UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA JÚLIO DE MESQUITA FILHO - UNESP FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES, COMUNICAÇÃO E DESIGN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÍDIA E TECNOLOGIA DAVID GUSTAVO POMPEI A CORRELAÇAO PROCEDENTE ENTRE A COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO E MIDIÁTICA DOS AGENTES DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL DE PEDERNEIRAS/SP E A CONSECUÇÃO DA VIGILÂNCIA SOCIOASSISTENCIAL Bauru 2023 DAVID GUSTAVO POMPEI A CORRELAÇAO PROCEDENTE ENTRE A COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO E MIDIÁTICA DOS AGENTES DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL DE PEDERNEIRAS/SP E A CONSECUÇÃO DA VIGILÂNCIA SOCIOASSISTENCIAL Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Mídia e Tecnologia da Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do título de Mestre. Orientadora: Prof.ª Dr.ª Célia Maria Retz Godoy dos Santos Coorientador: Prof. Dr. Marcelo Gallo Bauru 2023 Pompei, David Gustavo. A Correlação procedente entre a competência em informação e midiática dos agentes do Sistema Único de Assistência Social de Pederneiras/SP e a consecução da vigilância socioassistencial/ David Gustavo Pompei, 2023 126 f. : il. Orientadora: Célia Maria Retz Godoy dos Santos Dissertação (Mestrado)–Universidade Estadual Paulista (Unesp). Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design, Bauru, 2023 1. Sistema Telemático. 2. Competência em Informação (CoInfo)e midiática. 3. Assistência Social. 4. Vigilância Socioassistencial. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design. II. Título. IMPACTO POTENCIAL DESTA PESQUISA Esta pesquisa prevê impactos potenciais para a sociedade nos âmbitos social e econômico. A operacionalização da Assistência Social via utilização das mídias e tecnologias impacta diretamente na rapidez e flexibilidade de operacionalizações e na ampliação dos alcances territoriais, propiciando o reconhecimento mais ágil das necessidades da sociedade, e a proposição de soluções baseadas em diagnósticos sociais e políticas públicas. Especificamente, além da formação de recursos humanos capazes de correlacionarem o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e a Competência em Informação (CoInfo) e Midiática, essas operacionalizações permitem maior alcance aos direitos sociais dos usuários atendidos no município de Pederneiras/SP. Por essas razões, a significativa possibilidade de amplitude dos impactos econômicos e sociais viabilizados pela inclusão das mídias e tecnologias nas operacionalizações dialogam diretamente com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) relacionados à erradicação da pobreza (ODS 1), fome zero e agricultura sustentável (ODS 2), saúde e bem-estar (ODS 3), educação de qualidade (ODS 4), igualdade de gênero (ODS 5), trabalho decente e crescimento econômico (ODS 8), redução das desigualdades (ODS 10 ), paz, justiça e instituições eficazes (ODS 16) e parcerias e meios de implementação (ODS 17). POTENTIAL IMPACT OF THIS RESEARCH This research predicts potential impacts on society in the social and economic spheres. The operationalization of Social Assistance through the use of media and technologies impacts the time and flexibility of operations. Then, the expansion of territorial reach allows a more agile recognition of society's needs, and the proposition of solutions based on social diagnoses and public policies. Specifically, in addition to training human resources capable of correlating the Unified Social Assistance System (SUAS) and Competence in Information (CoInfo) and Media, these operations allow to expand the access of social rights of users in the municipality of Pederneiras/SP. For these reasons, the significant possibility of broadening the economic and social impacts by the inclusion of media and technologies in operations dialogue directly with the Sustainable Development Goals (SDG) related to the eradication of poverty (SDG 1), zero hunger and sustainable agriculture ( SDG 2), health and well-being (SDG 3), quality education (SDG 4), gender equality (SDG 5), decent work and economic growth (SDG 8), reducing inequalities (SDG 10), peace, justice and effective institutions (SDG 16) and partnerships and means of implementation (SDG 17). Dedico este trabalho à minha mãe Sonia Maria Mazeto Pompei por todo seu apoio, carinho, incentivo, compreensão e amor incondicional por toda minha vida. AGRADECIMENTOS Agradeço imensamente à minha orientadora, Professora Doutora Célia Maria Retz Godoy dos Santos, cuja dedicação e paciência serviram como pilares de sustentação para a conclusão deste trabalho. Ao meu amigo e coorientador, Professor Doutor Marcelo Gallo, da Faculdade de Serviço Social da UNESP de Franca/SP, que me auxiliou na germinação das ideias no processo de desenvolvimento deste projeto. Às Professoras Doutoras, Vânia Cristina Pires Valente e Maria Inês Fontana, por contribuírem com este trabalho compondo a banca de defesa, me deixando muito honrado. Às colegas da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social da Prefeitura Municipal de Pederneiras e das Organizações da Sociedade Civil, que foram fontes de apoio técnico durante todo o processo deste estudo. Minha gratidão aos professores, colegas de turma, de trabalho e todes que me acompanharam nesta trajetória acadêmica, e que me estimularam a refletir, aprender e amadurecer. Por último, agradeço à Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP e à Faculdade de Arquitetura, Artes, Comunicação e Design – FAAC, em especial ao Programa de Pós-graduação em Mídia e Tecnologia. Aqui é o cenário que não me deixa desistir de lutar por uma sociedade plural, inclusiva, cidadã e democrática. Este é um trabalho de resistência para a continuidade do SUAS e aprimoramento da política pública de Assistência Social. RESUMO Neste presente estudo foi avaliada a correlação entre a Competência em Informação (CoInfo) e Midiática dos agentes interdisciplinares que atuam no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) do município de Pederneiras/SP e a consecução da Vigilância Socioassistencial, visando contribuir para a definição de diretrizes, planejamento e organização das ações realizadas nos territórios do município a partir do uso do sistema telemático (ST-SUAS). Os procedimentos metodológicos foram baseados em levantamentos bibliográficos e em pesquisa de campo para a identificação das experiências dos agentes com o referido sistema. Como resultado, destaca-se que a interpretação e apropriação dos dados do ST-SUAS contribuem para a expansão do conhecimento e o planejamento de intervenções qualificadas dos agentes, influenciando na ampliação das garantias dos direitos dos usuários. Ainda, a capacitação em CoInfo e Midiática destes agentes correlaciona-se diretamente com o método utilizado para a seleção e interpretação de dados, possibilitando intervenções mais propícias e adequadas às demandas e necessidades dos usuários, bem como para a ampliação da efetividade das competências da Vigilância Socioassistencial do município. Dessa forma, espera-se que os resultados disponibilizados nesta pesquisa possam contribuir significativamente para o avanço desta temática e possam servir como base para futuras pesquisas. Palavras-chave: sistema telemático; competência em informação (CoInfo) e midiática; assistência social; vigilância socioassistencial. ABSTRACT The correlation between Information Competence (CoInfo) and Media of the interdisciplinary agents from the Unified Social Assistance System (SUAS) of Pederneiras/SP, and the achievement of Social Assistance Surveillance was evaluated in the present study. The goal of this research was to contribute to the definition of guidelines, planning and organization of actions performed in the municipality's territories using the telematic system (ST-SUAS). The methodological procedures were based on scientific literature review, and the field research was useful to identify the agents' experiences on the mentioned system. As a result, the interpretation and appropriation of ST-SUAS data contribute to the expansion of knowledge and the planning of qualified interventions by the agents, influencing on the guarantees of the users' rights. Furthermore, the training on CoInfo and Media is directly related to the method of selection and data interpretation, allowing more conducive and adequate interventions to the demands and needs of the users, as well as to increasing of the effectiveness of the Social Assistance Surveillance. For this reason, we hopefully expect that the results available on this research can contribute significantly to the advancement of this area, as well as being useful as a basis for future research. Keywords: telematic system; Information Competence (CoInfo) and Media; social assistance; social assistance surveillance. LISTA DE FIGURAS Figura 1 Principais competências da CoInfo 37 Figura 2 Impactos da AMI no SUAS e na sociedade 38 Figura 3 Ciclo de ações para a Competência em Informação (CoInfo) 46 Figura 4 Tela de cadastramento das famílias e demais funcionalidades 51 Figura 5 Tela da evolução dos atendimentos das famílias 52 Figura 6 Tela de vulnerabilidade educacional 52 Figura 7 Tela de ações coletivas 53 Figura 8 Tela de inscrição em cursos oferecidos à família atendida 53 Figura 9 Tela das condições habitacionais 54 Figura 10 Tela das condições de trabalho e rendimentos 54 Figura 11 Tela de programas sociais que as famílias estão inscritas 55 Figura 12 Tela dos benefícios eventuais concedidos às famílias 55 Figura 13 Tela de encaminhamentos para outros serviços de atendimento 56 Figura 14 Descumprimentos das condicionalidades dos programas sociais 57 Figura 15 Tela das condições de convivência familiar e comunitária 57 Figura 16 Tela das situações de violências vivenciadas nas famílias 58 Figura 17 Tela de histórico de medida socioeducativa na família 59 Figura 18 Histórico de acolhimento institucional de membros das famílias atendidas 59 Figura 19 Tela do Plano de Acompanhamento Familiar – PAF 60 Figura 20 Situações de vulnerabilidades apresentadas na família atendida 60 Figura 21 Tela de denúncias 61 Figura 22 Tela de geração de relatórios de gestão das informações 62 Figura 23 Painel de serviços territorializados, atendimentos e famílias atendidas 62 Figura 24 Universo da pesquisa 67 Figura 25 Tempo de atuação profissional 67 Figura 26 Perfil das pessoas pesquisadas 68 Figura 27 Formação profissional das pessoas pesquisadas 69 Figura 28 Gênero dos pesquisados 70 Figura 29 Frequência que utilizam o ST-SUAS 70 Figura 30 Finalidade de uso do ST-SUAS 71 Figura 31 Finalidades do ST-SUAS que consideram mais importantes 72 Figura 32 Avaliação do conteúdo do ST-SUAS 73 Figura 33 Avaliação da facilidade operacional do ST-SUAS 74 Figura 34 Facilitação oferecida pelo ST-SUAS 75 Figura 35 Justificativas sobre as facilitações do ST-SUAS 75 Figura 36 Facilitações do ST-SUAS para troca de informações e/ou comunicação 76 Figura 37 Justificativa para facilitações do ST-SUAS 77 Figura 38 Maior vantagem do ST-SUAS para a atuação profissional 78 Figura 39 Justificativas sobre a maior vantagem do ST-SUAS 79 Figura 40 Maior desvantagem do ST-SUAS 80 Figura 41 Importância do ST-SUAS 81 Figura 42 Justificativa sobre a importância do ST-SUAS 82 Figura 43 Competências em relação ao uso e conhecimento sobre o ST- SUAS 83 Figura 44 Justificativa das competências e conhecimento sobre o ST- SUAS 84 Figura 45 Formas de ampliar a competência e habilidade com o ST-SUAS 85 Figura 46 Sugestão para ampliar a competência e habilidade com o ST- SUAS 87 Figura 47 Outras formas utilizadas para a comunicação profissional 87 Figura 48 Justificativa sobre a forma mais eficaz para a atuação profissional 88 Figura 49 Linguagem utilizada pelos profissionais no ST-SUAS 90 Figura 50 Justificativa sobre a linguagem dos profissionais no ST-SUAS 91 Figura 51 Interferências da cultura organizacional no conjunto de práticas 92 Figura 52 Justificativa sobre as interferências da cultura organizacional 93 Figura 53 Contribuição do ST-SUAS para a proteção social e garantia de direitos 94 Figura 54 Contribuição do ST-SUAS para a proteção social e garantia de direitos 95 Figura 55 Principal contribuição do ST-SUAS para a Vigilância Socioassistencial 96 Figura 56 Justificativas da contribuição do ST-SUAS a Vigilância Socioassistencial 97 LISTA DE QUADROS Quadro 1 Rede de proteção social básica do SUAS de Pederneiras/SP 23 Quadro 2 Rede de proteção social especial do SUAS de Pederneiras/SP 24 Quadro 3 Dimensões da dinâmica da plataformização 34 Quadro 4 Características das dimensões da competência informacional 39 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AMI - Alfabetização Midiática e Informacional CadÚnico - Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal CID - Cadastro Internacional de Doença CIT - Comissão Intergestores Tripartite CNAS - Conselho Nacional de Assistência Social CNSS - Conselho Nacional de Serviço Social CoInfo - Competência em Informação CPF - Cadastro de Pessoa Física CRAS - Centro de Referência de Assistência Social CREAS - Centro de Referência Especializado da Assistência Social CTPS - Carteira de Trabalho e Previdência Social IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDHM - Índice de Desenvolvimento Humano Municipal ILPI - Instituição de longa permanência para idosos LBA - Legião Brasileira de Assistência LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social MDS - Ministério do Desenvolvimento Social MDSA – Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário NIS - Número de Inscrição Social NOB-SUAS - Norma Operacional Básica do SUAS PAEFI - Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos PAF - Plano de Acompanhamento Familiar PAIF - Proteção e Atendimento Integral à Família PIA - Planos Individualizados de Atendimento PIB - Produto Interno Bruto PNAS - Política Nacional de Assistência Social PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento RG - Registro Geral RMA - Registro Mensal de Atendimento SCFV - Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos ST-SUAS - Sistema Telemático do SUAS de Pederneiras/SP SUAS - Sistema Único de Assistência Social TIC - Tecnologias da Informação e da Comunicação SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 14 2 A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E AS MULTIMÍDIAS: CENÁRIOS E CONCEITOS 18 2.1 A política de Assistência Social brasileira: breve trajetória histórica 18 2.2 A inserção do SUAS no município de Pederneiras/SP 22 2.3 As multimídias no contexto do SUAS em Pederneiras/SP 24 3 PLATAFORMIZAÇÃO, SISTEMA TELEMÁTICO E A COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO E MIDIÁTICA 30 3.1 A Comunicação via mídias e sistema telemático 31 3.2 A Competência em Informação (CoInfo) e Midiática: aspectos técnicos, éticos e políticos 33 3.3 A perspectiva comunicativa interdisciplinar e os possíveis impactos no SUAS 40 4 O ST-SUAS DE PEDERNEIRAS: ARQUITETURA E FUNÇÕES 47 4.1 Breve descrição do ST-SUAS 47 4.2 Funcionalidades e operacionalização 50 5 A PESQUISA DE CAMPO: MÉTODOS, RESULTADOS E DISCUSSÃO 64 5.1 Os procedimentos da investigação 64 5.2 Resultados e discussão 66 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 99 REFERÊNCIAS 104 APÊNDICE A – FORMULÁRIO DE PESQUISA DO GOOGLE FORMS COM TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO – TCLE 109 ANEXO A — DECLARAÇÃO DE AUTORIZAÇÃO DE SUPERIORES 122 ANEXO B – PARECER COSUBSTANCIADO DO CEP 123 14 1 INTRODUÇÃO Como parte integrante do tripé da Seguridade Social, composto pelas políticas públicas de Saúde, Assistência Social e Previdência Social, o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) é um salto qualitativo efetivado no início da primeira década do século XXI em termos de fortalecimento da gestão da Assistência Social, qualificação dos serviços e organização setorial para mediar o alcance dos direitos sociais previstos na Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), que também efetivou a Assistência Social enquanto política pública e a inseriu no campo dos direitos sociais. É importante ressaltar que a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) foi a responsável inicial para a definição do objeto de ação da Assistência Social, que a partir de então, não mais deveria ser operacionalizada como privilégio assistencialista e clientelista à população pauperizada e marginalizada, como foi executada desde a Velha República do Estado brasileiro. Esse marco significou um grande avanço na constituição da cidadania e propiciou condições de rompimentos expressivos da situação de miséria que o povo brasileiro enfrentava e que, através de programas sociais e extensão de sua cobertura no âmbito das políticas públicas, trouxeram novas possibilidades de sua operacionalização. Neste sentido, os avanços que transformaram a política de Assistência Social em um sistema único de atendimento à população, significa a incorporação das demandas sociais históricas da classe trabalhadora pelo Estado de Direito e é fruto de reflexões coletivas entre pesquisadores, professores, alunos, especialistas e trabalhadores que estudaram profundamente as políticas e as práticas assistenciais e se empenharam fortemente, desde o processo de redemocratização do Brasil, na segunda metade da década de 1980, até os dias de hoje, para reduzir as desigualdades sociais brasileiras através da proteção social pública e da defesa de direitos. Assim, para o desenvolvimento de capacidades e meios de gestão do SUAS, a Norma Operacional Básica de 2005 (BRASIL, 2005) estabeleceu três funções que só se realizam por meio da interação e complementaridade entre si, que são: a Vigilância Socioassistencial, a Proteção Social e a Defesa de Direitos. Vale ressaltar que a Vigilância Socioassistencial é a função propulsora das demais, uma vez que deve produzir e organizar dados, indicadores, informações e 15 análises que contribuam para o caráter preventivo e proativo da política de Assistência Social, assim como para a redução dos agravos sociais, fortalecendo a capacidade das demais funções mediante estudos, planos e diagnósticos, que por sua vez, devem ser capazes de ampliar o conhecimento sobre a realidade dos territórios e as necessidades específicas da população (BRASIL, 2013b). Portanto, a Vigilância Socioassistencial tem um papel fundamental para a execução e gestão da Assistência Social, pois auxilia na definição de diretrizes para o planejamento e organização das ações realizadas nos territórios, bem como contribui com a própria condução dos serviços, produzindo informações sobre o tipo, volume, localização, qualidade das ofertas de atendimento, possibilidades de financiamento e condições de acesso aos serviços, benefícios, programas e projetos. Como é possível observar, a instauração do SUAS coincide com um dos maiores avanços no campo tecnológico e infocomunicacional do século XXI, que é a internet. Isso se dá principalmente porque ela disponibiliza uma série de serviços e é, cada vez mais, usada sistematicamente pela sociedade. A partir dela e com o surgimento dos sistemas informatizados e das multimídias, foram implementadas extraordinárias ferramentas de auxílio, dentre elas o sistema telemático (ST-SUAS), utilizado para executar e gerir os serviços inerentes à Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social do município de Pederneiras/SP, alterando o processo de relacionamento pessoal e social do ecossistema comunicacional que, por consequência, também modificou toda atuação entre os agentes, em maior ou menor escala, incluindo os usuários do SUAS, isto é, a população que necessita desta política pública. A partir disso, o presente estudo se faz relevante diante da observação das dificuldades constatadas na operacionalização dos serviços do SUAS pelos profissionais que atuam na rede de serviços, especialmente em relação à utilização do ST-SUAS da Secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social de Pederneiras/SP e dos meios midiáticos, bem como no que se refere à qualidade da comunicação entre os profissionais e gestores que operacionalizam as ações voltadas à proteção social e garantia de direitos. Neste sentido, o objetivo do estudo foi verificar a correlação existente entre a Competência em Informação (CoInfo) e Midiática dos agentes interdisciplinares que atuam com o sistema telemático (ST-SUAS) do SUAS (Sistema Único de Assistência 16 Social) do município de Pederneiras/SP e a consecução da Vigilância Socioassistencial da instituição, pois a partir dos incidentes levantados, acredita-se ser possível proporcionar condições técnicas para a produção de dados confiáveis por meio do aperfeiçoamento dos recursos humanos especializados, com competências em informação, midiática e comunicação para que a vigilância socioassistencial seja mais efetiva. Assim, na seção 2, “A política de assistência social e as multimídias: cenários e conceitos”, apresenta-se um recorte sobre a política pública de Assistência Social brasileira e alguns aportes sobre a inserção do SUAS em Pederneiras/SP para contextualizar o leitor ao assunto estudado. Já a seção 3, “Plataformização, sistema telemático e a Competência em Informação e midiática”, traz uma discussão sobre a transformação que as tecnologias digitais provocaram na ampliação e processamento de extensas quantidades de dados e na obtenção de informações a partir de redes, bem como para facilitações no campo operacional, a partir disponibilização de variados aportes teóricos sobre a temática. Para isso, debruça-se sobre as teorias de Poell, Nieborg e Van Dijck (2020), que definem a plataformização como uma movimentação contemporânea que envolve as infraestruturas, processos econômicos, estruturas governamentais em diferentes setores e esferas da vida, que contribuem, influenciam e reorganizam as práticas e imaginários culturais. E ainda, aborda-se a comunicação e os aspectos relevantes da Competência em Informação (CoInfo) e Midiática, perpassando pela reflexão sobre a teoria de Valente e Belluzzo (2020), as quais a destacam como a tecnologia da informação e da comunicação (TIC) que interfere nos processos cognitivos de uso e acesso aos dados por meio de uma visão integrada, contribuindo para o aprendizado e exercício da cidadania. Além disso, traz reflexões acerca da natureza relacional da comunicação, de acordo com a teoria de França (2016), em que se discute o processo de significação a partir do “compartilhamento de sentidos'', visto que a comunicação intercede em três dimensões (interacional, a simbólica e o contexto social, cultural e econômico), além de ser interdisciplinar. 17 Na seção 4, “O ST-SUAS de Pederneiras: arquitetura e funções”, relata-se mais objetivamente sobre o sistema telemático do SUAS no município de Pederneiras (ST-SUAS), apresentando um pouco sobre sua estrutura e funções. Em seguida, na seção 5, “A pesquisa de campo: métodos, resultados e discussão”, exibe-se tanto a metodologia e os procedimentos de investigação do estudo como os resultados da pesquisa aplicada, representando-os em gráficos e infográficos um conjunto de dados, a fim de facilitar a compreensão das informações apresentadas nesse conjunto. Ainda nesta parte, discute-se os resultados de forma imparcial e de acordo com os referenciais teóricos expostos sobre o assunto. Por fim, na seção 6, são apresentadas as “Considerações finais”, que respondem o problema central do estudo e trazem uma sínteses de argumentos, já tratados anteriormente, mas que resumidamente expõe que a CoInfo dos agentes interdisciplinares tem uma correlação direta com as potencialidades e escopo das atividades do ST-SUAS, ajudando na criação de soluções das demandas dos públicos de interesse, de modo a ampliar a efetividade da Vigilância Socioassistencial e as possibilidades de acesso aos direitos sociais e humanos dos usuários. Vale destacar que não existe um final para essa discussão, nem uma verdade absoluta e incontentável para o assunto, mas com este estudo, espera-se ter promovido alguma reflexão sobre o ST-SUAS e sua correlação com a competência dos agentes que usam e interagem com ele. 18 2 A POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL E AS MULTIMÍDIAS: CENÁRIOS E CONCEITOS Este capítulo versa brevemente sobre a trajetória da política de Assistência Social brasileira e os marcos históricos e legais que a compõem, até sua formalização enquanto política pública inscrita no campo dos direitos sociais e humanos nas décadas de 80 e 90, quando mais tarde na década de 2000 se tornou um sistema único de atendimento em nível nacional (SUAS). A partir desse marco, os processos de produção, análise e utilização de informações, ganharam relevância na medida em que as ações possibilitaram processos e resultados mais condizentes com as expectativas e necessidades da população em geral e, em especial, dos segmentos sociais mais vulneráveis da sociedade. Neste sentido, com o avanço das tecnologias, algumas ferramentas tecnológicas e digitais multimídias passaram a ser implantadas e utilizadas nos serviços, dada a imensa demanda, complexidade dos cenários e a diversidade do território brasileiro. Para facilitar a operacionalização do SUAS no município de Pederneiras/SP, além das multimídias projetadas pelo governo federal, também se passou a utilizar um serviço telemático (ST-SUAS) que através dos atendimentos, permitisse um retrato panorâmico dos setores para auxiliar na sua operacionalização e gestão com maior qualidade, celeridade e com vistas ao alcance dos direitos sociais da população atendida. 2.1 A política de Assistência Social brasileira: breve trajetória histórica A política pública de Assistência Social brasileira sofreu profundas transformações em sua história. Começou a ser discutida na velha república em 1898, para atender o grande número de pessoas em situação de miséria, especialmente após a libertação dos escravos, que foram excluídos e viviam precárias condições de subsistência e trabalho. Mais adiante, em 1938, sob a ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas, primeiramente de modo informal e depois a partir de decreto, foi criado o Conselho Nacional de Serviço Social (CNSS), vinculado ao Ministério da Educação e Saúde, com o propósito de atender os “desamparados” e os “mais desfavorecidos”, que em verdade eram os trabalhadores informais sem a cobertura da Previdência Social recém criada, os egressos da II 19 Guerra Mundial e/ou seus familiares, e, ainda, as mulheres, crianças e jovens necessitados (SPOSATI, 2004, p. 14). Com a finalidade de amparar os soldados brasileiros que lutaram na II Guerra Mundial, em 1942 surgiu a Legião Brasileira de Assistência (LBA), fundada pela primeira dama do Brasil, Sra. Darcy Vargas, com a ideia de reforçar o sentido patriótico, com o apoio de outras mulheres de militares do alto escalão e demais “damas da sociedade”, em um período em que não se pensava em relações democráticas ou presença da voz das pessoas que necessitavam da Assistência Social. Era realizada de forma compensatória àqueles que não possuíam meios de prover sua subsistência ou em situações de calamidades. Eram apenas atos de vontade dos mais favorecidos e não de direito de cidadania (SPOSATI, 2004). A Assistência Social, nesse período, era ditada por valores e interesses morais e religiosos, baseada no favorecimento de alguns poucos eleitos, mediante práticas clientelistas, populistas e de interesse eleitoreiro (PEREIRA, 2007a). Em sua trajetória, a Assistência Social caminhou primeiro através da tecnocracia e não pela democracia, tencionou seu caráter político populista buscando novas propostas através da luta de seus trabalhadores que se puseram em debates, criaram documentos, posicionamentos e proposições, que motivaram sua previsão e reconhecimento como direito na Constituição Federal de 1988, considerada cidadã após 21 anos de ditadura militar (1964-1985). Posteriormente à promulgação da Carta Magna, a política pública de Assistência Social tornou-se parte do modelo de Seguridade Social, em conjunto com a Previdência Social e a Saúde, prevendo-se nesse momento, a retirada de seu caráter compensatório aos trabalhadores registrados. A Constituição Federal de 1988 foi um marco para os movimentos de descentralização e democratização das políticas sociais que, segundo Degenszajn (2008, p. 2009), foi capaz de impulsionar uma nova relação entre Estado e sociedade civil, "fortalecendo demandas populares e o reconhecimento de novos interlocutores políticos". Mesmo assim, a Assistência Social passou por diversos escândalos políticos com a família Collor no início da década de 90; nos âmbitos estadual e federal, foi amadoramente operacionalizada por primeiras damas dos municípios brasileiros, que limitadas às capacidades herdadas da política populista, compensatória e clientelista, faziam pulsar sua prática por meio da filantropia, o que não significava incapacidade governamental, uma vez que já era uma política pública, direito do 20 cidadão e dever do Estado. Todavia, o caráter emergencial, dito assistencialista, eram respostas estatais eventuais e fragmentadas que reforçaram a subalternização da população que dela necessitava (SPOSATI et al., 2008). A Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) teve sua promulgação em 1993, no governo Itamar Franco, após a aprovação de um projeto de lei redigido pelo poder executivo. A LOAS (BRASIL, 1993) permitiu uma ampliação dos direitos já existentes, revolucionou o pensamento jurídico, político, redefiniu leis, teorias e filosofias (PEREIRA, 2007a) e ocasionou o fechamento da LBA em 1995. No período de 2004 a 2007, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, o SUAS foi aprovado pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), via Resolução 145/2004 (BRASIL, 2004), e a Secretaria Nacional de Assistência Social e Combate à Fome (que viria a se tornar Ministério), se tornou responsável pela elaboração da Política Nacional de Assistência Social (PNAS/2004) (BRASIL, 2004, 2005), enquanto um sistema único a ser operacionalizado em todo território nacional, respeitando as recomendações da IV Conferência Nacional da Assistência Social. Segundo Pereira (2007a), houve um avanço democrático na política de Assistência Social nesse período, processo que contou com a participação de renomados cientistas, agentes políticos e representantes da sociedade civil. No ano de 2005, a Norma Operacional Básica do SUAS (NOB-SUAS) regulamentou a operacionalização da gestão da Assistência Social (BRASIL, 2005), sendo atualizada posteriormente, em 2012 (BRASIL, 2012), com o objetivo de buscar seu aprimoramento. Segundo Figueiredo (2011), o SUAS apontou novas perspectivas para a gestão, financiamento e controle social e ressaltou o campo da informação, monitoramento e avaliação como meios estratégicos para melhor atuação no que se refere às políticas sociais. Essa trajetória se faz relevante para se compreender que o SUAS é a expressão máxima, até a atualidade, da institucionalização no Estado, das provisões estabelecidas pela Constituição de 1988, no que se refere à Assistência Social. Apesar de ser legalmente instituída somente em 2011, pela Lei Federal nº12.435/2011, no governo Dilma Rousseff, e, em seguida incorporada à LOAS - Lei Federal nº8.742/1993, tem como marcas de sua operacionalização, a defesa da 21 dignidade humana, da justiça social e dos direitos humanos e sociais, direcionados para a proteção social1 distributiva. O SUAS, portanto, em sua configuração legal, é um sistema público não contributivo, descentralizado e participativo, que tem por função a gestão do conteúdo específico da Assistência Social de forma compartilhada entre os três entes federados, de modo articulado e complementar, que operam a proteção social, fundamentado na Política Nacional de Assistência Social (BRASIL, 2004, 2005), que orienta-se pela unidade de propósitos, principalmente quanto ao alcance de direitos pelos usuários dos serviços, regulando em todo o território nacional, a hierarquia, os vínculos e as responsabilidades do sistema-cidadão de serviços, benefícios, programas, projetos e ações de caráter permanente e/ou eventual, sob critério universal e lógica de ação em rede hierarquizada nas três esferas de governo. Para tanto, o SUAS deve respeitar a diversidade das regiões, decorrente de características culturais, socioeconômicas e políticas em cada esfera de gestão, a realidade das cidades e da sua população urbana e rural, bem como reconhecer que as diferenças e desigualdades regionais e municipais que condicionam os padrões de cobertura do sistema e os seus diferentes níveis de gestão, que devem ser considerados no planejamento e execução das ações, articulando sua dinâmica às organizações e entidades (públicas e privadas) que configuram a rede de serviços. De acordo com a PNAS/2004 (BRASIL, 2004, 2005), são funções da Assistência Social: a proteção social hierarquizada entre proteção básica e especial, a vigilância social e a defesa dos direitos socioassistenciais. Especificamente a Vigilância Socioassistencial, estabelecida pela Norma operacional Básica do SUAS (BRASIL, 2012), consiste no desenvolvimento da capacidade e de meios de gestão assumidos pelo órgão público gestor da Assistência Social para conhecer a presença das formas de vulnerabilidade social da população e do território pelo qual é responsável. Tem como função produzir e sistematizar as informações, construir indicadores e índices territorializados das situações de vulnerabilidade, risco pessoal e social que incidem sobre famílias e pessoas nos diferentes ciclos de vida 1A proteção social é um conjunto amplo que engloba a seguridade social. Em poucas palavras, significa garantia às políticas sociais previstas em lei, como é o caso da Saúde, da Educação, Moradia, Trabalho, e Previdência Social (esta última contributiva) etc. É também um sistema programático de segurança contra riscos, circunstâncias, perdas e danos sociais, cujas ocorrências afetam negativamente a vida dos cidadãos. Não é, portanto, sinônimo de tutela do Estado, mas garantias legais que provém os mínimos sociais de subsistência para pessoas que não tem condições de prover, através do próprio trabalho, o seu sustento e de sua família, especialmente pessoas idosas e/ou com deficiência (PEREIRA, 2007b, p.16). 22 (crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos), que lhes impossibilite sua autonomia e integridade, a partir das fragilidades de sua existência, bem como exerce a vigilância sobre os padrões dos serviços, com o propósito final de proteção social e garantia de direitos. 2.2 A inserção do SUAS no município de Pederneiras/SP Localizada no centro-oeste paulista, na região de Bauru, Pederneiras é um município de pequeno porte, com 727,482 metros quadrados de território e uma população estimada de 47.523 habitantes, com densidade demográfica de 56,92 habitantes por quilômetro quadrado, segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2022). No que se refere à ocupação e economia, a maior parte do Produto Interno Bruto (PIB) municipal é proveniente da indústria, comércio e produção rural local. O salário médio mensal dos habitantes é de 2.6 salários-mínimos e a proporção de pessoas ocupadas em relação ao total populacional é de 27%. Ademais, considerando os domicílios com rendimentos mensais de até meio salário-mínimo por pessoa, consiste em 32,7% da população, o que colocava o município na posição de 244 das 645 cidades do estado de São Paulo e em 4.111 dos 5.570 municípios do Brasil (IBGE, 2022). Com base nos dados do Censo demográfico do IBGE do ano de 2000 (a última divulgada pelo órgão), cuja incidência da pobreza no município atingia uma variável percentual entre o limite inferior de 20,75% e limite superior de 34,65%, é que se inferiu o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), de acordo com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Essa medida resume o progresso a longo prazo em três dimensões básicas do desenvolvimento humano: renda, educação e saúde, oferecendo um contraponto ao indicador do Produto Interno Bruto (PIB) per capita, que considera apenas a dimensão econômica do desenvolvimento (PNUD, 2010) e que norteou a implantação do SUAS no município de Pederneiras, no ano de 2005. Seguindo a padronização dos serviços em conformidade com o extinto Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e, de acordo com o demonstrativo do Censo demográfico do IBGE de 2000, o município saltou de um indicador de 0,663 para o patamar de 0,739 em 2010 (IBGE, 2022), período esse 23 que registra as intervenções da política de Assistência Social no município a partir dos marcos legais do SUAS. O primeiro equipamento de atendimento do SUAS implantado no município foi o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS)2, do bairro Cidade Nova, no ano de 2006. Está localizado em um território considerado de maior risco e vulnerabilidade social, que na época, para sua implantação, foi realizado um estudo socioeconômico censitário em sua área de abrangência, que era composta pelos bairros: Cidade Nova, Maria Elena Pereira Bertolini, Jaime Bigeli, Vicente Juliano Minguili, Parque da Colina e Figueira e Paturis, em área rural. Ainda não se operacionalizava o SUAS via atendimentos informatizados e digitais, mas o trabalho em rede de serviços foi bastante articulado entre os profissionais, pautados na PNAS/2004 (BRASIL, 2004, 2005), que orientava a implantação dos serviços, bem como o SUAS deveria ser operacionalizado. No ano de 2011, foi implantado oficialmente o Centro de Referência Especializado da Assistência Social (CREAS), que ampliou a rede de proteção social do SUAS no município e organizou definitivamente os padrões de serviços de proteção social básica e especial de média e alta complexidade. Observa-se nos quadros 1 e 2, a organização da rede de proteção social do município, sendo subdivididos em serviços de proteção básica com oito unidades e proteção especial com cinco unidades. Quadro 1 - Rede de proteção social básica do SUAS de Pederneiras/SP Serviços de Proteção Básica Quantidade Mantenedor Unidade de Atendimento Social (Órgão Gestor) 1 Público CRAS – Centro de Referência de Assistência Social 1 Público Inclusão Produtiva 2 Público Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) para crianças e adolescentes 1 Público Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) para crianças e adolescentes 1 Privado Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) para idosos 2 Privado Fonte: Autoria própria, 2022. 2O CRAS é uma unidade pública de base territorial que visa a emancipação social das famílias, propiciando o exercício de cidadania no âmbito familiar e comunitário. Surgiu a partir da implantação do SUAS como meio de territorialização do atendimento da Política Nacional de Assistência Social e neste âmbito, promover o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários através de informação, orientação e atendimento às famílias e indivíduos na garantia de seus direitos sociais, tornando-se o local adequado para a implantação de planos, programas e projetos emancipatórios (BRASIL, 2004). 24 Quadro 2 - Rede de proteção social especial do SUAS de Pederneiras/SP Serviços de Proteção Especial de média e alta complexidade Quantidade Mantenedor CREAS – Centro de Referência Especializado de Assistência Social 1 Público Unidade de acolhimento infanto-juvenil 1 Público Unidade de acolhimento para pessoas adultas 1 Público Instituição de longa permanência para pessoas idosas – (ILPI) 1 Público Serviço de proteção social especial para pessoas com deficiência idosas e suas famílias 1 Privado Fonte: Autoria própria, 2022 Até o ano de 2017, manteve-se esta estrutura de organização dos serviços e no mês de maio do mesmo ano, foi implantado o setor da Vigilância Socioassistencial integrante à Secretaria de Desenvolvimento e Assistência Social do município, em conformidade com o PNAS/2004 (BRASIL, 2004, 2005) e em atenção ao plano decenal (2005-2015) da Assistência Social, elaborado pela Secretaria. Neste âmbito, mesmo com um atraso de dois anos, um novo estágio foi atingido pela política de Assistência Social municipal, uma vez que, com a implantação da Vigilância Socioassistencial iniciava-se a abertura para dar maior visibilidade aos desafios de gestão e operacionalização da política, especialmente no que se referia ao fortalecimento da gestão e qualificação dos serviços, cujos enfrentamentos pressupunham sua organização efetiva, bem como o desenvolvimento de capacidades de planejamento no âmbito da garantia ou mediação do acesso aos direitos sociais específicos, dos quais se tratam a proteção social (BRASIL, 2013a). 2.3 As multimídias no contexto do SUAS em Pederneiras/SP Os processos de produção, análise e utilização de informações ganharam relevância na medida em que as ações possibilitaram processos e resultados mais condizentes com as expectativas e necessidades da população em geral e, em especial, dos segmentos sociais mais vulneráveis da sociedade. Neste sentido, o extinto Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA), já havia criado ferramentas tecnológicas e digitais, como: blogs, sites, canal de vídeos via YouTube, cadastros e prontuários eletrônicos, portal de informações da rede SUAS, sistemas 25 de acompanhamento de gestão, aplicativos, redes sociais, bem como o núcleo de educação a distância e outros mecanismos. Assim, dada a imensidão da demanda, a complexidade dos cenários e a diversidade de territórios, a gestão do SUAS começou a pensar em utilizar efetivamente uma ferramenta que permitisse um retrato panorâmico do setor para auxiliar na sua gestão, com maior qualidade e celeridade. No campo operacional do SUAS, a partir do ano de 2020, a Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social de Pederneiras optou por utilizar um software desenvolvido para condensar informações para o exercício da política de Assistência Social, para que as mais importantes ferramentas eletrônicas do Ministério fossem alimentadas com as informações municipais pelas equipes profissionais de execução e gestão a cargo do setor de Vigilância Socioassistencial. Neste trato, supunha-se que o mais relevante desse sistema é que, a partir das informações condensadas e da comunicação entre os agentes de atendimento, a população usuária dos serviços da Assistência Social teria maior possibilidade de alcance de seus direitos sociais através de ações resolutivas das equipes interdisciplinares das proteções básica e especial, pois tal ferramenta possibilita, além de registrar atendimentos e acompanhamento das famílias atendidas pelos profissionais da rede de serviços, facilitar também a organização e as informações registradas por eles, criando históricos de todos os serviços e todas as ações realizadas, como: participação em ações coletivas, encaminhamentos, benefícios concedidos, acolhidas e evoluções de acompanhamento, bem como articula a interlocução entre os agentes das equipes. Além disso, os operadores da Vigilância Socioassistencial importam a base de dados das famílias do Cadastro Único do Governo Federal e organizam numa base única, para todos os equipamentos socioassistenciais do município (públicos e privados), permitindo a integração e o conhecimento da vida dos usuários da rede de serviços. Assim, a partir desse sistema, foi possível produzir informações para a criação de planos de atendimento e acompanhamento individual e familiar; registro do diagnóstico inicial; definição das potencialidades e vulnerabilidades das famílias; dos objetivos, estratégias e recursos a serem mobilizados pelos profissionais dos serviços nos territórios do município, bem como o registro de avaliações periódicas de todas as ações. 26 De tal modo, esse sistema é utilizado na execução dos serviços, gerando informações territorializadas, sistematizando os dados e facilitando a implementação das atividades da Vigilância Socioassistencial do SUAS, a partir do mapa do município. É um sistema que, neste estudo, denomina-se telemático, pois se refere a um conjunto de tecnologias da informação e da comunicação resultante da junção entre os recursos das telecomunicações e da informática, o qual possibilita o processamento, a compressão, o armazenamento e a comunicação de uma enorme quantidade de dados (nos formatos de texto, imagem e som), em curto período, entre usuários localizados em qualquer ponto do município. Por meio desse, o qual denomina-se aqui de ST-SUAS, é possível identificar onde estão as famílias atendidas e assistidas; a distribuição dos programas sociais; as maiores incidências de situações de vulnerabilidade, risco social e violência; enfim, oferece um elenco de informações que garante a integração entre os equipamentos de atendimento, possibilita encaminhar os procedimentos e as notificações aos profissionais que atuam na área, agiliza as respostas entre os parceiros do atendimento e cria um banco de dados que registra todos os relatos e elementos dos atendimentos, no prontuário eletrônico. Como aponta Jannuzzi (2002, p. 53): Procurando adaptar-se a esse novo contexto institucional na formulação e avaliação de políticas públicas, municípios e agências governamentais têm investido tempo, recursos humanos e financeiros na organização de sistemas de informações estatísticas municipais, em alguns casos bastante sofisticados, com interfaces para sistemas de georreferenciamento, pacotes estatísticos, construção de indicadores sintéticos para diagnóstico social e focalização de políticas. Raichelis (2010), por sua vez, destaca que as transformações contemporâneas que afetam o mundo do trabalho, seus processos e sujeitos, provocam redefinições profundas no Estado e nas políticas sociais, desencadeando novas requisições, demandas e possibilidades laborais neste âmbito. Essas inovações provocadas pela facilitação da mídia digital interferem não só no cenário das interações com os outros, mas também nas dimensões culturais, econômicas, legais e políticas, como afirmam Jenkins, Green e Ford (2014, p. 25): 27 [...] as facilitações da mídia digital funcionam como catalisadoras para a reconceituação de outros aspectos da cultura, exigindo que sejam repensadas as relações sociais, que imaginemos de outro modo a participação cultural e política, que as expectativas econômicas sejam revistas e que se reconfigurem as estruturas legais. Nota-se, portanto, que na sociedade global da informação de crescente concorrência, que exige rapidez, flexibilidade e alta percepção das organizações, a abrangência é cada vez maior para o uso dos sistemas telemáticos, os quais dão apoio às decisões, são suportes na solução de problemas e trazem como proposta o processamento de informações para reduzir a incerteza, resolver conflitos e buscar dados que subsidiam os conhecimentos e/ou produções. Eles servem para registrar e armazenar de maneira segura, organizada e padronizada, os dados, além de poder gerenciá-los em grande volume, se caracterizando como um repositório sistêmico de dados. Mais do que isso, o dinamismo e a socialização advindos destas formas de tecnologias têm provocado transformações no próprio ser humano, assim como na expansão das redes de comunicação que contribuem efetivamente para as relações sociais. As possibilidades desses novos sistemas de gestão ainda estão em construção e é um processo que se alimenta no próprio processo. Isto é, dependem de dados confiáveis para o aperfeiçoamento das rotinas, de recursos humanos especializados com competências para o armazenamento e atualização das novidades tecnológicas e de pessoas com visão ampla, capazes de inovar, criar soluções inteligentes e contribuir com as demandas dos públicos de interesse em suas necessidades específicas. Segundo North (2010), gerenciar uma organização orientada para o conhecimento, significa empregar recursos para aumentar a eficiência e renovar a qualidade, gerando saberes com base nos dados e transformando-os em vantagens, que ao serem mensuradas, trarão êxitos nas atividades. Cabe ainda destacar, conforme a ótica de Belluzzo (2018), que a informação deve ser considerada um bem social a ser compartilhado, e as Tecnologias da Informação e da Comunicação (TIC) que as armazena e as transfere para as pessoas, são elementos fundamentais nas políticas públicas. Nesta mesma linha de 28 raciocínio, os estudiosos Silva, Ottonicar e Yafushi (2017, p. 604) consideram que as TIC trazem: [...] maior transparência política nas sociedades democráticas ao possibilitar o acesso à informação em diferentes mídias e suportes. Entretanto, o acesso à informação é apenas uma etapa do processo de aplicação do conhecimento na realidade, levando em conta que, para além das TIC, existe um indivíduo capaz de interpretar e criar significados, a partir da leitura e releitura que faz das informações disponíveis pela sociedade. E ainda, analisando o termo “telemática” de maneira específica, vemos que este resulta da junção das palavras telecomunicação (serviços de telefonia, fibra óptica, satélite, cabo etc.) e informática (softwares, computadores, sistemas de redes, periféricos etc.), ou seja, se refere a qualquer sistema que transmite dados pela rede, seja em formato de texto, imagem ou som. Este termo foi utilizado pela primeira vez em um relatório destinado ao governo francês no final da década de 1970 (NORA; MINC, 1978), como resultado de um trabalho solicitado pela presidência da república para fazer progredir a reflexão sobre como conduzir a informatização na sociedade. Em outras palavras, Silva (2002) pontua que telemática é a tecnologia que permite a comunicação a distância entre serviços de informática, por meio de redes de telecomunicações. Assim, considerando a telemática presente no software utilizado para a comunicação profissional e gestão dos serviços ofertados pelo SUAS de Pederneiras (ST-SUAS), bem como a Assistência Social, enquanto política pública inscrita no campo dos direitos sociais, observa-se que a prática de sua operacionalização pelas equipes dos serviços depende também da forma como esses profissionais ou agentes dessa rede, se comunicam, interagem, fornecem dados e a partir de seus sentidos e intencionalidades os transformam em conhecimento e expertise para atuar de forma eficiente e ética, no oferecimento dos serviços da Assistência Social. Por sua vez, estas contribuições causadas pela atuação profissional e gestão dos serviços, concomitantemente vão também produzir transformações positivas na sociedade, seja estimulando a capacitação reflexiva e crítica das pessoas, produzindo conhecimentos independentes ou ampliando as competências para se 29 adaptar aos métodos e as formas de se decidir sobre as mudanças sociais (VALENTE; BELLUZZO, 2020, p. 26). Portanto, há que se pensar a execução da Assistência Social no município de Pederneiras, enquanto uma política pública composta por múltiplas disciplinas e áreas do conhecimento, que se utilizam das Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC) por meio de uma rede informacional e midiática de serviços. E, para além disso, há também de se absorver que o objeto empírico dessas relações, que compõem esse serviço público único, inter-relacionado pela comunicação, operacionalmente tem a possibilidade de apropriação das ferramentas tecnológicas, criam práticas sociais e fomentam outros espaços, que embora possam ser contraditórios, também contribuem para a emancipação dos indivíduos (VELOSO, 2011, p. 132). Por isso, no próximo capítulo, discutimos um pouco sobre a plataformização e a Competência em Informação (CoInfo) e Midiática. 30 3 PLATAFORMIZAÇÃO, SISTEMA TELEMÁTICO E A COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO E MIDIÁTICA O mundo contemporâneo, na última década, após a expansão da banda larga, ganhou impulso na comunicação, pois a conexão entre diferentes agentes públicos, empresariais, sociais e culturais permitiu - via Internet sem fio - a construção de vários ecossistemas que incluem pessoas, dados, organizações e coisas. As tecnologias de análises também ampliaram o processamento de extensas quantidades de dados e de obtenção de informações a partir dessas redes e, diante dessas possibilidades, essas novas formas de se lidar com os efeitos das redes trouxeram a facilidade para o monitoramento de eventos, fatos, situações, pessoas e identificação de padrões que podem sugerir e/ou apoiar decisões, insights e a orquestração de recursos ou, ainda, promover ações coordenadas entre os participantes dos ecossistemas. No caso do ST-SUAS, sistema telemático de Pederneiras, foco deste estudo, ao se utilizar de uma plataforma digital, a instituição pode se conectar com parceiros e usuários, compartilhar dados, cocriar ações, combinar serviços e estabelecer relações mais producentes a partir da plataformização, que, conforme Poell, Nieborg e Van Dijck (2020, p. 2), é definida como um processo contemporâneo que envolve a “penetração de infraestruturas, processos econômicos e estruturas governamentais das plataformas digitais, em diferentes setores econômicos e esferas da vida”, contribuindo e influenciando a reorganização de práticas e imaginários culturais em torno dessas. Neste sentido, é importante discutir a comunicação na gestão das instituições públicas e ainda a Competência em Informação (CoInfo) e Midiática, aspectos que vamos relacionar e refletir a partir dos dados da pesquisa empírica realizada junto aos agentes da rede. Destaca-se que a CoInfo apresenta diferentes concepções, tais como a digital com ênfase na tecnologia da informação e da comunicação (TIC); a informação propriamente dita, que se refere aos processos cognitivos do uso e acesso aos dados do ST-SUAS, por exemplo; e a social, que destaca a inclusão por meio de uma visão integrada de aprendizado ao longo da vida e exercício da cidadania. 31 3.1 A Comunicação via mídias e sistema telemático Considerando a perspectiva pragmatista da comunicação, apontada por França (2016), observa-se que a busca nas ações humanas em sua dimensão empírica, nos estimula a tomar os objetos (produtos, situações, acontecimentos) em seu contexto mais amplo e a nos atentar para o encadeamento e desdobramento das ações, buscando apreender a realidade em seu permanente movimento, pois o objeto de estudos da comunicação é a “ideia de comunicação”: um conceito, com a ajuda do qual, se distingue e apreende no campo do empírico. Uma vez que envolve a questão da midiatização e da teorização da mídia como agente de mudança social e cultural, Hjarvard (2012) diz que uma parte significativa da sua influência, enquanto transporte de informação, é decorrente do fato de ela ter se tornado um componente do próprio funcionamento das instituições. De tal modo, em todas as instâncias sociais, a mídia interfere e as submete a sua própria lógica. Nesse sentido, a mídia é, ao mesmo tempo, componente do tecido da sociedade e da cultura. É uma dimensão independente que se interpõe entre outras instituições culturais e sociais, coordenando as influências mútuas. Outro aspecto importante é a interação entre as pessoas mediante o ST-SUAS em Pederneiras, pois, de acordo com Braga et al. (2017), o fenômeno comunicacional se realiza em episódios de intercâmbio entre pessoas e/ou grupos, seja de forma presencial e/ou midiatizada. Essa premissa relaciona-se à decisão de desenvolver conhecimentos comunicacionais a partir de elaborações de pensamentos investigativos que possam sobrepujar o empírico, bem como buscar e/ou encontrar respostas a eles. Dessa forma, assume-se que não há comunicação sem interação, pode-se dizer que essa socialização corresponde ao lugar em que podemos tentar nos aproximar do fenômeno comunicacional em sua ocorrência. Ou seja, o convívio e o diálogo entre as pessoas envolvem uma grande variedade de circunstâncias, processos, participantes, objetivos e encaminhamentos que a cada episódio interacional pode ser considerado singular, na sua existência histórica. Para Belluzzo (2020), os novos aprendizados são essenciais para o desempenho da vida social, pois aqueles que não possuem boas habilidades de informação e de uso das tecnologias digitais, fatalmente serão marginalizados na vida privada e pública. 32 É neste cenário que tanto a comunicação, quanto a utilização de ferramentas midiáticas embargadas por seus paradigmas comunicacionais (funcionalista, interpretativo e crítico), devem estar voltadas a ações propositivas para garantia de acesso aos direitos sociais, quando no âmbito da política pública de Assistência Social. Porquanto, como sugerido por Kuhn (2007), essas ações e posicionamentos possuem vigência e legitimidade enquanto os membros envolvidos endossam suas visões. Essa posição também é defendida por Arrais (2011, p. 356), que entende que a comunicação deve: [...] se constituir num setor estratégico não só para comunicadores, mas para todos os intelectuais, profissionais e estudiosos comprometidos com a agregação de valores e saberes que facilitem os processos interativos e a mediação da sociedade civil com a opinião pública, o poder do Estado e da sociedade em geral. Em vista disso, França (2016) traz reflexões acerca da natureza relacional da comunicação em que discute o processo de significação, a partir do “compartilhamento de sentidos'', pois a comunicação está localizada na intersecção entre três dimensões: a interacional, a simbólica e o contexto social, cultural e econômico, no qual se dá a interação. De fato, a comunicação é considerada como um processo relacional que se inicia nas práticas individuais ou em grupos para, posteriormente, alcançar uma “estrutura coletiva de significados'', que diz respeito aos atores sociais envolvidos nessa ação. Desta forma, a dualidade dessa relação estrutural estabelece uma série de pré-requisitos de como os meios de comunicação, em determinadas situações, são usados e percebidos pelos emissores e receptores, afetando as relações entre as pessoas. Por isso, nas questões tradicionais sobre o uso e os efeitos dos meios de comunicação é preciso considerar as circunstâncias, nas quais a cultura e a sociedade se inseriram. Hoje, a lógica central que controla os fluxos de informação dos quais dependemos é midiatizada e tem o poder de possibilitar e atribuir significados (FRANÇA, 2016). Vemos, por exemplo, que a plataformização significa a penetração de infraestruturas, processos econômicos e estruturas governamentais das plataformas digitais em diferentes setores econômicos e esferas da vida. Ela envolve a 33 reorganização de práticas e imaginários culturais, em torno desses suportes telemáticos, aplicativos, sistemas e infraestruturas digitais (re)programáveis que facilitam e moldam interações personalizadas entre usuários e programadores, os quais mediante coletas sistematizadas, processamentos algorítmicos, monetização e circulação de dados, interferem nos processos econômicos e estruturas governamentais ou privadas, em diferentes setores. Isso influi nos conceitos de administração, de gestão estratégica e toda a tecnologia de informação, especialmente na comunicação, implicando nas Competências em Informação (CoInfo) e Midiáticas dos usuários e produtores. Assim, ao se refletir sobre como se operacionalizam as informações com base nos dados do ST-SUAS de Pederneiras e sobre a forma que são realizadas as trocas dos elementos referenciais do sistema pelos agentes da rede da Assistência Social – emissores e receptores de informações - para triangulá-los e gerenciá-los com o propósito comum de garantir os direitos sociais, é indispensável aferir o nível de competência em informação desses, especialmente no que se refere a organizar, receber, discriminar, gerir e compreender as demandas no âmbito da questão social3, que emerge das desigualdades econômicas, políticas e culturais da sociedade, colocando em causa amplos segmentos de públicos no acesso aos bens da civilização (IAMAMOTO, 2010). Assim, o atendimento oferecido pelos equipamentos sociais do SUAS deve efetivamente contemplar a proteção social e, para isso, os agentes precisam ter competência para realizar essa ação. Por isso, observando o gerenciamento das informações através do ST-SUAS de Pederneiras, os agentes da rede (pelo menos em tese) devem ter algum grau de competência em informação e midiática para acessar e utilizar as informações com efetividade. 3.2 A Competência em Informação (CoInfo) e Midiática: aspectos técnicos, eticos e politicos As mudanças institucionais estão entrelaçadas às práticas culturais, que por sua vez, se relacionam a infraestruturas de plataformas globais, arranjos de 3Segundo Iamamoto (1999, p. 27), a Questão Social pode ser definida como o “conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista” madura, que têm uma raiz comum: a produção social é cada vez mais coletiva, o trabalho torna-se mais amplamente social, enquanto a apropriação dos seus frutos se mantém privada, monopolizada por uma parte da sociedade. 34 mercado e estruturas de governanças. Neste sentido, o desafio é integrá-las na sociedade sem comprometer as tradições vitais de cidadania e sem aumentar as disparidades na distribuição de riqueza e poder. A partir deste entendimento, Poell, Nieborg e Van Dijck (2020, p. 5) caracterizam a dinâmica da plataformização em três dimensões: infraestrutura, mercado e governança, conforme descritas no quadro 3: Quadro 3 - Dimensões da dinâmica da plataformização Infraestruturas de dados Mercados Governança Explorado especialmente por estudos de software, apreendido por meio da noção de dataficação, refere-se às maneiras pelas quais as plataformas digitais se transformam em dados, práticas e processos que historicamente escaparam à quantificação e, consequentemente, transformam os dados das plataformas em produtos e serviços usados nas rotinas e práticas cotidianas. Diz respeito à reorganização das relações econômicas em torno de mercados multilaterais, que foram especialmente pesquisados e teorizados na área de negócios, onde as relações de mercado tradicionais (em contexto pré-digital), salvo algumas exceções, tendem a ser unilaterais, com uma empresa negociando diretamente com os compradores. Materializa por meio de classificação algorítmica, privilegiando sinais de dados específicos em detrimento de outros, moldando assim quais tipos de conteúdo e serviços se tornam visíveis e em destaque, o que permanece amplamente fora do alcance, rastreando e direcionando os usuários finais. Fonte: Poell, Nieborg e Van Dijck (2020, p. 6) A análise dessas dimensões da plataformização, segundo Poell, Nieborg e Van Dijck (2020, p. 8), permite uma compreensão ampla de como esse processo relaciona-se com a transformação dos principais setores da sociedade e apresenta desafios particulares para os gestores de organizações ou projetos (stakeholders). Para eles: É vital irmos além dos focos específicos dos estudos de software, da área de negócios, da economia política e dos estudos culturais que, até agora, dominaram o estudo de plataformas e da plataformização. Precisamos ter uma ideia de como as mudanças nas infraestruturas, nas relações de mercado e nas estruturas de governança estão interligadas e como elas se moldam em relação às práticas culturais que estão em constante mudança. Tal exploração não é apenas de interesse acadêmico. A plataformização só pode ser regulada de forma democrática e efetiva pelas instituições públicas se entendermos os principais mecanismos em ação nesse processo. Consequentemente, com base nestas dimensões, vê-se que as plataformas não só modelam o que os usuários finais vão receber, mas principalmente podem 35 auxiliar os agentes da rede através de suas interações com os demais atores de serviços mediante o sistema informacional, como é o caso do ST-SUAS de Pederneiras-SP. Entretanto, as plataformas, bem como sua utilização, precisam ter seus objetivos bem delineados, especialmente quando se referem a serviços públicos ou que estão atrelados às políticas públicas. O risco é que essa plataforma se torne meramente um banco de dados de informações, sem considerar as dimensões sociais e a garantia de direitos dos usuários finais dos serviços. É a partir da análise dos dados e das situações que constam nela que as ações podem ser insertadas nos ambientes concretos, ou seja, a relevância da operacionalização do ST-SUAS está ancorada na possibilidade de valorização e consolidação de atuações adequadas às situações de risco dos usuários, via análises, proposituras e processos mais dinâmicos e eficientes, sem perder de vista os objetivos das instituições de serviços públicos de garantia de direitos e proteção social. Outro ponto que merece destaque é a utilização de mecanismos midiáticos no âmbito das políticas públicas, desenvolvimento social, interação entre sujeitos com interesses semelhantes, compartilhamento de informação e construção de conhecimento que, necessariamente exige o incremento de novas competências. Neste âmbito, destacam-se as Competências em Informação (CoInfo) e Midiática, ou seja, as práticas que tratam das habilidades para reconhecer a necessidade de se buscar a informação, bem como estar em condições de identificá-la, localizá-la e “utilizá-la efetivamente na produção do novo conhecimento, integrando a compreensão e uso de tecnologias e da capacidade de resolver problemas com responsabilidade, ética e legalidade” (VALENTE; BELLUZZO, 2020, p. 22). Como identificam Ferrés e Piscitelli (2015), os processos de difusão, entre outras possibilidades, fazem parte dos diferentes tipos de competências a serem internalizadas; e neste bojo, inclui-se a competência no uso de mídias, pois o domínio de conhecimentos e habilidades que se inter-relacionam às dimensões da linguagem, interação e processos de produção, vêm ao encontro das ideias de Valente e Belluzzo (2020, p. 22) de que a Competência em Informação (CoInfo) apresenta duas dimensões. A primeira, o “domínio de saberes e habilidades de diversas naturezas que permitem a intervenção prática na realidade” e a segunda, a “visão crítica do alcance das ações e o compromisso com as necessidades mais concretas que emergem e caracterizam o contexto social”. 36 As autoras entendem que houve um avanço no período entre 2000 e 2018 no que se refere à CoInfo, especialmente quando a Unesco recomendou que a competência em informação estivesse articulada com a midiática. A definição dessas duas modalidades de competência, segundo a Unesco (2016, p. 9), é que se trata de: [...] um conjunto que empodera os cidadãos, permitindo que eles acessem, busquem, compreendam, avaliem, usem, criem e compartilhem informações e conteúdos midiáticos em todos os formatos, usando várias ferramentas, de forma crítica, ética e eficaz, com o objetivo de participar e de se engajar em atividades pessoais, profissionais e sociais. Ainda, segundo Valente e Belluzzo (2020, p. 24), “a competência midiática amplia o âmbito da competência em informação tradicional”, a partir da inclusão e da produção colaborativa em ambientes de formato digital participativo. Contudo, ela requer uma adaptação contínua às tecnologias emergentes e exige pensamento crítico e reflexivo para que a participação nesses espaços aconteça. Acresce-se a isso, a visão de Borges (2017), que entende que atores, produtores, colaboradores e/ou distribuidores precisam ter “competências infocomunicacionais”, que se referem à inter-relação entre competência em informação e a comunicação. Por isso, vê-se que a competência em informação e midiática está diretamente atrelada ao conteúdo, enquanto as competências em comunicação dizem respeito às relações do ato comunicativo (BORGES; OLIVEIRA, 2011). Essa operacionalização [...] demanda, desde a identificação de espaços e ferramentas adequados para participar, até a intervenção em si com comentários, informações ou discussão, sempre tendo por base o respeito à interação. É um exercício de debate e negociação. Implica a abertura para participar de comunidades eletrônicas, para conhecer pessoas e interagir, conhecer e respeitar as regras de relacionamento, escutar, argumentar e defender opiniões de forma respeitosa, além de estar atento a aspectos como visibilidade, reputação e privacidade suas e de outros. Em decorrência, emerge uma sociabilidade fortemente amparada na capacidade de gerir informação e relacionar-se com o outro através dos recursos digitais, o que demanda competência em informação e em comunicação (VALENTE; BELLUZZO, 2020, p. 24). 37 Como visto na citação das autoras, a sociabilidade está amparada, ou embasada especificamente, na capacidade de se gerir informação e relacionar-se com o outro, via os sistemas ou recursos digitais, isto é, na competência em informação e midiática dos sujeitos envolvidos em comunicação. Nesse processo, os dados são transformados em informação, conhecimento e sabedoria e compartilhados para subsidiar as decisões - ou seja, demanda a “alfabetização midiática e informacional” (AMI), que reúne as tecnologias da informação às da comunicação (TIC) e a da alfabetização digital, abarcando seis competências principais, que segundo Valente e Belluzzo (2020), são sobre o papel das mídias e da informação; os conteúdos e usos das mídias; o acesso eficiente e eficaz à informação; a aplicação de formatos novos e tradicionais de mídia, relacionados à situação e contexto sociocultural dos conteúdos midiáticos, de modo a realizar uma avaliação crítica das fontes de informação, conforme demonstra-se na figura 1: Figura 1 - Principais competências da CoInfo Fonte: Adaptado de Valente e Belluzzo, 2020. Tal processo da AMI, trazido para a operacionalização do SUAS, produz contribuições significativas, tanto para os planejadores que se utilizam das evidências dos dados como para os atores da rede, que são capazes, pelo menos em tese, de adaptar suas intervenções com base nas mudanças sociais ou, ainda, 38 para os tomadores de decisões que usam a informação para subsidiar suas ações. Neste sentido, seguindo as reflexões postas pela teoria de Valente e Belluzzo (2020), os impactos da Alfabetização Midiática e informacional, envolvem: atores informados e ativos; competentes e capazes de aumentar e adaptar suas intervenções às mudanças sociais com níveis relativamente altos de trabalho e exigência de competências, procedidos de responsabilidades, eficiência e ética; de modo que sejam planejadores da gestão do SUAS que utilizam informações baseadas nas evidências para a tomada de decisões, ou seja, esses impactos devem partir de pensadores reflexivos e críticos, produtores de conhecimento e independentes, como demonstra-se na figura 2: Figura 2 - Impactos da AMI no SUAS e na sociedade Fonte: Adaptado de Valente e Belluzzo, 2020. Nesse contexto, cabe-nos considerar que a informação é elemento constituinte da cultura de um grupo e, portanto, em sua essência é condição de permanência e instrumento de mudança. Por isso, Vitorino e Piantola (2011) 39 apontam que o acesso à informação e ao conhecimento são tidos como componentes fundamentais para o exercício da cidadania no âmbito democrático. Para as autoras: [ ] a cidadania não se constrói apenas a partir do acesso material à informação, mas deve compreender também a capacidade de interpretação da realidade e de construção de significados pelos indivíduos (VITORINO; PIANTOLA, 2011, p. 101). Elas identificam quatro dimensões na Competência em Informação (CoInfo) e Midiática, que se complementam mutuamente, que são: a técnica; a estética; a ética e a política (VITORINO; PIANTOLA, 2011, p. 102), cujas características estão representadas no quadro 4. Quadro 4 - Características das dimensões da competência informacional Dimensão técnica Dimensão estética Dimensão ética Dimensão política Meio de ação no contexto da informação; Consiste nas habilidades adquiridas para encontrar, avaliar e usar a informação de que precisamos; Ligada à ideia de que o indivíduo competente em informação é aquele capaz de acessar com sucesso e dominar as novas tecnologias. Criatividade sensível; Capacidade de compreender, relacionar, ordenar, configurar e ressignificar a informação; Experiência interior, individual e única do sujeito ao lidar com os conteúdos de informação e sua maneira de expressá-la e agir sobre ela no âmbito coletivo. Uso responsável da informação Visa à realização do bem comum; Relaciona-se a questões de apropriação e uso da informação, tais como propriedades intelectual, direitos autorais, acesso à informação e preservação da memória do mundo. Exercício da cidadania; Participação dos indivíduos nas decisões e nas transformações referentes à vida social; Capacidade de ver além da superfície do discurso; Considera que a informação é produzida a partir de (e em) um contexto específico. Fonte: Vitorino e Piantola, 2011. Todas essas caraterísticas apontadas no quadro 4, segundo as autoras, precisam estar presentes em harmonia tanto na competência quanto na informação, pois juntas e em equilíbrio, tendem a favorecer o desenvolvimento da competência em informação (VITORINO; PIANTOLA, 2011, p. 102). Assim, considerando a ideia da “nova visibilidade” das mídias, elaborada por Thompson (2008, p. 15), observa-se que o ponto de partida está nos meios de comunicação que elabora, destaca, dá relevo e proeminência aos interlocutores, trazendo novas maneiras de agir e 40 interagir: “é preciso entender os caminhos pelos quais o avanço das mídias comunicacionais transformou a natureza da interação social”. Vale ressaltar que a internet na sociedade midiatizada é um meio que vai além da instrumentalidade, pois interfere no âmago da formação de novas condutas, nas quais tanto as organizações como os sujeitos têm autonomia para compartilhar, publicar e socializar informações entre eles. Por isso, os sistemas midiáticos, os bancos de dados e a inteligência artificial são fundamentais para entender o comportamento dialógico-relacional dos atores sociais e na sociedade. Assim, a compreensão de que a comunicação não é um processo mecânico e sim sobre o mundo. Segundo França (2016, p. 159): “o uso da linguagem, bem como a configuração da relação com o outro, estão fundadas em procedimentos, técnicas, operações que aprendemos, modificamos e desenvolvemos” e assim, estamos continuamente afetando e sendo afetados pelos acontecimentos, pessoas e objetos. No entanto, nem todas as experiências atuam no indivíduo da mesma maneira ou proporção, pois decorrem de sua bagagem sócio-histórica adquirida, a partir das diferentes experiências de vida (FRANÇA, 2016). Sendo assim, a comunicação produz espaço e oportunidade para novas e diferentes experiências, que são resultados da interação entre um ser vivo e seu ambiente, o que supõe a autoconsciência (da própria atuação e formas de expressão) e a consciência do outro (quem ele é, como está reagindo ou irá reagir). Além disso, cabe-nos ainda compreender que “há uma reconfiguração do quadro das teorias e uma perspectiva mais propriamente comunicativa” que se evidencia, a partir do final do século XX (FRANÇA, 2016, p. 157). Tais mudanças traduzem de forma própria os reordenamentos vividos pela sociedade, que incluem uma verdadeira revolução no campo das tecnologias da informação; profundas transformações dos valores, no universo das representações; no desenho das relações e das sociabilidades. 3.3 A perspectiva comunicativa interdisciplinar e os possíveis impactos no SUAS Há quase vinte anos, McLuhan (2007) dizia que os meios de comunicação eram como extensões de nossos sentidos, estabelecendo novos índices relacionais, não apenas no sentido particular, mas entre si, pois eles se inter-relacionam. Na 41 medida em que há uma diversificação das fontes de mensagens no mundo da comunicação – mesmo mantendo sua função de receptora - as pessoas têm um relevante aumento de escolhas e passam a usar as novas oportunidades oferecidas pela mídia para expressar suas preferências, trazendo um outro nível de complexidade para a compreensão do processo comunicativo (CASTELLS, 2017, p. 182). Além disso, como a especificidade vem do olhar ou do viés individual dos seres, que permite vê-las e analisá-las enquanto comunicação, as ações interdisciplinares de diferentes profissionais que compõem o SUAS envolvem realidades e ciências diversas, provocando um deslocamento/alteração no referencial teórico das disciplinas: eles não são “afetados” pelo objeto e sim “o objeto que sofre diferentes olhares” (FRANÇA, 2001, p. 6). Por exemplo, quando ampliamos as especificidades para a transdisciplinaridade, suscitamos a “contribuição de diferentes disciplinas, mas essas contribuições são deslocadas de seu campo de origem e se entrecruzam num outro lugar” (FRANÇA, 2001, p. 7). Nota-se que este olhar múltiplo sobre um determinado fenômeno observado, permite que se abranja a complexidade crescente do mundo pós-moderno, justificando a definição da transdisciplinaridade como um movimento de reflexão sobre os conceitos, modificando inclusive a forma como entendemos o ser humano, seu papel no mundo e sua interação com o universo. Ser transdisciplinar quer dizer ter um enfoque pluralista do conhecimento sobre um objeto ou fenômeno a partir da articulação entre as inúmeras faces de compreensão do mundo, unindo as variadas disciplinas para que se torne possível um exercício mais amplo da cognição humana. Vemos que a transdisciplinaridade acena para uma mudança, pois tenta suprir uma anomalia do sistema anterior - não destrói o antigo, porém é aberta, mais ampla. A necessidade da transdisciplinaridade decorre do desenvolvimento dos conhecimentos, da cultura e da complexidade humana. Já a abordagem interdisciplinar tem como principal aspecto a atuação em equipes compostas por profissionais diversos, cuja colaboração tem a influência de várias especialidades que denotam conhecimentos e qualificações distintas. Na ótica de França (2001), a interdisciplinaridade é um estado transitório, quando falamos de um trabalho ou estudo interdisciplinar pontual. Porém, se em alguns momentos de um campo interdisciplinar uma temática atrai várias 42 contribuições; se o intercâmbio das tendências começa a criar bons resultados e tradições, esse deixa seu estado interdisciplinar e dá origem a uma nova disciplina. Ela entende a transdisciplinaridade como um: [...] movimento de transgressão das fronteiras disciplinares [que] não anula a existência de diferentes perspectivas; não significa que todos falam do mesmo lugar e a mesma coisa; não implica a pasteurização das análises – todas as áreas produzindo as mesmas leituras. Significa, ao contrário, a proliferação dos “pontos de vista” (lugares de onde se vê e se analisa a realidade); a possibilidade de que as mesmas sofram muitas e variadas leituras (FRANÇA, 2001, p. 12). Desta forma, o resultado da confluência dessas contribuições e dos esforços analíticos empreendidos em torno das práticas comunicativas nos indicam claramente as possibilidades do viés comunicacional, isto é, os dois movimentos, “os diálogos interdisciplinares e a construção do lugar próprio, não são incompatíveis, mas complementares” (FRANÇA, 2001, p. 13). Nesta mesma ótica, Baldissera (2009) observa que, assim como existem intenções no polo da produção e proposição das informações, há também a intencionalidade dos interlocutores que se realizam na informalidade, irrompendo sem que a organização tome conhecimento. Essa compreensão permite dar relevo aos processos dialógicos-recursivos, pois a possibilidade e fertilidade de ocorrências nas relações comunicacionais, escapam ao planejamento (controle) e inclinam-se a assumir mais potência (organização, cultura organizacional, organização comunicada), tendendo a forçá-la a movimentos de (re)organização, tornando possível a utilização de outros tipos de investimentos em ações e/ou comunicação formal para neutralizar as comunicações informais. Inclusive envolve a percepção equivocada sobre a organização e seus interlocutores. Por isso, pensar a comunicação em um sentido mais amplo e complexo envolve a possibilidade de assumir certas incertezas ou presenças que fortalecem a diversidade imbricada nesse processo. Fomentar a criação, a inovação e a potencialização do diálogo e dos fluxos multidirecionais de comunicação é também compreender e reconhecer as possibilidades de desvios de sentidos, dentre outras coisas (BALDISSERA, 2009). Por exemplo, alguns aspectos dos sistemas informatizados desenvolvidos para atender seus usuários, nos mais variados domínios de aplicação, são os 43 projetos lógico e funcional dos bancos de dados; as capacidades de prever o volume de informações armazenadas; de permitir diferentes tipos de gerenciadores de dados, como relatórios e consultas padronizadas; de ter interfaces com outras plataformas para propiciar aprendizado do usuário; de dar condições às operações de armazenamento e de informações de maneira simples; de orientar sobre os servidores de dados (relacional) e programar diferentes usos desses. Enfim, todas as funções do sistema, no caso de um serviço via plataformas digitais, são conectadas por uma rede. É importante prever os fluxos multidirecionais que poderão impactar nos desvios de sentidos e, por isso, deve-se prever interfaces apropriadas em sua arquitetura, que é o banco relacional, para cada um dos usuários que, de acordo com sua funcionalidade, pode gerar tipos de consultas e distribuição dos dados, bem como a decomposição desses em várias modalidades de relatórios, para inserir um conhecimento e melhorar a capacitação informacional nesses atores. Portanto, o objetivo de um sistema e/ou plataforma digital é prover os usuários com informações úteis para que possam utilizá-las de acordo com sua competência e repertório informacional. Logicamente, o ideal seria que esse processo encaminhasse para a efetiva eficiência desse profissional, porém nem sempre é o que acontece, uma vez que esses desconhecem como utilizar essas informações. Por isso, a necessidade da capacitação desse usuário, não só sobre o manuseio e operacionalidade do sistema, mas sobre os diversos níveis de interação que esse proporciona aos usuários da rede. Neste sentido, as dificuldades podem ser operacionais, referentes a falta de descrição e conhecimento sobre a infraestrutura de armazenamento dos dados e a organização do banco, mas também sobre as possíveis relações que poderiam ser entabuladas a partir desses dados, as quais envolvem o tipo de informação, as pessoas envolvidas, os direitos e leis, o repertório dos usuários, a facilidade de interagir com o sistema, a motivação para análise desses e as possibilidades de uso que o sistema pode promover. Questões estas que, a partir dos projetos éticos e políticos das profissões que se inter-relacionam na execução dos serviços da Assistência Social, podem interferir nos resultados, ampliando as possibilidades humanas, gerando mecanismos de negação ou até impedindo, a utilização concreta do ST-SUAS. Com efeito, percebe- se que as novas tecnologias digitais constituem uma oportunidade significativa para 44 promover intervenções e equalizar os serviços do SUAS, garantindo a inclusão de todos. Todavia, o potencial crucial para as plataformas digitais e redes usadas diariamente requer esforços ativos e coordenados para evitar vieses e efeitos adversos, especialmente nos grupos menos favorecidos. Isso decorre da inabilidade com os sistemas, da incompetência em informação no desenvolvimento e implantação desses, da falta de treinamento e dos desafios relacionados ao consentimento, ao sigilo dos dados e outros fatores, que colocam em dúvida sua ética e transparência, impedindo que alcancem a legitimidade necessária para que seu uso seja ampliado. Para Correia (2011, p. 372): [...] precisamos ultrapassar os limites da mera interatividade entre o público e os meios de comunicação para processar conhecimentos, analisar cenários, estabelecer nexos entre os discursos políticos e as práticas sociais. Refletir eticamente sobre nossa própria condição existencial e suas particularidades requer decodificar o mundo, desvendar a realidade aparente para captá-la nas suas contradições internas. Se somos todos seres de relação e construímos nossa identidade no convívio social, a comunicação no seu sentido mobilizador e articulador de demandas coletivas deve ser priorizada. Da mesma forma, para consolidarmos nossa identidade como profissionais voltados para as práticas educativas, precisamos dominar as ferramentas essenciais, para que o processo de veiculação de dados, fatos e acontecimentos possa fluir com clareza, permitindo que cada um que entre em contato com ele elabore seus próprios pontos de vista e atue socialmente a partir de suas posições. Observa-se, então, que todos esses desafios demonstram o importante papel dos sistemas e/ou plataformas digitais em termos de promoção do uso ético e responsável dos dados, com foco na geração de um impacto social, especialmente, no que se refere aos serviços da Assistência Social. Neste estudo, concentrado no ST-SUAS do município de Pederneiras/SP, a intenção não é privilegiar o mercado cada vez mais amplo e flexível ou garantir ganhos de produtividade e flexibilidade junto à concorrência, mas se fundamentar na lógica das políticas sociais, até porque mesmo em sociedades capitalistas, com valores progressistas, existe a necessidade de enfrentar a deterioração das condições de vida da população menos assistida, de se avaliar os efeitos do processo de urbanização e de defender os cidadãos. 45 Por isso, é preciso estruturar os sistemas de proteção social, de forma que a lógica não esteja atrelada à lucratividade. E ainda, por ser uma questão complexa, os recursos informáticos têm que ser adaptados à gestão das políticas sociais, sem abandonar os pressupostos, os valores, as expertises e o desenvolvimento das boas práticas e guias específicos dos profissionais da área. Portanto, verificar a competência em informação e midiática desses, junto ao ST-SUAS, é parte integrante do processo de ampliação dos direitos e aperfeiçoamento das instituições democráticas. Neste âmbito, recomenda-se evidenciar a dimensão estratégica das ações profissionais, a partir de uma visão ampla da comunicação, que incorpore especialmente, os aspectos culturais, sociais e humanos, rompendo com as ações meramente executivas ou tecnicistas, da racionalidade econômica, redimensionando a “visão estratégica conservadora” e estimulando interpretações para melhor “compreender os processos comunicativos contemporâneo e as inter-relações das pessoas” (KUNSCH, 2014, p. 57) e, a partir disso, fomentar a criação, a inovação e a potencialização de diálogos e de fluxos multidirecionais, para dar suporte às operações do próprio controle do SUAS, bem como garantir melhores serviços aos usuários e mais transparência nas informações. Contudo, observa-se na figura 3, um ciclo de ações que podem contribuir para a competência em informação e midiática, que envolve:  A percepção da necessidade de informação atualizada;  Identificação e definição da informação;  Saber buscar e encontrar a informação em diferentes fontes;  Conseguir analisar, interpretar, avaliar e organizar a informação pertinente e relevante;  Conhecer como utilizar a informação para solução de problemas;  Avaliar o impacto da informação, agir eticamente e respeitar os direitos de autor;  Saber como apresentar e comunicar a informação produzida, utilizando os meios adequados; e  Preservar a informação, estocando-a, reutilizando-a para uso futuro. 46 Figura 3 - Ciclo de ações para a Competência em Informação (CoInfo) Fonte: Labirinto do saber, 2022. Portanto, são muitas as questões que envolvem este assunto, como, por exemplo, se esse sistema digital pode ampliar a proteção social aos cidadãos; se os dados organizados e uma gestão mais participativa entre os agentes podem acrescentar benefícios aos usuários; se pode gerar mudanças estruturais no comportamento dos profissionais que atuam com ele; se existe a necessidade de maior capacitação para aproveitar melhor os recursos oferecidos pelo sistema; se essa ferramenta pode orientar os propósitos da política de Assistência Social ou se limita os aspectos internos e externos dos serviços. Enfim, neste estudo investigou-se algumas delas, especialmente sobre a implicação da Competência em Informação (CoInfo) e Midiática dos agentes que interagem com o ST-SUAS no município de Pederneiras/SP a partir de sua arquitetura e funcionalidades que veremos a seguir. 47 4 O ST-SUAS DE PEDERNEIRAS: ARQUITETURA E FUNÇÕES Nesta seção, relata-se mais objetivamente sobre o sistema telemático do SUAS no município de Pederneiras (ST-SUAS), que foi implantado em 2020, com o objetivo principal de otimizar os atendimentos da política pública de Assistência Social, bem como realizar o monitoramento e a avaliação das ações dos serviços ofertados pela rede pública e privada, identificando de maneira territorializada os indicadores de maior concentração de pobreza, condições de vulnerabilidade e risco social, de modo que a gestão administrativa enquanto Estado, obtivesse informações para realizar planejamentos de enfrentamento às expressões da questão social, em similaridade com as reais necessidades da população da cidade, apresentando-se as partes mais relevantes sobre sua arquitetura e funcionalidades. 4.1 Breve descrição do ST-SUAS Enquanto serviço telemático, o ST-SUAS de Pederneiras tem tecnologia de informação específica para a gestão integrada de dados referentes aos serviços socioassistenciais prestados aos usuários, via rede municipal de atendimento, além de propiciar o monitoramento nas três esferas governamentais. Para o cumprimento de suas funções, o sistema se propõe a oferecer transparência, agilidade, assertividade, segurança, qualidade em serviços e eficiência. Nele consta: a versão digital do Prontuário SUAS (todas as informações da versão impressa dos prontuários SUAS estão presentes no sistema digital e online); o formulário para os profissionais cadastrarem as famílias atendidas e realizar o acompanhamento psicossocial e visualizações de histórico de ações e atendimentos realizados; permite a criação de Planos de Acompanhamento Familiar (PAF), contendo diagnóstico inicial, registro de potencialidades e vulnerabilidades, definição de objetivos e estratégias de acompanhamento, agendamentos de atendimentos e registro de avaliações para efetiva constatação de superação de vulnerabilidades e situações de risco para o encerramento dos acompanhamentos; possibilita a elaboração de Planos Individualizados de Atendimento (PIA), contendo além das informações do plano familiar, a identificação do período de cumprimento de Medidas Socioeducativas (MSE), local de Prestação de Serviço à Comunidade 48 (PSC) e as informações sobre famílias acolhedoras, abrangendo todas as proteções, ou seja, da proteção social básica e da média e alta complexidade do SUAS. Destarte, o ST-SUAS facilita o acompanhamento familiar pelos programas do PAIF (Proteção e Atendimento Integral à Família), PAEFI (Proteção e Atendimento Especializado à Famílias e Indivíduos) e demais serviços da Assistência Social, desde o cadastro do usuário até o recebimento de ofícios e da abertura e encerramento dos acompanhamentos e também compartilha informações entre unidades de atendimento para referência e contrarreferência dos encaminhamentos e solicitações realizadas, as quais incluem: o histórico familiar e de alterações realizadas; as mudanças de domicílio; os registros de descumprimento de condicionalidades dos programas sociais; de atendimento a migrantes; de encaminhamentos realizados e benefícios eventuais concedidos; além das consultas de histórico a partir do nome, Número de Inscrição Social (NIS), Cadastro de Pessoa Física (CPF) ou qualquer documentação de identificação do responsável e/ou membro da família por diferentes perfis de acesso, como: os técnicos do Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), agendes de nível médio, profissionais de nível superior, de suporte de dados, da vigilância socioassistencial, bem como coordenadores, diretores e o/a secretário/a municipal. O ST-SUAS também propõe maior agilidade em todas as atividades das unidades da Assistência Social (CRAS, CREAS, Casa Lar, Unidades de Acolhimento Institucional, Repúblicas, Unidades Referenciadas etc.), permitindo a redução de custos e o atendimento aos usuários dos serviços com qualidade, rapidez e segurança. Espera-se ainda que esse possa oferecer: o emprego de processos e fluxos para acompanhamento de usuários da Assistência Social baseados nos moldes das unidades de atendimento; melhoria da qualidade da informação utilizada pelos gestores da Assistência Social; garantia de emissão de informações seguras e confiáveis, utilizando as orientações técnicas e nomenclaturas da Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais e Resolução nº44 da Comissão Intergestores Tripartite (CIT); segurança no registro e sigilo das informações confidenciais, permitindo o acesso somente de pessoas autorizadas; gestão de inscrição de usuários em ações coletivas e acompanhamento online pelos monitores 4Institui parâmetros nacionais para o registro das informações relativas aos serviços ofertados nos Centros de Referência da Assistência Social - CRAS e Centros de Referência Especializados da Assistência Social – CREAS. 49 das atividades; emissão de relatórios e formulários solicitados pelo Ministério da Cidadania e gestores estaduais; agilidade e a confiabilidade na emissão de relatórios por unidade de atendimento municipal. Outras especificações desse sistema são as referentes às possibilidades de integração com os serviços do SUAS, como o uso do cadastro das famílias e indivíduos, acompanhamento e monitoramento dos serviços socioassistenciais prestados à comunidade, que envolvem: integração online dos equipamentos e serviços socioassistenciais do município e disponibilização das informações cadastrais baseadas no cadastro único federal (CadÚnico) das famílias e nos prontuários SUAS disponibilizado pelo Ministério da Cidadania, podendo ser complementadas no programa, protegidas por um sistema de usuário e senha. Nota-se ainda que o acesso às informações é disponibilizado conforme o nível do usuário da seguinte forma: Gestor/Secretário (acessa relatórios de monitoramento); Diretor e Gerente de proteção (tem acesso a relatórios de monitoramento dos equipamentos de acordo com seu nível de proteção); Coordenador (acesso aos relatórios de monitoramento do seu equipamento, faz cadastro de equipe técnica, logradouros e localidades, realiza cadastro de ações coletivas (cria e registra informações), cursos (cria e registra informações), além de registrar e responder ofícios. Já o Técnico de Nível Superior: acessa os cadastros do grupo familiar; configura logradouros; cadastra novo grupo familiar; realiza diagnóstico do grupo familiar; insere informações de atendimento/acompanhamento do grupo; registra os encaminhamentos realizados; concede, cadastra e registra benefícios eventuais; ações coletivas (cria e registra informações); cursos (cria e registra informações); ofícios e, ainda, vincula membros familiares nas ações coletivas. O Técnico de nível superior da Vigilância Socioassistencial acessa os relatórios de monitoramento de todos os equipamentos, além de, em conjunto com o profissional de nível médio, localiza o grupo familiar; cadastra-o; altera as informações no cadastro das famílias; registra informações sobre as ações coletivas (vincula pessoas aos grupos e registra presenças); cadastra ofícios, denúncias e agenda atendimentos. A unificação das pessoas, famílias e logradouros, além dos acertos e correção das localidades e logradouros fica a encargo do Técnico de Suporte de Dados. E o Técnico de Abordagem Social é o responsável para acessar as abas 50 para inclusão das ações coletivas, das atividades e dos cursos oferecidos, além da emissão de ofícios e registro de denúncias. Ao se iniciar um atendimento, as abas disponíveis são a de identificação da família, encaminhamentos, con