Arq Bras Cardiol 56 (5): 407-412, 1991 401 FUNDAMENTOS BIOQUÍMICOS DA MODULAÇÃO DO TONO VASCULAR PAULO HENRIQUE WAIB, ROBERTO CARLOS BURINI Botucatu, SP Atualização Tono vascular é o grau de constrição mantido pelo vaso sangüíneo. Baseado na fonte de estímulo , o tono pode ser dividido em dois componentes: extrínseco e intrínseco1. O extrínseco ocorre pela ação do sistema simpático adrenérgico, hormônios e peptídeos vasoativos sobre o músculo liso vascular; é o principal gerador do tono arteriolar e portanto, da resistência periférica, influindo assim, de maneira preponderante nos níveis de pressao arterial. O in- trínseco depende da atividade miogênica mantida pelo estiramento da parede vascular promovido pelo fluxo sangüíneo. O componente passivo do tono vascular exercido pelas fibras elásticas da adventí- cia só é importante nos vasos de condução. A inervação colinérgica simpática existente nos vasos de resistência não tem ação direta sobre o músculo liso vascular. A influência colinérgica no tono vascular ocorre através da modulação da atividade adrenérgica e endotelial 2. 0 endotélio vascular está em íntimo contato físico e funcional com o músculo liso vascular. Nos vasos de resistência, as chamadas junções endoteliais são pontos em que inexiste a interposição da membrana basal. Deste modo, a re- sistência elétrica entre as membranas é baixa, per- mitindo a transmissão facilitada de estímulos elétri- cos e químicos, assim como a difusão de substancias de baixo peso molecular entre os dois tecidos, de modo a influir na contração do músculo liso adjacen- te3. Desta forma, o acoplamento funcional múscu- lo liso-endotélio vascular, diante dos estímulos nervo- sos, hormonais e dos peptídeos vasoativos, é o que determina a resultante final no tono vascular. Funcionamento do aparelho contrátil do músculo liso vascular Todas as células musculares lisas contêm as proteínas contráteis miosina, actina, tropomiosina e Laboratório de Bioquimica Nutricional e Metabólica do Departamento de Clí- nica Médica da Faculdade de Medicina ( UNESP) - Botucatu, SP. caldesmon. A miosina é a proteína principal do filamento grosso sendo composta por duas cadeias de alto peso molecular (cadeias pesadas), cada uma das quais associada a duas cadeias de baixo peso molecular (“myosin light chain”). Estas últimas têm atividade de ATPase e constituem o sítio principal da ativação, pelo íon cálcio, da contratilidade muscular. A proteína predominante no filamento fino é a actina, sendo a tropomiosina e o caldesmon, as proteínas in- termediárias deste filamento, as quais desempenham importante papel regulador na interação actina-miosina4. A contração muscular depende e é regulada pela concentração de Ca2 + disponível no citosol. No líquido intracelular este íon forma complexo com a calmodulina, proteína citosólica carreadora de cálcio. O complexo Ca+ +-Calmodulina, tem a capacidade de ativar uma quinase solúvel específica, a quinase das cadeias leves da miosina (KCLM), que por sua vez, fosforila as cadeias leves da miosina, que contêm atividade Mg2+ATPase responsável pela hidrólise do ATP e conseqüente liberação da energia necessária à contração muscular4. Por outro lado, alguns auto- res propõem que o complexo Ca++-Calmodulina po- deria atuar sobre as proteínas intermediárias do filamento fino, diminuindo o efeito inibidor destas pro- teínas sobre a interação actinamiosina, o que teria um efeito permissivo sobre a contração muscular5. As fenotiazinas e as difenil-alquilaminas (fendilina, prenilamina, perhexilina, cinarizina, etc..) têm efeitos vasodilatadores por inibirem a ação ativadora do com- plexo Ca+ +-Calmodulina sobre a KCLM6. Homeostase celular do cálcio no músculo liso vascular A homeostase da concentração do cálcio citosólico é fundamental na regulação do grau de contração do músculo liso vascular e portanto, na expressão do tono dos vasos de resistência. Sendo o tono destes vasos o promotor maior da chamada re- sistência periférica, pode-se inferir que, a resultante final dos mecanismos que regem a concentração de cálcio citosólico (e o fluxo deste íon através das membranas celulares) no músculo liso vascular tem Arq Bras Cardiol 56 (5): 407-412, 1991 402 influência importante na expressão da pressao arte- rial. O gradiente da concentração do cálcio entre o meio extra e intracelular é enorme (cerca de 5.000 a 10.000 vezes), sendo mantido em grande parte pela baixa permeabilidade natural da membrana citoplasmática ao cálcio. A concentração do cálcio citosólico depende: a) do funcionamento dos meca- nismos que possibilitam a entrada do cálcio extracelular para o meio intracelular (influxo); b) da ação moduladora exercida pelas organelas intracelulares, principalmente retículo sarcoplasmático e mitocôndrias e c) do funciona- mento dos mecanismos que promovem a retirada do cálcio do citosol para o meio externo (efluxo)7. Os mecanismos de influxo do cálcio estão sob o controle do potencial da membrana citoplasmática e de substancias vasoativas (neurotransmissores, hormonais e autacóides) que regulam o funciona- mento dos canais de cálcio. O potencial de membra- na é determinado pelo gradiente das concentrações iônicas, que dependem do funcionamento dos canais de K +, da bomba Na+-K+-ATPase e da troca Na+-Ca2+ (3Na+ para cada Ca2+). A permeabilidade da membrana citoplasmática ao cálcio é regulada pelos canais de cálcio voltagem-dependentes (CVDs) e pelos canais de cálcio receptor-dependente (CRDs). Tanto os canais de cálcio, como os mecanismos que determinam o po- tencial de membrana, interagem mutuamente na regulação do cálcio citosólico 8. Os canais de cálcio voltagem-dependentes são sensíveis ao bloqueio pe- las diidropiridinas, motivo pelo qual estas drogs, tam- bém chamadas “antagonistas dos canais de cálcio”, têm potente ação vasodilatadora, a inibirem o influ- xo de cálcio, diminuindo assim, a disponibilidade de cálcio citosólico para a contração do músculo liso vascular. Os canais de cálcio voltagem-dependentes e os receptor-dependentes são acoplados funcional- mente, havendo interação entre estes dois tipos na entrada de cálcio para o meio intracelular. Um me- canismo importante de ativaçao dos canais voltagem-dependentes é a despolarizaçao provocada pela ativação de canais receptor dependentes acoplados a canais de K + e à permuta 3Na+ -Ca2 +8. Outro mecanismo que pode facilitar a aber- tura dos canais voltagem-dependentes é a ação do AMPc, gerado pela interação de Beta-agonistas com seus receptores5. Isto poderia explicar parte da açao dos Beta-bloqueadores sobre o tono vascular. A proporção maior de canais voltagem-dependentes (em relaçao aos canais receptor-dependentes) na maioria das arteríolas de resistência poderia explicar a alta sensibilidade des- tes vasos aos antagonistas do cálcio, na inibição da contração induzida por neurotransmissores. Por ou- tro lado, a pobreza de volume do retículo sarcoplasmático nos vasos de resistência explica a importancia da entrada de cálcio extracelular para a fase inicial da contraçao do músculo liso vascular. Este fato também contribui para a açao vasodilatadora dos antagonistas do cálcio nos vasos de resistência 8. Os mecanismos de efluxo do cálcio mais impor- tantes sao: a) sistema Ca2+-2H+-ATPase ou bomba de cálcio, com baixa capacidade e alta afinidade pelo cálcio e b) sistema de permuta 3Na+-Ca2+ acionada de gradiente de Na+, mantido pela bomba de sódio (Na+ -K + -ATPase) com alta capacidade, baixa afi- nidade pelo cálcio. Suas atividades são reguladas pela concentração citosólica de cálcio. O principal mecanismo de retroalimentação negativa é o aumen- to da concentração do complexo Ca-Calmodulina estimulando o funcionamento da bomba de cálcio. Tanto o AMPc como o GMPc também exercem a mesma ação, estimulando as bombas de cálcio. Des- ta maneira o aumento de concentração destes men- sageiros no músculo vascular proporcionado pelos agonistas Beta adrenérgicos tem a propriedade de diminuir o tono vascular9. O efeito final das catecolaminas depende do balanço entre as ações Alfa (vasoconstritora) e Beta (vasodilatadoras). Sistema mensageiro do cálcio no músculo liso vascular A ativação dos canais voltagem-dependentes e/ ou dos canais receptor dependentes resulta em au- mento na permeabilidade da membrana citoplasmática ao íon cálciol10. Este aumento inicial na concentração do cálcio intracelular leva à forma- ção de complexos deste íon com a calmodulina. O complexo Ca2+-calmodulina tem capacidade de deflagrar a contração muscular através da ativação da quinase da cadeia leve da miosina. Por outro lado, o complexo Ca2+-calmodulina pode, através de um mecanismo de “feed-back” negativo estimular o efluxo de cálcio citosólico através das bombas de cálcio, provocando assim, uma diminuição no cálcio ntra-celular7. A manutenção da contração muscular vai depender da de segundos mensageiros oriundos da hidrólise de fosfolipídeos (fosfatidil colina) de membrana, os fosfoinositóis (IP)5. A interação de um agonista (Alfa 1 agonistas, vasopressina, angiotensina, etc.) com um receptor específico de Waib & Burini Modulação do tono vascular Arq Bras Cardiol 56 (5): 407-412, 1991 403 membrana vai mudar a conformação de uma proteína G acoplada a este receptor, de modo a ati- var uma enzima da membrana, a fosfolipase C11. A fosfolipase C ativada hidrolisa o inositol-2-fosfato em inositol-3-fosfato e diacilglicerol12. 0 primeiro funcio- naria liberando cálcio do retículo sarcoplasmático13. 0 segundo, na presença de cálcio, ativaria uma quinase nos domínios da submembrana, a proteína-C-quinase, que por sua vez, teria vários mecanismos de atuação: a) fosforilação de um gru- po de proteínas citosólicas responsáveis pela manu- tenção da ativação da quinase da cadeia leve da miosina. b) fosforilação direta da quinase da cadeia leve da miosina; c) inibição da fosfolipase e dos re- ceptores Alfa 1; d) fosforilação das bombas de efluxo; e) inibição do caldesmon. A manutenção da contração pela via diacilglicerol-proteína C quinase não depende dos níveis de Ca+ + intracelular encon- trados no início da contração muscular7, 9. Tanto o complexo Ca-Calmodulina como o diacilglicerol-proteína C quinase ativam as bombas de efluxo, mantendo o “turnover” de cálcio com con- centração citosólica, desse íon, um pouco acima da- quela encontrada no músculo em repouso. Desta maneira, existiriam duas vias no sistema mensagei- ro do cálcio: a via de deflagração da contração mus- cular desencadeada pela entrada rápida de cálcio no citosol e a formação do complexo CaCalmodulina e a via diacilglicerol-Proteína C quinase, que manteria a contração muscular13. Sistemas do AMP cíclico e do ácido aracdônico no músculo liso vascular Os receptores beta agonistas acoplados a uma proteína G estimulatória (Gs), uma vez estimulados, são capazes de ativar a adenilato ciclase ligada à superfície intracelular da membrana citoplasmática. Esta enzima hidrolisa o ATP a AMPc11. O aumento da AMPc no músculo liso vascular tem várias con- seqüências sobre o sistema mensageiro do cálcio: a) inativação da quinase da miosina de cadeia leve; b) inativação da fosfolipase C e c) aumento da atividade das bombas de efluxo de cálcio. Este conjunto de ações provocam o relaxamento muscular9. Desta maneira, os Beta bloqueadores, ao diminuírem a concentração de AMPc intracelular, teriam um efei- to direto de aumentar o tono vascular, o qual é con- trabalançado pelo efeito destas drogas sobre os ca- nais de cálcio voltagem-dependentes e transmissão adrenérgica (inibição). A cascata do ácido aracdônico se inicia a par- tir de sua formação a partir de duas fontes: ácido fosfático, oriundo do diacilglicerol e pela hidrólise de um fosfolípide de membrana, a fosfatidilserina, por uma fosfolipase A2. Esta enzima, localizada também na membrana celular, é ativada de maneira seme- lhante e concomitante à ativação da fosfolipase C, pela interação de agonistas do tipo Alfa 1, vasopressina, angiotensina II, com seus receptores específicos14.0 ácido aracdônico, sob a ação da ciclooxigenase, forma as prostaglandinas (PGE2 e PGI2) e tromboxanas (TBxA2). A PGE2 é a prostaglandina formada em maior concentração do músculo liso vascular e tem capacidade de ativar di- retamente a adenilato ciclase solúvel, aumento dos níveis de AMPc, e ativar também, a guanilato ciclase, aumentando os níveis de GMPc. Ambos, AMPc e GMPc, têm efeitos semelhantes, que indu- zem ao relaxamento muscular e conseqüentemente, diminuem o tono vascular9,15. Por outro lado, a TBxA2 (gerada em menor quantidade no músculo liso) age como um segundo mensageiro, agindo so- bre receptores da membrana e ativando a fosfolipase C, que vai gerar outras mensagens (DG, IP3) e man- tendo assim a contração do músculo liso. Assim, as drogas antiinflamatórias não hormonais, como aspi- rina e indometacina, ao inibirem a ciclooxigenase, di- minuem a formação de PGE2 muscular. Este efeito direto, que poderia levar a um aumento do tono vascular, é contrabalanceado pelo efeito das mesmas drogas sobre as plaquetas, com diminuição da TBxA2 plaquetária (principal prostaglandina forma- da do metabolismo destas células)16. Sistema renina-angiotensina vascular Foi demonstrado, recentemente, que a parede vascular contém os componentes do sistema renina-angiotensina, o que sugere a existência de um sistema local em adição ao sistema circulante. A angiotensina local poderia estimular a vasoconstricção ativando os receptores do músculo liso e facilitando a condução nervosa adrenérgica, aumentando, assim, o tono simpático18. Por outro lado, a síntese de prostaglandinas no endotélio pode ser aumentada por estímulo da angiotensina local, assim como a síntese de fatores relaxantes deriva- dos do endotélio. Estes dois últimos efeitos contraba- lançam o efeito vasoconstritor direto. Portanto, o efei- to dos inibidores da enzima de conversão pode ser explicado pela ação direta diminuindo a concentra- ção de angiotensina II e indireta, diminuindo o tono simpático e aumentando os níveis de bradicinina. A elevação da bradicinina se deve a sua menor destrui- ção visto ser degradada pela mesma cininase que Waib & Burini Modulação do tono vascular Arq Bras Cardiol 56 (5): 407-412, 1991 404 converte a angiotensina I em angiotensina II5. Papel do endotélio vascular na regulação do tono Basicamente, o endotélio vascular desempenha três funções na regulação do tono19: a) barreira físi- ca, impedindo a infiltração de substâncias de alto peso molecular na camada média de artérias maio- res, o que acredita-se representar um dos mecanis- mos desencadeadores de aterogênese; b) barreira metabólica, com capacidade de degradação da angiotensina II, nucleosídeos da adenina, serotonina e noradrenalina, inativação da trombina, e c) capa- cidade de síntese de fatores relaxantes (EDRFs) e constritores (EDCFs)2, de prostaglandinas, da enzima de conversão da angiotensina I, heparina e de um grupo de substancias denominadas glicoaminoglicans (entre elas o heparan sulfato), importantes no blo- queio dos estímulos aterogênicos e da proliferação do músculo liso (hipertrofia da média)3. Como barreira metabólica, o endotélio diminui a exposição do músculo liso à ação de diversos agen- tes constritores. Na aterosclerose existiria maior reatividade vascular dependente da combinação da diminuição desta barreira metabólica e diminuição da capacidade de síntese de EDRFs20. Inúmeros agen- tes vasoativos agem através de receptores da mem- brana endotelial provocando a síntese de EDRFs, que atuariam sobre o músculo liso modulando o efeito constritor direto destas substâncias21. A ação destes agentes vasoativos está associada ao aumento do cálcio citosólico endotelial provocado pela entrada de cálcio vias canais iônicos e pela liberação de estoques intracelulares 22. A entrada do cálcio extracelular pode ocorrer por canais agonista-dependentes acoplados à via do inositol, canais de cálcio depen- dentes do gradiente eletroquímico, canais catiônicos não seletivos ativados pelo estiramento e pela troca NA+-Ca2+. O potencial de membrana é regulado por vários tipos de canais de potássio. A via do inositol endotelial funcionaria de maneira semelhante àque- la descrita para o músculo liso vascular23. A síntese de EDRFs pelo endotélio está associada ao aumen- to da atividade da via do inositol 24. A síntese de prostaglandinas ocorre de maneira semelhante àque- la descrita para o músculo liso vascular16 (fig. 1). Entre as substâncias que atuam sobre os recep- tores endoteliais induzindo a síntese de EDRFs e prostaglandinas estão a acetilcolina, angiotensina, vasopressina, noradrenalina, bradicinina, trombina, serotonina e histamina. Por outro lado, a pressão pulsátil também é um poderoso estímulo para a pro- dução de EDRFs e prostaglandinas25. De acordo com as ações manifestadas no mús- culo liso foram descritos dois tipos de EDRFs25: óxido nítrico derivado do endotélio (EDNO) e o fator hiperpolarizante derivado do endotélio (EDHF). O primeiro seria sintetizado a partir da L-arginina27 e seu modo de ação seria o de estimular a guanilato ciclase solúvel do músculo liso (fig. 1)28. 0 aumento resultante dos níveis de GMPc, como já menciona- do, tem propriedades vasodilatadoras SR29. 0 segundo tipo de EDRF, de natureza química ainda não bem definida, atuaria sobre a condutância de K+ e na bomba Na+K+ATPase da membrana celular do mús- culo liso, levando à hipertensão e daí, ao relaxamen- to30. A entrada de Ca2+ via canais estiramento (shear stress)-dependentes, com conseqüente síntese de EDRFs e prostaglandinas, torna o endotélio um ver- dadeiro sensor para a regulação do fluxo arteriolar31. A prostaciclina, principal derivado do ácido aracdônico endotelial, ativa no músculo liso contíguo, estimulando a adenilatociclase. Desta maneira, o au- mento de AMPc levaria ao relaxamento muscular25. O endotélio vascular também é capaz de indu- Waib & Burini Modulação do tono vascular Fig. 1—Formação dos fatores endoteliais e auto sobre o músculo liso vascular. Arq Bras Cardiol 56 (5): 407-412, 1991 405 zir vasoconstrição, mediada pela síntese de um peptídeo chamado endotelina32. Esta substancia é produzida quando o endotélio está sob condi- ções de hipóxia aguda, baixa temperatura ou pressurização33. Atualmente a endotelina é re- conhecida como fa tor impor tante na autoregulação cerebral34. A ação da endotelina no músculo liso vascular levaria ao aumento da corrente de cálcio pelos canais voltagem depen- dentes , a t ivação di re ta da fosfol ipase C deflagrando a cascata dos mensageiros diacil gl icerol-proteína C quinase e inosi tol-3- fosfato35 36 e, aumento da atividade simpática por sensibilização dos receptores pós sinápticos às catecolaminas37. Pesquisas recentes sugerem que a endotelina pode ter um papel importante na rnodulação do tono vascular no homem38. Em resumo, o endotélio desempenha um papel importante no controle do tono vascular e na in ib ição da a terogênese . A função moduladora do endotélio diminui com a idade, aterosclerose, diabetes mellitus, nos indivíduos submetidos por longo tempo a dietas ricas em colesterol e tabagistas20,25, 0 consumo de óleos de peixe, ricos em ácido eicosapentanóico, pa- rece d iminuir a mor ta l idade por doença coronariana devido a uma diminuição da agregabil idade plaquetária , mediada pelo endotélio vascular16. Modulação da atividade adrenérgica vascular A atividade adrenérgica é a principal res- ponsável pela manutenção do tono vascular nos vasos de resistência. Diversas substâncias atu- am tanto na pré como pós-sinapse modulando a condução adrenérgica18 (fig. 2). A acetilcolina desempenha papel importante no controle do tono dos vasos de resistência, inibindo a trans- missão pré-sináptica através da ativação de re- ceptores muscarínicos. A função inversa é de- senvolvida pelos beta-agonis tas e pela angiotensina II. Esta última estimula o aumen- to do tono vascular também pela sensibilização pós-sináptica39. (fig. 2). De acordo com dados experimentais o envelhecimento leva a uma res- posta defeituosa do músculo liso vascular ao estímulo beta-adrenérgico40 (motivo pelo qual diminui a resposta aos bloqueadores beta com a idade) ass im como à modulação da neurot ransmissão adrenérgica pelas prostaglandinas41. 0 aumento da transmissão adrenérgica pré-sináptica pelas substancias com atividade Beta adrenérgica, explicaria parte da ação hipotensora das drogas Beta bloqueadoras, assim como os ECA diminuem a pressão arte- r ia l também por inibirem a es t imulação adrenérgica induzida pela ANG II. Conclusão: O músculo liso vascular desempenha papel primordial na manutenção do tono vascular sob a ação do sistema nervoso adrenérgico. Várias substâncias vasoativas atuam no binômio mús- culo l iso-endotél io al terando o estado de Waib & Burini Modulação do tono vascular Fig. 2—Modulação da transmissão adrenérgica no músculo liso vascular. Fig. 3—Controle local do tono vascular. Arq Bras Cardiol 56 (5): 407-412, 1991 406 constrição vascular basal. Existem, fundamen- talmente, três níveis de modulação do tono vascular (fig. 3): a) a nível muscular, proporci- onado por mecanismos de retroalimentação ne- gativa dentro do próprio sistema mensageiro do cálcio e pelos s is temas do AMPc, prostaglandinas e renina-angiotensina musculares; b) a nível endotelial, pela degradação de agentes vasoativos e produção de EDRFs e EDCFs; e c) a nível de condução adrenérgica, desempenhado pelo sistema colinérgico e pelas várias substâncias vasoativas. RBEFERÊNCIAS 1. Morgan KG—Calcium and vascular smooth muscle tone. Am. J. Med., 1987: S2 (suppl 3B): 9-15. 2. Furchgott RF — Role of endothelium responses of vascular smooth muscle. Circ. 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