UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CÂMPUS DE JABOTICABAL RELATÓRIO FINAL DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO DO CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA REALIZADO JUNTO AO CENTRO VETERINÁRIO CÃES E GATOS 24H (UNIDADE OSASCO), OSASCO/SP Caso (ou Assunto) de interesse: linfoma multicêntrico em cão: relato de caso Caio Henrique Turco Jaboticabal – S.P. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CÂMPUS DE JABOTICABAL RELATÓRIO FINAL DO ESTÁGIO CURRICULAR OBRIGATÓRIO DO CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA REALIZADO JUNTO AO CENTRO VETERINÁRIO CÃES E GATOS 24H (UNIDADE OSASCO), OSASCO/SP Caso (ou Assunto) de interesse: linfoma multicêntrico em cão: relato de caso Caio Henrique Turco Orientador: Prof. Dr. Fabrício Singaretti de Oliveira Supervisor: M.V. Orson Nobumitsu Kamakura Relatório do estágio curricular em prática veterinária apresentado à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinária, Câmpus de Jaboticabal, Unesp, para obtenção do título de bacharel em medicina veterinária. JABOTICABAL – S.P. 2º SEMESTRE 2023 iv Sumário I Relatório final do estágio curricular obrigatório do curso de medicina veterinária realizado junto ao centro veterinário cães e gatos 24h ........................................... 8 1. Introdução.................................................................................................................................... 8 2. Descrição do local do estágio ................................................................................................... 9 3. Descrição das atividades .......................................................................................................... 28 4. Discussão das atividades ......................................................................................................... 31 5. Considerações finais ................................................................................................................ 32 II ASSUNTO DE INTERESSE: linfoma multicêntrico em cão: relato de caso ....................... 33 6. Introdução ................................................................................................................................. 33 6.1 Objetivos ............................................................................................................................... 34 7. Revisão literária ....................................................................................................................... 35 7.1 Etiologia e epidemiologia .................................................................................................. 35 7.2 Classificação anatômica e sinais clínicos ........................................................................ 36 7.3 Diagnóstico........................................................................................................................... 38 7.4 Tratamento ........................................................................................................................... 40 8. Relato de caso ........................................................................................................................... 46 9. Discussão ................................................................................................................................... 52 10. Conclusão................................................................................................................................ 54 Referências .................................................................................................................................... 55 v Lista de ilustrações Figura 1 - Recepção térrea do Centro Veterinario Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP ............................................................................................................................... 8 Figura 2 - Salas de atendimento clínico geral do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP ................................................................................................ 9 Figura 3 - Recepção do Setor de especialidades do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP ....................................................................................................................................10 Figura 4 - Recepção do setor de diagnóstico por imagem do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, Osasco, SP ..............................................................................11 Figura 5 - Salas de atendimento do setor de especialidades do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP ................................................................12 Figura 6 - Farmácia do setor de especialidade do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP .....................................................................................13 Figura 7 – Sala de atendimento clínico do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP ....................................................................................................15 Figura 8 – Mesa com computador da sala de atendimento clinico do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP .......................................................................................................................16 Figura 9 - Sala de Radiografia do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP .................................................................................................................18 Figura 10 - Sala de radiografia do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, pode-se observar nesta imagem o computador programado para receber as imagens e calha para posicionamento dos animais .......................................................................................................................19 Figura 11 - Centro cirúrgico salas 02 e 03 do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP ...............................................................................................21 Figura 12 - Corredor de acesso as salas de cirurgia do centro cirúrgico, sala de paramentação, autoclave e sala de matérias do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP ...................................................................................................................... .22 Figura 13 - Centro cirúrgico principal (Sala 01), do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP .....................................................................................23 vi Figura 14 - Centro cirúrgico sala 01 do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, Osasco, SP. A: mesa de cirurgia, materiais para curativos e aparelho endoscópico. B: berço aquecido, tanque de nitrogênio líquido e aparelho para cirurgias oftalmológicas .......................................................................................................................24 Figura 15 - Centro cirúrgico sala 03 do Centro Veterinário Cães e Gatos24h®, destinado ao tratamento odontológico, em Osasco, SP. A: mesa do centro cirúrgico e aparelho anestésico. B: gaveteiro de armazenamento dos materias cirúrgicos .......................................................................................................................25 Figura 16 - Imagens ultrassonográficas do Baço em cão de 17 anos sem raça definida com linfoma, com as dimensões do órgão aumentadas, contornos regulares, ecogenicidade preservada e ecotextura heterogênea com aspecto tendendo a “rendilhado”.…………………............................................................................46 Figura 17 - Imagens ultrassonográficas dos linfonodos mesentéricos de cão sem raça definida de 17 anos com linfoma. A: linfonodo mesentérico esquerdo medindo 2,71cm de eixo longo e 1,13cm de eixo curto. B: linfonodos mesentérico direito com mensuração de 3,04cm de eixo longo e 1,42 de eixo curto ..............................................................................................................47 Figura 18 - Imagens ultrassonográficas dos linfonodos hepáticos (A) e gástrico (B) de cão de 17 anos sem raça definida com linfoma, com os linfonodos apresentando padrões de ecogenicidade heterogêneos ..........................................................47 Figura 19 - Imagens ultrassonográficas de linfonodos ilíacos de cão de 17 anos sem raça definida, representando linfadenomegalia abdominal generalizada .......................................................................................................................48 Figura 20 - Imagens ultrassonográficas da vesícula urinária em cão de 17 anos sem raça definida. A: as paredes do órgão se apresentam espessadas, normoecogênicas e irregulares, medindo cerca de 0,77cm. B: o órgão está preenchido por conteúdo líquido anecogênico, com discreta quantidade de estruturas puntiformes (sedimentos). ............................................................48 Figura 21 - Imagens da necropsia de cão de 17 anos sem raça defininda com linfoma. A: baço apresentando aumento de volume e lesão de padrão folicular em múltiplos pontos brancos coalescentes em sua superfície. B: vesícula urinária com paredes significativamente espessadas ..........................................................................49 vii Lista de tabelas Tabela 1 - Protocolo COP de 22 semanas ............................................................40 Tabela 2 - Protocolo COAP de 8 semanas ............................................................41 Tabela 3 - Protocolo UW-Madison-Short de 19 semanas ...........................42 8 I Relatório final do estágio curricular obrigatório do curso de medicina veterinária realizado junto ao centro veterinário cães e gatos 24h®. 1 Introdução A graduação em Medicina Veterinária tem o papel de qualificar os discentes nos âmbitos do ensino, pesquisa, extensão e prática profissional, preparando assim os estudantes, em um aspecto generalista e multidisciplinar, para atuar de forma técnica nas mais diversas áreas de concentração, como saúde animal, produção, reprodução, saúde pública, inspeção, entre outros. O domínio nestas áreas concretiza-se através do conhecimento adquirido pelas aulas teóricas (ou ensinamentos teóricos) e pela vivência/rotina das aulas práticas, projetos de pesquisas, grupos de estudo, estágios extracurriculares e obrigatórios. Neste sentido, o estágio curricular obrigatório tem papel indispensável na formação de um bom profissional, visto que proporcionará a aprendizagem de conhecimentos e desenvoltura de raciocínio para atuação na clínica e vivência da rotina, o que coloca a prova a bagagem teórica desenvolvida na graduação. Este relatório visa descrever as atividades desenvolvidas pelo graduando em Medicina Veterinária da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Campus de Jaboticabal, Caio Henrique Turco, sob orientação do docente Prof. Dr. Fabrício Singaretti de Oliveira. As atividades realizadas no estágio curricular obrigatório foram desenvolvidas no hospital Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, localizado na cidade de Osasco, SP, com início em 02/01/2023 e término em 28/04/2023, totalizando 605 horas, sob supervisão do Médico Veterinário Orson Nobumitsu Kamakura. O estágio foi realizado em 3 setores diferentes, sendo os dois primeiros meses no Laboratório de Análises Clínicas, o terceiro mês no setor da cirurgia, com acompanhamento da área de Anestesiologia e, no mês final, no setor de Diagnóstico por Imagem. 9 2 Descrição do local do estágio O Centro Veterinário Cães e Gatos 24h® - Unidade Osasco, encontra-se localizado na Rua Narciso Sturlini, nº 186, centro da cidade de Osasco, SP. O hospital possui pronto atendimento clínico 24 horas, com suporte para urgências e emergências, e internação. Os demais setores (análises clínicas, diagnóstico por imagem, cirurgia e especialidades) iniciam suas atividades as 7:00h da manhã e encerram-se às 22:00h. O hospital é dividido em diversos setores possibilitando assim a participação e presença de uma equipe multidisciplinar. A equipe médica- veterinária é composta por clínicos gerais, cirurgiões, anestesistas e especialistas: medicina felina; cardiologia; dermatologia; neurologia; entre outros. Além disso, conta com a presença de trainees, auxiliares veterinários e de funcionários responsáveis pela limpeza, serviço de atendimento ao cliente (SAC), recursos humanos (RH), gestão e contratos, departamento jurídico-financeiro, administração e diretoria. Constam como principais serviços oferecidos pelo hospital: consultas clínicas gerais e com especialistas; vacinação; cirurgias eletivas e emergenciais; internação 24h; exames complementares (processamento e envio de materiais biológicos para laboratórios terceirizados; radiografia; ultrassonografia; tomografia computadorizada; e ressonância magnética). Na parte externa, observa-se uma fachada com estacionamento prioritário para idoso, pessoas com deficiência e mulheres grávidas (2 vagas) e um local destinado para embarque e desembarque de ambulância (1 vaga). A fachada tem 3 entradas, sendo uma que leva a recepção e as outras duas levam ao pet shop, ao lado do hospital encontra-se o banho e tosa. O hospital possui uma área destinada a uma marca própria de pet shop denominada OzPet®, com a oferta de rações, petiscos, brinquedos, acessórios e farmácia comercial. Além disso, oferece também banho e tosa aos animais. Este espaço também conta com um café para que os tutores e funcionários possam fazer refeições. O hospital é dividido em 5 andares, sendo o subsolo para a garagem; o térreo para a recepção (figura 1), caixa, corredor com consultórios de atendimento e emergência (figura 2), farmácia interna do hospital, sala da ressonância magnética 10 e pet shop. Figura 1 - Recepção térrea do Centro Veterinario Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023 11 Figura 2 - Salas de atendimento clínico geral do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. O primeiro andar é destinado ao setor das especialidades e exames de imagem (figuras 3, 4, 5 e 6), ambos separados; bem como uma sala destinada à vacinação e sala de coleta de sangue e citologia e, isolada das alas hospitalares, encontra-se a sala do serviço de atendimento ao cliente. 12 Figura 3 - Recepção do setor da especialidades do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. 13 Figura 4 - Recepção do setor de diagnóstico por imagem do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023 14 Figura 5 - Salas de atendimento do setor de especialidades do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. 15 Figura 6 - Farmácia do setor de especialidade do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. No segundo andar está localizado o laboratório de exames clínicos , internação e centro cirúrgico com sala de paramentação e sala para materiais cirúrgicos, também há uma recepção que atende a internação e os animais que passarão ou passaram por procedimentos cirúrgicos. Por fim, no terceiro andar, se encontra a cobertura, que é contemplada com anfiteatro destinado a treinamentos e cursos, possui também refeitório e vestiário para os funcionários. A sala de recepção funciona pelo sistema de senhas e agendamentos. É dada prioridade aos pacientes em estado grave, descompensados e em choque, sendo o atendimento de emergência denominado “Código Azul”. Os funcionários da 16 recepção organizam os atendimentos, cadastram os tutores e os animais, encaminham os pacientes do pronto atendimento para a triagem e têm o papel importante de anunciar, pelo sistema de sinalização por autofalantes, os veterinários, a equipe de limpeza, auxiliares de veterinária, tutores e demais funcionários do hospital para qualquer intercorrência que possa acontecer na rotina. As salas de atendimento (figuras 7 e 8) são compostas por mesa de escritório com computador e telefone com ramais para comunicação com todos os setores do hospital, pia de mármore com água oxigenada, clorexidine, desinfetante, álcool 70%, algodão e gaze. Há também uma mesa de inox com suporte para fluidoterapia. A sala de emergência comporta três mesas de inox, canalização de oxigênio, aparelho portátil para monitoração de sinais vitais, bomba automática de infusão contínua e aparelho Doppler. Na farmácia interna é possível ter acesso a todo o aparato médico necessário para a rotina, como por exemplo: medicamentos das mais variadas classes (antibióticos, anti-inflamatórios, antieméticos, anti-histamínicos e etc), bolsas de fluidoterapia, tubos de coleta, seringas e agulhas de todos os tamanhos, vacinas, entre outros materiais médicos. A sala de coleta de sangue e citologia possui conformação semelhante as salas de atendimento, com a diferença de possuir armário próprio com seringas, agulhas, lâminas de vidro e lamínulas, para agilizar o processo de coleta, também conta com estante para tubos de coleta. 17 Figura 7 - Sala de atendimento clínico do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023 18 Figura 8 - Mesa com computador da sala de atendimento clinico do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. A sala da Ressonância Magnética fica distante das demais salas do térreo, sendo dividida em duas pequenas salas, uma com um pequeno escritório com computador programado com software específico para realização dos exames e mais uma tela de monitoração anestésica. Na outra sala, que é separada por uma porta de chumbo, é onde se encontra o aparelho da ressonância, sendo este de campo aberto, além disso é equipada com estação de trabalho de anestesia e armários com sondas orotraqueais de vários tamanhos, bem como cateteres, seringas, agulhas, medicamentos anestésicos e reversores, entre outros aparatos. É importante lembrar que objetos metálicos são proibidos na sala da máquina de ressonância, uma vez que esses objetos são atraídos por ela, podendo causar acidentes aos colaboradores e 19 animais, como também danos estruturais ao aparelho. O primeiro andar é composto pelo setor de diagnóstico por imagem, esse que dispõe de uma sala de laudos e sala de espera, que recebe os pacientes para os exames de raio-x (figuras 9 e 10), tomografia e ultrassom. A sala da tomografia é semelhante à ressonânc ia, munida de medicamentos, sondas, estação anestésica e demais aparatos médicos, com a diferença de que a separação entre a máquina de tomografia e computador de software se dá em salas distintas, sendo possível a visualização do paciente e de colaboradores na sala da máquina por meio de um vidro retangular entre a parede que separa as salas. O setor das especialidades também está localizado no primeiro andar, apresentando uma recepção geral e, separadamente, uma recepção própria para felinos; possui também um guichê com caixa, um corredor com consultórios, farmácia interna e uma pequena ala de internação para animais silvestres de pequeno porte. 20 Figura 9 - Sala de Radiografia do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. 21 . Figura 10 - Sala de radiografia do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, pode-se observar nesta imagem o computador programado para receber as imagens e calha para posicionamento dos animais. Fonte: arquivo pessoal, 2023. No segundo andar encontra-se o laboratório de análises clínicas, a internação, a cirurgia e a recepção dos setores de cirurgia e internação. O laboratório é dividido em 4 salas, sendo uma delas maior, onde está é realizado todo o trabalho de análises clínicas como hemograma, exames bioquímicos, sorologias, contagem diferencial de leucócitos, urinálise e coproparasitológico, há uma grande bancada de mármore que separa essa sala maior e possibilita a realização dessas atividades separadamente e, quanto à análise química de urina e o exame de fezes, uma bancada mais afastada é destinada para a realização desses exames. As outras três salas do laboratório são menores, sendo uma para estoque do laboratório, outra para as análises histopatológicas e outra para as análises microbiológicas. O laboratório é muito bem equipado e contém todos os equipamentos necessários para a rotina: analisador automatizado para hemograma, analisador bioquímico automático, analisador gasometria, centrífuga para tubos, centrífuga para capilares, microscópios ópticos de luz, homogeneizador hematológico, computadores, geladeiras com freezer congelador, estufas de secagem e esterilização, estufa para cultura microbiológica, 22 refratômetros, capela de exaustão, entre outros equipamentos. A internação é uma ala bem grande do hospital, contém 64 baias ao todo, com uma parte central para cães, com baias de dimensões diversas, havendo também 4 salas de isolamento, sendo uma para animais acometidos por doenças infectocontagiosas, uma para felinos, outra para neonatos e a última para internos da cirurgia. Sua estrutura comporta oxigênio canalizado, muitas bombas automáticas de infusão contínua, macas, área para banho e higienização dos animais, bancada para preparo de medicação, estoque de medicação e equipamentos hospitalares (seringas, agulhas, gazes, álcool, sondas e etc), computadores, ultrassom portátil, entre outros aparatos. O setor da cirurgia (figuras 11, 12, 13, 14 e 15) é dividido em 3 centros cirúrgicos pequenos, um centro cirúrgico grande, uma sala de materiais com autoclave, uma sala para paramentação, uma sala de estoque e lavagem de materiais e um pequeno vestiário. Cada centro cirúrgico é equipado com mesa cirúrgica, estação e monitoração anestésica, oxigênio canalizado, gazes, pissetas com álcool 70%, clorexidine degermante e alcoólico. O centro possui seu próprio estoque de medicamentos e aparatos hospitalares para os procedimentos de rotina da cirurgia e anestesia, sendo os mais utilizados os fármacos pré-anestésicos (cetamina, metadona, midazolam e etc), antibióticos, analgésicos e anti-inflamatórios, bem como cateteres, seringas, agulhas, fios de sutura, lâminas de bisturi, dentre outros. 23 Figura 11 - Centro cirúrgico salas 02 e 03 do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. 24 Figura 12 - Corredor de acesso as salas de cirurgia do centro cirúrgico, sala de paramentação, autoclave e sala de matérias do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. 25 Figura 13 - Centro cirúrgico principal (Sala 01), do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, em Osasco, SP. Fonte: arquivo pessoal, 2023. 26 Figura 14 - Centro cirúrgico sala 01 do Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, Osasco, SP. A: mesa de cirurgia, materiais para curativos e aparelho endoscópico. B: berço aquecido, tanque de nitrogênio líquido e aparelho para cirurgias oftalmológicas. Fonte: arquivo pessoal, 2023. A B 27 Figura 15 - Centro cirúrgico sala 03 do Centro Veterinário Cães e Gatos24h®, destinado ao tratamento odontológico, em Osasco, SP. A: mesa do centro cirúrgico e aparelho anestésico. B: gaveteiro de armazenamento dos materias cirúrgicos. Fonte: arquivo pessoal, 2023. A B 28 3 Descrição das atividades No laboratório o estagiário acompanhava a rotina como um todo: auxiliando na organização dos exames de hemograma e bioquímicos a serem realizados; identificação e numeração dos tubos de acordo com as requisições enviadas; encaminhamento dos exames para o livro ata de hemograma do veterinário responsável pela sua execução, onde cada profissional era responsável por 15 exames. Além disso, também era responsável pela análise química e física de urina, bem como o processamento das fezes para posterior leitura em lâmina pelos veterinários, sanando quaisquer dúvidas das etapas de processamento dos exames e auxiliando na interpretação dos exames e de seus resultados. O estagiário ainda possuía como demais funções: corar lâminas de microscopia para diferenciação leucocitária e avaliação celular das amostras para hemograma; realização de testes rápidos (Virús da Imunodeficiência Felina, Vírus da Leucemia Felina – FIV/FeLV; 4Dx; cinomose; parvovírus canino/coronavírus; lipase qualitativa de cães e gatos); armazenar amostras urinár ias para cultura bacteriana e antibiograma. Quando possível e, sob supervisão, o estagiário era autorizado a fazer esfregaços sanguíneos referentes aos hemogramas, identificava as lâminas e rodava as amostras no analisador automático para anotar os resultados referentes a fração vermelha do sangue e das plaquetas e, posteriormente, executava o exame de hematócrito correspondente a essas lâminas com leitura da taxa e visualização do capilar e, após isso, era feita a leitura da proteína total por refratômetro. No centro cirúrgico, acompanhando os anestesiologistas, o estagiário era responsável pela montagem de fluidoterapia e pela organização de bandejas com materiais hospitalares para cada centro cirúrgico quando necessário. Antes da preparação dos pacientes para as cirurgias, os anestesistas também solicitavam exame físico com aferição de frequência cardíaca; frequência respiratória; tempo de preenchimento capilar (TPC); avaliação de mucosas; ausculta pulmonar e escore corporal. Também era necessário calcular doses de medicamentos quando solicitado pelos anestesistas, bem como anotar parâmetros vitais dos pacientes durante todo o período de monitoração anestésica nas cirurgias (a cada 10 minutos). Ao estagiário também era solicitado efetuar contenção dos animais nos momentos da administração 29 de medicação pré-anestésica e de acesso venoso. Uma outra atribuição dos anestesistas durante a rotina era a de sedar animais reativos para tornar possível a realização de procedimentos, manipulação e contenção no setor da clínica. Outra tarefa importante dos anestesistas era a de anestesiar os pacientes para os exames de tomografia e ressonância magnética, sendo assim, o estagiário podia auxiliar nessas atividades fazendo a contenção dos animais. Durante este período no setor da cirurgia, o estagiário acompanhou diversos procedimentos ambulatoriais como acesso venoso, administração intramuscular de medicação pré-anestésica, intubação, antissepsia pré-cirúrgica, colocação de sonda esofágica; e diversos procedimentos cirúrgicos como orquiectomia, ovariohisterectomia, nodulectomia, osteossíntese, laparotomia exploratória, mastectomia, cistotomia, enucleação, esplenectomia, entre outros procedimentos. No setor de Diagnóstico Por Imagem o estagiário acompanhava os exames de raio-x e ultrassom ajudando os veterinários e enfermeiros na contenção. Nas radiografias era autorizado ao estagiário auxiliar no posicionamento dos pacientes para a confecção de imagens limpas e sem distorções. Ao estagiário também foi designado a recepção de tutores e pacientes, realizando o cadastro dos dados no aparelho de ultrassom. Posteriormente aos exames, os veterinários ultrassonografistas e radiologistas sanavam as dúvidas pertinentes aos exames e alguns promoviam discussão sobre os casos com perguntas. O acomapanhamento dos procedimentos tornou possíveis algumas observações frente à casuística dos exames de imagens. Houve maior número de atendimentos a cães do que gatos, sendo que haviam mais cães de pequenas raças em comparação aos portes médio e grande. Uma considerável parte da casuística, nos exames de radiografia era voltada para fratura de membros torácicos, com destaque para fraturas de rádio e ulna nos cães da raça Spitz Alemão. Também foram observados um número considerável de casos de displasia coxofemoral em cães de porte grande como labrador, rottweiler, golden retriever e boxer; outro destaque quanto a rotina da radiografia foi o de casos de dificuldade respiratória em cães braquicefálicos como Shih-Tzu, Lhasa Apso, Buldogue Francês e Pug em que foram observados alguns casos de colapso de traqueia. Já na rotina ultrassonográfica, o que mais foi observado foi a prevalência de casos de neoplasias em fígado e baço, seguidos de processos degerenativos nos rins e cálculos na bexiga. Quanto a casuística em gatos, o que mais se observou foram casos de trauma por 30 automobilístico, FIV e FeLV e obstrução uretral, sendo a grande maioria dos felinos atendidos sem raça definida. 31 4 Discussão das atividades O Centro Veterinário Cães e Gatos 24h® - Unidade Osasco é um grande hospital de funcionamento ininterrupto de suas atividades, com atuação multidisciplinar de seus colaboradores em diferentes setores. Os atendimentos são constantes e a casuística é muito variada e desafiadora devido ao contexto de uma grande cidade, atraindo para o hospital não só casos de Osasco, mas também de regiões próximas da capital de São Paulo. A grande estrutura física e a presença de diversos setores e equipamentos permite o atendimento de vários pacientes diariamente, seja voltado para o setor de clínica geral, coleta e processamento de exames ou atendimento especializado. Esse contexto proporcionou, ao estagiário, conhecimentos imprescindíveis sobre a rotina e organização de grandes hospitais veterinários, visto que a eficiência e a vasta oferta de serviços podem impactar beneficamente na saúde dos pacientes, trazendo confiança aos tutores e permite aprendizado constante dos colaboradores que alí trabalham. 32 5 Considerações finais O estágio curricular obrigatório que ocorreu no Centro Veterinário Cães e Gatos 24h® - Unidade Osasco foi de uma importância inquestionável para a formação deste discente, visto que o contato com a rotina constante de um grande hospital proporcionou uma excelente experiência setorial e organizacional. Desta maneira, as atividades realizadas permitiram aprimoramento de técnicas rotineiras da atividade médico-veterinária e absorção de novos conhecimentos acerca das áreas de patologia clínica, anestesiologia e diagnóstico por imagem. O estagiário pôde ter uma vivência generalista de como ocorre a assistência médica por completo do paciente, isso possibilitou um aprendizado mais amplo. Portanto, a vivência do estágio obrigatório despertou o interesse pela busca de uma qualificação mais robusta no que se refere à clínica de pequenos animais e diagnóstico por imagem, para que assim seja possível uma melhor e mais eficaz inserção no mercado de trabalho deste discente e futuro médico-veterinário. 33 II ASSUNTO DE INTERESSE: linfoma multicêntrico em cão: relato de caso 6 Introdução O linfoma é uma neoplasia maligna de células linfoides, tendo sua origem em órgãos hematopoéticos sólidos como fígado, baço e linfonodos (Nelson e Couto, 1998). Apesar desta origem bem definida, os linfomas, também conhecidos como linfossarcoma ou linfoma maligno, possuem potencial de se desenvolver em qualquer órgão devido à contínua e ininterrupta migração de linfócitos para qualquer região tissular do organismo. O linfoma que mais acomete animais domésticos, que muito se assemelha ao que ocorre em humanos em alguns aspectos (biologia, epidemiologia, morfologia celular e fenotipagem), é o não Hodgkin, entretanto já é relatado o acometimento de cães e gatos por linfomas do tipo Hogdkin pela constatação de células gigantes e multinucleadas, conhecidas pelo nome de Reed- Sternberg (Daleck e De Nardi, 2016). O linfoma é a neoplasia hematopoética mais comumente relatada em animais domésticos, tendo uma prevalência por ano de 13 a 24/100.000 em cães e 41,6/100.000 em gatos (Santos e Alessi, 2016). Animais adultos são os mais acometidos, entretanto já são relatados casos em animais com menos de 1 ano de idade, e as raças mais acometidas em cães são Boxer, Poodle, Chowchow, Beagle, Basset Hound, Pastor alemão, São Bernardo, Scottish Terrier, Airedale Terrier, Bulldog. Raças com alterações genéticas que levam a predisposição familiar como Golden Retriever e Bull Mastiff, podem apresentar deficiência no mecanismo de reparo de DNA. Já os felinos, os siameses e raças orientais são mais predispostas ao desenvolvimento de linfoma. (Daleck e De Nardi, 2016). Em cães a etiologia é desconhecida, o que configura uma característica de natureza multifatorial da origem da doença, já que nenhum agente etiológico foi especificamente identificado como o causador primário. Já em gatos atribuem-se como principais causas o Vírus da Leucemia Felina (FeLV) e o Vírus da Imunodeficiência Felina (FIV) (Nelson e Couto, 1998). Na medicina veterinária o linfoma é amplamente classificado de acordo com a localização anatômica das massas tumorais, podendo então ser categorizado como multicêntrico, mediastínico, alimentar, extranodal e leucêmico; em gatos também há a 34 forma nodal (Santos e Alessi; 2016). Vale ressaltar que os achados clínicos vão depender da forma anatômica de apresentação da neoplasia (Nelson e Couto, 1998). Entretanto, de maneira geral, os sinais clínicos em cães são linfoadenopatia generalizada superficial ou profunda, apatia, anorexia/hiporexia e perda de peso, ou seja, inespecíficos (Cardoso et al., 2004). O diagnóstico compreende principalmente o exame citológico ou histopatológico, como também o auxílio de exames complementares como hemograma, testes de função renal e hepático, proteionograma, mielograma, radiogr afiado tórax e ultrassonografia abdominal, que serão importantes para definir o estadiamento da doença e delimitar a sua extensão pelo organismo do paciente (Daleck e De Nardi, 2016). O tratamento de forma sistêmica se dá pela quimioterapia, já nas formas mais localizadas a estratégia terapêutica consiste na radioterapia e cirurgia. (Nelson e Couto, 1998). A justificativa deste trabalho é, além de trazer a discussão um caso de linfoma multicêntrico em cão sem raça definida, acrescentar ao mundo acadêmico achados importantes na vivência em estágio do discente de medicina veterinária ao ter contato com oncologia em estágio supervisionado, que no caso foi primordial para o amadurecimento profissional. 6.1 Objetivos Objetivos Gerais Descrever um caso de linfoma em cão sem raça definida atendido no hospital Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®, na cidade de Osasco, São Paulo. Objetivos Específicos Relatar precisamente o histórico, os sinais clínicos e, principalmente, os achados ultrassonográficos que possibilitaram presumir o diagnóstico, bem como a conduta terapêutica escolhida após a realização deste exame em um caso de linfoma em cão. 35 7. Revisão de Literatura 7.1 Etiologia e epidemiologia A etiologia do linfoma em cães é desconhecida, mas acredita-se que, além de predisposição genética, outros fatores externos estejam vinculados ao desenvolvimento desta enfermidade, como por exemplo: exposição a agentes químicos que podem ser os herbicidas de ácido fenoxiacético, clorofenóis, dioxinas; solventes orgânicos (benzeno, bifenilas policloradas, clordanos e fármacos imunossupressores); campos eletromagnéticos e outros fatores como aberrações cromossômicas, trombocitopenia imunomediada e os retrovírus (D aleck e De Nardi, 2016). Apesar disso, o componente genético nos linfomas é determinante, pois é observa-se a sua prevalência em linhagens sanguíneas de cães, assim como o fator racial também se mostra determinante no que diz respeito a epidemiologia (Nelson e Couto, 1998). Estudos apontam que alterações genéticas herdadas e/ou adquiridas podem levar a ativação dos genes Bcl-2 e c-myc que são proto- oncogenes, como também podem inativar genes supressores de tumor como o p53 e o Rb, facilitando assim o desenvolvimento de linfoma em ambas as situações. A influência de fatores epigenéticos como alterações nas histonas, metilação de DNA e o envolvimento de microRNA também estão sendo objetos de estudo para se comprovar se há ou não influência sobre o desenvolvimento de linfomas (Daleck e De Nardi, 2016). Em humanos, disfunções imunológicas podem levar ao desenvolvimento de linfoma, entretanto, essa associação para cães ainda precisa ser mais bem estudada e fundamentada, pois ainda há poucos dados para dar suporte a esta tese (Zandvliet, 2016). Das neoplasias diagnosticadas em cães, o linfoma acaba por representar uma taxa de 7 a 25% em relação aos demais tumores malignos e 83% em relação às hemopatias malignas, sendo a forma ganglionar multicêntrica a mais frequente (Morailon et al., 2013). Outro aspecto importante em relação aos linfomas é o estadiamento clínico, que é responsável por fornecer um parâmetro sobre a extensão da doença, se há presença de alguma síndrome paraneoplásica e outras afecções que possam estar associadas de alguma maneira (Moura et al., 1999). 36 Neste sentido, o estadiamento foi classificado pela Organização Mundial de Saúde em graus, que podem ir do I ao V, categorizados da seguinte forma por Owen (1980): “I - Envolvimento limitado a um único linfonodo ou tecido linfoide em um único órgão; II- Envolvimento em vários linfonodos regionais com ou sem tonsilas; III - Envolvimento generalizado dos linfonodos; IV – Acometimento do baço e/ou figado com presença ou ausência do envolvimento generalizado dos linfonodos; V – Acometimento do sangue, medula óssea e/ou outros órgãos.” Esse estadiamento torna possível definir um prognóstico ao quadro e também leva ao estabelecimento de uma conduta terapêutica mais adequada para cada caso (Moura et al., 1999), além disso, é usado como parâmetro de comparação em muitos estudos envolvendo linfoma em animais domésticos, juntamente com os fatores de predisposição racial, sexo, idade e classificação anatômica, que são dados importantes no estabelecimento de um diagnóstico efetivo e preciso, como aponta estudo realizado no Brasil (Moreno e Bacarense, 2007). Animais de meia-idade (entre 6,3 a 7,7 anos) são os mais acometidos, como aponta estudo feito nos Países Baixos, que também mostra que a taxa de incidência aumentou de 1,5 em cães de 1 ano de idade para 80 nos cães de 10 anos de idade, considerando-se relação de 100.000 animais (Tesk, 1994). O mesmo estudo aponta que, na distribuição da prevalência de Linfoma Não Hodgkin em raças de cães, o destaque vai para cães da raça Boiadeiro de Flandres (17,7%), mistura de raças/Sem raça definida (15,4%), Boxer (13%), Rottweiler (7,1%) e Doberman (5,1%) e, ainda neste mesmo estudo e em outros, não foi relatada nenhuma predisposição quanto ao sexo dos animais (Tesk, 1994). Entretanto, estudos realizados no Brasil mostram que os dados em relação à predisposição racial e de sexo podem variar e se mostrar controversos a depender da localização em que o estudo é feito. 7.2 Classificação anatômica e sinais clínicos O linfoma pode ser classificado quanto à sua posição anatômica, sendo assim para cães: multicêntrico, mediastinal, gastrointestinal, extranodal e cutênea (Daleck e De Nardi, 2016). A forma multicêntrica é que mais acomete os cães, representando cerca de 80% dos casos na espécie e, no que diz respeito à sua característica, este 37 acomete os linfonodos profundos e superficiais; o baço, fígado, tonsilas e medula óssea; o que configura uma gama de sinais clínicos distintos em vista dessa variação de órgãos que podem ser acometidos, sendo então os sinais: linfadenomegalia generalizada, anorexia, perda de peso, caquexia, esplenomegalia, hepatomegalia, tonsilomegalia, desidratação, febre, ascite, edema localizado, palidez de mucosas e icterícia (Santos e Alessi, 2016). Outros sinais clínicos observados são vômito, diarreia, dispneia, poliúria, polidipsia, alterações respiratórias e hipertermia (Cardoso et al., 2004). A forma mediastínica tem como alicerce da neoplasia o timo e os linfonodos mediastinais caudais e craniais. Os sinais clínicos mais observados são a dispneia, taquipneia, tosse, regurgitação e alterações na ausculta cardíaca e pulmonar ao exame físico, visto que a presença desses sinais se dá em razão da compressão das vias aéreas e do esôfago, podendo estes sinais se agravarem em decorrência de acúmulo de líquido na pleura (Santos e Alessi, 2016). Há também associação com poliúria e polidipsia a esta forma do tumor, que é oriunda da hipercalcemia paraneoplásica que pode se desenvolver juntamente ao linfoma (Nelson e Couto, 1998). O linfoma gastrointestinal é caracterizado por desenvolver-se no trato gastrintestinal e nos linfonodos mesentéricos, o que acaba por desencadear uma síndrome de má absorção alimentar nos animais, tendo como sinais clínicos mais expressivos a caquexia, diarreia e, além disso, é possível que ocorra espessamento de algum segmento do intestino, geralmente na porção íleocecocólica, gerando uma obstrução (Santos e Alessi, 2016). Poderá ainda haver sinais de peritonite, o que dificulta o diagnóstico (Daleck e De Nardi, 2016). O linfoma extranodal é uma massa linfóide, de aspecto mais isolado, que acomete qualquer órgão fora do sistema hematopoiético, com uma predileção por rins, pele e canal vertebral, havendo uma categorização para linfoma cutâneo (Santos e Alessi, 2016). Os sinais clínicos variam de acordo com o órgão acometido, já a forma cutânea, que afeta as mucosas, baço, fígado e medula óssea. A forma cutânea tem duas classificações histológicas importantes, a epiteliotrópica (células neopláscias originárias de linfócitos T) e não epiteliotrópica (células neoplásicas originárias de linfócitos B). (Daleck e De Nardi, 2016). A clínica dos animais acometidos à forma cutânea se resume em lesões multifocais ou generalizadas em forma de placas ou nódulos ulcerados, havendo também 38 eritrodermia esfoliativa, o que leva o paciente a apresentar prurido, alopecia e seborréia. (Cardoso et al., 2004; Nelson e Couto, 1998; Daleck e De Nardi, 2016). Lesões ulceradas com despigmentação mucocutânea em mucosa oral e conjuntival podem ser observadas em alguns casos (Scott et al., 1995 apud Cardoso et al., 2004). Quanto aos achados laboratoriais, estes são importantes para se avaliar a progressão do tumor e para o estabelecimento de uma referência nos parâmetros hematológicos quando da resposta ao tratamento quimioterápico, sendo assim é comum que os pacientes apresentem anemia, trombocitopenia, neutropenia, linfocitose e presença de células linfóides imaturas (precursoras) (Morris e Dobson 2001), já no exame bioquímico é comum identificar hipercalcemia, um achado muito comum em cães com linfoma, estando presente numa taxa aproximada de 10 a 40% dos pacientes linfoma (Nelson e Couto, 1998), bem como alteração de enzimas hepáticas que podem indicar um comprometimento morfológico e funcional do fígado, mas que só se comprova efetivamente com uma avaliação histopatológica do órgão (Daleck e De Nardi, 2016). 7.3 Diagnóstico O diagnóstico e estadiamento compreende o exame físico, hemograma completo, perfil bioquímico, urinálise e exames de imagem, mas principalmente, a avaliação citológica e histopatológica dos sítios acometidos, há também o emprego de imunofenotipagem atrelada à reação em cadeia da polimerase (PCR) e citometria de fluxo, bem como também faz-se uso de imunocitoquímica e imuno-histoquímica (Withrow et al., 2007; Daleck e De Nardi, 2016). O exame físico se dá principalmente pela palpação dos linfonodos, inspeção das membranas mucosas oral e ocular para avaliar coloração e sinais de lesão que possam remeter a causas secundárias como ulcerações, icterícia, petéquias, mucosas hipocoradas e etc; a palpação abdominal pode revelar aumento de órgãos, espessamento de parede intestinal e linfadenopatia mesentérica (Withrow et al., 2007). Alterações na ausculta torácica podem indicar efusão pleural ou presença de massa tumoral no mediastino e, ainda, com a fundoscopia é possível observar uveíte, hemorragia na retina e infiltrado ocular em animais com a forma extranodal ocular da doença (Withrow et al., 2007). 39 Todos esses achados laboratoriais compõem o diagnóstico, mas vale ressaltar outros sinais em algumas circunstâncias, como por exemplo a hiperuremia e a hipercreatinina quando o linfoma for renal bileteral, da mesma maneira, achados como hipoproteinemia e hipoalbuminemia podem indicar a forma digestiva da doença (Withrow et al., 2007). Quanto aos exames de imagem, a radiografia é uma ótima ferramenta para identificar a extensão do tumor, sendo possível observar nas projeções torácicas o aumento dos linfonodos retroesternais e traqueobroquiais, infiltração no pulmão, ef usões pleurais e massas no mediastino, enquanto que na região abdominal, será possível notar hepatoesplenomegalia, aumento dos linfonodos ilíacos e efusão abdominal (Morrison, 2002). Já na ultrassonografia, as alterações aparentes estão relacionadas com a ecogenicidade de órgãos como fígado e baço, que podem apresentar-se com ecogenicidade mista ou hipoecoicos e sofrerem aumento de tamanho, além disso pode ser observado linfadenopatia, neoformações e derrame. Sendo assim, o ultrassom tem o papel de indicar anormalidades na textura, tamanho, formato e estrutura de órgãos e qualquer infiltração ligada a eles, além de identificar também a presença de líquido na cavidade abdominal (Nelson e Couto, 1998; Morris e Dobson 2001; Morrison, 2002; Morailon et al., 2013). Neste contexto, outro aspecto essencial do manuseio desse aparelho é a sua utilização na técnica de biópsia com agulha guiada por ultrassom e em aspiração por agulha fina (Nelson e Couto, 1998). Quanto aos exames de citologia por agulha fina e biópsia, o primeiro terá a função de fornecer a classificação da neoplasia em seu aspecto celular, enquanto que a biopsia das regiões acometidas, podendo ser uma mais regiões, confirmará o diagnóstico de forma mais precisa e tem o papel de classificar a neoplasia quanto a sua estrutura histológica (De Moura et al., 1999). A imunofenotipagem também auxilia no diagnóstico no sentido de determinar a origem celular da neoplasia, ou seja, se as células linfóides malignas originaram-se de células B precursoras, de células T precursoras, células B maduras, células T maduras e de células nulas, logo, esses exames se mostram essenciais por definirem um prognóstico ao paciente e por oferecerem informações necessárias para se eleger uma conduta terapêutica mais adequada (De Moura et al., 1999; Santos e Alessi, 2016). Uma etapa indispensável do diagnóstico é o estadiamento do linfoma, o que inclui a extensão e a gravidade da doença, podendo ser feito seguindo as regras 40 estabelecidas pela OMS sobre a classificação de tumores em animais domésticos, deste modo, os estádios mais comuns em cães e gatos são o III, IV e V devido à incapacidade dos tutores de identificar estádio iniciais da enfermidade (D aleck e De Nardi, 2016). Portanto, este processo que envolve o diagnóstico e suas nuances têm a tarefa de elucidar um prognóstico e firmar uma conduta terapêutica ao paciente. O diagnóstico diferencial em cães para a forma multicêntrica do linfoma consiste na diferenciação de doenças que causam linfadenomegalia, sendo assim, enfermidades infecciosas como erliquiose, leishmaniose e toxoplasmose; doenças imunomediadas como lúpus e pênfigo e metástase de outros tumores (Daleck e De Nardi, 2016). 7.4 Tratamento O tratamento pode ser feito por quimioterapia, radioterapia ou cirurgia (Morailon et al., 2013). A eleição da conduta cirúrgica dependerá do local e da extensão do tumor e, no que se refere a radioterapia, a escolha por essa conduta também dependerá do local em que o tumor se encontra (Morailon et al., 2013). Embora a radioterapia e a cirurgia possam ser uma realidade de conduta terapêutica, a quimioterapia ainda se configura como principal forma de tratamento para linfoma, sendo também a mais eficaz, com uma taxa aproximada de 80% de remissão por volta de 4 a 8 meses em cães (Daleck e De Nardi, 2016). Os linfomas são considerados enfermidades sistêmicas, o que justifica a quimioterapia como principal meio de tratamento, pois a abordagem sistêmica, quando bem-sucedida, torna possível a remissão do tumor e prolonga o tempo de vida do paciente e, animais sem tratamento podem apresentar um tempo de sobrevida de 4 a 6 semanas (Withrow et al., 2007). Uma boa resposta à qumioterapia é observada em linfomas multicêntricos, o mesmo não ocorre em outros tipos de linfoma. A literatura relata que a resposta inicial para linfomas tímicos é boa, mas que no decorrer do tratamento a remissão é menor em comparação ao multicêntrico. As formas alimentar, hepatoesplênica e cutânea são difíceis de tratar, enquanto que o linfoma extranodal necessita de associação de quimioterapia com radioterapia e cirurgia, a depender da particularidade de cada caso (Argyle et al., 2008). 41 A quimioterapia tem como base 3 etapas: indução, manutenção e resgate (Nelson e Couto, 1998; Morris e Dobson 2001; Daleck e De Nardi, 2016). Na indução, as doses quimioterápicas são maiores com intervalos mais curtos entre as sessões objetivando a remissão do tumor. Já na manutenção ocorre o contrário, doses menores com maior tempo de intervalo entre sessões, sendo que esta fase o intuito é manter a remissão da doença, por fim, o resgate consiste na tentativa de proporcionar uma segunda ou terceira remissão (Daleck e De Nardi, 2016). A terapia antineoplásica deve vir acompanhada de hemograma completo a cada sessão e antes de se iniciar o tratamento também para haver um acompanhamento dos parâmetros hematológicos ao longo de todo o processo, em vista da miolossupressão causada pelos fármacos, logo, a referência para que a utilização desses medicamentos seja segura é de valores acima de 2000 leucócitos/ml e 70.000 plaquetas/ml e, caso os valores forem menores, será necessário interromper o tratamento por 1 semana e restituí-lo em seguida em doses menos intensa e frequentes (Morris e Dobson 2001; Daleck e De Nardi, 2016). Há muitos protocolos para se usar no tratamento de linfoma, como o protoloco COP (tabela 1) em que os fármacos utilizados são a ciclofosfamida, vincristina e prednisona, sendo 1mg/kg de predsnisona na primeira semana, sendo administrada em dias alternados a partir da segunda semana, com indução ocorrendo até a 4ª semana e manutenção durante 1 ano, enquanto que a ciclofosfamida é usada numa dose de 300mg/m2 com o uso interrompido durante a segunda e terceira semana e, por fim, a vincristina é usada por todo o tratramento numa dose de 0,75mg/m2 (Daleck e De Nardi, 2016). 42 Tabela 1 - Protocolo COP de 22 semanas indicado para tratamento de linfoma em cães e gatos (adaptado de Daleck e De Nardi, 2016). Semana de administração Ciclofosfamida (300mg/m2 VO ou IV) Vincristina (0,75mg/m2 IV) Prednisona (1 a 2mg/kg VO) 1º x x x 2º x x 3º x x 4º x x x 7º x x x 10º x x x 13º x x x 16º x x x 19° x x x 20° x x x Fonte: adaptado de Daleck e De Nardi, 2016. No protocolo COAP, com ciclofosfamida, vincristina, prednisona e citarabina (tabela 2) , a ciclofosfamida deverá ser administrada numa dose de 50mg/m² em dias alternados nos cães, enquanto que a citarabina será administrada numa dose de 100mg/m² IV por gotejamento uma vez ao dia ou duas vezes ao dia por via subcutânea numa dose de 50mg/m², por 4 dias; a prednisona terá doses diárias de 40mg/m² na primeira semana de protocolo e nas semanas seguintes a dose será reduzida para 20mg/m² e o medicamento fornecido em dias alternados (Daleck e De Nardi, 2016). A manutenção decorrerá por um ano, até que ocorra recidiva, e se estabelece pelo uso de clorambucila (20mg/m², VO) em semanas alternadas, metotrexato (2,2mg/m², VO) a cada dois dias e prednisona (20mg/m², VO) em dias alternados (Daleck e De Nardi, 2016). 43 Tabela 2 - Protocolo COAP de 8 semanas indicado para tratamento de linfoma em cães e gatos (adaptado de Daleck e De Nardi, 2016). Semana de administração Ciclofosfamida 50mg/m2, VO Vincristina 0,5mg/m2, IV Prednisona 40mg/m2, VO Citarabina 100mg/m2, IV 1º x x x x 2º x x x 3º x x x 4º x x x 5º x x x 6º x x x 7º x x x 8º x x x Fonte: adaptado de Daleck e De Nardi, 2016. No protocolo UW-Madison-Short (UW-19) consta os antineoplásicos prednisona, vincristina, ciclosfamida e Doxorrubicina (tabela 3), sendo um protocolo intensivo e que não precisa de manutenção, ainda assim é agressivo e muitos animais não toleram as aplicações dos fármacos a partir da segunda semana de protocolo, havendo a necessidade de estender o intervalo entre o fornecimento da medicação; a dose de prednisona será de 2mg/kg, VO, todos os dias da primeira semana, 1,5mg/kg na segunda semana, 1 mg/kg na terceira e na quarta 0,5mg/kg; a ciclofosfamida conta com a possibilidade de ser administrada opcionalmente por via oral, devendo ser substituída por clorambucila (1,4mg/m2, VO) se houve o desenvolvimento de uma cistite hemorrágica estéril, quadro este que pode ser evitado com o fornecimento de furosemida na dose de 1mg/kg por via intravenosa; é recomendado também a administração de defenidramina (1mg/kg, IM) para evitar reação de hipersensibilidade decorrente do uso de doxorrubicina (Daleck e De Nardi, 2016). 44 Tabela 3 - Protocolo UW-Madison-Short de 19 semanas indicado para tratamento de linfoma em cães (adaptado de Daleck e De Nardi, 2016). Semana de administração Prednisona 2mg/m2, VO Vincristina 0,7mg/m2, IV Ciclofosfamida 250mg/m2, IV Doxorrubicina 30mg/m2, IV 1º x x 2º x x 3º x x 4º x x 5º 6º x 7º x 8º x 9º x 10º 11º x 12º x 13º x 14º x 16° x 17° x 18° x 19° x Fonte: adaptado de Daleck e De Nardi, 2016. O protocolo UW-19 é protocolo de eleição para cães e apresenta os melhores resultados, garantido um tempo de sobrevida aos animais de 1 a 2 anos (Daleck e De Nardi, 2016). É necessário ter cautela com a aplicação de terapias antineoplásicas, pois trata-se de fármacos citotóxicos que causam lesões à células saudáveis, podendo acarretar no desenvolvimento da síndrome da lise tumoral aguda, que acomete animais nos estádios IV e V de linfoma, sendo este quadro agudo, podendo evoluir para choque. Deste modo, para reverter essa intercorrência, faz-se administração de fluidoterapia intensa e correção dos distúrbios hidroeletrolíticos e reestabelecimento do equilíbrio ácido-base (Daleck e De Nardi, 2016). É possível prevenir a ocorrência deste quadro com o fornecimento de fluidoterapia minutos antes de se começar com a aplicação da quimioterapia, podendo mantê-la por horas, ou então aplicar os fármacos em doses fracionadas (Daleck e De Nardi, 2016). A cirurgia é indicada para os estágios I e II da doença se os nódulos forem isolados, como também é indicada a esplenectomia para linfoma esplênico não responsivo à quimioterapia, apesar disso, a literatura é relata alguns casos em que houve um aumento da sobrevida dos pacientes que foram submetidos à terapia antineoplásica antes da realização da esplenectomia. (Daleck e De Nardi, 2016). 45 Quanto a radioterapia, esta modalidade de tratamento é limitada pelo aspecto sistêmico do linfoma, pois quando aplicada sobre todo o corpo do paciente, causará grande mieolossupressão, havendo necessidade de associar a técnica com transplante autólogo de medula óssea, além disso o alto custo da aparelhagem é outro fator limitante para sua utilização. Sua indicação é dada para nódulos isolados e para quando se deseja diminuir o tamanho da massa tumoral mais rapidamente; outra utilidade da radioterapia se configura nos casos de tumor resistente, em que é realizado 6 sessões ao longo de 2 semanas, podendo o tecido tumoral reduzir por completo após findado o tratamento (Daleck e De Nardi, 2016). O prognóstico é baseado no estadiamento da doença, ou seja, animais diagnosticados nos estágios iniciais têm prognóstico melhor (North e Banks, 2009). Muitos fatores influenciam para um melhor ou pior prognostico, são eles: diagnóstico precoce, grau de malignidade, resistência ao tratamento, imunofenotipagem, síndromes paraneoplásicas, sexo e idade (N orth e Banks, 2009). Tumores com grau de malignidade mais alto não respondem tão bem ao tratamento; linfomas com origem de células T são mais dispostos a desenvolver resistência à quimioterapia; a hipercalemia e a trombocitopenia, que são sinais observados na síndrome paraneoplásica, indicam pior prognóstico; desenvolvimento de resistência ao tratamento associada com presença de glicoproteína P ligada a expressão do gene de resistência MDR1, o que indica um prognostico ruim; pacientes mais jovens tendem a desenvolver formas mais agressivas da doença e há relatos na literatura sobre fêmeas terem mais sobrevida que machos, mas isso não é um consenso (North e Banks, 2009; Henry et al., 2010). Em que pese o prognóstico variar de caso para caso, a literatura estabelece o prognóstico como sendo, de maneira geral, reservado (Vail e Thamm, 2005). 46 8 Relato de caso Este relato de caso ocorreu no hospital Centro Veterinário Cães e Gatos 24h® na cidade de Osasco, São Paulo, no mês de Abril, sendo conduzido por uma médica veterinária que faz atendimentos como clínica geral. Uma cadela doméstica fêmea, cor preta, castrada, sem raça definida, com 17 anos de idade, pesando 9kg, foi atendida com diagnóstico prévio de discopatia em coluna vertebral, haja vista que a condição do animal se deteriorou rapidamente num período aproximado de 1 mês decorrente do atendimento anterior, este que foi feito no mesmo hospital, mas por outro médico veterinário que também atende na clínica geral. No primeiro atendimento a queixa principal dos tutores foi sobre dor na coluna, sendo que o animal estava com dificuldade para deambular e levantar a cabeça, o que foi confirmado com posterior palpação da região cervical, pois o animal apresentou algia ao estímulo. Apesar disso, no restante da anamnese foi relatado pelos tutores que o animal era bem ativo apesar da idade, que se alimentava e ingeria água regularmente, bem como defecava e urinava dentro da normalidade, porém no dia do atendimento foi relatado que o animal ainda não havia defecado. Ao exame físico o animal não apresentou anormalidade em seus parâmetros vitais, estava em alerta, as mucosas estavam normocoradas, palpação abdominal sem alterações ou dor, em ausculta cardíaca foi constatado sopro grau 2; na ausculta pulmonar não havia alterações evidentes em campos pulmonares passíveis de avaliação, a temperatura retal aferida foi de 38,6°C, animal se encontrava normohidratado (TPC<2’), sem alterações evidentes em olhos e ouvidos e presença de nódulo na pele de aproximadamente 5cm de aspecto verrucoso em região de escápula lado direito. Na radiografia cervical, torácica e toracolombar nas projeções latero-lateral direita e esquerda, foi observado diminuição o espaço intervertebral entre C3-4, C4- 5, C6-7 e C7-T1; espondilose ventral entre C3-4, T4-5, T5-6, T8-9, T9-10, T10-T11, T11-12, T12-13, T13-L1, L1-2, L2-3 e L4-5; opacificação de forame intervertebral entre L1-2, L2-3 e L3-4, bem como retenção fecal. Após essas constatações foi administrada medicações analgésicas e anti-inflamatórias por via intramuscular através do protocolo terapêutico: dipirona 25mg/Kg, metadona 0,2 mg/Kg, meloxicam 0,1 mg/Kg. Aos tutores foi explicado que essas alterações na coluna vertebral são comuns das condições de senilidade e, como tratamento, foi indicado o controle 47 da dor com sessões de acupuntura. Também foi requisitado pelo veterinário o retorno do animal para atendimento e realização de exames laboratoriais (hemograma completo, bioquímico e glicemia), ecodopplercardiograma, eletrocardiograma, citologia aspirativa do nódulo em região de escápula lado direito para acompanhamento em 5 dias, todavia não houve retorno dos tutores e paciente. Após aproximadamente um mês, o animal retornou para atendimento e apresentava muita dor na coluna, não se locomovia, apresentava tenesmo, havia falta de apetite, mas se alimentava às vezes quando era oferecido alimento direto na boca. Apresentava nódulos cutâneos espalhados pelo corpo, urinava em si mesmo e estava prostrado e letárgico no momento da consulta, não respondendo aos estímulos externos. Diante deste quadro foi requisitado pela médica veterinária exame de ultrassonografia abdominal. O baço (figura 16) se apresentava com dimensões aumentadas, contornos regulares, ecogenicidade preservada e ecotextura heterogênea tendendo a rendilhado, o que é indicativo de infiltração neoplásica no órgão. O fígado foi observado com dimensões aumentadas e vascularização congesta, com parênquima normoecogênico e ecotextura preservada; quanto a vesícula biliar, encontrava-se preenchida de conteúdo líquido anecogênico, com discreta quantidade de conteúdo amorfo, ecogênico e em suspensão (lama biliar) com paredes normoespessadas, normoecogênicas e regulares. O cólon ascendente estava com paredes espessadas medindo até 0,33cm, podendo indicar colite, mas sem evidência de obstrução ou intussuscepção de alças. Ao avaliar os linfonodos (figuras 17, 18 e 19), constatou-se linfadenomegalia generalizada de aspecto heterogêneo com aumento da ecogenicidade do linfonodo mesentérico adjacente, sinal sugestivo de infiltrado neoplásico/metastático. Foi observado espessamento pronunciado das paredes da bexiga (figura 20) medindo 0,77cm, normoecogênicas e irregulares, já o interior do órgão estava preenchido de líquido anecogênico com discreta quantidade estruturas puntiformes e ecogênicas sem suspensão (sedimento), o que poderia indicar uma cistite. Nos rins, foram observadas corticais hiperecogênicas e junções corticomedulares menos definias e hiperecogênicas. .A glândula adrenal esquerda não foi possível de ser caracterizada no exame em vista de tensão e algia abdominal da região, sinal este que ainda não 48 havia sido detectado durante a anamnese e exame físico, enquanto que a adrenal direita apresentava-se sem alterações dignas de nota quanto ao comprimento, espessura e diâmetro. Na região de cavidade abdominal foi detectada presença ínfima de líquido livre disperso. Em vista da idade avançada e condição deletéria de saúde do animal, além do alto grau de comprometimento sistêmico com muitos linfonodos aumentados, sinais indicativos de infiltração neoplásica em mesentério e baço, peritonite e doença hepática secundária, foi indicada a eutanásia do paciente no sentido de não prolongar ainda mais seu sofrimento, não sendo feito ou requisitado qualquer outro procedimento ambulatorial após o ultrassom. Com o óbito do animal, foi solicitada aos tutores autorização para o procedimento de necrópsia (figura 21), a qual foi deferida por eles e, neste procedimento, o que mais chamou atenção da equipe veterinária foi o espessamento da parede da bexiga, os linfonodos aumentados, baço com aumento de volume e notou-se lesão com padrão folicular em múltiplos pontos brancos coalescentes no parênquima esplênico. Figura 16 - Imagens ultrassonográficas do Baço em cão de 17 anos sem raça definida com linfoma, com as dimensões do órgão aumentadas, contornos regulares, ecogenicidade preservada e ecotextura heterogênea com aspecto tendendo a “rendilhado”. Fonte: cedido por Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®. 49 Figura 17 - Imagens ultrassonográficas dos linfonodos mesentéricos de cão sem raça definida de 17 anos com linfoma. A: linfonodo mesentérico esquerdo medindo 2,71cm de eixo longo e 1,13cm de eixo curto. B: linfonodos mesentérico direito com mensuração de 3,04cm de eixo longo e 1,42 de eixo curto. Fonte: cedido por Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®. Figura 18 - Imagens ultrassonográficas dos linfonodos hepáticos (A) e gástrico (B) de cão de 17 anos sem raça definida com linfoma, com os linfonodos apresentando padrões de ecogenicidade heterogêneos. Fonte: cedido por Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®. 50 Figura 19 - Imagens ultrassonográficas de linfonodos ilíacos de cão de 17 anos sem raça definida, representando linfadenomegalia abdominal generalizada. Fonte: cedido por Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®. Figura 20 – Imagens ultrassonográficas da bexiga em cão de 17 anos sem raça definida. A: as paredes do órgão se apresentam espessadas, normoecogênicas e irregulares, medindo cerca de 0,77cm. B: o órgão está preenchido por conteúdo líquido anecogênico, com discreta quantidade de estruturas puntiformes (sedimentos). Fonte: cedido por Centro Veterinário Cães e Gatos 24h®. A B 51 . . Figura 21 - Imagens da necropsia de cão de 17 anos sem raça defininda com linfoma. A: baço apresentando aumento de volume e lesão de padrão folicular em múltiplos pontos brancos coalescentes em sua superfície. B: vesícula urinária com paredes significativamente espessadas. Fonte: arquivo pessoal, 2023. 52 9 Discussão É comum que o linfoma se desenvolva em animais de raça definida, mas também pode acometer significativamente cães sem raça definida, como mostra estudo realizado com 77 animais pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel), em que 45 animais eram de raça definida e 29 sem raça definida (Coelho et al., 2019), assim como ocorreu no caso descrito acima. Em relação à faixa etária de acometimento da doença e estadiamento clínico, os estudos brasileiros são condizentes com boa parte da literatura de outros países (Sequeira et al., 1999; Moreno e Bacarense, 2007). Ainda assim, vale ressaltar um estudo feito na cidade de Uberlândia, em que se observou uma frequência de linfoma significativa na raça Pit Bull, mas o estudo conclui que isso se deve ao perfil de criação da raça na região e não resulta de uma predisposição racial, visto que a prevalência do tumor nessa região em raças como Boxer, Rottweiler, Pastor Alemão, Poodle e Labrador se mostrou condizente com o que já foi descrito na literatura, assim como os resultados referentes à idade e ao fato da prevalência ser maior em cães de raça definida (Coleto et al., 2017). O paciente apresentou sinais clínicos atípicos à casuística de linfoma num primeiro momento, pois sua condição prévia de discopatia acabou por mascarar o quadro neoplásico do paciente, visto que os sinais clínicos desta condição (dor na coluna cervical e torácica à palpação) eram mais evidentes. No momento do segundo atendimento, o paciente se mostrava apático e muito letárgico, além de apresentar nódulos cutâneos difusos pelo corpo e dificuldade de locomoção, sinais esses relatados pela literatura (Cardoso et at., 2004), todavia vale ressaltar que a dificuldade de locomoção pode ser relacionada com a prévia dor na coluna do paciente neste caso, podendo haver ou não relação direta com o quadro neoplásico. O ultrassom foi o exame que possibilitou presumir o diagnóstico sugestivo deste caso, e nele foram observadas alterações como hepatomegalia, esplenomegalia, alteração do parênquima esplênico e linfadenomegalia generalizada, sinais comumente associados ao estadiamento de linfoma, como mostra estudo realizado em Botucatu. (Geller et al., 2018). Este mesmo estudo aponta que, mesmo com esses sinais frequentes na casuística, não é possível 53 estabelecer precisamente o diagnóstico como linfoma, visto que os aspectos ultrassonográficos podem variar de paciente para paciente, mas que a característica dos linfonodos, principalmente os linfonodos ilíacos mediais, podem representar um sinal importante para a suspeita de linfoma (Geller et al., 2018). A literatura estabelece que linfonodos acometidos por linfoma são visibilizados com aumento de tamanho, bordas irregulares e ecogenicidade heterogênea (Mannion et al., 2006), ou seja, em consonância com o que foi observado no exame ultrassonográfico deste relato de caso. É importante frisar que a ultrassonografia será uma ferramenta complementar ao diagnóstico de linfoma, já que os exames de eleição para diagnóstico definitivo de linfoma são a biópsia e a aspiração por agulha fina de linfonodos e órgãos com suspeita de infiltrado neoplásico (Withrow et al., 2007), o que não foi possível realizar neste caso devido ao paciente estar muito debilitado e não ter condições físicas necessárias para uma sedação. A literatura relata, com uma prevalência rara, a forma folicular de linfoma, esta que na necropsia, mais precisamente no baço, se apresentará como uma lesão de diversos pontos brancos multifocais coalescentes distribuídas pela superfície do órgão, sendo um sinal claro de acometimento pela neoplasia (Santos e Alessi, 2016; Mazaro et al., 2018). Foi por meio deste achado amplamente difundido na literatura que foi possível presumir o diagnóstico, do caso relatado, pois na necropsia do paciente foi observado o mesmo padrão de lesão na superfície esplênica. O prognóstico de linfoma dependerá sempre da precocidade do diagnóstico e estadiamento da doença, que grande parte das vezes ocorre tardiamente, como relatado pela literatura do ponto de vista de sobrevida e resposta na remissão da doença (Capua et al., 2011), em vista disso, o paciente deste relato de caso era um animal muito idoso e que se encontrava em um estado grave de acometimento pela doença, o que fez com que a médica-veterinária sugerisse a eutanásia como opção terapêutica aos tutores, estes que deferiram a sugestão. 54 10 Conclusão O linfoma é uma neoplasia maligna hematopoiética prevalente em animais de raça definida, mas também pode afetar animais sem raça definida. O diagnóstico definitivo é feito pela histologia e citologia de células tumorais, de linfonodos ou órgãos acometidos, colhidas nos procedimentos de biópsia ou aspiração por agulha fina. O prognóstico é reservado, mas a casuística conta com prognóstico ruim, visto que os animais são diagnosticados tardiamente, assim como neste caso. Portanto, é fundamental que se realize o diagnóstico precocemente, com o emprego dos métodos diagnósticos de eleição e pelo auxílio dos métodos complementares, o que permitirá estadiar a doença e conduzirá à uma melhor conduta terapêutica, refletindo numa maior sobrevida ao paciente. 55 11. Referências ARGYLE, DAVID J. Decision making in small animal oncology . 1 ed. Iowa: Wiley- Blacwell, 2008. CARDOSO, M.J.L.1; MACHADO, L.H.A.2; MOUTINHO, F.Q.3; PADOVANI, C.R. 4 Sinais clínicos do linfoma canino (Clinical signs of the canine lymphoma) - Archives of Veterinary Science v. 9, n. 2, p. 19-24, 2004 CÁPUA, M. L. B. DE., COLETA, F. E. D., CANESIN, A. P. M. 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Epub 2016 Mar 8. I Relatório final do estágio curricular obrigatório do curso de medicina veterinária realizado junto ao centro veterinário cães e gatos 24h®. 1 Introdução 2 Descrição do local do estágio 3 Descrição das atividades 4 Discussão das atividades 5 Considerações finais II ASSUNTO DE INTERESSE: linfoma multicêntrico em cão: relato de caso 6 Introdução 6.1 Objetivos 7. Revisão de Literatura 7.1 Etiologia e epidemiologia 7.2 Classificação anatômica e sinais clínicos 7.3 Diagnóstico 7.4 Tratamento 8 Relato de caso 9 Discussão 10 Conclusão 11. Referências