Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 533 Prática esportiva e participação nas aulas de educação física: fatores associados em estudantes de Londrina, Paraná, Brasil Factors associated with participation in sports and physical education among students from Londrina, Paraná State, Brazil Práctica deportiva y participación en las clases de educación física: factores asociados en estudiantes de la ciudad de Londrina, Paraná, Brasil 1 Programa de Pós-graduação Associado em Educação Física, Universidade Estadual de Maringá/Universidade Estadual de Londrina, Londrina, Brasil. 2 Faculdade de Ciências, Universidade Estadual Paulista, Bauru, Brasil. Correspondência D. H. C. Coledam Programa de Pós-graduação Associado em Educação Física, Universidade Estadual de Maringá/Universidade Estadual de Londrina. Rua Delaine Negro 90, apto. 123b, Londrina, PR 86055-680, Brasil. diogohcc@yahoo.com.br Diogo Henrique Constantino Coledam 1 Philippe Fanelli Ferraiol 1 Raymundo Pires Junior 1 Júlio Wilson dos-Santos 2 Arli Ramos de Oliveira 1 Abstract This study aimed to analyze factors associ- ated with participation in sports and physical education. The sample consisted of 827 young people selected in two stages and stratified by neighborhood of Londrina, Paraná State, Brazil. The study analyzed participation in sports and physical education in relation to socio-demo- graphic, behavioral, and environmental vari- ables. Factors associated with participation in physical education included: male gender, age (10-13 years), equal to high self-rated physical activity, participation in sports, moving around during classes, and having classes on the court. Factors associated with participation in sports were male gender, age (10-13years), equal to high self-rated physical activity, physical activ- ity (≥ 7hours/week), participation in physical education, having ≥ 10 friends, participation in sports with friends, and frequency using facili- ties for sports practice. These factors should be considered in programs to encourage sports and participation in physical education. Sports; Motor Activity; Physical Education and Training ARTIGO ARTICLE Resumo O objetivo deste estudo foi analisar os fatores as- sociados à prática esportiva e participação nas aulas de educação física. A amostra foi compos- ta por 827 jovens, selecionados em dois estágios e estratificados por região da cidade de Londri- na, Paraná, Brasil. Foram analisadas a prática esportiva, participação nas aulas de educação física e variáveis sociodemográficas, comporta- mentais e ambientais. Os fatores associados à participação nas aulas de educação física foram: sexo masculino, idade (10-13 anos), percepção de atividade física igual ou elevada, prática es- portiva, movimentação durante as aulas e reali- zar aulas na quadra. Para a prática esportiva, os fatores associados foram o sexo masculino, idade (10-13 anos), percepção de atividade física igual/ elevada, atividade física (≥ 7horas/semana), par- ticipação nas aulas de educação física, possuir ≥ 10 amigos, prática de esportes com amigos e fre- quência de utilização de lugares para a prática. Esses fatores devem ser considerados nos progra- mas de incentivo à prática esportiva e à partici- pação nas aulas de educação física. Esportes; Atividade Motora; Educação Física e Treinamento http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00087413 Coledam DHC et al.534 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 Introdução A relação entre atividade física e saúde de crian- ças e adolescentes tem sido amplamente descri- ta na literatura 1. Dois aspectos que contribuem para o aumento da atividade física em jovens é a prática esportiva 2 e a participação nas aulas de educação física 3,4. De forma geral, ambas tam- bém apresentam relação com a saúde dos jovens, sendo que a prática esportiva está inversamente associada ao sobrepeso 5 e positivamente à saúde mental 6, enquanto que a participação nas aulas de educação física apresenta associação positiva com a aptidão cardiorrespiratória 7,8 e compor- tamentos saudáveis 9. Além disso, a participa- ção nas aulas de educação física representa um importante papel na saúde de jovens, uma vez que é inversamente associada ao sobrepeso 10 e obesidade 11. Apesar da prática esportiva e da participação nas aulas de educação física estarem inter-rela- cionadas com a quantidade de atividade física semanal 2,3, não devem ser tratadas como sinô- nimos. A prática esportiva é caracterizada como a realização de jogos com a utilização de regras regulamentadas por uma federação, podendo ter como objetivo a educação, o lazer, a saúde ou o rendimento 12. Com relação à aula de educa- ção física, esta pode ser definida como disciplina obrigatória na rede básica de educação, tendo como objetivo o ensino dos jogos, esportes, ati- vidades rítmicas, ginásticas e práticas de aptidão física em benefício da qualidade de vida 13. Por fim, a atividade física é definida como qualquer movimento corporal realizado na escola, traba- lho, lazer, afazeres domésticos ou deslocamen- tos, produzido por músculos esqueléticos que resulta em dispêndio energético acima dos níveis de repouso 14. Sendo assim, a prática esportiva e a participação nas aulas de educação física são dois aspectos que compõem a atividade física se- manal. Somadas aos outros componentes (trans- porte, tarefas domésticas, no trabalho, na escola e no tempo livre), devem resultar em no mínimo 300 minutos de atividade física semanal em in- tensidade moderada a vigorosa, recomendadas para crianças e adolescentes 15. Do ponto de vista epidemiológico, grande atenção tem sido dada em investigar a prevalên- cia e os fatores associados à prática de ativida- de física em crianças e adolescentes brasileiros 16,17,18,19. No entanto, há carência de informações acerca dos fatores associados à prática esportiva e participação nas aulas de educação física nessa faixa etária, o que impede a elaboração de pro- gramas de intervenção que poderiam contribuir para a diminuição da alta prevalência de jovens inativos 17. Um estudo analisou diferentes fatores sociodemográficos e comportamentais, e as úni- cas variáveis que apresentaram associação com a ausência nas aulas de educação física foram a idade (> 16 anos) e estar trabalhando 19. Apesar dos resultados encontrados, não foram analisa- das as características das aulas, o que limita a generalização dos resultados obtidos e impede a análise da possível interação entre as caracte- rísticas das aulas e a participação dos escolares. Com relação à prática esportiva, no Brasil a li- teratura apresenta apenas fatores motivacionais que impulsionam a prática dos jovens 20. Ainda não foram investigados os fatores sociodemográ- ficos, comportamentais e ambientais, como já descrito em outros países como Portugal, Dina- marca e Espanha 21,22,23,24. A prevalência de participação nas aulas de educação física é de aproximadamente 50% em jovens brasileiros 19 e, apesar de ainda não ter si- do descrita a prevalência de prática esportiva, em amostras de outros países foi descrito que entre 30% e 70% dos jovens praticam esportes 21,23,25. Investigar os fatores associados torna-se relevan- te para identificar os jovens que possam estar em risco de serem acometidos por agravos 5,6,7,8,9,10 oriundos da não prática esportiva e não partici- pação nas aulas de educação física. Investigar a temática em questão poderá fornecer informa- ções relevantes para a elaboração de programas de intervenção junto à escola e comunidade, além de nortear estudos futuros com o objetivo de identificar outros fatores associados e inter- venções para a promoção da prática esportiva e participação nas aulas de educação física. Por isso, o objetivo do presente trabalho foi analisar os fatores associados à prática esportiva e parti- cipação nas aulas de educação física em jovens. Métodos Este estudo é do tipo transversal e foi realizado na rede estadual de ensino da cidade de Londri- na, Paraná, Brasil, no período de abril a julho de 2012. Nesse ano, Londrina tinha 55.475 escolares matriculados na rede estadual de ensino. O mé- todo para a seleção amostral foi o probabilístico, utilizando dois conglomerados (escola e sala de aula) e estratificado por região da cidade (nor- te, sul, leste, oeste e centro) e sexo, realizado em dois estágios. Inicialmente, uma escola de gran- de porte de cada região da cidade foi sorteada aleatoriamente, e em cada uma foi avaliada a quantidade proporcional ao número de alunos da região. Foram utilizadas salas de aulas com- pletas, que tinham entre 20 e 35 alunos. O cálculo do tamanho amostral necessário teve como parâmetros a população de 55.475 es- PRÁTICA ESPORTIVA E PARTICIPAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA 535 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 colares, prevalência de participação nas aulas de educação física e prática esportiva de 50%, inter- valo de 95% de confiança (IC95%), erro amostral de 5%. Um número mínimo de 382 estudantes seria necessário, no entanto, devido à utilização de conglomerados na amostragem, foi adiciona- do o efeito de delineamento de 2 e perda amostral de 20%. Foram avaliados 965 escolares, porém a amostra final foi constituída por 827 participan- tes (15% de perda amostral), uma vez que foram analisados apenas os dados dos indivíduos que preencheram todas as questões. Todos os procedimentos foram realizados na escola onde os alunos estavam matriculados, em um único dia, por cinco pesquisadores treinados e supervisionados pelo coordenador do trabalho. Os alunos responderam a um questionário em sala de aula, com o objetivo de estimar as variá- veis dependentes (prática esportiva e participa- ção nas aulas de educação física) e as variáveis independentes (sexo, idade, número de irmãos, o responsável com quem mora, condição socio- econômica, escolaridades paterna e materna, atividade física semanal, percepção de ativida- de física, transporte ativo, comportamento se- dentário, necessidade de muita movimentação nas aulas de educação física, local de realização destas aulas, cansaço após as aulas de educa- ção física, número de amigos no bairro, prática esportiva com os amigos, local adequado para prática esportiva, frequência de utilização dos lo- cais, e locais utilizados caso não haja um espaço adequado). O tempo necessário para o preen- chimento do questionário variou de 30 minutos para os escolares com idades acima de 13 anos a 50 minutos para os demais. As variáveis dependentes do estudo foram obtidas por meio de duas questões: (1) sobre a prática esportiva: “Nas atividades de lazer e de ocupação do tempo livre você pratica esportes?”, com as opções de resposta “nunca; raramente; algumas vezes; frequentemente e sempre”; e (2) participação na aula de educação física: “Neste semestre, você participou das aulas de educação física?”, com as opções de resposta “sim; não”. O participante informou o sexo e a data de nascimento no questionário, a qual foi conferi- da consultando-se a lista de cadastro do aluno no IV Núcleo Regional de Ensino. A condição so- cioeconômica foi estimada por meio do Critério de Classificação Econômica Brasil (Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa. http://www. abep.org, acessado em 12/Abr/2013), que esta- belece classificações para o nível socioeconômi- co de acordo com a estimativa de renda média familiar: A1 (R$ 11.480), A2 (R$ 8.295), B1 (R$ 4.754), B2 (R$ 2.656), C1 (R$ 1.459), C2 (R$ 962), D (R$ 680) e E (R$ 415). As escolaridades paterna e materna foram analisadas utilizando-se a questão: “Coloque o grau de instrução de seu pai e sua mãe.”, com as opções de resposta “analfabeto/até 3a série fun- damental; 4a série fundamental; fundamental completo (8a série); médio completo (3o colegial) e superior completo”. O número de irmãos foi estimado por meio da questão de tipo aberta: “Quantos irmãos(ãs) você possui?” Para analisar com qual responsá- vel o participante morava foi utilizada a ques- tão: “Com quem você mora?”, tendo como op- ções de resposta: “com meu pai e minha mãe; apenas com minha mãe; apenas com meu pai; e nenhum”. Para estimar a atividade física habitual foi uti- lizado o Baecke Questionnaire of Habitual Physi- cal Activity (BQHPA) 26. No estudo foram usadas as seguintes informações: atividade física sema- nal, estimada por meio do cálculo do número de horas semanais em intensidade moderada a vigorosa, de atividades esportivas e/ou pro- gramas de exercícios físicos. O transporte ativo foi analisado utilizando-se a questão: “Durante quanto tempo por dia você caminha e/ou anda de bicicleta para ir ao trabalho, à escola e às com- pras?”, com as opções de resposta “< 5 minutos; 5-15 minutos; 15-30 minutos; 30-45 minutos e > 45 minutos”. A percepção de atividade física foi estimada por intermédio da questão: “Em com- paração com outras pessoas de mesma idade, você acredita que as atividades que realiza durante seu tempo livre são fisicamente”, com as opções de resposta “muito elevadas; elevadas; iguais; baixas e muito baixas”. O comportamento sedentário foi estimado por meio da questão: “Quantas horas, em média, você assiste TV, joga videogame ou usa o compu- tador?”, com as opções de resposta “< 1 hora por dia; 1 hora por dia; 2 horas por dia; 3 horas por dia; 4 horas por dia; e 5 ou mais horas por dia”. A mesma questão foi utilizada para estimar o com- portamento sedentário durante a semana e nos finais de semana. Foram investigadas três características das aulas de educação física. A necessidade de mo- vimentação foi avaliada pela questão: “Em todas as aulas de educação física as atividades realiza- das necessitaram de grande movimentação dos alunos (correr, saltar, jogar)?”, com as opções de resposta “não; sim, em algumas aulas e; sim, em todas as aulas”. O local onde a aula era realizada: “Onde você realiza as aulas de educação física?”, com as opções de resposta “duas aulas na qua- dra; uma aula na quadra e uma na sala e; as duas na sala”. O cansaço após as aulas: “Após as aulas de educação física, você se sente cansado e sem disposição para realizar outras atividades que Coledam DHC et al.536 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 envolvam esforço (por exemplo, caminhar, correr, brincar ou jogar)?”, com as opções de resposta “não; sim em apenas uma aula por semana e; sim, toda aula”. A quantidade de pessoas da mesma idade no bairro foi estimada por meio da questão de ti- po aberta: “No seu bairro há quantas pessoas da sua idade?”. A prática de esportes com amigos do bairro foi investigada pela questão: “Você ge- ralmente pratica algum esporte, jogo ou realiza atividades físicas com os amigos do seu bairro?”, com as opções de resposta “sim; não”. A disponibilidade de locais para a prática de atividade física próximo à residência foi anali- sada usando-se a questão: “No seu bairro existe algum lugar adequado (praça, parque, quadra, campo ou clube) para você jogar, brincar ou pra- ticar algum esporte?”, com as opções de resposta “não; sim, apenas um e; sim, mais que um”. Os participantes informaram a frequência de utili- zação desses lugares: “Quantas vezes por semana você utiliza esses lugares para realizar atividades físicas, jogar ou praticar esportes?”, com as res- postas “nenhuma vez; apenas uma vez; duas a quatro vezes; mais de quatro vezes”. Se o parti- cipante informasse que não havia lugar próximo à residência, respondeu à questão: “Caso em seu bairro não haja praça, parque, quadra, campo ou clube, qual lugar você utiliza para jogar, brincar, praticar esportes ou realizar atividades físicas?”, com as opções de resposta “rua; minha casa ou dos amigos; vou a outro bairro”. As variáveis independentes do presente tra- balho foram selecionadas de acordo com as in- formações disponíveis sobre a associação dos aspectos sociodemográficos, comportamentais e ambientais com a prática esportiva de jovens de outros países 21,22,23,24 e com a atividade física de jovens brasileiros 16,17,18,19. As três variáveis referentes às características aulas de educação física foram incluídas no estudo com base na ex- periência profissional dos pesquisadores. A reprodutibilidade do questionário utiliza- do no presente estudo foi testada em 70 escola- res, no intervalo de sete dias. Todas as questões apresentaram reprodutibilidade aceitável, com a concordância das questões variando de 65% a 100% entre os dois momentos. Para as questões com variável numérica discreta a reprodutibi- lidade foi alta, com coeficiente de correlação = 0,964 (0,926-0,983) para o número de irmãos e 0,852 (0,656-0,937) para o número de amigos. A análise descritiva foi realizada usando-se a frequência absoluta e relativa das variáveis analisadas. Para testar a reprodutibilidade do questionário foi utilizado o índice kappa para as variáveis categóricas e o coeficiente de cor- relação intraclasse de um fator aleatório para as variáveis numéricas. Tanto na análise bivariada quanto na multivariada foi utilizada a regressão logística binária para a estimativa da razão de chance e os respectivos IC95%. As análises foram realizadas considerando o plano amostral com- plexo, de acordo com o peso amostral de cada estrato e conglomerado. Na análise multivariada foi utilizada estrutura hierárquica 27 com quatro blocos de entrada das variáveis no modelo, como descrito na Figura 1. Foram incluídas nos blocos hierárquicos as variáveis que apresentaram as- sociação de até 20% na análise bivariada, verifi- cadas por meio do valor de p para tendência. As variáveis que apresentaram p ≤ 0,05 na análise multivariada foram consideradas significativa- mente associadas. O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Éti- ca em Pesquisa envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Londrina sob o proto- colo no 312/2011, de acordo com a Resolução no 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Todos os responsáveis pelos escolares que aceitaram par- ticipar do estudo assinaram o Termo de Consen- timento Livre e Esclarecido, constando todos os procedimentos que seriam realizados e formas de contatos para esclarecimento de possíveis dúvidas. Ao final do estudo, os resultados foram apresentados para cada unidade escolar por meio de um relatório individual a cada escola. Resultados As características dos participantes do estudo são: 54,4% eram do sexo feminino, 34,7% ti- nham entre 10-13 anos, 33% de 14 a 16 anos, 53,1% eram de condição socioeconômica mé- dia, 62,7% tinham mãe com o Ensino Médio completo, 62,4% tinham pais com o Ensino Mé- dio completo. A maioria dos participantes mo- rava com ambos os pais, 70,7% e 35,4% tinham apenas um irmão. Cinquenta e nove vírgula quatro por cento realizavam entre 0-2 horas de atividade física, 28,3% entre 3-6 horas e 30,7% tinham percepção de atividade física elevada. O transporte ativo entre 6-30 minutos era realiza- do por 51,5% dos jovens, 32,4% praticavam es- portes frequentemente/sempre, 72,9% partici- pavam das aulas de educação física, 78,6 tinham comportamento sedentário ≥ 2 horas durante a semana e 75,6% no fim de semana. Quarenta e quatro vírgula sete por cento relataram ne- cessitar de muita movimentação durante todas as aulas de educação física, 55% realizavam as duas aulas na quadra e 62,3% não se sentiam cansados após as aulas. Setenta e um por cento tinham entre 1-9 amigos no bairro, 53,7% rela- taram praticar esportes com amigos do bairro, PRÁTICA ESPORTIVA E PARTICIPAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA 537 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 Figura 1 Estrutura hierárquica das variáveis independentes analisadas. Prática esportiva Participação na aula de educação física Bloco 1 (variáveis demográficas) Sexo, idade, com quem reside, número de amigos e de irmãos(ãs) Bloco 2 (variáveis socioeconômicas) Condição socioeconômica, escolaridades paterna e materna Bloco 3 (variáveis comportamentais) Prática de atividade física, transporte ativo, comportamento sedentário, percepção de atividade física, participação nas aulas de educação física ou prática esportiva, frequência de utilização de lugares para prática esportiva e prática esportiva com amigos do bairro Bloco 4 (variáveis ambientais e características das aulas) Disponibilidade de local adequado para prática esportiva no bairro e local de prática caso não haja lugar disponível Necessidade de muita movimentação durante as aulas, local de realização das aulas e cansaço após a realização das aulas 40% tinham mais do que um lugar para a práti- ca esportiva no bairro, 37,1% frequentavam os lugares mais de uma vez na semana, e dentre os que não tinham lugar, 43,9% utilizavam as suas casas, 40,7% as ruas e 15,4% se deslocavam a outros bairros para praticar esportes. Na Tabela 1 estão descritos os resultados da associação bivariada entre as variáveis indepen- dentes analisadas e a prática esportiva e partici- pação nas aulas de educação física. Foram en- contradas proporções significativamente meno- res de prática esportiva e participação na aula de educação física em escolares do sexo feminino e nos que tinham entre 14 e 20 anos. Maiores proporções de prática esportiva foram encontradas entre os estudantes que ti- nham ≥ 10 amigos, mãe com os ensinos Médio e Superior completos, realizavam atividade física > 3 horas/semana, tinham percepção igual ou superior às pessoas da mesma idade, realizavam transporte ativo > 30 minutos/semana, partici- pantes das aulas de educação física, praticavam esporte com amigos do bairro, tinham mais de um local adequado à prática esportiva no bair- ro, utilizavam o local ≥ 1 vez/semana e, entre os que não tinham local adequado, deslocavam-se a outros bairros. Para a participação nas aulas de educação física foram encontradas maiores pro- porções de participação nos escolares que reali- zavam atividade física semanal > 3 horas, tinham percepção de atividade física igual ou superior às pessoas da mesma idade, praticantes de esporte, que necessitavam realizar muita movimentação em algumas ou todas as aulas e nos que realiza- vam uma ou duas aulas na quadra. As variáveis número de irmãos, comportamento sedentário no fim de semana e cansaço após as aulas de educação física não foram descritas na Tabela 1 por não apresentarem associação com os desfe- chos na análise bivariada (p > 0,20). A análise multivariada da associação entre as variáveis independentes com a prática espor- tiva e participação nas aulas de educação física são apresentados na Tabela 2. O sexo feminino e idades entre 17 e 20 anos permaneceram inver- samente associados à prática esportiva e partici- pação nas aulas de educação física. Ter entre 14 e 17 anos apresentou associação apenas com a participação nas aulas de educação física. Maiores razões de chances para prática es- portiva, que variaram de 1,81 a 3,75 vezes, foram encontradas entre os estudantes que tinham ≥ 10 amigos no bairro, realizavam atividade física ≥ 7 horas/semana, tinham percepção de ativida- de física igual ou superior às pessoas da mesma idade, participantes das aulas de educação física, praticavam esporte com os amigos e utilizavam os locais para prática esportiva em seu bairro ≥ 1 vez/semana. Da mesma forma, as razões de chances de participar das aulas de educação físi- ca variaram de 1,66 a 8,17 vezes superiores entre os escolares que tinham percepção de atividade física igual ou superior às pessoas da mesma ida- de, praticavam esporte, que necessitavam reali- zar muita movimentação em algumas ou todas as aulas de educação física e nos que realizavam uma ou duas aulas na quadra. As variáveis com quem mora (bloco 1), con- dição socioeconômica, escolaridades materna e paterna (bloco 2), transporte ativo e comporta- mento sedentário (bloco 3), local adequado para a prática esportiva no bairro e em que lugar rea- liza a prática caso não tenha disponibilidade no bairro (bloco 4) não foram descritas na Tabela 2 Coledam DHC et al.538 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 Tabela 1 Associação entre as variáveis independentes com a prática esportiva e participação nas aulas de educação física: regressão logística bivariada. Variáveis Prática esportiva Participação nas aulas de educação física Prevalência OR (IC95%) Prevalência OR (IC95%) Sexo p < 0,001 p < 0,001 Masculino 47,7 1,00 78,4 1,00 Feminino 19,6 0,25 (0,18-0,34) 65,7 0,50 (0,36-0,68) Idade (anos) p < 0,001 p < 0,001 10-13 44,6 1,00 83,6 1,00 14-16 32,2 0,62 (0,43-0,87) 68,9 0,43 (0,29-0,64) 17-20 19,5 0,32 (0,22-0,47) 65,5 0,42 (0,28-0,63) Com quem mora? p = 0,058 p = 0,619 Pai e mãe 33,7 1,00 72,8 1,00 Apenas com o pai 13,6 0,46 (0,14-1,52) 72,3 1,12 (0,77-1,62) Apenas com a mãe 31,6 0,85 (0,59-1,21) 73,8 1,82 (0,69-4,81) Nenhum 27,3 0,54 (0,25-1,18) 65,9 0,57 (0,28-1,15) Número de amigos no bairro p = 0,001 0 26,8 1,00 - - ≤ 9 33,2 1,23 (0,76-1,97) - - ≥ 10 48,0 2,24 (1,22-4,10) - - Condição socioeconômica p = 0,001 p = 0,590 Baixa (C1, C2, D e E) 30,1 1,00 75,1 1,00 Média (B1 e B2) 32,7 0,79 (0,56-1,11) 71,6 0,80 (0,56-1,15) Alta (A1 e A2) 18,8 0,36 (0,20-0,65) 71,9 1,06 (0,60-1,85) Escolaridade materna p = 0,001 p = 0,706 Fundamental incompleto 21,3 1,00 72,3 1,00 Ensino Médio completo 33,3 1,55 (1,02-2,36) 73,7 1,05 (0,70-1,57) Superior completo 41,4 2,10 (1,27-3,50) 70,0 0,94 (0,56-1,56) Escolaridade paterna p = 0,019 p = 0,451 Fundamental incompleto 23,9 1,00 73,0 1,00 Ensino Médio completo 33,7 1,43 (0,94-1,15) 73,6 1,25 (0,83-1,87) Superior completo 38,8 1,63 (0,97-2,71) 69,0 0,80 (0,48-1,34) Atividade física semanal (horas) p < 0,001 p < 0,001 0-2 17,3 1,00 66,6 1,00 3-6 49,1 4,89 (3,43 – 6,97) 79,9 1,88 (1,30-2,73) ≥ 7 66,7 9,12 (5,62-14,79) 87,3 2,71 (1,55-4,74) Percepção de atividade física * p < 0,001 p < 0,001 Baixa/Muito baixa 12,2 1,00 61,2 1,00 Igual 32,6 3,73 (2,37-5,85) 75,8 2,08 (1,44-2,99) Elevada/Muito elevada 53,1 8,46 (5,40-13,27) 81,5 2,87 (1,92-4,28) Transporte ativo (minutos) p < 0,001 p = 0,018 < 5 25,0 1,00 68,3 1,00 6-30 28,6 1,15 (0,49-1,75) 72,3 1,23 (0,87-1,90) > 30 44,3 2,04 (1,45-2,87) 77,2 1,37 (0,94-2,00) Participação em aulas de educação física p < 0,001 Não 17,9 1,00 - - Sim 37,8 2,93 (2,01-4,28) - - Prática esportiva p < 0,001 Nunca/Raramente/Algumas vezes - - 65,5 1,00 Frequentemente/Sempre - - 84,4 2,93 (2,01-4,28) (continua) PRÁTICA ESPORTIVA E PARTICIPAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA 539 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 Comportamento sedentário semana (horas) p = 0,001 p = 0,286 ≥ 2 29,6 1,00 71,5 1,00 < 2 38,7 1,32 (0,92-1,89) 73,2 1,07 (0,71-1,39) Necessidade de muita movimentação durante as aulas de educação física? p < 0,001 Não - - 33,3 1,00 Sim, algumas aulas - - 67,7 4,72 (2,40-9,27) Sim, todas as aulas - - 83,2 10,09 (5,04-20,20) Local da aula de educação física p < 0,001 As duas na sala - - 40,6 1,00 Uma na quadra e uma na sala - - 72,6 4,65 (2,31-9,35) As duas aulas na quadra - - 75,4 4,84 (2,43-9,64) Prática de esportes com amigos do bairro p < 0,001 Não 20,2 1,00 - - Sim 44,3 4,76 (3,40-6,66) - - Local adequado para prática esportiva no bairro p < 0,001 Não 26,0 1,00 - - Apenas 1 28,7 1,17 (0,77-1,79) - - Mais que 1 39,3 2,11 (1,39-3,19) - - Quantas vezes por semana utiliza os lugares para prática esportiva? ** p < 0,001 Nenhuma vez 18,4 1,00 - - Apenas uma vez 34,0 3,68 (2,24-6,05) - - Mais de uma vez 55,8 8,36 (5,29-13,22) - - Caso não tenha disponibilidade no bairro, qual lugar utiliza para prática esportiva? *** p < 0,001 Casa 29,3 1,00 - - Rua 33,0 1,82 (0,76-4,38) - - Desloca-se a outro bairro 54,9 5,29 (1,76-15,89) - - IC95%: intervalo de 95% de confiança; OR: odds ratio. * Comparado às pessoas da mesma idade; ** Apenas escolares que relataram ter lugar para prática; *** Apenas escolares que relataram não ter local para prática esportiva (variável que não tem relação com a variável independente analisada). Tabela 1 (continuação) Variáveis Prática esportiva Participação nas aulas de educação física Prevalência OR (IC95%) Prevalência OR (IC95%) por não se manterem associadas aos desfechos na análise multivariada. Discussão A prevalência de jovens dos sexos masculino e feminino que praticam esportes foi de 47,7% e 19,6%, e nos que participam das aulas de edu- cação física de 78,4% e 65,7% respectivamente. A prevalência de prática esportiva foi inferior a encontrada em estudos com jovens portugueses (62%-72% no sexo masculino 2,21,23, 34%-44% no feminino 2,23) e 60% em jovens americanos de ambos os sexos 25. Com relação à participação nas aulas de educação física, no presente estu- do foram encontradas prevalências superiores as encontradas no Brasil (50%) 19 e Estados Unidos (60%) 28,29. A menor proporção de jovens do sexo femi- nino comparada ao sexo masculino que prati- cavam esporte e participavam das aulas de edu- cação física corroboram com outros resultados já descritos na literatura 18,22,30. A diferença en- tre os sexos na prevalência de prática esportiva pode estar associada às experiências constran- gedoras na presença do sexo oposto e imagem corporal em meninas, fazendo com as jovens optem por atividades como corrida e ginástica de academia 29. Os mesmos aspectos 29 podem estar influenciando a participação nas aulas de educação física, haja vista que as aulas no Brasil Coledam DHC et al.540 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 Tabela 2 Associação multivariada entre as variáveis independentes com a prática esportiva e participação nas aulas de educação física: regressão logística utilizando modelo hierárquico (Figura 1). Variáveis Prática esportiva Participação nas aulas de educação física OR (IC95%) OR (IC95%) Bloco 1 Sexo Masculino 1,00 1,00 Feminino 0,27 (0,18-0,40) 0,53 (0,38-0,72) Idade (anos) 10-13 1,00 1,00 14-16 0,74 (0,49-1,12) 0,45 (0,30-0,68) 17-20 0,34 (0,22-0,53) 0,44 (0,30-0,67) Número de amigos no bairro 0 1,00 - ≤ 9 1,34 (0,80-2,24) - ≥ 10 2,30 (1,19-4,46) - Bloco 3 Atividade física seminal (horas) 0-2 1,00 1,00 3-6 2,51 (1,55-4,07) 1,11 (0,71-1,71) ≥ 7 3,56 (1,85-6,82) 1,57 (0,81-3,03) Percepção de atividade física * Baixa/Muito baixa 1,00 1,00 Igual 2,03 (1,11-3,70) 1,66 (1,11-2,48) Elevada/Muito elevada 3,75 (2,02-6,95) 1,70 (1,07-2,70) Prática esportiva Nunca/Raramente/Algumas vezes - 1,00 Frequentemente/Sempre - 1,88 (1,21-2,91) Participação em aulas de educação física Não 1,00 - Sim 1,81 (1,08-3,04) - Quantas vezes por semana utiliza os lugares para prática esportiva? ** Nenhuma vez 1,00 - Apenas uma vez 2,94 (1,60-5,42) - Mais de uma vez 3,70 (2,01-6,84) - Prática de esportes com amigos do bairro Não 1,00 - Sim 2,41 (1,48-3,92) - Bloco 4 Necessidade de muita movimentação durante as aulas de educação física? Não - 1,00 Sim, algumas aulas - 3,42 (1,63-7,19) Sim, todas as aulas - 8,17 (3,71-17,97) Local da aula de educação física As duas na sala - 1,00 Uma na quadra e uma na sala - 2,17 (1,08-4,35) As duas aulas na quadra - 2,38 (1,21-4,68) IC95%: intervalo de 95% de confiança; OR: odds ratio. * Comparado às pessoas da mesma idade; ** Apenas escolares que relataram ter lugar para prática; Nota: variável que apresentou valor de p > 0,20 na análise bivariada ou que não tem relação com a variável independente analisada. Variáveis que não se mantiveram associadas aos desfechos na análise multivariada não foram apresentadas. PRÁTICA ESPORTIVA E PARTICIPAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA 541 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 são realizadas em turmas mistas. Além disso, já foi descrito que jovens do sexo feminino relatam não gostar dessas aulas, provavelmente devido à menor competência atlética percebida 31, o que reduz a participação quando comparadas aos jovens do sexo masculino 32. Da mesma forma, outros fatores como a maior facilidade ao acesso para prática, incentivo dos amigos e prazer em realizar a atividade física podem explicar a maior prevalência de prática esportiva e participação nas aulas de educação física em jovens do sexo masculino, fatores que estão associados apenas aos rapazes 33. Para a idade, com o aumento dos anos ocor- reu a diminuição da participação nas aulas de educação física, fato que corrobora com um es- tudo realizado com jovens brasileiros e que pode ser explicado pelo início do trabalho remunera- do no contraturno 19. Outras informações dis- poníveis dizem respeito apenas aos fatores que permeiam a diminuição da atividade física ao longo da idade e, apesar disto, ainda não existem resultados conclusivos sobre o tema. Um estu- do longitudinal recente investigou 19 possíveis preditores da diminuição da atividade física em jovens aos 10 e 16 anos 34. Os resultados demons- traram que nos jovens do sexo masculino ape- nas a atividade física moderada a vigorosa aos 10 anos e a autoeficácia estiveram associadas à atividade física, enquanto que para as jovens a atividade física moderada a vigorosa aos 10 anos e a percepção de barreiras para a prática foram associadas à atividade física 34. Outro fator que pode estar associado à diminuição da prática es- portiva ao longo da adolescência é que nesta fase começam a trabalhar e os estudos são intensifi- cados, ocupando o tempo livre dos jovens 35,36. Tem sido relatado na literatura que a prática esportiva está positivamente associada à con- dição socioeconômica e escolaridade dos pais, sendo que este fato ocorre possivelmente devido ao suporte que crianças expostas a esta condi- ção têm em relação a lugares e equipamentos adequados para a prática esportiva 23. Isso já foi descrito tanto para prática esportiva quanto pa- ra atividade física vigorosa 37. No presente tra- balho os resultados são contrários à literatura, indicando que a condição socioeconômica não está associada à prática esportiva. Uma possível explicação é a não associação encontrada en- tre prática esportiva e disponibilidade de locais adequados para a prática. Tais resultados corro- boram um estudo recente que demonstrou não haver associação entre prática esportiva e dis- ponibilidade de locais e equipamentos adequa- dos 21. Esses dados permitem afirmar que possuir locais adequados não garante a prática esportiva de jovens. O que irá determinar a prática é a fre- quência do jovem nesses lugares, como descrito no presente trabalho. Dessa forma, programas de incentivo à prática esportiva devem buscar estratégias para atrair os jovens aos lugares como praças, parques, quadras poliesportivas e clubes, garantindo segurança e orientação especializada para a prática. Outros resultados encontrados fornecem in- formações relevantes para o entendimento da não associação verificada entre prática esportiva e disponibilidade de locais adequados próximo à residência. Primeiro, o jovem praticante de es- porte utiliza outros lugares improvisados, como por exemplo, a rua e as residências, ou ainda, se desloca para outros bairros onde há lugares ade- quados para praticar esportes, como verificado no presente trabalho. Além disso, quando ajusta- dos para todas as variáveis do estudo, dois fato- res, possuir ≥ 10 amigos e praticar esportes com amigos, se mostraram positivamente associados à prática esportiva. Os resultados corroboram aos previamente descritos, os quais demonstra- ram que a prática esportiva está positivamente associada ao incentivo dos amigos 38. Da mesma forma como a prática esportiva, não foram encontradas associações entre partici- pação nas aulas de educação física e indicadores socioeconômicos, corroborando com os resul- tados de um estudo realizado com jovens brasi- leiros 19. Nas escolas da rede estadual de ensino estão matriculados alunos de diferentes estratos socioeconômicos, como encontrado no presen- te estudo. Os alunos, independentemente da condição socioeconômica, usufruem da mesma infraestrutura, professores e currículo, variáveis que podem ser determinantes para a participa- ção nas aulas de educação física quando compa- radas à condição socioeconômica. Isso foi encontrado no presente trabalho, uma vez que realizar aulas na quadra e aulas que necessitam de muita movimentação foram po- sitivamente associadas à participação. Com re- lação às aulas na quadra, dois aspectos podem contribuir para maior proporção de participação nestas aulas. O aluno tem em média cinco aulas por dia em sala de aula com duração de 50 minu- tos cada, sendo assim, a aula de educação física realizada na quadra pode torná-la interessante, principalmente para os que se sentem motiva- dos para realizar atividades físicas 39. De forma semelhante, aulas que necessitam de muita mo- vimentação reduzem o tempo no qual o aluno permancece parado aguardando sua vez de exe- cutar tarefas ou apenas sendo instruído. A falta de movimentação nas aulas de educação física é um fator comumente relatado por alunos como sendo uma das causas da não participação 40. Um fato que poderia justificar a realização de au- Coledam DHC et al.542 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 las com menor movimentação é que a aula com muita movimentação resultaria em aumento da intensidade da atividade, gerando percepções de desconforto durante a realização, o que oca- sionaria a desistência da tarefa realizada, como já descrito em jovens 41. Isso não foi confirma- do pelos achados do presente estudo, haja vista que não foram encontradas associações entre se sentir cansado após as aulas de educação física e participação nas mesmas. Um dos fatores que apresentou associação com a prática esportiva e participação nas aulas de educação física foi a percepção de atividade física. Já foi descrito que jovens superestimam a sua atividade física real 42. No entanto, com rela- ção à prática esportiva e participação nas aulas de educação física isso não ocorreu. Os resulta- dos demonstram que indivíduos que se perce- bem iguais ou mais ativos fisicamente quando comparados às pessoas da mesma idade, têm maiores chances de praticar esportes e partici- par das aulas de educação física em relação aos que têm percepção de atividade física baixa ou muito baixa. A atividade física apresentou associação positiva com a prática esportiva, mas o mesmo não foi encontrado para a participação nas au- las de educação física. O instrumento utilizado permitiu quantificar a atividade física realizada por meio de programas de exercício físico de qualquer tipo e prática esportiva em intensidade moderada a vigorosa. Os resultados demonstram que a prática esportiva é um aspecto importante para o acúmulo de atividade física diária semanal dos jovens brasileiros, como já relatado previa- mente entre jovens 2. Assim, a prática esportiva deve ser incentivada com o objetivo de aumentar a proporção de jovens que atendem à recomen- dação de atividade física moderada a vigorosa se- manal. Com relação às aulas de educação física, apesar de já ter sido demonstrado que elas são eficazes para aumentar a atividade física sema- nal de jovens 3,4, na amostra estudada a quanti- dade de atividade física no tempo livre entre os que participam destas aulas não foi superior se comparada aos não participantes, como já de- monstrado 19. Um fator que pode explicar esse resultado é o fato de que o incentivo e a orien- tação à prática de atividade física ainda não são prioridades no currículo da educação física na escola 43, característica que deve ser reavaliada tendo em vista a promoção do estilo de vida ativo dos escolares. As duas variáveis dependentes analisadas no presente estudo apresentaram associação po- sitiva entre si. A educação física tem como um dos seus conteúdos norteadores o esporte 13, que além de ser praticado dentro da escola também é incentivado a ser realizado no tempo livre. Diver- sos são os fatores que motivam a prática espor- tiva de jovens, como por exemplo, promover a aptidão física e habilidades, prazer em competir e socialização 44, itens que podem impulsionar a participação dos alunos durante as aulas apenas pelo fato de gostar de praticar esporte. Devido ao delineamento transversal utilizado no trabalho, não é possível identificar efeito causal de uma variável sobre a outra. Apesar dos resultados encontrados, o estudo apresenta algumas limitações. Uma é o fato de que não foi analisado se o jovem realizava tra- balho remunerado, variável que pode estar asso- ciada à prática esportiva. Além disso, não foram identificados quais os esportes que eram pratica- dos pelos jovens e se o esporte era feito de forma orientada, características que podem apresentar associações diferentes das encontradas. Com re- lação às aulas de educação física, informações sobre a qualidade da infraestrutura, dos mate- riais, perfil do professor, métodos e conteúdos utilizados na aula não foram analisados, carac- terísticas que também podem estar associadas à participação durante estas aulas. Conclusão Os resultados encontrados no presente estudo sugerem que ser do sexo masculino, ter entre 10 e 13 anos e percepção de atividade física igual ou superior às pessoas da mesma idade são fatores positivamente associados com a prática espor- tiva e participação nas aulas de educação física. Participar dessas aulas, realizar atividade física 7 horas/semana, conviver com 10 ou mais amigos, frequentar lugares para a prática esportiva uma ou mais vezes na semana e realizar atividades com amigos estiveram positivamente associa- dos à prática esportiva. Maiores proporções de participação nas aulas de educação física foram encontradas entre os jovens que praticam es- portes, participam de aulas que necessitam de muita movimentação e nos que realizam aulas na quadra. Os resultados encontrados apontam carac- terísticas que devem ser consideradas por pro- fessores e pesquisadores, tanto na execução das aulas no âmbito escolar quanto na formulação de políticas públicas para o incentivo à prática esportiva e aumento da participação nas aulas de educação física, assim como na proposta de estudos experimentais com o mesmo objetivo. Sugere-se que futuros trabalhos investiguem ou- tros fatores, tais como conteúdos ministrados em aula e o ambiente físico e social das escolas, que também podem contribuir para o entendimento PRÁTICA ESPORTIVA E PARTICIPAÇÃO NAS AULAS DE EDUCAÇÃO FÍSICA 543 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 da participação dos jovens nas aulas de educação física. Da mesma forma, analisar fatores como barreiras ambientais, sociais e aspectos motiva- cionais torna-se relevante, uma vez que são as- pectos que também podem determinar a prática esportiva de jovens. Resumen El objetivo de este estudio fue analizar los factores aso- ciados a la práctica deportiva y participación en las clases de educación física. La muestra consistió en 827 jóvenes; se seleccionó en dos etapas y estratificó por re- gión en la ciudad de Londrina, Paraná, Brasil. Se ana- lizó la práctica deportiva, participación en las clases de educación física y variables sociodemográficas, de comportamiento y ambientales. Los factores asocia- dos a la participación en las clases de educación física fueron: sexo masculino, edad (10-13 años), percepción de actividad física igual o superior, práctica deportiva, ejercicio en las clases y clases en pista deportiva. Para la práctica deportiva, los factores asociados fueron: se- xo masculino, edad (10-13 años), percepción de activi- dad física igual o superior, actividad física (≥ 7 horas/ semana), participación en las clases de educación fí- sica, tener ≥ 10 amigos, práctica deportiva con amigos y frecuencia de uso de las instalaciones. Estos factores deben ser considerados en programas de incentivos a la práctica deportiva y participación en las clases de edu- cación física. Deportes; Actividad Motora; Educación y Entrenamineto Físico Colaboradores D. H. C. Coledam, P. F. Ferraiol e R. Pires Junior atuaram na coleta, análise e interpretação dos dados, elaboração, revisão crítica e final do manuscrito. J. W. dos-Santos e A. R. Oliveira colaboraram na análise e interpretação dos dados, revisão crítica e final do manuscrito. Coledam DHC et al.544 Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 30(3):533-545, mar, 2014 Referências 1. Ekelund U, Luan J, Sherar LB, Esliger DW, Griew P, Cooper A, et al. Moderate to vigorous physical ac- tivity and sedentary time and cardiometabolic risk factors in children and adolescents. JAMA 2012; 307:704-12. 2. Seabra AF, Mendonça DM, Thomis MA, Malina RM, Maia JA. Sports participation among Portu- guese youth 10 to 18 years. J Phys Act Health 2007; 4:370-80. 3. Dauenhauer BD, Keating XD. The influence of physical education on physical activity levels of urban elementary students. Res Q Exerc Sport 2011; 82:512-20. 4. Meyer U, Roth R, Zahner L, Gerber M, Puder JJ, Hebestreit H, et al. 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