MODELAGEM MATEMÁTICA DA CICATRIZAÇÃO DE FERIDAS CUTÂNEAS COM BASE EM MODELO BIOLÓGICO EM RATOS Marta Helena de Oliveira Tese apresentada à Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” para a ob- tenção do t́ıtulo de Doutor em Biometria. BOTUCATU São Paulo - Brasil Fevereiro – 2021 MODELAGEM MATEMÁTICA DA CICATRIZAÇÃO DE FERIDAS CUTÂNEAS COM BASE EM MODELO BIOLÓGICO EM RATOS Marta Helena de Oliveira Orientador: Dr. Paulo Fernando de Arruda Mancera Coorientadora: Dra. Cláudia Helena Pellizzon Tese apresentada à Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” para a ob- tenção do t́ıtulo de Doutor em Biometria. BOTUCATU São Paulo - Brasil Fevereiro – 2021 Palavras-chave: Angiogênese; Celularidade; Cicatrização ; Equações diferenciais; Feridas na pele. Oliveira, Marta Helena de. Modelagem matemática da cicatrização de feridas cutâneas com base em modelos biológicos em ratos / Marta Helena de Oliveira. - Botucatu, 2021 Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Instituto de Biociências de Botucatu Orientador: Paulo Fernando de Arruda Mancera Coorientador: Cláudia Helena Pellizzon Capes: 90194000 1. Modelos matemáticos. 2. Angiogênese. 3. Pele - Ferimentos e lesões. 4. Cicatrização. 5. Equações diferenciais. DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - CÂMPUS DE BOTUCATU - UNESP BIBLIOTECÁRIA RESPONSÁVEL: ROSEMEIRE APARECIDA VICENTE-CRB 8/5651 FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO TÉC. AQUIS. TRATAMENTO DA INFORM. Dedicatória Esse trabalho é dedicado à minha famı́lia. Agradecimentos Entre tropeços e recomeços escolhi viver essa aventura. Um árduo caminho a ser trilhado e o que seria deste sem meus apoiadores? Na concretização desse sonho ouso dizer que de nada valeria a conquista sem que eles estivessem comigo. Sempre tive apoio e companhia, fosse na glória ou na tribulação. E em primeiro lugar devo agradecer aos meus heróis: meus pais José e Áurea, guerreiros incansáveis e não muito além aos meus irmãos Ailton, Meirinês e Inês por todo apoio, carinho e incentivo. Aos meus sobrinhos André, Let́ıcia, Camila, Artur e Alexandre, meus eternos meninos, pelo sorriso e pelo brilho no olhar esternando constante orgulho, admiração e me impulsionando a resistir as grandes dificuldades. À todos os amigos que me acompanharam nessa jornada tornando-a mais gratificante e aqui devo citar Lucas Fernando Sérgio Gushiken, Eduardo Ribeiro Pinto, Jairo Gomes da Silva, Daniel Chieregato Vicentin, Francini Piccolo Ferreira, Gabriela Colovati de Almeida, Juliana Aparecida Gualberto, Felipe Teles Barbosa, Luiz Gustavo Lyra, Janielly Matos Vieira, Roniel Antonio de Araújo e Felipe de Almeida Camargo. À todos os docentes e funcionários do Departamento de Bioestat́ıstica, Biologia Vegetal, Parasitologia e Zoologia pela cordialidade e profissionalismo. Ao meu orientador do mestrado César Guilherme de Almeida que muito contribuiu com meus conhecimentos cient́ıficos e a Rosana Sueli da Motta Jafelice pelo incentivo. À minha coorientadora Cláudia Helena Pellizzon pela sua presteza, pelo companherismo e por todo apoio e aqui não poderia deixar de relatar minha v admiração por sua competência profissional e humana. Ao meu orientador Paulo Fernando de Arruda Mancera por todo com- panherismo, pela prontidão, pelos ensinamentos didáticos, cient́ıficos e humanos a quem devo muito mais que agradecimentos. Por ele tenho profunda admiração, me sinto honrada de ter sido agraciada com sua orientação e agora ouso chamá-lo de amigo. À Faculdade de Matemática da Universidade Federal de Uberlândia por todo apoio, inclusive financeiro. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nı́vel Superior – CAPES. Ao programa de pós-graduação em Biometria da Universidade Esta- dual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP, Botucatu. À banca examinadora pela disposição e pelo zelo. Às demais pessoas que contribúıram direta ou indiretamente na ela- boração deste trabalho ou participaram da minha vida, e que, porventura, não te- nham sido citadas. Sumário Página LISTA DE FIGURAS viii LISTA DE TABELAS xiv RESUMO xviii SUMMARY xx 1 INTRODUÇÃO 1 1.1 Células . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3 1.2 Cicatrização de feridas na pele . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.2.1 Fase Inflamatória . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 1.2.2 Fase Proliferativa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 1.2.3 Fase de Remodelamento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 1.3 Angiogênese . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 1.4 Tratamentos de Feridas na Pele . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 1.5 Dados Experimentais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 1.6 Modelagem Matemática da Cicatrização de Feridas na Pele . . . . . . . . 26 1.7 Estrutura do Texto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 1.8 Objetivo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 2 MODELAGEM MATEMÁTICA DA FASE INFLAMATÓRIA 29 2.1 Equação de Hill . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 2.2 Problemas Stiff . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 vii 2.3 Modelos Matemáticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 2.3.1 Calibração dos Parâmetros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 2.3.2 Resultados e Discussão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 2.4 Modelo Matemático da Fase Inflamatória . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 3 MODELAGEM MATEMÁTICA DA DIFUSÃO CELULAR 59 3.1 Equação de Fisher-Kolmogorov . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 3.1.1 Solução Numérica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 3.1.2 Ondas Viajantes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63 3.2 Sistema Reação-Difusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65 3.3 Modelagem Matemática da Fase Proliferativa . . . . . . . . . . . . . . . 68 3.4 Um Modelo Matemático Difusivo da Fase Inflamatória . . . . . . . . . . 73 4 UM MODELO MATEMÁTICO PARA ANGIOGÊNESE DE FE- RIDAS CUTÂNEAS 81 4.1 Modelagem Matemática . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 82 4.2 Resultados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88 5 CONCLUSÃO 93 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 95 Lista de Figuras Página 1 Representação esquemática da organização hierárquica da hematopoese na vida adulta. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4 2 Ilustração das fases de cicatrização de feridas. Figura modificada de Eming et al. (2017). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8 3 Ilustração de eventos que ocorrem na fase inflamatória da cicatrização de fe- ridas na pele. Fonte: Gushiken (2017), figura modificada de Reinke & Sorg (2012). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 4 Ilustração de eventos que ocorrem na fase proliferativa da cicatrização de feridas na pele. Fonte: Gushiken (2017), figura modificada de Reinke & Sorg (2012). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 5 Ilustração de eventos que ocorrem na fase de remodelamento da cicatrização de feridas na pele. Fonte: Gushiken (2017), figura modificada de Reinke & Sorg (2012). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 6 Ilustração do processo de formação dos vasos sangúıneos . . . . . . . . . 15 7 Ilustração da formação dos brotos (buds) e do brotamento proximal (sprout). Figura modificada de Bischoff (1995) e gerada pelo aplicativo BioRender (Aoki, 2020). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16 8 Esquema (A) e fotografia (B) ilustrando o modelo de excisão de lesão cutânea de segunda intenção utilizando punch de 2 cm de diâmetro. Fonte: Gushiken (2017). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 ix 9 Fotografias das lesões dos animais tratados com cremes Lanette, Colagenase, 10% EH e 10% OR durante 3, 7 e 14 dias de experimentação. Os grupos 10% EH e 10% OR apresentavam no local somente a cicatriz da lesão enquanto os grupos CL e colagenase apresentavam crosta fibrinosa. Fonte: Gushiken (2017). 22 10 Dispersão da média das concentrações de IL-6 (pg/mg de protéına) dos resul- tados obtidos em laboratório. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 11 Dispersão da média das concentrações de IL-10 (pg/mg de protéına) dos resul- tados obtidos em laboratório. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 12 Curva de dispersão da média dos dados experimentais da celularidade total na borda da ferida (cel mm−3). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 13 Dispersão da média dos dados experimentais da concentração qúımica da mi- tose (PCNA) na borda da ferida (pg mm−3). . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 14 Curva de dispersão da média dos dados experimentais do quimiotratante VEGF na borda da ferida (mm2). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 15 Dispersão da média dos dados experimentais da densidade do brotamento distal na borda da ferida (U). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 16 Ilustração dos gráficos da função de Hill para diferentes valores de nh. . . 31 17 Ilustração dos gráficos da equação (3) para diferentes valores de Vmax. . . . . 31 18 Ilustração dos gráficos da equação (3) para diferentes valores de k0.5. . . . . . 31 19 Diagrama representativo do modelo matemático (7). . . . . . . . . . . . 35 20 Diagrama representativo do modelo matemático (10) . . . . . . . . . . . 40 21 Ilustração da dinâmica do 10% OR, para o modelo 10. Tempo de cicatrização da ferida: 31,4 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultra- passando de forma descendente a linha pontilhada, a qual corresponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 22 Ilustração da dinâmica do 10% EH, para o modelo 10. Tempo de cicatrização da ferida: 28,4 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultra- passando de forma descendente a linha pontilhada, a qual corresponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 x 23 Ilustração da dinâmica do CL, para o modelo 10. Tempo de cicatrização da ferida: 16,9 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultra- passando de forma descendente a linha pontilhada, a qual corresponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 24 Ilustração da dinâmica da Colagenase, para o modelo 10. Tempo de cica- trização da ferida: 41,5 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultrapassando de forma descendente a linha pontilhada, a qual corres- ponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 25 Ilustração da dinâmica do tratamento 10% OR, para o modelo 26. Tempo de cicatrização da ferida: 18,9 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultrapassando a linha pontilhada de forma descendente, a qual corresponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 26 Ilustração da dinâmica do tratamento 10% EH, para o modelo 26. Tempo de cicatrização da ferida: 17,3 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultrapassando a linha pontilhada de forma descendente, a qual corresponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 27 Ilustração da dinâmica do CL, para o modelo 26. Tempo de cicatrização da ferida: 19,5 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultra- passando a linha pontilhada de forma descendente, a qual corresponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 28 Ilustração da dinâmica da Colagenase, para o modelo 26. Tempo de cica- trização da ferida: 11,3 dias, quando a celularidade total retorna ao estado basal, ultrapassando a linha pontilhada de forma descendente, a qual corres- ponde a 30% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 29 Diagrama representativo do domı́nio das EDP ilustrando o sentido da propagação. 61 30 Solução numérica do modelo para o caso linear p = 0 com D = 10−3, ∆x = 5× 10−3 e ∆t = 6, 25× 10−3. A celularidade evolui da direita para a esquerda. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 xi 31 Solução numérica do modelo para o caso não linear p = 4 com D = 10−3, ∆x = 5 × 10−3 e ∆t = 6, 25 × 10−3. A celularidade evolui da direita para a esquerda. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 62 32 Solução numérica do modelo matemático (37). Densidade celular N do caso ativador. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 33 Solução numérica do modelo (37). Concentração qúımica da mitose C do caso ativador. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 34 Solução numérica do modelo (37). Densidade celular N do caso inibidor. 68 35 Solução numérica do modelo (37). Concentração qúımica da mitose C do caso inibidor . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 36 Ilustração do gráfico da função N(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% OR. 70 37 Ilustração do gráfico da função N(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% EH. 70 38 Ilustração do gráfico da função N(1, t) da fronteira de Dirichlet para CL. . . . 71 39 Ilustração do gráfico da função N(1, t) da fronteira de Dirichlet para Colagenase. 71 40 Ilustração do gráfico da função C(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% OR. 71 41 Ilustração do gráfico da função C(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% EH. 71 42 Ilustração do gráfico da função C(1, t) da fronteira de Dirichlet para CL. . . . 72 43 Ilustração do gráfico da função C(1, t) da fronteira de Dirichlet para Colagenase. 72 44 Solução numérica do modelo (36). Densidade celular N , caso inibidor, do tratamento 10% OR. DN = 9, 9 × 10−6, DC = 1, 2 × 10−7, k = 3, 7 × 10−2 e λ = 10−3. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72 45 Solução numérica do modelo (36). Densidade celular N , caso inibidor, do tratamento colagenase. DN = 9, 7× 10−6, DC = 3, 9× 10−6, k = 3, 7× 10−2 e λ = 10−3. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 72 46 Ilustração do gráfico da função c(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% OR. . 75 47 Ilustração do gráfico da função g(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% OR. 75 xii 48 Ilustração do gráfico da função c(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% EH. . 76 49 Ilustração do gráfico da função g(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% EH. . 76 50 Ilustração do gráfico da função c(1, t) da fronteira de Dirichlet para CL. . . . 76 51 Ilustração do gráfico da função g(1, t) da fronteira de Dirichlet para CL. . . . 76 52 Ilustração do gráfico da função c(1, t) da fronteira de Dirichlet para Colagenase. 77 53 Ilustração do gráfico da função g(1, t) da fronteira de Dirichlet para Colagenase. 77 54 Solução numérica do modelo matemático (38). Celularidade total 10% OR. Ferida cicatrizada no tempo 14,2 dias. DN = 5 × 10−3, DC = 10−2, γc = 3, 0 e ω = 0, 03. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77 55 Solução numérica do modelo (38). Celularidade total 10% EH. Ferida cica- trizada no tempo 13,7 dias. DN = 5 × 10−3, DC = 10−2, γc = 5 9 γ̃c = 2, 5 e ω = 0, 03. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77 56 Solução numérica do modelo matemático (38). Celularidade total do CL. Fe- rida cicatrizada no tempo 18,8 dias. DN = 5×10−3, DC = 10−2, γc = 4, 4785, χn = χ̃n/10 = 0, 3915 e ω = 0, 03. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . 78 57 Solução numérica do modelo matemático (38). Celularidade total colagenase. Ferida cicatrizada no tempo 16,3 dias. DN = 5× 10−3, DC = 10−2, γc = 3, 6, χn = χ̃n = 5, 0 e ω = 0, 03. A linha tracejada corresponde ao critério de cicatrização imposto: 80% da celularidade total. . . . . . . . . . . . . . . . 78 58 Ilustração do gráfico da função b(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% OR. . 86 59 Ilustração do gráfico da função p(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% OR. 86 60 Ilustração do gráfico da função b(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% EH. . 87 61 Ilustração do gráfico da função p(1, t) da fronteira de Dirichlet para 10% EH. . 87 62 Ilustração do gráfico da função b(1, t) da fronteira de Dirichlet para CL. . . . 87 63 Ilustração do gráfico da função p(1, t) da fronteira de Dirichlet para CL. . . . 87 64 Ilustração do gráfico da função b(1, t) da fronteira de Dirichlet para Colagenase. 88 xiii 65 Ilustração do gráfico da função p(1, t) da fronteira de Dirichlet para Colagenase. 88 66 Ilustração da dinâmica da concentração de VEGF, no leito da ferida, para o tratamento 10% OR. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 67 Ilustração da dinâmica da concentração de VEGF, no leito da ferida, para o tratamento 10% EH. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 68 Ilustração da dinâmica da concentração de VEGF, no leito da ferida, para o tratamento CL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 69 Ilustração da dinâmica da concentração de VEGF, no leito da ferida, para o tratamento Colagenase. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 70 Ilustração da densidade brotamento distal, no leito da ferida, para o tratamento 10% OR. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 71 Ilustração da densidade brotamento distal, no leito da ferida, para o tratamento 10% EH. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 72 Ilustração da densidade brotamento distal, no leito da ferida, para o tratamento CL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91 73 Ilustração da densidade brotamento distal, no leito da ferida, para o tratamento Colagenase. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91 Lista de Tabelas Página 1 Substâncias biologicamente ativas produzidas pelos macrófagos e algumas de suas funções. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 2 Algumas substâncias biologicamente ativas produzidas pelos macrófagos. 6 3 Descrição das variáveis para os modelos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 4 Descrição dos parâmetros para os modelos matemáticos. Todos os parâmetros são positivos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 5 Parâmetros do modelo matemático (10) para os tratamentos 10% OR e 10% EH. Apresentamos os valores numéricos e as respectivas proporções desses valores comparados aos à condição inicial. . . . . . . . . . . . . . 49 6 Parâmetros do modelo matemático (10) para os tratamentos CL e Cola- genase. Apresentamos os valores numéricos e as respectivas proporções desses valores comparados aos à condição inicial. . . . . . . . . . . . . . . 50 7 Resultados dos ńıveis celulares e os respectivos tempos do modelo (10). . 51 8 Parâmetros do modelo (26) para os tratamentos 10% OR e 10% EH. Apresentamos os valores dos parâmetros e as respectivas expressões de proporção desses valores quando comparados aos obtidos no modelo 10. . 55 9 Parâmetros do modelo (26) para os tratamentos CL e Colagenasse. Apre- sentamos os valores dos parâmetros e as respectivas expressões de pro- porção desses valores quando comparados aos obtidos no modelo 10. . . . 56 10 Resultados dos ńıveis celulares e os respectivos tempos do modelo (26). . 57 11 Descrição das variáveis e dos parâmetros do modelo (36). . . . . . . . . . 69 xv 12 Constantes das funções fronteira de Dirichlet para celularidade total N(1, t) e concentração qúımica da mitose C(1, t). . . . . . . . . . . . . . 70 13 Constantes das funções fronteira de Dirichlet para IL-6, c(1, t), e IL-10, g(1, t). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75 14 Descrição das variáveis do modelo (39). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83 15 Descrição dos parâmetros do modelo (39). . . . . . . . . . . . . . . . . . 84 16 Constantes das funções fronteira de Dirichlet para concentração do qui- miotático, b(1, t), e densidade das pontas capilares, p(1, t). . . . . . . . . 86 17 Resultados numéricos estimados pelo modelo (39) para VEGF, b, e bro- tamento distal dos capilares, p, no centro da ferida. . . . . . . . . . . . . 91 xvi Lista de Śımbolos CFC Células Formadoras de Colônias Cel Célula CL Creme Lanette CR Coeficiente de Rigidez CTH Célula Tronco Hematopoética DBEH Dados biológicos e equação de Hill EDO Equação Diferencial Ordinária EDP Equação Diferencial Parcial EGF Fator de crescimento epidermal FGF-a Fator de crescimento de fibroblasto a FGF-b Fator de crescimento de fibroblasto b FGF-2 Fator de crescimento de fibroblasto 2 IFN Interferon IL-1 Interleucina 1 IL-4 Interleucina 4 IL-6 Interleucina 6 IL-8 Interleucina 8 IL-10 Interleucina 10 IL-1a Interleucina 1 a IL-1b Interleucina 1 b LTC-IC Linhagens de progenitores capazes de estensa proliferação e diferenciação MIF Fator inibidor de migração de macrófago xvii mRNA Ácido ribonucleico mensageiro PCNA Ant́ıgeno nuclear de proliferação celular PDGF Fator de crescimento derivado de plaqueta pH Potencial Hidrogeniônico TNF-a Fator de necrose tumoral a TNF-b Fator de necrose tumoral b VEGF Fator de crescimento endotelial vascular TGF-b Fator de crescimento transformador b mm2 Micrômetros quadrados pg Picograma U Unidade MODELAGEM MATEMÁTICA DA CICATRIZAÇÃO DE FERIDAS CUTÂNEAS COM BASE EM MODELO BIOLÓGICO EM RATOS Autora: MARTA HELENA DE OLIVEIRA Orientador: Prof. Dr. PAULO FERNANDO DE ARRUDA MANCERA Coorientadora: Profa. Dra. CLÁUDIA HELENA PELLIZZON RESUMO O acometimento de feridas na pele aciona o imediato processo de ci- catrização para reparar a lesão. A cicatrização de feridas é um processo complexo e composto por fases sucessivas e sobrepostas: inflamação, proliferação e remodela- mento. A cicatrização de feridas cutâneas é um processo complexo, devido aos es- tados patológicos associados, como a diabete, a localização e profundidade da lesão, presença ou não de infecção, estado nutricional do paciente, doenças crônicas, faixa etária e obesidade. As falhas no processo de cicatrização de feridas são um problema cĺınico importante com grandes impactos nos custos e cuidados com a saúde abrindo espaço para pesquisas. Uma alternativa de tratamento é o uso de produtos baseados em plantas medicinais por serem utilizadas popularmente desde o ińıcio da humani- dade. As formulações dos tratamentos 10% óleo-resina e 10% extrato hidroalcoólico xix da copáıba apresentam atividade anti-inflamatória, est́ımulo da angiogênese, da ree- pitelização, remodelamento da matriz extracelular e retração da área lesada. Como investigações in vivo, não invasivas, são dif́ıceis de executar, modelos matemáticos, biologicamente reaĺısticos, fornecem uma ferramenta importante para compreender a cicatrização de feridas por meio de previsões teóricas não obtidas de outra forma. Nesse trabalho é proposto a modelagem matemática dos tratamentos 10% óleo-resina e 10% extrato hidroalcoólico através de equações diferenciais ordinárias e equações diferenciais parciais determińısticas afim de obter o tempo de cicatrização das fe- ridas, evidenciar aspectos fundamentais da angiogênese e fazer predições acerca de resultados não obtidos em laboratório. Para verificar a eficiência dos tratamentos comparou-se os tratamentos à base de copáıba com o creme referência Colagenase e com o creme lanette, véıculo dos cremes 10% óleo-resina e 10% extrato hidroalcoólico. O modelo de equações diferenciais ordinárias estudado reproduziu a resolução do pro- cesso inflamatório, o primeiro modelo de equações diferenciais parciais reproduziu a dinâmica de dispersão celular ao longo do raio da ferida e possibilitou encontrar o tempo de cicatrização das feridas. O segundo modelo de equações diferenciais parci- ais estimou a concentração de fator de crescimento endotelial vascular e a densidade do brotamento distal no leito da ferida. MATHEMATICAL MODELLING OF SKIN WOUND HEALING BASED ON RATS BIOLOGICAL MODEL Author: MARTA HELENA DE OLIVEIRA Adviser: Prof. Dr. PAULO FERNANDO DE ARRUDA MANCERA Coadviser: Profa. Dra. CLÁUDIA HELENA PELLIZZON SUMMARY The skin wounds occurrence triggers the immediate healing process to repair the injury. The wound healing is a complex process and consists of successive and overlapping phases: inflammation, proliferation and remodeling. The healing of skin wounds is difficult due to the associated pathological conditions, such as di- abetes, the location, depth of the lesion, the presence or absence of infection, the patient’s nutritional status, chronic diseases, age range and obesity. The failures in the wound healing process are an important clinical problem with major impacts on costs and health care, and many researches are being developed. The use of products based on medicinal plants is an alternative treatment for wound healing due to their popularity since the beginning of the humanity. The formulations of the treatments, 10% oilresin and 10% hydroalcoholic extract of copaiba, have anti- inflammatory activity, stimulating angiogenesis, re-epithelialization, the extracellular xxi matrix remodeling and injured area retraction. As non-invasive in vivo investigati- ons are difficult to perform, then mathematical models, biologically realistic, provide an important tool for the understanding of the wound healing through theoretical predictions whic can not be obtained by other ways. In this work, we propose the mathematical modelling of the treatments, 10% oilresin and 10% hydroalcoholic ex- tract, using ordinary differential equations and partial differential equations to find the time for the wound healing, to highlight fundamental aspects of angiogenesis and to make predictions about results not obtained in the laboratory. In order to verify the treatment efficacy the copaiba-based treatments were compared with the collagenase cream reference and with the lanette cream, which is the vehicle for the creams 10% oilresin and 10% hydroalcoholic extract. The resolution of the inflam- matory process was reproduced by the model of ordinary differential equations, the first model of partial differential equations replicated the dynamics of cell dispersion along the radius of the wound and made it possible to find the healing time of the wounds. The second model of partial differential equations estimated the concentra- tion of vascular endothelial growth factor and the density of the capillary tips in the wound centre. ”Não existe sucesso sem sucessor.” John Maxwell 1 INTRODUÇÃO A cicatrização de feridas é um processo dinâmico, complexo, de grande demanda metabólica e regulado por mecanismos celulares, moleculares, bioqúımicos e humorais (relativo à imunidade), que se inicia logo após a ocorrência do ferimento e pode durar anos (Eming et al., 2017; Reinke & Sorg, 2012). A cicatrização de feridas cutâneas é reconhecida como importante para a saúde desde o prinćıpio da humanidade. Pergaminhos do antigo Egito (3200- 300 A.C.) já descrevem procedimentos de tratamentos de feridas, com o uso de compressão para hemostasia e prinćıpios de cicatrização em diferentes tipos de feridas (Reinke & Sorg, 2012; Murray, 2000b). A pele, maior orgão do corpo humano, é composto por duas camadas: a epiderme (superf́ıcie da pele) e a derme (alguns autores consideram a hipoderme, ou camada adiposa, como camada da pele). A pele possui anexos (foĺıculos capila- res, glândulas sebáceas e sudoŕıparas), nervos, corpúsculos sensoriais e vasculatura (Moreski et al., 2018; Rittié, 2016; Reinke & Sorg, 2012). Os vasos sangúıneos que fornecem oxigênio e nutrientes para a pele e que removem reśıduos de produtos me- tabólicos são encontrados na derme (Flegg et al., 2015). Entre as principais funções da pele normal pode-se destacar a garantia de uma barreira protetora ao ambiente externo, a termorregulação corpórea e a proteção contra perda de água (Gushiken, 2017; Horng et al., 2017; Rittié, 2016). Quando essa barreira protetora é rompida por trauma, lesão, radiação, lesão qúımica ou lesão térmica ocorre a injúria, que resulta na ruptura da pele, chamada de ferida ou úlcera e, imediatamente é acionado o processo de cicatrização para reparar o dano (Horng et al., 2017; Gushiken, 2017). 2 As feridas podem afetar uma ou mais camadas da pele. Feridas super- ficiais afetam a epiderme e, possivelmente, uma parte da derme, cuja cicatrização é, basicamente, por reepitelização. Feridas profundas destroem a derme e, possi- velmente, mais camadas e a cicatrização requer a formação de tecido de granulação (Rittié, 2016; Murray, 2000b). O sucesso na cicatrização de feridas profundas depende tanto de fa- tores intŕınsecos, como espécies oxidantes e fatores induźıveis por hipóxia, quanto de fatores extŕınsecos como medicação, estresse emocional, nutrição e idade (Flegg et al., 2015). Três principais abordagens são utilizadas para classificar/tratar uma ferida (Rittié, 2016): • primeira intenção: locais cirúrgicos não infectados com perda mı́nima de tecido fechados com suturas (as mais simples); • segunda intenção: processo de reparo de grandes perdas de tecido; • terceira intenção: feridas abertas por determinado tempo, intencionalmente para observação, desinfecção e desbridamento, e suturadas quando estiverem limpas (as mais complicadas). Nos seres humanos a maioria das feridas profundas são de primeira intenção. As feridas superficiais são pouco estudadas em pequenos roedores (ratos, camundongos, coelhos), pois sua epiderme possui cerca de 50 mm (0.05 mm) de espessura, o que inviabiliza a repetição dos ferimentos (Rittié, 2016). A epiderme e a derme, combinadas, têm a expessura de, aproximadamente, 1-3 mm, em porcos e humanos, e a camada do tecido adiposo pode ter mais de 1 cm de espessura em alguns locais da pele. No entanto, existem diferenças no mecanismo de cicatrização, no tecido fibroso, entre humanos e animais dificultando a transposição de estudos de animais para humanos (Rittié, 2016; Abdullahi et al., 2014). Segundo Chvapil et al. (1979) existem similaridades, na biologia do tecido conjuntivo, entre ratos e cavalos possibilitando a extrapolação de resultados obtidos nos experimentos com ratos para 3 cavalos, animais de grande porte e alto valor econômico. Em equinos, a cicatrização de feridas cirúrgicas ou traumáticas se estende por peŕıodos prolongados e muitas vezes o custo limita ou inviabiliza o sucesso do processo de cicatrização (DeRossi et al., 2009). 1.1 Células As células tronco hematopoéticas (CTH), produzidas na médula óssea, são pluripotentes (originam todas as células sangúıneas). As células precursoras resultantes da diferenciação das CTH expressam diferentes genes, a cada ciclo de mitose, e diferenciam-se em apenas um tipo celular, alguns destes estão representados na Figura 1. A diferenciação celular ocorre sob influência de fatores solúveis (por exemplo CSF - colony stimulatory-factor) e de interleucinas (IL-1, IL-3, IL-4, IL-5 e IL-6) produzidas por células maduras (Vilas Boas, 2019; Carvalho & Collares-Buzato, 2005). Os monócitos circulam na corrente sangúınea e quando são recruta- dos no tecido, por fatores qúımicos, se diferenciam em macrófagos. A função dos macrófagos é regulada por diversas citocinas, leucotrienos e quimiocinas (fatores que controlam a locomoção celular). O monócito é a maior das células brancas sangúıneas, seu diâmetro mede de 12 a 15 mm e seu núcleo é grande e localizado centralmente. Os macrófagos dos tecidos possuem aparência semelhante, porém são um pouco maiores, possuindo de 20 a 25 mm de diâmetro. Tanto a vida média, quanto a capacidade migratória dos macrófagos são pouco conhecidas (Carvalho & Collares-Buzato, 2005). A principal função dos macrófagos é a defesa do organismo, a partir da fagocitose, e apresentação de ant́ıgenos. Em estágio avançado de um processo inflamatório estas células podem se acumular em grandes quantidades englobando e digerindo detritos de células destrúıdas, protéınas indesejadas, microrganismos, células senescentes e tumorais e, até mesmo células com potencial fagoćıtico como os 4 Figura 1: Representação esquemática da organização hierárquica da hematopoese na vida adulta. Na medula óssea a célula tronco hematopoética (CTH), após vários ciclos de divisão celular, origina os precursores das células do sangue: linhagens de progenitores capazes de extensa proliferação e diferenciação (LTC-IC). Após alguns ciclos dão origem às células formadoras de colônias (CFC), neutrófilos e monócitos (sangue), e estes últimos são denominados macrófagos após diferenciarem-se nos tecidos. Fonte: Vilas Boas (2019). neutrófilos. Os macrófagos possuem enzimas hidroĺıticas para a digestão do material fagocitado e produzem espécies reativas de oxigênio e nitrogênio que são tóxicas para bactérias, fungos e parasitas. Na Tabela 1 é listado algumas substâncias, e sua importância em processos fisiológico e patológico, produzidas pelos macrófagos. Algumas substâncias são produzidas e secretadas continuamente, ao passo que outras são liberadas após est́ımulos externos, ou seja, os macrófagos devem estar estimulados ou ativados (Kondo & Ishida, 2010; Carvalho & Collares-Buzato, 2005). Os macrófagos mantêm suas atividades e seu metabolismo em ńıveis basais, pois as enzimas, citocinas e moléculas tóxicas produzidas por estas células podem causar sérios danos ao organismo se produzidas inadequadamente. Um macrófago ativo aumenta seu tamanho e volume, possui grande habilidade de adesão, 5 Tabela 1. Substâncias biologicamente ativas produzidas pelos macrófagos e algumas de suas funções. Substância Função Interleucinas 1 e 6 e TNF-a Inflamação e febre Elastase, colagenase e FGF Reorganização tecidual VEGF Angiogênese Interferon a Atividade antiviral TGF-b Antimitótico de linfófitos Fonte: Carvalho & Collares-Buzato (2005). produz grandes quantidades de mediadores biológicos e tem mais habilidade de fa- gocitar microrganismos e células tumorais (Carvalho & Collares-Buzato, 2005). Segundo Carvalho & Collares-Buzato (2005), os fibroblastos são células que sintetizam componentes fibrilares (colágeno e elastina) e não fibrilares (glico- protéınas e proteoglicanos) da matriz extracelular do tecido conjuntivo. Essas células participam ativamente do processo de cicatrização e de fibrose em determinadas doenças. As modulações fenot́ıpicas e a diferenciação dos fibroblastos são mediadas por citocinas promotoras de crescimento e por componentes da matriz extracelular, alguns destes mediadores estão descritos na Tabela 2. Os fibroblastos diferenciados possuem capacidade de sintetizar protéınas estruturais da matriz extracelular, como os colágenos dos tipos I, III e V, glicoprotéınas não-colagênicas, proteoglicanos, microfibrilas (colágeno tipo VI) e outros. Entre suas funções está a de contribuir para sustentação estrutural de teci- dos e orgãos, ou seja, atuam como reguladoras do arranjo de componentes da matriz extracelular no processo de reparo de lesões, recrutando e, ou, comunicando-se com macrófagos, linfócitos, granulócitos e mastócitos. Os fibroblastos da derme são capa- zes de sintetizar grandes quantidade de colágeno tipo III. Os fibroblastos produzem as interleucinas IL-4, IL-5, IL-10, IL-13, o fator de crescimento transformador b (TGF-b), entre outros, além das citocinas fibrogênicas IL-1a e IL-1b secretadas ini- 6 Tabela 2. Algumas substâncias biologicamente ativas produzidas pelos macrófagos. Mediador Fontes celulares e teciduais Atividades TGF-b e TGF-a Linfócitos T, Macrófagos, Fibroblas- tos e Células musculares esqueléticas Migração / Proliferação FGF-a e FGF-b Células endoteliais (cérebro, retina, matriz óssea) e Macrófagos Migração / Proliferação EGF Granulócitos, Células ectodérmicas, Rins, Glândulas duodenais, Plaque- tas Migração / Proliferação Interferon g Linfócitos T e Células NK Migração / Proliferação IL-1a e IL-1b Macrófagos/Monócitos, Linfócitos T, B e NK, Fibroblastos, Que- ratinócitos, Células endoteliais, musculares lisas e Glias Migração / Proliferação PDGF Macrófagos, Plaquetas, Células en- doteliais, epiteliais, musculares lisas e Glias Migração / Proliferação TNF-a Linfócitos Proliferação Colágeno e Elastina Produzidos por diversas células pre- sentes na matriz extracelular Migração IL-4 Linfócitos T e Mastócitos Migração TNF-b Macrófagos/Monócitos, Linfócitos B e Fibroblastos Migração Fonte: Carvalho & Collares-Buzato (2005). 7 cialmente por linfócitos T e, posteriormente, por neutrófilos, macrófagos, eosinófilos, mastócitos e fibroblastos. O TGF-b pode induzir, indiretamente, a proliferação celu- lar por meio de outros fatores de crescimento, por exemplo dos fatores de crescimento derivado de plaqueta (PDGF) (exacerba śıntese de colágeno e inibe a produção de colagenase) (Carvalho & Collares-Buzato, 2005). O processo de reparação tecidual, em lesões, caracteriza-se pela in- flamação aguda seguida pela deposição de um tecido de granulação transitório, cons- titúıdo, principalmente, por fibroblastos e uma matriz extracelular vascularizada, contendo os colágenos tipo I e III e fibronectina (Carvalho & Collares-Buzato, 2005). 1.2 Cicatrização de feridas na pele A expressão “cicatrização de feridas” designa uma série de processos biológicos complexos e que, normalmente, são descritos em três fases sucessivas e sobrepostas: inflamatória (hemostasia e inflamação), proliferativa (formação de te- cido de granulação e reepitelização) e remodelamento dos tecidos. Na Figura 2 estão ilustradas as fases de cicatrização de feridas baseando-se em resultados de feridas de animais (Gushiken, 2017; Rittié, 2016; Reinke & Sorg, 2012; Witte & Barbul, 1997). Falha ou prolongamento em uma fase pode resultar no atraso da cicatrização ou no não fechamento da ferida (Reinke & Sorg, 2012; Witte & Barbul, 1997). Uma fase precisa declinar para que a próxima se inicie; a desativação da fase inflamatória é pré-requisito para deposição da matriz extracelular no leito da ferida. O processo de cicatrização é cont́ınuo e a divisão em fases é útil para fins didáticos (Rittié, 2016). 8 Figura 2: Ilustração das fases de cicatrização de feridas. Figura modificada de Eming et al. (2017). 1.2.1 Fase Inflamatória A fase inflamatória é uma fase essencial na cicatrização de feridas ca- racterizada pelo aumento da permeabilidade vascular, quimiotaxia das células da cir- culação para a ferida, liberação local de citocinas e fatores de crescimentos e ativação das células migratórias (Witte & Barbul, 1997). O papel da fase inflamatória é lim- par a ferida de células e moléculas estranhas antes da reconstrução da pele (Rittié, 2016). A hemostasia precede a inflamação: a ruptura dos vasos sangúıneos expõe o colágeno subendotelial às plaquetas resultando em agregação de plaquetas e ativação da parte intŕınseca de coagulação (a vasoconstrição ocorre de 5 a 10 mi- nutos após a lesão dos vasos). O contato entre colágeno e plaquetas, bem como a presença de trombina e fibronectina, resulta na liberação de citocinas e fatores de crescimento, tais como fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF), fa- 9 tor de crescimento transformador b (TGF-b), fibronectina e serotonina. O coágulo de fibrina formado localmente serve como estrutura para células invasoras como os neutrófilos, monócitos, fibroblastos e células endoteliais (Reinke & Sorg, 2012; Witte & Barbul, 1997). Os neutrófilos são as primeiras células a invadirem a ferida e perma- necem até 5 dias após a lesão caso a ferida não esteja infectada. A permeabilidade vascular aumenta devido à inflamação e liberação de prostaglandinas juntamente com o gradiente de concentração de substâncias quimiotáticas como interleucina 1 (IL-1), fator de necrose tumoral α (TNF-a) e TGF-b. A resposta da célula, a um sinal quimiotático, também é mediada por receptores de superf́ıcie celular, por exem- plo, PDGF é um quimiotático potencial para fibroblastos e células musculares lisas, mas não para células endoteliais, células epiteliais e leucócitos (Reinke & Sorg, 2012; Witte & Barbul, 1997). Os neutrófilos agem como quimiotáticos para outras células presentes na fase inflamatória liberando mediadores tais como TNF-a, IL-1b e IL-6 os quais amplificam a resposta inflamatória e estimulam VEGF, IL-8 e IL-10. Na Figura 3 estão ilustrados alguns eventos que ocorrem na fase inflamatória (Horng et al., 2017; Reinke & Sorg, 2012). As citocinas e os fatores de crescimento, geralmente, possuem mais de um efeito nas células. Por exemplo, TGF-b é quimiotático para monócitos na escala fentomolar e aumenta a śıntese de colágeno na escala nanomolar, ou seja, TGF-b é quimiotático para monócitos em uma concentração menor (ordem de 106) do que a necessária para aumentar a śıntese de colágeno e PDGF é quimiotático para fibroblastos em uma concentração 100 vezes menor do que a necessária para estimular a proliferação (Witte & Barbul, 1997). Os neutrófilos são cruciais para que não haja contaminação bacteriana, os macrófagos e linfócitos são essenciais na fagocitose e na defesa antimicrobiana, funções primordiais durante a inflamação (Witte & Barbul, 1997). Estudos sugerem que os neutrófilos esgotam os quimiotáticos que inicialmente os atráıram para a ferida (Eming et al., 2017). 10 Figura 3: Ilustração de eventos que ocorrem na fase inflamatória da cicatrização de feridas na pele. Fonte: Gushiken (2017), figura modificada de Reinke & Sorg (2012). A ativação dos macrófagos têm implicações fundamentais em vários as- pectos da cicatrização de feridas como desbridamento, śıntese matricial e angiogênese. A liberação inicial de fatores de plaquetas é o primeiro est́ımulo forte à ativação de macrófagos, os quais permanecem na ferida até o décimo dia, seguida pela fagoci- tose de detritos celulares como fibronectina ou colágeno (Moreski et al., 2018). A ativação de macrófagos leva a liberação de citocinas que mediam a angiogênese e a fibroplasia. Os macrófagos ativados podem ativar outras células, como os linfócitos, via citocinas, os linfócitos, por sua vez, liberam interferons (IFN’s) e interleucinas. Os IFN’s atuam de volta nos macrófagos para induzir a liberação de outras citoci- nas, como TNF-a, IL-1 e IL-6. Esse exemplo ilustra a complexidade das interações entre as células durante a cicatrização (Carvalho & Collares-Buzato, 2005; Witte & Barbul, 1997). 11 Os fibroblastos derivados da ferida são caracterizados pelo aumento na śıntese e contração de colágeno e na diminuição da proliferação quando comparados aos fibroblastos normais (Witte & Barbul, 1997). A resposta inflamatória reduzida afeta muito o processo de cica- trização, mas também existem consequências negativas se essa resposta for aumen- tada, por exemplo, a ativação de um processo fibrótico que pode debilitar a função do tecido ou levar à falência do orgão (Eming et al., 2017; Witte & Barbul, 1997). Assim temos que é fundamental o equiĺıbrio entre os mediadores anti-inflamatórios e os pró-inflamatórios (Gushiken, 2017). As células leucoćıticas sofrem alterações comportamentais do estado pró-inflamatório para o anti-inflamatório. A inflamação, de um processo normal de restauração da arquitetura dos tecidos, possui três etapas distintas: uma etapa pró-inflamatória precoce na qual elementos de resposta imune inata iniciam o reparo mobilizando e recrutando as principais células inflamatórias, na segunda etapa a resposta pró-inflamatória começa a reduzir e as principais células inflamatórias, como os macrófagos, mudam para um fenótipo restaurador e na última etapa a homeostase do tecido é restaurada e as células inflamatórias evadem da lesão ou são eliminadas por apoptose (Eming et al., 2017). 1.2.2 Fase Proliferativa Na fase de proliferação (3 a 10 dias após a lesão) o foco principal do processo de cicatrização está na recuperação da superf́ıcie da ferida, na formação do tecido de granulação e na restauração da rede vascular (Reinke & Sorg, 2012). A epiderme humana é um epitélio estratificado composto por camadas organizadas de queratinócitos e o processo de reepitelização requer grande quantidade de novas células para repor os queratinócitos perdidos na lesão (Rittié, 2016). O tecido de granulação consiste em uma densa população de macrófagos, fibroblastos, vasos sangúıneos embutidos em uma matriz frouxa de fi- 12 bras de colágeno, fibronectina e ácido hialurônico. A matriz do tecido de granulação é depositada por fibroblastos. A formação do tecido de granulação para através do processo de apoptose das células (Rittié, 2016; Reinke & Sorg, 2012). Os fibroblastos e as células endoteliais são as células principais dessa fase. Os fibroblastos migram para o interior da ferida através do tecido circundante (os quais precisam ser ativados, a partir do seu estado de repouso, no qual não são replicativos), as células endoteliais proliferam das células intactas próximas à ferida e formam novos brotos capilares pelo processo de angiogênese. Os fatores de crescimento e as citocinas responsáveis pela proliferação desses dois tipos celulares advém, principalmente, de plaquetas e macrófagos ativados. Muitos dos fatores de crescimentos como PDGF, fator de crescimento epidermal (EGF) e VEGF induzem quimiotaxia, proliferação e replicação de fibroblastos (Reinke & Sorg, 2012; Witte & Barbul, 1997). Os brotos capilares formam pequenos canais capilares que se inter- conectam formando um laço de vasos os quais, posteriormente se diferenciam em artérias e vênulas, completando o processo angiogênico após a estabilização das pa- redes dos vasos. O último passo na fase de proliferação é a formação do tecido de granulação (grande quantidade de compostos celulares) ao mesmo tempo em que a fase de remodelamento se iniciou. A angiogênese ainda não está completa, logo o tecido é bastante vascularizado, e como consequência a ferida pode apresentar verme- lidão e pode ser traumatizada facilmente (Moreski et al., 2018; Reinke & Sorg, 2012). Na Figura 4 é ilustrado os principais eventos que ocorrem na fase proliferativa. 1.2.3 Fase de Remodelamento A principal caracteŕıstica na fase de remodelamento é a deposição de colágeno. Do ponto de vista cĺınico essa é a fase mais importante, pois é nela que se determina a força da cicatriz (Witte & Barbul, 1997). A derme intacta é composta, predominantemente, por colágenos tipo 13 Figura 4: Ilustração de eventos que ocorrem na fase proliferativa da cicatrização de feridas na pele. Fonte: Gushiken (2017), figura modificada de Reinke & Sorg (2012). I (80% a 90%) e tipo III (10% a 20%). No tecido de granulação o colágeno tipo III é aumentado para cerca de 30%, enquanto na cicatriz madura essa taxa se reduz a 10%. O aparecimento precoce do colágeno tipo III coincide com o da fibronectina, no entanto esse aparecimento precoce não contribui para a resistência da cicatriz. As fontes de colagenase na ferida são as células inflamatórias e endoteliais, os fibroblastos e os queratinócitos (Witte & Barbul, 1997). O remodelamento é a última fase da cicatrização que pode durar até um ano após a lesão. Essa fase é avascular, acelular e a deposição de colágeno tipo III (fase proliferativa) é substitúıda pela deposição do colágeno tipo I (Reinke & Sorg, 2012). Na Figura 5 é ilustrado os principais eventos que ocorrem na fase proliferativa. Existem componentes da pele que nunca se recuperam após o fecha- mento da ferida, em adultos a epiderme da cicatriz (última etapa fisiológica da re- paração de feridas em mamı́feros) resultante difere da pele não lesionada (Reinke & Sorg, 2012). 14 Figura 5: Ilustração de eventos que ocorrem na fase de remodelamento da cicatrização de feridas na pele. Fonte: Gushiken (2017), figura modificada de Reinke & Sorg (2012). A maioria das feridas que não cicatrizam não progridem normalmente nas fases de reparo da ferida, mas permanecem em um estado inflamatório crônico levando a um reparo anormal, ou seja, cicatrizes hipertróficas ou quelóides (Reinke & Sorg, 2012). 1.3 Angiogênese A formação de novos vasos sangúıneos, mais especificamente de no- vos capilares, a partir de uma rede capilar pré-existente é denominada angiogênese (Flegg et al., 2015, 2012; Bischoff, 1995). Os vasos sangúıneos são formados por artérias, arteŕıolas, veias, vênulas e capilares (tubos formados por células endoteli- ais) e estão ilustrados na Figura 6. As paredes finas dos capilares permitem a troca de substâncias entre o sangue e os tecidos do corpo (Meneghelli, 2013; Bischoff, 1995). 15 Figura 6: Ilustração dos vasos sangúıneos. As artérias ramificam-se em artérias menores chamadas arteŕıolas as quais ramificam-se em uma miŕıade de vasos sangúıneos minúsculos denominados capilares. Grupos de capilares, no interior dos tecidos, reúnem-se para formar pequenas veias chamadas vênulas as quais se fundem para formar as veias (Meneghelli, 2013). Figura modificada de Adams & Alitalo (2007) e gerada pelo aplicativo BioRender (Aoki, 2020). No ińıcio da fase inflamatória ocorre grande influxo de células infla- matórias (como macrófagos e neutrófilos) para região da ferida liberando uma vari- edade de fatores de crescimento e angiogênicos tais como VEGF (Flegg et al., 2012; Schugart et al., 2008). Protéınas de coagulação, células inflamatórias, e subprodutos metabólicos fornecem uma grande quantidade de fatores angiogênicos e de cresci- mento para o interior da ferida o qual é condicionado à moderada hipóxia. Esses fatores angiogênicos recrutam fibroblastos e células endoteliais os quais se acumulam na região da ferida, esse acúmulo de células aumenta a demanda por suprimentos sangúıneos (Schugart et al., 2008). Em situações de aumento de consumo de oxigênio e de nutrientes a rede vascular basal é insuficiente para o suprimento da regeneração 16 tecidual (Oliveira et al., 2010); Eeses fatores qúımicos fornecem o est́ımulo necessário para a angiogênese (Flegg et al., 2015, 2012; Bischoff, 1995). O crescimento de novos vasos sangúıneos em direção ao centro da fe- rida, direcionados por fatores qúımicos angiogênicos liberados por macrófagos, se inicia com o desenvolvimento de novos vasos precursores denominados brotos (do inglês buds). A formação dos brotos, recrutados de vasos intactos na borda da fe- rida, é induzida por elevados ńıveis de fatores angiogênicos (Pettet et al., 1996a). Cada broto se estende para formar um pequeno brotamento proximal (do inglês sprout) cujas extremidades, denominadas brotamento distal (do inglês tip), movem em direção ao centro da ferida, ou seja, na direção da fonte de fatores angiogênicos. O processo de formação dos brotos está ilustrado na Figura 7. Figura 7: Ilustração da formação dos brotos (buds) e do brotamento proximal (sprout). Figura modificada de Bischoff (1995) e gerada pelo aplicativo BioRender (Aoki, 2020). Enquanto as extremidades dos vasos, ou dos capilares, se direcionam ao centro da ferida ocorrem muitos contatos do tipo brotamento distal-com-brotamento 17 distal ou brotamento distal-com-brotamento proximal formando arcadas ou loops em um processo denominado anastomose (Flegg et al., 2015; Adams & Alitalo, 2007; Pettet et al., 1996a). Angiogênese é um processo fundamental e decisivo em resposta pro- tetiva tal como na cicatrização de feridas (Flegg et al., 2012; Schugart et al., 2008; Pettet et al., 1996b; Bischoff, 1995) envolvendo a resposta quimiotática das células en- doteliais dos vasos sangúıneos aos fatores angiogênicos produzidos pelos macrófagos no interior da ferida (Pettet et al., 1996a). A epiderme bem nutrida mantém sua capacidade de migração e proliferação e a manutenção desses nutrientes é garan- tida pelos vasos sangúıneos, ou seja, acredita-se que a angiogênese seja um processo essencial na recuperação de feridas na pele (Strigini & Ryan, 1996). Angiogênese é altamente regulada pela ação de citocinas e fatores de crescimento e auxilia no transporte de macrófagos e neutrófilos para o leito da ferida (Flegg et al., 2015). Miofibroblastos e macrófagos desempenham um papel impor- tante na angiogênese devido a secreção de VEGF durante o processo de cicatrização de feridas o qual é um fator angiogênico essencial na formação do tecido de granulação (Khalaf et al., 2019). Uma vez que a necessidade metabólica da cicatrização é atingida, a ferida se fecha e os vasos sangúıneos regridem (as células endoteliais tormam-se quiescentes) deixando a região vascularizada com cicatriz fibrosa na proporção da ocorrência da inflamação (Schugart et al., 2008; Bischoff, 1995). Em condições fi- siológicas como reprodução, desenvolvimento embrionário e regeneração tecidual, a angiogênese é altamente controlada, ou seja, é desencadeada por breves peŕıodos e em seguida é completamente inibida o que não ocorre em alguns cânceres que pos- sui crescimento anômalo de vasos sangúıneos (Meneghelli, 2013; Bischoff, 1995). A angiogênese patológica promove o recrutamento cont́ınuo de células inflamatórias exacerbando a inflamação e os danos (Kim et al., 2013). Segundo Flegg et al. (2015) o crescimento tumoral e a cicatrização de feridas possuem muitas semelhanças tal como a ligação célula-célula e a reorganização tecidual, no entanto existem diferenças 18 fundamentais como, por exemplo, a angiogênese associada à cicatrização de feridas é muito regulada, sendo que os novos vasos sangúıneos regridem após a cicatrização estar completa. A quimiotaxia é um fenômeno presente tanto na cicatrização de feridas quanto no desenvolvimento de tumores (Pettet et al., 1996a; Balding & McElwain, 1985). Segundo Iglesias & Devreotes (2008) muito do nosso entendimento do meca- nismo direcionado (quimiotaxia) é oriundo dos neutrófilos. A quimiotaxia, nas células eucarióticas, envolve uma série de pro- cessos coordenados e distintos: motilidade (as células se movem por extensão dos pseudópodes anteriores e retração dos posteriores), polarização (as células reorgani- zam os componentes celulares, levando ao desenvolvimento de bordas dianteiras e traseiras com sensibilidades distintas para quimioatratantes) e detecção de gradiente (células eucarióticas, como neutrófilos, possuem a habilidade de detectar e amplificar gradiente espacial) (Iglesias & Devreotes, 2008). A quimiotaxia, a capacidade de detectar heterogeneidades espaciais na concentração de quimioatratantes extracelulares e de responder por polarização e migração em direção às fontes, é crucial para direcionamento das células do sistema imunológico, bem como aquelas em tecidos em regeneração. A quimiotaxia também desempenha um papel fundamental em eventos patológicos, como metástases e in- flamação excessiva (Iglesias & Devreotes, 2008). 1.4 Tratamentos de Feridas na Pele A migração epidérmica é duas vezes mais rápida em uma ferida úmida do que em uma desidratada. A remoção da crosta e o contato com o ar também reduzem a migração de queratinócitos. Assim, cremes e adesivos curativos, para feridas, podem auxiliar no processo de cicatrização (Rittié, 2016). No entanto, em alguns casos, as feridas cutâneas apresentam dificuldades na cicatrização devido a estados patológicos associados como a diabetes, pertubações imunes e isquemia (Mo- 19 reski et al., 2018). Outros aspectos afetam o processo de cicatrização como, por exemplo, localização, profundidade da lesão, presença ou não de infecção, estado nu- tricional do paciente, doenças crônicas degenerativas, faixa etária e obesidade (Guo & DiPietro, 2010; Ferreira et al., 2003). Falhas na cicatrização de feridas continuam sendo um problema cĺınico importante, com grandes impactos nos custos com cuidados na saúde (Witte & Bar- bul, 1997). Segundo Gushiken (2017), no Brasil não existem dados oficiais sobre os gastos com tratamentos de lesões cutâneas, mas nos Estados Unidos esse custo atinge o valor de US$37 bilhões por ano, com gasto de aproximadamente US$5,700 por pessoa. O mercado oferece uma diversidade de produtos para o tratamento de feridas, entretanto não há consenso sobre a opção mais indicada, assim a busca por medicamentos, que possam acelerar o processo cicatricial, minimizando o desgaste f́ısico e emocional dos pacientes e o custo, é uma área promissora (Moreski et al., 2018; Ferreira et al., 2003). Uma alternativa é o uso de produtos naturais e de plantas medicinais, por serem muito utilizadas popularmente desde o ińıcio da humanidade no trata- mento de feridas. Já se conhece o efeito de vários produtos naturais (a base de babosa, arnica, babaçu, barbatimão, papáına, etc) que auxiliam na cicatrização da pele lesada. A Organização Mundial de Saúde recomenda o levantamento, a identi- ficação, o est́ımulo e a orientação do uso de plantas medicinais que possuam eficácia e segurança terapêutica comprovada (Moreski et al., 2018; Ferreira et al., 2003). Estudos comprovaram propriedades antimicrobianas, analgésicas, an- tiulcerosas, antitumorais e o potencial cicatrizante de diferentes formulações de Co- paifera langsdorffi, popular copáıba, árvore nativa das regiões norte e nordeste do Brasil. Esses estudos consideraram produtos à base da óleo-resina das cascas e do extrato hidroalcoólico das folhas das árvores (Gushiken et al., 2017b,a; Paiva et al., 2002). 20 1.5 Dados Experimentais A obtenção do extrato hidroalcoólico das folhas e da óleo-resina da casca de copáıba em forma de creme foi realizada pela equipe do Prof. Dr. Jairo Kenupp Bastos da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, Univer- sidade de São Paulo (USP), dentro do projeto FAPESP 2011/13630-7 - “Validação Qúımica e Farmacológica de Extratos e Prinćıpios Ativos de Espécies de Copáıfera”. Foram obtidos 90 mL da óleo resina de Copaifera langsdorffii de uma amostra localizada em Cajurú, São Paulo, Brasil. Um espécime de comprovante (SPFR 10120) identificado por Milton Groppo Junior foi depositado no Departa- mento de Biologia, FFCLRP, USP. Folhas de Copaifera langsdorffii foram coletadas em Ribeirão Preto, São Paulo, Brasil e identificadas por Milton Groppo Junior. Um espécime de comprovante (SPFR 10120) foi depositado no Departamento de Biologia, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, USP. O creme lanette (CL) foi usado como véıculo para o preparo dos cre- mes à base de Copaifera langsdorffii nas concentrações de 10%, tanto da óleo-resina da casca, quanto do extrato hidroalcoólico das folhas da planta. Também foi sinteti- zado um creme à base de Colagenase 1.2 UI (nome utilizado para designar o creme comercial à base de colagenases) a partir do véıculo (creme lanette/base) a fim de utilizar um controle positivo semelhante ao medicamento de referência no mercado para comparação com os tratamentos à base de copáıba (Gushiken, 2017). O CL é uma base farmacêutica iônica comumente indicado para incor- poração de extratos por assegurar significante estabilidade ao produto (Souza Neto Júnior et al., 2019; Silva, 2012). O CL apresenta pH entre 5,0 e 6,5 e sua cera é uma dispersão coloidal composta por 90 partes de álcool graxo e 10 partes de tensoativo (Silva, 2012). A colagenase é uma agente desbridante enzimática usada no tratamento de feridas infectadas e cirúrgicas. Estudos anteriores relatam que a colagenase atua limpando o tecido necrótico da ferida por um método enzimático, acelerando a formação do tecido de granulação e subsequente reepitelização em lesões 21 dérmicas de ratos (Durmus et al., 2009). Os dados biológicos foram coletados pela equipe da Profa. Dra. Cláudia Helena Pellizzon do Departamento de Biologia Estrutural e Funcional do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Fi- lho”, campus de Botucatu, dentro dos projetos FAPESP 2011/13630-7 - “Validação qúımica e farmacológica de extratos e prinćıpios ativos de espécies de copáıfera” e 2014/23684-5 - “Avaliação dos mecanismos celulares e moleculares na cicatrização de lesões cutâneas utilizando cremes à base de extrato hidroalcoólico e óleo-resina de Copaifera langsdorffii”. Todas as práticas experimentais foram executadas de acordo com os protocolos experimentais e de ética animal (Protocolo n◦ 413-CEUA de 19 de junho de 2012) e aprovados pela Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA). Foram utilizados ratos Wistar machos com peso entre 200 g e 250 g, os quais tiveram o dorso tricotomizado e feita uma lesão na região dorsal com o aux́ılio de um punch de 2 cm de diâmetro, conforme ilustrado na Figura 8. Os animais foram divididos em 4 grupos experimentais: creme base lanette (controle negativo), creme de Colagenase 1.2 UI (controle positivo), extrato hidroalcoólico das folhas de copáıba na concentração de 10% (10% EH) e óleo-resina da casca de copáıba na concentração 10% (10% OR). Figura 8: Esquema (A) e fotografia (B) ilustrando o modelo de excisão de lesão cutânea de segunda intenção utilizando punch de 2 cm de diâmetro. Fonte: Gushiken (2017). Os animais foram tratados uma vez ao dia com a aplicação dos cre- mes de acordo com o respectivo grupo experimental, por 3 diferentes peŕıodos de 22 tratamento: 3, 7 ou 14 dias (cada peŕıodo com 32 animais). Os dias, para experi- mentação, foram escolhidos de acordo com as fases da cicatrização de lesões cutâneas (inflamatória, proliferativa e de remodelamento) descritas na literatura (Gushiken, 2017; Reinke & Sorg, 2012). Figura 9: Fotografias das lesões dos animais tratados com cremes Lanette, Colagenase, 10% EH e 10% OR durante 3, 7 e 14 dias de experimentação. Os grupos 10% EH e 10% OR apresentavam no local somente a cicatriz da lesão enquanto os grupos CL e colagenase apresentavam crosta fibrinosa. Fonte: Gushiken (2017). Pelas lesões analisadas ao longo de 3 dias de tratamento não consta- taram diferença estat́ıstica de retração. Nas análises macroscópicas, os tratamentos 23 10% EH e 10% OR apresentaram lesões sem exsudato e com crosta aderida, sendo que nos demais grupos houve a presença de exsudato e edema na região das lesões. Após 7 dias de tratamento, os grupos tratados com 10% EH e 10% OR possúıam lesões com crosta aderida e sem a presença do exsudato, diferentemente do observado nos grupos CL e Colagenase. Pelas lesões analisadas ao longo de 14 dias constataram retração estatisticamente significativa para os grupos tratados com 10% EH e 10% OR. Nos animais do grupo CL e Colagenase, observou-se a permanência da crosta fibrinosa aderida à lesão. Nos grupos 10% EH e 10% OR, os animais não apresen- tavam mais a crosta de fibrina, apresentando no local somente a cicatriz da lesão (Gushiken, 2017). Efeitos dos tratamentos estão ilustrados na Figura 9. As amostras de pele homogeneizadas foram submetidas à análise por ELISA para a quantificação das citocinas pró-inflamatórias IL-1b, IL-6 e TNF-a e da citocina anti-inflamatória IL-10. Segundo Gushiken (2017) pelos resultados obtidos na análise de IL-1b constataram a redução da concentração dessa interleucina nos tratamentos 10% EH e 10% OR após 3 dias e as análises dos peŕıodos de 7 e 14 dias não mostraram diferenças entre os tratamentos nas concentrações de IL-1b. Os ńıveis de IL-6 também estavam reduzidos nos tratamentos 10% EH e 10% OR comparados aos ńıveis elevados dessa interleucina no grupo CL após 3 dias de tratamento. Não houve alteração na concentração de IL-6 (ilustrado na Figura 10) durante 7 e 14 dias (Gushiken, 2017). As concentrações de TNF-a também estavam reduzidas nos grupos 10% EH e 10% OR após 3 e 14 dias de tratamento. Não houve diferença significativa nos ńıveis da citocina anti-inflamatória IL-10 após 3 dias de tratamento. Em 7 dias, observamos aumento da concentração dessa interleucina nos grupos 10% EH e 10% OR em comparação aos grupos CL e Colagenase, conforme ilustrado na Figura 11. Após 14 dias não houve diferença significativa entre os tratamentos (Gushiken, 2017; Gushiken et al., 2017a). Na borda das lesões, observou-se no dia 3 um aumento significativo do número de células totais dos grupos 10% EH e 10% OR em relação aos grupos CL e Colagenase, conforme ilustrado na Figura 12. Também na borda das lesões, observou- 24 0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 0 5 10 15 OR 10% EH 10% BASE Colagenase Dias Figura 10: Dispersão da média das con- centrações de IL-6 (pg/mg de protéına) dos resultados obtidos em laboratório. 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 0 2 4 6 8 10 12 14 16 OR 10% EH 10% BASE Colagenase Dias Figura 11: Dispersão da média das con- centrações de IL-10 (pg/mg de protéına) dos resultados obtidos em laboratório. 6000 11000 16000 21000 26000 31000 36000 0 5 10 15 BASE COLAGENASE OR 10% EH 10% Dias Figura 12: Curva de dispersão da média dos dados experimentais da celula- ridade total na borda da ferida (cel mm−3). 5000 7000 9000 11000 13000 15000 17000 19000 21000 0 5 10 15 BASE COLAGENASE OR 10% EH 10% Dias Figura 13: Dispersão da média dos dados experimentais da concentração qúımica da mitose (PCNA) na borda da ferida (pg mm−3). se o aumento da imunomarcação do anticorpo ant́ıgeno nuclear de proliferação celular (PCNA) nos grupos 10% EH e 10% OR em relação aos grupos CL e Colagenase após 3 dias, conforme ilustrado na Figura 13. Durante o tratamento por 14 dias, houve aumento da área de retração nos grupos 10% EH e 10% OR comparados ao CL, conforme ilustrado na Figura 9 (Gushiken, 2017). A IL-6 é uma citocina que possui efeito na inflamação, resposta imune e hematopoese. Juntamente com o TNF-a e a IL-1b, a IL-6 atua como um fator pró- 25 inflamatório, mediando a migração de neutrófilos e macrófagos para a área de lesão. Desse modo, a redução da concentração de IL-6 após 7 dias nos grupos 10% EH e 10% OR comprova a ação anti-inflamatória desses tratamentos sobre essa citocina. O potencial anti-inflamatório do extrato hidroalcoólico e da óleo-resina na cicatrização de feridas de pele pode ser evidenciado não só pela redução dos ńıveis de citocinas pró-inflamatórias como IL-1b, IL-6 e TNF-a, mas também pela atividade da citocina anti-inflamatória IL-10, inibindo a inflamação crônica, o que evita a formação de fibrose tecidual e o atraso na cicatrização das lesões. Além de modular a śıntese de citocinas pró-inflamatórias, como a IL-6, a IL-10 também reduz a infiltração de neutrófilos e macrófagos na região da injúria. Os resultados obtidos, por Gushiken et al. (2017a), pela contagem dos vasos nas bordas e centro das lesões dos grupos tratados em 3, 7 e 14 dias (conta- gem do brotamento distal, na borda da ferida, ilustrado na Figura 15), juntamente com a imunomarcação para VEGF, ilustrado na Figura 14, indicam o est́ımulo dos tratamentos 10% EH e 10% OR na formação de vasos no centro das lesões após 3 dias e borda após 14 dias. O mecanismo de angiogênese local tem como um de seus mediadores o VEGF, entretanto, também pode haver influência do TGF-b1. 0 5000 10000 15000 20000 25000 30000 0 5 10 15 Creme Lanete Colagenase 10% OR 10% EH Dias Figura 14: Curva de dispersão da média dos dados experimentais do quimiotra- tante VEGF na borda da ferida (mm2). 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 0 5 10 15 Creme Lanete Collagenase 10%OR 10%EH Dias Figura 15: Dispersão da média dos da- dos experimentais da densidade do bro- tamento distal na borda da ferida (U). As formulações 10% EH e 10% OR apresentaram atividade anti- 26 inflamatória, retração da área lesada, est́ımulo da angiogênese, da reepitelização e remodelamento da matriz extracelular. No entanto, a 10% OR apresentou maior expressão de FGF-2, caracterizando a proliferação de fibroblastos e a śıntese de colágeno, e o 10% EH a maior expressão de fator inibidor de migração de macrófago (MIF), estimulando a diferenciação de fibroblastos a miofibroblastos na área de re- tração da lesão (Gushiken et al., 2017a). Gushiken (2017) verificou a eficácia dos tratamentos 10% EH e 10% OR na cicatrização a partir da retração macroscópica das lesões cutâneas após 14 dias de tratamento, além do efeito de ambos na atividade anti-inflamatória local, est́ımulo da reepitelização, angiogênese, proliferação celular e remodelamento de ma- triz extracelular. Em termos de experimentos com animais de grande porte, Walton & Neal (1971) realizaram um estudo com feridas de segunda intenção de 4 cm2 nos flancos e nos membros inferiores de cavalos que demoraram, em média, 27 e 59 dias para cicatrizarem, respectivamente. Sendo que foram verificadas alterações nas feridas durante 12 meses. Comparando o peŕıodo de tempo necessário para experimentos com cavalos e ratos percebemos a viabilidade de se estudar modelos em roedores e aproximá-los para os equinos. 1.6 Modelagem Matemática da Cicatrização de Feridas na Pele A cicatrização de feridas é crucial para preservar a integridade dos orgãos após perda de tecido, no entanto ainda é parcialmente compreendida, ape- sar de vários estudos (Murray, 2000b). Como investigações in vivo, não invasivas, são dif́ıceis de executar, modelos matemáticos biologicamente reaĺısticos fornecem uma ferramenta importante para compreender a cicatrização de feridas. O desen- volvimento de modelos matemáticos pode fornecer meios de identificar elementos do 27 processo, incluindo informações para auxiliar no aprimoramento de metodologias de tratamentos e na melhoria do gerenciamento cĺınico. Está bem estabelecido que esses modelos matemáticos têm o potencial de gerar previsão teórica, não antecipada por outros meios, estimulando pesquisas biomédicas e reduzindo o despêndio de tempo e de gastos financeiros com experimentos (Flegg et al., 2015). A aplicação de ferramentas computacionais modernas possibilita o cont́ınuo e acelerado desenvolvimento de modelos matemáticos para melhor descrever o processo de cicatrização de feridas durante o fechamento facilitado e não facilitado. Logo, existe a oportunidade de obtenção de modelos cada vez mais completos e preci- sos, que não envolvam simplificações excessivas as quais levariam a resultados menos adequados. Todas as fases de cicatrização de feridas têm sido modeladas, mas a maioria dos trabalhos focam nas fases proliferativa e na contração. Assim, existe a oportunidade de se criar modelos para estudar o processo transiente da cicatrização de feridas, tal como a migração celular (Jorgensen & Sanders, 2016). 1.7 Estrutura do Texto No Caṕıtulo 2 revemos três modelos de equações diferenciais ordinárias (EDO) homogêneas desenvolvidos por Dunster et al. (2014) com uma breve ex- planação anaĺıtica dos pontos de equiĺıbrios. Será apresentado a calibração dos parâmetros para o terceiro modelo, o mais completo, e então propomos um novo modelo matemático com o objetivo de reproduzir mais realisticamente a dinâmica celular. No Caṕıtulo 3 expomos o estudo de dois modelos de equações diferenci- ais parciais (EDP) desenvolvido por Murray (2000b) e Sherratt & Murray (1990) com a descrição do estudo de ondas viajantes, com a reprodução das soluções numéricas e com a aplicação do modelo composto por um sistema de EDP’s aos tratamentos 10% OR e Colagenase. Para finalizar propomos um novo modelo de EDP capaz de estimar a densidade celular total no leito da ferida e, consequentemente o tempo de 28 cicatrização da mesma. No Caṕıtulo 4 estendemos o modelo do Caṕıtulo 3, baseado em Schu- gart et al. (2008) e Pettet et al. (1996a), para um modelo original capaz de reproduzir aspectos importantes associados a angiogênese. No Caṕıtulo 5 apresentamos a conclusão final do trabalho e direções futuras para a pesquisa. 1.8 Objetivo Utilizar modelos matemáticos capazes de predizer o tempo de cica- trização de feridas na pele e de descrever aspectos da angiogênese a partir de um antioxidante fornecido. 2 MODELAGEM MATEMÁTICA DA FASE IN- FLAMATÓRIA Apresentamos três modelos, descritos em Dunster et al. (2014), que descrevem a evolução de populações de células: macrófagos, neutrófilos ativos e neutrófilos apoptóticos, de um mediador pró-inflamatório (IL-6), que é quimiotático para células brancas (leucócitos), e um mediador anti-inflamatório (IL-10), que é liberado pelos macrófagos quando eles removem os neutrófilos apoptóticos. Ao fi- nal do caṕıtulo propomos um modelo matemático considerando a inserção da ação dos macrófagos na produção do mediador pró-inflamatório. Os dois modelos mais completos serão aplicados aos quatro tratamentos descritos na Seção 1.5. 2.1 Equação de Hill A resposta de variações, de muitas interações moleculares, em sistemas celulares exibe uma curva sigmoidal, para entradas de concentrações. A equação de Hill é utilizada para quantificar a cooperatividade em que a ligação de uma molécula efetora (ligante, ativador) ao receptor aumenta a ligação das moléculas seguintes. Isso é observado na regulação alostérica (que exige cooperatividade) de enzimas e de ligantes que se conectam às suas respectivas macromoléculas (Dubitzky et al., 2013; Ingalls, 2013). A equação de Hill descreve a saturação das moléculas receptoras, Y , 30 em função da concentração efetora e é dada por: Y = Znh knh 0.5 + Znh , (1) sendo Z a concentração de entrada, nh o coeficiente de Hill (coeficiente de coope- ratividade) e k0.5 a constante de meia saturação (quantifica a concentração limiar necessária para 50% da produção de resposta) (Dubitzky et al., 2013; Ingalls, 2013). Alguns gráficos da função de Hill estão ilustrados na Figura 16 para diferentes valores do coeficiente nh. A equação (1) pode ser escrita na forma: Y knh 0.5 = Znh (1− Y ) , ou seja, Y 1− Y = Znh knh 0.5 . Aplicando o logaritmo à equação anterior temos a equação de Hill linearizada: ln ( Y 1− Y ) = nh lnZ − nh ln (k0.5) , para 0 < Y < 1. (2) Para o cálculo das constantes pode-se utilizar a equação (1) na sua forma linearizada a qual é apresentada na equação (2). Considerando Vmax a taxa máxima de reação alostérica temos que a taxa ĺıquida de reação alostérica, V , pode ser representada pela equação: V = Y Vmax = Vmax Znh knh 0.5 + Znh . (3) Se nh = 1 a equação (3) se torna a equação de Michaelis-Menten, se nh > 1 temos a resposta de cooperatividade positiva e para nh < 1 a resposta de cooperatividade é negativa (Dubitzky et al., 2013). Gráficos para equação (3) estão ilustrados nas Figuras 17 e 18 para diferentes valores de Vmax e de k0.5, respectiva- mente. A equação de Hill pode representar a cinética de repressão de uma reação biomolecular por meio da equação: Y = knh 0.5 knh 0.5 +Rnh , (4) sendo R a concentração de molécula repressora (Dubitzky et al., 2013). 31 Z 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Y 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1 n h > 1 n h =1 n h < 1 Figura 16: Ilustração dos gráficos da função de Hill para diferentes valores de nh. Z 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 V 0 0.5 1 1.5 V max > 1 V max =1 V max < 1 Figura 17: Ilustração dos gráficos da equação (3) para diferentes valores de Vmax. Z 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 V 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1 k 0.5 > 1 k 0.5 =1 k 0.5 < 1 Figura 18: Ilustração dos gráficos da equação (3) para diferentes valores de k0.5. 2.2 Problemas Stiff Todos os métodos para aproximação de solução de problemas de valor inicial possuem termos de erro que envolvem uma derivada de ordem superior da solução da equação. Se a derivada puder ser limitada, então o método terá um limi- tante de erro que pode ser usado para estimar a precisão da aproximação. Mesmo 32 que a derivada cresça à medida que os passos aumentam, o erro pode ser mantido sob relativo controle, desde que a solução também cresça em módulo. Entretanto, muitas vezes surgem problemas para os quais o módulo da derivada aumenta, mas a solução não. Nessa situação o erro pode crescer tanto que chega a dominar os cálculos. Problemas de valores iniciais para os quais tal fato pode ocorrer são cha- mados “equações ŕıgidas” (problema tipo stiff ) e são bastante comuns, especi- almente no estudo de vibrações, reações qúımicas e circuitos elétricos (Burden & Faires, 2008). As equações ŕıgidas têm restrições quanto ao uso de métodos numéricos para obtenção de suas soluções. Por exemplo, temos que um método pode ser apli- cado à equação ŕıgida y′ = λy, para λ < 0, somente se λh, em que h é o tamanho do passo, estiver na região de estabilidade absoluta do método - condição que impõe restrição sobre o tamanho de h. Por exemplo, se h < 2 |λ| o método de Euler pode ser aplicado à equação ŕıgida y′ = λy (Burden & Faires, 2008). Segundo Sartori (2014), em geral, rigidez surge em sistemas de EDO sendo posśıvel indentificar o grau de rigidez por meio da matriz associada ao sistema. Considere o sistema linear: y′ = Bx (5) com y = y(t) ∈ Rs e B uma matriz constante de dimensão s × s com autovalores λi ∈ C, i = 1, 2, · · · , s. Considerando λmax e λmin os autovalores, da matriz B, de maior e de menor módulo, respectivamente, definimos que um sistema linear com coeficientes constantes é ŕıgido se todos os autovalores, da matriz B, têm parte real negativa e se o coeficiente de rigidez (cr) for grande, ou seja, se cr = |λmax| |λmin| >> 1. (6) A Equação (6) continua válida para sistemas de equações diferenciais ordinárias não lineares considerando A como sendo a matriz jacobiana do sistema (Sartori, 2014). Esta definição diz que a solução do sistema, tem algumas compo- nentes que decaem muito mais rápido que outras, exigindo diferentes tamanhos de 33 passo para manter a solução dentro da região de estabilidade do método numérico. Se aplicarmos métodos expĺıcitos em equações ŕıgidas, precisaremos de passos bem pequenos para garantir a estabilidade, e assim serão necessários muitos passos para obter a solução, com uma dada tolerância, tornando o método muito caro, ou inviável (Sartori, 2014). Por outro lado, aplicando métodos impĺıcitos com uma região de es- tabilidade absoluta grande o suficiente para não impor restrições de estabilidade, poderemos escolher o passo tão grande quanto quisermos (Sartori, 2014; Burden & Faires, 2008). 2.3 Modelos Matemáticos Nessa seção serão apresentados três modelos de EDO’s com complexi- dade, biológica e matemática, crescente. No contexto de EDO estamos interessados no tempo gasto para se obter os ńıveis celulares que caracterizam a cicatrização em uma região pré-definida, logo, acompanhemos as variações das populações de células tempo a tempo, para esse trabalho, dia a dia. As variáveis e os parâmetros, para todos os modelos desse caṕıtulo estão descritos nas Tabelas 3 e 4, respectivamente. Iniciamos com o modelo da resposta inflamatória focando na resolução da inflamação baseada na interação de duas populações de células (macrófagos e neutrófilos) com uma citocina pró-inflamatória. Esse modelo é considerado em um ambiente estéril. Sejam n(t) e a(t) a celularidade total de neutrófilos ativos e apoptóticos, respectivamente, m(t) a celularidade total de macrófagos e c(t) a con- centração do mediador pró-inflamatório (IL-6), ao longo do tempo t. O est́ımulo do modelo é fornecido pela função f(t), a qual modela o efeito f́ısico do dano no tecido resultando em uma crescente concentração de mediador pró-inflamatório. O feed- back positivo atua via neutrófilos os quais invadem a ferida em resposta ao mediador pró-inflamatório e morrem naturalmente transformando em neutrófilos apoptóticos. Os neutrófilos apoptóticos podem decompor liberando sua carga tóxica, danificando tecidos e, portanto, fechando o ciclo de feedback positivo aumentando os ńıveis do 34 mediador pró-inflamatório. Os macrófagos também chegam em resposta ao mediador pró-inflamatório, mas depois agem para remover neutrófilos apoptóticos (formando assim um feedback negativo) e morrem naturalmente. O decaimento da concentração do mediador pró-inflamatório se dá pela resolução do processo inflamatório (Dunster et al., 2014). O modelo resultante é dado por: dn dt =χnc− ν n, da dt =ν n− γa a− φma, dm dt =χm c− γmm, dc dt =αf(t) + γa ka ( a2 β2 a + a2 ) − γc c. (7a) (7b) (7c) (7d) A função f representa o dano f́ısico no tecido e é da forma f(t) = H(Aπ − t) sen2(t) com H(Aπ − t) = { 1 , se t 6 Aπ 0 , se t > Aπ , em que A representa a quantia de danos ocorridos no tecido. As condições iniciais do sistema são impostas como n(0) = a(0) = m(0) = c(0) = 0. O diagrama representando os eventos incorporados no modelo (7) está ilustrado na Figura 19. O modelo possui, no máximo, três pontos de equiĺıbrio, os quais são obtidos igualando o sistema à zero e desconsiderando o parâmetro α, pois para t > Aπ temos que a função f(t) = 0. Temos o ponto de equiĺıbrio trivial (n, a,m, c, g) = (0, 0, 0, 0, 0) correspondente ao estado saudável da pele, e os não triviais dados pelas equações: 35 αf(t) Mediador pró-inflamatório (c) χn χm γc Neutrófilos ativos (n) ν Neutrófilos apoptóticos (a) ka γa βa Macrófagos (m) φ γm Figura 19: Diagrama representativo do modelo matemático (7). A linha pontilhada representa um feedback positivo e a linha tracejada o feedback negativo. O feedback positivo é baseado na habilidade dos neutrófilos apoptóticos em sintetizar o mediador pró-inflamatório à uma concentração ka o qual atrai mais neutrófilos para a área lesada. O feedback negativo ocorre segundo a fagocitose dos neutrófilos apoptóticos pelos macrófagos a uma taxa φ. O impulso inicial do modelo se dá pela função f(t) a uma taxa de concentração inicial de macrófagos. Baseado em Dunster et al. (2014). n∗ = χn ν c∗, m∗ = χm γm c∗, c∗ = kaγa γc a∗2 β2 a + a∗2 , a∗ = 1± √ 1− 4 ( γc kaχm + φ γm )( γcβ 2 a kaχm ) 2 ( γc kaχm + χ γm ) (8a) (8b) (8c) (8d) 36 Tabela 3. Descrição das variáveis para os modelos. Variáveis Unidades t Tempo Dia n(t) População de neutrófilos ativos no tempo t cel mm−3 a(t) População de neutrófilos apoptóticos no tempo t cel mm−3 m(t) População de macrófagos no tempo t cel mm−3 c(t) Mediador pró-inflamatório no tempo t pg mm−3 g(t) Mediador anti-inflamatório no tempo t pg mm−3 cel: número de células pg: picogramas (10−15 kg) correspondem ao estado não saudável da pele. Se 1 4 < ( γc kaχm + φ γm )( γcβ 2 a kaχm ) temos que o modelo é monoestável (o ponto de equiĺıbrio trivial é sempre estável, pois todos os autovalores da sua matriz jacobiana são reais e negativos), senão temos dois pontos de equiĺıbrios adicionais representando a pele não saudável, quando forem positivos. Existe uma região na qual o modelo apresenta bifurcação de Hopf (Dunster et al., 2014; Strogatz, 1994). Dunster et al. (2014) provaram a estabilidade do modelo (7), em sua forma adimensional, utilizando o critério de Routh-Hurwitz, apresentaram os diagra- mas de bifurcações e discutiram os efeitos de vários parâmetros-chave que são alvos para intervenção terapêutica e conclúıram que a taxa de apoptose de neutrófilos jun- tamente com a taxa de fagocitose de macrófagos seriam benéficos para a resolução da inflamação (Edelstein-Keshet, 2005). A análise da estabilidade do modelo não será aqui apresentada por não ser objetivo desse estudo. Para pequenos valores de βa o sistema é biestável e para grandes valores de βa apenas o ponto de equiĺıbrio trivial é estável, o que também ocorre para pequenos valores de γm. Dunster et al. (2014) afirmaram que embora o modelo (7) seja analiti- camente tratável, ele é incapaz de reproduzir algum comportamento biológico obser- 37 Tabela 4. Descrição dos parâmetros para os modelos matemáticos. Todos os parâmetros são positivos. Parâmetros Unidades ν Taxa de apoptose dos neutrófilos dia−1 χm Taxa máxima de influxo dos macrófagos cel pg−1 dia−1 χn Taxa máxima de influxo dos neutrófilos cel pg−1 dia−1 φ Taxa de fagocitose cel−1 mm3 dia−1 α Taxa de produção inicial do mediador c pg mm−3 dia−1 βn Taxa de saturação cel mm−3 βa Taxa de saturação cel mm−3 βc Taxa de saturação pg mm−3 βg Taxa de saturação pg mm−3 βgc Taxa de saturação pg mm−3 γa Taxa de necrose secundária dia−1 γm Taxa de evasão dos macrófagos dia−1 γg Taxa de decaimento do mediador g dia−1 γc Taxa de decaimento do mediador c dia−1 kn Taxa de produção do mediador c pelos neutrófilos pg mm−3 dia−1 ka Concentração da produção de c pg mm−3 kg Taxa de produção do mediador g cel−1 pg A Número de vezes que o dano é causado ao tecido no tempo dia Sistema (26) km Taxa de produção do mediador c pelos macrófagos pg mm−3 dia−1 βm Taxa de saturação cel mm−3 38 vado (no contexto de resposta inflamatória) necessitando, portanto, de melhoria. O modelo (9) inclui um feedback positivo advindo da liberação do fator pró-inflamatório pelos neutrófilos ativos e é dado por: dn dt =χnc− ν n, da dt =ν n− γa a− φma, dm dt =χm c− γmm, dc dt =αf(t) + kn ( n2 β2 n + n2 ) + γa ka ( a2 β2 a + a2 ) − γc c. (9a) (9b) (9c) (9d) Fixado os valores dos parâmetros do sistema (7), determinados pela análise da estabilidade, é posśıvel fazer o estudo análogo para determinar a região desejada para kn e βn. As condições iniciais são as mesmas do modelo (7). No modelo (9) dois feedbacks positivos ligam os neutrófilos ao mediador pró-inflamatório: através dos neutrófilos apoptóticos (kaγa) e também dos neutrófilos ativos (kn) introduzido nesse modelo. Baseado em experimentos biol’ogicos é espe- rado que a taxa na qual os neutrófilos ativos produzem o mediador pró-inflamatório seja menor do que a taxa de produção pelos neutrófilos apoptóticos, ou seja, kn << kaγa. Com um feedback negativo e dois positivos a taxa de apoptose dos neutrófilos (ν) passa a alterar a dinâmica do sistema, em contraste ao modelo (7). O próximo modelo matemático inclui a liberação do mediador anti- inflamatório (IL-10) derivado da ação dos macrófagos no processo inflamatório. Pensa-se que o reconhecimento de neutrófilos apoptóticos por macrófagos os reprogra- mem para liberar sinais anti-inflamatórios, incluindo IL-10 e TGF-b. Considerando que os macrófagos liberam um mediador genérico anti-inflamatório (g(t)) com taxa constante kg quando os macrófagos fagocitam os neutrófilos apoptóticos. Dunster et al. (2014) assumiram que o mediador anti-inflamatório decai linearmente a uma taxa γg e que auxilia na resolução da inflamação, diminuindo a taxa de influxo de neutrófilos (βgc é a escala de concentração na qual a taxa de influxo de neutrófilos diminui) e aumentando a taxa apoptose de neutrófilos. Sabe-se que 39 a taxa na qual os neutrófilos sofrem apoptose pode ser modificada por est́ımulos extracelulares, e acredita-se que mediadores anti-inflamatórios aumentem essa taxa. Considerando o mediador pró-inflamatório como um marcador que decresce a taxa de apoptose dos neutrófilos à uma taxa βc (ńıvel normalizado do mediador pró- inflamatório) e o anti-inflamatório como um que aumenta a taxa de apoptose à uma taxa βg. Esses efeitos foram incorporados na taxa de apoptose dos neutrófilos ν e o resultado é o modelo: dn dt = χnc( 1 + g βgc ) − ν ( 1 + g βg ) ( 1 + c βc ) n, da dt =ν n ( 1 + g βg ) ( 1 + c βc ) − γa a− φma, dm dt =χm c− γmm, dc dt =αf(t) + kn ( n2 β2 n + n2 ) + γa ka ( a2 β2 a + a2 ) − γc c, dg dt =kg φma− γg g, (10a) (10b) (10c) (10d) (10e) sendo que a condição inicial do mediador anti-inflamatório é g(0) = 0. O diagrama representando os eventos incorporados no modelo (10) está ilustrado na Figura 20, enquanto as variáveis e os parâmetros estão apresentados nas Tabelas 3 e 4, respectivamente. 40 αf(t) Mediador pró-inflamatório (c) χn χm γc βc Netrófilos ativos (n) ν kn Neutrófilos apoptóticos (a) ka γa βa Macrófagos (m) φ γm Mediador anti-inflamatório (g) kg γg βgc βg Figura 20: Diagrama representativo do modelo matemático (10). Um feedback po- sitivo é adicionado ao modelo considerando a habilidade dos neutrófilos ativos de danificar o tecido e posteriomente liberar mediador pró-inflamatório à uma taxa kn. Também é inclúıdo a ação de um mediador ant-inflamatório o qual é produzido por macrófagos no processo de fagocitose dos neutrófilos apoptóticos. Baseado em Dunster et al. (2014) 41 O sistema (10) possui, no máximo, três pontos de equiĺıbrio, o trivial (n, a,m, c, g) = (0, 0, 0, 0, 0) e os não triviais apresentados a seguir. Igualando o sistema (10) à zero obtemos, da equação (10c): m∗ = χm γm c. (11) Das equações (10c) e (10e) temos: g∗ = L1 c a, (12) no qual L1 = kg φχm γg γm . Substituindo a equação (12) na equação (10a), obtemos: n∗ = L2 ( c βgc + L1 c a )( βc + c βg + L1 c a ) , (13) em que L2 = χn βg βgc ν βc , ou ainda, n2 = [ L2 ( c βgc + L1 c a )( βc + c βg + L1 c a )]2 . (14) Da equação (10e), temos que: φma = γm kg g. (15) Substituindo as equação (12) e (15) na equação (10b) obtemos: a = L3 n βg (βc + c) (γakg + γg L1 c)− L4 n c , (16) em que L3 = νβckgβg e L4 = νkgβcL1. 42 Para que o segundo membro da equação (16) seja positvo é preciso que βg (βc + c) (γakg + γg L1 c) > L4 n c. Da equação (10d), temos: n2 = β2 n [c γc (a2 + β2 a)− kaγaa2] kn (a2 + β2 a)− [c γc (a2 + β2 a)− kaγaa2] . (17) Igualando as equações (14) e (17), temos: L2 2c 2 (βc + c)2 (βgc + L1 c a) (βg + L1 c a) = β2 n [c γc (a2 + β2 a)− kaγaa2] kn (a2 + β2 a)− [c γc (a2 + β2 a)− kaγaa2] , (18) ou seja, L2 2c 2 (βc + c)2 [(a2 + β2 a ) (kn − γc c) + kaγaa 2 ] = β2 n [ a2 (cγc − kaγa) + cγcβ 2 a ] (βgc + L1ca)2 (βg + L1ca)2 . Trabalhando com a equação acima temos L2 2c 2 (βc + c)2 [(kn − γc c) (a2 + β2 a ) + kaγaa 2 ] + β2 n (βgc + L1ca)2 (βg + L1ca)2 a2 (kaγa − cγc) = β2 nβ 2 acγc (βgc + L1ca)2 (βg + L1ca)2 . (19) Para que o segundo membro da equação (18) seja positivo é necessário que o numerador seja positivo, ou seja, c γc ( a2 + β2 a ) > kaγaa 2 e para que isso ocorra é suficiente que c > ka γa γc . (20) Caso contrário (se o numerador for negativo o denominador será, man- datoriamente, positivo) o segundo membro será negativo e isso é um absurdo! Além disso, é preciso que o denominador seja positivo e, então, kn γc + ka γa γc a2 a2 + β2 a > c. (21) 43 Dado que ka γa γc a2 a2 + β2 a < ka γa γc e comparando as desigualdades (20) e (21) temos uma condição de existência do ponto de equiĺıbrio não trivial ka γa γc < c < ka γa γc + kn γc . (22) Substituindo a equação (13) na equação (16) temos: a [ βg (γakg + γgL1c) (βgc + L1ca) (βg + L1ca)− L2L4c 2 ] = L2L3c. (23) Para que o primeiro membro da equação acima seja positivo é ne- cessário que βg (γakg + γgL1c) (βgc + L1ca) (βg + L1ca) > k2 gφχmχnβgcβg γgγm c2, (24) e assim temos a segunda condição para a existência do ponto de equiĺıbrio não trivial. Resolvendo o sistema não-linear formados pelas equações (19) e (23) temos as variáveis a e c do ponto de equiĺıbrio não trivial, enquanto as variáveis m, g e n são dadas pelas equações (11), (12) e (13), respectivamente. Fixado os valores dos parâmetros do sistema (9) determinados pela análise da estabilidade é posśıvel fazer o estudo análogo para determinar a região de- sejada para os novos parâmetros: βc, βg, βgc, γg e kg. Mas devido a complexidade do modelo, foram realizadas simulações numéricas para determinação dos parâmetros. Como um dos objetivos desse trabalho é determinar o tempo no qual a ferida es- tará cicatrizada, a busca dos parâmetros se concentrou na estabilidade do ponto de equiĺıbrio trivial, o qual representa a obtenção de uma pele saudável. Dunster et al. (2014) realizaram o estudo dos modelos acima na forma adimensional e forneceram valores para os parâmetros resultantes. Na adimensiona- lização do modelo ocorre a redução de cinco parâmetros: χm, χn, ka, γc e βgc tornando desafiador a obtenção dos mesmos, considerando a ausência de dados biológicos para determiná-los. Baseado nos valores adimensionais fornecidos e nas expressões do 44 processo de adimensionalização determinamos as expressões: ν = 0,1γc, χm = 0,2 γ2 c φka , kg = 0,07φ, γa = γc, γg = γc, γm = 0,01γc, βgc = kgkaχn 0, 05γc , βg = 0,01βgc, βc = 0,12ka, que serão utilizadas para determinar os valores dos parâmetros com dimensão. 2.3.1 Calibração dos Parâmetros Os parâmetros do modelo foram determinados, com base na literatura e nos dados biológicos, de acordo com os procedimentos abaixo: 1. Calculado dos dados biológicos: α = (IL−6)1−(IL−6)0 t1−t0 . 2. De acordo com Dunster et al. (2014), considerando os valores dos parâmetros adimensionais fornecidos e as expressões do processo de adimensionalização: ν, βg e γc. 3. Por meio da análise gráfica e numérica da dinâmica do modelo, estipulamos constantes a serem multiplicadas pelos parâmetros (valores e/ou expressões) fornecidos em Dunster et al. (2014): χm, χn, kg, γa, γg, γm, βc e βgc. Esses parâmetros serão denotados nos resultados com uma barra, ou seja, χ̄m, χ̄n, k̄g, γ̄a, γ̄g, γ̄m, β̄c e β̄gc. 4. Utilizando os dados biológicos, a equação de Hill (DBEH) e a ferramenta de otimização fsolve do Matlab/Octave, para resolução dos sistemas não lineares, obtivemos: ka, kn, βa e βn. O cálculo foi realizado com base nas equações (2), (3) e (10d) pelo seguinte procedimento: (a) para o cálculo de βa e βn utilizou-se as equações (10d) e (2). Considerou-se a forma linearizada das expressões ( n2 β2 n + n2 ) e ( a2 β2 a + a2 ) o que resulta em ln ( c 1− c ) = lnn+ ln a− ln βn − ln βa, para 0 < c < 1. (25) 45 Utilizando os dados biológicos do mediador pró-inflamatório c nos dias 3, 7 e 14 e considerando condições iniciais para as variáveis (do sistema não linear resultante) βn, βa, ni e ai para i = 1, 2, 3 obtemos um sistema não linear retangular 3× 8 o qual pode ser resolvido com a ferramenta fsolve. As condições iniciais de βn e βa foram baseadas nos valores fornecidos por Dunster et al. (2014) e os de ni e ai para i = 1, 2, 3 foram estipulados através de uma proporção dos dados biológicos e dos ńıveis celulares ob- tidos no modelo (7). Foram feitos testes para determinar os valores mais apropriados. (b) Para o cálculo de ka e kn baseamos nas equações (10d) e (3), nas formas originais, utilizamos a expressão como dc dt = kn ( n2 β2 n + n2 ) + γa ka ( a2 β2 a + a2 ) . Fixado os valores de βa, βn, ni e ai, para i = 1, 2, 3, encontrados anterior- mente, resolve-se o sistema não-linear quadrado utilizando a ferramenta fsolve. Para as condições iniciais baseou-se nos valores fornecidos por Dunster et al. (2014). 5. A taxa φ na qual os macrofágos fagocitam os neutrófilos foi estipulada em φ = 10−3 cel−1 mm3 dia−1 e a taxa de decaimento do mediador pró-inflamatório γc = 3, 0 dia−1 (considerando a meia vida do mediador pró-inflamatório, estipulou-se a escala de tempo como 1 γc ∼ 8h) (Dunster et al., 2014). 2.3.2 Resultados e Discussão A inflamação pode ter um de dois resultados distintos: resolução ou inflamação crônica. A resolução é bem-sucedida se neutrófilos e macrófagos deixam o tecido, os mediadores inflamatórios diminuem e as fases subsequentes de cicatrização são alcançadas. Por outro lado, a inflamação crônica é iniciada se os glóbulos b