Luis Paulo Mezzina Freitas Estudo Computacional de estrutura atômica e eletrônica em proteínas eletroativas de bactérias do gênero Geobacter Dissertação apresentada ao Instituto de Química de Araraquara, da Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisi- tos para a obtenção do título de Mestre em Biotecnologia. Orientador: Prof. Dr. Gustavo Troiano Feliciano Araraquara 2018 Elaboração: FICHA CATALOGRÁFICA Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação Biblioteca do Instituto de Química, Unesp, câmpus de Araraquara F862e Freitas, Luis Paulo Mezzina Estudo computacional de estrutura atômica e eletrônica em proteínas eletroativas de bactérias do gênero Geobacter / Luis Paulo Mezzina Freitas. – Araraquara-SP : [s.n.], 2018 82 f. : il. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Instituto de Química Orientador: Gustavo Troiano Feliciano 1. Simulação por computador. 2. Funcionais de densidade. 3. Estrutura eletrônica. 4. Química quântica. 5. Dinâmica molecular. I. Título. DADOS CURRICULARES IDENTIFICAÇÃO Nome: Luis Paulo Mezzina Freitas Nome em citações bibliográficas: FREITAS, L.P.M. ENDEREÇO PROFISSIONAL Rua Prof. Francisco Degni, 55 Bairro: Quitandinha 14800-060 - Araraquara, SP Instituto de Química - UNESP Departamento de Físico-Química FORMAÇÃO ACADÊMICA (2007-2012) Engenharia Mecânica, Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, UNESP TRABALHO APRESENTADO EM CONGRESSO • IV ESCOLA BRASILEIRA DE MODELAGEM MOLECULAR, realizada na Univer- sidade Federal do ABC, no período de 7 a 11/08/2017. Apresentação de trabalho na forma de pôster: ”Structural and electronic analysis of helical peptides with aro- matic agglomerates”. OUTROS • Estágio docência na disciplina de Física II para o curso de Engenharia de Biopro- cessos e Biotecnologia da UNESP-Araraquara, de março a julho de 2017. Dedico este trabalho à memória de meu avô, Mário Mezzina. Agradecimentos Agradeço aos meus pais, Ana Maria Mezzina Freitas e Ronaldo Freitas, por todo amor, apoio e suporte incondicional, sem os quais não seria possível chegar até aqui. Agradeço à minha irmã, Ana Luiza Mezzina Freitas, pelo carinho e incentivo em todos os momentos. Agradeço à minha avó, Maria A. C. Mezzina, pela atenção e carinho de sempre. Agradeço à minha namorada, Giovana D. G. Azevedo, por todo compa- nheirismo, carinho, compreensão e paciência, mesmo nos momentos mais difíceis. Agradeço a todos os meus familiares e amigos que torceram pelas minhas conquistas. Agradeço ao Professor Gustavo Troiano Feliciano por toda confiança depositada em mim ao oferecer esta oportunidade e pelo excelente professor e orientador que é, sempre muito participativo e empenhado em contribuir com meu desenvolvimento acadêmico e profissional. Agradeço a todos os colegas do grupo Nanobionics pelo conhecimento comparti- lhado nestes últimos dois anos, em especial Welder F. A. Callera e Melany I. G. Nichol- son pela constante troca de ideias, experiências e opiniões. Agradeço ao Instituto de Química de Araraquara por toda a infraestrutura, aos mem- bros do corpo docente que contribuíram para a minha formação e aos funcionários da Universidade por toda a atenção e ajuda. Resumo A pilina é um peptídeo produzido pela bactéria redutora de metais Geobacter sulfur- reducens. Este peptídeo compõe um sistema biológico que tem atraído a atenção de pesquisadores, devido às suas propriedades condutoras interessantes. Estudos indicam que a pilina é a subunidade de uma estrutura filamentosa denominada pilus e que o conjunto desses filamentos formam uma proteína monolateral, a pili. Investi- gações revelaram processos de transferência eletrônica na faixa de micrômetros de comprimento, o que sugere, mais provavelmente, um regime de transporte por hop- ping. Além disso, correntes associadas à topografia referente ao filmaneto indicaram um comportamento ohmico, característica associada à metais. A ausência de cofato- res e citocromo tornam essas propriedades ainda mais interessantes, indicando um transporte eletrônico ao longo da própria estrutura da proteína. Este trabalho apre- senta a investigação de fatores que possam contribuir para um transporte de carga tão eficiente sem a presença de citocromo. Para isso, análises foram realizadas em aglomerados aromáticos dentro da estrutura de modelos que mimetizam a pilina e de modelos propostos para o pilus. O estudo é feito utilizando, primeiramente, métodos teóricos clássicos com os pacotes de simulação AMBER e GROMACS, e em seguida cálculos híbridos QM/MM, com tratamento quântico baseado na Teoria do Funcional da Densidade, implementada no código computacional CPMD, para a obtenção da es- trutura eletrônica dos grupos aromáticos. Os peptídeos miméticos apresentaram gap energético entre HOMO e LUMO consideravelmente grande em água, mas reduzido no vácuo, principalmente em aglomerados de tirosina, onde os resultados indicaram características próximas de um metal, o que sugeria presença de aglomerados aro- máticos constituídos de alguns resíduos de tirosina e isolados do solvente no pilus. Entretanto, para os dois modelos de pilus estudados, estes grupos interagiam com o solvente, apresentando um gap de mais de 3 eV em água e de mais de 1 eV no vácuo. O potencial eletrostáticos apresentou uma função moduladora sobre o gap HOMO-LUMO e a composição do aglomerado utilizado na análise apresentou grande influência no gap obtido no vácuo. A localização do HOMO e LUMO não indicou a delocalização eletrônica esperada para um processo de transferência eletrônica por tunelamento, mas ofereceu indícios para o hopping em razão da ocupação de dife- rentes resíduos de tirosina pelo mesmo elétron em água para diferentes instantes da dinâmica. No vácuo, os resíduos de lisina provocaram grande alteração no ambiente eletrostático, impactando no potencial redox dos resíduos de tirosina. Palavras-chave: DFT; Pilina; QM/MM; estrutura eletrônica; aromático. Abstract Pilin is a peptide produced by the metal reducing bacteria Geobacter sulfurreducens. This peptide is present in a biosystem that has been attracting attention due to its inte- resting conductive properties. Studies indicate that pilin is a subunit of a filamentous structure called pilus and the arrangement of these filaments form a unilateral protein called pili. Investigations revealed electronic transfer processes in the length range of micrometers, what suggests a hopping transport mechanism. Besides, currents associ- ated with topography indicated an ohmic behavior along the filament, which is a metallic characteristic. The absence of cofactors and cytochrome is even more interesting be- cause it indicates an electronic transport through the protein structure. This dissertation presents an investigation of factors that may contribute to a highly efficient charge trans- port without a cytochrome. Therefore, it was made an analysis in aromatic agglomera- tes within the structure of models that mimic pilin and within proposed models for pilus. Initially, it was used methods based on classical mechanics with the simulation packa- ges AMBER and GROMACS, then hybrid calculations QM/MM were performed with a quantum approach based on the Density Functional Theory implemented in CPMD computer code. The mimetic peptides present a considerably high energetic gap for HOMO-LUMO in water. Nevertheless it was reduced in vacuum, mainly for groups of tyrosine where metal-like characteristics were indicated by the results, which sugges- ted that there might be tyrosine residues isolated from water in pilus. In contradiction, the results of the models for pilus showed interactions of the aromatic groups with the solvent and the gap observed in water (more than 3 eV) remained larger than in vacuum ( more than 1 eV). The electrostatic potential presented a modulating role with respect to HOMO-LUMO gap and the aromatic residues used in the analysis appear to have an influence on the gap obtained in vacuum. In addition, The delocalized electrons were not observed in HOMO and LUMO that could suggest a tunneling transport mechanism. However a variation of the tyrosine residue for HOMO occupation was observed in diffe- rente moments of the dynamics suggesting a hopping mechanism. Lysine amino acids caused a change in the electrostatic environment leading to an impact on tyrosine re- dox potential. Keywords: DFT; Pilin; QM/MM; electronic structure; aromatic. 8 Lista de ilustrações Figura 1.1–Comparação estrutural entre as pilinas produzidas pela Pseudomonas ae- ruginosa(esq.) e pela Geobacter sulfurreducens(dir.)(1) . . . . . . . . . . 16 Figura 1.2–Sequência de aminoácidos para a pilina PAK (10QW) e para a pilina GS (2M7G). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 Figura 1.3–Representação, em New Cartoon, de um modelo obtido por homologia(1) para fibra produzida pela espécieGeobacter sulfurreducens, com destaque para os resíduos aromáticos de fenilalanina (amarelo) e tirosina (vermelho) (esq.). Ampliação em uma pequena região da fibra, evidenciando os con- tatos entre os grupos aromáticos (dir.). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18 Figura 1.4–Representação, emNew Cartoon, de ummodelo obtido através de parâme- tros estruturais(2) para fibra produzida pela espécie Geobacter sulfurredu- cens, com destaque para os resíduos aromáticos de fenilalanina (amarelo) e tirosina (vermelho) (esq.). Ampliação em uma pequena região da fibra, evidenciando os contatos entre os grupos aromáticos, apresentando uma distância de aproximadamente 4 Å entre cada anel (dir.). . . . . . . . . . 19 Figura 1.5–Resíduos aromáticos Phe1, Phe24 e Tyr27 em diferentes subunidades or- ganizados em uma configuração helicoidal ao longo da fibra(2). Os resí- duos de fenilalanina estão representados em amarelo, enquanto que os de tirosina estão em vermelho. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 Figura 3.1–Métodos utilizados para os modelos miméticos e para o pilus. . . . . . . . 22 Figura 3.2–Peptídeos em caixa cúbica com água . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 Figura 3.3–Pilus, em representação New Cartoon, solvatado em caixa retangular . . 26 Figura 3.4–Pilus, em representação New Cartoon, solvatado em caixa retangular . . 27 Figura 3.5–Representação esquemática dos métodos utilizados no estudo da configu- ração eletrônica dos modelos miméticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Figura 3.6–Representação da partição QM em destaque, para molécula de politirosina. Dummy atom de hidrogênio presente para saturar os carbonos γ na fronteira. 39 Figura 3.7–Representação da partição QM em destaque, para o pilus. Dummy atom de hidrogênio presente para saturar os carbonos γ na fronteira. . . . . . . 41 Figura 4.1–Representação dos ângulos diedros para as regiões numeradas da molé- cula de politirosina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 Figura 4.2–Representação dos ângulos diedros para as regiões numeradas da molé- cula de polifenilalanina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43 Figura 4.3–Representação de instantes do início da dinâmica (1 ns) para os peptídeos modelo. Enquanto que a politirosina mantém a estrutura helicoidal, fica evidente a descaracterização completa da estrutura em hélice na polifeni- lalanina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44 Figura 4.4–Representação sequencial da evolução da hélice de politirosina. Retratos correspondentes a (da esquerda para a direita): Primeiro instante da dinâ- mica molecular, 5 ns de evolução e 10 ns de evolução (final da dinâmica). 44 Figura 4.5–Representação sequencial da evolução da hélice de polifenilanina. Retra- tos correspondentes a (da esquerda para a direita): Primeiro instante da dinâmica molecular, 5 ns de evolução e 10 ns de evolução (final da dinâ- mica). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 Figura 4.6–Variação da distância entre os centros de massa (a) e o cosseno do ângulo entre os planos formados pelos anéis (b) dos resíduos 7 e 10 da cadeia lateral da polifenilalanina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 Figura 4.7–Variação da distância entre os centros de massa (a) e o cosseno do ângulo entre os planos formados pelos anéis (b) dos resíduos 7 e 11 da cadeia lateral da politirosina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 46 Figura 4.8–Representação da partição QM definida a partir dos contatos entre os anéis para os sistemas (i) e (ii). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 Figura 4.9–Representação da partição QM definida a partir dos contatos entre os anéis para os sistemas (iii) e (iv). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Figura 4.10–Densidade de estados eletrônicos em um dos frames da politirosina com estrutura helicoidal fixa. A abertura do gap é claramente observada na presença de água. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Figura 4.11–Mapa de diferença de potencial, em Volts, da hélice de tirosina no Frame 3914, representando a diferença de potencial para o sistema, em cada ponto da malha, na ausência e presença de água. . . . . . . . . . . . . . 49 Figura 4.12–Densidade de estados eletrônicos em um dos frames da polifenilalanina com estrutura helicoidal fixa. A abertura do gap é observada na presença de água, embora menos pronunciada quando comparada à politirosina. . 50 Figura 4.13–Mapa de diferença de potencial, em Volts, da hélice de fenilalanina no Frame 5362, representando a diferença de potencial para o sistema, em cada ponto da malha, na ausência e presença de água. . . . . . . . . . . 51 Figura 4.14–Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de tirosina. 51 Figura 4.15–Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de feni- lalanina. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 Figura 4.16–Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de tiro- sina. Resultados para os peptídeo sem estrutura helicoidal fixa. . . . . . 53 Figura 4.17–Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de feni- lalanina. Resultados para os peptídeo sem estrutura helicoidal fixa. . . . . 53 Figura 4.18–Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica molecular do peptídeo de politirosina com estrutura helicoidal fixa. Repre- sentação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. . . . . . . 54 Figura 4.19–Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica molecular do peptídeo de politirosina sem estrutura helicoidal fixa. Repre- sentação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. . . . . . . 55 Figura 4.20–Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica molecular do peptídeo de polifenilalanina com estrutura helicoidal fixa. Re- presentação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. . . . . 56 Figura 4.21–Distâncias entre átomos de hidrogênio e oxigênio presentes em uma das hélices do pilus (II). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 Figura 4.22–Distribuição radial no backbone de átomos de oxigênio do com relação aos átomos de hidrogênio. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 Figura 4.23–Distribuição radial entre resíduos aromáticos de interesse nos modelos de pilus. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 Figura 4.24–Organização dos resíduos Phe1, Phe24 e Tyr27 no início e após 75 ns de dinâmica molecular. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60 Figura 4.25–Representação da partição QM em um frame do Pilus (I). Residuos seleci- onados com base nos contatos entre os átomos de anéis vizinhos. Distân- cias verificadas de aproximadamente 4Å. . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 Figura 4.26–Representação da partição QM em um frame do Pilus (II). Residuos seleci- onados com base nos contatos entre os átomos de anéis vizinhos. Distân- cias verificadas de aproximadamente 4Å. . . . . . . . . . . . . . . . . . 61 Figura 4.27–Representação dos resíduos carregados próximos aos grupos aromáticos em ambos os modelos de pilus. Destaque em amarelo para a cadeia lateral dos resíduos de tirosina e fenilalanina, em vermelho para os resíduos de caráter ácido e em azul para os resíduos de caráter básico. . . . . . . . . 62 Figura 4.28–Densidade de estados eletrônicos no frame do Pilus (I) correspondente ao instante inicial da dinâmica molecular. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63 Figura 4.29–Localização do HOMO e LUMO nos resíduos Phe1, Phe24 e Tyr27 do pilus (I) no instante inicial da dinâmica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 Figura 4.30–Vazamento de carga devido à presença do resíduo Lys30 no LUMO obtido para o Pilus (I) no vácuo, no instante inicial da dinâmica. . . . . . . . . . 64 Figura 4.31–Mapa da diferença de potencial em Volts obtido para o sistema no vácuo e em água, na estrutura do Pilus (I) do início da dinâmica. . . . . . . . . . . 65 Figura 4.32–Densidade de estados eletrônicos para o aglomerado aromático isolado da proteína. Coordenadas retiradas da partição QM do pilus (I) em sua estrutura correspondente ao início da dinâmica. . . . . . . . . . . . . . . 66 Figura 4.33–Localização do HOMOe LUMOno aglomerado, que corresponde à partição QM selecionada no Pilus (I), isolado da fibra. . . . . . . . . . . . . . . . 66 Figura 4.34–Densidade de estados eletrônicos no Pilus (I), para o frame correspondente a 75 ns de dinâmica molecular. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Figura 4.35–Mapa da diferença de potencial em Volts obtido para o sistema no vácuo e em água, na estrutura do Pilus (I) após 75 ns de dinâmica molecular. . . . 67 Figura 4.36–Localização do HOMO e LUMO nos resíduos Phe1, Phe24 e Tyr27 do pilus (I) após 75 ns de dinâmica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 Figura 4.37–Polarização devido às presenças do resíduo Lys30 e do terminal amina no LUMO obtido para o Pilus (I) no vácuo, na configuração após 75 ns de dinâmica. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 Figura 4.38–Densidade de estados eletrônicos para os frames 40 e 50 ns do Pilus (II). 69 Figura 4.39–Localização do HOMO e LUMO nos aglomerados que formam as partições QM do pilus (II) em 40 e 50 ns. Destaque para a polarização no frame de 50 ns na ausência de água. Representação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70 Figura 4.40–Mapa da diferença de potencial em Volts obtido para o sistema no vácuo e em água, na estrutura do Pilus (II) para os retratos correspondentes a 40 e 50 ns de dinâmica molecular. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 Figura 4.41–Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do modelo de pilus (I). 72 Figura 4.42–Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do modelo de pilus (I). 72 Figura 4.43–Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica molecular para o pilus (I). Representação em azul para o HOMO e em ver- melho para o LUMO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73 Figura 4.44–Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica molecular para o pilus (II). À esquerda, estão representados de aglome- rados com apenas 2 resíduos de tirosina. À direita, estão representados aglomerados com 4 resíduos de tirosina. Representação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 74 Sumário 1 INTRODUÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 1.1 Transporte Eletrônico em meios biológicos . . . . . . . . . . . . . . 14 1.2 Pilina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 2 OBJETIVOS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 3 METODOLOGIA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 3.1 Mecânica Molecular . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 22 3.1.1 Mecânica Molecular para os modelos miméticos . . . . . . . . . . . . . . 24 3.1.2 Mecânica Molecular para o pilus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 3.2 Mecânica Quântica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 3.2.1 Aproximação de Born Oppenheimer . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 3.2.2 O Princípio da Antissimetria e o Método Variacional . . . . . . . . . . . . 29 3.2.3 Teoria do Funcional da Densidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 3.2.3.1 Funcionais de correlação e troca . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 3.2.3.2 Pseudopotenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 3.2.4 Método Híbrido QM/MM . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 36 3.2.5 Cálculo QM/MM para os modelos miméticos . . . . . . . . . . . . . . . 37 3.2.6 Cálculo QM/MM para o pilus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 4.1 Modelos miméticos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 4.1.1 Análise estrutural dos peptídeos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 4.1.2 Estrutura eletrônica de aglomerados aromáticos nos modelos miméticos . . 47 4.2 Pilus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 4.2.1 Análise estrutural do pilus . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 4.2.2 Estrutura eletrônica de aglomerados aromáticos no pilus . . . . . . . . . . 59 5 CONCLUSÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76 REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79 13 1 Introdução A tecnologia é um conceito ligado à capacidade do ser humano de se adaptar, con- trolar e transformar o ambiente em que vive. Assim, a tecnologia é uma forma de aperfeiçoar as relações com o ambiente e seu desenvolvimento requer a ampliação do nosso conhecimento acerca dos fenômenos da natureza. Dentro deste desenvolvi- mento, podemos incluir maior eficiência de tarefas já realizadas por alguns dispositivos, aliada a um menor custo. Muitas vezes isso implica na diminuição do dispositivo utili- zado para este fim. Exemplos são os microcomputadores e seus componentes (unida- des de armazenamento de informação, memória, processadores, etc.), máquinas das quais inúmeras atividades são extremamente dependentes. No estágio presente, é necessário o conhecimento e a ciência para a manipula- ção em escala atômica e molecular da matéria: física aplicada, ciência dos materiais, química supramolecular, mecânica quântica, ciência de dispositivos, engenharia, bi- oquímica, etc., que compõem o vasto e interdisciplinar campo da Nanotecnologia. No mundo microscópico, certos fenômenos físicos se tornam muito mais pronunci- ados quando comparados com a escala macroscópica, evidenciando novas possibili- dades que permitem criar dispositivos revolucionários. Para tanto, faz-se necessária a compreensão de mecanismos já existentes na própria natureza, que foram otimizados ao longo de milhões de anos de evolução. Como exemplo, podemos citar a ação catalí- tica das enzimas, obervadas em condições normais de temperatura e pressão. Assim, sistemas biológicos apresentam alta eficiência na execução de suas tarefas em áreas de grande interesse para o campo tecnológico, como mecanismos de conversão de energia e geração de trabalho, mecânico ou químico. Contudo, o perfeito funcionamento e a alta eficiência de um biossistema necessi- tam de um ambiente químico adequado. Por isso, a reprodução correta deste ambi- ente pode conduzir ao desenvolvimento de tecnologias de alta eficiência capazes de executar suas tarefas em condições ambientes. No entanto, esta é uma tarefa desafiadora. Para reproduzir as condições desejadas, as interações nanoscópicas entre os átomos de um sistema biomolecular devem ser compreendidas, o que implica em uma análise de inúmeros graus de liberdade. A dificuldade imposta pelo número de constituintes de uma biomolécula, bem como suas inúmeras configurações possíveis, tornam complexa qualquer conclusão sobre os mecanismos de funcionamento obtida por meio de um método experimental. Somado a isso, há a complexidade da detecção da estrutura de uma macromolécula, fator de fundamental importância para determinar a função da mesma. Toda esta complexidade e estágio de eficiência foram alcançados após anos de Capítulo 1. Introdução 14 evolução, portanto, entender os mecanismos destes sistemas é de fundamental impor- tância para que se possa otimizar algumas propriedades, sem precisar esperar que o processo de seleção natural o faça. Dentro deste contexto, a simulação computacional se apresenta como uma impor- tante ferramenta com base na teoria, que fornece caminhos para o entendimento de mecanismos desejados, bem como a previsão de propriedades ainda não observadas. No entanto, o desenvolvimento da descrição atomísitca e molecular, juntamente com a evolução dos recursos computacionais são importantes para explorar a complexidade dos sistemas biológicos. 1.1 Transporte Eletrônico em meios biológicos Transferência eletrônica por meio de proteínas compõe o processo central de todas as vias de transdução de energia em células vivas (3, 4). Estudos em sistemas biológi- cos bem caracterizados, comometaloproteínas ou peptídeos sintéticos, demonstraram que as proteínas podem conduzir elétrons por dois mecanismos distintos: tunelamento (ou superexchange) ou hopping. O tunelamento é limitado à pequena distância (10 - 20 Å) que os elétrons podem migrar do doador ao aceptor por barreiras de energia potencial (como a matriz pro- téica, por exemplo). A taxa de transferência eletrônica neste processo depende da separação entre doador e aceptor, sendo máxima na distância de contato de van der Waals. Para distâncias mais longas, as proteínas desenvolveram outras vias para condu- ção eletrônica, na qual os elétrons residem por algum tempo em certas posições na cadeia protéica, como em grupos aromáticos ou nas ligações covalentes do esqueleto peptídico. Este processo é conhecido como hopping e pode ser entendido como uma série de pequenos eventos de tunelamento. Para que o elétron possa residir em determinadas regiões da proteína, estes sítios devem apresentar potenciais redox acessíveis. Aminoácidos como a fenilalanina, ti- rosina e o triptofano apresentam as características necessárias para a ocorrência do fenômeno. Todos os sistemas protéicos usados como modelos para a investigação de proces- sos de transferência eletrônica são restritos à transferência de carga por distâncias de 1-10 nm. Contudo, comprimentos de micrômetros foram observados na proteína pili, produzida pela bactéria redutora de metais Geobacter sulfurreducens(5, 6, 7, 8). Capítulo 1. Introdução 15 1.2 Pilina A pili é uma proteína monolateral formada por filamentos denominados pilus, for- mados através do arranjo helicoidal de um peptídeo, a subunidade pilina ou pilA(6). Recentemente, Reguera et al(5) purificaram a pili e investigaram sua composição química e propriedades condutoras. A proteína se revelou altamente condutora, indi- cando características de um nanofio biológico. Além disso, as correntes mais intensas foram associadas à topografia referente ao filamento e um comportamento ohmico foi registrado, indicando características metálicas na proteína. Mais interessante ainda foi a baixa quantidade de elementos inorgânicos (Fe, Cu) que auxiliam na catálise em sistemas biológicos e ausência de cofatores redox, como flavinas e quinonas(5, 9), observadas em espectroscopia de absorbância e fluorescên- cia. Apesar disso, quando filamentos da pili foram depositados ao longo de eletrodos de ouro, detectou-se uma condução de elétrons ao longo de seu comprimento a mais de 1 micrômetro de distância da extremidade do ouro(5). O grupo conseguiu medir uma resistência de 700 Mohms ao longo de um filamento de 1 micrômetro de comprimento, e taxas de transporte de cerca de 107 electrons por segundo sob um potencial de 100 mV(5). Para o diâmetro típico desta proteína de 2 a 4 nm, a resistividade medida ao longo da proteína foi 0.2-0.9 ohm.cm, a mais baixa já documentada para um fio biológico e dentro das faixas mais baixas já reportadas para nanofios de silício 5 moderadamente dopados (0.5 ohm.cm). Além disso, culturas de G. sulfurreducens em óxidos de Fe(III) apresentaram eleva- das taxas respiratórias, sendo observada uma grande concentração de pili em apenas um lado da célula(5), o que revela uma estratégia que maximiza a atividade redox sem limitar a taxa de transferência eletrônica. Um estudo recente(10) revela que a redução do óxido de Fe(III) está diretamente relacionada à condutividade da pili. Mais ainda, se a condutividade da proteína for afetada, então a transferência eletrônica de longo alcance também será, sendo esta mais eficiente quanto mais pronunciadas forem as propriedades condutoras observadas. Comparada à pili PAK produzida por outra espécie, Pseudomonas aeruginosa, a proteína produzida pela Geobacter sulfurreducens apresentou condutividade cinco or- dens de grandeza mais intensa(7). A pili PAK, por sua vez, mostrou ser uma proteína não condutora em estudos anteriores(5). Testes com biofilmes formados com a pili produzida pela G. sulfurreducens detec- taram condução por distâncias de mais de 1 cm(11), muito diferente dos resultados obtidos com outras espécies como P. aeruginosa e Escherichia coli, que apresenta- ram comportamento isolante. Esta condutividade significativa observada é comparável àquela observada em nanoestruturas de metais orgânicos como o poliacetileno. Outra característica da pili que remete à condução metálica é a correlação da condutividade Capítulo 1. Introdução 16 com a temperatura(11). Estudos ainda mostram a redução do Urânio(6), evidenciando um mecanismo com potencial para o desenvolvimento de tecnologias de aplicação à descontaminação do solo. Embora a transferência eletrônica observada na pilina seja notável, sabe-se pouco sobre a química do arranjo molecular e o caminho eletrônico pela molécula. Assim, identificar os aminoácidos mediando a transferência eletrônica na pili é uma tarefa de- safiadora e essencial para o desenvolvimento de sistemas modelos de transporte de carga. Mutações nos aminoácidos que participam usualmente deste processo, como aminoácidos aromáticos, podem resultar em mudanças estruturais e até mesmo afetar a associação das subunidades de pilina, o que torna a modelagem molecular com- putacional uma ferramenta poderosa, visto que várias possibilidades de composição química e estabilidade estrutural podem ser testadas, a um custo relativamente baixo e em um curto período de tempo. Resultados preliminares(1, 12) são consistentes com uma estrutura de pilina diver- gente e composição de aminoácidos que favorecem reações de transferência de elé- trons. O tamanho reduzido da pilina, a ausência do domínio globular com folhas-beta e o peptídio predominantemente helicoidal são características estruturais que apoiam estas observações. Figura 1.1 – Comparação estrutural entre as pilinas produzidas pela Pseudomonas aerugi- nosa(esq.) e pela Geobacter sulfurreducens(dir.)(1) Fonte: Feliciano et al.(1), 2012 A estrutura helicoidal gera um forte campo eletrostático como consequência do ali- Capítulo 1. Introdução 17 nhamento dos dipolos das ligações peptídicas. Esta orientação resulta em um mo- mento de dipolo ao longo da proteína. Espécies como a Pseudomonas aeruginosa apresentam estruturas semelhantes à pilA, mas com um domínio globular em uma das extremidades (Figura 1.1), o que altera o ambiente eletrostático gerado pela hélice. Logo, o momento de dipolo proveniente da hélice na pilina GS é conservado, criando um ambiente eletrostático mais favorável para o transporte de carga. A Figura 1.2 apresenta as sequências de aminoácidos para as pilinas PAK(13) e GS(14), sendo esta última obtida por NMR, evidenciando o tamanho reduzido da pilina GS sem o domínio globular com folhas beta. Figura 1.2 – Sequência de aminoácidos para a pilina PAK (10QW) e para a pilina GS (2M7G). PAK GS Fonte: Protein Data Bank Ainda mais, foi demonstrada que a presença em locais estratégicos de aminoáci- Capítulo 1. Introdução 18 dos carregados também modificam o ambiente eletrostático, que por sua vez também modula o processo de transferência eletrônica. Figura 1.3 – Representação, em New Cartoon, de um modelo obtido por homologia(1) para fibra produzida pela espécie Geobacter sulfurreducens, com destaque para os resíduos aromáticos de fenilalanina (amarelo) e tirosina (vermelho) (esq.). Ampli- ação em uma pequena região da fibra, evidenciando os contatos entre os grupos aromáticos (dir.). Fonte: Feliciano et al.(1), 2012 Cálculos de estrutura eletrônica para um dos modelos propostos mostraram que os estados de fronteira localizavam-se em regiões da cadeia lateral, onde os elétrons se apresentavam delocalizados. Além disso, essas regiões continham resíduos aromáti- cos como a tirosina, que podem favorecer o hopping devido ao potencial de oxidação relativamente baixo. O modelo é constituído por 18 subunidades e sua composição foi proposta por homologia com a pilina produzida pela espécie Neisseria gonorrhoeae. O modelo está representado na Figura 1.3. Outra característica a favor da transferência eletrônica via hopping é o empilha- mento dos grupos aromáticos presentes no modelo em questão. Mais recentemente, um modelo sugerido(2) (Figura 1.4) apresenta o empilhamento de resíduos aromáticos, com distâncias de aproximadamente 4 Å entre cada anel, o que sugere uma configuração favorável ao hopping. Além da configuração, este mo- delo difere do anterior apresentando 19 subunidades, porém, em uma estrutura mais compacta. Além disso, os resíduos Phe1, Phe24 e Tyr27 estão distribuídos em um arranjo periódico helicoidal ao longo de toda a fibra, como mostra a Figura 1.5 , formando um caminho potencialmente condutor. Essa organização estruturada dos anéis aro- Capítulo 1. Introdução 19 Figura 1.4 – Representação, em New Cartoon, de um modelo obtido através de parâmetros estruturais(2) para fibra produzida pela espécie Geobacter sulfurreducens, com destaque para os resíduos aromáticos de fenilalanina (amarelo) e tirosina (ver- melho) (esq.). Ampliação em uma pequena região da fibra, evidenciando os contatos entre os grupos aromáticos, apresentando uma distância de aproxima- damente 4 Å entre cada anel (dir.). Fonte: Xiao et al.(2), 2016 máticos por toda a proteína foi intencional na obtenção do modelo, sendo escolhida a conformação que apresentou menor energia. Figura 1.5 – Resíduos aromáticos Phe1, Phe24 e Tyr27 em diferentes subunidades organiza- dos em uma configuração helicoidal ao longo da fibra(2). Os resíduos de fenila- lanina estão representados em amarelo, enquanto que os de tirosina estão em vermelho. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Assim, as características citadas para este modelo indicam um possível ambiente favorável à transferência eletrônica, o que o torna interessante de ser estudado através da modelagem molecular computacional. 20 2 Objetivos Visando entender mecanismos que tornam sistemas especializados em transferên- cia de carga, procuramos caracterizar sistemas em meio solvente e no vácuo, a partir de suas estruturas moleculares. A caracterização é feita, primeiramente, por meio da modelagem molecular apli- cada a potenciais sistemas miméticos, construídos com base nos aminoácidos que supostamente contribuem para os mecanismos de transporte de carga na pilina, pep- tídeo presente na bactéria redutora de metais Geobacter sulfurreducens. Assim, os dois modelos propostos consistem em hélices de politirosina e polifenilalanina, uma vez que estes aminoácidos podem apresentar uma importante função no transporte por hopping. A modelagem destes modelos protótipos permite analisar o efeito da composição, conformação e do solvente no ambiente eletrostático e, com isso, inferir quais os fato- res que possivelmente contribuem para as propriedades condutoras da pilina. Em seguida, pretendemos submeter modelos propostos para o pilus, citados nas Figuras 1.3 e 1.4, à modelagem molecular. A partir de técnicas de amostragem, busca- mos caracterizar e estrutura eletrônica do pilus e comparar os resultados obtidos para cada modelo. Com os resultados obtidos com os modelos de pilus aliados aos resultados da mo- delagem dos modelos biomiméticos, almejamos alcançar uma melhor compreensão dos fatores que possibilitam um mecanismo tão eficiente para o transporte eletrônico. Com isso, objetiva-se contribuir para o planejamento de novos materiais e dispositi- vos híbridos orgânicos/inorgânicos mais eficientes e acessíveis, tanto para a geração quanto para a condução de eletricidade, com contribuição ao desenho de novos dispo- sitivos, com aplicações em nanotecnologia. 21 3 Metodologia O trabalho realizado envolve o uso da modelagem molecular aplicada a diferentes sistemas: • Modelos miméticos que auxiliam no entendimento das propriedades condutoras observadas na pilina, a partir da análise do efeito da hélice e dos grupos aromá- ticos na estrutura eletrônica. • Modelos da pilina propostos em trabalhos anteriores, enfatizando o estudo da estrutura eletrônica de sítios com aglomerados aromáticos através de uma abor- dagem híbrida QM/MM. A modelagem molecular é um método teórico computacional, que faz uso das leis da física implementadas em um algoritmo. A técnica é muito utilizada na química e biologia, principalmente para sistemas com alta complexidade, com o objetivo de mi- metizar sistemas moleculares. A escolha de ummétodo computacional é uma consequência do número de átomos de um sistema aliado à quantidade de equações diferenciais a serem resolvidas, o que torna inviável o cálculo sem o uso de um computador. Por se tratar de um método teórico, a descrição do sistema é determinante para a confiabilidade dos resultados de interesse, podendo ser feita através da Mecânica Mo- lecular (MM), que é baseada na Mecânica Clássica, ou através da Mecânica Quântica (QM). A escolha da abordagem depende das propriedades que se almeja extrair do sis- tema. Além disso, a capacidade computacional é outro fator limitante, o que pode tornar a descrição por meio da Mecânica Quântica inviável. Neste caso, quando a representação eletrônica é necessária, métodos híbridos se tornam uma alternativa. Estes métodos possibilitam a decrição do sistema através da Mecânica Clássica, com excessão de uma região menor onde os elétrons são representados explicitamente, ou seja, a abordagem é quântica. Neste caso, o sistema é dividido em duas partes: Par- tição QM e Partição MM. Estes termos serão muito utilizados ao longo deste trabalho. A simulação dos sistemas propostos foram divididas em duas etapas. A primeira etapa consiste no método clássico de cálculo seguida por uma análise estrutural. A segunda consiste no método híbrido QM/MM, onde a estrutura eletrônica foi avaliada por meio de amostragens. A Figura 3.1 apresenta os métodos utilizados de forma sequencial para os miméticos e para o pilus, respectivamente. A etapa de Mecânica Molecular para os modelos miméticos foi realizada com o pa- cote AMBER12(15), enquanto que para o pilus foi realizada como pacoteGROMACS(16). Capítulo 3. Metodologia 22 Figura 3.1 – Métodos utilizados para os modelos miméticos e para o pilus. Powered by TCPDF (www.tcpdf.org) Fonte: Elaborado pelo próprio autor Os cálculos híbridos QM/MM foram realizados para todos os sistemas com o pacote CPMD(17). Todas as ilustrações de estruturas moleculares foram obtidas no VMD(18). As es- truturas dos modelos miméticos foram construídas com o AVOGADRO(19). 3.1 Mecânica Molecular A modelagem clássica descreve o átomo apenas como função da posição nuclear, desprezando o movimento eletrônico, ou seja, é um método teórico clássico. Esta abordagem apresenta vantagens com relação ao custo computacional, uma vez que o número de variáveis necessárias para descrever o sistema é pequeno. Contudo, uma das propostas do trabalho é estudar a influência da estrutura e composição dos peptí- deos no potencial e na estrutura eletrônica. Assim, métodos clássicos de cálculo não são mais suficientes, concentrando esta etapa de simulação em uma fase preliminar e de análise puramente estrutural. A representação padrão da energia potencial U para esta abordagem é dada atra- Capítulo 3. Metodologia 23 vés da seguinte equação, em função das posições r de todos os átomos: U = ∑ lig klig(r−r0)2+ ∑ ang kang(θ−θ0)2+ ∑ torcoes Vn[1+cos(nτ−ϕ)]+ ∑ i ∑ j ( Aij (rij)12 + Bij (rij)6 + qiqj rij ) (3.1) Logo, a energia que descreve os sistema é considerada a partir das seguintes con- tribuições: (i) energia entre átomos ligados: contribuição proveniente das ligações co- valentes dentro da molécula e que são parametrizadas por um termo harmônico nas coordenadas nucleares de distância (potencial de dois corpos), ângulo (três corpos) e diedral (quatro corpos) e (ii) energia entre átomos não-ligados: corresponde a intera- ções de longo e curto alcance entre átomos não-ligados, como a interação eletrostática e de van der Waals, parametrizadas respectivamente por uma interação coulombiana entre cargas centradas nos átomos e com um potencial de Lennard-Jones. Assim, assume-se que o sistema apresenta pequenas vibrações incapazes de alte- rar o estado eletrônico do mesmo. Assim, a aproximação que descreve as interações covalentes do sistema é o modelo de osciladores harmônicos, onde os átomos inte- ragem entre si através de forças elásticas. O resultado disso é um campo de força clássico que descreve as interações inter e intramoleculares em um sistema. Uma vez que a energia potencial do sistema é definida, as forças podem ser obtidas a partir da 2ª Lei de Newton. O gradiente dessas forças é, então, obtido na etapa de minimização da energia do sistema. Durante este processo, um algoritmo altera as posições nucleares, com o objetivo de encontrar a configuração com a menor energia potencial. O método consiste em percorrer a superfície de potencial na direção que a energia decresce, ou seja, na direção contrária ao gradiente máximo das forças. Com a geometria otimizada, a evolução dos sistemas no tempo é calculada através da obtenção das forças, acelerações, velocidades e posições dos átomos, via equa- ções diferenciais que traduzem a 2ª. Lei de Newton: mi d2r⃗i dt2 = −∇⃗U(r1, r2, ...rN) (3.2) Como resultado final da dinâmica molecular, obtém-se uma trajetória especificando as mudanças de velocidade e posição de cada átomo ao longo do tempo. Com isso ,para que todo o método de Mecânica Molecular seja executado, é ne- cessário que seja especificada apenas uma configuração inicial do sistema, a partir da qual todo processo citado acima é realizado. Capítulo 3. Metodologia 24 3.1.1 Mecânica Molecular para os modelos miméticos Os cálculos para os miméticos nesta etapa foram realizados utilizando métodos clássicos teóricos, por meio do pacote AMBER12(15). Dois modelos foram construídos no AVOGADRO, cada um contendo 12 aminoácidos. Como discutido anteriormente, a estrutura em hélice contribui para o transporte eletrônico devido ao momento de dipolo resultante do alinhamento dos dipolos das ligações peptídicas. Com o objetivo de investigar o efeito que a hélice provoca no am- biente eletrostático do peptídeo, foram realizadas duas dinâmicas para cada sistema, onde em uma das dinâmicas restrições de posições foram aplicadas aos carbonos α para impedir que as características helicoidais fossem perdidas ao longo da dinâmica. Assim, quatro dinâmicas foram realizadas para os sistemas em meio solvente: i. molécula de politirosina com restrição de posição em todos os carbonos α, fi- xando a estrutura em α - hélice. ii. molécula de polifenilalanina com restrição de posição em todos os carbonos α, fixando a estrutura em α - hélice. iii. molécula de politirosina, inicialmente em α - hélice, sem aplicação de restrição de posição. iv. molécula de polifenilalanina, inicialmente em α - hélice, sem aplicação de restri- ção de posição. A simulação foi realizada para um estado de protonação que corresponde àquele dos aminoácidos isolados em condições de pH neutro, com os sistemas em caixas periódicas, método PME (Particle Mesh Ewald)(20, 21), contendo 2113 moléculas de água para o peptídeo de fenilalanina e 2038 moléculas de água para o peptídeo de tirosina. A Figura 3.2 ilustra os sistemas. O campo de força utilizado para a água foi o TIP3P(22), enquanto que para o pep- tídeo foi utilizado o amberff99SB(23), muito utilizado para proteínas. Inicialmente, utilizamos o algoritmo steepest decent na etapa de minimização de energia, com o intuito de alcançar mais rapidamente regiões mais próximas a um mí- nimo de energia na superfície de energia potencial. Feito isso, com a geometria mais próxima de um mínimo, utilizamos o algoritmo de gradientes conjugados por ser mais refinado que o utilizado inicialmente. Mesmo após submetido a este processo, os valores não atingiram o critério de convergência, possivelmente por apresentarem uma estrutura incial muito distante de um mínimo. A solução encontrada foi submeter o sistema à uma dinâmica prévia sem temperatura e pressão para estes sistemas com o objetivo de relaxar a estrutura. Capítulo 3. Metodologia 25 Figura 3.2 – Peptídeos em caixa cúbica com água Fonte: Elaborado pelo próprio autor A primeira etapa da dinâmica molecular é a termalização, que consiste em aumen- tar a temperatura, gradativamente, de 0 K à 300K, na ausência de pressão. O controle de temperatura no processo de termalização foi feito com a opção no input para o ter- mostato de Langevin(24). Este algoritmo controla a temperatura do sistema alterando as velocidades dos átomos, ou seja, adicionando e retirando energia do sistema. A etapa de produção finaliza a dinâmica molecular, sendo considerados os efei- tos da pressão no sistema, com a opção no input para o barostato de Parrinello Rah- man(25). Para cada iteração, passos de 2 fentossegundos foram estabelecidos, sendo realizados, ao final da dinâmica, 10 nanossegundos de evolução. A evolução do sistema foi armazenada a cada 500 passos da dinâmica em arquivos com as trajetórias dos átomos, a partir das quais foi feito todo o pós-processamento. 3.1.2 Mecânica Molecular para o pilus O objetivo da Mecânica Molecular aplicado aos modelos de pilus é uma análise estrutural, verificando até mesmo a estabilidade dos contatos presentes entre grupos aromáticos. Nesta etapa, foram realizadas duas dinâmicas em solvente, com as moléculas de pilus apresentando um estado de protonação que corresponde àquele dos aminoáci- dos isolados em condições de pH neutro: I. Modelo proposto na Figura 1.4. II. Modelo proposto na Figura 1.3. Capítulo 3. Metodologia 26 O pacote utilizado para os cálculos foi o GROMACS(16). Os sistemas foram solva- tados em caixas periódicas, método PME (Particle Mesh Ewald)(20, 21), mas devido à quantidade de átomos em cada sistema não utilizamos caixa cúbica, pois a capacidade computacional disponível não seria suficiente. Então, os sistemas foram confinados em células retangulares com distância mínima de 1,2 Å entre um átomo da proteína e as paredes da célula. Este critério de seleção da caixa reduziu consideravelmente a quantidade de moléculas de solvente. Além disso, como o estado de protonação estabelecido resultava em uma carga líquida de -2 para cada subunidade, utilizamos contra-íons de sódio para neutralizar a carga negativa das moléculas. As figuras 3.3 e 3.4 representam os sistemas descritos. Figura 3.3 – Pilus, em representação New Cartoon, solvatado em caixa retangular Fonte: Elaborado pelo próprio autor Utilizamos o campo de força SPC(26) para a água e amberff99SB(23) para a pro- teína. A etapa de minimização de energia não apresentou nenhum problema de conver- gência. A fase de termalização foi realizada com restrições de posição nos átomos das moléculas, permitindo assim, que as moléculas de água se ajustassem à tempe- ratura de 300 K sem que houvesse influência na estrutura das fibras. O acoplamento de temperatura foi feito com o algoritmo de v-rescale(27, 28). Logo após a termalização, os efeitos de pressão foram incorporados aos sistemas em uma nova etapa através do barostato de Parrinello Rahman(25), com os sistemas ainda submetidos às restrições de posição. A última etapa consistiu na dinâmica molecular, onde foram desconsideradas quais- quer restrições de posição na molécula. Uma iteração foi executada para cada 2 fen- Capítulo 3. Metodologia 27 Figura 3.4 – Pilus, em representação New Cartoon, solvatado em caixa retangular Fonte: Elaborado pelo próprio autor tossegundos de evolução do sistema, sendo realizados, ao final da dinâmica, 100 na- nossegundos de evolução no tempo. A evolução de cada sistema foi armazenada a cada 2500 passos da dinâmica em arquivos com as trajetórias dos átomos, a partir das quais foi feito todo o pós- processamento. 3.2 Mecânica Quântica Diferentemente do cálculo clássico (MM), onde apenas as coordenadas nucleares são consideradas na descrição molecular, a abordagem quântica (QM) descreve os elétrons explicitamente. O método é empregado em sistemas cujo interesse são pro- priedades ou fenômenos dependentes da configuração eletrônica, como as reações químicas, por exemplo, onde ligações são formadas e quebradas o tempo todo. O estudo de todo sistema molecular contendo N elétrons e M núcleos é feito atra- vés da solução da equação de Schroedinger independente do tempo: ĤΨ({r} , {R}) = EtotΨ({r} , {R}) (3.3) A resolução desta equação resulta na função de onda Ψ({r} , {R}), que representa a descrição matemática de um sistema de partículas, em que {r} é o conjunto de coor- denadas espaciais eletrônicas e {R} o conjunto de coordenadas espaciais nucleares. Capítulo 3. Metodologia 28 A partir da função de onda podemos obter todos os observáveis físicos do mesmo, ou seja, todas as suas propriedades. O operador Hamiltoniano do sistema, Ĥ, pode ser escrito da seguinte forma, em coordenadas atômicas:: Ĥ = − N∑ i=1 ▽2 i 2 − M∑ A=1 ▽2 A 2 − M∑ i=1 M∑ i=1 ZA riA + M∑ i=1 M∑ i=1 1 rij + M∑ i=1 M∑ i=1 ZAZB RAB (3.4) Os termos do operador correspondem à energia cinética eletrônica e nuclear mais a interação coulômbica núcleo-núcleo, elétron-núcleo e elétron-elétron. Os índices i e j são os índices eletrônicos e A e B nucleares. Dentro deste contexto, a solução exata não é possível, pois a equação só pode ser resolvida analiticamente para o átomo de hidrogênio, ou hidrogenóides. Sistemas com mais de dois elétrons só apresentarão solução para a equação de Schroedinger diante de aproximações feitas no Hamiltoniano. 3.2.1 Aproximação de Born Oppenheimer Para sistemas multieletrônicos, pode ser utilizada, a princípio, a aproximação de Born-Oppenheimer(29), que simplifica o problema através da separação dos movimen- tos nucleares e eletrônicos, o que implica na solução isolada do problema eletrônico. A aproximação parte da diferença de massa entre núcleo e elétron (o núcleo tem uma massa aproximadamente 1836 vezes maior), o que resulta na resposta eletrônica instantânea aomovimento nuclear. Logo, pode-se assumir que o elétron se movimenta em um espaço com núcleos fixos, desprezando-se, desta forma, o termo de energia cinética nuclear do Hamiltoniano. Como consequência, o termo correspondente à in- teração núcleo-núcleo no Hamiltoniano passa a ser constante. Este desacoplamento dos graus de liberdade eletrônicos e nucleares permite que a função de onda seja separável: Ψ({r} , {R}) = ψ({r} , {R})ϕ({R}) (3.5) A separação define ψ({r}) como a função de onda eletrônica, cuja dependência com relação às coordenadas nucleares é paramétrica, e ϕ({R}) como a função de onda nuclear. Dessa forma, o Hamiltoniano utilizado na equação de Schroedinger que descreve o movimento eletrônico é: Capítulo 3. Metodologia 29 Ĥele = − N∑ i=1 ▽2 i 2 − M∑ i=1 M∑ i=1 ZA riA + M∑ i=1 M∑ i=1 1 rij (3.6) Neste caso, o fato da dependência das coordenadas nucleares ser apenas para- métrica permite que o Hamiltoniano eletrônico, Ĥele, possa comutar com quaisquer posições nucleares, o que garante a obtenção de Eele({R}) a partir de {R} distin- tos. Somando-se à energia eletrônica a energia potencial núcleo-núcleo, difinida como constante devido à considerada inexistente movimentação nuclear, obtém-se a ener- gia total do sistema como se segue: Etot = Eele + M∑ i=1 M∑ i=1 ZAZB RAB (3.7) 3.2.2 O Princípio da Antissimetria e o Método Variacional A descrição eletrônica deve levar em consideração as coordenadas espacias e o spin. Feito isto, a função de onda deve satisfazer o príncipio de antissimetria(30), que requer que qualquer função de onda multieletrônica deve ser antisimétrica diante da permutação de dois elétrons. Dessa maneira, a função de onda de um elétron passa a ser representada por χ(x), denominada spin-orbital, onde x representa as coordenadas espaciais e de spin. O princípio da antissimetria é atendido quando se utiliza o determinante de Slater definido como: Ψ(x1, x2, ..., xN) = (N !)− 1 2 ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ χi(x1) χj(x1) · · ·χk(x1) χi(x2) χj(x2) · · ·χk(x2) ... ... ... χi(xN) χj(xN) · · ·χk(xN) ∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣ (3.8) Neste caso, a resolução da equação de Schroedinger pode ser tratada como um problema de autovalores, cuja solução é alcançada através do método variacional(31). Dado o operador Hamiltoniano Ĥ, dependendo do sistema, pode existir um con- junto infinito de soluções para a equação de Schroedinger independente do tempo: Ĥ|Ψi⟩ = ϵi|Ψi⟩, (3.9) Capítulo 3. Metodologia 30 onde i = 0, 1, 2, ... e ϵ0 ≤ ϵ1 ≤ ϵ2... < ϵi ≤ ..., sendo ϵi autovalores exatos e ϵ0 a energia do estado fundamental. O termo |Ψi⟩ representa as autofunções ortonormais, como se segue: ⟨ Ψi|Ψj⟩ = δij (3.10) Assim, {|Ψi⟩} forma um conjunto completo de soluções, o que significa que qual- quer função |Φ⟩ pode ser escrita como uma combinação linear de funções |Ψi⟩: |Φ⟩ = N∑ i=1 ci|Ψi⟩ (3.11) Sendo a função |Φ⟩ normalizada, o princípio variacional garante que o valor espe- rado do Hamiltoniano será maior ou igual a energia exata do estado fundamental: ⟨ Φ|Ĥ|Φ ⟩ ≥ ϵ0 (3.12) O método consiste na variação dos coeficientes {ci} até que o valor esperado⟨ Φi|Ĥ|Φj ⟩ atinja um mínimo, sendo este o valor estimado para a energia exata do estado fundamental. A minimização é realizada através do método de Lagrange dos multiplicadores in- determinados. Neste método subtraímos o termo E(⟨ Ψ|Ψ⟩ − 1) da função original (equivalente a subtrair zero devido à ortonormalidade da função |Ψ⟩), que estabelece o vínculo. Assim, como ⟨ Φi|Ĥ|Φj ⟩ = ∑ ij c ∗ i cjHij, temos uma nova função definida como: λ = ∑ ij c∗i cjHij − E (∑ i c2i − 1 ) (3.13) Assim, o mínimo da função λ ocorre nos mesmo coeficientes de ⟨ Ψ|Ĥ|Ψ ⟩ . Este procedimento permite que os coeficientes sejam obtidos independentemente. ∂λ ∂ck = 0 = ∑ j cjHkj + ciHik − 2Eck k = 1, 2, ...N (3.14) Capítulo 3. Metodologia 31 Como Hij = Hji, obtemos: ∑ j Hijcj − Eci = 0 (3.15) A equação (3.15) também pode ser representada na notação matricial através da expressão: Hc = Ec (3.16) Deste modo, o método variacional consiste em encontrar as N soluções da equa- ção de Schroedinger independente do tempo, através na diagonalização da matriz H, sendo que a autofunção correspondente ao mais baixo autovalor é a função de onda do estado fundamental. 3.2.3 Teoria do Funcional da Densidade O tratamento do problema de muitas partículas pode ser realizado através de uma descrição baseada na densidade eletrônica, ρ(r). A utilização da densidade eletrônica apresenta vantagens frente a função de onda dado o número de graus de liberdade envolvidos ser muito menor. Para um sistema com N elétrons, a função de onda necessita de 3N variáveis espaciais, mais N variá- veis de spin, enquanto que a densidade eletrônica depende de apenas de 3 variáveis espaciais e uma de spin. Logo, a empregabilidade da densidade eletrônica em proble- mas multieletrônicos reduz significativamente o custo computacional necessário. Este é o formalismo da Teoria do Funcional da Densidade(32) (DFT, do inglês Density Func- tional Theory). O primeiro passo para a aplicação da Teoria do Funcional da Densidade ao pro- blema de muitos corpos foi dado por Pierre Hohenberg e Walter Kohn, quando, na década de 60, formularam dois teoremas que nos permitem descrever o problema ele- trônico em termos da densidade eletrônica. Estes são denominados os Teoremas de Hohenberg-Kohn(33). O primeiro Teorema estabelece que a função de onda, e portanto a energia e qual- quer propriedade eletrônica do sistema é unicamente definida pela densidade eletrô- nica. A partir de uma dada densidade eletrônica, ρ(r), determina-se um potencial externo, υext(r), e o número de elétrons. Com isso é possível se construir o Hamiltoniano, per- Capítulo 3. Metodologia 32 mitindo a resolução da equação de Schroedinger para a obtenção da função de onda no estado fundamental, Ψ0. Com a função de onda do estado fundamental podemos extrair todos os observá- veis físicos do sistema no estado fundamental, que podem ser escritos como funcioanis da densidade eletrônica. Assim, a energia do estado fundamental pode ser expressa em função da densidade: E0 = E[ρ0(r)] = T [ρ0(r)] + Eee[ρ0(r)] + ENe[ρ0(r)] (3.17) Os dois primeiros termos da equação (3.17) representam a energia cinética dos elétrons e a energia das interações eletrônicas, respectivamente, e a soma entre eles resulta no funcional de Hohenberg-Kohn, definido por: FHK = ⟨ Ψ|T̂ + Ûee|Ψ ⟩ (3.18) O funcional FHK é universal para todo sistema de N partículas. O terceiro termo do funcional da energia representa a interação elétron-núcleo e é gerado a partir do potencial externo, υext(r), sendo este dependente das coordenadas nucleares. O segundo Teorema estabelece que para qualquer densidade particular ρ′, onde em todo espaço ∫ ρ′(r)d(r) = N e ρ′(r) ≥ 0, então E[ρ′] ≥ E0. O teorema ainda garante que a energia é mínima quando a densidade eletrônica corresponde àquela do estado fundamental, o que está de acordo com o princípio variacional. Embora os Teoremas de Hohenberg-Kohn demonstrem que a Energia eletrônica possa ser escrita como um funcional da densidade, o funcional FHK ainda é desco- nhecido, pois até esse ponto não é apresentada uma forma de se escrever a energia cinética eletrônica em função da densidade. Em 1965, Walter Kohn e Lu Jeu Sham(34) apresentaram uma abordagem para o problema da energia cinética eletrônica, descrevendo-a na sua forma funcional, T [ρ]. Neste método um sistema de elétrons interagentes é representado por um sistema de elétrons não interagentes (gás de elétrons) que produz a mesma densidade eletrônica. Este sistema não interagente é descrito por uma função de onda antissimétrica com orbitais de um elétron. Como apresentado anteriormente no princípio da antissimetria, a representação é matricial e é dada da seguinte forma para a densidade e energia cinética, com relação aos orbitais de Kohn-Sham, φi(r): Capítulo 3. Metodologia 33 ρ(r) = N∑ i=1 |φi(r)|2 (3.19) T [ρ] = −1 2 N∑ i=1 ⟨ φi(r)| ▽2 |φi(r) ⟩ (3.20) Dentro deste contexto, o funcional universal é definido da seguinte forma: F [ρ] = T [ρ] + 1 2 ∫ ∫ ρ(r⃗1)ρ(r⃗2) |r⃗1 − r⃗2| dr⃗1dr⃗2 + Exc[ρ] (3.21) O segundo termo da equação (3.21) é referente à energia potencial proveniente da interação elétron-elétron clássica, dada em termos da densidade eletrônica, e o terceiro termo, Exc[ρ], representa a energia de correlação e troca do sistema. Além das contribuições de correlação e troca eletrônica na energia, o termo Exc[ρ] apresenta correções para a auto-interação eletrônica e para a energia cinética, necessária em razão da aproximação de um sistema não interagente. Logo, a representação para a energia total do sistema é dada pelo funcional de Kohn-Sham, como se segue: EKS[ρ(r)] = F [ρ(r)] + ∫ υext(r)ρ(r)dr (3.22) O segundo termo da equação (3.22) representa a energia da interação elétron- núcleo obtida através do potencial externo, υext(r). Esta contribuição também pode ser obtida através das coordenadas nucleares, de acordo com a equação: ∫ υext(r)ρ(r)dr = − ∫ M∑ α=1 Zα |Rα − r|ρ(r)dr (3.23) O operador Hamiltoniano para o sistema é escrito conforme mostra a equação a seguir: Ĥ = N∑ i=1 [ −1 2 ▽2 i +υef (ri) ] (3.24) Capítulo 3. Metodologia 34 O termo υef (ri) é o potencial efetivo e contempla todos os potenciais envolvidos no sistema. Sua obtenção é feita por meio do método de multiplicadores de Lagrange, utilizando o vínculo de uma densidade eletrônica fixa: δ δρ(r) [ EKS[ρ(r)]− µ (∫ ρ′(r)d(r)−N )] = 0 (3.25) O que resulta em: µ = δT [ρ(r)] δρ(r) + υef (r) (3.26) υef (r) = υext(r) + ∫ ρ(r) |r− r′|dr+ δExc[ρ(r)] δρ(r) (3.27) Todas as equações apresentadas na determinação do potencial efetivo e do Ha- miltoniano para a resolução da equação de Schroedinger constituem as equações de Kohn-Sham, que é um problema de autovalores, cuja solução é obtida através do ciclo auto-consistente descrito a seguir: 1. Propor uma função tentativa, ρ(r); 2. Calcular o potencial efetivo através da equação (3.27); 3. Resolver as equações de Kohn-Sham, Ĥφi(r) = εiφi(r); 4. Obter uma nova densidade a partir da equação (3.19); 5. Comparar as energias eletrônicas obtidas para as duas densidades. Se houver convergência, as propriedades do sistema podem ser calculadas, caso contrário, o processo retorna para o item 2 utilizando a nova densidade eletrônica obtida. Assim, o DFT determina a energia eletrônica uma vez que o funcional de correlação e troca é conhecido. No entanto, não há uma forma universal de se expressar este funcional e aproximações são inevitáveis para este objetivo. 3.2.3.1 Funcionais de correlação e troca Duas aproximações utilizadas na determinação do funcional Exc[ρ(r)] serão apre- sentadas aqui. As descrições consideram a antissimetria da função de onda diante da permutação de dois elétrons (troca eletrônica) e o acoplamento do movimento de um elétron com relação a todos os outros (correlação eletrônica). Capítulo 3. Metodologia 35 A proposta mais simples é a Aproximação da Densidade Local, que resulta no fun- cional LDA(35) (Local Density Approximation). Esta descrição trata um sistema ele- trônico não homogêneo como localmente homogêneo. Este funcional, expresso na equação (3.28), descreve bem sistemas com densidade eletrônica uniforme ou com variação lenta (como sólidos), porém, apresenta falhas quando estas características não estão presentes. Exc[ρ(r)] = ∫ εLDA xc [ρ(r)]ρ(r)d(r) (3.28) O termo εLDA xc [ρ(r)] é a energia de correlação e troca por partícula de um gás de elétrons uniforme. Outra proposta surge com a finalidade de descrever mais adequadamente siste- mas com densidade eletrônica não homogênea. Esta é a aproximação do gradiente generalizado GGA(36) (Generalized Gradient Approximation), que avalia a densidade local e a variação espacial desta. Dessa forma, o funcional de correlação e troca GGA apresenta dependência com relação ao gradiente da densidade e é dado por: Exc[ρ(r), | ▽ ρ(r)|] = ∫ εGGA xc [ρ(r), | ▽ ρ(r)|]ρ(r)d(r) (3.29) O termo εGGA xc [ρ(r)] pode ser obtido através de diferentes expressões encontradas na literatura, sendo cada uma dependente do funcional proposto. 3.2.3.2 Pseudopotenciais Ométodo de pseudopotenciais surge com o esforço computacional necessário para descrever todos os elétrons contidos em um sistema. Contudo, alguns dos elétrons na ligação química não são afetados por alterações no ambiente, o que permite o uso de descrições mais simples. Assim, o problema eletrônico pode ser dividido em duas representações: elétrons do caroço, que são aqueles que não estão envolvidos diretamente na ligação química, e elétrons de valência, que são aqueles diretamente envolvidos na ligação química. Originalmente, a função de onda proposta(37) consistia na combinação de dois termos, representando os elétrons de valência, |φv⟩ (pseudo-função de onda) e os elé- trons do caroço, |φc⟩. A função de onda é representada através da seguinte relação: |Φ⟩ = |φv⟩ − ∑ c αcv|φc⟩, (3.30) Capítulo 3. Metodologia 36 em que αcv = ⟨φc|φv⟩ ̸= 0. A combinação escolhida deve ser tal que |Φ⟩ e |φc⟩ sejam autofunções de um mesmo operador Hamiltoniano Ĥ, como se segue: Ĥ|Φ⟩ = εv|Φ⟩ Ĥp|φv⟩ = εv|φv⟩ Ĥ|φc⟩ = εc|φc⟩ (3.31) Dado que os operadores Hamiltonianos são descritos por Ĥ = − ▽2 +V e Ĥp = −▽2 +Vp, em que V é o potencial coulômbico do núcleo e VP é o chamado pseudopo- tencial, cuja descrição para que as equações acima sejam satisfeitas é dada por: Vp = V + ∑ c (εv − εc)|φc⟩⟨φc| (3.32) A equação (3.32) é a forma mais geral para a definição do pseudopotencial, cuja ação é diferente em funções de onda de diferentes momentos angulares. 3.2.4 Método Híbrido QM/MM Como consequência da descrição eletrônica envolvida, evidentemente, o número de componentes no sistema aumenta consideravelmente, o que explica o custo com- putacional extremamente alto quando se faz uso da modelagem quântica, resultando em uma empregabilidade em sistemas menores, com poucos átomos. Como a descrição da estrutura eletrônica é fundamental para o entendimento futuro da transferência de carga observada neste sistema biológico, um método alternativo se faz necessário para que as informações eletrônicas sejam consideradas no cálculo. Neste caso, um método de cálculo híbrido apresenta uma alternativa eficaz. O método se mostra adequado para o estudo de macromoléculas e sítios ativos de enzimas(38), onde o número de átomos é significativamente alto. O método QM/MM foi proposto inicialmente por Warshel(39) no estudo de uma en- zima, onde a partição QM compreendia o sítio ativo, sendo empregado o método clás- sico para o restante da enzima e para o solvente. Como as reações químicas ocorrem apenas no sítio ativo da enzima, a descrição dos elétrons é necessária apenas nesta região, permitindo que se obtenha resultados confiáveis a um custo computacional relativamente baixo. Capítulo 3. Metodologia 37 O acoplamento QM/MM é dado por um Hamiltoniano híbrido ĤQM−MM . O Hamiltoniano total, ĤTOT , apresenta três termos: um termo quântico, um clássico e um termo de acoplamento: ĤTOT = ĤQM + ĤMM + ĤQM−MM (3.33) Este operador Hamiltoniano total opera sobre a função de onda do sistema, devol- vendo a energia total do sistema, também composta de três termos. ETOT = EQM + EMM + EQM−MM (3.34) O termo de acoplamento EQM−MM , na abordagem do DFT, é dado da seguinte forma: EQM−MM = C∑ i=1 qi ∫ ρ(r)) |r − τi| dr + C∑ i=1 Q∑ α=1 qiZα |Rα − τi| + ELJ QM−MM (3.35) Na equação (3.35) os termos representam interação coulômbica das cargas atômi- cas MM com os núcleos e elétrons QM e uma interação de van der Waals parametri- zada por um potencial do tipo Lennard-Jones para as interações de curto alcance. Na interface das partições QM e MM pode haver um corte fictício de uma ligação covalente, normalmente uma ligação carbono-carbono. Para evitar problemas com a valência do carbono na fronteira, um átomo fictício (link atom) de hidrogênio é adi- cionado saturando as ligações na interface. Uma vez que este átomo é apenas um artifício, ou seja, não está presente na molécula real, correções devem ser feitas no input de maneira a evitar que haja interação da partição MM com este link atom (Ex- clusões). 3.2.5 Cálculo QM/MM para os modelos miméticos Para os cálculos nesta etapa, Utilizamos o pacote CPMD(17), que funciona com uma base de ondas planas e é baseado na Teoria do Funcional da Densidade (DFT). O objetivo estabelecido para os miméticos envolvia a análise dos efeitos da hélice e dos grupos aromáticos na estrutura eletrônica do peptídeo e o ambiente eletrostático gerado, tanto na presença como na ausência de água. Para tanto, uma amostragem foi feita para cada dinâmica realizada, com 10 frames selecionados em intervalos de, Capítulo 3. Metodologia 38 aproximadamente, 1 ns entre eles. A obtenção dos retratos a partir do arquivo de trajetória foi conduzida pelo programa cpptraj(40) contido no AMBER. Os algoritmos permitem que a estrutura em determinado instante possa ser extraída em extensão pdb. Para cada retrato escolhido, duas estruturas foram obtidas: uma na presença e outra na ausência de água. A Figura 3.5 apresenta o método sequencial utilizado para o cálculo QM/MM(41, 42, 43). Figura 3.5 – Representação esquemática dos métodos utilizados no estudo da configuração eletrônica dos modelos miméticos Fonte: Elaborado pelo próprio autor A partição QM para cada frame selecionado era determinada com base na pro- ximidade dos resíduos aromáticos da cadeia lateral. Foram selecionados os quatro resíduos aromáticos que apresentavam os contatos mais interessantes. As escolhas foram feitas com o auxílio de um script escrito em python, que nos possibilitou avaliar a posição e orientação relativa de um anel aromático com relação a outro ao longo da trajetória. Estas análises serão apresentadas nos resultados do trabalho. A proximidade dos resíduos da cadeia lateral, bem como a orientação relativa entre eles podem apresentar um caminho que favorece um dipolo mais pronunciado ao longo do peptídeo. Na tentativa de analisar a estrutura eletrônica da mesma região da molécula em diferentes retratos da dinâmica, procuramos selecionar os mesmos grupos aromáticos em cada um dos frames da amostra. Esta divisão para a partição QM nem sempre é possível, devido às mudanças estruturais dos peptídeos. Contudo, quando necessário, poucos resíduos foram substituídos de um frame para outro. Os sistemas submetidos às restrições de posições no esqueleto não apresentavam mobilidade tão significativa da cadeia lateral quando comparados aos sistemas onde as restrições não estavam presentes, devido à conservação da estrutura helicoidal. Mais detalhes serão apresentados nos resultados. Capítulo 3. Metodologia 39 Figura 3.6 – Representação da partição QM em destaque, para molécula de politirosina. Dummy atom de hidrogênio presente para saturar os carbonos γ na fronteira. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Determinadas as partições QM/MM, os cálculos híbridos puderam ser feitos. A leitura das coordenadas e parâmetros da região MM é feita pelo CPMD a partir de arquivos no formato Gromos(44), obtidos a partir das coordenadas vindas do AMBER. A fronteira entre as partições QM e MM ficou estabelecida na ligação covalente entre os carbonos β e γ. Assim, apenas os anéis aromáticos constituem a partição QM. A saturação dos carbonos γ foi feita com o método de Hydrogen Capping(45)(Figura 3.6). Em todos os cálculos utilizamos um cutoff de 90 Ry e pseudopotenciais de Troullier Martins(46) com funcionais de correlação e troca BP(47). O protocolo de cálculo para as amostragens consistia, inicialmente, na otimização da função de onda(48), seguida pelo cálculo da densidade de estados eletrônicos via equações de Kohn-Sham. Em posse destes resultados, verificamos o gap de energia entre o último estado ocupado e o primeiro desocupado (HOMO e LUMO, respectivamente). Os níveis energéticos obtidos no final do cálculo QM/MM foram utilizados na cons- trução da DOS (Density of States), obtidas a partir de funções Gaussianas: f(x) = 1 σ √ 2π e− (x−µ)2 2σ2 (3.36) Capítulo 3. Metodologia 40 Uma análise complementar à DOS consistia na visualização da densidade eletrô- nica feita com o uso do VMD. 3.2.6 Cálculo QM/MM para o pilus Assim como nos cálculos dos modelos miméticos, o pacote utilizado nos cálculos híbridos aplicados ao pilus foi o CPMD(17). Com o objetivo de analisar a estrutura eletrônica e a localização da densidade ele- trônica em regiões contendo aglomerados aromáticos, o procedimento foi realizado para os sistemas na presença de água e, em seguida, no vácuo em diferentes instan- tes da trajetória. A amostragem foi feita com 12 frames, sendo dez deles selecionados com um intervalo de 10 ns entre um e outro, e os outros dois frames correspondentes aos instantes inicial e final da dinâmica. Como as dinâmicas foram realizadas com o GROMACS, a ferramenta utilizada na obtenção dos retratos foi o trjconv, que permite a extração da configuração do sistema em um instante desejado em extensão pdb. A sequência de métodos utilizadas nesta etapa foi a mesma apresentada para os modelos miméticos na Figura 3.5. O critério de seleção da partição QM segue o que foi apresentado para os modelos miméticos com relação à proximidade entre resíduos aromáticos vizinhos na cadeia lateral. Devido à periodicidade apresentada pela estrutura do pilus (I) (Figura 1.5), foram selecionados 6 resíduos aromáticos em cada frame. A pequena variação es- trutural dos aglomerados aromáticos e a periodicidade dos resíduos ao longo da fibra facilitaram a definição de partição QM para este sistema. Em contrapartida, o pilus (II) não apresenta estrutura padronizada para os resíduos aromáticos, o que conduziu a uma avaliação mais cautelosa, em cada um dos frames, em busca de aglomerados aromáticos. Definida a partição QM, a leitura das coordenadas e parâmetros da região MM é feita pelo CPMD a partir de arquivos de formato Gromos(44), assim como realizado no cálculo híbrido dos modelos miméticos. Contudo, a conversão para o formato Gromos é realizada a partir de um pdb vindo do AMBER. Uma vez que a dinâmica molecular foi realizada no GROMACS, a estrutura em pdb apresenta nomenclatura diferente para os átomos quando comparada àquela obtida no AMBER. Corrigido o problema de nomenclatura e convertido os arquivos para formato gro- mos, o cálculo híbrido foi executo pelo CPMD, com opções de cutoff de 90 Ry e pseu- dopotenciais de Troullier Martins(46) com funcionais de correlação e troca BP(47). Os cálculos realizados para os sistemas no vácuo também foram realizados visando entender o efeito do solvente nos sistemas. Para isso, as cargas das moléculas de água foram anuladas na topologia, simulando as condições do vácuo. A fronteira entre as partições QM e MM ficou novamentemente estabelecida entre Capítulo 3. Metodologia 41 os carbonos β e γ. O método Hydrogen Capping(45) foi utilizado na saturação dos car- bonos de fronteira(Figura 3.7), sendo os link atoms de hidrogênio invisíveis à partição MM, ou seja, não há interação entre um link atom e a partição MM. Figura 3.7 – Representação da partição QM em destaque, para o pilus. Dummy atom de hidrogênio presente para saturar os carbonos γ na fronteira. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Com o objetivo de entender a contribuição da matriz proteica para a estrutura ele- trônica e níveis energéticos, um cálculo puramente QM foi realizado para os anéis de benzeno e fenol isolados no vácuo em apenas um dos frames, com a sua correspon- dente configuração. O protocolo de cálculo foi o mesmo utilizado para os modelos miméticos: otimiza- ção da função de onda seguida pelo cálculo da densidade de estados eletrônicos via equações de Kohn-Sham. Da mesma forma como foi feito para os modelos miméticos, os niveis energéticos resultantes do cálculo híbrido foram utilizados na construção da DOS, com base em funções Gaussianas. A localização dos estados eletrônicos foi feita com o VMD, per- mitindo a identificação de possíveis transições eletrônicas entre resíduos aromáticos. 42 4 Resultados e Discussão 4.1 Modelos miméticos 4.1.1 Análise estrutural dos peptídeos A estrutura helicoidal predominante na pilina é especulada como um possível fator para a alta eficiência do transporte eletrônico observado neste biossistema. Em vista disso, uma análise da variação conformacional se torna necessária para os sistemas (iii) e (iv) ao longo da dinâmica, onde não houve restrições de posição para os carbonos α . Fazendo uso do cpptraj, pares de ângulos diedros, psi e phi, foram obtidos para to- das as regiões dos peptídeos (numeradas de 1 a 10, sendo 1 a região mais próxima do terminal amina e 10 a região mais próxima do terminal carboxila), ao longo da trajetó- ria da dinâmica. Em seguida, os valores foram agrupados em histogramas, indicando, dessa maneira, qual a conformação predominante ao longo da cadeia. Figura 4.1 – Representação dos ângulos diedros para as regiões numeradas da molécula de politirosina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Capítulo 4. Resultados e Discussão 43 Figura 4.2 – Representação dos ângulos diedros para as regiões numeradas da molécula de polifenilalanina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Para efeito comparativo, os histogramas das Figuras 4.1 e 4.2 representam ângulos diedros em porções diferentes da cadeia para politirosina e polifenilalanina, respecti- vamente. A análise dos diedros indica a predominância de uma estrutura próxima de uma hélice na politirosina, com valores próximos a −60 ◦ para phi e −40 ◦ para psi, caracte- rístico de α - hélice, enquanto que na polifenilalanina há indícios claros de descaracte- rização da estrutura helicoidal inicial. A partir da trajetória do sistema é possível observar que as características helicoi- dais são perdidas rapidamente na fenilalanina. A Figura 4.3 representa as estruturas obtidas após 1 ns de dinâmica, para ambos os sistemas. Estes resultados obtidos para a polifenilalanina tornam interessante a comparação posterior dos mapas de potencial eletrostático mostrados nas análises dos resultados vindos do cálculo QM/MM. A comparação direta do potencial observado na polifenilala- nina entre sistemas com e sem restrições na estrutura do esqueleto, fornecem evidên- cias importantes quanto à contribuição da estrutura em hélice no transporte eletrônico ao longo do peptídeo. Embora a mudança estrutural seja mais pronunciada para o peptídeo de fenilala- Capítulo 4. Resultados e Discussão 44 Figura 4.3 – Representação de instantes do início da dinâmica (1 ns) para os peptídeos mo- delo. Enquanto que a politirosina mantém a estrutura helicoidal, fica evidente a descaracterização completa da estrutura em hélice na polifenilalanina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor nina, podemos observar uma alteração mais lenta no peptídeo de tirosina com um intervalo de tempo maior na dinâmica. As Figuras 4.4 e 4.5 mostram claramente esta mudança entre o início e final da trajetória em cada sistema. Figura 4.4 – Representação sequencial da evolução da hélice de politirosina. Retratos cor- respondentes a (da esquerda para a direita): Primeiro instante da dinâmica mo- lecular, 5 ns de evolução e 10 ns de evolução (final da dinâmica). Fonte: Elaborado pelo próprio autor Estes retratos evidenciam que o peptídeo de tirosina mantém características heli- coidais em solução por um tempo relativamente longo, quando comparado ao peptídeo de fenilalanina, principalmente na região central da molécula. A Figura 4.5 ainda indica o início da descaracterização da hélice para a fenilalanina Capítulo 4. Resultados e Discussão 45 Figura 4.5 – Representação sequencial da evolução da hélice de polifenilanina. Retratos cor- respondentes a (da esquerda para a direita): Primeiro instante da dinâmica mo- lecular, 5 ns de evolução e 10 ns de evolução (final da dinâmica). Fonte: Elaborado pelo próprio autor ainda na otimização de geometria. O fenômeno é bem evidente na região próxima ao terminal carboxila. Mesmo que apareça apenas em uma região próxima a um dos terminais, a perda da helicidade pode anular parte do efeito dipolo. Assim, aplicar a restrição de posição no esqueleto antes da minimização de energia corrigiria o problema, mas geraria outro na convergência, uma vez que a estrutura inicial se encontrava muito distante de um mínimo de energia. Outra análise conformacional interessante a ser feita com os resultados da mecâ- nica molecular, são as variações de posições dos resíduos aromáticos presentes nas cadeias laterais e suas respectivas orientações no espaço. A análise ganha importân- cia devido a orientação e proximidade de grupos aromáticos observados na pilina. Com o cpptraj, as coordenadas dos átomos de cada grupo aromático foram obtidas para toda a trajetória, possibilitando o levantamento de curvas representando as dis- tâncias entre determinados grupos ao longo da dinâmica. Para tanto, escrevemos um algoritmo em python que permitisse o cálculo das coordenadas do centro de massa de cada anel, para todos os instantes da dinâmica, a partir das coordenadas atômicas. Em posse dos dados de coordenadas atômicas, para cada frame da trajetória, os vetores normais aos planos formados pelos carbonos aromáticos também foram obti- dos por meio de um algoritmo em python. Como consequência, curvas fornecendo a variação do cosseno entre planos formados pelos anéis foram levantadas. As Figuras 4.6 e 4.7 mostram exemplos de pares de resíduos que se mantém pró- ximos durante grande parte da dinâmica e a orientação relativa entre os planos. Ob- servamos que, de maneira geral, os grupos aromáticos para a politirosina apresentam uma organização mais estável, com empilhamentos mais frequentes que os grupos da Capítulo 4. Resultados e Discussão 46 polifenilalanina. Figura 4.6 – Variação da distância entre os centros de massa (a) e o cosseno do ângulo entre os planos formados pelos anéis (b) dos resíduos 7 e 10 da cadeia lateral da polifenilalanina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Figura 4.7 – Variação da distância entre os centros de massa (a) e o cosseno do ângulo entre os planos formados pelos anéis (b) dos resíduos 7 e 11 da cadeia lateral da politirosina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor A análise da estrutura do esqueleto, aliada à análise da cadeia lateral de cada peptídeo permite admitir que a estabilidade observada na hélice formada por tirosinas é uma consequência do oxigênio presente nos grupos aromáticos, que confere um caráter hidrofílico ao peptídeo. Como na fenilalanina o oxigênio está ausente no anel, o peptídeo apresenta um comportamento hidrofóbico, levando a molécula a assumir uma estrutura globular quando esta se encontra em meio aquoso. Capítulo 4. Resultados e Discussão 47 4.1.2 Estrutura eletrônica de aglomerados aromáticos nos modelos miméticos As curvas de orientação e posição relativa entre anéis distintos auxiliaram no en- tendimento da organização da cadeia lateral dos peptídeos e guiaram as escolhas ne- cessárias para a realização do método híbrido. Com isso, os dez frames com contatos interessantes foram selecionados, procurando manter intervalos de tempo aproxima- damente iguais entre cada um. Para os sistemas (i) e (ii), as escolhas foram facilitadas, uma vez que a conservação da estrutura helicoidal impedia uma mobilidade muito grande da cadeia lateral. Neste caso, os resíduos utilizados foram os mesmos em quase todas as configurações utili- zadas na amostragem, diferentemente da amostragem dos sistemas (iii) e (iv), onde a grande mobilidade da cadeia lateral impediu que os resíduos utilizados na partição QM fossem mantidos de um frame para outro. As Figuras 4.8 e 4.9 ilustram as partições QM obtidas em um dos frames de cada sistema estudado. É importante enfatizar que osmelhores contatos (aproximadamente 4 Å) em cada configuração foram determinados com o auxílio de curvas como demons- trado nas Figuras 4.6 e 4.7. Figura 4.8 – Representação da partição QM definida a partir dos contatos entre os anéis para os sistemas (i) e (ii). Fonte: Elaborado pelo próprio autor Com as partições QM e MM devidamente definidas, a densidade de estados ele- trônicos foi obtida para cada um dos frames, permitindo a comparação entre os níveis energéticos observados para os sistemas no vácuo e na presença de água, conforme mostrado na Figura 4.10. Neste caso, o gap observado quando o sistema se encontra no vácuo foi aproxima- Capítulo 4. Resultados e Discussão 48 Figura 4.9 – Representação da partição QM definida a partir dos contatos entre os anéis para os sistemas (iii) e (iv). Fonte: Elaborado pelo próprio autor damente de 1 eV, enquanto que para o sistema em água o gap abriu para mais de 3 eV. A diferença na separação dos estados HOMO e LUMO observada para a tirosina é um indicativo de que o ambiente eletrostático na presença da água é diferente, uma Figura 4.10 – Densidade de estados eletrônicos em um dos frames da politirosina com estru- tura helicoidal fixa. A abertura do gap é claramente observada na presença de água. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Capítulo 4. Resultados e Discussão 49 vez que não existe apenas o dipolo da hélice. Como consequência, a estrutura ele- trônica se modifica e a distribuição eletrônica dos estados de fronteira não mais são localizados nas extremidades. Portanto, artifícios oriundos da condição periódica de contorno também são atenuados. Essa análise é reforçada quando analisamos o mapa de diferença de potencial do sistema. A Figura 4.11 exibe a diferença entre o potencial calculado para o sistema, na ausência e presença de água, em cada ponto da malha para a partição QM da hélice de tirosina, em uma faixa de -1,63 V a 1,63 V. Em regiões próximas ao terminal amina, o mapa mostra um valor maior de potencial para o sistema no vácuo com relação ao sistema em solvente. O oposto acontece no terminal carboxila, onde o potencial calculado no vácuo é maior que aquele obtido em solvente. Figura 4.11 – Mapa de diferença de potencial, em Volts, da hélice de tirosina no Frame 3914, representando a diferença de potencial para o sistema, em cada ponto damalha, na ausência e presença de água. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Este resultado reforça o efeito de neutralização do dipolo da hélice provocado pela água, uma vez que a diferença de potencial entre os terminais da hélice obtida para o peptídeo no vácuo é maior. Em termos de composição do peptídeo, com a finalidade de detectar diferenças no efeito provocado por grupos aromáticos distintos, realizamos a mesma análise para o peptídeo de fenilalanina com estrutura fixa em hélice (Figura 4.12). Desta vez, a diferença entre os gaps observados para o HOMO e LUMO foi pe- quena, embora observável. A presença da água não afetou o gap da mesma forma, o que pode ser justificado pelo gap relativamente grande obtido para o sistema no vácuo. Capítulo 4. Resultados e Discussão 50 Figura 4.12 – Densidade de estados eletrônicos em um dos frames da polifenilalanina com estrutura helicoidal fixa. A abertura do gap é observada na presença de água, embora menos pronunciada quando comparada à politirosina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor É importante enfatizar que, embora o sistema tenha sido submetido à uma dinâmica com restrições no esqueleto, partes terminais do peptídeo apresentaram mudanças estruturais com o processo de minimização de energia. Como o momento de dipolo intenso nas hélices pode ser explicado pela soma de dipolos locais nas ligações peptí- dicas, favorecidos por uma orientação ao longo do esqueleto, uma pequena variação na estrutura peptídica pode afetar o dipolo resultante, o que reflete um gap maior para o sistema no vácuo. Na Figura 4.13 está representado este efeito no potencial. Assim como na Figura 4.11, esse mapa representa a diferença entre o potencial calculado para o sistema no vácuo e em solvente, para cada ponto da malha. A diferença de potencial para o sistema é relativamente menor, o que justifica a dife- rença no gap. Além disso, a identificação da diferença de potencial entre os terminais da hélice é dificultada, em função da dobra observada no terminal carboxila. Para confirmar as conclusões feitas até aqui é necessária uma análise sobre toda a amostragem. Para facilitar a verificação, as curvas de DOS foram sobrepostas, como mostram as Figuras 4.14 e 4.15 para os sistemas (i) e (ii), respectivamente. A análise da densidade de estados para toda a amostragem mostra que ao longo da trajetória o gap entre HOMO e LUMO apresenta pouca variação no peptídeo de fenilalanina, tanto em água quanto no vácuo. O mesmo é observado para o peptídeo de tirosina quando este se encontra emmeio solvente, mas não observamos este com- portamento na ausência de água, onde quase não é possível identificar a separação de estados. Capítulo 4. Resultados e Discussão 51 Figura 4.13 – Mapa de diferença de potencial, em Volts, da hélice de fenilalanina no Frame 5362, representando a diferença de potencial para o sistema, em cada ponto da malha, na ausência e presença de água. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Figura 4.14 – Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de tirosina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Este fenômeno observado na politirosina é característicos de metais, mas pode ser justificado como um erro metodológico, uma vez que o resultado do cálculo QM/MM é sensível à escolha da partição, o que interfere diretamente na convergência. Em alguns frames observamos um custo computacional maior, provavelmente devido a resíduos pertencentes à região MM estarem localizados muito próximos da região QM. Outro fator que justifica esta conclusão é o número de frames em que foi observado Capítulo 4. Resultados e Discussão 52 Figura 4.15 – Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de fenilala- nina. Fonte: Elaborado pelo próprio autor este efeito. Na maior parte da amostragem para o sistema no vácuo, a separação dos estados ocupados dos desocupados era observável. Como os frames amostrados foram diretamente tirados de uma trajetória de dinâ- mica molecular, cogitamos a possibilidade das forças atuantes nos resíduos escolhi- dos estarem altas. Assim, uma otimização de geometria foi previamente realizada a fim de verificar a hipótese. Para todos os testes em que a otimização foi realizada, não observamos nenhuma diferença significativa no gap obtido. Este resultado garante que as forças atuantes no sistema apresentam intensidades adequadas para o cálculo dos níveis energéticos e não comprometeram a separação obtida entre o HOMO e LUMO. A DOS também foi obtida para os peptídeos vindos de dinâmicas (iii) e (iv). Os resultados obtidos na Figura 4.16 mostram a semelhança na densidade de es- tados eletrônicos para a tirosina em água quando a estrutura em hélice não é fixa ao longo da dinâmica. Com relação ao vácuo, a DOSmostrou o fechamento praticamente absoluto do gap em apenas um frame, enquanto que o restante se manteve em uma faixa de, aproximadamente, 0,5 eV a 1 eV. Portanto, a única diferença observada para a politirosina ocorreu para o sistema no vácuo, onde a visualização do gap para a estrutura helicoidal fixa ao longo da dinâmica, não permitiu sua determinação, enquanto que para o peptídeo com o esqueleto livre para se movimentar o gap pode ser observado, embora pequeno. A Figura 4.17 representa a densidade de estados eletrônicos da amostragem de polifenilalanina, sem restrição na estrutura vinda da dinâmica. Os resultados em água foram próximos daqueles observados para o peptídeo helicoidal. Para o sistema no vácuo, o gap não é bem definido, embora seja maior que o en- Capítulo 4. Resultados e Discussão 53 Figura 4.16 – Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de tirosina. Resultados para os peptídeo sem estrutura helicoidal fixa. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Figura 4.17 – Sobreposição da DOS obtida em toda a amostragem do peptídeo de fenilala- nina. Resultados para os peptídeo sem estrutura helicoidal fixa. Fonte: Elaborado pelo próprio autor contrado na politirosina. Como já citado e ilustrado acima, a polifenilalanina apresenta tendência a buscar uma estrutura globular ao longo da dinâmica, característico de mo- léculas hidrofóbicas. Este fenômeno dificulta a escolha dos resíduos adequados para o cálculo QM/MM devido a alta taxa de mobilidade dos grupos aromáticos. Isso su- gere que o resultado do cálculo híbrido é, aparentemente muito sensível à escolha da partição QM. Uma análise complementar realizada foi a verificação da localização dos estados de fronteira. O empilhamento de anéis aromáticos pode provocar o alinhamento de orbitais pi (pi stacking), o que resulta no compartilhamento eletrônico por mais de um resíduo, ou seja, o orbital eletrônico passa a estar localizado em mais de um anel. Capítulo 4. Resultados e Discussão 54 A identificação de instantes em que a densidade eletrônica pode estar localizada em vários resíduos (delocalização eletrônica) sugere a provável transição eletrônica entre anéis aromáticos de forma não radiativa, ou seja, sem a necessidade de absorção de energia pelo sistema. Além disso, identificar a ocupação de regiões diferentes para o mesmo estado em diferentes momentos da dinâmica é outro indicativo da transição eletrônica espontânea nos aglomerados aromáticos. Figura 4.18 – Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica mo- lecular do peptídeo de politirosina com estrutura helicoidal fixa. Representação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Em outras palavras, se o elétron se encontrar delocalizado em todo o aglomerado, podemos considerar a hipótese de um regime de transporte por tunelamento, sabendo que este fenômeno depende de uma ponte entre doador e aceptor para que ocorra. Enquanto que a variação da localização eletrônica em um mesmo estado, durante a Capítulo 4. Resultados e Discussão 55 dinâmica, pode ser um indicativo de hopping, pois neste caso há a identificação de diferentes sítios onde o elétron pode residir. Buscando identificar estas características nos peptídeos de poilitirosina e polifenila- lanina, a visualização dos estados eletrônicos para ambos os modelos estão represen- tadas nas Figuras 4.18, 4.19 e 4.20. Para tal análise, utilizamos frames cujas partições QM são compostas pelos mesmos resíduos, permitindo que as variações das localiza- ções do HOMO e LUMO para esta região da cadeia lateral fossem avaliadas sem a necessidade de considerar a substituição de nenhum anel aromático. Figura 4.19 – Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica mo- lecular do peptídeo de politirosina sem estrutura helicoidal fixa. Representação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Em grande parte dos frames representados, é evidente a ocupação de mais de um resíduo da cadeia lateral tanto para o HOMO quanto para o LUMO, o que era esperado devido ao stacking. Em alguns poucos frames esta ocupação se estende a até três resíduos. Embora o HOMO no peptídeo de politirosina com estrutura em hélice fixa (Figura 4.18) apresente ocupação de dois anéis em toda a dinâmica, não há variação da loca- lização eletrônica para este estado com a evolução do sistema. Contudo, observamos Capítulo 4. Resultados e Discussão 56 a ocupação de mais anéis no LUMO. No entanto, no peptídeo de politirosina sem restrições de posição aplicadas ao esqueleto identificamos não somente a ocupação de dois ou mais anéis no HOMO, como também diferentes regiões visitadas pelo elétron em diferentes momentos da trajetória para este mesmo estado (Figura 4.19). O peptídeo de polifenilalanina também apresentou localização eletrônica de mais de um resíduo no mesmo estado e, além disso, identificamos a ocupação de diferentes regiões para o HOMO e LUMO (Figura 4.20). Figura 4.20 – Localização dos estados eletrônicos em diferentes momentos da dinâmica mo- lecular do peptídeo de polifenilalanina com estrutura helicoidal fixa. Represen- tação em azul para o HOMO e em vermelho para o LUMO. Fonte: Elaborado pelo próprio autor Obviamente, muitas características eletrônicas dos sistemas podem não ter sido observadas devido ao pequeno número de frames utilizados na amostragem, o que dificulta inferir sobre o regime de transporte nos modelos estudados. Contudo, a iden- Capítulo 4. Resultados e Discussão 57 tificação da pluralidade de resíduos da cadeia lateral ocupados em um estado, bem como a ocupação de diferentes regiões pelo mesmo estado como consequência da evolução do sistema, são características importantes que indicam a contribuição de aglomerados aromáticos na cadeia lateral para o transporte eletrônico na pilina. 4.2 Pilus 4.2.1 Análise estrutural do pilus Para que um modelo proposto para a fibra tenha validade para estudo, primeira- mente deve apresentar estabilidade estrutural ao longo da dinâmica. Como os mo- delos apresentam cadeias helicoidais, a prevalência de grande parte desta estrutura durante a dinâmica é de fundamental importância para análises posteriores. Contudo, houve uma quebra da molécula no modelo de pilus (II) em um instante próximo de 50 ns de dinâmica. Sendo assim todas as análises referentes a este modelo serão feitas para a primeira metade da trajetória. Uma forma de identificar uma estrutura predominantemente helicoidal é a análise de ligações de hidrogênio formadas entre átomos de hidrogênio e oxigênio no esqueleto da proteína. Na Figura 4.21 estão representadas as distâncias entre estes átomos. Figura 4.21 – Distâncias entre átomos de hidrogênio e oxigênio presentes em uma das hélices do pilus (II). Fonte: Elaborado pelo próprio autor Assim, distâncias próximas de 3 Å entre estes átomos indicam uma estrutura heli- coidal. A partir da função de distribuição radial(RDF) utilizada no pós processamento Capítulo 4. Resultados e Discussão 58 do GROMACS, obtivemos curvas indicando as distâncias mais frequentes entre os átomos de hidrogênio e oxigênio do esqueleto da fibra. A função de distribuição radial utiliza como referência um átomo de hidrogênio e divide o espaço em torno deste átomo em cascas esféricas de raios diferentes. A partir disto, o método determina o número de átomos de oxigênio presente em cada casca ao longo de toda a dinâmica. O cálculo é feito para cada átomo de hidrogênio do esqueleto e uma curva é obtida ao final do processo. A Figura 4.22 representa as curvas RDF obtidas para os dois modelos de pilus. Figura 4.22 – Distribuição radial no backbone de átomos de oxigênio do com relação aos átomos de hidrogênio. Fonte: Elaborado pelo próprio autor As curvas obtidas para ambos os modelos são similares, com picos situados a dis- tâncias próximas de 3 Å, o que evidencia uma frequência significativamente alta de oxigênios próximos a hidrogênios no backbone, indicando uma estutura predomiman- temente helicoidal para as subunidades da fibra em toda a trajetória. Mesmo através da visualização direta dos frames no VMD, foi possível notar que as subunidades mantiveram as caracterísitcas helicoidais em grande parte de suas estruturas após 100 ns de evolução. Os contatos aromáticos presentes em cada estrutura configuram uma característica importante do sistema. Anéis aromáticos próximos podem indicar empilhamento (pi stacking). Como citado anteriormente, este trabalho apresenta interesse particular na estrutura eletrônica de aglomerados aromáticos. A interação entre subunidades vizinhas resultou, inicialmente, em uma organização estruturada dos resíduos Phe1, Phe24 e Tyr27 na região central da fibra no modelo do pilus (I). Assim, verificar a estabilidade destes resíduos é de fundamental importância, visto que grupos aromáticos podem desempenhar uma função importante em regimes de transporte de carga em proteínas. Capítulo 4. Resultados e Discussão 59 Enquanto isso, a estrutura inicial do pilus (II) não apresentava uma organização padrão dos resíduos de fenilalanina e tirosina. Em contrapartida, tais resíduos são frequentes na estrutura e alguns se encontravam a curtas distâncias. A identificação de contatos próximos predominantes entre esses grupos em toda a trajetória pode indicar aglomerados na estrutura, mesmo que aleatórios. A análise da proximidade de resíduos aromátic