UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ENGENHARIA CAMPUS DE ILHA SOLTEIRA LUDMILLA FREITAS PEREIRA SEGURANÇA DE BARRAGENS NO BRASIL: UM BREVE COMPARATIVO COM A LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL E ANÁLISE DA INFLUÊNCIA DA COBERTURA DO SOLO DE APPs SOBRE MANCHAS DE INUNDAÇÃO (ESTUDO DE CASO DA PCH PEDRA FURADA, RIBEIRÃO – PE) Ilha Solteira 2019 Campus de Ilha Solteira LUDMILLA FREITAS PEREIRA SEGURANÇA DE BARRAGENS NO BRASIL: UM BREVE COMPARATIVO COM A LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL E ANÁLISE DA INFLUÊNCIA DA COBERTURA DO SOLO DE APPs SOBRE MANCHAS DE INUNDAÇÃO (ESTUDO DE CASO DA PCH PEDRA FURADA, RIBEIRÃO – PE) Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira – UNESP como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre em Engenharia Civil. Área de conhecimento: Recursos Hídricos e Tecnologia Ambiental. Prof. Dr. César Gustavo da Rocha Lima Orientador Prof. Dr. Mauro Mitsuuchi Tashima Co-orientador Ilha Solteira 2019 Pereira SEGURANÇA DE BARRAGENS NO BRASIL: UM BREVE COMPARATIVO COM A LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL E ANÁLISE DA INFLUÊNCIA DA COBERTURA DO SOLO DE APPs SOBRE MANCHAS DE INUNDAÇÃOESTUDO DE CASO DA PCH PEDRA FURADA, RIBEIRÃO – PEIlha Solteira2019 128 Sim Dissertação (mestrado)Engenharia CivilRecursos Hídricos e Tecnologias AmbientaisNão . . . FICHA CATALOGRÁFICA Desenvolvido pelo Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação Pereira, Ludmilla Freitas . Segurança de barragens no Brasil: um breve comparativo com a legislação internacional e análise da influência da cobertura do solo de APPs sobre manchas de inundação: estudo de caso da PCH Pedra Furada, Ribeirão – PE / Ludmilla Freitas Pereira. -- Ilha Solteira: [s.n.], 2019 125 f. : il. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Engenharia . Área de conhecimento: Recursos Hídricos eTecnologias Ambientais, 2019 Orientador: César Gustavo da Rocha Lima Co-orientador: Mauro Mitsuuchi Tashima Inclui bibliografia 1. Segurança de barragens. 2. Legislação. 3. Cobertura do solo. 4. Coeficiente de rugosidade de Manning. 5. Áreas de preservação permanente. 6. HEC-RAS. P436s AGRADECIMENTOS Primeiramente, gostaria de agradecer à Deus por sempre estar me guiando e me concedendo força. Agradeço também à minha família, que sempre me acompanhou de perto e em cada passo, principalmente aos meus pais, Nara e Kenes, pela confiança dada às minhas decisões e escolhas, e por nunca medirem esforços para tornar meus sonhos em realidade. Agradeço ao meu irmão, Felipe, pela amizade e momentos de descontração; e ao Matheus, pelo apoio e companheirismo ao longo de todas as etapas. Agradeço, imensamente, aos professores Dr. Mauro Mitsuuchi Tashima e Dr. César Gustavo da Rocha Lima pela disposição e compromisso em me auxiliarem a desenvolver esta pesquisa e muitos outros trabalhos, me incentivando e me apoiando em todas as ideias, bem como me estimulando a buscar resultados inovadores e melhores. Agradeço também ao professor Dr. José Augusto de Lollo pela parceria ao longo de trabalhos desenvolvidos, pelas contribuições no exame de qualificação e pelo aceite de convite para ser parte da banca examinadora. Agradeço à professora Dr.ª Liliane Lazzari Albertin pelas contribuições no exame de qualificação e ao professor Dr. José Cândido Stevaux pela disposição em fazer parte da banca examinadora deste trabalho. Agradeço aos amigos de longa data, àqueles que a graduação e a pós me trouxeram e àqueles que a vida profissional me trouxe, porque sem eles a caminhada não teria sido mais leve e divertida. Agradeço à toda equipe da Geometrisa, empresa na qual iniciei a minha carreira profissional, sem a qual inevitavelmente não teria descoberto minhas afinidades e aptidões. Agradeço por me auxiliarem a equilibrar a vida acadêmica e profissional e também à cada membro que já passou pela empresa pelos momentos de aprendizado e amizade. Agradeço à empresa Atiaia Energia por conceder autorização para utilizar dados de levantamentos de campo para subsidiar os resultados desta pesquisa. Sem esta contribuição, não teria sido possível desenvolver este estudo. Por fim, gostaria de agradecer à UNESP e, individualmente, à cada professor, técnico e funcionário, pelo ensino de qualidade conferido a mim, há pouco mais de sete anos. “A vida só passa rápido para quem passa por ela. Para aquele que vive com intensidade, a vida demora a passar e o tempo se multiplica, propiciando a oportunidade para fazer tudo o que realmente importa”. Caio Carneiro. RESUMO O Brasil, frente aos acidentes ocorridos em Mariana – MG (2015) e em Brumadinho – MG (2019), tem vivenciado inúmeras discussões no que tange à assuntos regulatórios e à confiabilidade das barragens construídas no país. Neste trabalho, inicialmente, fez-se um breve comparativo entre a legislação brasileira e alguns normativos internacionais (China, Portugal, Estados Unidos e África do Sul) sobre segurança de barragens, observando-se a existência de diferentes aspectos abordados entre eles. A Política Nacional de Segurança de Barragens se demonstrou uma das regulamentações menos rígidas entre as analisadas quanto a pré-requisitos técnicos para sua aplicação, deixando grande parte das barragens de pequeno porte dispensadas do cumprimento de algumas obrigações. Além disto, a legislação federal brasileira foi implementada há menos de uma década, o que implica, atualmente, em uma dificuldade muito grande do empreendedor, dos órgãos fiscalizadores e do governo federal a se adaptarem a possuir esta cultura de segurança de barragens. Diante da interface destas construções com o meio ambiente, faz-se necessário um monitoramento constante das estruturas por uma equipe multidisciplinar e um programa de segurança consistente que vise garantir a integridade do meio ambiente nas áreas de influência das barragens, bem como resguardar o bem-estar e a vida da população situada a jusante. O uso de funções matemáticas e softwares para o mapeamento das áreas sujeitas aos riscos impostos pelas barragens é um avanço grandioso no aspecto de segurança destas estruturas. Neste contexto, o presente estudo teve por objetivo prático principal analisar a influência da cobertura do solo das áreas de preservação permanente (APPs) a jusante da barragem da PCH Pedra Furada, localizada no município de Ribeirão no estado de Pernambuco, sobre características de manchas de inundação referentes a vazões hipotéticas para tempos de retorno de 10 e 10.000 anos, defluentes deste empreendimento. Foram utilizados dados de levantamento de campo como ortofotos e topografia (obtidas por VANT) assim como informações batimétricas cedidos pela empresa proprietária do empreendimento e, também, dados hidrológicos da Agência Nacional de Águas. Por meio da simulação do modelo hidrodinâmico bidimensional HEC-RAS 5.0.7, em regime transiente, variou-se os coeficientes de rugosidade (Manning) das faixas marginais ao rio Sirinhaém, fazendo-se análises em seções distantes 5, 15 e 25 km do barramento. Os resultados demonstraram que para um aumento de oito vezes da rugosidade da APP, reduziu-se o tempo de chegada de onda em 2h50 min para o cenário de TR=10 anos e em 2h10min para o cenário de TR=10.000 anos na seção distante 25 km da barragem. Já para a seção mais próxima ao barramento, este aumento de rugosidade levou ao acréscimo de profundidades da água de, cerca de, 2 metros dentro da calha fluvial, para ambos cenários de vazão. Assim, conclui-se que APPs vegetadas representam menor intensidade sobre planícies de inundações mais próximas do barramento, enquanto que, para as planícies mais distantes, representam uma janela de tempo maior para a implementação de ações contingenciais, caracterizando-se, assim, como uma boa contribuição para o rol de elementos de segurança de barragens. Palavras-chave: Segurança de barragens. Legislação. Cobertura do solo. Coeficiente de rugosidade de Manning. Áreas de preservação permanente. HEC-RAS. Modelo 2D. Inundação. ABSTRACT Brazil, faced with the accidents that occurred in Mariana - MG (2015) and in Brumadinho - MG (2019), has experienced numerous discussions regarding regulatory issues and the reliability of the dams built in the country. In this work, it was made a brief comparison between Brazilian legislation and some international regulations (China, Portugal, United States and South Africa) on dam safety, observing the existence of different aspects addressed among them. The National Dams Safety Policy demonstrated one of the less rigid regulations among those analyzed regarding technical prerequisites for their application, leaving most of the small dams exempted from compliance with certain obligations. In addition, Brazilian federal legislation was implemented less than a decade ago, which currently implies a great difficulty for the entrepreneur, the inspection agencies and the federal government to adapt to having this dam safety culture. In view of the interface of these constructions with the environment, it is necessary a constant monitoring of the structures by a multidisciplinary team and a consistent safety program that aims to guarantee the integrity of the environment in the areas of influence of the dams, as well as to protect the well-being and the life of the downstream population. The use of mathematical functions and softwares for the mapping of the areas subject to the risks imposed by the dams is a great advance in the safety aspect of these structures. In this context, the main objective of the present study was to analyze the influence of the soil cover of the permanent preservation areas (PPAs) downstream of the Pedra Furada Hydroelectric Power Plant, located in the city of Ribeirão in the state of Pernambuco, hypothesis flow rates for return times of 10 and 10,000 years, defluents of this dam. Field survey data such as orthophotos and topography (obtained by drone) were used as well as bathymetric information provided by the company that owns the project and hydrological data from the National Water Agency. By means of the simulation of the two-dimensional hydrodynamic model HEC-RAS 5.0.7, in the transient regime, the roughness coefficients (Manning) of the marginal banks of the Sirinhaém river were varied, being analyzed in sections distant 5, 15 and 25 km of the dam. The results showed that for an eight-fold increase in PPA roughness the wave arrival time was reduced in 2h50 min for the 10-year scenario and at 2h10min for the 10,000- year scenario in the 25 km distant section of the dam. As for the section closest to the dam, this increase of roughness led to the addition of water depths of about 2 meters inside the rain gutter, for both flow scenarios. Thus, we conclude that vegetated PPAs represent a lower intensity on flood plains closer to the dam, whereas for the more distant plains, they represent a larger window of time for the implementation of contingency actions, is thus a good contribution to the role of dam safety elements. Key words: Dams safety. Legislation. Soil coverage. Manning's roughness coefficients. Permanent preservation areas. HEC-RAS. Model 2D. Flood. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Rastro de lama nas proximidades da barragem de Fundão e da Mina Feijão decorrente de seus rompimentos .................................. 21 Figura 2 - Erosão na estrutura de concreto do vertedouro da barragem de Oroville ............................................................................................. 22 Figura 3 - Quantificação de causas prováveis de acidentes e incidentes registrados pela ANA entre 2010 e 2017 .......................................... 26 Figura 4 - Resumo do processo de modelagem hidrodinâmica e caracterização da mancha de inundação gerada ............................. 52 Figura 5 - Bacia hidrográfica contribuinte e localização da PCH Pedra Furada 58 Figura 6 - Ortofoto da área de estudo ............................................................... 61 Figura 7 - Modelo Digital de Terreno (TIN) da área de estudo........................... 62 Figura 8 - Postos fluviométricos consultados no Hidroweb ............................... 64 Figura 9 - Processo de simulação de vazões extremas para diferentes tempos de retorno.......................................................................................... 65 Figura 10 - Ilustração do processo de segmentação por meio do software eCognition ........................................................................................ 70 Figura 11 - Classificação do uso e ocupação do solo da situação real área de estudo .............................................................................................. 73 Figura 12 - Classificação da cobertura do solo para a situação real da APP da área de estudo.................................................................................. 74 Figura 13 - Síntese das atividades desenvolvidas no HEC-RAS 2D ................... 75 Figura 14 - Inserção do MDT referente à área de estudo no software HEC-RAS 76 Figura 15 - Malha de escoamento bidimensional com células de 20mx20m....... 77 Figura 16 - Alinhamento das células com as margens do rio para melhor representatividade do relevo............................................................. 78 Figura 17 - BC Line de montante sobre o vertedouro da PCH Pedra Furada 79 Figura 18 - BC Line de jusante na seção final da área de estudo ........................ 79 Figura 19 - Inserção de conexão interna de fluxo para representar as pontes 80 Figura 20 - Ferramenta de edição de conexões internas .................................... 81 Figura 21 - Setores do município de Gameleira atingidos pelas cheias de 2010 e 2017 .............................................................................................. 83 Figura 22 - Curva de descarga do posto fluviométrico Engenho Bento no rio Sirinhaém ......................................................................................... 85 Figura 23 - Curva de descarga do posto fluviométrico José Mariano no rio Amaragi ............................................................................................ 85 Figura 24 - Espacialização dos coeficientes de Manning calibrados ................. 89 Figura 25 - Mapa de inundação para um TR = 10 anos utilizando-se coeficientes calibrados ..................................................................... 94 Figura 26 - Mapa de inundação para um TR = 10.000 anos utilizando-se coeficientes calibrados ..................................................................... 95 Figura 27 - Mapa de inundação para uma TR = 10 anos utilizando-se coeficientes teóricos ......................................................................... 96 Figura 28 - Mapa de inundação para uma TR = 10.000 anos utilizando-se coeficientes teóricos ......................................................................... 97 Figura 29 - Comparativo entre a área alagada pelo TR=10 anos com coeficientes teóricos e calibrados ..................................................... 98 Figura 30 - Comparativo entre a área alagada pelo TR=10.000 anos com coeficientes teóricos e calibrados ..................................................... 99 Figura 31 - Mapa de inundação para um TR = 10 anos utilizando-se coeficientes calibrados, com a inserção das pontes na geometria.... 101 Figura 32 - Mapa de inundação para um TR = 10.000 anos utilizando-se coeficientes calibrados, com a inserção das pontes na geometria.... 102 Figura 33 - Comparativo entre a área alagada pelo TR=10 anos utilizando-se coeficientes calibrados, com/sem a inserção das pontes na geometria ......................................................................................... 103 Figura 34 - Comparativo entre a área alagada pelo TR=10.000 anos utilizando- se coeficientes calibrados, com/sem a inserção das pontes na geometria ......................................................................................... 104 Figura 35 - Resultados da simulação para TR = 10 anos (Seção 5 km) .............. 105 Figura 36 - Resultados da simulação para TR = 10 anos (Seção 15 km) ............ 106 Figura 37 - Resultados da simulação para TR = 10 anos (Seção 25 km) ............ 106 Figura 38 - Perfil longitudinal do trecho de estudo .............................................. 108 Figura 39 - Resultados da simulação para TR = 10.000 anos (Seção 5 km) ...... 109 Figura 40 - Resultados da simulação para TR = 10.000 anos (Seção 15 km) .... 110 Figura 41 - Resultados da simulação para TR = 10.000 anos (Seção 25 km) .... 110 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Distribuição das barragens no Brasil de acordo com o seu uso ............................................................................ 18 Quadro 2 - Acidentes e incidentes registrados pela ANA entre 2010 e 2017 .............................................................................. 23 Quadro 3 - Normativos sobre segurança de barragens na China ...... 35 Quadro 4 - Classificação das barragens portuguesas ....................... 39 Quadro 5 - Resumo comparativo entre a legislação internacional sobre segurança de barragens ........................................ 43 Quadro 6 - Tempos de recorrência mínimos recomendados pela ANA para as cheias de projeto ......................................... 49 Quadro 7 - Comparação de valores de coeficientes de rugosidade de superfícies encontrados na literatura .......................... 54 Quadro 8 - Coeficientes de rugosidade (Manning) para diferentes classes e materiais ........................................................... 54 Quadro 9 - Caracterização fisiográfica da bacia hidrográfica contribuinte da PCH Pedra Furada .................................. 59 Quadro 10 - Especificações técnicas dos postos fluviométricos escolhidos ........................................................................ 63 Quadro 11 - Série de vazões máximas anuais para o posto fluviométrico Engenho Bento ........................................... 66 Quadro 12 - Série de máximos anuais corrigidos ................................. 67 Quadro 13 - Análise de estatística descritiva da série de máximos anuais .............................................................................. 68 Quadro 14 - Resultados do estudo de frequência de cheias ................ 69 Quadro 15 - Chave de classificação de imagens ................................. 71 Quadro 16 - Quantificação das classes de cobertura do solo para a situação real da área de estudo ....................................... 72 Quadro 17 - Quantificação das classes para situação real de cobertura do solo da área de preservação permanente ... 72 Quadro 18 - Comparativo entre vazões observadas e simuladas ........ 87 Quadro 19 - Coeficientes de rugosidade calibrados ............................ 88 Quadro 20 - Coeficientes de rugosidade baseados na literatura .......... 90 Quadro 21 - Cenários de modelagens hidrodinâmicas ........................ 92 Quadro 22 - Comparação entre as áreas alagadas pelas simulações com coeficientes teóricos e calibrados ............................. 93 Quadro 23 - Comparação entre as áreas alagadas pelas simulações com/sem a inserção de pontes ......................................... 100 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS AESA Agência Executiva de Gestão das Águas AGERH Agência Estadual de Recursos Hídricos ANA Agência Nacional de Águas ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica ANM Agência Nacional de Mineração ANPC Autoridade Nacional de Proteção Civil APA Agência Portuguesa do Ambiente APAC Agência Pernambucana de Águas e Clima APP Área de Preservação Permanente ASDSO Association of State Dam Safety Officials CBDB Comitê Brasileiro de Barragens CGSB Centro de Gerenciamento de Segurança de Barragens CMSB Centro de Monitoramento de Segurança de Barragens CNRH Conselho Nacional de Recursos Hídricos CSB Comissão de Segurança de Barragens CSRES China Standards on Review Engagements CSSGB Centro de Supervisão de Segurança de Grandes Barragens DSO Dam Safety Office EEE Empresa Estatal de Energia FEMA Federal Emergency Management Agency HEC-RAS Hydrologic Engineering Center’s – River Analysis System ICODS Interagency Committee on Dam Safety ICOLD International Comission On Large Dams IMASUL Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul INEMA Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos LNEC Laboratório Nacional de Engenharia Civil MDT Modelo Digital de Terreno MRH Ministério de Recursos Hídricos NATURATINS Instituto Natureza do Tocantins NDSP National Dam Safety Program PCH Pequena Central Hidrelétrica PSB Plano de Segurança de Barragens RPB Regulamento de Pequenas Barragens RSB Regulamento de Segurança de Barragens SDS Secretaria de Desenvolvimento Econômico Sustentável SEDAM Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental SEMA Secretaria do Meio Ambiente e Recursos Hídricos SEMAD Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável SEMARH Secretaria de Estado do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos SINIMA Sistema Nacional de Informações sobre Meio Ambiente SNISB Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens SRH Secretaria dos Recursos Hídricos TIN Triangulated irregular network TR Tempo de Retorno UHE Usina Hidrelétrica UTM Universal Transversa de Mercator VANT Veículo aéreo não tripulado SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .............................................................................. 15 2 OBJETIVOS .................................................................................. 17 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA ......................................................... 18 3.1 BARRAGENS ................................................................................ 18 3.2 LEGISLAÇÃO SOBRE SEGURANÇA DE BARRAGENS ............. 27 3.2.1 Brasil ............................................................................................ 28 3.2.2 Estados Unidos ........................................................................... 31 3.2.3 China ............................................................................................ 33 3.2.4 Portugal ........................................................................................ 38 3.2.5 África do Sul ................................................................................ 41 3.2.6 Análise da legislação internacional ........................................... 42 3.3 ESTUDOS HIDROLÓGICOS ........................................................ 48 3.4 MODELAGEM HIDRODINÂMICA ................................................. 50 3.5 COEFICIENTE DE RUGOSIDADE ............................................... 52 3.5.1 Conceitos ..................................................................................... 52 3.5.2 Efeito sobre caracterização de cheias ...................................... 56 4 MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................ 58 4.1 ÁREA DE ESTUDO ....................................................................... 58 4.2 BASE DE DADOS UTILIZADA ...................................................... 60 4.2.1 Levantamentos de campo .......................................................... 60 4.2.2 Dados históricos de hidrologia .................................................. 63 4.3 DETERMINAÇÃO DAS VAZÕES DE CHEIA ................................ 65 4.4 CLASSIFICAÇÃO DA COBERTURA DO SOLO DA ÁREA A JUSANTE ...................................................................................... 69 4.5 MODELAGEM HIDRODINÂMICA ................................................. 75 4.5.1 Resumo das etapas ..................................................................... 75 4.5.2 Inserção de dados geométricos ................................................. 76 4.5.2.1 Modelo digital de terreno ............................................................ 76 4.5.2.2 Malha de Escoamento ................................................................. 76 4.5.2.3 Inserção das seções de montante e jusante ............................. 78 4.5.2.4 Inserção das pontes .................................................................... 79 4.5.2.5 Inserção dos coeficientes de Manning ...................................... 81 4.5.3 Definição do tempo computacional ........................................... 90 4.5.4 Definição dos dados de escoamento ........................................ 90 4.5.4.1 Montante ...................................................................................... 91 4.5.4.2 Jusante ......................................................................................... 91 4.5.5 Definição dos cenários de simulação ....................................... 91 4.5.6 Exportação dos resultados ........................................................ 92 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO .................................................... 93 5.1 COEFICIENTES DE RUGOSIDADE CALIBRADOS E TEÓRICOS ...................................................................................................... 93 5.2 PONTES INSERIDAS NO MODELO .......................................... 100 5.3 COBERTURA DE SOLO DA APP ............................................... 105 5.3.1 Vazão equivalente à TR = 10 anos ........................................... 105 5.3.2 Vazão equivalente à TR = 10.000 anos .................................... 109 6 CONCLUSÕES ........................................................................... 112 REFERÊNCIAS ........................................................................... 114 APÊNDICE 1 – PROCESSO DE SOLICITAÇÃO DE DADOS PARA DESENVOLVIMENTO DA PESQUISA ....................................... 122 APÊNDICE 2 – FICHA DE CAMPO DE LEITURAS POSTO FLUVIOMÉTRICO ENGENHO BENTO NO RIO SIRINHAÉM ... 124 APÊNDICE 3 – FICHA DE CAMPO DE LEITURAS POSTO FLUVIOMÉTRICO JOSÉ MARIANO NO RIO AMARAGI .......... 125 15 1 INTRODUÇÃO As barragens são sistemas construtivos disseminados por todo o mundo, muitas vezes edificadas com perspectivas que vão além de ganhos financeiros, como por exemplo, aquelas com propósitos de garantir o abastecimento de comunidades onde o acesso à água com qualidade é dificultoso. Uma preocupação crescente sobre a possibilidade de falhas e eventuais rupturas destas estruturas emergiu com grande imponência. À medida que eventos críticos foram se desenrolando ao longo dos anos e, consigo, implicando em consequências inestimáveis para o ser humano e o meio ambiente, novos questionamentos regulatórios e sobre padronização de procedimentos de segurança também foram levantados. As legislações sobre segurança de barragens são tratativas, relativamente recentes em diversos países e o conteúdo destas divergem de uma comunidade para outra, apontando-se elementos ímpares em cada uma e que se complementam. Assim, faz-se de suma importância a expansão de pesquisas e descobertas acerca de metodologias relacionadas à gestão de segurança de barramentos. Porque, desta forma, facilita-se a correção de gargalos e práticas ineficientes existentes neste setor. A identificação de cenários emergenciais decorrentes de rupturas ou defluências de barragens, por meio da manipulação de softwares e ferramentas computacionais, têm se tornado um recurso estratégico e bastante difundido atualmente, não tão somente com vistas ao desenvolvimento de pesquisas de cunho acadêmico, como principalmente no meio profissional. Os mapas de inundações hipotéticas devem ser gerados a partir de modelagens hidrodinâmicas bem calibradas e com dados de entrada que sejam apropriados e mais coerentes com a situação real no local do empreendimento. Assim, necessita-se de uma busca constante no aprimoramento de técnicas para sua correta estimativa e, consequentemente, na melhoria da gestão de uma emergência e da mobilização da população localizada a jusante. 16 Neste contexto, no presente estudo, inicialmente fez-se um breve comparativo entre a legislação brasileira e alguns normativos internacionais sobre segurança de barragens, observando-se a existência de diferentes aspectos abordados entre eles e, na sequência, analisou-se a influência da cobertura do solo das áreas de preservação permanente a jusante da barragem da PCH Pedra Furada sobre características de manchas de inundação, a fim de contribuir com análises que irão permitir o melhoramento das atividades de contingência sobre a população residente em áreas suscetíveis a inundações. 17 2 OBJETIVOS Realizar um breve comparativo entre a legislação brasileira e alguns normativos internacionais sobre segurança de barragens, nomeadamente: Estados Unidos, China, África do Sul e Portugal. Analisar a influência da cobertura do solo das áreas de preservação permanente (APPs) a jusante da barragem da PCH Pedra Furada, localizada no município de Ribeirão no estado de Pernambuco, sobre os tempos de chegada de onda e profundidades de água referentes a vazões hipotéticas para tempos de retorno de 10 e 10.000 anos, defluentes deste empreendimento. 18 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 3.1 BARRAGENS As barragens podem ser definidas como obstáculos artificiais edificados com a capacidade de reter água, ou qualquer outro líquido, rejeitos e detritos para fins de armazenamento ou controle (COMITÊ BRASILEIRO DE BARRAGENS- CBDB, 2013). Diante da possibilidade de usos múltiplos destas estruturas, da existência vasta de corpos hídricos pelo planeta e do grande potencial de rendimento econômico destes sistemas construtivos, elas são executadas em alta escala a nível mundial, utilizando-se diferentes materiais de construção como terra, rocha, concreto e combinações destes. A Agência Nacional de Águas (ANA) é o órgão brasileiro que gere e regulamenta o uso de recursos hídricos no país, assumindo a responsabilidade de manter um cadastro atualizado de barragens existentes em cursos d’água sob sua jurisdição e fiscalizar a segurança destes empreendimentos. Segundo o último relatório de segurança de barragens emitido pela instituição, somam-se, no Brasil, 24.092 barragens cadastradas, cuja distribuição por categoria de uso é apresentada no Quadro 1 (ANA, 2018). Quadro 1 – Distribuição das barragens no Brasil de acordo com o seu uso Uso Barragens Percentual Aquicultura 2702 11,22 Irrigação 9827 40,79 Industrial 846 3,51 Regularização Vazões 753 3,13 Hidrelétrica 890 3,69 Outros 548 2,27 Dessedentação 4245 17,62 Sem Informação 719 2,98 Contenção de Rejeitos Minerais 790 3,28 Abastecimento de Água 1803 7,48 Recreação 914 3,79 Contenção de Resíduos Industriais 55 0,23 Total 24.092 100 Fonte: Agência Nacional de Águas- ANA (2018). Organizado pelo autor. 19 Quanto ao Registro Mundial de Barragens (COMISSÃO INTERNACIONAL DE GRANDES BARRAGENS- ICOLD, 2018), o cadastro considera somente as barragens classificadas como de grande porte, somando- se 59.071 barragens já construídas, com as principais finalidades de irrigação e geração de energia elétrica. A Comissão Internacional de Grandes Barragens (ICOLD) adota como “grande porte”, barragens com alturas iguais ou superiores a 15 metros, ou ainda, com alturas entre 5 e 10 metros acumulando mais de 3 milhões de metros cúbicos de água, rejeitos ou resíduos (ICOLD, 2018). Do montante apresentado pela ICOLD, os países que lideram o ranking de maior quantidade de barragens de grande porte construídas em seus territórios são China, Estados Unidos e Índia. O Brasil aparece em quinto lugar nesta lista. Frente à magnitude que estas construções podem atingir, a possibilidade de ruptura de barragens e o dano potencial de acidentes decorrentes de falhas nestes sistemas sempre foram motivos de preocupação e cautela, mas agravou- se ainda mais nos últimos anos, decorrente do erguimento desenfreado de barramentos e a ocorrência de alguns acidentes expressivos. Além disto, as novas barragens têm atraído maiores preocupações em relação às barragens mais antigas, uma vez que os empreendimentos mais recentes têm sido implantados em áreas mais densamente povoadas e industrializadas (WANG, 2018). Em novembro de 2015, o rompimento da barragem “Fundão”, construída para fins de acúmulo de rejeitos de mineração, localizada no Brasil no município de Mariana, estado de Minas Gerais, provocou a defluência de, aproximadamente, 55 milhões de metros cúbicos de lama, impactando áreas adjacentes aos corpos hídricos localizados a jusante do barramento por uma extensão de 650 km até encontrar a foz do rio Doce (AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS- ANA, 2016a). Em menos de três anos após este ocorrido, em janeiro de 2019, ainda em território brasileiro, a barragem de contenção de rejeitos “Barragem I” da Mina Feijão, no município de Brumadinho, estado de Minas Gerais, sofreu um colapso, 20 provocando a defluência de, aproximadamente, 12 milhões de metros cúbicos de líquido a jusante (AGÊNCIA NACIONAL DE MINERAÇÃO- ANM, 2019). Embora o volume liberado pela segunda barragem supracitada seja cerca de quatro vezes menor que aquele liberado pelo primeiro desastre, o fato ocorrido em Brumadinho provocou um impacto direto sobre 419 pessoas, das quais foram confirmados 246 óbitos e 24 casos de desaparecimento (MINAS GERAIS, 2019). Esta catástrofe, então, representou o estopim, pelo menos para o território brasileiro, para reaquecer o cenário de segurança de barragens e promover discussões sobre potenciais melhorias de práticas neste setor. Inclusive, o Projeto de Lei do Senado Brasileiro nº 224, arquivado, criado em 2016 após o rompimento da barragem Fundão, que previa alterar e enrijecer a Política Nacional de Segurança de Barragens, foi colocado em pauta novamente em março de 2019 (BRASIL, 2019a). Além disto, segundo o Ministério do Desenvolvimento Regional, são previstas até o fim de 2019 a execução de vistorias em 3.386 barragens brasileiras classificadas como de maiores riscos (BRASIL, 2019b). Na Figura 1, a seguir, ilustra-se, por meio de imagens de satélite, os rastros de rejeitos provocados pelos acontecimentos que se desenrolaram no Brasil, em Mariana e Brumadinho, respectivamente. 21 Figura 1 – Rastro de lama nas proximidades da barragem de Fundão e da Mina Feijão decorrentes de seus rompimentos Fonte: Própria autora. Pode-se utilizar como outro exemplo de acidente relevante, a barragem de Oroville, localizada no rio Feather, no estado da Califórnia, considerada a mais alta dos Estados Unidos com 235 m de altura, que levou à evacuação das populações ribeirinhas situadas a jusante (cerca de 180 mil pessoas) e instaurou estado de emergência na cidade de Oroville em fevereiro de 2017, frente ao surgimento de uma erosão de alta magnitude localizada no rápido concretado de seu vertedouro principal. Esta barragem, construída para fins de acúmulo de água e geração de energia elétrica, sucumbiu aos efeitos de chuvas intensas na região (Figura 2) o que levou o Departamento de Recursos Hídricos da Califórnia à decisão de liberar uma vazão com até 2.800 metros cúbicos por segundo, por meio de um desvio, para aliviar a pressão da água represada sobre o barramento e assim, reparar o dano no vertedouro (SABALOW; STANTON, 2017). 22 Figura 2 – Erosão na estrutura de concreto do vertedouro da barragem de Oroville Fonte: California Department of Water Resources (2017). Ainda que os casos anteriores ilustrem barragens de diferentes tipos e dimensões, inversamente ao que ocorreu no Brasil, o acontecimento em Oroville não levou a consequências fatídicas, uma vez que a falha se desenvolveu lentamente, permitindo que os empreendedores e departamentos responsáveis pela obra pudessem controlar a anomalia e aplicar ações preditivas, emitindo o alerta de evacuação da população com antecedência (ações que não foram colocadas em prática nos rompimentos brasileiros). A tomada de decisão e a rapidez com que este processo se desenvolve no momento de uma emergência, pode significar uma linha tênue entre a ocorrência de impactos mínimos e máximos provenientes de uma anomalia estrutural ou operativa de um barramento. Por isso, faz-se necessário a existência de um planejamento da gestão e execução de procedimentos de manutenção ao longo da vida útil do barramento e previsão de ações de emergência, que visem garantir a integridade do meio ambiente nas áreas de influência das barragens, bem como resguardar o bem-estar e a vida da população situada a jusante. Métodos comparativos e de ponderação entre políticas e práticas adotadas por diferentes entes auxiliam na otimização de quaisquer processos, 23 principalmente, na gestão de segurança de barragens, orientando, inclusive os países em desenvolvimento a elaborarem seus próprios programas de manutenção e monitoramento de riscos de barramentos (PISANIELLO, 2015). Após a promulgação da Lei Federal brasileira n. 12.334 (BRASIL, 2010), a Agência Nacional de Águas (ANA) passou a utilizar e implementar novas metodologias e ferramentas destinadas a gerir o Sistema Nacional de Segurança de Barragens, tais como o Relatório de Segurança de Barragens. Documento este que apresenta, com uma periodicidade praticamente anual, registros de acidentes e incidentes comunicados à ANA durante o período de abrangência deste relatório. No Quadro 2 e na Figura 3, apresentados a seguir, estão contemplados todos os acidentes e incidentes já registrados formalmente pela instituição em seus Relatórios de Segurança de Barragens. Quadro 2 – Acidentes e incidentes registrados pela ANA entre 2010 e 2017 Nome da Barragem Caráter do Evento Ano de Ocorrência UF Entidade Fiscalizadora Causa Provável PCH Pedra Furada Acidente 2011 PE ANEEL Rompimento da Ombreira PCH Dona Rita Incidente 2012 MG ANEEL Cheia PCH Cajuru Incidente 2012 MG ANEEL Cheia PCH Gafanhoto Incidente 2012 MG ANEEL Cheia PCH Mosquitão Incidente 2012 GO ANEEL Desplacamento na adutora PCH Piedade Incidente 2012 MG ANEEL Rompimento da manta PEAD Jaburu Incidente 2012 CE ANA Deficiência de projeto Barragem da CBE Incidente 2012 Sem Informação ANM Deficiência de projeto Aurizona Incidente 2012 Sem Informação ANM Deficiência de projeto Cupim Incidente 2012 CE SRH/CE Deficiência de projeto Capoeira Incidente 2013 PB ANA Falta de manutenção Três Irmãos Incidente 2014 ES AGERH Cheia Araçagi Incidente 2014 PB AESA/PB Falha mecânica (Continua) 24 Nome da Barragem Caráter do Evento Ano de Ocorrência UF Entidade Fiscalizadora Causa Provável Barragem de Pesque- Pague Acidente 2014 MS IMASUL/MS Cheia Gramame Incidente 2014 PB AESA/PB Percolação UHE Jirau Incidente 2014 RO ANEEL Cheia Araçagi Incidente 2014 PB AESA/PB Obstrução do vertedouro Agropecuária Buritis Acidente 2014 MT SEMA/MT Sem Informação Fazenda Boa Vista do Uru Acidente 2014 GO SEMARH/GO Galgamento UHE Santo Antônio do Jari Acidente 2014 AP ANEEL Galgamento Vacaro Acidente 2014 SC SDS Galgamento Jacarecica I Incidente 2014 SE SEMARH/SE Sem Informação UHE Dona Francisca Incidente 2014 RS ANEEL Cheia B1 e B2 Acidente 2014 MG ANM Erosão Interna Fundão Acidente 2015 MG ANM Liquefação de Afluentes Germano Incidente 2015 MG ANM Rompimento de barragem a montante Santarém Incidente 2015 MG ANM Rompimento de barragem a montante UHE Risoleta Neves Incidente 2015 MG ANEEL Rompimento de barragem a montante Córrego Seco Incidente 2015 ES AGERH Lixiviação UHE Cachoeira Caldeirão Acidente 2015 AP ANEEL Cheia PCH Inxu Acidente 2015 MT ANEEL Erosão Interna Coronel Sapucaia Incidente 2015 MS IMASUL/MS Dragagem do Reservatório Propriedade de Nei Zampieri Acidente 2015 SC SDS Erosão Interna Bacanga Acidente 2015 MA SEMA Desabamento da comporta Alto Grande Acidente 2016 BA INEMA/BA Cheia Fazenda Felícia Acidente 2016 GO SEMAD/GO Sem Informação Fazenda Guavirova Acidente 2016 PR Aguas Parana/PR Cheia Jucazinho Incidente 2016 PE APAC/PE Fissuras (Continua) 25 Nome da Barragem Caráter do Evento Ano de Ocorrência UF Entidade Fiscalizadora Causa Provável Dique B3 Incidente 2016 MG ANM Sem Informação Itabiruçu Incidente 2016 MG ANM Sem Informação Canoas Incidente 2016 AL SEMARH/AL Falta de manutenção Bosque IV Incidente 2016 AL SEMARH/AL Insuficiência do Vertedor Taboca Incidente 2016 TO NATURANTINS/TO Carreamento de material São Francisco Incidente 2016 AL SEMARH/AL Insuficiência do Vertedor Prado Incidente 2016 AL SEMARH/AL Insuficiência do Vertedor Gulandim Incidente 2016 AL SEMARH/AL Insuficiência do Vertedor Piauí Incidente 2016 AL SEMARH/AL Insuficiência do Vertedor Botuporá Incidente 2016 BA INEMA/BA Cheia Rincão dos Kroeff Acidente 2017 RS SEMA/RS Cheia Cacimba Nova Acidente 2017 PE ANA Percolação pela fundação Barreiros Acidente 2017 PE ANA Percolação pela fundação Lageado Acidente 2017 MS IMASUL/MS Galgamento Açude dos Irmãos Incidente 2017 PB AESA/PB Vertedor insuficiente quase causou galgamento PCH Tamboril Incidente 2017 GO ANEEL Rompimento parcial da membrana PEAD e aterro na margem esquerda Conjunto de Baias VIGA Incidente 2017 MG ANM Recalque após remoção de rejeitos Conjunto de Baias VIGA Incidente 2017 MG ANM Recalque após remoção de rejeitos Pindoba Incidente 2017 AL SEMARH/AL Vertedor insuficiente quase causou galgamento Casa de Pedra Incidente 2017 MG ANM Surgências após elevação do nível da água do reservatório alteado PCH Rodulf Incidente 2017 SC ANEEL Pequeno rompimento em junta de dilatação PCH Verde 4A Incidente 2017 MS ANEEL Vazamento dentro da casa de força (Continua) 26 (Conclusão) Nome da Barragem Caráter do Evento Ano de Ocorrência UF Entidade Fiscalizadora Causa Provável Capané Incidente 2017 RS SEMA/RS Excesso de percolação Água Limpa Incidente 2017 ES AGERH/ES Material carreado obstruindo vertedor Balneário Ayrton Senna Acidente Sem Informação MS IMASUL/MS Cheia Chá dos Pereira Incidente Sem Informação PB AESA/PB Falta de manutenção Saulo Maia Incidente Sem Informação PB AESA/PB Falta de manutenção Capa Zero Incidente Sem Informação RO SEDAM/RO Carreamento de material Duas Bocas Incidente Sem Informação ES AGERH Sem Informação Fonte: ANA (2010-2018). Organizado pela autora. Figura 3 – Quantificação de causas prováveis de acidentes e incidentes registrados pela ANA entre 2010 e 2017 Fonte: ANA (2010-2018). Organizado pela autora. Nota-se que significativa parcela (35%) dos 67 registros formais de acidentes e incidentes em barragens deve-se a ocorrências de cheias, 1 13 1 1 4 4 1 1 1 6 4 3 1 3 1 1 1 1 5 2 2 2 1 2 1 1 1 1 1 0 2 4 6 8 10 12 14 Rompimento da Ombreira Cheia Desplacamento na adutora Rompimento da manta PEAD Deficiência de projeto Falta de manutenção Falha mecânica Percolação Obstrução do vertedouro Sem Informação Galgamento Erosão Interna Liquefação de Afluentes Rompimento de barragem a montante Lixiviação Dragagem do Reservatório Desabamento da comporta Fissuras Insuficiência do Vertedor Carreamento de material Percolação pela fundação Vertedor insuficiente quase causou galgamento Rompimento parcial da membrana PEAD e aterro na margem esquerda Recalque após remoção de rejeitos Surgências após elevação do nível da água do reservatório alteado Pequeno rompimento em junta de dilatação Vazamento dentro da casa de força Excesso de percolação Material carreado obstruindo vertedor 27 galgamentos ou à ineficiência de órgãos de descarga. Este contexto, portanto, evidencia uma natureza de inexatidão no que tange aos projetos construtivos de barramentos ou, ainda, à fatores de segurança – exigidos pelas normas – pouco rígidos, uma vez que estas estruturas estão sucumbindo à eventos hidrológicos mais intensos. Faz-se necessário, então, a reavaliação frequente de estudos de cheia de projeto e órgãos extravasores, face à eventuais erros humanos e de engenharia ou, ainda, às próprias modificações climatológicas e ambientais a que essas estruturas estão sujeitas ao longo da vida útil. 3.2 LEGISLAÇÃO SOBRE SEGURANÇA DE BARRAGENS O levantamento dos principais aspectos abordados na legislação internacional sobre segurança de barragens auxilia na identificação dos elementos mais eficazes e que se constituem pontos de apoio ideais para aplicação dessas normativas. As legislações analisadas foram escolhidas a partir da disponibilidade de dados ao acesso público, bem como pelos respectivos países estarem localizados em regiões diferentes e apresentarem características singulares relacionadas à segurança de barragens. A China e os Estados Unidos contabilizam um significativo número de barragens de grande porte construídas em seus territórios, com 23.842 e 9.265 barramentos, respectivamente (ICOLD, 2018). Além disto, ambos países são considerados as maiores economias do mundo (INSTITUTO DE PESQUISA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS - IPRI, 2017), dando margem para investimentos grandiosos no setor de infra-estrutura. Em Portugal, as barragens são estruturas de suma importância, primordialmente utilizadas para o abastecimento público e irrigação, sendo construídas principalmente nas regiões Sul e interioranas, cuja disponibilidade hídrica é irregular, tornando-se recursos escassos durante o verão. Já na região Norte, onde os recuros hídricos tem melhor distribuição, os barramentos são erguidos com propósitos de geração de energia hidrelétrica (AGÊNCIA PORTUGUESA DO AMBIENTE - APA, 2019). 28 A questão da segurança de barragens na África do Sul é um assunto abordado há mais de três décadas, desde o ano de 1987, quando entrou em vigor a legislação intitulada “Water Act of 1956”, que mais tarde, em 1998, veio a ser substituída por diretrizes específicas para este setor. E frente à isto, as práticas adotadas pelo país são utilizadas como base e modelo para muitos outros, como o Brasil, por exemplo, quando da elaboração de materiais e guias orientativos para os proprietários de barragens, pela ANA (ANA, 2016b). Cada um destes cinco países, incluindo-se o Brasil, possuem legislações específicas para construção, manutenção e operação de barragens, apresentando particularidades e focos diferentes, passíveis de análise e conhecimento, e que são brevemente apresentadas neste trabalho. 3.2.1 Brasil No Brasil, a Política Nacional de Segurança de Barragens é regida e estabelecida pela Lei Federal n. 12.334, de 20 de setembro de 2010 (BRASIL, 2010). Esta lei é aplicada a barragens destinadas ao acúmulo de água para quaisquer usos, à disposição final ou temporária de rejeitos e à acumulação de resíduos industriais, contanto que suas estruturas atendam à, pelo menos, um dos seguintes requisitos: • Altura do maciço, contada do ponto mais baixo da fundação à crista, maior ou igual a 15m (quinze metros); • Capacidade total do reservatório maior ou igual a 3.000.000m³ (três milhões de metros cúbicos); • Reservatório que contenha resíduos perigosos; • Categoria de dano potencial associado médio ou alto, em termos econômicos, sociais, ambientais ou de perdas de vidas humanas. A política brasileira atual visa, primordialmente, regulamentar e garantir ações de segurança nas barragens em todo o território nacional, desde as fases de planejamento e projeto do barramento, durante o enchimento do reservatório e operação contínua. 29 Esta lei é viabilizada pela a existência de determinados instrumentos, sendo eles: • A classificação de barragens por categoria de risco e dano potencial associado, regida pelos agentes fiscalizadores específicos para cada tipo de empreendimento; • O Plano de Segurança de Barragens (PSB), que deverá ser revisado de maneira periódica estabelecida pelo órgão fiscalizador em função da classificação da barragem; • O Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB), para fins de armazenamento e disponibilização de dados; • O Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente (Sinima); • O Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Civil; • O Cadastro Técnico Federal de Atividades Potencialmente Poluidoras ou Utilizadoras de Recursos Ambientais; e • O Relatório de Segurança de Barragens. O Plano de Segurança de Barragens (PSB) se configura como uma importante ferramenta de registro e atualização de informações, compreendendo manuais de operação, projetos diversos, plano de ação de emergência, relatórios de monitoramento e inspeção regulares, cujo nível de detalhamento é estabelecido pelo órgão fiscalizador. O Plano de Ação de Emergência que faz parte do PSB é um documento que integra ações a serem executadas em situação de emergência e os respectivos responsáveis, além de apresentar mapas que ilustrem inundações hipotéticas. Deve ser disponibilizado no empreendimento, nas prefeituras envolvidas, autoridades competentes e órgãos de defesa civil, reforçando a necessidade de alinhamento e mobilização de todas as partes em um cenário de urgência. 30 Dentro de um cenário emergencial, cabe destacar, que a legislação federal brasileira não decreta responsabilidades claras entre empreendedor e defesas civis quanto a atividades de alerta e resgate da população afetada em caso de defluências descontroláveis pelo empreendimento. Analisando-se as legislações promulgadas pelos órgãos fiscalizadores federais, a Resolução n. 236 da ANA (2017) e a Portaria n.70.389 da ANM (2017) mencionam a responsabilidade do empreendedor em alertar a população residente dentro da área nomeada “Zona de Auto Salvamento”. Ainda segundo ambas as resoluções, a Zona de Auto Salvamento compreende a região do vale a jusante ao barramento, delimitada pela menor (no caso da ANA) ou maior (no caso da ANM) das seguintes distâncias: a que corresponda a um tempo de chegada da onda de inundação igual a trinta minutos ou 10 km. A Lei Federal aponta que as inspeções regulares de segurança e análise de dados de auscultação são função da categoria de risco e dano potencial associado à barragem, cujo conteúdo e periodicidade podem variar, mas que, impreterivelmente, devem ser realizadas nas fases de construção, operação e desativação do barramento. Ressalta-se, ainda, que a categorização das barragens por risco, se baseia em características técnicas, estado de conservação da barragem e existência do Plano de Segurança da Barragem. Enquanto, a classificação quanto ao dano potencial associado é hierarquizada conforme a existência de população, infraestruturas e áreas protegidas a jusante, além da natureza do material represado e o respectivo volume (BRASIL, 2010). A política federal ainda incumbe, à instituição reguladora nacional, a realização de programas educativos e de comunicação sobre segurança de barragens, com o propósito de conscientizar a sociedade, promover ações em instituições de ensino, pesquisas e associações relacionadas à engenharia de barragens. 31 Instituições como a ANA (Agência Nacional de Águas), ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), ANM (Agência Nacional de Mineração), CNRH (Conselho Nacional de Recursos Hídricos), entre outros órgãos fiscalizadores, trabalham em conjunto e desenvolvem diretrizes e resoluções de maneira paralela para os empreendimentos a eles outorgados. Ressalta-se que, previamente à legislação apresentada, o Brasil tão somente dispunha de leis direcionadas ao gerenciamento de recursos hídricos como um todo, Lei Federal n. 9.433, de 8 de janeiro de 1997 (BRASIL, 1997) e à criação da Agência Nacional de Águas, Lei Federal n. 9.984, de 17 de julho de 2000 (BRASIL, 2000). 3.2.2 Estados Unidos Nos Estados Unidos, os programas de segurança de barragens são regidos por legislações e instituições submetidas à Agência Federal de Gestão de Emergências (FEMA – Federal Emergency Management Agency), criada em 1979 com o propósito de auxiliar o governo federal na coordenação de atividades de prevenção, mitigação e recuperação em situações de desastres. Entre os principais órgãos responsáveis pela segurança de barragens localizadas no país, e parceiros da FEMA, estão o Conselho de Revisão de Segurança de Barragens (Review Board) e o Comitê de Interagências sobre Segurança de Barragens (ICODS – Interagency Committee on Dam Safety). Este último, instituído e criado pelo Ato de Recursos Hídricos aprovado em 1996. No território norte-americano, os estados atuam de maneira independente na composição das leis sobre segurança de barragens, desde que estas sejam revisadas e aprovadas, periodicamente, pela FEMA, podendo ser revogada as suas aplicações (MENESCAL, 2009). Cita-se, então, como importante figura no cenário de segurança destas estruturas, a Associação dos Estados Oficiais de Seguranças de Barragens (ASDSO - Association of State Dam Safety Officials). Trata-se de uma organização sem fins lucrativos que apoia e incentiva os programas de segurança de barragens elaborados pelos estados, além de conscientizar a população acerca dos riscos inerentes à estas construções e a importância das 32 legislações e ações de prevenção (ASSOCIATION OF STATE DAM SAFETY OFFICIALS- ASDSO, 2017). Em linhas gerais, o governo federal, personificado pela FEMA, adota diretrizes e instrumentos dispostos no Programa Nacional de Segurança de Barragens (NDSP – National Dam Safety Program) para reger e promover o desenvolvimento das atividades em barragens outorgadas a agências federais, e busca, por meio dele, influenciar os planos estaduais e privatizados de segurança, propondo parcerias, disponibilizando recursos financeiros, treinamentos e pesquisas. Os instrumentos e orientações de aplicação do NDSP elaborados pelo ICODS, aprovados e adotados pela FEMA são os seguintes: • FEMA P-1025: diretrizes federais para gerenciamento de risco de segurança de barragens; • FEMA 64: plano de ação de emergência para empreendedores; • FEMA P-946: mapeamento de inundações de riscos de enchentes associados com acidentes e rompimento de barragens; • FEMA P-94: seleção e adequação de design de propagação de ondas; • FEMA 65: análises de terremotos e design de barragens; • FEMA 93: diretrizes federais para seguranças de barragens; • FEMA 148: glossário de termos; • FEMA 333: sistema de classificação de barragens de risco potencial. Das diretrizes federais para segurança de barragens, FEMA 93 (INTERAGENCY COMMITTEE ON DAM SAFETY- ICODS, 2004), tem-se que as barragens, para fins diversos de uso, para as quais esta legislação seja aplicável, devem preencher pelo menos um dos seguintes requisitos: • Altura, considerada desde o leito natural do curso hídrico a jusante ou desde o ponto mais baixo do maciço até o nível 33 máximo do volume represado, igual ou superior a 25 pés (7,62 m); • Capacidade de armazenamento volumétrico igual ou superior a 50 acre-pés (61.674 m³); • Risco a jusante potencialmente significativa, independente das dimensões. As barragens que não excederem 6 pés (1,83 m) de altura, independente da capacidade volumétrica, ou que não excedam a capacidade volumétrica de 15 acre-pés (18.502 m³), independente da altura, estão dispensadas da aplicação destas diretrizes. A FEMA 93 (ICODS, 2004) é aplicável de maneira equivalente para todas as barragens que atendem aos requisitos elencados acima, independentemente se os reservatórios são permanentes ou temporários, ou ainda, se acumulam água, rejeitos ou outros materiais. Há resoluções regulatórias paralelas ao NDSP criadas por órgãos que fiscalizam especificamente as barragens do setor de mineração e elétrico, durante todas as fases da vida útil do empreendimento, mas que não os excluem da aplicação das leis estaduais. Em suma, o conteúdo básico das regulamentações estaduais cria a figura de órgãos fiscalizadores próprios, desenvolvem uma metodologia de classificação de barragens para gradação das atividades de acompanhamento e apontam a responsabilidade primária sobre as barragens para o proprietário, ou seja, o dono do barramento é responsável pelas inspeções e monitoramento de operação (MENESCAL, 2009). 3.2.3 China As barragens na China são, à princípio, divididas em dois tipos, segundo suas finalidades: uso de recursos hídricos, sob jurisdição do Ministério de Recursos Hídricos (MRH), e geração de energia elétrica, sob responsabilidade da Empresa Estatal de Energia (EEE). 34 A responsabilidade primária pela segurança de barragem é do proprietário da mesma, onde o governo tem uma função supervisora e orientativa (MENESCAL, 2009; BRADLOW et al., 2002). Neste país, a autoridade reguladora tem o poder de monitorar inspeções realizadas pelo dono da barragem e aceitar ou rejeitar os relatórios emitidos, bem como têm o poder de conduzir suas próprias inspeções (BRADLOW et al., 2002). Em 1985, a Empresa Estatal de Energia criou o Centro de Supervisão de Segurança de Grandes Barragens (CSSGB). Em resposta, o Ministério de Recursos Hídricos criou o Centro de Monitoramento de Segurança de Barragens (CMSB), que mais tarde, em 1995, veio a ser conhecido como Centro de Gerenciamento de Segurança de Barragens (CGSB). O CSSGB conduziu uma rodada de inspeções nas barragens sob jurisdição da EEE, em 1987, que perdurou por 12 anos, e vistoriou 96 empreendimentos, sendo a maioria construída após 1980 (INTERNATIONAL WATER POWER, 1999). Este procedimento colaborou para o aprimoramento dos profissionais envolvidos com segurança de barragens e reafirmou a conscientização deles para com a importância da realização de inspeções periódicas. Algumas medidas corretivas como execução de alteamentos, tratamentos de trincas e fissuras nas estruturas, reparo de infiltrações e instalação de instrumentos de monitoramento, foram implementadas nos barramentos, compondo os princípios do Programa de Modificação de Monitoramento de Segurança de Barragem das Estações Hidrelétricas, publicado em 1992 pelo órgão correspondente. Desde meados de 1950, o país desenvolvia e fabricava instrumentos de monitoramento de barragens, que foram incorporando atualizações tecnológicas com o passar do tempo e ficando cada vez mais precisos e automatizados. Aliando esta produção de equipamentos ao grande número de barragens que começaram a ser construídas em 1980 e a implementação de 35 inspeções periódicas nas barragens, a partir de 1990, a China passou a se tornar um país de comportamento exemplar em termos qualitativos de monitoramento de barragem. Em 1999, o CSSGB e o CGSB passaram a cumprir seus serviços em prol de duas entidades: a Comissão Estadual de Economia e Comércio e a Corporação de Energia do Estado da China. As atividades incluem advertir o governo sobre a gestão da segurança das barragens das centrais hidrelétricas, implementar políticas e diretrizes nacionais, supervisionar e orientar trabalhos de gerenciamento e encorajar os proprietários das barragens a promover uma cultura de monitoramento e segurança. Atualmente, a segurança de barragens na China é analisada quanto à integridade das estruturas, monitoramento dos instrumentos, operação e planejamento de emergência (CHENG et al., 2010) e é regida pelas legislações apresentadas no Quadro 3, apresentado a seguir. Quadro 3 – Normativos sobre segurança de barragens na China Código Nome Departamento Data de Implantação DL/T 1134-2009 Unidade de aquisição automática de dados do monitoramento de segurança de barragem Administração Nacional de Energia 01-12-2009 DL/T 1321-2014 Padrões para estrutura e identificação do banco de dados de monitoramento de segurança de barragens Administração Nacional de Energia 01-08-2014 DL/T 1558-2016 Código para operação e manutenção do sistema de monitoramento de segurança de barragens Administração Nacional de Energia 01-06-2016 DL/T 1735-2017 Tecnologia básica de cabos de instrumentação de monitoramento de segurança de barragens Administração Nacional de Energia 01-03-2018 DL/T 1754-2017 Especificação técnica para sistema de informações de gerenciamento de segurança de barragens para usina hidrelétrica em operação Administração Nacional de Energia 01-03-2018 DL/T 1901-2018 Guia para planos de preparação para emergências para grandes barragens de usinas hidrelétricas em operação Administração Nacional de Energia 01-05-2019 (Continua) 36 (Conclusão) Código Nome Departamento Data de Implantação DL/T 324-2010 Protocolo de comunicação para sistema de automação de monitoramento de segurança de barragens Administração Nacional de Energia 01-05-2011 DL/T 5211-2005 Especificação técnica para automação de monitoramento de segurança de barragens Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma 01-06-2005 DL/T 5313- 2014(E)* Guia para Avaliação de Segurança de Grandes Barragens de Usinas Hidrelétricas em Operação Administração Nacional de Energia 01-08-2014 DL/T 5385-2007 Especificação para supervisão de construção do sistema de monitoramento de segurança de barragens Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma 01-12-2007 GB/T 22385- 2008 Especificação para aceitação do sistema de monitoramento de segurança de barragens Supervisão Nacional de Qualidade, Departamento de Inspeção e Quarentena, e Administração Nacional de Normalização 01-08-2009 SL 258-2017 Diretrizes para Avaliação de Segurança de Barragens Ministério de Recursos Hídricos 09-04-2017 SL 268-2001 Especificação fundamental de equipamentos de sistema de automação para monitoramento de segurança de barragens - 01-12-2001 SL 530-2012 Especificação para verificação e teste de instrumentos de monitoramento de segurança de barragens Ministério de Recursos Hídricos 16-08-2012 SL 531-2012 Norma para instalação de instrumentos de monitoramento de segurança de barragens Ministério de Recursos Hídricos 08-09-2012 SL 621-2013 Norma para desmantelamento de instrumento de monitoramento de segurança de barragem - 29-11-2013 SL/Z 720-2015 Diretrizes para o plano de preparação para emergências do gerenciamento de segurança de barragens de reservatórios Ministério de Recursos Hídricos 22-12-2015 SL 766-2018 Especificação técnica para identificação do sistema de monitoramento de segurança de barragens Ministério de Recursos Hídricos 2019-03-05 * DL/T 5313-2014(E) significa que há duas versões, incluindo em Chinês e Inglês. A versão chinesa é nomeada DL/T 5313-2014, e a versão em inglês é nomeada DL/T 5313-2014(E). Fonte: China Standards on Review Engagements – CSRES (2019). 37 A legislação vigente e aplicável à avaliação de segurança de barragens (SL 258-2017) é uma atualização do documento “Diretrizes para Avaliação de Segurança de Barragens”, publicado inicialmente em 2000. As “Diretrizes para Avaliação de Segurança de Barragens” (CHINA, 2017) são aplicáveis para barragens com altura de, no mínimo, 15 metros ou que represem um volume maior ou igual a um milhão de metros cúbicos. Baseado nesta mesma legislação, a avaliação de características técnicas como capacidade de controle de cheias, percolação, segurança estrutural, sismicidade e segurança de estruturas metálicas é dividida em três níveis: A, B, e C. Classe A é seguro e confiável; Classe B é segurança mínima, mas incompleta; Classe C é inseguro. As conclusões da avaliação da qualidade de engenharia são divididas em “qualificadas”, “qualificadas básicas” e “não qualificadas”; as conclusões da avaliação da gestão operacional são divididas em “normativo”, “normativo comparativo” e “não padrão”, como base de referência para avaliação abrangente da segurança de barragens. Segundo Cheng et al. (2010), o monitoramento do barramento por meio de inspeções é realizado de três formas: atividades diárias, anuais e especiais. O primeiro tipo é incluído na rotina de operação do barramento, acompanhamento sistematicamente as ocorrências observadas. As inspeções anuais são feitas pela equipe técnica antes e depois das épocas chuvosas e, também, no fim de todo ano. As inspeções especiais são realizadas quando são percebidos sinais de danos com potencial para prejudicar a segurança da operação. Quanto à previsão e medidas de emergência, estas são regidas pelas Diretrizes para o Plano de Preparação para Emergências da Gestão de Segurança de Barragens de Reservatórios (SL/Z 720-2015) que auxiliam no planejamento de respostas e sistemas de alerta. Esta norma é aplicável à preparação de reservatórios de grande e médio porte, e podem ser implementados, como referência, para pequenos reservatórios. 38 A preparação do plano deve ser organizada pela unidade de gestão do reservatório ou seu departamento competente, o proprietário do reservatório (proprietário), e deve executar os procedimentos correspondentes de aprovação e arquivamento. Na China, há uma especificação técnica intitulada “SL 164-2010” sobre testes de modelos e simulações numéricas de várias barragens, modelagem de inundação e simulações numéricas de bobinas e diques, e pode ser usada como referência para simulações de explosões de engenharia similares. Os planos de emergência devem ser desenvolvidos para todos os tipos de barragens, mas de acordo com o Guia de Mapeamento de Cheias (1997) apenas para grandes e médios reservatórios, um mapeamento das áreas de risco de inundação deve ser desenvolvido (CHENG et al., 2010). 3.2.4 Portugal Na política de segurança de barragens de Portugal, figuram como entidades de apoio e fiscalização às atividades, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), a Autoridade Nacional de Proteção e Defesa Civil (ANPC) e a Comissão de Segurança de Barragens (CSB). Atualmente, em Portugal, a legislação aplicável referente à segurança de barragens foi determinada pelo decreto-lei n. 21, de 28 de março de 2018, que estabelece dois instrumentos de atuação: o Regulamento de Segurança de Barragens (RSB) e o Regulamento de Pequenas Barragens (RPB). Inicialmente, o RSB foi publicado pelo decreto-lei n.11, de 6 de janeiro de 1990, e posteriormente revisado pelo decreto-lei n. 344, de 15 de outubro de 2007, estabelecendo algumas diretrizes para atividades de segurança em barragens maiores. O RPB também já era um instrumento existente, desde a promulgação do decreto-lei n. 409, de 14 de dezembro de 1993. Com a última atualização em 2018, houve uma revisão da repartição de competências no que diz respeito à dimensão destes empreendimentos, de tal 39 maneira que se pudesse enquadrar em algum destes regulamentos praticamente todas as barragens já construídas no país. Desta forma, de acordo com esta alteração, o RSB é aplicado às barragens entendidas como de grande porte, com altura igual ou superior a 15 m, ou com altura igual ou superior a 10 m que condicionem a existência de um reservatório com volume superior a 1 hm³. Já o RPB, é aplicado às barragens não enquadradas no regulamento supracitado, que compreendam estruturas com altura inferior a 10 m ou que tenham altura igual ou superior a 10 m e inferior a 15 m cujo reservatório tenha capacidade volumétrica inferior a 1 hm³. Excetuam-se deste regulamento, as barragens que possuem altura inferior a 2 m, medida desde a cota do talvegue até a cota do coroamento. Assim como a legislação brasileira, o decreto-lei n. 21/2018 de Portugal incorpora a gradação das medidas de registro e controle de segurança de barragens conforme o dano potencial associado a estrutura analisada. As barragens construídas em território lusitano podem ser classificadas em três classes distintas (classe I, II e III) a depender das características técnicas do barramento e do dano potencial oferecido a vidas humanas, bens e meio- ambiente. O Quadro 4, a seguir, apresenta os parâmetros adotados para a categorização das barragens em território Português. Entende-se que Y é o número de edificações fixas no vale a jusante e X, o risco da barragem caracterizado pela função 𝑋𝑋 = 𝐻𝐻² √𝑉𝑉, sendo H a altura da barragem, em metros, e V a capacidade do reservatório em hm³. Quadro 4 – Classificação das barragens portuguesas Classes Risco e danos potenciais I 𝑌𝑌 ≥ 10 𝑒𝑒 𝑋𝑋 ≥ 1000 II 𝑌𝑌 ≥ 10 𝑒𝑒 𝑋𝑋 < 1000 Ou 0 < 𝑌𝑌 < 10 , independente do valor de X Ou Existência de infrastruturas, instalações e bens ambientais importantes III 𝑌𝑌 = 0 , independente do valor de X Fonte: Portugal (2018). 40 Com relação a situações emergenciais nas barragens, o RSB define a existência de dois planos de ação: interno e externo. O primeiro é elaborado pelo dono da obra, relativo a segurança do reservatório e da zona de auto salvamento (tempo de chegada de onda igual a 30 min, com no mínimo 5 km de distância). Enquanto, o segundo é de responsabilidade do sistema de proteção e defesa civil. Para as barragens de classe I, do RSB, são exigidos ambos os planejamentos de emergência. Para as barragens classe II, são exigidos planejamentos simplificados de segurança. No caso de pequenas barragens, abarcadas pelo RPB, em casos de emergências, é incumbido ao dono da obra avisar os residentes próximos da barragem, alertar a Autoridade e os Serviços de Proteção Civil. Da mesma forma que apontam as resoluções brasileiras, em Portugal, no caso de uma emergência, o dono da obra é responsável por tão somente alertar a população na Zona de Auto Salvamento e os órgãos de defesa civil. O RSB promulga a existência de um plano de observação que rege a execução de inspeções visuais e análise do comportamento das estruturas que compõem as barragens. As grandezas de monitoramento, metodologias aplicadas e frequência das atividades de observação são levantadas pelo próprio dono da obra, de acordo com as Normas de Observação e Inspeção de Barragens (Portaria 847/93) e sujeitas a aprovação da Autoridade Nacional de Segurança de Barragens. Para as barragens de classe I sujeitas ao RSB, a Autoridade tem o direito de realizar inspeções, quando julgar oportuno, com vistas à verificação da conservação das estruturas e das condições de manutenção e operação dos órgãos extravasores. O RPB, em contrapartida, estipula que, para as barragens sob sua jurisdição, o dono da obra deve providenciar a execução de inspeções visuais anuais antes do período chuvoso e após a ocorrência de circunstâncias excepcionais, enviando os respectivos relatórios à Autoridade. 41 Os planos de observação e emergência, além de estudos e análises complementares executados pelos proprietários das barragens, compõem um arquivo técnico atualizado e disponível à Autoridade. 3.2.5 África do Sul O histórico legal da África do Sul em segurança de barragens, remonta à promulgação do National Water Act, pela República Federal Sul Africana em 1998, que tem por objetivos a gestão de recursos hídricos no país e a preservação da qualidade das águas em prol de usos sustentáveis. O capítulo 12 do Ato (AFRICA DO SUL, 1998), localmente conhecido por “The Act”, dispõe sobre as diretrizes que os proprietários de barragens no país devem utilizar e medidas a serem tomadas por eles, visando à manutenção de uma boa segurança com riscos de falhas mínimos em seus empreendimentos. As barragens de interesse, sobre as quais este ato é aplicável, são chamadas de “barragens com risco de segurança”, cujos maciços ultrapassam a marca dos 5 metros de altura, bem como uma capacidade de armazenamento de líquidos superior a 50.000 m³. À um barramento também pode ser atribuído este título, se o Ministro de Assuntos da Água e Florestas, julgar adequado, baseando-se na necessidade de proteção das pessoas, propriedades e qualidade dos recursos, características de projeto e impactos socioeconômicos. O Ato também instrui os proprietários das barragens com risco de segurança a se reportarem ao Ministério do Meio Ambiente com informações, projetos, desenhos, entre outros documentos ou substituir esta atividade permitindo que uma pessoa autorizada pelo ministério possa inspecionar o barramento, afim de que seja confirmada a classificação da estrutura, verificar se o regulamento tem sido cumprido e ainda, averiguar a necessidade de execução de possíveis atividades de reparos e correção de ocorrências anômalas. Em complemento a este Ato, em fevereiro de 2012, o governo sul africano publicou os Regulamentos de Segurança de Barragens (ÁFRICA DO 42 SUL, 2012), que são, atualmente, administrados e coordenados pela instituição doravante denominada Gabinete de Segurança de Barragens (DSO – Dam Safety Office). Os Regulamentos propõem que as barragens com risco de segurança possam ser subdivididas em três grupos (Categorias I, II e III), a partir do cruzamento de informações sobre suas dimensões estruturais (classes pequena, média e grande) e o dano potencial associado (classes baixa, significante e alta), objetivando-se graduar as medidas de controle e de segurança do maciço. Em méritos dos projetos de engenharia para as barragens, sejam elas enquadradas em qualquer categoria, cita-se a necessidade de se elaborar um mapeamento de manchas de inundação decorrentes de uma potencial falha estrutural da obra analisada, bem como um mapeamento das enchentes provenientes do rompimento de barragens a montante, caso existir. Uma avaliação e revisão da segurança das barragens de Categoria I, baseada em registros e dados técnicos, deve ser realizada em intervalos de tempo de cinco a dez anos e apresentadas, quando exigido pelo Diretor-Geral do Gabinete. Já para as Categorias II e III, o proprietário deve providenciar uma análise de segurança inicial da barragem, em um período de até três anos após o início da operação, e avaliações periódicas que não ultrapassem intervalos de cinco anos. 3.2.6 Análise da legislação internacional No Quadro 5, a seguir, é apresentado um resumo comparativo entre alguns pontos chaves, referente às legislações sobre segurança de barragens, descritas no item anterior. 43 Quadro 5 – Resumo comparativo entre a legislação internacional sobre segurança de barragens Fonte: Própria autora. BRASIL ESTADOS UNIDOS ÁFRICA DO SUL PORTUGAL CHINA Nome/Identificação Política Nacional de Segurança de Barragens (Lei n. 12.334/2010) Diretrizes Federais para Segurança de Barragens (FEMA 93/2004) Ato Nacional da Água (Act 36 of 1998) e Regulamento de Segurança de Barragens (2012) Regulamento de Segurança de Barragens (RSB) e Regulamento de Pequenas Barragens (RPB) - Decreto-Lei n.21/2018 Diretrizes para Avaliação de Segurança de Barragensn (SL258-2017) Altura mínima da barragem 15 metros 7,62 metros 5 metros 15 metros (RSB) and 2 metros (RPB) 15 metros Capacidade mínima da barragem 3.000.000 m³ 61.674 m³ 50.000 m³ RSB: altura mínima de 15 metros ou altura mínima de 10 metros com no mínimo 1hm³. RPB: altura inferior a 10 metros ou altura entre 10 e 15 metros com volume inferior a 1 hm³ 1 hm ³ Tipo de acumulação Resíduos Perigosos O tipo de acumulação não é pré-requisito. O tipo de acumulação não é pré-requisito. O tipo de acumulação não é pré-requisito. O tipo de acumulação não é pré- requisito. Dano potencial associado Existente Existente Existente O dano potencial assosiaco não é pré-requisito. O dano potencial assosiaco não é pré- requisito. Responsabilidades Responsável legal pela barragem Empreendedor (quem detém os direitos de exploração) Agência federal responsável pelo planejamento, projeto, construção, operação ou regulamentação de barragens Proprietário (quem detém direitos de controle) Proprietário da barragem. Proprietário da barragem. Critérios Risco, Dano Potencial Associado e Volume Dimensões estruturais (altura) e dano potencial associado Risco (altura e volume) e dano potencial associado Qualidade de projeto, operação, padrão de controle de manutenção e de inundação e infiltração, segurança estrutural, segurança sísmica e segurança estrutural. Responsável pela classificação Feita pelo Empreendedor e Aprovada por Agentes fiscalizadores Departamento de Assuntos da Água Feita pelo proprietário e aprovada pela Autoridade (APA) Feito pelo proprietário e supervisionado pela agência de inspeção Classes Varíavel conforme resoluções do órgão fiscalizador: elétrico, mineração, usos múltiplos (Classes de A a E) Classes I, II e III Classes I, II e III Classes A, B e C Tipos de inspeção Especial e Regular Informal, Intermediária, Formal e Especial. Regular e Formal Antes do enchimento, depois do primeiro enchimetno e inspeções visuais Diariamente, anual e especial Periodicidade Variável conforme resoluções e classificação do órgão fiscalizador. Especial: usualmente antes do 1º enchimento e/ou em caso de ocorrências excepcionais. Informal: agendada pela equipe de epecialistas. Intermediária: no mínimo bianual. Formal: no mínimo a cada 5 anos. Especial: imediatamente após um evento extremo (inundações, terremotos, falhas). Regular: variável, mas, no mínimo, semanal. Formal: intervalos entre 5 e 10 anos (conforme classificação). Antes do enchimento: antes, simultaneamente ou após o término da construção da barragem. Após o primeiro enchimento: antes do início da operação. Inspeções visuais: variáveis ​​de acordo com o cronograma do plano de observação, quando a Autoridade considerar apropriado e após ocorrências excepcionais. Diariamente: todos os dias. Anual: antes e depois da estação chuvosa e no final de cada ano. Especial: quando é percebido sinais de danos ou risco de emergência. Responsáveis técnicos pela execução Equipe multidisciplinar especializada em segurança de barragens (contratada pelo Empreendedor). Equipe treinada e qualificada de acordo como nível de inspeção exigido. Equipe com experiência e qualificada indicada pelo Proprietário. Inspeções formais de Classes II e III são realizadas por um profissional certificado (APP). Autoridade (APA) Equipe técnica especializada contratada pelo proprietário ou agência de fiscalização. Obrigatório para quais barragens Com dano potencial alto Todas que atendam aos requisitos Todas que atendam aos requisitos Classes I e II Reservatórios grandes e médios Quem tem acesso Empreendimento, prefeituras e defesas civis envolvidas Órgãos governamentais locais, estaduais e federais Proprietário e defesa civil local Empreendimento, defesa civil e Autoridade (APA) Empreendimento e agência fiscalizadora Requisitos mínimos para aplicação da legislação (Pelo menos uma característica) Classificação da barragem As barragens de propriedade das agências federais não são classificadas ou categorizadas Inspeções Plano de Ação de Emergência 44 Do comparativo exposto, então, tem-se que, em linhas gerais, as legislações de segurança de barragens apresentadas se assemelham em dois pontos cruciais para gestão da operação: a existência de um sistema de classificação das barragens em níveis de priorização e a necessidade de elaboração de um plano para situações de emergências. A subcategorização dos barramentos sujeitos às respectivas legislações destes países, permite a priorização daquelas obras que oferecem um maior risco de acidentes e que possivelmente causariam maiores danos nas áreas de influência, o que leva a fixação de níveis apropriados de monitoramento, inspeção e planos de segurança em geral. Entretanto, questiona-se a manutenção e atenção dadas às barragens consideradas de pequeno porte. Ainda que o dano potencial à essas estruturas sejam menores, elas também apresentam riscos oferecidos por falhas de projeto, operativas, ou pelo decaimento natural de qualidade construtiva ao longo da sua vida útil. Por meio do que foi exposto, infere-se que as legislações brasileira e chinesa, principalmente, são aquelas que menos apresentam rigidez com relação às características técnicas, em termos de altura do barramento e volume do reservatório, para aplicação das legislações federais. Por ventura, nestes países, os barramentos de menor porte devessem ser avaliados com um rigor mais acentuado antes de serem construídos, frente à maior facilidade de serem erguidos, quando comparados com barragens de portes maiores. Ou ainda, para os barramentos de menores dimensões, poderiam ser criados regulamentos específicos tal como foi feito por Portugal, ao alterar sua legislação principal adicionando o Regulamento para Pequenas Barragens. Desta forma, maximiza-se a aplicação de diretrizes de construção e manutenção de barramentos e, consequentemente, a segurança e controle de operação. A África do Sul, juntamente com o território lusitano, apresentam as legislações federais mais rígidas, quando comparadas aos demais países, com 45 relação às características técnicas mínimas para sua aplicação, coagindo um maior número de empreendedores a cumprirem com as normas. Quanto aos planos de emergência, exalta-se a possibilidade de aliar a simulação de manchas de inundação provenientes de rompimentos hipotéticos das barragens à um leque de possíveis ações e medidas mitigadoras a serem tomadas pelos proprietários, entes de resgate e populações atingidas. Assim, destaca-se a importância de haver simulados e treinamentos envolvendo as pessoas potencialmente impactadas, para que no momento da emergência, o planejamento corra com êxito e minimize os danos. A inserção de funções matemáticas e programas computacionais para o mapeamento das áreas sujeitas aos riscos impostos pelas barragens construídas é um avanço grandioso no aspecto de segurança destas estruturas. Mas, ainda não é possível detectar em todas as legislações e regulamentos elaborados, instruções que padronizem parâmetros ou meçam a viabilidade de aplicação de determinada metodologia. Deixa-se, assim, a cargo daqueles que elaboram os mapeamentos, a caracterização e quantificação das enchentes e das áreas que poderão ser atingidas. Destaca-se a importância de se compor uma legislação capaz de aliar medidas estruturais e operativas a medidas não-estruturais que vão além da obra. Isto é, soma-se à determinação de exigências e pontos de correção ligados à engenharia e comportamento do barramento, a necessidade de se criar uma interface entre a segurança da construção em si e a do meio ambiente viabilizada por programas e planos educacionais que visem conscientizar a sociedade e as populações que residem na área de influência destas obras sobre estes empreendimentos. O termo “Zona de Auto Salvamento” aparece nas resoluções das agências fiscais brasileiras e no decreto-lei português, definindo uma área de residentes a jusante dos barramentos em que se considera não haver tempo suficiente para que os entes de defesa civil possam realizar o resgate. Desta forma, em caso de situações emergenciais nas estruturas do empreendimento, esta região detém máxima prioridade. 46 O uso irregular de reservatórios e a ocupação indevida das áreas a jusante de uma barragem, que contribuem para o aumento do dano potencial associado à estrutura, podem ser minimizados por meio de atividades institucionais, organizadas por entes públicos ou privados, que alertem as pessoas e que levem conhecimento a elas, como é sugerido pela política nacional brasileira e lusitana, além da desapropriação das faixas marginais aos cursos hídricos. A partir de uma visão mais generalizada do panorama jurídico- institucional de segurança de barragens nos países apresentados, percebe-se a participação ativa do Estado, não só por meio da criação das legislações e normativos, mas como também por meio da criação de departamentos e instituições destinados especificamente a acompanhar e monitorar estas obras durante todas as fases de sua vida útil. Este processo contribui para a especialização dos órgãos em suas respectivas áreas de atuação, possibilitando um contato direto com o setor supervisionado e melhorando a qualidade da gestão da segurança. No entanto, é importante mencionar que a equipe técnica dessas agências, bem como a agilidade na realização das avaliações são extremamente importantes para o licenciamento e aprovação dos relatórios de segurança emitidos pelos proprietários. Não basta serem criados órgãos fiscalizadores e a ideia platônica de monitoramento federal sobre os cumprimentos das legislações pelos empreendedores. É necessário que essas cláusulas se solidifiquem e que, de fato, haja essa fiscalização. As barragens se tornaram empreendimentos de significativa contribuição construtiva e econômica para a sociedade. Mas, paralelamente a estes benefícios, esses empreendimentos sujeitam-se à adversidades e inconsistências provenientes de deficiências de projetos, construção, operação, manutenção e, inclusive, na tomada de decisões em situações emergenciais, que acabam por exigir um trabalho de gestão imperativo e minucioso. Até mesmo a política norte-americana que se configura pela existência de legislações estaduais independentes fica sujeita à aprovação da agência 47 federal correspondente. Isto porque a condição de obrigatoriedade de cumprimento de determinados requisitos, leva os empreendedores a promoverem uma cultura de segurança em seus empreendimentos, além de uma melhor gerência dos riscos perante as populações ribeirinhas e ao meio ambiente, como um todo. Aliado a este assunto, o histórico da criação de legislações relacionadas à segurança de barragens é um viés bem relevante de se caracterizar. Todas as publicações regulatórias aplicadas, atualmente, sobre os cinco países analisados, foram sancionadas há menos de 25 anos. Ou seja, este período, quando comparado à idade de determinadas construções, se configura como uma preocupação recente. No caso do Brasil, inclusive, a Politica Nacional de Segurança de Barragens foi implementada há, apenas, nove anos, o que implica, nos dias atuais, em uma dificuldade muito grande do empreendedor (ou concessionário do barramento), dos órgãos fiscalizadores e do governo federal a se adaptarem a possuir uma cultura e práticas de monitoramento de segurança constantes e regulares. Essa dificuldade de adaptação foi refletida, principalmente, nos últimos rompimentos de barragens acontecidos neste país, que evidenciaram a necessidade de validação das práticas empregadas nos empreendimentos e da correspondente fiscalização pelos órgãos responsáveis. Com relação à boas práticas, a China, ao instituir a execução de inspeções visuais diárias por parte dos empreendedores, se configura como o país, dentre os apresentados, com a melhor taxa de frequências de monitoramento. A África do Sul propõe uma regularidade semanal neste quesito. Ambos países, portanto, tem o monitoramento como um dos pontos fortes de suas legislações, uma vez que essa periodicidade permite à equipe técnica avaliar e acompanhar o desenvolvimento ou a evolução de anomalias com maior rapidez e, consequentemente, encontrar soluções antes que elas ofereçam risco ao barramento. 48 3.3 ESTUDOS HIDROLÓGICOS Os estudos hidrológicos são peças fundamentais para a segurança de barragens, acompanhando estas estruturas durante todas as fases de planejamento e projetos construtivos do empreendimento e, periodicamente, ao longo de toda a vida útil destas estruturas. Essa constante abordagem hidrológica, pode ser entendida a partir da simples conceituação desta ciência, como proposto por Tucci (2001): Área que estuda o comportamento físico da ocorrência e o aproveitamento da água na bacia hidrográfica, quantificando os recursos hídricos no tempo e no espaço e avaliando o impacto da modificação da bacia hidrográfica sobre o comportamento dos processos hidrológicos. A quantificação da disponibilidade hídrica serve de base para o projeto e planejamento dos recursos hídricos (TUCCI, 2001, p. 26). Dessa forma, compreende-se que a hidrologia é uma abordagem intrínseca ao monitoramento regular não só das barragens e reservatórios de acúmulo de água, mas como também de qualquer obra de engenharia que sofra influência direta dos recursos hídricos. Deve-se destacar, também, que a alteração do uso e ocupação das bacias hidrográficas ao longo do tempo, se traduz, hoje, em um condicionamento de primeira instância para diagnósticos geoambientais e consequente planejamento de medidas mitigadoras. Uma significativa parcela dos acidentes e incidentes com barragens (Figura 3), no Brasil, decorre de falhas de segurança destas estruturas relacionadas a eventos hidrológicos. Ou seja, estas obras, na conjuntura atual do país, não foram projetadas adequadamente ou, ainda, não têm seus estudos básicos reavaliados com frequência. O Manual do Empreendedor sobre Segurança de Barragens (ANA, 2016c) estabelece que a cheia de projeto destes empreendimentos deve ser fixada a partir da aplicação de métodos estatísticos, fazendo-se uso de séries históricas, simulações hidrológicas e fórmulas empíricas, além de recomendar tempos de recorrência mínimos para dimensionamento de extravasores, tal como exposto no Quadro 6. 49 Quadro 6 – Tempos de recorrência mínimos recomendados pela ANA para as cheias de projeto Altura (m) Volume (hm³) Tempo de Recorrência (anos) H ≥ 30 V ≥ 50 Cheia Máxima Provável* 15 ≤ H < 30 3 ≤ V < 50 1.000 H < 15 V < 3 500 *Em alternativa, pode-se utilizar o valor correspondente à cheia com período de recorrência de 10.000 anos. H: altura máxima da barragem. Fonte: ANA (2016c). As “Diretrizes para projetos de PCH” elaboradas pela Eletrobras, em 2003, recomendam requisitos de projetos similares àqueles propostos pela ANA, entre eles: • Para barragens com altura superior a 30 m ou cujo colapso envolva risco de perdas de vidas humanas, a vazão de projeto dos órgãos extravasores será a cheia máxima provável; • Para barragens de altura inferior a 30 m ou com reservatório com volume menor que 50 hm³ e, não havendo risco de perdas de vidas humanas, a cheia de projeto deverá respeitar a recorrência mínima de 1000 anos. Para a aplicação da metodologia de cálculo de cheias de projeto adequada, em primeiro lugar, deve-se verificar a extensão da série histórica de dados fluviométricos existente e também, se necessário, o tamanho da área de drenagem da bacia em estudo (DEPARTAMENTO DE ÁGUAS E ENERGIA ELÉTRICA- DAEE, 2005). A Centrais Elétricas Brasileiras S.A.- Eletrobras (2003) ainda aponta que a caracterização fisiográfica da bacia hidrográfica onde está inserido o empreendimento, auxilia na interpretação da hidrologia, na descrição do regime fluvial e sedimentológico do curso d’água principal, além de permitir estabelecer correlações com outras bacias hidrográficas. Este último aspecto, inclusive, é de suma importância para procedimentos de regionalização de vazões e determinação de parâmetros 50 hidrológicos em locais onde o acesso ou a disponibilidade de dados são escassos. No caso dos empreendimentos produtores de energia elétrica, pode-se inferir, ainda, que os estudos hidrológicos exercem influência direta na quantificação da geração e da potência hidroenergética instalada. E ao se adotar esta premissa como verdade, afirma-se que a hidrologia auxilia na otimização da relação custo/benefício do empreendimento, permitindo-se adotar condições construtivas ou tecnologias que melhor se adaptem aos regimes fluviais locais. 3.4 MODELAGEM HIDRODINÂMICA Segundo Cestari Junior (2013), a propagação de ondas de cheias de barragens pode ser simulada por meio de modelos empíricos (obtidos por meio de regressão e/ou observação de eventos já ocorridos), modelos físicos e modelos matemáticos (analíticos ou numéricos que se baseiam na solução de equações diferenciais). Para a simulação das cheias provenientes do rompimento hipotético de uma barragem e avaliação das suas consequências, têm sido utilizados, principalmente, os modelos matemáticos capazes de determinar a formação da brecha (abertura formada pela falha da barragem) e, na sequência, a propagação do hidrograma de cheia (COLLISCHONN; TUCCI, 1997). Os modelos numéricos mais aplicados para a simulação do escoamento, a jusante de barragens, também chamados de modelos hidrodinâmicos, são baseados na solução das equações de Saint-Venant e Navier-Stokes e passíveis de serem abordados sob perspectivas unidimensionais e bidimensionais (BALLESTEROS et al., 2011). Embora os modelos hidrodinâmicos unidimensionais sejam ideais para obtenção dos perfis de água (LEITÃO, 2018) e necessitem de um menor tempo de processamento (COUTINHO, 2015), estas hipóteses se configuram como alternativas mais simplificadas, desconsiderando-se a criação de ondas de choque (CESTARI JUNIOR, 2013). 51 O processamento das simulações bidimensionais, segundo Coutinho (2015), se desenvolve da seguinte maneira: Para a representação do escoamento na planície de inundação, esses modelos utilizam malhas computacionais com células regulares ou não regulares. Essa malha computacional possibilita simular a inundação se propagando no espaço bidimensional, ou seja, fluxos perpendiculares ao eixo do canal principal conforme a topografia representada através de um Modelo Digital de Elevação (COUTINHO, 2011, p. 22). No que concerne à análise de efeitos a jusante, decorrentes de ruptura de barragens, a importância recai sob o processo de propagação da onda, principalmente sobre efeitos a nível de rugosidade do leito e do armazenamento de terrenos marginais, que levam à possível atenuação da intensidade da cheia (VISEU, 2006). Frente a isto, os modelos hidrodinâmicos bidimensionais então, configuram-se como soluções mais coerentes quando objetiva-se analisar os efeitos de amortecimento produzidos pelas planícies de inundação, conferindo maior veracidade às previsões (LEITÃO, 2018), bem como obter a elevação da superfície da água e velocidade de forma discretizada (COUTINHO, 2015). Destaca-se que, embora estes modelos computacionais de simulações hidrodinâmicas – como por exemplo, Mike 11, HEC-RAS, TELECMAC-2D, DAMBRK, FLDWAV – sejam um recurso bastante aplicado para a gestão e previsão de emergências (ou seja, em situações hipotéticas de caráter de urgência), suas versatilidades de funções, permitem a análise de escoamento e inundações, a jusante, de vazões defluentes em situações operativas diversas. A utilização destes modelos de simulação requer alguns parâmetros de calibração, tais quais: vazão de pico na seção da barragem, caracterização da barragem e da ruptura (se for o caso), dados topobatimétricos, dados de geometria do canal de propagação, coeficiente de rugosidade do leito e das planícies de inundação, regime de escoamento, eventuais contribuições de tributários e inserção de possíveis estruturas de controle hidráulico, soleiras, reservatórios, entre outros (BRASIL, 2005). 52 A Figura 4 apresenta um resumo do processo de modelagem hidrodinâmica por meio de simulações computacionais. Figura 4 – Resumo do processo de modelagem hidrodinâmica e caracterização da mancha de inundação gerada Fonte: Pereira et al. (2018). 3.5 COEFICIENTE DE RUGOSIDADE 3.5.1 Conceitos Nos canais classificados como naturais, como córregos ou rios, onde usualmente são alocadas as estruturas das barragens, o escoamento de água se processa pela ação da gravidade. Na região de contato entre o fluido e o perímetro molhado do canal, surge uma força de resistência que se opõe ao movimento e é função da viscosidade e rugosidade do canal (PORTO, 2006). Uma das equações de resistência proposta para solucionar problemáticas de escoamentos livres é a fórmula de Manning (1891), obtida empiricamente: 𝑉𝑉 = 1 𝑛𝑛 .𝑅𝑅ℎ2/3. 𝐼𝐼01/2 Onde: Exportação dos resultados e Caracterização da Onda Execução da Modelagem Hidrodinâmica Caracterização da Estrutura (e da Ruptura, se for o caso) Dados Topobatimétricos Caracterízação da Geometria da Calha Fluvial Coeficiente de Rugosidade (Cobertura das margens e do leito) Caracterização do Escoamento 53 𝑉𝑉: Velocidade de escoamento (m/s); 𝑛𝑛: Coeficiente de rugosidade de Manning; 𝑅𝑅ℎ: Raio hidráulico (m); 𝐼𝐼0: Declividade de fundo do canal (m/m). Embora tenha sido elaborada, à princípio, para escoamentos permanentes, uniformes e turbulentos rugosos, esta equação pode ser utilizada como uma hipótese simplificadora para resolução das equações completas de escoamentos não permanentes variados – que é o caso de cursos d’águas naturais (PORTO, 2006). O coeficiente de rugosidade é altamente variável e dependente de diversos fatores (CHOW,1959). Segundo Kidson et al. (2002), inundações com níveis d’água mais elevados podem encontrar outras fontes de resistência ao fluxo, como por exemplo a vegetação. Cita-se ainda, que processos erosivos e de sedimentação também possuem influência sobre o coeficiente de rugosidade (PORTO, 2006), o que dificulta ainda mais a determinação de uma modelagem hidráulica com precisão. Quando há o extravasamento de água para as planícies de inundação adjacentes à calha do rio, as condições de superfície e cobertura vegetal das margens também deve ser levada em consideração para a simulação hidrodinâmica das cheias, principalmente pelo fato de que o coeficiente de rugosidade destas áreas é usualmente maior do que na própria calha do rio (CHOW, 1959). Nos Quadros 7 e 8, apresentados a seguir, pode-se comparar a variabilidade das