33 Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 1Submetido em 21/03/2007. Aceito para publicação em 22/12/2007. 2 UNESP, CP. 199, CEP 13506-900 Rio Claro, SP, Brasil, aapaoli@rc.unesp. 3Bióloga. MORFOANATOMIA E DESENVOLVIMENTO DE FRUTOS E SEMENTES DE Dodonea viscosa 1 ADELITA APARECIDA SARTORI PAOLI2, JANAINA SARTI3 RESUMO – São descritos aspectos morfológicos e estruturais dos frutos e sementes, em desenvolvimento, de Dodonea viscosa (L.) Jacquin (Sapindaceae), visando o conhecimento dos tegumentos, endosperma e embrião. Termos para indexação: morfologia, pericarpo, Sapindaceae. MORPHOLOGY AND ANATOMY OF THE FRUITS AND SEEDS IN Dodonea viscosa (L.) Jacquin (SAPINDACEAE) ABSTRACT - Morphological, structural and development features of fruits and seeds of Dodonea viscosa (L.) Jacquin (Sapindaceae) were described and illustrated emphazing the seed coat and embryo. Index terms: morphology, pericarp, Sapindaceae. INTRODUÇÃO e sementes, especialmente nos envoltórios, antigamente restringiam-se às plantas cultivadas de interesse econômico ou a estrutura do fruto maduro. Mais recentemente, as alterações estruturais em desenvolvimento de unidades de dispersão de espécies, estão sendo observadas. Porém, esses estudos com espécies nativas de matas brasileiras ainda são escassos. Segundo Corner (1976) existe grande necessidade de revisar a estrutura dos frutos e sementes de modo a atender 34 A. A. S. PAOLI et al. Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 As estruturas morfológicas de um embrião maduro, assim como a posição que ocupa dentro da semente são tão distintas entre os diferentes grupos de plantas que podem se que tanto as características externas quanto as internas das sementes, constituem um critério bastante seguro para (Gunn, 1972). com mais de 1000 espécies, distribuídas por todos os trópicos (Reitz, 1980). Segundo Schultz (1985), são 1100 espécies Dodonea engloba 53 espécies, das quais 49 são da Austrália, uma do Hawai, uma de Madagascar, uma da Flórida e D. viscosa, em todas as regiões tropicais. D. viscosa (L.) Jacq., conhecida vulgarmente como vassoura-vermelha, vassourão-vermelho, faxina-vermelha, erva-de-veado e vassoura-do-campo, é uma árvore ou um arbusto de 2,0 a 2,8m de altura, dotada de copa arredondada nas costas litorâneas desde a restinga até o alto da Serra do Mar. Suas folhas são utilizadas na medicina contra cólicas febres. A casca tem emprego nas preparações de banhos adstringentes. A espécie possui potencial para arborização, principalmente, de ruas estreitas sob redes elétricas. Também fornece lenha para queimar. É uma planta pioneira e de rápido crescimento, sendo recomendada para a composição (Schultz, 1985; Lorenzi, 1992). Devido à importância econômica, paisagística e ecológica desta espécie, foi efetivado um estudo morfo- anatômico e do desenvolvimento dos frutos e das sementes, obtendo informações sobre a biologia para melhor conhecimento da espécie, além de, fornecer subsídios para solucionar problemas de ordem taxonômica. MATERIAL E MÉTODOS O material botânico de Dodonea viscosa (L.) desenvolvimento. O material foi coletado de vários indivíduos junto ao arboreto do Centro Universitário Hermínio Ometto (UNIARARAS), no município de Araras (SP) e transportado em sacos plásticos para o laboratório de anatomia do IB/ UNESP/Rio Claro. No laboratório, o material foi examinado à fresco e as medições nos frutos e nas sementes foram efetuadas em amostras de 50 com auxílio de um paquímetro, registrando- se as médias. Para o estudo anatômico dos frutos e das sementes em diferentes estágios de desenvolvimento, foram efetuadas secções transversais, longitudinais e paradérmicas à mão livre, com auxílio de lâmina de barbear comum ou utilizando- se micrótomo rotatório. Na obtenção de lâminas semi-permanentes, os cortes realizados à mão livre foram corados com safrablau (Safranina mais Azul de Astra), segundo técnica descrita por Gerlach (1969) e montados em gelatina glicerinada. As lâminas permanentes foram confeccionadas com seguindo-se a técnica descrita por Guerrits (1991). O material foi seccionado em micrótomo rotativo manual, as acetato, pH 4,7 (Feder e O’Brien, 1968) e montadas em resina sintética. Os desenhos referentes aos aspectos morfológicos de fruto foram obtidos com auxílio de estereomicroscópio adaptado a uma câmara clara. anatômicos dos frutos e das sementes foram obtidas com auxílio de um fotomicroscópio da Olymphus e os desenhos com microscópio acoplado à câmara clara, projetando-se uma lâmina micrométrica, nas mesmas condições ópticas utilizadas para cada caso. RESULTADOS Dodonea viscosa apresenta-se em geral como uma árvore de pequeno porte (Figura 1); os frutos completamente maduros são secos, deiscentes, tipo cápsula septifraga, com coloração pálea e medindo 1,5cm de comprimento por 1,0cm de largura (Figuras 2, 3). 35MORFOANATOMIA E DESENVOLVIMENTO Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 Dodonea viscosa FIG Dodonea viscosa (L) FIG a – arilo, c – cotilédones, h – hilo. a – arilo, c – cotilédones, h – hilo. 36 A. A. S. PAOLI et al. Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 As sementes variam de 4 a 8 por fruto, são ovóides, com testa de coloração preta, lisa, brilhante e medem em geral 2,0mm de diâmetro (Figuras 4, 5). A região do hilo é envolvida por um arilo vestigial de coloração amarelada. A semente é exalbuminosa e o embrião é longo, estreito, com cotilédones espiralados e do tipo circinado, o eixo hipocótilo- radícula é curto (Figuras 6, 7). a – arilo, c – cotilédones, h – hilo. a – arilo, c – cotilédones, h – hilo. a – arilo, c – cotilédones, h – hilo. a – arilo, c – cotilédones, h – hilo. Ovário (Figuras 8, 10, 12): é súpero, tricarpelar, externa é unisseriada recoberta por cutícula, apresenta A epiderme interna do ovário é unisseriada com células aproximadamente retangulares, em secção transversal, e revestidas por cutículas. 37MORFOANATOMIA E DESENVOLVIMENTO Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 transversal do ovário mostrando numerosos tricomas e os lóculos com óvulos; ee – epiderme externa, ei – epiderme interna, ED – endocarpo, EP – ov – óvulo, tr – tricoma. Estrutura do pericarpo: O fruto bem jovem (Figuras 11, 13) possui epiderme externa unisseriada com estômatos e região parenquimática com feixes vasculares e drusas. Neste estágio já é possível observar o início de expansão aliforme do tegumento (Figuras 9, 11). A diferenciação das o desenvolvimento do fruto é pouco acentuada. No fruto mais desenvolvido, mas ainda jovem, o mesocarpo que é ovariano, apresenta duas regiões: a externa, constituída de células amplas de paredes espessadas; a interna, com células menores, alongadas tangencialmente, sendo que na primeira camada desta região, ocorrem muitos idioblastos contendo drusas. O endocarpo, representado pela epiderme interna é unisseriado, glabro e desprovido de estômatos e possui cutícula revestindo a parede periclinal voltada para a cavidade seminal (Figuras 14, 15). A vascularização do fruto é feita por feixes colaterais que estão localizados no mesocarpo externo. No fruto maduro (Figuras 16 a 20) o epicarpo não sofre praticamente alterações, apenas um decréscimo acentuado no número de tricomas. A região do mesocarpo interno é constituída de 3 a 4 camadas de células continua sendo unisseriado. 38 A. A. S. PAOLI et al. Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 tr – tricoma. 39MORFOANATOMIA E DESENVOLVIMENTO Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 EP – epicarpo, ME – mesocarpo. Anatomia do desenvolvimento da semente O óvulo é anacampilótropo, bitegumentado, crassinucelado e apresenta obturador placentário semelhante a uma pequena aba. O tegumento externo é constituído de 2 a (Figura 21). Ambos os tegumentos limitam a micrópila, existindo ainda entre o tegumento interno e o nucelo uma cutícula interna. Com o desenvolvimento da semente ocorre 17 40 A. A. S. PAOLI et al. Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 um acentuado aumento no número de estratos celulares no tegumento externo, caracterizando-se a testa como multiplicativa (Figuras 22, 23). Na semente bem jovem, na exostesta originada da epiderme externa do óvulo, observa-se o início de alongamento das células (Figura 22), constituindo- se na semente ainda jovem, uma camada de células em paliçada, radialmente alongadas (Figura 25). A mesotesta apresenta duas regiões distintas: a externa, constituída de várias camadas de células parenquimáticas de parede bem camadas de células pequenas e cubóides (Figuras 24, 25). em – embrião, ext – exotesta, fv – feixe vascular, mi – micrópila, mst – mesotesta, ob – obturador, T – testa, TG – tégmen. 41MORFOANATOMIA E DESENVOLVIMENTO Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 Dodonea viscosa c – cutícula, ent – endotesta, ext – exotesta, mst – mesotesta, TG – tégmen. Na semente madura (Figura 26) a testa é composta por várias camadas de células, apresentando exotesta constituída inteiramente por macroesclereídes, alongadas e de paredes bem espessadas na porção superior. A mesotesta continua dividida em parte externa, agora com células pouco alongadas, de paredes espessadas e parte interna amassada. Tégmem reduzido totalmente amassado. DISCUSSÃO variam de acordo com cada autor. Os autores modernos, na sua maioria, preferem usar os termos exo e endocarpo em sentido amplo, incluindo as epidermes externa e interna, respectivamente, e alguns dos tecidos subepidérmicos (Roth, 1977). Segundo Fahn (1978), a separação do pericarpo em representam camadas distintas do ponto de vista de sua origem. Em Dodonea viscosa facilitou a descrição, sendo que o mesocarpo, no fruto maduro ainda é diferenciado em duas partes distintas, sendo o fruto de Dodonea viscosa é incluído como capsular e apresenta valvas aladas. Spjut (1944) descreveu o fruto de Dodonea como uma sâmara. Roosmalen (1985) relata para ), baga (Talisia) ou esquizocarpo ( e Urvillea). Os óvulos de Sapindaceae são referidos como anátropo ou campilótropo, bitegumentado e crassinucelados, Em Dodonea viscosa anacampilótropo e possui obturador placentário. Segundo Corner (1976), o obturador é freqüente em Sapindaceae, sendo uma estrutura arredondada de origem placentária ou funicular que recobre ou não a micrópila. Este autor relatou a presença de obturador em , , Dodonea viscosa e . Albiero et al. (2001) trabalhando com sementes de saponarea L. e Nacif et al. (2001) num estudo com Litchi chinensis Sonn. cv. Brewster, ambas espécies pertencentes presente no óvulo. O obturador é uma estrutura especial que ocorre próximo a micrópila e tem a função principal de guiar o crescimento de tubo polínico, podendo ser de origem funicular, placentária ou de combinação das duas. Pode ou simplesmente, uma região com epiderme papilosa. O obturador cresce através da micrópila e mantém conexão com o tecido transmissor ou com a epiderme secretora do canal estilar, sendo que após a polinização se degenera (Bouman, 1984). No material do presente estudo constatou-se a presença de um obturador bem desenvolvido de origem 42 A. A. S. PAOLI et al. Revista Brasileira de Sementes, vol. 30, nº 2, p.033-042, 2008 placentária. bem desenvolvido é uma característica peculiar em muitasementes e sugeriu que, devido a este fato, arilos vestigiais poderiam ser encontrados. Em Dodonea viscosa foi encontrado um arilo vestigial na região do hilo, fato este observado por Barroso et al. (1999). O número de tegumentos é um caráter embrionário mais importante, uma vez que sementes bitegumentadas mais comuns são consideradas primitivas (Corner, 1976). Em Dodonea viscosa a semente é bitegumentada, sendo considerada testal, uma vez que a testa é multiplicativa e exotestal por ser a camada mais externa da testa, constituída pela camada de macroesclereídes, sendo considerada como semente levando-se em conta a principal camada mecânica é baseada no extenso trabalho de Corner (1976), sobre anatomia de sementes de dicotiledôneas. AGRADECIMENTOS Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento REFERÊNCIAS ALBIERO, A.L.M.; BACCHI, E.M.; MOURÃO, K.S.M. Caracterização anatômica das folhas, frutos e sementes de L. (Sapindaceae). Acta Scientiarum, Maringá, v.23, n.2, p.549-560, 2001. BARROSO, G.M.; MORIM, M.P.; PEIXOTO, A.L.; ICHASSO, C.L.F. Frutos e sementes: morfologia aplicada à sistemática de dicotiledôneas. Viçosa: UFV, 1999. 443p. BOUMAN, F. The ovule In: JOHR, B.M. (Ed.). Embriology . Berlin: Heidelberg Springer Verlag, 1984. p.123-157. CORNER, E.J.H. . Cambridge: Cambridge University Press, 1976. v.1, p.331 CORNER, E.J.H. . 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