RESSALVA Atendendo solicitação do(a) autor(a), o texto completo desta dissertação será disponibilizado somente a partir de 25/07/2017. PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS (BIOLOGIA CELULAR E MOLECULAR) ALTERAÇÕES NO CÉREBRO E NO VENTRÍCULO DE ABELHAS Apis mellifera EXPOSTAS AO IMIDACLOPRIDO ALINE FERNANDA CATAE Julho - 2016 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS - RIO CLARO Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas (Biologia Celular e Molecular). ALINE FERNANDA CATAE ALTERAÇÕES NO CÉREBRO E NO VENTRÍCULO DE ABELHAS Apis mellifera EXPOSTAS AO IMIDACLOPRIDO Orientador: Prof. Dr. Osmar Malaspina Co-Orientadora: Dra. Thaisa Cristina Roat Rio Claro 2016 Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas (Biologia Celular e Molecular). Agradecimentos Inicio os agradecimentos pela minha família, que sempre esteve presente em todos os momentos, me apoiando e me dando forças para enfrentar todos os desafios e seguir em frente em busca dos meus objetivos. Agradeço especialmente aos meus pais, Eliana e Carlos, que com muito amor e esforço, batalharam ao longo de todos esses anos para que os meus sonhos pudessem ser alcançados; e ao meu irmão Eduardo, pelo apoio em todas as fases de minha vida. Ao Murilo, meu porto seguro e abrigo, meu melhor amigo e meu amor. Por me ajudar em todos os momentos, por me fazer acreditar que as coisas dariam certo e por tornar meus dias mais felizes. Ao CEIS e ao Departamento de Biologia pelo suporte oferecido e extremamente importante para a realização desse trabalho. À FAPESP, pela concessão da bolsa de estudo e suporte financeiro à pesquisa (Nº Processos: 2014/14070-3; 2012/13370-8; 2012/50197-2). Ao Prof. Dr. Osmar Malaspina, pela orientação desde o meu primeiro ano de faculdade, quando eu ainda dava os meus primeiros passos na ciência. Tenho muito orgulho de poder trabalhar ao seu lado, e agradeço pelos ensinamentos e pelas oportunidades ao longo de todos esses anos (e já são 7 anos!). À Thaisa Cristina Roat, minha co-orientadora e muito mais do que isso! Não tenho nem palavras para descrever o quanto você foi importante nessa minha trajetória, me apoiando em todos os momentos, acreditando e confiando em mim, me ensinando diariamente. Você é muito especial e um grande exemplo pra mim! Obrigada por tudo! À Roberta Cornélio Ferreira Nocelli, que também me acompanha desde o início e está sempre por perto disposta a me ajudar, dar conselhos e discutir resultados. Você foi fundamental para que eu conseguisse chegar até aqui! Ao Laboratório de Biologia Estrutural e Zooquímica, em especial ao Prof. Dr. Mário Sérgio Palma pela colaboração e auxílio com a técnica do MALDI. Agradeço também ao Marcel Pratavieira e à Anally Menegasso por toda a disponibilidade e ajuda. Sem vocês a realização desta pesquisa não teria sido possível. Ao pessoal do LECA, em especial à Pamela, Pri Friol, Hellen, Tati, Jéssica, Adna, Ana, Lucas, Patrícia, Isabella, Gabi, Elisangela, Daiana e Pri Socolowski, pela amizade e companheirismo. É muito bom poder trabalhar com vocês!! Ao Antônio Sérgio Pascon, fundamental para a realização dos experimentos. Sei que não deve ser fácil nos aguentar com tantas coletas imensas e de última hora, por isso, muito obrigada! Agradeço também aos técnicos: Gérson Mello Souza, Antônio Yabuki e Mônika Iamonte por todo apoio e auxílio. À Necis Miranda de Lima, sempre super eficiente, atenciosa e disposta a me ajudar. Agradeço também ao pessoal do CBI 2009 principalmente à Elen e Lais por serem amigas tão especiais e presentes até hoje em minha vida. Às minhas amigas queridas Livinha e Bruna, por estarem sempre por perto, torcendo por mim, ouvindo meus desabafos e angústias e comemorando minhas vitórias. Agradeço a Deus por me dar forças e por permitir que eu realizasse mais esse sonho. RESUMO GERAL As abelhas Apis mellifera se destacam expressivamente no contexto econômico e ecológico pelos produtos apícolas fornecidos como própolis, geleia real, mel, cera e apitoxina, e pela extrema importância que o processo de polinização representa para o equilíbrio dos ecossistemas. Estudos atuais indicam que algumas substâncias sintéticas, utilizadas no controle de pragas na agricultura, podem estar envolvidas em casos de intoxicação de abelhas. Os efeitos desses produtos podem não ser imediatamente notados, mas podem causar sérios efeitos fisiológicos e comportamentais que acabam por comprometer a viabilidade da colônia, de uma maneira geral. Diante do exposto, este trabalho teve como objetivos principais: avaliar a toxicidade oral do imidacloprido para A. mellifera por meio da determinação da concentração letal média (CL50), e analisar os efeitos de uma concentração subletal (CL50/100) no intestino e no cérebro por meio de de microscopia eletrônica de transmissão, bem como na distribuição de proteínas no cérebro, por meio da técnica do MALDI-Imaging. O valor da CL50 estabelecido foi de 1,4651 ng imidacloprido/μL de dieta. A exposição à CL50/100 (0,0146 ng imidacloprido/μL alimento) causou alterações bastante significativas nas células do ventrículo, principalmente a partir do quarto dia de exposição, como redução do tamanho do núcleo, condensação cromatínica, alterações mitocondriais e aumento de vacúolos digestivos e citoplasmáticos. No cérebro, destacaram-se os danos mitocondriais, espaçamento entre as células, núcleos irregulares e dilatação do espaço perinuclear. Essa concentração subletal afetou também a distribuição espacial de diversas proteínas no cérebro de abelhas, envolvidas principalmente com processos de sinapses, suprimento de oxigênio, estresse químico e oxidativo, degeneração neuronal e aprendizado e memória, demonstrando que esse inseticida causa alterações bioquímicas que podem inviabilizar funções neuronais importantes. Palavras-chave: Inseticida. Toxicidade. Ultraestrutura. Espectrometria. Proteína. ABSTRACT The bees Apis mellifera stand out significantly in the economic and ecological context for products supplied as propolis, royal jelly, honey, beeswax and venom, and because the extreme importance that the pollination process is for the equilibrium of ecosystems. Current studies indicate that some synthetic substances used to control pests in agriculture may be involved in cases of intoxication of bees. The effects of these products may not be immediately noticeable, but they can cause serious physiological and behavioral effects that can compromise the viability of the colony. Given the above, this work had as main objectives: to evaluate the oral toxicity of imidacloprid to A. mellifera through the determination of the lethal concentration (LC50), and analyse the effects of a sublethal concentration (LC50/100) in the midgut and brain through transmission electron microscopy as well as the distribution of proteins in the brain, by MALDI-Imaging technique. The LC50 value established to imidacloprid was 1.4651 ng/μL diet. The exposure to LC50/100 (0.0146 ng imidacloprid/μL diet) caused quite significant alterations in ventricular cells, especially after the fourth day of exposure, such as reduction of the size of the nucleus, chromatin condensation, mitochondrial alterations and increased of digestive and cytoplasmic vacuoles. In the brain, it was possible to observe mitochondrial damages, spacing among cells, irregular nuclei and dilation in the perinuclear space. This sublethal concentration also affected the spatial distribution of several proteins in the brains of bees, mainly involved in synapse processes, oxygen supply, chemical and oxidative stress, neuronal degeneration, learning and memory, demonstrating that this insecticide cause biochemical changes that can derail important neuronal functions. Keywords: Insecticide. Toxicity. Ultrastructure. Spectrometry. Proteins. Sumário 1 INTRODUÇÃO GERAL ........................................................................................................................ 8 2 OBJETIVOS .......................................................................................................................................... 13 3 CAPÍTULO 1 ......................................................................................................................................... 14 3.1 RESUMO ............................................................................................................................................ 15 3.2 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 16 3.3 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................................................... 18 3.3.1 MATERIAL BIOLÓGICO ............................................................................................................... 18 3.3.2 COLETA E ACONDICIONAMENTO DAS ABELHAS ................................................................ 18 3.3.3 EXPOSIÇÃO CONTÍNUA À CONCENTRAÇÃO SUBLETAL DO IMIDACLOPRIDO............. 19 3.3.4 BIOENSAIOS DE INTOXICAÇÃO DAS ABELHAS .................................................................... 20 3.3.5 MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE TRANSMISSÃO .................................................................. 20 3.4 RESULTADOS ................................................................................................................................... 21 3.4.1 TOXICIDADE AGUDA ................................................................................................................... 21 3.4.2 MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE TRANSMISSÃO .................................................................. 22 3.4.2.1 VENTRÍCULO .............................................................................................................................. 22 3.4.2.2 CÉREBRO: CÉLULAS DE KENYON DOS CORPOS PEDUNCULADOS .............................. 25 3.5 DISCUSSÃO ....................................................................................................................................... 28 3.6 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................. 32 4 CAPÍTULO 2 ......................................................................................................................................... 35 4.1 RESUMO ............................................................................................................................................ 36 4.2 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 37 4.3 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................................................... 39 4.3.1 EXPOSIÇÃO CONTÍNUA A CONCENTRAÇÃO SUBLETAL DE IMIDACLOPRIDO ............ 39 4.3.2 TÉCNICA DE IMAGEAMENTO QUÍMICO (MALDI-IMAGING) ............................................. 40 4.3.3 IDENTIFICAÇÕES DE PROTEÍNAS ........................................................................................... 42 4.3.4 PROCESSAMENTO DOS DADOS DE IMAGEAMENTO ESPECTRAL ................................... 42 4.3.5 ANÁLISE DAS IMAGENS – CRIAÇÃO DE MAPAS DE CONTORNOS.................................... 43 4.4 RESULTADOS ................................................................................................................................... 45 4.5 DISCUSSÃO ....................................................................................................................................... 61 4.6 REFERÊNCIAS ................................................................................................................................. 71 5 DISCUSSÃO GERAL ........................................................................................................................... 79 6 CONCLUSÕES GERAIS ..................................................................................................................... 81 7 REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 82 8 1 INTRODUÇÃO GERAL A abelha A. mellifera africanizada, introduzida no Brasil em 1839, é resultante de um cruzamento entre Apis mellifera scutellata (originária da África), Apis mellifera mellifera (originária do norte da Europa), Apis mellifera ligustica (originária da Itália e norte da Iugoslávia) e Apis mellifera iberica (provinda da Europa Ocidental) (RUTTNER, 1988). Essa espécie é hoje, uma das mais estudadas, possuindo grande importância econômica pelo fornecimento de produtos apícolas de alto valor agregado tais como, própolis, geleia real, mel, cera e apitoxina (CARVALHO; MARCHINI; ROS, 1999; KEVAN, 1999). Elas se destacam também por sua importância cultural através dos produtos oferecidos com finalidades alimentícia, religiosa, cosmética e medicinal (COSTA-NETO, 1998; RODRIGUES, 2006). As abelhas africanizadas apresentam maior eficiência na coleta de alimentos, maior produtividade de mel, maior eficiência na transmissão de informações e comportamento de forrageamento mais longo durante o dia, quando comparadas às abelhas europeias (KERR et al., 1970; MALASPINA, STORT, 1987). Por utilizarem os recursos florais, especialmente néctar e pólen, como fonte de alimento e energia, as abelhas são extremamente importantes para o processo de polinização de áreas nativas e cultivadas (KEARNS; INOUYE, 1997; NOGUEIRA-NETO, 1997). A polinização é um processo essencial para a reprodução cruzada e consequente manutenção da diversidade nas plantas, aumentando desta maneira, a produtividade de culturas importantes para a alimentação (EARDLEY et al., 2006; KLEIN et al., 2007). Uma pesquisa desenvolvida pela FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) (2015) mostra a eficácia do uso de abelhas no processo de polinização em sete países. No Brasil, as culturas de algodão e tomate foram as que apresentaram suas produtividades aumentadas significativamente pela visita das abelhas. 9 Alguns registros mostram que 73% das espécies vegetais de interesse agrícola mundial são polinizadas pelas abelhas, 19% por moscas, 6,5% por morcegos, 5% por vespas, 5% por besouros, 4% por aves e 4% por borboletas e mariposas (FAO, 2004). Fatores como ampla extensão territorial, variabilidade climática e de flora fazem do Brasil um país de destaque no cenário agrícola, já que, diferentemente dos demais países, as colheitas ocorrem ao longo de praticamente o ano todo (MARCHINI; SODRÉ; MORETI, 2004). As áreas contínuas cultivadas vêm sendo ampliadas a cada dia em busca do aumento na produção agrícola e este crescimento da agricultura tornou-se cada vez mais dependente do uso de agrotóxicos para a eliminação de pragas agrícolas. Como resultado, o consumo anual de inseticidas no Brasil tem sido superior a 300 mil toneladas. Expresso em quantidade de ingrediente ativo, é consumido anualmente no país cerca de 130 mil toneladas, representando um aumento no consumo de inseticidas de 700% nos últimos quarenta anos, enquanto a área agrícola aumentou 78% nesse período (SPADOTTO et al., 2004). O Brasil começou a utilizar os agrotóxicos em grande escala a partir dos anos 70, não havendo neste período, maiores preocupações relacionadas ao seu emprego (EMBRAPA, 2014). Seu uso, nos últimos anos, aumentou de forma expressiva. No cenário mundial, o crescimento desse mercado foi de 93%, enquanto que no Brasil, é estimado um aumento de 190% (CARNEIRO et al., 2012). O consumo na safra de 2010/2011 foi de 936 mil toneladas, movimentando desta maneira, 8,5 bilhões de dólares entre dez empresas líderes desse segmento no país (ANVISA, 2013). Este uso de inseticidas vem provocando diversos impactos sobre o ambiente, gerando resíduos no solo, na água, no ar e nas plantas (FERNÁNDEZ et al., 2001). O fenômeno conhecido como “Colony Collapse Disorder” (CCD) vem sendo alvo de inúmeros trabalhos, pois dados apontados por apicultores indicam perda de até 75% das 10 colônias de A. mellifera (STOKSTAD, 2007; NEUMANN; CARRECK, 2010). Um dos fatores mais apontados como provável causador do CCD relatado por apicultores é o uso indiscriminado de agrotóxicos (CHAUZAT et al., 2006; HO; CUMMINS, 2007; OLDROYD, 2007; YANG et al., 2008). O sumiço de abelhas é um motivo de preocupação também no Brasil, principalmente nas regiões Sudeste e Centro-Oeste. Este fenômeno pode estar relacionado com infecções por protozoários ou fungos e com o intenso uso de inseticidas nas plantações (GUIMARÃES, 2007; WESTIN, 2007). Muitos relatos de apicultores alertam sobre a mortalidade de abelhas. No interior de São Paulo, por exemplo, diversas cidades já apresentam tal problema, como Araras, Boa Esperança do Sul, Brotas, Mogi Mirim, Piracicaba, Pirassununga, Rio Claro, Santa Rita do Passa Quatro, São Carlos e Tabatinga (MALASPINA; SOUZA, 2008). O desmatamento dos habitats naturais das abelhas faz com que essas ampliem suas atividades de forrageamento para áreas agrícolas, o que resulta numa maior exposição aos inseticidas utilizados nas culturas para o controle de insetos-praga (MALASPINA; SILVA- ZACARIN, 2006). Além disso, a deriva ocasionada pelas correntes de vento, que pode levar os agrotóxicos para apiários, meliponários ou colônias silvestres próximos aos locais de aplicação desses compostos, é um fator preocupante para as abelhas (KERR et al., 2001). A EMBRAPA realizou estudos que mostram o alto risco da pulverização aérea, já que esse procedimento é responsável por deixar 32% dos agrotóxicos pulverizados retidos nas plantas, 49% no solo, sendo que 19% sofrem deriva para outras áreas nos arredores do local alvo da aplicação (CHAIM, 2004). Diversos agrotóxicos possuem ação sistêmica, tendo a capacidade de se translocar através da seiva de uma parte da planta para outra, podendo ser detectado em todos os tecidos vegetais (MARICONI, 1983; SCHMUCK et al., 2001; GALLO et al., 2002; BONMATIN et 11 al., 2003). Com base nisto, uma forma de contaminação das abelhas se dá através da presença de ingredientes ativos e de seus metabólitos no pólen e no néctar (SCHMUCK; NAUEN; EBBINGHAUS-KINTSCHER et al., 2003; RORTAIS et al., 2005) As abelhas campeiras, apesar de estarem em contato direto com a área externa à colônia, não são as únicas a se exporem aos inseticidas. Os indivíduos que desenvolvem suas atividades dentro da colmeia, como as larvas, também podem se contaminar ao entrarem em contato com pólen e néctar contaminados com agrotóxicos (RORTAIS et al., 2005). Os efeitos dos agrotóxicos sobre as abelhas, em muitos casos, não são imediatos, já que pequenas doses podem não causar a morte das abelhas, entretanto, podem resultar em mudanças fisiológicas e comportamentais, tais como, desorientação e diminuição da atividade de forrageamento (GUEZ; ZHANG; SRINIVASAN, et al., 2005; van ENGELSDORP; MEIXNER, 2010). Os inseticidas neonicotinoides são neurotóxicos e se destacam dentre os diversos grupos de inseticidas, por serem muito utilizados para o controle de pragas (TOMIZAWA; CASIDA, 2003; ELBERT et al., 2008). Essa classe de inseticidas substituiu os compostos organofosforados e metilcarbamatos, que tiveram seu uso restrito devido à toxicidade em mamíferos e pela diminuição da eficiência dos mesmos no controle de pragas agrícolas (TOMIZAWA; CASIDA, 2003). Os neonicotinoides são agonistas da acetilcolina e ligam-se aos receptores nicotínicos de acetilcolina dos insetos (nAChRs), agindo principalmente nas subunidades α do receptor (BUCKINGHAM et al., 1997), localizados nos neurônios pós-sinápticos (BUCKINGHAM et al., 1997; SUCHAIL; DEBRAUWER; BELZUNCES, et al., 2004). Ao contrário da acetilcolina, que é hidrolisada pela acetilcolinesterase, esse composto não é degradado imediatamente, portanto, os impulsos nervosos são transmitidos de forma contínua e levam a hiperexcitação do sistema nervoso do inseto (GALLO et al., 2002). A afinidade entre os 12 receptores colinérgicos e os neonicotinoides é relativamente maior em insetos do que em mamíferos, tornando-os mais tóxicos para o primeiro grupo (CARVALHO, 2008). Os mais relevantes inseticidas dessa classe são o acetamiprido, o tiametoxam e o imidacloprido (YAMAMOTO; CASIDA, 1999; NAUEN; BRETSCHNEIDER, 2002; TOMIZAWA; CASIDA, 2003). O imidacloprido é amplamente utilizado no Brasil para o controle de pragas aéreas e do solo das culturas de cana-de-açúcar, algodão, café e citrus. Este inseticida, que é conhecido comercialmente como Confidor, Connect, Cropstar, Evidence, Gaucho, Kohinor, Premier, Provado, Warrant e Winner (BRASIL, 2008), é bastante utilizado no tratamento de sementes, do solo e de plantações, matando os insetos via ingestão ou contato. Apresenta alta tendência de sofrer lixiviação e dissipação no ambiente devido sua baixa adsorção em matéria orgânica do solo e elevada suscetibilidade em água (FOSSEN, 2006). A olefina e o 5-hidroxiimidaclopride são alguns dos metabólitos resultantes da degradação desse composto na planta, sendo estes, tóxicos ao sistema nervoso dos insetos (SUCHAIL; GUEZ; BELZUNCES et al., 2001). Seu uso, desde a sua introdução em meados dos anos 90, tem aumentado consideravelmente, sendo considerado atualmente, o inseticida possivelmente mais usado no controle de pragas e doenças agrícolas (FREITAS; PINHEIRO, 2010; BLACQUIÈRE et al., 2012). 81 Este compromentimento demonstra que não houve desintoxicação das células nervosas, já que as proteínas envolvidas neste processo, como a GST e a P450, não apresentaram grandes alterações em suas expressões relativas. Além disso, as HSPs que podem desempenhar papel protetivo nas células frente a diversos fatores estressantes, também não apresentaram alterações na expressão. As alterações referentes à expressão relativa de proteínas foram geralmente observadas nas regiões dos corpos pedunculados, dos lobos ópticos e dos lobos antenais. Tais estruturas estão relacionadas com o processamento de informações no sistema nervoso, captação de estímulos visuais e recepção de estímulos olfatórios, respectivamente. Dessa forma, as alterações promovidas pelo imidacloprido estão relacionadas com prováveis danos na memória, aprendizagem e orientação, o que se confirma pela alteração na expressão de proteínas envolvidas nesses processos (proteína quinase C, Leonardo 14-3-3, actina 5C e transferrina), bem como pelas alterações ultraestruturais observadas nas células de Kenyon dos corpos pedunculados. 6 CONCLUSÕES GERAIS A partir dos resultados obtidos nesse trabalho conclui-se que: - A CL50 do imidacloprido para abelhas A. mellifera africanizada é de 1,46 ng imidacloprido/μL de dieta; - A CL50/100 promoveu alterações ultraestruturais nas células do ventrículo e do cérebro; - A CL50/100 afetou a distribuição de proteínas específicas no cérebro de abelhas indicando presença de estresse químico, alterações no suprimento de oxigênio, em sinapses nervosas, degeneração neuronal e deficiência em processos de aprendizagem e memória; 82 - As regiões dos corpos pedunculados, dos lobos ópticos e dos lobos antenais foram as que mais apresentaram alterações de expressão relativa referentes às proteínas avaliadas, não havendo, entretanto, um padrão de alterações nessas estrututras, mesmo a partir da análise de proteínas pertencentes a um mesmo processo biológico. 7 REFERÊNCIAS ALBERTS, B. et al. 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