JESIANE DEBASTIANI A POLÍTICA IMIGRATÓRIA DO GOVERNO VARGAS (1940-1945) Teses, Práticas e Debates na Revista de Imigração e Colonização ASSIS 2018 JESIANE DEBASTIANI A POLÍTICA IMIGRATÓRIA DO GOVERNO VARGAS (1940-1945) Teses, Práticas e Debates na Revista de Imigração e Colonização Dissertação apresentada à Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras, Assis, para a obtenção do título de Mestra em História (Área de Conhecimento: História e Sociedade). Orientador: Prof. Dr. Paulo Cesar Gonçalves Bolsista: CAPES ASSIS 2018 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca da F.C.L. – Assis – Unesp D286p Debastiani, Jesiane A Política imigratória do governo Vargas (1940-1945): teses, práticas e debates na Revista de Imigração e Colonização / Jesiane Debastiani. Assis, 2018. 168 f.: il. Dissertação de Mestrado – Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras, Assis Orientador: Dr. Paulo Cesar Gonçalves 1. Brasil - Política e governo, 1930-1945. 2. Brasil Presi- dente (1930-1945: Vargas Migração. 3. Imigrantes. 4. Colo- nização. I. Título. CDD 981.08 AGRADECIMENTOS É com grande entusiasmo e felicidade encerrar este texto depois de três anos de muita pesquisa. Embora seja de minha autoria devo reconhecer que este trabalho só foi possível graças ao apoio e ajuda de muitas pessoas. Primeiramente agradeço a Deus por ter conseguido realizar este sonho, de realizar o Mestrado, e por estar presente em todos os momentos da minha vida. Agradeço a CAPES por ter fomentado esta pesquisa, possibilitando a dedicação integral. Ao Prof. Dr. Paulo Cesar Gonçalves pela paciência, pela disponibilidade de tempo, como também aos inúmeros conselhos e sugestões ao longo destes anos. Suas orientações desde a Iniciação Científica até a redação final da escrita foram fundamentais para a realização desta Dissertação de Mestrado. Como também colaboram para a formação de uma profissional na área de história. A Instituição UNESP, ao corpo docente e a seção técnica de pós-graduação pelo trabalho e ajuda durante estes anos. As contribuições da Prof. Dra. Endrica Geraldo e do Prof. Dr. José Luis Bendicho Beired que aceitaram gentilmente a participar do Exame da Banca de Qualificação, como também da Defesa de Mestrado, apresentando valiosas sugestões que colaboraram para o enriquecimento da pesquisa. Aos meus pais, João e Maria, que estiveram ao meu lado em todos os momentos, me apoiando, enfim, apontando sempre o caminho correto a ser seguido. Aos meus irmãos Gisele e João Neto pelo incentivo, pela ajuda e por sempre me ouvirem quando eu precisei. Aos amigos de longa data, como também os novos que fiz durante o Mestrado, Priscila, Carol, Maysa, por compartilharem saberes e experiências, além de boas risadas. Ao meu amigo, irmão André pelo apoio e amizade, ao Marcos pela paciência e companheirismo ao longo destes anos. DEBASTIANI. Jesiane. A Política Imigratória do Governo Vargas (1940-1945): Teses, Práticas e Debates na Revista de Imigração e Colonização. f.167. Dissertação (Mestrado Acadêmico em História). Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖, Assis, 2018. RESUMO A Dissertação busca realizar uma análise da política imigratória ao longo dos anos de 1940 a 1945, período caracterizado por controle, restrição e seleção dos imigrantes que vinham ao país. Para isso utilizaremos a Revista de Imigração e Colonização como também a historiografia acerca do período. A Revista de Imigração e Colonização foi um periódico do Conselho de Imigração e Colonização, criado em 1940 destinado a informar sobre os assuntos relacionados à imigração e colonização, como também defender a política do governo. Através desta revista podemos compreender como a as questões que envolviam imigração e colonização foram discutidas e analisadas pelo governo, ao mesmo tempo em que analisaremos as atuações do Conselho de Imigração e Colonização. Palavras-chave: Brasil, Imigrante, Colonização. DEBASTIANI. Jesiane. The Immigration Policy of the Vargas Government (1940- 1945): Theses, Practices and Debates in the Journal of Immigration and Colonization. f.167. Dissertation (Masters in History). Faculdade de Ciências e Letras, Universidade Estadual Paulista ―Júlio de Mesquita Filho‖, Assis, 2018. ABSTRACT The Dissertation seeks to carry out an analysis of immigration policy throughout the years from 1940 to 1945, a period characterized by control, restriction and selection of immigrants who came to the country. For this we will use the Journal of Immigration and Colonization as well as the historiography about the period. The Journal of Immigration and Colonization was a periodical of the Immigration and Colonization Council, created in 1940 to inform about immigration and colonization issues, as well as defend government policy. Through this magazine we can understand how the issues that involved immigration and colonization were discussed and analyzed by the government, at the same time that we will analyze the actions of the Board of immigration and Colonization. Keywords: Brazil, Immigrants, Colonization. Índice de tabelas: Tabela 1 - Artigos divididos por temáticas e suas respectivas quantidades.....................30 Tabela 2 – Referente aos números de cotas por nacionalidade...........................................47 Tabela 3- Autores e artigos publicados na Revista de Imigração e Colonização..........56 Tabela 4- Estrangeiros entrados no Brasil em 1940......................................................86 Tabela 5: Números de Estrangeiros entrados no Brasil ao longo dos anos de 1934 a 1939...............................................................................................................................109 Tabela 6: Imigração japonesa para o Brasil entre 1908 a 1959....................................130 Tabela 7: Brasil – Imigração Geral e Judaica, por Períodos, 1872-1972.....................134 SUMÁRIO INTRODUÇÃO............................................................................................................10 CAPITULO I A Revista de Imigração e Colonização: Nova abordagem sobre a imigração.........26 1.1 A estrutura da revista ........................................................................................ 26 A temática presente nos artigos da RIC .................................................................. 29 Legislação e Estatisticas .......................................................................................... 45 Noticiário, Livros e Revistas ................................................................................... 53 1.2 Os intelectuais da Revista ................................................................................. 55 1.3 A Revista na perspectiva da historiografia ........................................................ 57 CAPITULO II O Conselho de Imigração e Colonização: Subsidios para o debate..........................62 2.1 A criação do Conselho de Imigração e Colonização......................................... 62 2.2 Membros do Conselho de Imigração e Colonização ......................................... 66 2.3 Atividades do Conselho de Imigração e Colonização ...................................... 70 Relatórios Anuais do CIC ....................................................................................... 70 Resoluções do Conselho de Imigração e Colonização ............................................ 75 Pareceres, Circulares e Decisões do CIC ................................................................ 77 2.4 A imigração nas páginas da Revista de Imigração e Colonização .................... 80 CAPITULO III Da Teoria a Prática: A Política de Imigração e Colonização....................................99 3.1 O início das restrições e a influência eugênica na política imigratória brasileira. ................................................................................................................................. 99 3.2 A Era Vargas: restrição e controle da imigração ............................................ 103 3.3 O imigrante desejável ..................................................................................... 120 3.4 O imigrante indesejavel ................................................................................... 124 3.5 Os súditos do Eixo e a ameaça à segurança nacional ..................................... 145 CONSIDERAÇÕES FINAIS......................................................................................151 BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................159 10 INTRODUÇÃO A presente Dissertação busca trabalhar com a temática da política imigratória brasileira durante o Estado Novo, período que se caracterizou por intensa centralização em todos os âmbitos da sociedade, como também na imigração e colonização. Através da Revista de Imigração e Colonização (RIC), fonte principal desta pesquisa e periódico publicado pelo Conselho de Imigração e Colonização, podemos compreender como os intelectuais do Estado Novo defendiam a imigração e colonização no período. Ao mesmo tempo em que identificaremos o funcionamento do Conselho de Imigração e Colonização e também a política imigratória de acordo com a historiografia. O objetivo da pesquisa é analisar a política imigratória do Governo Vargas ao longo dos anos 1940-1945. Abordando primeiramente o conteúdo da Revista de Imigração e Colonização e como esta defendia a política imigratória durante o período proposto. Em seguida levantando através da fonte desta pesquisa, a RIC, a criação do Conselho de Imigração e Colonização e como este agiu sobre as questões de imigração e colonização. Finalizando, serão cotejadas a fonte pesquisada com a historiografia sobre o tema. A política imigratória brasileira sempre buscou e incentivou a vinda de imigrantes para o país, como mão de obra e também como fator primordial para a composição racial da população brasileira. Ao longo de sua história, a politica imigratória deu preferência ao imigrante branco europeu. No século XIX, existia a preocupação em exercer certo controle daqueles que entravam no país, que perdurou até a década de 1920. Com o início do governo Vargas, o Estado intervencionista passou a endurecer cada vez mais as restrições aos imigrantes através de legislação específica. O fim do tráfico de escravos (1850) e, posteriormente, a Lei do Ventre Livre (1871), juntamente com o crescimento dos movimentos abolicionistas anunciavam que a escravidão apresentava seus momentos finais. Ao mesmo tempo, a lavoura cafeeira passava a demandar cada vez mais mão de obra, além da preocupação, por parte dos governos, de ocupar terras com a constituição de núcleos coloniais. Os fazendeiros, ao se depararem com a escassez de mão de obra, passaram a cogitar a ideia de importarem trabalhadores imigrantes para o trabalho na lavoura exportadora. Por outro lado, debatia-se também a vinda de imigrantes para a constituição de núcleos coloniais. Cabe ressaltar que mesmo antes do fim do tráfico de 11 escravos havia o incentivo para a vinda de estrangeiros, mas com pouco êxito em termos numéricos. A primeira tentativa para promover a imigração foi através do Sistema de Parceria implantado pela iniciativa particular de Nicolau Campos Vergueiro. Entretanto este sistema começou a apresentar diversos problemas como o endividamento dos imigrantes e o fato de muitos fazendeiros estarem acostumados a lidarem com o trabalho escravo. Segundo Paulo Cesar Gonçalves no Sistema de Parceria ocorreu uma quebra de expectativas. Enquanto os colonos – que vinham para o Brasil com a ambição de se tornarem proprietários e melhorarem suas condições de vida – sentiram-se reduzidos à condição de escravos, os fazendeiros viam seus interesses econômicos abalados, pois pretendiam criar um tipo de trabalho que pudesse substituir vantajosamente a mão de obra escrava na cultura do café 1 . Devido aos inúmeros problemas apresentados pelo Sistema de Parceria, surgiu o regime Colonato, que se desenvolveu em grande escala na lavoura cafeeira, apresentando resultados, principalmente pelo fato que o Estado subvencionava as passagens para os imigrantes, livrando-os de dividas como as de transporte 2 . Na década de 1880, com a escravidão praticamente próxima a seu fim, e com a demanda cada vez maior de mão de obra, o Estado Brasileiro foi convocado a subsidiar a imigração. Primeiramente, por meio de Legislação, mas também através do subsidio financeiro, oferecendo serviços como recepção, embarque e desembarque, instalação para os imigrantes, sendo que uma das medidas foi à criação da Hospedaria da Ilha de Flores no Rio de Janeiro. Cabe destacar que a Província de São Paulo desempenhou um grande papel no que tange a promover a imigração para as áreas do interior e, já no ano de 1827, iniciava-se a formação de núcleos coloniais. A província de São Paulo apresentou uma estrutura dinâmica para atender os objetivos específicos da lavoura cafeeira, para isso utilizando-se de recursos públicos que iam desde o recrutamento até o alojamento dos imigrantes. Os fazendeiros com a 1 GONÇALVES, Paulo Cesar. Escravos e imigrantes são o que importam: fornecimento e controle da mão de obra para a economia agroexportadora Oitocentista. Almanack, Guarulhos, n. 17, Dez. 2017. p. 326. 2 Sobre os regimes de trabalho adotados para os imigrantes ao longo do século XIX ver: COSTA, Emilia Viotti da. Da senzala a Colônia. São Paulo. Editora UNESP.1998. HOLLOWAY. Thomas E. Imigrantes para o café: café e sociedade em São Paulo, 1886-1934. Tradução de Eglê Malheiros. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1984. 12 ajuda do Estado conseguiram alcançar soluções para as demandas da lavoura, uma vez que estas exigiram o dinheiro público, para isso alegando ser do interesse da riqueza do país 3 . Durante a Primeira República ocorreram mudanças na política imigratória brasileira, no sentido de sua descentralização. Com isso aos poucos os Estados brasileiros, através de inúmeros decretos e leis, passariam a terem maior liberdade de ação nas questões de imigração e colonização. Cabe destacar a Constituição de 1891 que estabelecia maior autonomia para os Estados lidarem com os problemas de imigração e colonização. O Governo republicano só manteve a imigração subsidiada nos primeiros anos, tendo depois reduzido as verbas destinadas à colonização, de 18 mil contos em 1896 para 960 contos no ano seguinte 4 . A partir dos anos 20 por meio de decretos passou-se a selecionar e controlar a entrada de imigrantes no país, estrangeiros com problemas físicos e psicológicos seriam proibidos de virem ao Brasil, temos como exemplo, primeiramente o Decreto-lei n.4.247 de 1921 e o Decreto n.16.761 de 1924. Ao mesmo tempo em que se incentivava a imigração para o Brasil, iniciava-se o debate acerca do imigrante ―desejável‖ ao país. A seleção do imigrante no século XIX e posteriormente, no século XX, seria influenciada pela tese do branqueamento 5 , segundo a qual, a vinda de europeus brancos, considerados como raça superior e civilizados, auxiliaria no processo de branqueamento da população brasileira do período, vista muitas vezes como atrasada, de maneira que conduziria a sociedade ao progresso. Segundo Célia Maria Marinho de Azevedo, quaisquer imigrantes seriam bem- vindos, desde que ―agricultores, trabalhadores e moralizados‖, o que não dizia respeito aos chineses, aos africanos e nem aos nacionais, descendentes de raças não viris e pouco inclinadas ao trabalho. Tratava-se em suma de abrir o país ao progresso e para isso era urgente favorecer a chegada e estabelecimento de seus agentes, os estrangeiros pertencentes às raças vigorosas 6 . 3 GONÇALVES, Paulo Cesar. Escravos e imigrantes são o que importam: fornecimento e controle da mão de obra para a economia agroexportadora Oitocentista. Almanack, Guarulhos, n. 17, Dez. 2017. p. 349. 4 CARVALHO. Péricles de Mello. A legislação imigratória do Brasil e sua evolução. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano I, N.4. Outubro de 1940. p.723. 5 Sobre a tese de branqueamento ver: SKIDMORE, Thomas E. Preto no Branco: Raça e Nacionalidade no pensamento brasileiro. Tradução de Raul de Sá Barbosa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976. 6 AZEVEDO. Celia Maria Marinho de. Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites- século XIX. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1987. p.146. 13 Desta maneira, negros e chineses foram vistos como ―indesejáveis‖, para isso alegando a inferioridade racial e cultural de ambos os imigrantes. O debate sobre a imigração chinesa iniciou-se nas décadas de 1850, quando políticos e fazendeiros passaram a analisar a vinda destes nacionais ao país, porém era recorrente a imagem deste grupo como uma raça inferior, de modo que não se adaptariam ao meio brasileiro. Com isso a mão de obra chinesa seria vista como algo transitório até a chegada dos desejáveis europeus. Enquanto não se forjassem as condições requeridas por imigrantes vistos como superiores, propunha-se como solução temporária a vinda de trabalhadores supostamente baratos e dóceis que desenvolveriam a produção, rebaixando, com isso, não só o preço da força de trabalho, como também, dos gêneros alimentícios. O chinês, exatamente por sua ―índole dócil e frugal‖, seria o único trabalhador capaz de operar tais milagres econômicos, abrindo caminho para a imigração europeia tão ansiada 7 . Desta forma, podemos destacar que a política de imigração no século XIX caracterizou-se pela busca de mão de obra estrangeira para a lavoura cafeeira, como também para a formação de núcleos coloniais. Ao mesmo tempo, iniciava-se um debate acerca do imigrante ideal para a sociedade brasileira, destacando determinadas estratégias de seleção do imigrante. Seleção e restrição a estrangeiros, classificados como ―desejáveis‖ e ―indesejáveis‖, que perduraria até as primeiras décadas do século XX. No momento em que Getúlio Vargas assumiu o governo do país, ocorreram mudanças tanto na política como na economia e sociedade do país. O Governo de Vargas se caracterizou por uma forte centralização política, pelo intervencionismo em diversos setores da sociedade, incentivou o desenvolvimento do Brasil promovendo a industrialização, como também foi um período marcado pelo autoritarismo e pelo nacionalismo. Para Pedro Cezar Dutra Fonseca o nacionalismo, a industrialização e a política intervencionista pró-crescimento juntamente com o positivismo, permitiu a construção de um fenômeno historicamente novo: o desenvolvimentismo, que caracterizou o Governo Vargas, associado ao intervencionismo 8 . 7 AZEVEDO. Celia Maria Marinho de. Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites- século XIX. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 1987. p.153. 8 FONSECA. Pedro Cezar Dutra. Gênese e precursores do desenvolvimentismo no Brasil. In. A era Vargas: desenvolvimento, economia e sociedade. São Paulo: Editora Unesp, 2012. p.23. 14 Na política imigratória que se configurou a partir do momento em que Vargas assumiu o Governo estavam presentes essas novas diretrizes de governo. Observa-se a intervenção do Estado na questão imigratória, buscando organizá-la e controlá-la e, para isso, utilizando medidas como a seleção e restrição aos imigrantes que não seriam considerados adequados aos interesses do país. Encontramos nesses nos novos ideais da política, a defesa do trabalhador nacional em face ao estrangeiro, como também a nacionalização, que seria imposta ao imigrante por meio de um processo forçado de assimilação. Com isso, a política imigratória a partir da década de 30 passou a estar inserida dentro de um contexto que buscava o desenvolvimento do país em seus diversos setores e, o imigrante, passaria a ser uma peça fundamental tanto para o branqueamento da população brasileira como para o progresso do país. A centralização e a intervenção do Estado estariam presentes neste novo momento da imigração. Como já comentado anteriormente, a imigração no século XIX se caracterizou pela descentralização de órgãos responsáveis. Primeiramente passou a ser dever do Governo dirigir e controlar a imigração para o país. O Artigo 128 do Anteprojeto da Constituição de 1934 deixava claro o controle e a intervenção do governo na questão imigratória. Segundo este, a lei federal poderia proibir, limitar ou favorecer a emigração e imigração, de acordo com os interesses nacionais. O Governo passaria a controlar a entrada de imigrantes ao país, para isso utilizando-se da Lei de Cotas 9 presente na Constituição de 1934, que reduzia os números de entradas de estrangeiros no Brasil. Ao mesmo tempo eram promulgados vários decretos que regulavam e proibiam a vinda de estrangeiros, como também se classificavam em imigrantes e não imigrantes. Na Revista de Imigração e Colonização, notamos a centralização e a intervenção do Estado na imigração: Hoje, os movimentos migratórios deverão ser cuidadosamente preparados e disciplinados pelo Estado, de forma a se adaptarem às necessidades dos países de emigração e imigração. As necessidades atuais são, pois, no sentido de uma melhor organização e um melhor controle dos movimentos migratórios. 9 Ao longo deste trabalho utilizaremos a expressão ―Lei de Cotas‖ para designar o dispositivo presente no artigo 121, parágrafo sexto da Constituição de 1934, que restringia a entrada de imigrantes a dois por cento para cada nacionalidade referente aos últimos cinquenta anos. 15 Em nenhum outro domínio a necessidade da intervenção do Estado se faz mais sentir do que neste. 10 O controle a imigração estaria relacionado aos interesses nacionais e, desta forma, selecionava o estrangeiro em desejável e indesejável, enquanto restringia os estrangeiros inadequados ao país. A política tem de basear-se, portanto, no selecionamento da imigração, pois é dever máximo do Estado intervir na composição da sua população, de forma a criar a maior colaboração e a maior harmonia entre os elementos que a formam. 11 Ao se restringir a entrada de imigrantes no país, alegava-se, muitas vezes, a defesa do trabalhador nacional. Desde os anos de 1930 os intelectuais argumentavam que determinadas nacionalidades, como as japonesas, chegavam ao país e que muitas vezes concorriam com os brasileiros na busca por empregos. O que resultou primeiramente no decreto n.19.482 de 1930 que limitava a entrada de estrangeiros, utilizando como propósito o fato que uma das causas do desemprego se encontrava na entrada desordenada de estrangeiros, que nem sempre traziam o concurso útil de quaisquer capacidades, mas, frequentemente, contribuíam para aumento da desordem econômica e da insegurança social 12 . Durante a Assembleia Constituinte e, posterirormente, o Estado Novo, os intelectuais e a altos funcionários do Governo acreditavam que a imigração deveria ser controlada para que não se tornasse uma ameaça ao trabalhador nacional. Para Getúlio Vargas, em mensagem durante a Assembleia Constituinte, a aglomeração de braços em nossos centros industriais viria a ser fator de perturbação e constituiria ameaça para o trabalhador nacional e para o estrangeiro já localizado no país 13 . A entrada de imigrantes devidamente selecionados era considerada um dos caminhos que poderia levar o país ao tão almejado desenvolvimento. Para Pedro Dutra Fonseca o desenvolvimento não é apenas uma palavra de ordem a mais, mas o elo que unifica e dá sentido a toda a ação do governo, ao legitimar a ampliação de sua esfera nos mais diferentes campos, além da economia propriamente dita: educação, saúde, 10 Primeiro Ano de Trabalhos do Conselho de Imigração e Colonização In. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano I, N.1. Janeiro de 1940. p. 07 11 Primeiro Ano de Trabalhos do Conselho de Imigração e Colonização In. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano I, N.1. Janeiro de 1940. p. 07 12 Decreto nº 19.482, de 12 de Dezembro de 1930. Disponível na Câmara dos Deputados: http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-19482-12-dezembro-1930-503018- republicacao-82423-pe.html. 13 NEIVA. Arthur Hehl. Getúlio Vargas e o problema de imigração e da nacionalização. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano III, N.1. Abril de 1942. p. 43. 16 legislação social, cultura, políticas públicas. Sem ele a nação permanecerá no atraso, com péssima distribuição de renda, periférica ou subordinada no contexto internacional, com indicadores sociais degradantes 14 . Ao se dar prioridade a imigração de europeus brancos, continuava-se a utilizar a tese de branqueamento. Destaca-se que durante a Primeira República foram muitos os políticos e intelectuais que debateram os rumos do Brasil. Todos, em geral, concordavam que era necessário superar o atraso no qual o país vivia. 15 . Intelectuais e políticos buscavam maneiras de superar este atraso para isso utilizando-se como modelos a civilização europeia e norte-americana. Entretanto, a partir da década de 30, este discurso se alterou. Entendia-se que o Brasil era visto como atrasado tanto economicamente como socialmente, como um imenso território rural e uma incipiente industrialização. Segundo Ângela de Castro Gomes exigia-se um esforço de compreensão das singularidades do país, capaz de orientar as novas diretrizes a serem traçadas. Nesses termos, o Brasil real não ficava desqualificado, pois era justamente com esse real que se poderia chegar a um projeto eficiente, uma vez que adequado a nossa singularidade 16 . Médicos, antropólogos utilizando-se destas singularidades brasileiras traçaram ideias eugênicas tanto para analisarem os problemas da sociedade brasileira como também para avaliarem quais nacionalidades seriam interessantes para o desenvolvimento do país. No Brasil a eugenia foi adequada às particularidades do contexto social brasileiro. Iniciava-se um intenso debate sobre as melhores nacionalidades ao país, como já comentado, priorizando a imigração de europeus brancos, preferencialmente de agricultores e profissionais especializados, dando destaque e incentivando à imigração de portugueses. Com base em ideias eugênicas, estrangeiros com deficiência física e psicológica, asiáticos, judeus, negros foram vistos como inadequados ao país, por apresentarem características distintas dos nacionais brasileiros e serem vistos pelos intelectuais do período como raças inferiores que poderiam interferir no processo de branqueamento da 14 FONSECA. Pedro Cezar Dutra. Gênese e precursores do desenvolvimentismo no Brasil. In. A era Vargas: desenvolvimento, economia e sociedade. São Paulo: Editora Unesp, 2012. p.23. 15 GOMES. Ângela de Castro. Autoritarismo e corporativismo no Brasil: o legado de Vargas. In. A era Vargas: desenvolvimento, economia e sociedade. São Paulo: Editora Unesp, 2012. p.72. 16 GOMES. Ângela de Castro. Autoritarismo e corporativismo no Brasil: o legado de Vargas. In. A era Vargas: desenvolvimento, economia e sociedade. São Paulo: Editora Unesp, 2012. p.75. 17 população brasileira. Enfim negros e asiáticos eram vistos como um empecilho à formação nacional. Cabe destacar que a seleção e restrição dos imigrantes sofreriam influências do pensamento autoritário de diversos intelectuais. Como Oliveira Vianna, que esteve presente no projeto de organização do CIC, e também na presidência da comissão para elaborar o anteprojeto de reforma das leis de entrada de estrangeiros. Apresentaram-se conclusões a respeito das correntes imigratórias indesejáveis ao país, estas que se encontram em formas de artigos na Revista de Imigração e Colonização. E de Francisco Campos, responsável pela criação do Decreto-Lei n.3.175 de 1941 que restringia a imigração. Campos também se mostrou contra a livre imigração de qualquer nacionalidade, inclusiva a de portugueses. O auge da centralização política e a ação intervencionista do Estado em relação à questão imigratória se configurou com a promulgação do Decreto-Lei n.406 de 04 de Maio de 1938, que dispunha sobre a entrada de estrangeiros em território nacional, os selecionando, mantendo o sistema de cotas, como também criava o Conselho de Imigração e Colonização. A formação do CIC esteve ligada ao surgimento de inúmeros Conselhos Técnicos criados pelo Estado, que serviram para fazer a ―política do presidente‖ e para consolidarem a centralização de um Estado gestor e intervencionista 17 . Apresentava como objetivo a centralização de todas as questões relacionadas à imigração e colonização, que se encontravam anteriormente distribuídas entre diversos órgãos, desse modo, a criação do CIC fazia parte da política centralizadora e intervencionista de Vargas. Entre suas muitas funções estavam estudar os problemas imigratórios no país, fixar cotas, fiscalizar a distribuição dos imigrantes em territórios nacional, proibir quando necessária à imigração para o Brasil, promover medidas que facilitassem a assimilação do estrangeiro. O Conselho de Imigração e Colonização, a partir de 1940, passou a divulgar seus debates, suas pesquisas relacionadas à imigração e colonização no seu periódico, a Revista de Imigração e Colonização, a qual é fonte desta pesquisa. Como uma das medidas importantes do Governo Vargas, principalmente do Estado Novo foi à exaltação do nacionalismo brasileiro. Segundo Dulce Pandolfi 17 D‘ARAÚLO. Maria Celina. O Estado Novo. Rio de Janeiro. Jorge Zahar. Ed. 2000. p.32. 18 buscou-se construir um sentimento de identidade nacional, que era essencial para o fortalecimento do Estado. Vargas investiu na cultura e na educação, chamando para este projeto os intelectuais 18 . O discurso estado-novista defendeu a instauração de um novo nacionalismo que se contrapõe ao nacionalismo do ideário liberal. Este novo nacionalismo seria orgânico, ao ligar o presente ao passado, respeitando as tradições, costumes, raça, enfim, o orgânico porque estava de acordo com a alma nacional 19 . Desta maneira, começa-se a valorizar a cultura, as tradições brasileiras. Este nacionalismo chegaria até a questão imigratória, como forma de assimilação e nacionalização aos imigrantes. Segundo a Revista de Imigração e Colonização: É esta a política imigratória brasileira, cuja alta finalidade é converter o bom imigrante em bom brasileiro. Em todo imigrante devemos ver um brasileiro em potencial. Uma boa política de imigração deve correr parelha com uma sadia política de nacionalização. As duas se completam, na frase feliz de Ribeiro Couto, são diferentes ―momentos‖ de um só fenômeno, o da contribuição estrangeira para a formação étnico-social do Brasil 20 . Fazia-se parte da política imigratória de Vargas o projeto de assimilação e nacionalização dos estrangeiros, principalmente para aqueles que eram considerados de difícil assimilação como japoneses e alemães, sendo vistos na maioria das vezes como quistos étnicos. Com a implantação do Estado Novo temos o auge da campanha de nacionalização alvejando tanto o meio rural como o urbano. Aos nacionais foram impostas medidas que visavam a sua assimilação ao meio brasileiro, fazendo com que estes tendessem a abandonarem os costumes de seus países de origem. Com isso iniciaram-se medidas como a proibição de manifestação da cultura e língua em idiomas estrangeiros. Escolas, associações estrangeiras foram fechadas no Brasil, jornais, revistas, livros que não fossem em língua nacional foram proibidas de circular no país. Passou-se a se vigiar cada vez mais as colônias nacionais, principalmente os alemães e japoneses, 18 PANDOLFI. Dulce. Apresentação. In. Repensando o Estado Novo. Organizadora Dulce Pandolfi. Rio de Janeiro. Ed. Fundação Getúlio Vargas. 1999. p.10 19 VELLOSO. Mônica Pimenta. Uma configuração do campo intelectual. In. Estado Novo: ideologia e poder. Rio Janeiro: Zahar Ed., 1982. p.84. 20 CLARK. Frederico de Castello Branco. Discurso de Posse In. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano IV, N.1. Março de 1943. p.15. 19 de maneira que, podemos considerar estas duas nacionalidades como o principal alvo da campanha nacionalista. Cabe destacar que embora os alemães fossem considerados europeus brancos, no período esta nacionalidade era vista como de difícil assimilação, e com a Segunda Guerra Mundial foram vistos como inimigos da pátria, juntamente com os japoneses e os italianos. A nacionalização, a política centralizadora e intervencionista, as ideias autoritárias, a defesa do desenvolvimento do país, estiveram presentes diretamente na construção da política imigratória ao longo do Estado Novo. De maneira que essas práticas também foram defendidas pela Revista de Imigração e Colonização. A Revista de Imigração e Colonização foi um periódico publicado pelo Conselho de Imigração e Colonização durante os anos de 1940-1955, ao qual serão abordados, neste trabalho, os anos de 1940-1945. Após a instauração do CIC em 1940 passou-se a publicar a Revista de Imigração e Colonização, como órgão oficial do Conselho: A Revista de Imigração e Colonização, destinada a orientar a opinião pública sobre os múltiplos aspectos daqueles problemas bem como constituir um repositório completo da legislação que lhes diz respeito. 21 Podemos perceber que para o próprio Conselho de Imigração e Colonização, a Revista de Imigração e Colonização, era dedicada ao estudo dos assuntos de imigração, colonização e povoamento, em especial do ponto de vista brasileiro 22 . Ao longo do período analisado eram publicadas três ou quatro edições por ano. Sua estrutura é composta por Artigos, Legislação, Noticiário, Livros e Revistas e Estatísticas, sendo a parte mais densa desse periódico os artigos. Analisando-se cada um dos tópicos que compunham a RIC, os artigos estão presentes em todas as edições. É por meio dos artigos que podemos entender como a Revista de Imigração e Colonização defendia a política imigratória do período pesquisado. Na Legislação estão inseridos os Decretos referentes aos mais variados assuntos que compunham a política imigratória do Estado Novo. Noticiário tratam de notícias acerca do período pesquisado referente à imigração e colonização. Livros e Revistas retratam desde relatórios de viajantes ao Brasil até trabalhos publicados em jornais e 21 Segundo Ano de Trabalhos do Conselho de Imigração e Colonização. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano II, N.1. Janeiro de 1941. p.10. 22 O Conselho de Imigração e Colonização em 1942. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano IV, N.1. Março de 1943. p.40. 20 revistas estrangeiras sobre as migrações internas de outros países. Estatística exibem os dados demográficos brasileiros, como também os números de entradas e saída das correntes imigratórias. A Revista de Imigração e Colonização por pertencer ao CIC, defenderia em suas páginas a política imposta pelo Estado Novo. Encontramos as ideias centrais desta nova política imigratórias nos diversos artigos que compõe o periódico. A RIC apresentou poucos trabalhos que buscaram realizar uma análise do periódico. A grande maioria acaba por citá-la rapidamente, enfatizando algumas críticas acerca de seu conteúdo. Primeiramente encontram-se os trabalhos que se dedicam exclusivamente a pesquisarem o periódico aqui apresentado. Destaca-se o artigo de Elena Pájaro Peres que analisa o discurso em relação ao imigrante na Revista de Imigração e Colonização ao longo das décadas de 40 e 50. Para a autora, nas décadas de 1930 e 1940, os intelectuais brasileiros empenhados em controlar a imigração sustentaram um discurso marcado pelo preconceito, sendo um dos canais oficiais de divulgação destas ideias a Revista de Imigração e Colonização 23 . Peres alega também o fato da Revista apresentar um discurso desumanizador em relação ao imigrante, utilizando constantemente os termos ―alienígena‖, ―bom‖ ou ―mau elemento‖, ―desejável‖ ou ―indesejável‖, ―reprodutor‖, entre outros, de sentido mais ou menos pejorativo 24 . Apontando também que nas páginas da RIC foi defendida a entrada de estrangeiros desde que devidamente selecionados. O artigo de Thaíla Guimarães Queiroz avalia as restrições que eram impostas na Revista, ressaltando que o tema central do periódico era a seleção das correntes imigratórias. Era desejável o imigrante europeu e branco, com atenção especial ao trabalhador rural e de preferência português. Por este motivo, aquele que não se enquadrava neste perfil era chamado de ―inassimilável‖, ―indesejável‖ ou ―alienígena‖, por exemplo 25 . Camila Almeida Belarmino apresenta um trabalho sobre a produção intelectual inserida na RIC nos anos de 1940 a 1945. Muitas ideias discutidas no periódico pelos intelectuais eram sobre a construção da identidade nacional. Aqueles que contribuíram 23 PERES. Elena Pájaro. ―Proverbial Hospitalidade? A Revista de Imigração e Colonização e o discurso oficial sobre o imigrante (1945-1955)‖. Revista Acervo. Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p.85. 24 PERES. Elena Pájaro. ―Proverbial Hospitalidade? A Revista de Imigração e Colonização e o discurso oficial sobre o imigrante (1945-1955)‖. Revista Acervo. Rio de Janeiro, v. 10, n. 2, p.88. 25 QUEIROZ. Thaíla Guimarães de. As restrições imigratórias na Revista de Imigração e Colonização(1940-1945) Recôncavo: Revista de História da UNIABEU. v. 3, n. 5, jul-dez, 2013. p.144. 21 para a Revista de Imigração e Colonização, inseridos neste contexto, buscaram articular o saber de forma a completar a missão de construção da nação brasileira. Utilizando elementos como povoamento, território e imigração, os autores observaram que de fato as discussões gravitaram em um campo de ideias já difundidas. A influência destas ideias nos artigos da Revista de Imigração e Colonização pode ser observada com frequência 26 . Alguns autores ao abordarem a política imigratória do Estado Novo, acabam por citar a Revista de Imigração e Colonização, como um periódico que defendia as propostas deste governo, além de, criticá-la a respeito da linguagem empregada, do discurso destinado ao estrangeiro. Encontramos os trabalhos de Érica Sarmiento da Silva 27 , da autora Giralda Seyferth 28 e de Maria Luiza Tucci Carneiro 29 . Para se entender as principais ideias da política imigratória presente na RIC utilizamos como metodologia primeiramente a leitura das dezoito edições que compreende os anos de 1940 a 1945. Posteriormente confeccionamos tabelas de todo o conteúdo sobre os itens Artigos, Legislação, Estatísticas, Noticiários, Livros e Revistas. Utilizando como exemplo o item Artigos, o mais extenso, em todas as revistas contabilizando o número de 64 artigos ao todo, e também, dos quais encontramos a defesa da política imigratória. A tabela apresenta a Edição da Revista, Autor, título, Classificação do Assunto, Resumo e Páginas. Abaixo uma imagem da tabela em tamanho reduzido. 26 BELARMINO. Camila Almeida. Diálogos para construir uma nação: continuidades da questão nacional do pensamento social brasileiro nas páginas da Revista de Imigração e Colonização. Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação e História das Instituições da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. 2012. p.129. 27 SILVA. Érica Sarmiento da. A ―não democracia‖ dos excluídos alguns pontos da política imigratória brasileira. Logos 27: Mídia e Democracia. Ano 14, 2. Semestre de 2007. 28 SEYFERTH. Giralda. Imigrantes, estrangeiros: a trajetória de uma categoria incomoda no campo político. Trabalho apresentado na Mesa Redonda Imigrantes e Emigrantes: as transformações das relações do Estado Brasileiro com a Migração. 26ª Reunião Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 01 e 04 de junho de 2008, Porto Seguro, Brasil. p.01-20. 29 CARNEIRO. Maria Luiza Tucci. Anti-semitismo na era Vargas (1930-1945), 2a. ed. São Paulo, Brasiliense, 1995. 22 Imagem 1: Exemplo de Tabela confeccionada para a Revista de Imigração e Colonização Como se pode observar na tabela acima, trata-se da Edição do primeiro ano da Revista em 1940. O total de artigos por revista variava, eram em média três a quatro artigos por Edição, em sua maioria, bem extensos. Na coluna denominada ―Autor‖, são os autores dos artigos, como já comentado sempre homens, a maioria membros do Conselho, como também intelectuais como Oliveira Vianna. Tratava-se de homens que colaboravam com o debate cientifico sobre a imigração e colonização, não fazendo necessariamente parte da composição do Conselho. Como parte da metodologia buscou-se conhecer quem eram estes autores, para isso utilizando a Base de Dados do Acervo do CPDOC, o Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós 1930 e a Biblioteca Nacional Digital do Brasil, que, através desta tivemos acesso a diversos jornais e revistas da época. Na coluna ―Titulo‖ são os títulos dos artigos fiéis a Revista, sendo que não há muitas diferenças do português escrito atual, e não há a presença de termos estrangeiros nos títulos. Na coluna ―Classificação do assunto‖, catalogamos em temáticas os artigos. Primeiramente através das leituras obtiveram-se as principais temáticas sobre os artigos, sendo oito temas que estão presente nos assuntos ao longo das Revistas são; Eugenia, Dados Estatísticos, Política Demográfica, Assimilação e Nacionalização, Guerra e Imigração, Estudos sobre Imigração e Colonização, Economia das colônias brasileiras e Imigração e Colonização em outros países. 23 São todos temas relacionados à política imigratória, analisando cada temática, Eugenia apresenta poucos artigos, e trabalha principalmente com a caracterização antropológica de determinados imigrantes. Temos como representantes Oliveira Vianna e Roquette-Pinto. Dados Estatísticos representam o censo demográfico do país. A terceira temática Política Demográfica analisa a política demográfica do Brasil ao longo dos anos de 1840 a 1940, como autores temos Giorgio Mortara e Aristóteles de Lima Câmara. Assimilação e Nacionalização foram impostas aos estrangeiros pelo Governo Vargas. Na Revista aborda-se a importância em assimilar e nacionalizar o estrangeiro, como também, as medidas tomadas pelo governo no sentido de fazerem o imigrante considerar o país como sua pátria. Os autores que abordam este tema são: Ribeiro Couto, Aristóteles de Lima Câmara. A relação entre Guerra e Imigração iniciou-se na Revista a partir do momento em que o Brasil entrou para a Segunda Guerra Mundial. Trata-se dos problemas que a imigração enfrentaria com a guerra, como também o interesse do Conselho com a imigração após a guerra, quais as melhores correntes imigratórias para o Brasil quando acabasse o conflito. Neste item temos os autores Estanislau Fischlowitz e Fernando Mibielli de Carvalho. Estudos sobre imigração e colonização é a que mais se apresenta na Revista. Estão presentes nesta temática a importância da colonização e do povoamento em determinadas áreas do país, a necessidade de imigração controlada para o Brasil, o modo como determinados grupos de imigrantes são vistos pela política imigratória, a influência estrangeira em determinadas áreas, a evolução da política em termos de imigração, relatórios de viagens feitas a colônias no interior dos Estados. Encontramos como autores Arthur Hehl Neiva, Antônio Xavier de Oliveira. Economia das colônias Brasileiras trata-se de estudos sobre algumas colônias brasileiras. A oitava temática Imigração e Colonização em outros países apresenta o processo de imigração em determinados países, como a imigração na Argentina e também sobre a vinda de sulistas norte-americanos ao Brasil após a Guerra da Secessão. Desta maneira, através das temáticas que se encontram na Revista conseguimos compreender que a Revista de Imigração e Colonização se trata de uma fonte muito útil para se compreender a política imigratória de Vargas, bem como, o modo como agiu o Conselho acerca da imigração. 24 Através da RIC buscamos analisar as ações do Conselho de Imigração e Colonização na questão imigratória, quais seus objetivos e como este órgão agiu no controle e seleção dos estrangeiros. Percebemos que o CIC buscou centralizar todas as problemáticas sobre a imigração e colonização, entretanto, devido o desenrolar da guerra, as atividades práticas deste órgão se tornaram escassas, desta forma, passando se dedicando mais especificamente aos estudos das correntes imigratórias. Finalizando a metodologia empregada nesta pesquisa buscou-se analisar a politica imigratória da Era Vargas com o levantamento da bibliografia, apontando as principais ideias desta política, como também a seleção e restrição às determinadas nacionalidade. Para isso, utilizamos os principais autores que abordam a questão imigratória neste período, como Endrica Geraldo, Jeffrey Lesser, José Sacchetta Mendes. Em síntese, buscamos analisar ao longo desta dissertação o modo como se deu na prática e na teoria a política imigratória no Estado Novo. No primeiro capítulo discutiremos a Revista de Imigração e Colonização. Abordaremos sua estrutura, seus artigos e os locais que encontramos as principais ideias acerca da política de imigração e colonização do período. Ainda neste capítulo analisaremos os intelectuais do periódico, identificando a sua biografia. Finalizando abordaremos os principais críticos da Revista, embora apresentem poucos trabalhos que se debrucem, exclusivamente acerca da RIC, identificaremos a visão destes historiadores acerca do periódico. Através deste capítulo poderemos compreender o modo em que era defendida a política imigratória do Estado Novo na revista. O segundo capítulo trata do Conselho de Imigração e Colonização, órgão criado para centralizar as questões de imigração e colonização. Analisaremos a criação deste Conselho, suas principais obrigações, como também identificaremos os membros do CIC. Com isto poderemos limitar as ações do Conselho em relação à imigração e colonização. Utilizando a Revista de Imigração e Colonização levantaremos as ações do Conselho no campo prático, através dos Relatórios anuais da CIC, as Resoluções e Decisões. Apontando o modo que este órgão agiu em relação ao controle e seleção dos estrangeiros. Ainda no segundo capítulo identificaremos o modo que se defendeu a política imigratória nas páginas da Revista de Imigração e Colonização, ressaltando as principais ideias desta política presente no periódico. 25 Finalizando, no terceiro capítulo apontaremos os decretos de controle à entrada de estrangeiro a partir da década de 1920. Em seguida abordaremos as ideias eugênicas no Brasil, o modo como estas se adequaram ao contexto brasileiro e sua influência na política imigratória, mais especificamente na seleção dos estrangeiros. Identificaremos as transformações da política imigratória a partir da década de 30, momento em que Getúlio Vargas assumiu o poder do país. Apresentando a importância da Assembleia Constituinte, resultando no primeiro mecanismo de controle da imigração, a Lei de Cotas. Posteriormente, analisaremos as principais características da política imigratória do Estado Novo, marcado pelo controle, restrição e seleção aos imigrantes, como também identificaremos o debate imigratório a respeito dos imigrantes desejáveis e indesejáveis para o Governo brasileiro. E, por último, ressaltaremos o modo como o governo agiu com os ―súditos do eixo‖, os imigrantes japoneses, alemães e italianos durante a Segunda Guerra Mundial. Através deste capítulo abordaremos a política imigratória e como esta se desenvolveu durante a Era Vargas, de forma que será contraposto a historiografia com as principais ideias defendidas pela Revista de Imigração e Colonização. 26 CAPITULO I - A Revista de Imigração e Colonização: Nova abordagem sobre a imigração Neste capítulo inicial discutiremos a Revista de Imigração e Colonização (RIC), periódico criado em 1940, no qual eram informados aos seus leitores diversos assuntos acerca da política imigratória brasileira ao longo do Estado Novo. Analisaremos primeiramente a sua estrutura como um periódico da época, e em seguida apresentaremos o seu conteúdo, ou seja, o que se pode encontrar em suas páginas, desde artigos que tratem das questões relacionadas à imigração e colonização durante o período abordado, bem como a Legislação e Estatísticas, Resoluções do Conselho de Imigração e Colonização; Noticiários e Livros; Revistas. Posteriormente, serão analisados os autores que apresentaram seus trabalhos na Revista de Imigração e Colonização, ou seja, os pensadores da Revista, que faziam parte do meio intelectual do Governo Vargas. Por se tratar de um periódico que representava um órgão público, este defendia os ideais do Governo. Finalizando, abordaremos os principais críticos da Revista, pesquisadores que apresentam sua visão acerca do caráter do periódico e qual sua importância para o debate imigratório. 1.1. A estrutura da Revista Antes de iniciarmos a abordagem acerca da Revista de Imigração e Colonização, devemos mencionar que esta se originou a partir da criação do Conselho de Imigração e Colonização (CIC), órgão instituído em 1938 através do Decreto-Lei n. 406 de 04 de Maio de 1938. A partir do ano de 1940 o Conselho passou a publicar notícias, artigos relacionados à imigração em seu periódico a Revista de Imigração e Colonização. Os principais objetivos da Revista eram divulgar assuntos relacionados à imigração e colonização no Brasil, através de artigos que apresentavam desde assuntos ligados à questão da Eugenia até a preocupação do governo com a imigração no pós- guerra, assim como a legislação do período, estatísticas, noticiário. Segundo o Conselho de Imigração e Colonização: a Revista de Imigração e Colonização seria destinada a orientar a opinião pública sobre os múltiplos aspectos dos 27 problemas de população e colonização no Brasil e a constituir um repositório completo da legislação relativa a esses assuntos 30 . João Carlos Muniz, o Presidente do Conselho de Imigração e Colonização mencionava que: A Revista de Imigração e Colonização tem também como objetivo servir de elemento de coordenação entre os que se preocupam no Brasil com os problemas demográficos, animando e orientando as pesquisas nesses assuntos e contribuindo, ao mesmo tempo, para criar na opinião do país uma melhor compreensão desses problemas 31 . O que se pode constatar ao longo das leituras do periódico é que este foi reservado a um pequeno grupo do Governo Vargas. Embora seja de fácil leitura, acredita-se que os assuntos tratados não seriam destinados à população em geral, além do que, de acordo com a Revista, sua tiragem variava de 800 a 1000 exemplares. Através das leituras da Revista percebemos que esta tinha alguns de seus volumes enviados para outros países, como no caso da existência da Revista na Biblioteca da Divisão de Cooperação Intelectual da União Pan-americana da cidade de Washington. Consultando a Biblioteca Nacional Digital do Brasil encontramos alguns documentos sobre a Revista de Imigração e Colonização 32 : a carta de Aristóteles de Lima Câmara comunicando que aceitava participar do periódico e uma correspondência a Artur Ramos solicitando os trabalhos deste autor sobre Antropologia para a publicação na Revista. Em relação ao orçamento destinado a RIC durante os anos de 1940 a 1943 foram gastos cerca de Cr$ 34.430,30. No ano de 1942 através do Decreto-Lei nº 4572 de 12/08/1942 Getúlio Vargas concedia ao Conselho de Imigração e Colonização o crédito especial de 30:000$0 (trinta contos de réis), para atender ao custeio da Revista de Imigração e Colonização (Serviços e Encargos), compreendendo despesas de material, impressão, colaboração e traduções. Ao longo da pesquisa foram analisadas dezoito edições da Revista de Imigração e Colonização durante os anos de 1940 a 1945. No período do Estado Novo, o Diretor 30 Relatório Anual do Conselho de Imigração e Colonização. In Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano III, N.1. Abril de 1942. p.22. 31 MUNIZ. João Carlos. Apresentação. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano I, N.1. Janeiro de 1940. p.04. 32 Arquivos encontrados no site: http://bndigital.bn.gov.br/acervodigital. Acesso em 02 de fevereiro de 2018. http://bndigital.bn.gov.br/acervodigital 28 do periódico foi o Major Aristóteles de Lima Câmara. A aparência externa da revista se assemelhava a um livro, sendo, portanto, diferente das revistas dos dias atuais. Na capa continha o nome do periódico, o órgão responsável pela sua publicação, o número da edição juntamente com o ano e a cidade. A Revista é monocromática, não apresenta figuras, apenas tabelas e gráficos. Eram publicadas, na maioria das vezes, quatro edições por ano e, em alguns casos, contemplava dois números na mesma edição, assim como, a quantidade de páginas variava de 124 a 252 páginas. A RIC era composta por um sumário dividido em Artigos, que compreendiam a maior parte do periódico, a Legislação, Estatísticas, Resoluções do CIC, Pareceres, Circulares do Conselho de Imigração e Colonização, Noticiário, Livros e Revistas. Em todas as primeiras edições de cada ano, o Conselho realizava um relatório de suas atividades no ano anterior. Acreditamos que os relatórios são extremamente interessantes, pois, assim, é possível obtermos uma breve ideia do funcionamento do Conselho em termos burocráticos e também das atividades desempenhadas por este órgão. Nos relatórios foram expostos aos seus leitores a importância da imigração para o Brasil, a organização, instalação e funcionamento do Conselho, meios de promover a imigração de portugueses ao país. Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial ganharam fôlego a questão dos refugiados de guerra, como também algumas alterações do CIC em termos de seus membros. O que se nota é que não se modificava constantemente a composição do Conselho, havendo uma mudança apenas no ano de 1945 com a inclusão de novos funcionários. Cabe destacar que durante os anos de 1940 a 1945 as variações do Conselho foram relacionadas à presidência deste órgão. No periódico, também, foram abordadas às migrações de nordestinos na maioria das vezes para São Paulo, o que, desta forma, o Conselho juntamente com o Presidente da República, adotavam medidas para fixar os nordestinos em suas terras. Outro dado importante é que foi comumente abordada nos relatórios do CIC a repercussão que a Segunda Guerra Mundial teve nas obrigações do Conselho, ocasionando uma diminuição nas atividades práticas deste órgão. Abaixo encontra-se a imagem do sumário da Revista de imigração e Colonização. 29 Imagem 1: Sumário da Revista de Imigração e Colonização, Ano I, N.1. Janeiro de 1940 A temática presente nos artigos da RIC Para a análise da Revista, obtivemos informações durante a pesquisa de Iniciação Científica. Foi realizada a leitura das dezoito edições durante os anos de 1940- 1945 o que resultou na confecção de tabelas sobre todo o conteúdo, como os itens Artigos, Legislação, Estatísticas, Noticiários e Livros e Revistas. Os artigos correspondem à parte que mais se destaca no periódico. Estes representam a visão dos membros do Conselho e de seus colaboradores a cerca da política imigratória brasileira, do imigrante desejável e indesejável, do problema acerca 30 de refugiados devido a Segunda Guerra Mundial, sendo que, também, na grande maioria destes artigos, representam os ideais do Estado Novo. Nas dezoito edições da RIC há o total de sessenta e seis artigos. Para isso, realizamos um catálogo de levantamento e, posteriormente, as classificações em temáticas, resultando em: Tabela 1: Artigos divididos por temáticas e suas respectivas quantidades Temática Quantidade de Artigos Eugenia 4 Dados Estatísticos 2 Política Demográfica 3 Assimilação e Nacionalização 7 Adequação do Imigrante 2 Guerra e Imigração 6 Estudos sobre Imigração e Colonização 30 Economia das colônias brasileiras 7 Imigração e Colonização em outros países 3 Outros temas 2 Como se pode observar são temas que representam as principais ideias da política imigratória imposta pelo Estado Novo como: a assimilação e nacionalização, eugenia, a preocupação do Governo com o futuro da imigração. Analisando cada um dos temas presentes nos artigos da RIC, temos que a Eugenia, embora esteja presente em todo o debate acerca da política imigratória, influenciando na busca pelo imigrante desejável, apresenta apenas quatro artigos ao longo dos volumes do Ano I (Ano de 1940). O que se destaca nesta temática é a preocupação da caracterização antropológica de determinadas nacionalidades, como também do povo brasileiro. No artigo de Edgar Roquette Pinto 33 , médico, antropólogo, que na Revista de Imigração e Colonização apresentou as características do povo brasileiro. Segundo o autor, não seria a raça (negra) que causaria a aparência mórbida de mulatos, caboclos, 33 Bases de Dados do Acervo do CPDOC. Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós 1930. Consulta em Outubro de 2016. Roquette-Pinto ao longo de sua vida foi membro de inúmeras associações culturais, nacionais e estrangeiras, como o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. 31 mas, sim, o problema da falta de saúde, de educação. Desta forma, acredita-se que para melhorar a população brasileira em termos de branqueamento e progresso não bastaria apenas trazer imigrantes brancos para o país, mas, também, realizar uma campanha de higienização, de saúde. O autor apresentava ideias diferentes de alguns eugenistas como Renato Kehl que será analisado posteriormente. Oliveira Vianna, historiador, sociólogo e bacharel em direito, durante boa parte de sua vida, se propôs a estudar à temática da formação e evolução do povo brasileiro. Neste viés, o autor se dedicou também à compreensão do processo imigratório e do tipo de imigrante ideal. Por este motivo, durante o Estado Novo suas publicações possuíram como tema principal a seleção de imigrantes 34 . Na Revista, o autor apresentou um dos capítulos do livro ―Os arianos no Brasil‖. Teceu comentários acerca da caracterização antropológica e origem dos imigrantes germânicos e eslavos que vieram para o Brasil, se concentrando precisamente na região sul do país, durante o período analisado. No artigo ―Os imigrantes germânicos e eslavos e suas caracterização antropológica‖ são apresentadas a caracterização dos alemães, divididos em três tipos antropológicos. O autor também aborda a caracterização dos poloneses, russos, austro-húngaros, tchecoslovacos, iugoslavos e os imigrantes da região dos Bálticos. Em outro artigo, Oliveira Vianna analisa antropologicamente os imigrantes semíticos e mongóis, que durante o Estado Novo teriam sua entrada restrita no Brasil, além de todo um debate acerca de seu grau de assimilação. Primeiramente ao analisar os imigrantes semíticos, acreditava que o judeu não teria propriamente um tipo antropológico definido, não havendo um tipo homogêneo deste grupo, mas, uma multidão de tipos, de acordo com a nação em que eles vivem 35 . Oliveira Vianna admitia que o judeu era inassimilável, de maneira que, era inconveniente a sua imigração. Entretanto, Arthur Neiva discordava de Vianna, ao considerar o judeu um grupo assimilável. Ainda nas concepções de Oliveira Vianna, os judeus que vieram para o Brasil seriam do Leste Europeu principalmente da Polônia e Rússia. Os judeus da Alemanha, entretanto, eram mais semelhantes aos alemães e os Judeus Meridionais da Espanha, Portugal, Itália se assemelhavam aos tipos raciais presentes nessas nações. 34 QUEIROZ. Thaíla Guimarães de. As restrições imigratórias na Revista de Imigração e Colonização (1940-1945) Recôncavo: Revista de História da UNIABEU. v. 3, n. 5, jul-dez, , 2013.p. 145 35 VIANNA. Oliveira. Os imigrantes semíticos e mongóis e sua caracterização antropológica. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano I. N.4. Outubro de 1940. p. 611. 32 Em relação aos imigrantes japoneses, o autor considerava dois tipos antropológicos: o ―Chosu‖ que seria caracterizado como sendo da classe urbana e dominaria a aristocracia, se aproximando dos tipos europeus brancos e, o segundo tipo, o ―stasuma‖ considerado rústico, grosseiro, das classes inferiores e das populações rurais, sendo este a se destacar na imigração japonesa para o Brasil. Para Vianna, ao permitir a entrada deste tipo de japonês estaríamos recebendo imigrantes japoneses de ―classes inferiores‖ considerados indesejáveis a imigração brasileira. Em relação a dados estatísticos a RIC apresenta pouquíssimos artigos, pois, existe uma parte destinada as Estatísticas no periódico. O artigo escrito por Antônio Gavião Gonzaga 36 , médico sanitarista, trata dos números de entradas de imigrantes japoneses no Brasil, desde 1908 a 1940, apontando o Estado de São Paulo com maior índice de imigrantes desta nacionalidade. No artigo de Giorgio Mortara 37 , estatístico, demógrafo e economista, que utilizou de seu conhecimento para trabalhar com o censo demográfico do Brasil nos anos de 1940 a 1941, este, especificou os Estados Brasileiros distribuídos em cinco regiões: Norte, Nordeste, Este, Sul e Centro-Oeste. Para o autor, a proporção de habitantes de aglomerações urbanas no total manteve-se relativamente baixa, entretanto, não despertava preocupações semelhantes as que agitavam estadistas e sociólogos em outros países como Estados Unidos e Argentina 38 . Em Política Demográfica encontramos outro artigo de Giorgio Mortara sobre o crescimento demográfico da população brasileira. Acreditava-se que o crescimento demográfico do país ao longo de 1840 a 1940 se deveu principalmente a quantidade de nascimentos mais do que a entrada de imigrantes, que já apresentava índices reduzidos, sofrendo uma diminuição em seus valores entre os anos de 1920 a 1940, período de grandes restrições aos estrangeiros. Aristóteles de Lima Câmara 39 major do exército, diretor da Revista de Imigração e Colonização entre 1940 a 1945 e vice-presidente do CIC ao longo dos anos 1938- 36 Informações retiradas nos Jornais: Correio da Manhã e A Noite referente aos anos de 1900-1950. Antônio Gavião Gonzaga foi também chefe do Serviço de Biometria Médica do Distrito Federal, inspetor sanitário do Departamento Nacional de Saúde Pública. 37 Informações cedidas pelo Núcleo virtual da Rede de Memória do IBGE. Acesso em Outubro de 2016. Giorgio Mortara veio ao país para assumir a função de assessor técnico do Conselho Nacional de Estatística e consultor técnico da Comissão Censitária Nacional, criada para projetar e executar o Recenseamento Geral de 1940. 38 MORTARA. Giorgio. O censo demográfico de 1940. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1942. p. 107 39 Informações retiradas nos Jornais: Correio da Manhã, Diário de Noticias, A Noite referente aos anos de 1900-1950. 33 1944. Ao abordar a política demográfica em seu artigo, o autor acreditava que a Europa se encontraria superpovoada e cerca de 2 bilhões de imigrantes viriam para a América do Sul, sendo mais da metade deste número para o Brasil. Para conter toda essa população de estrangeiros, o Brasil deveria ter sua política demográfica com bases biológicas, sendo necessário, no entanto, que atendêssemos a outro aspecto da questão: admitirmos que o imigrante que mais nos convém era o da raça branca. Assim, teríamos que o receber, porém, de várias procedências e falando os mais variados idiomas 40 . Segundo Aristóteles, além de sua preferência pela imigração de brancos europeus, a política imigratória do período não deveria permitir o isolamento do estrangeiro de mesma nacionalidade, deveria mesclar as nacionalidades nos núcleos coloniais, o que acarretaria uma assimilação e nacionalização do imigrante. Assimilação e Nacionalização estão presentes nas bases da politica imigratória do Estado Novo. O imigrante ao chegar ao Brasil deveria ser assimilado e nacionalizado de acordo com os padrões da cultura brasileira, algo imposto aos estrangeiros. A questão da assimilação e nacionalização estava contemplada até mesmo na legislação, como no decreto nº406, no qual, havia uma enorme preocupação por parte do Governo com a assimilação dos estrangeiros, em quem assimilado e nacionalizado abandonariam os costumes de origem e se adequariam a cultura brasileira. Aristóteles de Lima Câmara abordou um artigo sobre a importância da nacionalização do ensino, que seria substituir a escola estrangeira pela escola nacional, algo que o Governo Vargas fazia com empenho. O autor teceu comentários acerca deste problema enfrentado nos núcleos coloniais, em que, havia várias escolas estrangeiras, o que dificultava a nacionalização dos estrangeiros, pois, estas ainda predominava o ensino em idiomas de origem dos imigrantes. Lima Câmara em viagens aos diversos núcleos coloniais apurou o comportamento destes estrangeiros. O alemão e o italiano quando provocados, se exaltavam e se excediam em tudo o que dizem; o polonês, ainda mais emotivo, era capaz até de agressão; o japonês, ao sentir-se provocado, emudece, e dele não se conseguiria senão um reverência e um ―sim senhor‖. Até estas características não se pode apontar como ―defeitos‖, mas sim, como caracteres raciais. Diante do exposto, vemos, portanto que, para obtermos os resultados que desejamos, faz-se necessário agir 40 CÂMARA. Aristóteles de Lima. Alguns reparos sobre a política demográfica brasileira. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1941. p. 816. 34 de modo diferente, tomando na mais alta consideração à origem de cada individuo em particular 41 . Nesta breve citação de Câmara podemos compreender as diferenças que segundo o autor havia entre estas nacionalidades. O alemão e italiano, vistos antes da Segunda Guerra Mundial como desejáveis, não apresentavam um perigo ao país, porém, se comportavam de forma hostil quando irritados. Algo diferente quando se tratava dos japoneses, que durante toda a politica imigratória foram tidos como indesejáveis, tinham um comportamento mais dócil, mais submisso. E, apesar destas diferenças observadas na prática, o discurso em relação ao japonês como indesejável, se perpetuaria ao longo de todo o Estado Novo. Para Antônio Gavião Gonzaga a nacionalização começaria na escola e terminaria no lar, uma seria o complemento da outra, e, dessa sinergia educacional resultaria a assimilação cultural da família 42 . Quando se aborda a questão da assimilação e nacionalização nas páginas da Revista noata-se que havia a importância de assimilar desde o imigrante mais novo até o mais velho, levando esse projeto de nacionalização a todos os ambientes, desde o lar até mesmo a Igreja. Rui Ribeiro Couto 43 era diplomata, magistrado e jornalista, que afirma que teríamos que substituir o subconsciente do descendente de estrangeiro, enraizado na convivência exclusiva com a cultura doméstica, pelo subconsciente nacional, canalizado pela língua, pela escola, pela história, pela arte do país, pelo contato também com outros meios geográficos 44 . Todos os autores desta temática são unanimes em considerar a importância do ensino brasileiro no processo de assimilação e nacionalização do imigrante. A adequação do imigrante no periódico se relacionava ao modo que o imigrante deveria aderir e seguir as exigências do Brasil. Primeiramente o artigo de Dulphe Pinheiro Machado 45 engenheiro e arquiteto, que trabalhou como Diretor do Serviço de Imigração e Colonização, Diretor Geral do Departamento Nacional de Povoamento, Conselheiro do CIC durante os anos de 1938 a 1949, sendo Presidente do Conselho em 41 CÂMARA. Aristóteles de Lima. A nacionalização do ensino. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano I, N.2. Abril de 1940. p.246. 42 GONZAGA. Antônio Gavião. Fatores de assimilação nacionalizadora. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1940. p. 853. 43 Informações retiras em: Diário Oficial 1703/1943. 44 COUTO. R. Ribeiro. O problema da nacionalização. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1941.p. 33. 45 Informações retiradas dos Jornais: Correio da manhã e A Noite referente aos anos de 1900-1950. 35 1950. O artigo tratava da distinção entre os estrangeiros entrados como permanentes, pessoas que se fixassem no país por mais de seis meses, e os temporários, divididos em três categorias: a primeira os turistas, viajantes, cientistas, professores, homens de letras, conferencistas, a segunda, nos representantes de firmas comerciais e, a terceira, em artistas, desportistas. Cada categoria teria algumas diferenças: os imigrantes da primeira categoria eram impedidos de trabalhar no país, o que não ocorria com os imigrantes de segunda e terceira categoria. É interessante ressaltar que caso o estrangeiro pretendesse requerer a autorização de permanente no Brasil deveria apresentar uma série de documentos, além de atestado de antecedentes penais, atestado de saúde pública, provando não apresentar nenhuma deficiência física ou mental, uma vez que, o governo buscava imigrantes em perfeito estado de saúde. Oscar Tenório 46 juiz e professor especializado em Direito Internacional teceu informações acerca dos apátridas na Revista de Imigração e Colonização. Segundo o autor, apátridas eram pessoas que não se vinculavam a nenhum Estado como cidadão, não tinham direitos políticos devido à inexistência de nacionalidade, e, por isso, ficavam sujeitos a uma legislação especial. Segundo o direito brasileiro não eram apátridas apenas os que assim consideravam o legislador brasileiro, mas, também, os que o legislador de outras nações assim considerava 47 . Em relação à entrada no país de apátridas, a lei brasileira não faz distinção entre os apátridas e os estrangeiros, ou seja, pela lei brasileira os dois têm os mesmos direitos e deveres. A seção Guerra e Imigração tratava da preocupação do governo brasileiro com a imigração e colonização no contexto pós-guerra. Segundo Fernando Mibielli de Carvalho 48 , jurídico que ocupou o cargo de Professor da Faculdade de Ciências Econômicas e oficial do gabinete do Ministério da Aviação. Com o fim da Segunda Guerra Mundial haveria um grande contingente de pessoas que sairiam da Europa devastada com destino a América do Sul, principalmente o Brasil, que oferecia uma grande extensão de terras para colonizar e povoar. Desta forma, o país teria que abrir suas portas aos estrangeiros, mas, para isso, no entanto, 46 Informações retiradas dos Jornais: Jornal do Brasil e Correio da manhã nos anos de 1900-1950. 47 TENÓRIO. Oscar. Os apátridas a luz do direito brasileiro. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1943. p. 73. 48 Informações retiradas nos Jornais: Jornal do Brasil, Correio da Manhã, Última Hora referentes aos anos 1920-1950. 36 deveria seguir uma imigração cientificamente orientada e policiada, privilegiando a raça branca. A seleção do imigrante seria essencial, obedecendo a uma escala de estrangeiros de maior assimilação para menor assimilação sendo: italianos, portugueses, espanhóis, sírios, alemães, austríacos, e, em último lugar, os japoneses e os imigrantes da Europa Central e Oriental. Além disso, deveria se buscar o estrangeiro médio-técnico, o trabalhador especializado, o operário qualificado, profissões necessárias ao setor industrial do país. Se não estabelecermos uma imigração esclarecida, atraindo e selecionado na Europa os imigrantes capazes de concorrer para a melhoria da etnia nacional, para o nosso engrandecimento econômico e aumento da população, e, bem assim, organizando o aparelhamento necessário para acolhe-lo e distribui-lo convenientemente, por certo que só nos restará receber a ―escumalha da guerra‖ rejeitada pelos outros países de imigração 49 . Observamos a preocupação em receber no país a chamada ―escumalha da guerra‖ e como o autor se demonstrava contra a vinda destas pessoas, sendo necessário para isso a continuação do projeto de seleção e restrição aos imigrantes, desta forma, segundo Fernando Mibielli, Brasil não deveria abrir novamente ―suas portas‖ a qualquer imigrante. Com o fim da Segunda Guerra a política imigratória continuaria estritamente ligada ao povoamento e colonização, de maneira que, os imigrantes que chegassem ao Brasil deveriam ir para os núcleos coloniais localizados no interior do país de modo a não haver a concentração de uma única nacionalidade. Outra questão que se fez presente durante e após a guerra são os refugiados. Através da leitura da Revista observa-se uma tendência de considerar principalmente os judeus como refugiados. Este grupo sofreu restrições para entrarem no país, pois para muitos intelectuais do CIC havia a inconveniência de se alargar a sua admissão na comunidade brasileira, em virtude da intolerância sectária, principal causa do seu baixo coeficiente de assimilação 50 . 49 CARVALHO. Fernando Mibielli de. Ainda a imigração do após-guerra. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano IV, N.4. Dezembro de 1943. p.72. 50 CARVALHO. Fernando Mibielli de. Ainda a imigração do após-guerra. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano IV, N.4. Dezembro de 1943. p.76 37 Segundo Estanislau Fischlowitz 51 , sociólogo polonês que imigrou para o Brasil como refugiado de guerra, trabalhando em 1943 como Técnico do Departamento Administrativo de Serviço Público (DASP), continuando ao mesmo tempo, a sua cooperação técnica com a Repartição Internacional do trabalho, a solução, depois do fim do presente conflito, do problema de refugiados de guerra, dependeria, em última análise de três elementos: 1) da tendência do país de origem (repatriação), 2) da atitude do país de atual ―asilo‖ e 3) da vontade dos próprios interessados 52 . A temática que mais se destaca ao longo das páginas da Revista são Estudos sobre Imigração e Colonização no Brasil. Analisando os artigos percebemos que, em sua grande maioria, eles defendiam as principais características da política imigratória do Estado Novo. José de Oliveira Marques 53 , engenheiro civil, exerceu os cargos de Diretor do serviço de irrigação, reflorestamento e colonização, Diretor da Divisão de Terras e Colonização e Vice-Presidente do CIC ao longo dos anos de 1941-1945, foi Conselheiro do CIC durante os anos de 1946 a 1948, com cinco artigos no periódico, primeiramente tratava-se do relatório da Divisão de Terras e Colonização, sobre a visita a primeira colônia de Goiás, a colônia do Amazonas, Boa Vista, a colônia agrícola nacional do Pará e a colônia nacional do Maranhão. Segundo o autor, havia a necessidade de uma política de seleção de estrangeiros que para o nosso país se encaminhasse. Toda a vez que tivemos de recorrer ao imigrante; essas correntes, pelas suas características raciais, deverão constituir o generoso caudal que porá em valor as riquezas latentes que jazem inexploradas, dessa forma contribuindo para o robustecimento da nossa jovem nacionalidade 54 . Arthur Hehl Neiva 55 , filho do cientista Artur Neiva, que durante a Assembleia Nacional Constituinte defendeu a entrada apenas de estrangeiros de raça branca no Brasil, se formou em Engenharia pela Escola de Engenharia do Rio de Janeiro em 1934 e em Direito pela Faculdade de Direito de Niterói (RJ) em 1937, foi Chefe de gabinete da Secretaria de Agricultura de São Paulo (1930-1931), membro das comissões 51 SCHULZE. Frederik. A constituição global da nação brasileira: questões de imigração nos anos 1930 e 1940. Hist. cienc. saúde-Manguinhos vol.21 no.1 Rio de Janeiro Jan./Mar. 52 FISCHLOWITZ. Estanislau. O problema internacional das Migrações e a Paz Futura. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano IV, N.4. Dezembro de 1943. p.48. 53 Informações retiras nos Jornais: Diário de Noticias e A Noite nos anos de 1920-1950. 54 MARQUES. José de Oliveira. Colonização e povoamento. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1940. p.205. 55 Informações cedidas pelo Acervo do CPDOC, localizados no Arquivo: A imigração na política brasileira de Povoamento de Artur Hehl Neiva. 38 interministeriais de reforma da legislação imigratória (1934) e de elaboração das leis sobre entrada, fixação, naturalização e expulsão de estrangeiros (1938). Entre os anos de 1938-1947 foi membro do Conselho de Imigração e Colonização, em 1948 foi Vice- Presidente do Conselho. Arthur Neiva trouxe diversas entrevistas de Getúlio Vargas à Revista de Imigração e Colonização. Segundo Vargas, a imigração do Estado Novo deveria ser encarada como uma imigração sob o critério étnico, solucionando o problema de povoamento que era tão importante para o país. O Brasil, diferentemente dos Estados Unidos e da Argentina, apresentava determinadas condições topográficas, climáticas, que o caracterizava com um clima muito diferente do continente Europeu e, também, condições históricas e étnicas. Aqui ocorria a presença de três raças como também a presença latina em meios aos imigrantes brancos. Também, as condições sociológicas são as que faziam com que o país fosse um caso único em relação ao povoamento. Para Vargas não haviam discriminações, limitando-nos a regular, de acordo com as nossas conveniências, a entrada e a direção dos contingentes de povoamento. Os imigrantes deveriam de ser entre nós, fator de progresso e não de desordem e desagregação. Tínhamos de nos prevenir contra a infiltração de elementos que pudessem transformar-se, fronteiras adentro, em focos de dissenções ideológicas ou raciais 56 . Arthur Hehl Neiva escrevia também artigos na Revista de Imigração e Colonização acerca do problema imigratório brasileiro e abordava a história da imigração no Brasil. O autor criticava a falta de dados estatísticos sobre imigração. Em relação à seleção imigratória, sugeria que todos nos desejássemos ser um país de civilização branca, dentro de nossa tradição histórica. Mas, neste caso, era indispensável restringir ou de preferência excluir a imigração negra ou amarela no Brasil, favorecendo por todos os meios a corrente imigratória branca 57 . Neiva, como a grande maioria dos membros do Conselho, foi contrário à entrada da imigração negra ou amarela, uma vez que para o autor, os imigrantes negros ―atrapalhariam‖ o projeto de branqueamento da população brasileira e a imigração amarela era vista como inassimilável. 56 NEIVA. Arthur Hehl. Getúlio Vargas e o problema da imigração e colonização, Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano III, N.1. Abril de 1942. p.49. 57 NEIVA. Arthur Hehl. O problema imigratório brasileiro. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano V, N.3. Setembro de 1944. p.510. 39 Diferentemente dos outros autores da RIC, Arthur Neiva se mostrou a favor da vinda de judeus para o Brasil e apontava que estes estrangeiros foram assimilados no país em seu artigo ―Estudos sobre Imigração Semita no Brasil‖ publicado em 1944. Devido a sua posição, Neiva foi criticado por outros membros do CIC que afirmavam que ele era de origem judaica e que seu pai era um grande protetor dos judeus. O longo tratado de Neiva sobre os benefícios da entrada de judeus foi censurado pelo CIC, por razões óbvias, até 1944 58 . Para que pudesse haver a entrada de imigrantes no país, deveria ocorrer a seleção destes estrangeiros. No artigo de Dulphe Pinheiro Machado, acreditava-se que teríamos que resguardar os supremos interesses nacionais, que exigiam uma imigração tecnicamente dirigida, isto é, selecionada, orientada, fiscalizada e amparada pelos organismos competentes 59 . A seleção dos estrangeiros deveria ser feita em etapas, primeiramente eliminar os que não se enquadrariam nas normas que regulamentavam a política imigratória, a seleção profissional, a seleção social ou policial e a seleção física. Em um relatório sobre a viagem de dois membros do Conselho em 1940 a Fazenda Bastos e ao Vale do Itajaí percebemos como funcionavam estes núcleos coloniais. Na Fazenda Bastos, localizada no interior do Estado de São Paulo, os Conselheiros acreditavam que a imigração de japoneses nesta área se tratava de uma imigração agrícola, visto que, o imigrante japonês apresentava o maior índice de localização na lavoura em relação a quaisquer outras correntes imigratórias 60 . Outra questão acerca da Fazenda Bastos era que nesta colônia 90% dos moradores eram da nacionalidade japonesa, o que iria contra o artigo 166 do Decreto- Lei n.3010, que permitia apenas 25% da concentração de estrangeiros de uma mesma nacionalidade em núcleos coloniais. Sobre a viagem ao Vale do Itajaí, esta região se encontrava como uma zona de influência alemã, mais desenvolvida economicamente que a Fazenda de Bastos, no entanto, ambos os núcleos coloniais, apresentavam a mesma questão: falta de escolas que ensinassem a língua brasileira, levando a uma dificuldade de nacionalização destes imigrantes. 58 LESSER, Jeffrey. O Brasil e a questão judaica: imigração, diplomacia e preconceito. Rio de Janeiro: Imago, 1995. p.226 59 MACHADO. Dulphe Pinheiro. Meios e processos de atrair imigrantes desejáveis. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano V, N.3. Setembro de 1944. p. 464. 60 CÂMARA. Aristóteles de Lima; NEIVA. Arthur Hehl. Colonização nipônica e germânica no sul do Brasil. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano II, N.1. Janeiro de 1941. p.61 40 Observamos também a preocupação em se intensificar as correntes imigratórias ao Brasil. No artigo escrito por Henrique Doria de Vasconcelos 61 engenheiro que exerceu o cargo de Diretor do Departamento Nacional de Imigração e diretor de terras, colonização e imigração, além de ter sido observador dos Estados da União pelo CIC representando o Estado de São Paulo durante os anos de 1943-1945, foi Presidente do Conselho em 1950. O autor analisava o fato de se intensificar a corrente imigratória, para isso eram necessárias algumas medidas como: financiamento pelo governo de transporte marítimo, criação de núcleos coloniais, organização de serviços administrativos para o recebimento destes imigrantes, organização de serviços de propaganda e uma legislação sobre o trabalho agrícola e sobre o trabalhador rural. Em 1945 foi publicado um artigo de Carlos Alberto A. de Carvalho Pinto 62 formado em Direito em 1931, que integrou o setor de história e sociologia da Sociedade de Estudos Políticos, fundada por Plínio Salgado para aprofundar a doutrina integralista. Durante o Estado Novo, Pinto também foi assessor jurídico da prefeitura de São Paulo na administração de Francisco Prestes Maia, permanecendo no cargo até 1947. Na Revista, o autor tratava da legislação imigratória brasileira verificando se esta estava de acordo com a situação atual (1945) do mundo. Com isso, fez sérias críticas aos órgãos responsáveis pela imigração. Sobre a organização prática, necessitava de uma mais perfeita conjugação dos órgãos responsáveis, uma menos dispersão de responsabilidades, a redução dos formalismos burocráticos, um mais desenvolvido e eficaz aparelhamento administrativo (tanto no interior como no exterior), a maior provisão de recursos administrativos e técnicos destinados à seleção, transporte, recepção, encaminhamento, assistência, adaptação e controle do estrangeiro 63 . Vemos claramente que o autor criticava o desempenho dos órgãos responsáveis no que tange a imigração. Vargas quando instituiu o Conselho de Imigração e Colonização buscou centralizar, no órgão, a questão acerca do imigrante, desde a seleção até o seu desembarque. Entretanto, segundo Carlos Alberto A. de Carvalho Pinto, aparentemente o CIC não conseguiu desenvolver todas as suas funções devido à 61 Informações retiras dos Jornais Diário de Noticias e Jornal do Brasil referentes aos anos de 1940 a 1949. 62 Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós 1930. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2001. 63 PINTO. Carlos Alberto Alves de Carvalho. Nossa legislação Imigratória. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano VI. N.2 e 3. Maio-Setembro de 1945. p.262 41 falta de recursos. Quando comenta a falta de conjugação com os outros órgãos, possivelmente seria a problemática das funções do CIC em relação ao Departamento Nacional de Imigração, Departamento Nacional do Trabalho. Em relação à migração interna, havia uma crescente ida de nordestinos a São Paulo devido às péssimas condições que se encontravam na região em decorrência das inúmeras secas, de maneira que, o Governo Federal não poupava esforços, nem media sacrifícios para fixar os sertanejos em seu próprio habitat. Era notável a política de ataque intensivo e eficaz às obras do nordeste, mandando o Senhor Presidente da República executar importantes obras de açudagem, irrigação, reflorestamento, facilitando a circulação das riquezas e colocando em prática um programa cultural capaz de fixar as populações 64 . A colocação de trabalhadores no interior da região nordestina 65 ficaria a cargo do Ministério da Viação por intermédio da Inspetoria Federal de Obras Contras as Secas (IFOCS) e o emprego de trabalhadores fora da região do Nordeste competiria ao Ministério do Trabalho por intermédio do Departamento Nacional de Imigração (DNI). Vemos também os estudos sobre a influência dos imigrantes na história de determinado Estado. Como exemplo, tínhamos Minas Gerais, onde havia um trabalho sobre os aspectos de influência estrangeira na história social do Estado, desde o período Colonial ao Império. O artigo foi escrito por Afonso Arinos de Melo Franco 66 vindo de uma família composta de políticos, intelectuais e diplomatas, formou-se em Direito e ao longo dos anos de 1929-1930, participou da campanha da Aliança Liberal. Em 1943, vinculou-se à Sociedade Amigos da América, organização que defendia a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial ao lado dos Aliados, e também a redemocratização interna. Nesse mesmo ano, participou da elaboração do Manifesto dos Mineiros, primeira manifestação política contra a ditadura do Estado Novo e a redemocratização do país. É interessante analisarmos este autor, pois, no início de sua carreira este era a favor da presidência de Getúlio Vargas, o que possivelmente favoreceu a publicação de seu único artigo na Revista de Imigração e Colonização no ano de 1940. Ao se mostrar contra o Estado Novo, ato que poderia ter impedido de que mais artigos de Afonso 64 MACHADO. Dulphe Pinheiro. Relatório de uma viagem de inspeção através do nordeste em maio de 1942. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1942. p.29. 65 Sobre este tema ver PAIVA. Odair da Cruz. Caminhos cruzados: migração e construção do Brasil moderno (1930-1950). Bauru/SP: EDUSC, 2004. 66 Informações retiradas do Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós 1930. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2001. 42 fossem aceitos no mesmo periódico, uma vez que, a Revista defendia os ideais propostos pelo Governo. Paulo Pinheiro Chaga 67 , ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1925 e tornou-se amanuense da Delegacia de Minas no Rio de Janeiro, cargo que ocuparia até 1930. Ainda durante esse período atuou como vacinador da Saúde Pública do Distrito Federal. Entusiasta da Aliança Liberal participou como estudante universitário da Revolução de 1930, após abandonar a carreira médica pouco tempo depois, Pinheiro Chagas decidiu dedicar-se à política, ingressando no Partido Republicano Mineiro (PRM). Em 1934 elegeu-se deputado à Assembleia Constituinte de Minas Gerais, em 1937 bacharelou-se em direito, transferindo-se em seguida para o Rio de Janeiro. Em 1943 foi um dos signatários, entre outros importantes nomes da política de seu estado, do chamado Manifesto dos Mineiros, documento que representou a primeira manifestação ostensiva de oposição ao Estado Novo partida de lideranças políticas liberais e conservadoras. Com a desagregação do Estado Novo e a reorganização partidária em 1945, foi um dos fundadores da União Democrática Nacional (UDN). Seu artigo, na Revista, abordava e exaltava a vida de Teófilo Otoni, jornalista e político, além de ser um grande nome do liberalismo no Brasil, fundador da Companhia de Comércio e Navegação do Rio Mucuri em Minas Gerais. Teófilo Otoni como objetivo promover o desenvolvimento e a colonização do Vale do Rio Mucuri, posteriormente incentivou a instalação de imigrantes europeus, sendo que em 1858 vieram para a região os imigrantes alemães 68 . Paulo Pinheiro Chagas diferentemente da grande maioria dos autores presentes na Revista de Imigração e Colonização, fez parte do Manifesto dos Mineiros que defendia o fim da ditadura do Estado Novo e a redemocratização do país em Outubro de 1943. O artigo foi publicado pela RIC em setembro do mesmo ano, visto que, o artigo escrito não se tratava de ideias contrárias a politica imposta pelo Governo. Na temática acerca de Estudos sobre Imigração e Colonização encontramos as questões sobre os imigrantes indesejáveis. Sobre a imigração semita, Arthur Hehl Neiva deixava claro que não havia discriminação aos judeus, como também não existia na legislação imigratória. 67 Dicionário Histórico Biográfico Brasileiro pós 1930. 2ª ed. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2001. 68 CHAGAS. Paulo Pinheiro. Teófilo Otoni e a colonização do Mucuri. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano IV, N.3. 1943. Pp.405-415. 43 Segundo Neiva, não havia motivos, étnicos, históricos, econômicos, políticos, sociais ou religiosos que se oponham a entrada de cerca de 2.500 judeus 69 . Entretanto, não foi o que realmente ocorreu sobre os judeus, embora não encontramos na Legislação do período algum artigo que se mostre claramente contra a vinda destes imigrantes, apenas as Circulares Secretas. Inúmeros estudos mostram que estes estrangeiros foram considerados durante o Governo Vargas como indesejáveis. Na Revista vemos um artigo sobre a atuação de Félix Pacheco, Arthur Neiva e Miguel Couto durante a Assembleia Constituinte de 1934 escrito por Antônio Xavier de Oliveira 70 , formado em Medicina, especializando-se, posteriormente, em psiquiatria. Este dedicou-se ao estudo dos problemas brasileiros, em particular do Nordeste. Em maio de 1933 elegeu-se deputado pelo Ceará, durante a Assembleia Nacional Constituinte e defendeu, ao lado de Miguel Couto, a proibição da entrada de imigrantes japoneses e de todos os grupos de cor, especialmente negros, no Brasil. No periódico apresentou um artigo que exaltava as atitudes de Félix Pacheco, Arthur Neiva e Miguel Couto, intelectuais que restringiram a imigração de japoneses, e, com isso, observamos a imagem negativa ao qual faziam destes nacionais. A seção Economia das colônias brasileiras trata basicamente dos aspectos econômicos de alguns núcleos coloniais do país. Citando as colônias germânicas no Brasil que ao invés de serem mercados de consumo do seu país de origem, conseguiram estabelecer um mercado econômico capaz de competirem com a Alemanha. Emilio Willems 71 alemão que imigrou para o Brasil em 1931, ensinou antropologia e sociologia na Escola de Sociologia e Política e na Universidade de São Paulo de 1936 a 1948, e entre suas publicações destacam-se ―Aculturação dos alemães no Brasil‖ e ―Assimilação e populações marginais no Brasil‖. Como parte de suas obras, publicou na RIC dois artigos referentes à assimilação e aculturação de alemães e dos japoneses e seus descendentes no Brasil. Sobre japoneses, estes se inseriram no debate científico, embasados na teoria e métodos das Ciências Sociais, denunciando os preconceitos racistas e nacionalistas por detrás das restrições aos japoneses e outras populações estrangeiras. Eles eram importantes, por 69 NEIVA. Arthur Hehl. Estudo sobre a Imigração semita no Brasil. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. 1944. p. 412 70 ASSEMB. NAC. CONST. 1934. Anais; Boletim Min. Trab. (5/36): CÂM. DEP. Deputados; Câm. Dep. seus componentes; GIRÃO, R. Ceará; GODINHO, V. Constituintes; Grande encicl. Delta; MENESES, R. Dic.; TRIB. SUP. ELEIT. Dados (2). 71 HOFFNAGEL. Judith Chambliss. A família na obra de Emilio Willems. Revista ANTHROPOLÓGICAS, ano 9, volume 16(1): (2005). p. 150. 44 explicitarem o posicionamento do autor quanto ao racismo praticado pelos intelectuais brasileiros, e por reconhecerem este racismo 72 . O autor ao abordar as colônias germânicas, destacava que a segregação cultural de alguns núcleos coloniais que conduziu a mercantilização da mentalidade teuto- brasileira, criando sistemas econômicos locais com circulação interna bastante forte para refletir sobre a vida cultural interna, contribuindo assim, para a conservação de alguns traços culturais do país de origem (a língua, por exemplo). Todavia, era necessário frisar que, nos grandes centros urbanos, a mercantilização teve efeitos muito diferentes. Longe de intensificar a coesão da população de descendência germânica, a industrialização multiplicou os contatos com a economia nacional, contribuindo assim diretamente para a assimilação 73 . O artigo escrito por Rubens Massena 74 capitão do exército e chefe do serviço de transmissões da Primeira Região Militar. Analisou o Núcleo Colonial de Jaguari fundando em 1889 que era constituído por famílias italianas, alemãs, russo-polonesas e austríacas, sendo que, quase todos desde a colonização eram católicos apostólicos romanos. Imigração e Colonização em outros países apresenta três artigos. O primeiro tratava-se de um relatório de viagem feita à Argentina por José de Oliveira Marques e F. P. Assis Figueiredo com o objetivo de estudar a organização colonizadora deste país, como também os dados numéricos da imigração na Argentina. O artigo escrito pelo Conselho de Imigração e Colonização trazia documentos diplomáticos e informações acerca a imigração de norte-americanos sulistas para o Brasil a partir de 1866. Uma das consequências da Guerra da Secessão foi a vinda de 2070 norte-americanos para o país. O terceiro trabalho escrito pelo Escritório Comercial do Brasil em Montevidéu relatava o problema agrário enfrentando pelo Uruguai devido à seca nos anos de 1940- 1945, o que interferiu diretamente na produção e exportação de produtos e na imigração. A última temática que compõem o repertório de artigos da Revista intitula Outros Temas, estão localizados dois artigos que não se inserem em nenhuma das 72 NUCCI. Priscila. Emilio Willems e os estudos sobre os imigrantes japoneses. Associação Nacional de História – ANPUH. XXIV SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA. São Leopoldo, 2007. p. 03 73 WILLENS. Emilio. A emancipação econômica das colônias germânicas no Brasil. Revista de Imigração e Colonização. Rio de Janeiro. Ano III, N.1. Abril de 1942. p.82. 74 Informações retiraras nos Jornais: A Noite e Diário de Noticias referentes aos anos de 1920-1950. 45 temáticas acima. O primeiro tratava-se da Dissertação da história do Brasil escrita por Carlos Frederico Ph. De Martius conhecido mundialmen