unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” Faculdade de Ciências e Letras Campus de Araraquara - SP CARLOS ELISIO NASCIMENTO DA SILVA Questões de ritmo no ensino de inglês para aprendizes brasileiros: estudo da duração ARARAQUARA – S.P. 2017 CARLOS ELISIO NASCIMENTO DA SILVA Questões de ritmo no ensino de inglês para aprendizes brasileiros: estudo da duração Dissertação apresentada ao Programa de Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Mestre em Linguística e Língua Portuguesa. Linha de pesquisa: Análise Fonológica, Morfossintática, Semântica e Pragmática. Orientadora: Profa. Dra. Gladis Massini-Cagliari Bolsa: Capes ARARAQUARA – S.P. 2017 Silva, Carlos Elisio Nascimento Questões de ritmo no ensino de inglês para aprendizes brasileiros: estudo da duração / Carlos Elisio Nascimento da Silva — 2017 99 f. Dissertação (Mestrado em Linguistica e Lingua Portuguesa) — Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Faculdade de Ciências e Letras (Campus Araraquara) Orientador: Gladis Massini-Cagliari 1. Prsosódia. 2. Fonologia. 3. Ensino de Inglês. 4. Pés Fonéticos. 5. Duração da Sílaba. I. Título. CARLOS ELISIO NASCIMENTO DA SILVA Questões de ritmo no ensino de inglês para aprendizes brasileiros: estudo da duração Dissertação apresentada ao Programa de Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Mestre em Linguística e Língua Portuguesa. Linha de pesquisa: Análise Fonológica, Morfossintática, Semântica e Pragmática. Orientadora: Profa. Dra. Gladis Massini-Cagliari Bolsa: Capes Data da defesa: 26/05/2017 MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA: Presidente e Orientador: Profa. Dra. Gladis Massini-Cagliari Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara - Unesp. Membro Titular: Profa. Dra. Maíra Sueco Maegava Córdula Universidade Federal do Triângulo Mineiro - UFTM. Membro Titular: Profa. Dra. Ana Cristina Biondo Salomão Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara - Unesp. Local: Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciências e Letras UNESP – Campus de Araraquara AGRADECIMENTOS Agradeço a todos aqueles que me ajudaram em toda a minha formação, meus pais, professores e alunos, proporcionando os resultados gerados hoje. Em especial, agradeço aos docentes Profa. Dra Gladis Massini-Cagliari, minha orientadora, e ao Prof. Dr. Luiz Carlos Cagliari, por terem me mostrado como a Fonética e a Fonologia são ciências que podem gerar frutos valiosos no ensino de línguas, possibilitando uma melhora significativa dos resultados em sala de aula. Agradeço também às Profas. Dras. Ana Cristina Biondo Salomão e Egisvanda Isys de Almeida Sandes, por terem sido solícitas e me ajudado imensamente com seus apontamentos e correções. Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), por financiar este trabalho, o que me proporcionou dedicação exclusiva à pesquisa. RESUMO Esta pesquisa tem como objetivo analisar o que ocorre em relação ao ritmo do inglês americano quando um aprendiz brasileiro de inglês como segunda língua lê enunciados nesse idioma. Para tanto, a duração é isolada e medida. Para saber como a duração afeta o ritmo, uma gravação de um falante nativo de Inglês Americano é analisada, com as orações provenientes desse áudio sendo divididas em pés rítmicos dentro do modelo proposto por Abercrombie (1965). A partir daí, cada sílaba é medida e as sílabas átonas são comparadas proporcionalmente em relação ao contraste de duração com as sílabas tônicas do mesmo pé. O mesmo então é feito com três gravações em ambientes distintos de cinco informantes brasileiros aprendizes de Inglês. O resultado desta pesquisa mostra que é possível comparar as sílabas dessa maneira, deixando evidente como as sílabas átonas se comportam em relação às sílabas tônicas sem a interferência da velocidade de fala. Além disso, a pesquisa também apresenta um modelo de estudo que pode ser empregado por professores de Inglês com o intuito de se investigar o desenvolvimento da pronúncia de seus alunos. Palavras – chave: Prosódia. Fonologia. Ensino de inglês. Pés fonéticos. Duração da sílaba. ABSTRACT This research aims at analyzing how English rhythm behaves when a Brazilian learning English as Second Language reads sentences in English. In order to do this, duration is isolated and measured. To understand how duration affects rhythm, a recording from an English native speaker is analyzed, dividing the sentences from this recording in rhythmic feet following the feet model proposed by Abercrombie (1965). From this, each syllable is measured and unstressed syllables are compared proportionally in relation to stressed syllables from the same foot. The same is done with three recordings in different environments from five informers, who are Brazilian students learning English as a Second Language. The result from this research shows that comparing syllable through this method is possible, highlighting how unstressed syllables behave in relation to stressed syllables without interference from speech tempo. Also, this research presents a study model which can be employed by English teachers wishing to investigate their students’ pronunciation development. Keywords: Prosody. Phonology. English teaching. Phonetic feet. Syllable duration. LISTA DE FIGURAS Figura 1 Página 31 do livro American Headway, contendo um dos exercícios que envolvem pronúncia. 43 Figura 2 Página 49 do livro American Headway contendo exercícios que envolvem gramática. 44 Figura 3 Página 57 do livro American Headway contendo um dos exercícios que envolvem gramática. 45 Figura 4 Página 118 do livro American Headway contendo uma das explicações expandidas sobre gramática. 46 Figura 5 Página 91 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios textuais. 47 Figura 6 Página 98 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios textuais. 48 Figura 7 Página 7 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. 51 Figura 8 Página 15 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. 52 Figura 9 Página 23 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. 53 Figura 10 Página 31 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. 54 Figura 11 Página 39 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia 55 Figura 12 Página 47 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. 56 Figura 13 Página 61 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. 56 Figura 14 Página 69 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. 57 Figura 15 Página 77 do livro American Headway, apresentando um dos 58 exercícios de pronúncia. Figura 16 Demonstração de uma forma de onda, espectrograma com formantes (pontos em vermelho), altura melódica (linha azul) e intensidade (linha amarela), e da segmentação em camadas, tendo as divisórias de sílabas e palavras. 61 Figura 17 Forma de onda e espectrograma do pé formado pela palavra Lisa 71 Figura 18 Forma de onda e espectrograma do pé formado pelas palavras Parsons is. 73 Figura 19 Forma de onda e espectrograma do pé formado pelas palavras Thirty two. 75 Figura 20 Forma de onda e espectrograma do pé formado pelas palavras Years old and. 76 Figura 21 Forma de onda e espectrograma do pé formado pelas sílabas lives in Man. 77 Figura 22 Forma de onda e espectrograma do pé formado pelas sílabas hattan. 79 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 Durações comparadas das sílabas da oração “Lisa Parsons is thirty-two years old” em quatro gravações. 67 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Exemplo de organização das tabelas de duração. 62 Tabela 2 Duração em milissegundos de uma oração do áudio original em inglês. 62 Tabela 3 Durações em milissegundos e proporções das sílabas “stays” e “at”. 81 Tabela 4 Durações e proporções das sílabas “stays” e “at”. 82 LISTA DE ABREVIAÇÕES E SÍMBOLOS AC Abordagem Comunicativa 21 AG Abordagem Gramatical 20 C Consoante 31 / Início de pé 64 // Juntura do grupo tonal 64 # Pausa 64 % Proporção de variação em relação a uma sílaba átona e a sílaba tônica no mesmo pé 65 σ Sílaba 29 - Sílaba átona (modelo proposto por Abercrombie) 64 . Sílaba átona (tabelas de duração do Apêndice) 86 0 Sílaba tônica (modelo proposto por Abercrombie) 65 o Sílaba tônica (tabelas de duração do Apêndice) 65 V Vogal 31 https://en.wiktionary.org/wiki/%CF%83%27 SUMÁRIO AGRADECIMENTOS 5 RESUMO 6 ABSTRACT 7 LISTA DE FIGURAS 8 LISTA DE GRÁFICOS 10 LISTA DE TABELAS 11 LISTA DE ABREVIAÇÕES E SÍMBOLOS 12 INTRODUÇÃO 15 1. Subsídios Teóricos 20 1.1 Métodos e Metodologias de Ensino de Línguas 20 1.1.1 Gramática e Tradução 22 1.1.2 Método Direto 23 1.1.3 Método Audiolingual 23 1.1.4 Método Comunicativo 24 1.1.5 Métodos e o ensino de pronúncia 24 1.2 Elementos rítmicos: Sílaba e Ritmo 28 1.2.1 Sílaba 28 1.2.2 Ritmo 35 1.3 Considerações finais 37 2. Procedimentos Metodológicos 38 2.1 Apresentação dos exercícios de pronúncia do primeiro livro da série American Headway 40 2.2 Aceitação no Comitê de Ética 59 2.3 Procedimentos de gravação e coleta de dados 59 2.4 Considerações finais 63 3 Análise de dados 64 3.1 Análise de duração em valores absolutos 64 3.2 Análise de duração na perspectiva dos pés rítmicos 61 3.3 Análise da duração para fins de ensino 73 3.4 Considerações finais 82 CONCLUSÃO 83 REFERÊNCIAS 86 APÊNDICE – Neste apêndice serão apresentadas as tabelas com as durações de cada sílaba contendo a divisão em pés. 90 15 INTRODUÇÃO Com a preocupação de se propor uma análise de cunho fonológico que fosse útil para o desenvolvimento do ensino de inglês como língua estrangeira, a presente pesquisa passou por um momento de reflexão em que, ao pensarmos a sala de aula, queríamos definir qual aspecto linguístico e qual linha teórica seriam os mais adequados para dar uma contribuição para o ensino. Um aspecto importante ao se aprender uma língua estrangeira é a fala, pois queremos que o aluno possa se comunicar com a menor quantidade de ruído possível, ou seja, de forma clara, a fim de que outras pessoas o entendam sem dificuldade. Assim, a fonologia se torna um ótimo ponto de partida por ser uma área da linguística preocupada em entender como os sons da fala são compreendidos, proporcionando abordagens, materiais e textos diversos que podem ser adotados tanto por alunos quanto por professores para entender de forma prática, voltada para o ensino e aprendizado, a natureza dos sons e a compreensão de uma língua falada. Dentro dessa área, precisamos decidir exatamente qual seria o domínio a ser analisado. Para dar de fato uma contribuição aos materiais de ensino, concluímos que a prosódia seria um campo bastante produtivo. Esse campo é a área da linguística que analisa questões como o ritmo, a entoação e os aspectos acústicos que envolvem a fala, como duração, intensidade, frequência, etc. (ABERCROMBIE, 1965; COUPER-KUHLEN, 1986; SCARPA, 1999; CAGLIARI, 2007; MASSINI-CAGLIARI; CAGLIARI, 2001; MASSINI-CAGLIARI, 2005, 2015). Por exemplo, quando consideramos que a fala de uma pessoa soa “estranha”, “cantada” ou “arrastada”, estamos na verdade percebendo que existem características prosódicas diferentes da nossa própria fala e por isso acabamos descrevendo essas diferenças da melhor forma que conseguimos. Pode ser que essa fala seja mais rápida ou mais lenta que a nossa, quando, por exemplo, concluímos que ela é “arrastada”. Pode ser que ela tenha momentos de entoação diferente da que estamos acostumados com nossa própria fala, sendo interpretada como “cantada”. Ou seja, alguma característica fundamental do som é diferente, e, notando a diferença, queremos dar explicações sobre ela que demonstrem algum sentimento que tivemos ao ouvi-la. Às vezes, as diferenças podem fazer com que não sejamos capazes de compreender com tranquilidade o que a pessoa disse e é nas causas desse tipo de problema que o presente estudo se pauta. 16 Ao fazer um levantamento de materiais de apoio para aula de inglês como língua estrangeira, notamos que o ritmo é um campo deixado de lado, muitas vezes sendo abordado apenas como um adendo às lições, isso quando chega a ser mencionado. Nesta pesquisa, discutimos o tempo dedicado ao ensino vinculado com noções prosódicas. O material analisado, American Headway (SOARS; SOARS, 2009), possibilita concluir que apenas 1% das horas disponíveis de um curso de inglês acabam sendo destinadas para esse fim. Como o estudo da prosódia tem como um de seus objetivos descrever o ritmo das línguas, o fato de essa dimensão sonora não estar representada de forma aprofundada em materiais didáticos demonstra uma lacuna que deve ser preenchida, afinal, como podemos pensar em fala, sem que o padrão rítmico da língua alvo esteja suficientemente incorporado pelo aluno? Esperamos que o aluno adquira confiança e independência para realizar as atividades que o levaram a procurar o estudo de uma língua estrangeira: viajar, apresentar seu trabalho tanto em ambientes acadêmicos quanto empresariais, manter a conversação com nativos no seu dia-a-dia e, inclusive, com não-nativos que também aprenderam inglês para se comunicar em um contexto global. Para tanto, é necessário que o padrão rítmico da língua estrangeira esteja ao menos minimamente internalizado, tanto para que o aluno consiga compreender a fala dos falantes da língua em velocidade natural, quanto para que a fala do próprio aluno soe compreensível aos demais. Assim, a fim de se investigar como o ritmo da fala de brasileiros se realiza ao falarem uma língua estrangeira, escolhemos como padrão de comparação o Inglês Americano utilizado nos níveis iniciantes de materiais didáticos, em que traços de variantes regionais não são reforçados e a fala é mais lenta. Esse modelo é amplamente utilizado por livros didáticos, como o escolhido para a presente pesquisa. Devido à grande adesão, aprendizes de inglês como segunda língua de outros países, além do Brasil, também utilizam esse modelo como língua alvo em seu processo de ensino-aprendizado. Isso torna interessante o seu uso como base de estudos, uma vez que, dessa forma, o aprendiz pode ter a possibilidade de se comunicar não apenas com nativos, mas com outros povos que aprenderam a língua tal como ele. Para obter os dados desta pesquisa, os alunos de uma escola particular onde o autor leciona na cidade de Leme, interior de São Paulo, foram gravados conforme liam um texto do livro didático American Headway (SOARS; SOARS, 2009). Esses alunos são pessoas que nasceram e cresceram nessa região do interior de São Paulo e foram escolhidos entre os 17 iniciantes, pois o intuito da pesquisa é apresentar exatamente o que ocorre em relação à variação da duração de sílabas de falantes de Português ao pronunciarem enunciados em Inglês no início de seus estudos, obtendo assim uma noção de quanto esforço será necessário para o desenvolvimento desses alunos em direção à realização do ritmo do inglês. Ao se observar os padrões rítmicos referentes aos intervalos de duração entre sílabas tônicas e sílabas átonas à luz do modelo proposto de pés rítmicos por Abercrombie (1965), investigamos como os processos de variação de duração silábica interferem na produção da fala desses alunos. A partir dessas análises, pode ser proposta uma ferramenta para problemas que vão desde um tempo muito longo para terminar o curso, chegando a seis anos ou mais, até as dificuldades que não são resolvidas mesmo depois de todo esse tempo, gerando situações em que o aprendiz não consegue entender outro indivíduo falando Inglês ou não consegue se fazer entender, apesar de anos e muito dinheiro investidos em cursos que prometem proficiência ou fluência. Dessa forma, o desenvolvimento da fala nos cursos de idiomas ainda fica em segundo plano na prática, apesar de haver uma propaganda pesada na TV, na internet e em todos os meios de comunicação, que tenta induzir os alunos a contratarem cursos que focam na “conversação”, mas sem que de fato encarem a pronúncia da língua como elemento essencial no desenvolvimento dos alunos desde o início do curso. Para exemplificar esse fato, o livro didático American Headway (SOARS; SOARS, 2009) terá o seu primeiro volume analisado em relação ao que se dispõe a oferecer sobre ensino de pronúncia. A escolha recaiu sobre esse livro porque ele é o material utilizado na escola na qual a pesquisa foi desenvolvida. Devido a isso, pensa-se que mais esforços são essenciais para que o desenvolvimento da pronúncia se faça valer como aspecto importante do ensino de línguas. Pensando nessas dificuldades, a fonologia e a fonética entram como fundamentos básicos sobre os quais trabalhos didáticos podem ser feitos para dissipar as dificuldades dos alunos. Partindo do mesmo pressuposto abordado por Bolella (2002), Martins (2011) e Souza (2012), explorar aspectos fonéticos e fonológicos comparando o Português Brasileiro e uma variedade de Inglês propicia criar técnicas e agregar dados aos corpora que buscam melhorar a qualidade de ensino. Do ponto de vista científico, este trabalho proporciona uma análise de como a duração interfere no desenvolvimento do ritmo quando a língua em questão não é a materna do informante. Além disso, descrevem-se também noções fonológicas sobre a redução ou a 18 dilatação da duração das sílabas, que podem interferir no processo de construção do ritmo na passagem de uma língua à outra. A importância desta análise se dá diretamente pelas questões que envolvem o ensino: quanto mais técnicas precisas e bem elaboradas o campo possuir, mais eficientes serão os métodos que poderão desfrutar dessas técnicas e, com isso, os professores passam a ter mais ferramentas e recursos para o ensino de pronúncia. Este trabalho levanta dados que descrevem os processos de variação de duração dentro da estrutura silábica do Inglês Americano, considerando uma variante mais lenta e criada para fins de ensino da língua em nível iniciante. Esse levantamento de dados traz mais informações para professores e pesquisadores interessados no ensino de Inglês como língua estrangeira e investiga como os processos estudados afetam os enunciados em Inglês quando produzidos por falantes que tem o Português Brasileiro do interior do estado de São Paulo como língua materna. Por fim, descrevemos quais relações podem ser estabelecidas no que tange aos aspectos fonológicos das duas línguas em relação à duração das sílabas, gerando um modelo de análise que possa ser empregado por professores de inglês para brasileiros para melhor compreender o desenvolvimento da fala de seus alunos. As seções deste trabalho abrangem inicialmente os subsídios teóricos, em que discutimos as abordagens pedagógicas e como os métodos que derivam delas abordam o ensino da pronúncia de inglês como língua estrangeira. Nessa mesma seção, a discussão perpassa a sílaba, como constituinte do ritmo, e encerramos com reflexões acerca do ritmo do Português Brasileiro e do Inglês Americano. Na Metodologia, apresentamos como a coleta de dados foi feita e que princípios regem a análise desses dados. Além disso, discutimos como o livro didático American Headway (SOARS; SOARS, 2009) trata o ensino de pronúncia. Demonstramos nessa seção como o modelo de pés de Abercrombie (1965) pode ser aplicado e a partir dele como medir as sílabas utilizando o software Praat. Por fim, nossos resultados apontam que é possível comparar as durações de sílabas de um mesmo pé e obter valores proporcionais, que não recebem interferência da velocidade de fala, e assim demonstrar o quanto a fala de um brasileiro aprendendo Inglês varia quando comparada com a de um nativo em Inglês Americano. Além disso, a técnica desenvolvida nesta pesquisa pode ser aplicada em contextos de ensino de língua, sendo possível utilizar o método de gravação e a análise de durações para observar como a pronúncia do aluno está se desenvolvendo e 19 apontar indícios sobre o que poderia ser trabalhado em sala de aula para o melhor desenvolvimento da pronúncia. 20 1. SUBSÍDIOS TEÓRICOS Esta seção expõe quais autores e fundamentos teóricos são utilizados para basear a presente pesquisa. Inicialmente, vamos discutir a conceitualização de métodos de ensino e a posição em que o ensino de pronúncia se encaixa nesses métodos. Em seguida, a discussão passa a tratar do conceito de sílaba, que serve como unidade mínima para as discussões acerca de ritmo. 1.1 Métodos e Metodologias de ensino de línguas Os dados colhidos para o presente trabalho de mestrado foram obtidos em um contexto de ensino e aprendizado de inglês como língua estrangeira (LE). Faz-se, assim, não somente possível, mas também oportuno, inserir reflexões sobre as metodologias de ensino e, mais especificamente, o papel do ensino da pronúncia nessas metodologias. As abordagens, junto com os métodos e as técnicas, são as instâncias formadoras da qualidade do processo de ensino-aprendizagem de línguas. Obedecendo a uma hierarquia, elas organizam tudo o que se pensa e faz em sala de aula. A hierarquia à qual nos referimos [...] pode ser entendida como uma pirâmide. Na base, encontram-se as técnicas; logo acima, os métodos que elas plasmam, mais acima a metodologia que explica o método e, no topo, as abordagens orientadoras maiores de todo o processo. Essas, portanto, são o guarda-chuva sob o qual os métodos e suas técnicas se abrigam. Estando no mais alto plano dentro do processo de ensino-aprendizagem de línguas, as abordagens orientam a eleição de métodos e técnicas quando se ensina/aprende uma (nova) língua. (SANTOS, ALMEIDA FILHO, 2011, p. 2) A hierarquização dos conceitos de abordagem, método e técnica, originalmente proposta por Edward M. Anthony (1963), é retomada por Santos e Almeida Filho (2011), ao defenderem a pressuposição de duas grandes categorias de abordagens de ensino e aprendizagem de línguas. A primeira e mais antiga delas é denominada Abordagem Gramatical (AG), tomando a própria gramática como princípio organizador da língua. A partir da concepção da língua enquanto um sistema de regras, essa abordagem reforçaria a ideologia de uma língua correta e a marginalização da variação linguística. A aprendizagem de regras gramaticais teria o objetivo de minimizar a ocorrência de erros que, por sua vez, seriam considerados obstáculos na 21 aprendizagem. O ensino, assim, teria natureza prescritiva, na qual as regras são transmitidas (ou impostas) aos aprendentes para se alcançar correção linguística máxima. Por outro lado, na Abordagem Comunicativa (AC), estaria o sentido – e não mais a forma – em foco. Em outras palavras, na AC, o princípio organizador é a comunicação construída na interação possível na Língua-Alvo. O ensino é contextualizado de modo mais amplo no discurso significativo, e a gramática assume um papel complementar, em vez de centralizador, do processo aquisicional. A gramaticalidade se instauraria como decorrência, e não como indutora, na significação que é, na medida do possível, buscada e construída. Como contraponto à AG, portanto, a AC privilegia a comunicação em vez da correção. Aceitemos ou não a proposição de Santos e Almeida Filho (2011), é necessário reconhecer a definição de abordagem corresponde ao que em inglês se denomina approach. Uma definição razoavelmente pacífica para approach pode ser encontrada em um trecho de Teaching by Principles, de Douglas Brown. Approach: Theoretically well-informed positions and beliefs about the nature of language, the nature of language learning, and the applicability of both to pedagogical settings. (BROWN, 2001, p. 16)1 Seguindo um nível abaixo na hierarquia proposta por Edward Anthony, temos a noção de método. Method: A generalized set of classroom specifications for accomplishing linguistic objectives. Methods tend to be concerned primarily with teacher and student roles and behaviors and secondarily with such features as linguistic and subject-matter objectives, sequencing and materials. They are almost always thought of as being broadly applicable to a variety of audiences in a variety of contexts. (BROWN, 2001, p. 16)2 Assim como, ao longo do tempo, de um mesmo tronco linguístico surgem diversas línguas aparentadas entre si, com origem comum, mas desdobramentos diferentes, também foram/são vários os métodos de ensino de língua estrangeira. Assim como algumas línguas são 1 “Abordagem: Posições teoricamente bem definidas e crenças acerca da natureza da língua, a natureza do aprendizado de língua e a aplicabilidade de ambos em contextos pedagógicos.” (Todas as traduções em nota de rodapé são de nossa autoria.) 2 “Método: Um conjunto generalizado de especificações para o cumprimento de objetivos linguísticos. Os métodos tendem a se focar inicialmente nos papéis e comportamentos dos professores e dos alunos e em segundo plano com aspectos como objetivos linguísticos, temas, sequenciamento e os materiais. Eles são quase sempre considerados como sendo amplamente aplicáveis a uma gama de públicos em uma gama de contextos.” 22 mais faladas e dispõem de mais status do que outras, também os métodos são adotados em maior ou menor escala, entram e saem de moda. A glance through the past century or so of language teaching will give an interesting picture of how varied the interpretations have been of the best way to teach a foreign language. As disciplinary schools of thought – psychology, linguistics, and education, for example – have come and gone, so have language-teaching methods waxed and waned in popularity. Teaching methods, as “approaches in action,” are of course the practical application of theoretical findings and positions. In a field such as ours that is relatively young, it should come as no surprise to discover a wide variety of these applications over the last hundred years, some in total philosophical opposition to others. (BROWN, 2001, p. 16)3 Imersão, Total Physical Response [Resposta Física Total], Suggestopedia [Sugestopédia] e Community Language Learning [Aprendizado de Língua por Comunidade] são alguns entre os métodos de ensino mais famosos. Uma metodologia mais abrangente e aprofundada do ensino de língua estrangeira está fora do escopo do trabalho aqui proposto. Assim, tendo como base trabalhos de revisão desses métodos (RENAU, 2016; LIU; SHI, 2007, BROWN, 2001), optou-se por discutir, brevemente, quatro dos mais influentes métodos aplicados ao redor do mundo: o método de Gramática e Tradução, o Direto, o Audiolingual e o método Comunicativo. 1.1.1 Gramática e Tradução No que se refere à educação formal, o método de Gramática e Tradução é certamente o mais tradicional. Baseado no ensino das línguas clássicas, em especial o Latim e o Grego, na Europa (RENAU, 2016, p. 83), esse método é centrado na gramática, na tradução de textos escritos e na repetição mecânica e descontextualizada de vocabulário. Pouca ou nenhuma atenção era dada à produção e à compreensão orais (LIU; SHI, 2007, p. 69), o que não é surpresa, já que sua aplicação se dava principalmente para o ensino de línguas mortas cujo uso era extremamente restrito. Ainda que este método seja frequente e duramente criticado, 3 “Um olhar no século passado, mais ou menos, em relação ao ensino de língua proporcionará uma imagem interessante de como variadas as interpretações têm se dado sobre a melhor forma de ensinar uma língua estrangeira. Conforme as escolas de pensamento disciplinares – psicologia, linguística e pedagogia, por exemplo – chegaram e se foram, assim também se deu com com os métodos de ensino de língua que perderam popularidade. Métodos de ensino, como “abordagens em ação”, são com certeza a aplicação prática das descobertas e posicionamentos teóricos. Em um campo como o nosso que é relativamente jovem, não deve ser uma surpresa o fato de descobrir uma ampla variedade dessas aplicações nos últimos cem anos, algumas em oposição filosófica plena em relação a outras.” 23 principalmente no âmbito acadêmico, não foi totalmente abandonado. De fato, continua sendo bastante utilizado em alguns contextos, talvez devido à falta de formação adequada dos professores de idiomas que, assim, continuam reproduzindo os modelos de ensino mais conservadores. 1.1.2 Método Direto A premissa básica do Método Direto é a de que se deve tentar aprender uma segunda língua da mesma forma que as crianças adquirem sua língua materna. Há, assim, ênfase na interação oral e no uso espontâneo da língua-alvo. A gramática também é ensinada, porém de forma indutiva. Produção e compreensão orais são ensinadas e enfatizadas, ainda que a produção seja incentivada em estágios posteriores do aprendizado. A essência da linguagem seria o significado, e o vocabulário, não a gramática, seria seu "coração" (BROWN, 2001, p. 34). O Método Direto enfatiza que o aprendiz deve se sentir o mais relaxado possível na sala de aula, e que a comunicação deveria ser realizada apenas na língua-alvo e vocabulário abstrato ensinado através da associação de ideias, de modo que ocorresse a "aquisição" da língua-alvo. O método também preconiza duas ideias bastante controversas: o adiamento da exigência da produção oral por parte dos aprendizes (para que a fala, então, "emergisse" naturalmente) e a ênfase no estímulo compreensível (comprehensible input). 1.1.3 Método Audiolingual Influenciado pelo behaviorismo e pela linguística estruturalista (BROWN, 2001, p. 23; LIU; SHI, 2007, p. 70), o método audiolingual reflete a percepção behaviorista da linguagem como estímulo e resposta. O método utiliza diálogos como principais meios de apresentar a língua-alvo e as habilidades de compreensão e produção oral são enfatizadas. Há uma busca pelo aprendizado livre de erros, e a correção é incentivada. Padrões estruturais são ensinados através de repetição, há restrição do vocabulário (ensinado apenas em contexto) e de explicações gramaticais (a gramática é ensinada através de analogias indutivas em vez de explicações explícitas). Por outro lado, o uso de recursos visuais, gravações em áudio e prática em laboratório é abundante. 24 1.1.4 Método Comunicativo Considerado o método com maior aceitação geral atualmente (BROWN, 2001, p. 42), o ensino comunicativo tem como objetivo não necessariamente a correção gramatical e formal, mas o desenvolvimento da competência comunicativa do aprendiz. As aulas são elaboradas para que os alunos se envolvam em usos pragmáticos, autênticos e funcionais da língua para propósitos significativos, e os aspectos da língua que permitem ao aprendiz ser bem-sucedido nesses propósitos são o foco central (BROWN, 2001, p. 43). Fluência e precisão são vistos como princípios complementares e, ainda que eventualmente a fluência assuma maior importância do que a precisão e a correção, no intuito de manter os aprendizes engajados no uso da língua-alvo, preconiza-se que a fluência não seja encorajada às custas da comunicação clara, não-ambígua e direta (BROWN, 2001, p. 43-44). 1.1.5 Métodos e o ensino de pronúncia De acordo com Souza (2009), as habilidades de produção e compreensão oral têm ganhado destaque. Talvez como uma reação à predominância histórica do método de Gramática e Tradução e suas limitações, tornou-se lugar comum dizer que é importante desenvolver as quatro habilidades (fala, audição, escrita e leitura). Isso é facilmente observado em qualquer material promocional de escolas de ensino de idiomas e editoras de livros didáticos. No caso específico do Brasil, parece haver uma frustração generalizada: o ensino de uma língua estrangeira moderna (em geral, a língua inglesa) é parte do currículo do segundo ciclo do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, mas o ensino na escola regular costuma ser pautado por uma abordagem gramatical tradicional, e eventuais iniciativas por parte dos professores de dar mais ênfase à produção e compreensão oral dos alunos encontram obstáculos no elevado número de alunos por turma, na falta de recursos e na crença generalizada de que “não se aprende inglês na escola”. Esses problemas são ainda mais graves na rede pública, mas não estão restritos a ela. A todos esses fatores, soma-se o fato de que grande parte dos professores não têm formação adequada e muitos sequer dominam a língua que ensinam. Esse panorama, por si só, já permite supor que o ensino da pronúncia nas aulas de língua estrangeira no Brasil é bastante deficiente. Há, ainda, outro fator em jogo: 25 Em 1960, a Abordagem Cognitiva, influenciada pela gramática gerativa- transformacional de Chomsky [...] e pela psicologia cognitiva de Neisser [...] via a língua como regras de comportamento ao invés de formação de hábito, o que levou a enfatizar a gramática e o vocabulário em detrimento da pronúncia, pois acreditava-se que uma pronúncia igual a de falantes nativos era um objetivo irreal e poderia não ser alcançado (Scovel, 1969) e que o tempo de ensino seria melhor empregado com itens mais fáceis de serem aprendidos como estruturas gramaticais e vocabulário. (SOUZA, 2009, p. 36) De fato, “falar como um nativo” é um objetivo irreal para a esmagadora maioria dos aprendizes de uma língua estrangeira, o que fez com que o trabalho com a pronúncia fosse, por vezes, relegado ao segundo plano. Na década de 70, por exemplo, trabalhar com a pronúncia era visto como uma atividade ultrapassada, uma vez que se considerava como uma tentativa de fazer os alunos tentar pronunciar como falantes nativos, através de exercícios de repetição, sem dar importância para a comunicação, o que era desestimulante. Tempos depois, este mito foi quebrado e com a vigência da Abordagem Comunicativa no ensino de línguas, o interesse no ensino da pronúncia tem aumentado, com cursos e métodos que não mencionam o fato de os alunos deverem tentar falar com um sotaque perfeito como os falantes nativos. O objetivo de se ensinar pronúncia, atualmente, é desenvolver nos alunos habilidade de pronúncia suficiente para uma comunicação efetiva com falantes nativos. (SOUZA, 2009, p. 34) Como apontado, a comunicabilidade parece ser a bússola dos atuais teóricos do ensino e aprendizagem de língua estrangeira para decidir quais aspectos da pronúncia ensinar. [Andy] Kirkpatrick is adamant that teachers should not waste valuable class time being pedantic, by focusing on the pronunciation of minimal pairs, fossilised mistakes or the omission of ‘s’ at the end of words. He questions the point of trying to overcome this linguistic ‘hardwiring’ except where pronunciation impedes comprehension. One example of misunderstanding could occur from the modification of final ‘l’ sounds to ‘n’ in Thai, where ‘bill’ becomes ‘bin’. In the context of romance, if a native Japanese speaker were to utter “I rub you”, it would most likely be interpreted as “I love you”, considering the illocutionary force of such a statement. Therefore, learners should be made aware of not only what they hear and say, but also of their intended message. Alternatively, [Claire] Kramsch believes that accuracy is noticed and appreciated and that learners should strive for rhetorical eloquence. Their proficiency then extends to an ability to sound 26 ‘cool’ and fashionable in a natural way. Regarding the prosodic elements of speech, grammar and syntax, [Michael] Bryam probably has the least overall focus of the three scholars, with a proficiency goal for learners to become more culturally (self)aware and sensitive to speakers from other cultural contexts. (SMALL, 2013, p. 43-44)4 Há, no entanto, um problema ao considerar a comunicabilidade como único critério para guiar o ensino de pronúncia. Mais do que aproximar a pronúncia do aprendiz à da de um falante nativo, o ensino de pronúncia é uma poderosa ferramenta para melhorar a compreensão auditiva do aprendiz de língua estrangeira. While it may be easy to see the benefit of good pronunciation instruction for increasing intelligibility, it is just as useful for increasing listening comprehension. Students who are taught about English prosodic patterns often report improved understanding of speech on TV, in movies, and in face-to-face conversation. (GILBERT, 2008, p. 6)5 Quando se fala em ensino de pronúncia, costuma-se pensar imediatamente nos sons do inventário fonológico da língua alvo que não existem na língua materna, como, em relação ao português, o famoso TH de Thank You e a vogal da palavra Cat em inglês. Aspectos como a entoação e o ritmo são frequentemente negligenciados. One reason is that prosodically-trained students have learned to understand how rhythmic and melodic cues are used to organize information and guide the listener. Another reason is that these students have learned to notice how 4 “[Andy] Kirkpatrick se posiciona incisivamente em relação a como os professores não devem desperdiçar o valioso tempo em sala de aula sendo pedantes, focando na pronúncia de pares mínimos, erros fossilizados ou a omissão do “s” no fim de palavras. Ele questiona o fato de se tentar superar essa “programação” exceto onde a pronúncia impede a compreensão. Um exemplo de desentendimento poderia ocorrer com a modificação dos sons de “l” final para “n” em Tailandês, em que “bill” (conta) se torna “bin” (lixeira). No contexto romântico, se um falante nativo de Japonês fosse falar “I rub you” (Eu te esfrego), seria provavelmente interpretado como “I love you” (eu te amo), considerando a força ilocucionária dessa oração. Assim, os aprendizes deveriam estar cientes não apenas daquilo que ouvem e falam, mas também da mensagem que se quer passar. Por outro lado, [Claire] Kramsch acredita que a precisão é percebida e apreciada e que os alunos deveriam se esforçar rumo à eloquência retórica. A proficência então progridiria para uma habilidade de soar “legal” e estar na moda de uma forma natural. Levando em consideração os elementos prosódicos da fala, gramática e sintaxe, [Michael] Bryam provavelmente dá provavelmente o menor foco entre os três especialistas, com o objetivo da proficiência para aprendizes em se tornarem mais conscientes culturalmente e sensíveis aos falantes de outros contextos culturais. 5 Embora possa parecer fácil ver o benefício do ensino de uma boa pronúncia para aumentar a inteligibilidade, ele é útil da mesma forma no que tange a melhoria da compreensão auditiva. Os alunos que recebem instruções sobre os padrões prosódicos do Inglês geralmente relatam uma compreensão melhor da fala ao assistir TV, em filmes e em conversas face a face.” 27 prosody changes how words sound. Most English learners who suffer from inadequate training in listening comprehension complain that “native speakers talk too fast.” What this often means is that learners are unable to process important grammatical signals, (e.g., past tense markers) or effectively process contracted speech. (GILBERT, 2008, p. 6)6 A presente pesquisa adota uma postura favorável em relação às ideias defendidas por Gilbert (2008), pois nos parece claro que elementos suprassegmentais do sistema fonológico de uma língua não podem ser negligenciados no ensino de uma língua estrangeira. De fato, esses elementos podem inclusive ser considerados mais importantes do que a pronúncia precisa dos segmentos, pelo menos em alguns contextos. The individual sounds of spoken English are constantly changed by the communication pressures inherent in the prosody. Put another way, prosody often distorts sounds so much that they are unrecognizable from the sounds of a word when it is said in isolation. For example, to find out how a word is pronounced a learner will often look in a dictionary. But it is important to realize that actual pronunciation of that word may be dramatically changed depending on its importance to the speaker at a particular moment. In actual speech, words run together, consonants or vowels disappear or change in sounds all in relation to the prosody pressures. Also, the word stress pattern as indicated in the dictionary is actually only a “potential” stress pattern; the potential is activated in specific contexts, but it is not necessarily realized in every context. So if students depend on the “dictionary pronunciation” of words, they will likely fail to recognize a spoken vocabulary item when they hear it, even though they “know” the item in print. In fact, they do not really know the word until they can identify it in actual speech. (GILBERT, 2008, p. 7)7 6 “Uma razão é que os estudantes treinados prosodicamente aprenderam a compreender como indicações rítmicas e melódicas são usadas para organizar informações e guiar o ouvinte. Outra razão é que esses estudantes aprenderam a notar como as mudanças prosódicas mudam o som das palavras. A maioria dos aprendizes de Inglês que sofre de um treinamento inadequado em relação à compreensão auditiva reclama que “falantes nativos falam rápido demais”. O que isso geralmente significa é que os aprendizes não são capazes de processar sinais gramaticais importantes, (por exemplo, marcadores de tempo verbal passado) ou efetivamente processar a fala contraída.” 7 “Os sons individuais do Inglês falado são constantemente mudados pelas pressões de comunicação inerentes à prosódia. Pondo de outra maneira, a prosódia geralmente distorce os sons de tal maneira que eles se tornam irreconhecíveis em relação aos sons da palavra quando dita de forma isolada. Por exemplo, para descobrir como uma palavra é pronunciada, um aprendiz normalmente procurará no dicionário. Mas é importante compreender que a pronúncia real dessa palavra pode mudar drasticamente dependendo de sua importância para o falante em determinado momento. Na fala real, as palavras se juntam, consoantes ou vogais desaparecem ou seus sons mudam em realação às pressões prosódicas. Além disso, o padrão de acento da palavra como indicado no dicionário é na verdade apenas um padrão acentual “potencial”; o potencial é ativado em contextos específicos, mas não é necessariamente realizado em todos os contextos. Assim, se os alunos dependem da “pronúncia do dicionário” para saber as palavras, eles provavelmente não serão capazes de reconhecer um item dentro de um 28 1.2 Elementos rítmicos: Sílaba e Ritmo Para se poder fazer uma análise a respeito do ritmo de uma língua em comparação com o ritmo de outra, como é o objetivo desta dissertação, é fundamental saber de que ponto a análise deve partir para que as variáveis analisadas sejam suficientes para demonstrar como as adaptações de ritmo ocorrem quando um falante de Português Brasileiro pronuncia enunciados em Inglês Americano. Assim, o intuito da organização dos conceitos abordados nesta subseção é permitir uma reflexão sobre a sílaba como constituinte fonológico e abrir caminho para as análises com os dados coletados. 1.2.1. Sílaba Para iniciar uma discussão acerca do que é o ritmo de uma língua e como ele afeta o desenvolvimento do aprendizado de uma língua estrangeira, é importante definir parâmetros linguísticos que permitam mensurar de forma tangível aspectos da fala. Assim, partimos do conceito de sílaba com embasamento de uma unidade básica para a descrição de pés rítmicos. Desse modo, seguindo o conceito proposto por Mateus e d’Andrade (2000), a sílaba é um construto perceptual, portanto, fonológico. Concordando com esse conceito, Freitas e Santos (2001, p. 15) definem que “a capacidade que os falantes têm de manipular os formatos fonéticos dos seus enunciados decorre do seu conhecimento fonológico”. Um bom exemplo desse processo é dado na passagem a seguir, em que as autoras se referem ao Português Europeu: A variação nos formatos fonéticos das produções de fala pode surgir na sequência de diferentes velocidades de fala ou de diferentes estilos discursivos individuais. Por exemplo, a palavra descrever pode ser produzida por um falante A como [diʃkɾiˈver], com a presença de todas as vogais, e por um falante B como [dʃkɾˈver], com apagamento das duas primeiras vogais. No entanto, um formato fonético do tipo *[deʃˈkɾiver] (O asterístico antes do exemplo significa agramatical) para a palavra descrever será considerado agramatical pelos falantes do Português. É a fonologia que define o que está na base da gramaticalidade das duas primeiras produções ([diʃkɾiˈver] e [dʃkɾˈver]) e da agramaticalidade da última [deʃˈkɾiver]. As duas primeiras funcionam os príncipios do funcionamento fonológico regular do sistema, que correspondem (i) a uma atribuição inadequada do acento (o acento foi movido da sílaba ver para a sílaba cre) e (ii) a uma inadequação da qualidade das vogais às posições tónicas ou átonas que ocupam (em sílaba tónica, o [i] da sílaba cre passaria a ser [ɛ]; em sílaba átona, os [e] das sílabas des e ver passariam a ser [i]). (FREITAS; SANTOS, 2001, p. 16) vocabulário falado ao ouvi-lo, mesmo se eles “conhecerem” o item escrito. Na verdade, eles não conhecem de fato a palavra até serem capazes de identificá-la na fala real.” 29 Dessa forma, a percepção humana sobre a sílaba se dá a um nível mental e não a um nível puramente acústico, embora a produção dos sons seja essencialmente um processo físico que interpretamos conforme ouvimos. Partimos inicialmente de uma discussão sobre as sílabas, para embasar esse constituinte como unidade básica para a formação dos pés rítmicos, seguindo o modelo proposto por Abercrombie (1965), que será discutido na próxima seção. Na mesma abordagem, os pés rítmicos serão descritos para embasar uma unidade básica para a análise de ritmo. Como se espera observar alterações nas variáveis da sílaba, como duração e intensidade de seus segmentos, tanto uma abordagem fonológica (COLLISCHON, 2005[2006], SANTOS; FREITAS, 2001) quanto uma abordagem fonética (ABERCROMBIE, 1965, CAGLIARI, 2007) serão exploradas, a fim de se ter uma visão abrangente sobre a sílaba e o ritmo. A definição de sílaba pode ser encontrada tanto em trabalhos de fonologia, quanto de fonética e de gramática. Dentro da linguística, partindo de uma abordagem fonológica, a discussão e a aceitação sobre esse constituinte tomou corpo a partir dos anos 70, como aponta Collischon (2005), baseando-se em textos de Hooper (1976) e Kahn (1976). Dos modelos propostos nessa época, dois deles ganharam repercussão, sendo o primeiro o de Kahn (1976), em que é feita uma notação autossegmental, propondo que todos os elementos da sílaba estariam relacionados entre si em um mesmo nível. Segundo Collischonn (2005, p. 101), essa teoria “pressupõe camadas independentes, uma das quais representa as sílabas (indicadas pela letra grega σ) às quais estão ligados diretamente os segmentos”. Abaixo há um exemplo da representação da palavra “par” à luz desse modelo. (1) Já o outro modelo, proposto por Selkirk (1982) e baseado em Pike e Pike (1947) e Fudge (1969), defende uma estruturação mais complexa, com a sílaba possuindo um onset (ataque) e uma rima. O onset constitui as consoantes que antecedem a rima. A rima é composta pelo núcleo e pela coda, sendo o núcleo formado pela vogal da sílaba e a coda pelas consoantes que se 30 seguem ao núcleo. Um exemplo desse modelo pode ser visto abaixo, utilizando a palavra “ontem”: (2) Como esse modelo explicita de forma clara a posição de cada elemento e estabelece uma hierarquia com as relações de cada nível, ele acaba sendo mais interessante que o autossegmental, quando o intuito do trabalho é o de explorar aspectos mais específicos dos processos que venham a ocorrer dentro da sílaba afetando algum constituinte específico, como uma descrição de fenômenos diretamente relacionados com a coda e não com a sílaba inteira. A partir da classificação das sílabas de um ponto de vista fonológico, ocorrem sílabas pesadas e leves, sendo pesada quando possui rima ramificada (em núcleo e coda, como em par, ou núcleo ramificado, como em pai) e leve, quando não possui, como em pá. Essa conceituação é importante por refletir regras de atribuição de acento (COLLISCHON, 2005, p. 104). Quando há sílaba pesada em uma palavra o acento tende a se fixar na primeira sílaba pesada da direita para a esquerda. Por exemplo, papel e lençol. Collischon (2005), baseando-se em Hyman (1985), apresenta uma proposta diferente, a qual defende a concepção de que as sílabas são constituídas por unidades de peso e conhecidas como mora (TRUBETZKOY, 1970[1939]). Uma mora é identificada como um intervalo de duração regular que ocorre em uma determinada língua. A partir desta teoria, uma sílaba pesada possui duas moras e a sílaba leve uma. Não podemos levar em conta valores absolutos, ou seja, não se afirma que uma mora possui 100 ou 200 milissegundos ou qualquer outro valor fixo. O que define essa duração é a relativização das durações de sílabas pesadas e leves a partir de um 31 levantamento fonológico de uma língua. A duração pode ser aumentada ou reduzida conforme se manipula a velocidade de fala, mas ainda assim proporções entre sílabas de peso diferentes continuarão a ser bem marcadas. Essa questão de proporções entre durações de sílabas será explorada na Seção 4 – Análise de dados. Alguns fatores são necessários para definir o que será considerado gramatical para formações silábicas. Uma língua não permite formações aleatórias de sílabas e, para compreender quais estruturas são permitidas, é necessário algum conceito que possa explicá-las. A isso se dá o nome de molde silábico. Collischon (2005, p. 108), seguindo o modelo de Hogg e McCully (1993[1987], p. 35), lista os modelos possíveis para as sílabas em inglês, a partir dos quais se pode abstrair o molde silábico daquela língua: (3) id VC I VV ([aj]) bad CVC isle VVC ([ajl]) bread CCVC bye CVV ([baj]) band CVCC bide CVVC ([bajd]) brand CCVCC bind CVVCC ([bajnd]) bride CCVVC ([brajd]) grind CCVVCC ([grajnd]) A estrutura mínima é VC ou VV e a máxima CCVVCC. O núcleo é obrigatório, todos os outros elementos são opcionais. Além disso, não podemos considerar esse molde de forma exaustiva, pois sílabas como gnaw seriam aceitas, embora não sejam encontradas no inventário da língua inglesa. Segundo Collischon (2005, p.109), é necessário que se descreva algum tipo de filtro para que as sílabas permitidas estejam de acordo com a língua, para o qual, segundo ela, Clements e Keyser (1983) dão nome de condições negativas de estrutura de sílaba. Para excluir gnaw, um filtro possível seria determinar /n/ como não permitido na segunda posição de um onset complexo. 32 Já para o português brasileiro, Collischon (2005, p. 117) lista os seguintes padrões: (4) é V ar VC instante VCC cá CV lar CVC monstro CVCC tri CCV três CCVC transporte CCVCC aula VV lei CVV grau CCVV claustro CCVVC Pensando em restrições para o Português, os onsets complexos são constituídos de uma obstruinte seguida de um líquida, mas não é aceita qualquer combinação. Por exemplo, sílabas com onset pl, bl, fl, são permitidas (planta, blusa, flor). Já sílabas com dl, sl e zl são agramaticais, apesar de serem possíveis em outras línguas, como o próprio Inglês (slice, cuddle e puzzle, por exemplo). Definir um molde silábico permite descrever quais sílabas são possíveis em uma língua. Porém, o molde não explica o que ocorre quando duas possibilidades estão presentes em uma mesma situação. Para resolver esse problema, há a abordagem de regras proposta por Harris (1983) e a abordagem de condições de Hooper (1976) e Itô (1986). Collischon (2005, p.111) define a primeira abordagem como sendo “uma sequência de segmentos feita por meio de regras de criação de estrutura silábica: regra de formação do núcleo, regra de formação do ataque e regra de formação da coda”. A partir dessas regras ocorre ordenação, o núcleo se cria primeiro seguido do ataque e, por fim, a coda. 33 A abordagem de condições, segundo Collischon (2005, p. 111), “considera a silabação um processo automático que obedece a determinadas condições, não ordenadas entre si”. As condições podem ser universais ou paramétricas. Caso sejam universais, a aplicação delas se dá em todas as línguas. Caso sejam paramétricas, a ocorrência de cada uma se dá de forma específica. Partindo do conceito da generalização e sequência de sonoridade (SELKIRK, 1984), há uma escala de sonoridade que correlaciona a sonoridade relativa de um segmento com a posição que ele ocupa no interior da sílaba. O elemento mais sonoro se encaixa no núcleo da sílaba, enquanto que os menos sonoros se encaixam perifericamente, ou seja, adotando as posições de onset e coda. Caso haja uma sequência de elementos no onset ou na coda, haverá uma escala de sonoridade crescente em direção ao núcleo (COLLISCHON, 2005). (5) Escala de sonoridade: Vogal>líquida>nasal>obstruinte 3 2 1 0 Por exemplo, uma sílaba como “tra” é possível em Português Brasileiro, pois apresenta uma sequência obstruinte-líquida-vogal, ou seja, 0-2-3. Caso se tente criar uma sílaba “rta” ocorre uma sequência 2-0-3, fazendo com que essa sílaba seja considerada agramatical. Collischon (2005, p.112) define a noção de condição de sequência de sonoridade baseando-se em Selkirk (1984): “em qualquer sílaba, o elemento mais sonoro constitui o núcleo e é precedido/seguido por elementos de grau de sonoridade crescente/decrescente”. Esse filtro resolve palavras como pasta e orla, evitando silabações como pa.sta e o.rla. Apesar disso, palavras como lebre ainda podem ser divididas como leb.re. Por fim, ao comparamos os moldes silábicos entre Português Brasileiro e Inglês Americano, podemos notar diferenças entre quais sílabas são aceitáveis. Por exemplo, as sílabas formadas por CVC são aceitas nos dois moldes. Porém, em Português Brasileiro, o número de palavras que segue esse molde é consideravelmente menor que em Inglês Americano, pois nessa 34 segunda língua qualquer consoante pode aparecer na posição final. É fácil listar palavras dentro desse padrão: stuff, car, nap, nag, stop, stack, etc. Por outro lado, em português essa distribuição é bem mais limitada, mesmo ortograficamente, com as letras R, S, M e L em final de palavra. Especificamente no caso do Português Brasileiro, /R/ pode ser realizado como um som consonantal, assim como /S/. Porém, /m/ e /l/ não são comumente encontrados. Os falantes realizam a nasalização da vogal que antecede o /m/ e no caso do /l/, o fonema passa pelo processo de vocalização, que segundo CAMARA JR (1970, p. 51), /l/ passa a ser um /ʊ/ assilábico, fazendo com que palavras como “mal” e “mau” sejam pronunciadas da mesma forma. Essas diferenças entre Português Brasileiro e Inglês Americano possibilitam que mais processos ocorram. A palavra stop, por exemplo, pode ser realizada como [ɪsˈtɔpɪ] com duas vogais epentéticas. Uma vogal epentética ocorre para a realização do cluster [st], uma vez que esse cluster não ocorre naturalmente em Português Brasileiro. A outra vogal epentética surge a fim de se ter uma sílaba CV no final da palavra, evitando a realização de uma consoante [p] em coda. O que é uma palavra monossílabica em inglês no formato CCVC passa a ter o formato VC.CV.CV. O aumento de sílabas afeta consequentemente o ritmo. Com isso, cada sílaba passa a ter um valor de duração próprio, assim como se forma uma variação na intensidade conforme se tem agora uma sílaba tônica e duas átonas. O mesmo não ocorre em palavras como car. Como a coda dessa palavra apresenta o som [ɹ], há a possibilidade de se fazer o mesmo em Português Brasileiro e assim, realizações como [kɐɹ] são geralmente comuns, pelo menos na variação do interior paulista, onde foi feita a coleta de dados. Esse tipo de ocorrência é de especial interesse para a análise dos dados coletados nesta pesquisa, pois pode-se observar com clareza como fenômenos como esse se dão nas gravações e, assim, levantar discussões acerca da compreensibilidade de enunciados. 35 1.2.2. Ritmo Ritmo, do ponto de vista linguístico, pode ser definido da seguinte forma: Qualquer texto falado possui ritmo, uma vez que esta noção é definida como a maneira como as línguas organizam no tempo os elementos salientes da fala (em especial, as durações silábicas e os acentos). Por causa dessa concepção temporal de ritmo, esta noção tem sido, tradicionalmente, dentro da Fonética, trabalhada com base na ideia de isocronia. (MASSINI-CAGLIARI; CAGLIARI, 2001, p. 116) Como o termo ritmo é usado amplamente em contextos diversificados, de uma forma simples, podemos pensar desde o ritmo de batidas cardíacas, de passos, da respiração e até mesmo da música e da poesia. Para a linguística, segundo Cagliari (1981) e Abercrombie (1967), a noção de ritmo na fala baseia-se na repetição de determinados tipos de intervalos regulares baseados em sílabas ou acentos. Uma das maneiras de se definir possíveis medições de intervalo que possibilitem demonstrar a regularidade de um determinado ritmo de fala é a partir de uma dicotomia entre ritmo silábico e acentual. Antes de se aplicar esses modelos de ritmo para uma língua ou outra, é importante estabelecer em que se pautam as diferenças dessas definições. Dessa forma, a regularidade de intervalo é compreendida pelo conceito de isocronia. Segundo Abercrombie (1967, p. 97), o ritmo silábico “apresenta a recorrência periódica de movimento fornecida pelo processo de produção de sílabas: os pulsos toráxicos e, portanto, as sílabas recorrem a intervalos iguais de tempo”. Dentro dessa definição, podemos reconhecer como línguas de ritmo silábico o espanhol, o italiano, o francês, dentre outras. Em relação ao ritmo acentual, ele apresenta “a recorrência periódica de movimento fornecida pelo processo de produção de acentos: os pulsos dos acentos e, portanto, as sílabas acentuadas são isócronas”. Nesse caso, o exemplo que mais será trabalhado nesta pesquisa é o da língua inglesa e, além dela, línguas como o árabe e o russo também estão nessa classificação (ABERCROMBIE, 1967, p.97). A respeito dessa discussão, Massini-Cagliari (1992) aponta que tais definições de ritmo já estavam presentes em Pike (1947) e, a partir dele, em muitos outros trabalhos. 36 Além disso, Migliorini (2008) aponta também (com base em CAGLIARI, 1981; MAJOR, 1981, 1985; CAGLIARI; ABAURRE, 1986; MORAES; LEITE, 1989; MASSINI-CAGLIARI, 1992; BARBOSA, 2000, 2006, entre outros) que não há consenso em relação à tipologia rítmica do Português Brasileiro. É importante salientar que as discussões sobre ritmo linguístico demonstram ainda que não há consenso em relação a como se deve classificar uma determinada língua ou até mesmo quais categorias existem. Além das categorias de ritmo silábico e acentual, há autores que defendem um terceiro ritmo definido como moraico. A diferença entre esse ritmo e os outros seria a recorrência do intervalo em moras. Autores como Major (1981) definem essa categoria propondo que os intervalos regulares estariam representados pelas moras e que a contagem deve ser feita considerando o número de segmentos partindo do final da sílaba, incluindo a primeira vogal da sílaba. Em relação a essa descrição, Massini-Cagliari (1992) reflete que tais ocorrências se davam antes da possibilidade tecnológica de se fazer experimentos precisos. Conforme os experimentos avançaram, com as medições de intervalos entre sílabas e/ou acentos, constatou-se que muitas vezes a isocronia não era encontrada em um nível físico como se esperava. Isso abriu espaço para que novas reflexões a respeito da natureza isocrônica indicassem um fenômeno a nível psicológico. Ao assumirmos essa vertente, pensamos que tanto a noção de ritmo quanto a noção de sílaba estariam melhor vinculadas a um nível fonológico. Com isso em mente, Cagliari e Abaurre (1986) propõem que, ao fazermos medições instrumentais, não podemos assumir um valor como absoluto. Segundo os autores, a capacidade fonológica dos falantes faz com que interpretações a respeito do que se ouve sejam feitas a partir de expectativas que temos sobre a língua. Seguindo a mesma linha, e partindo da revisão bibliográfica proposta por Migliorini (2008), em Frota, Vigário e Martins (2001), tem-se que a isocronia absoluta nunca foi constatada. Esses autores discutem que trabalhos experimentais anteriores sugerem distinções rítmicas em um conjunto de propriedades fonológicas e fonéticas: [...] a isocronia absoluta (nem de sílabas nem de acentos) nunca foi constatada, de fato, em trabalhos experimentais anteriores, sugerem que as distinções rítmicas entre línguas estão presentes em um conjunto de propriedades fonológicas e fonéticas, como “a complexidade da estrutura da sílaba, a redução vocálica e o tipo de correlatos do acento”. Assim sendo, de acordo com os 37 autores, nas línguas de ritmo acentual, a estrutura silábica é mais complexa, há redução vocálica e a duração do acento é maior. Já nas línguas de ritmo silábico, ocorre exatamente o inverso: a estrutura silábica é mais simples, não há redução vocálica e a duração do acento é menor ou nula. Os autores lançam mão da metodologia proposta por Ramus, Nespor e Mehler (1999), cujas medidas de duração de intervalos consonânticos e vocálicos dão conta das diferenças entre classes rítmicas, para verificar se os sujeitos (estudantes universitários falantes nativos do PE) discriminavam PB e PE quanto ao ritmo. (MIGLIORINI, 2008, p.59). Essa questão é levada em conta neste trabalho, pois, ao analisarmos as durações do experimento, não consideramos apenas o valor absoluto de cada segmento analisado. Uma vez que questões como a velocidade de fala poderiam impedir que relações significativas fossem geradas, os valores indicados não representariam um resultado útil para a pesquisa, em especial, no que se refere a propor reflexões sobre como melhorar a qualidade e a eficiência do ensino de pronúncia. Ao invés disso, calculamos o quanto uma sílaba átona é maior ou menor em relação à sílaba tônica do mesmo pé. Em seguida, verificamos dessa mesma forma o que ocorre com as sílabas e os pés de todas as gravações. Assim, não buscamos saber em valores absolutos quais diferenças ocorrem, exploramos o quanto essas proporções variam. Neste momento, o que se espera é fazer uma análise que possa dialogar com os resultados obtidos em trabalhos como a tese de Bolella (2002). Nesse trabalho, foi explorado como a redução vocálica marcada pelo schwa é fundamental para o desenvolvimento de uma pronúncia do Inglês considerada eficiente. Esta pesquisa então aponta que a redução vocálica e silábica do próprio português pode afetar o processo de aprendizagem e se propõe a descrever como isso ocorre. 1.3 Considerações finais As discussões nesta seção focaram em detalhar, inicialmente, os conceitos de abordagem e método, a fim de que possamos compreender qual papel a prosódia detém em relação ao ensino. Concluindo que há discordâncias sobre como ela deve ser vista e aplicada, concordamos com Gilbert (2008), sobre a aplicação se dar de forma que a percepção do aluno se desenvolva. Com isso, a discussão seguiu para os conceitos de sílaba e ritmo, com o intuito de definir constituintes teóricos e mensuráveis em relação à prosódia. 38 2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS O trabalho aqui apresentado é alicerçado em gravações de falantes nativos de Português Brasileiro aprendizes de inglês, focando especificamente em indivíduos do interior de São Paulo, na cidade de Leme, região de Campinas. Comparamos o ritmo de fala desses informantes ao reproduzirem um texto em Inglês Americano, desenvolvido para alunos iniciantes do livro didático American Headway (SOARS; SOARS, 2009). Assim, o sotaque que esse livro usa como exemplo não se caracteriza por uma região específica dos Estados Unidos, mas uma variante didática, muito mais lenta que a fala natural. Como uma das possíveis aplicações desta pesquisa é justamente ajudar alunos a começarem o seu aprendizado de língua estrangeira de uma maneira mais eficiente e rápida, foram escolhidos cinco aprendizes de inglês da escola em que o autor leciona. Optou-se por escolher alunos que estão no início de seus estudos, pois a pesquisa busca analisar como o ritmo da língua materna influencia(ria) o ritmo na produção em língua estrangeira, pois a efetividade dessa influência só pode ser observada a partir da consideração de iniciantes, uma vez que aprendizes mais avançados já sofreram outras influências, não passíveis de controle em uma pesquisa desta natureza. Sendo assim, os resultados obtidos com aprendizes avançados não poderiam ser utilizados como evidência inequívoca da ação dos fatores controlados nesta pesquisa. Entretanto, isto não impossibilita, de forma alguma, que o método de trabalho com o ensino do ritmo venha a ser utilizado também com esses alunos ou mesmo em um estudo longitudinal. Para obter os dados desta pesquisa, os alunos de uma escola particular onde o autor leciona na cidade de Leme, interior de São Paulo, foram gravados conforme liam um texto do livro didático American Headway (SOARS; SOARS, 2009). Esses alunos foram escolhidos entre os iniciantes, pois o intuito da pesquisa é apresentar exatamente o que ocorre em relação à variação da duração de sílabas de falantes de Português ao pronunciarem enunciados em Inglês no início de seus estudos, obtendo assim dados dentro de variáveis controladas. Ao se observar os padrões rítmicos referentes aos intervalos de duração entre sílabas tônicas e sílabas átonas à luz do modelo proposto de pés rítmicos por Abercrombie (1965), investigamos como os processos de variação de duração silábica interferem na produção da fala desses alunos. 39 Antes de iniciar a apresentação da coleta e análise de dados, é importante detalhar como o livro utilizado é constituído e que orientações são dadas ao professor. Foi selecionado um áudio do primeiro volume do livro didático American Headway (SOARS; SOARS, 2009). A escolha desse áudio em específico se dá pelo fato de ser um livro fácil de se encontrar em livrarias e pela internet, além de ter como público alvo o mundo inteiro. Ele não se vincula a uma franquia, podendo ser usado livremente tanto por professores de escolas de idiomas quanto por professores particulares. A seguir temos o texto que corresponde ao áudio que foi gravado: Lisa Parsons is thirty-two years old and lives in Manhattan. From Monday to Friday she works at a bookstore in New York. Sometimes she stays at work until 10:30 at night, but Lisa doesn’t relax on weekends. On weekends she has another job – she is a singer. On Saturday afternoons she practices with her band, and on Saturday and Sunday nights she goes to nightclubs and sings. She has no free time, but she loves her life! (SOARS; SOARS, 2009, p.24).8 Esse é o primeiro áudio baseado em um texto completo a que os alunos são expostos nesse livro. Assim, é possível nesse momento saber como o aluno está compreendendo o inglês americano e também analisar especificamente quais dificuldades ele pode apresentar. Por ser um livro voltado para o início de um curso, a velocidade da leitura desse texto, assim como de outros do livro inteiro, se realiza de maneira mais vagarosa e mais fácil de compreender por quem acabou de começar os estudos em inglês como segunda língua. O texto é reproduzido de maneira descritiva sobre a vida de uma pessoa, não sendo um aúdio com características de difícil compreensão, pois é bem monitorado em relação à escolha do vocabulário e à velocidade de fala. A opção por um áudio bem monitorado e não por um natural ocorreu devido aos áudios mais naturais possuírem velocidades de fala variantes, hesitações e outros marcadores de fala, que, em um primeiro momento, dificultariam a compreensão do aprendiz iniciante, fazendo com que a complexidade dos fenômenos fonológicos interferisse na capacidade de apreender o ritmo nesse primeiro momento. Assim, definimos esse momento inicial do aprendizado como nosso foco para entendermos como um aluno desenvolve sua pronúncia logo nos primeiros meses em 8 “Lisa Parsons tem trinta e dois anos e vive em Manhattan. De segunda a sexta-feira ela trabalha em uma livraria em Nova York. Às vezes, ela fica no trabalho até 10h30 da noite, mas Lisa não descansa nos fins de semana. Nos fins de semana ela tem outro emprego – ela é cantora. Nas tardes de sábado, ela ensaia com sua banda e nas noites de sábado e domingo ela vai para boates e canta. Ela não tem tempo livre, mas ela ama sua vida!” 40 que está estudando e como esse é o primeiro áudio com texto completo do livro didático escolhido, as chances de obter resultados mais expressivos nas medições das sílabas são maiores. Já do ponto de vista teórico, apesar da superioridade sociolinguística de dados naturais, não teríamos como definir linearmente as ocorrências entre cada gravação em comparação com o áudio original do falante nativo, tornando assim a organização dos dados caótica. Para nosso objetivo, que é de medir e comparar rigidamente as durações das sílabas e dos pés rítmicos a fim de se ter uma noção do quanto essa duração varia na fala de brasileiros, partir de uma gravação monitorada e com velocidade regular foi a escolha mais adequada. 2.1 Apresentação dos exercícios de pronúncia do primeiro livro da série American Headway Conforme a pesquisa avançou, notamos a necessidade de incluir uma breve visão sobre os livros didáticos disponíveis no mercado e como eles tratam a questão de ritmo. Para uma análise inicial, apresentamos a seguir o livro que foi utilizado para gerar o experimento, o primeiro volume da série American Headway (SOARS; SOARS, 2009). O material é composto pelos livros do aluno e do professor e possui cinco volumes sequenciais, além de um Starter (“Iniciante”). Analisamos cada exercício de ritmo que ele apresenta, incluindo a página do exercício com as explicações para o estudante e a orientação dada ao professor. Na introdução do American Headway: Teacher’s Book (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. x), os autores apresentam o material da seguinte forma: “American Headway, Second Edition adopts a balanced approach to teaching English by combining the best of traditional methods with current approaches9”. Não há informações mais claras, de um ponto de vista teórico, sobre quais seriam essas abordagens, mas há uma descrição breve para definir o que é traditional approach (“abordagem tradicional”) e current approach (“abordagem atual”). Por traditional approach, entende-se o ensino de gramática: “Grammar is given high profile. It is not disguised. The grammatical systems of English are presented, practiced, tested, and explained”10 (MARIS; SOARS; 9 “American Headway, Second Edition, adota uma abordagem equilibrada para ensinar inglês combinando o melhor dos métodos tradicionais com as abordagens atuais.” 10 “A gramática é posta em primeiro plano. Ela não é disfarçada. Os sistemas gramaticais do inglês são apresentados, praticados, testados e explicados”. 41 SOARS, 2009, p. x). Não há informações mais aprofundadas sobre em qual teoria se baseia o ensino dessa gramática ou qual tipo de gramática está sendo utilizada. Já por Current approach, tem-se: Students are guided to work out rules for themselves. They are encouraged to adopt a certain responsibility for their own learning. Real life situations are rehearsed in the classroom, with role plays, situational activities, authentic material, extracts from newspapers and magazines, and interviews with real people. The language is seen as a whole. Learners acquire new language items by seeing them and using them in communicative activities.11 Novamente, não há uma definição minuciosa sobre a teoria linguística ou pedagógica que subjaz à criação dos exercícios. Portanto, o significado de expressões como language as a whole (“língua como um todo”) não fica claro. Ao informar que os “alunos adquirem novos itens linguísticos vendo-os e usando-os em atividades comunicativas”, também não há clareza sobre a abordagem, pois qualquer abordagem pode se pautar, ainda que superficialmente, em atividades comunicativas. Em outras palavras, é possível revestir qualquer atividade com uma roupagem comunicativa, ainda que a postura teórica e metodológica na qual a atividade se pauta seja outra. No programa do livro do professor (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. x), os tópicos estão organizados da seguinte forma: vocabulary, everyday English, skill work, reding and listening, speaking e writing12. Uma vez que o foco da análise é a maneira como o ensino de pronúncia é estruturado, no tópico Speaking, temos: American Headway, Second Edition aims to enable students to speak, make conversation, be sociable, and function in the target language. Speaking activities range from totally controlled to totally free. There are many repetition exercises, especially at the lower levels, where students are invited to repeat items simply to show that they can get their mouths around the sounds. Often this is for “display” purposes, so students can have the satisfaction of their teacher’s praise when they succeed.13 (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. xi) 11 “Os alunos são instruídos a compreender as regras por si mesmos. Eles são encorajados a adotar uma certa responsabilidade por seu próprio aprendizado. As situações da vida real são ensaiadas na sala de aula, com representações de papéis, atividades situacionais, material autêntico, extratos de jornais e revistas e entrevistas com pessoas reais. A língua é vista como um todo. Os alunos adquirem novos itens linguísticos vendo-os e usando- os em atividades comunicativas”. 12 “Vocabulário, Inglês do dia a dia, desenvolvimento de habilidade, leitura e compreensão auditiva, fala e escrita”. 13 “American Headway, Second Edition busca permitir que os estudantes falem, criem conversas, sejam sociáveis e funcionais utilizando a língua alvo. As atividades de fala vão desde as totalmente controladas até as totalmente livres. Há muitos exercícios de repetição, especialmente nos níveis mais iniciantes, em que os alunos são encorajados a repetir os itens simplesmente para mostrar que conseguem acostumar a boca com os sons. 42 Nessa explicação sobre como a fala é ensinada não há uma indicação de quais processos fonológicos os alunos deveriam desenvolver durante as aulas. O único objetivo realçado define que os exercícios são para fim de “exposição”. Com isso em mente, verificamos que cada livro dessa coleção tem uma carga horária dividida em 12 lições. O volume 1, que foi utilizado na coleta, contém 93 páginas de exercícios, divididas em uma média de 7,75 páginas por lição. Encontramos 9 exercícios de ritmo em todo o livro. Três lições não apresentam qualquer tipo de exercício de pronúncia e as que apresentam colocam essas atividades como um adendo ao último exercício da lição inteira, em um canto da página, como podemos ver na figura 1: Normalmente isso serve para o intuito de “exposição”, para que os alunos possam ter a satisfação de receber os elogios de seu professor ao terem êxito”. 43 Figura 1 - Página 31 do livro American Headway contendo um dos exercícios que envolvem pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS (2009) A título de comparação, o livro também oferece outros tipos de exercícios seguindo padrões fáceis de perceber, como os grammar spot (tópicos de gramática). A princípio, o espaço destinado a esses exercícios é bem parecido com os espaços para exercícios de ritmo, como podemos ver nas figuras 2 e 3. 44 Figura 2 - Página 49 do livro American Headway contendo um dos exercícios que envolvem gramática. Fonte: SOARS; SOARS (2009) 45 Figura 3 - Página 57 do livro American Headway contendo um dos exercícios que envolvem gramática. Fonte: Fonte: SOARS; SOARS (2009) Porém, eles estão alocados em posições mais relevantes dentro das unidades. Normalmente são encontrados na primeira metade e estão presentes em todas as lições, servindo o propósito de fixar os conteúdos gramaticais que o aluno deve desenvolver durante toda a unidade. Ao todo, são 25 grammar spots. As explicações dadas nesse espaço variam desde conjugação verbal até escolhas lexicais e, devido ao posicionamento dentro da lição, é muito mais fácil retomar esses tópicos do que os tópicos de ritmo, que ficam ao final de cada unidade. Por fim, há uma seção de referências no final do livro. Todo grammar spot está vinculado com essa seção e lá se encontram exercícios de fixação e explicações mais aprofundadas sobre os temas gramaticais, como pode ser visto na figura 4. 46 Figura 4 - Página 118 do livro American Headway contendo uma das explicações expandidas sobre gramática. Fonte: Fonte: SOARS; SOARS (2009) Além disso, existe também uma seção de exercícios estendidos ao final do livro. Essa seção é chamada de writing (escrita). Uma seção de writing passa a se vincular com uma unidade a partir da lição 3 até a 12, e elas se relacionam com os temas trabalhados durante a unidade, expandindo os conceitos ensinados através da proposta de se escrever textos. As figuras 5 e 6 mostram dois exemplos dessa seção. 47 Figura 5 - Página 91 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios textuais. Fonte: SOARS; SOARS, (2009) 48 Figura 6 - Página 98 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios textuais. Fonte: SOARS; SOARS, (2009) Como podemos ver nas figuras 5 e 6, uma página inteira é dedicada ao trabalho textual e esse padrão é repetido com todos os exercícios de writing. Um exercício sobre pronomes abre a seção, com o objetivo de memorizar palavras e expondo de forma clara e sistêmica uma tabela de como os pronomes devem se relacionar, passando pela prática de preencher lacunas e terminando 49 com a leitura de um texto, que evidenciará o uso dessas palavras que foram ressaltadas durante a lição. Toda essa exposição indutiva leva à reescrita desse texto. Dessa forma, comparando o amplo espaço dado aos exercícios textuais e gramaticais, percebemos que o espaço que é dado durante a aula para que o aluno entenda o desenvolvimento rítmico é pequeno e propicia poucas chances para que de fato um desenvolvimento satisfatório ocorra durante o período de ensino. Possivelmente, esse pouco espaço se dá pela forma como a abordagem do livro entende o ensino de pronúncia como sendo um fenômeno paralelo e natural, concomitante com outros fenômenos da língua. Em relação a isso, iremos mostrar como cada exercício é proposto ao aluno e quais instruções são dadas ao professor em relação a como executar esses exercícios. Com isso, notamos que não são claras nem explicativas as instruções propostas, seja em aula, para o aluno, seja o que consta no livro do professor. A fim de mostrar todo o conteúdo que o livro aborda sobre esse aspecto da língua, incluímos a seguir cada exercício em sequência, com um breve comentário sobre o que se espera que o aluno atinja. O primeiro exercício do livro ocorre logo ao final da primeira lição e apresenta um áudio que pede que o aluno ouça as palavras e perceba o “stress”, ou seja, o acento. A forma como o exercício está disposto no livro propicia empregar poucos minutos para sua execução, pois, além de curto, ele é apresentado ao final da lição. Ao unir a pouca ênfase dada a esses exercícios e o momento em que se busca ou terminar a aula ou iniciar a próxima lição, cria-se essa condição de pouco aproveitamento, lembrando que os exercícios de escrita e análise gramatical possuem enfoques bem melhor distribuídos pela lição, além de seções adicionais. Essa diferença na disposição do livro cria situações diferenciadas de aproveitamento dessas lições, pois é natural que o professor dedique mais tempo aos exercícios mais bem alocados pelas lições. Segundo o livro do professor, as instruções que devem ser seguidas em relação ao ritmo são: Read through the Music of English box as a class. Look at the expressions in the box. Ask students to identify the important words – i.e., the words carrying the most meaning (you, OK, thanks, not bad, etc.) Play the recording. Students listen and repeat, exaggerating the stress and intonation in the same way as the recording. Students practice the conversations in open and then closed pairs. Then ask students to practice again, using their own names and telephone numbers. Encourage students to attempt the intonation and stress patterns they encountered in the Music of English box 50 while role-playing the conversations. Be content with a good effort.14 (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 6) Dessa forma, as indicações em relação aos aspectos fonológicos sobre o que se espera como resultado do exercício ou quais processos estão sendo avaliados durante a aplicação em sala de sala se resumem a “exagerar” os padrões percebidos durante o áudio. O que se tem é na verdade uma indução pela prática. Os alunos são guiados a repetir um padrão expresso apenas pela gravação, em que há um realce entoacional nas palavras consideradas como de “maior significado”. Cabe ao professor, pela falta de informação, analisar e definir por conta própria o resultado esperado, pois a única exigência para esse exercício é que o aluno demonstre um “bom esforço” e como resposta, o professor deve “ficar feliz”. Por ser o primeiro exercício, não é estranho o fato de que ele exija pouco do aluno. Porém, por se tratar de um exercício entoacional, as explicações para o professor poderiam ir além, deixando mais clara uma relação em que palavras lexicais são marcadas mais fortemente na entoação do que palavras gramaticais, um padrão que poderia ser explorado conforme os alunos aprendem novas palavras. Isso já estabeleceria, a partir das classes gramaticais das palavras, uma expectativa sobre como quanto reforço essas palavras podem receber ao serem pronunciadas dentro de um enunciado, como exposto no exercício. Ao invés disso, os autores definem essas palavras como “importantes”, o que conduz a uma conotação muito subjetiva, pois importância não é uma definição linguística. 14 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono. Olhe as expressões da caixa. Peça aos alunos que identifiquem as palavras importantes – ou seja, as palavras com mais sentido (você, ok, obrigado, nada mal, etc). Toque o áudio. Os alunos ouvem e repetem, exagerando o acento e a entoação da mesma forma que o áudio. Os alunos praticam as conversas abertamente e depois em pares. Em seguida, peça aos alunos que pratiquem novamente, usando seus próprios nomes e números de telefone. Encoraje os alunos a tentar os padrões de entoação e acento que eles viram na caixa de Music of English enquanto imitam as conversas. Fique feliz com um bom esforço”. 51 Figura 7 - Página 7 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS (2009) Já no exercício referente à página 15, a noção explorada é a de ressilabação como processo de sândi. Em relação ao que o livro do professor aponta, temos: Read through the Music of English box as a class. Focus Students’ attention on the linking lines. Write Can I help you? on the board. Say the sentence to the class slowly, pronouncing each word separately. Then say the sentence faster, linking Can and I as in natural speech. Say it again, but this time draw in the linking line on the board as you say the words to demonstrate that a final consonant sound links with an initial vowel sound.15 (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 13) Nesse exercício, os alunos ficam alguns poucos minutos novamente trabalhando as ligações entre palavras. É importante observar que esse é o único exercício, em todo o livro, que trata desse tema. Considerando que tais processos fonológicos são de difícil apreensão até mesmo para os alunos dos primeiros anos dos Cursos de Graduação em Letras, é difícil assumir que um aluno de inglês como língua estrangeira iria desenvolver toda sua percepção baseado apenas neste exercício. Além disso, cabe notar também que no enunciado não há menção alguma sobre ressilabação, ou, como se costuma chamar em inglês, “linking sound”. O acesso a esse termo seria de interesse do aluno, pois livros de pronúncia tratam amplamente do tema, como pode ser visto em Godoy, Gontow e Marcelino (2006). 15 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono. Foque a atenção dos alunos nas linhas de ligação. Escreva Can I help you? na lousa. Fale a oração para a turma lentamente, pronunciando cada palavra separadamente. Então fale mais rápido, ligando Can e I conforme a fala natural. Fale novamente, mas dessa vez faça uma linha na lousa conforme você fala as palavras para demonstrar que um último som consonantal liga com uma vogal inicial”. 52 Figura 8 - Página 15 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS (2009) No exercício referente à página 23 é apresentada uma ideia breve de entoação. Os alunos desenvolvem marcações de entoação interrogativa, afirmativa e negativa. Nesse exercício, a indução pode ser mais eficiente que nos anteriores, pois há indicadores visuais sobre como a entoação se desenvolve nas orações. O livro do professor orienta da seguinte forma: Read the Music of English box as a class. Play the recording. Focus students’ attention on the stress and intonation arrows. Play the recording again. Students follow the highlighted stress pattern and intonation. Really encourage a good imitation of the recording – this should help them sound very polite. Practice the dialogues across the class. Keep the activity light-hearted and fun.16 (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 23) Essa orientação define que, ao utilizar a mesma curva entoacional como indicada pela figura, os alunos vão soar bem educados. Esse ponto é interessante pois, como define Cagliari (2007, p. 180), “as diferenças de significado carreadas pela entoação fazem parte da gramática da língua”. Ou seja, não só há uma informação passada pela entoação de cunho social, como exposta pelo livro, mas também de cunho gramatical. Nesse sentido, expor os alunos a essas informações desde o início dos estudos é valioso, pois abre caminho para que percebam e entendam as nuances que a entoação gera na fala. 16 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono. Toque a gravação. Foque a atenção dos alunos nas setas de acento e entoação. Toque a gravação novamente. Os alunos seguem o padrão de acentuação e acento realçados. Encoraje uma boa imitação da gravação – isso deve ajudar os alunos a soar bem educados. Pratique os diálogos pela sala. Mantenha a atividade de forma leve e divertida”. 53 Figura 9 - Página 23 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS (2009) No exercício referente à página 31, o mesmo da figura 1, os alunos devem repetir as conversas feitas na atividade, que toma a página inteira, prestando atenção aos acentos e à entoação. Nenhuma outra explicação ou outro apoio são fornecidos para os alunos e para o professor. Podemos ver a orientação dada no livro do professor a seguir: “Read through the Music of English box as a class. Play the recording. Students listen and repeat paying special attention to stress patterns and intonation, following the model as closely as possible.17” (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 32). 17 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono. Toque a gravação. Os alunos ouvem e repetem, prestando atenção aos padrões de acento e entoação, seguindo o modelo da melhor forma possível”. 54 É salutar questionar a eficácia dessa prática, afinal, aspectos fonológicos como a estrutura de acentos e os padrões de entoação não são simples de apreender conscientemente, mesmo em nossa língua materna. Ainda que os falantes de uma língua tenham internalizados os padrões acentuais e entoacionais de seu idioma, esse é um conhecimento, a princípio, inconsciente, e qualquer professor que tenha ensinado alunos de Ensino Fundamental a reconhecer a sílaba tônica das palavras sabe que essa é uma tarefa muito mais simples na teoria do que na prática. Se perceber esses aspectos fonológicos já pode ser difícil quando se trata da língua materna do aluno, no caso de uma língua estrangeira a dificuldade aumenta ainda mais. Não obstante, o exercício exige que os alunos (provavelmente sem treinamento linguístico adequado) percebam os dois elementos (acento e entoação) ao mesmo tempo, enquanto ainda tentam lidar com as trocas de turno entre interlocutores em quatro diálogos diferentes. O exercício poderia ser muito produtivo caso mais tempo e explicações sobre a natureza dos sons da língua fossem dados, mas novamente é uma atividade que é apresentada apenas ao término da lição, em poucos minutos e em caráter paralelo a outras atividades, como as com enfoque textual, como veremos nos exemplos da figura 10. Figura 10 - Página 31 do livro do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS (2009) No exercício referente à página 39, ocorre uma nova oportunidade para trabalhar acento e entoação. Nesse exercício, as explicações para o professor são mais detalhadas, como podemos ver na seguinte orientação: Read the music of English box as a class. Check students’ understanding of on the corner by asking them to find the bakery on the map and say where it is. Draw students’ attention to the intonation arrows. Write excuse me. Is there a drugstore near here? Yes, it’s over there, on the board [with intonation arrows]. Play the recording, following the words with your finger as the recording plays. Students listen and repeat. Explain to them that this is the “music of English.” Encourage them to copy the model as closely as possible, and to exaggerate the intonation and stress. Practice the second 55 example. Drill the questions and answers in open pairs across the class. Students continue practicing in pairs.18 (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 41) Figura 11 - Página 39 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS (2009) No exercício referente à página 47, ocorre mais uma oportunidade para desenvolver a entoação. As orientações para o professor apenas reforçam a técnica que já vem sendo trabalhada durante o livro: Read through the music of English box as a class, focusing on the stress highlighting, lining lines, and intonation arrows. Play the recording. Students listen and repeat, producing the stress, word linking and intonation in a natural way.19 (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 50) 18 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono. Confira a compreensão dos alunos de on the corner pedindo a eles que encontrem a padaria no mapa e digam onde ela fica. Direcione a atenção dos alunos para as flechas de entoação. Escreva Excuse me. Is there a drugstore near here? Yes, it’s over there. na lousa [com flechas de entoação]. Toque a gravação, seguindo as palavras com seu dedo conforme ela toca. Os alunos ouvem e repetem. Explique a eles que isso é a “música do inglês”. Encoraje-os a copiar o modelo da melhor forma possível e exagerar na entoação e nos acentos. Pratique o segundo exemplo. Treine as perguntas e respostas em pares pela sala. Os alunos continuam praticando em pares”. 19 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono, focando nos realces de acento, linhas de ligação e flechas de entoação. Toque a gravação. Os alunos ouvem e repetem, produzindo os acentos, as ligações entre palavras e a entoação de forma natural”. 56 Figura 12 - Página 47 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS, (2009) No exercício referente à página 61, o aluno precisa escolher uma conversa exposta no exercício que o acompanha na mesma página e o próprio aluno deve prestar atenção aos acentos e à entoação. Observando as orientações ao professor, podemos reiterar a crítica feita com relação à figura 1: Read the music of English box as a class. Using the recording as a model, drill the sentences in conversation 5, paying particular attention to stress and intonation. Get three students to take a role each and act out the conversation to the class. Put students in pairs and ask them to choose a different conversation (avoid 1 as it is a song). With weaker students allocate conversations 2, 3, 4, 6 and 7. Students practice, paying close attention to stress and intonation. Students take turns acting out their conversations to the class.20 (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 70) Figura 13 - Página 61 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS, (2009) 20 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono. Usando a gravação como um modelo, treine as orações na Conversa 5, prestando atenção no acento e na entoação. Escolha 3 alunos para representar os papéis para a turma. Coloque os alunos em pares e peça para que eles escolham uma conversa diferente (evite a 1 por ser uma música). Com os alunos mais fracos, distribua as conversas 2, 3, 4, 6, e 7. Os alunos praticam, prestando atenção ao acento e à entoação. Os alunos fazem turnos representando para a turma”. 57 No exercício referente à página 69, ocorre mais uma vez um trabalho voltado para a entoação, mantendo a mesma técnica exposta nos outros exercícios de entoação em que há indicativos de setas. O livro do professor apenas pede para que se preste atenção aos detalhes gráficos do exercício e que se façam repetições da melhor forma possível: Read through the music of English box as a class. Play the recording. Tell students to listen carefully, paying special attention to the intonation and stress highlighting. Students listen and repeat each request, closely following the polite intonation. If necessary, give students further practice with the questions and answers in Exercise 2. (MARIS; SOARS; SOARS, 2009, p. 78)21 Figura 14 - Página 69 do livro American Headway, apresentando um dos exercícios de pronúncia. Fonte: SOARS; SOARS, (2009) Por fim, o último exercício do livro, referente à página 77, simplesmente pede para que os alunos pratiquem acento e entoação. Porém, dessa vez, as instruções são ainda mais vagas: “Pratique a conversação com seu parceiro. Preste atenção ao acento e à entoação”. (tradução nossa). As orientações para o professor também são sucintas e não expressam nenhum objetivo a ser atingido em relação ao trabalho de todo o livro em relação à pronúncia: 21 “Leia a caixa de Music of English com todos os alunos em uníssono. Toque a gravação. Peça aos alunos que ouçam atenciosamente, prestando mais atenção à entoação e ao enfoque do acento. Os alunos ouvem e repetem cada pedido, seguindo à risca a entoação educada. Se necessário, deixe os alunos praticarem mais com as pergu