UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS Curso de Graduação Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia LUCAS BUTRICO BARBOSA Estudo da Imobilização de proteases extraídas da Bromelia fastuosa (Gravatá) Araraquara, SP 2025 LUCAS BUTRICO BARBOSA Estudo da Imobilização de proteases extraídas da Bromelia fastuosa (Gravatá) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do grau de Engenheiro de Bioprocessos e Biotecnologia. Orientadora: Profa. Dra. Ariela Veloso de Paula Coorientadora: Dra. Juliana Cristina Bassan Araraquara, SP 2025 Diretoria Técnica de Biblioteca e Documentação – Faculdade de Ciências Farmacêuticas UNESP Campus de Araraquara Kazumi Tomoyose - CRB 8/10904 Barbosa, Lucas Butrico. B238e Estudo da Imobilização de proteases extraídas da Bromelia fastuosa (Gravatá) / Lucas Butrico Barbosa. – Araraquara, 2025. 110 f. : il. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação – Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia) – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Orientadora: Ariela Veloso de Paula. Coorientadora: Juliana Cristina Bassan. 1. Proteases. 2. Bromelia fastuosa. 3. Diaion. 4. Agarose. 5. Soro do leite. I. Paula, Ariela Veloso de, orient. II. Bassan, Juliana Cristina, coorient. III. Título. Esta ficha não pode ser modificada LUCAS BUTRICO BARBOSA Estudo da Imobilização de proteases extraídas da Bromelia fastuosa (Gravatá) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências Farmacêuticas, Araraquara, para obtenção do título de Bacharel em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia. Data da defesa: 06/03/2025 Banca Examinadora: ______________________________________ Prof. Dr. Ariela Veloso de Paula UNESP – Faculdade de Ciências Farmacêuticas - Campus de Araraquara ______________________________________ Prof. Dr. Álvaro de Baptista Neto UNESP – Faculdade de Ciências Farmacêuticas - Campus de Araraquara ______________________________________ Eng. João Francisco Cabral do Nascimento UNESP – Faculdade de Ciências Farmacêuticas - Campus de Araraquara ______________________________________ Prof. Dr. Heitor Buzetti Simões Bento UNESP – Faculdade de Ciências Farmacêuticas - Campus de Araraquara ______________________________________ Prof. Dr. Daniela Remonatto IFSP – Campus de Matão Dedicatória Dedico este trabalho à Deus e a minha família, que sempre me apoiaram e me deram forças para continuar, mesmo nos momentos mais difíceis. À minha orientadora e minha coorientadora, que me acolheram e me orientou com paciência e confiança, sempre acreditando no meu potencial. Aos meus amigos, que compartilharam comigo os desafios e conquistas ao longo dessa jornada, sendo fontes constantes de apoio e crescimento. E aos meus colegas de graduação e de laboratório, que estiveram ao meu lado nos momentos de dificuldades, tornando essa trajetória mais leve e significativa. A todos vocês, minha eterna gratidão. Agradecimentos A jornada até aqui não foi fácil, e, por isso, tenho imensa gratidão a todos que, de alguma forma, contribuíram para a realização deste trabalho e para o meu crescimento pessoal e profissional. Agradeço, em primeiro lugar, à minha família, por todo o apoio incondicional, incentivo e força nos momentos difíceis. Sem vocês, eu não teria chegado até aqui. À minha orientadora, Profa. Dra. Ariela Veloso de Paula, por me acolher em seu laboratório e grupo de pesquisa, pela orientação dedicada e por sempre acreditar no meu potencial em cada etapa dessa jornada acadêmica. Á minha coorientadora, Profa. Dra. Juliana Cristina Bassan, que esteve comigo desde o primeiro dia no laboratório. Aos meus amigos de infância, Juninho, Secco, Yuri e todos os outros, que compartilharam comigo não apenas desafios, mas também aprendizados e crescimento, sendo muitas vezes meu porto seguro junto à minha família. Aos amigos da graduação e do laboratório, Enzo, Luíza, Lelis, Marianne, Danielle Gonçalves, Daniela Remonatto, João Francisco, Heloísa e Amanda Noli, que estiveram ao meu lado nos momentos mais desafiadores, tornando essa caminhada mais leve ao compartilharmos dificuldades, conquistas e aprendizados. A amizade e o companheirismo de vocês tornaram essa experiência ainda mais significativa. E a todas as pessoas que passaram pela minha vida durante essa fase de grande aprendizado. A todos vocês, minha eterna gratidão e respeito. "A ciência é muito mais que um corpo de conhecimentos. É uma maneira de pensar." — Carl Sagan RESUMO Proteases são enzimas que catalisam a quebra de proteínas, hidrolisando ligações peptídicas. Grande parte das proteases são de origem vegetal e são do tipo cisteíno- proteases, como as papaínas proveniente do mamão (Carica papaya) e as bromelinas do abacaxi (Ananas comosus), que são amplamente empregadas nos setores alimentícios. Dentre as possíveis fontes vegetais de proteases, tem-se o gravatá (Bromelia fastuosa), um fruto presente na flora brasileira, da família Bromeliaceae. Entretanto, a aplicabilidade das proteases presentes no gravatá é ainda pouco explorada devido, principalmente, aos poucos estudos sobre essas enzimas, além da ausência de trabalhos relacionados à sua imobilização, o que caracteriza uma lacuna sobre o potencial de aplicações desses catalisadores tanto livres, quanto imobilizados. Além disso, a fim de garantir uma maior viabilidade aos processos catalisados por essas enzimas, imobilizar o biocatalisador em um suporte sólido torna-se uma boa alternativa. A imobilização tem como outros objetivos, melhorar a estabilidade da enzima ao processo e sua fácil separação do meio reacional para o seu reuso por mais ciclos de produção, gerando assim economia no processo. Com isso, após o estudo do extrato proveniente da Bromelia fastuosa observou-se que o processo de extração das proteases foi eficaz, e a caracterização de suas proteases apresentou alta estabilidade ao pH. Quanto à imobilização das enzimas presentes no extrato, para os suportes avaliados obteve-se 74% de rendimento de imobilização com a agarose 6BCL modificada com glutaraldeído, o que se mostrou acima do esperado quando comparado a imobilização de proteases de extratos vegetais que alcançaram 30% e próximo a rendimentos de imobilizações de proteases comerciais. Para o outro suporte, o poli(estireno-co- divinilbenzeno) (Diaion HP-20), a imobilização alcançou resultados inéditos de 89%, já que não se possui estudos com este suporte para imobilização de proteases, destacando o potencial desse estudo. Para ambas as imobilizações se observaram melhorias em seus parâmetros ótimos de operação (pH e temperatura) e resultados interessantes de seus parâmetros cinéticos. No entanto, destaca-se o Diaion®, uma vez que este suporte forneceu resultados semelhantes à Agarose, que é bastante empregada para imobilização de proteases. O Diaion® não necessita de modificações para a imobilização das proteases, além de não ser relatado nenhum estudo com este suporte para esse grupo de enzimas. Por fim, as proteases do gravatá, tanto no extrato enzimático, quanto imobilizadas, se mostraram promissoras na hidrólise de substratos proteicos como o soro do leite. Palavras-chaves: proteases; Bromelia fastuosa; Diaion; Agarose; soro do leite. Abstract Proteases are enzymes that catalyze the breakdown of proteins by hydrolyzing peptide bonds. Most proteases are of plant origin and are cysteine-proteases, such as papain from papaya (Carica papaya) and bromelain from pineapple (Ananas comosus), which are widely used in the food industry. Among the potential plant sources of proteases is gravatá (Bromelia fastuosa), a fruit native to the Brazilian flora and belonging to the Bromeliaceae family. However, the applicability of the proteases present in gravatá is still underexplored, primarily due to the limited studies on these enzymes, as well as the lack of research on their immobilization, which highlights a gap in understanding the potential applications of these catalysts, both free and immobilized. Moreover, to ensure greater viability for the processes catalyzed by these enzymes, immobilizing the biocatalyst on a solid support is a promising alternative. Immobilization aims to enhance enzyme stability during the process and facilitate its separation from the reaction medium for reuse in multiple production cycles, thus providing economic benefits. The study of the extract from Bromelia fastuosa revealed that the extraction process was effective, and the characterization of its proteases showed high stability at different pH levels. Regarding the immobilization of the enzymes in the extract, 74% immobilization yield was achieved with 6BCL agarose modified with glutaraldehyde, which was higher than expected compared to the immobilization of proteases from other plant extracts, which typically achieve around 30%, and close to yields for commercial protease immobilizations. For the other support, poly(styrene-co-divinylbenzene), immobilization reached unprecedented results of 89%, as there are no studies available for protease immobilization on this support, highlighting the potential of this study. For both immobilization methods, improvements in optimal operational parameters (pH and temperature) and interesting kinetic results were observed. However, Diaion® stands out, as this support provided results similar to agarose, which is widely used for protease immobilization. Diaion® does not require modifications for protease immobilization, and no studies have been reported using this support for this group of enzymes. Finally, the proteases from gravatá, both in the enzymatic extract and when immobilized, showed promising results for the hydrolysis of protein substrates such as whey. Keywords: proteases; Bromelia fastuosa; Diaion; Agarose; whey. Lista de figuras Figura 1. Métodos de imobilização de enzimas. .................................................................. 22 Figura 2. Etapas de preparo dos extratos enzimáticos. ....................................................... 30 Figura 3. Esquema do protocolo modificado para ensaio proteolítico. ................................. 31 Figura 4. Esquema do protocolo para imobilização em Agarose 6BCL ativada com glutaraldeído. ...................................................................................................................... 34 Figura 5. Esquema do protocolo para imobilização no copolímero de estireno-divinilbenzeno. ........................................................................................................................................... 36 Figura 6. Curva analítica de soro albumina bovina para determinação do teor de proteínas totais. .................................................................................................................................. 41 Figura 7. Curva analítica de tirosina para determinação de atividade proteolítica. .............. 41 Figura 8. Fruto da Bromelia fastuosa (Gravatá) antes da extração. .................................... 42 Figura 9. Eletroforese do extrato enzimático extraído da B. fastuosa. ................................. 44 Figura 10. Atividade do sobrenadante do extrato imobilizado em relação ao extrato submetido as mesmas condições. ........................................................................................................ 47 Figura 11. Gráfico da atividade do sobrenadante do extrato imobilizado em relação ao extrato submetido as mesmas condições. ...................................................................................... 48 Figura 12. Comparativo entre as etapas de imobilização nos dois suportes. ...................... 51 Figura 13. pH ótimos das proteases no extrato enzimático e nos derivados imobilizados. .. 53 Figura 14. Temperaturas ótimas das proteases no extrato enzimático e nos derivados imobilizados. ....................................................................................................................... 55 Figura 15. Estabilidade ao pH das proteases presentes no extrato enzimático e dos derivados imobilizados. ....................................................................................................................... 57 Figura 16. Estabilidade térmica das proteases presentes no extrato enzimático e dos derivados imobilizados. ....................................................................................................... 59 Figura 17. Gráfico do modelo cinético das proteases no extrato enzimático e dos derivados imobilizados para determinação de Km e Vmax. ................................................................. 61 Figura 18. Eletroforese do soro do leite e dos hidrolisados obtidos das reações com o extrato enzimático e as proteases imobilizadas. ............................................................................. 63 Lista de tabelas Tabela 1. Protocolo modificado para ensaio proteolítico. ..................................................... 32 Tabela 2. Metodologia para o ensaio proteolítico das proteases imobilizadas. .................... 35 Tabela 3. Determinação do teor de proteínas e da atividade enzimática presente nos frutos do Gravatá. ......................................................................................................................... 42 Tabela 4. Rendimento de imobilização de proteases em Agarose ativada com Glutaraldeído e Diaion® HP-20 antes e após modificação na agitação durante os processos de imobilização. ........................................................................................................................................... 49 Tabela 5. Parâmetros cinéticos das proteases presentes no extrato enzimático e derivados imobilizados. ....................................................................................................................... 61 Lista de Símbolos ® Marca registrada pH Potencial hidrogeniônico M Molar (mol por litro) g Grama ml Mililitro L Litro NaOH Hidróxido de sódio NaCl Cloreto de sódio µl Microlitro H2O Água °C Graus Celsius mM Milimolar HCl Ácido clorídrico Na2CO3 Carbonato de sódio Nm Nanômetros KNaC4H4O6·4H2O Tartarato de sódio e potássio U Unidade internacional de atividade enzimática t Tempo V Velocidade da reação V0 Velocidade inicial Vmáx Velocidade máxima µmol Micromol Km Constante de Michaelis-Menten λ Comprimento de onda (nm) x g Força centrífuga NaBH4 Borohidreto de sódio m/m Massa por massa Sumário 1.Introdução ........................................................................................................................ 14 2.Revisão Bibliográfica ........................................................................................................ 17 2.1.Proteases.........................................................................................................................17 2.2.Fruto Gravatá ................................................................................................................ 20 2.3.Imobilização .................................................................................................................. 21 2.4.Suportes de imobilização .............................................................................................. 24 2.5.Aplicações de enzimas imobilizadas ............................................................................. 27 3. Objetivos ........................................................................................................................ 28 3.1.Objetivos específicos .................................................................................................... 28 4.MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................. 29 4.1.Coleta dos frutos ........................................................................................................... 29 4.2.Extração e Preparo dos Extratos Enzimáticos ............................................................... 29 4.3.Quantificação do Teor de Proteínas dos extratos enzimáticos ....................................... 30 4.4.Determinação da Atividade Proteolítica dos extratos enzimáticos ................................. 31 4.5.Determinação do Perfil Proteico dos extratos enzimáticos ............................................ 33 4.6.1.Imobilização em Agarose 6BCL ativada por glutaraldeído .......................................... 33 4.6.2.Imobilização em partículas de copolímero de estireno-divinilbenzeno (Diaion®) ......... 35 4.6.3.Determinação do rendimento de imobilização ............................................................ 37 4.7.Caracterização enzimática do extrato bruto e derivados imobilizados ........................... 37 4.8.Determinação dos parâmetros cinéticos (Km e Vmax) ..................................................... 38 4.9.Hidrólise do soro do leite ............................................................................................... 39 4.9.1.Obtenção do soro do leite .......................................................................................... 39 4.9.2.Reação de hidrólise ................................................................................................... 39 5.RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................................ 40 5.1.Curvas analíticas........................................................................................................... 40 5.2.Extração e preparo dos extratos enzimáticos ................................................................ 42 5.3.Perfil Proteico do Extrato Enzimático ............................................................................ 43 5.4.Imobilização das proteases dos extratos enzimáticos ................................................... 46 5.4.1.Avaliação da Influência da Agitação e do Tempo na Imobilização de Proteases ........ 46 5.5.Caracterização do extrato enzimático ........................................................................... 52 5.5.1.Determinação do pH ótimo ......................................................................................... 53 5.5.2.Determinação da temperatura ótima .......................................................................... 55 5.5.3.Estabilidade ao pH .................................................................................................... 57 5.5.4.Estabilidade Térmica .................................................................................................. 58 5.5.5.Determinação dos parâmetros cinéticos (Km e Vmáx) .................................................. 60 5.6.Hidrólise do soro do leite ............................................................................................... 62 6.CONCLUSÃO .................................................................................................................. 65 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 66 ANEXO A – Artigo desenvolvido a partir do trabalho de conclusão de curso ....................... 74 14 1. Introdução As proteases são enzimas responsáveis pela catálise da hidrólise das ligações peptídicas em proteínas, promovendo a liberação de peptídeos e aminoácidos. Essas enzimas representam aproximadamente 60% do mercado global de biocatalisadores (Sebastián et al., 2018; Troncoso; Sánchez; Ferreira, 2022). Essa importância se deve à sua ampla aplicabilidade em diversos setores, incluindo nas indústrias médica e farmacêutica, onde são empregadas no tratamento de patologias como diabetes, glaucoma e lesões cartilaginosas (Dhillon et al., 2017; Gurumallesh et al., 2019). Dentre as subclasses de proteases de interesse industrial, destacam-se as cisteíno proteases, que são predominantemente de origem vegetal (Bolivar et al., 2023). Dois exemplos amplamente empregados são a papaína, extraída do mamão (Carica papaya), e a bromelina, obtida do abacaxi (Ananas comosus), ambas com aplicações consolidadas na indústria alimentícia (Troncoso; Sánchez; Ferreira, 2022; Hassan; Haque; Rahman, 2022). A família Bromeliaceae, da qual são extraídas as bromelinas, constitui uma fonte relevante de proteases com potencial industrial. Essa família botânica apresenta ampla distribuição em regiões tropicais, como o Brasil, e inclui uma diversidade de gêneros e espécies conhecidas popularmente como bromélias, caraguatás e gravatás (Krumreich et al., 2015; Eguiluz et al., 2019). Uma espécie pertencente a essa família, Bromelia fastuosa, popularmente denominado gravatá, é tradicionalmente empregada na medicina popular na formulação de xaropes para o tratamento de bronquite e asma, além de ser utilizada como agente vermífugo. Essa espécie contém a fastuosaina, uma cisteíno protease caracterizada por elevada atividade catalítica, pH ótimo próximo à neutralidade e resistência a condições moderadas de temperatura (Cabral et al., 2006; Gurumallesh et al., 2019). 15 No entanto, embora a fastuosaina apresente características comparáveis às proteases comerciais, a investigação sobre suas capacidades e características ainda é muito superficial. O único estudo disponível de aplicação dessa protease, conduzido por Garcia et al. (2009), demonstrou seu potencial na aceleração do processo de maturação do queijo Prato, resultando em um produto com menor teor de gordura e aprimoramento das propriedades físico-químicas do laticínio, evidenciando sua aplicabilidade na indústria de alimentos. No setor alimentício, a aplicação dessas cisteino proteases na hidrólise de proteínas e na modificação de matrizes alimentares ainda é pouco explorada, sendo um exemplo notável a produção de peptídeos bioativos, cujos efeitos benéficos à saúde são descritos na literatura. No entanto, a viabilidade econômica da síntese enzimática desses compostos ainda enfrenta desafios, principalmente devido aos altos custos envolvidos (Tavano et al., 2018; Gurumallesh et al., 2019). Uma estratégia amplamente adotada para viabilizar economicamente essas reações enzimáticas é a imobilização das enzimas em suportes adequados. Esse processo consiste na fixação das biomoléculas em uma matriz física ou química, conferindo maior estabilidade estrutural e resistência a condições operacionais adversas. Além disso, a imobilização facilita a recuperação e reutilização do biocatalisador, podendo reduzir significativamente os custos do processo industrial (Lyu et al., 2021; Basso; Serban, 2019; Tacias-Pascacio et al., 2021). No caso das proteases, a imobilização não apenas viabiliza a hidrólise de substratos líquidos, mas também minimiza a possibilidade de ocorrer autólise, um problema intrínseco a essa classe enzimática. Dessa forma, proteases imobilizadas têm sido aplicadas com sucesso na obtenção de hidrolisados proteicos a partir de subprodutos da indústria alimentícia, conferindo propriedades bioativas de interesse para a saúde (Tavano et al., 2018; Bilal et al., 2024; Morellon-Sterling et al., 2022). E, assim, faz-se necessário mais estudos referentes a esses derivados imobilizados para viabilizar ainda mais suas aplicações Diante disso, o presente estudo teve como objetivo avaliar o potencial da B. fastuosa como uma nova fonte de proteases. Além disso, os extratos enzimáticos dessa espécie foram imobilizados em dois suportes distintos: a agarose 6BCL, 16 amplamente empregada na imobilização de proteases, e o Diaion® HP-20, um copolímero ainda pouco explorado para essa classe de enzimas. 17 2. Revisão Bibliográfica 2.1. Proteases As proteases são uma classe de enzimas que catalisam reações de degradação de proteínas através da hidrólise de ligações peptídicas. A enzima favorece a polarização no grupo carbonila que participa da ligação entre os aminoácidos, resultando em uma estabilização do oxigênio deste grupo que consequentemente, propicia um ataque nucleofílico ao átomo de carbono e a quebra da ligação (Balakireva et al., 2017). Como essas ligações são responsáveis pela manutenção da estrutura nativa das proteínas, ao serem hidrolisadas são liberados peptídeos ou aminoácidos livres (Sebastián et al, 2018). As proteases apresentam diferentes especificidades, ou seja, são classificadas de acordo com as características catalíticas que possuem, como: a região das proteínas em que as ligações peptídicas são clivadas, sejam na parte interna (endopeptidases) ou na extremidades da proteína (exopeptidases), o tipo de resíduo de aminoácido catalítico presente no sítio ativo da enzima e de acordo com o tipo de resíduos de aminoácidos envolvidos da ligação peptídica (Sebastián et al, 2018; Gurumallesh et al., 2019). Em relação a classificação de acordo com o resíduo de aminoácido presente no sítio catalítico da enzima, as endopeptidases, podem conter resíduos de serina, treonina, ácido glutâmico, ácido aspártico e cisteína (Balakireva et al., 2017). Para as cisteino-proteases, os resíduos presentes são os de cisteína e histidina em seus sítios ativos, e podem ser subdivididas em famílias, de acordo com as semelhanças entre as estruturas das enzimas e suas atividades proteolíticas (Verma; Dixit; Pandey, 2016). As proteases têm grande aplicabilidade nos setores industriais, e por isso, representam em torno de 60% das enzimas comercializadas no mundo (Sebastián et al., 2018; Troncoso; Sánchez; Ferreira, 2022). Suas aplicações nos setores médicos 18 e farmacêuticos, vão desde auxiliar no tratamento de diabetes e glaucoma até no reparo cartilaginoso (Dhillon et al., 2016; Gurumallesh et al., 2019). Já na indústria alimentícia, o emprego de proteases para hidrolisar as proteínas presentes na matriz dos alimentos, possui um efeito muito positivo também. Tais modificações permitem que esses alimentos possuam novas características, como qualidade sensorial melhorada nos atributos de textura e sabor, uma melhoria na sua digestão, além de diminuir a sua capacidade alérgica. Sendo assim, as proteases atuam desde a produção de produtos livres de glúten, até no amaciamento de carnes, hidrolisando proteínas facilitando a mastigabilidade do alimento (Gurumallesh et al., 2019; Tavano et al., 2018). Outra aplicação destas enzimas no setor alimentício e farmacêutico é na produção de peptídeos bioativos, cuja ingestão está associada a diversas propriedades benéficas à saúde, como antioxidantes, anti-hipertensivos, antibacterianos, entre outras (Tavano et al., 2018). Esses peptídeos são obtidos de proteínas presentes em matrizes alimentares de origem animal e vegetal, como restos de carne da indústria e o soro do leite e derivados e grãos como o arroz, a soja, o milho, respectivamente (Martínez-Medina et al, 2019). Em relação ao soro, sua constituição é de lactose, vitaminas, sais minerais e de diversas proteínas, entre elas estão a β-lactoglobulina, α-lactalbumina, algumas imunoglobulinas e a albumina, e por isso, é uma boa alternativa como substrato para a produção peptídeos, pois em muitos países ainda é considerado um resíduo industrial abundante que pode ser transformado em produtos de alto valor agregado reduzindo concomitantemente o impacto ambiental (Bustamante et al., 2021). Na literatura já existem diversos trabalhos em que é feita produção desses hidrolisados proteicos a partir do soro de queijo com a utilização de proteases, mostrando o quanto a aplicabilidade desses peptídeos a partir dos resíduos da indústria de laticínios é viável. Um exemplo é o apresentado por Bustamante (2021), que hidrolisou o soro do queijo, obtendo peptídeos com boas propriedades antioxidantes e inibitórias a Enzima Conversora de Angiotensina (ECA). Outro exemplo de aplicação bem-sucedida é o demonstrado por Bassan (2015), que avaliou o emprego das proteases tripsina e pepsina imobilizadas para a hidrólise do soro de leite. Foi empregado o sabugo de milho modificado como suporte para a imobilização, 19 obtendo rendimentos de imobilização superiores a 80%, além de manter a atividade também superior a 80%, em relação a enzima livre. A hidrólise parcial das proteínas presentes no soro do leite bovino e bubalino utilizando os derivados imobilizados, também forneceu resultados interessantes, como atividade relativa alta e grau de hidrólise superior a 12% para reações em batelada. Quanto à origem das proteases que são empregadas nesses bioprocessos, podem ser originárias de fonte animal, microbiana ou vegetal (Chinnadurai; Krishnan; Perumal, 2018). Em relação às proteases de origem vegetal, biologicamente, elasdesempenham desde funções simples, como degradar proteínas mal enoveladas, até processos mais complexos, como apoptose e defesa celular (Sebastián et al, 2018; Balakireva et al., 2017). Porém, suas aplicações não ficam restritas as suas funções biológicas, sendo também aplicadas em processos industriais, devido às características que estas enzimas podem atribuir aos produtos de hidrólise (Gagaoua et al., 2021). Entre as proteases vegetais, destacam-se a papaína e a bromelina, provenientes do mamão (Carica papaya) e do abacaxi (Ananas comosus), respectivamente, que são utilizadas no setor alimentício (Bolívar et al., 2023; Chinnadurai; Krishnan; Perumal, 2018; David Troncoso; Alberto Sánchez; Luján Ferreira, 2022; Hassan, Haque; Rahman, 2022). Um dos processos no setor alimentício que estas enzimas atuam é no amaciamento de cortes de carne que naturalmente são mais rígidas. As proteases provocam a degradação das proteínas presentes nas estruturas da carne, e consequentemente, proporcionam um produto com maior maciez (Madhusankha; Thilakarathna, 2021). Um exemplo dessa aplicação é o proposto por Ribeiro et al (2021), que utilizaram a papaína aliadaara amaciar hamburgueres bovinos e de frangos, obtendo com sucesso produtos com maior maciez, o que demonstra a importância dessa classe de enzimas para aplicação em processos industriais. 20 2.2. Fruto Gravatá Entre as fontes vegetais, uma família que já é conhecida por ter proteases empregadas em diversos processos (bromelinas) é a Bromeliaceae. Esta família é típica de países tropicais, como o Brasil, porém, também são conhecidas pela sua capacidade de adaptação em diversos ambientes. Isso faz com que as plantas dessa família sejam umas das mais variadas morfologicamente e ecologicamente diversas, com vários gêneros e espécies dessa família, como as bromélias, caraguatás e os gravatás (Eguiluz et al., 2019; Krumreich et al., 2015). Os gravatás são frutos presentes na flora brasileira, desde o estado do Rio de Janeiro, até países como o Uruguai, sendo característicos do cerrado e matas como mesófilas, atlântica e de restinga (Wanderley; Martins, 2007). Além disso, são conhecidos por suas propriedades químicas ligadas aos efeitos proteolíticos, devido à presença de proteases em seu meio biológico (Texeira et al., 2019; Vallés; Cantera, 2018). Entre os tipos de gravatás, pode-se citar a Bromelia fastuosa, que é popularmente utilizada em xaropes para tratar de doenças como bronquite e asma e até em vermífugos (Cabral et al., 2006). Porém, na literatura se encontram poucos trabalhos que utilizam este fruto como fontes de enzimas proteolíticas, somente o apresentado por Cabral (2005), que relata níveis altos de atividade proteolítica quando comparada a outras enzimas, como a papaína e algumas bromelinas. Além disso, também pela falta de estudos sobre o gravatá, se sabe ainda menos sobre as enzimas presentes no fruto. Cabral (2005) também realizou uma análise estrutural e funcional de uma de suas proteases, a fastuosaína. A enzima foi classificada como uma cisteino-protease, o que é confirmado por Gurumallesh (2019), que afirma que a maioria das proteases vegetais são endopeptidases com resíduos de cisteína presente em seu sítio catalítico. No estudo também foi determinado seus parâmetros ótimos de operação: sua temperatura de atuação, de 55°C; e pH, em torno de 7,5. E por fim, através da técnica de modelagem molecular, foi possível 21 confirmar que a protease é pertencente à família da papaína, por apresentar semelhanças em sua estrutura e propriedades físico-químicas. Porém, mesmo com características semelhantes a de enzimas utilizadas comercialmente, a única aplicação relatada foi em trabalho realizado por Garcia et al (2009), que extraiu, purificou e a utilizou para alterar o tempo de maturação do queijo Prato, produzindo um produto com teor reduzido de gordura. O emprego da fastuosaína não só reduziu o tempo de maturação, como também melhorou as características físico-químicas do queijo, demonstrando o seu potencial de aplicação na indústria de laticínios. Outro estudo que mostra uma possível aplicação é no setor medicinal, onde foi avaliado in vivo os possíveis efeitos antitumorais da fastuosaína, sobre a expressão de CD44, que são moléculas diretamente relacionadas ao desenvolvimento de tumores. Os resultados foram promissores, a injeção da protease em camundongos resultou em uma diminuição dos nódulos de células de melanomas (Guimarães- Ferreira et al., 2007). 2.3. Imobilização Assim, para que essas reações sejam economicamente viável, a enzima pode ser reutilizada em vários ciclos, gerando economia de custos (Basso; Serban, 2019; Lyu et al., 2021; Tacias-Pascacio et al., 2021). No caso das proteases, a imobilização possibilita a hidrólise de substratos líquidos e minimiza um problema intrínseco dessa classe, a autólise. As proteases imobilizadas têm sido aplicadas para a produção de hidrolisados de proteínas com propriedades benéficas à saúde a partir de subprodutos da indústria alimentícia (Bilal et al., 2024; Morellon-Sterling et al., 2022; Tavano et al., 2018). A imobilização de enzimas em suportes sólidos tem como objetivo garantir uma maior estabilidade aumentando a resistência mecânica dos catalisadores e sua estabilidade térmica, além de permitir a fácil separação do catalisador imobilizado do 22 meio reacional durante o processo catalítico (Basso; Serban, 2019; Lyu et al., 2021; Tacias-Pascacio et al., 2021). A tecnologia de imobilização também permite que a enzima seja reutilizada por mais ciclos de produção, mesmo que tenha uma queda na sua atividade, podendo gerar economia ao processo (Guisán, 1988; Basso; Serban, 2019). De forma geral, a imobilização de enzimas é o confinamento da enzima, seja por uma matriz ou um suporte físico ou localizada em certa região definida do espaço, com retenção de sua atividade catalítica (Guisan, 2006; Sirisha; Jain; Jain, 2016). Há diferentes métodos de imobilização de enzimas, como demonstrado na figura 1. Figura 1 - Métodos de imobilização de enzimas. Fonte: Modificado e traduzido de Sirisha et al. (2016). Entre os métodos de imobilização citados na figura 1, existe aquele que não necessita de um suporte sólido para imobilizar a enzima denominado como cross- linking. Trata-se de uma técnica irreversível que consiste na formação de ligações cruzadas entre as enzimas utilizando agentes funcionais. Estes agentes podem ser 23 bi ou multifuncionais e são capazes de se ligar a dois ou mais grupos dos aminoácidos das enzimas, formando uma estrutura tridimensional. Porém, ainda é uma técnica que causa uma perda considerável na atividade catalítica, além de ter baixa estabilidade mecânica pela falta de um suporte físico (Furlani et al., 2020; Mohamad et al., 2015). Já entre os métodos que utilizam uma matriz polimérica para imobilizar a enzima, tem-se o aprisionamento (entrapment), em que a enzima fica retida em uma rede polimérica. Diferentemente de outros métodos, neste a enzima não está ligada quimicamente ao suporte. Outra técnica semelhante ao aprisionamento, é o encapsulamento, que por sua vez, utiliza membranas semipermeáveis para encapsular uma ou mais enzimas (Sirisha; Jain; Jain, 2016). A vantagem desses dois métodos é a proteção que a enzima tem por estar envolta pelo suporte, diminuindo os efeitos causados pelos compostos presentes no meio reacional. Porém, do mesmo modo que essas técnicas protegem a enzima, também criam problemas de transferência de massa, já que o substrato necessita adentrar na matriz polimérica para ter contato com a enzima (Furlani et al., 2020; Liu; Chen; Shi, 2018). No entanto, os métodos mais empregados para imobilização de enzimas, são os por adsorção física e ligação covalente. Em relação a técnica de adsorção física, consiste em interações fracas como ligações iônicas, forças de Van der Waals e ligações de hidrogênio entre a enzima e os grupos funcionais da superfície do suporte (Furlani et al., 2020; Mohamad et al., 2015). Por isso, trata-se de uma técnica simples e reversível, já que é realizada por interações fracas, no entanto, quaisquer mudanças nas condições do meio reacional (pH e temperatura) podem resultar na dessorção dessas interações enzimas (Sirisha; Jain; Jain, 2016). Além disso, devido a sua simplicidade, não se tem controle das formas como as interações irão ocorrer, acarretando uma possível queda em sua atividade, principalmente quando as interações ocorrem próximas ao sítio catalítico (Furlani et al., 2020). Para o método de ligação covalente, a interação é feita por ligações covalentes entre os resíduos de aminoácidos e os grupos funcionais presentes no suporte (Furlani et al., 2020). Por se tratar de um método irreversível, a retenção da enzima 24 no suporte permite o seu reuso por um período mais prolongado que o de outros métodos. Além disso, o método normalmente proporciona um aumento no tempo de meia vida da enzima e na sua estabilidade térmica (Mohamad et al., 2015). Em geral, os resíduos de aminoácidos mais comuns na participação dessas ligações são de lisina e arginina, que possuem grupos (-NH)2, mas os de ácido glutâmico e aspártico (-COOH), serina e treonina (-OH) e de cisteína (-SH) também podem interagir com os grupos químicos na superfície do suporte (Yushkova et al., 2019). No entanto, a escolha do método de imobilização também depende das características físicas e químicas do suporte, como tamanho e natureza de seus grupos superficiais (Mohamad et al., 2015). Por isso, em determinadas condições, é necessário a utilização de um grupo funcionalizador para ativar o suporte. Isso ocorre, pois, a ligação covalente direta pode ocorrer de forma com que a enzima sofra uma modificação, acarretando um impedimento estérico do substrato até o sítio catalítico, ou acarretando em um baixo grau de imobilização (Furlani et al., 2020; Henriques, 2016). 2.4. Suportes de imobilização Um dos principais pontos a serem considerados para uma imobilização bem- sucedida, é a seleção do suporte em que a enzima irá ser imobilizada. A escolha do suporte afeta diversos outros parâmetros da imobilização, como o método que será empregado e até mesmo algumas propriedades das enzimas (Furlani et al., 2020; Zdarta et al., 2018). Por isso, há algumas características, referentes ao material suporte que será selecionado, que devem ser considerados, como: a superfície, se será adequada para o processo de imobilização, ou se terá que sofrer modificações químicas; a porosidade do material, dependendo da aplicação; se haverá problemas de difusão, podendo resultar na perda das enzimas e na queda da atividade catalítica; a solubilidade do material no meio reacional; a sua estabilidade mecânica e microbiana; sua toxicidade; e se o seu reuso será viável (Furlani et al., 2020). 25 Em relação aos tipos de suportes que são empregados, podem ser classificados de acordo com sua composição química, em orgânicos ou inorgânicos (Mohamad et al., 2015). Os suportes orgânicos, tem a vantagem de serem mais biocompatíveis e menos tóxicos. Em geral, são polímeros de origem sintética ou natural. Os polímeros que são sintetizados permitem escolher a composição de seus monômeros, garantindo que o suporte possa interagir de forma mais efetiva com a enzima. Já os biopolímeros naturais, devido a sua origem, sua biocompatibilidade é ainda maior, afetando menos a estrutura da enzima e permitindo que o derivado imobilizado tenha atividades catalíticas altas. Além disso, em geral, esse tipo de material não necessita de agentes funcionais, já que possuem muitos grupos reativos que interagem fortemente com a enzima. Entre eles, destacam-se como suportes a quitosana, o alginato, o colágeno, a celulose e a agarose (Zdarta et al., 2018). Um suporte polimérico, não poroso, de origem natural bem consolidado para as imobilizações de proteases é a Agarose. Este polissacarídeo é amplamente utilizado para imobilização covalente devido à sua facilidade de ativação, apoiada por inúmeros protocolos de modificação baseados em diferentes grupos de funcionalização (Antunes Lopes et al., 2020; Bassan et al., 2016; Tacias-Pascacio et al., 2021). Já entre os materiais inorgânicos, tem-se os minerais, óxidos metálicos, os cerâmicos, as partículas magnéticas, compostos de carbono, como os nanotubos e os grafenos, e outros polímeros. Em geral, esse tipo de suporte possui ótimas propriedades mecânicas, resistência química, térmica e microbiana e a capacidade de se obter diversos formatos e composições, desde géis a coloides, como no caso dos compostos a base de sílica (Sirisha; Jain; Jain, 2016; Zdarta et al., 2018). Outros materiais inorgânicos que vêm ganhando espaço como suportes para imobilização, são os magnéticos, entre eles, os nano magnéticos. As propriedades magnéticas permitem, que com um campo magnético, a recuperação das enzimas imobilizadas seja otimizada, em menos etapas e com um menor custo das etapas de purificação. Além disso, quando se utiliza suportes nano magnéticos, devido ao seu tamanho, sua área superficial é maior, ou seja, a área de contato do suporte com a enzima é maior. Isto permite a imobilização de uma maior carga de enzima quando 26 comparada com outros tipos de suporte com o mesmo volume (Darwesh et al., 2020; Liu; Chen; Shi, 2018; Henriques, 2016; Zdarta et al., 2018). As nanopartículas magnéticas que mais são empregadas para imobilização são as de óxidos de ferro (FexOy). Dentre elas, a magnetita (Fe3O4), a maguemita (γ- Fe2O3) e a hematita (α-Fe2O3), são as mais utilizadas, pois mesmo que possuam propriedades magnéticas menores que outros materiais, outras propriedades como estabilidade oxidativa e baixa toxidade fazem com que sejam mais interessantes para utilizar como suportes em meios reacionais (Domingues et al., 2019; Henriques, 2016). Muitas vezes esse tipo de nanopartícula magnética necessita de um grupo ativador, pois a ligação direta com a enzima não é tão estável. Um exemplo é o uso do APTS (3- aminopropiltrietoxisilano), glutaraldeído, tanino, entre outros compostos (Furlani et al.,2020; Darwesh et al, 2020). Outro material inorgânico empregado para imobilizações é o estireno- divinilbenzeno (Diaion® HP-20). Esse copolímero foi originalmente desenvolvido como uma matriz porosa para purificação cromatográfica (Chou et al., 2015), mas também é um material avaliado em imobilizações enzimáticas. Há relatos de seu uso para imobilização de enzimas que atuam em substratos hidrofóbicos, como lipases (Freitas et al., 2024; Miotti et al., 2024). Entretanto, até o momento, nenhum estudo avaliou o potencial do Diaion® HP-20 como suporte de imobilização para outras classes de enzimas, como proteases, embora um estudo tenha utilizado o copolímero para purificação por adsorção de proteases de culturas microbianas (Joo e Choi, 2012). Além disso, uma forma de tentar ampliar as opções de suportes e otimizar as reações de imobilização, é combinar diferentes materiais, com o intuito de maximizar os benefícios que ambos os materiais podem garantir para o derivado imobilizado (Zdarta et al, 2018). Entre esses tipos de combinações, tem-se a de materiais orgânicos com inorgânicos, como no trabalho de Cao (2015), em que celulose nanocristalina foi combinada com óxidos de ferro para ganharem propriedades magnéticas e permitir sua recuperação para seu reuso no processo. 27 2.5. Aplicações de enzimas imobilizadas Todas essas opções de imobilização fornecem várias vantagens para aplicação industrial de derivados enzimáticos. Uma das principais aplicações, como já dito anteriormente, é no setor alimentício para a produção de xaropes de açúcares, alimentos e bebidas lácteas, bebidas alcoólicas e de hidrolisados do soro do leite. Outras aplicações de enzimas imobilizadas no setor alimentício, é na produção de produtos sem lactose e na clarificação de bebidas à base de frutas, para modificação de compostos que causam sabores amargos. Um exemplo de aplicações de derivados imobilizados no setor alimentício é o emprego de proteases imobilizadas na produção de hidrolisados de proteínas com propriedades benéficas à saúde a partir de subprodutos da indústria alimentícia (Tavano et al., 2018; Bilal et al., 2024; Morellon-Sterling et al., 2022). Além da indústria alimentícia, as enzimas imobilizadas são empregadas na produção de diversos compostos, como biodiesel e polímeros, como o poliéster (Yushkova et al., 2019). Já em relação a indústria farmacêutica, enzimas imobilizadas podem atuar como biossensores, para a detecção de diversos metabólitos que podem estar relacionados com problemas de saúde (Sirisha; Jain; Jain, 2016). No entanto, como também já mencionado, devido à falta de estudos com proteases oriundas da Bromelia fastuosa, também não há trabalhos sobre a imobilização dessas enzimas. O que destaca a falta de estudos sobre o potencial dessas enzimas tanto livres, quanto imobilizadas. Neste contexto, o objetivo deste trabalho foi a extração e imobilização de proteases provenientes do fruto do Gravatá (Bromelia fastuosa), uma fonte alternativa e pouco explorada de enzimas para aplicação em reações de hidrólise de substratos proteicos. Assim, espera-se que este trabalho reforce o potencial das proteases de B. fastuosa para futuras aplicações em hidrólise de proteínas. 28 3. Objetivos O objetivo deste trabalho foi a extração e imobilização das proteases provenientes do fruto do Gravatá para o emprego como fonte alternativa de enzimas para reações de hidrólise de substratos proteicos. 3.1. Objetivos específicos • Extração e preparo do extrato enzimático com atividade proteolítica obtido a partir do fruto do Gravatá; • Análise da atividade proteolítica relativa e determinação de pH e temperatura de máxima atividade do extrato bruto escolhido; • Screening e seleção do suporte de imobilização através da avaliação do rendimento da imobilização e das atividades dos derivados imobilizados; • Caracterização do derivado imobilizado quanto ao pH ótimo, temperatura ótima, estabilidade operacional, e propriedades cinéticas (Km e Vmáx); • Avaliação do potencial hidrolítico do biocatalisador, tanto na forma livre quanto imobilizada, em reações de hidrólise de soro de leite. 29 4. MATERIAL E MÉTODOS 4.1. Coleta dos frutos Os frutos de Gravatá (Bromelia fastuosa) foram colhidos ainda imaturos em uma fazenda na região de Araraquara – SP. Em seguida foram lavados e higienizados para retirada de possíveis contaminantes, embalados em sacos plásticos e mantidos em congelamento a -20ºC até serem utilizados nos experimentos de obtenção do extrato vegetal com atividade proteolítica. 4.2. Extração e Preparo dos Extratos Enzimáticos A fim de avaliar qual parte do fruto possuía maior atividade catalítica, os frutos foram divididos em grupos para o preparo de 3 extratos: i) fruto inteiro, ii) polpa do fruto, iii) cascas. Em ambos os casos, os frutos congelados foram cortados e homogeneizados em um liquidificador da marca Arno por 2 minutos, no meio tampão de extração McIlVaine pH 4,5 0,2 M, contendo 5 mM de EDTA e 5 mM de cisteína na proporção de 1 grama de fruto para 5 mL de tampão (1:5; m:v). As suspenções obtidas foram filtradas utilizando gaze, e os filtrados coletados foram transferidos para tubos Falcon e centrifugados à 9000 x g por 30 min a 4°C. Os sobrenadantes de centrifugação foram congelados a −20°𝐶 (Cabral et al., 2005). O procedimento de extração é ilustrado na Figura 2. 30 Figura 2 - Etapas de preparo dos extratos enzimáticos. Fonte: próprio autor. 4.3. Quantificação do Teor de Proteínas dos extratos enzimáticos Para determinar o teor de proteínas nos extratos enzimáticos foi empregado o método de Bradford (1976). Inicialmente foi construída uma curva padrão utilizando uma solução padrão de soroalbumina bovina (0,03 mM a 0,5 mM) e a leitura de absorbância foi realizada em λ= 595 nm. Para a quantificação de proteínas totais das amostras foram retirados 100 μL dos extratos enzimáticos e homogeneizados em 700 μL de água ultrapura (Milli-Q). Em seguida, 800 μL do reagente de Bradford foram adicionados e após 5 min. de reação, as amostras foram submetidas a leitura no espectrofotômetro a λ = 595 nm (Bradford, 1976). 31 4.4. Determinação da Atividade Proteolítica dos extratos enzimáticos Para determinar a capacidade proteolítica de todos os extratos, foi realizado o ensaio da atividade proteolítica seguindo o protocolo de Sarath et al (2001) utilizando como substrato uma solução de caseína 1% como proposto por Cabral (2005) e Garcia et al (2009) com algumas modificações (Figura 3). Figura 3 - Esquema do protocolo modificado para ensaio proteolítico. Fonte: próprio autor. Inicialmente foram preparados microtubos de 2 mL contendo 800 μL de caseína 1% com 50 μL de tampão McIlVaine 0,2 M pH 7, que após a incubação a 37°C por 10 min, foi adicionado o extrato enzimático. Esses ensaios enzimáticos foram mantidos 32 em incubação por 10 min a 37°C sob agitação no banho termostatizado. Ao final dos 10 minutos foi adicionado 600 μL de solução de TCA 10% (ácido tricloroacético) para interromper a reação, sendo que para o branco a solução de TCA 10% foi adicionada imediatamente após a adição do extrato extratos enzimáticos. Todos os extratos enzimáticos foram armazenados em geladeira a 1°C overnight. Após a período de refrigeração, as amostras foram centrifugadas por 20 minutos a 5000 x g na centrifuga 5415 D da Eppendorf. O sobrenadante resultante foi filtrado e submetido a leitura de absorbância em espectrofotômetro em λ=280 nm. Com o auxílio de uma curva de calibração de tirosina, previamente construída, foi determinado a atividade proteolítica total utilizando a equação 1 e a atividade proteolítica específica utilizando a equação 2 (Cabral, 2005; Garcia et al.,2009). Os volumes empregados e o processo do protocolo modificado estão resumidamente descritos na tabela 1. 𝑈 = 𝜇𝑚𝑜𝑙 𝑑𝑒 𝑝𝑟𝑜𝑑𝑢𝑡𝑜 𝑓𝑜𝑟𝑚𝑎𝑑𝑜 𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑎çã𝑜 (1) 𝑈/𝑚𝑔 = 𝑈 𝐶𝑜𝑛𝑐𝑒𝑛𝑡𝑟𝑎çã𝑜 𝑑𝑒 𝑝𝑟𝑜𝑡𝑒í𝑛𝑎𝑠 𝑛𝑜 𝑒𝑥𝑡𝑟𝑎𝑡𝑜 (2) Em que: o µmol de produto formado é obtido pela curva de calibração e o tempo de reação é o tempo (min) em que o substrato esteve em contato com as enzimas. Tabela 1 - Protocolo modificado para ensaio proteolítico. Soluções Tubo Teste Tubo Branco Caseína 1% 800 μL 800 μL Tampão pH 7,0 50 μL 50 μL Incubar por 10 min a 37°C Extrato do Gravatá 15 μL 15 μL Incubar por 10 min a 37°C 33 TCA 10% 600 μL 600 μL Fonte: próprio autor. 4.5. Determinação do Perfil Proteico dos extratos enzimáticos Por fim, para confirmar o sucesso da extração das proteases da Bromelia fastuosa e garantir que para as etapas de imobilização foi fornecido principalmente a proteína de interesse para o suporte, foi realizado uma Eletroforese SDS-PAGE com os extratos enzimáticos obtidos do fruto do gravatá (Laemmli, 1970). Para isso, foram utilizados géis de poliacrilamida a 5% e 12% para empilhamento e separação, respectivamente. O tamanho das bandas foi identificado por comparação com a escala BLUeye da Sigma–Aldrich®. 4.6. Imobilização das Proteases do Extrato Enzimático da Polpa Após a escolha do extrato enzimático com maior potencial, a etapa seguinte foi a de imobilização das proteases do fruto nos seguintes suportes: Agarose 6BCL ativada por glutaraldeído e estireno-divinilbenzeno (Diaion®). 4.6.1. Imobilização em Agarose 6BCL ativada por glutaraldeído O primeiro suporte avaliado foi a Agarose 6BCL ativada com glutaraldeído. A metodologia empregada para a imobilização via ligação covalente unipontual foi a descrita por Bassan (2015). O esquema do processo de imobilização está representado na Figura 4. 34 Figura 4 - Esquema do protocolo para imobilização em Agarose 6BCL ativada com glutaraldeído. Fonte: próprio autor. Inicialmente 5 gramas de agarose 6BCL foram lavadas com água deionizada e misturadas com 7,25 mL de água deionizada, 11,9 mL de NaOH 1,7 M contendo 0,34 gramas de NaBH4. Em seguida, a mistura foi mantida sob agitação para adição de 8,5 mL gota a gota de glicidol. A mistura continuou sob agitação leve por 18 horas em banho de gelo pelas primeiras 2 horas e as 16 horas restantes em temperatura ambiente. A suspensão foi filtrada e lavada com água ultrapura em abundância. A agarose modificada com grupos gliceril foi misturada com 10 mL de NaIO4 100 mM e 40 mL de água deionizada para obtenção do suporte glioxil-agarose. Essa nova mistura, foi mantida sob agitação por 2 horas em temperatura ambiente e filtrada e lavada novamente com água ultrapura. Após a ativação com grupos glioxil, 2,5 gramas de glioxil-agarose, foi adicionado em 14,275 mL de uma solução de etilenodiamina 2 M pH 10. A mistura foi mantida sob agitação por 2 horas em temperatura ambiente. Em seguida, foi adicionado 14,275 mg de NaBH4 para redução de grupos aldeídos remanescentes em hidroxilas. O suporte amino-agarose obtido nessa reação foi filtrado e lavado com Protease imobilizada 35 tampão acetato de sódio 100 mM em pH 4 e água deionizada em abundância. Por fim, 1 grama do suporte amino-agarose foi homogeneizado em 2 mL de tampão fosfato 200 mM em pH 7 contendo glutaraldeído 3 mM por 15 horas. A suspensão foi filtrada e o suporte glutaraldeído-agarose foi abundantemente lavado tampão fosfato de sódio 25 mM em pH 7,0. 1 grama da agarose ativada com glutaraldeído foi adicionada em um volume de 84 mL do extrato contendo 10 miligrama de proteínas. Essa mistura foi mantida em agitação suave por 2 horas. Para determinar se a imobilização foi bem-sucedida, em intervalos de 30 minutos ao longo da etapa de imobilização, foram retirados 15 μL do sobrenadante para avaliar sua atividade hidrolítica. Por fim, também foi determinada a atividade do derivado imobilizado seguindo uma adaptação do protocolo do ensaio proteolítico modificado apresentado no item 3.4. Os volumes e as massas empregadas e o processo do protocolo modificado estão resumidamente descritos na tabela 2. Tabela 2 - Metodologia para o ensaio proteolítico das proteases imobilizadas. Soluções Tubo Teste Tubo Branco Caseína 1% 865 μL 865 μL Incubar por 10 min a 37°C Derivado Imobilizado 50 mg 50 mg Incubar por 10 min a 37°C TCA 10% 600 µL 600 μL Fonte: próprio autor. 4.6.2. Imobilização em partículas de copolímero de estireno- divinilbenzeno (Diaion®) O segundo suporte de imobilização avaliado foi o copolímero de estireno- divinilbenzeno (sty-dvb), apresentado na Figura 5. 36 Figura 5 - Esquema do protocolo para imobilização no copolímero de estireno-divinilbenzeno. Fonte: próprio autor. A metodologia empregada consistiu em secar o suporte por no mínimo 12 horas em estufa de secagem a 100°C. O material suporte seco foi homogeneizado em etanol 95% (m/m) e incubado por 18 horas a temperatura ambiente em uma proporção de 1 grama de suporte seco para cada 5 mL de álcool. Em seguida a suspensão foi filtrada e lavada em abundância com água deionizada. O suporte obtido desse processo hidroalcóolico foi utilizado para na etapa de a imobilização. A imobilização das proteases por adsorção física consistiu em homogeneizar 1 grama do suporte foi adicionada em um volume de 84 mL do extrato contendo 10 mg de proteínas. Essa mistura foi mantida sob agitação por um período de 15 horas. Para determinar se a imobilização foi bem-sucedida, também foram retiradas alíquotas de 15 μL do sobrenadante para avaliar sua atividade hidrolítica e determinar o rendimento de imobilização. Além disso, a atividade do derivado imobilizado também foi determinada seguindo o protocolo apresentado no item 3.6.1. Protease imobilizada Álcool etílico 37 4.6.3. Determinação do rendimento de imobilização Para avaliar os processos de imobilização ao longo do tempo, alíquotas do sobrenadante foram coletadas em intervalos predeterminados e analisadas quanto à atividade hidrolítica, conforme descrito no item 3.4. Um controle negativo foi incluído em todas as reações de imobilização. Esse controle consistiu no extrato enzimático sem a adição do suporte, sendo submetido às mesmas condições do sistema de imobilização (extrato enzimático + suporte avaliado). Além disso, considerando que a imobilização envolve proteases de um extrato bruto, um extrato enzimático contendo diversas proteínas em seu meio, o rendimento foi calculado apenas com base na atividade proteolítica do sobrenadante da imobilização e do controle (extrato enzimático sem adição do suporte), sem considerar o teor proteico. Isso ocorre porque outras proteínas podem migrar para o suporte, resultando em uma superestimação do rendimento (Bassan et al., 2016). Assim, o rendimento de imobilização foi calculado utilizando a Eq. (3). 𝑅(%) = (𝑈𝐸𝑥𝑡𝑟𝑎𝑡𝑜 𝑏𝑟𝑢𝑡𝑜−𝑈𝑠𝑜𝑏𝑟𝑒𝑛𝑎𝑑𝑎𝑛𝑡𝑒) 𝑈𝐸𝑥𝑡𝑟𝑎𝑡𝑜 𝑏𝑟𝑢𝑡𝑜 ∗ 100 (3) Em que R é o rendimento de imobilização (%), UExtrato bruto é a atividade hidrolítica do extrato enzimático bruto, e Usobrenadante é a atividade hidrolítica do sobrenadante do processo de imobilização. As atividades hidrolíticas são expressas em µmol de produto*min⁻¹. 4.7. Caracterização enzimática do extrato bruto e derivados imobilizados Após a determinação do extrato empregado nas etapas de imobilização e o preparo dos dois derivados imobilizados, a etapa seguinte foi a caracterização de todos os biocatalisadores avaliados. 38 Tanto o extrato enzimático da polpa contendo as proteases quanto os derivados imobilizados foram inicialmente caracterizados quanto ao pH ótimo (faixa de pH de 5,5 a 8, tampão McIlvaine) e temperatura (35 a 70 °C), usando o ensaio de atividade hidrolítica proposto por Sarath (2001), com modificações (item 3.4). A quantidade de amostra usada foi de 15 µL para o extrato enzimático e 10 mg para os derivados imobilizados. Além disso, também foram avaliadas as estabilidades térmicas e ao pH dos biocatalisadores. Para avaliar a estabilidade ao pH, foram preparadas as soluções do tampão McIlVaine nos pHs selecionados (6, 6,5 e 7). Em seguida, em microtubos de 2 mL foi adicionado o tampão e incubado o extrato e mantidos a temperatura ambiente. A atividade desse extrato foi avaliada ao longo de 8 horas, em intervalos de 2 horas seguindo o ensaio descrito no item 3.4. Para a estabilidade térmica, com o pH fixado, em microtubos de 2 mL foram incubados o extrato enzimático em banhos termostatizados nas temperaturas pré- determinadas (50°C, 60°C e 65°C). A estabilidade foi avaliada ao longo de 1 hora, com a atividade do extrato determinada em intervalos de 15 minutos, seguindo o ensaio descrito no item 3.4. 4.8. Determinação dos parâmetros cinéticos (Km e Vmax) Foram preparadas soluções de diferentes concentrações de caseína (0,05 mM; 0,1 mM; 0,15 mM; 0,2 mM; 0,25 mM; 0,3 mM; 0,35 mM; 0,4 mM; 0,45 mM; 0,5 mM) no tampão McIlVaine pH 7. Em seguida, foi realizado o protocolo de Sarath (2001) para determinação da atividade do extrato empregando as soluções de caseína, seguindo o ensaio descrito no item 3.4. e dos derivados imobilizados, descrito no item 3.6.1. 39 4.9. Hidrólise do soro do leite Por fim, foi realizada a hidrólise do soro do leite com as proteases imobilizadas seguindo a metodologia proposta por Bassan (2015). 4.9.1. Obtenção do soro do leite O soro do leite foi obtido a partir do leite integral pasteurizado. No leite foi adicionado a enzima renina de Aspergillus niger e CaCl2, nas proporções 0,6% (v/v) e 0,5% (m/v), respectivamente. Essa mistura foi mantida durante uma hora a 35°C em banho-maria. Após a coagulação, o soro foi separado do sólido resultante por filtração com gaze. Em seguida, o soro foi dialisado em membrana celulósica Trip- Fort (Hoechst) por 24 horas a 8°C em constante agitação. Decorrido a diálise para a remoção da lactose, foi adicionado caulim para a adsorção da gordura presente. Foi empregado uma proporção de 0,02 g de caulim para cada 1 mL de soro. Essa mistura foi então centrifugada a 7400 x g por 30 min a 4°C. Após a separação do caulim, o soro do leite foi armazenado em frascos e congelados até o seu uso. 4.9.2. Reação de hidrólise O soro do leite já tratado (item 1.8.1) foi submetido a reação por 24 horas a 45°C (banho termostatizado) empregando-se 0,5 g do derivado imobilizado ou 15 µL de extrato para cada 1mL do substrato. Ao fim dessa reação, o produto formado foi filtrado e submetido uma eletroforese para uma análise qualitativa para avaliar a se houve a hidrólise (Bassan, 2015). 40 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO Para o presente estudo, foi realizada a extração, imobilização e caracterização das proteases presentes no fruto do Gravatá (B. fastuosa) para avaliar se essa fonte pouco explorada é uma alternativa viável para a obtenção de proteases para a aplicação em reações de hidrólise de substratos proteicos. 5.1. Curvas analíticas Para determinar o teor de proteínas presente nos extratos foi construída uma curva analítica utilizando soro albumina bovina (SBA) como padrão de proteína (Figura 6) e para determinação da atividade enzimática total e específica foi construída uma curva utilizando o aminoácido tirosina como padrão (Figura 7). A partir da construção das curvas analíticas, os coeficientes de determinação (R2) de 0,9971 (Figura 6) e de 0,9995 (Figura 7) comprovam que o modelo se ajustou aos dados experimentais, garantido que todos os cálculos realizados com as respectivas equações são adequados. 41 Figura 6 - Curva analítica de soro albumina bovina para determinação do teor de proteínas totais. Fonte: próprio autor. Figura 7 - Curva analítica de tirosina para determinação de atividade proteolítica. Fonte: próprio autor. 42 5.2. Extração e preparo dos extratos enzimáticos Após o preparo dos extratos de acordo com o item 3.2, partindo-se dos frutos apresentados na Figura 8, foram realizadas a quantificação das proteínas presentes no meio e o ensaio de atividade enzimática. Assim, foi possível confirmar a existência de proteases presentes no fruto, além do fato de que a metodologia empregada para o preparo do extrato mostrou-se bem-sucedida. Ademais, a partir desses experimentos foi possível determinar qual parte do fruto possuía maior potencial catalítico. Portanto, os resultados apresentados na Tabela 3, mostram que o preparo do extrato somente com a polpa mostrou-se mais vantajoso do que o preparo com o fruto inteiro. Figura 8 - Fruto da Bromelia fastuosa (Gravatá) antes da extração. Fonte: Próprio Autor. Tabela 3 - Determinação do teor de proteínas e da atividade enzimática presente nos frutos do Gravatá. Extrato Teor de Proteínas (μg/mL) Atividade (U/mL) Atividade Específica (U/mg) Polpa 163,60 ± 5,60 17,98 ± 1,29 109,92 ± 7,86 43 Casca 110,09 ± 3,28 4,69 ± 0,65 42,62 ± 5,90 Fruto Inteiro 119,87 ± 0,42 10,11 ± 0,27 84,34 ± 2,22 Fonte: próprio autor. Assim, pode-se observar pelos dados da Tabela 3 que o extrato da polpa apresentou o maior teor de proteína. Esse resultado contradiz a expectativa de que o teor de proteína do extrato da fruta inteira seria maior do que o do extrato da polpa (apenas uma parte do fruto). Uma possível explicação para esse resultado é a ligação de compostos encontrados na casca da fruta com proteínas durante a extração e sua subsequente separação do sobrenadante após a etapa de centrifugação. Vale ressaltar que o sobrenadante é a fração onde as proteínas de interesse são encontradas. Essa hipótese é reforçada pelos resultados da atividade proteolítica. A atividade do extrato da polpa foi 23,27% maior do que a do extrato da fruta inteira e 61,23% maior do que a do extrato da casca. Assim, a baixa atividade dos outros extratos sugere a presença de compostos interferentes que podem ter reagido com proteínas de interesse (proteases) e inativando ou inibindo sua atividade. Ao avaliar tanto a concentração de proteínas, quanto a atividade específica, observou-se que os mais elevados valores de atividade e atividade específica foram obtidos empregando-se o extrato contendo a polpa do Gravatá. Isto sugere uma maior concentração das proteases na polpa do fruto, corroborando o estudo de Cabral (2005) que também realizou seus experimentos com o fruto sem casca e semente, somente a polpa. Dessa forma, optou-se por dar continuidade ao trabalho utilizando apenas o extrato contendo a polpa do Gravatá, sem a casca e as sementes. 5.3. Perfil Proteico do Extrato Enzimático Assim, a SDS-PAGE foi realizada para identificar as proteínas de interesse (proteases) e confirmar qual extrato apresentou o maior potencial para as próximas etapas. Os perfis proteicos dos 3 extratos avaliados, na eletroforese realizada, estão apresentados na figura 9. 44 Figura 9 - Eletroforese do extrato enzimático extraído da B. fastuosa. Fonte: Próprio autor. Dessa forma, como pode ser visto na figura 9, o perfil proteico dos extratos é caracterizado pela presença de três bandas mais visíveis, duas em cerca de 25 kDa e uma logo abaixo de 11 kDa. A presença de grandes quantidades de proteínas na faixa de 25 kDa está de acordo com os resultados de Cabral (2005), que extraiu e caracterizou a cisteino protease, fastuosaína, de 25 kDa de frutos de B. fastuosa. Com isso, a presença desta enzima nos extratos preparados é uma descoberta interessante, visto que a fastuosaína é uma protease com características semelhantes às proteases comerciais, como alta atividade proteolítica em temperaturas amenas e pH ótimo próximo ao neutro (Gurumallesh et al., 2019). A presença dessa protease na banda de 25 KDa reforça que o processo de obtenção dos extratos enzimáticos com as proteínas de interesse foi bem sucedido. 45 Ademais, a presença de apenas essas bandas é outro indicativo de que outras proteínas e compostos foram removidos durante a extração. Com isso, as proteases têm maiores chances de se ligar ao suporte na reação de imobilização. Assim, como os extratos brutos tinham baixas concentrações de proteínas indesejadas, a reação de imobilização pode contribuir para aumentar a purificação parcial desse enzimas, possivelmente resultando em maiores rendimentos após o processo de imobilização (Remonatto et al., 2022a; Morellon-Sterling et al., 2022). Além disso, comparando os perfis proteicos dos extratos enzimáticos brutos, observa-se visualmente uma diferença nas concentrações proteicas nas bandas de 25 KDa e 11 KDa entre os extratos. Com isso, é perceptível que os extratos provenientes do fruto inteiro e da polpa, apresentaram uma maior quantidade da proteína de interesse. Essa afirmação vai de encontro com os valores de teor proteicos dos extratos apresentados na tabela 3. Portanto, o extrato enzimático da polpa de B. fastuosa foi selecionado para as próximas etapas de imobilização, dada sua maior concentração de protease, maior atividade proteolítica e menores níveis de contaminantes. Uma vez que a presença de casca e sementes nos extratos pode resultar em contaminantes que interferem na atividade catalítica, como observado em outros extratos proteolíticos de origem vegetal (Chaiwut; Pintathonga; Rawdkuen, 2010). O que pode ser observado no extrato enzimático proveniente da fruta inteira. Embora contivesse todas as partes dos outros extratos, o extrato da fruta inteira apresentou a menor atividade e concentração de proteína. Pois, como já mencionado anteriormente, é possível que alguns compostos tenham interagido com as proteínas de interesse. Dessa forma, seriam necessárias etapas adicionais para remover impurezas, o que poderia aumentar o custo e o tempo de produção do extrato (Atsakou et al., 2023). Diferente do extrato proveniente da polpa, em que uma única etapa de separação física das sementes e casca foi suficiente para eliminar esses contaminantes, reduzindo a quantidade de interferentes durante a imobilização e, consequentemente, proporcionando uma maior porcentagem de proteases com atividade catalítica (Morellon-Sterling et al., 2022). 46 5.4. Imobilização das proteases dos extratos enzimáticos Após a escolha do extrato com maior potencial catalítico para imobilização, dois suportes foram testados: um consolidado para proteases (agarose 6BCL) e outro que ainda não havia sido aplicado para essa classe de enzimas (Diaion® HP-20) (Braham et al., 2021). Para a imobilização na agarose, o glutaraldeído foi utilizado como agente funcionalizante para a ligação covalente da enzima. Já a imobilização no Diaion® HP-20 ocorreu por adsorção física, sem necessidade de etapas de ativação (Bassan et al., 2016; dos Freitas et al., 2024). 5.4.1. Avaliação da Influência da Agitação e do Tempo na Imobilização de Proteases Inicialmente, foram avaliados os fatores da agitação e do tempo de imobilização das proteases em ambos os suportes. Em relação ao tempo de imobilização, para isso, foi avaliado o rendimento de imobilização, acompanhando-se os valores de atividade do sobrenadante do extrato imobilizado em relação ao extrato submetido as mesmas condições. Assim, para o processo de imobilização na agarose 6BCL, o resultado está apresentado na Figura 10. 47 Figura 10 - Atividade do sobrenadante do extrato imobilizado em relação ao extrato submetido as mesmas condições. Fonte: próprio autor. Observando a figura 10 nota-se uma queda na atividade do extrato presente na imobilização (sobrenadante), o que indica uma migração das enzimas do meio líquido para o suporte sólido. O extrato utilizado como comparativo (controle) manteve sua atividade, sem muita variação ao longo processo de imobilização, o que indica a não ocorrência de uma reação de autólise degradando as enzimas presentes no meio. Além disso, é possível afirmar que após o tempo de 90 min não houve uma variação significativa da atividade do sobrenadante, indicando que o máximo de proteínas foram imobilizadas, resultando em 46% de rendimento de imobilização das proteases na agarose modificada com glutaraldeído. 48 Para o outro suporte avaliado (Figura 11), o poli(estireno-co-divinilbenzeno), obtiveram-se resultados semelhantes da agarose quanto ao rendimento de imobilização, alcançando após 15 horas um total de 49% de migração para o suporte. Nesse caso também não há uma queda considerável na atividade do controle após as 15 horas, indicando que não houve perda na atividade do sobrenadante durante a imobilização também. Figura 11 - Gráfico da atividade do sobrenadante do extrato imobilizado em relação ao extrato submetido as mesmas condições. Fonte: próprio autor. Além do tempo da etapa de imobilização, como comentado, outro fator avaliado foi a agitação durante essa etapa. Portanto, com o tempo do processo de imobilização definido para cada etapa, foi avaliado duas condições de agitação: uma mais suave, a 80 RPM; e outra maior, a 190 RPM. Esse aumento na agitação teve como objetivo promover a interação entre as proteínas e os suportes. 49 Como resultado, observou-se um aumento significativo na migração da enzima para a agarose e para o Diaion® HP-20, conforme mostrado na Tabela 4. Esse aumento na migração foi avaliado pela determinação do rendimento de imobilização (item 3.6.3), que considera a atividade proteolítica do extrato enzimático antes e após a imobilização. A redução da atividade durante a reação de imobilização indica que as proteínas de interesse migraram para o suporte. O maior rendimento de imobilização obtido a 190 rpm pode ser atribuído ao aumento na velocidade de agitação, levando a uma interação mais intensa entre as enzimas e o suporte. Tabela 4 - Rendimento de imobilização de proteases em Agarose ativada com Glutaraldeído e Diaion® HP-20 antes e após modificação na agitação durante os processos de imobilização. Fonte: próprio autor. No primeiro teste de imobilização (80 rpm), o rendimento foi superior a 40% para ambos os suportes. Esse valor foi inferior ao obtido com enzimas comerciais, conforme relatado por Bassan et al. (2016), que alcançaram rendimentos superiores a 80% na imobilização da protease tripsina na agarose 6BCL. No entanto, esses baixos rendimentos já eram esperados, pois extratos vegetais são conhecidos por conter outros compostos, como proteínas, que podem dificultar a migração das enzimas de interesse para o suporte (Patil e Rathod, 2021). Porém, quando comparado com rendimentos obtidos de imobilizações de proteases de outros extratos vegetais, os rendimentos iniciais de imobilização foram superiores. Lamas et al. (2001), ao imobilizar proteases derivadas de Cynara cardunculus em agarose 6BCL modificada com glutaraldeído, obtiveram um rendimento de apenas 30%. Suporte Rendimento de imobilização (%) 80 RPM 190 RPM Agarose 6BCL 46 74 Diaion® HP- 20 49 89 50 Esse rendimento maior observado para a imobilização proposta neste trabalho pode indicar uma maior interação entre as proteases de B. fastuosa e o polissacarídeo, demonstrando o seu potencial para aplicações industriais, já que quanto maior for o rendimento de imobilização, provavelmente maior será a atividade desse derivado imobilizado. Outra possível explicação dos rendimentos obtidos pode estar associada ao método de extração das enzimas de interesse. O extrato de C. cardunculus foi obtido por meio de um sistema aquoso bifásico, resultando na presença de contaminantes no meio, o que pode ter dificultado a migração das proteases para o suporte (Lamas et al., 2001). Como no presente trabalh, o extrato enzimático apresentou baixa concentração de proteínas contaminantes, conforme confirmado pela eletroforese, pode ter ocorrido uma maior migração das proteases para os suportes, sem a concorrência com outras proteínas. Além disso, para ambos os suportes, o aumento da velocidade de agitação durante a imobilização foi favorável, resultando em um rendimento de 74% para a agarose 6BCL ativada com glutaraldeído e 89% para o Diaion® HP-20. Esses resultados demonstram que tanto os materiais quanto os processos de imobilização foram adequados e eficazes. Com o aumento da velocidade de agitação, foi possível alcançar um rendimento semelhante ao obtido por Bassan (2016), que imobilizou uma protease comercial na agarose 6BCL. Esse resultado é relevante, pois, como já mencionado, enzimas obtidas de fontes não comerciais, como vegetais ou microrganismos, geralmente contêm proteínas contaminantes, que podem competir com as enzimas de interesse durante a imobilização (Brígida et al., 2023). Essa competição não ocorre com extratos enzimáticos comerciais, que não apresentam outras proteínas ou contaminantes. Dessa forma, alcançar rendimentos de imobilização próximos aos obtidos com enzimas comerciais, reforçam ainda mais o potencial desses biocatalisadores. Por fim, comparando os dois derivados imobilizados e seus processos de obtenção, nota-se que o Diaion® HP-20, neste estudo, ele proporcionou um 51 rendimento de imobilização 16% superior ao da agarose (Tabela 4), que já é amplamente utilizada para imobilização de proteases em estudos anteriores (Tacias- Pascacio et al., 2021). Esses resultados demonstram o potencial do Diaion® HP-20 como suporte para enzimas hidrofílicas, com uma afinidade superior à esperada. Comparado à agarose, o Diaion® HP-20 não requer múltiplas etapas para modificação de seus grupos reativos, pois a imobilização ocorre por adsorção física (Fig. 12). Na adsorção física, as enzimas interagem principalmente por ligações fracas com os grupos químicos presentes na superfície do suporte (Freitas et al., 2024). Já na imobilização em agarose, o polissacarídeo passa por diversas etapas complexas de ativação, e as enzimas são ligadas covalentemente ao suporte (Bassan et al., 2016). Assim, considerando que o Diaion® HP-20 não passou por modificações na superfície, pode-se afirmar que seu maior rendimento está relacionado à sua maior afinidade com proteases. Figura 12 - Comparativo entre as etapas de imobilização nos dois suportes. 52 Fonte: próprio autor. Outra vantagem do Diaion® HP-20 é que o derivado imobilizado apresentou maior atividade em comparação à agarose ativada com glutaraldeído. Os derivados obtidos com o polissacarídeo apresentaram uma atividade hidrolítica de 2,9 U/g, enquanto aqueles obtidos com o copolímero atingiram 3,9 U/g, representando um aumento de 25%. Essa diferença significativa pode estar relacionada ao tipo de interação entre as enzimas e o suporte, conforme mencionado anteriormente. Como o Diaion® HP-20 não passa por nenhuma modificação superficial, as interações entre enzimas e suporte são fracas. Consequentemente, não há ligações fortes que possam alterar a conformação ou o sítio ativo da enzima (Boudrant et al., 2020; Remonatto et al., 2018). De forma geral, o maior rendimento de imobilização e a maior atividade hidrolítica obtidos com o uso do Diaion® HP-20 destacam o potencial inédito desse suporte na imobilização de proteases e, possivelmente, de outras enzimas hidrofílicas. Com poucos testes, foi possível imobilizar com sucesso o catalisador e obter resultados similares aos da agarose, que é amplamente utilizada para a imobilização de proteases. Em relação a esse suporte, é importante destacar que não são encontrados na literatura trabalhos de imobilização de proteases. Assim, a obtenção de tais resultados de rendimento e de atividade proteolítica quando comparados a da Agarose, demonstram o grande potencial do poli(estireno-co-divinilbenzeno) para imobilização de enzimas. 5.5. Caracterização do extrato enzimático Os parâmetros de atuação das enzimas podem mudar com a imobilização. Pois esses parâmetros estão associados às condições ambientais nas quais as enzimas são aplicadas, possivelmente afetando a estrutura da enzima e a capacidade catalítica (Remonatto et al., 2021). Assim, a etapa seguinte foi a caracterização das 53 proteases presentes no extrato enzimático proveniente da polpa do gravatá e dos derivados imobilizados obtidos. 5.5.1. Determinação do pH ótimo O primeiro parâmetro avaliado foi o pH. Não foi possível avaliar o comportamento do extrato em uma faixa de pH maior devido à desnaturação do substrato. Tal desnaturação foi evidenciada pela formação de agregados e precipitação (Dalgleish, 1982), não permitindo sua solubilização no tampão para a realização dos experimentos. Figura 13 - pH ótimos das proteases no extrato enzimático e nos derivados imobilizados. Fonte: próprio autor. Conforme ilustrado na figura 13, houve um pico de atividade catalítica próximo ao pH 7,0, com uma redução acentuada em níveis de pH mais altos tanto no extrato enzimático quanto nos derivados imobilizados. Os resultados do extrato bruto estão de acordo com os de Cabral et al. (2006), que, ao extrair e caracterizar a fastuosaína, 54 observaram atividade proteolítica máxima próximo ao pH 7,0. Esse comportamento é semelhante ao observado para cisteíno proteases comerciais de origem vegetal, como a bromelaína e a papaína, que apresentam alta atividade próxima ao pH neutro. Essas proteases também apresentam semelhanças às de B. fastuosa em relação à estrutura e sequência de aminoácidos (Cabral et al., 2006; Gurumallesh et al., 2019; Gagaoua et al., 2021). Os derivados imobilizados apresentaram comportamento semelhante às proteases presentes nos extratos enzimáticos, atingindo atividade máxima em pH 7 (figura 13). Esse resultado confirma que a imobilização não resultou em alterações conformacionais que pudessem ter alterado o ponto de conversão máxima do substrato em produto. Entretanto, em valores de pH mais altos, a diminuição da atividade foi menos acentuada. Em pH 7,5, a atividade catalítica dos derivados foi superior a 70% daquela obtida no pH ótimo (pH 7,0). Esse comportamento é esperado para enzimas imobilizadas, visto que a imobilização diminui o acesso dos componentes do meio à enzima, aumentando os problemas associados à transferência de massa (Bilal et al., 2019; Zdarta et al., 2018; Tacias-Pascacio et al., 2021). Como resultado, o impacto desses compostos nas enzimas é minimizado, permitindo que as proteases imobilizadas resistam e permaneçam ativas em condições mais alcalinas. Em meio ácido, a atividade dos derivados imobilizados foi menor que a das proteases solúveis. Esse fato pode ser atribuído ao processo de imobilização: o confinamento do catalisador ao suporte pode modificar a conformação da enzima, prejudicando o desempenho nessa faixa de pH (Tavano et al., 2018). Entretanto, para o derivado de Agarose, foi observado um aumento no pH 8,0. Esse comportamento pode estar associado à desnaturação do substrato devido ao pH avaliado, indicando que houve degradação da caseína e liberação de aminoácidos no meio, o que pode ter resultado em um falso aumento da atividade neste ponto (Dalgleish, 1982). Por fim, comparando o comportamento dos derivados imobilizados nos diversos valores de pH, nota-se novamente que as proteases associadas ao Diaion® se destacam. Em condições alcalinas, as enzimas imobilizadas no copolímero apresentaram 90% da atividade máxima. Comportamento semelhante foi observado 55 nas condições mais ácidas. As proteases imobilizadas em Diaion® HP-20 mantiveram 21% mais atividade do que aquelas imobilizadas em agarose. Esses resultados são ainda mais relevantes, dado que o copolímero ainda não havia sido aplicado na imobilização de proteases. Não apenas a imobilização foi bem-sucedida, mas a capacidade catalítica dos derivados também foi superior à observada ao usar agarose como suporte. 5.5.2. Determinação da temperatura ótima A análise seguinte teve como objetivo determinar a faixa de temperatura ótima dos derivados imobilizados. Os resultados são mostrados na figura 14. Figura 14 - Temperaturas ótimas das proteases no extrato enzimático e nos derivados imobilizados. Fonte: próprio autor. 56 Assim, a atividade máxima foi alcançada a 55 °C para proteases presentes no extrato enzimático e em temperaturas ainda mais altas para derivados imobilizados. Na faixa de 55 a 70 °C, houve uma variação mínima na atividade enzimática do extrato, permanecendo alta. Esta descoberta demonstra o potencial do extrato de B. fastuosa para aplicações em altas temperaturas. Ademais, as cisteino proteases possuem a capacidade de manter a atividade proteolítica em altas temperaturas, como a bromelaína e a papaína, que também apresentam atividade em temperaturas de até 80 °C (Gurumallesh et al., 2019). Com isso, ao comparar os resultados ao estudo realizado por Cabral (2005), observa-se uma semelhança na temperatura ótima, uma vez que este autor também obteve a atividade máxima em 55°C para a fastuosaína, que como mencionado, possui características semelhantes ao relatado para outras proteases vegetais como bromelinas. No estudo realizado por Vallés e colaboradores (2018), por exemplo, as peptidases presentes na Bromelia antiacantha também forneceram valores de pH ótimo próximo ao neutro e temperatura ótima próximo ao das proteases presentes no extrato enzimático. No geral, os resultados também demonstram o potencial dos derivados imobilizados para aplicações catalíticas. Já que é esperado que o processo de imobilização reduza o impacto das condições de reação, como o efeito da temperatura, na atividade enzimática (Remonatto et al., 2022a; do Nascimento et al., 2024). Assim, foi observado que a imobilização deslocou a faixa ótima das proteases avaliadas para temperaturas mais altas. A temperatura ótima das proteases foi de 55 °C e a do derivado de agarose foi de 65 °C, com atividade se mantendo próxima de 90% até 75 °C e reduzindo para 50% ao alcançar 80 °C. Já o derivado imobilizado do Diaion® HP-20 teve uma temperatura ótima em 60 °C, mas mostrou uma redução acentuada na atividade em temperaturas mais altas (12% a 65 °C) e mais baixas (10% a 55 °C), sendo menor do que a das proteases solúveis. Essa mudança no comportamento do catalisador em temperaturas mais 57 altas pode ser atribuída ao método de imobilização, já que a adsorção física resulta em interações fracas entre a enzima e o suporte em comparação com a ligação covalente . Assim, em condições extremas de temperatura, o derivado pode sofrer dissociação, dadas as ligações mais fracas entre os componentes (Furlani et al., 2020). 5.5.3. Estabilidade ao pH A partir da determinação do pH ótimo, foram escolhidos os 3 valores de pH em que a atividade foi superior a 80% para avaliar os efeitos do pH nas proteases presentes no extrato e nos derivados imobilizados ao longo do tempo. após a realização do experimento, foi construído o gráfico apresentado na figura 15 que apresenta a relação da atividade das proteases do extrato e dos derivados imobilizados nos valores de pH de 6, 6,5 e 7 ao longo de 8 horas. Figura 15 - Estabilidade ao pH das proteases presentes no extrato enzimático e dos derivados imobilizados. 58 Fonte: Próprio autor. Inicialmente é perceptível que tanto para os valores de 6 e 6,5, mesmo não representando a atividade máxima das proteases presentes no extrato enzimático, a estabilidade dos catalisadores se manteve elevada, com 72% para o pH 6 e 83% para o 6,5 após o experimento. Tal efeito não é observado no ensaio com o pH 7, que resultou em uma queda de mais de 50 % em metade do tempo (4 horas), atingindo 12% da atividade inicial ao fim das 8 horas, mesmo sendo o valor de pH com máxima atividade da enzima. Isso indica que para a sua aplicação em reações de longa duração, o seu emprego possa ser em condições mais ácidas, já que ainda sim apresentam atividades elevadas e conseguem mantê-las. No entanto, para ambos os suportes empregados, observa-se que a imobilização não resultou em uma melhora na estabilidade em relação a faixa de pH testada, causando até uma queda mais rápida da atividade proteolítica. 5.5.4. Estabilidade Térmica Quanto à estabilidade térmica das proteases presentes no extrato enzimático, o gráfico na figura 16 apresenta os resultados obtidos. Assim como na estabilidade ao pH, foram selecionados os valores de temperatura que mantiveram a atividade acima de 80%, sendo os valores de 55°C, 60°C e 65°C. 59 Figura 16 - Estabilidade térmica das proteases presentes no extrato enzimático e dos derivados imobilizados. Fonte: Próprio autor. Neste caso, os resultados apontam uma maior influência da temperatura nas proteases presentes no extrato proveniente da polpa do Gravatá, já que o tempo total do ensaio foi de apenas 2 horas, promovendo quase a total inativação das enzimas. Também se observaram quedas maiores na atividade, resultando em uma perda de quase 50% em apenas 15 minutos de exposição nas diferentes temperaturas. Isso sugere que tais temperaturas, mesmo que representem maiores conversões do substrato (máxima atividade proteolítica), não são indicadas para reações de longa duração. O mesmo efeito é observado para os derivados imobilizados, no entanto, nesse caso, a queda foi de 100% da atividade. Para os derivados imobilizados, observou-se que após os primeiros 15 minutos, a atividade também caiu para 0. Dessa forma, tal problemática indica que para manter a estabilidade do extrato enzimático e para os derivados imobilizados, é interessante que sejam empregadas menores faixas de temperatura para a realização 60 do estudo, como no realizado por Cabral (2005). Este autor observou que para valores menores de temperatura (25°C, 37°C e 45°C) a atividade se manteve estável acima de 80% por até 3 horas. Além disso, comparando-se os dados obtidos neste trabalho ao de Cabral (2005), também nota-se que a estabilidade térmica (65°C) da fastuosaína forneceu comportamento semelhante, uma vez que após 2 horas de exposição nesta temperatura, a atividade proteolítica atingiu valores extremamente baixos. Assim, tanto para as proteases presentes no extrato, quanto para os derivados imobilizados, avaliar sua estabilidade em condições mais brandas, como as apresentadas por Cabral (2005), pode resultar em um melhor entendimento dos comportamentos desses biocatalisadores. 5.5.5. Determinação dos parâmetros cinéticos (Km e Vmáx) O Km e Vmax do extrato bruto e derivados imobilizados foram determinados para entender melhor os efeitos da imobilização na atividade proteolítica. A cinética da reação é descrita na figura 17. 61 Figura 17 - Gráfico do modelo cinético das proteases no extrato enzimático e dos derivados imobilizados para determinação de Km e Vmax. Fonte: próprio autor. O ajuste do modelo cinético (modelo lineweaver-burk) aos dados experimentais (figura 17) forneceu coeficientes de determinação (R2) de 0,9877 para enzimas solúveis, 0,9974 para enzimas imobilizadas em Diaion® HP-20 e 0,9921 para enzimas imobilizadas em agarose. Os parâmetros cinéticos Km e Vmax para proteases solúveis e imobilizadas foram determinados usando o modelo (Tabela 5). Tabela 5 - Parâmetros cinéticos das proteases presentes no extrato enzimático e derivados imobilizados. Km (µmol) Vmax (µmol.min-1) Extrato enzimático 0,115 0,046 Agarose 6BCL 0,143 0,043 Diaion® HP-20 0,074 0,029 62 Fonte: próprio autor. O uso de agarose ativada por glutaraldeído não forneceu mudanças consideráveis nos parâmetros cinéticos, indicando nenhuma mudança na conformação da enzima ou no sítio catalítico durante o processo de imobilização. Tal resultado é interessante, já que demonstra que o processo de imobilização não afetou a enzima e sua capacidade catalítica, que continua atuando de forma semelhante de quando está no extrato enzimático, sofrendo apenas dos efeitos de transferência de massa e de energia, característicos de derivados imobilizados, que foram apresentados na caracterização dos parâmetros ótimos nos itens 4.5.1 e 4.5.2. Em contraste, a imobilização no Diaion® HP-20 resultou em uma diminuição em Km e Vmax em comparação com o extrato enzimático. Um Km menor indica que as proteases imobilizadas requerem uma concentração menor de substrato para atingir metade de sua velocidade máxima, representando uma maior afinidade com o substrato (Remonatto et al., 2021; Abdella; Ahmed; Hassan, 2023). Uma hipótese para essa maior afinidade é que a imobilização serviu como uma etapa de purificação, separando e concentrando as enzimas de interesse enquanto eliminava contaminantes que poderiam interromper a interação do substrato com o biocatalisador (Troncoso; Sánchez; Ferreira, 2022). 5.6. Hidrólise do soro do leite Por fim, para confirmar o potencial para hidrolisar substratos proteicos, as proteases do Gravatá foram empregadas como catalisadores na reação de hidrólise do soro do leite. O perfil proteico dos produtos formados pode ser visualizado na eletroforese (Figura 18), em que S é o soro do leite antes da reação, E é o produto da reação empregando o extrato enzimático, A é o produto da reação com o derivado imobilizado da Agarose e D o produto usando o derivado com Diaion®. Além disso, as análises apresentadas em S’, E’, A’ e D’ representam as amostras concentradas (4x) com um corte em 10 kDa. 63 Figura 18 - Eletroforese do soro do leite e dos hidrolisados obtidos das reações com o extrato enzimático e as proteases imobilizadas. Fonte: Próprio autor. Sendo assim, ao observar os resultados obtidos, é possível concluir que as proteases estudadas nesse projeto foram capazes de hidrolisar o substrato ofertado (soro de leite bovino). Isso se deve ao fato de que quando comparado o perfil do substrato (S e S’) com os outros perfis, nota-se que o primeiro possui diversas bandas ao longo de todo o gel, o que é esperado, já que é conhecido diversas proteínas presentes no leite que se encontram nessas bandas, como a soro albumina entre os 75 e 63 kDa, α-lactoalbumina e β-lactoglobulina entre 20 e 11 kDa (Bassan, 2015; Mazorra – Manzano et al., 2020). Tais bandas não aparecem ou apresentam-se menores nos perfis com os produtos hidrolisados (E, A, D, E’, A’ e D’), indicando que sim a hidrólise dessas proteínas. Esse resultado é mais perceptível em E e E’, em que nota-se um clareamento das bandas das proteínas com maior peso molecular e um acumulo de proteínas na parte do gel em que encontram-se proteínas de menor peso molecular. Entretanto, ao avaliar os perfis A, D, A’ e D, referentes aos derivados imobilizados, percebe-se o desaparecimento de quase todas as bandas proteicas quando comparados ao soro 64 bovino antes da reação (S ou S’). Isso indica que houve a hidrólise das proteínas do soro do leite, sendo possível visualizar apenas uma pequena banda na faixa de 20 a 11 kDa. Este resultado está de acordo com literatura, que prevê uma resistência das proteínas nessa faixa de serem hidrolisadas (Mazorra – Manzano et al., 2020). 65 6. CONCLUSÃO Ao fim do estudo, foi possível confirmar o potencial da Bromelia fastuosa como fonte de proteases. Os resultados demonstraram que o extrato enzimático obtido da polpa do fruto apresentou a maior atividade proteolítica e concentração de proteínas, além da menor quantidade de contaminantes em comparação aos demais extratos avaliados. A caracterização enzimática revelou que as proteases presentes nesse extrato exibiram propriedades térmicas, de pH e parâmetros cinéticos compatíveis com proteases amplamente utilizadas comercialmente. A avaliação dos suportes empregados para imobilização (agarose e Diaion® HP-20) indicou que ambas as metodologias foram eficazes, resultando em derivados imobilizados com atividade hidrolítica semelhante à das proteases na forma livre. Destaca-se que o Diaion® HP- 20 apresentou desempenho superior, principalmente por ser sua primeira aplicação na imobilização de proteases. Esse suporte demonstrou alta eficiência na imobilização e manteve boa atividade catalítica em comparação à agarose 6BCL, amplamente utilizada para esse fim. Além disso, o Diaion® HP-20 exigiu menos etapas e reagentes para a imobilização por adsorção física e apresentou maior afinidade com o substrato, ressaltando seu potencial como suporte promissor para outras enzimas. Ademais, tanto as proteases no extrato enzimático quanto na forma imobilizada mostraram-se promissoras na hidrólise de substratos proteicos, como o soro de leite. Assim, os resultados obtidos evidenciam o potencial biotecnológico do fruto de B. fastuosa e de suas proteases, bem como a viabilidade dos suportes avaliados, para aplicações industriais, especialmente na hidrólise de proteínas. 66 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABDELLA, M. A. A.; AHMED, S. A.; HASSAN, M. E. Protease immobilization on a novel activated carrier alginate/dextrose beads: Improved stability and catalytic activity via covalent binding. International Journal of Biological Macromolecules, v. 230, p. 123-139, 2023. ABOUSAWAY, O. et al. Noninvasive imaging of cancer immunotherapy. Nanotheranostics, v.5, 90, 2021. LOPES, LAIANE et al. Glyoxyl-activated agarose as support for covalently link novo- pro d: Biocatalysts performance in the hydrolysis of casein. Catalysts, [s. l.], v. 10, n. 5, 2020. ATSAKOU, A. E. et al. 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