ISSN 1809-4678 Med. Vet. 2011 dez.; 5(4 Supl. 1): 176 Simpósio Internacional de Diagnóstico por Imagem. 30 de Novembro a 02 de Dezembro de 2011. Recife – Pernambuco, Brasil. Aspectos radiográficos e ecocardiográficos da Tetralogia de Fallot em canino da raça Border Collie: relato de caso (Echocardiographic and radiographic aspects of tetralogy of Fallot in a Border Collie: case report) Karen Maciel Zardo 1 ; Alexandra Frey Bellota 1 ; Daniel Diola Bento 2 ; Priscilla Macedo Souza 1 ; Hugo Salvador Oliveira 1 ; Débora Rodrigues Santos 1 ; Viviam Rocco Babicsak 1 ; Maria Jaqueline Mamprim 1 ; Maria Lúcia Gomes Lourenço 2 1Diagnóstico por Imagem, Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ), Universidade Paulista Julio de Mesquita Filho (UNESP). Botucatu, São Paulo, Brasil 2Clínica Médica de Pequenos Animais, FMVZ, UNESP. Botucatu, São Paulo, Brasil. *Autor para correspondencia: . kmz@bol.com.br Resumo A tetralogia de Fallot é uma mal formação cardíaca complexa caracterizada por quatro defeitos anatômicos, sendo eles a estenose da valva pulmonar, a hipertrofia ventricular direita, o defeito septal interventricular e a dextroposição da aorta. Técnicas de imaginologia são úteis no diagnóstico da doença, tais como a radiografia para triagem e a ecodopplercardiografia como método diagnóstico definitivo. Objetiva-se relatar os aspectos radiográficos e ecodopplercardiográficos de um caso de tetralogia de Fallot em um cão de 10 meses da raça Border Collie. Palavras Chave: cardiopatia congênita, tetralogia de Fallot, cão. Abstract Tetralogy of Fallot is a complex cardiac malformation characterized by four anatomical defects: pulmonary valve stenosis, right ventricular hypertrophy, interventricular septal defect and aortic dextroposition. Imaging techniques are useful in the diagnosis of this disease, such as radiography for screening and Doppler echocardiography for a definitive diagnosis. Our objective is to report the radiographic and Doppler echocardiographic aspects of a tetralogy of Fallot case in a 10 month-old Border Collie dog. Key words: congenital heart defect, tetralogy of Fallot, dog. Introdução A tetralogia de Fallot (TF) é uma mal formação cardíaca complexa, raramente diagnosticada, caracterizada por quatro defeitos anatômicos, sendo eles a estenose da valva pulmonar, a hipertrofia ventricular direita (VD), o defeito septal interventricular e a dextroposição da aorta (ETTINGER & SUTER, 1970; BONAGURA, 1992; FOSSUM, 1997; LARSSON et al., 2000). O desvio do fluxo através do defeito septal interventricular e a estenose pulmonar causam cianose e hipoxemia. (ETTINGER & SUTER, 1970; BONAGURA, 1992). Há uma predisposição racial em cães, sendo o Bulldog Inglês, Keeshond, Poodles, Schnauzers, Fox Terrier, Collie e Pastor de Shetland os mais acometidos (BONAGURA, 1992; FOSSUM, 1997; LARSSON et al., 2000). Os principais achados clínicos são retardo no crescimento, intolerância a exercício, fraqueza, dispnéia e síncopes (BONAGURA, 1992; LARSSON et al., 2000). A TF pode ser tolerada durante anos pelo animal, principalmente se o fluxo pulmonar for mantido e a policitemia secundária for controlada, porém a morte súbita é frequente nesses animais (BONAGURA, 1992). O tratamento pode ser clínico ou cirúrgico (BONAGURA, 1992; LARSSON et al., 2000), embora seja descrito a ocorrência de 75% de mortalidade na intervenção cirúrgica (LARSSON et al., 2000). Atualmente, com a melhoria dos métodos de diagnóstico por imagem, principalmente o ecodopplercardiograma, o diagnóstico da TF é mais preciso e seguro (LARSSON et al., 2000). Dentre as técnicas de imaginologia úteis no diagnóstico desta doença, podemos destacar o exame radiográfico pois evidencia aumento ventricular direito, dilatação de artéria pulmonar e hipoperfusão pulmonar, já o ecocardiograma é o meio de diagnóstico mais eficaz, no qual se observa hipertrofia ventricular direita, dimensões reduzidas da cavidade ventricular esquerda, defeito septal interventricular, permitindo o fluxo sanguíneo entre os ventrículos, dextroposição ISSN 1809-4678 Med. Vet. 2011 dez.; 5(4 Supl. 1): 177 Simpósio Internacional de Diagnóstico por Imagem. 30 de Novembro a 02 de Dezembro de 2011. Recife – Pernambuco, Brasil. aórtica e estenose de valva pulmonar (BONAGURA, 1992; FOSSUM, 1997; TIDHOLM, 1997; LARSSON et al., 2000). Relato do caso Foi atendido no hospital veterinário da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da Unesp- Botucatu, um canino fêmea da raça Border Collie, dez meses de idade, com queixa principal de cansaço fácil, pré-síncopes durante passeios, distrição respiratória, cianose, tosse seca em crises e posição ortopnêica com início há 4 meses. À auscultação foi identificado sopro grau IV/VI diastólico, mais evidente em foco pulmonar e aórtico com campos pulmonares limpos. O animal foi encaminhado ao serviço de Diagnóstico por Imagem para avaliação radiográfica e ecocardiográfica, com suspeita de estenose subaórtica e estenose pulmonar. O exame radiográfico revelou aumento de silhueta cardíaca com abaulamento mais evidente em átrio direito (AD), VD e arco aórtico, associado a discreto deslocamento dorsal de trajeto traqueal e padrão pulmonar broncointersticial difuso discreto. Ao exame ecodopplercardiográfico foi visibilizada 1) hipertrofia concêntrica do VD, com sua espessura (1,41cm) maior que a do VE (1,28cm) - a razão entre as espessuras das paredes livre dos VD e VE foi de 1,10; 2) aumento do diâmetro da raíz aórtica (1,60cm) com seu desvio para o VD (dextroposição) e fluxo sanguíneo convergindo de ambos os ventrículos para a aorta; 3) descontinuidade do septo interventricular com a parede anterior da aorta com fluxo sanguíneo entre os dois ventrículos, sendo identificado desvio sanguíneo da direita para a esquerda e vice- versa e 4) válvula pulmonar espessada, com folhetos imóveis caracterizando a estenose de pulmonar (figura1). A B C D E F Figura 1: Imagens ecodopplercardiográficas pela janela paraesternal direita em eixo longitudinal (A, B, E e F) e eixo transversal (C) e janela apical esquerda 4 câmaras (D) demonstrando os quatro defeitos que compõem a tetralogia de Fallot. A – hipertrofia do ventrículo direito (seta). B – dextroposição aórtica (seta). C – estenose pulmonar, com fluxo sanguíneo turbulento pela válva. D – comunicação interventricular (civ). E – fluxo sanguíneo dos dois ventrículos convergindo para a aorta (seta aberta). F- desvio do fluxo sanguíneo do ventrículo direito para o ventrículo esquerdo (seta aberta). VD: Ventrículo Direito. VE: Ventrículo Esquerdo. AE: Átrio Esquerdo. AD: Átrio Direito. AO – Aorta. PULM – Tronco da Pulmonar. artéria pulmonar ISSN 1809-4678 Med. Vet. 2011 dez.; 5(4 Supl. 1): 178 Simpósio Internacional de Diagnóstico por Imagem. 30 de Novembro a 02 de Dezembro de 2011. Recife – Pernambuco, Brasil. Discussão e Conclusão O exame radiográfico pode ser utilizado como exame de triagem e sugerir a TF como diagnóstico diferencial, ao se observar abaulamentos na silhueta cardíaca correspondentes às regiões acometidas pela doença (VD e arco aórtico), principalmente quando se tratar de paciente cianótico com menos de 12 meses de idade. No presente caso, diante da suspeita clínica de estenose subaórtica ou estenose pulmonar e dos achados radiográficos supracitados, o exame ecodopplercardiográfico foi de fundamental importância para o diagnóstico definitivo. A prevalência da tetralogia de Fallot em cães foi estimada em apenas 1 por 4.000 (KIENLE & WILLIAM, 2005), portanto, trata-se de uma doença congênita rara, que atualmente é mais frequentemente diagnostica devido à introdução desse exame na rotina veterinária (LARSSON et al., 2000). O exame ecocardiográfico pode, com alto nível de precisão diagnóstica, identificar todos os componentes da tetralogia de Fallot (KIENLE & WILLIAM, 2005). Com relação à hipertrofia do ventrículo direito, estudos anteriores relatam que a razão entre as espessuras das paredes livre dos ventrículos direito e esquerdo em cães com essa doença foi de 1 a 2,3, sendo que o normal é de 0,4 a 0,8 (RINGWALD & BONAGURA, 1988). No presente relato, essa relação foi de 1,10, estando de acordo com a literatura consultada. O defeito do septo interventricular normalmente é identificado na localização típica, subcristal e perimembranosa. O exame ainda permite avaliar a localização e a gravidade da estenose pulmonar e o fluxo sanguíneo por essa estrutura, além da posição exata da raíz aórtica e de sua repercussão hemodinâmica (KIENLE & WILLIAM, 2005). O êxito diagnóstico de tal relato é que suporta a relevância de divulgação do mesmo além de reforçar a indicação da ecocoardiografia nas doenças cardíacas. Referências BONAGURA, J.D. Moléstia cardíaca congênita. In: ETTINGER, S.J. Tratado de medicina interna veterinária - Moléstias do cão e do gato. São Paulo : Manole, 1992. p.1026-82. ETTINGER, S.J.; SUTER, P.F. Congenital heart disease. In: ETTINGER, S.J.; SUTER, P.F. Canine cardiology. Philadelphia :Saunders, 1970. p.497-602. FOSSUM, T.W. Surgery of the cardiovascular system. In: FOSSUM, T.W. Small animal surgery. Missouri : Mosby-Year Book, 1997. p.575-608. KIENLE, R.D,; WILLIAM, T.P. Ecocardiografia. In: NYLAND, T.G.; MATTOON, S.J.Ultra-som Diagnóstico em Pequenos Animais. 2.ed. São Paulo : Roca, 2005. 409-412. LARSSON, M.H.M.A. et al. Clinical diagnosis and alternative surgical treatment of tetralogy of Fallot in a dog. A case report. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, v.52, n.5, p.433-436, 2000. LEW, L.J. et al. Open-heart correction of tetralogy of Fallot in an acyanotic dog. J Am Vet Med Assoc, v.213, n.5, p.652-657, 1998. RINGWALD R J; BONAGURA JD. Tetralogy of Fallot in the dog: Clinical findings in 13 cases. J Am Anim Hosp Assoc, 1988;24:33-43 TIDHOLM, A. Retrospective study of congenital heart defects in 151 dogs. J Small Anim Pract, v.38, n.3, p.94-98, 1997.