Ibama n° 12/2019, instituiu o Sistema de Informação de Manejo de Fauna (Simaf) para monitoramento das atividades de manejo do javali (Sus scrofa) e aprimororou pontos regulamentados pela IN 03/2013, como os meios de controle autorizados e as regras que devem ser cumpridas pelos controladores. O crescimento e a dispersão da população de javalis no território nacional aumentam o risco de transmissão de patógenos parasitários entre estes e outras espécies susceptíveis, ao passo que a normatização do controle desta espécie exótica possibilita a amostragem para investigar os reais riscos sanitários, a fim de fundamentar ações preventivas e/ou corretivas pertinentes. 13 Referências Ahn KS, Oh DS, Ahn AJ, Suh GH, Shin SS (2013) First record of Bourgelatia diducta (Nematoda: Chabertiidae) from wild boars in the Republic of Korea. Korean Journal of Parasitology 51:441–448. Ahn KS, Ahn AJ, Kim TH, Suh GH, Joo KW, Shin SS (2015) Identification and prevalence of Globocephalus samoensis (Nematoda: Ancylostomatidae) among wild boars (Sus scrofa coreanus) from Southwestern regions of Korea. Korean Journal of Parasitology 53:611–618. 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RESUMO: Javalis são uma das principais espécies invasoras do planeta, causando impactos à biodiversidade nativa, danos ao ambiente, lavoura e pecuária e é um conhecido reservatório de doenças infecciosas e parasitárias importantes. Considerando-se o desconhecimento do status parasitológico de javalis selvagens no Brasil, o objetivo deste trabalho foi identificar e analisar as helmintoses de javalis (Sus scrofa) de vida livre da região norte do Estado de São Paulo, e avaliar possível interferência sobre a suinocultura local. Para tal, foram necropsiados 35 javalis de vida livre e 18 suínos domésticos, todos provenientes da região de Monte Azul Paulista/SP, área com alta densidade desses animais. Nas amostras de suínos domésticos, provenientes de estabelecimento de suinocultura tecnificada, não foram encontrados macroparasitas. A partir das amostras de javalis de vida livre foram coletados 13.262 espécimes de helmintos de dez espécies diferentes, sendo nove espécies pertencentes ao Phylum Nematoda: Globocephalus urosubulatus (94,3%), Metastrongylus salmi (82,9%), Stephanurus dentatus (71,4%), Strongyloides ransomi (59,3%), Ascarops strongylina (28,6%), M. pudendotecus (11,4%), Trichuris suis (8,6%), Ascaris suum (2,9%) e Oesophagostomum dentatum (2,9%); e uma ao Phylum Acantocephala, Macracanthorhynchus hirudinaceus (5,7%). Em exames coproparasitológicos foram identificados ovos de 3 morfotipos diferentes, estrongilídeo, metastrongilídeo e Strongyloides, e a prevalência de parasitismo foi de 86% (19/22). Também foram observados oocistos de Eimeria spp. A contagem de ovos variou de 100 a 1800 ovos por grama de fezes. Os resultados permitem inferir que nematódeos dos gêneros Globocephalus, Metastrongylus, Stephanurus e Strongyloides são predominantes na comunidade parasitária de javalis selvagens da região norte do Estado de São Paulo. Na população estudada não houve influência do sexo nos indicadores de infecção. Apesar do potencial patogênico dos parasitas encontrados, os animais avaliados apresentavam bom escore corporal. Para a amostragem de suínos domésticos analisada, as práticas de biossegurança adotadas pelo estabelecimento de criação foram eficazes em prevenir possível introdução de parasitas a partir de javalis selvagens. Palavras-chave: espécies exóticas, espécies invasoras, diversidade parasitária, Suidae. WILD BOAR (Sus scrofa LINNAEUS, 1758) HELMINTHS IN THE NORTHERN REGION OF THE STATE OF SÃO PAULO, BRAZIL ABSTRACT – Wild boars (Sus scrofa) are one of the most important invasive species worldwide. They impact biodiversity; damage the environment, farming, and livestock; and are a reservoir of important infectious and parasitic diseases. Considering the lack of knowledge of the parasitological status of wild boars in Brazil, the objective of this study was to identify and analyze helminths in free-living wild boars in the northern region of the State of São Paulo and evaluate a possible interference 22 on local pig farming. For this purpose, 35 wild boars and 18 domestic pigs were necropsied, all from the region of Monte Azul Paulista, São Paulo, Brazil, which is an area with a high density of these animals. No macroparasites were observed in the domestic pigs from a technified pig farm. The free-living wild boars presented with 13,262 helminth specimens from ten different species, among which nine species were of the phylum Nematoda: Globocephalus urosubulatus (94.3%), Metastrongylus salmi (82.9%), Stephanurus dentatus (71.4%), Strongyloides ransomi (59.3%), Ascarops strongylina (28.6%), M. pudendotecus (11.4%), Trichuris suis (8.6%), Ascaris suum (2.9%), and Oesophagostomum dentatum (2.9%) and one was of the phylum Acanthocephala: Macracanthorhynchus hirudinaceus (5.7%). Coprological analysis identified eggs of three different morphotypes, Strongylidae, Metastrongylidae, and Strongyloides, and the prevalence of parasitism was 86% (19/22). Oocysts of Eimeria spp. were also observed. The egg count ranged from 100 to 1,800 eggs per gram of feces. The results show that nematodes of the genera Globocephalus, Metastrongylus, Stephanurus, and Strongyloides are predominant in the wild boar parasitic community in the northern region of the state of São Paulo. The population studied showed no influence of sex on infection indicators. Despite the pathogenic potential of these parasites, the animals evaluated had a good body score. The sample of domestic pigs analyzed showed that the biosafety practices used on the farm were effective in the prevention of the possible introduction of parasites from wild boars. Keywords: exotic species, invasive species, parasite diversity, Suidae Introdução A invasão de espécies exóticas é considerada uma das maiores ameaças para a biodiversidade mundial, sendo apenas menos impactante que a destruição de habitats naturais pela atividade antrópica (Clavero e Garcia-Berthou, 2005; Simberloff et al., 2013; LUQUE et al., 2014). Uma espécie exótica é considerada invasora quando se adapta com sucesso ao novo ambiente, multiplicando-se, aumentando a competição por recursos naturais e território, predando espécies nativas, introduzindo novas doenças ou aumentando a ocorrência de patógenos pré-existentes e levando ao deslocamento e até extinção de espécies nativas (CBD, 2010). Os javalis (Sus scrofa, Linnaeus 1758), nativos do Paleártico, foram um dos primeiros animais intencionalmente introduzidos ao redor do mundo para domesticação e criação comercial e, mais recentemente, para fins cinegéticos. Estão dispersos em todos os continentes, com exceção da Antártida, e o sucesso de sua adaptação a diferentes ambientes deve-se, principalmente, à alta prolificidade e à plasticidade alimentar da espécie (Barrios-Garcia e Ballari, 2012). Sua presença 23 frequentemente está relacionada a problemas econômicos como ataques a lavouras, a risco sanitário por atuarem como reservatório de patógenos, e a impactos ambientais como alteração da vegetação e predação de espécies autóctones. Tais fatores fazem com que estes mamíferos estejam listados entre as 100 espécies exóticas invasoras mais danosas do mundo (Lowe et al., 2000). No Brasil, a invasão de ambientes naturais por javalis teve início em 1989 na região de fronteira com o Uruguai, onde surgiram os primeiros relatos de danos a lavouras causados por esses animais (Deberdt e Scherer, 2007). Durante a década de 90 a popularidade do javali como fonte de carne exótica levou a uma expansão de criatórios legais e ilegais e à importação de espécimes puros da França e do Canadá. Entretanto, a proibição de abertura de novos criatórios comerciais pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e a baixa rentabilidade econômica inviabilizaram a criação comercial destes animais o que fez com que muitos javalis acabassem sendo soltos na natureza. Translocações e introduções em novas áreas, devido ao interesse pela caça do javali, associadas à dispersão natural da espécie têm aumentado a cada ano o número de municípios com relatos de ocorrência de javalis selvagens no Brasil (Deberdt e Scherer, 2007; Pedrosa et al., 2015; Brasil, 2019). A espécie está dividida em subespécies que variam em seu número de cromossomos, e tais diferenças se devem a diversos cruzamentos ocorridos aleatoriamente durante séculos (Scandura et al. 2011). No Brasil, a maioria dos animais observados em vida livre apresenta porte avantajado, até 250 kg, em decorrência de cruzamentos, intencionais ou não, com suínos domésticos, originando linhagens popularmente conhecidas como “javaporcos” (Brasil, 2017). Para simplificação, neste estudo o termo “javali” foi empregado de forma genérica para denominar todas as variações de cruzamentos entre javalis, porcos domésticos e porcos asselvajados que formam as populações ferais recentes de S. scrofa no Brasil. Em regiões onde ocorre como invasor, existem evidências de que os javalis atuam como reservatórios de doenças infecciosas e parasitárias relevantes para a agropecuária e para a fauna silvestre, muitas delas com importante potencial zoonótico. Relatos de javalis afetados por brucelose, leptospirose, salmonelose, tuberculose, peste suína africana, peste suína clássica, febre aftosa, hepatite E, 24 Influenza A, Circovírus suíno, pseudoraiva (Doença de Aujeszky), estomatite vesicular, toxoplasmose e triquinelose (Pavlov et al., 1992; Ranque et al., 2000; USDA-APHIS-WS, 2016), evidenciam a importância destes animais como reservatórios de patógenos. O complexo teniose-cisticercose é uma das principais zoonoses relacionadas a suídeos e estudos demonstraram a participação dos javalis no ciclo desta doença (Eslami e Farsad-Hamdi, 1992; Solaymani-Mohammadi et al., 2003). Diversos estudos sobre parasitas de S. scrofa selvagens foram realizados em diferentes regiões do mundo, incluindo Paleártico (Humbert e Henry, 1989; Eslami e Farsad-Hamdi, 1992; De-la-Muela et al., 2001; Rajkvic-Janje et al., 2002; Fernandez- de-Mera et al., 2003; Solaymani-Mohammadi et al., 2003; Mowlavi et al., 2006; Järvis et al., 2007; Morita et al., 2007; Sato et al., 2008; Moretta et al., 2011; Senlik et al., 2011; Garcia-Gonzales et al., 2013; Mezo et al., 2013; Ahn et al.,2015; Gassó et al., 2015; Kołodziej-Sobocinska et al., 2016; Mansouri et al., 2016; Sarkari et al., 2016; Dodangeh et al., 2018; Kamimura et al., 2018; Moratal et al., 2018; Panayotova- Pencheva e Dakova, 2018; Papini et al., 2018; Stojanov et al., 2018; Castagna et al., 2019; Jankowska-Makosa et al., 2019; Paoletti et al., 2019), Neártico (Henry e Conley, 1970; Coombs e Springer, 1974; Pence et al., 1988; Shender et al., 2002), Oceania (Mckenzie e Davidson, 1989) e Neotrópico (Okoro et al., 2015), identificando infecções causadas por nematódeos, cestódeos, digenéticos e acantocéfalos. Apesar de alguns trabalhos avaliando a helmintofauna de javalis de criatórios comerciais nas regiões sul e sudeste (Mundim et al., 2004, Gomes et al., 2005; Silva e Müller, 2013ab; Marques et al., 2016), estudos sobre parasitas de javalis de vida livre são escassos no Brasil. Considerando-se o desconhecimento do status parasitológico de javalis selvagens no país e a possibilidade de risco para a saúde animal e humana, o objetivo deste trabalho foi identificar e analisar a ocorrência de helmintoses em javalis (Sus scrofa) de vida livre da região norte do Estado de São Paulo, ampliando o conhecimento sobre a ecologia e sanidade dessa espécie invasora em uma das regiões mais afetadas do território brasileiro (Brasil, 2019), e avaliar possível interferência sobre a suinocultura local quanto à possibilidade de transmissão de helmintos. 25 Materiais e Métodos Área do estudo As amostras utilizadas no presente estudo foram provenientes de javalis de vida livre abatidos por equipes de manejo de fauna invasora no norte do estado de São Paulo, região Sudeste do Brasil. Os javalis foram abatidos em propriedades rurais nos municípios de São José do Rio Preto e Monte Azul Paulista (20°50’ a 20°54’S, 48°41’ a 49°15’W), durante o período de setembro de 2016 a julho de 2017. As amostras de suínos domésticos foram obtidas de animas criados em suinocultura tecnificada localizada no município de Monte Azul Paulista (20°55'47"S 48°42'05"W) e abatidos em abatedouro frigorífico no mês de março de 2017 (Figura 1). A atividade agropecuária é o setor mais destacado da economia regional e as principais culturas são a cana de açúcar, a laranja, a borracha, a soja, o milho, o amendoim, o tomate, a bovinocultura de corte e a avicultura (São Paulo, 2012). A suinocultura é pouco desenvolvida na região, sendo a propriedade de origem das amostras de suínos analisadas a maior e uma das únicas granjas de suínos tecnificadas, havendo também registro de uma pequena granja de terminação e de pouco mais de 20 criações de suínos de subsistência em Monte Azul Paulista e municípios limítrofes. (CDA-SP 2020, IBGE 2020). A área de estudo localiza-se na faixa de transição entre os biomas Cerrado e Mata Atlântica, caracteriza-se por clima subtropical úmido, segundo a classificação climática de Köppen modificada, com temperaturas médias mensais acima de 18°C durante todo o ano e média pluviométrica anual entre 1200 e 1500 mm. Apresenta 4 a 5 meses de estiagem no inverno, entre os meses de maio a setembro, e está a uma altitude média de 600 metros acima do nível do mar (CIIAGRO, 2019; INMET, 2019; IBGE, 2019). A região é altamente antropizada, possui extensas áreas de produção agrícola, que alteram a paisagem e diminuem consideravelmente a vegetação nativa. Assim, a fauna fica restrita às áreas de preservação permanente, reservas legais e bosques urbanos. Considerando um raio de 120 km a partir da área de estudo, encontram-se as Unidades de Conservação: Floresta Estadual de Bebedouro, Floresta Estadual do Noroeste Paulista, Estação Ecológica de Paulo de Faria, Área de Proteção Ambiental 26 de Ibitinga, Estação Ecológica de Ribeirão Preto e Estação Ecológica de Jataí-Luiz Antônio. Encontram-se também quatro Reservas Particulares do Patrimônio Natural (Cava II, Sítio Palmital, Porto do Ifé e Vale Verdejante). Quanto à fauna nativa, existem registros de ocorrência de catetos (Pecari tajacu) na Estação Ecológica de Paulo de Faria e de catetos (Pecari tajacu) e queixadas (Tayassu pecari) na Estação Ecológica de Jataí (São Paulo, 2020). Desta forma, apesar da baixa probabilidade devido à extrema fragmentação e destruição de habitats naturais na região, considerando a alta capacidade de deslocamento de javalis selvagens ao longo da vida, existe possibilidade de simpatria com suiformes nativos, principalmente com catetos. Figura 1. Localização dos pontos de coleta de amostras biológicas de javalis selvagens abatidos por equipes de manejo de fauna exótica na região norte do Estado de São Paulo e do município da granja de origem das amostras biológicas de suínos domésticos coletadas em abatedouro. 27 Amostras biológicas A amostragem dos javalis e dos suínos domésticos foi realizada por conveniência, não obedecendo critérios bioestatísticos, considerando a ausência de dados populacionais de javalis na região, a dependência do sucesso de captura de javalis pela equipe de manejadores de fauna exótica e a quantidade de amostras de vísceras de suínos cedidas pelo abatedouro. Javalis Foram analisados os órgãos de 35 javalis de vida livre, 22 machos e 13 fêmeas, abatidos com uso de arma de fogo e eviscerados após o abate. A idade dos animais foi estimada com base na erupção dentária (Magnell e Carter, 2007) e a maioria dos animais foi classificada como jovens ou adultos jovens (6 meses a 2 anos), apenas dois leitões apresentaram-se fora desta faixa etária. Os órgãos das cavidades torácica e abdominal foram removidos, embalados em sacos plásticos, identificados e armazenados em caixas isotérmicas com gelo para transporte até o Laboratório de Enfermidades Parasitárias (LabEPar) no Departamento de Medicina Veterinária Preventiva e Reprodução Animal da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV), da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Campus de Jaboticabal, São Paulo, Brasil. Suínos domésticos de criação comercial Foram avaliadas amostras de 18 suínos domésticos, abatidos aos 4 meses de idade com peso médio de 100 kg, provenientes de granja comercial de suinocultura intensiva tecnificada localizada no município de Monte Azul Paulista/SP (20°55'47"S 48°42'05"W), mesma região onde foram realizadas as coletas de amostras de javalis. A propriedade de origem dos suínos analisados é uma granja de ciclo completo, com plantel de aproximadamente 3000 animais, sendo 350 fêmeas em reprodução. A granja adota boas práticas agropecuárias como, por exemplo, medidas de biossegurança, isolamento da área produtiva com cerca de alambrado, controle de entrada e saída de veículos, pessoas e animais, criação dos animais em galpões de alvenaria divididos em baias com chão de concreto e manejo diário dos resíduos, manejo de isolamento das fêmeas em fase de reprodução e controles nutricional, genético e sanitário do plantel, incluindo administração sistemática de anti-helmínticos via ração, conforme a fase de criação, suspensa no período pré-abate de acordo com 28 o produto utilizado. No passado, a propriedade sofreu com problemas associados à invasão de javalis, situação que foi resolvida após a instalação de cerca de alambrado isolando a área produtiva. Os órgãos dos suínos domésticos foram coletados em abatedouro frigorífico sob inspeção oficial do Serviço de Inspeção do Estado de São Paulo (SISP), embalados em sacos plásticos, identificados e armazenados em caixas isotérmicas com gelo para transporte até o laboratório. Diagnósticos parasitológicos No laboratório, os órgãos de javalis e suínos domésticos foram separados e examinados macroscopicamente para pesquisa de cistos ou parasitas visíveis. A vesícula e os ductos biliares foram inspecionados e seccionados. Foram feitos cortes seriados na língua, no fígado, no diafragma e no coração, após abertura de suas cavidades, para procura de cisticercos ou outros parasitas. Pâncreas, baço e omento foram examinados. Rins, ureteres e bexiga foram inspecionados e dissecados. Os helmintos encontrados durante o exame macroscópico foram colhidos e acondicionados em frascos com solução de Railliet & Henry. O trato gastrointestinal foi ligado para corte e separação de seus segmentos anatômicos que tiveram seus conteúdos e mucosa lavados em água corrente e passados por tamis de malha metálica de 100 µm. Traqueia, brônquios e bronquíolos também foram seccionados e lavados em água corrente tendo seu conteúdo passado por tamis de malha metálica de 100 µm. O material retido nos tamises foi envasado com solução de Railliet & Henry para posterior separação, identificação e contagem de helmintos com auxílio de microscópio estereoscópico. Para identificação, os parasitas foram diafanizados em ácido acético 80% e creosoto de Faia e montados em lâminas para observação em microscópio. Para análise de características morfológicas, imagens dos parasitas foram obtidas em microscópio e a identificação taxonômica dos helmintos foi feita seguindo chaves propostas por Yamaguti (1963), Vicente et al. (1997) e Anderson, Chabaud e Wilmott (2009). Vouchers de cada espécie diagnosticada foram depositados na coleção do LabEPar, FCAV/Unesp Jaboticabal. 29 Análise estatística Os indicadores de infecção prevalência, intensidade média e abundância média foram calculados para cada espécie de parasita encontrada. A terminologia ecológica empregada está de acordo com Bush et al. (1997). Previamente à análise estatística, a normalidade dos dados foi avaliada pelos testes de Kolmogorov-Smirnov e/ou Shapiro-Wilk. O efeito do sexo do hospedeiro sobre a prevalência foi avaliado através do teste exato de Fischer. A influência do sexo do hospedeiro sobre a intensidade média foi analisada utilizando-se o teste t, para os dados com distribuição normal, ou teste U de Mann-Whitney, para dados que não apresentaram distribuição normal. P foi ajustado em 0,05. Os cálculos foram realizados utilizando o software GraphPad Prism versão 5.0. Diagnóstico Coproparasitológico Amostras de fezes foram colhidas da ampola retal, colocadas em frascos apropriados para coleta e mantidas sob refrigeração (5 a 8°C), pelo período máximo de 24 horas, até o momento da análise. Foi utilizada a técnica de Gordon e Whitlock (1939) para a contagem de ovos dos helmintos. Aspectos éticos e legais Este trabalho faz parte de projeto de pesquisa aprovado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), solicitação no Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade (SISBIO) nº 55352-1, e pelo Comitê de Ética no Uso de Animais da FCAV/Unesp Jaboticabal, protocolo nº 2465/17. A equipe de manejo de fauna parceira deste projeto possui licenças ambientais para manejo de fauna exótica invasora junto ao Cadastro Técnico Federal do IBAMA (Registros nº 2865226, nº 5680506 e nº 6220451) e Certificados de Registro para porte e transporte de armas para atividade de caça junto ao Exército Brasileiro (CRs nº 55480, nº 59376 e nº 117441). Resultados e Discussão Comunidade parasitária Nas amostras de suínos domésticos não foram encontradas fases adultas ou larvais de macroparasitas. A partir das amostras de javalis de vida livre foram 30 coletados, no total, 13.262 espécimes de helmintos de dez espécies diferentes, sendo nove espécies pertencentes ao Phylum Nematoda e uma ao Phylum Acantocephala. A variação da intensidade total foi de 82 a 959 espécimes por hospedeiro, com intensidade média total de 378,9 helmintos por animal. Foram calculados os indicadores de infecção prevalência, intensidade média e abundância média encontrados para cada espécie de helminto identificada (Tabela 1). Tabela 1. Indicadores de infecção de helmintos encontrados em javalis de vida livre (Sus scrofa) abatidos por equipes de manejo de fauna na região norte do Estado de São Paulo, entre 2016 e 2017. Parasita LI P (%) AM ± EP IM ± EP VI NEMATODA Ancylostomatoidea Globocephalus urosubulatus ID 94,3 215,5 ± 31,7 228,6 ± 32,2 1 - 892 Strongyloidea Stephanurus dentatus Pe, U, R, F, C 71,4 17,9 ± 3,8 25,1 ± 4,6 1 - 341 Oesophagostomum dentatum IG 2,9 0,03 1 - Metastrongyloidea Metastrongylus salmi Pu 82,9 25,9 ± 5,8 31,2 ± 6,6 1 - 128 Metastrongylus pudendotecus Pu 11,4 0,26 ± 0,1 2,25 ± 0,6 1 - 4 Rhabditoidea Strongyloides ransomi ID 59,3 118,3 ± 32,6 188,2 ± 46 1 - 673 Spiruroidea Ascarops strongylina E 28,6 0,57 ± 0,2 2 ± 0,6 1 - 6 Trichuroidea Trichuris suis IG 8,6 0,23 ± 0,1 2,7 ± 0,7 1 - 8 Ascaridoidea Ascaris suum ID 2,9 0,03 1 - ACANTOCEPHALA Oligacanthorrhychidae Macracanthorhynchus hirudinaceus ID 5,7 0,2±0,2 3,5±2,5 1 - 6 Abreviações: LI = local de infecção, P = prevalência, AM = abundância média, IM = intensidade média, EP = erro padrão, VI = variação da intensidade, E = estômago, ID = intestino delgado, IG = intestino grosso, Pu = pulmões, Pe = peritônio, U = ureteres, R = rins, F = fígado, C = coração. As quatro espécies mais abundantes da comunidade parasitária dos animais examinados foram Globocephalus urosubulatus, com 7.542 (56,9%) espécimes coletados; Strongyloides ransomi, com 4.140 (31,2%) espécimes; Metastrongylus salmi, com 906 (6,8%) espécimes; e Stephanurus dentatus, com 628 (4,7%) espécimes. Com abundâncias totais consideravelmente menores foram encontradas as espécies Ascarops strongylina, 20 espécimes; M. pudendotecus, 9 espécimes; Trichuris suis, 8 espécimes; Macracanthorhynchus hirudinaceus, 7 espécimes; 31 Ascaris suum e Oesophagostomum dentatum apenas um espécime cada (Figuras 2, 3, 4 e 5). Globocephalus urosubulatus foi o parasita com maiores prevalência (94,3%) e abundância média (215,5), enquanto Ascaris suum e Oesophagostomum dentatum foram as espécies menos frequentes com prevalência de 2,9% e abundância média de 0,03. Todos os javalis avaliados neste estudo apresentaram infecções mistas compostas por duas a seis espécies de helmintos, sendo encontradas em média 3,7 espécies por hospedeiro. A maior parte dos hospedeiros apresentou infecções mistas com 3 espécies (42,8%), seguido por infecções com 4 espécies (37,1%), 5 espécies (14,3%), 6 espécies (2,8%) e 2 espécies (2,8%). Apesar da riqueza de parasitas encontrados todos os animais avaliados apresentavam bom escore corporal. Na população de animais avaliados não houve influência do sexo do hospedeiro sobre os indicadores prevalência (p>0,9999) ou (A. suum: p=0,3714; A. strongrylina: p=0,4437; G. urosubulatus: p= 0,5193; M. salmi: p=0,6485; M. pudendotecus: p=0,6176; S. dentatus: p=0,2591; O. dentatum: p>0,9999; S. ransomi: p>0,9999; T. suis: p=0,2790; M. hirudinaceus: p>0,9999) e intensidade média (p=0,8377) ou (A. suum: p=0,2143; A. strongrylina: p=0,5322; G. urosubulatus: p=0,2672; M. salmi: p=0,0671; M. pudendotecus: p=0,5366; O. dentatum: p>0,4780; S. dentatus: p=0,3973; S. ransomi: p>0,5750; T. suis: p=0,1815; M. hirudinaceus: p=0,7026) das espécies de parasitas encontradas. Nos exames coproparasitológicos, todas as 18 amostras de suínos domésticos apresentaram resultado negativo. Devido à perda de amostras, foram analisadas amostras de fezes de 22 javalis, nas quais foram identificados ovos de 3 morfotipos diferentes, estrongilídeo, mestastrongilídeo e Strongyloides e a prevalência de parasitismo foi de 86% (19/22). Também foram observados oocistos de Eimeria spp em 5 amostras. A contagem de ovos variou de 100 a 1800 ovos por grama de fezes (Figura 6). Estes achados evidenciam que a maioria dos javalis selvagens apresentava infecções ativas e estava eliminando ovos nas fezes, contribuindo para o aumento da contaminação ambiental por fases infectivas dos helmintos. No presente estudo, a comunidade de helmintos parasitas de javalis de vida livre da região norte do estado de São Paulo apresentou riqueza de espécies maior do que a encontrada para javalis de criatórios comerciais na mesma região (Gomes 32 et al., 2005), sendo composta por dez espécies de helmintos, com forte predominância de nematódeos (9/10). Todas as espécies encontradas já foram descritas parasitando suínos domésticos (Taylor et al., 2016), javalis de criatório (Marques et al., 2016), javalis selvagens (Coombs e Springer, 1974; Eslami e Farsad-Hamdi, 1992, Senlik et al., 2011; Gassó et al., 2015; Panayotova-Pencheva e Dakova, 2018) e taiassuídeos autóctones (Souza, 2014). 33 Figura 2. Fotomicrografias de helmintos parasitas de javalis selvagens da região norte do estado de São Paulo. A) Porção anterior de Ascarops strongylina, presença de lábios trilobados (seta) e faringe com espessamentos espiralados (ponta de seta). Barra: 35 μm. B) Região posterior de macho de A. strongylina, cloaca rodeada por um espessamento cuticular serrilhado A) B) C) D) E) F) * * V 34 (seta). Barra: 75 μm. C) Porção anterior de Globocephalus urosubulatus, cutícula espessa estriada transversalmente (ponta de seta), cápsula bucal globular (*) e esôfago claviforme (seta). Barra: 150 μm. D) Posterior de macho de G. urosubulatus com bolsa copuladora bem desenvolvida (ponta de seta) e espículos longos, finos e iguais (seta). Barra: 150 μm. E) Anterior de Oesophagostomum dentatum, abertura bucal com coroa radiata (seta), cáspula bucal larga e rasa (*) e esôfago claviforme (ponta de seta). Barra: 75 μm. F) Região posterior de fêmea de Oesophagostomum dentatum. Barra: 75 μm. Figura 3. Fotomicrografias de helmintos parasitas de javalis selvagens da região norte do estado de São Paulo. A) Anterior de Stephanurus dentatus, cápsula bucal subglobular com paredes espessas (*). Barra: 2500 μm. B) Posterior de macho de S. dentatus, bolsa copuladora pouco desenvolvida e subterminal (seta), espículos iguais ou subiguais (pontas de seta). Barra: 150 μm. C) Strongyloides ransomi, vermes delgados filiformes com esôfago longo, podendo ocupar até um terço do corpo. Apenas as fêmeas possuem geração de vida parasitária. Barra: 2500 μm. D) Posterior de Trichuris suis, macho, A) B) C) D) * 35 cauda espessa e espiralada e presença de espículo único, envolto em uma bainha semelhante a prepúcio (seta). Barra: 2500 μm. Figura 4. Fotomicrografias de helmintos parasitas de javalis selvagens da região norte do estado de São Paulo. A) Anterior de Metastrongylus pudendotecus, lábios A) B) C) D) E) F) 36 laterais trilobados (seta), cavidade bucal muito pequena e esôfago claviforme (ponta de seta). Barra: 150 μm. B) Anterior de Metastrongylus salmi, lábios laterais trilobados (seta), cavidade bucal muito pequena e esôfago claviforme (ponta de seta). Barra: 75 μm. C) Posterior de Metastrongylus pudendotecus; macho, espículos longos, finos e com ganchos duplos na extremidade terminal. Barra: 150 μm. D) Posterior de Metastrongylus salmi, macho, espículos de maior comprimento e com gancho único na extremidade. Barra: 150 μm. E) Posterior de Metastrongylus pudendotecus, fêmea, presença de dilatação cuticular circular proeminente (seta) e cauda reta. Barra: 150 μm. F) Posterior de Metastrongylus salmi, fêmea, extremidade posterior flexionada ventralmente e dilatação cuticular ausente. Barra: 150 μm. Figura 5. Helmintos parasitas de javalis selvagens da região norte do estado de São Paulo. A) Fotomicrografia de Ascaris summ mostrando a boca cercada por três grandes lábios (*), sem interlábios. Barra: 35 μm. B) Fotografia da região anterior de espécime de Macracanthorhynchus hirudinaceus, obtida através de estereomicroscópio em aumento de 8x, evidenciando a probóscide retrátil recoberta de ganchos recurvados (setas). * * * A) B) 37 Figura 6. Fotomicrografias de morfotipos de ovos e oocistos observados em exames coproparasitológicos de javalis selvagens da região norte do Estado de São Paulo. A) Ovo do tipo metastrongilídeo, elipsoidais e com casca espessa e rugosa. Barra: 30 μm. B) Oocisto de Eimeria sp. Barra: 30 μm. C) Ovos do tipo estrongilídeo (1), elipsoide e morulado, e Strongyloides (2), elipsoide e larvado. Barra: 30 μm. Dentre as dez espécies de helmintos encontradas, sete parasitam o trato gastrintestinal de suídeos, sendo A. strongylina localizada no estômago; G. urosubulatus, S. ransomi, A. suum e M. hirudinaceus localizadas no intestino delgado; T. suis e O. dentatum no intestino grosso. Em geral, as espécies encontradas neste estudo parasitando o trato gastrointestinal de javalis estão relacionadas a infecções leves e assintomáticas, podendo ter maior relevância clínica em infecções intensas, principalmente em animais jovens. Em relação ao número de espécies encontradas houve predominância de helmintoses gastrintestinais, porém, analisando as espécies mais prevalentes e abundantes, G. urosubulatus, S. ransomi, M. salmi e S. dentatus, percebe-se que a ocorrência de parasitas está bem distribuída dentre todos os sistemas orgânicos afetados por helmintos identificados neste estudo. Relações parasita-hospedeiro Dentre as quatro espécies predominantes, três possuem ciclo biológico monoxeno, G. urosubulatus, S. ransomi e S. dentatus, e as altas prevalências e intensidades encontradas para esses parasitas podem estar relacionadas aos hábitos A) B) C) 1 2 38 comportamentais dos javalis, como o chafurdamento em solos úmidos, onde a alta umidade favorece a sobrevivência de fases infectivas no ambiente, e a ação de revolver o solo em busca de alimentos. Estes hábitos aumentam a probabilidade de contato do hospedeiro com fases infectivas destes helmintos, larvas de terceiro estádio que têm como vias de infecção a ingestão ou a penetração pela pele do hospedeiro e após migração tecidual alcançam os órgãos de predileção de cada espécie (Coombs e Springer, 1974; Taylor, et al., 2016). Outro fator determinante para a dispersão de parasitas monoxenos é a densidade populacional de seus hospedeiros. A alta densidade de hospedeiros também é um fator importante ao aumento da riqueza parasitária. Quanto a isso, o número crescente de relatos de ocorrência de javalis no Brasil evidencia que as populações de vida livre desses animais são numerosas (Pedrosa et al., 2015; Brasil, 2019), o que aumenta a probabilidade das larvas L3 infectivas alcançarem novos hospedeiros e completarem seu ciclo biológico. Locais de alimentação que atraem javalis, como as cevas feitas por caçadores e as plantações agrícolas, têm maiores níveis de contaminação ambiental tornando-se áreas com alto risco de infecção por parasitas monoxenos (Navarro-Gonzales et al., 2013). Estudos avaliando a suplementação alimentar de populações selvagens de javalis para fins cinegéticos demonstraram que, além da concentração de animais nos pontos de alimentação causar maior contaminação ambiental destes por fases infectivas, outro fator importante para a disseminação de parasitas é que a maior disponibilidade de alimentos favorece a reprodução e reduz a taxa de mortalidade, resultando em aumento da população de hospedeiros (Navarro-Gonzales et al., 2013; Oja et al. 2017). Dentre as espécies com maiores prevalência e intensidade também foi encontrada uma com ciclo indireto. M. salmi é uma espécie de ciclo heteroxeno que tem como hospedeiros intermediários as minhocas, item importante na dieta de suídeos selvagens (Ballari e Barrios-Garcia, 2013). Novamente, o hábito de revolver o solo em busca de alimentos facilita a viabilidade do ciclo parasitário, neste caso por aumentar a probabilidade de ingestão do hospedeiro intermediário contendo fases infectivas do parasita em seus tecidos (Coombs e Springer, 1974; Humbert e Henry, 1989; Nagy, 2014). As minhocas também podem desempenhar papel importante 39 como hospedeiros paratênicos de fases larvais de S. dentatus e A. suum, aumentando o período de sobrevivência das fases infectivas destes parasitas monoxenos (Pence et al., 1988; Taylor, et al., 2016). A diversidade de espécies encontradas no presente estudo é semelhante aos resultados encontrados nos Estados Unidos (Coombs e Springer, 1974; Shender et al., 2002), na França (Humbert e Henry, 1989), na Espanha (De-la-Muela et al., 2001; Fernandez-de-Mera et al., 2003; Gassó et al., 2015), na Croácia (Rajkovic-Janje et al., 2002), na Estônia (Järvis et al., 2007), na Turquia (Senlik et al., 2011), na Bulgária (Panayotova-Pencheva e Dakova, 2018), no Irã (Eslami e Farsad-Hamdi, 1992; Solaymani-Mohammadi et al., 2003) e no Japão (Sato et al., 2008; Morita et al., 2007); que demonstram a predominância de nematódeos na helmintofauna de javalis selvagens e riqueza parasitária variando até 18 espécies diferentes identificadas em um estudo (Sato et al., 2008). Semelhante ao observado neste trabalho, a ocorrência de metastrongilídeos, parasitas comumente encontrados em altas prevalências em javalis, foi evidenciada na França (Humbert e Henry, 1989), na Espanha (De-la-Muela et al., 2001; Fernandez-de-Mera et al., 2003; García-González et al., 2013; Gassó et al., 2015), na Itália (Castagna et al., 2019), na Sérvia (Stojanov et al., 2018), na Turquia (Senlik et al., 2011), na Bulgária (Panayotova-Pencheva e Dakova, 2018), na Estônia (Järvis et al., 2007), na Croácia (Rajkovic-Janje et al., 2002), no Irã (Solaymani-Mohammadi et al., 2003; MANSOURI et al., 2016), no Japão (Morita et al., 2006) e nos Estados Unidos (Henry e Conley, 1970, Coombs e Springer, 1974; Pence et al., 1988; Mckenzie e Davidson, 1989; Shender et al., 2002). De-la-Muela et al. (2001) não identificaram influência do sexo na intensidade ou prevalência de metastrongilídeos, o que foi corroborado pelos resultados do presente estudo. A estafanurose é uma doença importante em suídeos e nos EUA foram relatadas prevalências elevadas, entre 25 e 100%, em javalis de vida livre para esta parasitose (Henry & Conley, 1970; Coombs e Springer, 1974; McKenzie & Davidson, 1989; Shender et al., 2002). Na Espanha, Moratal et al., (2018) encontraram 76,5% de prevalência e observaram influência do sexo na intensidade parasitária, com os machos apresentando as maiores intensidades de infecção. No presente estudo não 40 houve influência do sexo nos indicadores de infecção, semelhante ao observado por Pence et al. (1988) nos EUA. A ausência de relação entre sexo do hospedeiro e indicadores de infecção parasitária dos javalis analisados pode estar relacionada à faixa etária dos animais que compõem a amostra estudada. Machos de até 02 anos de idade ainda são adultos jovens e podem ser encontrados em pequenos grupos de machos jovens ou ainda vivendo junto a grupos de fêmeas (Keeling e Gonyou, 2001). Diferente dos machos adultos em plena atividade reprodutiva que apresentam hábitos solitários e possuem maior área de vida, os machos jovens estão expostos aos mesmos fatores de risco dos demais animais do bando. Assim, a ausência de diferença comportamental s