RESSALVA Atendendo solicitação do autor, o texto completo desta tese será disponibilizado somente a partir de 07/05/2023. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO unesp PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIENCIAS BIOLOGICAS (BIOLOGIA VEGETAL) META-ANÁLISE FITOGEOGRÁFICA DAS EPÍFITAS VASCULARES NA REGIÃO NEOTROPICAL E O EFEITO DA ALTITUDE NA DIVERSIDADE E COMPOSIÇÃO: UM ESTUDO DE CASO NO SUDESTE DO BRASIL GABRIEL MENDES MARCUSSO Rio Claro – SP Maio de 2021 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS – RIO CLARO unesp PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS (BIOLOGIA VEGETAL) META-ANÁLISE FITOGEOGRÁFICA DAS EPÍFITAS VASCULARES NA REGIÃO NEOTROPICAL E O EFEITO DA ALTITUDE NA DIVERSIDADE E COMPOSIÇÃO: UM ESTUDO DE CASO NO SUDESTE DO BRASIL GABRIEL MENDES MARCUSSO Orientador: Prof. Dr. Julio Antonio Lombardi Coorientador: Prof. Dr. Luiz Menini Neto Tese apresentada ao Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Ciências Biológicas (Biologia Vegetal). Rio Claro – SP Maio de 2021 M322m Marcusso, Gabriel Mendes Meta-análise fitogeográfica das epífitas vasculares na Região Neotropical e o efeito da altitude na diversidade e composição: um estudo de caso no Sudeste do Brasil / Gabriel Mendes Marcusso. -- Rio Claro, 2021 253 p. : il., tabs., fotos, mapas Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto de Biociências, Rio Claro Orientador: Julio Antonio Lombardi Coorientador: Luiz Menini Neto 1. Biogeografia. 2. Espírito Santo. 3. gradiente. 4. montanhas. 5. padrão de distribuição. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca do Instituto de Biociências, Rio Claro. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Câmpus de Rio Claro CERTIFICADO DE APROVAÇÃO TÍTULO DA TESE: META-ANÁLISE FITOGEOGRÁFICA DAS EPÍFITAS VASCULARES NA REGIÃO NEOTROPICAL E O EFEITO DA ALTITUDE NA DIVERSIDADE E COMPOSIÇÃO: UM ESTUDO DE CASO NO SUDESTE DO BRASIL AUTOR: GABRIEL MENDES MARCUSSO ORIENTADOR: JULIO ANTONIO LOMBARDI COORIENTADOR: LUIZ MENINI NETO Aprovado como parte das exigências para obtenção do Título de Doutor em CIÊNCIAS BIOLÓGICAS (BIOLOGIA VEGETAL), área: Biologia Vegetal pela Comissão Examinadora: Prof. Dr. JULIO ANTONIO LOMBARDI (Participaçao Virtual) Departamento de Biodiversidade / UNESP - Instituto de Biociências de Rio Claro - SP Profa. Dra. RAFAELA CAMPOSTRINI FORZZA (Participaçao Virtual) Herbário / Jardim Botânico do Rio de Janeiro - RJ Prof. Dr. ALEXANDRE KENNETH MONRO (Participaçao Virtual) Identification & Naming Departament - Herbarium / Royal Botanic Gardens - Kew - London - United Kingdom Profa. Dra. SAMYRA GOMES FURTADO (Participaçao Virtual) Departamento de Botânica - Instituto de Ciências Biológicas / Universidade Federal de Juiz de Fora - MG Prof. Dr. DAYVID RODRIGUES COUTO (Participaçao Virtual) Laboratório de Ciências Ambientais - Herbário HUENF / Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro - Campos dos Goytacazes / RJ Rio Claro, 07 de maio de 2021 Instituto de Biociências - Câmpus de Rio Claro - Av. 24-A no. 1515, 13506900 http://ib.rc.unesp.br/#!/pos-graduacao/secao-tecnica-de-pos/programas/biologia-vegetal/apresentacao/CNPJ: 48.031.918/0018-72. http://ib.rc.unesp.br/%23!/pos-graduacao/secao-tecnica-de-pos/programas/biologia-vegetal/apresentacao/CNPJ AGRADECIMENTOS Em especial agradeço o Dr. Julio Antonio Lombardi por ter me dado a oportunidade de trabalhar ao seu lado durante esses anos, me orientando, indo à campo, auxiliando, ensinado e sempre me instigando, sobretudo no campo, a conhecer mais as plantas. Foi um grande privilégio ter tido essa oportunidade! Ao meu coorientador, Dr. Luiz Menini Neto por ter aceitado compartilhar seu amplo conhecimento sobre as epífitas vasculares e biogeografia. À Universidade Estadual Paulista (UNESP) por ter me proporcionado a infraestrutura necessária para o desenvolvimento desse projeto, sobretudo o Herbário Rioclarense (HRCB) e o Jardim Experimental. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001, fomentando a bolsa de estudo durante os 47 meses do curso e pelos recursos fornecidos via Programa de Apoio a Pós-Graduação (PROAP) para revisão e correção do inglês de alguns dos capítulos dessa tese. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pelo auxílio financeiro (processo nº 2018/04121-0) que nos possibilitou realizar as viagens de campo, assim como a manutenção da Land Rover e a reforma e ampliação da casa de vegetação, ambas de fundamental importância para o desenvolvimento desse projeto. Ao Instituto Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (IEMA) pela permissão para coleta (processo nº 77257804/17) na Reserva Biológica de Duas Bocas e Parque Estadual da Pedra Azul. Ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) (permissão número 57613-3) pela permissão para coleta na Reserva Biológica Augusto Ruschi. Ao Vitor de Andrade Kamimura pela imprescindível ajuda nas análises estatísticas. Ao Renan Borgiani pelo auxílio no enorme trabalho de compilação nas listagens. Ao Henrique Lauand Ribeiro pela confecção dos mapas. À Fabiula Moreno Arantes, Janaine Kunrath Hammes, Renan Borgiani e Vitor de Andrade Kamimura pelo grande auxílio e companheirismo nas viagens de campo para coletar os materiais que foram uma das bases para esse trabalho. Aos taxonomistas que me auxiliarem nas identificações: Janaine Kunrath Hammes, Lívia Godinho Temponi, Marcus Coelho Nadruz, Rodrigo Theófilo Valadares (Araceae), Elton Leme, Dayvid R. Couto, Rafaela C. Forzza, Rebeca P. Romanini (Bromeliaceae), Alexandre Salino (Ferns and Lycophytes), Alain Chateums (Gesneriaceae), Felipe Gonzatti (Hymenophyllaceae), Benjamin Øllgaard (Lycopodiaceae), Antonio Toscano de Brito, Edlley Pessoa, Luiz Menini Neto, Tiago Luiz Vieira e Wellington Forster (Orchidaceae). Aos pesquisadores que me auxiliarem na busca e aquisição das dispersas e diversas literaturas sobre flora de epífitas vasculares na Região Neotropical: Adriano Quaresma (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, Brasil), Aline Melo (Universidade Federal de Pernambuco, Brasil), Beatriz Gomez (Universidad Nacional Autónoma del México, México), Boris Villanueva Tamayo (Universidad del Tolima Colômbia), Enrique Alonso Castro Fonseca (Organization for tropical studies, Costa Rica), Flávio Obermüller (Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil), Giovanni Onore (Misión Marianista, Equador), Holger Kreft (Georg-August-Universität Göttingen, Alemanha), Nils Köster (University of Bonn, Alemanha), Peter Hietz (University of Natural Resources and Life Sciences, Austria), Pierre Ibisch (Eberswalde University for Sustainable Development, Alemanha), Sergio Javier Ceballos (Universidad Nacional de Tucumán, Argentina), Thorsten Krömer (Universidad Veracruzana, México), Wolfgang Küper (University of Bonn, Alemanha). Em especial ao Pierre Ibisch por ter gentilmente enviado a cópia impressa de sua dissertação, e à Beatriz Gomez por ter escaneado a importante referência sobre epífitas vasculares do vale do rio Uxpanapa, no Mexico. Ao Alexandre Salino por permitir acesso e consulta à coleção do BHCB. À Márlia Coelho-Ferreira, do Instituto Nacional da Mata Atlântica, por providenciar a digitalização das coletas depositadas no MBML citadas nessa tese. À Marina Zaia pelo auxílio na montagem das exsicatas. Aos amigos e companheiros de profissão que durante esse tempo tive oportunidade de conhecer e compartilhar experiências que certamente contribuíram para o meu crescimento profissional e pessoal: Gabriel Pavan Sabino, Henrique Lauand Ribeiro, Ian Meireles, Fabíula Moreno Arantes, Leonardo Biral, Matheus Vergne, Renan Borgiani, Pablo Hendrigo Alves de Melo, Vitor de Andrade Kamimura. Aos meus pais, Tadeo e Gisele, e à minha irmã Tamara, por terem sempre me apoiado a seguir nessa carreira. E a todos que de alguma forma me influenciaram ou me auxiliaram durante esse período. Agradeço. “O fator fundamental foi que o botânico à procura de plantas e o oficial da marinha à procura de colônias tinham uma mentalidade similar. Ambos, o cientista e o conquistador, começaram admitindo sua ignorância – ambos disseram: “Eu não sei o que existe lá”. Ambos se sentiram compelidos a sair e fazer novas descobertas. E ambos esperaram que o novo conhecimento adquirido os tornasse senhores do mundo.” Yuval Harari em Sapiens – Uma breve história da humanidade RESUMO GERAL A congruência nos padrões de distribuição das espécies tem sido uma das principais ferramentas utilizadas para a classificação das entidades biogeográficas, servindo como fontes de evidência para auxiliar na compreensão nas histórias das biotas assim como gerar subsídios para conservação. As epífitas vasculares são um grupo de plantas que respondem de maneira muito eficaz às alterações ambientais, principalmente climáticas. Alguns estudos têm utilizado essa sinúsia como modelo para classificações biogeográficas, no entanto, diversas lacunas ainda restam. Nesse sentido, tivemos como objetivos explorar os padrões de distribuição das epífitas vasculares em duas escalas: uma continental (Região Neotropical) e uma regional (ao longo de um gradiente altitudinal na região serrana do Espírito Santo, Sudeste do Brasil). Para isso a tese foi dividida em cinco capítulos. No primeiro foi explorado os padrões de distribuição das epífitas vasculares na Região Neotropical com base em levantamentos exclusivos dessa sinúsia até 2017, gerando a compilação de 173 listagens oriundas de 14 países, correspondendo a 14,636 registros identificados, pertencendo a 3,849 espécies. Estes dados permitiram demonstrar alguns padrões mais amplos para localidades com poucos estudos (e.g. Amazônia), no entanto em áreas com mais publicações, como o leste do Brasil, padrões mais refinados foram encontrados, corroborando classificações biogeográficas propostas para a localidade. Ademais, fatores climáticos auxiliaram na explicação desses padrões. O segundo, terceiro e quarto capítulos compreendem os levantamentos baseados em coletas e dados de herbários das epífitas vasculares em três Unidades de Conservação do Espírito Santo, Sudeste do Brasil. Nesses estudos registrou-se uma das maiores riquezas de epífitas vasculares para o Brasil, assim como para a Região Neotropical, corroborando o destacado papel que o estado possui para a diversidade da Floresta Atlântica. Além disso, sete novos registros para o Espírito Santo foram feitos, demonstrando que a diversidade do estado ainda se encontra subestimada. Por fim, o quinto capítulo compara a diversidade das epífitas vasculares nas três áreas estudadas nos capítulos anteriores (2, 3 e 4), abordando a riqueza, composição, diversidade beta e distinção taxonômica ao longo do gradiente. Esta comparação demonstrou que a localidade situada em altitudes intermediárias possui a maior riqueza de espécies, no entanto, a diversidade filogenética é alta em todas as altitudes. Além disso, demonstrou a importância das áreas em elevadas altitudes para a contribuição na substituição de espécies, destacando sobretudo a importância da conservação dessas áreas. Tais resultados são consequência do histórico biogeográfico da região, sobretudo as oscilações climáticas do Pleistoceno, e mantidos pela distribuição das condições climáticas atuais. Palavras-chave: Biogeografia, Espírito Santo, gradiente, montanhas, padrão de distribuição. ABSTRACT The congruence in the patterns of species’ distribution has been one of the main tools used for the classification of biogeographic entities, serving as sources of evidence to understanding the histories of the biotas as well as generating subsidies for conservation. Vascular epiphytes comprise a group of plants that respond very effectively to environmental changes, especially climatic. Some studies have used this synusia as a model for biogeographic classifications, however, several gaps remain. In this sense, we aimed to explore the distributional patterns of vascular epiphytes in two levels: continental (Neotropical Region, NR) and local (along an altitudinal gradient in the mountainous region of Espírito Santo, Southeast Brazil). For this, the thesis was divided into five chapters. In the first, the distributional patterns of vascular epiphytes in the NR were explored based on exclusive surveys carried out with the synusia until 2017, generating the compilation of 173 listings from 14 countries, corresponding to 14,636 identified records, belonging to 3,849 species. These data allow us to demonstrate some broader patterns for locations with few studies (e.g. Amazonia), however in areas with more publications, such as eastern Brazil, more refined patterns were found, corroborating the proposed biogeographic classifications. In addition, climatic factors helped to explain these patterns. The second, third and fourth chapters comprise surveys based on collections and data from herbariums of vascular epiphytes in three Conservation Units in Espírito Santo, Southeastern Brazil. In these studies, one of the greatest riches of vascular epiphytes was registered for Brazil, as well as for the Neotropical region, corroborating the outstanding role that the state has for the diversity of the Atlantic Forest. In addition, seven new records for Espírito Santo were made, demonstrating that the diversity of the state is underestimated. Finally, the fifth chapter compares the diversity of vascular epiphytes in the three areas studied in the previous chapters (2, 3 and 4), exploring the changes in the richness, composition, beta diversity and taxonomic distinction along the gradient. This comparison showed that the sites located at intermediate altitudes has the highest species richness, however, the phylogenetic diversity is high at all altitudes. In addition, it demonstrated the importance of areas at high altitudes for the contribution in the replacement of species, highlighting the importance of the conservation of these areas, even with a small number of species. Such results as consequence of the biogeographical history of the region, especially the climatic fluctuations of the Pleistocene, are discussed in the text. Keywords: Biogeography, Espírito Santo, gradient, mountains, distribution pattern. SUMÁRIO INTRODUÇÃO GERAL ..............................................................................................13 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................15 Capítulo 1 .......................................................................................................................18 Phytogeographic meta-analysis of the vascular epiphytes in the Neotropical Region .........................................................................................................................................18 Abstract ..........................................................................................................................18 Introduction ...................................................................................................................19 Methods ..........................................................................................................................21 Results .............................................................................................................................24 Discussion .......................................................................................................................34 References ......................................................................................................................44 Capítulo 2 .......................................................................................................................61 A first checklist of the vascular epiphytes of Duas Bocas Biological Reserve, a protected area in the Espírito Santo, Southeastern Brazil ....................................... 61 Abstract ..........................................................................................................................61 Introduction ...................................................................................................................62 Material and Methods ...................................................................................................63 Results .............................................................................................................................66 Discussion .......................................................................................................................84 References ......................................................................................................................88 Capítulo 3 .......................................................................................................................96 Augusto Ruschi Biological Reserve vascular epiphytes: a hotspot in the Atlantic Forest of Southeastern Brazil ...................................................................................... 96 Abstract ..........................................................................................................................96 Introduction ...................................................................................................................97 Materials and methods ..................................................................................................98 Results ...........................................................................................................................101 Discussion .....................................................................................................................126 References ....................................................................................................................130 Capítulo 4 .....................................................................................................................141 Plants in the clouds: Vascular epiphytes of Pedra Azul, a mountain top in Espírito Santo, Southeastern Brazil ........................................................................................ 141 Abstract ........................................................................................................................141 Introduction .................................................................................................................142 Material and Methods .................................................................................................143 Results ...........................................................................................................................147 Discussion .....................................................................................................................158 References ....................................................................................................................162 Capítulo 5 .....................................................................................................................170 Elevational distribution of the vascular epiphytes of the mountainous region of Espírito Santo, Southeastern Brazil .......................................................................... 170 Abstract ........................................................................................................................170 Introduction .................................................................................................................171 Material and Methods .................................................................................................174 Results ...........................................................................................................................178 Discussion .....................................................................................................................183 References ....................................................................................................................187 CONCLUSÃO GERAL ..............................................................................................197 Appendix 1. ..................................................................................................................198 Appendix 2. ..................................................................................................................206 Appendix 3. ..................................................................................................................246 Appendix 4. ..................................................................................................................251 Appendix 5. ..................................................................................................................252 Appendix 6. ..................................................................................................................253 13 INTRODUÇÃO GERAL Em todo o mundo, cerca de 28 mil espécies, ou 9% da flora vascular, são epífitas (Zotz 2013), ou seja, plantas que germinam sobre outras plantas vivas (forófitos) e as utilizam como suporte, sem parasitá-las, passando a vida sem estabelecer contato com o solo ou estabelecendo-o em parte de seu ciclo (hemiepífitas) (Benzing 1990; Zotz 2013). As famílias com maior número de representantes dessa forma de vida são: Orchidaceae, Bromeliaceae, Araceae e Polypodiaceae, concentrando grande maioria das espécies epifíticas (Küper et al. 2004; Zotz 2013). E é na Região Neotropical que a maior diversidade de espécies ocorre (Gentry and Dodson 1987; Zotz 2016). Compreender os padrões de distribuição e diversidade dos organismos, assim como os fatores determinantes, constitui uma das principais questões da biogeografia. Para tal objetivo, estudos florísticos ou checklists constituem fontes de dados essenciais (e.g. Cantídio and Souza 2019). Entretanto, grande parte do conhecimento disponível sobre o tema contemplou somente a flora arbórea (Oliveira-Filho and Fontes 2000; Santos et al. 2007; Silva-Souza and Souza 2020), em detrimento de outros hábitos, como o das epífitas vasculares, mesmo com a elevada riqueza florística que estas apresentam nas regiões tropicais (Gentry and Dodson 1987; Kreft et al. 2004; Freitas et al. 2016). Além disso, pelas condições ecológicas que vive, essa sinúsia tem demonstrado responder de maneira mais direta aos fatores ambientais como temperatura e umidade (Kessler 2001; Kreft et al. 2004; Ding et al. 2016; Furtado & Menini Neto 2021), tornando-a de grande relevância para o estudo de determinados padrões (Kessler 2001). O atual estado do conhecimento florístico, apesar de aquém do necessário, já nos permite a análise e apreciação de um bem estruturado corpo de conhecimento sobre os padrões fitogeográficos na Região Neotropical. Por outro lado, aliado à formação dessa base de conhecimentos, ampliar estudos locais são de enorme relevância, sobretudo em localidades com lacunas de conhecimento, o que permitirá tornar mais robusto e corroborar o conhecimento atual, assim como trazer novas informações. Desse modo, esse projeto tem como objetivo contribuir com o conhecimento sobre a composição e fitogeografia das epífitas vasculares em duas escalas: a nível continental (Região Neotropical) e local (na região serrana do estado do Espírito Santo, Sudeste do Brasil). No capítulo 1 apresentamos uma síntese fitogeográfica das epífitas vasculares na Região Neotropical, buscando, especificamente: a) Investigar as relações florísticas das epífitas vasculares nas diferentes províncias fitogeográficas da Região; b) Associar os 14 padrões observados atualmente com os fatores climáticos, que são preponderantes para essa sinúsia. A compilação dos dados se revelou bastante útil na busca dos padrões fitogeográficos, sendo possível associá-los com alguns fatores climáticos cruciais para a distribuição das epífitas vasculares. Ademais, essa compilação serve como subsídio para demonstrar onde novos levantamentos devem ser priorizados, tendo em vista enormes lacunas que existem e a elevada diversidade e heterogeneidade da biota da Região Neotropical. Em uma escala menor, buscamos explorar a diversidade e distribuição das epífitas vasculares em uma região mega diversa, a Floresta Atlântica, que apesar da elevada riqueza de espécies e ser considerada uma das áreas mais bem estudadas do Brasil (Marques et al. 2021), 19% das espécies de epífitas são conhecidos por apenas uma coleta e 59 % possuem menos de 10 coletas (Ramos et al. 2019), tornando-se imprescindível o aumento das buscas ativas em campo. Gerar e documentar dados e coleções de biodiversidade, assim como seu uso ou conservação correspondem às demandas da sociedade sobre taxonomia, conforme articulado na Convenção sobre Diversidade Biológica (MMA 2000). No Espírito Santo somente cerca de 7% a 10,5% da vegetação original ainda existe (SOS Mata Atlântica & INPE 2019), e desses, apenas 4% correspondem à Unidades de Conservação, sendo 77% destas de proteção integral (MMA 2019; Rosa et al. 2019). As Unidades de Conservação (UC) têm como uma das funções conservar a diversidade biológica nesses territórios delimitados, no entanto, pouco se sabe o que de fato ocorre nas UCs (e.g. Colli-Silva et al. 2016), fato que reitera a importância das contínuas coleções, tanto nessas UCs, para se documentar e conhecer o que já é protegido, quanto em outras áreas, para subsidiar a criação de novas UCs (e.g. Mello- Silva 2018; Covre et al. 2021). Nesse sentido, nos capítulos 2, 3 e 4 analisamos a flora epifítica vascular em três Unidades de Conservação da região montanhosa do estado do Espírito Santo, onde buscamos responder basicamente a uma questão: o que as Unidades de Conservação conservam? Para isso investigamos a diversidade e composição das epífitas vasculares nessas áreas, com base em materiais depositados em herbários e, principalmente, através de coletas em campo. Apesar de o estado ser tradicionalmente reconhecido como possuidor de uma excepcional riqueza de sua flora epifítica, até pouco tempo nada se sabia sobre essa sinúsia nessa unidade federativa (Kersten 2010). Para tal, coletamos 866 amostras de epífitas vasculares em campo (238 na REBIO Duas Bocas, 395 na REBIO Augusto Ruschi e 233 na Pedra Azul). Nestes capítulos demonstramos que, de fato, a 15 região montanhosa desse estado corresponde a uma das localidades mais ricas em epífitas vasculares, tanto do Brasil, como da Região Neotropical. O levantamento em campo também permitiu que sete espécies de epífitas fossem registradas pela primeira vez no Espírito Santo. Por fim, no último capítulo (5) utilizamos os dados dos capítulos 2, 3 e 4 para explorarmos a distribuição das espécies de epífitas vasculares entre as diferentes faixas altitudinais (200 a 1550 m a.s.l.). Utilizando diferentes métricas demonstramos que a riqueza e composição mudam ao longo das faixas altitudinais. Os resultados sugerem uma grande conservação de nicho, com grande contribuição de espécies das áreas mais elevadas. Além disso, apesar da variação da riqueza de espécies, uma grande diversidade de linhagens é observada em todas as faixas altitudinais. Os prováveis fatores que causaram esses padrões atuais remetem ao clima atual e ao histórico biogeográfico (e.g. oscilações climáticas do Pleistoceno) dessa cadeia de montanhas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Benzing DH (1990) Vascular epiphytes. General biology and related biota. Cambridge University Press, Cambridge. 354p. 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Este levantamento possibilitou registrar a maior riqueza de epífitas vasculares para uma determinada localidade na Floresta Atlântica. Assim como trouxe dados inéditos sobre a composição e diversidade de áreas montanas e alto montanas, consideradas relictos de vegetações amplamente distribuídas nos períodos glaciais e que se encontram restritas e ameaçadas a poucos maciços montanhosos. Ademais, as florestas das encostas serranas, em altitudes inferiores demonstrou ser detentora de relevante diversidade florística. Esses levantamentos também permitiram que sete novos registros para a flora capixaba fossem feitos. Várias espécies consideradas com dados deficientes também foram documentadas, auxiliando no aumento do conhecimento sobre essas espécies no estado. Por fim, também demonstramos o efeito das mudanças altitudinais na composição das espécies, com um expressivo número de espécies exclusivas para cada faixa, com poucas espécies ocorrendo em todo o gradiente. Destaca-se que mesmo áreas com um menor número de espécies a diversidade taxonômica e a contribuição com espécies exclusivas é alta. Estes resultados justificam e reforçam o papel das Unidades de Conservação em todas as faixas de elevação, para que uma proteção mais efetiva da biodiversidade possa ocorrer. RESSALVA - texto parcial marcusso_gm_dr_rcla_int.pdf