UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ENGENHARIA CAMPUS DE ILHA SOLTEIRA ANDRÉ LUIS TONIATI ESCOAMENTOS PULSANTES COM SUPERFÍCIE LIVRE: CARACTERIZAÇÃO E SUA AÇÃO EM FUNDO DE CANAIS ILHA SOLTEIRA 2018 ANDRÉ LUIS TONIATI ESCOAMENTOS PULSANTES COM SUPERFÍCIE LIVRE: CARACTERIZAÇÃO E SUA AÇÃO EM FUNDO DE CANAIS Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia - UNESP – Campus de Ilha Solteira, para obtenção do título de Mestre em Engenharia Mecânica. Área de conhecimento: Ciências Térmicas. Prof. Dr. Geraldo de Freitas Maciel Orientador Drª. Fabiana de Oliveira Ferreira Coorientador ILHA SOLTEIRA 2018 Toniati Escoamentos Pulsantes com Superfície LivreCaracterização e sua Ação em Fundo de CanaisIlha Solteira2018 120 Sim Dissertação (mestrado)Engenharia MecânicaCiências Térmicas e Mecânica dos FluidosSim . . . FICHA CATALOGRÁFICA Desenvolvido pelo Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação Toniati, André Luis. Escoamentos pulsantes com superfície livre: caracterização e sua ação em fundo de canais / André Luis Toniati. -- Ilha Solteira: [s.n.], 2018 120 f. : il. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Engenharia. Área de conhecimento: Ciências Térmicas e Mecânica dos Fluidos, 2018 Orientador: Geraldo de Freitas Maciel Co-orientador: Fabiana de Oliveira Ferreira Inclui bibliografia 1. Roll Waves. 2. Fluidos newtonianos. 3. Fluidos não-newtonianos. 4. Corridas de lama. 5. Tensão de cisalhamento no Fundo. 6. Transporte de sedimentos. T665e UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA E S C O A M E N T O S P U L S A N T E S C O M S U P E R F Í C I E L I V R E : CARACTERIZAÇÃO E SUA AÇÃO EM FUNDO DE CANAIS TÍTULO DA DISSERTAÇÃO: CERTIFICADO DE APROVAÇÃO AUTOR: ANDRÉ LUÍS TONIATI ORIENTADOR: GERALDO DE FREITAS MACIEL COORIENTADORA: FABIANA DE OLIVEIRA FERREIRA Aprovado como parte das exigências para obtenção do Título de Mestre em ENGENHARIA MECÂNICA, área: CIÊNCIAS TÉRMICAS pela Comissão Examinadora: Prof. Dr. GERALDO DE FREITAS MACIEL Departamento de Engenharia Civil / Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira Prof.Dr. RENE ORLANDO MEDRANO TORRICOS Departamento de Física / Universidade Federal de São Paulo Prof. Dr. GUILHERME HENRIQUE FIOROT Departamento de Engenharia Mecanica / Universidade Federal do Rio Grande do Sul Ilha Solteira, 30 de julho de 2018 Faculdade de Engenharia - Câmpus de Ilha Solteira - Avenida Brasil, 56, 15385000, Ilha Solteira - São Paulo www.ppgem.feis.unesp.brCNPJ: 48.031.918/0015-20. A familiares e amigos que sempre torceram por mim. Em especial, aos meus pais, pela torcida de camarote. AGRADECIMENTOS Aos meus pais, Onofre Francisco Toniati e Maria Andrea B. Toniati, por sempre estarem ao meu lado, me apoiando e orientando na minha jornada. Aos meus irmãos, Eugênio e Josana, pelo carinho e amor fraterno compartilhado ao longo da vida. Aos meus amigos e companheiros que conviveram comigo neste período. À minha namorada Giulia Marcucci Peron, pelo carinho e paciência nesta etapa. Ao Professor Geraldo de Freitas Maciel, pela orientação, ensinamentos e oportuni- dades, que contribuiram para minha formação tanto profissional como pessoal, além do despertar do saber e questionar. À Professora Fabiana de Oliveira Ferreira, pela coorientação, pelas conversas, pelas muitas horas dedicadas, pelo incentivo, pela ajuda no desenvolvimento deste trabalho. Ao Professor Guilherme Henrique Fiorot, pelo apoio no desenvolvimento deste trabalho. A todos do grupo de pesquisa RMVP, em especial ao João e Renan, pelas inúmeras contribuições e cafezinhos da tarde, que tornaram este período muito mais agradável. Aos funcionários da UNESP de Ilha Solteira, na parte técnica e administrativa, que cooperaram para realização deste projeto. Por fim, não menos importante, agradeço a Deus, por iluminar o meu caminho e ter colocado pessoas especiais em minha vida que sou tão agradecido. “(...) que o objetivo da vida não é maximizar o lucro, mas minimizar o tédio.” (José Augusto Penteado Aranha) RESUMO No contexto de Desastres “Naturais”, as corridas de lama têm sido objeto de estudo devido ao seu poder erosivo e, muitas vezes, destrutivo, acarretando perdas materiais vultosas e ceifando vidas. Nestes escoamentos, quando em condições favoráveis de vazão, inclinação e reologia do fluido, podem surgir instabilidades que se propagam em forma de trem de ondas na superfície, denominadas roll waves. A literatura acerca do assunto trata, geralmente, dos critérios de geração, estabilidade, e determinação das características principais do fenômeno, como amplitude, comprimento e celeridade de onda. Nesta dissertação buscou-se estudar a tensão de cisalhamento no fundo na presença de roll waves, em duas vertentes: a primeira apresenta as roll waves em água limpa, baseando-se no trabalho clássico de Dressler (1949); a segunda, dando continuidade aos trabalhos do Grupo de Pesquisa de Reologia de Materiais Viscosos e Viscoplástcos (Grupo RMVP), focou no estudo de roll waves desenvolvendo-se em fluidos do tipo Herschel-Bulkley, em duas situações - canal de fundo impermeável e fundo com condição de permeabilidade, grande contribuição desta dissertação. Os modelos matemáticos foram desenvolvidos com base nas equações de águas rasas, cuja implementação numérica permitiu confrontar resultados experimentais e numéricos, que apresentaram boa aderência. Para o modelo com condição de permeabilidade no fundo, verificou-se a influência do fator de porosidade nas características das roll waves (amplitude, comprimento e celeridade de onda), tendo sido constatado que a amplitude de onda geralmente aumenta, enquanto seu comprimento e celeridade diminuem quando da presença deste fator. Por fim, avaliou-se a tensão de cisalhamento no fundo, cujos resultados apontam, para fundos impermeáveis, incremento em relação ao escoamento base (sem presença de roll waves) de 12% a 27%, dependendo, respectivamente, da natureza laminar/turbulenta e da dinâmica (número de Froude) do escoamento. Quando levada em conta a porosidade do leito, o incremento de tensão de cisalhamento no fundo pode atingir valores bem mais significativos (60% a 100%). Palavras-chave: Roll waves. Fluidos newtonianos. Fluidos não-newtonianos. Corridas de lama. Tensão de cisalhamento no fundo. Transporte de sedimentos. ABSTRACT Mudflows have been the focus of studies because of their erosive ability and often destructive power, causing material losses and taking away lives. Under favorable conditions of discharge, slope, disturbance, and rheology, these flows can develop a specific type of instability that is propagated downstream as shock waves, called roll waves. Most of the roll waves literature provides information on generation criteria, stability, and information of amplitudes, wavelengths, and celerity. This works brings a study of bottom shear stress in pulsating flows (roll waves) in 2 parts. In the first part, we present roll waves in clean water, based on Dressler’s work. In the second part, we continue the works of research team about roll waves developing in Herschel-Bulkley fluid under 2 conditions: impermeable bottom and porous bed. The mathematical models developed were based on shallow water equations. The results of these models were compared to Fluent and experimental results, showing a good agreement. For the mathematical model with porous bed condition, we evaluated the effect of porosity factor in properties of roll waves, and we observed that the amplitude of the roll wave usually increases, whereas the length and the celerity decrease with the presence of this factor. Finally, considering an impermeable bottom, the bottom shear stress presented an increase of 12% to 27%, depending on nature (laminar-turbulent) and dynamics (Froude number) of flow. Taking in account a porous bed, the bottom shear stress reached more significant values (60% to 100%). Keywords: Roll waves. Newtonian fluids. Non-newtonian fluids. Mudflows. Bottom shear stress. Sediment transport. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Cidade de Teresópolis, após deslizamentos de terra e corridas de lama em 2011. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 Figura 2 – Exemplos de aparecimento de roll waves em canais artificiais. (a) Roll waves em escoamentos lamosos, canal na França; (b) Roll waves em água, no canal de Merligen, Suíça; (c) Instabilidades de superfície livre em fluido não-Newtoniano; (d) Roll waves em gel de carbopol em rampa experimental. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 Figura 3 – Registro de monitoramento de profundidade de escoamento, em Acquabona, com a presença do fenômeno roll wave após tempestade de 17 de agosto de 1998. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 Figura 4 – Perfil das “mínimas” roll waves, isto é, a menor amplitude, celeridade e comprimento de onda, obtidas por Ng e Mei (1994) para 3 casos de número de Froude, quais sejam: 𝐹𝑟 → ∞ ( ), 𝐹𝑟 = 1 ( ) e 𝐹𝑟 = √ 2 ( ). Sendo ℎ (𝜉): lâmina do escoamento, 𝑢 (𝜉): velocidade média e 𝜏𝑏 (𝜉): tensão de cisalhamento no fundo. . . . . . . . . . . . . . 28 Figura 5 – Exemplo de estudo, relacionando roll waves e transporte de sedimentos (região hachurada). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 Figura 6 – Perfil no espaço (𝑧) x tempo (𝑡), de partículas de SiC (carbeto de silício) obtidos a partir de imagens de uma câmera posicionada na lateral da rampa experimental alinhada com a inclinação da mesma. O eixo vertical é a espessura do escoamento livre e no eixo horizontal o tempo de experimento para um período de 4 segundos em (a) e 2 segundos em (b). A linhas preta representa a posição do fundo rugoso em relação ao fluxo. As linhas horizontais representam partículas depositadas. . . . . 31 Figura 7 – Esquema indicando duas possíveis representações de ondas granulares de erosão/deposição em uma plano inclinado em 𝜁 com a horizontal. O material em repouso está hachurado em cinza, a espessura do escoamento, normal à direção 𝑧 é considerado em (a) a altura ℎ(𝑥, 𝑡) das partículas entre a superfície livre 𝑠(𝑥, 𝑡) e a base da onda granular em 𝑧 = 𝑏(𝑥, 𝑡), ou (b) a profundidade ℎ(𝑥, 𝑡) entre a superfície livre e o fundo. O perfil típico de velocidade 𝑢(𝑥, 𝑡) ao longo da profundidade é representado. A solução da onda considera que esta se move com velocidade contante 𝑢𝑤, e erode uma camada estática de sedimentos de espessura ℎ+ a sua frente, depositando a mesma espessura atrás. . . . . 31 Figura 8 – Esquema geral para representação do escoamento. Na qual 𝑥 é a coordenada na direção longitudinal do canal, 𝑧 a coordenada na direção longitudinal do canal, ℎ a profundidade do escoamento, ℎ1 a profundidade referente à “cava” da onda (lâmina baixa), ℎ2 a profundidade referente à “crista” da onda (lâmina alta), 𝑈 a celeridade da onda, 𝜆 o comprimento de onda, 𝑔 a aceleração da gravidade, 𝑢 a componente da velocidade na direção 𝑥, 𝑤 a componente da velocidade em 𝑧, 𝜃 a inclinação do canal. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 Figura 9 – Esquema para o problema estudado, fluido não-Newtoniano tipo Herschel-Bulkley escoando em um meio permeável. . . . . . . . . . . . 46 Figura 10 – Fluxograma para método numérico utilizado no Modelo 1. . . . . . . 60 Figura 11 – Fluxograma para o método numérico utilizado no Modelo 2. . . . . . 60 Figura 12 – Comparação entre o Modelo 1, Ensaio Experimental (BROCK, 1969) e Fluent®. No eixo da ordenada, amplitude de onda adimensionalizada pela lâmina do escoamento base, e na abscissa o comprimento de onda normalizado. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63 Figura 13 – Tensão de cisalhamento máxima em função do número de Froude. . . . 64 Figura 14 – Perfil de roll waves obtido a partir do Modelo 1 utilizando-se dado experimental obtido por Fiorot (2016). Sendo ℎ: lâmina do escoamento, 𝑢: velocidade média e 𝜏𝑓 : tensão de cisalhamento no fundo. . . . . . . . 65 Figura 15 – Valores de tensão cisalhamento máxima para 𝐶 = 0 e 𝑛 variando de 0, 1 a 1, 0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Figura 16 – Valores de tensão cisalhamento máxima para 𝐶 = 0, 1 e 𝑛 variando de 0, 1 a 1, 0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Figura 17 – Valores de tensão cisalhamento máxima para 𝐶 = 0, 2 e 𝑛 variando de 0, 1 a 1, 0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 Figura 18 – Valores de tensão de cisalhamento máxima para 𝑛 = 0, 6 e 𝐶 variando de 0 a 0, 2. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 Figura 19 – Amplitudes de onda: M2FI vs. software Fluent® vs. experimental em laboratório (MACIEL et al., 2017) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 Figura 20 – Profundidades, velocidade média e tensão de cisalhamento no fundo, para os dois modelos: M2FI e Fluent®. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 Figura 21 – Valores de 𝐹𝑟min em função do fator porosidade (𝛾). . . . . . . . . . . 72 Figura 22 – 𝐹𝑟min em função do fator porosidade 𝛾 para 𝑛 = 0, 6. . . . . . . . . . . 73 Figura 23 – Valores de amplitude de onda (Δℎ) em função de 𝐹𝑟. . . . . . . . . . . 74 Figura 24 – Valores de comprimento de onda (𝜆) em função de 𝐹𝑟. . . . . . . . . . 75 Figura 25 – Valores de celeridade (𝑈) em função de 𝐹𝑟. . . . . . . . . . . . . . . . 76 Figura 26 – Perfil de onda, perfil de velocidade média e tensão de cisalhamento no fundo de canal do Caso 1, com parâmetros 𝑛 = 0, 4, 𝐶 = 0, 𝐹𝑟 −→ ∞ para 𝛾 = 0, 𝛾 = 0, 2, 𝛾 = 0, 4, 𝛾 = 0, 8. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79 Figura 27 – Perfil de onda, perfil de velocidade média e tensão de cisalhamento no fundo de canal do Caso 2, com parâmetros 𝑛 = 0, 4, 𝐶 = 0, 2, 𝐹𝑟 −→ ∞ para 𝛾 = 0, 𝛾 = 0, 2, 𝛾 = 0, 4, 𝛾 = 0, 8. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79 Figura 28 – Perfil de onda, perfil de velocidade média e tensão de cisalhamento no fundo de canal do Caso 3, com parâmetros 𝑛 = 0, 4, 𝐶 = 0, 𝐹𝑟 = 1 para 𝛾 = 0, 𝛾 = 0, 2, 𝛾 = 0, 4, 𝛾 = 0, 8. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80 Figura 29 – Perfil de onda, perfil de velocidade média e tensão de cisalhamento no fundo de canal do Caso 4, com parâmetros 𝑛 = 0, 4, 𝐶 = 0, 2, 𝐹𝑟 = 1 para 𝛾 = 0, 𝛾 = 0, 2, 𝛾 = 0, 4, 𝛾 = 0, 8. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 80 Figura 30 – Perfil de onda, perfil de velocidade média e tensão de cisalhamento no fundo de canal do Caso 5, com parâmetros 𝑛 = 0, 4, 𝐶 = 0, 𝐹𝑟 = √ 0, 2 para 𝛾 = 0, 𝛾 = 0, 2, 𝛾 = 0, 4, 𝛾 = 0, 8. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81 Figura 31 – Perfil de de onda, perfil de velocidade média e tensão de cisalhamento no fundo de canal do Caso 6, com parâmetros 𝑛 = 0, 4, 𝐶 = 0, 2, 𝐹𝑟 = √ 0, 2 para 𝛾 = 0, 𝛾 = 0, 2, 𝛾 = 0, 4, 𝛾 = 0, 8. . . . . . . . . . . . 81 Figura 32 – Análise da amplitude de onda Δℎ em função de ℎ1 = ℎmin, para diversos parâmetros (𝐶, 𝑛, 𝛾, 𝐹𝑟). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83 Figura 33 – Envoltória superior e inferior de Δℎ em função de ℎ1 = ℎmin. . . . . . . 84 Figura 34 – Comparativo entre a envoltória superior e inferior de Δℎ em função de ℎ1 = ℎmin com aquela obtida por Fiorot (2012). . . . . . . . . . . . . . 85 Figura 35 – Aproximação por interpolação dos resultados de celeridade (𝑈) apresen- tados quando da presença da porosidade (𝛾 ̸= 0) em função do número de Froude (𝐹𝑟). Em vermelho, resultado para um fluido Newtoniano com fundo impermeável. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86 Figura 36 – Aproximação por interpolação dos resultados de comprimento de onda (𝜆) apresentados quando da presença da porosidade (𝛾 ̸= 0) em função do número de Froude (𝐹𝑟). Em vermelho, resultado para um fluido Newtoniano com fundo impermeável. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 87 Figura 37 – Máxima tensão de cisalhamento no fundo em função do número de Froude, para 𝐶 = 0. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88 Figura 38 – Máxima tensão de cisalhamento no fundo em função do número de Froude, para 𝐶 = 0, 1. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 Figura 39 – Máxima tensão de cisalhamento no fundo em função do número de Froude, para 𝐶 = 0, 2. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 Figura 40 – Máxima tensão de cisalhamento no fundo em função do número de Froude. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Esquema numéricos utilizados no Fluent®. . . . . . . . . . . . . . . . . 61 Tabela 2 – Dados de ensaio experimental realizado por Brock (1969) utilizados como parâmetros de entrada no Modelo 1 e no Fluent. . . . . . . . . 62 Tabela 3 – Valores de lâminas baixa e alta, amplitude, período e celeridade para modelos testados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63 Tabela 4 – Dados experimentais de medidas de parâmetros de escoamento realiza- das por Fiorot (2016) para um canal com fundo impermeável. . . . . . 65 Tabela 5 – Valores de amplitude, comprimento de onda e celeridade para modelos testados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 Tabela 6 – Dados do ensaio experimental realizado por Maciel et al. (2017) utilizados como parâmetros de entrada no M2FI e no Fluent. . . . . . 70 Tabela 7 – Parâmetros de entrada nos estudos de caso; valores máximos e mínimos para o perfil de onda, velocidade média de escoamento e tensão de cisalhamento no fundo; e comprimento de onda. . . . . . . . . . . . . . 78 LISTA DE SÍMBOLOS 𝐹𝑟 número de Froude 𝜇 viscosidade dinâmica ou absoluta de fluido Newtoniano 𝜇𝑛 índice de consistência para fluido do tipo Power Law 𝜇𝐵 viscosidade plástica (fluido de Bingham) 𝑛 índice de escoamento do fluido 𝑥 coordenada na direção longitudinal do canal 𝑧 coordenada na direção vertical do canal 𝑈 velocidade de propagação ou celeridade da roll wave 𝜆 comprimento de onda da roll wave 𝑔 aceleração da gravidade 𝑢 componente da velocidade na direção 𝑥 𝑤 componente da velocidade na direção 𝑧 𝑢𝑝 componente da velocidade na direção 𝑥 do meio permeável 𝑤𝑝 componente da velocidade na na direção 𝑧 do meio permeável ℎ profundidade do escoamento ℎ𝑐 profundidade crítica do escoamento ℎ1 profundidade referente à “cava” da roll wave (lâmina baixa) ℎ2 profundidade referente à “crista” da roll wave (lâmina alta) ℎmin menor lâmina baixa possível da roll wave Δℎ amplitude de onda (ℎ2 − ℎ1) 𝑢 velocidade média do escoamento da componente 𝑥 na vertical 𝑢𝑐 velocidade média do escoamento da componente 𝑥 na vertical na seção crítica do escoamento 𝑢1 velocidade média do escoamento da componente 𝑥 referente à profundi- dade da “cava” da onda (ℎ1) 𝑢2 velocidade média do escoamento da componente 𝑥 referente à profundi- dade da “crista” da onda (ℎ2) 𝜉 sistema móvel de coordenadas apresentado no modelo de Ng e Mei (1994) 𝑆ℎ número de Shields ℎ+ espessura granular depositada no modelo de Edwards e Gray (2015) 𝜃 inclinação do canal em relação à horizontal 𝑡 tempo 𝜌 massa específica �⃗� vetor velocidade 𝐿 comprimento característico longitudinal 𝑙 largura do canal 𝑃 pressão total �⃗� 𝑔 força peso por unidade de massa �⃗� res forças resistivas por unidade de massa 𝑥′ abscissa no sistema móvel de coordenadas ( )* variável adimensional 𝜓 parâmetros do escoamento e fluido 𝐶𝑓 coeficiente de fricção que depende da rugosidade do canal 𝑟2 coeficiente de fricção que depende da rugosidade do canal 𝐶ℎ coeficiente de Chézy 𝑓 coeficiente de atrito de Darcy-Weisbach 𝑞 vazão relativa adimensional, que em regime permanente e uniforme é uma constante 𝑚 inclinação do canal no modelo de Dressler (1949) ( )0 variável em condições de regime uniforme 𝑆𝑓 declividade da linha de energia 𝜏𝑏 tensão de cisalhamento no fundo de canal no modelo de Ng e Mei (1994) 𝜏𝑓 tensão de cisalhamento no fundo do canal 𝜏𝑐 tensão limite de escoamento 𝜏𝑥𝑧 tensão de cisalhamento na direção 𝑥 devido a um gradiente em 𝑧 𝜏𝑓min tensão de cisalhamento mínima no fundo 𝜏𝑓max tensão de cisalhamento máxima no fundo 𝐾𝑛 índice de consistência do fluido de Herschel-Bulkley 𝛼 coeficiente de distribuição de velocidade, na vertical 𝐶 tensão limite de escoamento adimensional 𝜒 parâmetro adimensional relacionado ao fator de forma dos vazios e no meio permeável 𝜅 fator de permeabilidade modificado no meio 𝑃𝑝 pressão total no meio permeável 𝜅𝐼 permeabilidade inercial 𝜅𝐾 permeabilidade intrínseca Ω𝑓 relação entre o limite inercial e a resistência cinemática no meio poroso 𝑧0 altura da zona não-cisalhada (plug flow) 𝛾 parâmetro adimensional referente à permeabilidade no meio, relacio- nando parâmetros geométricos e do fluido 𝑢𝑓 velocidade no fundo ℋ magnitude de perturbação 𝑘𝑟 número de onda 𝑘𝑖 taxa de amplificação no domínio do espaço 𝑤𝑟 frequência de perturbação 𝑤𝑖 taxa de amplificação no domínio do tempo 𝐹𝑟min número de Froude mínimo 𝑅𝑒 número de Reynolds do escoamento SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 1.1 OBJETIVOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 1.2 ESTRUTURAÇÃO DA DISSERTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 2 ESTADO DA ARTE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 2.1 ROLL WAVES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 2.2 TRANSPORTE DE SEDIMENTOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 2.3 ROLL WAVES E O TRANSPORTE DE SEDIMENTOS . . . . . . . . 29 3 METODOLOGIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 3.1 MODELO GERAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 3.2 MODELO 1 (M1) - MODELO MATEMÁTICO CLÁSSSICO DE ROLL WAVES EM ÁGUA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 3.2.1 Equações motrizes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 3.2.2 Mudança de referencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 3.2.3 Adimensionalização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 3.2.4 Equação da roll wave . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 3.2.5 Determinação da celeridade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 3.2.6 Condições de choque de Rankine-Hugoniot . . . . . . . . . . . . . 39 3.2.7 Determinação da tensão de cisalhamento no fundo . . . . . . . . 40 3.2.8 Equações adimensionalizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 3.3 MODELO 2 - MODELO MATEMÁTICO DO GRUPO RMVP: ROLL WAVES EM FLUIDOS DE HERSCHEL-BULKLEY, COM FUNDO IMPERMEÁVEL (M2FI) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 41 3.3.1 Equações motrizes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 3.3.2 Adimensionalização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 3.3.3 Mudança de referencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 3.3.4 Equação da roll wave . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 3.3.5 Determinação da celeridade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 3.3.6 Condições de choque de Rankine-Hugoniot . . . . . . . . . . . . . 44 3.4 MODELO 2 - MODELO MATEMÁTICO: AS ROLL WAVES EM FLUIDOS DE HERSCHEL-BULKLEY, COM FUNDO PERMEÁVEL (M2FP) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 3.4.1 Condições de contorno do problema . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 3.4.2 Perfil de velocidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 3.4.3 Perfil de velocidade média . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 3.4.4 Verificação de soluções “menos complexas” . . . . . . . . . . . . . 50 3.4.5 Determinação da taxa de deformação . . . . . . . . . . . . . . . . 52 3.4.6 Obtenção da expressão da tensão de cisalhamento . . . . . . . . 52 3.4.7 Equações do modelo matemático, processos de promediação e adimensionalização . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 3.4.8 A equação da roll wave . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 3.4.9 A celeridade da roll wave . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 3.4.10 Determinação do número de Froude mínimo . . . . . . . . . . . . 56 3.5 MODELO NUMÉRICO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 3.5.1 MATLAB® . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 3.5.2 Procedimento numérico para o modelo geral . . . . . . . . . . . . 59 3.5.3 Fluent® . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60 3.6 DESENVOLVIMENTO DOS RESULTADOS . . . . . . . . . . . . . . . 61 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 4.1 MODELO MATEMÁTICO CLÁSSICO DE ROLL WAVES EM ÁGUA - MODELO 1 (M1) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 4.1.1 Comparação de resultado entre Modelo 1, resultados experi- mentais de Brock (1969) e Fluent® . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 4.1.2 Tensão de cisalhamento máxima em fundo de canais . . . . . . . 63 4.1.3 Estudo de caso: o transporte de sedimentos a partir do Modelo 1 64 4.2 MODELO MATEMÁTICO DO GRUPO RMVP: ROLL WAVES EM FLUIDOS DE HERSCHEL-BULKLEY, COM FUNDO IMPERMEÁ- VEL (M2FI) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 66 4.2.1 Análise da tensão de cisalhamento no fundo . . . . . . . . . . . . 66 4.2.2 Confrontação de resultados entre o Modelo 2 - com fundo impermeável (M2FI), simulação com o Fluent® e experimento em canal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 4.3 MODELO MATEMÁTICO: AS ROLL WAVES EM FLUIDOS DE HERSCHEL-BULKLEY, COM FUNDO PERMEÁVEL (M2FP) . . . . 71 4.3.1 Análise em relação ao número de Froude mínimo . . . . . . . . . 72 4.3.2 Análise com relação aos parâmetros de roll waves . . . . . . . . 73 4.3.3 Estudos de caso em função do número de Froude, tensão limite de escoamento e fator de porosidade. . . . . . . . . . . . . . . . . 77 4.3.4 Uma análise mais aprofundada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82 4.3.5 Tensão de cisalhamento no fundo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS E PERSPECTIVAS FUTURAS 93 5.1 CONSIDERAÇÕES FINAIS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 5.1.1 Modelos com fundo impermeável . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 5.1.2 Modelo com fundo permeável/poroso . . . . . . . . . . . . . . . . 94 5.1.3 Vantagens e desvantagens dos modelos implementados . . . . . 95 5.2 SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS . . . . . . . . . . . . . 95 5.3 PRODUÇÃO CIENTíFICA E TÉCNICA . . . . . . . . . . . . . . . . . 96 REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 97 ANEXOS 103 ANEXO A – REOLOGIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 105 APÊNDICES 110 APÊNDICE A – DESENVOLVIMENTO ALGÉBRICO - ES- TABILIDADE LINEAR . . . . . . . . . . . . 112 APÊNDICE B – RESULTADOS E DISCUSSÕES COMPLE- MENTARES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117 18 1 INTRODUÇÃO Ao longo dos anos, o meio ambiente vem sofrendo transformações como resultado de mudanças climáticas e ações antrópicas. Se muitas das ações antrópicas são profícuas e trazem benefícios ao homem e ao habitat, outras são indevidas, quando não, desastrosas1. Ações antrópicas equivocadas e persistentes produzem sobre o meio, no médio e longo prazo, vulnerabilidades de ordens diversas que, somadas a ações de diversos agentes da natureza, potencializam riscos, gerando catástrofes. No Brasil, os principais fenômenos relacionados a Desastres “Naturais”, são derivados da dinâmica externa da Terra, tais como, inundações/enchentes, escorregamentos de solos e/ou rochas, tempestades e secas prolongadas. Segundo dados do Centre for Research on the Epidemiology of Disasters - CRED (2018), considerando o período de 1900 a 2018 e, apenas os desastres hidrológicos (inundações, enchentes e movimentos de massa), o Brasil ocupa o quinto lugar em ocorrência, com mais de 9 mil mortes e mais de 24 milhões de afetados, estando entre os dez primeiros no mundo em números de vítimas. Dentre estes tipos de desastres, os que ganham mais destaque, na região Sul e Sudeste do país, são as corridas de lama ao longo das encostas, que ocorrem após chuvas intensas (GUIDICINI; NIEBLE, 1984). Ao traçar uma linha cronológica dos grandes Desastres “Naturais” no Brasil devido às corridas de lamas, pode-se destacar o evento ocorrido em Caraguatatuba/SP, em 1967, um dos mais antigos registrados, com cerca de 500 mortes e perdas significativas (REBELLO et al., 2012). Apesar de outros eventos semelhantes terem ocorrido, como os de Timbé do Sul/SC (1995), Região de Blumenau/SC (2008) e Angra dos Reis/RJ (2010), o de Caraguatatuba/SP foi considerado um dos mais catastróficos, até 2011, quando a Região Serrana do Rio de Janeiro foi protagonista de mais uma catástrofe. O acidente na Região Serrana do Rio Janeiro (Figura 1), segundo observadores e estudiosos, foi resultado da convolução de três fatores: a ação meteorológica da Zona de Convergência do Atlântico Sul - ZCAS, a topografia acidentada com uma fina camada de solo saturado (devido a chuvas intensas que ocorreram momentos antes, de 200 a 300 mm em poucas horas) e, por último, concomitantemente, a ocupação desordenada do espaço e ações antrópicas errôneas. De acordo com balanço divulgado pela Defesa Civil Estadual do Rio de Janeiro, em 28 de janeiro de 2011, havia 8.777 pessoas desabrigadas, mais de 20 mil desalojadas, 950 mortos 1 quando faz-se alusão à produção social de Riscos (CARMO; VALENCIO, 2014) Capítulo 1. Introdução 19 e mais de 430 desaparecidas (GUIDUGLI et al., 2012). Na mesma direção, porém por total ausência de governança, tem-se o acidente ocorrido em Mariana (Bento Rodrigues), em novembro de 2015, quando do rompimento da barragem de rejeito de mineração de Fundão, que mesmo com número de mortes reduzido (19 óbitos), foi considerado um mega desastre por causa dos impactos ambientais devastadores na biota de todo vale do Rio Doce e consequente alteração do modo de vida de cerca de um milhão de pessoas (MORGENSTERN et al., 2016). Figura 1 – Cidade de Teresópolis, após deslizamentos de terra e corridas de lama em 2011. Fonte: Motta (2011). A respeito de políticas ambientais preventivas, a história tem demonstrado um padrão, isto é, para que haja mobilização, primeiro é necessário a ocorrência de grandes desastres ambientais com graves consequências e perdas de vidas humanas para, depois, buscar soluções (POTT; ESTRELA, 2017). De qualquer forma, assiste-se a uma mudança de paradigma, graças à implementação de Políticas Públicas Ambientais, com questionamentos mais amplos acerca dos Desastres “Naturais”. No Brasil, encontrou-se, em termos de ação governamental, após episódio de 2011 na Região Serrana do Rio de Janeiro, um Capítulo 1. Introdução 20 primeiro projeto promissor, o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento de Alerta de Desastres Naturais), agência federal criada com o intuito de emitir alertas sobre a ocorrência de eventuais desastres em locais que podem colocar a vida das pessoas em risco. Compete ao Cemaden o desenvolvimento de pesquisas que auxiliem nas ações de mitigação e prevenção de Desastres “Naturais”, como modelos de previsão de eventos extremos e mudanças climáticas (PIVETTA, 2016). Ademais, parcerias internacionais têm sido criadas, como o projeto Gestão Integrada de Riscos em Desastres Naturais (Gides), parceria entre a Agência Brasileira de Cooperação (ABC) e a Agência de Cooperação Internacional do Japão (Jica), no intuito de formular estratégias, avaliar riscos, bem como recuperar e reconstruir áreas afetadas, tendo como projeto inicial o município de Blumenau que sofre, frequentemente, as consequências destes tipos de desastres (COMPANHIA DE PESQUISA DE RECURSOS MINERAIS - CPRM, 2018). Por fim, mesmo com políticas ambientais e prevencionistas, observa-se que muitas das medidas utilizadas pelo poder público têm surtido pouco efeito. Deve-se, portanto, repensar um modelo de gestão e nas medidas de prevenção que devem ser aplicadas, de maneira a incorporar a cultura do risco e romper, por definitivo, o paradigma da tragédia anunciada. Dentro desta perspectiva, necessita-se fomentar ações integradas e multidisciplinares entre as Ciências Sociais, Exatas e de Engenharias, buscando trabalhar de forma mais colaborativa por uma engenharia social (humana). Na contexto de Engenharia, as corridas de lama produzidas nos episódios supracitados apresentam, via de regra, matriz e reologia complexas, com presença de material argiloso e outros materiais de granulometria estendida, e com larga faixa de concentrações em volume (10% < 𝐶𝑣 < 60%) conforme Coussot (1994), Maciel et al. (2009). Tais corridas, além de apresentarem frentes com potencial energético destrutivo, geralmente apresentam capacidade erosiva significativa com elevada produção de sedimentos. Ademais, durante a evolução dessas corridas, outros fenômenos agravantes podem ocorrer, como por exemplo, o surgimento de instabilidades na superfície livre que, em condições favoráveis de vazão e inclinação dos corredores de deslizamento, se propagam em forma de frentes de ondas, com formas e velocidade de propagação características, conhecidas na literatura como roll waves ou “ondas de rolo”. Apesar de surgirem mais frequentemente em canais artificiais (Figura 2), não é raro encontrá-las em ambientes naturais, tais como em rios, vertedouros e barragens, deslizamentos de encostas, corridas de lama e detritos (mudflows, debris flow), avalanchas, etc. Embora não exista no Brasil registro da presença do fenômeno roll waves, comprovado por meio de medições em encostas ou talvegues naturais, em outros países, como Nova Zelândia, China, Suíça e Itália foram confirmados o surgimento de frentes e trens de ondas desse tipo em escoamentos de detritos e/ou lamosos (FERREIRA, 2013). Vários registros em bacias de drenagem, como em Acquabona, na Itália, Barcelonnette, nos Alpes Franceses (França/Itália), etc., têm oferecido possibilidade de exploração de Capítulo 1. Introdução 21 Figura 2 – Exemplos de aparecimento de roll waves em canais artificiais. (a) Roll waves em escoamentos lamosos, canal na França; (b) Roll waves em água, no canal de Merligen, Suíça; (c) Instabilidades de superfície livre em fluido não-Newtoniano; (d) Roll waves em gel de carbopol em rampa experimental. (a) (b) (c) (d) Fonte: (a) Acervo Digital - Grupo RMVP; (b) Cornish (1934); (c) Chanson et al. (2006), citado por FIOROT (2016); (d) Acervo Digital - Grupo RMVP. dados do fenômeno. Em Acquabona, uma bacia de drenagem com canal de 1300 m dispõe de registros (profundidades, velocidades) de escoamentos com presença de frentes de ondas e transporte significativo de detritos, conforme Figura 3 (BERTI et al., 1999; BERTI et al., 2000). A presença de roll waves, seja em canais naturais ou artificiais além de ocasionar transbordamentos e carreamento de detritos, o fenômeno pode causar sérios prejuízos econômicos e sociais, caso atinjam ambientes com presença de infraestrutura civil vulnerável e população. Por isso, conhecer as condições de geração destas ondas é de suma importância para definir os domínios de interesse quando da execução de um projeto de infraestrutura civil. Dentre as magnitudes desejadas, a tensão cisalhante exercida pelo escoamento no leito da calha (fundo do canal) representa um parâmetro importante de projeto, relacionado sobretudo à capacidade erosiva do escoamento em transportar sedimentos. No caso das roll waves, a sua influência no transporte de sedimentos ainda não é bem compreendida, porém estudos experimentais e numéricos vêm tentando descrever tal dinâ- Capítulo 1. Introdução 22 Figura 3 – Registro de monitoramento de profundidade de escoamento, em Acquabona, com a presença do fenômeno roll wave após tempestade de 17 de agosto de 1998. Fonte: Berti et al. (2000). mica (ARMANINI; RECCHIA, 2006; ZHAO et al., 2015; EDWARDS; GRAY, 2015). A conclusão lógica é que deve existir uma interação física entre roll waves e transporte de sedimentos, assunto que constitui, ainda, lacuna na literatura. Em se tratando das propriedades cinemáticas e dinâmicas das roll waves, os modelos matemáticos e numéricos têm, majoritariamente, fornecido amplitude, comprimento e velocidade de propagação dessas ondas (MACIEL, 2001; ZANUTTIGH; LAMBERTI, 2007; MACIEL et al., 2013; DI CRISTO et al., 2015). No entanto, ainda existem poucos trabalhos na literatura que tratam da tensão de cisalhamento no fundo ao longo do comprimento da roll wave eventualmente presente nas corridas de lama, seja em regimes laminares ou turbulentos. Assim, o parâmetro tensão de cisalhamento no fundo reportada à tensão de cisalhamento do escoamento base (regime uniforme) passa a ser a chave de discussão acerca da maior ou menor capacidade erosiva do fenômeno. Dentro deste contexto, o Grupo RMVP2 tem buscado integrar diferentes formações, para agregar valores, no contexto de Desastres “Naturais” e corridas de lama, desenvolvendo trabalhos, de natureza teórica, física e numérica, na busca de identificar propriedades reométricas de materiais hiperconcentrados, como, por exemplo, mistura de água e argila; água, areia, argila (MACIEL et al., 2009), com aplicação em problemas tipo ruptura de barragem de rejeito (MINUSSI, 2007; LEITE, 2009) e, ainda, formação de instabilidades na superfície livre de escoamentos hiperconcentrados e lamas (FERREIRA, 2007; FERREIRA, 2013; CUNHA, 2013). 2 Reologia de Materiais Viscosos e Viscoplásticos – Grupo de pesquisa certificado no CNPq Capítulo 1. Introdução 23 1.1 OBJETIVOS O objetivo principal desta dissertação é estudar a tensão de cisalhamento no fundo, em presença de regimes pulsantes (roll waves), para escoamentos de fluidos Newtonianos e não-Newtonianos3. Para isto foram propostos os seguintes objetivos específicos: • Compreender, inicialmente, os mecanismos de geração das roll waves e suas propriedades (altura de onda, comprimento, celeridade), e a ação da tensão de cisalhamento exercida pelo escoamento pulsante no leito da calha ou fundo do canal tanto para escoamentos de fluidos Newtonianos quanto para fluidos não-Newtonianos; • Reproduzir os procedimentos matemáticos apresentados por Dressler (1949) e obtenção de um sistema de equações (conservação da massa, quantidade de movimento) sob hipóteses de águas rasas, fluido invíscido, e efeito de parede do tipo Chézy-Manning-Strickler, cuja solução do sistema de equações resultou na equação das roll waves; • Implementar o modelo matemático obtido em MATLAB®; • Realizar análises de comprimento de onda, amplitudes de ondas e critério de energia, conforme Dressler (1949). • Comparar com resultados da literatura (BROCK, 1969; LIU et al., 2005), simulação com o software Fluent®, e com resultados experimentais do Grupo RMVP; • Determinar a taxa de tensão de cisalhamento no fundo com relação ao cisalhamento do escoamento base (sem roll waves), como função do número de Froude; • Implementar o cálculo da tensão de cisalhamento no fundo no modelo numérico do Grupo RMVP; • Realizar simulações numéricas a respeito do comportamento da tensão de cisalha- mento de fundo em relação ao número de Froude e parâmetros reológicos. • Obter a equação da roll wave, a partir das equações de Cauchy com o modelo reológico de Herschel-Bulkley com condição de fundo permeável; • Implementar, numericamente, as equações da roll wave para fluidos do tipo Herschel- Bulkley com condição de fundo permeável; • Determinar a influência do fator porosidade nas características das roll waves (amplitude, celeridade e comprimento de onda); • Realizar análises da tensão de cisalhamento no fundo considerando o fundo permeável; 3 no Anexo A é apresentado terminologia básica e de forma simplificada os principais modelos reológicos Capítulo 1. Introdução 24 • Comparar os modelos (com e sem porosidade) com relação à tensão de cisalhamento do fundo. 1.2 ESTRUTURAÇÃO DA DISSERTAÇÃO Esta dissertação é composta por cinco Capítulos: Introdução; Estado da Arte; Modelos Matemáticos e Numéricos; Resultados e Discussões; Considerações Finais e Perspectivas Futuras. Ao final são apresentados as Referências Bibliográficas e Apêndices. No Capítulo 1 (Introdução) foram apresentadas as motivações e justificativa da pesquisa, no contexto de Riscos e Catástrofes “Naturais” (corridas de lama), bem como os objetivos. O Capítulo 2 trata do estado da arte e a contribuição deste trabalho para o entendimento de roll waves evoluindo em superfície livre de fluidos Newtonianos (água limpa) e não-Newtonianos (misturas hiperconcentradas, lamas), com foco nos efeitos destas ondas na tensão de cisalhamento no fundo de canais. O Capítulo 3 apresenta a metodologia desenvolvida, e este foi dividido em cinco partes: em um primeiro momento é apresentado a formulação “global” da fenomenologia roll waves, abordando as equações governantes, as hipóteses e as condições de contorno “globais”. Em seguida, são desenvolvidas as especificidades de cada modelo, qual seja, o escoamento de água em uma formulação da hidráulica clássica (fluido invíscido e lei de atrito de parede), escoamento em fluidos de Herschel-Bulkley, com fundo impermeável e, por fim, escoamento em fluidos de Herschel-Bulkley, com fundo permeável. Neste último modelo, além do desenvolvimento matemático, é realizada uma análise de estabilidade linear para determinação de um critério de geração de roll wave. Em seguida, é apresentado o modelo numérico implementado em MATLAB® para obtenção dos resultados, bem como a descrição da modelagem utilizada no Fluent®. No Capítulo 4 são apresentados os resultados obtidos ao longo do desenvolvimento deste Mestrado, quais sejam: análises comparativas entre modelos acerca da tensão de cisalhamento no fundo, comparação entre modelos numéricos e experimentais, bem como análise da influência do fator de porosidade nas propriedades de roll waves. No Capítulo 5 são realizadas as considerações finais acerca dos modelos desenvolvi- dos, retomando os resultados mais relevantes. São tratadas, ainda, as perspectivas para trabalhos futuros, bem como a produção bibliográfica e produção técnica desenvolvida ao longo do Mestrado. 25 2 ESTADO DA ARTE 2.1 ROLL WAVES A primeira observação registrada do fenômeno roll waves foi realizada por Cornish (1934), no canal de Merligen, Suíça, na qual foi possível verificar a natureza periódica das ondas, a forma de suas frentes, com cristas bem íngremes, quase verticais. Desde o relato de Cornish (1934), o fenômeno tem despertado interesse da comunidade científica, principalmente por se tratar de um assunto multidisciplinar. De plano, o estudo de roll waves tem se desenvolvido nas vertentes matemática, numérica e experimental, cujas características estão atreladas ao tipo de fluido (Newtoniano ou não-Newtoniano) e a geometria do problema. Jeffreys (1925) foi o primeiro a estabelecer um critério de formação de roll waves, relacionado ao número de Froude (𝐹𝑟), partindo da formulação de águas rasas e considerando um escoamento de fluido invíscido (𝜇 = 0). O autor determinou que quando 𝐹𝑟 > 2, o escoamento seria favorável ao aparecimento de instabilidades. Mais tarde, buscando quantificar o fenômeno, Dressler (1949), partindo também da hipótese de fluido invíscido, construiu o perfil de roll waves como um trem de ondas, interconectando a solução obtida (contínua por partes) através de choques (condições de choque de Rankine-Hugoniot). Este trabalho tem grande contribuição dentro do plano teórico, já que o método utilizado é aplicado até hoje por diversos pesquisadores, tanto para escoamentos turbulentos quanto laminares, como para diversos modelos reológicos. Vale destacar que o método utilizado nesta dissertação é baseado na formulação de Dressler (1949). Estendendo o estudo de Dressler (1949), Needham e Merkin (1984) introduziram efeitos difusivos ao equacionamento (𝜇 ̸= 0), regularizaram os choques e provaram a existência de soluções suaves, com derivadas contínuas para o problema, permitindo observar o comprimento da onda gerada, sem alterar as condições de estabilidade do mesmo. Kranenburg (1992) revalidou, numericamente, os critérios de geração estabelecidos anteriormente, e verificou que roll waves periódicas são instáveis para pertubações sub- harmônicas, isto é, quando há pertubações no escoamento de comprimentos variados, as Capítulo 2. Estado da Arte 26 roll waves com o maior comprimento são predominantes. Na vertente experimental, Brock (1969) foi o primeiro a realizar diversas medições de amplitude e celeridade de roll waves, em um canal de aproximadamente 20 cm de largura e 40 m de comprimento, utilizando técnicas intrusivas de medições (sensor de pressão). O autor verificou que as roll waves não eram geradas quando 𝐹𝑟 < 2, corroborando o estudo de Jeffreys (1925), porém nem sempre eram observadas no domínio favorável (𝐹𝑟 > 2). Seguindo esta vertente, alguns trabalhos trazem aparatos experimentais para medições e verificação de ocorrência de roll waves tanto para fluidos Newtonianos quanto para fluidos não-Newtonianos (LIU; GOLLUB, 1994; COUSSOT, 1994; FIOROT, 2012; CUNHA, 2013; YANG et al., 2017). Retomando o plano teórico e numérico, Ishihara et al. (1954) expandiram o problema de roll waves para escoamentos Newtonianos e em regime laminar, trazendo análises de estabilidades lineares e critérios de geração relacionados ao número de Froude (𝐹𝑟 > 1/ √ 3). Utilizando-se dos modelos desenvolvidos por Dressler (1949) e Needham e Merkin (1984), Hwang e Chang (1987) desenvolveram análises utilizando teoria de singularidade dinâmica e verificaram numericamente a formação de roll waves, evidenciando particularidades do problema, como bifurcações tipo Hopf, e existência de outras “famílias” de roll waves. Balmforth e Mandre (2004) exploraram o efeito topográfico no fundo do canal, e trouxeram análises da estabilidade linear e dinâmica do problema, concluindo que o efeito topográfico é um fator de condição para geração e propagação de roll waves. Liu et al. (2005) puseram em questão a capacidade erosiva do fenômeno de roll waves em relação ao escoamento base, no entanto realizaram uma formulação matemática de roll waves baseada apenas na hidráulica clássica (fluido invíscido e atrito de fundo). Mais recentemente, Huang e Lee (2015) realizaram uma modelagem numérica considerando termo difusivo e viscosidade turbulenta tipo Colebrook-White para o fundo, comparando os resultados com os dados experimentais de Brock (1969). Aqueles autores concluíram que os efeitos difusivos melhoravam quantitativamente as análises comparativas (numérica versus experimental). Entretanto, os resultados qualitativos foram, fortemente dependentes dos valores da viscosidade turbulenta, que de fato devem ser calibrados. Com o mesmo princípio de reproduzir os dados experimentais de Brock (1969), Cao et al. (2015) propuseram um modelo hidrodinâmico de águas rasas, incorporando o tensor turbulento de Reynolds com um modelo 𝑘− 𝜖, e a formulação de Chézy; os autores utilizaram o conceito de enstrofia introduzido por Richard e Gavrilyuk (2012), que representa a dispersão/difusão devido à não-uniformidade da distribuição da componente longitudinal da velocidade na vertical. Campomaggiore et al. (2016b) ressaltaram que o processo de desenvolvimento Capítulo 2. Estado da Arte 27 (geração e propagação) de roll waves deve ser totalmente compreendido apenas por meio de simulações totalmente não-lineares das equações governantes, uma vez que, conforme as pertubações do escoamento crescem, as interações não-lineares tornam-se significantes. Ademais, pode-se observar que os trabalhos têm apresentado, nos últimos anos, além das análises de estabilidade linear e não-linear, o que chamam de estabilidade espectral, que é uma complementação de análise não-linear (BARKER, 2014; RODRIGUES; ZUMBRUN, 2016; BARKER et al., 2017; JOHNSON et al., 2018). Assim posto, o trabalho de Johnson et al. (2018) trouxe um estudo sistemático analítico e numérico da estabilidade espectral para roll waves considerando fluido invíscido (𝜇 = 0). Barker et al. (2017) aplicaram procedimentos análogos aos Johnson et al. (2018) para realizar a análise do modelo, considerando a viscosidade, para que este fosse capaz de fornecer resultados mais realísticos no intuito de realizar comparações com eventos físicos naturais e desenvolvidos em laboratório. No que diz a respeito à modelagem de roll waves em fluidos não-Newtonianos, em regime laminar, muitos são os trabalhos que desenvolveram métodos analíticos, numéricos e experimentais para abordar o problema. Ng e Mei (1994), utilizando um modelo tipo power law, em regime laminar, estabeleceram um critério de estabilidade relacionado ao número de Froude (𝐹𝑟 > 𝑛/ √︁ (2𝑛+ 1), em que 𝑛 é o índice de escoamento do fluido), e trazem além do perfil de onda, o perfil da velocidade média do escoamento e da tensão de cisalhamento no fundo (Figura 4). Paralelamente, Liu e Mei (1994) estudaram numericamente a evolução de roll waves em escoamento de fluido Binghamiano. Maciel (2001), utilizando-se de uma proposta binghamiana, e considerando os efeitos difusivos, obteve soluções contínuas para o perfil de roll waves, e determinou as condições de existência e estabilidade. Na tentativa de melhor representar os escoamentos lamosos, pesquisadores têm verificado que suspensões argilosas e hiperconcentradas obedecem, de uma maneira geral, ao modelo reológico não-linear viscoplástico do tipo Herschel-Bulkley (COUSSOT, 1994; PIAU, 1996; HUANG; GARCÍA, 1998) para as quais uma proposta Binghamiana torna-se um caso particular, não obstante, às vezes interessante e conveniente em certas aplicações da engenharia (MACIEL, 2001). Assim, Ferreira (2007) propôs representar o fenômeno de roll waves por meio de um modelo matemático de primeira ordem, a partir das equações de Cauchy, considerando o fluido tipo Herschel-Bulkley. Neste trabalho, uma análise de estabilidade linear temporal foi desenvolvida, conduzindo à identificação da condição de existência de roll waves, permitindo análises não apenas de fluidos Herschel-Bulkley como também de seus casos particulares (power law e Binghamiano). Pascal (2006), retomando o trabalho proposto por Ng e Mei (1994), propôs um modelo matemático considerando o fluido tipo power law em um fundo permeável, no Capítulo 2. Estado da Arte 28 Figura 4 – Perfil das “mínimas” roll waves, isto é, a menor amplitude, celeridade e comprimento de onda, obtidas por Ng e Mei (1994) para 3 casos de número de Froude, quais sejam: 𝐹𝑟 → ∞ ( ), 𝐹𝑟 = 1 ( ) e 𝐹𝑟 = √ 2 ( ). Sendo ℎ (𝜉): lâmina do escoamento, 𝑢 (𝜉): velocidade média e 𝜏𝑏 (𝜉): tensão de cisalhamento no fundo. Fonte: Ng e Mei (1994). intuito de modelar os escoamentos que geralmente ocorrem na natureza. Nas condições de contorno, o autor apresentou a compatibilização de velocidades entre a interface fluido-fundo e realizou as análises de estabilidade para o modelo. Nos últimos anos, percebe-se uma tendência na literatura científica de produzir trabalhos que buscam: validar modelos, tanto matemáticos quanto numéricos, em comparação a resultados experimentais e de eventos reais (ainda escassos), no interesse de predizer as propriedades de roll waves incidindo sobre obras de infraestrutura (ANCEY, 2007; ZANUTTIGH; LAMBERTI, 2007; FERREIRA, 2013); aperfeiçoar modelos representativos do fenômeno, tanto em escoamentos de água quanto de fluidos lamosos (não-Newtonianos), seja introduzindo condições iniciais não-uniformes (DI CRISTO et al., 2015; CAMPOMAGGIORE et al., 2016a) ou buscando critérios de geração e de estabilidade (DI CRISTO et al., 2013; FERREIRA et al., 2014). A título de exemplo, o Grupo RMVP tem buscado, a partir de modelos matemáticos simplificados, reproduzir eventos registrados de corridas de lamas e detritos (BERTI et al., 1999; BERTI et al., 2000; ZANUTTIGH; LAMBERTI, 2007), como aquele realizado quando do estudo do evento ocorrido em Acquabona, Itália (FIOROT et al., 2014; FIOROT et al., no prelo). Capítulo 2. Estado da Arte 29 2.2 TRANSPORTE DE SEDIMENTOS O assunto transporte de sedimentos tem sido estudado amplamente em diversas áreas de interesse, como na geologia, geomorfologia, engenharia ambiental, hidráulica, e engenharia costeira, etc., tendo como processos principais a erosão, transporte e deposição de material, cujo movimento de partículas sólidas (coesivas e não-coesivas) ocorre, geralmente, devido à ação da gravidade e/ou ao movimento do fluido. De acordo com a tensão de cisalhamento imposta pelo escoamento nas partículas do fundo de canal, ou mais precisamente o atrito no fundo, o escoamento é capaz de superar o estado estático das partículas e, então, transportar o material. A relação entre a energia cinética disponível no escoamento e a energia potencial de sedimentos é dado pelo número de Shields (𝑆ℎ), que correlaciona tensão de cisalhamento no fundo, massa específica da água, massa específica do material, diâmetro característico, e ação gravitacional (SHIELDS, 1936). Para o transporte, o número de Shields (𝑆ℎ) deve ser superior a um valor limite, o Shields crítico (PAPHITIS,2001 citado por FIOROT, 2016). 2.3 ROLL WAVES E O TRANSPORTE DE SEDIMENTOS A justaposição do assunto roll waves com transporte de sedimentos é ainda bem restrita na literatura. Entre os poucos trabalhos existentes, Colombini e Stocchino (2005) verificaram (Figura 5), numericamente, a coexistência de roll waves desenvolvidas em água e a formação de antidunas quando 𝐹𝑟 > 2. Figura 5 – Exemplo de estudo, relacionando roll waves e transporte de sedimentos (região hachurada). Fonte: Adaptado de Colombini e Stocchino (2005). Capítulo 2. Estado da Arte 30 Em trabalhos experimentais, Armanini e Recchia (2006) perceberam que as roll waves mudavam consideravelmente a dinâmica do transporte de sedimentos e que a alteração da geometria de fundo, com a formação de antidunas, influenciava na geração e propagação das próprias. Zhao et al. (2015) investigaram a influência da concentração de sedimentos (em suspensão/mistura) nas características das roll waves. A partir de suas observações, concluíram que sedimentos em suspensões poderiam inibir a formação de roll waves e diminuir a probabilidade de erosão/sedimentação do solo causada por roll waves, já que verificaram que as roll waves não permanecem periodicamente estáveis quando da presença de sedimentos em suspensão. Os autores observaram também que, frequentemente, há o “engolimento” da onda mais lenta pela mais rápida, além disso, o comprimento para desenvolvimento das roll waves (critério de Montuori) e o comprimento de onda são diretamente proporcionais à concentração de sedimentos, enquanto que a velocidade e a frequência são inversamente proporcionais. Ainda na vertente experimental, Edwards e Gray (2015) verificaram ondas de “erosão-deposição” em um escoamento granular, fenomenologia que inicialmente é semelhante a roll waves (Figura 6), mas quando analisadas separadamente parecem frentes de avalanchas granulares se propagando em um fundo erodível. Os autores também descreveram, matematicamente, o fenômeno, e determinaram uma equação diferencial de segunda ordem semelhante à solução encontrada para roll waves, porém a velocidade média do escoamento é zero, quando a profundidade é igual a espessura granular depositada (ℎ = ℎ+), como pode ser visto na Figura 7, chegando à conclusão que tal modelagem representa bem o comportamento observado, entretanto o modelo não pode ser aplicado para fundos de topografia variável. Recentemente, Fiorot (2016), buscando compreender a relação entre instabilidades de superfície livre e o transporte de sedimentos utilizou, experimentalmente, um sistema PIV (Particle Image Velocimetry) de medição e quantificou o transporte de sedimentos em presenças de instabilidades do tipo roll waves (apesar de não tê-las medido). O autor conclui que a presença de ondas não alterou significativamente o transporte médio de sedimentos, ainda que suas flutuações tenham sido observadas e registradas. Apesar dos avanços na temática, há lacunas na literatura, principalmente, quando trata-se de escoamentos não-Newtonianos, uma vez que o entendimento sobre os mecanismos de erosão/deposição nestes meios são, ainda, menos compreendidos do que para escoamentos de água (LEFEBVRE et al., 2016). Assim exposto, buscando culminar com um modelo mais representativo do fenômeno natural, buscou-se, nesta dissertação, inserir um parâmetro para representar a porosidade no fundo no modelo de roll waves, que vem sendo desenvolvido pelo Grupo RMVP. Capítulo 2. Estado da Arte 31 Figura 6 – Perfil no espaço (𝑧) x tempo (𝑡), de partículas de SiC (carbeto de silício) obtidos a partir de imagens de uma câmera posicionada na lateral da rampa experimental alinhada com a inclinação da mesma. O eixo vertical é a espessura do escoamento livre e no eixo horizontal o tempo de experimento para um período de 4 segundos em (a) e 2 segundos em (b). A linhas preta representa a posição do fundo rugoso em relação ao fluxo. As linhas horizontais representam partículas depositadas. Fonte: Edwards e Gray (2015). Figura 7 – Esquema indicando duas possíveis representações de ondas granulares de erosão/deposição em uma plano inclinado em 𝜁 com a horizontal. O material em repouso está hachurado em cinza, a espessura do escoamento, normal à direção 𝑧 é considerado em (a) a altura ℎ(𝑥, 𝑡) das partículas entre a superfície livre 𝑠(𝑥, 𝑡) e a base da onda granular em 𝑧 = 𝑏(𝑥, 𝑡), ou (b) a profundidade ℎ(𝑥, 𝑡) entre a superfície livre e o fundo. O perfil típico de velocidade 𝑢(𝑥, 𝑡) ao longo da profundidade é representado. A solução da onda considera que esta se move com velocidade contante 𝑢𝑤, e erode uma camada estática de sedimentos de espessura ℎ+ a sua frente, depositando a mesma espessura atrás. Fonte: Edwards e Gray (2015). 32 3 METODOLOGIA O problema roll wave, tratado nesta dissertação, de cunho matemático e numérico, tem como objetivo principal analisar as tensões de cisalhamento no fundo de canais que modificariam o processo de erosão, transporte e deposição de sedimentos. Para isto, foram propostas duas vertentes. Na primeira vertente, estudou-se o fenômeno em escoamento de água limpa (fluido Newtoniano), partindo-se de uma modelagem da hidráulica clássica, considerando fluido invíscido e termos de fricção tipo Chézy-Manning-Strickler, o qual foi nomeado de Modelo 1 (DRESSLER, 1949). Na segunda vertente, estudou-se o fenômeno em situação de escoamento de fluido não-Newtoniano, em regime laminar, nomeado de Modelo 2. Nesta vertente foram conside- radas duas situações: na primeira situação, partiu-se da hipótese de fundo impermeável/não- poroso, conforme trabalhos anteriores do Grupo RMVP (MACIEL et al., 2013); na segunda situação, grande contribuição deste trabalho, estudou-se a evolução de roll waves com condição de fundo permeável. Os problemas abordados nas duas vertentes têm o mesmo princípio de modelagem, divergindo-se em alguns pontos, como regime de escoamento, propriedades reológicas do fluido, e permeabilidade de fundo. Propõe-se, portanto, um esquema geral para modelagem do problema, visando melhor esclarecer o conteúdo do Capítulo. As principais equações e cálculos específicos de cada caso são apresentadas nas respectivas seções, ou são referenciadas. Assim exposto, este Capítulo é dividido em seis partes, quais sejam: • na seção 3.1 é apresentada a forma global do problema: principais equações, passos de cálculo, principais incógnitas; • na seção 3.2, trata-se do Modelo 1, hipóteses particulares e respectivas equações constitutivas; • nas seções 3.3 e 3.4, apresenta-se o Modelo 2 com fundo impermeável e fundo permeável, respectivamente; Capítulo 3. Metodologia 33 • a seção 3.5 trata do modelo numérico, das funções utilizadas, bem como do procedimento numérico; • por fim, na seção 3.6 são apresentados os meios para desenvolvimento dos resultados. 3.1 MODELO GERAL No processo de modelagem de roll waves devem-se estabelecer as boas hipóteses, explicitar um modelo matemático adequado para representar o fenômeno, o modelo reológico mais representativo do fluido escoante, assim como as condições de contorno adequadas ao problema. O esquema geral do problema é representado pela Figura 8, e apresenta as seguintes hipóteses: Figura 8 – Esquema geral para representação do escoamento. Na qual 𝑥 é a coordenada na direção longitudinal do canal, 𝑧 a coordenada na direção longitudinal do canal, ℎ a profundidade do escoamento, ℎ1 a profundidade referente à “cava” da onda (lâmina baixa), ℎ2 a profundidade referente à “crista” da onda (lâmina alta), 𝑈 a celeridade da onda, 𝜆 o comprimento de onda, 𝑔 a aceleração da gravidade, 𝑢 a componente da velocidade na direção 𝑥, 𝑤 a componente da velocidade em 𝑧, 𝜃 a inclinação do canal. Fonte: Próprio autor. • fluido homogêneo e incompressível, portanto, massa específica (𝜌) é constante; • escoamento ocorre sobre um fundo inclinado com ângulo 𝜃 em relação à horizontal, e se dá pela ação da gravidade 𝑔; • condições de águas rasas, isto é, profundidade do escoamento (ℎ) muito menor que o comprimento longitudinal característico (𝐿), e que a largura do canal (𝑙); Capítulo 3. Metodologia 34 • modelo bidimensional (𝑥, 𝑧), de um fluido de natureza qualquer, com campo de velocidade �⃗� = (𝑢,𝑤) e pressão total 𝑃 ; Após hipóteses estabelecidas, determinaram-se as condições de contorno gerais, quais sejam: condição cinemática na superfície livre: 𝑤 = 𝜕ℎ 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕ℎ 𝜕𝑥 , para 𝑧 = ℎ(𝑥, 𝑡) (1) tensões na superfície livre: 𝑃 = 0 , 𝜏𝑥𝑧 = 0 para 𝑧 = ℎ(𝑥, 𝑡) (2) Em que 𝜏𝑥𝑧 é a tensão de cisalhamento atuando na direção 𝑥 devido a um gradiente em 𝑧, e 𝑡 é o tempo. Assim, a partir do esquema do problema, hipóteses e condições de contornos determinadas, parte-se para o modelo matemático propriamente dito. Deve-se estabelecer as equações motrizes do fenômeno roll wave, as quais são obtidas a partir do sistema de equações de Cauchy, conservação da massa (Equação 3) e balaço de quantidade de movimento (Equação 4). ∇⃗ · �⃗� = 0 (3) 𝑑�⃗� 𝑑𝑡 = �⃗� 𝑔 − 1 𝜌 ∇⃗𝑃 − �⃗� res (4) Em que 𝑑�⃗�/𝑑𝑡 é a aceleração total, �⃗� 𝑔 a força peso por unidade de massa e �⃗� res as forças resistivas por unidade de massa (forças viscosas e/ou forças de atrito de parede). Dando continuidade à modelagem, foram realizados os seguintes processos ou etapas: 1. Promediação, ao longo da profundidade (ℎ), aplicando as condições de contorno (Equações 1 e 2) nas Equações 3 e 4; 2. Mudança do referencial do sistema de equações obtido para um sistema móvel de coordenadas, que se desloca com a velocidade de propagação da roll wave (celeridade). Assim, por hipótese, tem-se que 𝑥′ = 𝑥− 𝑈𝑡, sendo 𝑈 a velocidade de propagação da roll wave; Capítulo 3. Metodologia 35 3. Adimensionalização das equações nas boas escalas, a saber: • escala de comprimento: 𝑥* = 𝑥/𝐿 e (ℎ*, 𝑧*) = (ℎ, 𝑧) /ℎ0 ; • escala de velocidade: 𝑢* = 𝑢/𝑢0 ; • escala de tempo: 𝑡* = 𝑢0𝑡/𝐿. Com os seguintes adimensionais: • número de Froude: 𝐹𝑟 = 𝑢0/ √︁ 𝑔ℎ0 cos 𝜃; • tensão limite de escoamento adimensional: 𝐶* = 𝜏𝑐/ (𝜌𝑔ℎ0 sen 𝜃) ; • tensão de cisalhamento no fundo adimensional: 𝜏𝑓 * = 𝜏𝑓/ (𝜌𝑔ℎ0 sen 𝜃). No qual ℎ0 é a profundidade do escoamento uniforme, 𝐿 o comprimento característico longitudinal dado por 𝑢2/ (𝑔 sen 𝜃) , 𝑢 a velocidade média na direção 𝑥, 𝜏𝑐 a tensão limite de escoamento e 𝜏𝑓 a tensão de cisalhamento no fundo. O subscrito ( )0 indica condições de escoamento uniforme e o sobrescrito ( )* variável adimensional. Vale ressaltar, que nas seções referentes às equações adimensionais, optou-se pela omissão do sobrescrito para evitar a sobrecarga de notação. 4. Determinação da equação da roll wave, através da resolução do sistema de equações (conservação da massa e quantidade de movimento) no sistema móvel para ℎ, eliminando-se a variável 𝑢. A solução assim, obtida, a equação da roll wave, é uma equação diferencial de primeira ordem que é função da profundidade, parâmetros do escoamento e do fluido, conforme apresentado na Equação 5; 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = 𝑓 (ℎ, 𝜓) ≡ 𝐹 (ℎ) 𝐺 (ℎ) (5) Com 𝜓 parâmetros do escoamento e do fluido. 5. Determinação da expressão da celeridade da onda (𝑈), a partir da equação da roll wave (Equação 5), e da condição de existência de roll waves, qual seja, o numerador e denominador da equação da roll wave devem se anular, conforme demonstrado por Dressler (1949), e detalhado na subseção 3.2.5; 6. Imposição das condições de choque de Rankine-Hugoniot para estabelecer uma relação entre as profundidades ℎ2 e ℎ1, lâmina alta e lâmina baixa respectivamente; 7. Determinação da menor lâmina baixa possível da roll wave, ℎmin, e por consequência o domínio de ℎ1, a partir de análise de fases do numerador e denominador da Equação 5 (FIOROT, 2012). Capítulo 3. Metodologia 36 De maneira simplificada, busca-se: 𝐹 (ℎ) = |𝐹 (ℎ)| 𝑒𝑖𝜋 , para ℎmin < ℎ = ℎ1 < ℎ0 𝐺 (ℎ) = |𝐺 (ℎ)| 𝑒𝑖𝜋 , para ℎ = ℎ1 < ℎ0 𝐹 (ℎ) 𝐺 (ℎ) = |𝐹 (ℎ)| |𝐺 (ℎ)|𝑒 𝑖(𝜋−𝜋) = |𝐹 (ℎ)| |𝐺 (ℎ)| , para ℎmin < ℎ = ℎ1 < ℎ0 Em outras palavras, busca-se a região onde a fase da função 𝐹 (ℎ) seja igual a fase da função 𝐺 (ℎ) ( ∠𝐹 (ℎ) = ∠𝐺 (ℎ)). 8. Cálculo do comprimento de onda 𝜆, conhecida a amplitude de onda Δℎ = ℎ2 − ℎ1; O comprimento de onda é definido a partir da integração do inverso da Equação 5 entre a lâmina baixa (ℎ1) e a lâmina alta (ℎ2) do escoamento, conforme apresentado na Equação 7. 𝜆 = ∫︁ ℎ2 ℎ1 𝐺 (ℎ) 𝐹 (ℎ)𝑑ℎ (7) 9. Determinação do perfil de velocidade média, 𝑢 (𝑥′), utilizando-se da equação da conservação da massa. 10. Determinação da tensão de cisalhamento no fundo (𝜏𝑓 ). O procedimento supracitado tem sido utilizado em referências da literatura (DRESSLER, 1949; NG; MEI, 1994; LIU; MEI, 1994; BALMFORTH; MANDRE, 2004; LIU et al., 2005; PASCAL, 2006; MACIEL et al., 2013) a cerca de roll waves, impondo comprimento de onda ou altura e calculando, na sequência, altura ou comprimento de onda, respectivamente. 3.2 MODELO 1 (M1) - MODELO MATEMÁTICO CLÁSSSICO DE ROLL WAVES EM ÁGUA O Modelo 1 teve como base os trabalhos de Dressler (1949) e Liu et al. (2005). Este modelo de roll wave, é o caso em que se desenvolve em água, que apesar de apresentar reologia Newtoniana, foi considerado como um fluido invíscido, isto é, 𝜇 = 0 e, portanto, 𝑅𝑒 → ∞ (regime turbulento), acrescentado de termo de força resistiva (atrito de parede), representado por leis da hidráulica clássica (Chézy, Manning-Strickler), validadas para Capítulo 3. Metodologia 37 regime uniforme. A Equação 8 mostra a relação entre as diversas leis encontrados na literatura. 𝐶𝑓 = 𝑟2 = 𝑔/𝐶ℎ 2 = 𝑓/8 (8) Em que 𝐶𝑓 = 𝑟2 são constantes que dependem da rugosidade do canal; 𝑔 a gravidade; 𝐶ℎ é o coeficiente de Chézy; 𝑓 é o coeficiente de atrito de Darcy-Weisbach. Considerou-se, ainda, a condição de contorno de impermeabilidade no fundo do canal, ou seja, componente da velocidade nula na parede, conforme a Equação 9. 𝑢 = 𝑤 = 0 em 𝑧 = 0 (9) 3.2.1 Equações motrizes As Equações 10 e 11, já promediadas na vertical, compõem as equações motrizes para o Modelo 1. 𝜕ℎ 𝜕𝑡 + 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑥 = 0 (10) 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝑔 cos 𝜃𝜕ℎ 𝜕𝑥 = 𝑔 sen 𝜃 − 𝐶𝑓 𝑢2 ℎ (11) 3.2.2 Mudança de referencial Realizando a mudança de coordenadas do sistema (Equações 10 e 11) para o sistema móvel 𝑥′, obtêm-se as Equações 12 e 13: ℎ (𝑢− 𝑈) = 𝑞 (12) (𝑢− 𝑈) 𝜕𝑢 𝜕𝑥′ + 𝑔 cos 𝜃 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = 𝑔 sen 𝜃 − 𝐶𝑓 𝑢2 ℎ (13) Na qual 𝑞 é uma constante e representa uma vazão relativa. 3.2.3 Adimensionalização As equações adimensionalizadas do Modelo 1 se encontram no subseção 3.2.8, pois optou-se para este modelo, inicialmente, trabalhar-se na forma dimensional. Capítulo 3. Metodologia 38 3.2.4 Equação da roll wave Resolvendo o sistema (Equações 12 e 13), obteve-se a Equação 14 (equação da roll wave no sistema 𝑥′): 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = − ℎ {︁ 𝑔 sen 𝜃 − [︁ 𝐶𝑓 (𝑈ℎ− 𝑞)2 ]︁ /ℎ3 }︁ (𝑞/ℎ)2 − 𝑔ℎ cos 𝜃 ≡ 𝐹M1 (ℎ) 𝐺M1 (ℎ) (14) O subíndice ( )M1 é referente ao Modelo 1. 3.2.5 Determinação da celeridade Para a determinação da celeridade da onda, deve-se, inicialmente, reforçar o princípio da existência das roll waves, como bem cita Dressler (1949), a Equação 14, equação da roll wave não gera a solução contínua periódica que se busca, mas apenas uma solução contínua por partes. Ademais, o sistema é estritamente hiperbólico, gerando no cabo de tempo finito, choques. Assim, para a construção das roll waves, as soluções contínuas por partes são interconectadas por meio de choques, qual seja, choque de propriedades como massa e quantidade de movimento. Vale lembrar que as roll waves assim como as bore waves e os ressaltos hidráulicos, apresentam descontinuidade ou “choques”, o escoamento passa de um regime supercrítico (𝐹𝑟 > 1) para um regime subcrítico (𝐹𝑟 < 1). E pela condição de continuidade, em algum ponto entre essas duas regiões o escoamento é crítico. Dressler (1949) mostrou em seu trabalho que as condições de Rankine-Hugoniot (condições de choque), utilizadas na dinâmica dos gases para considerar salto de propriedades (descontinuidades), também poderiam ser utilizadas no problema de roll wave. Deste modo, obedecendo às condições de choque de Rankine-Hugoniot, devem existir duas lâminas características, uma antes do choque (ℎ1) e outra após o choque (ℎ2), que satisfaçam as condições de regimes de escoamento e energia, de tal maneira que a celeridade (velocidade de propagação da onda) seja maior que uma velocidade crítica do escoamento 𝑈 > 𝑢𝑐. Assim posto, bem como demonstrado em Dressler (1949), a única maneira de se obter uma solução para a equação da roll wave (Equação 14) é se o numerador e o denominador da equação se anularem, assim escreve-se as Equações 15 e 16. 𝐹M1 (ℎ𝑐) = ℎ𝑐 {︁ 𝑔 sen 𝜃 − [︁ 𝐶𝑓 (𝑈ℎ𝑐 − 𝑞)2 ]︁ /ℎ𝑐 3 }︁ = 0 (15) 𝐺M1 (ℎ𝑐) = (𝑞/ℎ𝑐)2 − 𝑔ℎ𝑐 cos 𝜃 = 0 (16) Em que ℎ𝑐 é a lâmina crítica do escoamento. Capítulo 3. Metodologia 39 Pode-se reescrever a Equação 16, utilizando a Equação 12, de tal forma como apresentado na Equação 17: (𝑢𝑐 − 𝑈)2 − 𝑔ℎ𝑐 cos 𝜃 = 0 (17) Resolvendo o sistema (Equações 15 e 17), pode-se determinar a expressão da velocidade crítica (𝑢) e lâmina crítica ℎ𝑐. Como as roll waves desenvolvem-se em torno do escoamento base (regime uniforme), pode-se escrever a expressão da velocidade crítica e lâmina crítica em função das propriedades do escoamento uniforme, conforme Equações 18 e 19, e determinar a celeridade “mínima” do escoamento. 𝑢𝑐 = 𝑢0 = 𝑈 1 + √︁ 𝑚/𝐶𝑓 < 𝑈 (18) ℎ𝑐 = ℎ0 = 1 𝑔 ⎛⎝ 𝑈 1 + √︁ 𝑚/𝐶𝑓 ⎞⎠2 (19) Com 𝑚 = tg 𝜃; Portanto, a celeridade pode ser escrita conforme Equação 20 𝑈 = 𝑢0 (︂ 1 + √︁ 𝑚/𝐶𝑓 )︂ (20) Obtida a celeridade, e as expressões da velocidade crítica e da lâmina crítica, foi possível reescrever a Equação 14, colocando em evidência (ℎ− ℎ0), o que resultou na Equação 21. 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = 𝑚ℎ2 + (𝑚ℎ0 − 𝑈2𝐶𝑓/𝑔)ℎ+ 𝐶𝑓ℎ0 2 ℎ2 + ℎ0ℎ+ ℎ0 2 (21) 3.2.6 Condições de choque de Rankine-Hugoniot Aplicando as condições de choque de Rankine-Hugoniot, Equações 22 e 23, obtém-se a Equação 24. Conservação da massa: 𝑈 [ℎ]21 = [𝑢ℎ]21 (22) Capítulo 3. Metodologia 40 Balanço de quantidade de movimento: [︂ (𝑈 − 𝑢)2ℎ+ 1 2𝑔ℎ cos 𝜃 ]︂2 1 = 0 (23) ℎ1 = 1 2 ⎡⎣(︃ℎ2 2 + 8𝑞0 2 𝑔 cos 𝜃ℎ2 )︃1/2 − ℎ2 ⎤⎦ (24) 3.2.7 Determinação da tensão de cisalhamento no fundo De maneira simples, a tensão de cisalhamento no fundo pode ser escrita conforme a Equação 25. 𝜏𝑓 = 𝜌𝑔ℎ𝑆𝑓 (25) Com 𝑆𝑓 = 𝑢2/ (︁ 𝐶ℎ 2ℎ )︁ a declividade da linha de energia, e 𝐶ℎ o coeficiente de Chézy. 3.2.8 Equações adimensionalizadas Optou-se, nesta seção, por realizar o processo de adimensionalização das equações, conforme Equações 26–29, no intuito de facilitar a comparação de resultados com os da literatura. As escalas utilizadas foram as mesmas citadas na seção 3.1, lembrando que o sobrescrito ( )*, que representa variáveis adimensionais, foi omitido. Ainda, o número de Froude pode ser escrito como 𝐹𝑟 = √︁ tg 𝜃/𝐶𝑓 . Equação da roll wave: 𝑑ℎ 𝑑𝑥′ = 𝐹𝑟2ℎ2 − ℎ− 2ℎ𝐹𝑟 + 1 ℎ2 + ℎ+ 1 (26) Celeridade: 𝑈 = 1 + 1/𝐹𝑟 (27) Relação entre ℎ1 e ℎ2: ℎ1 = 1 2 [︃(︂ ℎ2 2 + 8 ℎ2 )︂1/2 − ℎ2 ]︃ (28) Capítulo 3. Metodologia 41 Tensão de cisalhamento no fundo: 𝜏𝑓 = 𝑢2 (29) 3.3 MODELO 2 - MODELO MATEMÁTICO DO GRUPO RMVP: ROLL WAVES EM FLUIDOS DE HERSCHEL-BULKLEY, COM FUNDO IMPERMEÁVEL (M2FI) O Modelo 2 é aquele desenvolvido pelo Grupo RMVP (MACIEL et al., 2013), que considera regime laminar, fluido de Herschel-Bulkley, que é o modelo reológico representativo de fluidos lamosos, conforme Coussot (1994), Huang e García (1998), Maciel et al. (2009). Em condições permanentes e de cisalhamento simples, o modelo reológico pode ser escrito conforme Equação 30. 𝜏𝑥𝑧 = 𝜏𝑐 +𝐾𝑛 (︃ 𝜕𝑢 𝜕𝑧 )︃𝑛 , se 𝜏𝑥𝑧 > 𝜏𝑐 𝜕𝑢 𝜕𝑧 = 0 , se 𝜏𝑥𝑧 < 𝜏𝑐 (30) Em que 𝜏𝑥𝑧 é a tensão de cisalhamento atuando na direção 𝑥 devido a um gradiente em 𝑧, 𝑢 é a componente da velocidade na direção 𝑥, 𝑧 a coordenada vertical, 𝜕𝑢/𝜕𝑧 a taxa de deformação ou cisalhamento, 𝜏𝑐 a tensão limite de escoamento, 𝐾𝑛 o índice de consistência e 𝑛 é o índice de escoamento do fluido. O Modelo 2, com fundo impermeável, foi determinado por Maciel et al. (2013), com tensão de cisalhamento no fundo detalhada por Huang e García (1998) e verificada por Ferreira (2013). Assim, por hipótese, tem-se que o regime é laminar e o fundo do canal impermeável, com as seguintes condições de contorno: impermeabilidade no fundo (Equação 31) e tensão no fundo do canal (Equação 32). 𝑢 = 𝑤 = 0 em 𝑧 = 0 (31) 𝜏𝑥𝑧 = 𝜏𝑓 , para 𝑧 = 0 (32) Sendo 𝑤 a componente da velocidade na direção 𝑧, 𝜏𝑓 a tensão de cisalhamento no fundo do canal. Capítulo 3. Metodologia 42 3.3.1 Equações motrizes As equações motrizes do problema, resultado da promediação das Equações 3 e 4 ao longo da profundidade, sob as condições de contorno 31 e 32, são dadas pelas Equações 33 e 34. Conservação da massa: 𝜕ℎ 𝜕𝑡 + 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑥 = 0 (33) Balanço de quantidade de movimento em 𝑥: 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑡 + 𝜕(𝛼𝑢2ℎ) 𝜕𝑥 = 𝜕 𝜕𝑥 (︃ −𝑔 cos 𝜃ℎ 2 2 )︃ + 𝑔ℎ sen 𝜃 − 1 𝜌 (𝜏𝑓 ) (34) Em que 𝛼 é o coeficiente de distribuição da velocidade na vertical e 𝜏𝑓 a tensão de cisalhamento no fundo do canal representada pela Equação 35. 𝜏𝑓 = 𝜏𝑐 +𝐾𝑛 {︃ 𝑢ℎ0 (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) (𝜌𝑔 sen 𝜃)2 (𝜌𝑔ℎ0 sen 𝜃 − 𝜏𝑐) [𝑛 (𝑛+ 1) 𝜌𝑔ℎ0 sen 𝜃 + 𝜏𝑐𝑛2] }︃𝑛 (35) 3.3.2 Adimensionalização O sistema, composto pelas Equações 33 e 34, e a tensão de cisalhamento no fundo (Equação 35) podem ser reescritas a partir das escalas citadas na seção 3.1. Vale lembrar que se optou por omitir o sobrescrito das Equações 36–47, para evitar sobrecarga de notação. Assim, têm-se as Equações 36–38 em variáveis adimensionais. 𝜕ℎ 𝜕𝑡 + 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑥 = 0 (36) ℎ (︃ 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝛼𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 )︃ + ℎ 𝐹𝑟2 𝜕ℎ 𝜕𝑥 + (1 − 𝛼)𝑢𝜕ℎ 𝜕𝑡 = = ℎ− 𝐶 − (1 − 𝐶) {︃ 𝑢ℎ (1 − 𝐶) (ℎ− 𝐶) (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) [ℎ (𝑛+ 1) + 𝑛𝐶] }︃𝑛 (37) 𝜏𝑓 = 𝐶 + (1 − 𝐶) {︃ 𝑢ℎ (1 − 𝐶) (ℎ− 𝐶) (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) [ℎ (𝑛+ 1) + 𝑛𝐶] }︃𝑛 (38) Capítulo 3. Metodologia 43 3.3.3 Mudança de referencial Reescrevendo as Equações 36 e 37 em um sistema móvel de coordenadas conforme o item 2 da seção 3.1, obtiveram-se as Equações 39 e 40. Conservação da massa: ℎ (𝑈 − �̄�) = 𝑞 (39) Balanço de quantidade de movimento: ℎ (︃ −𝑈 𝜕𝑢 𝜕𝑥′ + 𝛼𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥′ )︃ − 𝜕ℎ 𝜕𝑥′𝑢𝑈 (1 − 𝛼) + ℎ 𝐹𝑟2 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = = ℎ− 𝐶 − (1 − 𝐶) {︃ 𝑢ℎ (1 − 𝐶) (ℎ− 𝐶) (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) [ℎ (𝑛+ 1) + 𝑛𝐶] }︃𝑛 (40) Vale ressaltar que (ℎ, 𝑢) = (ℎ𝑐, 𝑢𝑐) = (1, 1) é uma solução da Equação 39, em regime permanente, portanto 𝑞 é uma constante e vale 𝑈 − 1. 3.3.4 Equação da roll wave A solução do sistema de Equações 39 e 40, determinada por Maciel et al. (2013) produziu a Equação 41 (equação da roll wave), sendo esta função da profundidade do escoamento, do número de Froude, da velocidade de propagação da roll wave e dos parâmetros reológicos do fluido. 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = ℎ− 𝐶 − (1 − 𝐶) {︃ (𝑈ℎ− 𝑞) (1 − 𝐶) (ℎ− 𝐶) (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) [ℎ (𝑛+ 1) + 𝑛𝐶] }︃𝑛 𝑈2 (𝛼− 1) − 𝑞2 ℎ2𝛼 + ℎ 𝐹 𝑟2 ≡ 𝐹M2FI (ℎ) 𝐺M2FI (ℎ) (41) No qual 𝐹𝑟 > 𝐹𝑟min = 𝜗 (𝜙2 − 2𝛼𝜙𝜗+ 𝛼𝜗2)1/2 ; com 𝜗 = 𝑛 (1 − 𝐶) e 𝜙 = [(𝑛+ 1) (2𝑛+ 1)] (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) . O subíndice ( )M2FI é referente ao Modelo 2, fundo impermeável. 3.3.5 Determinação da celeridade A celeridade da roll waves, considerando ℎ = ℎ𝑐 = 1, dada pela Equação 44 é obtida resolvendo as Equações 42 e 43. 𝐹M2FI (ℎ𝑐) = ℎ𝑐 − 𝐶 − (1 − 𝐶) {︃ (𝑈ℎ𝑐 − 𝑞) (1 − 𝐶) (ℎ𝑐 − 𝐶) (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) [ℎ𝑐 (𝑛+ 1) + 𝑛𝐶] }︃𝑛 = 0 (42) Capítulo 3. Metodologia 44 𝐺M2FI (ℎ𝑐) = 𝑈2 (𝛼− 1) − 𝑞2 ℎ𝑐 2𝛼 + ℎ𝑐 𝐹𝑟2 = 0 (43) 𝑈 = 𝛼± [︂ 𝛼 (𝛼− 1) + 1 𝐹𝑟2 ]︂1/2 (44) 3.3.6 Condições de choque de Rankine-Hugoniot As condições de choque do problema são dadas pelas Equações 45 e 46. Conservação da massa: 𝑈 [ℎ]21 = [𝑢ℎ]21 (45) Balanço de quantidade de movimento: 𝑈 [𝑢ℎ]21 = ⎡⎣𝛼𝑢2ℎ+ 1 2 (︃ ℎ 𝐹𝑟 )︃2 ⎤⎦2 1 (46) Em que [ ]21 representa o salto de propriedades, [ℎ]21 = ℎ2 − ℎ1; [𝑢ℎ]21 = 𝑢2ℎ2 − 𝑢1ℎ1. Realizando a combinação das Equações 45 e 46, e reescrevendo em ℎ, obteve-se a Equação 47 que relaciona as alturas ℎ1 e ℎ2. ℎ2 = ⎧⎨⎩ [︃ ℎ1 2 + (𝛼− 1)𝑈2𝐹𝑟2 ]︃2 + 2𝛼𝑞2𝐹𝑟2 ℎ1 ⎫⎬⎭ 1 2 − ℎ1 2 − (𝛼− 1)𝑈2𝐹𝑟2 (47) Os procedimentos de determinação de ℎmin, e comprimento de onda 𝜆 e perfil de velocidade média 𝑢 (𝑥′) seguem o protocolo apresentado na seção 3.1. 3.4 MODELO 2 - MODELO MATEMÁTICO: AS ROLL WAVES EM FLUIDOS DE HERSCHEL-BULKLEY, COM FUNDO PERMEÁVEL (M2FP) Em reologia de fluidos, a presença de tensão limite de escoamento traz complexidades ao problema devido a interação entre a natureza do fluidos (misturas, suspensões, etc.) e o meio. Quando se estuda escoamentos, em meio poroso, com presença de tensão limite, como suspensões, pequenas partículas poderiam obstruir os vazios do meio por adesão, alterando a porosidade do meio ao longo do tempo, e consequentemente, mudando o problema estudado. Capítulo 3. Metodologia 45 O problema proposto nesta seção é analisar a alteração na dinâmica de escoamentos de fluidos não-Newtonianos devido à presença de um fundo poroso/permeável nas condições de contorno. Para isto, um escoamento com superfície livre é considerado, tendo no fundo a presença de um meio poroso/permeável. O meio poroso é composto por partículas fixas de diâmetro 𝐷, dispostas aleatoriamente. Assim, as hipóteses do problema citadas na seção 3.1 foram levadas em consideração. Neste momento, considera-se que o fluido permite escoamento no meio que compõe o fundo do canal que é plano e fixo, isto é, o fluxo está saturado e existe um equilíbrio entre erosão e deposição; ou a capacidade erosiva não é suficiente para arrastar o material do fundo. O fundo do escoamento, apresenta uma porosidade 𝑝. Vale ressaltar a diferença entre porosidade e permeabilidade, pois são propriedades físicas distintas: a porosidade refere-se aos espaços vazios existentes em um meio sólido; a permeabilidade refere-se à capacidade da massa sólida permitir ou restringir a passagem de fluido. Estas propriedades estão intimamente correlacionadas, a título de exemplo, toda rocha permeável é porosa, porém nem toda rocha porosa é permeável, em virtude dos poros não comunicarem entre si, ou de serem de tamanho tão pequeno que não permitam a passagem de fluido (LUMEN LEARNING, 2018). Desta maneira, neste trabalho, foi considerado que os vazios existentes no material que compõem o fundo são suficientemente permeáveis e que todos os vazios estão preenchidos e possibilitam o escoamento do fluido não-Newtoniano por ele. Problemas desta natureza são conhecidos como escoamentos regidos pela Lei de Darcy. E o esquema do problema é representado na Figura 9. No caso do escoamento permanente e uniforme, a velocidade e altura da lâmina são constantes, valendo 𝑢0 e ℎ0, respectivamente. Já no meio poroso, um escoamento permanente é estabelecido com velocidade 𝑢𝑝, e 𝑤𝑝. Capítulo 3. Metodologia 46 Figura 9 – Esquema para o problema estudado, fluido não-Newtoniano tipo Herschel- Bulkley escoando em um meio permeável. Fonte: Próprio autor. 3.4.1 Condições de contorno do problema Para a solução deste problema é necessário encontrar a relação entre o gradiente de pressão no meio permeável e as velocidades 𝑢𝑝 e 𝑤𝑝, para então, estabelecer as condições de contorno na interface entre o fluido/meio permeável. Seguindo trabalhos anteriores (BEAVERS; JOSEPH, 1967; RAO; MISHRA, 2004; PASCAL, 2006; FIOROT, 2016), parte-se do princípio que existe continuidade da tensão de cisalhamento na interface, dada pela condição apresentada pela Equação 48: 𝜕𝑢 𝜕𝑧 ⃒⃒⃒⃒ ⃒ 𝑧=0 = 𝜒 𝜅 1 𝑛+1 (𝑢− 𝑢𝑝) , (48) Na qual 𝜒 é um parâmetro adimensional relacionado ao fator de forma dos vazios no meio permeável, 𝜅 o fator de permeabilidade modificado do meio e 𝑛 é o índice de escoamento do fluido. A condição de cisalhamento apresentada na Equação 48 considera os efeitos não- Newtonianos da tensão de cisalhamento na velocidade longitudinal 𝑢𝑝. A outra condição de contorno, dada pela Equação 49, é relacionada à velocidade no meio permeável que, na interface, não deve variar. Assim: 𝑤𝑝 = 0, para 𝑧 = 0; (49) Recapitulando, no trabalho de Chevalier et al. (2013) foi apresentado uma adaptação da Lei de Darcy para fluidos tipo Herschel-Bulkley baseados em dados experimentais, na qual chegaram a uma relação entre o gradiente de pressão e a velocidade de Darcy (𝑢𝑝), Capítulo 3. Metodologia 47 apresentada na Equação 50: −𝜕𝑃𝑝 𝜕𝑥 = 𝜏𝑐 𝜅𝐼 + 𝐾𝑛 𝜅𝐾 𝑢𝑝 𝑛 (50) Em que 𝜅𝐼 e 𝜅𝐾 são parâmetros de permeabilidade que definem as propriedades do meio poroso, relacionando a forma, dispersão e geometria do meio. O primeiro parâmetro 𝜅𝐼 é chamado de permeabilidade inercial, que representa como a estrutura do meio poroso acoplada a reologia do fluido não-Newtoniana se opõe ao movimento do fluido. E o segundo 𝜅𝐾 , é a permeabilidade intrínseca, termo clássico, que representa a capacidade do meio poroso de permitir o fluxo (FIOROT, 2016). E 𝑃𝑝 é a pressão total no meio permeável. Vale ressaltar que a validade deste conceito, adaptação da Lei de Darcy para fluidos Newtonianos, é garantida para fluidos não-Newtonianos sob a mesma condição de trabalho da realizada por Chevalier et al. (2013), ou seja, sem alteração do meio permeável. Sendo assim, a Lei de Darcy adaptada para um escoamento tipo Herschel-Bulkley pode ser escrita sob forma das Equações 51–54. 𝑢𝑝 = − (︂ 𝜅𝐾 𝐾𝑛 )︂1/𝑛 ⎡⎣(︃𝜕𝑃𝑝 𝜕𝑥 + 𝜏𝑐 𝜅𝐼 )︃1/𝑛 − 𝜌𝑔 sen 𝜃 ⎤⎦ (51) 𝜕𝑢𝑝 𝜕𝑥 + 𝜕𝑤𝑝 𝜕𝑧 = 0 (52) 𝜕𝑃𝑝 𝜕𝑧 = −𝜌𝑔 cos 𝜃 (53) 𝑃𝑝 = 𝑃 , para 𝑧 = 0 (54) Consideram-se os casos na qual o meio permeável apresenta escoamento mais lento do que na camada acima, de tal forma que os termos da velocidade do meio permeável na interface (condições 48 e 49) são desprezados. Para determinação das ordem de grandeza das variáveis do meio permeável, assume- se a pressão hidrostática. Com base nas Equações 4 e 53, e a continuidade da condição de pressão (Equação 54), pode-se concluir que 𝜕𝑃𝑝/𝜕𝑥 = 𝜕𝑃/𝜕𝑥. Assim, a ordem de grandeza Capítulo 3. Metodologia 48 da pressão no escoamento acima do meio permeável é dada pela Equação 55. 𝑃0 ∼ 𝐾𝑛 (︂ 𝑢0 ℎ0 )︂𝑛 𝐿0 ℎ0 (55) A partir da Equação 52, obtém-se a Equação 56, como escala para a velocidade longitudinal no meio poroso. 𝑈𝑝 ∼ (︃ 𝜅𝐾 𝑢0 𝑛 ℎ0 𝑛+1 − Ω𝑓 )︃1/𝑛 (56) Em que Ω𝑓 = 𝜅𝐾 𝜅𝐼 𝜏𝑐 𝐾𝑛 é a relação entre o limite inercial (inertial threshold) e a resistência cinemática no meio poroso para o fluido (FIOROT, 2016). Por uma questão de simplificação, ao considerar um fluido sem tensão limite de escoamento (𝜏𝑐 = 0), tem-se Ω𝑓 = 0 e portanto, 𝑈𝑝 é dado pela Equação 57. 𝑈𝑝 ∼ (︃ 𝜅𝐾 𝑢0 𝑛 ℎ0 𝑛+1 )︃1/𝑛 = 𝜅𝐾 1/𝑛 ℎ0 1+1/𝑛 𝑢0 (57) Como a escala do tamanho do poro é muito menor que a escala do escoamento (ℎ0 𝑛+1 ≫ 𝜅𝐾), então 𝜅𝐾/ℎ0 𝑛+1 ≪ 1, portanto, chega-se que 𝑈𝑝 ≪ 𝑢0. Assim, a condição de contorno no meio permeável (interface entre fluido e meio permeável) pode ser simplificada, resultando na Equação 58. 𝜕𝑢 𝜕𝑧 ⃒⃒⃒⃒ ⃒ 𝑧=0 = 𝜒 𝜅𝐾 1 𝑛+1 𝑢; 𝑤|𝑧=0 = 0; (58) Esta condição de contorno (Equação 58) pode ser encontrada na forma adimensional conforme Equação 59 permitindo o entendimento das propriedades que governam a lei de contorno. O asterisco sobrescrito ( )* indica propriedades adimensionalizadas pelas propriedades do escoamento médio. 𝑢0 ℎ0 𝜕𝑢* 𝜕𝑧* ⃒⃒⃒⃒ ⃒ 𝑧=0 = 𝑢0 𝜒 𝜅𝐾 1 𝑛+1 𝑢*|𝑧*=0 −→ 𝜕𝑢* 𝜕𝑧* ⃒⃒⃒⃒ ⃒ 𝑧=0 1 (1 − 𝐶*) 𝛾 𝑢 *|𝑧*=0 (59) Com 𝑢* = 𝑢/𝑢0, 𝑧* = 𝑧/ℎ0, 𝛾 = 𝜅𝐾 1/(1+𝑛) 𝜒𝑧0 e (1 −𝐶*) = 𝑧0/ℎ0. Em que 𝑧0 = ℎ0 − 𝜏𝑐 𝜌𝑔 sen 𝜃 é altura da zona não- cisalhada (plug flow) que pode ser reescrito como 𝑧0 = ℎ0 (1 − 𝐶*). Capítulo 3. Metodologia 49 3.4.2 Perfil de velocidade O perfil de velocidade utilizado no modelo M2FP é o obtido por Fiorot (2016). Nesta subseção são apresentadas os grandes passos para obtenção do perfil de velocidade, e confrontados com resultados já existentes em literatura. A partir da hipótese de pressão hidrostática e cisalhamento simples, pode-se chegar a Equação 60. 𝜕𝑢 𝜕𝑧 = (︃ 𝜌𝑔 (ℎ0 − 𝑧) sen 𝜃 − 𝜏𝑐 𝐾𝑛 )︃1/𝑛 (60) Resolvendo a Equação 60 para 𝑢, o perfil de velocidade é escrito conforme Equação 61. 𝑢 (𝑧) = (︂ 𝑛 𝑛+ 1 )︂ [︃ 1 − (︂ 1 − 𝑧 𝑧0 )︂𝑛+1 𝑛 + (︂ 𝑛 𝑛+ 1 )︂ 𝛾 ]︃(︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝐾𝑛 𝑧𝑛+1 0 )︃1/𝑛 (61) Na região acima do plug (região não-cisalhada) (𝑧0 < 𝑧 < ℎ0), a velocidade é constante e dado pela Equação 62. 𝑢𝑧0 = 𝑢 (𝑧 = 𝑧0) = (︂ 𝑛 𝑛+ 1 )︂ [︂ 1 + (︂ 𝑛+ 1 𝑛 )︂ 𝛾 ]︂ (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝐾𝑛 𝑧𝑛+1 0 )︃1/𝑛 (62) Uma importante característica presente no modelo com fundo poroso é que, na interface, o escoamento “desliza” (CHEN; ZHU, 2008), portanto a velocidade no fundo do canal (𝑧 = 0) é dado pela Equação 63. 𝑢𝑓 = 𝑢 (𝑧 = 0) = 𝛾 (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝐾𝑛 𝑧𝑛+1 0 )︃1/𝑛 (63) 3.4.3 Perfil de velocidade média O perfil de velocidade média é calculado por meio da promediação da Equação 61 na vertical conforme a Equação 64. 𝑢 = 1 ℎ0 ∫︁ ℎ0 0 𝑢 (𝑧) 𝑑𝑧 = 1 ℎ0 ∫︁ 𝑧0 0 𝑢 (𝑧) 𝑑𝑧 + 1 ℎ0 ∫︁ ℎ0 𝑧0 𝑢 (𝑧0) 𝑑𝑧 (64) Resolvendo a Equação 64, chega-se na Equação 65, que expressa o perfil de Capítulo 3. Metodologia 50 velocidade média: 𝑢 = (︂ 𝑛 𝑛+ 1 )︂(︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝐾𝑛 𝑧0 𝑛+1 )︃1/𝑛 [︂ 1 − 𝑧0 ℎ0 (︂ 𝑛 2𝑛+ 1 )︂ + (︂ 𝑛+ 1 𝑛 )︂ 𝛾 ]︂ (65) A Equação 65 ainda pode ser reescrita em função do termo 𝐶*, chegando-se a Equação 66. 𝑢 = (︂ 𝑛 𝑛+ 1 )︂(︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝐾𝑛 𝑧0 𝑛+1 )︃1/𝑛 [︂(︂1 + 𝑛+ 𝑛𝐶* 2𝑛+ 1 )︂ + (︂ 𝑛+ 1 𝑛 )︂ 𝛾 ]︂ (66) 3.4.4 Verificação de soluções “menos complexas” A solução do perfil de velocidade média obtida (Equação 66) pode ser verificada para fundos impermeáveis (𝛾 = 0), e em diferentes comportamentos reológicos1 (Newtoniano, power law, Bingham e Herschel-Bulkley). Herschel-Bulkley Para fundo impermeável (𝛾 = 0), tem-se a Equação 67, conforme Ferreira (2013). 𝑢 = (︂ 𝑛 𝑛+ 1 )︂(︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝐾𝑛 𝑧0 𝑛+1 )︃1/𝑛 (︂1 + 𝑛+ 𝑛𝐶* 2𝑛+ 1 )︂ (67) Plástico de Bingham Para a reologia Binghamiana, o fluido apresenta tensão limite de escoamento, mas exibe relação linear entre a tensão de cisalhamento e a taxa de deformação. Em condições de cisalhamento simples, pode-se escrever conforme a Equação 68. 𝜏 = 𝜏𝑐 + 𝜇𝐵 (︃ 𝜕𝑢 𝜕𝑧 )︃ , para 𝜏 > 𝜏𝑐 (68) Em que 𝜇𝐵 é a viscosidade do fluido plástico de Bingham, e 𝜏𝑐 a tensão limite de escoamento. Partindo da Equação 66, quando 𝑛 = 1, então, chega-se ao perfil de velocidade média dado pela Equação 69. 𝑢 = (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝜇𝐵 𝑧0 2 )︃ [︂(︂2 − 𝐶* 6 )︂ + 𝛾 ]︂ (69) 1 ver Anexo A Capítulo 3. Metodologia 51 Para um fundo impermeável, a solução é a Equação 70 (LIU; MEI, 1994): 𝑢 = (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝜇𝐵 𝑧0 2 )︃(︂2 − 𝐶* 6 )︂ (70) Power Law (Lei de Potência) Em fluidos do tipo power law não existe tensão limite de escoamento (𝜏𝑐 = 0), entretanto a relação entre a tensão de cisalhamento e a taxa de deformação é não-linear. Em condições de cisalhamento simples, o modelo reológico pode ser escrito conforme a Equação 71: 𝜏 = 𝜇𝑛 (︃ 𝜕𝑢 𝜕𝑧 )︃𝑛 (71) Sendo 𝜇𝑛 a viscosidade plástica, e 𝑛 é o índice de escoamento do fluido, para 𝑛 > 1, tem-se um fluido dilatante, e para 𝑛 < 1, pseudoplástico. Se 𝜏𝑐 = 0, obtém-se o perfil de velocidade média para um fluido tipo power law representada pela Equação 72 (PASCAL, 2006). 𝑢 = (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝜇𝑛 ℎ0 𝑛+1 )︃1/𝑛 [︂(︂ 𝑛 2𝑛+ 1 )︂ + 𝛾 ]︂ (72) Para um fundo impermeável, a solução é a Equação 73 (NG; MEI, 1994): 𝑢 = (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝜇𝑛 ℎ0 𝑛+1 )︃1/𝑛 (︂ 𝑛 2𝑛+ 1 )︂ (73) Newtoniano Fluidos Newtonianos não apresentam tensão limite de escoamento (𝜏𝑐 = 0) e a relação entre a tensão de cisalhamento e a taxa de deformação é linear. Em condições de cisalhamento simples, o modelo reológico pode ser escrito como apresentado na Equação 74: 𝜏 = 𝜇 (︃ 𝜕𝑢 𝜕𝑧 )︃ (74) Em que 𝜇 é a viscosidade dinâmica ou absoluta. Para o modelo Newtoniano tem-se que 𝜏𝑐 = 0 e 𝑛 = 1, resultando na Equação 75. 𝑢 = (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝜇 ℎ0 2 )︃(︂1 3 + 𝛾 )︂ (75) Capítulo 3. Metodologia 52 Para fundo impermeável, a solução é dado pela Equação 76: 𝑢 = 𝜌𝑔 sen 𝜃 3𝜇 ℎ0 2 (76) 3.4.5 Determinação da taxa de deformação Para determinação da taxa de deformação 𝜕𝑢/𝜕𝑧 deriva-se a equação da velocidade média (Equação 61). Como a velocidade na zona não-cisalhada (plug flow) é constante, resta calcular a derivada da velocidade na região cisalhada, obtendo-se a Equação 77. 𝜕𝑢 𝜕𝑧 = (︃ 𝜌𝑔 sen 𝜃 𝐾𝑛 𝑧0 𝑛+1 )︃1/𝑛 1 𝑧0 (︂ 1 − 𝑧 𝑧0 )︂ 1 𝑛 (77) Pode-se observar, na Equação 77, que a taxa de deformação do fluido é nula em 𝑧 = 𝑧0 , o que geralmente ocorre próximo à superfície livre (região não-cisalhada), ou plug, de escoamentos que só se deformam com aplicação de uma tensão mínima de cisalhamento, tais como, lamas e detritos, concreto fresco, géis, etc. 3.4.6 Obtenção da expressão da tensão de cisalhamento Após a determinação da velocidade média e da taxa de deformação do escoamento, a tensão de cisalhamento pode ser expressado em função da velocidade média e das propriedades reológicas do fluido, conforme Equação 78. 𝜏𝑓 = 𝜏𝑐 +𝐾𝑛 {︃ 𝑢ℎ0 (𝜌𝑔ℎ0 sen 𝜃 − 𝜏𝑐) }︃𝑛 × × {︃ (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) (𝜌𝑔 sen 𝜃)2 (𝜌𝑔ℎ0 sen 𝜃 [𝑛 (𝑛+ 1) + (2𝑛+ 1) (𝑛+ 1) 𝛾] + 𝜏𝑐𝑛2) }︃𝑛 (78) A tensão de cisalhamento determinada nesta dissertação está em consonância com trabalhos na literatura (HUANG; GARCÍA, 1998; PASCAL, 2006; FERREIRA, 2013) que estudaram escoamentos de fluidos não-Newtonianos, cada qual com suas particularidades de modelo (presença ou ausência do fator porosidade e de tensão limite de escoamento), o que vem confirmar a técnica utilizada para o cálculo da velocidade média e da taxa de deformação, tanto para fluidos Newtonianos quanto para não-Newtonianos (power law, Bingham e Herschel-Bulkley). Capítulo 3. Metodologia 53 3.4.7 Equações do modelo matemático, processos de promedia- ção e adimensionalização Com base nas equações apresentadas na seção 3.1, utilizou-se o sistema de equações de Cauchy, aplicaram-se as devidas hipóteses para o problema, o bom modelo reológico (Herschel-Bulkley), como visto em seção 3.3, e, por fim, adicionou-se o fator de porosidade. As Equações 79–81 (conservação de massa e quantidade de movimento) representam o sistema de equações motrizes do problema, que são integradas na vertical aplicando as condições de contorno dadas pelas Equações 82–84. Conservação da massa: 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝜕𝑤 𝜕𝑧 = 0 (79) Balanço de quantidade de movimento em 𝑥: 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 + 𝑤 𝜕𝑢 𝜕𝑧 = −1 𝜌 𝜕𝑃 𝜕𝑥 + 𝑔 sen 𝜃 + 1 𝜌 𝜕 𝜕𝑧 𝜏𝑥𝑧 (80) Balanço de quantidade de movimento em 𝑦: 𝜕𝑃 𝜕𝑧 = −𝜌𝑔 cos 𝜃 (81) Condição cinemática na superfície livre: 𝑤 = 𝜕ℎ 𝜕𝑡 + 𝑢 𝜕ℎ 𝜕𝑥 , para 𝑧 = ℎ(𝑥, 𝑡) (82) Tensões na superfície livre: 𝑃 = 0 , 𝜏𝑥𝑧 = 0 para𝑧 = ℎ(𝑥, 𝑡) (83) Tensões no fundo: 𝜕𝑢 𝜕𝑧 ⃒⃒⃒⃒ ⃒ 𝑧=0 = 𝜒 𝜅𝐾 1 𝑛+1 𝑢; 𝑤|𝑧=0 = 0; (84) Após a integração na vertical, obtiveram-se as Equações 85 e 86, conservação da massa e balanço de quantidade de movimento em 𝑥, respectivamente. Capítulo 3. Metodologia 54 Conservação da massa: 𝜕ℎ 𝜕𝑡 + 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑥 = 0 (85) Balanço de quantidade de movimento em 𝑥: 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑡 + 𝜕(𝛼𝑢2ℎ) 𝜕𝑥 = 𝜕 𝜕𝑥 (︃ −𝑔 cos 𝜃ℎ 2 2 )︃ + 𝑔ℎ sen 𝜃 − 1 𝜌 (𝜏𝑓 ) (86) No qual 𝛼 é o coeficiente de distribuição de velocidade na vertical dado pela Equação 87 𝛼 = 1 𝑢2ℎ0 ∫︁ ℎ0 0 𝑢 (𝑧)2 𝑑𝑧 (87) Resolvendo a Equação 87, obtém-se a Equação 88. 𝛼 = 𝑧0 ℎ0 [︁ − (4𝑛+3)𝑛 (2𝑛+1)(3𝑛+2) − 2𝛾 (︁ 𝑛+1 2𝑛+1 )︁]︁ + [︁ 1 + (︁ 𝑛+1 𝑛 )︁ 𝛾 ]︁2 [︁ 1 − 𝑧0 ℎ0 𝑛 2𝑛+1 + (︁ 𝑛+1 𝑛 )︁ 𝛾 ]︁2 (88) Reescrevendo em termos de 𝐶* e fazendo algumas manipulações algébricas, obtém-se a Equação 89. 𝛼 = (𝑛+ 𝑛𝛾 + 𝛾)2 (2𝑛+ 1)2 [𝑛 (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶*) + (2𝑛+ 1) (𝑛+ 1) 𝛾]2 + − (1 − 𝐶*) (2𝑛+1) (3𝑛+2) [(4𝑛+ 3)𝑛+ 2𝛾 (𝑛+ 1) (3𝑛+ 2)]𝑛2 [𝑛 (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶*) + (2𝑛+ 1) (𝑛+ 1) 𝛾]2 (89) Em seguida, foi realizada a adimensionalização das Equações 85 e 86, de acordo com as escalas citadas na seção 3.1, obtendo-se as Equações 90 e 91, representando a conservação da massa e quantidade de movimento, respectivamente. Optou-se por omitir todos os asteriscos para evitar a sobrecarga de notações. 𝜕ℎ 𝜕𝑡 + 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑥 = 0 (90) 𝜕(𝑢ℎ) 𝜕𝑡 + 𝜕(𝛼𝑢2ℎ) 𝜕𝑥 + 1 2𝐹𝑟2 𝜕ℎ2 𝜕𝑥 = ℎ− 𝜏𝑓 (91) Capítulo 3. Metodologia 55 Sendo a tensão de cisalhamento no fundo (𝜏𝑓 ) dado pela Equação 92 𝜏𝑓 = 𝐶 + (1 − 𝐶) {︃ 𝑢ℎ (︂1 − 𝐶 ℎ− 𝐶 )︂(︃ 𝑛 (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) + (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) 𝛾 ℎ [𝑛 (𝑛+ 1) + (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) 𝛾] + 𝑛2𝐶 )︃}︃𝑛 (92) Ainda a Equação 91 pode ser escrita na forma apresentada pela Equação 93: ℎ (︃ 𝜕𝑢 𝜕𝑡 + 𝛼𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥 )︃ + ℎ 𝐹𝑟2 𝜕ℎ 𝜕𝑥 + (1 − 𝛼)𝑢𝜕ℎ 𝜕𝑡 = ℎ− 𝜏𝑓 (93) Em seguida, as Equações 90 e 93 são reescritas em um sistema móvel de coordenadas, que se desloca com a velocidade de propagação da roll wave ou celeridade (𝑈) (ver seção 3.1). Desta forma, obtiveram-se as Equações 94 e 95. Conservação da massa: ℎ (𝑈 − �̄�) = 𝑞 (94) Balanço de quantidade de movimento: ℎ (︃ −𝑈 𝜕𝑢 𝜕𝑥′ + 𝛼𝑢 𝜕𝑢 𝜕𝑥′ )︃ − 𝜕ℎ 𝜕𝑥′𝑢𝑈 (1 − 𝛼) + ℎ 𝐹𝑟2 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = ℎ− 𝜏𝑓 (95) 3.4.8 A equação da roll wave A equação da roll wave (Equação 96) é obtida resolvendo o sistema, composto pelas Equações 94 e 95, para ℎ. 𝜕ℎ 𝜕𝑥′ = ℎ− 𝜏𝑓 𝑈2 (𝛼− 1) − 𝑞2 ℎ2𝛼 + ℎ 𝐹 𝑟2 ≡ 𝐹M2FP (ℎ) 𝐺M2FP (ℎ) (96) O subíndice ( )M2FP é referente ao Modelo 2, fundo permeável. 3.4.9 A celeridade da roll wave Como exposto, a solução da equação (Equação 96) só existe quando o numerador e denominador se anulam, e isto ocorre na seção crítica (ℎ = ℎ𝑐 = 1) da roll wave. Desta forma, pôde-se obter a velocidade de propagação das roll waves no ponto crítico, dada pela Equação 97. 𝑈 = 𝐵𝛼 ± [︃ 𝐵2𝛼 (𝛼− 1) + ℎ 𝐹𝑟2 ]︃1/2 (97) Capítulo 3. Metodologia 56 Com: 𝐵 = 1 ℎ (︃ ℎ− 𝐶 1 − 𝐶 )︃(𝑛+1 𝑛 ) {︃ℎ [𝑛 (𝑛+ 1) + (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) 𝛾] + 𝑛2𝐶 𝑛 (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) + (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) 𝛾 }︃ Quando ℎ = ℎ𝑐 = 1, tem-se: 𝐵 = 𝑛 (𝑛+ 1) + (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) 𝛾 + 𝑛2𝐶 𝑛 (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) + (𝑛+ 1) (2𝑛+ 1) 𝛾 A solução obtida neste trabalho está em consonância com aquela encontrada por Ferreira (2013), quando anula-se o termo fator de porosidade 𝛾. 3.4.10 Determinação do número de Froude mínimo Roll waves apenas existem quando o número de Froude é superior a um Froude mínimo (𝐹𝑟min), que é determinado a partir de análise de estabilidade linear temporal (NG; MEI, 1994; LIU; MEI, 1994; PASCAL, 2006; FERREIRA, 2013; MACIEL et al., 2013). No Apêndice A é apresentado, com mais detalhes, a obtenção do número de Froude mínimo. O princípio da análise de estabilidade linear é impor, no sistema de equações (Equações 90 e 93), uma pertubação infinitesimal sobre a lâmina e a velocidade média do escoamento, da seguinte maneira: ℎ(𝑥, 𝑡) = 1 + ℋ(𝑥, 𝑡) e 𝑢(𝑥, 𝑡) = 1 + 𝒱(𝑥, 𝑡), com ℋ(𝑥, 𝑡) ≪ 1 e 𝒱(𝑥, 𝑡) ≪ 1. Após o processo de linearização das Equações 90 e 93 e alguns desenvolvimentos matemáticos (ver Apêndice A, Equações de A.7–A.12), obteve-se a Equação 98. 𝜕2ℋ 𝜕𝑡2 + 2𝛼 𝜕 2ℋ 𝜕𝑥𝜕𝑡 + (︂ 𝛼− 1 𝐹𝑟2 )︂ 𝜕2ℋ 𝜕𝑥2 + 𝜙𝑝 𝜕ℋ 𝜕𝑥 + 𝜗 𝜕ℋ 𝜕𝑡 = 0 (98) Com: 𝜗 = 𝑛 (1 − 𝐶) 𝜙𝑝 = 1 + 𝑛+ 𝑛 (1 − 𝐶) [𝑛 (𝑛+ 1) + (2𝑛+ 1) (𝑛+ 1) 𝛾] 𝑛 (𝑛+ 1 + 𝑛𝐶) + (2𝑛+ 1) (𝑛+ 1) 𝛾 Impõe-se uma solução (Equação 99) que caracteriza a taxa de crescimento das perturbações e a frequência das mesmas. ℋ = �̂�𝑒𝑖(𝑘𝑥−𝜔𝑡) (99) Capítulo 3. Metodologia 57 Sendo ℋ a magnitude de perturbação, 𝑘 e 𝜔 geralmente são números complexos e são definidos como: 𝜔 = 𝜔𝑟 + 𝑖𝜔𝑖 e 𝑘 = 𝑘𝑟 + 𝑖𝑘𝑖, 𝑘𝑟 é o número de onda, 𝜔𝑟 a frequência de pertubação, 𝑘𝑖 e 𝜔𝑖 são taxas de amplificação no espaço e tempo respectivamente. A obtenção da relação de dispersão, Equação 100, é estabelecida ao inserir a solução imposta (Equação 99) na equação linearizada (Equação 98), cuja incógnita é 𝜔. 𝜔2 − 𝜔 [2𝛼𝑘 − 𝑖𝜗] + (︂ 𝛼− 1 𝐹𝑟2 )︂ 𝑘2 − 𝜙𝑝𝑖𝑘 = 0 (100) Resolvendo a Equação 100 obtém-se a solução apresentada em Equação 101. 𝜔 = 1 2 [︁ 2𝛼𝑘 − 𝜗𝑖± √ 𝑎+ 𝑏𝑖 ]︁ (101) Com: 𝑎 = 4𝑘2 (︂ 𝛼2 − 𝛼 + 1 𝐹𝑟2 )︂ − 𝜗2 𝑏 = −4𝛼𝑘𝜗+ 4𝜙𝑝𝑘 Da Equação 101, obtém-se a solução, a qual é separada em parte imaginária e parte real, conforme as Equações 102 e 103, que representam a taxa de crescimento das pertubações e a velocidade de propagação de ondas, respectivamente. ℐ (𝜔) = 1 2 ⎡⎣−𝜗± √︃ 1 2 (︁√ 𝑎2 + 𝑏2 − 𝑎 )︁⎤⎦ (102) ℛ (𝜔) = 1 2 ⎡⎣2𝛼𝑘 ± √︃ 1 2 (︁√ 𝑎2 + 𝑏2 + 𝑎 )︁⎤⎦ (103) A taxa de amplificação das instabilidades é determinada através da parte imaginária (Equação 102), conforme estudos já realizados (NG; MEI, 1994; PASCAL, 2006; MACIEL et al., 2013). Desta maneira, para determinar a condição de formação de instabilidades, relacionada ao número de Froude, utiliza-se da expressão obtida na Equação 102, considerando ℐ(𝜔) > 0. A partir da solução desta inequação, obtém-se uma condição necessária para geração de instabilidades do tipo roll waves relacionada ao número de Froude, conforme apresentado na Equação 104. 𝐹𝑟 > 𝐹𝑟min = [︃ 𝜗2 𝜗2𝛼− 2𝛼𝜗𝜙𝑝 + 𝜙𝑝 2 ]︃1/2 (104) Capítulo 3. Metodologia 58 A Equação 104 está em consonância com as obtidas para modelos mais simplificados (NG; MEI, 1994; PASCAL, 2006; MACIEL et al., 2013). Vale ressaltar que o domínio estabelecido por 𝐹𝑟 > 𝐹𝑟min, conforme citado por Ferreira (2013), é dito favorável para geração de roll waves. Após a determinação do número de Froude mínimo necessário para a obtenção do perfil de roll waves, deve-se ainda estabelecer o domínio de ℎmin e o comprimento de onda, conforme seção 3.1, e a relação de ℎ2 e ℎ1 (vide seção 3.3). 3.5 MODELO NUMÉRICO Os resultados de roll waves dos modelos aqui apresentados (Modelo 1 e Modelo 2), foram obtidos a partir de soluções numéricas utilizando o software MATLAB®, distribuído pela Mathworks. Para análises comparativas, realizaram-