JÚLIO CÉSAR BATISTA MICROGERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA (ABAIXO DE 100 kW) UTILIZANDO TURBINA TESLA MODIFICADA Tese apresentada à Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, para obtenção do título de Doutor em Engenharia Mecânica na área de Transmissão e Conversão de Energia. Orientador: Prof. Dr. João Andrade de Carvalho Júnior Co-Orientador: Prof. Dr. Heraldo da Silva Couto Guaratinguetá 2009 B33 3m Batista, Júlio César Microgeração de energia elétrica (abaixo de 100kw) utilizando turbina tesla modificada. / Júlio César Batista – Guaratinguetá : [s.n], 2009. 107f. : il. Bibliografia: f. 100-102 Tese (doutorado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, 2009. Orientador: Prof. Dr. João Andrade de Carvalho Júnior Co-orientador: Heraldo da Silva Couto 1. Turbinas a vapor. I. Título CDU 621.165 ii iii DADOS CURRICULARES JÚLIO CÉSAR BATISTA NASCIMENTO 21.10.1960 – S. J. RIO PRETO/SP. FILIAÇÃO Deoclécio Batista Luzia Martins Batista 1979/1982 Curso de Graduação em Engenharia Elétrica Universidade Federal de Brasília 1983/1985 Curso de Pós-Graduação em Engenharia Elétrica, nível de Mestrado, na Universidade Estadual de Campinas iv em especial à minha esposa Simone, e à minha família, cujos apoios me permitiram chegar até aqui. v AGRADECIMENTOS Ao orientador, Prof. Dr. João Andrade de Carvalho Júnior. Ao co-orientador, Prof. Dr. Heraldo da Silva Couto. Ao professor Dr. Teófilo Miguel de Souza, pelo auxílio recebido. Ao coordenador do projeto Fapesp, Dr. Demétrio Bastos Netto. Ao INPE – Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, pelo apoio institucional. À Vale Soluções em Energia – VSE, por patrocinar a simulação computacional. A todos aqueles que direta ou indiretamente contribuíram para este trabalho. À PETROBRÁS, pelo recebimento do PRÊMIO PETROBRÁS DE TECNOLOGIA EM ENERGIA, Modalidade Doutorado – 2007, cujos recursos contribuíram para a pesquisa. vi Este trabalho contou com o apoio da: FAPESP – através do contrato no 2006/52438-6 (Auxílio à Pesquisa). vii “A paciência é amarga, mas seus frutos são doces” Jean-Jacques Rousseau viii BATISTA, J. C. Micro-geração de Energia Elétrica (Abaixo de 100 kW) Utilizando Turbina Tesla Modificada, 2009. 107f. Tese (Doutorado em Engenharia Mecânica) – Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá. Universidade Estadual Paulista, Guaratinguetá , 2009. RESUMO Este trabalho desenvolve um sistema para gerar energia elétrica com caldeira e turbina, para ocupar um nicho de mercado em que os sistemas a vapor existentes não são economicamente viáveis. O sistema utiliza a turbina Tesla que é compatível para essa faixa e não possui pás, podendo operar com vapor saturado fornecido por uma pequena caldeira consumindo lenha. A micro-geração proposta pode levar energia a milhões de brasileiros no campo, onde se dispõe de algum tipo de biomassa. Apesar do baixo custo da turbina Tesla, por ser de simples construção e compacta, e de suas incontáveis possibilidades de aplicação, se desconhece, até então, aplicações comerciais massivas devido ao baixo torque obtido nos protótipos feitos desde 1910 e por essa razão foi modificada. Este trabalho inova ao desenvolver um protótipo da turbina Tesla modificado para fornecer maior torque e ao comparar à turbina Tesla original. Devido à inexistência de equações que descrevem a turbina Tesla, um modelo matemático que permite projetar a turbina Tesla foi desenvolvido e validado por resultados experimentais e de simulação. Testes comparativos com duas turbinas com as mesmas dimensões mostraram que a turbina Tesla modificada apresentou eficiência superior à turbina Tesla original. Desenvolveu-se, também, um protótipo do sistema para micro-geração utilizando a turbina Tesla modificada, caldeira e gerador elétrico. Os custos do sistema e da energia gerada foram comparados com os de outros meios de geração mostrando serem competitivos economicamente para essa faixa de operação. PALAVRAS-CHAVE: turbina Tesla, turbina a vapor, micro-geração. ix BATISTA, J. C., Electric Energy Micro-generation (below 100 kW) With Modified Tesla Turbine, 2009. 107f. Thesis (Doctorate in Mechanical Engineering) - Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, Guaratinguetá, 2009. ABSTRACT This work develops a system to generate electric power with boiler and turbine that aims to occupy the niche of the market for which steam systems are not economically viable. The system uses a Tesla turbine, which is compatible to the range of power. Also, it does not have blades, being able to operate with steam delivered by a small boiler fed with wood. The proposed micro-generation system can take energy to millions of Brazilians living in the country, where some type of biomass is available. In despite of the low cost of the Tesla turbine, because it is compact and simple to build, and despite of its uncountable possibilities of applications, massive commercial applications of the technology are not found due to the low torque of the prototypes built since 1910. For this reason, the Tesla turbine was modified. This work is original since it develops a modified Tesla turbine prototype to furnish a higher torque when compared to an original Tesla turbine. Due to the lack of equations that model a Tesla turbine, a mathematical model was developed to allow the design of the Tesla turbine; it was validated by means of experimental and simulating results. The comparative tests with two turbines, with same dimensions, showed that the modified Tesla turbine presents a higher efficiency than the original Tesla turbine. A micro-generation system, using the modified Tesla turbine, boiler and electric generator, was also developed. The costs of the system and of the generated energy were compared with other means of generation and showed to be commercially competitive for that range KEYWORDS: Tesla turbine, steam turbine, micro-generation. x LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 - Turbina Tesla composta por discos lisos ................................................20 FIGURA 2 - Esquema termodinâmico do sistema .......................................................24 FIGURA 3 - Esquema do sistema com condensador fechado ……………………….25 FIGURA 4 - Diagrama T x s para ciclo de Rankine …………………………………25 FIGURA 5 - Diagrama T x s para ciclo de Rankine do sistema …………………….26 FIGURA 6 - Componentes da turbina Tesla …………………………………………34 FIGURA 7 - Trajetória do fluído na turbina Tesla …………………………………..35 FIGURA 8 - Bocal da Turbina Tesla ………………………………………………...37 FIGURA 9 - Raio interno e externo do disco ………………………………………..40 FIGURA 10 - Desenho da Turbina Tesla projetada ………………………………….46 FIGURA 11 - Desenho do disco “tipo Pelton” da turbina Tesla-Pelton ……………..47 FIGURA 12 - Turbina de impulsão Roda Pelton …………………………………….48 FIGURA 13 - Pá de turbina Pelton com a indicação dos ângulos ………………...…49 FIGURA 14 - Potência hidráulica de uma turbina Pelton em função de 1Vr� ……...50 FIGURA 15 - Rendimento hidráulico de uma turbina Pelton em função 1Vr� ……..51 FIGURA 16 - Geometria do injetor de fluído e dos discos “Pelton” ...........................54 FIGURA 17 - Canais de passagem do fluído entre os discos ......................................54 FIGURA 18 - Malha híbrida ........................................................................................55 FIGURA 19 - Camada de prismas para captura dos efeitos da camada limite ............56 FIGURA 20 - Voluta, rotor, tampa e injetor ................................................................56 FIGURA 21 - Condições de contorno da turbina .........................................................58 FIGURA 22 - Planos de corte 1, 2, 3 e 4 .....................................................................58 FIGURA 23 - Campo de velocidades nos Planos dos discos ......................................59 FIGURA 24 - Campo de velocidades próximo à injeção do fluído ..............................59 FIGURA 25 - Número de Mach nos Planos dos discos ...............................................60 FIGURA 26 - Número de Mach na região de injeção do fluído ..................................60 FIGURA 27 - Pressão nos discos .................................................................................61 FIGURA 28 - Massa específica nos discos ..................................................................61 FIGURA 29 - Temperatura nos discos .........................................................................62 FIGURA 30 - Torque nas cavidades (blades) dos discos .............................................63 xi FIGURA 31 - Torque nas superfícies das extremidades dos discos ............................64 FIGURA 32 - Tampas direita e esquerda ....................................................................65 FIGURA 33 - Vetores de velocidade nos discos .........................................................66 FIGURA 34 - Vetores de velocidade na região de injeção do fluído ..........................67 FIGURA 35 - Sentido de rotação do fluído nas saídas ................................................67 FIGURA 36 - Planos de corte ......................................................................................68 FIGURA 37 - Campos de velocidade nas superfícies externas do rotor ......................68 FIGURA 38 - Número de Mach nas tampas ................................................................69 FIGURA 39 - Temperatura nas tampas .......................................................................69 FIGURA 40 - Regiões de recirculação ........................................................................70 FIGURA 41 - Vista da turbina acoplada ao gerador ....................................................71 FIGURA 42 - Vista da turbina acoplada ao sistema ....................................................72 FIGURA 43 - Vista da caldeira ....................................................................................73 FIGURA 44 - Vista do condensador ............................................................................73 FIGURA 45 - Vista da válvula de controle de pressão ................................................74 FIGURA 46 - Vista do sistema protegido por parede e grade .....................................76 FIGURA 47 - Detalhe da montagem das Turbinas Tesla, Mista e Tesla-Pelton .........77 FIGURA 48 - Sistema de aquisição .............................................................................78 FIGURA 49 - Interface gráfica do Sistema de aquisição .............................................78 FIGURA 50 - Banco de resistências ............................................................................79 FIGURA 51 - Esquema de polias e correias entre a turbina e o gerador .....................80 FIGURA 52 - Gráfico de � Turbina, w� gerador, � Gerador e � Combinado para a turbina Tesla ...82 FIGURA 53 - Gráfico de � Turbina, w� gerador, � Gerador e � Combinado para a Tesla-Pelton ...83 FIGURA 54 - Gráfico entalpia-entropia (h-s) da expansão do vapor em turbina .......84 FIGURA 55 - Sistema para medir o torque da turbina ................................................ 92 FIGURA 56 - Torque medido em uma turbina de 3 discos ......................................... 92 FIGURA 57 - Potência medida em uma turbina de 3 discos ...................................... 93 xii LISTA DE TABELAS TABELA 1 - Rendimento térmico para várias temperaturas e pressões .....................27 TABELA 2 - Poder calorífico, densidade e preço da lenha ........................................31 TABELA 3 - Torque de pressão e viscoso nas concavidades dos discos ....................63 TABELA 4 - Torque de pressão e viscoso nos canais 1 a 5 ........................................64 TABELA 5 - Torque de pressão e viscoso nas superfícies das tampas .......................65 TABELA 6 - Proporção de torque de pressão e viscoso e a potência da turbina ........65 TABELA 7 - Valores de � Turbina, w� gerador, � Gerador e � Combinado para a turbina Tesla .. 82 TABELA 8 - Valores de � Turbina, w� gerador, � Gerador e � Combinado para a Tesla-Pelton ....83 xiii LISTA DE SÍMBOLOS a distância de separação entre placas (m) d distância entre discos (m) CM Torque obtido pelos dois lados do disco (Nm) D diâmetro (m) Def diâmetro efetivo (m) Dext diâmetro externo (m) Dh diâmetro hidráulico (m) Dmáx diâmetro máximo [1] f lam fator de atrito laminar de Darcy [1] h entalpia (J/kg) há entalpia na entrada (J/kg) hb entalpia na saída (J/kg) vazão mássica (kg/s) lenha vazão mássica de lenha (kg/s) vapor vazão mássica de vapor (kg/s) n número de espaços consecutivos entre discos da turbina [1] P perímetro molhado [1] Ph potência hidráulica [1] potência do jato [1] pi pressão na entrada da turbina (Pa) po pressão na saída da turbina (Pa) qH calor fornecido pela fonte quente por kilograma de fluído (J/kg) qL calor rejeitado pelo fluído de trabalho por kilograma de fluído (J/kg) lenha calor fornecido pela lenha (J) r raio do disco (m) Re número de Reynolds [1] Red número de Reynolds no duto [1] s entropia (J/ kg K) S área de escoamento (m2) Sext área de escoamento entre discos consecutivos (m2) Sint área interna do disco (m2) T0 torque na face de um disco [1] TH temperatura da fonte quente (oC) Ti temperatura na entrada da turbina (oC) TL temperatura da fonte fria (oC) To temperatura na saída da turbina (oC) m� m � m� jP m� Q� m � xiv TT torque total da turbina [1] V velocidade (m/s) Vi velocidade de injeção (m/s) . U lenha consumo volumétrico de lenha (m3/s) � viscosidade cinemática (m2/s) wb trabalho realizado pela bomba por kilograma de fluído (J/kg) wgerador trabalho realizado pelo gerador (J) gerador taxa de transferência de trabalho no gerador (J/s) winterno trabalho interno (J/s) wLíquido trabalho líquido (J) máx taxa de transferência de trabalho (J/s) Wt trabalho realizado pela turbina (J) ângulo de entrada do jato na pá da roda Pelton [1] ângulo de saída do jato na pá da roda Pelton [1] �hs diferença de entalpia na entrada e saída (kJ/kg) espessura da camada limite (m) �ciclo térmico rendimento do ciclo térmico [1] �combinado rendimento combinado ou global [1] �freio rendimento no freio [1] �g rendimento do gerador [1] rendimento hidráulico [1] �interno rendimento interno [1] �m rendimento de máquina [1] �sistema rendimento do sistema [1] �Sistma Líquido rendimento líquido do sistema [1] �tr rendimento da transmissão [1] � coeficiente de viscosidade dinâmica do fluído [1] � coeficiente de viscosidade cinemática [1] � massa específica do fluído (kg/m3) � velocidade angular (rad/s) � Turbina rotação da turbina (rpm) (rpm) � Gerador rotação do gerador (rpm) (rpm) w� w� � 1� 1� h� 1� 2� xv SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT LISTA DE FIGURAS LISTA DE TABELAS LISTA DE SÍMBOLOS 1. INTRODUÇÃO .....................................................................................................18 1.1 Histórico ................................................................................................................19 1.2 Características da micro-geração e do uso da turbina Tesla ..................................21 1.3 Objetivos ............................................................................................................ ...22 1.4 Desenvolvimento dos capítulos .............................................................................23 2. PROJETO DO CICLO TERMODINÂMICO ...................................................24 2.1 Determinação do modelo termodinâmico ..............................................................24 2.2 Materiais e Métodos ................................................................................................26 2.3 Cálculo do rendimento térmico do sistema ............................................................28 2.3.1 Rendimento com condensação a 100ºC (condensador aberto) ...........................28 2.3.2 Rendimento com condensação a 45ºC (condensador fechado) ..........................30 2.4 Cálculo da quantidade de lenha consumida ...........................................................31 2.4.1 Cálculo da lenha consumida com condensação a 100ºC ....................................31 2.4.2 Cálculo da lenha consumida com condensação a 45ºC ......................................32 3. PROJETO DAS TURBINAS ................................................................................33 3.1 Turbina Tesla .........................................................................................................33 3.1.1 Introdução ...........................................................................................................33 3.1.2 Princípios de operação ........................................................................................35 3.1.3 Projeto da turbina ................................................................................................36 3.1.3.1 Cálculo do bocal ..............................................................................................36 3.1.3.2 Número de Reynolds .......................................................................................38 3.1.3.3 Cálculo da espessura da camada limite ...........................................................39 3.1.3.3.1 Cálculo da espessura da camada limite turbulenta .......................................39 3.1.3.3.2 Cálculo da espessura da camada limite laminar ...........................................40 3.1.3.4 Cálculo do número total de discos ...................................................................41 3.1.3.5 Cálculo do torque total de discos .....................................................................43 3.1.3.5.1 Cálculo do torque total para camada limite turbulenta .................................43 3.1.3.5.2 Cálculo do torque total para camada limite laminar .....................................44 3.1.3.6 Desenho da turbina Tesla projetada .................................................................45 3.2 Turbina Tesla-Pelton ..............................................................................................46 3.2.1 Descrição da turbina Tesla-Pelton ......................................................................46 3.2.2 Princípios de operação da roda Pelton ................................................................48 3.2.3 Potência e potência máxima da roda Pelton .......................................................50 3.2.4 Rendimento e rendimento máximo da roda Pelton .............................................51 3.2.5 Considerações .....................................................................................................52 3.2.6 Estudo computacional do escoamento na turbina Tesla-Pelton ..........................53 3.2.6.1 Introdução ........................................................................................................53 3.2.6.2 Objetivo ............................................................................................................53 3.2.6.3 Modelo computacional .....................................................................................53 3.2.6.3.1 Geometria ......................................................................................................53 xvi 3.2.6.3.2 Malha computacional ....................................................................................55 3.2.6.3.3 Modelo numérico ..........................................................................................57 3.2.6.3.4 Condições de contorno ..................................................................................57 3.2.6.4 Resultados ........................................................................................................58 3.2.6.4.1 Campo de velocidade nos discos ..................................................................59 3.2.6.4.2 Número de Mach nos discos .........................................................................60 3.2.6.4.3 Campo de pressão nos discos ........................................................................61 3.2.6.4.4 Massa específica nos discos ..........................................................................61 3.2.6.4.5 Campo de temperatura nos discos ................................................................62 3.2.6.4.6 Torque ..........................................................................................................63 3.2.6.4.7 Torque e potência total .................................................................................65 3.2.6.4.8 Vetores de velocidade nas superfícies externas do rotor ..............................66 3.2.6.4.9 Campo de velocidade nas superfícies externas do rotor ...............................67 3.2.6.4.10 Número de Mach nas superfícies externas do rotor ....................................68 3.2.6.4.11 Campo de temperatura nas superfícies externas do rotor ...........................69 3.2.6.4.12 Vetores de velocidade nas superfícies externas do rotor ............................69 3.2.6.5 Análise da simulação ........................................................................................70 4. DESCRIÇÃO DO SISTEMA CONSTRUÍDO ...................................................71 4.1 Introdução ..............................................................................................................71 4.2 Componentes do sistema .......................................................................................71 4.3 Controle .................................................................................................................74 4.4 Segurança ...............................................................................................................75 4.5 Operação ................................................................................................................76 4.6 Turbinas tesla e Tesla-Pelton .................................................................................77 5. TESTES DO SISTEMA ........................................................................................78 5.1 Equipamentos para testes .......................................................................................78 5.2 Procedimento de teste ............................................................................................80 5.3 Teste com turbina Tesla .........................................................................................81 5.4 Teste com turbina Tesla-Pelton ..............................................................................82 6. CÁLCULOS DOS RENDIMENTOS DAS TURBINAS E DO SISTEMA .......84 6.1 Rendimento de turbina a vapor ..............................................................................84 6.2 Cálculo do rendimento efetivo da turbina Tesla e do sistema ...............................86 6.2.1 Rendimento térmico ............................................................................................86 6.2.2 Rendimento combinado .......................................................................................87 6.2.3 Rendimento da turbina ........................................................................................87 6.2.4 Rendimento do sistema .......................................................................................87 6.2.4.1 Rendimento do sistema com condensação a 100ºC .........................................87 6.2.4.2 Rendimento do sistema com condensação a 45ºC ...........................................88 6.2.5 Rendimento líquido do sistema ...........................................................................88 6.3 Cálculo do rendimento efetivo da turbina Tesla-Pelton e do sistema ....................88 6.3.1 Rendimento térmico ............................................................................................88 6.3.2 Rendimento combinado ......................................................................................89 6.3.3 Rendimento da turbina ........................................................................................89 6.3.4 Rendimento do sistema .......................................................................................90 6.3.4.1 Rendimento do sistema com condensação a 100ºC .........................................90 6.3.4.2 Rendimento do sistema com condensação a 45ºC ...........................................90 6.3.5 Rendimento líquido do sistema ...........................................................................90 xvii 6.4 Rendimento com co-geração ................................................................................. 91 6.5 Avaliação das perdas do gerador ............................................................................ 91 6.6 Cálculo dos custos do sistema com turbina Tesla-Pelton ...................................... 93 6.6.1 Cálculo do custo do kilowatt-hora produzido .................................................... 93 6.6.2 Cálculo do custo do sistema ................................................................................ 94 6.6.3 Comparações de custos ....................................................................................... 95 7. CONCLUSÕES ...................................................................................................... 97 8. SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS ............................................... 99 REFERÊNCIAS ………………….............................................................................100 APÊNCIDE A: Potência do gerador com polias de 180 e 250 mm .......................103 ANEXO A: Propriedades do vapor saturado .........................................................104 ANEXO B: Especificações da caldeira ....................................................................106 ANEXO C: Rendimento de geradores elétricos ......................................................107 18 1 INTRODUÇÃO Este trabalho consiste no desenvolvimento de um sistema para geração de energia elétrica com caldeira e turbina, que é a forma mais econômica (depois da hidroelétrica), na faixa até 100 kW, para ocupar um nicho de mercado em que os sistemas existentes não são economicamente viáveis. Segundo conclusões das Centrais Elétricas Brasileiras (ELETROBRÁS) (ELETROBRÁS, 2008): “A opção mais econômica para a geração de energia elétrica com queima direta de biomassa, em escala relativamente pequena, seria a utilização do sistema de caldeira e turbina a vapor.... os sistemas de geração elétrica com biomassa baseados em caldeira e turbina a vapor só se tornam viáveis para potências acima de 250kW”. O sistema utiliza a turbina Tesla, cujo custo de produção é baixíssimo e é apropriada para uso na faixa de 100 kW. A turbina Tesla utilizada consiste numa inovação, pois foi modificada para fornecer maior torque, superando tal deficiência das turbinas Tesla. A turbina Tesla modificada ou Tesla-Pelton (patente requerida), incorpora características da turbina de impulsão conhecida como roda Pelton, muito utilizada para produzir energia elétrica em quedas d’água. A turbina Tesla é uma turbina de discos e não apresenta o problema de cavitação que ocorre nas turbinas convencionais de pás, podendo operar com vapor saturado produzido por caldeira movida com biomassa, gás, biodiesel, ou qualquer outro combustível. A utilização de biomassa é importante para levar energia a milhões de brasileiros no campo, onde se dispõe de lenha ou resíduos de produção agrícola como casca de arroz e bagaço de cana. Apenas a casca de arroz corresponde a 1.100.000 toneladas/ano. Tal sistema consiste em micro-geração de energia elétrica com utilização de combustível disponível localmente e consumida onde é gerada, evitando os altos custos de transporte de combustíveis e de linhas de transmissão. A turbina Tesla conhecida também por turbina de discos, foi inventada por Nikola Tesla, em 1910 (TESLA, 1911a, 1911b, 1911c, 1911d; CAIRNS, 2003). Diversas aplicações experimentais foram feitas desde então, citando como exemplos entre outros, turbina a vapor para gerar eletricidade, motor automotivo e compressor. 19 É importante notar que a teoria da camada limite, que alicerça o aspecto científico do funcionamento da turbina Tesla, foi concebida por L. Prandtl na mesma década (SCHLICHTING, 1962). O efeito da adesão e viscosidade aerodinâmica na superfície dos discos da turbina Tesla causa a resistência ao fluxo de vapor ou gás entre os discos, resultando em transferência de energia ao eixo. O vapor ou gás entra pelas extremidades dos discos e passa livremente entre os discos em trajetória espiral e finalmente escapa através da saída de exaustão localizada no centro dos discos. Apesar do seu baixo custo, não há aplicações comerciais massivas devido ao baixo torque obtido nos protótipos feitos desde 1910. Outro fator limitador de seu uso foi à indisponibilidade, até recentemente, de equações que permitissem seu projeto. Utilizou-se neste trabalho equações que auxiliam o projeto da turbina Tesla recentemente publicadas por Couto et al. (2006). Outros trabalhos analíticos sobre a turbina Tesla não foram encontrados na literatura de pesquisa corrente. Trabalhos relacionados com o assunto foram conduzidos por Rice (1965), Adams e Rice (1970), Lawn e Rice (1974), Schmidt (1991), e Rey (2004). Deste trabalho resultaram protótipos da turbina Tesla-Pelton com torque e eficiência superiores à da turbina Tesla original, e o protótipo de um sistema para gerar energia elétrica com caldeira e gerador elétrico que fornece potência de até 5 kW utilizando turbinas com 5 discos de 0,21 m de diâmetro. 1.1 Histórico Nikola Tesla, mais conhecido pela invenção da bobina elétrica e do motor à indução, patenteou em 1913 (TESLA, 1913), na Inglaterra, um compressor e um motor que utilizavam discos rotativos montados em um eixo. Tesla afirmou ser possível a construção de máquinas muito pequenas, mas extremamente poderosas, usando o princípio de discos rotativos (CAIRNS, 2003). As máquinas eram similares e consistiam em uma série de discos finos montados em um eixo e separados por espaçadores, formando um rotor, como se observa na Figura 1. Um invólucro no formato de tubo (com tampas nas extremidades) acondiciona os discos, sem ter contato com os mesmos. Os discos giram com a injeção tangencial de ar 20 ou gás por um bocal. O fluído passa por entre os discos e sai pelas aberturas situadas próximas ao eixo, fazendo-o girar. Figura 1 - Turbina Tesla composta por discos lisos, eixo, encapsulamento e bocal A maior máquina construída foi de 500 kW, movida a vapor com pressão de 5,5 atm, com 60 discos de 1,5 m de diâmetro e rotação de 3.600 rpm. A máquina foi construída pela empresa Allis Chalmers (EUA) em acordo com Nikola Tesla. Após os testes realizados na turbina observou-se o alongamento radial dos discos de aço sob ação centrífuga. Na época, devido ao estado de desenvolvimento da metalurgia, não se dispunha de materiais para a utilização em altas temperaturas e elevadas velocidades de rotação. A falta de recursos inibiu a continuação do desenvolvimento da turbina de discos, pois a empresa concentrou esforços na manufatura e exploração de máquinas do tipo impulsão Curtis e Parsons e máquinas do tipo Reação-Impulsão que estabeleceram o padrão a partir do qual evoluíram as subseqüentes turbinas a vapor, e, mais recentemente, as turbinas a gás. Após a construção das máquinas pela empresa Allis Chalmers, o interesse pelo conceito de motor com discos rotativos de Nikola Tesla diminuiu. Entretanto, mais recentemente, algumas empresas passaram a se interessar pelo princípio para o desenvolvimento de motores e bombas. Com a disponibilidade de ligas mais resistentes à temperatura e à deformação, e a experiência atual na tecnologia de turbinas a gás, tornou-se viável a construção de máquinas práticas, de forma que a turbina de discos 21 rotativos pode vir a prover uma fonte de torque e potência alternativa às máquinas convencionais. 1.2 Características da micro-geração e do uso da turbina Tesla A micro-geração, o uso de biomassa e a turbina Tesla apresentam muitas vantagens, especialmente em áreas rurais, podendo-se citar: � A energia produzida pelo sistema de micro-geração é utilizada no mesmo local em que é produzida, dispensando linhas de transmissão e os custos associados a sua manutenção e perdas por dissipação. � O combustível, lenha (ou outro tipo de biomassa), é normalmente disponível localmente ou pode ser cultivada nas quantidades moderadas requeridas na micro- geração. Economiza-se assim o transporte de combustível ao local de geração. O projeto aqui proposto viabiliza também o aproveitamento de resíduos agrícolas como a casca de arroz e bagaço de cana, desperdiçados em muitos locais. A biomassa é um combustível renovável e apresenta equilíbrio na produção (queima) e na absorção (cultivo) do CO2. � Há milhões de brasileiros no campo sem energia elétrica, mas com disponibilidade de algum tipo de biomassa ou com a possibilidade de cultivá-la nas pequenas quantidades necessárias para seu próprio consumo. � O sistema para geração de energia elétrica com turbina a vapor fornece como subproduto água quente. A água aquecida pode ser utilizada em chuveiros e torneiras, os quais representam, em média, grande parte do consumo energético em uma residência, dispensando o uso de eletricidade para este fim. � Não há grupos geradores que utilizam turbinas a vapor (de forma a permitir o aproveitamento de biomassa) economicamente viáveis abaixo de 100 kW. Segundo estudo da Eletrobrás (2008), sistemas para geração de eletricidade com turbina a vapor só são viáveis economicamente acima de 250 kW. O referido estudo foi feito para o projeto “Ribeirinhas” que visa levar energia elétrica às pequenas comunidades situadas às margens do rio Amazonas. Inclusive, descartou-se a utilização do ciclo Stirling, que também permite o aproveitamento da queima de biomassa, pelo preço excessivo. Praticamente todos os meios 22 existentes para geração de energia elétrica foram considerados e alguns implementados pelo Centro de Pesquisas da Eletrobrás (CEPEL) juntamente com universidades e as conclusões são apresentadas no referido material. Destacando- se o texto a seguir: A opção mais econômica para a geração de energia elétrica com queima direta de biomassa, em escala relativamente pequena, seria a utilização do sistema de caldeira + turbina a vapor. A disponibilidade de pequenas turbinas a vapor a preços razoáveis é relativamente recente, e praticamente tirou o mercado potencial das locomóveis. O problema é que a "pequena escala" referida ainda é muito superior à escala aplicável às comunidades isoladas consideradas no Projeto Ribeirinhas. Neste projeto, contemplam-se comunidades que demandariam no máximo 40kW, ao passo em que a menor turbina a vapor disponível é projetada para até 500kW. Ela pode trabalhar gerando 50kW, mas o consumo de biomassa, o custo da caldeira, dos equipamentos auxiliares e das instalações, não decresceriam na mesma proporção. Operando com 50kW, o consumo de madeira seria de aproximadamente 10kg/kWh. Desta forma, os sistemas de geração elétrica com biomassa baseados em caldeira e turbina a vapor só se tornam viáveis para potências acima de 250kW.(ELETROBRÁS, 2008) (grifos do autor). � A turbina Tesla tem custo de produção baixo e sua manutenção é simples, pois não possui partes móveis (além de seu eixo) e por serem essas fisicamente simples e extremamente compactas, fornecendo a menor relação peso e volume – potência, se comparada às outras máquinas (RICE, 1991). � Neste trabalho é utiliza uma caldeira à lenha, mas é possível utilizar caldeiras operadas a gás ou outro combustível onde estes forem mais convenientes. 1.3 Objetivos Objetivo Principal: � Desenvolver um sistema utilizando uma turbina de baixo custo, comparado às máquinas convencionais, para micro-geração de energia elétrica. Objetivos Complementares: � Desenvolver uma turbina Tesla-Pelton para fornecer mais torque e eficiência do que a turbina Tesla original. � Testar e comparar a eficiência da turbina Tesla desenvolvida com a turbina Tesla original. � Projetar e montar um sistema para produzir energia elétrica com caldeira e gerador elétrico utilizando as turbinas construídas. � Avaliar os custos da energia produzida e do sistema. 23 1.4 Desenvolvimento dos capítulos Este capítulo apresentou o histórico da criação e aplicações da turbina Tesla e descreveu suas características. Abordou as vantagens da micro-geração e do sistema proposto, comparando-o a outros meios disponíveis para gerar energia e apresentou os objetivos desse trabalho. O capítulo 2 apresenta a análise e o projeto do ciclo termodinâmico. O capítulo 3 descreve a teoria que suporta o desenvolvimento da turbina Tesla. Apresenta o projeto das turbinas Tesla e da turbina Tesla-Pelton. Apresenta, também, os resultados da simulação em computador da turbina Tesla-Pelton. O capítulo 4 descreve o sistema construído, seus componentes e os aspectos relativos a controle, segurança e a operação do sistema. Descreve também as turbinas construídas. O capítulo 5 apresenta os resultados dos testes feitos com as turbinas e com o sistema para determinar a potência fornecida e, também, a rotação que as turbinas fornecem a maior potência e eficiência. No capítulo 6 são calculados os rendimentos das turbinas e do sistema. Compara-se o desempenho das turbinas. Determinam-se as vantagens da turbina Tesla-Pelton em relação à turbina Tesla original. Calcula-se o custo do sistema e do kilowatt-hora gerado e compara-se com o de outros sistemas para gerar energia elétrica. No capítulo 7 apresentam-se as conclusões. No capítulo 8 apontam-se sugestões para melhorias do sistema e para novos estudos. 24 2 PROJETO DO CICLO TERMODINÂMICO 2.1 Determinação do modelo termodinâmico O ciclo térmico do sistema Rankine (LEE e SEARS, 1969) é mostrado na Figura 2. Fazem parte do ciclo a caldeira, a turbina, o condensador e a bomba. TURBINA CONDENSADOR T = 100 ºC, P = 100kPaL T = 172 ºC, P = 830kPaH wT Água líquida Vapor saturado wb qH 1 2 3 4 BOMBA qL Figura 2 - Esquema termodinâmico do sistema para geração de energia elétrica O vapor que sai da turbina pode ser condensado em um reservatório aberto (uma caixa d´água) submergindo a ponta de um tubo que recolhe o vapor da saída da turbina. Neste caso, tem-se uma condensação à pressão ambiente. A caixa d´água troca calor com o ambiente e sua temperatura não atinge a temperatura de evaporação, embora alguma evaporação ocorra. O condensador também pode trocar calor com a água de um reservatório através de uma serpentina, de forma a ter um condensador fechado, como mostra a Figura 3. A pressão na saída da turbina então é mais baixa e corresponde a temperatura de condensação. A água no reservatório pode ser resfriada fazendo-a circular por aspersores, causando a perda de calor para o meio ambiente por evaporação e convecção, como em torres de resfriamento. Na eventualidade de haver um rio próximo ao sistema, pode-se circular a água deste para resfriar o condensador. 25 TURBINA BOMBA CALDEIRA CONDENSADOR T = 45 ºC, P = 10kPaL T = 170 ºC, P = 800kPaH RESERVATÓRIO wT TROCADOR DE CALOR Água líquida Àgua líquida Vapor saturado BOMBA wb BOMBA EJETOR Gases não condensáveis q H q L Figura 3 - Esquema do sistema com condensador fechado Em um condensador fechado pode-se ter uma temperatura de condensação de 45ºC (valor prático (LORA et al., 2004)) e cerca de 40ºC no reservatório. A pressão de condensação para a temperatura de 45ºC é 9,6 kPa (Tabelas de vapor d’água (WYLEN e BORGNAKKE, 2003)). O rendimento do ciclo de Rankine depende da temperatura da fonte quente TH e da fonte fria TL. A Figura 4 mostra no diagrama temperatura (T) x entropia (s) as áreas correspondentes ao trabalho produzido pela turbina,W (área 1,2,3,4,5,6,1), o calor perdido na fonte fria, qL (área 1,6,7,8,1) e o calor fornecido pela fonte quente, qH = w + qL. O rendimento do ciclo de Rankine é w/qH (ou a divisão das respectivas áreas no gráfico). T s w qL q H = + w qL TH T L 1 2 3 4 5 6 PA PB 78 Figura 4 - Diagrama T x s (Temperatura x Entropia) para ciclo de Rankine 26 2.2 Materiais e Métodos Um ciclo otimizado para a turbina, operando com vapor saturado, é mostrado na Figura 5. O superaquecimento do vapor mostrado pelo ponto 5 na Figura 4 não é utilizado no projeto por contribuir pouco para o aumento do rendimento e implicar em aumento do custo e em temperaturas elevadas. Para turbinas tipo Tesla é desnecessário superaquecer o vapor para diminuir o efeito de cavitação e erosão da turbina porque não há formação de bolhas de ar na camada limite. T S w q L (TH=172ºC) (T =45ºC)L 1 2 3 4 5 P A = 8 3 0 k P a P B = 1 0 k P a (100ºC) q H L = W + q 0 K 443 K 318 K 373 K (Kelvin) (KJ/kg K) Figura 5 - Diagrama T x s para ciclo de Rankine do sistema A caldeira utilizada produz 220 kg/h (máximo) de vapor saturado à temperatura de 172ºC e pressão de 830 kPa. Esta temperatura e pressão, bastante inferiores àquelas utilizadas em grandes termelétricas, resultam em um rendimento menor. A escolha destes valores, relativamente baixos, visa à obtenção de custos menores de materiais e componentes do sistema, resultando num sistema com preço mais acessível e riscos reduzidos. Avaliou-se que a temperatura de 172ºC e pressão de 830 kPa fornecem boa relação de custo/benefício, como pode ser observado na Figura 5 e ilustrado na Tabela 1 que apresenta rendimentos obtidos para algumas temperaturas TH e respectivas pressões 27 de saturação (em todos os casos considera-se TL = 45 ºC em um condensador fechado à baixa pressão, ver seção 2.2.2): Tabela 1 - Rendimento térmico para várias temperaturas e pressões Rendimento do ciclo termodinâmico Temperatura Pressão Rendimento 152 ºC 500 kPa 23,0% 172 ºC 830 kPa 25,6% 212 ºC 2 MPa 30,3% 311 ºC 10 MPa 36,9% O resfriamento no condensador, da água que sai da turbina, até a temperatura TL de 45ºC aumenta o trabalho produzido, w. Observa-se na Figura 5 que diminuindo TL aumenta a área w, pois diminui a área qL (calor rejeitado no condensador), sem alterar o calor fornecido pela caldeira qH. Desta forma, aumenta-se significativamente o rendimento do ciclo térmico de 15,2% para 25,6% (calculado na seção 2.2). A eficiência do ciclo térmico de 25,6 %, no caso do condensador fechado, significa que é esta a percentagem da energia térmica entregue à caldeira (com a queima da lenha) que será efetivamente fornecida à turbina. A eficiência global do sistema, ou seja, quanta energia elétrica será produzida no gerador para uma determinada quantidade de lenha queimada na caldeira depende, além da eficiência do ciclo térmico, do rendimento da turbina e do rendimento do gerador. As perdas nas tubulações não são significativas. O rendimento da turbina é avaliado no capítulo 6. No cálculo do rendimento global do sistema deve ser somada a contribuição da água quente produzida e que pode ser utilizada em chuveiros e torneiras, pois esta evita a utilização da energia elétrica gerada para esta finalidade. Esta característica é importante uma vez que, em média, a energia gasta nos chuveiros corresponde a mais de 30% do consumo de residências. De forma a simplificar, no protótipo desenvolvido o ciclo foi implementado utilizando a temperatura de condensação a pressão ambiente, ou seja, TL = 100ºC em um condensador aberto. Uma caixa d’água de 1.000 litros foi utilizada como condensador (cuja temperatura não ultrapassou 60oC durante a operação devido às perdas de calor 28 para o ambiente). No entanto, esta implementação resulta no rendimento baixo do ciclo térmico de 15,2%, conforme calculado na seção 2.2.1. O benefício desta implementação é pequeno, pois o calor requerido pela caldeira, qH, é reduzido em menos de 10% em relação à injeção de água na caldeira à temperatura de 45ºC (reduz qH de 2.581 kJ/kg para 2.352 kJ/kg conforme calculado na seção 2.2). Para exemplificar o pouco ganho, a caldeira utilizada neste trabalho tem produção de 170 kg/h de vapor utilizando água à 80ºC e produção de 150kg/h de vapor utilizando água à 20ºC (Anexo B). Embora aumente significativamente o rendimento do ciclo termodinâmico, o condensador fechado não foi utilizado, pois se trata de tecnologia conhecida, não sendo objeto deste trabalho a sua implementação. 2.3 Cálculo do rendimento térmico do sistema 2.3.1 Rendimento com condensação a 100 ºC Calcula-se aqui a eficiência do ciclo térmico para condensação à temperatura de TL = 99,6ºC e pressão de 100 kPa (estado de saturação com condensador aberto). O vapor deixa a caldeira como vapor saturado seco (Título = 1). O esquema termodinâmico foi mostrado na Figura 2. Indica-se por wb o trabalho na bomba por kilograma de fluído que escoa no equipamento e por qL o calor rejeitado pelo fluído de trabalho por kilo de fluído que escoa no equipamento, qH o calor fornecido pela caldeira, wT o trabalho produzido pela turbina, v o volume específico do fluido e x o título. Volume de controle: Bomba. Análise dos estados 1 e 2 (Figura 2): Primeira lei da termodinâmica: wb = h2 – h1 (1) Segunda lei da termodinâmica: s2 = s1 (2) A temperatura no estado 1, T1 = 99,6ºC, corresponde à pressão p1 = 100 kPa para o vapor no estado de saturação e h1 = 417,4 kJ/kg. O volume específico, v, para a água a 29 99,6ºC e 100 kPa é 0,001043 m3/kg. A temperatura no estado 2 é T2 = 99,6ºC e a pressão p2 = 830 kPa. Valores obtidos de tabelas de vapor (WYLEN e BORGNAKKE, 2003). Admitindo-se que o líquido seja incompressível, wb = v . (p2 – p1) = (0,001043).(830 – 100) = 0,761 kJ/kg (3) h2 = h1 +�wb�= 417,4 + 0,761 = 418,2 kJ/kg (4) Volume de controle: Caldeira. Análise dos estados 2 e 3 (Figura 2): Primeira lei: qH = h3 – h2 (5) A temperatura no estado 3, T3 = 172ºC, corresponde à pressão p3 = 830 kPa para o vapor saturado (título 1) e h3 = 2770,6 kJ/kg kPa. Valores obtidos de tabelas de vapor (WYLEN e BORGNAKKE, 2003). qH = h3 – h2 = 2.770,6 – 418,2 = 2.352,4 kJ/kg (6) Volume de controle: Turbina. Análise dos estados 3 e 4 (Figura 2): Primeira lei: wT = h3 – h4 (7) Segunda lei: s3 = s4 = 6,6503 kJ/kg K (8) O valor da entalpia no estado 3 é h3 = 2770,6 kJ/kg. A temperatura no estado 4, T4 = 99,6 ºC, corresponde à pressão p4 = 100 kPa para o vapor no estado de saturação. Neste estado, a entropia do líquido saturado é s4l = 1,3025 kJ/kg K e a diferença entre a entropia do líquido saturado e a entropia do vapor saturado é s4lv = 6,0568 kJ/kg K. A entalpia do líquido saturado é h4l = 417,4 kJ/kg e a diferença entre a entalpia do líquido saturado e a entalpia do vapor saturado é h4lv = 2.258,0 kJ/kg. Valores obtidos de tabelas de vapor (WYLEN e BORGNAKKE, 2003). Pode-se determinar o título no estado 4 a partir da entropia neste estado. Assim, s3 = s4 = 6,6503 = 1,3025 + x4 . 6,0568 � x4 = 0,8829 (9) h4 = 417,4 + (0,8829).(2.258,0) = 2410,9 kJ/kg (10) wT = h3 – h4 = 2.770,6 – 2410,9 = 359,7 kJ/kg (11) Onde wT é a energia térmica por unidade de massa do fluído máxima entregue a turbina. 30 Volume de controle: Condensador. Análise dos estados 1 e 4 (Figura 2): Primeira lei: qL = h4 – h1 (12) qL = h4 – h1 = 2410,9 – 417,4 = 1.993,5 kJ/kg (13) Pode-se agora calcular o rendimento térmico: O rendimento térmico é: �ciclo térmico = wLíquido = qH – qL = wT – wb = 359,7 – 0,8 = 0,152 = 15,2% (14) qH qH qH 2.352,4 Considerando uma vazão mássica m� = 220 kg/h = 0,06111 kg/s (máximo obtido na caldeira utilizada), tem-se a energia térmica máxima entregue à turbina: w� máx = (359,7).(0,06111) = 40,31 kJ/s = 21,93 kW (15) O energia gasta na bomba é: w� b = wb . m� = 0,8 . (0,06111) = 0,049 kJ/s = 49 W (16) A energia entregue a caldeira pela lenha: Q� H = qH . m� = (h3 – h2). m� == (2.352,4).(0,06111) = 143,7 kJ/s = 143,7 kW (17) 2.3.2 Rendimento com condensação a 45 ºC Calcula-se aqui a eficiência do ciclo térmico para condensação à temperatura de 45ºC e pressão de 10 kPa (condensador fechado). O vapor deixa a caldeira como vapor saturado (título 1). O esquema termodinâmico foi mostrado na Figura 3. Volume de controle: Bomba. Análise dos estados 1 e 2: wb = v . (p2 – p1) = 0,001010 . (830 – 9,6) = 0,828 kJ/kg (20) h2 = h1 +�wb�= 188,4 + 0,828 = 189,2 kJ/kg (21) Volume de controle: Caldeira. Análise dos estados 2 e 3: qH = h3 – h2 = 2.770,6 – 189,2 = 2.581,4 kJ/kg (23) Volume de controle: Turbina. Análise dos estados 3 e 4: s3 = s4 = 6,6503 = 0,6386 + x4 . 7,5261 � x4 = 0,7988 (26) 31 h4 = 188,42 + 0,7988 . 2394,8 = 2101,4 kJ/kg (27) wT = h3 – h4 = 2.770,6 – 2110,1 = 660,5 kJ/kg (28) Volume de controle: Condensador. Análise dos estados 1 e 4: qL = h4 – h1 = 2101,4 – 188,4 = 1.913,0 kJ/kg (30) O rendimento térmico é: �ciclo térmico = = wLíquido = qH – qL = wT – wb = 660,5 – 0,8 = 0,256 = 25,6% (31) qH qH qH 2.581,4 A energia térmica máxima entregue à turbina é: w� máx = (660,5) .(0,06111) = 40,31 kJ/s = 40,31 kW (32) O energia gasta na bomba é: w� b = wb . m� = 0,8 . (0,06111) = 0,049 kJ/s = 49 W (33) A energia entregue a caldeira pela lenha é: Q� H = qH . m� = (h3 – h2). m� == 2.581,4 . (0,06111) = 157,8 kJ/s = 157,8 kW (34) 2.4 Cálculo da quantidade de lenha consumida 2.4.1 Cálculo da lenha consumida com condensação a 100 ºC Considerando as propriedades da lenha (LORA et al, 2004)) e preço médio (ESCOLA SUPERIOR DE AGRICULTURA “LUIZ DE QUEIROZ” – USP, 2009), mostrados na Tabela 2. Tabela 2 - Poder calorífico, densidade e preço da lenha 1 Características da lenha Poder calorífico da lenha (pci) 3.300 kcal/kg Densidade da lenha (�) 390 kg/m3 Preço da lenha R$ 40,00/m3 Da equação (17), convertendo em calorias o calor fornecido pela lenha a caldeira: 1 Valor médio em região do estado de São Paulo. Metro cúbico com espaços entre as peças (estere). 32 Q� H = 143,7 kJ/s = 143,7 . 0,239 . 3600 kcal/h = 123.639 kcal/h (35) Da Tabela 5-1, o consumo mássico de lenha para entregar 21,93 kW (equação (15)) à turbina é: m� lenha = 123.639 kcal/h = 37,4 kg/h (36) 3.300 kcal/kg Ou o consumo volumétrico de lenha é: . U lenha/h = 37,4 kg/h � 0,096 m3/h (37) 390 kg/m3 O consumo de lenha por kW de energia produzida pelo sistema depende da eficiência real do sistema, ou seja, deve-se medir a energia efetivamente gerada, a qual é reduzida devido às perdas na turbina, na transmissão (polias e correias) e no gerador. Tal cálculo é apresentado no capítulo 6 e são obtidos a partir dos testes feitos no sistema. 2.4.2 Cálculo da lenha consumida com condensação a 45 ºC Da equação (34), convertendo em calorias o calor fornecido pela lenha a caldeira: Q� H = 157,8 kJ/s = 157,8 kJ/s . 0,239 . 3600 = 135.771 kcal/h (38) Da Tabela 3-2, o consumo mássico de lenha para entregar 40,31 kW (equação (32)) à turbina é: m� lenha = 135.771 kcal/h = 41,1 kg/h (39) 3.300 kcal/kg Ou o consumo volumétrico de lenha é: . U lenha= 41,1 kg/h = 0,105 m3/h (40) 390 kg/m3 33 3 PROJETO DAS TURBINAS Nesta seção são apresentados os conceitos relacionados às turbinas Tesla e Pelton, e são projetadas as turbinas Tesla e Tesla-Pelton para operar a potência de até 5 kW. Também é apresentada a simulação computacional da turbina Tesla-Pelton. 3.1 Turbina Tesla 3.1.1 Introdução As equações de Euler (publicadas em 1775) para o movimento de um fluído não- viscoso contrariavam em muitos casos observações experimentais. Posteriormente o movimento de um fluído viscoso foi completamente descrito pelas equações de Navier-Stokes (desenvolvidas por ambos independentemente, respectivamente em 1827 e 1845). As dificuldades matemáticas para a sua solução (exceto para alguns casos simples) proíbem o tratamento teórico dos escoamentos viscosos. Só recentemente (no final do século 20), com modernos computadores e softwares para simulação de fluídos, as soluções por computador das equações de Navier-Stokes se tornaram comuns. Em 1904 Ludwig Prandtl introduziu o conceito de camada limite. Prandtl mostrou que muitos escoamentos viscosos podem ser analisados dividindo o escoamento em duas regiões, uma perto das fronteiras sólidas (camada limite) e a outra cobrindo o resto do escoamento. Na primeira o efeito da viscosidade é importante e na segunda é desprezível, podendo o fluído ser tratado como não-viscoso. O conceito de camada limite permitiu solucionar analiticamente problemas de escoamentos viscosos que não era possível pela aplicação de equações de Navier-Stokes ao campo completo do escoamento. A camada limite é uma região adjacente a uma superfície sólida na qual tensões viscosas estão presentes. Essas tensões estão presentes porque existe cisalhamento das camadas do fluído, isto é, gradientes de velocidade na camada limite. Tanto a camada limite laminar quanto a turbulenta apresentam tais gradientes. 34 Nikola Tesla em 1910 requereu na Inglaterra uma patente dupla (British Office Number 24001) para uma turbina e um compressor usando discos que giram em um eixo, como mostra a Figura 6. Estas máquinas usam o mesmo princípio e operam de modo similar. Consistem de um conjunto de finos discos paralelos dispostos muito próximos um do outro, com espaçadores entre eles e montados e um eixo, formando um rotor que é colocado em um invólucro cilíndrico (estator). As extremidades do cilindro são fechadas e nelas se encontram os rolamentos que sustentam o eixo. No centro dos discos, próximo ao eixo, há aberturas que permitem a saída do fluído para a atmosfera (ou condensador, dependendo do uso como turbina a gás ou a vapor). Um injetor é disposto tangencialmente na borda da turbina alimentado-a com o fluído de trabalho, que passa entre os discos e saí pelas aberturas de exaustão no centro do disco, como mostra a Figura 6 (CAIRNS, 2003). Figura 6 - Componentes da turbina Tesla A Figura 7 mostra o movimento em forma de espiral que descreve o fluído da entrada até a saída. Em uma turbina real o fluído realiza muitas voltas até sair da turbina. 35 Figura 7 - Trajetória do fluído na turbina Tesla Nas seções seguintes, após uma breve discussão do movimento relativo do fluído nas superfícies dos discos, serão estabelecidas as equações de transporte que descrevem o escoamento entre os discos paralelos que giram, e, também, calculadas a espessura da camada limite sob regime laminar e turbulento, de forma a obter a distância entre discos consecutivos mais apropriada ao projeto. Uma vez definido o fluído de trabalho, as condições de entrada e escolhida a potência de saída requerida, será calculado o número de discos necessários. 3.1.2 Princípios de operação A aderência do fluído à parede do disco (condição de “não-deslizamento”) é o fenômeno básico por trás da turbina Tesla. O disco tende a adquirir a velocidade do fluído escoando sobre ele. Se este fluído é injetado tangencialmente sobre a superfície do disco, então a componente tangencial do vetor velocidade do fluído é zero para o sistema de referência fixo na superfície do disco, movendo com ele, então a única componente da velocidade “vista” neste sistema 36 que influência o escoamento do fluído é a componente de velocidade em direção ao centro do disco, que empurra o fluído em direção às saídas de exaustão próximas ao centro do disco. Mas, para um observador externo, o fluído descreve uma trajetória em espiral sobre a superfície do disco. Assim que o disco adquirir a velocidade do fluído sobre ele, a única velocidade relativa não nula em relação aos discos será a da penetração do fluído entre os discos consecutivos em direção ao centro e será levada em conta para o cálculo do número de Reynolds do projeto (COUTO, 2006). Isto facilita o projeto, embora não seja a condição de operação da turbina. Deve-se observar que quando a extremidade do disco atinge a velocidade do fluído injetado tangencialmente, a velocidade relativa entre fluído e disco é nula, e, portanto, não há forças do fluído sobre o disco e não há realização de trabalho ou potência no eixo. Da mesma forma, se o disco estiver impedido de girar a velocidade relativa entre fluído e disco será máxima e igual à velocidade do fluído, mas também não será realizado trabalho ou potência sobre o eixo. 3.1.3 Projeto da turbina O objetivo do projeto é obter um protótipo de turbina Tesla-Pelton que possa fornecer uma potência de até 5 kW para testar o sistema de micro-geração de energia elétrica com o ciclo térmico projetado no capítulo 2. 3.1.3.1 Cálculo do Bocal A Figura 8 mostra o bocal que injeta o fluído tangencialmente nos discos da turbina Tesla. 37 p ,T 0 0 p,T V 0 V Figura 8 - Bocal da Turbina Tesla Calcula-se nesta seção a área A da saída do bocal para que a velocidade do fluído na saída do bocal seja máxima, ou seja, igual à velocidade do som no fluído. A tubulação de saída da caldeira possui diâmetro de 0,0254m com área A0 = 0,0005067m2. A vazão mássica de vapor é de m� =220kg/h = 0,06111kg/s. A pressão do vapor saturado que sai da caldeira é p0 = 830kPa que corresponde à temperatura T0 = 172oC e � 0 = 4,3029kg/m3 (WYLEN, 2003). Para o cálculo do bocal considera-se o escoamento isentrópico e que a velocidade V0 é desprezível na entrada do bocal (SHAMES, 1962), resultando as relações abaixo: T = 2 0 ]2/)1[(1 Mk T � = 21]2/)140,1[(1 )273172( � K = 370,83K = 97,83 oC (41) onde k = cp/cv = 1,40 é a constante do vapor (Anexo A) para p= 830 kPa e T0 = 172 oC e M = 1 é o número de Mach na saída do bocal. p = )1(2 0 }]2/)1[(1{ �� kkMk p = )140,1(40,12 3 }1]2/)140,1[(1{ 10.830 � � � = 438,47kPa (42) = )1(12 0 }]2/)1[(1{ �� kMk = )140,1(12}1]2/)140,1[(1{ 3029,4 �� = 2,7278 kg/m3 (43) A velocidade do som no fluído na saída do bocal, c, pode ser obtida aproximadamente utilizando a fórmula para gás perfeito (FOX, 2004): c= kRT = )15,273+83,97).(517).(34,1( = 506,0 m/s (44) onde k e R são obtidos da tabela do Anexo A. A velocidade do som no vapor na saída do bocal, c, é melhor obtida da tabela de vapor do Anexo A onde c = 493,3 m/s para a pressão p = 438,7 kPa. Será utilizado o valor aproximado c = 493 m/s. 38 Como a vazão na saída é VAm �� (45) Calcula-se a área da saída do bocal para que o fluído atinja a velocidade do som (V = c): V mA � � = )).(,( , 493732 061110 = 4,54.10-5 m2 (46) Portanto a saída do bocal deve ter área de 4,54.10-5 m2 e sua forma deve ser retangular para distribuir uniformemente o fluído entre os discos. Observação: No protótipo construído a pressão na saída da turbina é atmosférica (condensador aberto), sendo pouco abaixo de 100 kPa, que corresponde à temperatura de evaporação em torno 98oC para a altitude de Cachoeira Paulista, SP, onde foram realizados os experimentos. Pelas equações (41) e (42), para que o vapor esteja saturado na saída do bocal a cerca de 98oC tem-se uma pressão estática de cerca de 100 kPa e uma pressão dinâmica de 338 kPa. Nota-se na equação (41) que se for utilizada uma pressão menor que 830 kPa resulta da mesma forma vapor saturado na saída do bocal, mas o número de Mach será inferior a 1 (para obter a temperatura de 98oC na saída do bocal). Se utilizar um condensador fechado com temperatura e pressão de condensação menores, implica pela equação (42), que será necessária uma pressão (do vapor saturado) menor na entrada do bocal para obter Mach 1 e, consequentemente, maior eficiência no ciclo térmico, pois a caldeira consumirá menos energia, conforme calculado no capítulo 2. 3.1.3.2 Número de Reynolds A teoria estabelece (WHITE, 1979) que o fator de atrito laminar de Darcy, f lam, para escoamentos laminares em dutos é: �.V.d �64. f lam = (47) onde � é a massa específica do fluído, V a velocidade relativa do escoamento, � o coeficiente de viscosidade dinâmico do fluído e d o diâmetro do duto. Ou, 39 d lam Re 64f � (48) onde: Red é o número de Reynolds baseado no diâmetro do duto como comprimento característico. A distância característica do escoamento entre discos consecutivos é P 4SDh � (49) onde Dh é o diâmetro hidráulico, S é a área do escoamento e P o perímetro molhado. Assim, Deff, o diâmetro efetivo, pode ser escrito como heff D 3 2D � (50) A teoria tem precisão razoável quando se usa o diâmetro hidráulico sendo muito precisa para o diâmetro efetivo. Usando na equação (49) o valor a como a distância de separação entre os discos da turbina, vem: a)extD.(�2 a.extD.�4. hD + = (51) onde Dext é o diâmetro externo do disco. Assim, como a << Dext, resulta D h = 2a D eff = 4 a (52) 3 Portanto, o número de Reynolds pode ser escrito como � �.V.a 3 4 Red = (53) 3.1.3.3 Cálculo da espessura da camada limite 3.1.3.3.1 Cálculo da espessura da camada limite turbulenta A Figura 9 mostra o raio interno r e o externo R do disco. 40 r = 0,038m R = 0,105m Figura 9 - Raio interno e externo do disco A espessura da camada limite turbulenta sobre um disco girando pode ser calculada pela seguinte correlação (SCHLICHTING, 1962) 51 2�r r0.526 � � � � �� � (54) 5 1 2 6 105,0 493)038,0( 10.84,21038,0.526,0 � � � � � � � � � � � � � � = 1,59.10-3m (55) onde r é o raio do disco local, é o coeficiente de viscosidade cinemática do fluído (para T = 98oC, Anexo A) e � a velocidade angular. Esta é a espessura máxima que deve ser admitida entre o encapsulamento do disco e o disco, porém entre discos há o desenvolvimento de duas camadas limites, uma para cada disco, portanto, a distância máxima de separação entre discos deverá ser de 2� e dessa forma tem-se: �� 2�máxD (56) ).,.( 3105912=máx�D = 3,18.10-3 m (57) onde D�máx é a distância máxima admitida entre discos. 3.1.3.3.2 Cálculo da espessura da camada limite laminar Impondo que o escoamento deva ser laminar, pode-se usar a seguinte estimativa para a espessura da camada limite laminar (HAYES, 1998) de forma que a partir deste valor pode-se estimar uma distância de separação dos discos apropriada, 41 V D.�.� 5� = 5 493 21,0..10.84,21 6 �� = 0,86.10-3 m (58) onde � é o coeficiente de viscosidade cinemática do fluído de trabalho (para T = 98oC, Anexo A), � D é o comprimento do círculo de raio mais externo e V = Vi = c é a velocidade de injeção. Esta é a espessura máxima que deve ser admitida entre o encapsulamento do disco e o disco, porém entre discos há o desenvolvimento de duas camadas limites, uma para cada disco, portanto, a distância máxima de separação entre discos deverá ser de 2� e dessa forma tem-se: �� 2�máxD (59) 310.86,0.2 ��máxD� = 1,72.10-3 m (60) onde D�máx é a distância máxima admitida entre discos. Dependendo do número de Reynolds tem-se um escoamento laminar ou turbulento. Portanto, deve-se utilizar uma distância entre os discos menor que 1,72.10-3 para aproveitar o efeito de viscosidade da camada limite para gerar torque na turbina. Como a potência da turbina é zero para rotação do disco correspondente a velocidade de injeção do fluído, RV� i /= , a turbina irá operar a uma rotação menor que a máxima e � será maior que o calculado na equação (55). Portanto a distância entre os discos deve ser menor que máxD� de forma a aproveitar todo o efeito da camada limite. Se for utilizada uma distância entre discos bem menor que máxD� , o efeito das forças de cisalhamento sobre o disco será ainda maior, mas não pode ser muito pequeno a ponto de restringir muito a vazão, pois seria necessário utilizar muitos discos para obter a vazão requerida. Também uma distância entre os discos muito pequena é de difícil implementação. Utilizou-se �D 0,7 mm nas turbinas construídas. 3.1.3.4 Cálculo do número total de discos Para estimar o número total de discos para a turbina, utiliza-se o seguinte procedimento: Impõe-se que o escoamento, da entrada na periferia do disco até o sumidouro no centro, seja laminar. Será atribuído um valor de Reynolds na transição entre o escoamento laminar e o turbulento, ou seja, inferior a 2300. A atribuição de um 42 valor para o número de Reynolds facilita o calculo do número de discos, como será visto a seguir, porque não requer os valores de massa específica e velocidade V, que não são conhecidos uma vez que variam da periferia para o centro do disco. A vazão mássica do escoamento na turbina é: �.V.�.D.am =� (61) ou �.�.D m Va � = (62) Então a vazão mássica total, Tm� , pode ser escrita como �.�.D mVna T�= (63) ou �.D�..n m Va T�= (64) onde n é o número de espaços entre discos e carcaça, logo o número de discos é igual a n-1, o que resulta: � �.V.a 3 4 Re = (65) ou � �.Re 4 3 Va = (66) Utilizando-se equações (65) e (66), �.�.D.Re m 3 4 n � = = 2000.21,0.10.22,1..3 06111,0.4 5�� = 5,1 (67) onde n é o número de espaços entre discos consecutivos (com as superfícies laterais do estator incluídas), de forma que o número total de discos requerido será n-1. Utilizou-se no protótipo construído 5 discos ou n = 6, equivalendo a Reynolds = 1687. Quanto menor o valor da distância de separação entre os discos da turbina, a, comparado a largura da camada limite calculada nas equações (54) e (58), maior a restrição ao movimento do fluído, ou seja, maior o efeito da camada limite, mas a distância entre os discos, a, sendo pequena, requer aumento no número de discos e 43 dificulta a implementação física da turbina. Utilizou-se no protótipo mma 7,0� que na equação (64) resulta numa velocidade radial do fluído de cerca de 9 m/s. Quanto à velocidade tangencial do disco, pode-se afirmar que quando a velocidade do disco é zero a potência fornecida pela turbina é zero e quando a velocidade do disco atinge a velocidade de injeção do fluído Vi não há forças exercidas pelo fluído incidindo sobre os discos e, portanto, a potência também é zero. Portanto, para se ter uma referência, será considerado para o cálculo da potência máxima a velocidade do disco Vi/2, mas os testes da turbina mostram que a potência máxima ocorre em uma velocidade menor do disco. 3.1.3.5 Cálculo do torque total dos discos Para o escoamento do fluído na direção radial impõe-se um escoamento laminar por meio da atribuição de um número de Reynolds abaixo de 2300 na equação (67). No entanto, para a componente de velocidade tangencial do fluído não se sabe se o escoamento é laminar ou turbulento, uma vez que � e V variam a medida que o fluído se aproxima do centro do disco. Também há uma desaceleração brusca do fluído ao entrar nos discos devido à distância entre os discos ser bem menor que a largura da camada limite restringindo o perfil de velocidade que teria caso a distância entre os discos fosse grande. Portanto, o torque e a potência serão calculados considerando as duas formas de escoamento, laminar e turbulento. Deve-se observar que as equações utilizadas para o cálculo do torque fornecido por cada disco (equações (68) e (76)) são equações para disco girando livre e não para disco encapsulado como é o caso da turbina Tesla. Utiliza-se tais equações para ter uma referência de projeto quanto à potência fornecida pela turbina, pois não há na literatura equações que permitem calcular o torque fornecido por discos encapsulados. 3.1.3.5.1Cálculo do torque e da potência para a camada limite turbulenta Segundo Schilichting (1962), para o regime turbulento, o torque fornecido pela turbina, para uma face ativa do disco, pode ser calculado por: 44 �� � � � �� 5 1 2 52 0 2 073,0 R RT � � � (68) 5 1 2 6 5 2 0 105,0 105,0 5,246 10.84,21105,0. 105,0 5,246.559,0. 2 073,0 � � � � � � � � � � � � � � � � � � T = 0,0875 Nm onde R é o raio externo do disco; � é a velocidade angular do disco na velocidade do disco de: smV /2532/ � ; =� 1/v 35590=7911= mkg /,,/ e 610.84,21 ��� m2/s são respectivamente a massa específica e a viscosidade cinemática do vapor a temperatura local (T=98oC, Anexo A). A massa específica na saída do bocal calculada na equação (43) é 728,2� kg/m3, mas dentro do disco na temperatura de 98oC é =� 559,0=79,11=�1 kg/m3 como mostra a tabela do Anexo A para vapor saturado. A Torque total é: NmTnTT 875,00875,0).16.(2).1(2 0 ����� (69) A Potência máxima da turbina é: kWWTP T 05,22054 105,0 5,246.875,0 ��� � � � � �� � (70) 3.1.3.5.2 Cálculo do torque e da potência para a camada limite laminar No regime laminar (com o escoamento sendo assumido próximo de incompressível) o torque 2T, obtido pelos 2 lados do disco, pode se escrito como (HAYES, 1998): 52 0 M R�� 2 1 2T C = (71) ou MCRT 52 0 4 1 �� (72) onde 2 1 - M Re3.87C = (73) 45 e � = �R Re 2 (74) Portanto: 2 1 2 52 0 87,3. 4 1 � �� � �� � � � � � � RRT (75) ou NmT 0350,0 10.84,21 5,246.105,0.87,3.105,0. 105,0 5,246.559,0.25,0 2 1 6 5 2 0 ��� � �� � � � � � � � � � � (76) e o torque total pode ser escrito como Nm350,00350,0).16.(21)T(n2T 0T ����� (77) A Potência máxima da turbina é: kWWTP T 81,0821 105,0 5,246.350,0 ��� � � � � �� � (78) Observação: O valor calculado na equação (70) para a potência da turbina é de mesma magnitude do obtido nos testes, como será visto no capítulo 5. 3.1.3.6 Desenho da turbina tesla projetada O protótipo da Turbina Tesla projetado e construído é mostrado nas Figuras 10. Este fornece potência em torno de 5 kW (como será demonstrado nas seções 6.3.3 e 6.3.4) e possui 5 discos lisos de 0,21 m de diâmetro. A Figura 10 mostra os 5 discos montados no eixo, os mancais compostos por rolamentos de esferas. Os rolamentos podem ser refrigerados a óleo ou pode-se utilizar rolamentos engraxados blindados, dispensando refrigeração. 46 1mm 210mm 25mm Óleo Óleo Óleo 3mm VAPOR 25mm VAPORVAPOR VAPOR 1mm Óleo VAPOR Figura 10 - Desenho da turbina Tesla projetada 3.2 Turbina Tesla-Pelton 3.2.1 Descrição da turbina Tesla-Pelton A turbina Tesla-Pelton tem a mesma construção da turbina Tesla mostrada na figura 10, exceto pelos discos que têm ressaltos no formato das pás de uma roda Pelton. A idéia de modificar os discos lisos da turbina Tesla para obter maior torque consiste em juntar as forças de cisalhamento viscoso da camada limite com as forças resultantes da pressão exercida pelo fluído sobre a área de ressaltos colocados sobre os discos. Isto foi feito restringindo a trajetória espiral do movimento do fluído na turbina Tesla, impelindo-o para a saída de escoamento por meio de um obstáculo com geometria similar às pás da Roda Pelton, mostrado na Figura 11. O obstáculo que restringe o movimento do fluído tem o formato de um segmento de elipse ajustado entre a entrada do fluído e a abertura de saída do fluído. A implementação deste obstáculo é feita 47 acrescentando-se aos discos da turbina Tesla original ressaltos em forma de elipse com espessura igual à distância entre os discos calculada na seção 3.1.3.3. Os discos resultantes dessa alteração são denominados aqui por “discos tipo Pelton” e a turbina que utiliza esses discos é chamada de turbina Tesla-Pelton. Os ressaltos em forma de elipse, mostrados nas Figura 11, são colocados apenas em uma das faces do disco e, quando os discos são montados, formam cavidades ou dutos por onde escoa o fluído. Ao montar os discos, o último disco do rotor deve ser fechado com um disco liso em ambas as faces. Assim, a turbina Tesla-Pelton do protótipo montado possui 4 discos tipo Pelton e 1 disco liso igual ao da turbina Tesla original. (A) (B) 210 30 13 67 (C) 48 Figura 11 - Desenho do disco “tipo Pelton” da turbina Tesla-Pelton projetada 3.2.2 Princípios de operação da roda Pelton A turbina de impulsão roda Pelton, mostrada na Figura 12, baseia-se na deflexão do jato de fluído que é impelido pelo bocal em direção às pás da roda móvel, dando origem a uma força tangencial que impulsiona a roda. Figura 12 - Turbina de impulsão Roda Pelton A velocidade absoluta do escoamento V1 é dada pela diferença da velocidade do fluído com a velocidade da pá. 1V = RV �� (79) No estudo do princípio de funcionamento das turbinas de ação tangenciais despreza-se o regime de escoamento variável realmente existente sobre as pás e supõe-se que a ação do jato se faça sentir continuamente sobre uma só pá, situada em posição perpendicular ao jato (mostrada na Figura 12). A aproximação resultante desta hipótese, que corresponde a supor um número infinito de pás no rotor, é bastante satisfatória, dando resultados teóricos bem próximos dos experimentais (VIEIRA, 1971). A força F resultante da ação do jato sobre a pá pode ser obtida através do teorema do Impulso. F = )VV(Q� 21 + (80) 49 Onde 1V é dado pela equação (79) e 2V = � 1V cos 1� cos 2� . Os ângulos 1� e 2� são os ângulos de entrada e de saída do fluído na pá, como mostra o corte transversal de uma pá apresentado na Figura 13. � é o fator de desaceleração sofrido pelo jato em conseqüência da existência da camada limite sobre a superfície da pá. Resulta, assim: F = Q� ( RV �� )(1+ � cos 1� cos 2� ) (81) Figura 13 - Corte transversal de uma pá de turbina Pelton com a indicação dos ângulos de entrada e de saída O torque é: T = F R (82) ou T = Q� V R (1+ � cos 1� cos 2� )( V R� �1 ) (83) ou T = Tmax ( V R� �1 ) (84) A equação (84) mostra não atuar força alguma sobre a pá quando for r� = 1V , e também ser máxima a força e o torque para R� = 0. 50 3.2.3 Potência e potência máxima da roda pelton A potência hidráulica fornecida à roda dada por Ph = T� . Substituindo-se T da equação (83) obtém-se a variação de Ph em função de Vr� : Ph = Q� V 2(1+ � cos 1� cos 2� ) V R� ( V R� �1 ) (85) ou Ph = Pmax V R� ( V R� �1 ) (86) Correspondendo à variação parabólica da Figura 14. A Figura 14 apresenta a curva real obtida experimentalmente (VIEIRA, 1971), variando ligeiramente da curva obtida teoricamente. A potência máxima é atingida praticamente para a condição: V R� = 0,5 (87) Figura 14 - Variação da potência hidráulica em função do coeficiente Vr� , tendo como parâmetro a vazão Q (VIEIRA, 1971) 51 3.2.4 Rendimento e rendimento máximo da roda Pelton O rendimento hidráulico é: h� = j h P P (88) onde Pj é a potência do jato, dada por: jP = 2 2QV� (89) resulta a variação de h� em função de 1Vr� indicada na Figura 15: h� = 2(1+ � cos 1� cos 2� ) V R� ( V R� �1 ) (90) apresentando o valor máximo para: V R� = 0,5 (91) Portanto: h� max= 2 1 (1+ � cos 1� cos 2� ) (92) Para obter um valor de h� max mais elevado é necessário que � , 1� e 2� sejam os maiores possíveis. Um elevado valor de � é obtido com pás bem desenhadas e apresentando superfície bem polida. Figura 15 - Variação do rendimento hidráulico em função do coeficiente 1Vr� (VIEIRA, 1971) 52 3.2.5 Considerações No disco tipo Pelton, mostrado na Figura 11, tem-se 1� = 21º e 2� =8º. O raio do disco é R = 0,105m, a massa específica do fluído na saída do bocal é � =2,728 kg/m3 e a velocidade de injeção do fluído é V=493m/s. Das equações 85 e 92 e considerando Vr� =0,5, resulta: Ph = Q� V 2(1+ � cos 1� cos 2� ) V R� ( V R� �1 ) � (93) �� � )5,01(5,0)].8cos()21cos(1[5,246.06111,0.728,2 2 oo hP � Ph = 2532(1+0,92� ) (94) O efeito da camada limite é muito forte, fazendo o fluído sair com velocidade mais baixa, ou seja � < 1. Portanto Ph > 2532 e Ph << 2532(1+0,92) No capítulo 3 observa-se nos gráficos de velocidade e massa específica que a velocidade é pequena na saída, e: h� max= 2 1 (1+ 0,92� ) = 0,5 + 0,46� (95) � < 1, portanto h� max > 0,5 e h� max << 0,96 Os dados da simulação em computador do funcionamento da turbina Tesla-Pelton são apresentados na seção 3.2.6. Esses mostram que o torque resultante da pressão exercida pelo fluído sobre a área dos obstáculos em forma de elipse é muito predominante em relação ao fornecido pelo ocasionado pela tensão de cisalhamento na camada limite, de forma que o comportamento da turbina Tesla-Pelton é semelhante ao de uma roda Pelton. 53 3.2.6 Estudo computacional do escoamento no interior de uma turbina Tesla-Pelton 3.2.6.1 Introdução A simulação da turbina Tesla Pelton apresentada nesta seção foi encomendada e cedida gentilmente pela empresa Vale Soluções em Energia – VSE e realizada pela empresa Engineering Simulation and Scientific Software - ESSS. 3.2.6.2 Objetivo Os objetivos desta simulação são: � Compreender e avaliar as principais características do escoamento no interior de uma turbina Tesla-Pelton. � Descobrir qual a proporção entre o torque resultante da força de pressão sobre as áreas das cavidades em forma de elipse (chamado nesta secção de “torque de pressão”) e o torque causado pela força de cizalhamento na camada limite que se desenvolve nas paredes dos discos (chamado nesta seção de “torque viscoso”), de forma a avaliar a contribuição dos obstáculos em forma de elipse implementados sobre os discos para o aumento do torque da turbina. � Verificar se a turbina apresenta o comportamento esperado. 3.2.6.3 Modelo computacional Para este estudo, foi implementado um modelo de CFD (Computer Fluid Dynamics) para o escoamento no interior de uma turbina Tesla-Pelton. 3.2.6.3.1 Geometria A Figura 16 mostra a geometria do injetor de fluído e dos discos “tipo Pelton”. 54 Figura 16 - Geometria do injetor de fluído e dos discos “Pelton” A Figura 17 mostra os canais de passagem do fluído entre os discos. Figura 17 - Canais de passagem do fluído entre os discos 4 Canais de passagem 55 3.2.6.3.2 Malha computacional A Figura 18 mostra a malha híbrida (hexa + tetra + prisma) utilizada, com aproximadamente 10.000.000 de nós. (A) (B) (C) Figura 18 - Malha híbrida (hexa + tetra + prisma), com aproximadamente 10.000.000 de nós 56 A Figura 19 mostra a camada de prismas para captura dos efeitos da camada limite. Figura 19 - Camada de prismas para captura dos efeitos da camada limite A Figura 20 mostra a voluta, rotor, tampa e injetor. Figura 20 - Voluta, rotor, tampa e injetor Camada de prismas: capturar os efeitos de camada limite Voluta Rotor Domínio Completo � 57 3.2.6.3.3 Modelo numérico utilizado • Aproximações: – 1 Domínio Rotativo: Rotor • Frozen Rotor – 1 Domínio Estacionário: Voluta – Escoamento em regime permanente – Compressível – Turbulento • Propriedades do fluido – Vapor d’água: – Viscosidade: 12.0e-06 [kg m^-1 s^-1] – Condutividade Térmica: 0.024 [W m^-1 K^-1] – Calor específico à pressão constante: 2029.0 [J kg^-1 K^-1] • Dados numéricos: – Solver: ANSYS CFX-11 – Discretização dos termos advectivos: • High Resolution – Critério de Convergência: < 1e-05 RMS 3.2.6.3.4 Condições de contorno A Figura 21 apresenta as condições de contorno da turbina, ou seja: (A) Entrada – Pressão Prescrita: 7.16 atm Saídas – Vazão Prescrita: 0.061 kg/s Rotação: 20000 rpm Temperatura = 165°C 58 (B) Figura 21 - Condições de contorno da turbina 3.2.6.4 Resultados Os resultados são apresentados para os planos de corte mostrados na Figura 22. A turbina possui 5 discos com 4 entradas de fluído entre eles. Considera-se os planos mostrados na figura para analisar o que ocorre entre os discos. Figura 22 - Planos de corte 1, 2, 3 e 4 Paredes sem deslizamento Caso 2 Caso 3 Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 59 3.2.6.4.1 Campo de velocidade nos discos As Figuras 23 e 24 mostram o campo de velocidades nos discos. A simulação mostra que a velocidade é inferior ao esperado que seria a velocidade do som. Figura 23 - Campo de velocidades nos Planos dos discos (em m/s) Figura 24 - Campo de velocidades próximo à injeção do fluído (em m/s) Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 60 3.2.6.4.2 Número de mach nos discos As Figuras 25 e 26 mostram o número de Mach nos discos. A simulação mostra que a velocidade é inferior ao esperado que seria Mach 1. Figura 25 - Número de Mach nos Planos dos discos Figura 26 - Número de Mach na região de injeção do fluído Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 61 3.2.6.4.3 Campo de pressão nos discos A Figura 27 mostra a pressão nos discos. Esta cai rapidamente quando o fluído entra nas cavidades. Figuras 27 Pressão nos discos (em Pa) 3.2.6.4.4 Massa específica nos discos A Figura 28 mostra a massa específica nos discos. Nota-se que o fluído se distribui uniformemente pelo disco, reduzindo ligeiramente após uma volta do disco. Figuras 28 - Massa específica nos discos (em kg/m3) Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 62 • A massa específica é calculada no ANSYS CFX através da equação de estado para gases ideais: TR ppw ref 0 )( � (96) • Segundo a tabela termodinâmica de água saturada, o volume específico de gás para 167°C (440K) é 0,261 m3/kg, o que equivale a uma massa específica de 3,83 kg/m3, valor próximo ao obtido na região da entrada do estudo apresentado. 3.2.6.4.5 Campo de temperatura nos discos A Figura 29 mostra a temperatura nos discos. A temperatura cai rapidamente junto com a pressão ao percorrer o disco, mantendo-se o estado de saturação do vapor. Figura 29 - Temperatura nos discos (em Kelvin) Plano 1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 63 3.2.6.4.6 Torque A Figura 30 mostra as cavidades (blades) dos discos. A Tabela 3 mostra os torques causado por pressão e o torque causado por tensão de cisalhamento ou “torque viscoso” nas cavidades. Figura 30 - Torque nas cavidades (blades) dos discos Tabela 3 – “Torque de pressão” e “torque viscoso” nas concavidades dos discos (blades) “Torque de pressão” e “torque viscoso” nas concavidades Torque de pressão Torque viscoso Blade 1 -0,1806 N m -0,000562 N m Blade 2 -0,1785 N m -0,000587 N m Blade 3 -0,1738 N m -0,000580 N m Blade 4 -0,1737 N m -0,000545 N m Blade 1 Blade 2 Blade 3 Blade 4 64 A Figura 31 mostra o torque devido à pressão e à tensão de cisalhamento (“viscoso”) nas superfícies das extremidades dos discos. A Tabela 4 mostra o “torque de pressão” e “torque viscoso” nos canais 1 a 5. Figura 31 - Torque nas superfícies das extremidades dos discos. Tabela 4 – “Torque de pressão” e “torque viscoso” nos canais 1 a 5 “Torque de pressão” e “torque viscoso” nos canais Torque de pressão Torque viscoso Canal 1 -0,00757 N m -0,11750 N m Canal 2 -0,00546 N m -0,01175 N m Canal 3 -0,00618 N m -0,00841 N m Canal 4 -0,00568 N m -0,01164 N m Canal 5 -0,00627 N m -0,11850 N m A Figura 32 mostra as tampas e a Tabela 5 o torque devido à pressão e à tensão de cisalhamento (“viscoso”) nas superfícies das tampas. 65 Figura 32 - Tampas direita e esquerda Tabela 5 – “Torque de pressão” e “torque viscoso” nas superfícies das tampas “Torque de pressão” e “torque viscoso” nas tampas Torque de pressão Torque viscoso Tampa direita 0,0000013 N m -0,1187 N m Tampa esquerda 0,0000052 N m -0,1204 N m 3.2.6.4.7 Torque e potência total • O torque total foi calculado somando-se o torque resultante devido às forças de pressão e viscosas para todas as paredes do domínio Rotor; • A Potência foi calculada como sendo. 75.60 2 nTP � � (97) A tabela 6 mostra a proporção de “torque de pressão” e “torque viscoso” e a potência da turbina. O torque na turbina é predominantemente devido a pressão exercida pelo fluído sobre a área das elipes. Tabela 6 - Proporção de “torque de pressão” e “torque viscoso” e a potência da turbina Torque e potência “Torque de pressão” “Torque viscoso” Torque total -0,774 N m 95,2% 4,8% Potência 1,49 kW 66 3.2.6.4.8 Vetores de velocidade nos discos A Figura 33 mostra os vetores de velocidade nos discos. Figura 33 - Vetores de velocidade nos discos. A Figura 34 mostra os vetores de velocidade na região de injeção do fluído. Plano1 Plano 2 Plano 3 Plano 4 Plano1 Plano 2 67 Figura 34 - Vetores de velocidade na região de injeção do fluído. A Figura 35 mostra o sentido de rotação do fluído nas saídas. Figura 35 - Sentido de rotação do fluído nas saídas. 3.2.6.4.9 Campo de velocidade nas superfícies externas do rotor A Figura 36 mostra os planos de corte considerados para apresentar os campos de velocidade nas superfícies externas do rotor. Plano 3 Plano 4 68 Figura 36 - Planos de corte. A Figura 37 mostra os campos de velocidade nas superfícies externas do rotor. Figura 37 - Campos de velocidade nas superfícies externas do rotor. 3.2.6.4.10 Número de mach nas superfícies externas do rotor A Figura 38 mostra o número de Mach nas superfícies externas do rotor. Caso 2 Caso 3 Plano Esquerdo Plano Direito Plano Esq Plano Dir 69 Figura 38 - Número de Mach nas superfícies externas do rotor 3.2.6.4.11 Campo de temperatura nas superfícies externas do rotor A Figura 39 mostra a temperatura nas superfícies externas do rotor. Figura 39 - Temperatura nas superfícies externas do rotor. 3.2.6.4.12 Vetores de velocidade nas superfícies externas do rotor A Figura 40 mostra as regiões de recirculação. A recirculação do fluído, que ocorre entre os discos da extremidade do rotor e as paredes do estator, pode ser evitada utilizando-se mais injetores para distribuir o fluxo em torno dos discos. Plano Esq Plano Dir Plano Esq Plano Dir 70 Figura 40 - Regiões de recirculação. 3.2.6.5 Análise da simulação • Os resultados apresentaram boa distribuição e uniformidade entre os canais da turbina; • A área de restrição na entrada (injetor) promove um aumento significativo de velocidade, porém não é o suficiente para que o escoamento atinja a condição de Mach igual a 1. Em média, o escoamento está atingindo Mach igual a 0,50 na região da entrada; • 95% do torque gerado no rotor é devido aos efeitos de pressão e somente 5% devido aos efeitos viscosos; • Os efeitos viscosos são responsáveis por 0,32% do torque resultante nas pás e 100% nos canais; • As pás são responsáveis por 91,6% do torque na turbina; • Os planos de velocidade próximos às tampas indicam regiões com recirculações; Plano Esq Plano Dir 71 4. DESCRIÇÃO DO SISTEMA CONSTRUÍDO 4.1 Introdução O sistema construído é composto por caldeira à lenha (Anexo B), válvula reguladora de pressão, turbina Tesla ou turbina Tesla-Pelton, um condensador aberto, gerador elétrico e bomba. O condensador fechado não foi implementado. Trata-se de tecnologia conhecida e amplamente utilizada, não sendo objeto deste trabalho sua implementação. As turbinas Tesla e Tesla-Pelton utilizadas nos testes possuem 5 discos de 0,21 m de diâmetro e foram desenvolvidas para produzir até 5 kW nas condições do ciclo térmico utilizado. 4.2 Componentes do sistema A Figura 41 mostra o “rack” com a turbina (ao fundo), a mangueira que conecta a turbina à caldeira (acima), o sistema de transmissão composto por duas correias e uma Figura 41 - Vista da turbina acoplada ao gerador. 72 polia intermediária, o gerador elétrico de 7,5 kVA (à frente), bomba de óleo com tanque de óleo e radiador para refrigerar os mancais da turbina, o coletor de vapor da turbina que leva o vapor ao condensador aberto (caixa d’água à direita). Utilizou-se um gerador elétrico AC fornecido pela NH Geradores (2009) com campo gerado por imãs permanentes. Este gerador não possui regulagem eletrônica de tensão e opera em uma faixa grande de freqüência. Isto permitiu testar a turbina sem o risco de danificar o gerador. A Figura 42 mostra detalhes da montagem da turbina. Óleo flui através dos mancais para refrigerá-lo. Uma caixa lateral conduz o vapor que sai da turbina através de dutos coletores para o condensador. A figura mostra também sensores de temperatura e pressão instalados no duto de coleta de vapor. Figura 42 - Vista da turbina acoplada ao sistema. Utilizou-se uma caldeira à lenha disponível no mercado (Anexo B), mostrada na Figura 43, para gerar o vapor saturado utilizado no Sistema. A caldeira tem capacidade 73 para fornecer até 220 kg de vapor por hora à pressão máxima de 1.200 kPa. Atrás da caldeira encontram-se as paredes de alvenaria que abrigam o sistema. Figura 43 - Vista da caldeira. A Figura 44 mostra a caixa d’água e conexões utilizadas para implementar o condensador que liquefaz o vapor que sai da turbina e retorna à caldeira no estado líquido. Figura 44 - Vista do condensador. 74 4.3 Controle Para um consumo constante de energia, o controle da tensão e freqüência da energia elétrica fornecida pelo gerador elétrico é feito mantendo-se a pressão da saída da caldeira constante. Isto é obtido por meio de uma válvula reguladora de pressão mostrada na Figura 45 (acima, no “by-pass”). A Figura 45 mostra também o medidor de vazão mássica, á esquerda. Figura 45 - Vista da válvula de controle de pressão. A pressão na saída da caldeira oscila 5% sem a válvula reguladora. Então, para estabilizar a pressão, operou-se a caldeira a uma pressão de 1.000 kPa e ajustou-se a válvula reguladora para na pressão desejada, inferior a pressão da caldeira, no caso 830 kPa. Este controle fornece uma precisão maior que 3% na freqüência e tensão, que é suficiente para aplicações em geral. No caso de ser necessária uma precisão maior, como, por exemplo, para alimentar computadores, pode-se utilizar um regulador de tensão que normalmente já são utilizados em residências. Tal controle não é suficiente para gerar energia para injetar em redes de transmissão do sistema Eletrobrás, que requer uma precisão de 0,1%. No entanto, o sistema para micro-geração aqui proposto, a princípio, não tem tal finalidade. 75 Pequenas oscilações no consumo não alteram a freqüência e tensão no gerador devido à inércia do sistema. Uma roda de inércia de cerca de 10 kg e 0,3 m de diâmetro é utilizada para esta finalidade. Se houver mudança brusca no consumo de energia (carga do gerador), a caldeira não responde rapidamente a uma diminuição ou aumento na quantidade de lenha fornecida para adequar a produção de energia à demanda. Um controle eletrônico para esta finalidade não seria apropriado, mesmo com o uso de um alimentador de lenha automático. No caso do aumento do consumo de energia elétrica, a pressão da caldeira cai e, conseqüentemente, a freqüência e tensão do gerador cai. O foguista deve abrir mais a entrada de ar da caldeira, o que faz aumentar as chamas e manter a pressão, ao mesmo tempo em que coloca mais lenha na fornalha. No caso de diminuição da demanda, a pressão da caldeira sobe e, conseqüentemente, a freqüência e tensão do gerador sobe. O foguista deve fechar a entrada de ar o que reduz as chamas e impede que a pressão suba demasiadamente e reduzir a alimentação de lenha. Esta operação do foguista mantém a pressão em torno de 1.000 kPa para que a válvula de segurança opere corretamente mantendo a pressão em 830 kPa. Grandes variações na carga podem ocasionar uma queda ou aumento de tensão acentuada que, no entanto, são toleradas, transitoriamente, por equipamentos elétricos em geral. Para citar um exemplo prático, sistemas com turbina de impulsão roda Pelton, como os fabrica