Marcella Palhiari Tralli Diversidade de algas verdes em crostas biológicas de solos do cerrado São José do Rio Preto 2015 Marcella Palhiari Tralli Diversidade de algas verdes em crostas biológicas de solo do cerrado Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Microbiologia do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de São José do Rio Preto. Orientador: Prof. Dr. Luis Henrique Zanini Branco Coorientadora: Profª. Drª. Nadia Martins Lemes da Silva São José do Rio Preto 2015 Marcella Palhiari Tralli Diversidade de algas verdes em crostas biológicas de solo do cerrado Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Microbiologia do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de São José do Rio Preto. Comissão Examinadora Prof. Dr. Luis Henrique Zanini Branco UNESP – São José do Rio Preto Orientador Prof. Dr. Orlando Necchi Júnior UNESP – São José do Rio Preto Prof. Dr. Carlos Eduardo de Mattos Bicudo IBt – Instituto de Botânica São José do Rio Preto 2015 AGRADECIMENTOS Agradeço ao meu orientador Luis Henrique Zanini Branco pela oportunidade, paciência, dedicação, ensinamentos e exemplo de postura e profissional durante esses 5 anos em que trabalhamos juntos. Agradeço a minha coorientadora Nadia Martins Lemes da Silva pela amizade, paciência e palavras de conforto quando algo não corria como planejado. Sem vocês, eu não conseguiria. Agradeço, aos meus pais Arthur e Marinelva e à minha irmã Maraysa, pois sem o apoio, carinho e esforço de vocês eu não estaria onde estou. Ao meu noivo e amigo Paulo Vittor, pelo excesso de amor, carinho, compreensão e mimo. Aos meus avós Augusto, Odália e Evanira pelo carinho tão aconchegante nos finais de semana. Aos colegas de laboratório, Douglas, Náthali, Auro, Natalia, Monica, Bruna, pelos cafés, pelas palavras de conforto, amizade e bate-papos, sem vocês seria mais difícil. Agradeço, em especial à Mariéllen, pelas ajudas sempre muito bem vindas e necessárias na elaboração do trabalho. Aos professores Orlando Necchi Júnior e Maria Stella Noll pelos conselhos durante a banca de qualificação. À doutora Janaina Rigonato pelas ajudas nas análises moleculares. À FAPESP pela bolsa de Mestrado (processo 2013/03354-8) concedida para a execução deste trabalho. “Tudo vale a pena se a alma não é pequena” (Fernando Pessoa, 1934) RESUMO As algas verdes representam um grupo bastante diversificado e seus representantes podem ser encontrados em muitos tipos de habitats. Nos solos, as algas verdes, em associação com outros organismos, podem originar as crostas biológicas, uma comunidade considerada relevante nos ecossistemas (especialmente nos áridos e semiáridos). São colonizadores, auxiliando na redução da erosão, estabilizando e melhorando as propriedades físicas e químicas dos solos e também influenciando a germinação de diferentes plantas. O estudo proposto visa o levantamento taxonômico das assembleias de algas verdes encontradas em áreas de cerrado nos estados de São Paulo e Minas Gerais (Parque Estadual Furnas do Bom Jesus e Parque Nacional Serra da Canastra, respectivamente). Também pretende-se realizar a comparação da biota encontrada nos ambientes estudados e a caracterização molecular das espécies mais frequentes. O material coletado foi submetido a exame direto sob microscópio de luz e também a cultivo em meio artificial. Os resultados obtidos baseiam- se nas análises de 40 amostras coletadas em abril de 2013. O levantamento taxonômico resultou em 17 morfotipos, incluídos nas classes Trebouxiophyceae, Chlorophyceae, Ulvophyceae, Klebsormidiophyceae e Conjugatophyceae. Duas identificações foram possíveis apenas até o nível genérico (Chlorococcum sp. e Klebsormidium sp.) devido à ausência dos estágios reprodutivos e uma população não foi identificada devido à inconsistência no conjunto das características observadas. Quatro ocorrências são novos registros para o país. As duas áreas de estudo apresentaram composição florística distinta, havendo apenas seis ocorrências comuns aos dois parques. A maior riqueza específica foi registrada no Parque Nacional da Serra da Canastra, com 14 morfotipos, enquanto no Parque Estadual das Furnas do Bom Jesus foram registradas apenas sete. A análise dos nutrientes, umidade, temperatura e pH mostrou que não se pode correlacionar a ocorrência das espécies a partir de uma variável ambiental em específico, sendo que, possivelmente, dois ou mais fatores agem em conjunto, propiciando a ocorrência de um conjunto diversificado de espécies. Outros parâmetros podem, também, influenciar a composição da flora de um determinado local, tais como o solo, clima e sombreamento. Os estudos moleculares não obtiveram êxito, sendo que a maior dificuldade esteve relacionada com a extração de DNA do material e com a ausência de primers específicos para o grupo. O presente trabalho foi pioneiro na realização de levantamento taxonômico de algas verdes em crostas biológicas no país e, sendo assim, poderá servir de subsídio para futuros estudos com o tema, além de representar uma importante adição ao conhecimento taxonômico das algas verdes do Brasil, especialmente daquelas habitantes de áreas de cerrado. Palavras-chave: Biologia molecular, Cultivo, Taxonomia, Morfologia. ABSTRACT Green algae are a higly diversified group and their representatives can be found in many types of habitats. On soils, green algae, in association with other organisms, may form biologica l crusts, a community considered relevant in some ecosystems (especially in arid and semi-arid environments). They are pioneer in soil systems, helping to reduce erosion by stabilizing and improving the physical and chemical properties of soils and influencing the germination of different plants. This study aims to the taxonomic survey of green algae assemblages found in savannah areas in the states of São Paulo and Minas Gerais. In addition, the comparison of taxonomic compositions of the assemblages from different localities and the molecular characterization of the most frequent species are complementary objetives. The sampled material was directly examined under light microscope and also cultivated on artificial growth media. The results obtained are based on the analyzes of 40 samples collected in April 2013. The taxonomic survey resulted in the finding of 17 morphotypes pertaining to Trebouxiophyceae, Chlorophyceae, Ulvophyceae, Klebsormidiophyceae and Conjugatophyceae. Two out 17 identifications were possible only to the generic level (Chlorococcum sp. and Klebsormidium sp.) due to the absence of reproductive stages. One population was not identified due to the inconsistence of the observed characteristics to identify. Four occurrences are new records for the country. The two study areas showed distinct florist ic composition, with only six occurrences common to both parks. The highest species richness was recorded in the Serra da Canastra National Park, with 14 morphotypes, while in the State Park Furnas do Bom Jesus were recorded only seven. Soil nutrients, moisture, temperature and pH have shown that the occurrence of a species cannot be addressed to a single environmenta l variable, but possibly two or more factors act together, allowing the occurrence of a diverse set of species. Other parameters may also influence the flora composition of a particular location, such as soil, climate and shading. Molecular studies were not successful, mainly due to the difficulties with DNA extraction and due to the absence of specific primers for the group. This work was pionee in the surveying of green algae occurring in biological crusts in Brazil and, in that way, it will be, possibly, useful as background for future studies on the subject, besides of representing an important addition to the taxonomic knowledge of green algae in the Brazil, especially for the savannah area. Keywords: Cultivation, Molecular biology, Morphology, Taxonomy. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 8 2. OBJETIVOS ..................................................................................................................... 11 2.1. OBJETVOS GERAIS ................................................................................................... 11 2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ....................................................................................... 11 3. HIPÓTESES ...................................................................................................................... 11 4. MATERIAL E MÉTODOS .............................................................................................. 12 4.1. ÁREAS DE ESTUDO .................................................................................................. 12 4.2. ATIVIDADES DE COLETA ....................................................................................... 13 4.3. ANÁLISES DAS AMOSTRAS ................................................................................... 14 4.4. PRESERAÇÃO DAS AMOSTRAS E PREPARAÇÃO DOS CULTIVOS................ 16 4.5. ANÁLISES MOLECULARES ..................................................................................... 18 5. RESULTADOS E DISCUSSÕES .................................................................................... 22 5.1. CONDIÇÕES AMBIENTAIS ...................................................................................... 22 5.2. CULTIVOS ARTIFICIAIS E IDENTIFICAÇÕES ..................................................... 27 5.3. LEVANTAMENTO TAXONÔMICO ........................................................................ 30 5.4. ANÁLISES MOLECULARES ..................................................................................... 44 6. CONCLUSÃO..................................................................................................................... 47 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................ 50 8 1. INTRODUÇÃO Nos ambientes terrestres, as algas podem ocupar praticamente todos os tipos de habitats (RINDI, 2007), crescendo em diferentes substratos como rochas, plantas superiores (troncos e folhas) (HOFFMANN, 1989), substratos artificiais e solo (RINDI, 2007). Dentre os grupos de algas encontrados nos ambientes terrestres, as algas verdes estão entre os organismos mais frequentes, sendo inseridas dentro de um grupo monofilético bem suportado, Viridiplantae, onde também inserem-se as plantas terrestres (LEWIS & McCOURT, 2004). Viridiplantae inclui organismos que contêm clorofilas a e b e cloroplastos envoltos por membranas duplas e está dividido em duas grandes linhagens, Chlorophyta e Streptophyta , sendo que as chamadas algas verdes estão distribuídas em ambas. Entre as Chlorophyta estão as algas verdes cujas células dividem-se por formação de ficoplasto durante a citocinese (RINDI et al., 2009) e a divisão abriga três classes bem suportadas filogeneticamente, Chlorophyceae, Trebouxiophyceae e Ulvophyceae, além das prasinófitas, um grupo não monofilét ico (LELIART et al., 2012). Streptophyta, por sua vez, é composta, além das plantas terrestres, pelas algas verdes que formam fragmoplasto durante a citocinese, sendo elas, Charophyceae, Chlorokybophyceae, Coleochaetophyceae, Klebsormidiophyceae, Mesostigmatophyceae e Zygnemophyceae (LELIART et al., 2012). As algas verdes constituem um dos grupos de organismos eucarióticos mais diversos, incluindo desde formas unicelulares até pseudoparenquimatosas (PROSCHOLD & LELIAERT, 2007). Seus membros possuem cloroplastídios envoltos por uma membrana dupla, contendo clorofilas a e b, β-caroteno e xantofilas como pigmentos acessórios (encontrados também nas plantas terrestres), amido como substância de reserva, armazenado dentro dos cloroplastídeos, e as paredes celulares, quando presentes, são compostas de celulose (GRAHAM & WILCOX, 2000). Do ponto de vista taxonômico, são consideradas de difícil interpretação, especialmente aquelas que habitam o ambiente terrestre. Segundo Neustupa & Škaloud (2010), isso se deve à adaptação às condições oferecidas por esse meio, que resultou na convergência morfológica de organismos não relacionados filogeneticamente. Atualmente, são reconhecidas, aproximadamente, 800 espécies de algas verdes em ambientes terrestres e o solo é o substrato mais reportado para esses organismos. No entanto, dados moleculares sugerem que a diversidade genética de algas verdes terrestres é muito maior que a demonstrada pela morfologia (RINDI et al., 2009). O estudo da diversidade dessa flora é dificultado por alguns fatores, como a simplicidade morfológica de muitas dessas algas, resultado da pressão de seleção pelas baixas relações de superfície-volume celulares, tornando- 9 as quase sempre globulares ou elípticas (HOFFMANN, 1989). Sendo assim, a identificação baseada na morfologia necessita de esforços consideráveis para a compreensão de pequenas diferenças entre as estruturas e da variação de formas nas populações (NEUSTUPA & ŠKALOUD, 2010). O grupo das algas verdes é abundante e ubíquo e cujos representantes têm sido registrados já nos primeiros estudos de sistemática, com alguns deles descritos por autores como Linnaeus (1753, 1759), Agardh (1824), Kützing (1843, 1849) e Nägeli (1849). Entretanto, os maiores avanços no estudo de diversidade do grupo ocorreram nos últimos 20 anos, quando os dados moleculares tornaram-se disponíveis (RINDI et al., 2009). Apesar de possuírem uma história evolutiva longínqua, algas verdes de solo são ainda pouco estudadas quando comparadas com outros grupos ou com algas de outros ambientes, principalmente em regiões tropicais (METTING, 1981; RINDI, 2007; RINDI et al., 2009). Segundo Rindi et al. (2009), algumas espécies, definidas com base em análises morfológicas, são consideradas amplamente distribuídas ou mesmo cosmopolitas, como são os casos de Apatococcus lobatus (Chodat) Petersen, Chlorella vulgaris Beyerinck, Desmococcus olivaceus Laundon, Klebsormidium flaccidum Silva, Mattox & Blackwell-Jr, Stichococcus bacillaris Nägeli e Trentepohlia aurea Martius, além de outros gêneros comumente citados, como Chlorococcum Meneghini e Stichococcus Nägeli (JOHANSEN, 1993; FLECHTNER et al., 1998; HU & LIU., 2003). No solo, além das algas verdes, representantes de vários grupos (cianobactérias, xantofíceas, eustigmatofíceas e diatomáceas) são encontrados associados a uma comunidade diversa que também pode incluir fungos, líquens, protistas e invertebrados (LEWIS & FLECHTNER, 2002). Esse crescimento e desenvolvimento conjunto pode constituir as crostas biológicas (CBs), uma comunidade complexa em composição e metabolismo, também chamadas de crostas microbióticas e crostas criptogâmicas (ASHLEY et al., 1985; FLECHTNER et al., 1998; EVANS & JOHANSEN, 1999; JOHANSEN et al., 2001; LI et al., 2003), entre outras denominações. As CBs possuem ampla distribuição geográfica e ambiental (BELNAP, 2006), ocorrendo em todos os biomas do mundo (BÜDEL, 2001), com maior relevância em regiões áridas e semiáridas (JOHANSEN, 1993). Os organismos que as compõem são tolerantes a estresse hídrico e a condições extremas de luz e temperatura, diferentemente da maioria das plantas vasculares (BELNAP et al., 2006). Esses agrupamentos (CBs) têm sido considerados componentes bastante relevantes dos ecossistemas por diversos motivos. Entre outros atributos, são colonizadores iniciais com 10 papéis importantes na ocupação de áreas expostas, onde promovem o desgaste de minerais e criam condições ligeiramente ácidas, devido à produção de ácido carbônico gerado pela fotossíntese (METTING, 1981). Também auxiliam na redução da erosão, diminuindo a quantidade de escoamento de água (BROTHERSON & RUSHFORTH, 1983) e são estabilizadores e melhoradores das propriedades físicas e químicas dos solos (ANANTANI & MARATHE, 1974; FLETCHER & MARTIN, 1998). Também podem influenciar a germinação de sementes de plantas vasculares (STARKS et al., 1981; JOHANSEN et al., 2001; HU et al., 2002). O interesse no papel dessas assembleias na ciclagem de nutrientes e a descoberta de uma microfauna e microflora rica associada têm levado a um número crescente de estudos ecológicos, fisiológicos e taxonômicos (WEST, 1990; LANGE et al., 1992; ST. CLAIR et al., 1993; SCHLESINGER et al., 1996; EVANS & JOHANSEN, 1999; SHEPHERD et al., 2002). Estudos abordando os diferentes componentes biológicos de CBs já foram conduzidos em diversos continentes do mundo, como América do Norte (Estados Unidos e México; ROSENTRETER & BELNAP, 2001), África (África do Sul; ULLMAN & BÜDEL, 2001), Ásia (China; BÜDEL, 2001), Oceania (Austrália; ELDRIDGE, 2001), América do Sul (Venezuela; BÜDEL, 2001). No território brasileiro, o único estudo envolvendo CBs foi realizado em áreas do bioma caatinga, no nordeste do país (BÜDEL, 2001), embora o foco principal tenha sido mais abrangente do que apenas as algas verdes, com ênfase na estrutura da crosta, e os organismos estudados foram briófitas e cianobactérias. Entre os diferentes tipos vegetacionais brasileiros, o bioma cerrado (ou savana) oferece grande potencial para o desenvolvimento de crostas biológicas, devido ao clima tropical sazonal, com inverno seco, e à vegetação lenhosa de porte reduzido encontrada em muitas dessas áreas. Uma parte considerável do território brasileiro (2.036.448 km²) é ocupada por tal bioma, correspondendo a aproximadamente 22% do território nacional (MMA, 2012). Entretanto, apesar da existência dessa área com grande potencial de ocorrência de CBs e, portanto, de algas verdes, nenhum estudo com foco nessas assembleias e nesses organismos foi realizado até o momento. Dessa forma, há uma lacuna no conhecimento da diversidade e ecologia do grupo em CBs e o presente trabalho pretende apresentar a primeira abordagem considerando os tais aspectos. 11 2. OBJETIVOS 2.1. Objetivos gerais O principal objetivo deste projeto foi a realização de levantamento taxonômico das assembleias de algas verdes encontradas nas crostas biológicas de regiões de cerrado. Essa abordagem é importante face à escassez de estudos com algas verdes de solo no território brasileiro, especialmente daquelas ocorrentes em crostas biológicas. Com base nos resultados dos levantamentos, também objetivou-se a comparação da biota encontrada entre os ambientes estudados e a caracterização de parâmetros ambientais sob os quais as diferentes espécies e assembleias de algas verdes ocorrem. 2.2. Objetivos específicos O estudo teve como objetivos específicos os seguintes objetivos: a. Estudar a composição florística das algas verdes em crostas biológicas de cerrado, segundo critérios tradicionais (morfológicos), a partir de amostras de campo e de cultivo artificial; b. Estabelecimento de cultivos artificiais para posterior comparação com material de campo a fim de confirmação e adição de identificações, e para estudos moleculares; c. Realizar estudos moleculares em organismos de interesse, para complementação dos estudos taxonômicos baseados nos critérios tradicionais. d. Fornecer informações sobre os ambientes de ocorrência de espécies e assembleias de algas verdes de crostas biológicas de cerrado, utilizando parâmetros físicos e químicos selecionados. 3. HIPÓTESES Na proposição desse projeto, foram articuladas as seguintes hipóteses: 1- Considerando a grande diversidade de algas verdes em ambientes terrestres, esperou-se que as CBs de áreas do cerrado apresentassem uma elevada riqueza de espécies; 2- Devido à falta de conhecimento dos componentes do grupo das algas verdes de ambientes terrestres, especialmente daqueles ocorrentes em CBs de solos brasileiros, a possibilidade da existência de táxons novos para a ciência ou, pelo menos, de novas ocorrências taxonômicas para o território brasileiro, foi avaliada como provável. 3- Considerando que as espécies de microalgas encontradas no ambiente terrestre são principalmente unicelulares (RINDI et al., 2009), esperou-se nesse projeto encontrar uma maior quantidade de organismos caracterizados por uma morfologia simples. 12 4. MATERIAL E MÉTODOS 4.1. Áreas de estudo As áreas de estudo foram duas regiões de cerrado, situadas nos estados de Minas Gerais (MG) e São Paulo (SP). Em MG, foram amostradas áreas de cerrado no Parque Nacional da Serra da Canastra (PNSC) (20°00’- 20º30’S e 46º15’- 47º00’W), e em SP, no Parque Estadual Furnas do Bom Jesus (PEFBJ) (20°11’- 20º16’S e 47°22’- 47º29’W). O cerrado é um bioma composto por um complexo vegetacional (COUTINHO, 1978; RIZZINI, 1979; EITEN, 1983). Segundo o conceito “floresta – ecótono – campo” (COUTINHO, 1978), o cerrado é composto por duas floras distintas, sendo uma puramente arbustivo-arbórea, predominante nas fisionomias florestais (cerradão), e outra herbáceo- subarbustiva, característica das fisionomias campestres (campo limpo). As fisionomias savânicas, ou seja, as formas intermediárias ou ecótonos (cerrado sensu stricto, campo cerrado e campo sujo), caracterizam-se pela ocorrência de uma flora mista, composta por elementos florestais e campestres (COUTINHO 1978, 2002). Segundo Coutinho (1978), o campo limpo caracteriza-se pela predominância de plantas herbáceas; o campo sujo, pela presença de árvores e arbustos isolados ao longo da paisagem; o cerrado sensu stricto, pela ocorrência de árvores e arbustos, e o cerradão, pela dominância de espécies lenhosas de dossel alto e fechado. O PNSC, criado dia 3 de abril de 1972 (decreto-lei nº 70.355), localiza-se na porção sudoeste do estado de Minas Gerais (Figura 1), nos municípios de São Roque de Minas, Delfinópolis e Sacramento, e apresenta área de 71.525 ha e altitudes entre 800 e 1.496 m, sendo o ponto mais elevado localizado na Serra Brava. O clima predominante no cerrado é o tropical sazonal, de inverno seco. A temperatura média anual fica em torno de 22 e 23º C, sendo que as médias mensais apresentam pequena estacionalidade (IBDF, 1981). As fitofisionomias encontradas são as florestas mesófilas de encosta, capões, cerradão, cerrado, campo cerrado, campo limpo e campo rupestre (IBDF, 2005). A região da cachoeira Casca d`Anta apresenta solos pouco profundos, de textura arenosa, em relevo suavemente ondulado, com um grande bloco de afloramento rochoso, quartzítico (ROMERO & NAKAJIMA, 1999). Nesse trabalho, a coleta de material ocorreu em uma área dominada pelas fitofisionomias campo sujo (20°-17’- 51,2” de latitude, 46º-31’-18,5” de longitude e 1195 m de altitude na transeção A; 20º-17’-53,9” de latitude, 46º-31’-19,2” de longitude e 1189 m de altitude na transeção B), na região da cachoeira Casca d` Anta; sendo as amostras denominadas CA (advindas da transeção A) e CB (transeção B). O PEFBJ, criado em 12 de outubro de 1989 (decreto-lei n.º 30.591), localiza-se no município de Pedregulho, junto à divisa dos estados de Minas Gerais e São Paulo (Figura 1), e 13 possui área total de 2.069,06 ha e altitudes de 635 e 1.035 m (BRANCO et al., 1991). O clima da região é Mesotérmico de inverno seco, com temperaturas variando entre 18 e 32 °C no verão, e entre 3 e 13 °C no inverno (ARAUJO et al., 2009). A região do PEFBJ pode ser incluída no domínio dos chapadões recobertos por cerrados e penetrados por floresta de galeria (AB’SABER, 2005). No parque, a vegetação natural nos topos das chapadas e nas vertentes mais suaves ocupadas por fitofisionomias de cerrado foi quase inteiramente substituída por culturas de café e pastagens, sendo que atualmente essas formações se encontram em regeneração. Por outro lado, as áreas de mais difícil acesso, como as escarpas que delimitam as furnas, mantiveram-se pouco alteradas, apresentando atualmente remanescentes da mata natural, incluindo floresta estacional decidual e semidecidual em manchas descontínuas (BRANCO et al. 1991). Em Furnas, na região de estudo, a predominância é de solo raso ou afloramentos rochosos (ARAUJO et al., 2009). A coleta de material ocorreu em uma área dominada pela fitofisionomia cerrado sensu stricto, (20º-13’-2” de latitude, 47º-26’-38,4” de longitude e 980 m de altitude na transeção A, 20º-12’-58” de latitude, 47º-26’-34,5” de longitude, e 977 m de altitude na transeção B). As amostras coletadas nesse parque foram denominadas FA (transeção A) e FB (transeção B). 4.2. Atividades de coleta As coletas de material biológico, dados de GPS, temperatura e umidade do solo foram realizadas uma vez em cada área. Os dados históricos de precipitação e umidade no período entre 2008 e 2013 de cada parque foram obtidos em banco de dados virtual (INPE, 2015). As amostragens ocorreram entre os dias 24 e 26/04/2013, imediatamente após o término do período chuvoso. Em cada uma das localidades escolhidas foram demarcadas duas transeções (transects) paralelas com 200 m de comprimento, distando 20 m entre si, e registrados dados de posicionamento global e altitude (GPS Garmin E-trex Vista). Ao longo de cada transeção, foram estabelecidos dez pontos de coleta de material (20 m, 40 m, 60 m, 80 m, 100 m, 120 m, 140 m, 160 m, 180 m e 200 m), totalizando 20 pontos de amostragem por parque (Figura 2). A coleta das crostas foi feita inserindo-se a parte inferior de uma placa de Petri (90 mm de diâmetro) invertida no solo, e retirando uma amostra de cerca de 2cm de profundidade (modificado de GUNDLAPALLY & GARCIA-PICHEL, 2006; Figura 3). Separadamente, amostras de solo foram recolhidas em cinco pontos aleatórios, até 5 cm de profundidade, com auxílio de uma pá de jardinagem e desprezando-se a camada superficial (entre 0,5 e 1,0 cm correspondente à região com crescimento das CBs). 14 Figura 1. Localização dos parques Nacional da Serra da Canastra (Minas Gerais) e Estadual Furnas do Bom Jesus (São Paulo). O solo coletado (porção combinada das amostras coletadas nos cinco pontos aleatórios) foi submetido à análise para avaliação da concentração de nutrientes (nitrogênio total, amônio, nitrito, nitrato, potássio, manganês, cálcio, magnésio, fósforo, ferro, zinco) e dos valores de pH. Também foram analisadas as proporções de areia, argila, silte, com a consequente classificação textural do solo. Essas análises foram realizadas em laboratório comercial especializado. Em campo, temperatura e umidade do solo foram tomadas com termohigrômetro (Hanna Instruments), com a finalidade de caracterização ambiental dos locais de coleta. 4.3. Análises das amostras As crostas coletadas para avaliação taxonômica foram analisadas inicialmente sob microscópio estereoscópico para visualização e reconhecimento de morfotipos presentes e, posteriormente, foram observadas sob microscópio fotônico (Olympus BH-2), para estudo morfológico detalhado e identificação dos organismos presentes. Durante essa etapa não houve padronização para a montagem e quantidade de lâminas feitas para cada amostra. 15 Figura 2. Esquema das transeções destacando os pontos de coleta. Figura 3. Coleta de crosta com pá e placa de Petri invertida. Posteriormente, uma avaliação padronizada foi realizada com o objetivo de abranger mais minuciosamente cada amostra obtida. As crostas coletadas e contidas nas placas de Petri foram divididas em quadrantes (Figura 4), sendo feita uma lâmina por quadrante para estudo mais detalhado. Caso não tenha sido possível a visualização de algum caráter morfológico, outras lâminas foram confeccionadas a fim de complementar as informações taxonômicas necessárias. As algas verdes encontradas foram analisadas segundo os critérios taxonômicos aplicáveis ao grupo, consistindo do estudo das características métricas (diâmetro e comprimento celular), morfológica (filamentos ou unicelulares, formato celular, espessura da parede, formato e posição do cloroplasto), presença/ausência de estruturas (pirenoides), e quando possível, visualização dos estágios de reprodução. 16 Figuras 4. Placa contendo CBs divididas em quadrantes. O sistema de classificação utilizado para a apresentação do posicionamento dos táxons inventariados seguiu a proposta de Ettl & Gärtner (1995), que também foi a principal fonte de consulta para realização das identificações e como base para a elaboração das descrições de espécies e de gêneros. O trabalho de Bicudo & Menezes (2006) foi o mais utilizado para descrições de classes e comparação de ocorrências entre espécies aquáticas e terrestres. O banco de dados construído por Guiry & Guiry (2015) também foi consultado, principalmente para comparação morfológica por meio de registros fotográficos e as identificações específicas dos táxons foram baseadas em literatura especializada para taxonomia de algas verdes. Para os táxons inventariados, foram produzidas fotomicrografias para o registro das características taxonômicas relevantes. Nas descrições das espécies foram utilizadas as seguintes abreviações diâm. (diâmetro), compr. (comprimento) e RC/L (relação comprimento/ largura celular). Informações sobre a ocorrência dos táxons encontradas nas transeções também foram incluídas. 4.4. Preservação das amostras e preparação dos cultivos Porções representativas das CBs com os organismos identificados (ou, se possível, espécimes representativos selecionados das amostras) foram fixadas com solução de formaldeído 4% e foram incorporadas ao Herbário SJRP (IBILCE/UNESP – campus de São José do Rio Preto – THIERS, 2015) para testemunho. Para a obtenção dos cultivos, pequenas quantidades de solo com provável colonização de algas verdes (substrato com cor diferenciada) foram inicialmente separadas de cada amostra para inoculação direta. Essa inoculação foi realizada, a partir da visualização em microscópio estereoscópico à medida que as observações para identificações e fotomicrografias eram feitas. Adicionalmente, uma única amostra de solo foi produzida a partir da homogeneização (peneiramento e mistura) de pequenas quantidades de solo (5g) de cada uma das amostras coletadas. Essas amostras homogeneizadas foram mantidas, por 12 horas, em meio de cultivo 17 líquido Bold (NICHOLS, 1973). Posteriormente, porções de sedimento e de sobrenadante das amostras homogeneizadas foram inoculadas em meio de cultura sólido e líquido (Figuras 5-6), buscando-se obter crescimentos de representantes não evidentes visualmente nas amostras coletadas. Cinco placas de Petri, contendo meio de cultura sólido, e cinco tubos de ensaio contendo meio de cultura líquido receberam tais inóculos. Estes foram nomeados CD1, CD2, FUR1, FUR2, sendo que CD e FUR indicam a origem, Canastra e Furnas, respectivamente; já 1 e 2, indicam se a inoculação da mistura de solos foi feita a partir do sobrenadante ou do sedimento, respectivamente. No total, houve em torno de 60 inoculações. O meio de cultivo utilizado foi o de Bold (NICHOLS, 1973), sendo o meio sólido acrescido de 1,5% de agarose. Os inóculos foram acondicionados em estufas incubadoras sob condições controladas de temperatura (23ºC ± 1), irradiância (40μmol de fótons.m-2.s-1) e fotoperíodo (12 horas de luz e 12 horas de escuro) (NEUSTUPA & ŠKALOUD, 2010). Todos os meios utilizados (sólidos ou líquidos; Figuras 7-8), tubos e placas de Petri foram devidamente autoclavados a 120ºC, a 1 atm, durante 20 minutos, para a esterilização dos mesmos. As inoculações e os repiques foram feitos em câmara de fluxo laminar, previamente esterilizada com luz UV por 30 minutos e aplicação de álcool 70% sobre a superfície do trabalho, além da utilização do bico de Bunsen para a esterilização do material usado durante o procedimento. Figuras 5-6. 5. Mistura das amostras com meio de cultura. 6. Porções da mistura inoculadas. Os cultivos que apresentaram crescimentos significativos foram inspecionados periodicamente (cerca de 20 dias) e procedimentos de isolamento foram feitos pelo método de “pescaria”, com auxílio de pipeta tipo Pasteur (capilar estéril manipulado em bico de Bunsen) sob microscópio fotônico invertido (Leica DMIL LED). Nesse procedimento, o capilar foi posicionado na direção da célula de interesse, até que o material de interesse fosse transferido para o interior do capilar (Figura 9). 5 6 18 Figuras 7-8. 7. Meio de cultura sólido. 8. Meio de cultura líquido. O material coletado foi transferido para outra gota de solução tampão esterilizada para lavagem, fazendo limpezas consecutivas (FRÖHLICH & KÖNIG, 2000) e, após três a cinco repetições do procedimento, as células foram armazenadas em tubos de ensaio com meio de cultivo para crescimento das células de interesse. Figura 9. Ilustração do método de pescaria para separação de material de interesse (seg. FRÖHLICH & KÖNIG, 2000). 4.5. Análises moleculares Os estudos moleculares feitos nesse trabalho foram realizados de forma complementa r aos outros parâmetros taxonômicos e envolveram técnicas tradicionais de extração de DNA realizadas a partir de organismos provenientes de cultivo. Após selecionada, as massas (quando filamentos) foram trituradas em homogeneizador de tecidos Precellys™ 24 (Bertin Tecnologies, Bordeaux, França) com duas esferas de aço por tubo, em dois ciclos de 5000 rpm de 20 segundos cada com um intervalo de 20 segundos entre os ciclos; para a ruptura das células e preservação das moléculas de DNA. Para os organismos unicelulares, células foram separadas pela técnica de pescaria (Figura 9), colocadas em um microtubos de 2ml (tipo Eppendorf) com celulase (concentração 4%), durante 12 horas a temperatura de 30ºC. Posteriormente, o material decantado foi pipetado em lâmina e submetidos à técnica de maceração por meio de esfregaço com outra lâmina. O material 7 8 19 macerado foi processado utilizando-se Nucleo Spin Plant II Mini Kitt (Macherey-Nagel) ou DNeasy Plant Mini Kit (Qiagen) para a extração do DNA e, mantido em freezer a - 20°C. Alternativamente, ao invés da maceração, o material pescado foi submetido ao tratamento freeze-thaw, que consistiu de sete ciclos de congelamento (com nitrogênio líquido) e aquecimento a temperatura de 65°C (SUNNOTEL et al., 2006), em banho-maria. Esse processo teve a finalidade de romper ou desestabilizar a parede celular e, assim, facilitar a exposição do material genético para as reações de PCR. A partir do material genético extraído, foram feitas tentativas de amplificações dos genes da subunidade menor do ribossomo (SSU), subunidade maior da Rubisco (rbcL), amplicon de plastídeo universal (UPA) e fator de elongação (tufA). Diferentes oligonucleotídeos iniciadores (primers) encontrados na literatura foram testados (Tabela 1), e a reação de PCR (Polymerase Chain Reaction) foi realizada usando os kits de PCR KAPA Taq (KapaBiosytems) e Platinum Taq DNA Polimerase (Life Technologies), com a reação final contendo 25 µL. As reações foram feitas em termocicladores Techgene TC-312 e TC-512 (Techne, Burlington, Reino Unido) e foram utilizados os seguintes programas de temperatura para os ciclos da reação de PCR: - SSU 1: 96ºC por 3 minutos (desnaturação inicial); 35 ciclos: 95ºC por 1 minuto (desnaturação); 52ºC por 30 segundos (anelamento); 72ºC por 3 minutos (extensão); 72ºC por 3 minutos (extensão final); 4ºC (armazenamento), adaptado de Shoup & Lewis (2003); - SSU 2: 94°C por 4 minutos (desnaturação inicial); 35 ciclos: 94°C por 30 segundos (desnaturação); 55°C por 30 segundos (anelamento); 72°C por 2 minutos (extensão); 72°C por 6 minutos (extensão final); 4°C (armazenamento), adaptado de Rindi et al. (2009); - rbcL: 95°C por 5 min (desnaturação inicial); 40 ciclos: 95°C por 1 min (desnaturação); 50°C por 1 min (anelamento); 72°C por 1 min (extensão); 72°C por 7 min (extensão final); 4°C (armazenamento), adaptado de Rindi et al. (2009); - UPA: 94oC por 2 minutos (desnaturação inicial); 35 ciclos: 94oC por 20 segundos (desnaturação); 55oC por 30 segundos (anelamento); 72oC por 30 segundos (extensão); 72oC por 10 minutos (extensão final) e 4oC (armazenamento), conforme Sherwood & Presting (2007); - tufA: 94oC por 1 minuto (desnaturação inicial); 38 ciclos: 94oC por 1 minuto (desnaturação); 54oC por 30 segundos (anelamento); 72oC por 2 minutos e 15 segundos (extensão); 72oC por 7 minutos (extensão final) e 4oC (armazenamento), adaptado de Saunders & Kucera (2010). 20 Os produtos de PCR foram analisados em gel de agarose 0,7% (70mg de agarose em 100 ml da solução-tampão TBE - tris-borato-EDTA) e as bandas geradas foram comparadas com marcador de tamanho “1 Kb DNA ladder” (Gibco, Gaithersburg, E.U.A.), pela visualização sob luz UV em transiluminador. Os produtos de PCR, com concentração de 40ng/μl, foram submetidos a reação de sequenciamento usando Big Dye Terminator versão 3.0 (Applied Biosystems). 21 Tabela 1. Primers utilizados nesse estudo. Gene Primer Orientação Sequencia Referência SSU 45f Forward GCCATGCATGTCTAAGTA SHOUP & LEWIS, 2003 1243r Reverse AGAGCTCTCAATCTGTCA SHOUP & LEWIS, 2003 PCRA Forward AACCTGGTTGATCCTGCCAGT MEDLIN et al., 1988 PCRB Reverse TGATCCTTCTGCAGGTTCACCTAC MEDLIN et al., 1988 rbcL RH1 Forward ATGTCACCACAAACAGAAACTAAGC ZURAWSKI & CLEGG, 1987 rbcLQ Reverse GATCTCCTTCCATACTTCACAAGC ZECHMAN, 2003 UPA p23Sr_fl Forward GGACAGAAAGACCCTATGAA SHERWOOD & PRESTING, 2007 p23SrV_rl Reverse TCAGCCTGTTATCCCTAGAG SHERWOOD & PRESTING, 2007 tufA tufAF Forward GGNGCNGCNCAAATGGAYGG SAUNDERS & KUCERA, 2010 tufAR Reverse CCTTCNCGAATMGCRAAWCGC SAUNDERS & KUCERA, 2010 22 5. RESULTADOS E DISCUSSÕES 5.1. Condições ambientais Os dados históricos de precipitação e umidade no período entre 2008 e 2013 (INPE, 2015) para as regiões amostradas, mostram uma grande variação nos períodos seco e chuvoso (Tabela 2). No período seco, que corresponde aos meses de junho a agosto, a região de Canastra apresentou menor precipitação e maior umidade, quando comparada com a região de Furnas. Diferentemente, as duas regiões apresentaram valores semelhantes de precipitação e umidade no período chuvoso, que corresponde aos meses de novembro a janeiro. Tabela 2. Precipitação média (PR; mm) e umidade relativa do ar média (UR; %) dos meses mais secos (junho, julho e agosto), dos meses mais chuvosos (novembro, dezembro e janeiro) e média anual no período de 2008 a 2013. Canastra Furnas PR/ UR seco 13,4/76,4 25,6/59,6 PR/ UR Chuva 280,9/81,3 278,5/77,1 PR/ UR Média 2008-2013 1616,2/78,5 1718,8/69,1 De acordo com o banco de dados, os valores médios de temperatura para os períodos quentes (novembro a janeiro) e frios (junho a agosto) mostram que a região de Canastra apresentou maior variação de temperatura que a região de Furnas, tanto no período frio como no quente (Tabela 3). Tabela 3. Temperatura máxima média e temperatura mínima média (ºC) nos meses mais frios (Tmin frio; junho, julho e agosto) e nos mais quentes (Tmax calor; novembro, dezembro e janeiro) e média das temperaturas máximas e mínimas no período de 2008 a 2013. Canastra Furnas Tmax/Tmin frio 27,4/9,8 25,3/15,0 Tmax/Tmin calor 29,8/18,9 27,7/18,7 Média Tmax/Tmin 2008-2013 29,0/15,0 26,9/17,3 Estudos anteriores apontam que a riqueza de algas de solo está intimamente relacionada com os fatores ambientais, tais como disponibilidade de nutrientes, luz, temperatura, pH no solo (SHIELDS & DURRELL, 1964; HOFFMANN, 1989) e, principalmente, disponibilidade de água (HAÜBNER et al., 2006; HOLZINGER, 2009). O solo amostrado de Canastra (a aproximadamente 5 cm da superfície) apresentou umidade variando entre 35 e 48% (Tabela 4), sendo o local com maior ocorrência de táxons. Considerando que a faixa de umidade ideal para crescimento de algas é cerca de 40 a 60% no 23 solo (SHIELDS & DURRELL, 1964), esse resultado evidencia que organismos de crostas requerem baixa umidade e sua capacidade de utilizar chuvas de pequena intensidade, nevoeiros e/ou orvalho como fontes de água lhes permite existir ainda quando o déficit de umidade limita a cobertura vegetal (BELNAP et al., 2001). Tabela 4. Umidade (U) e temperatura do solo (T) em cada área de coleta para cada unidade amostral ao longo das transeções. Canastra Furnas Ponto U (%) T (ºC) U (%) T (ºC) 1A 38 21 - 24 2A 44 20 - 22 3A 35 21 - 23 4A 39 20 - 19 5A 41 18 - 21 6A - 17 - 27 7A - 17 - 27 8A - 17 - 27 9A - 16 - 34 10A - - - 28 1B 48 20 - - 2B 45 20 - - 3B 36 21 - - 4B 40 18 - - 5B 41,8 19 - - 6B - 17 - - 7B - 18 - - 8B - 18 - - 9B - - - - 10B - - - - - dado não disponível A predominância de algas em solos nos quais umidade não é um fator limitante é governada pela flutuação da temperatura (BECQUEREL, 1936; HOLM-HANSEN, 1963; LUND, 1962). A temperatura no solo de Canastra variou pouco (16 a 21ºC), enquanto Furnas apresentou uma variação maior (19 a 34ºC). Algas de solo são mais tolerantes às altas temperaturas quando presentes em solos úmidos (GLADE, 1914; ZEHNDER, 1953; DEMETER, 1956; TRAINOR, 1962). Provavelmente, a grande variação de temperatura em Furnas, deve-se a um maior sombreamento, em algumas áreas, resultante da cobertura vegetal advinda dos maiores portes dos vegetais presentes nesse parque, enquanto outras áreas estavam totalmente expostas. 24 Devido à alta tolerância de algas às temperaturas extremas (ZEHDER, 1953), especialmente às baixas, temperatura não tem se apresentado significativamente como um fator limitante na determinação da distribuição das espécies (BECQUEREL, 1936; HOLM- HANSEN, 1963; LUND, 1962), o que também foi observado durante esse estudo. Macentee et al. (1972) submeteram alíquotas de solo por 6 a 8 semanas a temperaturas de 0ºC, 60ºC e 100ºC a fim de determinar as taxas de sobrevivência de algas endêmicas; as duas temperaturas extremas reduziram o número de gêneros após seis horas de exposição. Como nesse trabalho as temperaturas do solo observadas foram entre 16 e 34ºC, longe de valores extremos, não houve influência significativa da temperatura na ocorrência das espécies. Com relação aos nutrientes, a análise do solo mostrou algumas diferenças entre os parques amostrados, sendo que a região da Canastra apresentou solo ligeiramente mais ácido, com aproximadamente, o dobro de ferro e silte, e maior quantidade de areia. Já Furnas apresentou o dobro de NH+4 e concentrações mais elevadas de K, Mn, Ca, Mg, P, Zn e argila no solo (Tabela 5). De acordo com classificação textural, os locais possuem solos semelhantes, e quantidades iguais de NO3- e NO2-. Tabela 5. Parâmetros do solo nas diferentes áreas amostradas. Canastra Furnas pH 3,7 4,3 NH4 + (mg.dm-3) 9,1 18,7 NO3 - (mg.dm-3) <1 <1 NO2 - (mg.dm-3) <1 <1 K (mmolc.dm-3) 0,8 3,9 Mn (g.dm-3) 1,1 25,7 Ca (mmolc.dm-3) 3 10 Mg (mmolc.dm-3) <1 17 P (mg.kg-1) 141 605 Fe (g.dm-3) 112 66 Zn(g.dm-3) 0,3 1,2 Areia (g.kg-1) 608 503 Silte (g.kg-1) 330 168 Argila (g.kg-1) 62 329 Classificação textural Franco Arenoso Franco Argilo Arenoso Solos contendo K, Mn, Ca, Mg e P são consistentemente demonstrados com taxas maiores em solos de ocorrência de crostas biológicas (BELNAP & HARPER, 1995; HARPER & BELNAP, 2001; HARPER & PENDLETON, 1993). Diferentemente do esperado, o solo de 25 Furnas, que apresentou maiores porcentagens desses elementos, não apresentou crostas biológicas visíveis. Os elementos Fe e Zn, entretanto, geralmente apresentam taxas mais baixas em áreas de crostas (BELNAP & HARPER, 1995; HARPER & BELNAP, 2001; HARPER & PENDLETON, 1993). Nesse estudo, apenas Fe se apresentou em menores concentrações na área visivelmente dominada por CBs, em Canastra. Não há na literatura, porém, valores numéricos para tal comparação, sendo as comparações feitas a partir de maiores e menores concentrações. Silte, sedimentos e partículas de argila aumentam a absortividade do solo e, podem também diminuir a porosidade do mesmo (BRADY & WEIL, 1996). Nesse estudo, a quantidade de areia nos dois parques foi alta (608g.kg-1 e 503g.kg-1, em Canastra e Furnas, respectivamente). No entanto, a concentração de silte e argila foi consideravelmente maior em Canastra. Os efeitos do pH na flora de algas são dificilmente avaliados e normalmente correlacionados com outros fatores (SHIELDS & DURRELL, 1964). Segundo Hoffmann (1989), o pH depende da quantidade de carbonato de cálcio no solo e Shields & Durrell (1964) pontuaram que o teor da umidade não deve ser analisado separadamente de pH, devido à alcalinidade de substratos não lixiviados e a acidez do solo úmido. Entre os diferentes tipos de grupos de algas, as cianobactérias e as diatomáceas geralmente estão mais associadas com solos de pH neutro e alcalino, enquanto algas verdes parecem tolerar uma ampla gama de condições de pH, de modo que elas dominam a flora de habitats ácidos devido à ausência de competição (HOFFMANN, 1989), mas ainda podem ser numerosas em solos de pH neutro e alcalino (DURRELL & SHIELDS, 1961). No trabalho de Lund (1947), um compilado de várias amostras de solos obtidas de vários locais da Inglaterra (pH 3,7- 4,8) mostrou que as ocorrências mais frequentes foram Coccomyxa, Gloeocystis sp., Mesotaenium violescens; e algumas espécies de Klebsormidium. No material de estudo, muitas ocorrências desse estudo foram congruentes ao trabalho de Lund (1947), como Coccomyxa, Gloeocystis, Mesotaenium e Klebsormidium. No presente estudo, os valores de pH encontrados nos parques foram aproximados, sendo que os dois parques apresentam pH ácidos. Canastra apresentou esse valor ligeiramente menor (Canastra pH 3,7 e Furnas, 4,3), e foi o parque que apresentou mais organismos pertencentes às algas verdes. Apesar da textura do solo ser considerada um fator importante na ocorrência de diatomáceas (LUND, 1945) e cianobactérias (SHIELDS & DURRELL, 1964), pouco se sabe sobre sua influência na distribuição de algas verde (GONZALVEZ & GANGLA, 1949). 26 Segundo Eiten (1994), a fitofisionomia de Furnas é caracterizada por vegetação savânica composta por um estrato arbóreo-arbustivo e outro herbáceo-graminoso (Figura 10A), enquanto, em Canastra, a fitofisionomia é caracterizada pela presença de árvores e arbustos isolados ao longo da paisagem herbácea-graminoso de acordo com Naves-Barbeiro et al. (2000) (Figura 10B). Figuras 10 A-B. Fitofisionomia das áreas amostradas. A. Cerrado sensu stricto (Furnas). B. Campo sujo (Canastra). As relações hídricas de uma mesma espécie podem mudar entre uma área em que o estrato arbustivo-arbóreo é descontínuo (campo sujo) e uma área em que a vegetação lenhosa apresenta uma maior densidade (cerradão, cerrado sensu stricto), especialmente na estação seca (NAVES-BARBEIRO et al., 2000). No campo sujo, onde predomina estrato herbáceo com sistemas radiculares superficiais, as camadas mais profundas do perfil do solo permaneceriam úmidas e disponíveis para os indivíduos arbóreos esparsos, mesmo durante a estação seca (NAVES-BARBEIRO et al., 2000). No cerradão, as vegetações lenhosas sofreriam um déficit hídrico acentuado, devido a maior densidade de árvores com sistemas radiculares profundos, ocorrendo uma sobreposição dessas raízes e, consequentemente, competição pelo recurso hídrico, devido ao esgotamento das reservas de água do subsolo (NAVES-BARBEIRO et al., 2000). Essa diferença na composição da vegetação nas fitofisionomias resulta numa composição do solo distinta e, consequentemente, nos microrganismos presentes nele. Fato observado no material estudado, no qual as diferenças estruturais dos solos da Canastra e de Furnas, que apresentaram maior e menor agregação de partículas, respectivamente (Figura 11A-B), podem estar influenciando na ocorrência das espécies nestas áreas. A B 27 Figura 11. Solos dos parques. A. Solo de Canastra. B. Solo de Furnas. 5.2. Cultivos artificiais e identificações Nos parques estudados, foram encontrados organismos pertencentes às divisões Chlorophyta e Streptophyta (Tabela 5). Chlorophyta foi a divisão representada por mais ordens (cinco) e, consequentemente mais espécies (13). As classes encontradas nesse estudo foram Trebouxiophyceae (com representantes de Chlorellales, duas espécies, e Chaetophorales, uma), Chlorophyceae (Chlamydomonadales, com três, Sphaeropleales, três) e Ulvophyceae (Trentepohliales, com três espécies), além de um grupo de organismo não identificado. Streptopyta foi representada por apenas duas classes, distribuídas em duas ordens e quatro espécies, sendo elas, Klebsormidiophyceae, com a ordem Klebsormidiales (duas espécies) e Zygnematophyceae, com Zygnematales (duas espécies). Dentre as espécies registradas nesse estudo, cinco foram encontradas somente em cultura, dez somente nas amostras de solo e apenas duas foram registradas em ambas as condições. Desse levantamento, sete gêneros são tipicamente constituídos por organismos filamentosos e dez, por unicelulares (células livres ou em colônias). A B 28 Tabela 5. Ocorrências das espécies nas áreas estudadas e segundo a origem da amostra (campo ou cultura). Canastra Furnas Filo Classe Ordem Espécies Cultura Campo Cultura Campo Chlorophyta Trebouxiophyceae Chlorellales Chlorella vulgaris X X X X Chlorella sp. X X Chaetophorales Desmococcus olivaceus X Chlorophyceae Chlamydomonadales Chlamydocapsa lobata X X Coccomyxa brevis X X Chlorococcum sp. X Sphaeropleales Gloeocystis polydermatica X Microspora cf palustris X X Microspora cf wittrockii X Organismo unicelular não identificado X Ulvophyceae Trentepohliales Trentepohlia cf. abietina X Trentepohlia arborum X Trentepohlia monilia X Streptophyta Klebsormidiophyceae Klebsormidiales Klebsormidium nitens X X Klebsormidium sp. X Zygnematophyceae Zygnematales Mesotaenium macrococcum X X Mesotaenium cf degreyi X 29 De todas as inoculações feitas em cultivos artificiais, foram obtidos 56 inóculos, sendo 33 de Canastra e 23 de Furnas, resultando em 20 isolados unialgais (Tabela 6). Os inóculos feitos inicialmente em meio sólido (Bold agarizado) apresentaram contaminação por fungos (Figura 12) ou não resultaram em crescimentos algais (Figura 13). Figuras 12-13. 12. Meio de cultura sólido contaminado por fungo. 13. Meio de cultura sólido sem crescimento de organismos. Tabela 6. Inóculos de Canastra (CA: transeção A e CB: transeção B; misturas: CD1 e CD2; sobrenadante e sedimentado, respectivamente) e Furnas (FA: transeção A e FB: transeção B; misturas: FUR1 e FUR2, sobrenadante e sedimentado, respectivamente). Inóculos Quantidade Isolados Espécies CA1 8 2 Klebsormidium nitens, organismo unicelular não identificado CA2 1 0 Chloroccoccum sp., Coccomyxa brevis CA6 2 1 Chlorella vulgaris CA7 1 0 Chlorella vulgaris CA9 5 3 Chlorella vulgaris, Klebsormidium nitens, Chloroccoccum sp., Chlamydocapsa lobata CB1 2 1 Klebsormidium nitens CB5 3 1 Chloroccoccum sp. CB8 1 1 Chlorella vulgaris CB9 3 0 Klebsormidium nitens CD1 2 1 Organismo unicelular não identificado CD2 4 1 Chlamydocapsa lobata FA1 4 2 Chlorella vulgaris FA2 2 1 Chlorella vulgaris FA3 1 1 Desmococcus olivaceus FA4 3 2 Desmococcus olivaceus FA8 3 2 Desmococcus olivaceus, Chlamydocapsa lobata FB6 3 0 Chlamydocapsa lobata FB10 3 0 Chlorella vulgaris FUR1 1 1 Chlorella vulgaris FUR2 4 1 Klebsormidium nitens 12 13 30 Culturas são úteis para fornecer informações preliminares sobre a ecologia de algas (PRINGSHEIM, 1949), além de serem essenciais para estudos taxonômicos e morfológicos (BOLD, 1942), pois estabelecer a taxonomia das algas é pré-requisito para a investigação significativa na distribuição, ecologia, fisiologia e genética dos grupos (TIFFANY, 1951). 5.3. Levantamento taxonômico Filo Chlorophyta Ordem Chlorellales Gênero Chlorella Beyerinck, 1890. Células esféricas, subesféricas ou elipsoides, livres ou formando colônias com mais de 64 células, bainha mucilaginosa presente ou ausente. Cloroplasto único, parietal e urceolado, pirenoide pequeno e único, quando presente, rodeado por grânulos de amido. Reprodução sempre por autósporos liberados pela ruptura da parede celular da célula mãe. Células filhas podem permanecer ligadas às partes remanescentes da parede celular da célula mãe e formar colônias com bainha mucilaginosa. Chlorella vulgaris Beyrinch [Beijerinck] Botanische Zeitung, 47: 758, 1890. Figuras 14-17 Células esféricas, 4,8-8,8µm diâm.; cloroplasto parietal e urceolado; pirenoide pequeno; reprodução por 2-4(-8) autósporos, 5,6-6,4µm diâm. Ocorrência: CA1, CA2, CA3, CA4, CA5, CA6, CA7, CA8, CB1, CB2, CB3, CB4, CB5, CB7, CB8, CB9, FA1, FA2, FA4, FA8, FB2 e FB4. Comentários: A identificação específica desse grupo foi possível pela observação em cultura das amostras FA1, CA4 e CB9, nas quais foram observados os autósporos, sendo eles de igual tamanho e a divisão acontece em 2-4-8 autósporos (Ettl & Gärtner, 1995). De acordo com Durrell (1959), essa espécie é cosmopolita, tendo sido observada em diversos países da Europa, como Espanha (ÁLVAREZ COBELAS, 1982; ABOAL & LLIMONA, 1984), Áustria (ETTL & GÄRTNER, 1995), França e Dinamarca (RINDI & GUIRY, 2004) e Alemanha (MÜLLER et al., 2005; TAUSCHER, 2014). Vogel (1955), Cameron & Devaney (1970) e Hu et al. (2003) também observaram a espécie em crostas na África, Antártica e China, respectivamente. No Brasil, já foi registrada por Nogueira (1991) em 31 Goiás, por Bicudo et al. (1999) e Lira et al. (2009) em São Paulo, por Menezes (2010) no Rio de Janeiro e Mendes et al. (2012) como primeira citação para o estado da Bahia. Chlorella sp. Figura 18 Células esféricas a subesféricas, 9,6-15,2µm diâm., 10,4-14,4µm compr.; cloroplasto parietal e urceolado; pirenoide pequeno; autósporos não observados. Ocorrência: CA3, CA7, CB1, CB6, CB8 e FB9. Comentários: Devido à confusão estabelecida nas relações taxonômicas do gênero Chlorella e com os similares esféricas e como não há uma clara separação entre os clados de unicelula res esféricas e elípticas, para a descrição desse grupo foi levado em consideração a classificação de Ettl & Gärtner (1995). Os espécimes analisados apresentaram características correspondentes à Chlorella luteoviridis Chodat e C. fusca Shihira & Krauss, ambas de hábito terrestre, porém a distinção dessas duas espécies se restringe à diferença nos tamanhos dos autósporos. Na primeira, os autósporos formados são de tamanhos distintos, e na segunda há a formação de autósporos de igual tamanho. Como nesse material não houve a observação dessas estruturas, a identificação específica desse grupo não foi possível. Chlorella luteoviridis já foi registrada em países da Europa, como Áustria (ETTL & GÄRTNER, 1995), República Tcheca (GROSS et al., 2002) e Alemanha (GUSTAVS et al., 2011), da África, como Namíbia (GUSTAVS et al., 2011), e da Ásia, como Japão (ETTL & GÄRTNER, 1995) e Singapura (PHAM et al., 2011). Entretanto, nunca foi registrada em países do continente americano. Chlorella fusca, por sua vez, foi registrada na Europa (Romênia; CARAUS, 2002; CARAUS, 2012), Ásia, (Japão e Nepal; ETTL & GÄRTNER, 1995), Austrália (Austrália e Nova Zelândia; DAY et al., 1995) e América do Sul (Argentina; ETTL & GÄRTNER, 1995). Ordem Chaetophorales Gênero Desmococcus Brand, 1925. Células globulares, geralmente formando pacotes sarcinoides em três planos, ocasionalmente como filamentos curtos e unisseriados. Células com único cloroplasto e pirenoide. Reprodução assexuada por aplanósporos produzidos em esporângios grandes e esféricos. Reprodução 32 sexuada desconhecida. Cosmopolita, livres no solo, superfícies subaéreas incluindo paredes e troncos de árvores, especialmente em habitats poluídos. Desmococcus olivaceus (Persoon ex Archerson) Laundon, Taxon 34: 671, 1985. Figura 19 Colônias compostas por células esféricas, 7,0-11,0µm diâm.; bainha mucilaginosa envolvendo uma ou mais células presente, lisa, espessa; cloroplasto único, parietal poculiforme; pirenoides não observados; parede celular delgada; estágios reprodutivos não observados. Ocorrência: FA3, FA4 e FA8. Comentários: Segundo Ettl & Gärtner (1995), Desmococcus olivaceus é uma espécie subaérea que se desenvolve em vários tipos de ambientes (corticícola, edáfico, epilítico). É reportada como a alga verde mais comum do mundo (LAUNDON, 1985; ETTL & GÄRTNER, 1995). Nurul-Islam (1972) reportou a espécie ocorrendo em Bangladesh, enquanto Schlicht ing (1975) e Rindi & Guiry (2003) registraram sua presença em ambientes urbanos na Irlanda. Ainda, teve ocorrência registrada para Antártica, por Broady & Engerfeld (1993), e Península Ibérica, por Leitão et al. (1996), Noguerol-Seoane & Rifón-Lastra (1997) e Rifón-Lastra & Noguerol-Seoane (2000). Em crostas, já teve ocorrência observada em solos ácidos de Ohio, por Rosentreter & Belnap (2001). O gênero foi encontrado entre as algas verdes que colonizam inicialmente o solo para a posterior formação de crostas (BÜDEL, 2001). No Brasil, já foi registrada por Lemes-da-Silva et al. (2010), ocorrendo em caules de árvores de áreas de floresta estacional semidecidual no noroeste do estado de São Paulo. Esse registro é o segundo para a espécie no território brasileiro. Ordem Chlamydomonadales Gênero Chlamydocapsa Fott, 1972. Células livres ou formando colônias. Células ovais a esféricas a talos, com ou sem par de flagelos, apicais e mesmo comprimento, com dois vacúolos contráteis. Colônias formadas por uma ou mais células embebidas numa bainha mucilaginosa, estratificada e hialina. Parede celular fina. Cloroplasto único, parietal e poculiforme, sem estigma na maioria das células; um pirenoide (ocasionalmente dois, em C. lobata) por célula, basal ou submediano, esférico a oval e envolto por grânulos de amido. Reprodução assexuada por autósporos ou zoósporos e fragmentação colonial. Esporos são liberados por fragmentação da parede do esporângio. Em 33 cultura, a produção de zoósporos é geralmente associada com culturas jovens e autósporos com culturas velhas. Reprodução sexuada desconhecida. Chlamydocapsa lobata Broady, British Phycological Journal 12: 10, 1977. Figuras 20-21 Células livres ou em colônias irregulares com duas, quatro ou oito células subesféricas, 8,0- 9,6µm diâm., 13,6-14,4µm compr.; bainha mucilaginosa, estratificada envolvendo de uma a quatro células; cloroplasto único, parietal, lobado, pirenoides presentes, parede celular espessa, vacúolos contráteis presentes; estágios reprodutivos não observados. Ocorrência: CA9, CD2, FA8 e FB6. Comentários: O gênero Chlamydocapsa, descrito por Fott (1972), é composto por sete espécies cosmopolitas, principalmente de hábito planctônico em lagos de água doce. Segundo Guiry & Guiry (2015), as espécies terrestres do gênero são C. lobata Broady e C. mucifera Hindak. Chlamydocapsa lobata distingue-se de C. mucifera principalmente por apresentar cloroplasto lobado e é encontrada principalmente em musgos e em ambientes terrestres. Quando mantidos em cultivo, o grau de estratificação da mucilagem varia de acordo com a idade da cultura, sendo mais estratificadas e visíveis em culturas jovens e inconspícuas em culturas antigas (BROADY, 1997). No material em estudo, a mucilagem apareceu estratificada e visível. A espécie C. lobata já foi encontrada na Europa (Espanha), por Cambra Sánches et al. (1998), Oceania (Austrália e Nova Zelândia), por Day et al. (1995), e em algumas ilhas da Antártica, por Broady (1977) e Ettl & Gärtner (1995), porém nunca havia sido encontrada no Brasil. Gênero Coccomyxa Schmidle, 1901. Colônias microscópicas ou macroscópicas, disformes, delimitadas nas extremidades. Bainha mucilaginosa ligeiramente estratificada, desaparecendo em colônias antigas. Células fusiformes, elipsoides, ovoides a subesféricas, cloroplastos únicos. Reprodução por 2-4(-8) autósporos. Células filhas permanecem na colônia. 34 Coccomyxa brevis (Vischer) Gärtner & Schragl 513, 1988. Figura 22 Colônias compostas por células fusiformes, 3,2-3,9µm diâm., 5,0-7,8µm compr., bainhas mucilaginosas ligeiramente espessas envolvendo cada célula; cloroplasto único, parietal, em forma de taça; parede celular delgada; estágios reprodutivos não observados. Ocorrência: CA1, CA2, CA9, CB1, CB6 e CB9. Comentários: Segundo Langhans et al. (2009), Coccomyxa está entre os gêneros de Chlorophyta mais comuns em CBs. Espécies desse gênero já têm ocorrência registrada em ambientes terrestres da França, Áustria e Suíça (ETTL & GÄRNER, 1995). Em crostas biológicas, foi encontrada na Florida, por Hawkes & Flechtner (2002), e também em crostas nos Alpes austríacos, por Türk & Gärtner (2001). Não há, até o momento, registro de ocorrência de C. brevis para o território brasileiro e, portanto, se confirmada a identificação, será o primeiro registro de ocorrência para o país. O formato celular fusiforme, a parede celular delgada e cloroplasto parietal em forma de taça, são características das populações estudadas que se aproximam da espécie Coccomyxa brevis (Vischer) Gartner & Schragl. Diferem, entretanto, pelo comprimento celular, que é ligeiramente maior em C. brevis (5,0-7,0µm; ETTL & GÄRTNER, 1995). A espécie foi observada em cultura, na amostra CA2, porém estruturas de reprodução não foram observadas. Gênero Chlorococcum Meneghini, 1842. Células livres ou em colônias temporárias de forma indefinida, nunca submersas em bainhas mucilaginosas. Células elipsoides a esféricas e tamanhos variados. Parede celular delgad a. Cloroplasto parietal com um ou mais pirenoides. Células uni ou multinucleadas antes da zoosporogênese. Reprodução por zoósporos, aplanósporos ou isogametas. Células móveis apresentam dois flagelos de tamanho iguais e elipsoides durante um tempo. Esse gênero é cosmopolita. Embora primordialmente uma alga edáfica, já foi reportada em diversos habitats como fontes termais na Ásia central e solos coletados na Antártica. Representantes do gênero já foram registrados como aquáticos, marinhos e aerofíticos. Chlorococcum sp. Figura 23 Células livres ou em colônias com aproximadamente dez células, células esféricas, 3,0-10,0µm diâm.; bainha mucilaginosa colonial hialina, lisa; cloroplasto único, poculiforme, pirenoides pequenos, parede celular espessa, estágios reprodutivos não observados. 35 Ocorrência: CA2, CA9 e CB5. Comentários: Esse gênero é amplamente relado em solos (BISCHOFF & BOLD, 1963; MILLINGER, 1969; SHUBERT, 1979; BÜDEL, 2001). O gênero é composto por 86 espécies (GUIRY & GUIRY, 2015), sendo 21 terrestres (ETTL & GÄRTNER, 1995). As característ icas que permitem a identificação específica do grupo são de difícil visualização. Os espécimes observados apresentam morfologia semelhante à C. infusionum e à C. minimum. Porém, as medidas celulares dessas espécies se sobrepõem (a primeira variando entre 10-40µm de diâmetro e a segunda, entre 8-16µm). A principal característica que separa essas espécies está relacionada com a estrutura do pirenoide (presença de grânulos de amido em C. minimum). Uma vez que essa característica é de difícil observação, preferimos manter a identificação em nível genérico. Ordem Sphaeropleales Gênero Gloeocystis Nägeli, 1849. Colônias microscópicas ou em células solitárias, raramente. Colônias compostas por envelope mucilaginoso irregular formando massas esféricas, piramidais ou amorfas. Bainha mucilaginosa geralmente lamelada ao redor de cada célula ou grupo de células. Células esféricas a ovais, com parede celular delgada, cloroplasto único e parietal com um pirenoide. Reprodução assexuada por autósporos, ou vegetativa, por acinetos. As espécies são distinguidas baseadas no diâmetro celular, formato e arranjo e morfologia da colônia. Gloeocystis polydermatica (Kützing) Hindák, Preslia, 50: 8, 1978. Figura 24 Colônias amorfas ou células livres, células esféricas a levemente ovais, 2,9-7,2µm diâm., 3,2- 7,1µm compr.; bainhas mucilaginosas translúcidas envolvendo uma ou mais células, estratificada, espessa; cloroplasto parietal e poculiforme; pirenoides pequenos; parede celular delgada; autósporos e acinetos não observados. Ocorrência: CA2, CA3, CA5, CA6, CA7, CA9, CB1, CB2, CB5, CB6, CB8 e CB9. Comentários: A espécie (antes denominada Gloeocapsa polydermatica Kützing) foi amplamente reportada em solos na Inglaterra (WHITTON et al., 2003), Ilhas do Havaí (SHERWOOD, 2004) e China (HU & WEI, 2006). Gloeocystis polydermatica foi encontrada no solo do Colorado, nos Estados Unidos (DURELL, 1959), no Japão (ETTL & GÄRTNER, 36 1995), na Inglaterra (JOHN & TSARENKO, 2002; WHITTON et al., 2003; JOHN et al., 2011), em solos de tundra na Europa (PATOVA & DOROKHOVA, 2008; BÜDEL, 2001), em crostas biológicas na Alemanha (HOPPERT et al., 2010) e na Nova Zelândia (BROADY et al., 2012). Nunca foi reportada no Brasil, sendo esse o primeiro registro para o país. Gênero Microspora Thuret, 1850. Filamentos unisseriados e não ramificados. Células cilíndricas a levemente abauladas, com as paredes celulares praticamente homogêneas em algumas espécies ou compostas por duas peças em H de celulose e pectose, entrepostas e articuladas umas às outras. Usualmente as células são preenchidas com grânulos de reserva de amido e pouco pode ser observado sobre a natureza do cloroplasto, que varia muito entre as espécies e nos diferentes estágios de crescimento. Em células jovens os cloroplastos são parietais e ocupam a periferia da célula; variando de cilíndricos a reticulados entre as espécies. Em células mais velhas, geralmente, apresentam espessura assimétrica e aparecem dispostos em bandas constritas e irregulares, unidos formando uma rede. A reprodução em Microspora é principalmente assexuada pela formação de zoósporos e aplanósporos ou por acinetos, vegetativamente. Reprodução sexuada ainda não é conhecida. Microspora cf. palustris Wichmann, Pflanzenforschung 20: 35, 1937. Figuras 25-26 Filamentos compostos por células arredondadas a levemente abauladas 18,6-22,4μm diâm., 14,4-25,6 μm compr., RC/L 0,7-1,4 vez mais longa que larga; cloroplasto único, parietal, reticulado; parede celular espessa, 4,0-4,3 μm diâm., composta por peças em H, grânulos de amido presentes pela célula; acinetos arredondados, 18,6-21,8μm diâm., 17,58-21,41μm compr. Ocorrência: CA1, CA5, CA6, CA7, CA8, CA9, CB2, CB3, CB5, CB6, CB7, CB8, CB9 e FB9. Comentários: Os espécimes analisados apresentaram as características diagnósticas da espécie M. palustris, como descrito por Ramanathan (1964), em destaque para os grânulos de amido presentes nas células e ao formato dos acinetos, porém os organismos estudados possuem diâmetro dos acinetos menores em relação àqueles descritos por Ramanathan (22,0-32,0μm diâm), assim como o comprimento celular (21,0-42,0μm compr.). Além disso, a espécie em questão é de hábito aquático e nunca teve sua ocorrência registrada para o Brasil. O gênero Microspora (como M. floccosa) teve ocorrência em solos de crostas na India e Sri Lanka (BÜDEL, 2001), nesse estudo, M. cf. palustris foi uma das espécies mais comuns. 37 Microspora cf. wittrockii (Wille) Lagerheim, Pflanzenforschung 20: 38, 1887. Figuras 27-28 Filamentos compostos por células cilíndricas, 12,0-16,0μm diâm., 20,0-58,4μm compr., RC/L 1,4-4,7 vezes mais longa que larga; cloroplasto único, parietal e reticulado; paredes celulares delgadas compostas por peças em H; estruturas de reprodução presentes, globosas, 21,5μm diâm., 20,5μm compr. Ocorrência: CB7 e CB9. Comentários: Os espécimes foram identificados com base na morfologia celular e da estrutura de reprodução, porém, os diâmetros celulares são um pouco inferiores aos referidos para a espécie por Ramanathan (1964) (18-24μm diâm). Além da espécie mencionada, os organismos analisados assemelham-se também a M. membranacea, no entanto, essa espécie é caracterizada pela parede celular espessa, não observada nos espécimes estudados; ainda, M. membranacea tem ocorrência restrita a China. Microspora amoena e M. loefgrenii também apresentam características semelhantes aos espécimes desse estudo e foram registradas na América do Sul, porém, também possuem parede celular mais espessa. Organismo unicelular não identificado Figura 29 Células livres e esféricas, 5,0-10,0µm diâm.; parede celular espessa, cloroplasto único e parietal, pirenoide único e grande, estágios reprodutivos não observados. Ocorrência: CA1 e CD1. Comentários: Esse morfotipo apresenta células esféricas e livres, sendo que algumas células apresentam parede celular consideravelmente espessa, por não apresentar nenhuma característica diagnóstica marcante e visível, não foi possível a identificação sequer genérica do grupo. Como estruturas de reprodução ou outra estrutura diagnóstica não foram encontradas, a identificação do táxon não pode ser concluída. Essas algas estudadas assemelham-se a exemplares do gênero Bracteacoccus pelas medidas, presença de pirenoides e cloroplasto parietal, porém não há evidências confiáveis para essa identificação. 38 Ordem Trentepohliales Gênero Trentepohlia Martius, 1817. Filamentos unisseriados e ramificados, geralmente em tons alaranjados. Ramificações do mesmo diâmetro do filamento principal perpendicular ou não ao filamento principa l; geralmente gradualmente atenuadas. Células vegetativas cilíndricas, elípticas ou levemente infladas, aproximadamente duas vezes mais longas que largas, uninucleadas, podendo em células adultas apresentar mais de um núcleo; célula apical diferenciadas em algumas espécies. Paredes celulares espessas, composta de celulose, às vezes lamelada com camadas paralelas ou divergentes. Cloroplastos únicos ou numerosos, discoide ou parietal; pirenoides ausentes. Reprodução por zoósporos ovoides únicos e terminais ou em cachos, com algumas células anexadas à célula cabeça. Gametângios, em geral, terminais; zoósporos biflagelados. Trentepohlia cf. abietina (Flotow) Hansgirg, Prodr. Alg. Bohmen 1: 86, 1886. Figuras 30 Filamentos ramificados, não afilados e não constritos, compostos por células cilíndricas, (5,0)- 6,0-8,0μm diâm., (8,0-)10,0-11,0μm compr., RC/L (1,3-) 1,4-1,6 vez mais longas que largas; célula apical arredondada; cloroplasto único, parietal; gametângios subesféricos e laterais, 5,0- 8,0μm diâm., 7,0-9,0μm compr. Ocorrência: FA7. Comentários: Essa espécie foi descrita por Ettl & Gärtner (1995), caracterizando-se por possuir células cilíndricas, 4,0-10,0μm diâm., 1 a 3 vezes mais longas que largas, característ icas congruentes com as da população estudada. A espécie também se caracteriza por formar gametângios laterais ou apicais, mas, no material estudado, apenas gametângio lateral foi observado. Trentepohlia abietina é uma das espécies geograficamente mais bem distribuídas do gênero e tem registro de ocorrência em muitos ambientes de regiões temperadas e tropicais (DE WILDEMAN, 1900; JOSE & CHOWDARY, 1980; TRACANNA, 1989; ETTL & GÄRTNER, 1995; JOHN, 2002; RINDI et al., 2005). Há ocorrências registradas para essa espécie na Áustria (SARMA, 1986), Irlanda (RINDI & GUIRY, 2002), Ilhas Havaianas (RINDI et al., 2005), África (RINDI et al., 2006), China (HU & WEI, 2006) e Guiana Francesa (RINDI & LOPEZ- BAUTISTA, 2008). No material em estudo, poucos filamentos foram encontrados e já mortos, com as características morfométricas diagnósticas da espécie (medidas celulares combinadas com o 39 formato celular) os organismos analisados quase puderam ser plenamente identificados como Trentepohlia abietina. A medida do gametângio foi consideravelmente menor que encontrada em literatura (18,1-25,0μm diâm., 15,0-25,0μm compr.; LEMES-DA-SILVA et al., 2010), possivelmente por já estarem mortos. A espécie foi reportada para o Brasil somente por Akiyama (1971) e Lemes-Da-Silva et al. (2010) e, caso se confirme a identificação, esse é o terceiro registro da espécie para o território brasileiro. Além disso, seria o primeiro registro para a espécie em crostas biológicas. Trentepohlia arborum (Agardh) Hariot, J. Bot. 3: 383, 1889. Figuras 31-32 Filamentos ramificados formando ângulos de 90º, não constritos e afilados, células cilíndricas, (12,0-)13,6-20,0µm diâm., (25,6-)28,0-37,6µm compr., RC/L 1,8-2,1 vezes mais longas do que largas; célula apical afilada, cloroplasto único, parietal e reticulado; gametângio lateral e subesférico; 21,6µm diâm, 18,4µm compr. Ocorrência: CA1. Comentários: Trentepohlia arborum pode ser reconhecida por apresentar filamentos longos com ramificações abundantes, células cilíndricas, de duas a quatro vezes mais longas do que largas e esporângios em grupos derivados de uma célula dilatada (célula de suporte) (CRIBB, 1958). No material de Canastra, foram observados apenas fragmentos de filamentos, mas a identificação foi possível devido às características morfométricas particulares das células vegetativas, que foram condizentes com outras descrições da espécie apresentadas por Cribb (1987, 1989) e Rindi et al. (2005). A espécie já foi encontrada em diversos países como Áustria (HARIOT, 1889; SARMA, 1986), República Tcheca, Canadá, Chile, Colômbia, China, Índia (SARMA, 1986) e Brasil (BICUDO & SANTOS, 2001; LEMES-DA-SILVA et al., 2010; NELSEN et al., 2011; FREITAS & LOVERDE-OLIVEIRA, 2013), porém não havia sido registrada em crostas biológicas. Trentepohlia monilia De Wildemann, Bull. Soc. R. Bot. Belg. 27: 181, 1889. Figuras 33-34 Filamentos curtos, ramificados e constritos, compostos por células elípticas ou moniliformes, (15,0-)19,0-24μm diâm., (20,0-)26,0-29,0μm compr., RC/L (0,9-)1,6-1,7 vez mais longas que largas; célula apical semelhante à vegetativa; cloroplasto único, parietal e discoide; esporângios e gametângios não observados. 40 Ocorrência: CA5. Comentários: Esse grupo de organismos foi identificado com base na morfologia celular. Por ser uma espécie com o formato celular marcante e característico (moniliformes), não há necessidade da presença de estruturas de reprodução para defini- la. O táxon foi registrado no Japão, por Akiyama & Hirose (1967), no Chile, por Hariot (1889), na Nova Zelândia, por Broady et al. (2012) e no Brasil, por Akiyama (1971), Bicudo & Santos (2001) e Lemes-da- Silva et al. (2010), porém não havia sido registrado em crostas biológicas. Filo Streptophyta Ordem Klebsormidiales Gênero Klebsormidium Silva, Mattox & Blackwell, 1972. Filamentos unisseriados e não ramificados, sem diferenciação polar. Células cilíndricas, parede celular fina, sob condições adversas torna-se grossa, lamelada, simultaneamente com peças em H compondo a parede celular. Cloroplasto único e parietal, laminado, elípticos ou discoides, usualmente ocupando menos da metade da periferia da célula. Pirenoides únicos, no centro do cloroplasto, envoltos por envelope de amido. Reprodução assexuada por zoósporos biflagelados ou aplanósporos. Multiplicação vegetativa ocorre a partir da propagação de filamentos resultando em células livres ou fragmentos com poucas células. Klebsormidium nitens (Meneghini) Lokhorst, Cryptogamic Studies 5: 13, 1996. Figuras 35-38 Filamentos longos com aproximadamente 67 células, células cilíndricas, 5,6-6,0µm diâm., 9,6- 14,4µm compr.; RC/L 1,7-2,4 vezes mais longa que larga; cloroplasto único e parietal ocupando menos da metade da célula, pirenoides presentes; parede celular delgada; zoósporos em formação, células livres e propágulos com 2 a 5 células em disposição linear. Ocorrência: CA1, CA9, CB1, CB9, CD2, FB6, FUR1 e FUR2. Comentários: Essa espécie foi identificada com base na observação de características dos espécimes crescendo em cultura, uma vez que a formação de propágulos ou de zoósporos é de caráter taxonômico essencial. As características que possibilitaram a correta identificação foram filamentos dispostos paralelos em meios líquidos; parede celular fina, mesmo em culturas mais velhas; formato celular cilíndrico, em todos os estágios do ciclo de vida; cloroplasto sem diferenciação nas margens; filamentos estritamente sem formação das peças em H na parede 41 celular; propagação de filamentos associado com produção de estruturas globulares, reprodução assexual por zoósporos muito frequente (LOKHORST, 1996). O diâmetro celular de no máximo 6 µm (ŠKALÖUD, 2006), e propágulos dispostos linearmente (LOKHORST, 1996) também são características coincidentes com as da espécie K. nitens. Klebsormidium nitens é uma das espécies mais comum do gênero (LOKHORST, 1996), especialmente em habitats terrestres; tem ocorrência registrada na Áustria, Bélgica, França, Holanda (LOKHORST, 1996) e Espanha (UHER et al., 2004, 2005). Também há registro de ocorrência em Singapura (PHAM et al., 2011). A espécie nunca foi reportada no Brasil, portanto, esse é o primeiro registro de ocorrência para o país. Klebsormidium sp. Figura 39 Filamentos com até 20 células, células cilíndricas, 5,3-6,8µm diâm., 3,7-8,6µm compr.; RC/L 0,7-1,2 vez mais longa que larga; cloroplasto único e parietal ocupando menos da metade da célula, um pirenoide presente; parede celular delgada; zoósporos e aplanósporos não observados. Ocorrência: FA8. Comentários: Para identificação específica de Klebsormidium, é necessário a observação de características das células de reprodução e do comportamento da espécie em cultura (Lokhorst, 1996). Identificações específicas sem observações na cultura só são possíveis na avaliação de uma massa de filamentos homogêneos, vindos do material de campo, porém neste estudo, foram observados somente alguns filamentos. Características como parede celular delgada, formato celular cilíndrico e pirenoide único, observadas nos espécimes estudados, são congruentes com as espécies K. crenulatum (Kützing) Lokhorst e K. montanum Watanabe. Porém a característica diagnóstica que separa essas duas espécies está ligada à reprodução. K. crenulatum se reproduz por fragmentação dos filamentos, K. montanum por formação de zoósporos. Ordem Zygnematales Gênero Mesotaenium Nägeli, 1849. Células longas, cilíndricas com extremidades amplamente ovaladas, livres ou em colônias dentro de bainha mucilaginosa com estrutura simples ou em camadas. Cloroplastos um ou dois 42 por célula, axial ou em banda (raramente parietal), com 1 ou 2 pirenoides. Parede celular de duas camadas. Reprodução assexuada apenas por divisão celular transversal formando aplanósporos com a mesma forma das células vegetativas. Reprodução sexuada por conjugação. Mesotaenium macrococcum (Kützing ex Kützing) J. Roy & Bisset, Annals of Scottish Natural History, 100: 61, 1894. Figura 40 Colônias ou células livres; colônias disformes, com 10 a 20 células; bainha mucilaginosa, homogênea e translúcida; células cilíndricas com extremidades arredondadas, 8,3-19,7µm diâm., 13,6-39,3µm compr.; RC/L 1,6-1,9 vez mais longa que larga; cloroplasto único e axial; 2 pirenoides presentes; estruturas de reprodução não observadas. Ocorrência: CA1, CA3, CA4, CA5, CA6, CA7, CA8, CB1, CB2, CB3, CB4, CB8, CB9, FA2 e FA4. Comentários: As dimensões celulares dos espécimes estudados são coincidentes com as descritas por Ettl & Gärtner (1995). Segundo esses autores, esses organismos são encontrados em solos úmidos entre musgos e líquens. A espécie já foi encontrada a alguns centímetros abaixo do solo no Colorado por Durrell (1959), em solos úmidos (juntamente com musgos), próximo de rios no norte de Borneo por Hirano (1974), em rochas de granito na Ucrânia por Mikhailyuk (2008), onde foi listada como espécie rara para a flora Ucraniana; e em lápides biodeterioradas no cemitério da cidade de Bratislava, num local úmido e sombreado, por Uher (2008). A espécie já foi listada no Brasil num levantamento florístico no Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro por Araújo et al. (2010), sendo o presente estudo o segundo registro. Nunca havia sido encontrada em crostas biológicas, sendo esse o primeiro registro para a espécie. Mesotaenium cf. degreyi W. B. Turner, Naturalist Hull, 12: 34, 1886. Figura 41 Células livres cilíndricas e longas com extremidades arredondadas, 16,8µm diâm., 25,6µm compr.; RC/L 1,5 vez mais longa que larga; cloroplasto único e axial, ausentes nas bordas da célula; pirenoide único presente; estruturas de reprodução não observadas. Ocorrência: CA8. Comentários: As características desse espécime são coincidentes com as descritas para a espécie Mesotaenium degreyi, exceto o comprimento celular. Na espécie descrita, o comprimento mínimo é de 32µm compr., e a espécime encontrada obteve 25,6µm compr.; 43 porém apenas uma célula foi encontrada, dificultando assim a identificação específica correta. A espécie tem como hábitats principais, solos ou rochas úmidas entre musgos, sendo sua distribuição cosmopolita (ETTL & GÄRTNER, 1995). A espécie já foi encontrada na Holanda (COESEL, 1982), Espanha (CAMBRA-SÁNCHEZ et al., 1998), Austrália e Nova Zelândia (DAY, et al., 1995), França (KOUWETS, 1999), Áustria (LENZENWEGER, 2003), República Tcheca (STASTNY, 2010), Irlanda (JOHN et al., 2011). No Brasil, sua ocorrência foi registrada por Araújo et al. (2010), em um levantamento florístico no Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, entretanto nunca foi encontrada em crostas biológicas, e se confirmada a identificação, será a primeira ocorrência e a segunda para o Brasil. O levantamento florístico realizado durante esse estudo revelou ocorrências de gênero congruentes a outros trabalhos de algas verdes em CBs ao redor do mundo, como Chlorella (VOGEL, 1955; CAMERON 1960, 1972), Desmococcus (GRONDIN & JOHANSEN, 1995; ROSENTRETER & BELNAP, 2003), Chlamydocapsa (BROADY, 1998), Coccomyxa (REISIGL, 1964; GRONDIN & JOHANSEN, 1995; ROSENTRETER & BELNAP, 2001), Chlorococcum (SHUBERT, 1979; SHIELDS et al., 1957, Gloeocystis (SKUJA, 1964; BÜDEL, 2005), Klebsormidium (SHIELDS et al., 1957; GAYEL & SHTINA, 1974; JOHANSEN et al., 1984) e Microspora (MARATHE & KUSHALDAS, 1975). Das espécies observadas neste trabalho, seis revelaram ocorrência nos dois parques do estudo, sendo oito de ocorrência restrita à Canastra e apenas três, à Furnas (Figura 42). Entre as algas verdes encontradas nesse estudo, algumas que já foram reportadas em outros trabalhos revelam certa importância e peculiaridade nos ambientes onde ocorrem. Chlorococcum (STARKS, 1979) e Desmococcus olivaceus (BÜDEL, 2001) demonstraram ser gêneros pioneiros na sucessão ecológica de solos, sendo de extrema importância na manutenção das crostas. O gênero foi encontrado apenas em Canastra, justamente a área que apresentou CBs com maior desenvolvimento estrutural. Em solos da Inglaterra, após a morte de gramíneas, Klebsormidium flaccidum espalha- se amplamente no período úmido, possibilitando a germinação de capim na primavera seguinte (PIERCY, 1917). Os valores de umidade dos solos de Canastra foram considerados favoráve is à ocorrência de algas de solo. Em Furnas, essa variável não foi medida devido à quebra do aparelho, mas em função dos elevados valores de umidade do ar e alto índice de precipitação, pode-se supor que apresenta, também, solos úmidos. Desse modo, a ocorrência do gênero Klebsormidum foi observada nos dois parques (em Canastra apareceu apenas em cultivos artificiais). 44 5.4. Análises moleculares Foram feitas várias tentativas de amplificação de DNA a partir do material de cultivos. A extração de DNA das amostras de cultivo trouxe dificuldades, mesmo com os procedimentos de quebra da parede celular com o uso da celulase (com organismos unicelulares) ou por meio de procedimentos para homogeneização de tecidos (com organismos filamentosos). Amplificações com os genes rbcL (primers RH1 e rbcL Q), UPA (primers p23Sr_fl e p23SrV_rl) SSU (45f e 1243r, PCRA e PCRB) foram feitas, porém sem sucesso. Mudanças no ciclo de temperaturas dos termocicladores, bem como em alguns componentes da reação de PCR foram feitas, em busca de um resultado positivo nas amplificações. As amplificações com resultados positivos foram apenas de duas amostras (Chlamydocapsa lobata e Klebsormidium nitens) com os genes rbcL (primers RH1 e rbcL Q) e tufA (tufGF4 e tufAR), respectivamente. A primeira amplificação teve a sequência de bases nucleotídicas gerada com baixa qualidade (índice de qualidade <20), e as tentativas subsequentes não obtiveram êxito na extração do DNA. A amplificação de K. nitens com o gene tufA resultou em uma sequência de bases de boa qualidade, porém o banco de dados para esse gene e essa espécie não constitui-se de linhagens para a comparação. Alternativamente, as sequências de rbcL produzidas na PCR foram clonadas com o intuito de melhorar a qualidade das sequências, porém sem sucesso. A dificuldade encontrada na obtenção de sequências gênicas pode estar relacionada a diversos fatores, principalmente na extração do DNA e a utilização de primers inespecíficos. O isolamento pelo método de “pescaria” de células é um processo muito lento, retardando a obtenção de biomassa considerável para uma extração de DNA eficiente, além disso, o método single-cell PCR foi de pouco sucesso. 45 Figuras 14-26. 14-17. Chlorella vulgaris. 17. Seta: Autósporos. 18. Chlorella sp. 19. Desmococcus olivaceus. Seta: Células em pacotes cúbicos. 20-21. Chlamydocapsa lobata. 20. Seta: Bainha estratificada. 21. Seta: Vacúolo. 22. Coccomyxa brevis. Seta: Bainha. 23. Chlorococcum sp. Seta: Colônia. 24. Gloeocystis polydermatica. Seta: Bainha lamelada. 25-26. Microspora cf. palustris. 26. Seta: Acinetos arredondados. Escala= 10µm. 46 Figuras 27-41. 27-28. Microspora cf. wittrockii. 28.Seta: Acineto globoso. 29. Organismo unicelular não identificado. 30. Trentepohlia cf. abietina. Seta: Gametângio. 31-32. Trentepohlia arborum. 32. Seta: Gametângio. 33-34. Trentepohlia monilia. 33. Seta: Célula abaulada. 35-38 Klebsormidium nitens. 36. Seta: Célula se destacando. 38. Propágulo de duas células. 39. Klebsormidium sp. 40. Mesotaenium macrococcum. Seta: Bainha. 41 Mesotaenium cf. degreyi. Escala= 10µm. 47 Figura 42. Ocorrências exclusivas e comuns das espécies de algas verdes encontradas em crostas biológicas nas áreas de cerrado dos parques estudados. 6. Conclusão Os táxons inventariados até o nível específico estão inseridos nas classes Trebouxiophyceae, Chlorophyceae, Ulvophyceae, Klebsormidiophyceae e Zygnematophyceae. A primeira foi representada pelas ordens Chlorellales (Chlorella vulgaris) e Chaetophorales (Desmococcus olivaceus), a segunda pelas ordens Chlamydomonodales (Chlamydocapsa lobata e Coccomyxa brevis), Sphaeropleales (Gloeocystis polydermatica), a terceira, por Trentepohliales (Trentepohlia arborum e T. monilia), a quarta por Klebsormidia les (Klebsormidium nitens) e a última por Zygnematales (Mesotaenium macrococcum). Os táxons que foram identificados apenas no nível genérico estão incluídos nas classes Trebouxiophyceae, Chlorophyceae, Ulvophyceae, Klebsormidiophyceae e Zygnematophyceae. As ordens representativas dessas classes, foram, respectivamente, Chlorellales (Chlorella sp.), Chlamydomonodales (Chlorococcum sp.) e Sphaeropleales (Microspora cf palustris e Microspora cf wiitrockii); Trentepohliales (Trentepohlia cf. abietina); Klebsormidia les (Klebsormidium sp.) e Zygnematales (Mesotaenium cf degreyi). A falta da observação de estruturas de reprodução e de algumas características essenciais à identificação especifica em função do estágio de desenvolvimento das populações e o insucesso nos estudos molecula res culminaram em algumas identificações não conclusivas. 48 Como já foi mencionado em muitos trabalhos, o estudo morfológico de algas de ambiente terrestres apresenta inúmeras dificuldades, particularmente pela simplicidade morfológica dos organismos (HOFFMANN, 1989). A morfologia de grupos que ocupam esse ambiente é resultado da pressão seletiva pelas baixas taxas de relação superfície-volume das células, que as tornam globulares ou elípticas, de forma que, espécies não relacionadas filogeneticamente tenham formas convergentes (HOFFMANN, 1989). Embora esses fatores exijam cautela no estudo desses organismos, o estudo morfológico ainda tem sido considerado para a implementação do conhecimento sobre distribuição e estrutura taxonômica de comunidades de microalgas (ETTL & GÄRTNER, 1995). Por meio de estudos morfológicos, muitas vezes a identificação até o nível específico não é possível, mas ainda assim, podem ajudar a fornecer informações sobre a flora e a diversidade de organismos locais (NEUSTUPA & ŠKALOUD, 2010). As hipóteses propostas no início da execução desse trabalho foram corroboradas. O levantamento de flora de algas verdes revelou uma alta riqueza desse grupo de organismos nas regiões amostradas, com 17 morfotipos registrados nas duas áreas, sendo mais diversa quando comparada com os levantamentos de crostas de outras regiões mundiais, presentes no trabalho de Belnap & Lange (2001), no qual o máximo de espécies de algas verdes encontradas foram dez. Dos táxons encontrados durante o estudo, dez (59%) foram representados por organismos unicelulares, confirmando que esse tipo morfológico é o mais comum em solos de CBs. Novos registros de ocorrência para o território brasileiro também foram constatados, como foram os casos de K. nitens, G. polydermatica, C. brevis e C. lobata. Apenas uma ocorrência não foi identificada. A análise dos nutrientes, umidade, temperatura e pH do solo mostrou que não se pode correlacionar a ocorrência das espécies a partir de uma variável ambiental em específico, já que, possivelmente dois ou mais fatores agem em conjunto, propiciando a ocorrência de um conjunto diversificado de espécies. Além deles, muitos outros parâmetros podem influenciar a composição da flora de um determinado local, tais como outras características do solo não estudadas nesse trabalho, clima e sombreamento. Os cultivos artificiais foram enriquecedores para o trabalho, de modo que permitiram a observação de espécies não antes observadas nas amostras de solos, possivelmente pelo oferecimento de condições e nutrientes inexistentes no ambiente natural, possibilitando o crescimento de uma flora potencial. O estabelecimento de cultivos artificiais também foi útil para o estudo taxonômico, pois permitiu a observação de estruturas de reprodução, o que complementou o conjunto de dados para a identificação dos táxons (em vários níveis). 49 No que diz respeito aos estudos moleculares, a maior dificuldade encontrada foi relacionada à extração do material genético, especialmente de organismos unicelulares, pela pequena biomassa e, algumas vezes, pela presença de paredes celulares espessas. Aliado a isso, a ausência de primers específicos para os diferentes grupos encontrados no trabalho também tornou-se um obstáculo para a obtenção de dados moleculares. Esse trabalho foi pioneiro em ilustrar a ocorrência de algas verdes em solos de crostas biológicas no Brasil, além de ser o segundo envolvendo estruturas e características de crostas para o país. Pelo pioneirismo, poderá dar subsídios para futuros estudos com o tema, além de se tratar de um levantamento taxonômico da diversidade de algas verdes de áreas do cerrado brasileiro. 50 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AB`SABER, A.N. Os domínios de natureza no Brasil: potencialidades paisagísticas. Ateliê Editorial, São Paulo. 2005. 159p. ABOAL, M.; LLIMONA, X. Aportaciones al conocimiento de la flora del río Mula, Limnética, v. 1, p. 141-147, 1984. AGARDH, C.A. Systema algarum. Lund, Sweden: Berling. 1824. 312p. AKYIAMA, M. On some Brazilian species of Trentepohliacea. Memoirs of the Faculty of Education Shimane University. Natural Science, v. 5, p. 81-95, 1971. AKIYAMA, M.; HIROSE, H. Physolinum monilia (De Wildem.) Printz, A newly found subaerial algae from Japan. Bulletin of the Japanese Societe of Phycology, v. 15, p. 127-131, 1967. ÁLAVAREZ COBELAS, M. Las algas de una charka ganadera temporal: susucesión en relación con los factores ambientales. Collectanea Botanica, v. 13, p. 709-722, 1982. ANANTANI, Y.S.; MARATHE, D.V. Soil aggregating effects of some algae occurring in the soils of Kutch and Rajasthan. Journal of the University of Bombay, v. 41, p. 94-100, 1974. ARAÚJO, A.; BUENO, N.C.; MEURER, T.; BICUDO, C.E.M. Charophyceae. In: FORZZA, R.C. (Ed.) Catálogo de plantas e fungos do Brasil. Rio de Janeiro: Andrea Jakobsson Estúdio; Instituto de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro, p. 310-334, 2010. ARAUJO, C.O.; CONDEZ, T.H.; SAWAYA, R.J.S. Anfíbios Anuros do Parque Estadual das Furnas do Bom Jesus, sudeste do Brasil, e suas relações com outras taxocenoses no Brasil. Biota Neotropical, v. 9, p. 77-98, 2009. ASHLEY, J.; RUSHFORTH, S.R.; JOHANSEN, J.R. Soil algae of cryptogamics crusts from the Uintah Basin. Utah. USA. Great Basin Naturalist, v. 45, p. 432-442, 1985. BECQUEREL, P. La vie latente de quelques algues et animaux inferieurs aux basses temperatures et la conservation de la vie dans l'univers. Comptes Rendus de I Acadamie des Sciences, v. 202, p. 978-981, 1936. BELNAP, J. The potencial roles of biological soil crusts in dryland hidrologic cycles. Hydrological Processes, v. 20, p. 3159-3178, 2006. 51 BELNAP, J.; HARPER, K.T. Influence of cryptobiotic soil crusts on elemental content of tissue of two desert seed plants. Arid Soil Research Rehabilitation, v. 9, p. 107-115, 1995. BELNAP, J; LANGE, O.L. Biological soil crusts: structure, function and management. Ecological Studies, 2001, 496p. BELNAP, J.; PHILLIPS, S.L.; TROXLER, T. Soil lichen and moss cover and species richness can be highly dynamic: The effects of invasion by the annual exotic grass Bromus tectorum, precipitation, and temperature on biological soil crusts in SE Utah, Applied Soil Ecology, v. 32, p. 63–76, 2006. BELNAP, J.; ROSENTRETER, R.; LEONARD, S.; KALTNECKER, J.H; WILLIANS, J.; ELDRIDGE, D. Biological soil crusts: ecology and management. Tech Ref 1730-2, US Department of Interior Bureau of Land Management, Denver, CO, 2001. BICUDO, C.E.M.; MENEZES, M. Gêneros de algas de águas continentais do Brasil (chave para identificação e descrições) (Org.) BICUDO, C.E. de M, MENEZES, M. São Carlos, RiMa, 2006, 508p. BICUDO, C.E.M.; RAMIREZ, R.J.J.; TUCCI, A.; BICUDO, D.C. Dinâmica de Populações Fitoplanctônicas em Ambiente Eutrofizado: O Lago das Garças, São Paulo. In: HENRY, R. (Ed.) Ecologia de Reservatórios: estrutura, função e aspectos sociais: Botucatu: FUNDIBIO/FAPEST. 1999, 800 p. BICUDO, C.E.M.; SANTOS, C.I. Criptógamos do Parque Estadual das Fontes do Ipiranga, São Paulo, SP. Algas, 15: Chlorophyceae (Trentepohliales). Hoehnea, v. 28, p. 183-190, 2001. BISCHOFF, H.W.; BOLD, H.C. Some soil algae from Enchanted Rock and related algal species, University of Texas, 1963, 95p. BOLD, H.C. The cultivation of algae. Botanical Review, v. 8, p. 69-138, 1942. BRADY, N.C.; WEIL, R.R. The nature and properties of soils . Prentice- Hall Inc., 1996, 740p. BRANCO, I.H.D.C.; DOMINGUES; E.N.; SÉRIO, F.C.; DEL CALI, I.H; MATTOS, I.F.A.; BERTONI, J.E.A.; ROSSI, M.; ESTON, M.R.; PFEIFER, R.M.; ANDRADE, W.J. Plano conceitual de manejo - Parque Estadual das Furnas do Bom Jesus, município de Pedregulho, SP. Revista do Instituto Florestal, v. 3, p. 137-155, 1991. 52 BROADY, P.A. A new genus and two new species of terrestrial chlorophycean algae from Signy Island, South Orkney. British Phycological Journal, v. 12, p. 7-15, 1997. BROADY, P.A. Algae in microbiotic crusts of semi-arid soils of western New South.Wales. Unpubl report, 1998. BROADY, P.A.; ENGERFELD, M. Tree new species and a new record of Chaetophoracean (Chlorophyta) algae from terrestrial habitats in Antartica. European Journal of Phycology, v. 28, p. 25-31, 1993. BROADY, P.A.; FLINT, E.A.; NELSON, W.A.; CASSIE COOPE, V.; DE WINTON, M.D.; NOVIS, P.M. Phylum Chlorophyta and Charophyta: green algae. In: GORDON, D.P. (Ed.) New Zealand inventory of biodiversity. Kingdoms Bacteria, Protozoa, Chromista, Plantae, Fungi. Christchurch: Canterbury University Press, v. 3, p. 347-381, 2012. BROTHERSON, J.D.; RUSHFORTH, S.R. Influence of cryptogamic crusts on moisture relantionships of soils in Navajo National Monument, Arizona. Great Basin Naturalist, v. 43, p. 73-78, 1983. BÜDEL, B. Synopsis: comparative biogeography of soil crust biota. In: BELNAP, J, LANGE, O.L.(Eds.) Biological soil crusts: structure, function and management. Springer, Berlin Heidelberg New York, 2001, p. 141-152. BÜDEL, B. Microorganisms of biological crusts on soil surfaces. Soil Biology, v. 3, p. 307- 323, 2005. CAMBRA SÁNCHEZ, J.; ÁLVAREZ COBELAS, M.; ABOAL SANJURJO, M. Lista florística y bibliográfica de los clorófitos (Chlorophyta) de la Península Ibérica, Islas Baleares e Islas Canarias. Burgos: Asociación Española de Limnología, 1998, 614p. CAMERON, R.E. Communities of soil algae occurring in the Sonoran desert in Arizona. Journal Arizona Acadamy of Science, v. 1, p. 85–88, 1960. CAMERON, R.E. Comparison of soil microbial ecosystems in hot, cold, and polar desert regions. In: RODIN, L.E. (Ed.) The eco-physiological foundation of ecosystems productivity in arid zones.Nauk, Leningrad, USSR, p. 185–192, 1972.