RESSALVA Atendendo solicitação do(a) autor(a), o texto completo desta tese será disponibilizado somente a partir de 25/05/2020. 0 unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” CAMPUS DE ARARAQUARA FACULDADE DE CIÊNCIAS E LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LINGUÍSTICA E LÍNGUA PORTUGUESA CURSO DE DOUTORADO GLAUCIA MIRIAN SILVA VAZ MICRODIAGRAMA DO FASCÍNIO POR ASSASSINOS EM SÉRIE: práticas midiáticas e subjetividades ARARAQUARA – SP MAIO/2018 1 GLAUCIA MIRIAN SILVA VAZ MICRODIAGRAMA DO FASCÍNIO POR ASSASSINOS EM SÉRIE: práticas midiáticas e subjetividades Tese apresentada ao curso de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Araraquara da Unesp como requisito parcial para obtenção do título de doutora. Linha de Pesquisa: Estrutura, Organização e funcionamento discursivos e textuais. Orientadora: Profª Dra. Maria do Rosário F. V. Gregolin Bolsa: CNPq 140905/2014-6 ARARAQUARA – SP MAIO/2018 2 Vaz, Glaucia Mirian Silva Microdiagrama do fascínio por assassinos em série: práticas midiáticas e subjetividades / Glaucia Mirian Silva Vaz — 2018 163 f. Tese (Doutorado em Linguística e Língua Portuguesa) — Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Faculdade de Ciências e Letras (Campus Araraquara) Orientador: Maria do Rosário de Fátima Valencise Gregolin 1. Assassinos em série. 2. Mídias. 3. Análise do discurso. I. Título. Ficha catalográfica elaborada pelo sistema automatizado com os dados fornecidos pelo(a) autor(a) 3 GLAUCIA MIRIAN SILVA VAZ MICRODIAGRAMA DO FASCÍNIO POR ASSASSINOS EM SÉRIE: práticas midiáticas e subjetividades Tese apresentada ao curso de Doutorado do Programa de Pós-graduação em Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras – Campus de Araraquara da Unesp como requisito parcial para obtenção do título de doutora. Linha de Pesquisa: Estrutura, Organização e funcionamento discursivos e textuais. Orientadora: Profª Dra. Maria do Rosário F. V. Gregolin Bolsa: CNPq 140905/2014-6 Data da defesa: 25/05/18. MEMBROS COMPONENTES DA BANCA EXAMINADORA: Presidente e Orientadora: Profª. Drª. Maria do Rosário de Fátima Valencise Gregolin Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) Membro Titular: Prof. Dr. Cleudemar Alves Fernandes Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Membro Titular: Profª. Drª Ivânia dos Santos Neves Universidade Federal do Pará (UFPA) Membro Titular: Prof. Dr Israel de Sá Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Membro Titular: Prof. Dr. Vinícius Durval Dorne Universidade Federal de Uberlândia (UFU) Local: Universidade Estadual Paulista Faculdade de Ciências e Letras UNESP – Campus de Araraquara 4 AGRADECIMENTOS Sem dúvida, este doutoramento foi realizado por um percurso muito diferente daquele percorrido durante o mestrado: outra configuração de constituição, outros sujeitos, outra instituição, outros modos de enunciar. Algo, no entanto, é certo e recorrente: o caminho nunca é percorrido sozinho. E este é o lugar em que cada amigo, cada familiar, cada colega, cada professor são efetivamente ditos e, assim, postos na ordem de irrupção deste acontecimento acadêmico. É tempo de agradecer. Inicio por minha família que, acreditando e apostando em mim, por pressão amorosamente institucionalizada (institucionalmente amorosa), me incitou a realizar o curso. Rede de relações das mais intrigantes que eu poderia conhecer no mundo, a família tem esse caráter de agenciar amor, aconchego, segurança. Tem também o caráter agenciador de demandas, obrigações, incômodos. Os incômodos. Sem eles, a lugar nenhum chegamos porque de lugar nenhum queremos sair. Agradeço, assim, à minha família, agenciadora de mim, essa subjetividade incomodada. Obrigada Fátima, Antônio e Juninho. Obrigada, Juliana, por ser parte da minha família e minha parceira e por acrescentar um modo a mais nessa maquinaria complexa, não menos bonita. Talvez me arrisque dizer que, em nós, superfície, que nos inventamos nessa relação, o amor se inscreve com cada sorriso seu. Obrigada, professora Rosário, pela oportunidade, pela paciência, pelas questões maravilhosamente desestabilizadoras, por ser a Gregolin de todos nós, para todos nós, desatados ou não, encantados pelos seus textos, suas aulas, sua postura incentivadora. Obrigada, professora Luciane, por abrir a porta e me permitir entrar e arriscar. Por ser tão trabalhadora, questionadora e responsiva, nos fazendo compreender a importância do trabalho dedicado. Obrigada, professor Cleudemar, pelo carinho das críticas duras. Profissional, ético, objetivo, sério. Sempre o respeitei e tudo indica que esse respeito aumenta a cada dia mais. Obrigada professora Ivânia, pela leitura atenta, pela consideração e respeito com que recebeu minha proposta de pesquisa. A despeito das lacunas e falhas de meu texto, sua generosidade em refleti-las comigo é uma preciosidade. Obrigada, professores Vinícius e Israel, pela paciência e pelas contribuições valiosas. Cada pontuação, cada pergunta e cada crítica foram incentivos formulados de modo muito profissional e educado. Com vocês, a banca não poderia ter composição melhor. 5 Obrigada aos colegas de Geada, com quem tive momentos tão ricos de debates e estudos. Em especial, à Juliane Gonzaga, parceira no Geada, amizade das mais queridas em/de Araraquara e exemplo de dedicação sem igual. Obrigada, amiga, você é um “achado” arqueogenealógico! Obrigada, colegas do Colégio Estadual “Maria Elias de Melo”, em especial à diretora Florecy Pereira Mundim, que me apoiou durante as viagens à Araraquara. Obrigada, ainda, aos novos colegas do Centro de Ensino de Tempo Integral “Polivalente Dr. Tharsis Campos”, pela acolhida e compreensão durante os últimos meses do curso, dias tensos em que me dividi entre as atribuições e responsabilidades como professora e a redação final da tese, os protocolos e a defesa. Agradeço ao Programa de Pós-graduação em Linguística e Língua Portuguesa da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara pela oportunidade e respaldo acadêmicos. Agradeço, ainda, ao CNPq pelo financiamento desta pesquisa e à Secretaria de Educação, Cultura e Esportes de Goiás pela licença para cursar o doutorado. 6 VAZ, Glaucia M. S. Microdiagrama do fascínio por assassinos em série: práticas midiáticas e subjetividades. 2018. 142 f. Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, 2018. RESUMO Dado o levantamento da fortuna crítica e da circularidade dos estudos pautados em uma explicação psicologista do fascínio por assassinos em série, esta pesquisa se pauta na compreensão do fascínio como construção discursiva que se dá em práticas midiáticas contemporâneas (mídia jornalística, mídias sociais e franquias culturais). Esta tese tem como objetivo geral traçar um diagrama da relação de forças entre esses diferentes suportes midiáticos. Isto decorre em três objetivos específicos, a saber: positivar as regularidades de surgimento de um regime de enunciados que forma sistematicamente o fascínio por assassinos em série no elemento de um arquivo; evidenciar as regras que incidem na configuração do discurso do fascínio partindo da análise do modo como a mídia jornalística nacional constrói o criminoso célebre e de como as mídias sociais o enunciam como ídolo; evidenciar as regras de emergência do assassino em série como objeto de consumo materializado em produtos de entretenimento como séries de televisão. Pautada na Análise de discurso francesa com a perspectiva arqueogenealógica de Michel Foucault, esta tese visa evidenciar uma ordem discursiva do olhar sobre o assassino em série, ordem esta que remete a uma subjetividade consumidora dessas visualidades/dizibilidades. O corpus é composto por séries enunciativas cuja materialidade é imagética e verbal, formuladas em sistemas de distribuição que vão desde a materialidade dos diferentes suportes como a magazine impressa Veja e o jornal O Estadão, passando pelas postagens na fanpage Assassinos em Série do Facebook até o material publicitário da série Dexter e da cinematografia da série Hannibal. Por fim, esta tese apontou a necessidade de refletir sobre o modo como consumimos a nós mesmos, como sujeitos, já que nos subjetivamos por meio de estratégias midiáticas cuja finalidade é mercadológica. Isso implica refletir sobre a subjetividade pelo viés das práticas consumidoras. Palavras-chave: Mídias. Assassinos em série. Discurso. Foucault. 7 VAZ, Glaucia M. S. Microdiagramme de la fascination par les tueurs en série: pratiques médiatiques et subjectivités. 2018. 142 f. Thèse (doctorat) - Université d'État de São Paulo, Faculté des Sciences et Lettres d'Araraquara, 2018. RÉSUMÉ Compte tenu de l'enquête de la fortune critique et circularité des études guidées dans un psychologue expliquant la fascination pour les tueurs en série, cette recherche est basée sur la compréhension de la fascination comme une construction discursive qui se passe dans les pratiques médiatiques contemporaines (médias d'information, médias sociaux et les franchises culturelles). Cette thèse vise à dessiner un diagramme de la relation de forces entre ces différents médias. Cela fait suite à trois objectifs spécifiques, à savoir: faire positif les régularités de l'émergence d'un régime établi comment systématiquement la fascination pour les tueurs en série dans un élément de archive; montrer les règles qui affectent la configuration de le discours de fascination basée sur une analyse de la façon dont les médias de nouvelles nationales construit le célèbre criminel et comment les médias sociaux annoncent l'idole; mettre en évidence les règles d'urgence du tueur en série en tant qu'objet de consommation incarné dans les produits de divertissement tels que les séries télévisées. Basée sur l'analyse du discours français avec la perspective archéo-généalogie foucaldienne, cette thèse vise à mettre en évidence un ordre discursif du regard sur le tueur en série, un ordre qui renvoie à une subjectivité consommatrice de ces visibilités/énoncés. Le corpus est composé de séries énonciatives dont la matérialité a image et verbale, formulée dans des systèmes de distribution allant de la matérialité des différents supports tels que le magazine imprimé Veja et le journal O Estadão, à travers les fanpage Assassinos em série de Facebook à la publicité de la série Dexter et cinématographie de la série Hannibal. Enfin, cette thèse a souligné la nécessité de réfléchir sur la façon dont nous nous consommons, en tant que sujets, puisque nous nous subjectivons à travers des stratégies médiatiques dont le but est le marketing. Cela implique une réflexion sur la subjectivité en face des pratiques de consommation. Mots-clés: Média. Tueurs en série. Discours. Foucault 8 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 Capas do jornal Notícias Populares nas décadas de 1960 e 1970 29 Figura 2 Série Enunciativa A 36 Figura 3 Norman Bates, de Psicose (1960) 41 Figura 4 Série Enunciativa B 43 Figura 5 Série Enunciativa C 45 Figura 6 Série Enunciativa H 52 Figura 7 Série Enunciativa I 56 Figura 8 Série Enunciativa J 58 Figura 9 Série Enunciativa K 62 Figura 10 Série Enunciativa L 64 Figura 11 Página oficial da loja online da Showtime: produtos da série Dexter 76 Figura 12 Série Enunciativa M 79 Figura 13 Série Enunciativa N 82 Figura 14 Zéfiros e Clóvis 84 Figura 15 Série Enunciativa O 86 Figura 16 Série Enunciativa P 88 Figura 17 Página inicial do blogue O Aprendiz Verde 93 Figura 18 Série Enunciativa Q 96 Figura 19 Trecho da postagem Serial Killer: O Vampiro de Niterói 98 Figura 20 Coleção pessoal da administradora da fanpage: fotos de Jeffrey Dhamer 100 Figura 21 Tatuagens 101 Figura 22 Camiseta Serial Killers 102 9 LISTA DE TABELAS Tabela 1 Mix de produtos Dexter 77 Tabela 2 Mix de produtos Hannibal 77 10 SUMÁRIO CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS............................................................................ 12 CAPÍTULO 1 – O fascínio na mídia de imprensa jornalística em 1970, 1990 e 2014: do monstruoso ao belo........................................................................................................... 26 1.1) Assassinos em série na mídia jornalística......................................................................... 27 1.2) Sensacionalismo e fait divers........................................................................................... 29 1.3) Efeitos e práticas na mídia brasileira................................................................................ 31 1.3.1) A maldade da loucura......................................................................................... 35 1.3.2) A loucura do criminoso...................................................................................... 44 1.3.3) O monstro no corpo das vítimas........................................................................ 50 1.3.4) O corpo do criminoso em evidência.................................................................. 54 1.4 Considerações do capítulo................................................................................................. 66 CAPÍTULO 2 – O fascínio na franquia de mídia: o ícone cultural................................... 68 2.1) Assassinos em série da indústria de entretenimento......................................................... 68 2.2) Franquia de mídia como dispositivo................................................................................. 70 2.2.1) Da massificação ao nicho....................................................................... 72 2.2.2) Mix de produtos...................................................................................... 75 2.2.3) Fandom: o ídolo como fenômeno na comunidade de fãs....................... 80 2.3) O assassino esteta e o homicídio como obra de arte......................................................... 80 2.4) O assassino justiceiro........................................................................................................ 86 2.5) Considerações do capítulo................................................................................................ 89 CAPÍTULO 3 – O fascínio nas mídias sociais digitais: o ídolo.......................................... 91 3.1) Blogue O aprendiz verde.................................................................................................. 92 3.2) Página/comunidade Assassinos em série do Facebook.................................................... 99 3.3) Serial Killer de Goiânia e os áudios de Whatsapp......................................................... 103 3.4) Considerações do capítulo.............................................................................................. 105 CAPÍTULO 4 – Dos lugares teórico-metodológicos.......................................................... 108 4.1) Problematização do objeto de pesquisa.......................................................................... 108 11 4.2) Delimitação do corpus.................................................................................................... 110 4.2.1) Função enunciativa........................................................................................... 111 4.2.2) Arquivo: acúmulo raridade e a priori histórico............................................... 115 4.3) O discurso: prática e acontecimento............................................................................... 118 4.4) Protocolos de leitura....................................................................................................... 121 4.5) Dispositivo...................................................................................................................... 122 4.5.1) Positividade e tipos ideais................................................................................ 123 4.5.2) Operador concreto de subjetividades............................................................... 126 4.5.3) Cultura da convergência e Indústria Cultural da Escola de Frankfurt............. 127 4.6) Diagrama e arqueogenealogia......................................................................................... 131 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................. 134 REFERÊNCIAS................................................................................................................... 137 ANEXOS................................................................................................................................ 141 Anexo A: Página do jornal O Estadão digitalizada............................................................................. 142 Anexo B: Capa da revista Veja (26 de fevereiro de 1992)................................................................... 143 Anexo C: Reportagem A mente do monstro completa digitalizada..................................................... 144 Anexo D: Capa da Veja digitalizada (12 de agosto de 1998)............................................................... 150 Anexo E: Reportagem Fui eu completa digitalizada........................................................................... 151 Anexo F: Captura de tela da reportagem do Correio Braziliense........................................................ 159 Anexo G: Captura de tela da reportagem d’ O tempo.......................................................................... 160 Anexo H: Captura de tela da reportagem do Jornal Opção................................................................ 161 Anexo I: Captura de tela da reportagem do jornal O Popular (1)....................................................... 162 Anexo J: Captura de tela da reportagem do jornal O Popular (2)....................................................... 163 12 CONSIDERAÇÕES INTRODUTÓRIAS De como se chegou ao objeto desta tese Antes de qualquer coisa, é importante fazer uma apresentação do projeto que foi transformado nesta tese bem como do percurso que me levou a refletir sobre a relação entre o fascínio por assassinos em série e o consumo. Durante o mestrado, me ocupei da constituição identitária do matador em série no discurso literário, a partir de enunciados de dois romances de Patrícia Melo. Em O Matador (1995) e Mundo Perdido (2006), o assassino era um matador profissional, contratado por um grupo de comerciantes importantes que buscavam alguma segurança alternativa à instituição policial e por aqueles que buscavam solução contra a violência urbana através da eliminação de ladrões, estupradores e assassinos. A defesa social via a eliminação da vida dos criminosos foi uma regularidade analisada na dissertação e os enunciados que compunham o corpus de pesquisa configuravam o discurso de justificativa para aceitação de um matador profissional que protegesse a sociedade da violação da propriedade privada e oferecesse à comunidade uma forma de retratação da violência que o Estado não oferece, por meio de vingança. Naquele momento, a série de televisão estadunidense Dexter (2006-2013) estava no auge (tendo iniciado sua exibição no Brasil em 2007 pelos canais FX Brasil e Liv, e em 2010 na RedeTV!) e tinha em comum com os referidos romances o fato de que os enunciados se caracterizavam por posições-sujeito que construíam o protagonista como justiceiro. Em ambos eram assassinos e eliminavam criminosos, o que despertou meu interesse pela série. Em Dexter, entretanto, o assassino não matava por uma retratação social, matava por prazer. Tratava-se da conhecida figura midiática do assassino em série, cuja finalidade de matar é satisfazer uma vontade individual, sendo o assassinato direcionado apenas a criminosos (caso da série) um meio de esconder seu comportamento homicida com o argumento de que tal vontade de matar fosse útil à sociedade. O fato é que assassinos são tematizados de modo significativo na literatura, como em romances e em produtos de entretenimento e são admirados de forma diferente do que ocorre com o banditismo de Hobsbawn (1976): o assassino em série não é o herói camponês cujo laço com a comunidade é estreito e familiar1: ele é o sujeito urbano contemporâneo, onde os 1 Refiro-me ao banditismo social, forma particular de criminalidade que aparece entre o século XVI e XIX como uma reação das pequenas e tradicionais comunidades locais rurais contra emergência da modernização das grandes propriedades rurais: “O ponto básico a respeito dos bandidos sociais é que são proscritos rurais, 13 sujeitos se relacionam de modo distante e impessoal. Embora não seja um assassino em série, o caso de Pierre Rivière2 (FOUCAULT, 2013) promove uma reflexão acerca da criminalidade e sua relação com determinada configuração socioeconômica, já que assassinos em série não são sujeitos que viveram a miséria no campo, sendo a posse de terras o único meio de ascensão social: considerados egoístas e preocupados em atender senão sua satisfação pessoal, assassinos em série são sujeitos de uma sociedade biopolítica e líquida (afirmação que explicitarei mais adiante), algo, em princípio, contraditório, mas, dentro de uma perspectiva discursiva, um efeito. Ponderei, então, que seria importante refletir sobre o modo como a criminalidade foi tematizada na literatura e espetacularizada na mídia. Conforme Foucault (2008), os noticiários policiais do início do século XIX apresentavam o delinquente como cotidiano, mas temível. Por outro lado, os romances policiais (ou de crime) surgem para dissociar o delinquente de sua popularidade. Por volta de 1840 aparece o herói criminoso, herói porque criminoso, que não é nem aristocrata nem popular. A burguesia, então, se propicia seus próprios heróis criminosos. Foi nesse mesmo momento que se constituiu o corte entre os criminosos e as classes populares: o criminoso não deve ser um herói popular, mas sim um inimigo das classes pobres (FOUCAULT, 2010, p. 165). A criminalidade ou delinquência, nesse sentido, é constitutiva da lei como forma de normatização da ilegalidade. O assassino em série, embora decorrente do delinquente do século XIX, apresenta outros contornos de irrupção. O delinquente serviu para justificar a vigilância e controle policiais; já o assassino em série funciona para justificar as diversas ciências que compõem a prática forense. Em primeiro lugar, ao colocar o delinquente como exemplar clínico da espécie humana; em segundo lugar, ao ser um categorizador não de controle, mas investigação científica na captura do criminoso. Hoje, tema não específico da literatura, o assassino em série ou serial killer é bastante popular no entretenimento de massa e na imprensa. Todo um fenômeno baseado na figura do serial killer irrompe, na década de 1970, quando institutos policiais acionaram o aparato médico para defini-lo como categoria específica de criminoso. Desde então, a mídia tornou o encarados como criminosos pelo senhor e pelo Estado, mas que continuam a fazer parte da sociedade camponesa, e são considerados por sua gente como heróis, como campeões vingadores, paladinos da justiça, talvez até mesmo como líderes da libertação e, sempre, como homens a serem admirados, ajudados e apoiados (HOBSBAWM, 1976, p 11). 2 Foucault, ao analisar o julgamento de um jovem camponês normando do século XIX chamado Pierre Rivière, demonstra como a forma jurídica do Inquérito indicava o dano como infração contra um indivíduo ao Estado, à sociedade e ao soberano. 14 serial killer o espetáculo do horror e do medo, especialmente nos Estados Unidos. O assassino em série passa a ser tema de filmes, músicas e romances. No Brasil, essa popularização só ocorre de forma massiva a partir dos anos 90, quando os maníacos começam a pulular as matérias de jornais e o termo serial killer ou assassino em série passa a ser bastante comum nos noticiários. A partir de então, o assassino em série se torna objeto de curiosidade e discussão entre especialistas também no Brasil, especialmente, com a popularização das séries televisivas. Para ser bastante sintética, poderia citar o romance O Perfume (1985), de Patrick Suskind, transposto para o cinema em 2006 bem como o romance Psycho (1959), de Robert Bloch, transposto para o cinema e para a série televisiva Bates Motel (2013). É sintomática ainda a produção das séries de televisão lançadas em 2013, The Folowing e The Fall, e a já em exibição desde 2005, Criminal Minds. A infinidade das obras literárias e suas transposições cinematográficas geralmente se insere na literatura policial cujo cunho narrativo é o do romance de crimes a que se refere Foucault (2008): enaltecer o trabalho da polícia e tornar a criminalidade estranha, exótica. Porém, o assassino em série não possui o mesmo apelo popular que o delinquente do século XIX: funciona como efeito (e consequente normatizador) de uma falha na administração das populações, é indicador de que algo não funcionou na gestão da espécie humana: amoralidade, falta de culpa, de empatia, de sentimentos. No entanto, o que considero necessário problematizar não é a tematização de assassinos em série em diferentes domínios, mas o fascínio a que estão atrelados. Este é o ponto em que se distingue esta tese dos demais estudos sobre assassinos em série. Em primeiro lugar, porque é necessário compreender que não há como tematizar assassinos em série sem falar no fascínio que produzem. E não me refiro a fascínio como algo restritamente benfazejo, mas ao que o verbo fascinar tem em sua literalidade: “dominar com o olhar” (HOUAISS, 2009), seja de modo admirável, surpreendente ou assombroso. Gostaria que a palavra fascínio fosse levada nesse sentido de força, de subjugação pelo olhar, de efeito de um jogo entre o que é visto e o que observa. Tomada dessa maneira, a palavra fascínio permite pensar o assassino em série como uma subjetividade submetida a determinado conjunto de procedimentos de visibilidade e de dizibilidade. Tais observações remetem a questionar, em primeiro lugar, por que o prazer em matar (representado pelo assassino em série), enquanto produto de entretenimento, emerge como discurso possível num sistema biopolítico? Em segundo lugar, quais as regras de emergência e de circulação do fascínio por assassinos em série e como ele ocorre no Brasil hoje? E, por 15 último, seria o entretenimento de onde vem a principal linha de força desse discurso? Se não, quais seriam as demais e de que modo atuariam? Assim, cheguei a esta tese, considerando o fascínio por assassinos em série como objeto de discurso cujas regras que o configuram num regime de enunciação se encontram numa exterioridade. O discurso do fascínio tem seus enunciados dispersos na descontinuidade da história e se caracteriza como um acontecimento, isto é, como aquilo que irrompe na aparente evidência de uma continuidade e que, sendo objeto de discurso, não tem origem e nem sempre foi evidente, mas é um limiar na descontinuidade histórica. Nesse sentido, defendo que as linhas de força advém do modo como os assassinos em série são dados a ver/falar, ou seja, como são dados a ler/interpretar em/como produtos de consumo. Tendo uma relação bastante estreita com os suportes midiáticos, os assassinos em série são postos numa esfera de fascínio por práticas leitoras, que proponho ampliar para pensar como práticas espectadoras/interpretadoras e, antes de tudo, consumidoras). O modo como determinados suportes midiáticos orientam como serão vistos/ditos/interpretados/consumidos é que configura o discurso do fascínio. Nesse sentido, afirmo que o discurso do fascínio se constitui a partir de práticas leitoras/interpretadoras/consumidoras e compõe o dispositivo midiático em sua heterogeneidade e diversidade. Talvez haja uma tendência, dentro do raciocínio que elaboro, em atrelar o assassino em série ao delinquente de Vigiar e Punir (FOUCAULT, 2008). No entanto, repito: o delinquente surge como um tipo de delinquência que afasta a ilegalidade da camada popular da sociedade, surge em meados da metade do século XIX na Europa e atende à justificativa de uma vigilância policial. O assassino em série, por outro lado, surge nos institutos forenses estadunidenses, ou seja, é categorizado como criminoso somente na segunda metade do século XX e emerge no momento em que as ciências se dividem em especialidades. O assassino em série não surge como um tipo de herói criminoso da burguesia europeia do século XIX. Ele, de certo modo, é o descendente do delinquente e constitui o desenvolvimento das ciências criminológicas, mas suas condições históricas de emergência são distintas das do delinquente. Esse tipo específico de criminoso não emerge para atender à sociedade disciplinar ou de controle3, ele emerge e só poderia emergir numa sociedade biopolítica, porque ele permite 3 A sociedade disciplinar é estudada por Foucault em Vigiar e Punir (2008b) e se caracteriza por “uma rede difusa de dispositivos, instituições (prisão, fábrica, asilo, escola etc.) que estruturam o terreno social e fornecem explicações lógicas para a disciplina – esse paradigma de poder esteve na base de toda a primeira fase do capitalismo” (GREGOLIN, 2007, p. 18). Deleuze (2010) sustenta que há uma transição da sociedade disciplinar para uma sociedade de controle, na qual “os mecanismos tornam-se cada vez mais 16 apontar a importância da vida humana, a humanidade dos corpos e a ética humana. O assassino em série só poderia emergir numa sociedade biopolítica porque é nela que a vida humana como espécie ganha força e cuidado, tornando-se governável. Na biopolítica, o que é reivindicado e serve de objetivo é a vida, entendida como as necessidades fundamentais, a essência concreta do homem, a realização de suas virtualidades, a plenitude do possível. Pouco importa que se trate ou não de utopia; temos aí um processo bem real de luta; a vida como objeto político foi de algum modo tomada ao pé da letra e voltada contra o sistema que tentava controlá-la (FOUCAULT, 2012, p. 158). O assassino em série é o oposto normatizador de um sujeito ético numa sociedade de direito: ele exerce o poder soberano sobre a vida e a morte humanas (poder contra o qual a biopolítica emerge), decide e elimina o direito sobre a vida. Ele se insere numa regulação da prática de matar, que aponta a importância da vida humana como direito fundamental e se contrapõe aos casos em que matar é possível apenas para uma defesa da vida. Por ser um praticante emblemático do homicídio gratuito e perverso (inútil, portanto), define o inaceitável numa sociedade de direitos humanos. Ele aponta os limites da prática de matar numa sociedade biopolítica: atentar contra a vida humana ou atentar contra a vida humana sem nenhuma justificativa produtiva, isto é, defensiva. Como um criminoso que não se confunde com o delinquente que justifica o trabalho da polícia e constitui a sociedade disciplinar e de controle, o assassino em série foi celebrizado (dado a ver e a falar ) pela mídia como monstro com a figura do maníaco e superestimado pelas ciências forenses. Tais construções, no entanto, são transformadas quando a indústria de entretenimento investe na venda de franquias cujo tema é o assassino em série. Desse modo, me refiro de modo muito pontual ao serial killer, a essa noção de assassino em série tal como conhecemos hoje. O que não significa que só se falou desse tipo de assassino a partir do período mencionado acima. As figuras do monstro, do maníaco e do criminoso, que nele culminaram, não emergiram no século XXI, muito menos sempre compuseram o campo discursivo da criminologia. A noção de assassino em série e a forma como tal noção circula atualmente é uma irrupção histórica sem origem, mas com começos diversos, em regras de visibilidade/dizibilidade de diferentes configurações históricas e que remetem a agenciamentos diversos. “democráticos”, cada vez mais interiorizados pelos sujeitos: esse poder é exercido por máquinas que organizam o cérebro (redes de informação) e os corpos (em sistemas de bem-estar, atividades monitoradas etc.)” (GREGOLIN, 2007, p. 18). 17 Por isso suas condições históricas são diferentes daquelas em que surge o delinquente, embora a lógica seja a mesma, já que considero a constituição desse sujeito pelo viés arqueogenealógico, mas o que permanece é o modo de analisar tal constituição e não que ela seja a mesma e ocorre do mesmo modo. Afinal, "Como exercer o poder da morte, como exercer a função da morte, num sistema político centrado no biopoder?" (FOUCAULT, 1999, p. 304). Porém, não é sobre a constituição do assassino em série como sujeito de criminalidade a que esta tese se propõe. Essa é uma discussão para ser desenvolvida em outra oportunidade. O discurso do fascínio constituído a partir de práticas leitoras é o meio pelo qual o consumo se efetiva: esta é a tese, ou seja, trata-se da constituição dos sujeitos consumidores (de revistas, de notícias meio eletrônico, de produtos de entretenimento), é sobre o potencial de consumo que nossa sociedade atingiu, sobre o modo como compramos, assistimos a, desejamos, consumimos ídolos mesmo que eles sejam, em primeira instância, o protótipo oposto ao que é defendido, aceitável, ético e humano. O fascínio não é o objeto em si sobre o qual uma análise deve se debruçar, mas o ponto de partida para refletir sobre o modo como a subjetividade é transformada em produto de consumo. Por esse motivo, uma análise do discurso do fascínio por assassinos em série é primordial para compreender o que a franquia cultural, como um dispositivo de subjetivação, consegue fazer e como o consegue: tornar fascinante aquele que tem o poder sobre a vida e morte humanas enquanto esse poder não deveria caber a qualquer um nem em qualquer circunstância. Além disso, a análise que proponho adentra as estratégias midiáticas de produção de uma subjetividade posta em evidência e construída sobre as figuras do monstro, do maníaco, da celebridade, do ídolo e ícone até que chegue ao acontecimento discursivo. Subjetividade esta que responde ou deveria responder a uma demanda, a um público-alvo, que é sua contraparte, o interessado em, o curioso por, o leitor de, o admirador, o fascinado por: só se pode vender algo a alguém que queira consumi-lo. E não me refiro a uma visão ideológica da mídia, como aparelho repressor, como discurso dominante, mas, como afirma Gregolin (2007), trata-se de compreender a mídia como um dispositivo que agencia essa subjetividade consumidora e a subjetividade consumida. A subjetividade não se situa no campo individual, mas no de todos os processos de produção social e material e, consequentemente, o sujeito moderno é um consumidor de subjetividade: ele consome sistemas de representação, de sensibilidades. A subjetividade está em circulação, é essencialmente social, assumida e vivida por indivíduos em suas existências particulares. Colocando em circulação enunciados que regulamentam as 18 formas de ser e agir, os meios de comunicação realizam um agenciamento coletivo de enunciação, entrecruzando determinações coletivas sociais, econômicas, tecnológicas etc. (GREGOLIN, 2007, p. 21). Nesse caso, convém ressaltar que, embora as condições de emergência do assassino em série sejam diferentes daquelas em que o delinquente surge, o interesse pelas vidas infames já foi apontado por Michel Foucault quando investiga documentos como as lettres de cachet e mostra como a vida cotidiana se torna interesse público com finalidade administrativa como forma de controle sobre o comportamento e a conduta dos indivíduos durante a monarquia absolutista francesa (FOUCAULT, 2005). Novamente a biopolítica é a configuração histórica a partir da qual o assassino em série adentra um regime de discursos: não apenas funcionalmente como normatizador, como apontado anteriormente, mas também como efeito de procedimentos através dos quais a governamentalidade opera, colocando em evidência os acontecimentos cotidianos das existências “sem importância”. É nesse momento em que a vida cotidiana e as subjetividades mais ínfimas são ditas, sendo vetorizadas pelo poder em suas práticas mais microscópicas. Este é um segundo sentido em que a biopolítica se relaciona com o fascínio por assassinos em série. Assim, é necessário avaliar como ocorre a emergência do fascínio por esse sujeito em uma sociedade consumista, convergente, pós-moderna e biopolítica pois: a) há todo um viés psicologista de estudos que, buscando explicar o interesse pelo assassino em série, apontam para uma certa circularidade das discussões e não deveria ser a única perspectiva, embora rica, para a compreensão desse tema, que poderia ser pensado em termos de discurso; b) a cultura de consumo produz subjetividade consumível que representa o prazer ou indiferença em matar, ações que coexistem de forma tensa com o sistema biopolítico (em que a vida humana é um bem importante); c) é preciso, ainda, colocar em pauta todo um processo de subjetivação dos sujeitos consumidores a partir de estratégias de leitura que orientam o olhar para o assassino em série e produz efeitos de sentido que se localizam em determinado regime de visibilidade/dizibilidade, ou seja, analisar o modo como os sujeitos são dominados pelo olhar (fascinados). Diante de tais considerações, tenho como objetivo geral traçar um diagrama das relações de força entre esses diferentes suportes midiáticos, abarcando a problematização do discurso do fascínio por assassinos em série pelo viés de uma postura arqueogenealógica, isto 19 é, em seu caráter histórico, dentro de um regime de práticas. Isto decorre em três objetivos específicos, a saber: 1. positivar as regularidades de surgimento de um regime de enunciados que forma sistematicamente o fascínio por assassinos em série no elemento de um arquivo; 2. evidenciar as regras que incidem na configuração do discurso do fascínio partindo da análise do modo como as mídias (jornalística, social e cultural) funcionam na elaboração de uma subjetividade consumível; 3. evidenciar os modos de subjetivação dos sujeitos consumidores. Fundamentos teórico-metodológicos Pautando esta proposta de pesquisa em uma perspectiva arqueogenealógica, executarei os objetivos fazendo funcionar alguns conceitos, nas análises e na delimitação do corpus, já que são considerados, afinal, como teórico-metodológicos. A estrutura da tese seguirá um percurso redacional próprio ao modo como delineei o objeto de pesquisa e ao modo como se apresentam, numa análise exploratória, as materialidades. Assim, os procedimentos constituem-se em: a) Delinear o corpus seguindo um trajeto temático a partir de diferentes materialidades para definir um conjunto de enunciados que constituem o discurso do fascínio por assassinos em série. b) Tomar o enunciado, de modo operatório, em seu aspecto semiológico, já que as materialidades são sincréticas e analisá-lo em séries enunciativas; c) Evidenciar posições-sujeito (que apontam para a construção do assassino em série como monstro, maníaco, celebridade, ícone e ídolo) para buscar as regularidades enunciativas na dispersão caracterizada pela sistematicidade de um arquivo; d) Balizar o discurso em seu aspecto de prática e em sua heterogeneidade; e) Descrever como ocorrem as estratégias midiáticas que orientam o olhar-leitor na construção do monstro, do maníaco e da celebridade criminoso a partir da noção de anormal advindo do aparato médico-jurídico; f) Elucidar as técnicas da franquia cultural que, produzindo o assassino em série como produto de consumo, subjetivam os sujeitos consumidores. g) E, por fim, explanar e refletir como os conceitos foram mobilizados nas análises. Nos três capítulos analíticos que seguem a fortuna crítica, evidencio séries enunciativas de um arquivo, nas quais a subjetividade dada a 20 ver/ler/examinar/admirar/consumir implica a constituição de uma subjetividade leitora/admiradora/fã/consumidora. Esclareço, de modo sumular, mas necessário, que o termo subjetividade é tomado em seu sentido histórico, como processo de subjetivação ou modos pelos os seres humanos se tornam sujeitos. Essa perspectiva é claramente a perspectiva foucaultiana da subjetividade. A teoria do discurso subjacente às propostas foucaultianas deriva do seu objetivo fundamental de compreender como se articulam os processos de subjetivação e as verdades no âmbito da produção discursiva. É importante ressaltar, desde o início, que em Foucault a subjetividade não se refere ao sujeito em sua essencialidade ou individualidade e, muito menos, como categoria ontologicamente invariável. A subjetividade é entendida como efeito de processos de subjetivação modificáveis e plurais. Assim, uma análise de discursos com Michel Foucault convida à construção de objetos discursivos numa tríplice tensão entre a sistematicidade da linguagem, da historicidade e da produção de subjetividades (GREGOLIN, 2015, p. 192). Conforme explica Gregolin (2015), a investigação esses processos de constituição da subjetividade é tomada de diferentes formas na obra foucaultiana: a partir dos processos de subjetivação pelos saberes estratificados como “verdadeiros” sobre o sujeito; a partir das relações de poder que disciplinam e submetem os sujeitos pelos dispositivos e práticas sociais, nos textos genealógicos; e a partir dos modos de o sujeito tornar-se objeto de si mesmo, por meio da ética, das práticas de si. Esta tese se pauta nos modos de subjetivação por meios dos dispositivos midiáticos. A leitura, nesse sentido, trata-se de um processo amplo que parte de um regime do enunciável e do dizível. A análise de discurso empreendida nesta tese é uma análise da ordem discursiva do olhar sobre o assassino em série, ordem esta que remete a uma subjetividade leitora dessas visualidades/dizibilidades enunciadas em diferentes materialidades como imagens, sons e linguagem verbal, além de emergirem de campos enunciativos distintos como o jornalismo, as redes sociais e as franquias culturais. Portanto, funcionando de modos distintos dentro do dispositivo midiático. Essas escolhas teórico-metodológicas têm um fundamento na noção de visibilidade/dizibilidade, tal como a leitura de Deleuze (2005) da obra de Foucault: É preciso pegar as coisas para extrair delas as visibilidades. E a visibilidade de uma época é o regime de luz, e as cintilações, os reflexos, os clarões que produzem no contato da luz com as coisas. Do mesmo modo é preciso rachar as palavras ou frases para extrair os enunciados. E o enunciável numa época é o regime de linguagem, e as variações inerentes pelas quais ele não cessa de passar, saltando de um sistema homogêneo a outro (a língua está sempre em desequilíbrio). (DELEUZE, 1992, p. 124-125). 21 O corpus, portanto, é composto por séries enunciativas cuja materialidade é imagética e verbal. O recorte é feito pensando nos sistemas de distribuição que vão desde a materialidade do discurso nos diferentes suportes e que constituem a heterogeneidade do dispositivo midiático. As materialidades de onde se parte para realizar a análise do discurso do fascínio são compostas por linguagem e sistemas de distribuição que configuram um regime de visibilidade/dizibilidade. Essa positividade do discurso constitui práticas sociais materializadas e compõe regras que vão determinar os regimes do que pode e deve ser dito/visto. É nessas materialidades que buscarei a historicidade, portanto, as transformações a que são submetidos os enunciados que formam um discurso do fascínio, pois a história altera os regimes discursivos. Como procedimento metodológico acionarei o conceito de protocolo de leitura de Chartier (2011) e me apropriarei dele para pensar outras materialidades, pensando a leitura no seu sentido amplo, em fotografias, em imagens em movimento e sons. Esses elementos compõem um todo a ser lido/interpretado pelos sujeitos. Fortuna crítica A fortuna crítica em um trabalho é uma questão ética: respeitar os trabalhos já realizados, não silenciar as propostas e perspectivas sobre o tema, fazer um levantamento dos estudos feitos acerca do tema que problematizo e que muito provavelmente foi problematizado de outros lugares, em outras investigações. Além disso, é no levantamento da fortuna crítica que a problematização pode ser enriquecida, pois é possível, a partir dela, repensar lacunas, (re)construir questões, continuar ramificações, refletir recortes não abordados. Sem dúvida, momento mais motivador de uma pesquisa é o da fortuna crítica. E pensar o tema assassinos em série ou o fascínio por assassinos em série é enveredar as áreas da Medicina, em especial, a Psiquiatria, da Psicanálise e do Direito. Esses são os campos discursivos cuja seriedade dos enunciados está assentada no saber científico, posto estar consolidado e autorizado. Perguntas como “quais seriam as motivações do assassinato em série”, “como é a mente do assassino em série”, “qual a origem do comportamento psicopata”, “qual a razão para as pessoas sentirem-se fascinadas por criminosos”, “como é o funcionamento do inconsciente que explica a tendência a admirar a criminalidade” só poderiam, dentro da ordem do dizer, ser respondidas, estudadas e enunciadas de lugares 22 autorizados e marcados pela instituição. E não é desse lugar que enuncio a problematização desta tese. Dentre os artigos, monografias, dissertações e teses (em sua integralidade ou resumos) consultados, o assassino em série é enunciado em uma regularidade discursiva e essa regularidade está atrelada a posições de sujeito também regulares. Os quatro tópicos deste capítulo sugerem essas regularidades: enunciados médicos, enunciados do Direito, enunciados da lei e enunciados da psicanálise. Em busca de estudos acadêmicos que elucidassem as questões de pesquisa anteriormente apresentadas, encontrei, o artigo de Tais Nader Marta e Henata Mariana de Oliveira Mazzoni Assassinos em série: uma questão legal ou pscológica?, de 2009; a dissertação de Camila Tersariol Vellasques O perfil criminal dos serial killers, de 2008; e as monografias de Vitor Wakim Baptista, Assassinos em série: o tratamento concedido aos psicopatas pelo sistema penal brasileira, de 2015 e A imputabilidade dos serial killers, publicada em 2002, de Mariana Neme Nogueira Ramos 2002. Dentre os diversos estudos que envolvem o assassino em série, considerei que estes sintetizassem o modo como o tema tem sido abordado até então. A fortuna crítica apresenta uma discussão circular do tema já que as questões levantadas pelos artigos, monografias e dissertações consultadas giram em torno de explicações sobre a personalidade do assassino em série e, em alguns momentos, sobre as razões para que ele se torne objeto de interesse (todas pelo viés psicológico), cuja explicação se encontraria também no estudo da personalidade daqueles que consomem informações e produtos de entretenimento sobre o tema. Em suma, esses estudos sempre se debruçam sobre o assassino em série. E, quando se trata de pensar no fascínio que exercem, a hipótese geral é de que há algo do comportamento do assassino em série compartilhado com seus admiradores, o que significa focalizar o assassino em série do mesmo modo. Proponho que fascínio seja analisado focalizando o sujeito fascinado, isto é, o sujeito que é dominado pelo olhar. Daí a importância de compreender o fascínio pelo verbo fascinar, pois trata-se de uma ação e, pelo viés discursivo, a ação dos sujeitos é marcada historicamente e se dá em um regime de regras que definem uma prática. O discurso do fascínio, portanto, é constituído pela prática do fascínio, ou mais especificamente, por práticas midiáticas que agenciam uma subjetividade consumidora que se dá nos modos como se produz o olhar sobre o assassino em série. 23 Feita a apresentação da fortuna crítica e, concomitantemente, a análise e problematização desta a partir dos estudos que abarcam o tema que proponho para análise, seguirei a interpretação do discurso do fascínio pelo viés da Análise de Discurso de linha francesa junto à arqueogenealogia de Michel Foucault, bem como ao conceito de protocolo de leitura de Roger Chartier, à Semiologia de Roland Barthes e à ideia de diagrama conforme a leitura de Gilles Deleuze da obra de Foucault. No capítulo a seguir, indicarei os modos de subjetivação de sujeitos leitores da/na mídia jornalística em suas modalidades impressa e digital. Estrutura da tese No primeiro capítulo, me debruçarei sobre as práticas midiáticas que constituem o discurso do fascínio, perpassando o deslocamento do monstro ao maníaco e deste ao assassino serial como criminoso célebre. Para tanto, buscarei casos de notabilidade da mídia brasileira de 1970, 1990 e 2014, a saber, Chico Picadinho, Vampiro de Niterói, Maníaco do Parque e Serial Killer de Goiânia. Neste momento, analiso os efeitos de sentido produzidos diante da mudança de suporte: da magazine impressa ao jornal em versão digital cuja materialidade altera o regime discursivo sobre o assassino em série, analisarei séries de enunciados que constituem a subjetividade que vê e fala (o leitor, espectador) a partir da subjetividade dada a ver e a falar (o assassino em série). No segundo capítulo, analisarei como o assassino em série, tornado ícone cultural, é elaborado como mercadoria de consumo, especialmente pelo fenômeno das séries televisivas, descrevendo as técnicas e estratégias da indústria de entretenimento. O corpus será recortado a partir de enunciados de dois produtos de franquias culturais: Dexter e Hannibal. Partindo de séries enunciativas determinadas, elucidarei o papel da cinematografia em Hannibal e da fotografia publicitária em Dexter como materialidades que carregam protocolos de leitura sobre o assassino em série. Nesse sentido, a análise mostrará como o assassino em série pode ser vendido como ícone cultural na construção do discurso da justiça pela próprias mãos e da estética cinematográfica. No terceiro capítulo, investigarei as apropriações dos protocolos de leitura sugeridos na revista impressa. Na dispersão, a fim de delinear o discurso do fascínio pelo assassino em série, apontarei posições-sujeito e descreverei enunciados a partir de práticas materializadas no blogue O aprendiz verde, nos comentários e postagens da página/comunidade Assassinos 24 em série do Facebook e do áudio de Whatsapp sobre o Serial Killer de Goiânia (2014). A partir dessas análises, descreverei as regularidades identificadas, as quais versam sobre a construção discursiva do ídolo. E, por fim, no último e quarto capítulo, realizarei uma retomada detalhada dos lugares teóricos para localizar não apenas os conceitos acionados, mas o modo como foram acionados nas análises, observando a demanda do corpus em relação à teoria e aos procedimentos metodológicos. Essa estruturação redacional não supõe nada mais que um esclarecimento teórico-metodológico de conceitos que aparecerão indicados em meio às análises. A proposta desse balanço é apenas contextualizar o lugar dos conceitos que serão acionados. A escolha de afixar as resenhas detalhadas da teoria no último capítulo (o que não significa que os conceitos não serão apontados muito pontualmente durante as análises) é redacional e nada mais que isso: afirmo com essa estruturação textual da tese o foco que concedo ao objeto analisado colocando-o em primeiro plano. Se a teoria é a base que sustenta a análise, considerei importante que esta não fosse coadjuvante daquela. Isso implica que detalhamentos, amiúdes e esclarecimentos podem ser postos após as análises sem que isso signifique uma modificação teórica ou uma intervenção conceitual. Muito pelo contrário, nesta tese, primo pelo objeto a ser analisado, vendo na teoria o aporte em que me respaldo. A lógica do capítulo teórico ao final do texto, nesse sentido, é de longe radical ou arriscada, pois a análise já aponta a cor local da teoria. Apresentar logo de início as análises sem longos parágrafos explicativos dos conceitos é uma questão de escrita: em lugar de apresentações teóricas, nesta tese, opto por retificações teóricas. Em suma, apontarei porque esta tese deve à genealogia foucaultiana a problematização do fascínio por assassinos em série; explorarei os conceitos que balizaram a delimitação do corpus desta tese, a saber, da função enunciativa ao arquivo; esclarecei porque tomar o discurso enquanto prática e como podem ser compreendidas a prática discursiva e a não discursiva; apontarei o protocolo de leitura como procedimento metodológico para além dos textos verbais, abrangendo o conceito de studium barthesiano, indo à análise das imagens e do som. Para sintetizar as discussões teóricas, descreverei a franquia cultural como dispositivo na indústria de entretenimento, contrapondo esta em relação à noção de Indústria Cultural para a Escola de Frankfurt; e explanarei a escolha da noção de diagrama, conforme a leitura de Deleuze acerca da obra de Foucault, como constructo teórico profícuo para uma análise dos discursos concernente à arqueogenealogia foucaultiana. O fascínio por assassinos em série não tem origem oculta a ser descoberta, mas tem seus pontos de emergência rarefeitos na história. E é sobre esses pontos descontínuos e 25 lacunares que me propus algumas questões. Compreendendo que as linhas de força na construção de um objeto de discurso emanam concomitantemente de diversos lugares e não necessária ou restritamente de temporalidades que se alternam cronologicamente, isso significa que o fascínio será analisado nesta tese a partir da rarefação dos enunciados que não seguem uma temporalidade, mas uma espacialidade. A expectativa, desta feita, é que esta pesquisa auxilie nas reflexões para uma crítica do presente, permitindo um diagnóstico de nossa atualidade em suas práticas culturais, nas relações sociais e em nossa constituição como sujeitos de consumo. Espero ainda que tais análises possam promover discussões teóricas sobre os dispositivos contemporâneos e seus funcionamentos. 134 CONSIDERAÇÕES FINAIS Propus positivar as regularidades de surgimento de um regime de enunciados que forma sistematicamente o fascínio por assassinos em série no elemento de um arquivo. Masis especificamente, objetivei evidenciar as regras que incidem na configuração do discurso do fascínio partindo da análise do modo como as mídias (jornalística, social e cultural) funcionam na elaboração de uma subjetividade consumível e evidenciar os modos de subjetivação dos sujeitos consumidores. Demonstrei, como o discurso do fascínio, constituído a partir de práticas midiáticas, é o meio pelo qual o consumo se efetiva. A tese, nesse sentido, teve como foco o potencial de consumo que nossa sociedade atingiu, sobre o modo como compramos, assistimos a, desejamos, consumimos. O fascínio não é o objeto em si sobre o qual uma análise deve se debruçar, mas o ponto de partida para refletir sobre o modo como a subjetividade é transformada em produto de consumo. A análise permitiu que fossem evidenciadas as estratégias midiáticas de produção de uma subjetividade posta em evidência e construída sobre as figuras do monstro, do maníaco, da celebridade, do ídolo e do ícone até que chegue ao acontecimento discursivo. A subjetividade foi tomada como processo do agenciamento do dispositivo midiático. O título de cada capítulo, assim, se referiu a cada agenciamento de subjetividade: o criminoso monstruoso, o criminoso célebre, o ícone cultural e o ídolo; o leitor espectador, o admirador, o consumidor e o fã. Foi possível averiguar que o discurso do fascínio por assassinos em série está ancorado na prática do consumo de subjetividades, não apenas de produtos. Daí a importância do conceito de subjetividade, ou seja, da construção histórica dos sujeitos que se dá no discurso. O consumo implica sujeitos que se tornaram objetos de posse não necessariamente na pessoa (personalidade), mas no que o sujeito representa como valores, identidades, comportamentos, modos de vida enfim. É nesse sentido que defendo que o fascínio por assassinos em série é uma prática discursiva de consumo da subjetividade que o assassino em série representa. Essa subjetividade é construída historicamente em torno de identidades como o monstro, a celebridade e o ídolo, do mesmo modo em que se constitui, na contraparte, a subjetividade do consumidor que perpassa identidades como fã, leitor/expectador e vítima. O processo de produção da subjetividade do fã/consumidor está atrelado à objetivação do sujeito serial killer por um regime de verdade e à circulação do discurso legitimado (científico e jurídico) em diferentes materialidades (o livro, mídias como o jornal impresso de 135 apelo sensacionalista, a revista magazine, o jornal online, o blogue, a fanpage de redes sociais, o áudio de Whatsapp e as séries televisivas). Não é possível que se analise um sem o outro. Como o consumidor de cada materialidade dessas se subjetiva em expectador, em fã ou em vítima? Esse foi o trajeto delineado em cada capítulo. Foi possível também demonstrar como a análise do discurso não pode se ater a materialidades ou apenas linguísticas ou apenas verbais, mas como é preciso considerar que um objeto de discurso implica materialidades muito diversas como o que ocorre com o audiovisual. Nesse sentido, a teoria/metodologia nunca é apenas aplicada, mas revisitada e adequada a cada objeto. Conceitos podem ser resenhados repetidamente, mas a análise nunca é repetida, o que significa que os conceitos nunca funcionam do mesmo modo em qualquer análise. Se o objeto não chega a dar sua cor local à teoria, ao menos, dá seu tom. Por meio da operacionalização do conceito de dispositivo, o corpus foi analisado quanto à produção de visibilidades e dizibilidade, bem como à ação de linhas de força das mídias. Isso implica aferir que as orientações do olhar, os protocolos de leitura, são práticas discursivas, já que atreladas à materialidade do suporte em que se efetivam os enunciados. Concomitantemente, os protocolos constituem um conceito analítico que pode abarcar não apenas a modalidade impressa da mídia jornalística, como também pode ser uma condução dos modos de olhar para as materialidades visuais em séries televisivas, por exemplo. A franquia de mídia, desta feita, foi descrita como dispositivo da indústria de entretenimento, isto é, como operadora de subjetividades consumidoras. Essa consideração permite repensar a noção de Indústria Cultural segundo a Escola de Frankfurt, já que tal noção implica sujeito passivos mediante a atuação da produção de produtos culturais. Considerar a franquia de mídia como dispositivo supõe um processo produtivo de subjetividades que consomem e que também podem ser consumidas, ao passo que a noção frankfurtiana supõe uma coerção dos sujeitos. No entanto, os sujeitos são constituídos por processos históricos, posicionam-se conforme os regimes de discurso em que se encontram e que também produzem. O diagrama foi pensando no sentido de uma esquematização das linhas de força, das relações e das práticas que constituem as mídias em sua heterogeneidade. Como conceito abstrato, o diagrama foi um modo de interpretar esse funcionamento do dispositivo. Tendo em mente que analisar discursos conforme o projeto arqueogenealógico significa numa não aplicabilidade de conceitos sem uma problematização e demanda do próprio corpus proposto, o diagrama do fascínio por assassinos em série é uma interpretação do funcionamento das concretudes (dispositivos e discursos), ao passo que arquivo (o sistema de onde emergem e 136 partir do qual são formuladas as séries de enunciados que constituem o corpus desta tese) foi o ponto de partida para abstrair o diagrama, sendo o prefixo micro a forma de esclarecer que se trata de uma análise local e de reafirmar a não aplicabilidade da arqueogenealogia foucaultiana sem uma consideração das especificidades (a cor local) dos objetos submetidos à investigação, à análise. Para encerrar, é importante considerar que o corpus foi recortado de materialidades que vão do texto impresso à série televisa e que o audiovisual precisa ser posto em discussão. No entanto, a linguagem dos sons, da música, sem dúvida, tem suas peculiaridades e estas podem ser tratadas como protocolos de leitura para a análise de materialidades audiovisuais como filmes, clipes e séries de televisão. A música, ainda, como linguagem codificada deveria ser pensada como materialidade do discurso. Junto a isso, é necessário considerar que o discurso do fascínio por assassinos em série não se sustenta apenas no dispositivo midiático, mas também nos dispositivos técnico- científicos da Criminologia e da Ciências Forenses. Os efeitos de sentido produzidos quando os enunciados são materializados em livros cuja área do saber é estratificada, como a Psiquiatria e a Criminologia, sem dúvida, são distintos dos produzidos pela mídia. Objetivado como criminoso excepcional, os manuais de classificação e investigação forenses são suportes que carregam o discurso da excepcionalidade do assassino em série. Por fim, a partir desta tese, apontaria a necessidade de refletir sobre o modo como consumimos a nós mesmos, como sujeitos, já que nos subjetivamos por meio de estratégias midiáticas cuja finalidade é mercadológica. Produtos e consumidores do que somos, do que nos constituímos em. Me pergunto até que ponto, até quando e em que entornos nos (re)(des)fazemos que, de sujeitos, somos engrenagens, operários e processo. 137 REFERÊNCIAS ADORNO, Theodor. A Indústria Cultural: O Iluminismo como mistificação das massas. In: ______. Indústria Cultural e Sociedade. São Paulo: Paz e Terra, 2009. AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo e outros ensaios. Chapecó: Argos, 2009. ALCADE, Luísa; SANTOS, Luís Carlos dos. Caçada ao Maníaco do Parque. São Paulo: Escrituras, 1999. ALVES, José Augusto Lindgren. A desumanização do humano. In:______. Os direitos humanos na pós-modernidade. Perspectiva: São Paulo: 2005. p. 01-19. ANGRIMANI, D. Espreme que sai sangue: um estudo do sensacionalismo na imprensa. 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