LARISSA SOUZA MENDES Síntese de nanopartículas de sílica mesoporosa e aplicações como biomaterial Araraquara 2012 Dissertação apresentada ao Instituto de Química, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisites para obtenção do titulo de Mestre em Biotecnologia. Orientador: Prof. Dr. Reinaldo Marchetto Co-orientador: Marco Antônio Utrera Martines FICHA CATALOGRÁFICA Mendes, Larissa Souza M538s Síntese de nanopartículas de sílica mesoporosa e aplicações como biomaterial / Larissa Souza Mendes. - Araraquara : [s.n], 2012 107 f. : il. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Instituto de Química Orientador : Reinaldo Marchetto Coorientador : Marco Antônio Utrera Martines 1. Biotecnologia. 2. Peptídeo de crescimento osteogênico. 3. Liberação controlada. 4. Adsorção de moléculas. I. Título. Elaboração: Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação do Instituto de Química de Araraquara Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação DADOS CURRICULARES Larissa Souza Mendes 1. DADOS PESSOAIS Nascimento: 24/09/1985, Guaraçaí – SP Filiação: Ivanil Souza Mendes e Aparecida Monteiro Mendes RG: 42.792.814-x/ SSP 28/10/1999 CPF: 348.742.728-19 Endereço residencial: Avenida Itápolis, 2422 Vila Bela Vista – Araraquara – SP CEP: 14.800-040 Telefone: (16) 3114-0228 2. FORMAÇÃO ACADÊMICA/TITULAÇÃO 2010 – Atual Mestrado em Biotecnologia Universidade Estadual Paulista – UNESP Título: Síntese de nanopartículas de sílica mesoporosa e aplicações como biomaterial Orientador: Prof. Dr. Reinaldo Marchetto Bolsista: CAPES . 2005 – 2009 Graduação em Ciências Biológicas Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira - FEIS Universidade Estadual Paulista – UNESP 3. PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA 3.1 Artigos completos publicados em periódicos: 1 3.2 Trabalhos completos publicados em anais de eventos: 1 3.3 Resumos publicados em anais de eventos: 17 4. PRÊMIOS RELEVANTES: 2009 Menção Honrosa com o trabalho: “Precipitação de hidroxiapatita na superfície de matriz de sílica mesoporosa a partir de cloreto de cálcio e fosfato de sódio diácido” XV Reunião de Iniciação Científica da FEIS/UNESP., Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira - FEIS/UNESP 2008 Menção Honrosa com o trabalho: “Síntese e Caracterização de Biomaterial Mesoporoso Funcionalizado com 3-aminopropiletoxisilano (APTES)”, XV Reunião de Iniciação Científica da FEIS/UNESP., Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira - FEIS/UNESP DEDICATÓRIA À Deus, por me manter em pé todas as vezes que quis cair, Aos meus pais, Ivanil e Aparecida, onde quer que estejam, espero que estejam orgulhosos pelos caminhos e decisões que eu segui em vossa ausência física, pois sei que “a morte não é tudo. Não é o final...tudo permanece exatamente como foi. Eu sou eu, você é você, e a antiga vida que vivemos tão maravilhosamente juntos permanece intocada, imutável...”, Às minhas amigas, Ju, Mi e Di (a morena bruta), Roberta, minha madrinha Susy e minhas irmãs Dai e Dessa, aos meus sobrinhos, Pedro e Jõao Vitor, irmãs Agmar e Marta, por compreender minha ausência nesses últimos anos, Ao meu grande amor, Hudson, por me apoiar, compreender e se mostrar prestativo até nas discussões sobre síntese de peptídeos e deixar que a caminhada não seja individual, onde podemos nos encher de felicidade e dizer que essa caminhada é NOSSA. AGRADECIMENTOS Ao meu orientador, Prof. Dr. Reinaldo Marchetto, pela confiança em mim, uma desconhecida interiorana; pela disposição em interpretar e buscar soluções frente resultados inesperados, pela paciência a minha ansiedade. Muito obrigada! Ao meu co-orientador, Prof. Dr. Marco Antonio Utrera Martines, que para mim é mais que um professor, é um amigo que não mediu forças a me ajudar desde o momento que nos conhecemos; me ”iniciou” no meio científico, ensinou bons procedimentos e para mim ;e um exemplo de profissional. Ao Prof.Sidney e Prof. Lucas Rocha por ceder seu laboratório e compartilhar técnicas para preparação das partículas de sílica. Ao Prof. Eduardo Maffud, pela carta de aceite, pelas discussões de corredor e por ter acreditado em mim. Aos meus colegas do Grupo de Síntese, Estrutura e Aplicações de Peptídeos e Proteínas, em especial, ao Anderson, Caroline, Davi Pardal, Edson Araketu, Eduardo Lentilha, Graziely, Hermanito Esteban, Luiz, Paulo e ao Prof. Saulo, pelas novas amizades, pelo convívio amigo e pela ajuda direta no desenvolvimento deste trabalho, principalmente nas purificações e uso do HPLC “RoboCop”. À grande colega de trabalho e amiga Dr(a). Sybele, pela ajuda na síntese do peptídeo, puro e marcado, por me deixar participar das cirurgias dos animais; por compartilhar as novas informações sobre biomateriais e nunca medir esforços para me ajudar. Ao meu grande amigo Mauro, que com seus maracujás “amarelos de formato ovóide” tentava entender porque a área das partículas era maior que a da sua casa (rs). À todos os docentes e servidores do Departamento de Bioquímica e Tecnologia Química que de alguma forma contribuíram para a execução deste trabalho. À Dr(a) Beatriz Cury por me ajudar a definir os parâmetros dos ensaios de liberação. À Prof.(a) Dr(a) Carminha, da Unicamp, pelas discussões via email, mesmo não sendo sua linha de pesquisa. Ao Prof. Dr. Edison Pecoraro que sempre me atendeu e me ajudou a “pensar” melhor sobre os meus resultados. Aos técnicos Tarik e Ricardo, pelas medidas de microscopia eletrônica de varredura e medidas de porosidade; e conversas paralelas. Aos colegas Ricardo Santim e Michael Jones, pelas medidas de difração de raios X. À minha amiga Juliana Jorge, que mesmo com a distância imposta entre nós, continuou trocando suas informações e experiências, mantendo-se sempre presente quando o assunto é discutir resultados. Às minhas roomates, Selma, Luciana, Laurianne, principalmente a Silvia pelas discussões dos resultados obtidos e pela companhia. À família De Lazari por ter-me “adotado” e sempre estar dispostos a me ajudar, seja com o que for. Ao LNLS pelas medidas de SAXS. Ao LMA-IQ pelas imagens de Microscopia Eletrônica Varredura. As funcionárias da Seção de Pós-Graduação e da Biblioteca por todo apoio necessário durante esses anos. À Capes, pelo apoio financeiro. Ao Instituto de Química e aos seus funcionários. “O seu tempo é limitado, então não o gaste vivendo a vida de um outro alguém. Não fique preso pelos dogmas, que é viver com os resultados da vida de outras pessoas. Não deixe que o barulho da opinião dos outros cale a sua própria voz interior. E o mais importante: tenha coragem de seguir o seu próprio coração e a sua intuição. Eles de alguma maneira já sabem o que você realmente quer se tornar...” Steve Jobs RESUMO Materiais mesoporosos têm sido largamente estudados devido ás suas características e potenciais aplicações. A sílica mesoporosa apresenta elevada área de superfície específica (~1000 m2.g-1) e tamanho de poros usualmente em torno de 2-30 nm, atraindo atenção para aplicações em catálise, adsorção e troca iônica. O peptídeo de crescimento osteogênico (OGP) é um tetradecapeptídeo endógeno, cuja forma ativa gera ligações covalentes com as proteinases, mostrando ser um bom agente anabólico e estimulador hematopoiético. Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi à preparação de materiais inorgânicos mesoporosos, a partir de sílica e de um surfactante não-iônico como agente direcionador de estrutura, incorporados com OGP, para atuarem como biomateriais na regeneração óssea. O peptídeo foi sintetizado pelo método em fase sólida (SPFS; estratégia Fmoc); foi purificado e caracterizado por Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (HPLC), Espectrometria de Massas e Análise de Aminoácidos. Os materiais sólidos foram caracterizados por Espectroscopia na região do Infravermelho (FT-IR), Difração de Raios X (XRD), Espalhamento de Raios X à Baixo Ângulo (SAXS), Adsorção-dessorção de Nitrogênio a 77K (BET), Microscopia Eletrônica de Transmissão (TEM) e Microscopia Eletrônica de Varredura (SEM). A bioatividade in vitro desses materiais em Simulated Body Fluid (SBF) foi verificada por FTIR, SEM e XRD, e a adsorção e liberação do peptídeo marcado com 5,6-carboxifluoresceína da matriz mesoporosa foi monitorada por Espectroscopia de Fluorescência. Ficou evidente que a composição do material refletiu em diferentes características físicas, onde a área de superfície específica foi de 880, 484, 220 m2.g-1, para a LMSiO, LMSiCaP I e II, respectivamente, que por sua vez influenciou na porcentagem de incorporação do peptídeo (99% na LMSiO, 55% na LMSiCaP I e nenhuma adsorção na LMSiCaP II). O teste de liberação do peptídeo em SBF demonstrou ser dependente da composição das partículas, da quantidade de peptídeo incorporada e da degradação do material, onde a amostra LMSiCaP I liberou 50% do seu conteúdo peptídico em aproximadamente 4 horas enquanto a LMSiO precisou de mais que 30 horas. Os dados demonstraram que tanto o material de sílica pura (LMSiO) quanto de sílica com apatita (LMSiCaP I e II) apresentou bioatividade in vitro e degradação em função do tempo frente a fluídos biológicos, que é uma importante prospectiva para bio-aplicações. Palavras-chave: sílica mesoporosa; peptídeo de crescimento osteogênico (OGP); bioatividade; adsorção de moléculas; liberação controlada. ABSTRACT Mesoporous materials have been widely studied due to their characteristics and potencial applications. The mesoporous silica has a high specific surface area (1000 m2.g-1) and pore size is usually around 2-30nm, and it has attracted much attention for applications in catalysis, adsorption and ion exchange. The Osteogenic Growth Peptide (OGP) is an endogenous tetradecapeptídeo, which generates the active form covalent bonds with proteases, showing to be a good anabolic agent and hematopoietic stimulator. In this sense, this work presents the preparation of inorganic mesoporous materials from silica and a nonionic surfactant as a structure director agent incorporated with OGP to act as biomaterials in bone regeneration. The peptide was synthesized by solid-phase method (SPFS; Fmoc strategy), purified and characterized by High Performance Liquid Chromatography (HPLC), Mass Spectrometry and Aminoacid Analysis. The solids were characterized by Infrared Spectroscopy (FT-IR), X-ray Diffraction (XRD), Small Angle X-ray Scattering (SAXS), Adsorption-desorption of Nitrogen at 77K (BET), Transmission Electron Microscopy (TEM) and Scanning Electron Microscopy (SEM). The in vitro bioactivity of these materials in Simulated Body Fluid (SBF) was studied by Infrared Spectroscopy (FT- IR), Scanning Electron Microscopy (SEM) and X-ray Diffraction (XRD), and loading and release of the peptide labeled with 5,6-carboxyfluorescein of mesoporous matrix was monitored by Fluorescence Spectroscopy. It was evident that the composition of the material reflects different physical characteristics, where the specific are was 880, 484, 220 m2.g-1 for LMSiO, LMSiCaP I e II, respectively, which in turn influenced the percentage of incorporation of the peptide (99% in LMSiO, 55% in LMSiCaO I e no adsorption in LMSiCaP II). The results have showed that both the pure silica material (LMSiO) and silica with apatite (LMSiCaP I e II) have in vitro bioactivity and show degradation as a function of time in front of the biological fluids, which is an important prospective for bio-applications. Keywords: mesoporous silica; osteogenic growth peptide; bioactivity; loading molecules; controlled release. LISTA DE FIGURAS Figura 1.1. Processo de reparação da fratura, por formação de novo tecido ósseo a partir do endósteo e do periósteo (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008). 26 Figura 1.2. Fórmula estrutural do peptídeo OGP (NCBI, 2012). 29 Figura 1.3. Domínios funcionais no peptídeo OGP. A porção C-terminal participa do reconhecimento e ligação ao receptor macromolecular e sinalização da via mitogênica. A porção N- terminal compreende o domínio que participa da ligação às OGPBPs (BAB; CHUREV, 2002). 30 Figura 1.4. Mecanismo de formação da sílica mesoporosa (HOFFMANN et al., 2006). 32 Figura 3.1. Fluxograma representando resumidamente o trabalho desenvolvido. 42 Figura 3.2. Diagrama da estratégia Fmoc de síntese de peptídeos em fase sólida. 47 Figura 3.3. Formula estrutural da fluoresceína. 49 Figura 3.4. Esquema do sistema de liberação do peptídeo OGP. 54 Figura 4.1.1. Espectros de FT-IR de sílica pura e com fosfato de cálcio sintetizada por sol-gel a partir de P123, onde (↑) indicam bandas Si-O-Si, (o) Si-OH e (*) P-O. 57 Figura 4.1.2. Padrões de XRD para as amostras LMSiO (a), LMSiCaP I (b) e LMSiCaP II (c). As difrações referentes a HA estão assinaladas por (*); β-TCP (o). 59 Figura 4.1.3. Isoterma de adsorção (circulo sólido)/dessorção (circulo aberto) de nitrogênio da sílica mesoporosa pura calcinada, obtida a partir de P123. 61 Figura 4.1.4. Isoterma de adsorção (circulo sólido)/dessorção (circulo aberto) de nitrogênio da amostra de sílica mesoporosa LMSiCaP I calcinada, obtida a partir de P123. 62 Figura 4.1.5. Isoterma de adsorção (circulo sólido)/dessorção (circulo aberto) de nitrogênio da amostra de sílica mesoporosa LMSiCaP II calcinada, obtida a partir de P123. 63 Figura 4.1.6. Representação esquemática da estrutura dos materiais mesoporosos hexagonais (MARKER et al., 1996). 63 Figura 4.1.7. Difratogramas de SAXS das amostras de sílica mesoporosa LMSiO, LMSiCaP I e II 65 Figura 4.1.8. Imagens de TEM da amostra LMSiO, perpendicular e paralelo (insert) ao eixo dos poros. 67 Figura 4.1.9. Imagens fornecidas por SEM das amostras de sílica: LMSiO (a), LMSiCaP I (b) e LMSiCaP II (c); e suas respectivas curvas de distribuição de tamanho de partículas. 68 Figura 4.2.1. Cromatogramas do peptídeo OGP bruto e após purificação, respectivamente. 71 Figura 4.2.2. Cromatogramas obtidos em escala analítica do peptídeo OGP- CF bruto (a) e purificado (b). 73 Figura 4.2.3. Espectro de Massas da fração purificada do peptídeo OGP- CF. 74 Figura 4.3.1. Espectros de FTIR das amostras LMSiO (a), LMSiCaP I (b) e LMSiCaP II (c) após imersão em SBF por diferentes períodos (7-28 dias). 76 Figura 4.3.2. Imagens de SEM das amostras LMSiO e LMSiCaP I após imersão em SBF por 7 (a, a’), 21 (b, b’) e 28 dias (c, c’). 78 Figura 4.3.3. Imagens de SEM da amostra LMSiCaP II após imersão em SBF por 7 (a), 21 (b) e 28 dias (c). 79 Figura 4.3.4. Padrões de XRD das amostras LMSiO, LMSiCaP I e LMSiCaP II após 28 dias de imersão em SBF. 81 Figura 4.3.5. Espectro de fluorescência do peptídeo OGP-CF (a) e Curva padrão OGP-CF em solução tampão Tris (b). 84 Figura 4.3.6. Curvas de adsorção do peptídeo OGP para as amostras de sílica. 85 Figura 4.3.7. Curvas de adsorção do peptídeo OGP-CF pelas amostras LMSiO e LMSiCaP I. 86 Figura 4.3.8. Perfis de liberação cumulativa de OGP-CF a partir das amostras de LMSiO. 90 Figura 4.3.9. Perfis de liberação cumulativa de OGP-CF a partir das amostras de LMSiCaP. 90 Figura 4.4.1. Imagens de Microscopia Óptica (10x) e SEM (1000x e 600x) dos pellets de LMSiO após 1, 4 e 8 dias de imersão em SBF, respectivamente. 93 Figura 4.4.2. Imagens de Microscopia Óptica (10x) e SEM (600x) dos pellets de LMSiCaP I após 1, 4 e 8 dias de imersão em SBF, respectivamente. 94 LISTA DE TABELAS Tabela 3.1. Composição química (%mol) das amostras de sílica mesoporosas 44 Tabela 4.1. Dados obtidos por SAXS e BET. 66 Tabela 4.2. Rendimento da purificação e pureza relativa do OGP. 71 Tabela 4.3. Rendimento da purificação e pureza relativa do OGP-CF. 73 Tabela 4.4. Concentração iônica do plasma sanguíneo humano e da solução SBF. 75 Tabela 4.5. Parâmetros experimentais dos perfis de liberação. 91 Tabela 4.6. Dados do ensaio de perda de massa realizado nas pastilhas. 92 LISTA DE ABREVIATURAS 1. Aminoácidos Ala (A) Alanina Arg (R) Arginina Phe (F) Fenilalanina Gly (G) Glicina Gln (Q) Glutamina Leu (L) Leucina Lys (K) Lisina Pro (P) Prolina Tyr (Y) Tirosina Thr (T) Treonina 2. Outras α2-M Macroglobulina α ACN Acetonitrila BET Brunauer-Emmet-Teller BMP Proteína Morfogenética Óssea C18 Grupo Octadecil CF 5,6-carboxifluoresceína DCM Diclorometano DIC N,N-diisopropilcarbodiimida DMF Dimetilformamida DNA Ácido Desoxirribonucleico ES-MS Espectrometria de Massa FGF Fator de Crescimento Fibroblástico Fmoc 9-fluorenilmetiloxicarbonila FS Espectroscopia de Fluorescência FSM Folded Sheet Materials (Materiais com Poros Intercalados) FT-IR Espectroscopia no Infravermelho com Transformada de Fourier HA Hidroxiapatita HCA Hidroxicarbonatoapatita HMS Hollow Mesoporous Silica Spheres (Esferas de Sílica Mesoporosa) HOBt 1-hidroxibenzotriazol HPLC High Performande Liquid Chromatography (Cromatografia Líquida de Alta Eficiência) ICDD International Centre for Diffraction Data IGF Fator de Crescimento Semelhante á Insulina IL Interleucina IUPAC International Union of Pure and Applied Chemistry MBG Vidro Bioativo Mesoporoso MCM Mobil Composition of Matter (Composição Mobil da Matéria) MSU Michigan State University (Universidade do Estado de Michigan) MTS Micelle Template Structures (Estruturas Moldadas por Micelas) Nf Número de mols adsorvido por grama de adsorvente OGP Osteogenic Growth Peptide (Peptídeo de crescimento osteogênico) OGP-BP OGP-CF Proteínas Ligantes do Peptídeo de Crescimento Osteogênico Osteogenic Growth Peptide marcado do 5,6-carboxifluoresceína P123 Pluronic 123 PBS Solução Tampão Fosfato PDGF Fator de Crescimento Derivado de Plaquetas PEO Poli(óxido de etileno) PLGA Poli(ácido láctico-co-ácido glicólico) PPO Poli(óxido de propileno) rhBMP Proteína Morfogenética Óssea Humana Recombinante SAXS Espalhamento de Raios X à Baixo Ângulo SBA Santa Barbara Amorphous SBF Simulated Body Fluid (Fluido Corpóreo Simulado) SEM Microscopia Eletrônica de Varredura SPFS Síntese de Peptídeos em Fase Sólida t50% Tempo Necessário para Liberar 50% do Fármaco t-Bu t-butílico TCP Fosfato tricálcio TEM Microscopia Eletrônica de Transmissão TEOS Tetraetilortosilicato TGF Fator de Crescimento Transformador TFA Ácido Trifluoracético TIS Triisopropilsilano Tris Tris(hidroximetil)metilamina UV-Vis Ultravioleta-visível VEGF Fator de Crescimento Vascular Endotelial XRD Difração de Raios X Sumário 1. INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 21 1.1. Fisiologia do tecido ósseo ............................................................................... 23 1.2. Fatores de crescimento na reparação óssea ................................................. 27 1.3. Materiais Mesoporosos .................................................................................... 31 1.3.1. Aplicações em Biotecnologia ......................................................................... 35 2. OBJETIVOS .............................................................................................................. 41 3. MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................................................ 42 3.1. Síntese de nanopartículas de sílica pura e sílica-fosfato de cálcio mesoporosos ........................................................................................................... 43 3.2. Caracterização .................................................................................................. 44 3.2.1. Espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) ............. 44 3.2.2. Difração de raios X (XRD) ............................................................................. 44 3.2.3. Medidas de porosidade e de superfície específica (BET) ................................. 45 3.2.4. Espalhamento de raios X a baixo ângulo (SAXS) ............................................ 45 3.2.5. Microscopia eletrônica de varredura (SEM) .................................................... 45 3.2.6. Microscopia eletrônica de transmissão (TEM) ................................................. 46 3.3. Síntese do Peptídeo OGP[1-14] ....................................................................... 46 3.3.1. Síntese do peptídeo OGP marcado com carboxifluoresceína ........................... 48 3.3.2. Purificação .................................................................................................. 49 3.3.3. Caracterização ............................................................................................. 50 3.4. Análises in vitro ................................................................................................ 51 3.4.1. Estudo da bioatividade in vitro para regeneração óssea em solução de SBF . 51 3.4.2. Adsorção do peptídeo OGP e OGP-CF às nanopartículas de sílica .................. 52 3.4.2.1. Cinética de adsorção do peptídeo ..................................................... 52 3.4.2.2. Incorporação de OGP e OGP-CF ...................................................... 52 3.4.2.3. Liberação do peptídeo OGP-CF em solução SBF ............................... 53 3.4.2.4. Estudo de degradação in vitro em SBF .............................................. 54 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................................ 56 4.1. Caracterização das nanopartículas de sílica pura e com fosfato de cálcio 56 4.1.1. Espectroscopia vibracional na região do infravermelho .................................... 56 4.1.2. Difração de raios X ....................................................................................... 58 4.1.3. Medida de porosidade e de superfície específica ............................................ 60 4.1.4. Espalhamento de raios X a baixo ângulo ........................................................ 63 4.1.5. Microscopia Eletrônica de Transmissão (TEM) ............................................... 66 4.1.6. Microscopia Eletrônica de Varredura (SEM) ................................................... 68 4.2. Síntese e purificação do peptídeo OGP e OGP-CF ........................................ 69 4.3. Análises in vitro ................................................................................................ 74 4.3.1. Estudo da bioatividade in vitro em solução de SBF ......................................... 74 4.3.2. Adsorção do peptídeo OGP e OGP-CF às nanopartículas de sílica .................. 82 4.3.3. Cinética de adsorção do peptídeo ................................................................. 84 4.3.4. Incorporação de peptídeo OGP-CF ................................................................ 86 4.3.5. Liberação do peptídeo OGP-CF em solução SBF ........................................... 88 4.3.6. Estudo de degradação in vitro em SBF .......................................................... 91 5. CONCLUSÕES ......................................................................................................... 96 6. PERSPECTIVAS ....................................................................................................... 97 REFERÊNCIAS Introdução 21 1. INTRODUÇÃO Deficiências esqueléticas, especialmente decorrentes de traumas, tumores ou desenvolvimento anormal, são comuns, e são normalmente tratadas por intervenção cirúrgica e enxerto para restaurar a função mecânica e reconstruir a área afetada. Devido a problemas como disponibilidade limitada, dificuldade de armazenamento e um tempo cirúrgico maior, no caso dos enxertos autógenos e alógenos, pesquisadores buscam materiais sintéticos que facilitem a reparação óssea visando o restabelecimento rápido das funções fisiológicas (PINTO et al., 2007). Um grande número de trabalhos vem utilizando materiais mesoporosos ordenados em diversas aplicações (TAGUCHI; SCHÜTH, 2005; BECK; VARTULI, 1996). As pesquisas com materiais mesoporosos têm resultado em biomateriais com duas aplicações principais na área médica: emprego como sistemas carreadores de fármacos e na regeneração de tecido ósseo. A sílica mesoporosa com estrutura hexagonal, SBA-15, apresenta elevada área superficial (na faixa de 690-1040m2.g-1) e tamanho de poros usualmente em torno de 4,6 a 30nm, sendo assim um material adequado para incorporar e liberar uma grande variedade de moléculas, inclusive aquelas que apresentam atividades terapêuticas. Vidros mesoporosos bioativos (MBGs) têm sido sintetizados com sucesso exibindo uma propriedade bioativa maior e uma relação estrutura/composição diferente em relação aos vidros convencionais. Além do mais, tanto o grande volume de poro quanto os mesoporos uniformes dos MBGs torna possível uma imobilização direta e altamente eficiente de proteínas e fármacos dentro dos MBGs, que são muito importantes nas aplicações médicas (ZHAO et al., 2008). Dentre as moléculas que podem ser carreadas pelos MBGs, os moduladores de fator de crescimento ósseo têm se destacados por atuarem em pequenas concentrações e por atuarem como mediadores locais sobre as células osteoprogenitoras. Neste contexto, o Osteogenic Growth Peptide (OGP), peptídeo de crescimento osteogênico, tem atraído interesse clínico como um agente anabólico e estimulador hematopoiético. Introdução 22 Nessas condições, o efeito simulatório extra da inclusão de um fator de crescimento e a capacidade osteogênica do material são interessantes propriedades para a regeneração óssea. De acordo com Woo et al. (2001) a eficácia de um fator de crescimento não é apenas dependente de sua atividade, mas também influenciada pelo método de liberação, ou seja, o material carreador. Carreadores aumentam a retenção do peptídeo no local do tratamento por um tempo suficiente para permitir a atividade e, posteriormente, pode fornecer uma base para o crescimento ósseo. Neste trabalho, os materiais mesoporosos de sílica foram obtidos por método envolvendo micelas de surfactantes e de precursores inorgânicos. Devido a natureza biocompatível das apatitas, foram realizadas sínteses com preparação simultânea de sílica e apatita mesoporosos com diferentes concentrações de sílica. A escolha deste sistema visa reunir as características texturais, de estabilidade e resistência da sílica mesoporosa com a biocompatibilidade das apatitas. As alterações dos parâmetros estruturais, superficiais, texturais e de distribuição de tamanho de poros foram avaliadas neste trabalho por meio de medidas de espectroscopia na região do infravermelho e adsorção e dessorção de nitrogênio (N2). As imagens de microscopia eletrônica de varredura forneceram informações morfológicas das amostras. Além disso, medidas de microscopia eletrônica de transmissão e de espalhamento de raios X a baixos ângulos foram utilizadas com o objetivo de se tentar elucidar a estrutura de poros do material puro e verificar a ocorrência de possíveis alterações causadas pela introdução da apatita na estrutura da sílica. Após a caracterização, os materiais foram imersos em soluções do peptídeo OGP para incorporação desta molécula e os ensaios preliminares de liberação do peptídeo a partir das amostras mesoporosas foram realizados em uma solução que simula o fluido corpóreo. Os resultados obtidos foram comparados com os ensaios de degradação dos materiais. Mesmo com os materiais disponíveis no mercado atualmente e dos avanços conquistados no desenvolvimento de novos biomateriais para engenharia tecidual, ainda busca-se materiais bioativos com características e propriedades mecânicas similares ao autoenxerto ósseo. Assim, o que motivou este trabalho foi preparar materiais mesoporosos com propriedades bioativas e capazes de carrear um Introdução 23 peptídeo osteoindutor, para futuramente promover a regeneração de fraturas no tecido ósseo em tempo menor. 1.1. Fisiologia do tecido ósseo O tecido ósseo é o constituinte principal do esqueleto e serve de suporte para as partes moles e proteção dos órgãos vitais, como os contidos nas caixas craniana, torácica e no canal raquidiano. Atua alojando e protegendo a medula óssea, formadora das células do sangue. Possui propriedades mecânicas, como alta resistência a fratura e flexibilidade, proporcionando apoio aos músculos esqueléticos, transformando suas contrações em movimentos úteis, constituindo um sistema de alavancas que amplia as forças geradas na contração muscular (GARTNER; HIATT, 2003). O tecido ósseo é um tipo especializado de tecido conjuntivo de sustentação, formado por células e por material extracelular calcificado, denominado matriz óssea, em constante processo de remodelamento. Sua macroestrutura é constituída pelo osso cortical (compacto), osso trabecular (esponjoso), medula óssea e vasos sanguíneos. O osso cortical é encontrado nas diáfises dos ossos longos e na superfície externa dos ossos planos, e possui a função de proteção dos tecidos e órgãos vitais, devido à resistência a incidência de cargas. Já o osso trabecular é encontrado nas extremidades e cavidades medulares de ossos longos, bem como nas vértebras e no centro de ossos planos, sendo menos resistente, atuando nas funções metabólicas (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008). O osso é composto de três tipos de células (osteoblastos, osteoclastos, osteócitos), uma matriz extracelular mineralizada (composta de 65% de hidroxiapatita e fosfato tricálcio) e uma matriz extracelular orgânica (composta de 35% de colágeno e outras proteínas como glicoproteínas, proteoglicanas, osteocalcina, osteopontina e fatores de crescimento). Estas proteínas contribuem para a abundância de sinais no interior da matriz extracelular. As fibras de colágeno flexíveis e resistentes reforçadas com cristais de hidroxiapatita são importantes para o requisito de força compressiva e alta resistência do osso à fratura (STEVENS, 2008). Introdução 24 As células ósseas estão envolvidas nos processos de osteogênese, manutenção e remodelação óssea. Os osteoblastos são as células que sintetizam a parte orgânica (colágeno tipo I e V, proteoglicanas e glicoproteínas) da matriz óssea, sendo, portanto, as células responsáveis pela expressão gênica dessas proteínas de forma a promover um equilíbrio de troca iônica, principalmente de íons Ca2+ e PO4 3-, iniciando a mineralização da matriz (GARTNER; HIATT, 2003). Uma vez aprisionado pela matriz recém-sintetizada, o osteoblasto passa a ser chamado de osteócito. A matriz se deposita ao redor do corpo da célula e de seus prolongamentos, formando assim as lacunas e os canalículos. Os osteócitos secretam fatores de crescimento que facilitam o recrutamento de pré-osteoblastos para a remodelação do esqueleto (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008). Já os osteoclastos são células móveis, gigantes, ramificadas, que se originam de precursores mononucleados provenientes da medula óssea, responsáveis pela reabsorção óssea. Apesar da sua resistência às pressões e da sua dureza, o tecido ósseo é muito plástico e possui alta capacidade de se remodelar mediante diversas situações a que é submetido, tais como lesões, fraturas e perdas ósseas. O processo de regeneração óssea se inicia a partir de importantes reações biológicas, desencadeadas pela própria lesão do tecido. O acometimento de uma lesão no tecido ósseo, traumática ou cirúrgica, é seguido por sequência histológica definida, destinada a reparar a lesão. Nos locais de fratura óssea, ocorre hemorragia, pela lesão dos vasos sanguíneos, destruição de matriz e morte de células ósseas (GERIS et al., 2008). A reparação se inicia após a remoção, pelos macrófagos, do coágulo sanguíneo e dos restos celulares e da matriz. A nível histológico, o periósteo e o endósteo próximos à área fraturada respondem com uma intensa proliferação, formando um tecido muito rico em células osteoprogenitoras que constitui um colar em torno da fratura que penetra entre as extremidades ósseas rompidas (Figuras 1.1a e 1.1b). Nesse anel ou colar conjuntivo e também no conjuntivo que se localiza entre as extremidades ósseas fraturadas, surge tecido ósseo imaturo, tanto pela ossificação endocondral de pequenos pedaços de cartilagem que aí se formam, bem como por ossificação intramembranosa. Desta forma, no local de reparação, podem ser encontradas ao mesmo tempo áreas de cartilagem, áreas de ossificação intramembranosa e áreas de ossificação endocondral (GARTNER; HIATT, 2003). Esse processo evolui de Introdução 25 modo a aparecer, após certo tempo, um calo ósseo que envolve as extremidades do osso fraturado (Figura 1.1c e 1.1d). A nível celular, o remodelamento ósseo depende da atividade integrada de dois tipos de células: os osteoblastos, para produção de tecido ósseo novo, e os osteoclastos, para reabsorção óssea, ambos os eventos cruciais ao processo no decorrer do crescimento ósseo normal, ou após lesão. Durante o processo de neoformação óssea, na ossificação intramembranosa, as células mesenquimais presentes na medula óssea se diferenciam em osteoblastos e iniciam a síntese de matriz osteóide, formando assim o osso primário ou imaturo. As fibras de colágeno são depositadas randomicamente formando uma estrutura entrelaçada não mineralizada. Conforme ocorrem as trocas iônicas entre os tecidos e o fluído sanguíneo, a matriz vai sendo mineralizada e este osso vai sendo reabsorvido e sendo substituído por osso secundário ou lamelar (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008). Mesmo representando apenas 1% da matriz extracelular orgânica, os fatores de crescimento têm se tornado de grande interesse para entender os processos fisiopatológicos de regeneração óssea e osteointegração. Introdução 26 Figura 1.1. Processo de reparação da fratura, por formação de novo tecido ósseo a partir do endósteo e do periósteo (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 2008). Introdução 27 1.2. Fatores de crescimento na reparação óssea O processo de reparação óssea é um conjunto complexo de eventos biológicos regulados por células específicas, pela matriz extracelular e por diferentes fatores de crescimento. Os fatores de crescimento e citocinas são importantes reguladores do processo de cura e são produzidos por células presentes no local de regeneração e liberados nesta área por tecidos vizinhos (extremidades ósseas danificadas, músculos, medula, periósteo) (GERIS et al., 2008). Os fatores de crescimento, combinados às suas proteínas de ligação, agem como reguladores locais das funções celulares, estimulando a diferenciação, proliferação, migração, adesão celular e expressão gênica. Em casos de lesão óssea, fraturas, tratamentos de tumores ósseos, defeitos congênitos e outras patologias, o osso danificado não se regenera espontaneamente. É necessário um auto-enxerto ou osso alogênico para restaurar a integridade estrutural e funcional, no entanto, efeitos adversos estão associados a estas técnicas, como por exemplo, a necessidade de um segundo sítio cirúrgico para a obtenção do enxerto, o que pode, muitas vezes, contra-indicar o procedimento e o fato de não haver células para que ocorra a fase I da osteogênese, respectivamente (PINTO et al.,2007). Assim, a liberação de fatores de crescimento nos locais lesionados pode complementar a terapia convencional de reparação óssea (WOZNEY; SEEHERMAN, 2004). Os fatores de crescimento são secretados por uma grande variedade de células para regular o processo de cura de ferimentos. Vários fatores de crescimento têm sido usados para melhorar os resultados clínicos em cirurgias cardíacas, ortopédicas, plásticas, oral e periodontal, onde se pode citar: - Fator de crescimento transformador beta (TGF-β): estimula o recrutamento e proliferação de células mesenquimais, sua diferenciação em osteoblastos e/ou condrócitos, e atua na produção de matriz extracelular (TSIRIDIS et al., 2007). - Fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF): regula a síntese de DNA e a proliferação celular; regula a reparação inicial da fratura e cura de ferimento, através da reabsorção óssea e degradação de colágeno; inibe a aposição de matriz (colágeno tipo I); estimula os osteoblastos a produzir interleucina (IL-6), que recruta osteoclastos (KOFRON; LAURENCIN, 2006). Introdução 28 - Fator de crescimento semelhante à insulina (IGF): mediando efeitos de hormônios, fatores de crescimento, citocinas e morfogênese durante a cura da fratura, estimulando a proliferação de osteoblastos e a produção de matriz óssea (SOO- HONG; SHIN, 2007). - Fator de crescimento vascular endotelial (VEGF): secretado pelos osteoblastos, estimula a angiogênese, que é um fator essencial para a formação óssea, sendo importante na formação e manutenção dos vasos sanguíneos; regula a migração, proliferação, sobrevivência e atividade de células endoteliais, osteoclastos e osteoblastos (KOFRON; LAURENCIN, 2006). - Proteínas morfogenéticas ósseas (BMPs): fatores de diferenciação celular que induzem a diferenciação de células mesenquimais em osteoprogenitoras. Estudos in vivo usando BMPs associadas a sistemas de liberação têm demonstrado a capacidade dessas proteínas em induzir o crescimento ósseo e estimular a reparação de fraturas. Como exemplo, a utilização de rhBMP (proteína morfogenética óssea recombinante humana) incorporada em implantes de PLGA (ácido poli láctico-co-glicólico) acelerou a cura de fraturas em fêmur de ratos (LEE et al., 1994) e promoveu a formação óssea em defeitos críticos em diáfises umeral (ZEGZULA et al., 1997) e a cicatrização de defeitos críticos em crânio de ratos quando em cimentos de fosfato de cálcio (BODDE et al., 2008). O conceito de osteoindução foi primeiro descrito por Urist (1965) quando observou a neoformação óssea no interior de matrizes ósseas desmineralizadas. Desde então, estas proteínas têm sido descritas como fatores responsáveis pela neoformação óssea (EPPLEY et al., 2005), pois por meio de quimiotaxia, as BMPs atraem células mesenquimais para o local da formação óssea e induz a conversão destas células em uma linhagem préosteoblástica. No entanto, há um certo questionamento sobre a relação custo-eficácia das BMPs, devido à grande quantidade necessária (1,5 mg.ml-1, dose terapêutica do INFUSE) para se obter uma regeneração óssea eficaz em comparação às técnicas cirúrgicas convencionais (EPSTEIN, 2011) que pode limitar seu uso em relação aos demais materiais. Desta forma, peptídeos, biomoléculas constituídas por dois a dezenas de resíduos de aminoácidos unidos entre si através de ligações peptídicas (MACHADO et al., 2004), são quimicamente versáteis e têm demonstrado interesse científico Introdução 29 quando o assunto é moléculas osteoindutoras ou modeladoras de fatores de crescimento. Recentemente, uma classe de sequências peptídicas tem sido sintetizada diretamente pela Síntese de Peptídeos em Fase Sólida (SPFS), incluindo motifs indutores da medula óssea. Dentre os de interesse na engenharia óssea, a sequência peptídica reguladora de fator de crescimento ósseo, no caso o OGP, foi escolhida devido à propriedade de osteoindução. O OGP é um peptídeo de ocorrência natural cuja estrutura primária é idêntica à sequência C-terminal 89-102 (Ala-Leu-Lys-Arg-Gln-Gly-Arg-Thr-Leu-Tyr-Gly-Phe- Gly-Gly) da Histona H4 (Figura 1.2). É um tetradecapeptídeo endógeno presente fisiologicamente no soro humano, em concentração micromolar (BAB et al., 1992). Seu pequeno tamanho e linearidade, que o faz susceptível a proteólise, aliada à baixa concentração, sugere uma proteína de ligação para o OGP, OGPBP-OGP (OGPBP: OGP binding protein), que promove sua proteção contra proteólise e a manutenção da concentração deste peptídeo na circulação (BAB; CHOREV, 2002). Figura 1.2. Fórmula estrutural do peptídeo OGP. (NCBI, 2012) A maioria do OGP sérico encontra-se ligado não covalentemente a α2- macroglobulina (α2-M) do soro, em ambas as formas, nativa e ativada. A forma ativada gera ligações covalentes com as proteinases, em um processo que envolve uma mudança conformacional, tornando a molécula mais compacta, diminuindo, dessa forma, a disponibilidade do OGP para o sistema. A forma nativa aumenta Introdução 30 imediatamente a disponibilidade do OGP para o sistema circulatório (GAVISH et al., 1997), onde sua concentração é aumentada durante uma injúria local ao tecido ósseo, medula óssea ou a reações osteogênicas sistêmicas (BAB et al., 1992). Estudos indicaram que o OGP se liga as OGPBPs via motivos diferentes daqueles que são reconhecidos pelos anticorpos anti-OGP (Figura 1.3) (GREENBERG et al., 1995). Figura 1.3. Domínios funcionais no peptídeo OGP. A porção C-terminal participa do reconhecimento e ligação ao receptor macromolecular e sinalização da via mitogênica. A porção N-terminal compreende o domínio que participa da ligação às OGPBPs (BAB; CHUREV, 2002). In vitro, o OGP e seus derivados possuem excelente potencial mitogênico para células de linhagem osteoblástica e fibroblástica (BAB et al., 1992; GREENBERG et al., 1993), favorecem o aumento da atividade da fosfatase alcalina (ALP) e da mineralização da matriz óssea (ROBINSON; BAB; NEVO, 1995; BAB; CHOREV, 2002) e ainda regulam diretamente a diferenciação de células mesenquimais de medula em osteoblastos, favorecendo assim a neoformação óssea (CHEN et al., 2007; VANELLA et al., 2010). In vivo, o OGP regula a expressão dos fatores de crescimento de transformação TGF-β1, TGF-β2 e TGF-β3, fator de crescimento fibroblástico FGF-2, fator de crescimento insulínico IGF-1 e do colágeno tipo I (BRAGER et al., 2000), favorece a reparação da medula óssea recém transplantada ou irradiada, com aumento considerável das células hematopoiéticas (GUREVITCH et al., 1996), e ainda com a vantagem de ser prontamente sintetizado, pode substituir ou suplementar a terapia convencional, a qual é muito cara. Defeitos ósseos tratados Introdução 31 com scaffolds de PLGA com OGP sintético adsorvido foram reparados em um menor tempo em relação aos animais que receberam o OGP por via sistêmica; este estudo apontou um importante resultado na via de administração destes peptídeos, revelando um efeito terapêutico mais eficaz quando aplicado localmente (SHUQIANG et al., 2008). Estudos com administração via sistêmica do OGP relata o estímulo da ossificação endocondral em locais de fratura tanto em ratos quanto em coelhos, reduzindo o tempo de reparação óssea (SUN; ASHHURST, 1998; BRAGER et al., 2000; GABET et al., 2004) Muitos materiais podem ser utilizados como carreadores para liberação de moléculas de interesse biológico, como os moduladores de fator de crescimento no tecido ósseo. Entre eles, pode ser citados os materiais bioativos mesoporosos, governado pela natureza química das paredes dos poros, área de superfície específica e a relação diâmetro dos poros-molécula hospedeira (VALLET-REGÍ et al., 2007). 1.3. Materiais Mesoporosos Um grande número de processos e reações químicas tem lugar na interface entre um meio fluido e um sólido poroso, e o resultado final dessa interação depende das características do sistema poroso e do sólido. Este eixo tem conduzido ao desenvolvimento de metodologias específicas para as sínteses de materiais com porosidade mais adequada para a função que se deseja. O aumento do número de processos para obtenção de materiais porosos, que utilizam condições brandas, promoveu o desenvolvimento de matrizes (inorgânicas ou híbridas nanoestruturadas) a partir da utilização de conjuntos de surfactantes auto organizáveis como agentes direcionadores de estruturas, permitindo assim, a construção de uma nova classe de materiais nanoestruturados em escala mesoscópica (ROCHA, 2010). De acordo com a IUPAC (International Union of Pure and Applied Chemistry), os materiais porosos são classificados em três classes: microporosos (diâmetro do poro entre 0,2-2,0 nm); mesoporosos (2,0-50,0 nm); macroporosos (acima de 50,0 nm) (SING et al., 1985). O tamanho dos materiais mesoporosos permite não Introdução 32 somente o fácil acesso de moléculas com tamanho acima de certa extensão, mas também o controle de funções dependendo da geometria do poro. Materiais microporosos e macroporosos são grandemente usados como adsorventes, mas eles são incapazes de adsorver um grande espectro de moléculas orgânicas de interesse por causa da distribuição do tamanho de poro como, por exemplo as zeólitas, que apesar da sua importância industrial, absorvem somente aquelas moléculas suficientemente pequenas para penetrar em seu sistema de poros (VALLET-REGÍ; VILLAREJO, 2006). Os poros dos materiais mesoporosos permitem não somente o fácil acesso pelas moléculas com certo tamanho, como também, a possível contratibilidade em funções dependendo da geometria do poro. A síntese de materiais mesoporosos ordenados requer o emprego de moléculas de surfactantes em solução aquosa. Nessas condições, quando a concentração do surfactante em dissolução alcança um valor crítico, denominado concentração micelar crítica, as moléculas formam agregados denominados micelas, cuja forma e tamanho depende essencialmente da natureza e composição química da molécula de surfactante, de sua concentração e da temperatura, junto com fatores como o pH da solução e a concentração total salina (Figura 1.4). As micelas, por sua vez, agrupam formando estruturas supramicelares, e a natureza das distintas fases micelares variam em função da concentração e temperatura (VALLET- REGI; VILLAREJO, 2006). Figura 1.4. Mecanismo de formação da sílica mesoporosa (HOFFMANN et al., 2006). De maneira geral, os agentes surfactantes podem classificar-se em: catiônicos, aniônicos, neutros e não iônicos (HOFFMANN et al.,2006). Assim, os surfactantes catiônicos podem conter as cadeias hidrofóbicas unidas ao mesmo átomo de nitrogênio da cabeça polar, ou cada uma das cadeias unidas a um átomo Micela esférica Organização das micelas cilíndrica Molde pronto Compósito inorgânico mesoestruturado sólido/surfactante Material mesoporoso Remoção do surfactante Introdução 33 de nitrogênio distinto. Os surfactantes aniônicos contem um grupo sulfônico ou um fosfato como cabeça polar. O emprego de um tipo de surfactante tem grande importância na síntese de materiais mesoporosos, já que a natureza da fase que se obtém está condicionada em boa medida pela interação que se estabelece entre as espécies químicas em solução e o surfactante. No caso dos surfactantes não iônicos, por exemplo, aqueles em que a cabeça polar formam grupos polióxido de etileno, prevalece a interação entre átomos de oxigênio do grupo éter e átomos de hidrogênio pertencentes a grupos silano, Si-OH, dos oligômeros de silício, a um pH moderado. Em um pH fortemente ácido (abaixo do ponto isoelétrico do silício, pH = 2) há que se considerar a possibilidade de protonação dos grupos Si-OH. Em todos os casos é necessário considerar que o pH da dissolução determina a carga das espécies químicas que vão formar o esqueleto inorgânico do material, e portanto condiciona o mecanismo de interação com o surfactante (VALLET- REGI; VILLAREJO, 2006). Foi assim que em 1990, Yanagisawa e colaboradores reportaram a preparação de sílica mesoporosa com distribuição de poro uniforme como resultado da intercalação de cátion cetiltrimetilamônio entre camadas de kanemita polissilicato, seguida pela calcinação para remoção do surfactante. Este novo material foi chamado de FSM-16 (Folded Sheet Materials). Este material tem grande estabilidade térmica e hidrotérmica devido ao alto grau de condensação nas paredes das sílicas desses materiais. Inagaki, Fukushima e Kuroda (1993) relataram que o diâmetro de poro da FSM-16 pode também ser controlado pela variação do comprimento da cadeia alquil do surfactante catiônico. Uma significante descoberta na pesquisa de materiais mesoporosos foi quando cientistas da Móbil Oil Company divulgaram a família M41S de mesoporosos silicato/aluminossilicato onde um surfactante de cadeia longa foi usado como “template” ou agente formador de poros durante a síntese sol-gel (BECK et al., 1992). Entre estes materiais, os mais conhecidos estão a MCM-41 (com estrutura hexagonal), MCM-48 (com estrutura cúbica) e MCM-50 (com estrutura lamelar) (HOFFMANN et al.,2006). Estes materiais têm poros estruturados uniformemente, grande área de superfície específica e volume de poro específico que resultou no interesse mundial pelos materiais mesoporosos (VINU; HOSSAIN; ARIGA, 2005). Introdução 34 Huo e colaboradores (1994) noticiaram a síntese de materiais mesoporosos, usando surfactantes catiônicos e aniônicos em condições ácidas. Tanev, Chibwe e Pinnavaia (1994) prepararam sílica HMS (Hollow Mesoporous Silica Spheres) usando uma amina neutra como “template”. Em comparação com a MCM-41, mesoestruturas de HMS geralmente possuem estrutura hexagonal desordenada e paredes finas, estabilidade térmica superior e menor tamanho cristalino que torna a mesoporosidade textural um acesso improvável para o confinamento na rede mesoporosa. Bagshaw, Prouzet e Pinnavaia (1995) relataram a síntese de um material mesoporoso desordenado chamado MSU-1 (Michigan State Univesity) usando óxido de polietileno (PEO) como agente direcionador de estrutura. O MSU-1 possui paredes finas e pequeno tamanho de partículas com considerável mesoporosidade devido aos poros formados entre as partículas serem relativamente pequenos, que o distingui da MCM-41. Já em 1998, foi desenvolvia uma rota de preparação de sílica mesoporosa ordenada a partir do emprego de moldes à base de surfactante não-iônico ou de copolímeros polietoxilados e polipropoxilados como o Pluronic® P123 (EO20PO70EO20) agentes direcionadores de estrutura (ZHAO et al., 1998). A formação de sílica se dá à temperatura ambiente, a partir da adição do TEOS em solução fortemente ácida (HCl 2M) contendo o surfactante não-iônico ou o copolímero. Esse material foi desenvolvido na Universidade de Santa Bárbara, nos Estados Unidos, e denominado SBA-15 (Santa Barbara Amorphous number 15) (ZHAO et al., 1998). O SBA-15, de maneira similar ao MCM-41, possui uma rede hexagonal de mesoporos. Este material apresenta estreita distribuição de tamanho de poros, usualmente na faixa de 4,6 a 30nm e áreas superficiais na faixa de 690 a 1040 m2.g- 1. Devido à maior espessura das paredes de seus poros (3,1 a 6,4nm) ele apresenta uma melhor estabilidade hidrotérmica quando comparado ao MCM-41 (CIESLA; SCHÜTH, 1999). Diferente do MCM-41, o SBA-15 pode possuir além dos mesoporos primários, mesoporos secundários e microporos não ordenados entre suas paredes (SOUSA et al., 2008). Materiais do tipo HMS são obtidos através do emprego de aminas com cadeias carbônicas longas e precursor de fase inorgânica à base de alcóxido. Por outro lado, se o composto à base de amina for substituído por surfactante à base de Introdução 35 etóxido, o material obtido será classificado como MSU. Nestes dois casos, a interação entre o surfactante e a fase inorgânica se dá por ligações de hidrogênio. Os materiais obtidos através de reações que levam à formação de híbrido orgânico- inorgânico são denominados MTS-1 (SOLLER-ILLIA et al., 2003). O método sol-gel, empregado na síntese dos materiais mesoporosos, surgiu no fim da década de 90 e pode ser visto como uma sequência de processos inter- relacionados. Estes processos envolvem a síntese de uma rede inorgânica obtida pela mistura de alcoóxidos e água, na presença de solvente e catalisador, seguida por hidrólise, gelatinização, remoção de resíduos orgânicos e água dos poros do gel sólido por tratamento a baixas temperaturas. Finalmente, a densificação do gel seco por tratamento térmico pode levar a materiais porosos (xerogéis) ou densos, na forma de pós ou monólitos (RUBIO; OTEO,1997). Sua hidrólise é rápida, principalmente em compostos cujo grupo alquil (R) é pequeno, porém alguns alcoóxidos como os de silício possuem uma baixa reatividade (comparados aos alcoóxidos de titânio) sendo necessária a adição de catalisadores ao processo para promover um aumento na velocidade das reações de hidrólise e condensação (WALLINGTON; PILON; WRIGHT, 1997). Materiais mesoporosos de sílica e do sistema ternário SiO2-CaO-P2O5 obtidos por processo sol-gel têm demonstrado excelente bioatividade. Desde as fases iniciais de pesquisa de biomateriais, ficou claro que uma elevada área superficial do material bioativo desempenha um papel importante na bioatividade (HENCH, 1971). Tanto uma carga de superfície negativa como um substrato poroso tem sido relatado ser importante para a formação de hidroxiapatita (HA) (HENCH, 2006; ANDERSSON et al., 2005; SOUSA; SOUZA; SOUSA,, 2008). 1.3.1. Aplicações em Biotecnologia Os materiais mesoporosos bem ordenados têm sido muito estudados nas universidades e laboratórios industriais devido ao interesse comercial de seus usos como adsorventes, em catálises, suporte para adsorção de biomoléculas (VINU; HOSSAIN; ARIGA, 2005). A estrutura dos materiais mesoporosos baseados em silício é formada por uma rede de tetraedros SiO4 conectados entre si mediante os átomos de oxigênio Introdução 36 dos vértices. Naturalmente, esta é uma característica compartilhada pelos silicatos cristalinos como as zeolitas, ou por sílicas amorfas. Os grupos Si-OH nas propriedades do material. Estes grupos são capazes de reagir com uma grande variedade de compostos químicos formando ligações covalentes do tipo Si-O-R que permite fixar, na superfície do material, diferentes espécies químicas (VALLET- REGI; VILLAREJO, 2006). A característica porosa desses materiais é de importância tecnológica potencial, pois pode ser usada para confinar uma variedade de moléculas para muitos processos químicos e biológicos. Como a rede de sílica mesoporosa apresenta transparência óptica no visível, perto da região UV, os materiais com grupos funcionais opticamente ativos são candidatos promissores para aplicações ópticas incluindo filtros, sensores, lasers, fotocatálise, adsorventes (BECK; VARTULI, 1996), suportes para catalisadores e dispositivos para liberação controlada de fármacos (VALLET-REGÍ et al., 2001). A obtenção de materiais incorporados com moléculas de corantes ou íons luminescentes (ROCHA, 2010) torna-se extremamente interessante para aplicações ópticas e fotônicas. As propriedades da superfície e os tamanhos das partículas podem permitir a atuação como sensores dentro de células tanto in vitro quanto in vivo (SLOWING et al., 2007). Outra importante aplicação é catálise e remediação ambiental (VINU; HOSSAIN; ARIGA, 2005). A nanotecnologia biomédica está assumindo um papel de grande importância para aplicações em diagnóstico, terapêutica, biologia molecular e bioengenharia. Um dos materiais em destaque para aplicações biomédicas e que tem sido extensamente estudado é a sílica nanoestruturada. Este sistema também pode ser modificado com biomoléculas, como enzimas, proteínas e DNA (BHARALI et al., 2005), para aplicações biológicas. A superfície modificada com estas biomoléculas permite o reconhecimento específico entre as espécies livres e as imobilizadas, podendo proporcionar informações diagnósticas ou servir como um processo de separação ou purificação (SLOWING et al., 2007). A engenharia óssea está passando por extensiva pesquisa devido ao seu excelente potencial reparador de doenças ou danos teciduais via regeneração em vez de substituição. Essa técnica permite reconstruir uma estrutura semelhante promovendo apropriado apoio para a ancoragem de células in vitro. Um ideal apoio Introdução 37 para a regeneração óssea pode ser uma rede porosa altamente interconectada, onde os poros e interconexões devem ser suficientemente grandes para que ocorra penetração celular e vascularização para o centro de regeneração do tecido no implante. Além disso, a biocompatibidade, osteocondutividade e a bioatividade do material podem ser geneticamente influenciadas pelas células osteoprogenitoras (BASTOS et al., 2004). Além do mais, a textura da superfície pode promover a adesão celular e absorção de metabólitos biológicos. Vidros bioativos (bioglass) têm atraído muita atenção desde o primeiro relato por Hench et al. em 1971. Um material é dito bioativo quando é capaz de formar apatita em sua superfície em contato com fluidos fisiológicos in vivo ou SBF in vitro. Nessa apatita formada, osteoblastos podem se aderir, crescer e se proliferar, o que significa que o material é bioativo e pode ser implantado (VALLET-REGÍ et al., 2006). A composição inorgânica do osso humano é hidroxiapatita (HA). Quando implantado no corpo humano, a superfície de uma cerâmica bioativa induz a biomineralização do fosfato de cálcio através da interação com o plasma sanguíneo, que é a primeira fase que interage com a superfície do implante logo após sua inserção em defeitos teciduais. As espécies iônicas inorgânicas dissolvidas no plasma, uma solução saturada em relação aos fosfatos de cálcio, apresentam um grande potencial de precipitação neste meio (ZHAO et al., 2008). É conhecido que os vidros bioativos podem apresentar adesão ao osso e/ou ao tecido mole. Assim, aqueles que apresentam composições de até 53% de SiO2 têm adesão ao osso e ao tecido mole. A porcentagem de SiO2 entre 53% e 60% resulta em adesão apenas ao osso e em concentrações acima de 60% não há formação de ligação com o tecido, assumindo o material comportamento bioinerte, que ao ser implantado no organismo, apresenta uma resposta interfacial mínima que não resulta na ligação ou na rejeição, havendo apenas formação de uma membrana de tecido fibroso ao redor do material com o propósito de isolá-lo, prevenindo assim possíveis interações adicionais (HENCH; PASCHALL, 1973; KOKUBO, 2008). No entanto, com o aumento da área de superfície do material, que pode ser conseguido pelo processo sol-gel, esse intervalo de concentração de SiO2 pode ser estendido conservando-se ainda elevados índices de bioatividade (SIQUEIRA; ZANOTTO, 2011). Introdução 38 Existem dois principais protocolos in vitro para prever o comportamento dos materiais no interior do corpo humano. O teste mais simples é o protocolo estático, baseado na introdução do material teste em SBF; e o dinâmico, onde o SBF é continuamente trocado por meio de uma bomba peristáltica (VALLET-REGÍ et al., 2007). Os mecanismos de formação de apatita em SBF em materiais contendo grupos Si-OH em suas superfícies tem sido estudos em detalhe. Takadama et al. (2001; 2002) descreveu cinco estágios de formação de HA em vidros bioativos, que estão resumidos a seguir: Estágio 1: rápida troca iônica entre íons Ca2+ pertencentes à superfície do material com íons H+ da solução, ocasionando aumento do pH do meio e formação de grupos silanol (Si−OH): Estágio 2: liberação de sílica solúvel do material para a solução na forma Si(OH)4, sendo resultado da quebra de ligações siloxano (Si−O−Si) e contínua formação de grupos silanol: Estágio 3: policondensação dos grupos silanol formando uma camada porosa rica em sílica na superfície do material exaurida de íons Ca+: Estágio 4: aumento da concentração de íons na solução com o passar do tempo, ocorrendo posterior formação de um filme amorfo, rico em Ca2+ e PO4 3- na superfície do material, quando o ponto de saturação da solução é alcançado. A alta área superficial da camada rica em sílica age como uma fonte de sítios para a nucleação heterogênea do filme, que cresce pela incorporação de mais íons Ca2+ e PO4 3- presentes na solução; Estágio 5: formação da HA na superfície do material em consequência da cristalização do filme amorfo, rico em íons Ca2+ e PO4 3-, pela incorporação dos ânions OH- e CO3 2- presentes na solução. Hench e Paschall (1973) avaliaram a influência da sílica na bioatividade do Bioglass® e concluíram que a alta densidade dos grupos silanóis (Si-OH) existentes Introdução 39 na superfície da sílica amorfa é considerada responsável pelo crescimento da hidroxiapatita. Em função de sua capacidade de adsorção e biocompatibilidade, os materiais de sílica têm sido empregados na produção de implantes artificiais por causa das propriedades osteogênicas de seus compósitos (AREVA et al., 2007), além de serem aptos em armazenar e liberar gradualmente fármacos. Esses materiais estão sendo utilizados para melhorar a biocompatibilidade de diversos sistemas de liberação controlada de fármacos. Dentre os materiais baseados em sílica, os materiais mesoporosos têm sido muito investigados como suportes de fármacos devido sua natureza atóxica, ajustável diâmetro de poros e elevada área superficial com muitas interações do tipo Si–OH. Estudos usando sílica mesoporosa como adsorvente da gentamicina, um antibiótico usualmente empregado na traumatologia, mostraram que após implante em fêmur de ratos este material promoveu integração óssea, crescimento de tecido cortical e esponjoso que permitiu que o defeito ósseo fosse restaurado. Além do mais, o nível de gentamicina local foi superior a concentração inibitória mínima, sendo sensível para a maioria dos microrganismos (VALLET-REGÍ et al., 2002). A incorporação de albumina bovina (BSA) em partículas de SBA-15 foi mostrada ser dependente do tamanho dos poros, onde o máximo de proteína incorporada foi 0,15g de BSA por grama de SBA-15. Já os ensaios de liberação mostraram um comportamento burst, onde aproximadamente 90% de BSA adsorvida foram liberados dentro de 24 horas (SONG; HIDAJAT; KAWI, 2005). Utilizando amostras de SBA-15 como carreador de osteostatina, que corresponde a sequência (107-111) da porção C-terminal da proteína relacionada ao hormônio paratireoidiano (PTHrP), foi demonstrado que houve aumento no crescimento celular e na expressão de vários produtos osteoblásticos, como fosfatase alcalina em cultura de células osteoblásticas (LOZANO, et al., 2010). Além das aplicações comerciais no reparo de defeitos dos ossos, esta família de biomateriais poderia ser usada para revestir implantes metálicos, proteínas e/ou células de ativação para regeneração do tecido (ZHAO et al., 2008). A possibilidade de combinar as propriedades de biocompatibilidade e liberação controlada de moléculas é um objetivo muito atrativo que pode ser Introdução 40 compartilhado com o uso de sílica mesoporosa devido basicamente às suas propriedades texturais extrínsecas, que pode induzir à bioatividade, juntamente com a opção de preencher os poros com agentes biológicos, tais como fatores de crescimento. Objetivos 41 2. OBJETIVOS Este trabalho objetivou desenvolver materiais bioativos a base de sílica mesoporosa para aplicação em sistemas carreadores de moléculas de interesse biológico, como o peptídeo OGP (osteogenic growth peptide), de forma a promover a osteoindução. Para tanto visou-se:  Otimizar as condições de síntese de sílica mesoporosa pura e contendo hidroxiapatita, empregando materiais mesoporosos a partir de sílica, com arranjo hexagonal regular e alinhamento dos poros lineares e uniformes.  Obter o peptídeo OGP por SPFS e utilizar a moléculas 5,6- carboxifluoresceína como sua sonda fluorescente.  Analisar a eficiência da 5,6-carboxifluoresceína, bem como a utilizar a Espectroscopia de Fluorescência na monitoração da incorporação às partículas de sílica mesoporosa.  Avaliar a liberação controlada do peptídeo OGP-5,6- carboxifluoresceína por Espectroscopia de Fluorescência, após incorporação nos sólidos.  Avaliar a bioatividade in vitro em SBF destes materiais e o padrão de degradação em função do tempo. Materiais e Métodos 42 3. MATERIAIS E MÉTODOS Os materiais foram estudados a partir de três sistemas: a) sílica mesoporosa pura; b) sílica mesoporosa e fosfato de cálcio; c) sílica mesoporosa pura e com fosfato de cálcio funcionalizadas com OGP. A Figura 3.1 apresenta o fluxograma mostrando de forma resumida o desenvolvimento do trabalho. Figura 3.1. Fluxograma representando resumidamente o trabalho desenvolvido. Síntese de sílica mesoporosa : pura e com fosfato de cálcio Síntese Peptídeo em Fase Sólida: OGP e OGP-CF Caracterização: FT-IR, XDR, SAXS, BET, SEM e TEM Purificação: HPLC Caracterização: Análise de AA e MS Incorporação de OGP e OGP-CF às partículas de sílica: monitorada por FS Liberação de OGP em SBF: monitorada por FS Materiais e Métodos 43 3.1. Síntese de nanopartículas de sílica pura e sílica-fosfato de cálcio mesoporosos As nanopartículas de sílica mesoporosa foram preparadas a temperatura ambiente, a partir de soluções contendo bloco copolímero como agente direcionador de estrutura e tetraetilortossilicato Si(OEt)4 (TEOS) como fonte de sílica. Para tanto, foram realizadas três sínteses, cujos produtos finais foram denominados LMSiO, LMSiCaP I, e LMSiCaP II respectivamente. 1. Inicialmente foram dissolvidos 1,5g do copolímero não-iônico polioxietileno- polioxipropileno-polioxietileno (Pluronic® P123, BASF) como agente direcionador de estrutura, em 50 mL de água deionizada, ajustando o pH em 1,5 com solução de HCl 1,0 mol.L-1. Após dissolução completa do tensoativo em temperatura ambiente, foi adicionado, sob agitação intensa, tetraetilortossilicato Si(OEt)4 (TEOS, Acros) como fonte de sílica. A etapa final da condensação foi produzida pela adição de solução de fluoreto de sódio (2,5ml, NaF 0,25 mol.L-1), seguido do tratamento hidrotérmico da amostra a 65oC por 24h. O produto obtido foi lavado, seco e calcinado a uma temperatura de 200oC por um período de 6h e depois a 600oC por mais 6h, até a completa eliminação do agente direcionador de estrutura. Esse produto foi denominado LMSiO. 2. Para se obter partículas de sílica com fosfato de cálcio mesoporosos, optou-se por uma adaptação da proposta de Díaz et al. (2006). O primeiro passo da síntese (dissolução do P123) foi realizado nos mesmos parâmetros acima detalhados. Após dissolução completa do tensoativo, Ca(NO3)2.4H2O foi adicionado e a solução foi mantida em agitação por 3h a 40oC. Sob agitação intensa, a mesma quantidade de TEOS foi adicionado. A solução foi mantida em agitação por 24h e então, sob tratamento hidrotérmico a 80oC por 24h. O produto foi seco em estufa a 80oC por 12h. Após este período, o produto foi imerso em uma solução de (NH4)2HPO4 (0,06 mol.L-1), seguido de um segundo tratamento hidrotérmico a 80oC por 24h, onde foi denominada LMSiCaP I. 3. Para obtenção do LMSiCaP II, os mesmos procedimentos descritos acima foram adotados, porém empregando quantidade maior de Ca(NO3)2.4H2O e solução de (NH4)2HPO4 a 0,13mol.L-1. Os dois produtos foram lavados, secos e calcinados a uma temperatura de 700oC por um período de 6h. Materiais e Métodos 44 A composição (expressa em %mol) dos materiais de sílica mesoporosa sob estudo nesse trabalho estão listadas na Tabela 3.1. Tabela 3.1. Composição química (%mol) das amostras de sílica mesoporosas. Amostras SiO2 (%mol) CaO (%mol) P2O5 (%mol) LMSiO 100 0 0 LMSiCaP I 80 15 5 LMSiCaP II 50 30 20 3.2. Caracterização 3.2.1. Espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FTIR) Os espectros de FTIR foram obtidos usando um espectrômetro FT-IR 8.300 – SHIMADZU. As pastilhas foram preparadas com mistura em KBr (1:100). Cento e vinte e oito escaneamentos foram acumulados numa resolução de 4 cm−1, e os resultados foram utilizados na identificação de grupos funcionais. 3.2.2. Difração de raios X (XRD) Os padrões de XRD, para determinar a estrutura cristalina, foram obtidos usando um Difratômetro de Raios X Shimadzu XRD-6000, com um filtro de níquel e sob radiação de Cu (Kα) a 40 kV e a 30 mA, com varredura angular entre 15° a 70° com passo de 0,02 s (2θ) e tempo de aquisição de contagem de 3 s para cada amostra. As amostras foram fixadas sobre um suporte de vidro. A identificação das fases de apatita presentes nos materiais foi realizada comparando-se os dados obtidos com as fichas cristalográficas padrões da base de dados ICDD – PDF-2 (International Centre for Diffraction Data – Power Diffraction File-2). Materiais e Métodos 45 3.2.3. Medidas de porosidade e de superfície específica (BET) A área de superfície específica foi determinada pelo método de BET na razão de pressão relativa de 0,05 - 0,2 e a distribuição de tamanho de poros pela relação polinomial deduzida do modelo de Broekhoff e Boer (BdB) (PROUZET et al., 1999; BROEKHOFF; BOER, 1968). Os materiais obtidos foram caracterizados em um equipamento Micromeritcs 2010 e 2020. 3.2.4. Espalhamento de raios X a baixo ângulo (SAXS) As medidas de espalhamento de raios X a baixo ângulo (SAXS) das amostras foram realizadas na linha SAXS no Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS Campinas, Brasil), utilizou-se uma fenda assimétrica e monocromador de silício (111), com feixe monocromático (λ = 1,488 Å) e foco horizontal. A intensidade espalhada foi coletada com um “imaging plate” localizado a 849,64 mm da amostra. A distância corresponde ao intervalo do vetor q de 0,018 a 0,39Å−1. Os “beam- stoppers” horizontal e vertical foram usados para absorver o feixe de raios X direto e refletido, respectivamente. A maioria dos padrões exibe pico de difração simples os quais foram atribuídos à distância de correlação dos poros. A distância de correlação do centro de poro a outro centro de poro é chamada de “d-spacing”. O efeito da absorção foi corrigido para todas as amostras. 3.2.5. Microscopia eletrônica de varredura (SEM) .A microscopia eletrônica de varredura foi realizada em um equipamento de alta resolução FEG-VP Zeiss modelo Supra 35, com um canhão de emissão como fonte de elétrons. Materiais e Métodos 46 3.2.6. Microscopia eletrônica de transmissão (TEM) As medidas de TEM foram realizadas em um aparelho Philips CM20, com tensão de aceleração 200kV. A preparação da amostra foi realizada por suspensão em etanol, depositadas e secas em grades de Cu recobertas por carbono. 3.3. Síntese do Peptídeo OGP[1-14] O peptídeo OGP foi sintetizado manualmente pela metodologia da fase sólida (SPFS) (MERRIFIELD, 1984), que se baseia no crescimento, resíduo por resíduo, da cadeia peptídica ligada covalentemente pelo seu aminoácido carboxi-terminal aos sítios reativos existentes em um suporte sólido (resina). Empregou-se o protocolo de síntese Fmoc (Figura 3.2), que utiliza o grupamento base-lábil 9- fluorenilmetiloxicarbonila (Fmoc) como protetor dos α-amino grupos, e derivados t- butílicos (t-Bu) para a proteção da maioria das cadeias laterais de resíduos de aminoácidos trifuncionais (FIELDS; NOBILE, 1999; CHAN; WHITE, 2000). Partiu-se de 1g de resina Fmoc-Gly-Wang (grau de substituição de 0,55 mmol/g) (Novabiochem) e DIC/HOBt (Fluka e Advanced Chem Tech, respectivamente) como agentes de condensação. Os aminoácidos com o grupo N-terminal protegidos por Fmoc utilizados na síntese foram adquiridos da Novabiochem. Na etapa de condensação de cada aminoácido, foi utilizado um excesso molar, em relação ao grau de substituição inicial de 3 equivalentes para cada Fmoc- aminoácido e 3 equivalentes para DIC (diisopropilcarbodiimida) e HOBt (1- hidroxibenzotriazol), em uma mistura de DCM (diclorometano):DMF (dimetilformamida) (1:1) (ambos Synth). Na desproteção dos grupos α-amínicos (remoção do grupo Fmoc), foi empregada uma solução de piperidina 20% (v/v) (Merck) em DMF. A eficiência das etapas de condensação foi monitorada pelo teste de Kaiser (KAISER et al., 1970) e, quando positivo (presença de grupos aminos livres), o processo de acoplamento era repetido com 50% da quantidade inicial dos reagentes. Materiais e Métodos 47 Figura 3.2. Diagrama da estratégia Fmoc de síntese de peptídeos em fase sólida Após os acoplamentos dos resíduos de aminoácidos a massa total de peptidil- resina foi de 1,73 g, a qual foi dividida em duas partes, onde uma delas foi utilizada para o acoplamento da carboxifluoresceína (CF). A clivagem final do peptídeo e a desproteção dos grupos protetores das cadeias laterais foi efetuada utilizando 1 ml de solução de clivagem (94,5% TFA, 2,5% EDT, 0,5% Tioanisol e 2,5% água ultrapura) para 100 mg de peptidil-resina, a 25°C por 2 horas. O peptídeo bruto OGP foi precipitado e lavado com éter etílico gelado e centrifugado (seis vezes). Os reagentes desta solução foram adquiridos respectivamente da Fluka, Sigma e Acros; a água ultrapura foi obtida através do sistema de filtração Barnstead, equipado com cartuchos para retenção de sais e de compostos orgânicos. Após o procedimento de clivagem foi realizada a extração com ácido acético 10% em sistemas de seringas de polipropileno de 5 ml, equipadas com um filtro de polietileno poroso acopladas a um sistema de vácuo com frasco coletor para o peptídeo extraído. O extrato bruto do peptídeo foi liofilizado, onde ao final foram obtidos 160 mg de material branco e floculoso. 3 eq. de Fmoc-aa+ DIC/HOBt Materiais e Métodos 48 O material obtido foi purificado utilizando a técnica de Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (CLAE) e caracterizado por meio da análise de aminoácidos e espectrometria de massas (ES-MS positivo) 3.3.1. Síntese do peptídeo OGP marcado com carboxifluoresceína Para realizar os experimentos envolvendo o peptídeo OGP e Espectroscopia de Fluorescência foi necessário marcar a sequência de aminoácidos com uma molécula capaz de se excitar pela absorção de radiação UV-Vis. Para tanto, foi escolhido a molécula 5,6-carboxifluoresceína (CF, Sigma®) (Figura 3.3), para que fosse acoplada ao término da síntese com os mesmos padrões de acoplamento para os aminoácidos. Este procedimento se fez necessário devido à ausência de fluorescência intrínseca na sequência do OGP. A síntese do peptídeo OGP marcado com CF foi desenvolvida pela metodologia da fase sólida nos mesmos moldes que a síntese descrita anteriormente, sendo utilizada a massa reservada para o acoplamento da CF. O protocolo sintético empregado para marcação da peptidil-resina foi o mesmo adotado durante todo processo sintético, utilizando CF e DIC/HOBt (Fluka®), como agentes de condensação, com um excesso molar em relação ao grau de substituição da peptidil-resina (0,16 mmol/g) de cinco equivalentes para cada reagente em uma mistura de DMF/DCM 9:1; a reação de acoplamento ocorreu a temperatura ambiente por 2 h. A clivagem final do OGP-CF da respectiva resina (200 mg) e a desproteção dos grupos protetores das cadeias laterais foi efetuada com uma solução contendo 95% TFA, 2,5% Tioanisol e 2,5% água deionizada, a 25°C por 2 h sob agitação. Materiais e Métodos 49 Figura 3.3. Fórmula estrutural da fluoresceína. O peptídeo bruto OGP-CF foi precipitado e lavado com éter etílico gelado e centrifugado (seis vezes), foi extraído empregando uma mistura acetonitrila e água deionizada (1:1) a qual foi posteriormente concentrada em rotaevaporador. O extrato bruto do peptídeo foi liofilizado e o valor da massa obtida OGP-CF foi de 87 mg. 3.3.2. Purificação Cromatografia líquida de alta eficiência Os produtos isolados foram analisados e purificados por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE), na escala analítica e semi-preparativa, respectivamente. Primeiro, o material bruto foi analisado em um cromatógrafo líquido de alta eficiência analítico Shimadzu LC-10A/C-47A equipado com três bombas LC 10AT, injetor automático SIL 10AF e detectores de UV SPD 10A e fluorescência RF 10A, com uma coluna C18 de fase reversa (Kromasil, 150 x 4,6 mm; d = 5 µm; 300 Å). Nesta análise foram utilizados solventes A (água ultrapura contendo 0,045% de TFA) e B (acetonitrila, Mallinchrodt, contendo 0,036% de TFA) empregando um gradiente de 5 a 95% de B em 30 min com fluxo de 1,0 ml.min-1, com detecção em 220 nm. Após análise, o peptídeo bruto foi purificado em modo semi-preparativo utilizando um Cromatógrafo System Gold BECKMAN, com coluna C18 de fase reversa (Phenomenex, 250 x 21,20 mm; d = 5 µm; 100 Å). Foram utilizados os solventes A e B empregando um gradiente ajustado de acordo ao perfil e ao pico de eluição obtidos no cromatograma analítico, que foi de 15 a 60% de B em 120 min Materiais e Métodos 50 com fluxo de 5 ml.min-1 para o peptídeo não marcado e 20 a 60% de B em 120 min com fluxo de 3 mL.min-1 para o peptídeo marcado, com detecção em 220 nm. 3.3.3. Caracterização Espectrometria de massas Análises das massas dos peptídeos foram realizadas por injeção direta em um aparelho Fison Plataform ESI (“eletrospray ionization”), com injeção direta com uma bomba Shimadzu LC-10AD, sistema este controlado por uma Workstation Compaq modelo AP 200.A técnica baseia-se em um analisador quádruplo que ioniza a amostra utilizando um eletrospray, obtendo-se ao final um espectro com picos na qual é possível determinar a razão massa molecular/carga (m/z). Análise de aminoácidos Os peptídeos foram previamente pesados (aproximadamente 1,0mg) e hidrolisados em 1 ml de HCl 6 mol.L-1 e 160 µL de Fenol 5% em água a 110°C por 72 horas em atmosfera de N2 sob agitação. Após a hidrólise, o material foi concentrado a vácuo, dissolvido posteriormente em tampão de diluição citrato de sódio 0,2 mol.L-1, pH 2,2 e filtrado em unidade GV Millex (0,22 µm) (Millipore) antes de ser injetado no aparelho. As análises de aminoácidos foram efetuadas pelo Cromatógrafo Líquido Shimadzu LC-10A/C-47A equipado com três bombas LC 10AT, injetor automático SIL 10AF e detectores de UV SPD 10A e fluorescência RF 10A, empregando o método de funcionalização pós-coluna por orto-ftalaldeído (OPA). O sistema é periodicamente calibrado com uma mistura padrão de aminoácidos, obtendo-se um valor para o tempo de eluição de cada aminoácido e o fator de conversão entre a área de cada pico e a concentração da amostra. Para cálculo da proporção relativa dos aminoácidos das amostras determinou-se a relação entre as suas concentrações unitárias e a média. Materiais e Métodos 51 3.4. Análises in vitro 3.4.1. Estudo da bioatividade in vitro para regeneração óssea em solução de SBF Preparação do Simulated Body Fluid (SBF) A preparação da solução do SBF foi efetuada em um béquer utilizando 500mL de água ultra-pura em agitação, onde adicionou-se os reagentes abaixo listados, obedecendo as etapas descritas por Kokubo et al. (2006). 1. Cloreto de Sódio (NaCl); 2. Bicarbonato de Sódio (NaHCO3); 3. Cloreto de Potássio (KCl); 4. Monohidrogêno Fosfato de Potássio tri-hidratado (K2HPO4.3H2O); 5. Cloreto de Magnésio hexa-hidratado (MgCl2.6H2O); 6. Solução de HCl a 1,0 mol.L-1; 7. Cloreto de Cálcio (CaCl2); 8. Sulfato de Sódio (Na2SO4); 9. Tris-hidroximetil aminometano (HOCH2)3CNH2) (Tris). O pH foi corrigido com HCl 1,0 mol. L-1 para um pH de 7,35. O conteúdo foi transferido a um balão volumétrico, onde se perfez a quantidade de 1L com água ultra-pura. Após agitação do balão o conteúdo foi passado para um frasco de polietileno e conservado em geladeira. Teste de bioatividade in vitro A avaliação da bioatividade in vitro das nanopartículas foi realizada em solução SBF, como descrito por Kokubo et al. (2006). Amostras de sílica LM-SiO e LM-SiCaP I (0,1g) foram imersas nesta solução (100 ml) (YAN et al., 2006), e colocadas em banho a 37oC. Cada amostra foi imersa em SBF por 1, 7, 14, 21 e 28 Materiais e Métodos 52 dias, sem mudança na solução, mantidas em agitação constante. Após esses períodos as amostras foram secas em estufa a 60oC e analisadas por FT-IR e SEM. 3.4.2. Adsorção do peptídeo OGP e OGP-CF às nanopartículas de sílica 3.4.2.1. Cinética de adsorção do peptídeo Para determinar o tempo necessário para o sistema atingir o equilíbrio (nanopartículas e solução) foram feitos testes pela imersão de 0,05 g das amostras LMSiO, LMSiCaP I e LMSiCaP II em 5 ml da solução do OGP 10-4 mol.L-1 em solução tampão Tris pH 7,4, em triplicata para garantir a reprodutibilidade ao longo do trabalho experimental. O monitoramento foi feito a cada 10 minutos durante 90 minutos, onde 0,4 ml do sobrenadante foi coletado, para análise do peptídeo remanescente em solução em um espectrofotômetro de fluorescência Cary Eclipse VARIAN, com λexc em 492nm e λem em 520nm, permitindo a análise da intensidade de fluorescência x tempo. A mesma quantidade de sobrenadante tirada foi reposta com solução nova e a diluição foi considerada nos cálculos. A capacidade de troca iônica é um importante processo verificado nos métodos de extração líquido-sólido. Esta é normalmente calculada por meio da determinação do Nf. Esse parâmetro corresponde à capacidade máxima de adsorção do adsorbato por grama de sílica, determinada pela equação (1), onde: Na é o número de mols iniciais do analito em solução; Ns o número de mols do analito restante na solução; e w, a massa de sílica utilizada. (eq.1) 3.4.2.2. Incorporação de OGP e OGP-CF O peptídeo OGP-CF foi utilizado para avaliar a performance de incorporação das amostras LM-SiO e LM-SiCaP I e posterior liberação in vitro em solução de SBF. Materiais e Métodos 53 Após o conhecimento do tempo máximo de adsorção, foram realizados os experimentos com diferentes concentrações de OGP. De acordo com Spreafico et al. (2006) a quantidade de 10-11 mol de OGP promove uma melhor atividade da fosfatase alcalina, maior formação e mineralização de nódulos de osso neoformado, porém Saska (2011) mostrou que concentrações acima apresentam uma resposta mais imediata do organismo, além de melhorar a sensibilidade do método de quantificação. Assim, 50 mg do material sólido foi imerso em 5 ml das soluções, 10-4, 10-5 e 10-6 mol.L-1, de OGP-CF em solução tampão Tris 0,01 mol.L-1 e pH 7,4, mantendo agitação por 30 minutos, determinado em 3.4.2.1, em temperatura ambiente. Após esse período, foram coletados 0,4 ml do sobrenadante de cada sistema, em triplicata, para determinação do peptídeo remanescente em solução, por Espectroscopia de Fluorescência, em um espectrofotômetro de fluorescência Cary Eclipse VARIAN, com λexc em 492 nm e λem em 520 nm, permitindo a análise da intensidade de fluorescência x tempo. A determinação da quantidade de peptídeo incorporada foi dada pela curva padrão do peptídeo marcado livre em solução tampão Tris 0,01 mol.L-1. Já o material sólido, foi filtrado e lavado com tampão Tris por cinco vezes, para eliminar o excesso de solução do peptídeo e possíveis moléculas não adsorvidas, e seco a temperatura ambiente. A mesma sequência de imersões foi realizada para a incorporação do peptídeo OGP não marcado nas amostras de sílica para posteriores análises de proliferação e citotoxidade em culturas de células ósseas. 3.4.2.3. Liberação do peptídeo OGP-CF em solução SBF Determinados os parâmetros dos ensaios, os estudos de liberação do OGP- CF in vitro foram realizados de acordo com as etapas seguintes. Após as amostras LMSiO e LMSiOCaP I carregadas de OGP-CF se consagrarem totalmente secas, porções de 25 mg foram compactadas usando uma pressão uniaxial (0,5 MPa) para se obter pastilhas com dimensões de 7 mm x 1 mm. O perfil de liberação foi obtido pela imersão desses discos em 15 ml de solução SBF pH 7,4. A temperatura foi Materiais e Métodos 54 mantida constante a 37oC, com um auxílio de um termômetro em um sistema a parte. A fim de evitar limitações da taxa de liberação por limitações de difusão externas, manteve-se agitação contínua, 100rpm, durante os ensaios de liberação (Figura 3.4). Figura 3.4. Esquema do sistema de liberação do peptídeo OGP. A liberação in vitro do peptídeo OGP-CF das amostras LMSiO e LMSiCaP I foi monitorado por um espectrofotômetro de fluorescência Cary Eclipse VARIAN, com λexc em 492nm e λem em 520nm., em triplicata para cada amostra. As intensidades de fluorescência foram obtidas pela amostragem pontual de 0,4 ml de solução em tempos pré-determinados, até o sistema ficar constante. A cada amostragem, o mesmo volume retirado para análise foi reposto no sistema com solução pura e a diluição foi considerada nos cálculos. A concentração de peptídeo foi obtida através da curva padrão do peptídeo marcado livre em solução SBF. 3.4.2.4. Estudo de degradação in vitro em SBF Para analisar o comportamento das pastilhas frente à SBF, no período de liberação do peptídeo, foram realizadas análises microscópicas da superfície das pastilhas. Os pós das amostras LMSiO e LMSiOCaP I foram compactados, como Materiais e Métodos 55 descrito anteriormente, imersos em 10 ml de SBF e colocados em banho a 37oC, em períodos de 1 a 8 dias. Após cada período, as pastilhas foram retiradas da solução, congeladas e liofilizadas para análise em um Microscópio óptico trinocular com amplitude de 200 vezes acoplado a uma câmera da marca Samsung, modelo SDC- 415ND e software Image Tool e por SEM em um equipamento FEG-VP Zeiss. Resultados e Discussão 56 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Neste tópico serão apresentados os resultados de caracterização química e estrutural das amostras de sílica mesoporosa pura e sílica mesoporosa e fosfato de cálcio antes da incorporação do peptídeo, os resultados obtidos com a síntese do peptídeo OGP utilizando a SPFS e os ensaios de incorporação e liberação de OGP utilizando as amostras mesoporosas como carreador, bem como a discussão e interpretração desses resultados. 4.1. Caracterização das nanopartículas de sílica pura e com fosfato de cálcio 4.1.1. Espectroscopia vibracional na região do infravermelho Os espectros dos materiais LMSiO, LMSiCaP I e LMSiCaP II, calcinados e sintetizados a partir de Pluronic P123 são mostrados na Figura 4.1.1. Em todos os espectros, uma banda larga na região de 3.450 cm-1 é atribuída ao estiramento simétrico de grupos OH, νs(H-O-H) e νs(SiO-H), e o pico em torno de 1.635 cm-1 é devido à deformação de grupos OH, δ(H-O-H) (SOUSA, 2009). Em geral, unidades tetraédricas SiOx exibem estiramentos nas seguintes regiões: ν1, 750-830 cm-1; ν2, 300-400 cm-1; ν3, 800-1.000 cm-1; ν4, 450-600 cm-1. Tanto no espectro referente à LM-SiO quanto LM-SiCaP I e II, pode-se observar frequências vibracionais de compostos do tipo tetraédrico MO4 onde M = Si (NAKAMOTO, 1997). Os espectros apresentam as principais atribuições características da sílica na região próxima a 1091 cm-1 correspondente a νas(Si-O-Si), 813 cm-1 associados a νs (Si-O-Si), 460 cm-1 a deformação δ(O-Si-O). A banda atribuído ao estiramento νs(Si- OH) é observada em torno de 970 cm-1 em sólidos tratados termicamente a 600ºC (MASUDA; KAWASHITA, KOKUBO, 2007). Resultados e Discussão 57 4000 3000 2000 1000 * * * * LMSiO LMSiCaP I LMSiCap II T ra n s m it â n c ia ( u .a .) Nْ mero de ondas (cm -1 ) * o Figura 4.1.1. Espectros de FT-IR de sílica pura e com fosfato de cálcio sintetizada por sol-gel a partir de P123, onde (↑) indicam bandas Si-O-Si, (o) Si-OH e (*) P-O. No espectro de HA (não apresentado), foram observados os picos correspondentes aos grupos PO4 3- na região de 1089, 960, 603, e 563 cm-1, cujos comprimentos de onda estão de acordo com a literatura (REHMAN; BONFIELD, 1997). Algumas bandas de absorção de sílica são difíceis de identificação devido à sobreposição das bandas de absorção da HA, em especial na região de 1.185-1.000 cm-1, onde bandas de vibração Si-O-Si geralmente são mais fortes e em torno de 960 cm-1, região de absorção dos grupos Si-OH. Ao analisar o espectro da amostra LM-SiCaP I e II, algumas bandas de estiramento apresentam-se de acordo ao padrão da HA. No espectro que representa a amostra LMSiCaP I além das bandas características de sílica já mencionadas, são observadas bandas de absorção na região de 613 e 560 cm-1 que foram atribuídas a grupos PO4 3- (SOUSA; SOUZA; SOUSA, 2008). No entanto no espectro correspondente a amostra LMSiCaP II as bandas que se apresentaram a 1089, 933, 613 e 566 cm-1 foram atribuídas a ν3PO4 3-, ν1PO4 3- e Resultados e Discussão 58 ν4PO4 3-, respectivamente (ANDERSSON et al., 2005). A presença dessas bandas sugere a formação de fosfato de cálcio na estrutura porosa dessas amostras. 4.1.2. Difração de raios X Os raios X são radiações eletromagnéticas que possuem elevadas energias e curtos comprimentos de onda. Quando um feixe de raios X incide sobre um material sólido, uma fração deste feixe se dispersa, ou se espalha, em todas as direções pelos elétrons associados a cada átomo ou íon que se encontra na trajetória do feixe. Assim, a técnica de difratometria de raios X é amplamente usada para identificação de materiais cristalinos. Os difratogramas de raios X das amostras de sílica e sílica com fosfato de cálcio estão representados na Figura 4.1.2. As difrações foram identificadas através da coleção de padrões de difração do ICDD, PDF-2 (International Centre for Diffraction Data, Power Diffraction File-2). O difratograma 4.1.2a apresenta a estrutura amorfa da amostra LMSiO, onde somente uma difração larga entre 16º e 30º 2θ característica da estrutura amorfa da sílica e nenhuma difração característica cristalina foi visualizada. Sabe-se que as apatitas apresentam cinco fases distintas: DCPD ou bruxita (CaHPO4.2H2O), OCP ou fosfato octacálcio [Ca8H2(PO4)6.5H2O], β-TCP ou β- Tricálcio fosfato ou β-whitloquita [Ca3(PO4)2], HA ou hidroxiapatita [Ca10(PO4)6(OH)] e ACP ou fosfato de cálcio amorfo (KOKUBO, 2008). Assim, os difratogramas que correspondem as amostras LMSiCaP I e II apresentam difrações que corresponde a fase apatita, com vários picos entre 25º e 50º 2, com um pico máximo em torno de 32º 2. No difratograma 4.1.2b, foi observado difrações características de β-TCP, com um máximo em 31,01º 2θ (021) e uma fase secundária de HA, com uma difração correspondente a reflexão (211) (JCPDS #01-70-2065 e #01-73-0293, respectivamente). Quando a razão atômica Ca/P não é exatamente 1,5, correspondente ao TCP, pode aparecer impurezas, onde a principal é HA, que corresponde a uma razão acima de 1,5 (KOKUBO, 2008). No difratograma 4.1.2c, as principais fases correspondem ao ICDD padrão para HA com um máximo em 31,72º 2θ correspondente a reflexão (211) (JCPDS #01-73- Resultados e Discussão 59 0293), mostrando que se trata de uma HA semicristalina ou uma camada amorfa na superfície. As sobreposições e o alargamento dos picos das fases de apatita indicam uma baixa cristalinidade, e os padrões de XRD observados para HA nestas amostras são muito similares ao padrão de XRD de apatitas de tecido ósseo, mostrando baixa cristalinidade (DANILCHENKO et al., 2004). Figura 4.1.2. Padrões de XRD para as amostras LMSiO (a), LMSiCaP I (b) e LMSiCaP II (c). As difrações referentes a HA estão assinaladas por (*); β-TCP (o). Estudos indicam que a dissolução controlada de materiais bioativos é a principal importância para a estimulação da função celular, reabsorção e regeneração óssea (SALDAÑA et al., 2009). O β-TCP é caracterizado pela alta taxa de dissolução, que acelera a reabsorção do material e estimula a resposta imunológica. Vidros bioativos estão sujeitos a uma dissolução parcial em solução fisiológica, seguido pela precipitação de uma camada de Ca-P, que promove a atividade celular e formação óssea, na superfície de sílica (PADILLA et al., 2006). 15 20 25 30 35 40 45 50 o o o ** ** c a LMSiO LMSiCaP I LMSiCaP II In te n s id a d e r e la ti v a ( u .a .) 2 ( o ) b * o Resultados e Discussão 60 4.1.3. Medida de porosidade e de superfície específica A superfície de área específica é definida como sendo a superfície de área por unidade de massa ou volume de um material, e sugere a extensão da superfície do material disponível a interações físicas e químicas. Esta superfície é normalmente determinada pela absorção física de um gás ou pela absorção química de um corante como o azul de metileno (REED, 1995). Em estudos de caracterização, na determinação da superfície de área específica de pós cerâmicos, metálicos ou poliméricos, utiliza-se normalmente o método BET, que leva esse nome em homenagem aos seus idealizadores, Brunauer, Emmet e Teller. O método consiste na absorção física de um gás inerte a baixa temperatura, que passa rapidamente através da amostra, sendo o N2 no ponto de ebulição (77,4 K) em geral o mais utilizado (BROEKHOFF; BOER, 1968). Para análise da porosidade das amostras de sílica pura e com fosfato de cálcio foi realizado análise usando isoterma de adsorção/dessorção de N2. As curvas de adsorção-dessorção de nitrogênio e dD/dV em função do diâmetro de poro, apresentadas nas Figuras 4.1.3, 4.1.4 e 4.1.5, permitem observar o tamanho médio de poros da sílica mesoporosa. As isotermas são características de materiais mesoporosos, mostrando que são do tipo IV (ZHAO et al., 1998; MANSANO et al., 2008; IZQUIERDO-BARBA et al., 2009). Assim, as amostras exibem uma estrutura característica de materiais mesoporosos estruturados por micelas (MTS), onde em determinado valor da pressão relativa P/P0 o volume aumenta bruscamente, formando um loop de histerese,(BECK et al.,1992). A presença de histerese é devido ao preenchimento incompleto dos mesoporos e quanto menor sua inclinação mais homogênea é a distribuição do tamanho dos poros. Comparando-se os valores da área da superfície específica das amostras LMSiO e LMSiCaP I e II, pode-se observar que houve diminuição significativa com a diminuição da porcentagem de sílica. A isoterma de adsorção da amostra de sílica mesoporosa pura (Figura 4.1.3) exibe histerese do tipo H1, na curva de adsorção e dessorção entre a pressão Resultados e Discussão 61 parcial P/Po de 0,4-0,7, característica de poros uniformes (MANSANO et al., 2008; IZQUIERDO-BARBA et al., 2009) com canais 1 D cilíndricos. A porosidade desta amostra apresenta tamanho médio de poros de 60 Å. A amostra apresenta também uma distribuição fina de poros, típica de materiais MTS e alta área de superfície (880 m2.g-1). A amostra LMSiCaP I apresenta um isoterma com histerese do tipo H1, entre a pressão parcial P/Po de 0,4-0,7, também característico de material mesoporoso, com contribuições microporosas, com canais cilíndricos (Figura 4.1.4). Pode-se observar que com o aumento da porcentagem de fosfato de cálcio, e consequentemente menor sílica, houve redução no valor da área de superfície, sendo neste caso igual a 484 m2.g-1. Além disso, a distribuição dos diâmetros dos poros esteve entre 50-300 Å, aproximadamente, devido ao crescimento do fosfato de cálcio. Figura 4.1.3. Isoterma de adsorção (circulo sólido)/dessorção (circulo aberto) de nitrogênio da sílica mesoporosa pura calcinada, obtida a partir de P123. 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 0 100 200 300 400 500 600 V o lu m e a d s o rv id o ( c m 3 .g -1 S P T ) Pressão Relativa (P/Po) 0 50 100 150 200 0 20 40 60 80 100 120 d V /d D Diâmetro de Poro (إ) Resultados e Discussão 62 Figura 4.1.4. Isoterma de adsorção (circulo sólido)/dessorção (circulo aberto) de nitrogênio da amostra de sílica mesoporosa LMSiCaP I calcinada, obtida a partir de P123. Em contraste, a amostra LM-SiOCaP II (Figura 4.1.5) apresenta uma isoterma com histerese do tipo H3, entre a pressão parcial P/Po de 0,7-0,9. De acordo com Santilli et al. (1993), a estrutura mesoporosa não definida, apresentando mais de um tipo de mesoporo, e este tipo de histerese é associado a presença de poros no formato de fenda, cone e/ou pirâmides. Essas partículas possuem área de superfície de 220 m2.g-1. Poucas informações podem-se obter sobre a distribuição dos poros, o que também não é aconselhável s