Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de Ciências Farmacêuticas Programa de Biocências e Biotecnologia aplicadas à Farmácia JUNYA DE LACORTE SINGULANI Pesquisa de novas terapias e de biomarcadores na paracoccidioidomicose: estudo da atividade antifúngica e toxicidade de galatos de alquila em modelos alternativos e camundongos e identificação de microRNAs circulantes Araraquara 2017 JUNYA DE LACORTE SINGULANI Pesquisa de novas terapias e de biomarcadores na paracoccidioidomicose: estudo da atividade antifúngica e toxicidade de galatos de alquila em modelos alternativos e camundongos e identificação de microRNAs circulantes Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Biociências e Biotecnologia aplicadas à Farmácia da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” como pré- requisito para obtenção do título de Doutor. Orientadora: Profa. Dra. Maria José Soares Mendes Giannini Coorientador: Prof. Dr. Francisco Javier Enguita Araraquara 2017 JUNYA DE LACORTE SINGULANI Pesquisa de novas terapias e de biomarcadores na paracoccidioidomicose: estudo da atividade antifúngica e toxicidade de galatos de alquila em modelos alternativos e camundongos e identificação de microRNAs circulantes Tese de Doutorado apresentada à Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual Paulista – UNESP, Campus de Araraquara como requisito para obtenção do título de Doutor(a) em Biociências e Biotecnologia aplicadas à Farmácia Araraquara, 10 de fevereiro de 2017. BANCA EXAMINADORA AGRADECIMENTOS A Deus pelo amor incondicional e graça, e pelas pessoas e oportunidades colocadas em meu caminho. Aos meus pais Jesus e Antônia (in memorian) pelo amor, por terem sido grandes exemplos de humildade e honestidade, e pelos valores deixados para que eu pudesse prosseguir. À minha família, em especial aos meus irmãos, Cláudia, Emiliana, Roberto e Rafaela, sobrinhos e cunhados pelas orações e torcida para a realização dos meus objetivos e por sempre poder contar com vocês. Ao meu esposo Rafael pelo companheirismo, paciência e ajuda nas dúvidas da vida e em química. À profa. Dra. Maria José Soares Mendes Giannini pela oportunidade, orientação, ensinamentos e por ser um exemplo de profissional. À Profa. Dra. Ana Marisa Fusco Almeida pela colaboração, apoio e disponibilidade em me ajudar. Ao Prof. Dr. Francisco Javier Enguita e à Dra. Marina Célia Costa por me receberem em seu laboratório na Universidade de Lisboa e por toda ajuda nos experimentos com os microRNAs. Ao Prof. Luís Octávio Regasini pela síntese e fornecimento dos compostos. Ao Prof. Marlus Chorilli e a Dra. Patrícia Bento pelo preparo do sistema lipídico nanoestruturado e incorporação dos compostos. Aos amigos do laboratório de Micologia Clínica e Núcleo de Proteômica: Ana (Espanha), Bruna, Carol (MG), Carol (Panta), Carol (Tatoo), Cláudia, Fernanda Gullo, Fernanda Sangalli, Haroldo, Janaina, Jaqueline, Julhiany, Kaila, Liliana, Luana, Mariana, Mônica, Natália, Nayla, Patrícia (Laranja), Paulo, Priscila, Regina, Rodrigo, Rosana, Rosângela, Suélen, Tatiane e Wanessa. Agradeço-lhes muito por cada palavra, atenção, incentivo, pela cooperação nas dúvidas e nos experimentos, pelas caronas e confraternizações. Em especial agradeço à Liliana pela amizade e disponibilidade em me orientar e ajudar nos experimentos com os modelos invertebrados. Ao Paulo pelos conselhos e ajuda com os cuidados e experimentos com zebrafish. À Cláudia pelas conversas, por ser sempre prestativa e pelo preparo das células. À Julhiany pelos direcionamentos, principalmente com os microRNAs. À Rosângela pelos momentos de descontração e colaboração na infecção dos camundongos e na obtenção de soros. Às “Feinhas” Carol (MG) e Luana pela amizade em diferentes circunstâncias e motivação. Às amigas do grupo zebrafish Ana (Espanha), Fernanda Gullo, Mariana e Natália por toda cumplicidade e cooperação. À Rosana que me deu a oportunidade da minha primeira orientação, mas que com enorme gentileza, me ensinou muito também. À Mônica e Priscila pelas conversas, risadas e por sempre me acolherem em sua casa. Aos funcionários da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (UNESP) pelos serviços prestados. À banca representada pelo Prof. Dr. Daniel de Assis Santos (UFMG), Profa. Dra. Nádia Rezende Barbosa Raposo (UFJF), Profa. Dra. Cláudia Vianna Maurer Morelli (UNICAMP) e Prof. Dra. Valeria Velente (UNESP) pela atenção dispensada na leitura deste trabalho e contribuições. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e, posteriormente, à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP - processo nº 2014/10446-9) pela bolsa de doutorado no país concedida. À CAPES/FCT (processo nº 345/13) pela bolsa de doutorado sanduíche concedida. A todos aqueles que, embora não nomeados, me brindaram com seus inestimáveis apoios em distintos momentos e independente de distância física, o meu reconhecido e carinhoso muito obrigada! RESUMO A paracoccidioidomicose (PCM) é uma micose sistêmica causada por fungos do gênero Paracoccidioides e endêmica na América Latina. Três aspectos são de grande importância nessa doença: o desenvolvimento de antifúngicos e modelos alternativos para estudo dos mesmos e a busca de biomarcadores para o diagnóstico. O número de antifúngicos disponíveis é restrito, e problemas como efeitos adversos, interações medicamentosas e a ocorrência de isolados fúngicos resistentes são descritos. Neste contexto, a busca por novos compostos tem aumentado. Adicionalmente, modelos animais alternativos como Caenorhabditis elegans, zebrafish (Danio rerio) e Galleria mellonella são utilizados para o estudo de novos fármacos de forma simples e em grande escala. Neste trabalho, utilizou-se desses modelos para avaliação da eficácia antifúngica e toxicidade do ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila (galatos). O composto com melhor atividade nesses modelos foi testado em camundongos. O galato de dodecila apresentou melhor eficácia e menor toxicidade no modelo C. elegans – C. albicans e menor efeito tóxico em embriões de zebrafish. Entretanto, em G. mellonella e camundongos infectados com Paracoccidioides, o composto não apresentou eficácia antifúngica, o que pode ser decorrente de sua baixa biodisponibilidade. Para resolver tal problema, os galatos foram associados a um sistema lipídico nanoestruturado. Tal associação foi benéfica, resultando em menor toxicidade em fibroblastos pulmonares e em zebrafish, bem como em maior eficácia em modelo murino. Outro aspecto deste estudo diz respeito à pesquisa de microRNAs para PCM. MicroRNAs são pequenos RNAs não-codificantes que desempenham funções em processos biológicos e doenças. Assim, com auxílio da qPCR-RT, oito microRNAs mostraram-se diferencialmente expressos no soro de pacientes com PCM crônica. Já em células pulmonares, distintos microRNAs foram observados de acordo com a espécie filogenética de Paracoccidioides sp. que as infectou. Os microRNAs encontrados parecem estar relacionados a processos de adesão, apoptose e resposta imune à infecção e podem servir como biomarcadores e ferramentas terapêuticas da doença. Palavras-chave: Paracoccidioides sp. Modelos In vivo. Eficácia. Toxicidade. MicroRNAs. ABSTRACT Paracoccidioidomycosis (PCM) is a systemic mycosis caused by the fungi of the genus Paracoccidioides, which is endemic in Latin America. Three aspects are of great importance in this disease: the development of new antifungals and the use of alternative models for their study and also, the search of biomarkers for diagnosis. The number of antifungal agents available is restricted, and problems such as adverse effects, drug interactions and the development of resistance are related to them. In this context, the search for new compounds has increased. In addition, alternative animal models such as Caenorhabditis elegans, zebrafish (Danio rerio) and Galleria mellonella have been used for the study of new drugs in a simple and large scale manner. In this work, these models were used to evaluate the antifungal efficacy and toxicity of gallic acid and its alkyl esters derivatives (gallates). The compound with the best activity in these models was tested in mice. Dodecyl gallate presented better efficacy and lower toxicity in the C. elegans - C. albicans model and lower toxic effect in zebrafish embryos. However, in G. mellonella and in mice infected with Paracoccidioides sp., the compound showed no antifungal efficacy, which may be explained due to its low bioavailability. To resolve such a problem, gallates were associated with a nanostructured lipid system. Such association was beneficial, resulting in lower toxicity in lung fibroblasts and zebrafish, as well as in greater efficacy in the murine model. Another aspect of this study concerns the investigation of microRNAs for PCM. MicroRNAs are small non-coding RNAs that perform functions in biological processes and diseases. Thus, with the aid of RT-qPCR, eight microRNAs were differentially expressed in the serum of patients with chronic PCM. In the lung cells, distinct microRNAs were observed according to a phylogenetic species of Paracoccidioides sp. that infected them. The microRNAs found in appear to be related to the processes of adhesion, apoptosis and immune response to the infection and can serve as biomarkers and therapeutic tools of the disease. Keywords: Paracoccidioides sp. In vivo models. Efficacy. Toxicity. microRNAs. LISTA DE FIGURAS Figura 1. Incidência da paracoccidioidomicose nas América do Sul e Central........................................................................................... 23 Figura 2. Imagens representativas dos animais alternativos e número de publicações entre os anos de 1994 e 2014 na base de dados Pubmed com as palavras chave Caenorhabditis elegans (A), Galleria mellonella (B) e zebrafish (C)........................................... 32 Figura 3. Curva de sobrevivência (A) e curva concentração-resposta (B) do C. elegans infectado com C. albicans (Ca) tratado com anfotericina B (AMB) em concentrações variando de 0,1 a 5 µg/mL............................................................................................. 57 Figura 4. Estrutura química do ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila............................................................................................ 58 Figura 5. Curva de sobrevivência e curva concentração-resposta do C. elegans infectado com C. albicans (Ca) tratado com ácido gálico (GAL) e galatos de hexila (HEX), octila (OCT) e dodecila (DOD). 61 Figura 6. Larvas de C. elegans viáveis e mortas (L4) nas imagens de campo claro e larvas mortas marcadas com SYTOX® Green nas imagens de fluorescência. Larvas infectadas e não tratadas (A e D); larvas infectadas e tratadas com 5 µg/mL de anfotericina B (B e E) e larvas infectadas e tratadas com 30 µg/mL do galato de dodecila (C e F)........................................................................ 62 Figura 7. Curva de sobrevivência e curva concentração-resposta 48 hpf de embriões de zebrafish tratado com ácido gálico (GAL) e galatos de hexila (HEX), octila (OCT) e dodecila (DOD)............... 65 Figura 8. Imagens representativas do desenvolvimento embriônico de zebrafish às 5 (A), 24 (B) e 48 hpf (C). Exemplo de má formação (coagulação de óvulo fertilizado) causada pela exposição a 15 µg/mL do galato de octila (D)........................................................ 67 Figura 9. Curva de sobrevivência de larvas de G. mellonella infectadas com P. brasiliensis (Pb) e P. lutzii (Pl) tratadas com diferentes doses de anfotericina B (AMB) e itraconazol (ITRA)..................... 70 Figura 10. Carga fúngica de larvas de G. mellonella infectadas com P. brasiliensis (Pb) e P. lutzii (Pl) tratadas com 2 mg/Kg de anfotericina B (AMB) e 44 mg/Kg de itraconazol (ITRA)............... 73 Figura 11. Avaliação histopatológica de G. mellonella após 48 h (40x). (A) Larva não infectada; (B) Larva infectada com P. brasiliensis e tratada com (C) anfotericina B 2 mg/Kg e (D) itraconazol 44 mg/Kg; (E) Larva infectada com P. lutzii e tratada com (F) anfotericina B 2 mg/Kg e (G) itraconazol 44 mg/Kg...................... 74 Figura 12. Densidade de hemócitos de larvas de G. mellonella não infectadas (PBS) e infectadas com P. brasiliensis (Pb) e P. lutzii (Pl) tratadas com 2 mg/Kg de anfotericina B (AMB) e 44 mg/Kg de itraconazol (ITRA)..................................................................... 76 Figura 13. Curva de sobrevivência de larvas de G. mellonella infectadas com P. brasiliensis (Pb) e P. lutzii (Pl) tratadas com 160 mg/Kg dos galatos de octila (OCT) e dodecila (DOD).............................. 77 Figura 14. Carga fúngica de larvas de G. mellonella infectadas com P. brasiliensis (Pb) e P. lutzii (Pl) tratadas com 160 mg/Kg dos galatos de octila (OCT) e dodecila (DOD)..................................... 77 Figura 15. Densidade de hemócitos de larvas de G. mellonella não infectadas (PBS) e infectadas com P. brasiliensis (Pb) e P. lutzii (Pl) tratadas com 160 mg/Kg dos galatos de octila (OCT) e dodecila (DOD).............................................................................. 78 Figura 16. Carga fúngica do pulmão de camundongos Balb/c infectados com P. brasiliensis (Pb) e tratados com 5 mg/Kg de itraconazol (ITRA) e 5 mg/Kg e 50 mg/Kg do galato de dodecila (DOD)......... 81 Figura 17. Diagrama de fases segundo regiões observadas no sistema lipídico nanoestruturado desenvolvido.......................................... 83 Figura 18. Citotoxicidade do galato de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) associados a um sistema lipídico nanoestruturado (SLN) em fibroblastos pulmonares.......................................................... 91 Figura 19. Citotoxicidade dos galato de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) associados a um sistema lipídico nanoestruturado (SLN) em células de hepatoma humano................................................. 92 Figura 20 Curva de sobrevivência e curva concentração-resposta 120 hpf de embriões de zebrafish tratado com galato de octila (OCT) associado a um sistema lipídico (SLN)......................................... 96 Figura 21. Curva de sobrevivência e curva concentração-resposta 120 hpf de embriões de zebrafish tratado com galato de dodecila (DOD) associado a um sistema lipídico (SLN)......................................... 97 Figura 22. Curva de sobrevivência de larvas de G. mellonella infectadas com P. brasiliensis tratadas com 20 mg/Kg do galatos de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) associados ao sistema lipídico nanoestruturado (SLN)......... 99 Figura 23. Carga fúngica do pulmão de camundongos Balb/c infectados com P. brasiliensis (Pb18) e tratados com 5 mg/Kg de itraconazol (ITRA), 20 mg/Kg do galato de dodecila (DOD) sozinho e associado ao sistema lipídico nanoestruturado (SLN).. 101 Figura 24. Volcano plot dos miRNAs circulantes detectados em pacientes com paracoccidioidomicose em comparação com os controles saudáveis. MiRNAs com expressão elevada e com expressão reduzida são mostrados em vermelho e verde, respectivamente. MiRNAs estatisticamente significantes são representadas com os seus nomes descritos no miRBase.......................................... 111 Figura 25. Interação entre os miRNAs com expressão elevada (indicados pelos quadrados) e genes (indicados pelos círculos) dos soros de pacientes com PCM................................................................. 112 Figura 26. Diagrama Venn com miRNAs comuns nos pneumócitos infectados com as diferentes linhagens filogenéticas do gênero Paracoccidioides com expressão reduzida (à esquerda) e com expressão elevada (à direita)........................................................ 120 Figura 27. Predição das vias (descritas nos retângulos brancos) e genes (destacados em vermelho) nas quais os microRNAs detectados no processo de interação pneumócitos-Paracoccidioides estão envolvidos...................................................................................... 121 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Concentração inibitória mínima (µg/mL) do ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila contra C. albicans e espécies de Paracoccidioides......................................................................... 59 Tabela 2. Concentração letal 50% (µg/mL) do ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila em modelo de embriões de zebrafish...................................................................................... 66 Tabela 3. Valores das médias e desvio-padrão dos tamanhos das partículas e IPD para o sistema lipídico nanoestruturado (SLN), bem como para os compostos galato de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) incorporados no sistema.................... 85 Tabela 4. Valores das médias e desvio-padrão do potencial zeta do sistema lipídico nanoestruturado (SLN), bem como para os compostos galato de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) incorporados no sistema............................................................. 86 Tabela 5. Concentração inibitória mínima (CIM - µg/mL) do galato de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) associados a um sistema lipídico nanoestruturado (SLN) contra espécies de Paracoccidioides......................................................................... 88 Tabela 6. Concentração inibitória 50% (CI50 - µg/mL) do galato de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) associados a um sistema lipídico nanoestruturado (SLN) em fibroblastos pulmonares (MRC5) e células de hepatoma humano (HepG2)...................... 93 Tabela 7. Concentração letal 50% (CL50 - µg/mL) do galato de octila (OCT) e galato de dodecila (DOD) associados ao sistema lipídico nanoestruturado (SLN) em modelo de embriões de zebrafish...................................................................................... 95 Tabela 8. Quantificação dos parâmetros hepáticos e renais em soro de camundongos tratados com galato de dodecila (DOD) sozinho e associado ao sistema lipídico nanoestruturado (SLN)............. 103 Tabela 9. miRNAs diferencialmente expressos em pacientes com paracoccidiodomicose................................................................. 110 Tabela 10. Vias reguladas pelos miRNAs e genes alvos em pacientes com paracoccidioidomicose........................................................ 113 Tabela 11. miRNAs diferencialmente expressos em células A549 (pneumócitos) infectados com P. lutzii 01................................... 117 Tabela 12. miRNAs diferencialmente expressos em células A549 (pneumócitos) infectados com P. lutzii 02................................... 118 Tabela 13. miRNAs diferencialmente expressos em células A549 (pneumócitos) infectados com P. lutzii 18................................... 119 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ALT - Alanina aminotransferase AMB - Anfotericina B ANOVA - Análise de variância AST - Aspartato aminotransferase ATCC - American Type Culture Collection BHI - Brain Heart Infusion ºC - Graus Celsius Ca - Candida albicans cDNA - Ácido desoxirribonucléico complementar CI50 - Concentração inibitória 50% CIM - Concentração inibitória mínima CL50 - Concentração letal 50% CLSI - Clinical and Laboratory Standards Institute DMSO - Dimetilsulfóxido DOD - Galato de dodecila EBP - Estradiol binding protein FA - Fase aquosa FO - Fase oleosa G - Gramas GAL - Ácido gálico GO - Gene Ontology gp43 - Glicoproteína de 43kDa h – Hora hpf - Horas pós-fertilização HepG2 - Células de hepatoma humano HEX - Galato de hexila IP - Intraperitoneal IPD - Índice de polidispersidade ITRA - Itraconazol KEGG - Kyoto Encyclopedia of Genes and Genomes Kg - Kilogramas L - Litros M - Molar MAPKs - Quinases ativadoras de mitógenos MCTI - Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação MEC - Matriz extracelular mg - Miligramas min - Minutos mL - Mililitros MOPS - Ácido morfolinopropanosulfônico mV - Milivolts NAC - Núcleo de Atendimento à Comunidade npcRNAs - Ácido ribonucléico não codificador de proteínas nm - Nanômetros NGM - Nematode growth media OCT - Galato de octila PAS - Ácido periódico-Schiff Pb - Paracoccidioides brasiliensis PBS - Phosphate buffered saline PCM - Paracoccidioidomicose PCR - Reação em cadeia da polimerase Pl - Paracoccidoides lutzii RENAMA - Rede Nacional de Métodos Alternativos ao uso de animais RISC - Complexo de Indução de silenciamento do RNA RNA - Ácido ribonucléico RNAm - Ácido ribonucléico mensageiro rpm - Rotações por minuto RPMI - Roswell Park Memorial Institute s - Segundos SF - Separação de Fases SLN - Sistema lipídico nanoestruturado SLT - Sistemas Líquido-Transparentes SVO - Sistemas Viscosos e Opacos SVST - Sistema viscoso semi transparente SVT - Sistema viscoso transparente T - Tensoativo TGF-β - Fator de crescimento transformante β TGO - Transaminase glutâmica TGP - Transaminase glutâmica TNF - Fator de necrose tumoral UFC - Unidades formadoras de colônia µg - Microgramas μL - Microlitros μM – Micromolar vs - Versus SUMÁRIO CAPÍTULO 1 ............................................................................................................. 21 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 22 1.1. Paracoccidioides sp e paracoccidioidomicose (PCM) ........................................ 22 1.2. Diagnóstico da PCM ........................................................................................... 26 1.3. Tratamento da PCM ........................................................................................... 27 1.4. Pesquisa de produtos naturais e seus derivados sintéticos como novos tratamentos ............................................................................................................... 29 1.4.1. Ácido gálico e seus derivados ésteres ............................................................ 30 1.5. Pesquisa de modelos animais alternativos para o estudo da infecção fúngica e de antifúngicos .......................................................................................................... 31 1.5.1. Caenorhabditis elegans ................................................................................... 34 1.5.2. Galleria mellonella ........................................................................................... 36 1.5.3. Zebrafish (Danio rerio) ..................................................................................... 37 1.6. Pesquisa de microRNAs como potenciais biomarcadores para diagnóstico e tratamento ................................................................................................................. 38 2. JUSTIFICATIVA .................................................................................................... 41 PARTE I: Avaliação da atividade antifúngica e toxicidade de galatos de alquila em modelos animais alternativos e camundongos .......................................................... 42 3. OBJETIVOS .......................................................................................................... 42 3.1. Objetivo geral ..................................................................................................... 42 3.2. Objetivos específicos ......................................................................................... 42 4. MATERIAIS E MÉTODOS..................................................................................... 43 4.1. Fungos e condições de cultivo ........................................................................... 43 4.2. Fármacos e compostos ...................................................................................... 44 4.3. Interação entre C. elegans e fungos e avaliação de fármacos e compostos no modelo ...................................................................................................................... 44 4.4. Ensaio de toxicidade dos compostos em embriões de zebrafish ....................... 45 4.5. Interação entre G. mellonella e fungos e avaliação de fármacos e compostos no modelo ...................................................................................................................... 46 4.6. Determinação da carga fúngica em G. mellonella .............................................. 47 4.7. Avaliação histológica de G. mellonella ............................................................... 47 4.8. Determinação da densidade de hemócitos de G. mellonella.............................. 48 4.9. Infecção dos camundongos para a avaliação de um galato de alquila .............. 48 4.10. Associação dos galatos ao sistema nanoestruturado lipídico .......................... 49 4.11. Caracterização dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado .. 50 4.12. Atividade fúngica in vitro dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado ........................................................................................................ 51 4.13. Citotoxicidade dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado ... 53 4.14. Modelos animais alternativos para a avaliação dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado ............................................................................... 54 4.15. Infecção dos camundongos para a avaliação de um galato associado ao sistema lipídico nanoestruturado ............................................................................... 54 4.16. Análise bioquímica e do peso dos animais ....................................................... 55 4.17. Análise estatística ............................................................................................ 55 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................. 56 5.1. Toxicidade e eficácia em C. elegans do ácido gálico e galatos .......................... 56 5.3. Toxicidade e eficácia em G. mellonella do ácido gálico e galatos ...................... 69 5.4. Eficácia em modelo murino do galato de dodecila ............................................. 79 5.5. Caracterização dos galatos associados à nanopartícula ................................... 82 5.6. Atividade antifúngica dos galatos associados à nanopartícula ........................... 88 5.7. Citotoxicidade dos galatos associados à nanopartícula ..................................... 90 5.8. Toxicidade em zebrafish dos galatos associados à nanopartícula ..................... 94 5.9. Toxicidade e eficácia em G. mellonella dos galatos associados à nanopartícula ............................................................................................................. 99 5.10. Toxicidade e eficácia em camundongos do galato de dodecila associados à nanopartícula ........................................................................................................... 101 6. CONCLUSÕES ................................................................................................... 104 PARTE II: Avaliação da expressão de microRNAs na PCM.................................... 107 7. OBJETIVOS ........................................................................................................ 107 7.1. Objetivo geral ................................................................................................... 107 7.2. Objetivos específicos ....................................................................................... 107 8. MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................... 107 8.1. Extração dos RNAs de soros ........................................................................... 107 8.2. Extração dos RNAs das células infectadas ...................................................... 108 8.3. Síntese da primeira fita e análise quantitativa por PCR Real-Time .................. 109 8.4 Análise bioinformática ....................................................................................... 110 9. RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................... 110 9.1. MiRNAs no soro de pacientes com paracoccidioidomicose ............................. 110 9.2. MiRNAs na interação pneumócitos-Paracoccidioides ...................................... 117 10. CONCLUSÕES ................................................................................................. 123 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 124 CAPÍTULO 2 ........................................................................................................... 142 1. PRODUÇÃO CIENTÍFICA ................................................................................... 143 1.1. Artigos publicados como primeira autora ...................................................... 143 1.2. Artigos publicados como co-autora ............................................................... 143 21 CAPÍTULO 1 22 1. INTRODUÇÃO 1.1. Paracoccidioides sp e paracoccidioidomicose (PCM) O gênero Paracoccidioides pertence ao grupo de fungos termo-dimórficos, que podem ser encontrados na forma de micélio a temperaturas próximas a 25 °C e na forma de levedura a temperaturas em torno de 37 °C. As colônias de micélio apresentam, macroscopicamente, coloração branca com micélios aéreos, irregulares e curtos; microscopicamente, notam-se hifas septadas, delgadas e hialinas com raros clamidósporos terminais ou intercalares. Já as colônias leveduriformes têm coloração creme, aspecto cerebriforme e não aderente ao meio; ao microscópio observam-se leveduras esféricas ou ovais com paredes bem definidas e bi- refrigentes, que podem apresentar múltiplos brotamentos (formato de roda de leme) (MARTINEZ, 2004). O fungo foi isolado pela primeira vez por Adolfo Lutz, em 1908, a partir de lesões orais e linfadenopatia cervical de um paciente. Em 1912, Alfonso Splendore realizou a caracterização morfológica e biológica do fungo e o denominou de Zymonema brasiliensis. Posteriormente, em 1930, Floriano Paulo Almeida, propôs o nome de Paracoccidioides brasiliensis (MARTINEZ et al., 1996). Em 2006, através de estudos filogenéticos, P. brasiliensis pôde ser dividido em três espécies filogenéticas distintas, entre elas S1, PS2 e PS3. S1 (espécie 1) apresenta 38 isolados e encontra-se no Brasil, Argentina, Paraguai, Peru e Venezuela; PS2 (espécie filogenética 2) possui 6 isolados distribuídos no Brasil e Venezuela; e PS3 (espécie filogenética 3) possui 21 isolados restritos à Colômbia (MATUTE et al., 23 2006). Mais recentemente, a espécie filogenética PS4 foi descrita, sendo composta por isolados clínicos da Venezuela (SALGADO-SALAZAR et al., 2010; TEIXEIRA et al., 2014a). Além disso, estudos genômicos mostraram que a cepa 01 de P. brasiliensis não pôde ser incluída nesses grupos e foi considerada uma nova espécie denominada Paracoccidioides lutzii, em homenagem a Adolfo Lutz (CARRERO et al., 2008). As características individuais de cada espécie podem trazer consequências nas manifestações clínicas e para o tratamento e diagnóstico da infecção (TEIXEIRA et al., 2014b). Espécies de Paracoccidioides causam a paracoccidioidomicose (PCM), uma micose sistêmica humana que assume importância clínica cada vez maior, em razão do aumento de sua frequência, da gravidade de suas formas anátomo-clínicas e das taxas de mortalidade. A PCM é endêmica nas Américas do Sul e Central, nos quais Brasil, Venezuela e Colômbia são os países com maior número de casos (Figura 1). Nessas regiões, a taxa de incidência anual varia de 1 a 3 novos casos por 105 habitantes. Em países não-endêmicos como os da Europa, Ásia e América do Norte, alguns casos importados foram relatados (BOCCA et al., 2013; COUTINHO et al., 2002; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006). No Brasil, a PCM é a oitava causa de mortalidade entre as doenças infecciosas crônicas, com 1,65 óbitos por 106 habitantes. Entretanto, vale ressaltar que os dados de incidência podem estar subestimados, pelo fato da doença não ser de notificação compulsória. O país apresenta áreas endêmicas, as quais podem ser divididas segundo o grau de incidência da doença (Figura 1). Dessa forma, as regiões sudeste, sul e centro-oeste são descritas como altamente endêmicas; as 24 regiões localizadas ao longo da extremidade leste da Amazônia, incluindo os estados do Pará, Maranhão e Tocantins são considerados como moderadamente endêmicas; e as regiões do extremo-oeste da Amazônia, o estado de Rondônia e o Nordeste do país apresentam baixa endemicidade (BOCCA et al., 2013; COUTINHO et al., 2002; MARTINEZ et al., 2015; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006). Figura 1. Incidência da paracoccidioidomicose nas Américas do Sul e Central (Adaptado de SHIKANAI-YASUDA et al., 2006) O habitat do Paracoccidioides sp. na natureza parece ser a matéria orgânica presente nos solos de regiões endêmicas, especialmente em áreas de cultivo de café 25 e cana de açúcar (ARANTES et al., 2016; BONIFAZ et al., 2011; FERREIRA, 2009; SHIKANAI-YASUDA et al.., 2006). A infecção destes fungos ocorre na forma de micélio quando conídios ou fragmentos de hifas são dispersos no meio ambiente e, após inalação pelo hospedeiro, estas estruturas se diferenciam em formas leveduriformes. Esta transição de micélio para levedura mostra-se essencial para o estabelecimento do processo infeccioso, no qual o pulmão é o primeiro sítio de infecção e as leveduras podem se espalhar para outros órgãos (LACAZ, 1994). Os humanos foram os primeiros hospedeiros naturalmente infectados identificados, mas há descrições de outros animais portadores do fungo, como tatus e cães (FERREIRA, 2009; SHIKANAI-YASUDA et al., 2006). As formas clínicas da doença podem ser classificadas em aguda e crônica, dependendo do período e dos órgãos atingidos pela infecção. A forma aguda representa ao redor de 5% dos casos e afeta principalmente crianças, adolescentes e adultos jovens (com idade inferior a 30 anos), sendo homens e mulheres acometidos igualmente. Linfadenomegalia, hepatoesplenomegalia e lesões cutâneas são manifestações comuns. Já a forma crônica representa mais de 90% dos casos e homens adultos (30 a 50 anos), trabalhadores de zonas rurais e imunodeprimidos são os principais acometidos. Manifestações pulmonares estão presentes na maioria dos pacientes, porém outros órgãos como fígado, baço, mucosas, pele e sistema nervoso central podem ser afetados (FRANCO et al., 1987). De forma geral, os indivíduos acometidos por essa micose estão na fase de maior produtividade, e por isso a doença também possui um impacto social e econômico (SHIKANAI-YASUDA et al., 2006). As mulheres, normalmente, não desenvolvem a PCM graças à proteção 26 do 17-β-estradiol. Esse hormônio se liga à proteína fúngica EBP (estradiol binding protein) e como consequência, a sinalização ativada por esse processo inibe a transição da fase miceliar para a fase leveduriforme, patogênica, do Paracoccidioides sp. (SHANKAR et al., 2011). Além disso, o estradiol afeta a resposta imune, demonstrando que camundongos fêmeas foram mais protegidas da infecção por P. brasiliensis (PINZAN et al., 2010). 1.2. Diagnóstico da PCM O diagnóstico da PCM é baseado nos sintomas clínicos, seguido de exames laboratoriais. A técnica padrão-ouro consiste no exame micológico direto do material recolhido de lesões ou de tecido, no qual é feita a observação dos fungos, especialmente com o seu aspecto multibrotamento típico, bem como, a cultura com a observação do termodimorfismo (MENDES-GIANNINI; FUSCO-ALMEIDA, 2013; BENARD; MENDES-GIANNINI, 2014). Porém, a identificação do agente etiológico da PCM nem sempre é fácil e a confirmação pela reversão de levedura para forma miceliar é lenta (maior que 20 dias) (Da SILVA et al., 2016). Além disso, o diagnóstico da doença pode ser feito por métodos sorológicos, nos quais a glicoproteína de 43 kDa (gp43) secretada pelo fungo é o principal antígeno detectado no soro dos pacientes (VIDAL et al., 2014). A glicoproteína de 70 kDa, expressa pelo fungo, também é outro importante antígeno para o diagnóstico da PCM (De MATTOS GROSSO et al., 2003). A detecção e quantificação dos antígenos correlacionam também com a progressão da doença e resposta ao tratamento. Por outro lado, variabilidades nos resultados e na sensibilidade dos testes sorológicos, 27 além de reações cruzadas com outras infecções são observadas (Da SILVA et al., 2016). Assim, quando os métodos microscópico e sorológico falham, uma alternativa pode ser a detecção por métodos moleculares através da reação em cadeia da polimerase (PCR). Neste contexto, alguns primers para genes alvos como gp43, PbITS1s, PbITS3a e OPG18 foram descritos (BUITRAGO et al., 2009; GOMES et al., 2000; SAN-BLAS et al., 2005). 1.3. Tratamento da PCM A PCM requer tratamento prolongado, o qual pode ocorrer por mais de um ano. Os pacientes com essa micose são comumente tratados com anfotericina B, azóis (cetoconazol, itraconazol, fluconazol e voriconazol) e sulfonamidas (associação sulfametoxazol/trimetropim) (HAHN et al., 2002). Os antifúngicos estão disponíveis desde a década de 1950. No entanto, os desafios na descoberta e desenvolvimento de agentes eficazes e seguros, decorrente, sobretudo, da semelhança molecular entre as células de fungos e as de mamíferos, resultaram numa descoberta mais lenta dos antifúngicos em comparação aos antibacterianos ou antivirais. A evolução do limitado arsenal antifúngico disponível inicia-se pelos fármacos altamente tóxicos nistatina e anfotericina B, passando pelos amplamente utilizados triazóis até as recentes equinocandinas (OSTROSKY-ZEICHNER et al., 2010; PETRIKKOS; SKIADA, 2007). A anfotericina B pertence ao grupo poliênico dos agentes antifúngicos. Seu mecanismo de ação baseia-se na ligação ao ergosterol da membrana fúngica e conseqüente formação de poros na membrana, que causa distúrbios no equilíbrio 28 iônico celular (KAUFFMAN, 2006; RANG; DALE, 2007). Outro mecanismo de ação desse fármaco é a produção de espécies reativas de oxigênio e nitrogênio, causando estresse oxidativo e levando a célula à apoptose (FERREIRA et al., 2013; MESA- ARANGO et al., 2014). A anfotericina B apresenta boa eficácia contra P. brasiliensis e P. lutzii e tem sido utilizado principalmente em casos graves de PCM. Além disso, há poucos episódios de resistência micológica a esse fármaco. Por outro lado, a anfotericina B é administrada por via intravenosa e efeitos adversos importantes, por vezes, requerem a interrupção da terapia. A injeção normalmente resulta em calafrios, febre, zumbido, cefaléia e vômito. Porém, o efeito adverso mais comum e sério é nefrotoxicidade. Neste aspecto, algum grau de comprometimento renal é observado em mais de 80% dos pacientes que utilizam esse fármaco. Outros efeitos adversos como hepatotoxicidade, trombocitopenia e reações anafiláticas também podem ocorrer (KAUFFMAN, 2006; RANG; DALE, 2007). Os azóis, especialmente o itraconazol, têm sido utilizados em casos leves ou moderados da PCM. Eles inibem a enzima 3A do citocromo P450, lanosterol 14α- desmetilase, bloqueando a conversão do lanosterol em ergosterol. Tal fato altera a fluidez da membrana e, consequentemente, a replicação fúngica é inibida. De forma geral, essa classe de fármacos é eficaz contra vários fungos, podem ser administrados oralmente e apresentam efeitos adversos brandos (RANG; DALE, 2007). Entretanto, além de inibir as enzimas do citocromo P450 nos fungos, os azóis inibem essas enzimas responsáveis pelo metabolismo hepático de fármacos nos seres humanos. Em consequência, os azóis podem interagir com várias classes de fármacos anti-histamínicos, antineoplásicos, esteroides, antimicrobianos, 29 antirretrovirais, opióides, barbitúricos, agentes cardiovasculares, psicotrópicos e anticoncepcionais orais. Assim, a monitorização do paciente quando esses fármacos forem coadministrados se faz necessária (BATES; YU, 2003). Outro aspecto, é que esses antifúngicos são teratogênicos. Além disso, Hahn e colaboradores (2003) descreveram a ocorrência de isolados de P. brasiliensis resistentes ao cetoconazol em pacientes com PCM. Quando não há disponibilidade do itraconazol para o tratamento dos pacientes com PCM, realiza-se o tratamento com a combinação sulfametoxazol/trimetropim. Visto que o número de agentes antifúngicos é limitado e que os mesmos apresentam inúmeras desvantagens, nos últimos anos, houve um aumento do interesse em estudar novos compostos com potencial antifúngico (DERENGOWSKI et al., 2009). 1.4. Pesquisa de produtos naturais e seus derivados sintéticos como novos tratamentos Compostos presentes em extratos e óleos essenciais, produzidos pelas plantas como consequência do metabolismo secundário, possuem propriedades antimicrobianas reconhecidas empiricamente há séculos e comprovadas cientificamente nas últimas décadas. Dessa forma, países como o Brasil, que possuem uma flora diversificada e rica e tradição na utilização de plantas medicinais têm se dedicado à pesquisa de plantas nativas com atividades antimicrobianas (SARDI et al., 2016). Especificamente contra Paracoccidioides sp., alguns produtos naturais e derivados sintéticos como maitenina, pristimerina, eschinol, metil 30 linolenato, óxido de cariofileno, trans-nerolidol e curcumina mostraram atividade in vitro contra esse fungo (GULLO et al., 2012; JOHANN et al., 2010, 2012; MARTINS et al., 2009). Além desses, outros como 6-quinolinil N-óxido chalcona e ajoeno também apresentaram atividade anti - Paracoccidioides in vivo (De SÁ et al., 2015; MALUF et al., 2008). 1.4.1. Ácido gálico e seus derivados ésteres Um exemplo de um composto derivado do metabolismo secundário de plantas, sendo um produto da hidrólise de taninos, é o ácido gálico. Este composto é distribuído em várias espécies de plantas como Paeonia rockii, Astronium sp., Syzygium cumini, Euphorbia lunulata, Labisa pumila, Zingiber officinale, Klainedoxa gabonensis, Nervilia aragoana, Atlantia monophylla, Lawsonia inermis, Ardisia chinensis e Alchornea glandulosa, podendo ser extraído de folhas, caules, raízes ou frutos (CHOUBEY et al., 2015; SARDI et al., 2016). O ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila (galatos) têm sido descritos por apresentarem potencial antioxidante, antifúngico e antibacteriano (CHOUBEY et al., 2015; VAQUERO; ALBERTO; DE NADRA, 2007) . Kubo, Xiao e Kubo (2001), por exemplo, estudaram três derivados contra 16 microrganismos e observaram que o galato de octila exibiu atividade antifúngica contra Saccharomyces cerevisae, Zygosaccharomyces bailii, Candida albicans e Aspergillus niger. Recentemente, nosso grupo publicou a atividade in vitro de uma série de galatos de alquila contra fungos patogênicos humanos, incluindo P. brasiliensis e P. lutzii, no qual os galatos de hexila, heptila, octila, decila, undecila e dodecila apresentaram um valor baixo de concentração 31 inibitória mínima - CIM (De PAULA; SILVA et al., 2014). Além disso, vários galatos de alquila também demonstraram atividade contra fungos patogênicos de plantas (ITO et al., 2014). Dessa forma, apesar de se ter conhecimento do potencial antifúngico dos galatos in vitro, pouco se tem avançado em estudos in vivo com esses compostos. Além da busca por compostos com potencial antifúngico, novas formulações que garantam o aumento da eficácia e segurança desses compostos em sistemas de infecção in vitro e in vivo também têm sido estudadas. Diante dos avanços da nanotecnologia, as nanopartículas, as quais são constituídas por um pequeno número de átomos de dimensão menor que um mícron, têm se destacado como ótimos carreadores de moléculas (ISLAM; MIYAZAKI, 2009). Neste contexto, a incorporação de antifúngicos como anfotericina B, azóis e nistatina à nanopartículas contribuem para melhor liberação, biodisponibilidade e menor toxicidade desses fármacos (VOLTAN et al., 2016). 1.5. Pesquisa de modelos animais alternativos para o estudo da infecção fúngica e de antifúngicos Por questões éticas, custo elevado, novas exigências de proteção e consideração ao princípio dos 3 Rs (Refinement, Reduction, Replacement), o uso de animais mamíferos de experimentação está cada vez mais restrito ao mínimo necessário, o que gera a necessidade de padronização de modelos alternativos (RUSSELL; BURCH, 1959; HARTUNG, 2010). A promoção e validação dos modelos alternativos são bem difundidas na Europa, Estados Unidos e Japão. Já no Brasil, a 32 iniciativa é mais recente e merece destaque a implantação da Lei Arouca de 2008, cujo principal objetivo é zelar pela ética na utilização de animais em pesquisa e ensino, bem como preconizar o desenvolvimento de métodos alternativos. Além disso, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) criou a Rede Nacional de Métodos Alternativos ao uso de animais (RENAMA) em 2012. Métodos ou modelos alternativos têm por objetivo complementar ou substituir, os tradicionais testes com mamíferos na pesquisa biomédica ou ensino. Além de ensaios in vitro com células e in silico, eles incluem o uso de animais inferiores (HARTUNG, 2011). Neste contexto, cresce a importância da utilização de modelos experimentais como Caenorhabditis elegans, Galleria mellonella e zebrafish (Danio rerio), para estudo da interação patógeno-hospedeiro e de novos fármacos, os quais são objetos de estudo da presente tese. Tal fato pode ser evidenciado pelo aumento do número de publicações, a cada ano, em bases de dados como o Pubmed (Figura 2). 33 Figura 2. Imagens representativas dos animais alternativos e número de publicações entre os anos de 1994 e 2014 na base de dados Pubmed com as palavras chave Caenorhabditis elegans (A), Galleria mellonella (B) e zebrafish (C). Imagens adaptadas de ADAMS, 2008; BOTTHOF, 2015; ULAAH e colaboradores, 2014 34 1.5.1. Caenorhabditis elegans C. elegans é um nematóide de vida livre encontrado no solo, cujo uso apresenta uma série de vantagens em ensaios experimentais. Seu pequeno tamanho (1 mm de comprimento), o tempo de geração rápida e a facilidade de manutenção em laboratório permite sua produção barata e rápida (KALETTA; HENGARTNER, 2006). Outra vantagem é que seu genoma já foi totalmente sequenciado (PETERSON et al., 2008). Nesse aspecto, uma alta homologia genética e a conservação de aspectos biológicos como da resposta imune inata são observados entre esse nematóide e mamíferos (MILLET; EWBANK, 2004). Em relação aos fungos, a utilização do C. elegans como hospedeiro também é possível, desde que o fungo substitua adequadamente à sua fonte normal de alimentação, Escherichia coli OP50. Além disso, fenótipos como sobrevivência e motilidade do animal e a carga do patógeno podem ser facilmente examinados. Embora o C. elegans não possua nenhuma imunidade mediada por células, vários trabalhos revelaram uma abordagem complexa da imunidade inata para resistência a doenças, compreendendo barreiras físicas, moléculas antimicrobianas e vias reguladas por quinases ativadoras de mitógenos (MAPKs) e pelo fator de crescimento transformante β (TGF-β) (MARSH; MAY, 2012). A resposta à infecção por agentes patogênicos naturais do C. elegans tem sido descrita para o fungo Drechmeria coniospora, cuja rápida proliferação e formação de filamentos levam a morte do animal (JANSSON, 1994). Além disso, estudos têm demonstrado que fungos patogênicos humanos como C. albicans, C. krusei (PUKKILA-WORLEY et al., 2009; SCORZONI et al., 2013), C. neoformans 35 (MYLONAKIS et al., 2002), H. capsulatum (JONHSON et al., 2009) e Penicillium marneffei (HUANG et al., 2014) também podem infectar letalmente o C. elegans. Além do estudo da interação entre C. elegans e fungos, esse modelo também podem ajudar a identificar compostos que provavelmente não seriam identificados em ensaios in vitro ou seria dispendioso na utilização de mamíferos (BREGER et al., 2007). Alguns estudos utilizaram o modelo C. elegans para a triagem de compostos com potencial antifúngico contra C. albicans. Um estudo utilizou 1.266 compostos com atividades farmacêuticas conhecidas e identificou 15 que prolongaram a sobrevivência de nematóides infectados com C. albicans e inibiram a filamentação do fungo in vivo. Dois desses compostos, ácido cafeico fenetil éster e fluoroquinolona enoxacina, foram selecionados e posteriormente testados num modelo murino de candidíase e apresentaram atividade antifúngica também nesse modelo (BREGER et al., 2007). Outra triagem de produtos naturais também foi realizada com a utilização do modelo de C. elegans e C. albicans, no qual 12 saponinas derivadas de plantas revelaram ter propriedades antifúngicas. Duas delas interromperam a formação de hifas e de biofilme de cepas de C. albicans resistentes a antifúngicos (COLEMAN et al., 2010). Recentemente, dois produtos naturais, magnolol e ronokiol mostraram ser capazes de prolongar a sobrevivência do C. elegans infectado com C. albicans (SUN; LIAO; WHANG, 2015). Além disso, o produto natural timol mostrou potencial atividade contra C. albicans no modelo C. elegans (SHU et al., 2016). 36 1.5.2. Galleria mellonella G. mellonella é um inseto encontrado no ambiente, onde se alimenta de mel, pólen e cera de abelha. Ela também apresenta vantagens importantes como modelo de estudo fungo-hospedeiro: as larvas podem ser incubadas numa temperatura entre 25 e 37 °C, o que possibilita simular o habitat e também as condições de infecção em mamíferos; possuem seis tipos de células fagocíticas importantes no sistema de defesa denominadas hemócitos; e quantidades exatas dos patógenos podem ser administradas. Além disso, a viabilidade das larvas pode ser facilmente constatada pela falta de movimento e melanização induzida em resposta à infecção (DESALERMOS; FUCHS; MYLONAKIS, 2012; FUCHS et al., 2010; FUCHS; MYLONAKIS, 2006). O estudo da virulência de diferentes fungos como P. brasiliensis (SCORZONI et al., 2015), P. lutzii, Histoplasma capsulatum (THOMAZ et al., 2013), Cryptococcus neoformans (GARCÍA-RODAS et al., 2011), Fusarium spp (COLEMAN et al., 2011), Candida krusei, C. albicans (SCORZONI et al., 2013), Sporothrix schenckii, Sporothrix brasiliensis (CLAVIJO-GIRALDO et al., 2016) e espécies de Trichosporon (MARINÉ et al., 2015) tem sido realizado em G. mellonella com sucesso. No modelo G. mellonella, C. neoformans foi avaliado para os tratamentos com anfotericina B e fluconazol (MYLONAKIS et al., 2005). O tratamento de Fusarium spp com anfotericina B também foi eficaz nesse modelo animal não convencional (COLEMAN et al., 2011). A eficácia de fármacos antifúngicos contra C. albicans e C. krusei em G. mellonella também foi descrita (KELLY; KAVANAGH, 2011; SCORZONI et al., 2013). Recentemente, Favre-Godal e colaboradores (2014) testaram alguns 37 produtos naturais da classe das antraquinonas em larvas de G. mellonella infectadas com C. albicans, e embora os compostos tenham apresentado previamente atividade antifúngica in vitro, eles não foram eficazes nesse modelo in vivo. A combinação do produto natural pedaltina com anfotericina B se mostrou eficaz contra C. neoformans no modelo G. mellonella e em modelo murino (SANGALLI-LEITE et al., 2016). 1.5.3. Zebrafish (Danio rerio) Outro modelo animal alternativo utilizado neste trabalho é o zebrafish (Danio rerio), conhecido popularmente como “paulistinha”. Ele é um peixe nativo da Índia, pertencente à família Crypinidae, e que possui de 3 a 4 cm. Entre várias aplicações, esse modelo tem se mostrado conveniente para avaliar potenciais efeitos tóxicos de novos compostos sobre o desenvolvimento embrionário. A utilização de embriões de zebrafish mostra-se vantajosa porque os mesmos são pequenos, de forma que os testes podem ser feitos em placas de 24, 96 e até 384 poços e os embriões conseguem sobreviver por até sete dias nessas placas. Além disso, embriões e larvas absorvem com facilidade os compostos com os quais são colocados em contato. Outras vantagens é que os embriões são transparentes, o que permite a visualização do seu desenvolvimento, e a postura de um casal gera até 200 embriões (KANUNGO et al., 2014). Também é válido ressaltar que o genoma desse vertebrado já foi totalmente sequenciado, sendo demonstrado que 71,4% dos genes de zebrafish são ortólogos com os de humanos (HOWE et al., 2013). Assim, embora modelos mamíferos ainda sejam considerados padrão ouro para o estudo de efeitos teratogênicos, o zebrafish tem sido cada vez mais aceito como um modelo para 38 predição desses efeitos, sendo utilizado para nanopartículas e novos fármacos (KANUNGO et al., 2014). Neste aspecto, vários antifúngicos da classe dos azóis foram testados em embriões de zebrafish, onde, assim como em humanos, também se observou o potencial teratogênico dessa classe de fármacos (HERMSEN et al., 2012; JONG et al., 2011) No presente trabalho, pretendeu-se desenvolver os modelos C. elegans e G. mellonella para as espécies P. brasiliensis e P. lutzii. Além disso, pretendeu-se testar o ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila nesses modelos e no zebrafish, a fim de se fazer uma triagem, para posteriormente selecionar um deles para ser testado em mamífero. 1.6. Pesquisa de microRNAs como potenciais biomarcadores para diagnóstico e tratamento O reconhecimento do próprio fungo, de seus fatores de virulência e dos mecanismos de defesa do hospedeiro auxiliam no diagnóstico e terapia da PCM. Nesse contexto, a ação e interação de processos complexos, inclusive de regulação gênica por microRNAs, permitirá a melhor compreensão da patogenia. Nos últimos anos, a análise do transcriptoma tem gerado uma ampla gama de informações sobre RNAs relacionadas com diferentes mecanismos de regulação gênica, incluindo mecanismos epigenéticos. Tais RNAs não codificam proteínas (non-protein or peptide-coding ou npcRNAs), embora não seja possível excluir a possibilidade de que alguns deles codifiquem pequenos peptídeos (MERCER; DINGER; MATTICK, 2009; SHARP, 2009). Dados gerados por sequenciamento em 39 larga escala revelaram que npcRNAs excedem o número de genes codificadores de proteínas, indicando que o genoma humano é transcricionalmente muito mais ativo que foi anteriormente previsto. Os microRNAs ou miRNAs são pequenos RNAs (19 a 24 nucleotídeos) pertencentes a essa classe de npcRNAs pequenos e que regulam a expressão do gene, quer por degradação do RNA mensageiro ou por inibição da tradução de proteínas (HU; DRESCHER; CHEN, 2012). MiRNAs são sintetizados por uma via específica que inicia a transcrição dentro do locus genômico selecionado, que vai codificar para os precursores de miRNAs. Esses precursores serão cortados duas vezes; em primeiro lugar no núcleo pelo conjunto de proteínas DGCR8 e Drosha para gerar um pré-miRNA, e subsequentemente no citoplasma por uma nuclease especializada chamada Dicer, que irá gerar o miRNA maduro. MiRNAs maduros serão então envolvidos em um complexo de alta massa molecular chamado RISC (Complexo de Indução de silenciamento do RNA), e eles vão exercer sua ação reguladora negativa pela ligação às regiões 3'-UTR de transcritos de RNAm nascentes (SHUKLA; SINGH; BARIK, 2011). A atividade de regulação dos miRNAs é exercida no nível pós- transcricional e estima-se que regula até 1/3 dos genes que codificam proteínas (HU; DRESCHER; CHEN, 2012). Os perfis de expressão dos miRNAS variam entre diferentes tipos celulares. Além disso, as células também são capazes de secretar ativamente miRNAs, sendo possível detectá-los em todos os fluidos biológicos. Evidências das funções desses miRNAs celulares e circulantes têm sido descritas em várias doenças humanas e em processos fisiológicos normais (HU; DRESCHER; CHEN, 2012). 40 Estudos anteriores têm demonstrado que os miRNAs possuem papel fundamental nas infecções causadas por bactérias, vírus e protozoários (VERMA et al., 2016). Por outro lado, um número reduzido de trabalhos tem focado em infecções fúngicas. Neste contexto, em monócitos e células dendríticas infectados com Aspergillus fumigatus, os miR-132 e miR-155 mostraram-se diferencialmente expressos (Das GUPTA et al., 2014). Já em macrófagos infectados com C. albicans, foi demonstrado que miR-155, miR-146, miR-146b, miR-125a e miR-455 podem ser regulados por LPS e TLR4. Estudos in silico para miR-125A e miR-455 mostraram que eles podem atingir proteínas envolvidas na sinalização inflamatória em resposta à infecção fúngica (MONK; HUTVAGNER; ARTHUR, 2010). Também em tecidos epiteliais respiratórios humanos infectados por C. albicans, 55 microRNAs mostraram diferencialmente expressos comparados com os tecidos controle, sendo que o miR- 16-1 e miR-17-3p apresentaram substancial aumento e redução na expressão, respectivamente (MUHAMMAD et al., 2015). A identificação de miRNAs diferencialmente expressos no hospedeiro pode ajudar na compreensão dos mecanismos de regulação envolvidas na interação parasito-hospedeiro. Além disso, os miRNAs circulantes podem ser úteis tanto como biomarcadores no diagnóstico quanto para o tratamento de doenças (MADHAVAN et al., 2013). Por esses motivos devem ser identificados em infecções fúngicas como a PCM. 41 2. JUSTIFICATIVA Nota-se que, atualmente, o arsenal de fármacos antifúngicos é limitado. Dessa forma, a pesquisa por compostos com maior segurança e eficácia antifúngica mostra- se promissora. Também se torna necessária a busca por modelos alternativos para análise da interação fungo-hospedeiro e do teste desses novos compostos, visto que o uso de mamíferos tem sido restrito. Além disso, o entendimento do processo de regulação gênica por microRNAs, por exemplo, traz a perspectiva de novos biomarcadores para diagnóstico e também de novos terapias nas doenças fúngicas sistêmicas como a PCM. Para melhor compreensão, os dados resultantes desta tese foram divididos em duas partes: a primeira relacionada ao doutorado no Brasil, com foco no tratamento da PCM, sob a orientação da Profa. Dra. Maria José Soares Mendes Giannini e a segunda, referente ao doutorado sanduíche, com foco no diagnóstico da PCM, realizado no Instituto de Medicina Molecular da Universidade de Lisboa, Portugal, sob orientação do Prof. Dr. Francisco Javier Enguita. 42 PARTE I: Avaliação da atividade antifúngica e toxicidade de galatos de alquila em modelos animais alternativos e camundongos 3. OBJETIVOS 3.1. Objetivo geral No presente trabalho, pretendeu-se identificar potenciais novos fármacos para tratamento da PCM empregando ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila com estudos in vitro e in vivo em modelos animais alternativos e convencional (camundongo). 3.2. Objetivos específicos  Avaliar a interação entre fungos do gênero Paracoccidioides e o modelo animal alternativo C. elegans;  Verificar a toxicidade e a eficácia antifúngica de fármacos, do ácido gálico e dos galatos de alquila contra Paracoccidioides sp no modelo C. elegans;  Verificar a toxicidade do ácido gálico e dos galatos de alquila sobre o desenvolvimento de embriões de zebrafish;  Desenvolver a interação entre fungos do gênero Paracoccidioides e o modelo animal alternativo G. mellonella;  Verificar a toxicidade e a eficácia antifúngica de fármacos, do ácido gálico e dos galatos de alquila contra Paracoccidioides sp no modelo G. mellonella; 43  Verificar a eficácia antifúngica do composto, com melhor atividade antifúngica e menor toxicidade nos modelos animais alternativos, contra P. brasiliensis em camundongos;  Associar os galatos a um sistema lipídico nanoestruturado;  Avaliar a atividade dos galatos de alquila associados a um sistema lipídico nanoestruturado in vitro contra Paracoccidioides sp.;  Avaliar a toxicidade dos galatos de alquila associados a um sistema lipídico nanoestruturado in vitro em linhagens celulares pulmonar e hepática;  Avaliar a toxicidade dos galatos de alquila associados a um sistema lipídico nanoestruturado sobre o desenvolvimento de embriões de zebrafish;  Avaliar a toxicidade e a eficácia dos galatos de alquila associados a um sistema lipídico nanoestruturado contra P. brasiliensis no modelo G. mellonella;  Verificar o peso, a toxicidade hepática e renal, bem como a eficácia de um galato de alquila associados a um sistema lipídico nanoestruturado contra P. brasiliensis em camundongos. 4. MATERIAIS E MÉTODOS 4.1. Fungos e condições de cultivo P. brasiliensis S1 isolado 18 (PCM crônica/São Paulo) e P. lutzii, Pb01-like- cepa ATCC MYA-826 (PCM aguda/Goiânia), foram mantidos em meio Fava-Netto a 37 °C. C. albicans ATCC 90028 foi mantida em ágar Sabouraud dextrose a 37 ºC. 44 4.2. Fármacos e compostos Os fármacos anfotericina B e itraconazol, e o composto ácido gálico foram obtidos comercialmente (Sigma-Aldrich). Os derivados ésteres (galato de hexila, galato de octila e galato de dodecila) foram sintetizados de acordo com Morais e colaboradores (2010) e fornecidos pelo Prof. Dr. Luis Octávio Regasini do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas, UNESP – São José do Rio Preto. Os fármacos e compostos foram solubilizados em dimetilsulfóxido (DMSO) para o preparo das soluções estoque. 4.3. Interação entre C. elegans e fungos e avaliação de fármacos e compostos no modelo Larvas de C. elegans cepa glp-4;sek-1 cresceram em placas com agar NGM (nematode growth media), alimentadas com E. coli OP50 e incubadas a 15 °C de acordo com procedimentos padrões (SULSTON; HODGKIN, 1988). Para a realização dos experimentos, as larvas foram sincronizadas por tratamento com hipoclorito de sódio e ao atingirem o estágio L4 foram adicionadas no centro das placas com meio Brain Heart Infusion (BHI) suplementado com canamicina (90 µg/mL) e ampicilina (200 µg/mL) e que continham o inóculo de P. brasiliensis ou P. lutzii ou C. albicans. As placas foram incubadas a 25 °C por 3 h. Posteriormente, as larvas foram lavadas com tampão M9 (KH2PO4 20 mM; Na2HPO4 42 mM; NaCl 86 mM; MgSO4 1 mM) e um grupo de 15 a 20 larvas foi adicionado em cada poço da placas de 96 poços contendo tampão M9 60%, BHI 40%, 10 µg/mL de colesterol em etanol, 90 µg/mL de canamicina e 200 µg/mL de ampicilina. Diferentes concentrações do fármaco 45 controle anfotericina B (0,1; 0,5; 1 e 5 µg/mL), do ácido gálico e de seus derivados galatos de hexila, octila e dodecila (0,1; 1; 5; 10; 15; 30; 60 and 120 µg/mL) foram adicionadas aos poços. As placas foram mantidas a 25 ºC e a morte das larvas foi avaliada diariamente por 4 dias, usando como critério sua mobilidade e sua forma (larvas com formato de vara foram consideradas mortas e com formato sinusoidal foram consideradas vivas). Três experimentos independentes foram realizados. Além disso, no 4º dia, algumas larvas foram coradas com SYTOX® Green (Invitrogen) a uma concentração final de 1 μM e foram incubadas durante 15 min à temperatura ambiente num agitador horizontal a 120 rpm. As imagens foram capturadas no microscópio automatizado In Cell Analyzer 2000 (GE Healthcare). 4.4. Ensaio de toxicidade dos compostos em embriões de zebrafish Zebrafish wild type (Danio rerio) foram mantidos em um aquário com temperatura controlada (28 ± 0,5 °C), num laboratório com um ciclo de 14 h de luz/10 h de escuro. A alimentação dos peixes foi realizada três vezes ao dia, sendo duas vezes com ração e uma com o crustáceo Artemia salina. Os peixes adultos foram colocados para acasalamento (relação macho/fêmea de 1:1 ou 1:2 ou 2:1) e os embriões foram recolhidos na criadeira. Os embriões foram lavados com meio embriônico (NaCl 10 mM; KCl 0,34 mM; CaCl2.2H2O 0,66 mM; MgCl2.6H2O 0,66 mM) adicionado de azul de metileno 0,00003% e colocados em placas de Petri. Aqueles com fertilização normal foram selecionados para o teste. Os embriões foram transferidos para placas de 96 poços (2 embriões/poço e 8 embriões/concentração) e diferentes concentrações do ácido gálico e dos seus derivados, galatos de hexila, 46 octila e dodecila foram adicionadas (0,1; 1; 5; 10; 15; 30; 60 e 120 µg/mL). A exposição aos compostos ocorreu 2 a 3 horas pós-fertilização (hpf). As placas foram mantidas a 28 ºC e foram observados fenótipos de má formação como coagulação de óvulos fertilizados, falta de formação de somite, falta de desprendimento da cauda e falta de batimentos cardíacos às 5, 24 e 48 hpf (OECD, 2013). Três experimentos independentes foram realizados. O efeito dos compostos sobre o desenvolvimento dos embriões foi avaliado com auxílio de um microscópio invertido e imagens foram capturadas no microscópio automatizado In Cell Analyzer 2000 (GE Healthcare). Os valores para a concentração letal 50% (CL50) foram calculados a partir da curva concentração-resposta. 4.5. Interação entre G. mellonella e fungos e avaliação de fármacos e compostos no modelo Larvas de G. mellonella foram mantidas em recipientes de plástico em incubadoras verticais a 25 ºC no escuro, e alimentadas com cera de abelhas e pólen. Grupos de 8 larvas com peso aproximado de 150 mg foram colocados em placas de Petri e incubados a 37 °C, na noite anterior aos experimentos. P. brasiliensis 18 e P. lutzii 01, cultivados em meio Fava Netto a 37 °C durante 4 - 5 dias, foram transferidos para meio líquido BHI suplementado com glicose 1% e cresceram durante 3 - 4 dias, em agitação a 150 rpm e 37 °C. Suspensões fúngicas de P. brasiliensis ou P. lutzii foram lavadas três vezes com tampão fosfato salina (PBS) acrescida de ampicilina 20 mg/L e também preparadas nesse tampão para que as concentrações na larva fossem 5x106; 106 e 5x105 células. A última pró-pata esquerda das larvas foi limpa 47 com etanol 70% e 10 µL das suspensões fúngicas foram injetadas nelas com auxílio de uma seringa Hamilton. Após uma hora da infecção, as larvas foram tratadas com 10 µL de diferentes doses de anfotericina B (0,5 a 2 mg/kg), itraconazol (5,5 a 44 mg/kg) e dos galatos de alquila (2 a 160 mg/Kg) através da inoculação na última pró- pata direita. Grupos de larvas não infectadas foram tratados com os fármacos e compostos para testar a toxicidade. As placas foram incubadas a 37 ºC por 7 dias. A morte das larvas foi avaliada diariamente por inspeção visual da falta de movimento. No mínimo três experimentos independentes foram realizados. 4.6. Determinação da carga fúngica em G. mellonella Algumas larvas de cada grupo estudado foram coletadas em diferentes tempos após o tratamento (1, 48 e 96 h). Cada larva foi lavada com etanol 70%, cortada em pequenos pedaços com auxílio de uma lâmina de bisturi e suspensa em 1 mL de PBS-ampicilina. Os tecidos foram transferidos para tubos cônicos (Falcon) com pérolas de vidro e foram homogeneizados utilizando um vórtex. Cada amostra foi diluída 100x em PBS e 100 μL da diluição resultante foram plaqueados em meio BHI suplementado com 4% de soro fetal bovino, 5% filtrado de Pb339 e 40 mg/L de gentamicina. As placas foram incubadas durante 10 dias a 37 °C. Após esse período, as unidades formadoras de colônias (UFC) foram contadas. 4.7. Avaliação histológica de G. mellonella Algumas larvas, 48 h após o tratamento com anfotericina B ou itraconazol, foram fixadas por imersão em formalina a 4% tamponada com fosfato. Um grupo de 48 larvas não infectadas e um grupo de larvas infectadas sem tratamento também foram utilizados. As amostras foram incorporadas em parafina, seccionadas em série com uma espessura de 5 microns e coradas utilizando solução de ácido periódico-Schiff (PAS). As imagens foram capturadas utilizando um microscópio óptico (ZEISS AxioCam HRc) (Magnificação: 40x). 4.8. Determinação da densidade de hemócitos de G. mellonella Algumas larvas de cada grupo estudado foram coletadas em diferentes tempos após o tratamento (1 e 48 h). Como as larvas sem tratamento estavam debilitadas ou mortas em 96 h, não foi possível adquirir quantidade suficiente de hemolinfa nesse tempo para a análise. As amostras de hemolinfa foram recolhidas através de corte no abdômen larval e 10 µL foram diluídos em PBS gelado (1:20). A densidade de hemócitos foi estimada por contagem em uma câmara de Neubauer. 4.9. Infecção dos camundongos para a avaliação de um galato de alquila A utilização de camundongos machos Balb/c no presente projeto foi aprovada pelo Comitê de ética em pesquisa da UNESP-Araraquara (Protocolo CEUA/FCF/CAr nº 21/2013). Os animais foram obtidos do Biotério Central da Universidade de São Paulo (USP – Campus Ribeirão Preto). Durante o experimento, eles foram mantidos com ciclo claro/escuro de 12 h com água e ração ad libitum. Para a infecção, animais com cerca de 25 g foram anestesiados por via intramuscular com 80 mg/kg de quetamina e 10 mg/kg de xilazina. Em seguida, 50 µL de uma suspensão fúngica com 3x105 células de P. brasiliensis 18 foi inoculada via intratraqueal. Trinta dias 49 após a infecção, os animais foram divididos em 5 grupos: tratado com PBS; tratado com itraconazol 5 mg/kg/dia; tratado com galato de dodecila 5 mg/kg/dia; tratado com galato de dodecila 50 mg/kg/dia. Um grupo não infectado e tratado com PBS também foi utilizado como controle. A administração dos tratamentos foi feita por via intraperitoneal (ip) durante 15 e 30 dias consecutivos. Após esse período, os camundongos foram eutanasiados com uma superdosagem de anestésico, seguida de deslocamento cervical, e seus pulmões retirados para contagem de UFC. Para isso os órgãos foram triturados em PBS com auxílio de um homogeneizador tipo potter e 100 µL foram plaqueados em meio sólido BHI suplementado com 4% de soro fetal bovino, 5% filtrado de Pb339 e gentamicina 40 mg/L. As placas foram incubadas a 37 ºC por 10 dias. O número de colônias contadas foi expresso em UFC por grama de tecido. 4.10. Associação dos galatos ao sistema nanoestruturado lipídico Os galatos de octila e dodecila foram selecionados para serem associados a um sistema lipídico nanoestruturado por motivos posteriormente detalhados na seção Resultados e Discussão. O sistema nanoestruturado lipídico foi preparado com a seguinte composição: colesterol (fase oleosa), mistura de polioxietileno 23 lauril éter (Brij® 35) e fosfatidilcolina de soja (Epikuron® 200) 2:1 (tensoativo) e PBS (fase aquosa), baseada no trabalho de Formariz e colaboradores (2005) e Bonifácio e colaboradores (2015) com adaptações. As formulações foram preparadas da seguinte forma: em um frasco transparente transferiu-se a fase oleosa (FO) e o 50 sistema tensoativo (T). Construiu-se um diagrama de fases, fixando-se a proporção de tensoativo e fase oleosa, e procedendo a titulação com a fase aquosa (FA). A mistura foi preparada num banho de gelo com auxílio de um sonicador em haste (Q500 - QSonica®) com potência de 500 watts, amplitude de 20%, em modo descontínuo durante 10 min, com 30 s de incubação a cada minuto durante o processo de sonicação. Os galatos de octila e dodecila foram associados ao sistema lipídico nanoestruturado com auxílio do sonicador em haste durante 2 min, amplitude de 20% em modo descontínuo, com banho de gelo. 4.11. Caracterização dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado A determinação do diâmetro das gotículas do sistema lipídico nanoestrututado foi realizada segundo metodologia descrita por Silva e colaboradores (2009) de correlação de fótons, usando equipamento de espalhamento dinâmico de radiação laser – Light Scattering – Brookhaven. Este é particularmente sensível para determinar pequenas mudanças no diâmetro médio, tais como aquelas devido às camadas adsorvidas na superfície da partícula ou pequenas variações no processo de manufatura. Quando um feixe de luz passa através de uma dispersão coloidal, as partículas ou gotas espalham a luz em todas as direções. É possível, então, observar flutuações tempo-dependentes na intensidade do espalhamento através de um detector que processa os dados e envia a um computador. A partir dessa técnica, calcula-se o raio hidrodinâmico das partículas coloidais da equação de Einstein- Stokes (Equação 1): 51 D = KT/6πηRh sendo: D = coeficiente de difusão das partículas; K = constante de Boltzmann (1,3807 x 10-23 Nm K-1); T = temperatura absoluta (293,15 K); π = 3,141592; η = viscosidade (1,002 x 10-3 NM-2s); Rh = raio hidrodinâmico. O sistema lipídico nanoestruturado foi analisado em um analisador de gotículas. As amostras foram colocadas na câmara de análise de modo que o feixe de laser atravessasse a dispersão em toda a sua extensão. A temperatura do sistema foi mantida a 20 °C, o comprimento de onda do laser foi de 532 nm e o índice de refração foi de acordo com o índice observado para cada amostra analisada. Realizou-se 10 determinações do diâmetro e índice de polidispersidade (IPD) das gotículas de cada amostra (n=3), com a duração total de 5 min. O sistema lipídico nanoestruturado foi também caracterizado quanto ao potencial zeta. A determinação foi realizada a partir da mobilidade eletroforética, utilizando equipamento Zetasizer Nano NS (Malvern Instruments), sendo que as análises foram realizadas 24 h após o preparo das formulações. As amostras foram previamente diluídas (10 μL/mL) com solução aquosa de KCl para manter uma constante de força iônica durante a análise. As amostras foram colocadas na célula eletroforética e foram realizadas, para cada amostra, 3 determinações do potencial de superfície, calculando-se a média e o desvio padrão. 4.12. Atividade fúngica in vitro dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado O teste de sensibilidade por microdiluição foi realizado conforme descrito no documento M27 – A3 do The Clinical and Laboratory Standards Institute (CLSI, 52 2008), com algumas modificações (De PAULA; SILVA et al., 2013). P. brasiliensis 18 e P. lutzii 01 foram cultivados em meio sólido Fava-Netto por 4 dias a 37 ºC. A preparação do inóculo foi realizada em tampão fosfato salina (PBS) e ajustado para concentrações de 1x106 a 5x106 células/mL, com auxílio da câmara de Neubauer. Em seguida, foram realizadas diluições de 1:50 e 1:20 em meio RPMI 1640 com L- glutamina, acrescido de 2% de glicose e tamponado a pH 7,2 com 0,165 M de ácido morfolinopropanosulfônico (MOPS). Os galatos de octila e dodecila sozinhos ou associados ao sistema lipídico nanoestruturado também foram diluídos em RPMI para obtenção de concentrações de 250 – 0,48 g/mL nas placas de 96 poços. A suspensão fúngica (100 L) foi transferida para placas que haviam sido preparadas com os compostos (100 L). O controle positivo (100 L de meio RPMI com 100 L do inóculo) e o controle negativo (200 L do meio RPMI) foram incluídos nas placas. O fármacos anfotericina B e itraconazol foram utilizados como controles. O solvente DMSO e o sistema lipídico nanoestruturado foram testados nas concentrações correspondentes às dos compostos. As placas foram incubadas com agitação (150 rpm) a 37 °C durante 48 h, protegidas da luz. Após esse período, o revelador Alamar Blue (Invitrogen’s BioSource), cujo princípio ativo é a resazurina, foi adicionado e as placas foram incubadas com agitação (150 rpm) a 37 °C por mais 24 h. A leitura espectrofotométrica foi realizada em leitor de microplacas (Biotek) a 570-600 nm e a concentração inibitória mínima (CIM) foi determinada. Os compostos foram testados em duplicata e três experimentos independentes foram realizados. 53 4.13. Citotoxicidade dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado As linhagens MRC5 (fibroblastos pulmonares) e HepG2 (células de hepatoma humano) foram obtidas do banco de células do Rio de Janeiro e cultivadas em garrafas próprias com meio DMEM enriquecido com 10% de soro fetal bovino e 2% de uma solução de antibióticos (estreptomicina, penicilina, gentamicina e anfotericina B). As garrafas foram incubadas à 37 ºC com 5% de CO2 até atingir a confluência celular. Posteriormente, as células foram retiradas através do uso de solução de tripsina, centrifugadas e contadas. Para o ensaio, as linhagens foram ressuspensas em seus meios de cultura para serem contadas na câmara de Neubauer, de forma a obter uma concentração de 5 x 105 células por poço da placa de microdiluição. Cem microlitros das suspensões de células foram semeados em cada poço de uma placa de 96 poços, a qual foi incubada por 24 h à 37 ºC com 5% de CO2 para permitir a adesão celular antes, obtendo pelo menos 80% de confluência. Soluções dos compostos (100 µL) em concentrações de 500 – 0,48 µg/mL foram adicionadas aos poços. O solvente DMSO e o sistema lipídico nanoestruturado foram testados nas concentrações correspondentes às dos compostos. As células foram expostas aos compostos por 24 e 48 h. Após esse período de tempo, 10 µL de resazurina 0,01% foram adicionados e as placas foram incubadas por 6 h. Após a incubação, a absorbância foi lida em leitor de microplacas (Biotek) e a concentração inibitória 50% (CI50) foi determinada. Os compostos foram testados em duplicata e três experimentos independentes foram realizados. 54 4.14. Modelos animais alternativos para a avaliação dos galatos associados ao sistema lipídico nanoestruturado Os galatos de octila e dodecila associados ao sistema lipídico nanoestruturado foram testados em modelo zebrafish conforme o método anteriormente citado e os efeitos foram observados por um maior período de tempo (até 120 hpf). A eficácia e toxicidade dos galatos de octila e dodecila associados ao sistema lipídico nanoestruturado também foram avaliadas no modelo G. mellonella conforme o método anteriormente citado e as curvas de sobrevivência foram construídas. 4.15. Infecção dos camundongos para a avaliação de um galato associado ao sistema lipídico nanoestruturado Camundongos Balb/c machos com cerca de 25 g foram anestesiados por via intramuscular com 80 mg/kg de quetamina e 10 mg/kg de xilazina. Em seguida, 50 µL de uma suspensão fúngica com 3x105 células de P. brasiliensis 18 foi inoculada via intratraqueal. Um dia após a infecção, os animais foram divididos em 6 grupos: tratado com PBS; tratado com itraconazol 5 mg/kg/dia; tratado com galato de dodecila 10 mg/kg/dia; tratado com sistema lipídico nanoestruturado; tratado com sistema lipídico nanoestruturado + galato de dodecila 10 mg/kg/dia; um grupo não infectado e tratado com PBS utilizado como controle. A administração dos tratamentos foi feita por via intraperitoneal (ip) durante 20 dias consecutivos. No final do experimento, os camundongos foram eutanasiados com uma superdosagem de anestésico, seguida de deslocamento cervical, e seus pulmões retirados para contagem de UFC. Para isso os órgãos foram triturados em PBS com auxílio de um 55 potter e 100 µL foram plaqueados em meio sólido BHI suplementado com 4% de soro fetal bovino, 5% filtrado de Pb339 e gentamicina 40 mg/L. As placas foram incubadas a 37 ºC por 10 dias. O número de colônias contadas foi expresso em UFC por grama de tecido. Dois experimentos independentes foram realizados com n = 3 a 4 animais/grupo em cada experimento. 4.16. Análise bioquímica e do peso dos animais O sangue dos animais foi coletado através de punção cardíaca e centrifugado a 3500 rpm por 10 min a 25 ºC (Centrifuge 5810R – Eppendorf). O soro obtido foi analisado para os parâmetros hepáticos, alanina aminotransferase (ALT) ou transaminase glutâmico-pirúvica (TGP) e a aspartato aminotransferase (AST) ou transaminase glutâmico-oxalacética (TGO) e renais, uréia e creatinina. Essas análises bioquímicas foram realizadas no Núcleo de Atendimento à Comunidade (NAC) da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da UNESP, Araraquara, através de análise de química seca pelo equipamento Vitros 250 (Orto Clinical Diagnostics – Johnson & Johnson Company®). Os animais também foram pesados ao final do experimento. 4.17. Análise estatística A análise estatística dos resultados foi realizada no programa Graph Pad Prisma 5 (La Jolla CA, EUA). As curvas de sobrevivência foram plotadas pelo método Kaplan-Meyer e analisadas por Log-rank (Mantel-Cox). Os resultados de carga fúngica e densidade de hemócitos foram analisados por análise de variância 56 (ANOVA) com pós-teste de Bonferroni. O valor p < 0,05 foi considerado estatisticamente significante. 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1. Toxicidade e eficácia em C. elegans do ácido gálico e galatos O nematóide C. elegans tem sido utilizado para avaliação de virulência de vários fungos como Candida, Cryptococcus, Fusarium, Histoplasma e Penicillium (HUANG et al., 2014; JONHSON et al., 2009; MYLONAKIS et al., 2002; PUKKILA- WORLEY et al., 2009; SCORZONI et al., 2013), entretanto a interação entre C. elegans e fungos do gênero Paracoccidioides não foi previamente descrita. Dessa forma, a primeira parte do teste consistiu em realizar esse objetivo. Para a análise da curva de sobrevivência do C. elegans com P. brasiliensis e P. lutzii foi utilizada a cepa AU37 duplo mutante glp-4; sek-1. Esta cepa mostra-se muito útil nos estudos de interação C. elegans – fungo, visto que a mutação glp-4(bn2) torna a larva incapaz de produzir progênie a 25 ºC e a mutação sek-1(km4) aumenta a sensibilidade a vários patógenos (OKOLI et al., 2009). Larvas do C. elegans foram colocadas em contato com P. brasiliensis e P. lutzii, seguindo os procedimentos utilizados para outros fungos, entretanto não foi observada a morte das larvas nos quatro dias de observação. Dois fatores podem ter dificultado a interação entre o fungo e o nematóide: o fato do fungo ser relativamente grande (5 a 25 µm) e o termodimorfismo, já que a temperatura na infecção em C. elegans não pode ser superior a 25 ºC, e nessa temperatura o fungo passa para a morfologia filamentosa dificultando a ingestão e com isso, a infecção. http://www.wormbase.org/species/c_elegans/gene/WBGene00001611 http://www.wormbase.org/species/c_elegans/gene/WBGene00004758 57 Como o C. elegans não se mostrou um modelo animal adequado para o estabelecimento da infecção por Paracoccidioides sp e o posterior tratamento com fármacos e com os galatos, optou-se então por utilizar o modelo amplamente descrito C. elegans - C. albicans, para o cumprimento desse objetivo. Estudos prévios utilizaram o modelo C. elegans para a avaliação de compostos antifúngicos convencionais e novos contra espécies de Candida (BREGER et al., 2007; COLEMAN et al., 2010; SCORZONI et al., 2013; SUN; LIAO; WANG, 2015). Além disso, uma correlação entre a atividade antifúngica em C. elegans e em modelo murino de candidíase foi observada (BREGER et al., 2007). Assim, larvas do C. elegans AU37 foram colocadas em contato com C. albicans por 3 h e posteriormente em contato com várias concentrações de anfotericina B (usada como controle) e do ácido gálico e dos galatos de hexila, octila e dodecila. As soluções estoque da anfotericina B e dos compostos (preparada em DMSO) foram diluídas em tampão M9, respeitando a concentração máxima de DMSO tolerado pelas larvas que é de 2% (BREGER et al., 2007; COLEMAN et al., 2010; OKOLI et al., 2009). Além disso, o DMSO foi testado como controle no C. elegans - C. albicans, nas mesmas concentrações presentes nos compostos, e não apresentaram nenhum efeito sobre o modelo (dados não mostrados). Na Figura 3 estão representados os resultados de curva de sobrevivência e curva concentração-resposta quatro dias pós tratamento. A maioria das larvas infectadas com C. albicans e não tratadas morreu no 2º dia. A anfotericina B aumentou significativamente o tempo de sobrevivência das larvas em todas as concentrações testadas de forma concentração dependente (p < 0,0001 em todos os casos). A porcentagem de sobrevivência das larvas infectadas com C. 58 albicans no 4º dia foi de 20; 54; 66 e 84% tratadas com as concentrações de 0,1; 0;5; 1 e 5 µg/mL de anfotericina B, respectivamente. Figura 3. Curva de sobrevivência (A) e curva concentração-resposta (B) do C. elegans infectado com C. albicans (Ca) tratado com anfotericina B (AMB) em concentrações variando de 0,1 a 5 µg/mL (n = 45 – 60 larvas/grupo) 0 1 2 3 4 0 20 40 60 80 100 Ca AMB 0,1g/mL AMB 0,5g/mL AMB 1g/mL AMB 5g/mL Tempo (dias) % s o b re v iv ê n c ia 0 20 40 60 80 100 0 ,1 0 ,5 1 5 Concentração AMB (g/mL) % s o b re v iv ê n c ia A B Com a padronização do modelo no laboratório, os compostos foram selecionados para o teste: optou-se por utilizar o ácido gálico e os galatos de hexila, octila e dodecila, três derivados ésteres de alquila com diferentes tamanhos de cadeia carbônica (Figura 4). De PAULA; SILVA et al. (2014) testaram esses compostos previamente in vitro contra C. albicans ATCC 90028, P. brasiliensis 18 e P. lutzii 01 e os valores de CIM mostraram que o aumento da cadeia carbônica proporcionou um aumento da atividade antifúngica (Tabela 1). Outros estudos demonstraram ainda que o galato de propila apresentou efeito sinérgico com imidazol, itraconazol e fluconazol, reduzindo a concentração inibitória mínima desses fármacos contra C. albicans (D’AURIA et al., 2001; STRIPPOLI et al., 2000). Sobre o 59 mecanismo de ação, é sugerido por Fujita e Kubo (2002) que o galato de nonila é capaz de danificar a membrana plasmática fúngica, o que resulta em seu efeito fungicida. Além disso, o galato de decila parece atuar nas vias de n-glicosilação relacionadas à formação da parede celular fúngica (De PAULA e SILVA, 2016). Assim, no presente estudo pretendeu-se avançar no estudo do ácido gálico e dos galatos através da avaliação da atividade e toxicidade desses compostos em diferentes modelos in vivo. Figura 4. Estrutura química do ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila 60 Tabela 1. Concentração inibitória mínima (µg/mL) do ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila contra C. albicans e espécies de Paracoccidioides (adaptado de De PAULA e SILVA et al., 2014) Composto C. albicans ATCC 90028 P. brasiliensis 18 P. lutzii 01 Ácido gálico 62,5 4 16 Galato de hexila 62,5 0,25 0,25 Galato de octila 8 0,125 0,015 Galato de dodecila 2 0,125 0,125 Na Figura 5 estão representados os resultados de curva de sobrevivência e curva concentração-resposta dos compostos após quatro dias. O tratamento com a menor concentração (0,01 μg/mL) do ácido gálico e dos galatos não protegeu as larvas de C. elegans da infecção com C. albicans (dados não apresentados). No entanto, nas outras concentrações (1, 5, 10, 15, 30 e 60 μg/mL) os quatro compostos aumentaram significativamente a taxa de sobrevivência de C. elegans infectado com C. albicans (p < 0,05 em todos os casos). No final de quatro dias, o ácido gálico, o galato de hexila, o galato de octila e o galato de dodecila aumentaram a sobrevivência das larvas para 17-31%, 20-30%, 12-34% e 16-45% nas concentrações testadas, respectivamente. Assim, o galato de dodecila foi o composto mais eficiente para proteger as larvas da infecção fúngica aumentando a sobrevivência das mesmas em 45% a 30 μg/mL. Estudos prévios mostraram que os galatos possuem propriedades farmacológicas mais favoráveis do que as 61 observados para o ácido gálico (LOCATELLI et al., 2008; SAVI et al., 2005), as quais foram correlacionadas ao caráter anfipático desses derivados. A fração hidrofóbica parece contribuir para a atividade, presumivelmente pelo aumento da afinidade pelas membranas celulares e consequente aumento da permeabilidade (SAEKI et al., 2000). Além disso, o aumento do comprimento da cadeia carbônica dos galatos resultou num aumento da atividade antifúngica in vitro. A CIM para C. albicans ATCC 90028 do ácido gálico e do galato de hexila foi de 62,5 μg/mL para ambos os compostos, enquanto que a CIM do galato de octila e do galato de dodecila foi de 8 e 2 μg/mL, respectivamente (De PAULA e SILVA et al., 2014) (Tabela 1). Assim, os perfis de atividades contra C. albicans do ácido gálico e dos galatos no modelo in vivo C. elegans correlacionaram-se muito bem com a atividade observada in vitro. Outro ponto a ser considerado nos gráficos (Figura 5) diz respeito à toxicidade dos compostos. Alguns trabalhos têm descrito que a toxicidade pode ser observada de forma concomitante à eficácia antifúngica no modelo C. elegans-C. albicans (BREGER et al., 2007; COLEMAN et al., 2010; OKOLI et al., 2009). Nesse caso uma redução da taxa de sobrevivência das larvas em concentrações mais altas do composto testado pode significar que o mesmo seja tóxico nessas concentrações. No presente trabalho, a sobrevivência dos nematóides foi reduzida quando expostos à concentração de 120 μg/mL do ácido gálico e dos galatos de hexila e dodecila e às concentrações de 60 e 120 μg/mL do galato de octila, demonstrando ser esse o composto mais tóxico entre os quatro. 62 Figura 5. Curva de sobrevivência (esquerda) e curva concentração-resposta (direita) do C. elegans infectado com C. albicans (Ca) tratado com ácido gálico (GAL) e galatos de hexila (HEX), octila (OCT) e dodecila (DOD). N = 45 - 60 larvas/grupo 0 1 2 3 4 0 20 40 60 80 100 Ca 1 g/mL 5 g/mL 10 g/mL 15 g/mL 30 g/mL 60 g/mL 120 g/mL GAL Tempo (dias) % s o b re vi vê n ci a 0 10 20 30 40 50 1 5 1 0 1 5 3 0 6 0 1 2 0 Concentração GAL (g/mL) % s o b re vi vê n ci a 0 1 2 3 4 0 20 40 60 80 100 Ca 10 g/mL1 g/mL 5 g/mL 60 g/mL 120 g/mL30 g/mL15 g/mL HEX Tempo (dias) % s o b re vi vê n ci a 0 10 20 30 40 50 1 5 1 0 1 5 3 0 6 0 1 2 0 Concentração HEX ( g/mL) % s o b re vi vê n ci a 0 1 2 3 4 0 20 40 60 80 100 Ca 1 g/mL 5 g/mL 10 g/mL 15 g/mL 30 g/mL 60 g/mL 120 g/mL OCT Tempo (dias) % s o b re vi vê n ci a 0 10 20 30 40 50 1 5 1 0 1 5 3 0 6 0 1 2 0 Concentração OCT ( g/mL) % s o b re vi vê n ci a 0 1 2 3 4 0 20 40 60 80 100 Ca 1 g/mL 5 g/mL 10 g/mL 15 g/mL 30 g/mL 60 g/mL 120 g/mL DOD Tempo (dias) % s o b re vi vê n ci a 0 10 20 30 40 50 1 5 1 0 1 5 3 0 6 0 1 2 0 Concentração DOD ( g/mL) % s o b re vi vê n ci a A linha tracejada na curva concentração-resposta representa a % de larvas infectadas e não tratadas. 63 Larvas viáveis com formato sinusoidal e mortas com formato de vara são mostradas na Figura 6. A coloração com SYTOX® Green contribuiu para identificar larvas de C. elegans mortas pela infecção ou pelo tratamento com concentrações mais elevadas dos compostos. A identificação é possível, pois esse fluoróforo se liga ao ácido nucléico dos organismos mortos, emitindo fluorescência verde (GOSAI et al., 2010). Figura 6. Larvas de C. elegans viáveis e mortas (L4) nas imagens de campo claro (acima) e larvas mortas marcadas com SYTOX® Green nas imagens de fluorescência (abaixo). Larvas infectadas e não tratadas (A e D); larvas infectadas e tratadas com 5 µg/mL de anfotericina B (B e E) e larvas infectadas e tratadas com 30 µg/mL do galato de dodecila (C e F). Magnificação: 10 x 64 5.2. Toxicidade em zebrafish do ácido gálico e galatos A avaliação da toxicidade reprodutiva e sobre o desenvolvimento também é importante no desenvolvimento de novos fármacos. Neste contexto, o zebrafish tem sido utilizado como um modelo animal rápido, fácil e eficiente para detectar efeitos potencialmente letais e teratogênicos de compostos (HE et al., 2014; RIZZO et al., 2013). Além disso, estudos têm demonstrado que as respostas à toxicidade dos compostos observadas em zebrafish são preditivas das respostas vistas em mamíferos (HE et al., 2014; McGRATH; LI, 2008; PARNG et al., 2002). Devido às vantagens do modelo, neste trabalho também foi avaliado os efeitos do ácido gálico e galatos em embriões de zebrafish. Para realização do experimento com embriões de zebrafish, primeiro foi realizada uma padronização do número de embriões a ser utilizado em placas de 24 e 96 poços. Foram colocados 3 e 4 embriões com 1 mL de meio embriônico em cada poço da placa de 24; e 2 e 3 embriões com 200 µL de meio embriônico em cada poço da placa de 96. As maiores porcentagens de sobrevivência 48 horas pós- fertilização (hpf), foram alcançadas com 3 embriões em cada poço da placa de 24 e com 2 embriões na placa de 96. Uma taxa de sobrevivência acima de 80% é necessária para a realização adequada dos experimentos. Assim, optou-se por utilizar 2 embriões por poço na placa de 96 para o teste posterior, visto que apresenta uma taxa de sobrevivência dentro da estabelecida e se utiliza de menor volume dos compostos. O ácido gálico e seus derivados foram testados nas mesmas concentrações utilizadas anteriormente para o modelo C. elegans - C. albicans (0,1; 1; 5; 10; 15; 30; 65 60 e 120 µg/mL). As soluções estoque dos compostos (preparada em DMSO) foram diluídas no meio embriônico, respeitando a concentração máxima de DMSO tolerado pelos embriões que é de 2% (MAES et al., 2012). Além disso, o DMSO foi testado como controle nos embriões, nas mesmas concentrações presentes nos compostos, e não apresentaram nenhum efeito tóxico sobre o modelo (dados não mostrados). Na Figura 7 estão representados os resultados de curva de sobrevivência e curva concentração-resposta 48 hpf. Além disso, os valores de CL50 (concentração letal 50%) foram calculados (Tabela 2). O ácido gálico não teve efeito tóxico nos embriões de zebrafish até 120 μg/mL e o valor de CL50 não pode ser calculado. Para os outros compostos testados, o número de embriões afetados foi dependente da concentração. O galato de hexila e o galato de octila não demonstraram efeito tóxico sobre os embriões de zebrafish até 1 μg/mL e apresentaram CL50 de 10 e 4,5 μg/mL, respectivamente. O galato de dodecila não mostrou efeito tóxico nos embriões de zebrafish até 10 μg/mL e apresentou CL50 de 40 μg/mL. Assim, o ácido gálico e o galato de dodecila tiveram a menor embriotoxicidade em comparação com os galatos de hexila e octila. 66 Figura 7. Curva de sobrevivência (esquerda) e curva concentração-resposta 48 hpf (direita) de embriões de zebrafish tratado com ácido gálico (GAL) e galatos de hexila (HEX), octila (OCT) e dodecila (DOD). N = 24 embriões/grupo 0 20 40 60 80 100 Controle 5 24 48 1 g/mL 5 g/mL 10 g/mL 15 g/mL 30 g/mL 60 g/mL 120 g/mL GAL Tempo (hpf) % s o b re vi vê n ci a 0 20 40 60 80 100 1 5 10 15 30 60 12 0 Concentração GAL (g/mL) % s o b re v iv ê n c ia 0 20 40 60 80 100 Controle 1 g/mL 5 g/mL 10 g/mL 15 g/mL 30 g/mL 5 24 48 60 g/mL 120 g/mL HEX Tempo (hpf) % s o b re vi vê n ci a 0 20 40 60 80 100 30 601 5 10 15 12 0 Concentração HEX (g/mL) % s o b re v iv ê n c ia 0 20 40 60 80 100 Controle 1 g/mL 5 g/mL 10 g/mL 15 g/mL 5 24 48 30 g/mL 60 g/mL 120 g/mL OCT Tempo (hpf) % s o b re vi vê n ci a 0 20 40 60 80 100 30 601 5 10 15 12 0 Concentração OCT (g/mL) % s o b re v iv ê n c ia 0 20 40 60 80 100 Controle 1 g/mL 5 g/mL 10 g/mL 15 g/mL 5 24 48 30 g/mL 60 g/mL 120 g/mL DOD Tempo (hpf) % s o b re vi vê n ci a 0 20 40 60 80 100 30 601 5 10 15 12 0 Concentração DOD (g/mL) % s o b re v iv ê n c ia 67 Tabela 2. Concentração letal 50% (µg/mL) do ácido gálico e seus derivados ésteres de alquila em modelo de embriões de zebrafish Composto CL50 (µg/mL - 48 hpf) Ácido gálico > 120 Galato de hexila 10 Galato de octila 4,5 Galato de dodecila 40 Assim como no modelo C. elegans, o galato de octila se mostrou como o composto mais tóxico em zebrafish. Outro ponto a ser considerado é que os valores de CL50 encontrados para os galatos de hexila e octila foram inferiores aos valores de CIM encontrados contra C. albicans, porém a CL50 do galato de dodecila foi de 40 μg/mL, o que é 20 vezes maior que a CIM (2 μg/mL), permitindo uma boa janela terapêutica e reforçando o potencial desse composto como futuro agente antifúngico. A toxicidade dos galatos nos embriões zebrafish foi influenciada pelo comprimento da cadeia carbônica. O galato com oito átomos de carbono na cadeia lateral (galato de octila) foi mais tóxico que o galato com seis átomos de carbono (galato de hexila) no zebrafish. No entanto, quando a cadeia carbônica foi maior (galato de dodecila), o composto se mostrou menos tóxico, sugerindo um fenômeno “cut-off” para o