UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS DE BOTUCATU CURSO DE GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS - BACHARELADO CAMILLA TOTTI DE OLIVEIRA SANTOS RELATÓRIO DE ESTÁGIO EM INSTRUMENTAÇÃO: O TRABALHO DO BIÓLOGO NA CONSERVAÇÃO DE ESPÉCIES E SEUS HABITATS ÁREA DE FORMAÇÃO: MEIO AMBIENTE E BIODIVERSIDADE BOTUCATU - SP 2023 CAMILLA TOTTI DE OLIVEIRA SANTOS RELATÓRIO DE ESTÁGIO EM INSTRUMENTAÇÃO: O TRABALHO DO BIÓLOGO NA CONSERVAÇÃO DE ESPÉCIES E SEUS HABITATS Relatório de atividades de estágio curricular obrigatório em instrumentação e trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de graduação em Ciências Biológicas Bacharelado do Instituto de Biociências de Botucatu, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), como requisito para a obtenção do título de Bacharel em Ciências Biológicas. Orientador-Supervisor: Prof. Dr. Ricardo Cardoso Benine BOTUCATU - SP 2023 S237r Santos, Camilla Totti de Oliveira Relatório de estágio em instrumentação: o trabalho do biólogo na conservação de espécies e seus habitats / Camilla Totti de Oliveira Santos. -- Botucatu, 2023 72 p. Trabalho de conclusão de curso (Bacharelado e licenciatura - Ciências Biológicas) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto de Biociências, Botucatu Orientador: Ricardo Cardoso Benine 1. Conservação ambiental. 2. Monitoramento e manejo de fauna. 3. Comportamento animal e etologia. 4. Reabilitação e reintrodução de animais silvestres. 5. Educação ambiental. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca do Instituto de Biociências, Botucatu. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. AGRADECIMENTOS Agradeço imensamente a todos aqueles que fizeram parte da minha vida e contribuíram para que eu me tornasse quem sou, independentemente de como o fizeram. Agradeço aos amores, aos amigos, aos colegas, aos meus mestres e professores, à família, aos artistas que me inspiram, aos pensadores que me cativam em suas obras e aos mais diversos seres vivos. Agradeço à vida por me ensinar a amar e cuidar, e à natureza por me permitir ser parte dela. RESUMO O presente relatório tem como objetivo descrever as atividades desenvolvidas e as vivências aprendidas durante o estágio curricular obrigatório em instrumentação, realizado pela estagiária, estudante de graduação do curso de Bacharelado em Ciências Biológicas - Integral, do Instituto de Biociências de Botucatu - IBB (UNESP). Os estágios foram realizados nas seguintes instituições: Instituto Argonauta (Centro de Reabilitação e Despetrolização de Ubatuba-SP), VIVA Instituto Verde e Azul (Ilhabela-SP), Zoológico Municipal de Guarulhos (Guarulhos-SP) e Fundação Mamíferos Aquáticos, no Projeto Viva O Peixe-Boi Marinho (Barra do Rio Mamanguape, Rio Tinto-PB). Em todas as instituições, foram desenvolvidas atividades voltadas para a área de conservação ambiental, tratando de temas como Ecologia, Etologia, Comportamento animal de cativeiro, educação ambiental, bem-estar animal, nutrição, medicina veterinária, manejo de animais silvestres, funcionamento das unidades de conservação, monitoramento de animais silvestres e reintroduzidos, comunidades tradicionais e indígenas, ecoturismo e turismo de base comunitária, ética e legislação ambiental. Em cada instituição, os objetivos para com a conservação ambiental foram transpostos em atividades com diferentes meios de atuação, no entanto, a natureza dessas atividades em cada uma e também seus objetivos fez com que as quatro interagissem de maneira complementar, contribuindo na formação profissional da estagiária, abrangendo diferentes aspectos que tornam a conservação ambiental um tema tão amplo e que envolve, também, características sociais, econômicas e políticas da sociedade. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO……………………………………………………………………….8 1.1 Objetivos gerais…………………………………………………………………….9 1.2 Objetivos específicos…………………………………………………………….10 2 DESENVOLVIMENTO……………………………………………………………..11 2.1 As instituições e sua relevância………………………………………………..11 2.1.1 Instituto Argonauta (Centro de Reabilitação e Despetrolização)..............11 2.1.2 VIVA Instituto Verde e Azul…………..………………………………………….13 2.1.3 Zoológico Municipal de Guarulhos…...……………………………………….15 2.1.4 Fundação Mamíferos Aquáticos………………………………………………..17 2.2 Atividades desenvolvidas…………………………………………………….…18 2.2.1 Instituto Argonauta - CRD……………………………………………………….19 2.2.1.1 Atividades gerais………………………………………………………….19 2.2.1.2 Animais mantidos e como são organizados na instituição……….21 2.2.1.3 A rotina de estagiários e voluntários………………………………….24 2.2.2 VIVA Instituto Verde e Azul……………………………………………………...29 2.2.2.1 Atividades gerais………………………………………………………….29 2.2.2.2 Atividades extras………………………………………………………….32 2.2.2.3 Observações……………………………………………………………….34 2.2.3 Zoológico Municipal de Guarulhos…………………………………………….35 2.2.3.1 Atividades gerais………………………………………………………….35 2.2.3.2 A rotina de estagiários…………………………………………………...36 2.2.3.3 Observações……………………………………………………………….46 2.2.3.4 Atividades extras………………………………………………………….48 2.2.4 Fundação Mamíferos Aquáticos………………………………………………..49 2.2.4.1 Resumo de atividades desenvolvidas………………………………...49 2.2.4.2 Monitoramento de peixes-bois-marinhos (Trichechus manatus)..50 2.2.4.3 Observações acerca do monitoramento de peixes-bois…………..53 2.2.4.4 Monitoramento de botos-cinzas (Sotalia guianensis).....................56 2.2.4.5 Atividade de reflorestamento…………………………………………...58 2.2.4.6 Atividades de educação ambiental em comunidades tradicionais e indígenas…………………………………………………………………………………...59 2.2.4.7 Atendimento ao encalhe de animais…………………………………..61 2.2.4.8 Apoio às atividades da comunidade local……………………………63 2.2.4.9 Atividade desenvolvida dentro do manguezal………………………64 2.2.4.10 Teste de tecnologia IOT (LoRa).........................................................65 2.2.4.11 Outras atividades………………………………………………………….66 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS……………………………………………………….67 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS……………………………………………..70 8 1 INTRODUÇÃO Este trabalho teve cunho de investigar e evidenciar, através da experiência direta com profissionais em pleno exercício de sua profissão, a relevância das atividades desempenhadas por estes em seu dia a dia, demonstrando quais são seus papeis e objetivos nas áreas de conservação ambiental e no mercado de trabalho, valorizando suas diferentes funções, sem as quais não seria possível fazer ciência e estabelecer estratégias de conservação e preservação de espécies e habitats, levando em consideração a amplitude dos trabalhos e programas ambientais realizados com a participação de diversas instituições com alvos de conservação diferentes, tanto no Brasil como fora dele. Nesse aspecto, há interdisciplinaridade entre profissionais de medicina veterinária, zootecnia, biologia, gestão ambiental, engenharia de meio ambiente, e outros profissionais que não necessariamente possuem uma formação acadêmica ou são da área, mas que desempenham papeis essenciais para a realização dos diversos projetos de objetivo conservacionista. As atividades a serem descritas foram realizadas inicialmente no Instituto Argonauta, do dia 13 de março de 2023 ao dia 10 de abril de 2023, em Ubatuba - SP. Posteriormente, do dia 12 de abril ao dia 31 de maio, foram realizadas no VIVA Instituto Verde e Azul, em Ilhabela - SP, e em sequência, no Zoológico Municipal de Guarulhos, do dia 1 de junho de 2023 ao dia 30 de junho de 2023, em Guarulhos - SP e na Fundação Mamíferos Aquáticos, do dia 01 de agosto 2023 ao dia 30 de setembro de 2023, no Projeto Viva O Peixe-Boi Marinho, na comunidade tradicional Barra do Rio Mamanguape, pertencente ao município de Rio Tinto - PB. As mesmas foram supervisionadas pelos profissionais responsáveis de cada instituição, como técnicos, tratadores, biólogos, veterinários e educadores ambientais, responsáveis 9 por instruir os estudantes e prepará-los para exercer autonomia parcial na execução de atividades pertinentes. A oportunidade de trabalhar como estagiário dessas instituições, por fim, foi uma ferramenta interessante para conhecer a profissão de uma perspectiva de mercado de trabalho e carreira, construindo gradativamente aprendizados importantes, tanto pessoais como profissionais, abrangendo não somente assuntos diretamente relacionados às ciências biológicas, mas também questões burocráticas e normas essenciais para a organização e o sucesso das atividades nessas instituições, de modo a cumprir seus objetivos dentro dos padrões estabelecidos legalmente para as profissões. 1.1 Objetivos Gerais O propósito deste estágio foi de ampliar os conhecimentos acerca do campo de atuação existente para profissionais da área de Meio Ambiente e Biodiversidade, uma das áreas de atuação determinadas pelo Conselho Federal de Biologia para o curso de ciências biológicas. Não só isso, a experiência prévia desenvolvida em instituições de conservação ambiental prepara o estudante para sua atuação profissional e ajuda a estruturar sua desenvoltura pessoal, possibilitando, até certo ponto, autonomia e contatos essenciais com outros profissionais. Sendo assim, o estágio é uma etapa importante para que o estudante possa colocar em prática os conhecimentos teóricos adquiridos durante o curso, de forma a complementar as experiências acadêmicas. As responsabilidades profissionais adquiridas durante o estágio variaram conforme a instituição, uma vez que possuem formas de atuação relativamente diferentes, cada qual com sua rotina e propósitos institucionais, mas sempre contemplando temas similares. 10 1.2 Objetivos específicos Os objetivos específicos deste trabalho compreenderam formas de melhor aproveitar a experiência oferecida por cada instituição, individualmente. Sendo assim, entre os diferentes aprendizados adquiridos, foram contemplados os seguintes: técnicas de manejo e enriquecimento ambiental, processos de reabilitação e soltura, acompanhamento de procedimentos veterinários, realização de biometrias para controle de escore corporal de indivíduos, observação e monitoramento de animais nativos e reintroduzidos para a conservação adequada de diferentes grupos de seres vivos, análise crítica do espaço ocupado na natureza por cada espécie assistida (individualmente e em um contexto ambiental/ecológico), entendimento e proposição de melhorias para ambientes de cativeiro, compreensão de diferentes tipos de ambiente de cativeiro e seu propósitos, análise de situações comportamentais das espécies animais assistidas e suas interações com o ambiente e com outros indivíduos da mesma ou de outras espécies, incluindo a espécie humana, compreensão e discussão sobre soluções para as problemáticas acerca de assuntos de conservação ambiental e impacto de atividades antrópicas, compreender a importância do senso de comunidade e participação de comunidades tradicionais e indígenas inseridos em contextos de conservação ambiental, participar de ações de educação ambiental e entrar em contato próximo com temas que fazem parte da temática, como por exemplo movimentos e organizações ativistas, normas éticas, protocolos e outros. 11 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 As instituições e sua relevância Serão descritas, daqui em diante, as atividades relevantes realizadas por cada instituição para os fins de conservação ambiental. Além das atividades descritas, é válido ressaltar que cada instituição contribui de forma ativa direta ou indireta para a educação pública em diferentes níveis, tais como: educação infantil pré-escolar, ensino fundamental, ensino médio e formação acadêmica em diferentes cursos de graduação, além da possibilidade de que estudantes de mestrado e doutorado possam realizar pesquisas científicas em parceria com estas instituições. 2.1.1 Instituto Argonauta (Centro de Reabilitação e Despetrolização) A unidade do Instituto Argonauta localizada em Ubatuba, no estado de São Paulo, é reconhecida como um Centro de Reabilitação e Despetrolização, ou seja, dedica seu trabalho principalmente, mas não exclusivamente, à reabilitação de animais marinhos como aves marinhas, cetáceos odontocetos e pinípedes vítimas de atividades antrópicas e outros tipos de deficiência em suas atribuições físicas e mentais, além de funcionar também como um centro de estabilização para animais acometidos por acidentes ambientais, como vazamentos de petróleo, uma vez que o instituto é voltado para prestar assistência a ambientes marinhos. O Instituto Argonauta é uma iniciativa privada, e foi fundado em 1998 pela diretoria do Aquário de Ubatuba, com objetivos de funcionar como uma instituição voltada para a conservação ambiental de ecossistemas costeiros e marinhos. O instituto foi reconhecido em 2007 como uma OSCIP (Organização da Sociedade 12 Civil de Interesse Público), e promove parcerias voltadas ao desenvolvimento de pesquisas, ações de educação ambiental, análise de resíduos sólidos contaminantes no ambiente marinho, resgate, reabilitação e monitoramento de fauna (viva ou morta) na região litorânea do litoral norte de São Paulo (Ubatuba, Caraguatatuba, São Sebastião e Ilhabela) pertencente à Bacia de Santos, uma vez que o instituto é uma das instituições executoras do Projeto de Monitoramento de Praias da Bacia de Santos (PMP-BS), da Petrobras. Além do Instituto Argonauta, outras instituições também funcionam como unidades executoras do PMP-BS, cada uma responsável por um trecho, sendo o Instituto Argonauta responsável pelo trecho 10, que engloba as cidades mencionadas anteriormente. Ainda, o instituto mantém parcerias com outras instituições que complementam, dão apoio ou têm objetivos parecidos com os do trabalho realizado dentro do mesmo, tais como, laboratórios para análises de material biológico, outras instituições de conservação, como o Projeto TAMAR, órgãos públicos e privados, como o Aquário de Ubatuba, a Polícia Militar Ambiental, o IBAMA e a Prefeitura de Ubatuba. Dessa forma, o trabalho realizado pelo instituto pode obter uma base mais sólida e mais eficaz em seus objetivos, por exemplo, no caso do Projeto TAMAR de Ubatuba, todas as tartarugas encontradas encalhadas vivas pela equipe do Instituto Argonauta são levadas para os cuidados do TAMAR, onde são reabilitadas e soltas, ou mantidas em cativeiro para educação ambiental no caso de não serem aptas à soltura, enquanto que as tartarugas mortas encontradas são mantidas pelo Instituto Argonauta para realização de sua necropsia e coleta de material biológico para análise, taxidermia ou utilização de seus ossos para educação ambiental. Esse tipo de organização ajuda a dividir o trabalho, evitando a sobrecarga das instalações das instituições e ajuda a manter uma relação orgânica entre elas, de modo que mantém viva a parceria e benefícios mútuos. Assim, o instituto realiza atividades voltadas para o estudo e avaliação dos impactos antrópicos no meio ambiente, mais especificamente, nos ecossistemas 13 costeiros e marinhos, proporcionando atendimento veterinário e reabilitação à fauna, monitoramento de atividades antrópicas e maior controle dos produtos associados aos processos de licenciamento ambiental da Petrobras. Além disso, como mencionado anteriormente, o instituto possui projetos voltados à educação ambiental, como o Museu de Vida Marinha, com seu acervo biológico e o Nautilus, uma hidronave voltada ao turismo de cunho educativo. Por último, mas não menos importante, o Instituto Argonauta, juntamente ao Aquário de Ubatuba, edita mensalmente o Boletim do Lixo, um documento informativo quanto à presença de lixo no litoral norte de São Paulo, com categorias como “Ausente: não há evidência de lixo; Traço: predominantemente ausente, com a presença de alguns itens espalhados; Inaceitável: amplamente distribuído com algumas acumulações; Caótico: pesadamente contaminado com várias acumulações” (Instituto Argonauta, 2023). 2.1.2 VIVA Instituto Verde e Azul O VIVA Instituto Verde e Azul está localizado no município de Ilhabela, no litoral norte do estado de São Paulo, e é uma instituição outrora idealizada por três biólogas marinhas com propósitos em comum. Destas, somente uma permanece no instituto até os dias atuais. O VIVA, inicialmente, foi fundado sob o nome “VIVA Baleias, Golfinhos e cia” e posteriormente veio a tornar-se o VIVA Instituto Verde e Azul. Apesar dos nomes diferentes, o VIVA possui o mesmo propósito desde sua criação, isto é, promover o desenvolvimento de trabalhos científicos voltados para a conservação de cetáceos misticetos e odontocetos, realizar ações de educação ambiental acerca desse tema e desenvolver materiais didáticos para tal, participar de propostas ativistas pelas causas dos cetáceos, promover ações informativas voltadas para a conservação dos cetáceos marinhos, apoiar estudantes 14 interessados na vida marinha e participar de ações ativistas em prol do meio ambiente. Assim, a missão do VIVA enquanto instituição é contribuir para a conservação dos ecossistemas marinhos ensinando, conscientizando e sensibilizando as pessoas através de divulgação científica, tratando também das ameaças antrópicas das quais estes animais são vítimas diretas e indiretas, além de pesquisar e desenvolver soluções para protegê-los e conservá-los. Em relação às atividades de educação ambiental (EA), o VIVA trabalha, desde 2020, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação e Turismo de Ilhabela com objetivos de levar o conhecimento sobre os cetáceos para os estudantes das escolas municipais da cidade. Essa ação conta com dois livros didáticos desenvolvidos pela equipe do VIVA: “Baleias, golfinhos e cia” e “São Paulo, mar de baleias, golfinhos e cia – guia ilustrado” que são utilizados como ferramentas de educação ambiental. A distribuição desse material por toda a rede de educação municipal e disponibilização gratuita do material foi possível graças à parceria com a Prefeitura de Ilhabela. Para garantir o sucesso das ações de educação ambiental, o VIVA elaborou um plano de ação em parceria com a secretária de educação, plano o qual envolveu todos os educadores das escolas municipais de Ilhabela, incluindo coordenadores gerais, diretores e professores. Com isso, até o presente momento, já foram alcançados todos os alunos do ensino infantil e do ensino fundamental I do município. Além da EA com as escolas, o instituto também promove ações de educação itinerante, divulgando materiais educativos em totens e ônibus municipais da cidade. Também, o VIVA participou de eventos como o Ubatuba Sailing Festival, a Feira de Ciências do Colégio Objetivo de Ilhabela, IEC Raízes em Boiçucanga, realizando palestras e atividades, a Abertura Oficial da Temporada de Baleias Jubartes de Ilhabela, a Semana do Meio Ambiente na Prefeitura de Ilhabela, o Vela Show na 15 Escola de Vela Lars Grael, e a 50ª Semana de Vela de Ilhabela, eventos nos quais foi possível realizar ações de EA com públicos de diferentes idades e dentro de um modelo não convencional. Além da divulgação científica, trabalhos de educação ambiental, desenvolvimento de pesquisas e apoio aos estudantes, o VIVA, como mencionado anteriormente, também participa de movimentos ativistas em prol do meio ambiente. São eles: o “Empty the Tanks” e o “Japan Dolphins Day”, dois movimentos internacionais relacionados entre si, pois tratam de temas relacionados à caça predatória de golfinhos realizada em Taiji, no Japão, anualmente e com duração de seis meses, os quais são, na maior parte das vezes, levados para abastecimento de tanques e delfinários ao redor do mundo e utilizados para o entretenimento humano. O VIVA conta ainda com a parceria de instituições como o Centro Mamíferos Aquáticos (CMA), este sendo um dos centros de pesquisa e conservação do ICMBio, projetos como a ECO Informe e a ECO 360, além de outros profissionais dedicados à conservação do meio ambiente que oferecem seu apoio ao Instituto Verde e Azul. 2.1.3 Zoológico Municipal de Guarulhos O Zoológico Municipal de Guarulhos foi fundado em 1981 sob o nome de “Parque Municipal Edgard Casal de Rey”, nomeado em homenagem ao homem que incentivou a criação da área. Em 1982, o parque foi oficializado como Zoológico Municipal de Guarulhos. Anteriormente à criação do Parque Municipal Edgard Casal de Rey, a área pertencente ao zoológico já era utilizada desde 1926 por uma família que cultivava na área ciprestes e pinheiros, mas eram especializados no cultivo de rosas para estudos, além de cultivar orquídeas e camélias. O lugar chamava-se “Chácara Rosa de França” e foi nomeado pelo dono à sua esposa francesa, e esse 16 nome deu origem posteriormente ao nome do bairro. A partir de 1987, quando o local já era o próprio zoológico, a vegetação ainda era majoritariamente composta por ciprestes e pinheiros, sendo substituída gradativamente, até 1990 por árvores frutíferas com preferência por espécies nativas de mata atlântica. Sendo assim, parte da área do zoológico é reconstituída com espécies de mata atlântica e a outra parte é mata nativa, havendo um cuidado para reconstituir o ambiente próximo do natural (Loureiro, 2020). Graças à sua área de mata e seus lagos, o zoológico é um atrativo para espécies de vida livre, como tucanos, garças, anseriformes migratórias, passeriformes, pequenos anfíbios, lagartos, gaviões, entre outras. O zoológico mantém aproximadamente 500 animais de 100 espécies diferentes, dando prioridade para espécies nacionais, sendo que 91% das espécies mantidas são brasileiras (Zoológico Municipal De Guarulhos, 2023). Além disso, participa de programas de conservação de espécies ameaçadas, pesquisas científicas e ações de educação ambiental. A área do zoológico possui 59 recintos de exposição, quarentenário e demais recintos restritos aos funcionários, onde animais em tratamento recebem os devidos cuidados, salas de cirurgia, laboratório, clínica veterinária, sala de internação dos pacientes animais, sala de necropsia, setor para preparo das alimentações dos animais e biotério para a produção de alimentos vivos, tais como ratos para serpentes e rapinantes, e tenébrios e baratas para passeriformes. Além de desenvolver programas de educação ambiental, pesquisa em diversas áreas e reprodução de animais nativos da fauna brasileira, com propósitos de conservação ambiental, o Zoológico Municipal de Guarulhos também recebe animais feridos e doentes pelas mãos de órgãos como a polícia ambiental, e ainda, aqueles animais silvestres mantidos em cativeiro e entregues espontaneamente pela população, funcionando como um CRAS (Centro de Reabilitação de Animais Silvestres), ou um CETAS (Centro de Triagem de Animais Silvestres) e assim 17 realizando atividades de tratamento clínico, reabilitação e soltura, nos casos em que isso é possível, dadas as condições de cada animal e sua aptidão ou não para a soltura. 2.1.4 Fundação Mamíferos Aquáticos A criação da Fundação Mamíferos Aquáticos, se deu em 1989, a partir da percepção de que o “Projeto Peixe-Boi Marinho” (projeto iniciado a partir dos esforços dos cientistas adeptos da causa dos peixes-bois) necessitava uma organização institucional para promover ações de preservação da espécie que o nomeia, assim criando a então chamada Fundação para Preservação e Estudos dos Mamíferos Marinhos, apelidada inicialmente de Fundação Mamíferos Marinhos, com os objetivos de fomentar e desenvolver trabalhos visando abranger os mamíferos aquáticos e os ecossistemas em que vivem, especialmente aqueles ameaçados de extinção, utilizando-se também de programas de educação ambiental para propagar os temas que envolvem as causas ambientais. A criação do Projeto Viva o Peixe-Boi-Marinho e da Fundação Mamíferos Aquáticos, nome com o qual veio a ser apelidada posteriormente, uniu a necessidade da preservação da espécie, extremamente ameaçada de extinção, devido às muitas décadas de caça predatória e, atualmente, à constante perda de habitat por consequência de atividades antrópicas (AQUASIS, 2016), à necessidade de adquirir conhecimentos sobre a mesma, uma vez que as informações sobre o peixe-boi eram extremamente escassas. Assim, foram pensadas estratégias que possibilitaram a execução de planos de atendimento de resgate ao encalhe dos mamíferos marinhos (focado em peixes-bois), manejo, reabilitação, atendimento clínico veterinário, e soltura (se o animal estiver apto) ou necropsia e análise de amostras biológicas, no caso de animais que venham a óbito. Além disso, desde então, a Fundação vem realizando trabalho de base em 18 diferentes regiões do Nordeste brasileiro, estabelecendo metas para com o meio ambiente, mas também abrangendo as questões sociopolíticas que o envolvem, criando contextos e ações que levem em conta as diferentes categorias sociais das populações e comunidades inseridas nas regiões onde são desenvolvidos seus projetos de conservação e educação ambiental. Atualmente, o programa precursor da instituição ainda é seu destaque, o “Projeto Viva O Peixe-Boi-Marinho”. Este programa, realizado em parceria com a Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental, é uma estratégia de conservação e proteção desta espécie no Nordeste do Brasil através da pesquisa, tecnologia de monitoramento via satélite, manejo, educação ambiental, desenvolvimento comunitário, fomento ao turismo eco pedagógico e políticas públicas” (Fundação Mamíferos Aquáticos, 2023). O projeto Viva o Peixe-Boi-Marinho também atua em parceria com outra iniciativa, colocada em prática em 2017, o “Programa Nacional para Conservação dos Peixes-Bois Marinhos”, apoiado pela Fundação Grupo Boticário. Desde então, vem realizando o atendimento em ocorrências com peixes-bois marinhos, monitoramento com tecnologia nacional, campanhas de sensibilização ambiental, ordenamento do turismo de observação aos animais alvo e também, com essa iniciativa foi possível a construção do cativeiro em ambiente natural para etapas de reintrodução dos peixes-bois reabilitados ao ambiente natural. O trabalho de resgate, reabilitação e reintrodução dos peixes-bois está previsto no Plano de Ação Nacional de Conservação dos Peixes-Bois-Marinhos (Fundação Mamíferos Aquáticos, 2023). 2.2 Atividades Desenvolvidas As atividades previstas no plano de atividades de estágio e no plano de atividades de cada instituição estão aqui descritas detalhadamente. 19 2.2.1 Instituto Argonauta - CRD 2.2.1.1 Atividades gerais O CRD, ou Centro de Reabilitação e Despetrolização de Ubatuba, é a maior base do Instituto Argonauta, sendo a outra base de estabilização e necropsias para a fauna marinha, em São Sebastião. Ambas as bases são importantes espaços para realização de programas de monitoramento do impacto das atividades antrópicas nos ecossistemas costeiros e marinhos, no entanto, o CRD é o que recebe a maior quantidade de animais vivos estabilizados ou em condições de saúde instáveis, sendo que todos os que necessitam atendimento são recebidos de acordo com o espaço disponível na instituição, especialmente, mas não exclusivamente, a fauna aquática marinha. Depois do atendimento mais urgente, os animais em tratamento vão para um recinto reservado a cada um deles e são mantidos em reabilitação durante o tempo necessário e, se possível, durante o tempo ideal considerado para cada grupo animal. Aqueles que não podem ser soltos, por diversos motivos que os tornem inaptos, são mandados para instituições com o preparo profissional e estrutural necessários para recebê-los em cativeiro. O Instituto Argonauta possui instalações desenvolvidas para cada tipo de atendimento. No caso da reabilitação, existem os espaços de ambulatório, enfermaria, sala de internação para animais em condições de saúde instáveis, farmácia para armazenamento de medicamentos, cozinha projetada para o armazenamento e preparo da alimentação dos animais, salas de raio-x e anestesia onde são realizados exames clínicos necessários à recuperação dos animais vivos, sala de quarentena e almoxarifado. Existe também o setor específico para a realização de necropsias em animais resgatados mortos ou aqueles que vem a óbito em quaisquer momentos ao longo do período de tratamento. Por último, o setor que 20 nomeia a base do instituto, a sala de despetrolização é onde a fauna afetada geralmente por acidentes com petróleo recebe tratamento de estabilização, sendo uma das etapas o banho em água morna para eliminar o excesso de contaminante, a fim de evitar maiores danos ao seu organismo. Uma importante observação, segundo uma das veterinárias do instituto, é que, no caso das aves marinhas, animais recebidos em maior quantidade no local, o estresse gerado pela contaminação e pela tentativa da equipe em banhar o animal pode levá-las a óbito, pois são animais sensíveis. Nesse caso o que se aconselha é esperar o estresse da ave diminuir, evitando uma morte cuja causa não foi a intoxicação em si, mas uma falha nos cuidados primários. Alguns animais tratados e que vieram a óbito na instituição são direcionados para a sala de taxidermização, de onde saem com pele e esqueleto tratados quimicamente para destinação ao acervo científico do instituto, como o museu de vida marinha e o acervo de materiais para educação ambiental. As amostras biológicas de animais vivos e mortos retiradas nos procedimentos de necropsias e biópsias recebem direcionamento para serem analisadas em laboratório, seja o do próprio instituto ou laboratórios externos especializados em técnicas que suplementam as que o instituto não pode realizar, como por exemplo análises da idade óssea de cetáceos, feita através de cortes de lâminas odontológicos dos mesmos. Em relação ao museu de vida marinha mencionado, é um local com entrada paga e acessível a moradores da cidade e turistas, e é também uma ferramenta indispensável de educação ambiental, onde biólogos formados e estagiários se dispõem a explicar os diferentes componentes do espaço, como os animais taxidermizados, alguns fósseis originais, réplicas de fósseis, esqueletos ósseos, dentições, instalações para demonstração de equipamentos domésticos sustentáveis e jogos didáticos com temas ambientais. Sendo assim, é um espaço que pode contribuir para a sensibilização da população em diferentes faixas etárias. 21 2.2.1.2 Animais mantidos e como são organizados na instituição Todos os tipos de animais para os quais o instituto foi preparado para atender possuem espaços/recintos destinados especificamente para eles. Por exemplo: o recinto destinado aos pinípedes possui um tanque com plataformas diagonais, de modo a oferecer mobilidade a estes no percurso para a saída da água, uma vez que são marinhos mas passam parte significativa de seu tempo em terra. Em se tratando de Pinípedes resgatados, geralmente são esperadas focas (Phocidae), leões-marinhos e lobos-marinhos (Otariidae), mas o grupo pinípedes também engloba elefantes-marinhos (Phocidae) e morsas (Família Odobenidae, ocorrência não observada na América-do-Sul e, portanto, também não há estrutura capaz de receber um animal de tal porte dentro do instituto). Além dos pinípedes, a base é capaz de receber outro grupo de mamíferos de grande porte: os Cetáceos odontocetos, que incluem diversas espécies de golfinhos, como o boto-cinza (Sotalia guianensis), golfinho-rotador (Stenella longirostris) e as Toninhas (Pontoporia blainvillei), sem contar as outras espécies de golfinhos/cetáceos odontocetos que habitam os mares Sul-Americanos. Infelizmente, o instituto não possui estrutura para receber animais de porte maior que os golfinhos mencionados. Nesse caso, não são incluídos na lista de odontocetos atendidos pelo instituto animais como as orcas (Orcinus orca), as cachalotes ou mesmo espécies de cetáceos misticetos. Excluindo-se os animais de grande porte mencionado, o CRD também recebe outros tipos de animais que se enquadram na fauna aquática marinha ou interagem indireta ou diretamente com ela, como as aves e quelônios de diversos tamanhos, tanto de água salgada como de água doce. Dando enfoque para as aves, pode-se citar algumas aves que já foram ou eventualmente poderão ser recebidas no instituto, tais como pinguins (Família Spheniscidae, ex: Spheniscus magellanicus/pinguim-de-magalhães), gaivotas (Família Laridae, ex: Larus 22 dominicanus/gaivota-meridional), atobás (Família Sulidae, ex: Sula leucogaster/atobá-pardo), fragatas (Família Fregatidae, ex: Fregata magnificens/tesourão), albatrozes (Família Diomedeidae, ex: albatroz-viageiro, albatroz-real-meridional, albatroz-de-sobrancelha-negra, albatroz-de-nariz-amarelo, respectivamente: Diomedea exulans, Diomedea epomophora, Thalassarche melanophris, Thalassarche chlororhynchos), biguás (Família Phalacrocoracidae, ex: Phalacrocorax brasilianus/mergulhão), socós e garças (Família Ardeidae, ex: Ardea cocoi/garça-moura; Ardea alba/garça-branca-grande; Nycticorax nycticorax/socó-dorminhoco), trinta-réis (Família Sternidae, ex: Thalasseus maximus/trinta-réis-real; Gelochelidon nilotica/trinta-réis-de-bico-preto) e outras aves, como guarás, pardelas, almas-de-mestre, pombas-do-cabo, marias-faceiras, outras espécies de garças e socós, colhereiros e talha-mares. Entre as espécies de quelônios recebidas no Instituto Argonauta, podemos citar as espécies marinhas presentes no Brasil, alvos de pesquisa e monitoramento pelo PMP-BS, tais quais: Chelonia mydas/tartaruga-verde; Eretmochelys imbricata/tartaruga-de-pente; Caretta caretta/tartaruga-cabeçuda e Lepidochelys olivacea/ tartaruga-oliva, essas espécies, quando encontradas vivas, são destinadas prioritariamente para o centro de reabilitação do Projeto Tamar, como mencionado anteriormente, e quando mortas sua necropsia é realizada no próprio instituto. No caso de espécies não-alvo do PMP-BS, como é o caso das tartarugas de água doce, tais como a Kinosternon scorpioides (muçuã), o Instituto Argonauta se encarrega de reabilitá-las e soltá-las em seu ambiente natural (se possível). No entanto, no caso de espécies invasoras como a Trachemys dorbigni (tartaruga-tigre-d'água), a soltura é impossível. Trata-se de uma espécie natural do Rio Grande do Sul mas considerada uma problemática ambiental recorrente em outros estados brasileiros e ameaça para espécies nativas (Abdala, 2023). É uma espécie cuja problemática foi causada devido ao excesso de soltura desses animais fora de seu ambiente originário (Instituto Hórus, 2023). Assim como no caso das tartarugas de água doce, o Instituto Argonauta, em casos 23 específicos, recebe algumas outras espécies que necessitam cuidados veterinários em suas instalações, como por exemplo o Coendous spinosus/ouriço-cacheiro, uma fêmea encontrada pelos funcionários com quadro de miíase e tratada no instituto no mês de março. Todos os dados de espécies alvo encontradas, vivas ou mortas, tratadas e estudadas pelo instituto devem ser registrados no Sistema de Informação de Monitoramento da Biota Aquática (SIMBA). O SIMBA foi desenvolvido pela Petrobras juntamente ao IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e serve como um grande banco de dados comumente utilizado por cada uma das instituições parceiras responsáveis e participantes no Programa de Monitoramento de Praias, e é lá que estão os registros de animais resgatados (vivos ou mortos), quais as causas de óbito/adoecimento e, no caso de estarem relacionadas a interações antrópicas, quais foram estas, quais os locais onde foram achados esses animais, quem os encontrou, quem os resgatou e com qual veículo (SIMBA, 2023). Para essas atividades, os técnicos de campo do Instituto Argonauta possuem uma sala com equipamento necessário para a realização do trabalho de monitoramento e passagem dos dados de monitoramento para o sistema. Em sua maioria, os técnicos são biólogos ou oceanógrafos, mas não necessariamente são todos formados na área de biológicas. A sala de monitoramento possui câmeras fotográficas, binóculos, drones, computadores, fichas técnicas, equipamentos de segurança, documentos de veículos terrestres e aquáticos do instituto, rádios de comunicação, entre outros equipamentos úteis para o trabalho dos técnicos. Os estagiários não possuem acesso à participação nesse tipo de atividade, somente a uma explicação teórica de como funciona. Cada uma das tarefas realizadas dentro do instituto foi explicada diretamente aos estagiários através de diálogos inseridos nas tarefas do dia a dia das atividades e em acompanhamento de rotina junto aos funcionários. A receptividade e atenção dos profissionais é indispensável para a manutenção do programa de estágios do 24 instituto e para o aprendizado dos estagiários e voluntários. As atividades são uma rotina diária dentro do instituto, uma vez que lidam-se com animais vivos que precisam de cuidado constante. Mesmo a retirada e análise de animais mortos é uma rotina frequente, dada a quantidade de vezes por semana que estes são encontrados. Já a organização de dados sobre tudo que acontece dentro do instituto é um trabalho que compreende todas as atividades feitas num dia de expediente. Portanto, nenhuma atividade é menos importante que outra, pois é uma rotina que envolve, além dos dados de pesquisa direcionados para a conservação do meio ambiente, a vida dos animais e a segurança daqueles que se comprometem a atendê-los. 2.2.1.3 A rotina de estagiários e voluntários A rotina do estagiário dentro do Instituto Argonauta se inicia desde a conceituação de toda a parte teórica, até a rotina prática em si. A parte teórica é direcionada ao estagiário para que este possa entender algumas normas técnicas do Instituto, por exemplo como funciona a rotina nas instalações da reabilitação e do museu de vida marinha, como o estagiário deve agir em determinadas situações e quais as funções que deve desempenhar. Algumas instruções são dadas nos dois primeiros dias, são elas: sobre o uso de vestimenta adequada de uniformização com colete e crachá, e sobre o uso de equipamento de proteção individual (EPIs), como galochas, óculos de proteção, macacão emborrachado, máscaras N95 ou PFF2 e luvas de látex; também é explicado sobre como funciona a rotina do CRD-UBT e as atividades realizadas, instrução de modo de trabalho e rotina do CRD e do museu de vida marinha, além de explicações gerais das funções de cada profissional do instituto. A vestimenta mencionada é importante tanto para a segurança e identificação do estagiário como para a proteção dos animais, evitando a contaminação de 25 recintos e contato direto com os mesmos. Nesse ponto, vale ressaltar o aumento de casos de gripe aviária relatado nos últimos meses, sendo esta uma doença perigosa de transmissão entre aves e mamíferos e de mamíferos para mamíferos sendo, portanto, passível de ser passada entre humanos (Ministério Da Agricultura e Pecuária, 2023). É uma doença cuja principal forma de transmissão ocorre através do contato direto com aves infectadas, ou com suas excreções contaminadas, como saliva, fluidos nasais ou fezes (Jordão, 2023). A doença vem sendo alvo de alerta desde 2021, sendo conhecida desde 1996, mas neste ano de 2023, foram relatados casos de milhares de animais contaminados e mortos pela doença, como os 3.4 mil leões-marinhos na costa do Peru (Biernath, 2023). As colocações acima servem como bons exemplos do por que a vestimenta seguindo os protocolos de segurança é tão importante. Assim, ao compreender os tipos de riscos que corre ao realizar atividades em contato direto com animais, o estagiário pode tomar decisões melhores para sua segurança. O estagiário deve chegar ao instituto às 8h e marcar o ponto, sendo o horário de saída variável de acordo com o termo de compromisso de estágio. Ao marcar ponto e vestir o traje adequado, as atividades começam pela cozinha dos animais (sempre a prioridade é dos animais vivos, logo, a alimentação dos mesmos e seus cuidados primários devem receber atenção em relação aos horários). Os horários de alimentação são tão importantes porque são os tratadores e biólogos que controlam o peso em quilogramas do quanto cada animal comeu ou deixou de comer todos os dias, as preferências alimentares dos mesmos, os horários em que cada animal recebe medicamento via oral pela alimentação ou sondas (no caso dos mais debilitados). Existindo esse controle, é possível designar por exemplo, as diferentes adequações alimentares: se o animal tem dificuldade de comer ou não, se ele está com algum tipo de imprinting alimentar que deve ser corrigido, qual o melhor método de alimentar aquele animal e quais os tipos de enriquecimento e cuidados que ele precisa receber de acordo com seus hábitos. Tudo isso é trabalho conjunto dos 26 biólogos, com tratadores, veterinários e estagiários em aprendizagem. Nesse aspecto, para ter um controle tão estreito, os responsáveis pela cozinha animal devem ter acesso aos diversos tipos de alimentação e remédios que o instituto compra, sejam frutas, peixes e rações. Com esse acesso, é possível controlar o que cada animal come todos os dias de acordo com sua dieta adequada, cujo cardápio alimentar é elaborado em trabalho conjunto entre um ou mais biólogos e veterinários, de acordo com as necessidades nutricionais e com os hábitos naturais do animal e, assim, fornecendo uma alimentação balanceada. Tudo que os animais comem durante o dia é preparado pela manhã, todo o alimento é cortado em tamanhos adequados ao modo de alimentação do animal e pesado na balança de acordo com a necessidade energética de cada um. Em situações habituais, os animais comem duas vezes ao dia, em horários aproximadamente iguais (podem ocorrer variações propositais em casos em que pretende-se descondicionar o animal aos horários de alimentação), mas tudo é preparado pela manhã e armazenado na geladeira em temperatura correta. A organização do preparo do alimento pela manhã se deve à necessidade dos profissionais de adiantar o trabalho relacionado aos animais vivos que já estão em tratamento, a fim de facilitar que a equipe esteja pronta para prestar atendimento a um animal que chegue a qualquer momento pelo resgate, sem negligenciar os que já estão no instituto. Seguindo pelo mesmo princípio, os tratadores e, eventualmente, os estagiários, limpam todos os dias os recintos, mesmo os que estão vazios, e os deixam prontos para o abastecimento com água salgada para um eventual recebimento de um animal, pois sempre há essa possibilidade. Assim, com toda a alimentação preparada, os animais recebem alimentação nos horários adequados e são ministradas medicações (quando necessário) no momento em que a alimentação vai ser fornecida, de modo a não reduzir o efeito dos medicamentos, vitaminas e soros eletrolíticos por exposição prolongada ao ar ou contato com outros materiais. No caso de animais que necessitam receber alimentação/medicação por sondas, há o acompanhamento 27 veterinário para análise das reações do animal e de que o mesmo está em condições de saúde estabilizadas no momento. Importante enfatizar que, sempre ao alimentar um animal, todos devem usar equipamento de proteção, inclusive ao preparar o alimento (como luvas, toucas, galochas e óculos de proteção, entre outros) a fim de proteger a si mesmo e o animal de contaminações e acidentes. Além disso, nunca se deve desconsiderar a maneira que um animal se comporta em seu ambiente natural ou sua condição de saúde durante o tratamento, por exemplo: se em vida livre e saudável o animal come peixes inteiros, fornecer peixes inteiros; se ele come frutas pequenas, fornecer frutas pequenas ou em pedaços; se o animal tem problemas de impermeabilização das penas, fornecer a comida em terra firme; se consegue nadar bem e é um animal que se alimenta na água, jogar os peixes ou outros alimentos na água, e assim por diante, a fim de aproximar o animal de uma condição de bem-estar adequada e proporcionar uma reabilitação da qual o animal possa reestruturar seus hábitos caso venha a ser devolvido ao seu ambiente natural. Com isso, também é possível evitar condicionamentos comportamentais desnecessários ou prejudiciais ao animal. A rotina de estágio não se restringe somente à cozinha, nos dias em que há necropsias, cada estagiário e/ou voluntário é escalado para auxiliar na necropsia ou permanecer em outras atividades. Somente um estagiário é escalado por necropsia, isso porque é uma atividade com alto risco de contaminação, portanto, o estagiário escalado para tal não deve realizar atividades com animais vivos posteriormente ao procedimento. As necrópsias costumam demorar uma ou mais horas, é uma atividade que exige cuidado, pois utiliza-se de objetos cortantes e perfurantes para abrir animais contaminados com diferentes tipos de patógenos provenientes do ambiente natural. Sendo assim, devido ao risco de doenças, tudo que é usado na sala de necropsia não deve sair dela, e deve ser lavado e desinfetado antes e após o uso. Os funcionários e estagiários que realizam essa atividade devem descartar luvas, máscaras, toucas e papeis usados no lixo infectante da própria ala. Além 28 disso, galochas e macacões desta ala devem ser usados exclusivamente nela, não podendo ser levados a outros ambientes. Dito isso, uma importante observação é de que todos os ambientes do instituto possuem pedilúvio com desinfetante bactericida na entrada, a fim de evitar contaminações por movimentação entre os ambientes, o desinfetante é usado também para limpeza de materiais de trabalho, EPIs, recintos e bancadas de cada ala. Complementarmente às atividades citadas, os estagiários são incluídos para acompanhamento e participação auxiliar em atividades de exames clínicos de cada um dos animais do instituto. Esses exames utilizam ferramentas veterinárias comuns como estetoscópios, seringas para medicações e coleta sanguínea, lanternas para análise de reflexo pupilar e verificação das mucosas (se estão com aspecto saudável, pálido ou doente de uma forma geral) entre outros procedimentos veterinários de rotina. Quando os animais estão em condições de saúde estabilizadas, costuma-se realizá-los a cada 15 dias (duas vezes ao mês), quando estão instáveis, os exames são realizados diariamente ou conforme a necessidade, uma vez que a condição instável de cada animal pode acabar levando-os a uma piora grave repentinamente, e até ao óbito, levando em consideração que os animais estão submetidos ao estresse, além da enfermidade em si. Dessa forma, os estagiários acompanham os procedimentos e as observações veterinárias, recebendo explicações dos veterinários responsáveis sobre cada um dos procedimentos e por que estão sendo realizados. As conversas devem ser em tom moderado, sempre visando o bem estar do animal e a amenização do estresse do mesmo. Para além dos procedimentos veterinários nesses momentos, é importante o aprendizado quanto às técnicas de manejo e contenção de cada espécie de animal, uma vez que uma contenção incorreta pode gerar acidentes em que tanto o animal quanto os profissionais envolvidos na contenção podem sofrer injúrias. Rotineiramente, uma compreensão do comportamento específico e individual de cada animal também é interessante, pois ajuda a avaliar condições em que há 29 alguma anormalidade no quadro do animal e se há processos que estejam interferindo negativa ou positivamente em sua reabilitação. Por fim, o estagiário pode também ser escalado em alguns dias para realizar atendimento ao público no museu de vida marinha. Esta é uma atividade de igual importância, pois é através desse contato com o público que os profissionais em formação podem compartilhar seu conhecimento com a população e fazer um trabalho de conscientização ambiental através de explicações sobre os componentes do museu, de trocas de ideias orgânicas com os visitantes, ou mesmo utilizando-se de jogos e brincadeiras disponíveis no acervo material de educação ambiental do Instituto Argonauta. Algumas atividades de educação ambiental são feitas fora do instituto por uma equipe composta por estagiários, biólogos e técnicos de campo, que vão até praias pré-determinadas para realizar palestras, conversas, coleta de lixo e outras atividades com crianças, adolescentes e adultos interessados em interagir com os materiais preparados pela equipe. Esses materiais são basicamente cartazes, animais taxidermizados, lixo recolhido (inclusive lixo de outras décadas e continentes) e classificado para exposição, álbum de fotos de animais com nomes científicos e jogos. Tudo é montado numa tenda e disposto de forma organizada formando um ambiente voltado para a interação com o público. 2.2.2 VIVA Instituto Verde e Azul 2.2.2.1 Atividades gerais Durante o desenvolvimento do estágio, foram fornecidas explicações teóricas e treinamentos práticos para a realização e cumprimento de metodologia de observação de cetáceos na área de etologia e comportamento, dentro da biologia de Meio Ambiente de Biodiversidade, que é o trabalho realizado pela equipe do VIVA, 30 além das atividades de educação ambiental, educação itinerante, divulgação científica e ativismo ambiental. A metodologia utilizada para observação de Baleias e Golfinhos em Ilhabela-SP, é um método de ponto fixo de observação à distância e é chamado de “Survey” pelos pesquisadores do VIVA Instituto Verde Azul, e se assemelha a um tipo de varredura contínua, lembrando um método de “Scan Sampling” (Martin & Bateson, 1993) mas com adaptações. O método ponto fixo de observação à distância é interessante pois minimiza a interferência antrópica no comportamento dos animais durante as observações e anotações por parte dos observadores, uma vez que os animais não notam ou não são afetados pela presença dos observadores (VIVA, 2023). Os surveys consistem num método de observação que ocorre a cada uma hora, durante o tempo de 30 minutos, ou seja, depois de 30 minutos de observação e varredura visual, o próximo survey será realizado após o intervalo de uma hora. As observações são intercaladas entre observação com binóculo e observação a olho nu, dentro de cada survey, a fim de obter maior amplitude visual. O ideal é que haja dois ou mais observadores, assim, enquanto um observador observa a olho nu, o outro observa no binóculo, no caso de não haver avistamentos. Se houver avistamentos, um terceiro observador será responsável por anotar os dados na planilha desenvolvida para isso. O ideal é que um dos observadores consiga realizar registros fotográficos dos avistamentos, nesses casos. Cada observação, ou survey é realizado com auxílio de ferramentas como: um binóculos para cada observador, um teodolito ou uma estação total para medir ângulos horizontais e verticais (ambos cumprem a mesma função para o propósito, com a diferença de que a estação total pode ser configurada para salvar dados de campo em sua memória interna), uma câmera fotográfica para registrar avistamentos de cetáceos e um tablet para anotação de dados de campo em planilhas. As observações são realizadas de dois pontos com altitude diferentes no 31 local de mesmas coordenadas de latitude e longitude, ou seja, há um eyepiece (altura dos olhos) diferente mas o ponto fixo é o mesmo. Para as anotações de campo, são utilizadas duas planilhas, onde são registrados dados como o número do survey, número de mês, número da amostragem do mês e número de amostragem do dia, além de dados referentes ao esforço amostral, como o nome das observadoras, data, horário, local de observação (referente às duas altitudes mencionadas anteriormente), modelo do teodolito utilizado, fase da lua (influência no nível do mar/marés), os dados de campo ambientais referentes aos registros abióticos, tais como escala Beaufort, nebulosidade (de 1 a 4), nuvens (porcentagem do céu que está coberta por nuvens, medida de 5% em 5%), glare (reflexo do sol no mar, medido pelos ângulos horizontais observados no teodolito) e por último, o parâmetro de visibilidade, que leva em consideração os outros parâmetros mencionados e é medido de 1 a 3. No caso da escala Beaufort utilizada no instituto, são utilizados códigos de 0 a 5. A escala Beaufort vai até o código 12, e cada código representa diferentes graus de intensidade do vento (UNESP, 2013). Na segunda planilha, no início de cada survey, também são registrados nesta planilha dados como coordenadas geográficas de embarcações que estejam presentes na área amostral, sejam navios, lanchas, bateras, traineiras ou embarcações esportivas como veleiros e caiaques, entre outros. As embarcações que passam pela área amostral ao longo do survey também são registradas, mas sem registro de coordenadas (como no início do survey), apenas registros de presença e movimentação, a fim de marcar dados de ocorrência e/ou interações antrópicas na área. Os surveys são realizados durante todo o dia, enquanto houver luz do sol e condições favoráveis para a visualização do mar e observação de cetáceos. Os horários para início dos surveys durante os dias são variados entre intercalações: com início às 6h30, com início às 7h00 e com início às 7h30, e seguem o método de observação por 30 minutos e pausa de 1hora durante o decorrer da amostragem. Os horários de início e fim da amostragem durante o dia 32 se baseiam nas horas de luz de cada estação do ano, e portanto podem variar ao longo do ano. Durante o período de estágio, foram visualizados e registrados dois cetáceos misticetos, mais especificamente baleias jubarte (Megaptera novaeangliae), e diversos grupos de odontocetos, como botos-cinzas, toninhas e outras espécies de golfinhos. 2.2.2.2 Atividades extras Algumas atividades realizadas durante o estágio foram pontuais, ou seja, não faziam parte da rotina de estágio referente às observações em ponto fixo no Instituto VIVA, mas foram atividades possibilitadas devido às circunstâncias. Devido à relação de trabalho de parceria entre o VIVA e outras instituições, a equipe foi convidada pela equipe ICMBio Alcatrazes para ir em expedição ao Arquipélago de Alcatrazes, em São Sebastião, realizar as observações de ponto fixo no arquipélago. Não foi a primeira vez que esse tipo de atividade foi realizada pela equipe do VIVA, mas a expedição nem sempre é possível pois depende da disponibilidade da equipe do ICMBio ou da Marinha em convidar outras instituições. Sendo assim, juntamente à equipe de monitoramento e mergulho do ICMBio Alcatrazes, dois integrantes da equipe VIVA foram para a expedição, incluindo a estagiária. A saída do píer do Perequê localizado em Ilhabela foi realizada a bordo da lancha do ICMBio por volta das 5h30 do dia 22 de agosto. A navegação até chegar em Alcatrazes dura em média 1h30, e após o desembarque segue uma trilha íngreme e de difícil acesso que dura aproximadamente 1h até o acampamento próximo de umas das bases da Marinha, no topo da principal ilha do arquipélago. A subida pela trilha até o local de montagem do acampamento foi finalizada aproximadamente às 7h50. Após a instalação da equipe, o que inclui montar 33 acampamento e receber as instruções necessárias para a estadia, foram iniciadas as amostragens de surveys. No total, foram realizados 12 surveys, 1 deles sendo cancelado do dia 23 devido ao excesso de nebulosidade, cuja intensidade impossibilitou a visualização adequada da área no entorno do Arquipélago de Alcatrazes. Os surveys são realizados em quatro diferentes pontos fixos de observação no arquipélago, sendo estes: “Saco do Funil”, “Portinho”, “Bromelial” e “5 Milhas”. Não foi observado nenhum cetáceo durante o monitoramento entre os dias 22 e 23 de maio de 2023. Durante o dia 22 os surveys foram realizados iniciando às 9h30 terminando às 17h, onde todos os pontos foram monitorados. Já no dia 23, os surveys começaram às 6h30, sendo o primeiro cancelado devido à alta nebulosidade, mas com os restantes surveys realizados devidamente. O retorno, no dia 23 de agosto, pela mesma trilha e mesma embarcação do ICMBio, iniciou por volta de 15h40. A saída do Arquipélago aconteceu por volta das 16h30. O horário de retorno ao continente ocorreu de acordo com o horário da equipe do ICMBio, que estava em operação de mergulho e retirada de Corais-Sol e monitoramento de presença de embarcações na área do território do arquipélago. A metodologia de observação utilizada para os pontos fixos no Arquipélago de Alcatrazes foi a mesma utilizada no ponto fixo da sede do VIVA Instituto Verde e Azul. Sendo assim, as duas observadoras presentes utilizaram como material de campo um binóculo e câmera fotográfica para realizar os monitoramentos por por 30 minutos, alternando entre os 4 pontos, com uma hora de descanso entre as amostragens. Os mesmos dados foram registrados em campo, tais como: data, hora, ponto de observação e dados ambientais (Beaufort, nebulosidade, visibilidade, porcentagem de nuvens e glare) e dados bióticos (espécie, número de indivíduos e comportamentos apresentados), além do registro da presença de embarcações, com a diferença de que todos esses dados foram anotados em papel (na sede, como 34 mencionado, os dados são preenchidos em planilha diretamente no tablet do instituto). Apesar de nenhum cetáceo ter sido observado durante a expedição, foi possível observar outros animais, como anfíbios diversos, tarântulas, uma Jararaca de Alcatrazes e o maior ninhal de fragatas (Fregata magnificens) do Atlântico Sul. Além disso, foi possível observar diferentes espécies vegetais, como bromélias (muito presentes no arquipélago). 2.2.2.3 Observações No momento de avistagem de um cetáceo, ou um grupo deles, dentro da área amostral, são registrados dados como as coordenadas de onde ele foi primeiro avistado, o horário de avistamento, qual o grupo ou espécie do animal, se for possível identificá-la, o número de indivíduos ou, no caso de grupos muito grandes, uma estimativa do mesmo, o evento ou os estados comportamentais, como por exemplo, o que o animal está fazendo, se está parado, em movimento, se está batendo caudais, saltando, entre outros comportamentos, além dos registros fotográficos. Os comportamentos são registrados de acordo com etogramas disponíveis na literatura e de acordo com etogramas estabelecidos no protocolo do instituto. O primeiro comportamento ou estado comportamental avistado pelo observador quando visualiza o animal é chamado de “cue” ou “pista”, ou seja, a pista do que o fez identificar que havia um animal na área amostral. Finalmente, para a conclusão do período de estágio nesta instituição, foi proposta uma apresentação de seminário na qual cada estagiária poderia escolher um artigo científico de seu interesse, relacionado aos cetáceos, para apresentar para as integrantes da equipe do VIVA. O artigo escolhido foi: Lori Marino; Convergence of Complex Cognitive Abilities in Cetaceans and Primates. Brain Behav Evol 1 July 2002; 59 (1-2): 21–32. https://doi.org/10.1159/000063731 https://doi.org/10.1159/000063731 35 2.2.3 Zoológico Municipal de Guarulhos 2.2.3.1 Atividades gerais As atividades desenvolvidas durante o estágio no Zoológico Municipal de Guarulhos foram organizadas em atividades principais do planejamento de estágio, tais como: ● acompanhamento na rotina de manejo dos animais, tanto para transferências de alguns indivíduos para outros recintos, como para realização de acompanhamento clínico veterinário; ● ambientação de recintos (nos casos de transferência, um recinto antes utilizado por uma espécie passa por um processo de nova ambientação, onde são colocados acessórios mais adequados para o novo morador); ● marcação individual e microchipagem de animais; ● atividades de reabilitação e soltura de fauna silvestre resgatada; ● condicionamento do comportamento para espécies inaptas para soltura; ● treinamentos de vôo para aves em processo de pré-soltura; ● atividades de rotina veterinária, planejamento e produção de atividades de enriquecimento ambiental; ● participação na elaboração de dietas animais e avaliação de consumo; ● procedimentos de biometria em mamíferos e répteis; ● vistoria de recintos para observação de necessidades dos animais e prevenção de problemáticas em seus tratamentos; ● monitoramento de primatas e observação de aves em saídas de campo; ● planejamento de atividades de manejo; 36 ● participação nas discussões de cada caso animal e pesquisas bibliográficas para contribuição com as atividades. 2.2.3.2 A rotina de estagiários O planejamento do mês de estágio, feito pelos supervisores, é organizado para atender a quatro etapas de atividades, sendo cada etapa realizada por cada estagiário pelo período de uma semana. Ou seja, cada semana do mês possui um enfoque temático e ocorre em ordens diferentes para cada estagiário (geralmente quatro estagiários por mês), de modo que cada um esteja realizando atividades em setores diferentes, mas de maneira integrada e ciente daquilo que os outros estão fazendo. Esse tipo de organização melhorou o desempenho dos estagiários durante o trabalho em equipe, além de ajudar em sua integração com a rotina e com os demais funcionários do zoológico. Dito isso, as temáticas das quatro semanas intercalam-se em: 1. Manejo de fauna e recintos, 2. Clínica veterinária, 3. Nutrição e avaliação de consumo e 4. Enriquecimento ambiental. É importante ressaltar que o tema educação ambiental não entra nessa organização, uma vez que os estagiários de educação ambiental são selecionados somente para realizar atividades de educação ambiental e são supervisionados por outro setor técnico voltado somente para estas, no entanto, os estagiários podem trocar experiências entre os setores e auxiliarem nas atividades uns dos outros, desde que priorizem as atividades às quais foram designados, para só então participarem de outras. Esse trabalho cooperativo é importante pois independentemente de estarem realizando atividades diferentes, os estagiários podem, durante o dia de trabalho, se envolver nas atividades de seus colegas, e assim cooperar e complementar positivamente numa atividade que não seja a sua, possibilitando um ambiente dinâmico e de maior aprendizado. 37 Sendo assim, as semanas de estágio desenvolveram-se de acordo com a seguinte ordem: 1. Manejo de fauna e recintos, 2. Clínica veterinária, 3. Nutrição e avaliação de consumo e 4. Enriquecimento ambiental, com atividades para serem executadas das 8h às 17h. Seguindo a lógica, os outros estagiários realizaram atividades com temáticas semanais em ordens diferentes. As atividades aconteceram de forma integrada ao longo das semanas, de modo que nem todos os manejos foram realizados na semana de mesmo tema de somente um estagiário, mas também nas semanas de manejo sob responsabilidade dos outros estagiários, obviamente organizados de modo a permitir a participação de todos os estagiários. A mesma lógica segue para as outras semanas temáticas: o calendário é seguido à risca, mas estão permitidas as participações nas atividades dos outros parceiros de trabalho. Assim, foram desenvolvidas, dentro dos temas, as seguintes propostas: 1. Manejo de fauna e recintos: As atividades de manejo requerem maior desempenho físico, trabalhos manuais e bastante empenho no planejamento de ambientação de recintos e transferências dos animais. As transferências envolvem tanto técnicas de manejo adequadas, transporte e movimentação de animais pelo espaço do zoológico como transporte de materiais pesados com auxílio de um carrinho elétrico, como troncos, espécies vegetais vivas, cortes de madeira, folhagem seca, feno, bambu, cipós, cordas, ferramentas de jardinagem, vasos, terra, entre outros materiais. Uma vez que a translocação de um ou mais animais para um novo recinto gera estresse nos mesmos, essa movimentação só ocorre em caso de reais necessidades, como por exemplo a de haver alguma alteração ou manutenção no espaço ocupado pelo animal, seja para reunir animais que antes estavam separados, seja no intuito de tentar parear casais para reprodução, sociabilizar um novo indivíduo a um grupo, proporcionar um espaço maior a um animal, aproximar 38 indivíduos de mesma espécie a fim de proporcioná-los enriquecimento social e cognitivo, otimizar espaços de recintos ou realizar manutenção e ambientação de um recinto para melhoria do espaço para uso do próprio animal. Ainda, as aproximações podem envolver indivíduos que nunca tiveram contato, o que significa acostumar os indivíduos um ao outro gradualmente em ambiente próprio para isso. No caso das ambientações, quando uma espécie é translocada para um recinto ocupado anteriormente por uma outra espécie, é preciso, antes da efetiva translocação, realizar no espaço uma espécie de “design” de interiores, ou seja, tudo que está dentro daquele recinto é analisado e, após essa análise, é decidido quais materiais podem ser reaproveitados, quais devem ser descartados e como serão dispostos para oferecer desafio motor e cognitivo ao animal sem risco de acidentes e sem reduzir seu espaço livre. Por exemplo: na translocação dos saguis-da-serra-escuros para o recinto antes pertencente aos sauins-de-coleira amazônicos, todo o material dos recintos destinados a essa espécie foi descartado por ser muito velho e deteriorado, mas também por não ser apropriado o suficiente ao comportamento desses primatas.Desta forma, foram instalados novos troncos, balanços de madeira e pontes de corda e cipó que permitiram a livre movimentação dos primatas pelo recinto e maior enriquecimento espacial e sensorial. Além disso, em cada recinto foram escolhidas plantas vivas para dar ao ambiente maior enriquecimento e cobertura. As plantas foram escolhidas de acordo com o comportamento do animais: para os sauins-de-coleira, cujo comportamento é mais ativo, explorador e mais agressivo, foram colocadas, num segundo recinto, plantas mais resistentes, enquanto que para os saguis, que são mais tranquilos, não houve a necessidade de selecionar com tanto rigor as plantas, já que estes indivíduos não costumam ter o hábito de arrancá-las. Os mesmos critérios foram utilizados para o planejamento dos recintos ambientados para alguns passeriformes, psitaciformes e columbiformes: foram pensados poleiros, plantas e outros recursos que pudessem ser instalados nos 39 recintos “voadeira”, a fim de proporcionar a esses animais um espaço para livre circulação e repouso de acordo com sua biologia. Em todos esses manejos, foi preciso planejamento e aprendizagem para lidar com técnicas de manejo e protocolos, evitando o estresse dos animais e acidentes de trabalho. Por exemplo: ao realizar movimentação de aves passeriformes e columbiformes, foi preciso rapidez e cuidado, pois são animais com maior sensibilidade a estímulos estressores, sendo sua captura rápida e com o uso de “pulsares” leves (ferramenta de rede ou malha para captura e manejo). Já para o manejo de rapinantes, foram utilizados pulsares mais resistentes. No caso de primatas, como saguis, sauins-de-coleira, micos-leões (tanto o de cara preta como o de cara dourada) e macacos-prego, foram utilizadas caixas de transporte metálicas. No caso de manejos com canídeos e pequenos e grandes felinos, como os lobos-guarás, os gatos-do-mato, os gatos-mouriscos e a onça-pintada, tendo em vista a dificuldade de acessá-los devido ao seu comportamento e ao propósito de seu manejo (procedimentos odontológicos e cirúrgicos), a fim de reduzir seu estresse, foi requerido o uso de anestesia para transportá-los e realizar cada um dos procedimentos. Ainda, foram pensadas outras maneiras de realizar os manejos dos animais, como por exemplo, maneiras alternativas de condicionar o animal a entrar e sair de caixas de transporte, diminuindo o estresse da contenção física ou química. Mais de uma transferências foram realizadas e planejadas pelos estagiários do mês junto de seus supervisores, e toda mudança de recinto foi calculada pensando nas necessidades de cada animal. Cada um desses planejamentos contribui para a formação do estagiário ensinando-o a olhar para cada animal de forma mais analítica e crítica, pensando nele como espécie e como indivíduo com comportamento e personalidade próprios. Assim, o momento de preparar um ambiente onde um animal vai passar parte de sua vida é um momento de definitivamente olhar para o animal e aprender sobre ele, de forma complementar ao conhecimento já descrito em literatura. 40 Resumidamente, o deslocamento de um animal entre recintos envolve: limpeza e reorganização do recinto novo de acordo com a biologia, ecologia e comportamento da espécie e temperamento dos indivíduos em si, e também envolve a ambientação do antigo recinto para o próximo animal que irá utilizá-lo. Assim, uma ambientação planejada proporciona a complexidade ambiental mais próxima do adequado dentro do que um ambiente de cativeiro pode oferecer, e algo além do básico que um animal precisa para sobreviver. A instalação de troncos, poleiros, vegetação e espaços cobertos mais fechados não são meramente paisagísticos, ou seja, possuem um papel funcional para a interação do animal com um ambiente mais rico, além de proteger o animal de distúrbios de temperatura e importunações humanas durante o horário de visitação do zoológico. 2. Clínica veterinária: Essa etapa consiste em acompanhar e executar atividades da clínica veterinária e, no caso dos estagiários de ciências biológicas, participar de atividades de suporte às atividades veterinárias. O trabalho realizado na clínica envolve não só controle da medicação dos animais em tratamento e outros procedimentos clínicos, como também o acompanhamento de animais em fase de amamentação, desmame, crescimento e animais que estão saindo da fase juvenil e passando para a fase adulta, controle de peso e escores corporais desses animais, treinamentos de vôo e locomoção, condicionamentos e anilhamentos. Além disso, a ala de quarentena onde são isolados animais doentes e que precisam de um lugar aquecido também faz parte da clínica. Na clínica, todos os dias são preparadas alimentações especiais para aves, mamíferos e répteis que precisem ganhar ou perder peso, ou que precisem de alimentação com suplementação ou medicação. Por exemplo, durante o mês de estágio, eram preparadas alimentações especiais para uma sauá (Callicebus nigrifrons) em fase de amamentação, um periquitão (Psittacara leucophthalmus) com 41 dificuldades de se alimentar sozinho (necessitava sonda), três gambás (Didelphis spp.) filhotes que precisaram ganhar peso para serem devolvidos à natureza, um maitaca-de-cabeça-azul (Pionus menstruus) com dificuldades respiratórias e motoras, passeriformes em fase pré-soltura, um sagui-da-serra-escuro com problemas de estresse, um papagaio-verdadeiro com problemas de perda de penas, dois periquitões-maracanãs filhotes, um falcão-peregrino com um pé machucado e dois ouriços-cacheiros que, posteriormente, foram aproximados de um terceiro ouriço fêmea num novo recinto. As alimentações especiais são preparadas na clínica com rações trituradas, suplementos alimentares, leites em pó e farinhas lácteas, de acordo com a dieta de cada animal, e envolvem um controle de horários mais rígido, muitas vezes por conterem medicamentos inseridos, além de haver controle e acompanhamento diários da evolução desses animais, sendo seus dados mais relevantes de avanço no tratamento anotados em fichas. Esses dados envolvem dados de ganho ou perda de peso, quantidade de alimento oferecida e consumida, dosagem de remédios e suplementos ofertados na comida, métodos de oferta de alimento, data, horário e nome de quem realizou a tarefa. Assim, com esse controle, torna-se mais fácil a tomada de decisão para liberar um animal para soltura em ambiente natural ou apenas fazer sua translocação para recintos com funções diferentes, como os recintos de exposição do zoológico (animais inaptos para soltura), para um recinto com função de pré-soltura (animais que ainda precisam de continuidade no processo de reabilitação e treinamentos específicos) onde permanecem aqueles animais que não necessitam cuidados clínicos diários. Na clínica, além do controle de peso e alimentação de alguns animais selecionados, são realizadas outras atividades como treinamentos de voo para aves de pequeno porte em reabilitação, como a andorinha-de-casa-pequena (Pygochelidon cyanoleuca), inalações, anilhamento de aves, microchipagem de animais em fase pré-soltura, coletas de sangue, processos de amamentação e 42 desmame para filhotes de mamíferos criados sem seus progenitores, avaliações clínicas de rotina, procedimentos como raio-x, cirurgias, procedimentos odontológicos e outros. Durante procedimentos cirúrgicos que levem anestesia geral, é possível realizar simultaneamente ao trabalho dos veterinários, tarefas como medições biométricas para fins de controle de escore corporal de cada espécie e controle de fichas individuais dos animais. Todas essas tarefas são realizadas com a ajuda ativa dos estagiários, e não somente sua participação como telespectadores, o que ajuda a desenvolver senso de autonomia em atividades que provavelmente necessitarão realizar por conta própria ao longo de sua vida profissional. Durante as atividades na clínica veterinária, foram acompanhados procedimentos clínicos, cirúrgicos e odontológicos nos seguintes animais: lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), onça-pintada (Panthera onca), gato-do-mato (Leopardus tigrinus), gato-doméstico (Felis catus), gambá (Didelphis sp.), falcão-peregrino (Falco peregrinus), urubu-rei (Sarcoramphus papa), maitaca-de-cabeça-azul (Pionus menstruus), periquitão-maracanã (Psittacara leucophthalmus), macaco-prego (Sapajus sp.) e algumas serpentes. 3. Nutrição e avaliação de consumo: A semana da nutrição consiste em acompanhar o planejamento e preparação da alimentação diária dos animais. Acompanhar a preparação das dietas faz parte do processo de entender a necessidade nutricional de cada indivíduo ou espécie e a relação da mesma com a biologia, hábitos de vida e alimentares de cada animal como espécie e também, no caso de animais de cativeiro, como indivíduos: quanto aquele animal precisa comer; o que ele precisa comer; como ele interage com seu alimento; de que maneira seria melhor ofertar o alimento para aquela espécie; como incentivar um processo de alimentação mais complexo em que o animal interaja com a comida e não só coma rapidamente (enriquecimento alimentar), como reduzir casos de imprinting alimentar, entre outros planejamentos. 43 A alimentação dos animais é organizada em fichas de cardápio para cada espécie mantida no zoológico, e é modificada parcialmente ao longo dos dias da semana a fim de proporcionar uma maior variedade de alimentos nas dietas. Todos os animais, sejam carnívoros, herbívoros ou onívoros, possuem ficha própria com especificação de cardápio, a qual é seguida pelos tratadores na cozinha do zoológico, oferecendo aos animais uma dieta equilibrada e adequada. Todas as semanas são realizadas avaliações de consumo de um grupo específico de animais, a fim de saber o quanto aqueles animais estão comendo a partir do que está sendo ofertado, e assim reavaliar uma possível mudança de dieta, conforme se fizer necessário. Durante a semana de avaliação de consumo foram avaliadas as dietas dos pequenos primatas do zoológico, sendo estes: saguis-da-serra-escuros (Callithrix aurita), saguis-de-tufo-branco (Callithrix jacchus), sauás (Callicebus nigrifrons), micos-leões-da-cara-dourada (Leontopithecus chrysomelas), micos-pretos (Leontopithecus chrysopygus) e sauins-de-coleira (Saguinus bicolor), sendo estes todas as espécies de primatas da instituição, com exceção dos bugios-ruivos (Alouatta guariba clamitans) e dos macacos-barrigudos (Lagothrix spp), que não entraram para o grupo que estava sob avaliação de consumo naquela semana. Sendo assim, suas respectivas dietas foram ofertadas todos os dias pela manhã pelo período de uma semana, e recolhidas ao final da tarde para serem pesadas as sobras (individualmente) de cada tipo de alimento presentes em suas bandejas de alimento individuais, por exemplo (valores simbólicos): beterraba total 140g - sobra: 120g; ração de primatas - total 140g - sobra: 140g; etc. Assim, a partir dessa análise feita por cada estagiário pelo período de uma semana, pôde-se avaliar a possibilidade de mudanças na dieta dos primatas, o que possibilitou dados, por exemplo, para solicitação da troca do tipo de ração oferecida para esses animais, entre outras mudanças, pela veterinária responsável. 44 4. Enriquecimento ambiental: A semana de enriquecimento ambiental consiste no planejamento de alvos de interação para os animais, de modo a proporcionar um ambiente com maior complexidade e que estimule funções cognitivas, sociais, físicas, sensoriais e alimentares. A função do enriquecimento é, a grosso modo, dar ao animal algo com o qual se entreter e utilizar de suas capacidades cognitivas, motoras e sensoriais, exercer seus graus de sociabilidade e vivenciar um ambiente que possa aproximá-lo de seu comportamento natural, ou o que seria similar ao seu comportamento em vida livre. Ou seja, “trata-se de manter os animais cativos ocupados, melhorando seu ambiente e diversificando as oportunidades comportamentais” (Sgai; Pizzutto; Guimarães, 2010, p.93). Sendo assim, o enriquecimento pensado e instalado todas as semanas nos recintos dos animais mantidos em cativeiro no zoológico de guarulhos, é formulado de acordo com os hábitos e comportamentos de cada espécie, afim de que sejam colocados atrativos adequados que os façam realmente interagir com aquele objeto e/ou ambiente. Esses atrativos podem ser brinquedos confeccionados com materiais atóxicos que estimulem a investigação, a função cognitiva (exercer um raciocínio para interagir com o objeto); a procura por comida (por exemplo: caixas de papelão com comida escondida dentro, pinhões para araras, tubos com furos e ração dentro para tamanduás, etc). O importante é gerar a possibilidade de interação do animal com os elementos presentes no meio de uma maneira diferente da qual o indivíduo está acostumado, estimulando também sua curiosidade e independência. Dessa forma, a semana na qual o estagiário fica responsável pelo enriquecimento é um momento adequado para olhar para o comportamento do animal como um todo, entender mais sobre aquele grupo, espécie e indivíduos, desenvolvendo atividades que sejam atrativas para os mesmos, sempre pensando nos tipos de materiais que podem ou não ser usados de acordo com o que pode ou 45 não ser prejudicial para o animal, por exemplo: utilizar-se de materiais que não dão problema ao serem digeridos (uma vez que um animal digerir algo que não deveria é uma possibilidade), não usar cordas para animais que podem se enroscar ou digerí-las, causando problemas passíveis de intervenção cirúrgica, entre outras problemáticas possíveis, como intoxicação por consumo de plantas inadequadas. As atividades de enriquecimento são realizadas para todos os animais do zoológico, sem exceção, cada qual direcionada de acordo com a classificação de grupo e espécie. Ao longo do mês de estágio, cada estagiário confeccionou, por uma semana, distintos materiais para grupos diferentes, de modo que ao longo do mês todos os animais do zoológico fossem atendidos. Os enriquecimentos dispostos na última semana de estágio foram direcionados para mais de um grupo. Foram eles: Aves: carcará (Caracara plancus), gavião-carijó (Rupornis magnirostris), gavião-carrapateiro (Milvago chimachima), mocho-orelhudo (Bubo virginianus), coruja-suindara (Tyto furcata), urubu-rei (Sarcoramphus papa), ema (Rhea americana), tucanuçu (Ramphastus toco), tucano-de-bico-verde (Ramphastus dicolorus), jacutinga (Aburria jacutinga), papagaio-de-peito-roxo (Amazona vinacea), anacã (Deroptyus accipitrinus), jandaia-mineira (Aratinga auricapillus), maracanã-do-buriti (Orthopsittaca manilatus), maracanã-nobre (Diopsittaca nobilis), maitaca-de-cabeça-azul (Pionus menstruus), papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva), arara-azul (Anodorhynchus hyacinthinus), arara-vermelha (Ara chloropterus), arara-canindé (Ara ararauna), periquitão (Psittacara leucophthalmus), tiriba-de-testa-vermelha (Pyrrhura frontalis), periquito-rico (Brotogeris tirica), periquito-de-encontro-amarelo (Brotogeris chiriri), maitaca-verde (Pionus maximiliani); Mamíferos: mico-preto (Leontopithecus chrysopygus), mico-leão-de-cara-dourada (Leontopithecus chrysomelas), sagui-da-serra-escuro (Callithrix aurita), sagui-de-tufo-branco (Callithrix jacchus), sauá (Callicebus nigrifrons), sauim-de-coleira (Saguinus bicolor), bugio-ruivo (Alouatta guariba clamitans), macaco-prego (Sapajus spp.) e macaco-barrigudo (Lagothrix spp), 46 onça-pintada (Panthera onca), suçuarana (Puma concolor), leão (Panthera leo), jaguarundi (Puma yagouaroundi), gato-maracajá (Leopardus tigrinus), lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), quati (Nasua nasua), anta (Tapirus terrestris), veado-catingueiro (Subulo gouazoubira), furão (Galictis cuja), paca (Cuniculus paca), e tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla). Foram confeccionados aparatos como: móbiles de pano e cipó para psitacídeos, tubos de papelão com ração dentro para tamanduás, sacos de papel com tenébrios dentro para quatis, sacos de papel com pedaços de carne dentro para rapinantes, trouxas de feno com ovos cozidos dentro para tucanos, biscoitos de ração e banana para pequenos primatas (os biscoitos foram espalhados pelos troncos dentro dos recintos), tubos de papelão com ração para macacos-barrigudos, bolas de feno com capim e pó de canela para leões, suçuaranas e onça, caixa de papelão cheia de feno com rato escondido dentro para lobos-guarás, bolas de feno com essência de patchouli para gatos-maracajás e jaguarundis, folhas verdes de bananeira para a anta, entre outros aparatos. Todos os enriquecimentos foram pensados pela veterinária responsável, com ajuda dos estagiários, para serem desenvolvidos em conformidade com o animal em questão, estimulando a busca por alimentos e interação com objetos novos no meio, mas de forma responsável sem causar uma situação onde os animais pudessem se machucar. 2.2.3.3 Observações Durante todas as semanas, foram realizados manejos de diferentes animais, tais como mamíferos (felídeos, canídeos, didelfídeos, erinaceídeos, tapirídeos, xenartros, cervídeos e algumas famílias de primatas), répteis (quelônios e 47 serpentes) e aves (anseriformes, psittaciformes, piciformes, passeriformes, columbiformes, galliformes, cuculiformes e accipitriformes), permitindo a aprendizagem de conhecimentos de ciências biológicas e veterinários a todos os estagiários. Outros animais manejados, além dos mencionados ao longo do texto, foram: gambás (Didelphis spp), pombas asa-branca (Patagioenas picazuro), anus-brancos (Guira-guira), bem-te-vis (Pitangus sulphuratus), sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris), sabiá-barranco (Turdus leucomelas), falcão-peregrino (Falco peregrinus), ganso-doméstico (Anser domesticus), ouriço-cacheiro (Coendou spinosus), corujinha-do-mato (Megascops choliba), cágado-pescoço-de-cobra (Hydromedusa tectifera). Além disso, os estagiários ficaram responsáveis por realizar o condicionamento de comportamento com alguns primatas, tais como sauás, bugios e micos-leões-da-cara-preta, e aves como a andorinha, utilizando-se de bastonetes, clickers, tenébrios e malvaviscos (família Malvaceae, mesma do hibisco). Todos os manejos foram realizados com equipamento de proteção e orientação dos supervisores. Os animais do zoológico são divididos em setores, aqueles que não ficam na exposição do parque, permanecem na área restrita, distribuídos em recintos da clínica, da quarentena ou na área externa restrita aos funcionários e estagiários chamada de corredor extra, onde os visitantes não têm acesso. Nessas áreas, ficam animais em tratamento ou que ainda não estão aptos para soltura ou não possuem destino adequado, e também animais que necessitam permanecer isolados dos outros por motivos patológicos ou comportamentais. Já os animais da exposição são divididos em setores que os distinguem em répteis, aves, aves rapinantes, mamíferos de grande, médio e pequeno porte. 48 2.2.3.4 Atividades extras Ainda, foram oferecidas aos estagiários oportunidades para participar de atividades para além das atividades convencionais de rotina do zoológico, como a realização de acompanhamento em trilhas nos núcleos da região do Contínuo Cantareira Itaberaba, que engloba duas Unidades de Conservação (UCs): o Parque Estadual do Itaberaba e o Parque Estadual da Cantareira, sendo a atividade realizada por uma equipe do zoológico juntamente com uma equipe da Fundação Florestal de São Paulo. As trilhas são feitas em trabalho conjunto com parte da equipe da Fundação Florestal para realização do Programa de Monitoramento da Biodiversidade, desenvolvido no estado de São Paulo em parceria com o ICMBio, que desenvolveu também o Programa Monitora para monitoramento de unidades de conservação federais. No caso da equipe do zoológico junto à Fundação Florestal, o enfoque é dado ao monitoramento de primatas, como saguis e sauás, mas durante as trilhas é possível avistar diversas espécies de aves, mamíferos, plantas e fungos, além de diversos registros de atividade biológica de outros animais, como pegadas de suçuarana adultas e filhotes, escavações de mamíferos na terra, fragmentos de mata alterados pela movimentação de mamíferos de médio e grande porte, pegadas de aves, frutos com marcas de mordidas, entre outros registros. 49 2.2.4 Fundação Mamíferos Aquáticos 2.2.4.1 Resumo de atividades desenvolvidas Para contextualização inicial dentro do ambiente de estágio, houve apresentação, por parte da Fundação, de material bibliográfico fundamental, ou seja, aquele utilizado como fundamento para as ações, projetos e formulação dos saberes básicos acerca do tema no qual se insere o estágio, além de material em vídeo apresentando o histórico da Fundação e seus valores profissionais e éticos. Compondo as atividades realizadas no que compete à unidade da Fundação estabelecida na Barra do Rio Mamanguape estão, resumidamente: ● atividades de monitoramento de mamíferos aquáticos em diferentes municípios dentro da Paraíba, focado em peixes-bois e botos-cinzas; ● atividades de reflorestamento; ● estratégias de educação ambiental em comunidades tradicionais e comunidades indígenas; ● atendimento ao encalhe de animais (vivos e mortos) nos litorais paraibanos; necropsias; ● atividades de fomento ao turismo de base comunitária para a geração de renda para as comunidades tradicionais litorâneas; ● parcerias com outras instituições, como ICMBio, na elaboração de projetos para a preservação da biodiversidade e promoção de educação; ● apoio e parcerias com universidades, contribuindo para a formação acadêmica de estudantes em diversas áreas ambientais; ● aprendizagem relacionada aos equipamentos de coleta de dados em campo, metodologias de coleta de dados e preenchimento de planilhas; 50 ● início de desenvolvimento de metodologia dentro de manguezais para avaliação do impacto do turismo no mangue; ● avaliação da interação humana com animais marinhos, com enfoque em mamíferos; ● teste de equipamento para emissão de coordenadas em embarcação; contato básico com programas de geoprocessamento; ● acompanhamento de palestras e atividades de outros profissionais da área da conservação ambiental. 2.2.4.2 Monitoramento de peixes-bois marinhos (Trichechus manatus) No que se refere ao monitoramento dos peixes-bois marinhos, espécie alvo principal da equipe, existem duas relações de dados para o preenchimento de planilhas e uma metodologia padrão quanto ao tempo de observação, sendo esta última a que estabelece que a cada 1 hora deve-se realizar 15 minutos de observação e preenchimento de planilha relativo ao animal (se avistado), nas situações em que o animal estiver livre de interações humanas e/ou com peixes-bois nativos. Já em contextos em que uma, ou as duas categorias de interações estiverem ocorrendo, a observação e preenchimento de dados na planilha deve ser sem pausas. Ambas as planilhas dispõem de dados básicos como: data, horário de início, horário de término, tempo total de esforço, tábua de maré do dia, rádio (no que se refere ao dispositivo de localização por coordenadas que pode ou não estar preso ao animal monitorado), nome e sexo do animal, visibilidade da água e condições climáticas do dia. Também dispõem de dados fundamentais que são anotados independentemente de ocorrer ou não avistagem do peixe-boi, como horário de chegada ao ponto de observação, nome do ponto de observação e acurácia. 51 A acurácia é um dado disposto em siglas que descrevem a situação de avistamento do animal, ou seja, se o animal está com ou sem rádio ou outros acessórios de marcação individual, se foi ou não localizado, se foi localizado com avistagem, por captação de sinal de rádio ou por informação falada, se foi captado o sinal de seu rádio mas sem avistamento ou se foi avistado o animal sem rádio. No caso de ocorrência de avistamento, a planilha passa a ter, além dos dados mencionados anteriormente, incluindo a acurácia, o horário de avistamento, as coordenadas de posicionamento do animal obtidas com GPS, dados de padrão comportamental do mesmo, as interações (humanas ou animais) que podem ou não estar ocorrendo e que descrevem alguns comportamentos mais comuns a essas duas categorias, a distância preamar e a profundidade (quando conhecida) em que se localiza o animal, o tipo de alimentação (no caso de ocorrência de comportamento alimentar do animal), se há ou não público (banhistas e embarcações), e observações excedentes feitas pelos observadores, desde que possuam características cujo enquadramento não ocorra em nenhuma das outras categorias de dados. Os dados citados, como mencionado anteriormente, são competentes às duas planilhas de monitoramento de peixes-bois, no entanto, em uma delas há dados complementares que competem às interações humanas na presença ou ausência de embarcações com o animal, tais quais: quantidade de embarcações turísticas, quantidade de público no que se refere aos banhistas turistas, tempo de interação de uma ou mais embarcações com o animal e a distância das embarcações em relação ao mesmo. Esses dados são utilizados para análises da interferência humana e turística em relação ao padrão comportamental dos animais monitorados e sua qualidade de vida. Os monitoramentos ocorrem em diferentes locais ao longo da semana. Nos dias da semana em que ocorrem monitoramentos de peixe-boi na Barra do Rio Mamanguape, dentro do estuário e seus rios, as saídas a campo são realizadas pela 52 equipe da Fundação junto à equipe da APA (Área de Proteção Ambiental) da base do ICMBio com embarcação motorizada. Enquanto isso, nos dias de monitoramento em outras cidades da Paraíba, especialmente Cabedelo, as saídas a campo são realizadas de carro, na maioria das vezes com membros da APA ICMBio, mas não sempre. Os locais de monitoramento são escolhidos com base nas áreas de uso dos animais monitorados e seus sítios de fidelidade (locais de preferência dos animais). Os horários de monitoramento ocupam períodos ao longo do dia todo, dentro do período das 8h às 17h (em situações comuns), incluindo nesse período os tempos de deslocamento ao sair e ao retornar para a base da FMA na Barra do Rio Mamanguape. Em relação aos peixes-bois monitorados durante o período de estágio, foram monitoradas as fêmeas Zelinha (com equipamento transmissor de sinal de localização) e Mel (sem equipamento de transmissão), e os machos Puã (sem transmissor) e Favo (sem transmissor) que é o filhote da Mel, ainda em fase de amamentação. Dentre os monitorados pela unidade FMA da Barra do Rio Mamanguape, os únicos peixes-bois reintroduzidos atualmente monitorados que habitam o estuário do Rio Mamanguape e Rio Camurupim são as fêmeas Zelinha e Yara. Enquanto que Mel, Favo e Puã habitam as regiões do município de Cabedelo, frequentando o Rio da Guia (braço do Rio Paraíba, chamado Rio da Guia em referência à igreja de Nossa Senhora da Guia, pelos locais) e seu estuário. Além desses, também houve um dia de monitoramento particular e excedente à rotina, no qual foi monitorado no município de Baía da Traição - PB, o peixe-boi Gabriel, que não é monitorado pela Fundação Mamíferos Aquáticos mas pelo PCCB/UERN (Projeto Cetáceos da Costa Branca/Universidade Estadual do Rio Grande do Norte). Nesse caso, o peixe-boi se deslocou rapidamente, partindo do Rio Grande do Norte até a Paraíba, e a equipe FMA, que estava mais próxima, acompanhou o animal até a chegada da equipe PCCB/UERN, que permanece 53 monitorando o deslocamento do animal no litoral da Paraíba, com o mesmo indo cada vez mais em direção ao sul. 2.2.4.3 Observações acerca do monitoramento de peixes-bois A etapa de monitoramento dos peixes-bois marinhos consiste em um processo de manutenção do extenso trabalho preparatório que ocorre antes da soltura e monitoramento de um animal reintroduzido. Esse trabalho consiste em todo planejamento teórico-técnico para estabelecer um plano de resgate, reabilitação, cuidados veterinários, reintrodução e soltura que possa ser padronizado e executado. Em ordem lógica, o trabalho de reintrodução de peixes-bois da equipe começa quando ocorre um encalhe (geralmente de filhotes) de um animal vivo. Segundo a AQUASIS (2016): Os mais vulneráveis aos encalhes são os filhotes, pois para as fêmeas grávidas ou em trabalho de cuidado parental, a perda de habitat estuarino gera dificuldade de mantê-los abrigados de correntes marítimas, das quais são vítimas quando a fêmea não consegue encontrar esse espaço seguro oferecido pelo estuário para parir ou permanecer com seu filhote. Assim, é comum que os encalhes de animais vivos dos quais a equipe se encarrega sejam de filhotes de peixe-boi marinho. No que precede aos encalhes, “...é necessário que as instituições procurem manter uma boa relação com as comunidades onde estão realizando atividades, além de frequentes trabalhos de educação ambiental…” (Attademo et al., 2022). Esse é um ponto importante, uma vez que em maioria de vezes, é a população quem aciona as instituições quando há ocorrência de animais encalhados ao longo das cidades litorâneas. Além disso, a manutenção de programas de educação ambiental e campanhas, realizadas pela equipe, acaba por sensibilizar a população para com a causa. 54 Dito isso, há todo um processo envolvido no resgate desses animais, e que é fundamentado em livros base, como o “Protocolo de Atendimento a Peixes-Bois Encalhados e Transporte de Filhotes”, o “Protocolo de Soltura e Monitoramento de Peixes-Bois” e o “Protocolo de Reintrodução de Peixes-Bois Marinhos no Brasil”, sendo os dois primeiros desenvolvidos pelo CMA (Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Mamíferos Aquáticos) do ICMBio/MMA, e o último desenvolvido pelo ICMBio e IBAMA. Já o livro “Peixe-Boi-Marinho: Biologia e Conservação no Brasil”, também utilizado como base teórica, foi desenvolvido pela ONG Aquasis. Após o resgate e transporte adequado do animal encalhado, os filhotes recebem o atendimento necessário no CMA, também chamado de Centro Mamíferos Aquáticos, em sua unidade especializada em reabilitação na Ilha de Itamaracá/PE. Após todo o processo de reabilitação que compete à equipe habilitada do CMA/ICMBio, o animal pode ser novamente transportado ao cativeiro em ambiente natural sob responsabilidade da Fundação Mamíferos Aquáticos, na região estuarina da Barra do Rio Mamanguape. Realizado este processo, os animais aptos à soltura são liberados em áreas determinadas em seu ambiente natural, após instalação de seu equipamento de localização desenvolvido sob medida para cada animal, que envolve tanto os cintos de nadadeira caudal de cada um, como o equipamento de telemetria satelital inseridos no housing/boia acoplados a ele pelo cabo de um metro e meio chamado tether. O conjunto de telemetria foi pensado para ser adaptável ao modo de vida dos peixes-bois e ao seu ambiente de vida, ou seja, boias e tethers desenvolvidos de acordo com a profundidade atingida pelos animais, ao tipo de água (uma vez que a água salgada impede a transmissão de sinal de satélite, e por isso a necessidade da boia e tether que permitem que o aparelho fique por mais tempo na superfície da água) e também nas interações antrópicas de pesca, isto é, na construção dos cintos e tethers do equipamento são desenvolvidos pontos de quebra frágeis e 55 suscetíveis à força do animal, ou seja, quando o mesmo se depara com uma situação de emalhamento em qualquer tipo de equipamento de pesca ou quaisquer outras situações onde ele se veja enroscado, o cinto pode ser quebrado pela força bruta exercida pelo animal ao tentar soltar-se, facilitando sua fuga. O uso desse tipo de sistema para o monitoramento foi um grande passo no programa de conservação dos peixes-bois, uma vez que “…o monitoramento permite aferir se o animal está se adaptando e conseguindo viver no seu habitat natural, sem necessidade de fornecimento de alimentos e cuidados que vinham recebendo no cativeiro…” (Luna et al., 2021). Até o início do projeto nomeado “Telemetria Satelital - Desenvolvimento e difusão de tecnologia inovadora aplicada ao monitoramento satelital e conservação dos peixes-bois-marinhos”, não havia equipamento adequado de telemetria para peixes-bois marinhos no Brasil, de modo que esses eram estritamente importados, dificultando as etapas e idealizações para o programa de reintrodução dos peixes-bois. Assim, o desenvolvimento de equipamentos nacionais de telemetria utilizando tecnologia GlobalStar foi crucial para o desenvolvimento dos projetos, possibilitando o monitoramento, localização, identificação de áreas de uso, padrão espacial e distribuição geográfica dos animais bem como facilitando o acesso da equipe ao animal para garantir estabilidade em sua qualidade de vida. Dois tipos de tecnologia são utilizadas para o desenvolvimento dos dispositivos inseridos nos housings/boias com os quais os peixes-bois são equipados no momento da soltura: a tecnologia VHF Satelital e a tecnologia IoT (mais recente), ambas cumprindo o mesmo propósito, mas com diferentes custos e diferentes forma de cobertura (Fundação Mamíferos Aquáticos, 2023). 56 2.2.4.4 Monitoramento de botos-cinzas (Sotalia guianensis) Outra espécie de relevância ecológica dentro do ambiente estuarino são os Botos-Cinzas. Essa é uma espécie conhecidamente avistada ao longo de todo o ano em áreas costeiras, principalmente em baías, estuários e águas rasas (IUCN, 2023). Os indivíduos dessa espécie utilizam-se desses ambientes para se alimentar, se reproduzir e cuidar de seus filhotes, assim como os peixes-bois, e são animais sentinelas ambientais, ou seja, bioindicadores (LEC - Laboratório De Ecologia e Conservação/UFPR,