1 ”AVALIAÇÃO DE UMA PROPOSTA FORMATIVA USANDO A INVESTIGAÇÃO: UM ESTUDO COM BASE NOS DISCURSOS E ATUAÇÃO DE UM GRUPO DE LICENCIANDOS EM QUÍMICA”. Ana Silvia Carvalho Ribeiro Gomes Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”- Unesp; Faculdade de Ciências-FC Eixo Temático: Formação inicial e continuada de professores para a educação básica. OBJETIVOS O presente trabalho tem por objetivo principal, identificar convergências e divergências entre o discurso e a prática de licenciandos em relação ao ensino por investigação. Podemos então traçar os seguintes objetivos: Objetivo geral: - Comparar os discursos dos licenciados e sua prática numa atividade investigativa. Objetivos específicos: - Analisar qual a concepção dos licenciandos já expostos à proposta investigativa a respeito de sua utilização na elaboração dos minicursos. - Analisar através da aplicação dos minicursos, como essas concepções se refletem na prática. METODOLOGIA No presente trabalho o método de pesquisa adotado é o qualitativo, que se preocupa com a análise dos fenômenos. A palavra fenômeno vem da expressão grega fainomenon e deriva do verbo fainestai que é o mesmo que dizer aquilo que se mostra, que se manifesta. A pesquisa qualitativa é entendida, segundo Martins (1994), como uma modalidade onde se busca uma compreensão, entendida como uma capacidade própria do homem compreender, daquilo que se estuda, não se preocupando com generalizações, princípios e leis. Nela, a generalização é posta de lado e o foco da atenção volta-se para o específico, o peculiar, o individual, sempre buscando a compreensão e não a explicação dos fenômenos estudados (MARTINS, 1994). 0443 2 De acordo com Neves (1996), o método qualitativo de pesquisa não enumera nem mede eventos e geralmente, na análise de dados não utiliza nenhum recurso estatístico. Seu foco de interesse é mais amplo diferenciando-se assim de análises quantitativas. A ausência de um roteiro pré-estabelecido que leva a generalizações é importante característica desse tipo de metodologia, sendo assim a teorização dedutiva não existe nas análises qualitativas (MARTINS, 1996). Segundo Manning, (1979) e Martins (1996), o trabalho de descrição é fundamental no estudo qualitativo, pois é por meio dele que os dados são obtidos, onde o pesquisar mantém contato direto e interativo com o objeto ou situação estudada. Através disso, o pesquisador procura entender os fenômenos, segundo a perspectiva dos participantes da situação que está sendo analisada, e partir dai expressa sua interpretação do objeto em estudo. A pesquisa qualitativa é definida por Maanem, (1979) : Compreende um conjunto de diferentes técnicas interpretativas que visam descrever e codificar os componentes de uma sistema complexo de significados. Tem por objetivo traduzir e expressar o sentido dos fenômenos do mundo social; trata-se de reduzir a distância entre indicador e indicado, entre teoria e dados, entre contexto e ação ( p. 520). Segundo Godoy (1995), os trabalhos qualitativos podem ser identificados por um conjunto de características que enumera, a saber: (1) O ambiente natural como fonte de dados do pesquisador (2) O caráter descritivo (3) O significado que as pessoas atribuem às coisas e a suas vidas como preocupação do investigador (4) Enfoque indutivo (NEVES, 1996). O modelo descritivo foi utilizado para analisar e interpretar dados do presente trabalho e a característica que será analisada refere-se ao significado que os sujeitos atribuem às vivencias observadas. Os objetivos desse modelo são situar, especificar, categorizar e proporcionar uma visão do contexto que está sendo estudado. 0444 3 Os dados foram obtidos através da observação, entrevistas semiestruturadas, com questões pré-estabelecidas (Apêndice A), gravados em forma de áudio e transcritas posteriormente (Apêndice B) e gravações em vídeo que auxiliaram na análise de tais dados. Os sujeitos da investigação são alunos do último ano do curso de Licenciatura em Química que cursavam a disciplina obrigatória de Estágio Supervisionado em Ensino de Química II. O processo de análise envolveu a leitura das respostas obtidas das entrevistas, categorização destas, seguidas de trechos das falas dos licenciandos, onde, por sua vez foram confrontados com os dados obtidos pela observação e gravação em vídeo. Nos próximos tópicos podem ser encontrados detalhes como o papel da proposta na disciplina de estágio supervisionado, bem como o processo da análise de dados. Organização e Análise dos dados A análise dos dados foi produzida com base na técnica análise de conteúdo, proposta por Bardin (1995 apud Freitas, Cunha Jr. e Moscarola 1996). Consiste na leitura detalhada do material transcrito, identificando palavras ou grupo de palavras que tenham significado para a pesquisa, bem como a classificação em categorias que possuam semelhança quanto ao critério sintático ou semântico. Berelson apud Bardin (1995) define a análise de conteúdo como sendo uma “técnica de pesquisa para descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto das comunicações tendo por objetivo interpretá-las”. A presente pesquisa tem enfoque predominantemente qualitativo, porém indicadores quantitativos foram utilizados para ressaltar os índices mais frequentes nas falas dos licenciandos. Os dados foram obtidos através de entrevista semiestruturada, ou seja, foi direcionada por um roteiro previamente elaborado, composto por questões abertas. A entrevista semiestruturada permite uma organização flexível e ampliar as perguntas à medida que o entrevistado fornece informações (Fujisawa, 2000 apud Belei et al., 2008). 0445 4 Segundo Dessem e Borges (1998) Apud Belei et al. (2008) é interessante a utilização de mais de um recurso para que se desenvolvam pesquisas estruturadas, através de uma coleta de dados mais ampla, facilitando a compreensão do fenômeno estudado e sendo possível obter maiores informações. Concordando com esses autores, foi feita a observação minuciosa das atividades pesquisadas, tornando-a sistematizada através de gravações em vídeo, onde a análise baseada na investigação tornou-se mais fidedigna. A observação do pesquisador foi uma importante ferramenta de coleta de dados, pois este juntamente com os registros em vídeo foram confrontados com a análise das entrevistas aos licenciandos. Isto permitiu uma análise minuciosa da situação investigada. De acordo com Pinheiro, Kakehashi e Ângelo, 2005, a filmagem reduz muitos aspectos que por ventura venham a interferir na fidedignidade da coleta de dados. Ao contrário da observação em tempo real, o vídeo permite sua análise quantas vezes forem necessárias, tornando o processo de análise mais aprofundado (BELEI, et al, 2008). O vídeo permite também a ampliação, a transformação das qualidades, das características e particularidades do fenômeno observado. “A imagem oferece á pratica da observação e descrição um melhor suporte, um novo olhar” (Mauad, 2004 apud BELEI et al., 2008) Bardin (1995) apresenta a análise de conteúdo em três fases fundamentais: a pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados. O processo de tratamento do material contou com quatro etapas. A primeira vem a ser a definição da unidade de significados, que tiveram como fonte, neste caso, as questões das entrevistas com os licenciandos (Apêndice A). A segunda constituiu a determinação das categorias, que são trechos que contém características em comum. Cada categoria foi definida conforme a intersecção entre as respostas das entrevistas. Ainda, a terceira foi a análise e discussão das questões, mostrando as respostas mais relevantes ou frequentes. 0446 5 Por fim, a quarta etapa constituiu em confrontar as análises das entrevistas com os fatos observados através da gravação em vídeo. DISCUSSÃO DOS DADOS Com relações as características necessárias para aplicar a proposta investigativa, três diferentes respostas puderam ser observadas nas falas dos alunos: identificar conhecimento prévio dos alunos, iniciar aula com situações problemas e questionar acerca dos experimentos. Dentre as respostas, a ideia mais frequente é de que a proposta tem que se iniciar com uma questão ou uma situação problema para que os próprios alunos possam investigar. Isso pode ser percebido nas falas dos licenciandos quando dizem: [...] acho que é muito importante começar com uma questão problema [...]” [Roberta, questão 1] e “[...] é abordar o tema de forma intrigante, por exemplo, fazendo perguntas interessantes que estejam ligadas ao dia-a-dia [...]” [Maria, questão 1]. Concordamos com Cañal, Pozuelos e Travé (1997), que afirmam que a natureza do ser humano é sentir curiosidade, explorar, conhecer, refletir e transformar a realidade, e neste sentido a proposta investigativa incorpora este potencial cognitivo na aulas, “e promovem que alunos e professores perguntem, averiguem, vejam, analisem, estudem e compreendam” situações e problemas de interesse para ambos, de forma que assim se construa seus conhecimentos (SCHNETZLER, 1995, AZEVEDO, 2004, WILSEK e TOSIN, 2009). Com relação às dificuldades de implementação da proposta, três respostas podem ser destacadas: falta de treinamento dos professores, dificuldade de elaboração de uma questão problema, indisponibilidade de tempo e trabalhar experimentação em sala de aula. Dentre as quais cada aluno licenciando deu ênfase a cada uma delas, não existindo uma dificuldade unânime entre eles, já que a amostra de alunos investigados era reduzida. Todas estas dificuldades parecem ser frutos da inexperiência profissional e com a metodologia empregada, o que afeta diretamente no seu desenvolvimento. Isto pode ser evidenciado pela seguinte resposta: 0447 6 “[...] a maior dificuldade é de acertar o “ponto” onde queremos que os alunos cheguem, porque para isso temos que usar uma linguagem que eles entendam [...]” [Pedro, questão 2]. Esta polêmica em torno dos aspectos positivos e negativos da proposta investigativa, mostra segundo Cañal (2000), a necessidade que se tem de aprofundar a análise de experiências de ensino com enfoque investigativo. É justamente o que trata o trabalho de Cunha (2009), intitulado “As dificuldades de implementação de atividades experimentais investigativas no ensino de química”, onde a autora investiga os principais fatores que dificultam a utilização da proposta investigativa apontados por licenciandos e professores em exercício. A autora mostra que, tanto os professores em exercício quanto os professores em formação atentam para a importância da experimentação investigativa no ensino de Química, porém ressaltaram inúmeros obstáculos para a utilização destas. Nele as dificuldades identificadas foram a falta de experiência com a metodologia, conduzir o aluno à resposta esperada, pouco tempo para elaboração, entre outros. Dentre as contribuições apontadas, os licenciandos reconhecem que a proposta desperta a curiosidade dos alunos contextualiza os conceitos químicos, o que corrobora com os dados obtidos neste trabalho. Em relação aos conhecimentos a serem adquiridos durante o curso necessários para a utilização da proposta, os licenciandos apontaram que é importante conhecer fundamentos teóricos em química, conhecer e utilizar a investigação na graduação e ter contato com a realidade de sala de aula. Conhecer e utilizar a proposta investigativa na graduação foi uma resposta quase unânime a questão 3 [apêndice A], como pode-se constatar através de um trecho da entrevista: “mas o ideal seria utilizarmos esse tipo de metodologia durante a graduação. Se a gente estivesse vivenciando esse tipo de proposta, seria mais fácil de colocar em prática” [Roberta, questão 3]. Isto está diretamente ligado com a questão anterior que trata das dificuldades de implementação da proposta. Portanto, a qualidade na formação de professores ligando a teoria à prática seria uma das possíveis soluções para sanar tais dificuldades (IMBERNÓN, 2000). 0448 7 Para Pérez Gómes (1997), o abismo que separa teoria e prática é o responsável pelo fracasso mais significativo e generalizado dos cursos de formação de professores. Já em relação às contribuições da investigação para os aprendizes, os licenciandos indicaram do ponto de vista pedagógico as seguintes categorias: não acreditam nessas contribuições, auxiliam na construção do conhecimento dos alunos, melhora o raciocínio e aproxima o aluno do dia- a-dia. O fato de alguns alunos não acreditarem na eficácia da proposta reside justamente nas dificuldades que encontraram em aplicá-la. Alguns alunos que não obtiveram sucesso na aplicação da proposta atribuíram isso à sua ineficácia. Discordamos desta opinião, uma vez que se pôde observar que mesmo com deficiências na aplicação da proposta, os alunos demostraram interesse na abordagem dos licenciandos, mostrando ter construído algum conhecimento que foi constatado através de avaliação. Alguns, apesar do insucesso da aplicação reconhecem as contribuições positivas da proposta, pois atribuem o fracasso da aplicação às dificuldades encontradas por eles. É o que pode ser percebido nas três últimas categorias apontadas, que são inclusive contribuições que eles puderam detectar na aprendizagem dos alunos. De maneira geral, a avaliação dos licenciandos a respeito das contribuições da investigação para os alunos foi positiva, mostrando que apesar das dificuldades encontradas na sua implementação, a proposta é considerada eficiente por parte dos futuros professores. Isto pode ser percebido na seguinte fala: “os alunos constroem o próprio conhecimento....eles elaboram estratégias e depois colocam em prática. Daí...quando ele elabora essas estratégias, se sente próximo do assunto....sente que faz parte da vida dele” [Roberta, questão 4]. Estamos de acordo com Wilsek e Tosin (2009), que afirmam que as atividades experimentais pautadas na investigação favorecem a construção do conhecimento do aluno. Quando o professor propicia ao aluno a oportunidade de pensar por si mesmo, está favorecendo a autonomia intelectual deles, tornando-os capazes de atuar de forma competente, criativa e crítica. 0449 8 Finalmente, os licenciandos foram questionados até que ponto eles consideravam seus minicursos fiéis a proposta investigativa e as respostas foram: Não conseguiram aplicar a metodologia e foi investigativa todo o tempo. A maioria dos licenciandos reconheceram a falta de preparo para implementar a proposta. Apesar disso alguns destes conseguiram em algum momento desenvolver a metodologia, desempenhando seu papel como guias do conhecimento. Mesmo a pouca experiência com a proposta, o que já se esperava, pois a vivencia e aplicação das atividades se limitaram à elaboração e aplicação dos minicursos, os licenciandos em algum momento, mesmo raros, conseguiram implementar uma proposta investigativa, pois agiram como guias na atividade experimental, promovendo o protagonismo dos alunos. Já outros, afirmaram ter conseguido aplicar a metodologia com sucesso. Porém isso não pôde ser observado durante o minicurso, pois o discurso dos licenciandos não confere com a prática levada a termo na aplicação da proposta em todos os casos. Isso mostra que os licenciandos não conseguem avaliar a própria prática, não se mostrando capazes de refletir sobre a própria prática. De acordo com Imbernón, 2000, a formação inicial deve ter: [...] como base uma reflexão dos sujeitos sobre sua prática docente, de modo a lhes permitir examinar suas teorias implícitas, seus esquemas de funcionamento, suas atitudes, etc, realizando um processo constante de auto-avaliação que oriente seu trabalho (p. 48). Apesar de a proposta vivenciada favorecer a reflexão dos sujeitos, esta se mostra ainda distante da realidade dos licenciandos o que faz com que se acredite ser a reflexão sobre a prática um objetivo que para ser alcançado, necessite de investimentos a mais longo prazo. Muitos equívocos podem ser identificados através da posterior análise dessas questões. Destes, os mais evidentes e relevantes para este trabalho são: os licenciandos demostram terem domínio conceitual acerca da metodologia investigativa, porém afirmam que não conseguiram aplicá- la com sucesso, enquanto que outros demostram falta de embasamento teórico, contudo afirmam erroneamente terem conseguido aplicar a metodologia. 0450 9 O primeiro caso pode ser constatado através das falas da entrevistada Roberta quando diz: “...para aplicar essa metodologia, acho que é muito importante começar com uma questões problema, que através dela todo o trabalho será desenvolvido. Daí....a gente tem que fornecer meios para os alunos poderem investigar o problema, através de experimentos, textos ou sei lá....outros materiais. Mas o que é importante mesmo é o próprio aluno elaborar uma estratégia e tentar colocar um prática para ver se eles podem ou não solucionar o problema e explicar o que aconteceu o porque”. Em seguida, respondendo outra questão afirma: “Não consigo destacar um fato que tenha sido especificamente investigativo. Nós elaboramos alguns experimentos e tentamos questionar os alunos a respeito dos conhecimentos,...não dava para eles executarem os experimentos por si mesmos sem nossa interferência. Acredito que esta dificuldade foi por causa do tema que escolhemos...era muito limitante. Não tinha como trabalhar uma questão problema que abrangesse o trabalho inteiro. Acabamos tendo que trabalhar os temas separados....é....não foi fielmente investigativo”. Contudo, nesta fala a entrevistada indica um início de reflexão sobre a própria prática docente. Isto mostra que esta proposta aplicada ao estágio se torna válida e eficiente no sentido de fomentar a reflexão sobre a prática e pode ser um caminho para formar, através da utilização da investigação orientada, futuros professores que tenham maiores possibilidades de investir nesta reflexão, mesmo que isto não ocorra com todos os licenciandos. Já no outro caso, as falas da entrevistada Telma retratam a situação já exposta quando diz: “(...) a primeira coisa é avaliar o que o aluno já sabe...pra saber a direção da aula. E na apresentação dos experimentos fazer questionamentos e fazer com que o aluno consiga raciocinar e entender o conteúdo”. 0451 10 E posteriormente afirma que: “Acho que conseguimos atingir nossos objetivos, porque eles chegaram a conclusão que esperávamos a partir da nossa aula. O conteúdo aplicado foi só agregação do conhecimento”. A defasagem no embasamento teórico se refletiu em equívocos em relação a outras questões da entrevista, como ainda no caso de Telma que afirma a respeito das contribuições da proposta para o aluno: “O raciocínio deles melhora, porque com uma aula mais atrativa eles prestam mais atenção e se concentram melhor assim”. Todos estes equívocos servem de indicador para que as práticas formadoras produzam atividades diferenciadas, com sólido embasamento teórico, bem fundamentadas, aplicando estas atividades em todo o processo de formação, não somente nas disciplinas pedagógicas, mas no currículo como um todo. A partir daí, os licenciandos reconhecem as possibilidades que essas práticas podem oferecer e ao tomar conhecimento delas entram em um processo de reflexão sobre sua aplicação no ensino (CUNHA, 2009). Por meio desta reflexão sobre a própria prática enquanto docente, o profissional desenvolve seu conhecimento profissional (CAÑAL, POZUELOS E TRAVÉ, 2005). Os registros de vídeo utilizados foram dos minicursos intitulados: Propriedades Gerais das substâncias e Forças intermoleculares. Primeiramente foi analisado o minicurso propriedades gerais das substâncias, seguindo como critérios a verificação das perguntas feitas nas entrevistas, identificando assim confirmações ou contradições entre eles. Neste minicurso foram abordados os subtemas densidade, ponto de ebulição, ponto de fusão. No início os licenciandos levantaram algumas questões relacionadas com o cotidiano, envolvendo o conteúdo, a fim de verificar o 0452 11 conhecimento prévio dos alunos. Isto concorda com suas respostas à entrevista, pois a grande maioria enfatizou a idéia da necessidade deste levantamento. A abordagem do assunto propriamente dita não se iniciou com uma única questão problematizadora, mas com várias perguntas de acordo com os subtemas, pois segundo relataram, não conseguiram fazer interligação dos assuntos. Concordamos com a visão de Schnetzler (1995), que enfatiza que o professor deve identificar no aluno suas concepções prévias sobre o conteúdo que está sendo abordado. Então, em função dessas concepções deve planejar desenvolver e avaliar as atividades que levem a uma evolução conceitual nos estudantes em direção aos conceitos cientificamente aceitos, atuando assim como um professor pesquisador. Seguiu-se propondo alguns experimentos que funcionaram como uma problematização, sendo que todos eles foram elaborados pelos licenciandos. Porém o desempenho como guias desses experimentos foi falho, pois as perguntas feitas eram imediatamente respondidas, não favorecendo a construção do conhecimento do aluno. Assim o aluno não encontrava tempo para levantar suas próprias hipóteses sobre o fenômeno em estudo. De acordo com Zuliani, 2006 quando os alunos são submetidos à proposta de investigação, e conseguem caminhar de maneira autônoma, sem que o professor interfira antecipando as respostas, percebem que sua aprendizagem se torna independente das respostas do professor, e que eles podem buscar as respostas, ainda que esbarrem em alguma habilidade ou conceito. E ainda ressalta que: “[...] não deve haver a interferência do orientador na atividade proposta, sua interferência deve limitar-se apenas aos pontos relacionados à forma de apresentação do projeto, ou à emissão de erros conceituais na introdução teórica ao assunto tratado, não indicando as respostas, mas desafiando e despertando nos alunos o interesse e disposição para sua busca” (ZULIANI, 2006, p. 46). 0453 12 Apenas um experimento não foi expositivo, ou seja, os alunos puderam manusear os instrumentos, que foram previamente providenciados. Esse experimento foi apresentado para a constatação de parte do conteúdo já discutido de forma tradicional com os alunos. Não se esperava resposta a nenhuma questão levantada em relação a ele. De forma geral, os experimentos foram utilizados na forma de situação problema, porém o desenvolvimento deles pelos licenciandos não obedeceu à proposta investigativa. Os subtemas em nenhum momento fizeram parte de um mesmo conjunto de propriedades, objetivo principal da aula. Para Azevedo (2004) uma atividade investigativa deve se originar de uma situação- problema que leve o aluno a refletir, discutir, explicar, ou seja, produza o próprio conhecimento por meio da interação pensar, sentir e fazer. Assim como o primeiro minicurso já descrito, o que tratou de forças intermoleculares teve seu inicio de maneira semelhante ao anterior. Foi feito um levantamento dos conhecimentos prévios dos alunos, seguido de perguntas que circundavam o conteúdo. Alguns pontos importantes e requisitos básicos foram discutidos de forma expositiva, porém não puramente tradicional. Os licenciandos interagiram com os alunos de forma a buscar neles os conceitos desejados, para que pudessem posteriormente responder as situações problemas propostas. Então, foram colocadas duas situações-problema, que envolviam o conteúdo discutido e através de perguntas, os licenciandos ouviram dos alunos as hipóteses que haviam sido registradas por escrito no caderno. Posteriormente essas hipóteses foram discutidas entre alunos e licenciandos, onde os últimos atuaram como guias na construção do conhecimento dos alunos. Essa atividade ofereceu aos alunos a possibilidade de desenvolvimento da autonomia, criatividade, interação com os outros alunos, de forma que participaram ativamente da construção do conhecimento. Nesse momento os alunos conseguiram aplicar uma atividade experimental com base na linha investigativa, visto que atenderam as suas principais características. Por fim, houve a retomada do conteúdo teórico exposto tradicionalmente através de apresentação de slides. Uma atividade 0454 13 experimental foi proposta pelos licenciandos ao final da apresentação. Porém não houve a utilização da metodologia investigativa em sua aplicação. Através dos fatos observados e das respostas à entrevista pode-se perceber que os licenciando não reconhecem as próprias dificuldades, devido principalmente ou por não ter embasamento teórico suficiente, ou por apenas possuírem esse embasamento, ausentando-se neles a experiência adquirida nos cursos de formação. Assim não têm domínio prático da teoria. É o que evidencia Pérez Gomes (1997), que atribui o fracasso dos programas de formação ao abismo que separa teoria e prática. Em suas palavras: “O mundo da investigação e o mundo e o mundo da prática parecem formar currículos independentes, que rodam sobre si mesmos, sem se encontrarem” (1997, p. 107). A respeito dessa dificuldade de desenvolvimento da proposta, os alunos ressaltam na entrevista que tal é devida a falta de preparo durante os cursos de formação, sendo assim, a maior dificuldade é a visualização didática de como funciona a proposta, uma vez que foram submetidas a ela apenas uma vez, no semestre anterior. Na prática, os licenciandos de uma forma geral, resumem a proposta em uma aula experimental tradicional onde estes, servem para constatar uma teoria à qual já foram submetidos, não favorecendo o pensamento autônomo, criativo e pesquisador necessário ao exercício da profissão, como apontam Cañal et al. (2005). Uma atividade pode ser considerada investigativa quando favorece a participação do aluno como ser ativo no processo de construção do próprio conhecimento e tem como objetivo o desenvolvimento de habilidades e não a simples aplicação de uma atividade que se esgota por si mesma (WILSEK E TOSIN, 2009). Isso pode ser facilmente percebido analisando-se as entrevistas com os licenciandos, como é o caso de Roberta, que demostra ter 0455 14 conhecimento da metodologia na prática, reconhece neles contribuições positivas para os aprendizes, e, no entanto, pôde-se observar em seu minicurso a ausência de importantes momentos da prática investigativa. Ou ainda como no caso do licenciando Paulo, que também apresenta embasamento teórico sobre tal método de ensino, porém não acredita que se utilizando o método isoladamente possa trazer alguma contribuição aos aprendizes. Contudo, em seu minicurso houve momentos importantes e relevantes da utilização da metodologia, que, inclusive mostraram resultados eficientes. Considerações Finais Com a presente pesquisa foi possível averiguar quais as concepções dos alunos a respeito da metodologia investigativa e como isto de refletiu em sua prática, na disciplina Estágio Supervisionado em Ensino de Química II. Os aspectos mais evidentes que puderam ser observados, analisando-se entrevista, a observação realizada em aula e a gravação em vídeo estão listados a seguir: - Há um grande desinteresse por parte dos licenciandos em relação às disciplinas pedagógicas. - Os licenciandos não conseguem reconhecer as próprias dificuldades pedagógicas e didáticas. - Possuem apenas embasamento teórico e pouco domínio da prática. - Os licenciandos não interligam teoria pedagógica a prática docente. - E por fim, não conseguem elaborar e aplicar atividades totalmente investigativas. De maneira geral, como já foi discutido, muitas contradições entre entrevista e observação puderam ser detectadas. Foi possível identificar nos licenciandos a falta de experiência com a prática docente, bem como um desinteresse geral por ela. Parece-nos 0456 15 que isso pode estar relacionado principalmente ao desequilíbrio na distribuição das disciplinas pedagógicas nos cursos de formação (o que acontece no curso a que estes licenciandos estão vinculados), que acabam por adiá-las para o último ano do curso, tornando implícita a secundariedade dessas disciplinas, causando nos licenciandos tal desinteresse. Assim, sugerem-se algumas possíveis alternativas para a solução dos problemas identificados, em relação à melhoria da qualidade dos cursos de formação de professores. - Fomentar a interação das disciplinas pedagógicas com as específicas no currículo desses cursos. - Promover o abandono da concepção da didática como uma teoria desvinculada da prática docente para torná-la uma disciplina integradora e capaz de produzir uma formação de melhor qualidade. - Distribuir as disciplinas pedagógicas ao longo dos cursos de formação, principalmente na licenciatura estudada, onde isto não ocorre, dando ênfase à sua importância, ligando a teoria à prática através dos estágios supervisionados, onde parcerias entre universidade e escola poderiam minimizar algumas dificuldades dos licenciandos em relação à prática docente. - Diversificação dos conteúdos, dentro das disciplinas, das metodologias de ensino, bem como sua aplicação aos licenciandos, provocando assim o reconhecimento de sua validade pelos sujeitos em formação. Acrescenta-se ainda que, deve haver uma sintonia entre professores das disciplinas pedagógicas e específicas nos cursos de Licenciaturas a fim de que haja um compromisso com a formação de um profissional capaz de construir sua prática com autonomia e competência. Palavras chave: Formação de professores. Ensino de Química. Metodologia Investigativa. 0457 16 0458