UNESP UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” Faculdade de Ciências e Letras Campus de Araraquara – SP WILLER NOGUEIRA COQUETI UM PANORAMA HISTÓRICO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS A PARTIR DA MACRORREGIÃO NORDESTE ARARAQUARA – SP 2015 2 WILLER NOGUEIRA COQUETI UM PANORAMA HISTÓRICO DAS DESIGUALDADES REGIONAIS A PARTIR DA MACRORREGIÃO NORDESTE Monografia apresentada ao Conselho de Curso de Ciências Econômicas, da Faculdade de Ciências e Letras – Unesp/Araraquara, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Ciências Econômicas. Orientadora: Profª. Drª. Suzana Cristina Fernandes de Paiva. Banca: Profª Drª Luciana Togeiro de Almeida ARARAQUARA – SP 2015 3 4 Ao meu afilhado, Guilherme, e que em seu futuro seja vislumbrado um Brasil sem desigualdades. 5 AGRADECIMENTOS À minha mãe, por me apoiar sempre, e fazer muito mais do que apenas seu papel de mãe, mas sendo também minha amiga, conselheira e principalmente minha companheira nas melhores e piores situações, me ensinando todos os dias que não existe limites para o amor. Ao meu padrasto Nil que esteve do lado da minha mãe todos os dias que estive longe, cuidando dela e protegendo-a. À minha irmã, que é meu exemplo de vida, sendo a pessoa mais incrível que eu já tive o prazer de conviver, por seu meu ídolo e me surpreender a cada dia com seu esforço, carisma, alegria, inteligência e amor. Ao meu afilhado Guilherme, que mesmo sendo tão jovem já foi capaz de transformar completamente a vida da família. Ao meu pai, Valdir, e minha família, que sempre torceram muito por mim e que me incentivaram no período que estive em Araraquara fazendo a faculdade em especial minha Madrinha, Valneide, e meu Padrinho, Paulo. Agradeço as Lascanelas, que me ensinou o verdadeiro significado da palavra lar, e que podemos ter família que vai além dos laços de sangue, por ter me ajudado a entender quem eu sou e como eu sou, por sua importância na construção de meu senso crítico, meus valores e meus ideais, eu agradeço profundamente por ter me ajudado a me tornar uma pessoa melhor. Em especial, agradeço à Fernanda, Luiza, Larissa, Bia, Carol e Skolta que foram as que mais dividiram esse lar comigo e me propiciaram os melhores momentos da minha vida, cheios de amor delícia. Aos amigos que conquistei: Os de longa data Guilherme, Márcio e Felipe, que me ensinam sempre que amizades verdadeiras não têm prazo de validade; Os de longe, Bruno e Gustavo que mostram que elas não possuem limites de distância; E aos novos amigos, Rafael, Roni e Estevan, que me demostram que não há limites para fazer novos amigos e sempre terá a possibilidade de conhecermos pessoas maravilhosas todos os dias. E finalmente, agradeço a minha orientadora, que teve toda a paciência comigo e conseguiu me direcionar quando estive perdido nos temas desse trabalho, por ter me propiciado a oportunidade de estudar esse tema que tanto me encanta e instiga. 6 7 Sertão é isto: o senhor empurra para trás, mas de repente ele volta a rodear o senhor dos lados. Sertão é quando menos se espera (ROSA, p. 402, 1994). 8 RESUMO As históricas desigualdades sociais que caracterizam a sociedade brasileira, especificamente, expressam-se, com clareza, na base territorial. A questão regional no Brasil despontou, na década de 1950, como um tema relacionado ao Nordeste, quando Celso Furtado levou a questão nordestina ao debate nacional. Desde então, avançou a partir dos diagnósticos de Furtado, que resultaram na criação de políticas públicas voltada para o desenvolvimento regional, mas se esmoreceu nos anos oitenta e noventa, voltando a ser discutida no início do Governo Lula, quando se propôs uma nova política de desenvolvimento regional com o objetivo de arrefecer as acentuadas desigualdades persistentes nas regiões brasileiras: a Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR). A proposta deste trabalho de monografia é fazer um resgate histórico da questão das desigualdades regionais no Brasil, a partir da macrorregião nordeste, tomando como ponto de partida as análises realizadas por Celso Furtado sobre as desigualdades regionais brasileiras, que resultaram em proposições de políticas públicas voltadas para o Nordeste, com a criação do GTDN e da SUDENE nos anos cinquenta, e depois avaliando a retomada nos anos 2000 de novas políticas de desenvolvimento regional centradas no Plano Nacional de Desenvolvimento Regional. Palavras – chave: Desigualdade regional, Nordeste, SUDENE, PNDR. 9 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 09 1. DESIGUALDADES REGIONAIS – O CASO DO NORDESTE. 12 1.1. INÍCIO DO SÉCULO XX – PASSAGEM DA CAFEICULTURA PARA A INDUSTRIALIZAÇÃO. 13 1.2. DOIS MODELOS DESENVOLVIMENTISTAS: DA AUSÊNCIA DAS QUESTÕES QUANTO ÀS DESIGUALDADES REGIONAIS EM VARGAS À PROEMINÊNCIA DE TAL PROBLEMÁTICA EM KUBITSCHEK. 15 1.3. DADOS COMPARATIVOS DAS MACRORREGIÕES, ANTECEDENTES DA SUDENE, A DESIGUALDADE DO NORDESTE. 18 1.4. EFEITO SUDENE, A RETOMADA DO CRESCIMENTO DA REGIÃO NORDESTE. 22 1.5. CRISE NAS POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL DO NORDESTE. 28 1.6. DOS DESCAMINHOS DOS ANOS 90. 32 1.7. NOVO PADRÃO DE CRESCIMENTO DOS ANOS 2000 35 2. SUDENE - SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE. 41 2.1. SUDENE – BASE DA CONCEPÇÃO E CRIAÇÃO – O GTDN. 41 2.2. CRIAÇÃO DA SUDENE E SUA ESTRUTURA JURÍDICA. 42 2.3. FASES DA SUDENE E SUA EVOLUÇÃO. 46 2.3.1. AUTONOMIA ABSOLUTA 1959/1964. 46 2.3.2. CENTRALIZAÇÃO PARCIAL: 1964/1979. 51 2.3.3. CENTRALIZAÇÃO TOTAL 1979/2001. 57 2.4. A EXTINÇÃO E RECRIAÇÃO DA SUDENE. 58 2.5. EFEITOS DA SUDENE NOVA FORMA DE TRATAR A DIMENSÃO REGIONAL. 60 3. POLÍTICA NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO REGIONAL – PNDR. 62 3.1. NOVA ABORDAGEM DE POLÍTICA REGIONAL PARA UM NOVO CONTEXTO DE DESENVOLVIMENTO NACIONAL E GLOBAL. 63 3.2. OBJETIVOS, INSTRUMENTOS E DISTRIBUIÇÃO DAS COMPETENCIAS DO PNDR. 64 3.3. DAS PREMISSAS E TIPOLOGIAS SUB-REGIONAIS 66 3.4. PNDR E O NORDESTE. 70 3.5. RESULTADOS OBTIDOS NA PRIMEIRA FASE DO PNDR. 72 3.6. PNDR II E O QUE SE ESPERA PARA O FUTURO. 75 CONSIDERAÇÕES FINAIS. 81 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS. 84 10 INTRODUÇÃO As desigualdades regionais são objeto de estudo no mundo todo e são pauta de políticas de desenvolvimento de diversos países, principalmente os que, como o Brasil, têm proporções continentais. As históricas desigualdades sociais que caracterizam a sociedade brasileira, especificamente, expressam-se, com clareza, na base territorial. A questão regional no Brasil despontou, na década de 1950, como um tema relacionado ao Nordeste, quando Celso Furtado levou a questão nordestina ao debate nacional, no famoso Relatório do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), em que mostrava que o problema do Nordeste não se limitava a problemática da seca. A proposta deste trabalho de monografia é fazer um resgate histórico da questão das desigualdades regionais no Brasil, a partir da macrorregião nordeste, tomando como ponto de partida as análises realizadas por Celso Furtado sobre as desigualdades regionais brasileira, que resultaram em proposições de políticas publicas voltada para o Nordeste com a criação do GTDN e da SUDENE nos anos cinquenta, e depois avaliando a retomada nos anos 2000 de novas políticas de desenvolvimento regional centradas no Plano Nacional de Desenvolvimento Regional. O objetivo central é buscar nessa analise histórica da região as razões para que, mesmo com tais políticas focadas na diminuição das desigualdades regionais, as disparidades significativas ainda persistem no país. Para Furtado, as desigualdades estão associadas ao subdesenvolvimento econômico do país e têm sua origem na formação brasileira, desde a colônia, tendo suas raízes na implantação da empresa agrícola de exportação e sua intensificação com o aumento da concentração da propriedade fundiária e o aprofundamento do processo de industrialização em meados do século XX. Este nosso modelo de desenvolvimento permitiu a reprodução da desigualdade já existente a todo o território nacional, mas é no Nordeste onde destacam-se os piores indicadores econômicos e sociais do país. Os diagnósticos de Furtado sobre a desigualdade regional brasileira resultaram em formulações de políticas de desenvolvimento regional a partir da década de cinquenta. Até então a questão regional era vista 11 apenas como um problema relacionado às secas do Nordeste. A partir das análises de Furtado e das pressões políticas desencadeada pela seca, pela concentração industrial em São Paulo e pelo intenso debate que se formava em torno da problemática do subdesenvolvimento nacional e regional, entre outros, tem origem a formulação de políticas específicas para o desenvolvimento do Nordeste. Tais políticas resultaram na criação do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), no lançamento da Operação Nordeste em 1959 e na criação da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) no final de 1959. Com a SUDENE tem-se uma nova visão sobre o desenvolvimento do Nordeste e o aprofundamento das análises e diagnósticos sobre os desníveis regionais, e o consequente enfrentamento da "indústria das secas". Novas propostas foram apresentadas visando estimular o desenvolvimento da região via recuperação das indústrias tradicionais existentes e implantação da indústria metalúrgica e mecânica simples. A partir dos anos 1970 a política de desenvolvimento regional foi se esvaziando, em grande parte em decorrência da pulverização dos recursos para financiamento e incentivos voltados para o Norte e Nordeste, o que levou ao enfraquecimento da própria Sudene e sua posterior extinção. A prioridade neste momento era completar a matriz industrial brasileira. Entretanto, apesar dos avanços econômicos e sociais atingidos pela economia brasileira ao longo da segunda metade do século XX, as políticas regionais não foram suficientes para promover mudanças na estrutura social e romper com as desigualdades sociais e regionais. Nos anos recentes, passada a crise das décadas de oitenta e noventa, as características desiguais do nosso desenvolvimento e as contradições que e a cercam, trouxeram a questão regional de volta ao debate, reforçando a necessidade de uma política nacional voltada para sua solução. Assim surge, no início do Governo Lula uma nova proposta política de desenvolvimento regional com o objetivo de arrefecer as acentuadas desigualdades persistentes nas regiões brasileiras: a Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR) - uma política especializada e com forte conotação territorial. A proposta foi apresentada em 2003 e institucionalizada em 2007 e era parte integrante de uma estratégia ampla que previa a criação das novas SUDAM e 12 SUDENE, a criação de um Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) e o redesenho dos programas regionais sob gestão do Ministério da Integração Nacional. Todavia, a PNDR ainda não conseguiu avançar de maneira significativa no processo de redução desigualdades intra e interregionais, seja por falta de consolidação da sua agenda de prioridades políticas, perdendo espaço para as ações do PAC, seja pela falta da aprovação do Fundo (FNDR) para financiamento das políticas públicas, que limita a sua eficiência. Nem com a SUDENE nem com o PNDR foram alcançados resultados significativos para a redução das desigualdades regionais, que persistem até os dias atuais, mesmo após 56 anos da criação das políticas com fins de sanar tais desigualdades. Pretende-se nesse trabalho levantar os fatores desses resultados, entendendo-os inseridos em seus devidos contextos econômicos, políticos e globais. Para atender ao objetivo proposto a monografia está dividida em três capítulos além desta introdução e das considerações finais. No capítulo 1 apresento um resgate histórico sobre a formação das desigualdades regionais no Brasil a partir de Celso Furtado, avançando neste retrospecto até o início deste século. No Capítulo 2 abordo a criação da SUDENE, sua evolução e suas propostas de desenvolvimento para o Nordeste, até sua extinção. O Capítulo 3 é dedicado a análise da nova política de desenvolvimento regional do governo Lula - a PNDR. 13 CAPÍTULO 1 DESIGUALDADES REGIONAIS – O CASO DO NORDESTE. A formação do território brasileiro e sua trajetória econômica, social e política deram origem e intensificaram as desigualdades territoriais no país. A grandeza desta problemática sempre foi alvo de análises, mas foi a partir da década de cinquenta que a questão passou a mobilizar mentes diversas para entender e interpretar tal realidade, propondo soluções para a amenização destas desigualdades. Seu precursor é Celso Furtado, que realiza um estudo minucioso de toda a história de construção do território brasileiro, observando as causas e origens para os problemas diversos que hoje enfrentamos. É somente a partir de Celso Furtado que a questão das desigualdades regionais e, em especial o caso do Nordeste, é tratado como prioridade no ciclo desenvolvimentista nacional. O Nordeste brasileiro é ponto chave para a análise e síntese de um dos problemas centrais do Brasil que são suas desigualdades econômicas e sociais, dado sua primeira participação central do ciclo virtuoso inicial da história da ocupação econômica do país pelos portugueses no século XVI, sendo Salvador a primeira capital colônia e depois passando por um longo período de estagnação e esquecimento, ficando para trás no processo de mudanças rápidas e profundas que o país teve entre o final do século XIX e a primeira metade do século XX. Furtado tem uma série de obras de referência sobre o tema: Formação Econômica do Brasil (FEB), Economia Colonial no Brasil nos Séculos XVI e XVII (tese de doutoramento de 1948); o artigo Características Gerais da Economia Brasileira (1950); e os livros A Economia Brasileira: contribuição à análise do seu desenvolvimento (1954) e Perspectiva da Economia Brasileira (1958). Obras que revelam as raízes da desigualdade regional no Brasil e propõem diagnósticos e políticas públicas para sua solução. A análise desses trabalhos revelam alguns pontos característicos importantes quanto ao perfil do conjunto de agentes que formam a região Nordeste (FURTADO, 2002, p. 141-169). Furtado destaca o desenvolvimento do país voltado para uma demanda externa e a predominância dos núcleos de decisão feitos fora do país; a persistência de monoculturas e o patriarcalismo; o atraso técnico e economia de subsistência no campo (agricultura de subsistência, expandida de forma 14 desarticulada e aprofundando a condição de pobreza no campo); a estrutura econômica colonial ainda prevalecente; a persistente piora nas relações de troca; a vulnerabilidade em relação à elevação da taxa cambial; a perspectiva de inflação crônica do meio circulante; a tendência à concentração da renda. E, além disso, a lentidão na formação do mercado interno - na segunda década do século XX inicia- se um processo de criação de uma demanda interna no Brasil, porém concentrada na região Sudeste ficando o Nordeste na mesma posição de dependente de uma demanda não local -, a não integração da economia e política do Nordeste com as demais regiões do país. Destacamos ainda as questões climáticas da região com estiagens prolongadas que agravavam as situações já precárias da população dependente de uma agricultura de subsistência no local. 1.1. Início do século XX – passagem da cafeicultura para a industrialização. O Brasil foi um país predominantemente rural, escravocrata e primário exportador durante os quatro séculos após seu descobrimento pelo capital mercantil, sendo apenas no século XX que surge um processo tipicamente capitalista, industrial e urbano (ARAÚJO, 1999, p. 2). Nesse período não podemos dizer que exista ainda uma profunda e evidente situação de desigualdade regional no país. Ainda que antigas bases primário-exportadoras estivessem montadas no amplo litoral brasileiro, era dispersa em diversas regiões uma base manufatureira local. As transformações das estruturas produtivas e das relações sociais de produção a partir da fase tipicamente capitalista no século XX foram estudadas, principalmente, nos trabalhos de Furtado (2007) e Cano (1981). Neles é apontado que, a partir da segunda metade do século XIX, estabelecem-se as condições para a concentração produtiva industrial regional. Isso se deu com a transição do modelo de produção escravocrata para assalariada na produção cafeeira e de localidade (Rio de Janeiro para São Paulo) (LIMA, 2007, p 17- 20). A expansão da produção cafeeira capitalista no Estado de São Paulo, viabilizada pelo desenvolvimento da infraestrutura de transportes e depois energética, além do desenvolvimento do setor financeiro e de outros serviços, foi o pilar fundamental para a implementação e o crescimento industrial no Brasil (Diniz, 2001, p. 7). Para Cano (1981) é nesse período (1880 a 1930) que há uma 15 intensificação significativa das desigualdades regionais do Brasil, dada a dinâmica diferenciada das várias regiões brasileiras. Com a crise de 1929-30 e a decadência do ciclo econômico do café, iniciou-se um novo processo de industrialização espontânea no Brasil, que se acentua após 1930, principalmente nas regiões do CENTRO-SUL do país, dando início a um processo de crescimento acelerado da indústria e do consumo de bens duráveis. Assim a região do café passa a ser a região da indústria, tendo São Paulo como o centro dinâmico. Neste momento, a expansão econômica no país passou a ter o Centro-Sul como o núcleo da reprodução capitalista, tornando-se a “região” do café o polo industrial brasileiro. Ou seja, no trânsito de uma situação em que o mercado exterior determinava a dinâmica das “ilhas regionais” exportadoras para uma outra, em que se internalizava a acumulação, teve início um processo de articulação das regiões econômicas do país. A partir de então, as diversidades regionais, realimentadas pela divisão nacional do trabalho, ganharam visibilidade, fazendo emergir a problemática regional, cujo adensamento acompanhou a concentração fabril em São Paulo. As diferenças regionais, especialmente as de produtividade, ganharam relevo com a integração ditada pelo centro dinâmico, abrindo-se, com isto, caminho à destruição das economias regionais, através de um processo que, na realidade, não era outra coisa senão a expansão capitalista em escala nacional. (VIEIRA, 2004, p. 55). As pequenas manufaturas descentralizadas que existiam até esse período, que tiveram sua origem na fase de menor integração nacional, sobretudo no Rio Grande do Sul, Bahia, Pernambuco e Minas Gerais, passam a enfrentar a competição com a nova base industrial de São Paulo e Rio de Janeiro (CASTRO 1971). Para Cano (1981) esse processo competitivo gerou três efeitos simultâneos: seu bloqueio e, por conseguinte, sua destruição (em razão de sua desvantagem comparativa) ou complementariedade (servindo de suporte às indústrias Rio-São Paulo). Sendo assim, as regiões que outrora apresentavam indústrias incipientes tiveram que se adaptar à competição dentro do mercado, se atrofiando ou passando a complementar a indústria da região central. A transição do ciclo econômico nacional baseado, sobretudo, no modelo primário-exportador para uma base produtiva industrial foi significativa na intensificação das desigualdades regionais, devido ao seu caráter concentrador de industrialização espontânea, em que as bases geradas com o acúmulo de capital da 16 produção cafeicultora foram os focos de atração da instalação dos polos industriais do país. 1.2. Dois modelos desenvolvimentistas: da ausência das questões quanto às desigualdades regionais em Vargas à proeminência de tal problemática em Kubitschek. Em 1930 é instalado no Brasil o Governo provisório (início da era Vargas) em que o caráter descentralizador e federalista da Primeira República, período anterior, passa a ser agora um modelo centralizador e intervencionista, onde foram priorizados os interesses dos industriais e das oligarquias (D’ARAUJO, p. 28, 2011). A “revolução de 1930” abriu novas condições institucionais para o fortalecimento do mercado nacional de mercadorias, caracterizado pela enorme concentração de capitais e força de trabalho no eixo industrial Rio–São Paulo. As transferências de recursos financeiros da burguesia do centro econômico para a da periferia por via de políticas governamentais (preceito constitucional de 1934) e pelas relações de trocas desiguais de produtos manufaturados da região-polo por produtos primários das áreas periféricas, não bastavam para compensar a polarização econômica nas regiões centrais do Brasil, que na verdade foram agravadas (FARIAS, p. 64, 2010). Com Vargas eleito indiretamente presidente constitucional da República em 17 de julho de 1934 é instaurado o Governo Constitucional. Há nesse período a preocupação em fazer o país retomar o crescimento e diversas medidas são tomadas, entre elas, a criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) em 1933. A produção açucareira em crise, por questões externas, como a concorrência do açúcar de beterraba na Europa e das produções mais avançadas e desenvolvidas de alguns países da América Central, passou a ser destinada ao mercado interno. Tal quebra de dinâmica teve impactos maiores no Nordeste, pois esse passa a enfrentar a concorrência dos Estados Centrais, devido a vantagens de localização desses com o principal mercado, gerando, assim, conflitos e quedas nas produções do Nordeste (FARIAS p. 94, 2010). O IAA buscava um “desenvolvimento equilibrado” para que não houvesse benefício de um estado em detrimento de 17 outros, em especial de São Paulo com relação aos estados do Nordeste e de Pernambuco em particular (RAMOS, 1999). No entanto as resoluções do instituto que o complementavam criaram todas as condições para a transferência da hegemonia da produção, onde o aumento da produção era distribuída pelo IAA pelos estados, proporcionalmente ao seu respectivo consumo. Logo o grande beneficiário foi o produtor do Centro-Sul, especialmente de São Paulo, que detinha o maior mercado consumidor interno comparado à região Nordeste, que, em situação inversa, perdia cada vez mais poder aquisitivo (FARIAS p. 94, 2010). Tal qual ao processo feito no período do Governo provisório em relação às bases industriais, temos na fase do Governo constitucional igual degradação das relações regionais e disparidades entre os polos dinâmicos do Centro-Sul e Nordeste quanto ao perfil produtivo da agricultura, sobretudo do açúcar e álcool. O Estado Novo (1937-1945) é o período do auge da crise do café e de um aumento significativo da dívida externa e foi dignificante para uma total centralização do poder, Vargas deu continuidade à reestruturação do estado brasileiro, orientando- se cada vez mais para a intervenção estatal e para o nacionalismo econômico, nesse período o governo passou a constituir diretamente grandes empresas estatais, dentre as quais a mais importante para o Nordeste foi a Companhia Hidrelétrica do São Francisco instaurada em 3 de outubro de 1945 (D’ARAUJO, p. 36, 2011). Nesse período pouco protagonismo era dado às questões das desigualdades regionais, apesar da política para evitar a fragmentação do país causada por essa desigualdade ser pauta da agenda de Vargas. O Nordeste até o final da década de 40 se articulava predominantemente com o mercado internacional, sofrendo pelas oscilações do mercado externo e concorrências, enquanto o mercado interno era inteiramente dominado pelo eixo Centro-Sul (FARIAS p. 550, 2010). No início de 1945, a “ditadura” entrou em sua fase final, sendo finalmente retomada a democracia no país, as eleições no dia 3 de Outubro de 1950 levam retorno de Vargas ao poder, dessa vez de forma democrática e é então instaurado o Segundo Governo (1951-1954), marcado pela orientação nacionalista, e pela preocupação com o desenvolvimento regional, com o projeto Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia (SPVEA). Em 1954 encerra-se a era 18 Vargas com o seu suicídio e assume a presidência um de seus aliados, Juscelino Kubitscheck (D’ARAUJO, p. 40, 2011). É nesse período que finalmente as desigualdades regionais e como combate-las começa a tomar protagonismo na agenda política. Kubitscheck tinha grande preocupação em desenvolver o Brasil como um todo, nesse sentido coloca em ação o seu Plano de Metas. A abordagem do problema dos desequilíbrios regionais surgia para advertir que eles não seriam resolvidos espontaneamente, ao contrário o desenvolvimento estava, na verdade, contribuindo para o aumento dessas disparidades regionais. Para o Nordeste, que passava por uma grande seca, foi dado uma atenção especial, a seca já não era suficiente para se entender os problemas da região, e as medidas de combate à elas estavam se enfraquecendo paulatinamente com diversas denuncias que revelaram os escândalos da “indústria das secas”. O contexto na região Nordeste era de surgimento de grupos descontentes que geravam tensões sociais, pondo em risco a estabilidade política do país com a enorme possibilidade do governo perder o controle sobre a realidade nordestina. Fato que levou as elites dirigentes do país a tentarem encontrar alternativas capazes de, pelo menos, suprir as reivindicações mínimas e abafar esses grupos de tensões. Alguns dos grupos mais presentes foram as Ligas Camponesas, liderado por Francisco Julião, que conscientizavam as massas populares quanto aos seus direitos e exigiam dos governantes tratamento igual para a região nordeste ao que era dado às demais regiões. Nesse contexto, as Ligas Camponesas pressionavam pelos direitos do trabalhador rural. De Pernambuco, ganha notoriedade nacional a luta dos moradores do Engenho Galileia, em Vitória de Santo Antão, que formaram uma associação de ajuda mútua que contava com a defesa jurídica de seus anseios, com o apoio do deputado e advogado Francisco Julião (PSB), na luta pela desapropriação das terras do Engenho. Para eles, esta seria a melhor via para tentar superar problemas como atraso nos pagamentos, medição errada da área trabalhada pelo agricultor (por aqueles que se aproveitavam da falta de letramento do trabalhador) e pagamento em crédito para compra na venda do próprio latifundiário. (CABRAL, p. 18, 2011). A Igreja Católica, organizada pelos bispos da região, foi outro grupo importante reivindicando prioridade do governo Federal para os problemas da região nordeste, e ainda teve influência na organização de pequenas lideranças locais que buscavam os mesmos ideais de desenvolvimento à região, Segundo Silva Filho 19 (2007) essas pressões tiveram grande impacto na posição favorável à região Nordeste adotado pelo então presidente Juscelino Kubitscheck. Acompanhando um movimento mundial de criações de instituições que visavam o desenvolvimento temos no Brasil a formação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE, hoje BNDES) em 1952 e a partir dele, no mesmo ano, a criação do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), instituições voltadas ao desenvolvimento com a influência Cepalina recém-criada. Finalmente em 1956 é instituído, pelo presidente Juscelino Kubitscheck, o Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN) e Celso Furtado é então convidado para elaborar um estudo analítico da região em conjunto com a instituição gerando o Plano de Política Econômica para o Nordeste que, mesmo com resistência da bancada conservadora do Nordeste é aprovado, por meio de congressistas de outras regiões, um projeto de lei que permitiu a futura criação da SUDENE. Este é um ponto fundamental para entendermos a evolução da economia nordestina. Em Fevereiro de 1959 o presidente lança a Operação Nordeste (OPENO), criando por decreto o Conselho de Desenvolvimento do Nordeste (CODENO), composto por um conselho com representantes do governo federal em conjunto com os governadores dos nove Estados da Região e uma secretaria executiva na qual Celso Furtado foi nomeado como secretário executivo. E finalmente, o presidente Juscelino Kubitscheck assinou a mensagem de nº 79-A encaminhando ao Congresso Nacional o Projeto de lei 32/59, criando a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), tendo a lei de nº 3.692 de criação da SUDENE sido sancionada pelo presidente da República em 15 de Fevereiro de 1959 (SILVA FILHO, p.7, 2007). 1.3. Dados comparativos das macrorregiões, antecedentes da SUDENE, a desigualdade do Nordeste. As tabelas a seguir auxiliam na elaboração de conceitos das disparidades socioeconômicas da Região Nordeste em comparação com o Brasil nesse período da era Vargas à criação da SUDENE, no governo JK (1930-60). 20 TABELA 1 Região Nordeste e Brasil: taxa de crescimento populacional (% a.a.) e grau de urbanização – 1940 – 1991 Período Região Nordeste Brasil anos Grau de urbanização Urbana Rural Total Urbana Rural Total Nordeste Brasil 1940-50 3,5 1,8 2,2 3,1 1,6 2,3 1940 23,4 31.2 1950-60 4,9 1,1 2,2 5,5 1,6 3,2 1950 26,4 36,2 Fonte: Moura e Teixeira (p. 97, 1997). Na tabela 1 temos a relação do crescimento populacional de áreas urbanas e rurais do Nordeste e do Brasil, onde notamos na primeira década referida (1940-50) um maior crescimento porcentual da população urbana do nordeste do que do Brasil, condição que é invertida bruscamente na década seguinte (1950-60), quando a população total do Nordeste mantém a taxa de crescimento percentual de 2,2% nas duas décadas. Já o Brasil como um todo teve um crescimento populacional substancialmente maior. O grau de urbanização do Brasil já era bem superior ao da região nordestina na década de 40 ficando ainda mais distante na década seguinte, onde teve um aumento de 5% em comparação ao aumento de apenas 3% da região nordeste. TABELA 2 Brasil e Regiões: taxas de fecundidade total (TFT) – (filhos/mulher) Anos Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Norte Brasil 1940 7,15 5,69 5,65 6,36 7,17 6,16 1950 7,50 5,45 5,70 6,86 7,97 6,21 1960 7,39 6,34 5,89 6,74 8,56 6,28 Fonte: Moura e Teixeira (p. 106, 1997). A tabela 2 nos mostra a relação da taxa de fecundidade entre as regiões brasileiras e o país como um todo, e ao contrário do que sugere a taxa de crescimento populacional total menor do nordeste, mostrado na tabela 1, nessa verificamos que a taxa de fecundidade do Nordeste está entre as maiores do Brasil. Sugere problemas da região nordeste em outros índices como mortalidade infantil e esperança de vida ao nascer. 21 Tabela 3 Mortalidade Infantil a cada 1000 nascidos vivos. Ano Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Norte 1940 187 140 118 133 166 1950 175 122 109 119 145,4 1960 164,1 110 96 115 122,9 Fonte: Censo demográfico IBGE 1940-1991 (1999). TABELA 4 Brasil e regiões: esperança de vida ao nascer (eº) – 1940 – 1960 Anos ou períodos Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Norte Brasil Nºs Absolutos (anos) 1940 36,7 43,5 49,2 47,9 40,7 41,5 1950 38,9 48,9 52,8 51,1 44,6 45,5 1960 41,0 57,2 60,3 56,7 53,4 51,6 Fonte: Moura e Teixeira (p. 110, 1997). Nas tabelas 3 e 4 fica evidente que a problemática da taxa de crescimento populacional da região nordeste está justamente nos índices de mortalidade infantil e de esperança de vida. A primeira tabela estampa o cenário da taxa de mortalidade infantil nordestina que mesmo apresentando queda entre as décadas de 30-60 apresenta a maior taxa dentre todas as regiões. Além de taxas altíssimas de mortalidade infantil representada pela tabela 3, temos a tabela 4 que apresenta a esperança de vida ao nascer nos mostrando que na região nordestina temos a menor expectativa de vida comparativa ao restante do país. A taxa de crescimento populacional do nordeste, que como visto na tabela 1, está bem abaixo da média nacional, mesmo com o alto grau de fecundidade, mostrado na tabela 2, acaba sendo prejudicada pelas altas taxas de mortalidade infantil e esperança de vida ao nascer (tabelas 3 e 4 respectivamente). Tal realidade é reflexo de graves problemas sociais e das condições de vida da população da região, má qualidade na saúde pública, problemas de fome extrema e a quase ausência de saneamento básico são os fatores para esses índices preocupantes no período 1930-60. 22 TABELA 5 Proporção PIB por Região/Estado Região/Estado Proporção PIB (%) 1939 1949 1959 Norte 2,6 1,7 2,0 Nordeste 16,7 13,9 14,4 Minas Gerais 10,0 10,4 7,9 Espírito Santo 1,2 1,3 0,8 Rio de Janeiro 20,9 19,5 18,5 São Paulo 31,2 36,4 37,9 Paraná 2,9 4,0 5,4 Santa Catarina 2,2 2,5 2,4 Rio Grande do Sul 10,2 8,6 8,4 Centro-Oeste 2,1 1,7 2,3 Distrito Federal 1,0 1,5 2,3 Fonte: CANO (p. 165, 1981) Nessa tabela 5 podemos verificar a participação percentual no PIB de alguns Estados e regiões, como alguns estados são desproporcionais foi necessário um detalhamento de suas respectivas participações. Nota-se a perda da parcela da região Nordeste na primeira década de 16,7% para 13,9% (1939-49) e mesmo com uma ligeira retomada da participação da região no montante do PIB nacional na década seguinte, de 13,9% para 14,4%, os níveis do período anterior à era Vargas (1939) está longe de ser alcançada. Paralelamente o Estado de São Paulo com maior relevância no PIB nacional tem ainda maiores aumentos nessa parcela nas décadas em destaque na tabela 5, saindo de 31,2%, em 1939, de participação no PIB nacional para 37,9% em 1959. Na tabela 6 temos a relação da participação no PIB industrial de Estados e regiões selecionados, nela verificamos que apenas São Paulo, que já apresentava uma proporção significante do PIB industrial nacional, Paraná e em menor grau Santa Catarina tiveram aumentos em suas proporções da participação do PIB industrial brasileiro, já as outras regiões e Estados tiveram todos perdas na participação do PIB industrial nacional, em especial a Região Nordeste e o Estado do Rio de Janeiro. 23 TABELA 6 Proporção do PIB industrial (%) por regiões e Estados selecionados Região/Estado 1939 1949 1959 Norte 2,3 0,9 1,2 Nordeste 12,1 9,7 7,5 Minas Gerais 8,0 6,9 6,1 Espirito Santo 0,4 0,5 0,3 Rio de Janeiro 26,9 20,0 17,4 São Paulo 36,4 47,9 54,4 Paraná 2,2 2,8 3,0 Santa Catarina 2,0 2,6 2,4 Rio Grande do Sul 8,7 8,0 6,9 Fonte: CANO (p. 91, 1981) A era Vargas é ponto chave para entendermos as disparidades econômicas entre as regiões brasileiras, temos nessas três décadas um efeito drástico quanto a concentração econômica no Estado de São Paulo e o chamado centro-sul do país, o modelo de industrialização espontânea teve papel intensificador das desigualdades regionais e a falta de uma política incisiva para combater tais desigualdades geraram consequências que durarão por anos. Já no período de Juscelino Kubitschek houve uma quebra de paradigma desse desenvolvimento concentrador e inicia-se um processo de desenvolvimento preocupado em protagonizar os problemas das desigualdades regionais na agenda das políticas públicas. 1.4. Efeito SUDENE, a retomada do crescimento da região nordeste. Até os anos 50 a economia nordestina acomodava-se lentamente às transformações na economia brasileira, apenas a partir da década seguinte, pós GTDN e SUDENE, com as transferências de capitais produtivos para a região mediante a ação do Estado, na realização de estudos e pesquisa sobre a dotação de recursos naturais da região e na ampliação da oferta de infraestrutura econômica, que tiveram papel importantíssimo tanto no setor industrial quanto no terciário (ARAUJO, 1997), iniciava-se uma fase de vigoroso dinamismo. Mesmo num período de ditadura militar 1964-1985, com o enfraquecimento da SUDENE e o caráter centralizador das políticas aplicadas no Brasil, é evidente os avanços da economia e social da região. 24 Na agricultura temos nesse período uma “modernização sem mudanças” na região, ou seja, houve um desenvolvimento do setor, com reflexo no PIB agrícola da região, mas a estrutura oligopólica e conservadora não se alteraram, em muitos casos aumentou. Os grandes investimentos em infraestrutura, as políticas de crédito e os programas de modernização adotados favoreceram os grandes proprietários de terras e fortaleceu os grupos conservadores da região. A proposta do GTDN de maior distribuição das terras não foi atingida e, na verdade houve uma concentração ainda maior das terras além de gerar um abismo competitivo entre os grandes produtores e os agricultores familiares (CARVALHO, p. 73, 2001). A Irrigação instituída, tão importante nos períodos de seca, atingiram uma parcela muito pequena da população e a criação de oportunidade de emprego na agricultura não foi eficaz, então os programas adotados no período não resolveram nem de longe os problemas fundiários do Nordeste. Isso gerou uma redução da produção de alimentos e aumento da emigração rural, desorganizada (CARVALHO, p. 74, 2001). TABELA 7 Proporção do PIB (%) Agropecuário por regiões e estados selecionados – Brasil Região/Estado 1959 1970 1980 1985 Norte 2,4 4,1 5,0 6,5 Nordeste 27,9 20,9 19,5 20,7 Minas Gerais 10,5 11,9 16,3 17,0 Espírito Santo 1,6 1,9 2,1 2,9 Rio de Janeiro 4,1 2,4 2,0 1,8 São Paulo 21,9 18,0 14,2 16,7 Paraná 11,6 12,1 11,7 11,9 Santa Catarina 4,1 5,4 5,2 4,3 Rio Grande do Sul 11,2 15,9 12,6 10,9 Centro-Oeste 4,7 7,4 11,4 7,4 Fonte: CANO (p. 432, 1981) Na tabela 7 vemos as relações entre a proporção do PIB Agropecuário dos Estados e regiões brasileiros, vemos uma primeira queda brusca da participação nordestina entre 1959-70, seguidos de certa estabilidade na participação do PIB agrícola total do país. O que sugere que realmente, todas as medidas realizadas no período para a área agropecuária na região, por mais que a tenha modernizado, 25 deixou a desejar também quanto ao crescimento da participação do PIB agropecuário total Brasileiro. A estratégia de desenvolvimento do Nordeste a partir da década de 1950 tem como referência conceito cepalino de desenvolvimento, baseado em industrialização, estimulando a implantação de projetos em atividades industriais antes inexistentes, promovendo também, a modernização das principais atividades industriais já existentes, como a Têxtil, por exemplo, (ARAÚJO; SOUZA; LIMA; 1997). Furtado adaptou a análise cepalina de relação centro-periferia, buscando demonstrar que a relação entre o Nordeste e o Centro-Sul do Brasil tinha um efeito bastante negativo para a região nordestina. Existia um processo de transferência de renda do Nordeste para o Centro-sul, provenientes dos superávits comerciais da região Nordestina com o exterior que eram usados para financiar as importações do Centro-Sul e, também, uma política cambial protecionista, em paralelo com a manutenção de uma economia primária no Nordeste, fazendo com que este importasse bens industrializados do Centro-Sul, de alto valor agregado, e exportasse matérias-primas e alimentos para este. Típica relação de centro-periferia da teoria cepalina. Furtado argumenta que a única saída para o Nordeste seria através da industrialização que fosse autônoma e de fortalecimento da burguesia regional. Em consequência disso temos um avanço rápido dessas indústrias ao Nordeste, uma expansão oligopolista da indústria nacional, ou seja, ao contrário do que se propunha o GTDN há uma presença marcante na região nordeste, nesse período, do capital extra regional, gerando efeitos contrários aos inicialmente pretendidos, mantêm-se a relação de dependência da região nordestina com a região do Centro- Sul, e essas novas indústrias seguem os interesses do capital extra regional, pouco se preocupando com as particularidades e potencialidades da região Nordestina. Na década de 70 há ênfase no investimento em insumos básicos no Brasil, dessa forma começam a caminhar para o Nordeste indústrias “pesadas”. Ao contrário do período anterior que se caracterizava por uma indústria eminentemente “leve” levando a uma especialização maior desse setor. A região nordestina, cada vez mais, passa a assumir um papel complementar no conjunto da indústria nacional, em bens intermediários, mas ainda sob o controle dos grupos privados do 26 Centro- Sul ou Estatais (ARAÚJO, 1997). Os bens intermediário que em 1949 respondiam por apenas 16,2% no Valor da transformação industrial VTI, passa a responder por 49,3% até 1985 (CARVALHO, p. 78, 2001). Além disso, se levar-se em consideração que a indústria do Nordeste, como um todo, apresentou um elevado nível de crescimento no período, percebe-se que as taxas de crescimento do setor intermediário foram então elevadíssimas. TABELA 8 Estrutura do Valor da Transformação Industrial, segundo os usos (%) 1949/1985 Subsetores 1949 1960 1970 1975 1980 1985 Bens de Consumo não duráveis 82,5 65,7 57,4 46,6 36,4 41,0 Bens Intermediários 16,2 31,1 34,9 41,9 50,2 49,3 Bens de Capital e de Consumo duráveis 1,3 3,2 7,7 11,5 13,4 9,7 Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Fonte: CARVALHO, (p. 74, 2001) Resta aos investidores nordestinos concentrarem seus capitais, sobretudo na indústria de bens de consumo não duráveis, mais simples e tradicionais. Na indústria de bens de consumo duráveis e de Capital os grupos regionais estão praticamente assentes (GUIMARÃES NETO e GALINDO, 1992). Ou seja, o processo de industrialização da região Nordeste, apesar de ter avançado, não deixou de depender no núcleo hegemônico do país, Centro-Sul, baseado na transferência de capitais desse para o Nordeste (OLIVEIRA JÚNIOR, 1999). Em síntese, esse foi um período de grandes avanços da região nordestina, mostrando claramente que a estagnação anteriormente registrada, até a década de 50, finalmente foi rompida como afirma Araújo: Não é exagero afirmar que esse período foi uma época sem precedentes na história econômica do Nordeste, em que a região apresentou a mais elevada taxa média de crescimento do PIB no País. À exceção da fase do "Milagre Econômico", em todos os demais períodos a região ou acompanhou ou apresentou dinamismo superior à média do País. ARAÚJO (1995, p. 127). Entretanto, muito do que se pretendia o GTDN, tomou diferente rumos, principalmente quanto a origem do capital financiador da industrialização da região, como visto, predominantemente proveniente da acumulação do Centro-Sul. 27 TABELA 9 Participação das Regiões no PIB 1970/1985 Regiões Período 1970 1975 1980 1985 Norte 2,2 2,1 3,3 4,1 Nordeste 11,7 11,1 12,0 13,7 Sudeste 65,5 64,8 62,3 59,1 Sul 16,7 17,9 17,0 17,1 Centro-Oeste 3,9 4,1 5,4 6,0 Fonte: CARVALHO, (p.78, 2001) Na tabela 9 verificamos que o Nordeste aumenta sua participação no PIB nacional no período 1970-85, acompanhado pelas regiões Norte e Centro-Oeste, a região Sul fica relativamente estável e a região Sudeste tem uma involução na participação do PIB nacional, o que mostra um período de caráter descentralizador da economia no país. O Nordeste, acompanhando a tendência verificada no Brasil, procurou ampliar suas articulações com o comércio exterior, no entanto, obteve um dinamismo inferior ao restante do país nesse quesito, podemos novamente verificar aí a articulação econômica nordestina, que apesar dessa tendência nacional de aumento do comércio externo, está voltado para dentro, de forma a complementar os mercados e demandas comandada pelo Centro-Sul (CARVALHO, p. 81, 2001). 27 TABELA 10 Valor das Exportações (Brasil) e participação relativa. 1970/1985 Regiões Exportações 1970 1975 1980 1985 US$ 1,00 % US$ 1,00 % US$ 1,00 % US$ 1,00 % Norte 86.717.648 3,12 198.060.024 2,60 595.515.669 3,44 538.845.071 2,35 Nordeste 406.596.237 14,61 1.476.568.294 19,40 2.296.821.924 13,27 2.525.629.405 11,00 Sudeste 1.587.104.430 57,04 3.802.227.698 49,95 10.168.633.967 58,73 14.284.033.260 62,21 Sul 691.849.412 24,86 2.095.066.402 27,52 4.199.664.272 24,26 5.495.534.076 23,94 Centro-Oeste 10.184.941 0,37 39.723.014 0,52 52.767.659 0,30 115.928.194 0,50 Brasil 2.782.452.668 100,00 7.611.645.432 100,00 17.313.403.491 100,00 22.959.970.006 100,00 Fonte: CARVALHO, (p. 81, 2001) 28 Na tabela 10 vemos que por mais que todas as regiões tenham crescido suas exportações, apenas as regiões Sudeste, Norte e, num grau quase nulo, o Centro-Oeste aumentaram suas participações relativas no total nacional, já o Nordeste teve uma expressiva queda desse total. De todo modo esse dinamismo que se instalou, a partir da SUDENE, na economia nordestina gerou transformações que, superando o quadro de atraso, assumiu vários aspectos: expansão do produto regional, com taxas de crescimento superiores às da economia nacional como um todo; Mudanças na estrutura produtiva, com novos processos de trabalho; Modificações da natureza da competição inter-regional, maior interdependência regional (ARAÚJO; SOUZA; LIMA; 1997). Reflexo de três décadas de intenso crescimento da economia do Brasil que se desacelerou no início dos anos 80, com a interrupção abrupta das fontes de financiamento externo e a incapacidade de gerar fontes alternativas de financiamento. 1.5. Crise nas políticas de desenvolvimento regional do nordeste. A partir de 1985 inicia-se um longo período de crise nacional com graves efeitos nas políticas de desenvolvimento regional e, sobretudo de desenvolvimento da região Nordeste. O Brasil enfrenta um choque para obtenção de recursos externos e paralelamente à isso sua dívida externa está bastante elevada, sendo assim ele faz grande esforço para manter sua balança comercial favorável, sendo bem sucedida inicialmente de 1984 a 1994 LOPES NETO (2001). Nesse período temos um aprofundamento da desconcentração fiscal, marcada principalmente com a Constituição de 1988, os estados aumentaram sua participação relativa no total das receitas fiscais ao longo dos anos 80, com receita própria passando de 22% para 27% em 88, e a união ao contrário perde espaço nas receitas fiscais nesse período. Como decorrência desse movimento ocorre a desestruturação dos planejamentos e regulações federativas, inclusive os relacionados ao combate as desigualdades regionais, dando espaço à disputas entre estados e municípios, através de guerra fiscal, que são agravantes dessa desigualdade (BERNAL, 2005). 29 Como agravante da crise, temos no Brasil a constante ameaça da hiperinflação, que aliada as condições de divida externa elevadas e busca por uma balança comercial favorável colocam em cena os ideais ortodoxos de estabilização econômica, o curto prazo domina as decisões do cenário nacional e os planejamentos, já enfraquecidos pela descentralização, são abandonados (CARVALHO, p. 91, 2001). No Nordeste a grande seca da década de 80 leva ao consenso, que as estiagens na região é um fenômeno permanente e o Nordeste teria que se preparar para conviver com elas. Tal consciência aumenta as críticas às medidas estatais paliativas e descontínuas de intervenção em relação às secas no semiárido nordestino (TAVARES, 1989). Finalmente, como reflexo da queda da demanda interna e da busca por um saldo positivo da balança comercial o Brasil, e o Nordeste seguiu essa tendência, passa ao padrão de exportação. Entre 1975 e 1990 o Brasil expandiu suas exportações em quatro vezes, passou de US$ 7,6 bilhões de vendas anuais para US$ 31,1 bilhões, o Nordeste também reproduziu esse padrão duplicando seu valor exportado, que passou de US$ 1,5 bilhão, em 1975, para US$ 3 bilhões em 1990 (ARAÚJO, 1997). Em 1990, Fernando Collor, que assumiu a presidência nesse ano, editou uma Medida Provisória que suspendia os incentivos fiscais regionais, a SUDENE então fez uma contraproposta para evitar a extinção dos Fundos de investimento que eram destinados à região. A comissão do então presidente concorda com tal proposta de não extinguir tais fundos, mas acabou exigindo que o controle desses fundos passe para o BNB (Banco do Nordeste) que fazia parte do Ministério da Fazenda. Os interesses deixam de ser técnicos e de resolução das desigualdades e passam a ser de poder. (CARVALHO, p. 124, 2001) Apesar de todos esses fatores o Nordeste apresentou durante esse período resultados menos desfavoráveis de crescimento econômico que o Brasil, grande parte desse fator está relacionado ao investimento do setor público na região, sendo que o Nordeste tem seu crescimento mais atrelado ao investimento público enquanto que o Centro-Sul do país é mais sensível ao investimento privado (CARVALHO, p. 128, 2001). 30 TABELA 11 Taxa média anual de crescimento do PIB do Nordeste e do Brasil e taxa média de investimentos públicos no Nordeste 1970/1996. Período PIB Nordeste PIB Brasil Investimento do setor público no Nordeste 1970-80 8,7 8,6 9,6 1980-90 3,3 1,6 3,1 1990-95 2,8 2,7 -2,2 Fonte: ARAUJO, et ali (1997) Na tabela 11 vemos que o Nordeste teve um decrescimento substancial nas taxas de crescimento, embora inferior ao do Brasil. Com relação ao emprego, vale salientar-se que, na década de 90, o mercado de trabalho sofreu fortes transformações, devido em grande parte a maior competição decorrente da abertura econômica que atingiu principalmente o setor industrial causando um aumento significativo da informalização do mercado de trabalho e o Nordeste seguiu essa tendência nacional diminuindo 216 mil postos de trabalho (GUIMARÃES NETO, 1997). Quanto ao desempenho social, o Nordeste não apresentou a mesma tendência de crescimento vigoro que apresentou seus dados econômicos, ainda persistem na região altos índices de mortalidade infantil, analfabetismo, pobreza, concentração de renda e uma baixa esperança de vida ao nascer, a maioria desses índices permaneceram bastante inferiores à média nacional, sendo menos dinâmico na melhoria desses indicadores sociais que o restante do país (CARVALHO, p. 130, 2001). TABELA 12 Número de Pobres, Segundo regiões -1970 e 1980. Regiões 1970 1980 mil % mil % Norte e Centro-Oeste 6.028 9,86 5.091 12,33 Nordeste 23.563 38,54 20.305 49,17 Sudeste, exceto São Paulo 13.424 21,96 7.315 17,71 São Paulo 8.742 14,3 4.302 10,42 Sul 9.382 15,35 4.284 10,37 Brasil (TOTAL) 61.138 100 41.297 100 Fonte: ROCHA (p. 5, 2013) A tabela 12 demonstra que a região Nordeste chegou a piorar sua porcentagem do número de pessoas consideradas pobres entre a década de 70 e 31 80, que foi um período de grande avanço econômico. Significa que o desenvolvimento econômico não necessariamente representa melhoras nas condições de vida da população. TABELA 13 Esperança de Vida ao Nascer (anos) 1970/1996 Região/Estado 1970 1980 1991 1995 1996 Brasil 52,67 61,76 66,13 67,28 67,58 Norte 54,06 60,3 65,67 67,03 67,38 Nordeste 44,38 57,67 62,71 64,1 64,46 Sudeste 56,89 64,26 67,71 68,59 68,82 Sul 60,26 64,6 68,9 69,94 70,2 Centro-Oeste 55,96 62,22 67,14 68,26 68,54 Fonte: CARVALHO, (p. 132, 2001) A tabela 13 ilustra bem essa falta de dinamismo dos índices sócias da região Nordeste, que apesar de ter apresentado um grande salto na esperança de vida, principalmente entre 1970 e 1980, chega ao ano de 1996 com o nível próximo ao da região Sudeste em 1980, ou seja, de 15 anos atrás. Com relação à taxa de alfabetização (tabela 14), percebe-se comportamento similar, há uma melhora da região nordeste, mas o nível permanece extremamente preocupante. TABELA 14 Taxa de Alfabetização (15 anos e mais) - % 1970/1996 Região/Estado 1970 1980 1991 1996 Brasil 66 74,6 79,9 86,5 Sudeste 76,0 83,1 87,7 91,6 Nordeste 45,3 54,6 62,4 76,3 Fonte: CARVALHO, (p. 133, 2001) Vemos que 23,7% da população Nordestina são analfabetos em 1996, estando bem abaixo da média nacional, sendo um índice gravíssimo. Duas questões que agravam o cenário social são as desigualdades interpessoais de renda que aumentam desde a década de 60 e a incidência da pobreza na região, que mesmo apresentando uma significativa redução nos anos 80, permanece muito elevada. O coeficiente de GINI, que mede as desigualdades interpessoais de renda, na região Nordeste agravou-se passando de 0,596 nos anos 32 60 para 0,6381. A mesma tendência é verificada quando se analisada pela participação dos 5% mais ricos e dos 40% mais pobres no rendimento domiciliar, onde no Nordeste os 5% mais ricos elevaram sua participação na renda de 39% para 42% entre o final dos anos 60 e o final dos anos 80, já os 40% mais pobre reduziram sua participação de 9% para 8% no mesmo período (CARVALHO, p. 132, 2001). O índice de pobreza na região Nordeste apresenta uma queda em 1970 era de 76,8% da população da região enquanto que em 1980 este percentual cai para 49,6%2, em 1988 esse índice volta a crescer atingindo 58,8% da população nordestina, ou seja, mais da metade da população da região é considerada pobre nessa época. TABELA 15 Valores do Índice de Gini do rendimento domiciliar per capita para as macrorregiões e Brasil, de 1981 a 1990 Ano Sul Sudeste Centro-Oeste Nordeste Norte Brasil 1981 0,537 0,551 0,574 0,571 0,510 0.582 1984 0,557 0,560 0,581 0,571 0,530 0,587 1988 0,573 0,572 0,620 0,623 0,573 0,616 1990 0,575 0,573 0,608 0,625 0,584 0,612 Fonte: BESSA; FERREIRA; SOUZA, (p.4, 2013). Quanto ao índice de Gini, representado na tabela 15, temos uma situação em que todo o país apresenta uma piora na distribuição de renda, porém o Nordeste passa a ser a região com o pior índice do Brasil. É evidente que a qualidade de vida do povo nordestino, mesmo apresentando melhoras no período da década de 70-90, não foi significativa para garantir um real desenvolvimento social e humano da região, sendo que o Nordeste permaneceu com os piores índices da grande maioria das questões sociais. 1.6. Dos descaminhos dos anos 90. Na década liberal (anos 90) as perspectivas de desenvolvimento para o Nordeste na prática não existiam. O preceito era que a intervenção estatal de 1O Coeficiente de GINI é uma medida de desigualdade desenvolvida pelo estatístico italiano Corrado Gini e publicada no documento “Variabilità e mutabilità” em 1912. Ele consiste em um número entre 0 e 1, onde 0 corresponde à completa igualdade de renda e 1 corresponde à completa desigualdade. Thomas, Wang, Fan (Janeiro 2001). "Measuringeducationinequality – Ginicoefficientsofeducation". The World Bank. 2 Estimativa realizada por Tolosa – 1991, na qual considera pobre a pessoa que possui rendimento familiar per capita abaixo do valor de ¼ do salário mínimo vigente em 1980, no país. 33 incentivos fiscais era um desserviço econômico industrial, que gerava privilégios para as empresas que recebiam esses incentivos e afastava a economia dos preços certos, determinados pelas vantagens comparativas dadas pelos recursos presentes em cada região ou país (LACERDA 2014). Restava à região nordeste nesse período, segundo as diretrizes do governo federal e repetido pelos governos estaduais e mesmo agências regionais de desenvolvimento que as bases do desenvolvimento econômico nordestino de viam ser restritas a dois únicos eixos: Turismo e Fruticultura irrigada, que mesmo sendo duas áreas importantes, são insuficientes para garantir o crescimento socioeconômico de uma região tão extensa e com mais de 50 mil habitantes. Coube aos estados, frente ao abandono de politicas nacionais, adotarem incentivos fiscais via redução de ICMS, processo conhecido como Guerra Fiscal, e que acabam por gerar vantagens maiores justamente aos Estados mais ricos (VERSANO, 1997). Os investimentos em infraestrutura produtiva e social no Nordeste foram praticamente nulos ao longo da década de 90, chegando a taxas negativas de 6,3% de formação bruta de capital fico do setor público entre 1990 e 1996 (LACERDA 2014). Apenas depois da crise cambial de 1998/99, após o Brasil ter sido socorrido pelo FMI, que o projeto liberal começou a perder forças aqui, entra em discussão, novamente, a necessidade de uma política nacional de desenvolvimento regional, dessa vez, que atenda as diversas localidades desiguais do país, e não apenas as macrorregiões. Do contrário, as áreas e sub-regiões menos desenvolvidas, consideradas não competitivas, correm o risco de tornar-se marginalizadas no processo de inserção do país no contexto internacional (LOPES NETO 2001). Assim essa nova política nacional de desenvolvimento regional no Brasil deve levar em consideração as heterogeneidades e diversificações das microrregiões, inclusive com áreas de grande dinamismo econômico convivendo com áreas estagnadas num mesmo espaço regional, é importante se identificar as potencialidades não só macro, mas também micro regionais e sub regionais, dessa forma tratando cada região de maneira distinta fazendo florescer suas potencialidades e corrigindo suas falhas (ARAÚJO 2007) 34 Abre espaço para a discussão e, posterior, criação de uma nova Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), que tomará como eixo essa nova tendência de desenvolvimento de inserção do local no global, mas de forma integrada com todo o país evitando sua fragmentação e respeitando e potencializando cada particularidade das várias sub-regiões. Nesse contexto temos um Nordeste com várias potencialidades sub- regionais e macrorregionais, podemos destacar as seguintes: Quanto ao mercado consumidor, a região apresenta a segunda maior população do país (45,4 milhões de habitantes), representando 28,4% da população nacional, sendo 29,0 milhões de habitantes na área urbana e 16,4 milhões na zona rural. População essa que chega a quase 70%de pessoas ativas no mercado de trabalho representando um enorme mercado consumidor latente; Quanto a Infraestruturas, grandes investimentos em produção de energia elétrica na região, que acompanha as taxas de crescimento anual do consumo (33,5 milhões de MWH em média), experiências em funcionamento de parques eólicos em áreas da região, representando uma produção de energia renovável e limpa, sistema de telecomunicações instalado em todos os Estados da Região, com significativa expansão das telefonias fixas e móveis; Quanto aos Transportes, vastas redes rodoviárias ligando Intra e Inter regionalmente os principais polos de desenvolvimento da Região e do restante do país, posição estratégica para o transporte aéreo, sobretudo o internacional, destaque para os aeroportos de Fortaleza, Natal, Recife, Maceió e Salvador. O transporte marítimo possui um sistema de portos com calado e equipamentos suficientes para o desenvolvimento da atividade de transporte marítimo, houve um crescimento no volume geral de cargas de 41,6% entre 1991 e 1999; Quanto aos recursos minerais, o Nordeste é possuidor de uma das maiores reservas mineral do Brasil, e também em combustíveis fósseis como petróleo e gás natural; Por fim quanto ao turismo a região é sem dúvida uma das áreas brasileiras de maior potencialidade, a rede hoteleira nordestina vem apresentando elevada expansão nos anos 903. 3 Dados retirados do Relatório de Desempenho Econômico da Região Nordeste do Brasil de 1960-97, disponibilizado pela Secretaria Especial de Políticas Regionais Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste. 35 1.7. Novo padrão de crescimento dos anos 2000. Na primeira década do Século XXI o crescimento econômico nordestino volta a ser expressivo e em sintonia com a economia nacional. Destaque para o ritmo positivo da renda da massa assalariada e dos segmentos mais pobres, decorrente do crescimento econômico regional, os efeitos se estendem ainda na maior formalização dos trabalhadores assalariados, ganhos reais do salário mínimo e aumento da transferência de renda, novos instrumentos financeiros decorrentes da “bancarização”, do crédito consignado e do microcrédito produtivo, que resultam num aumento do consumo e diminuição das desigualdades sociais da região (CARVALHO, 2008). Foi em 2004 que houve a retomada de crescimento nordestino, por meio, principalmente dos programas de inclusão social, políticas de elevação real dos salários mínimos e a retomada dos investimentos em infraestrutura social, com destaque para o saneamento e mobilidade urbana, além de investimentos na infraestrutura produtiva. Estima-se que todas as sub-regiões do Nordeste apresentaram, entre 2000 e 2011, taxas de crescimento do PIB superiores à média do Brasil (LACERDA, 2014), abrangeu, portantotambém, áreas historicamente estagnadas e/ou problemáticas, como os cerrados nordestinos, o semiárido (que é a sub-região mais pobre de recursos naturais) e a sub-região da Zona da Mata (onde se localiza a maior parte das capitais e os polos industriais, de comércio e serviços). Uma característica, desse período, marcante é que, segundo Tânia Bacelar (2007) “É a primeira vez, desde o ciclo do açúcar, que a região passa por um processo de crescimento ancorado no setor privado”4. Essa combinação de crescimento econômico atrelado com distribuição de renda é uma fase particular na história regional nordestina desde a criação da SUDENE. Com a retomada do crescimento do país, o Nordeste voltou a receber investimentos expressivos, destaque nas obras de infraestrutura como a Ferrovia Transnordestina; A transposição do Rio São Francisco; A montagem de parques eólicos na região; duplicações da BR-101; Investimento nos protos de Suape, Aratu e Pecém; O aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN); Projetos ligados ao fornecimento de energia elétrica e de recursos hídricos; Entre outros. O Banco 4 Revista exame, N. 891 (30/04/2007). 36 Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passou de um investimento de R$ 2,73 bilhões, em 2000, para R$ 5,3 bilhões, em 2007, chegando ao montante de R$ 60,7 bilhões no acumulado entre 2010 e 2014, mesmo em meio à crise recente de 2008, (LACERDA, 2014). Na área de infraestrutura produtiva tais operações alcançaram cerca de R$ 25 bilhões, com destaque no setor de energia (hidroelétrica, termoelétrica e eólica) e também no setor de transportes terrestres (rodoviário e ferroviário) No setor industrial identifica-se grande participação também dos investimentos privados nos setores automobilístico, de química, papel e celulose, petróleo e gás natural e na indústria farmacêutica. Tais investimentos são concentrados fundamentalmente nos estados da Bahia, Ceará e Pernambuco (CARVALHO, 2008). Dessa forma, a distorção já existente, das concentrações econômicas intrarregionais, são ampliadas. Os grandes polos atrativos de investimentos da região Nordeste concentram-se no litoral, onde consiste sua base produtiva, a maioria da sua população, cerca de 20 milhões de habitantes e 90% do PIB da região (ARAUJO, 2008). Apesar disso, todos os Estados do Nordeste registraram um crescimento de PIB per capita maior que a média nacional, entre 2002 e 2010 a média de crescimento do PIB per capita nacional foi de 2,22% enquanto que o Nordeste registrou avanços de 3,12% nesse quesito. Muito por conta do forte crescimento do PIB que chegou em 2013 a representar 13,5% de participação no produto interno bruto brasileiro. Esses indicadores, no entanto, não são refletidos, ainda, em melhorias na qualidade de vida da população da região, por conta dessa desigualdade intrarregional, onde poucos municípios acabam por sentir efeitos positivos em seus índices sociais (VILLELA, 2013). O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) do Nordeste ainda é o menor do Brasil, entre 2000 e 2010, mesmo com crescimento de 2,5%, que é superior a média nacional e às demais macrorregiões. Esse crescimento é puxado pelo crescimento do PIB per capita da região, mascarando outros indicadores (que incluem no calculo do IDHM) que permanecem preocupantes da região nordestina, como a taxa de analfabetismo, baixa frequência escolar e baixo valor investido por aluno (VILLELA, 2013). 37 Chama a atenção os dados de migrações da região Nordeste, conhecida pese seus autos índices de envio de migrantes para outras regiões, que teve na década de 90 um êxodo em massa de saída de trabalhadores, nos anos 2000 teve esse índice diminuído quase que pela metade, principalmente no envio dessa população, economicamente ativa, para o Sudeste. Entre os anos 1992 e 2002, o Nordeste perdeu o equivalente à 1,5% da sua população para o Sudeste (média anual), já entre 2002 e 2007, essa parcela diminui para 0,98% (média anual), passando para 0,85% em 2008 e 2009 (CHIARA, 2010). O Fluxo populacional da região Nordeste para o Sudeste continua, mas num ritmo bem inferior e com uma população de características distintas das dos anos anteriores, que eram de famílias inteiras que partiam do Nordeste com intensão de se fixarem nas regiões Sul e Sudeste, modificando-se para um perfil de jovens que viajam sozinhos em busca de qualificação profissional (VILLELA, 2013). Em contra partida, temos ainda um fluxo acentuado de Nordestinos, e filhos de Nordestinos, que estão fazendo o caminho inverso, ou seja de retorno à região Nordeste (CHIARA, 2010). O Emprego está diretamente ligado às questões migratórias e, essa atual etapa de crescimento econômico da região, está garantindo uma expressiva ampliação do trabalho formal em cerca de 40% entre 2000 e 2006, fator que segura a população economicamente ativa evitando seu êxodo à outras regiões do país. São 1,8 milhões o número de novos contratos formais de trabalho, vagas essas abertas quase que exclusivamente no mundo urbano (CARVALHO, 2008). TABELA 16 Nordeste: Empregos formais (2000/2006) Setor 2000 2002 2004 2006 Extrativo Mineral 20.070 23.919 23.391 33.672 Industria de Transformação 585.147 646.507 734.227 838.265 Serviços Industriais Públicos 58.725 63.366 65.702 65.561 Construção Civil 208.622 208.486 20.900 267.109 Comércio 628.678 712.138 827.756 974.741 Serviços 1.177.402 1.331.839 1.441.667 1.630.441 Administração Pública 1.526.055 1.677.588 1.864.022 2.133.748 Agropecuária 169.994 195.554 228.965 234.372 TOTAL 4.374.850 4.859.397 5.394.730 6.185.903 Fonte: CARVALHO (p. 135, 2008) 38 A tabela 16 mostra o pujante crescimento dos empregos formais da região nordeste entre 2000 e 2006, todos os setores apresentaram crescimento nesse período, mas o destaque maior está no setor de Administração pública, de serviços (que acompanha a tendência mundial de grande empregadora) e da Indústria de Transformação. As exportações continuam no ritmo apresentado anteriormente, ou seja, num processo de expansão, entre os anos 2000 e 2007, é triplicado as vendas externas nordestinas, chegando inclusive, em alguns anos desse período, a apresentar taxas maiores que a média nacional. A balança comercial sente os reflexos desse crescimento das exportações e após um período de déficit na década de 90 tem, a partir de 2003, saldos positivos, ano após ano. A pauta exportadora também tem caráter bastante benéfico, mesmo com as vantagens acrescidas pelo aumento dos preços das commodities, segue apresentando resultados intensos aos produtos industrializados (de maior valor agregado), podemos tomar como exemplo a indústria de sapatos, onde a região Nordeste que representava 16,5% das exportações nacionais desse setor, passa em 2006 a representar 42,6% (CARVALHO, 2008). Na tabela 17, vemos que no total as exportações nordestinas tiveram um expressivo crescimento no período pós 1999, onde os produtos Manufaturados tiveram maior peso em todos os anos, o que representa uma pauta exportadora de boa qualidade e valor agregado. TABELA 17 Nordeste: Exportações 1999/2007 Ano Básicos Industrializad os (A+B) Semimanufatu rados (A) Manufaturados (B) Operações Especiais Total 1999 545.428 2.765.602 1.322.620 1.442.983 44.475 3.355.505 2000 738,187 3.215.350 1.461.589 1.753.761 72.621 4.026.157 2001 804.741 3.307.854 1.354.615 1.953.238 75.187 4.187.781 2002 948.178 3.648.705 1.395.065 2.253.641 58.684 4.655.567 2003 1.436.565 4.618.029 1.563.227 3.054.802 57.517 6.112.111 2004 2.038.457 5.925.179 1.959.737 3.965.442 79.649 8.043.285 2005 2.560.890 7.871.911 2.481.239 5.390.672 128.339 10.561.141 2006 2.067.610 9.429.741 3.492.671 5.937.071 131.775 11.629.126 2007 2.605.318 10.303.887 4.029.620 6.274.267 177.038 13.086.243 Fonte: CARVALHO (p. 82, 2008) 39 Fonte: CARVALHO (p. 141, 2008) Analisando o gráfico 1 observamos que o saldo da balança comercial da região nordeste que ficou em níveis negativos até 2002 tem, a partir de 2003, um longo período de saldos positivos e bem acentuados. Os fundos de investimento, agora sistematizados a égide do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), apontam para a continuidade, nos próximos anos, de aplicações na região nordeste, porém de forma desigual entre os estados dela, com destaque para o estado de Pernambuco, sendo esse o destino dos maiores negócios regional (LIMA, SICSÚ, PADILHA, 2007). O setor privado impulsiona também essa alavancada de investimentos, que obedecem à dinâmica de atração em regiões já bastante desenvolvidas. No que diz respeito à urbanização nas ultimas três décadas é bastante acelerada no Nordeste, mesmo ainda possuindo uma população rural de 14,6 milhões de habitantes, que representa quase metade dos 31 milhões do total da população rural brasileira (IBGE, 2007). Vale lembrar que esse êxodo rural se deve muito ao caráter desigual de crescimento intrarregional (ARAUJO, 2008). O mercado de consumo nordestino, tal qual ao brasileiro, vem atravessando um novo momento, marcado por um cenário nacional favorável, recuperação da renda dos assalariados, elevação do número de trabalhadores com carteira assinada, além do processo de “cancerização” que vem facilitando o acesso ao crédito, empréstimos consignados e microcréditos, a região nordeste é líder no aumento da circulação de cartão de crédito no país entre 2003 e 2007, de acordo com uma pesquisa intitulada “Indicadores do Mercado de Meios Eletrônicos de -2 -1 0 1 2 3 4 5 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 GRÁFICO 1 Saldo da balança Comercial Nordeste 1998/2007 40 Pagamento” realizada pelo Banco Itaú, crescimento esse de 140,9% no período (BANCO ITAÚ, 2008). Os resultados no consumo regional que vem se sustentando desde 2004 são os melhores da história da região nordestina, centrado em itens básicos, os bens não duráveis, e produtos e serviços de telefonia móveis e transportes. O nordeste é em 2008 o mercado de maior expansão desses produtos (CARVALHO, 2008). Muitos foram os avanços, desde 2002 até os anos atuais, na região Nordeste, principalmente sob a perspectiva econômica e financeira, porém outras demandas e questões são agora postas, principalmente quanto ao desenvolvimento social e de qualidade de vida da população. Essa nova fase coloca em cheque a evidente problemática da desigualdade intrarregional, que em certa medida foi agravada com os planos de desenvolvimento regional, como a SUDENE, sendo necessárias que as novas vertentes das políticas públicas que forem implementadas estejam preparadas para sanar essas novas demandas, estas que sempre existiram, mas agora estão finalmente sendo reivindicadas pela população do Nordeste. Diante disso temos a inserção do PNDR em 2007, que tem como objetivo principal desenvolver as várias sub-regiões do país que estão, em certa medida, atrás no desenvolvimento econômico e social do país. A problemática regional não é mais vista apenas por uma visão de cima para baixo, ou seja, através de uma visão macrorregional, mas também por uma visão de baixo para cima, protagonizando as várias sub-regiões e suas potencialidades. A região Nordeste não é mais vista apenas como região problema, estagnada e atrelada a seca, mas sim como uma macrorregião formada por diversas sub-regiões cada qual com suas particularidades. No entanto não basta apenas que seja feitos novos projetos e novas ideias teóricas de desenvolvimento e diminuição das desigualdades regionais, é necessário que essas tomem protagonismo da agenda política e assim termos um desenvolvimento efetivo e de caráter capaz de diminuir as desigualdades regionais. Os capítulos seguintes serão dedicados em expor os principais programas para a diminuição das desigualdades regionais, com foco principal no Nordeste, ressaltando o contexto em que foram inseridos, bem como seus resultados e falhas. 41 CAPÍTULO 2 SUDENE - SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE. A SUDENE é uma autarquia especial, administrativa e financeiramente autônoma, integrante do Sistema de Planejamento e de Orçamento Federal, criada pela Lei Complementar nº 125, de 03/01/2007, com sede na cidade de Recife, Estado de Pernambuco, e vinculada ao Ministério da Integração Nacional. Foi criada em 15/12/1959 como uma ação do projeto desenvolvimentista do governo do então presidente Juscelino Kubitscheck que visava à coordenação das ações do Governo Federal com os seguintes objetivos: implementar a industrialização na Região e resolver os problemas agrícolas do Nordeste, agravados pela ocorrência de secas, ou seja, promover o desenvolvimento econômico da região Nordeste nas décadas de 60 e 70 e foi possível após a criação da a instituição do Grupo de Trabalho para o Desenvolvimento do Nordeste (GTDN), em 1956. 2.1. Criação da SUDENE e sua estrutura jurídica. A SUDENE foi criada como uma autarquia subordinada diretamente à Presidência da República apresentava, quanto aos aspectos institucionais e administrativos, uma proposição “sui generis”, considerando que a Instituição, a ser criada com a situação jurídica de autarquia, era integrada por um Conselho Deliberativo e uma Secretaria Executiva, cabendo a Celso Furtado o comando de 1959 a 1964. O projeto de lei que criou a SUDENE enfrentou uma série de obstáculos5. Houve enorme resistência, sobretudo pelos parlamentares nordestinos, que buscavam atender interesses políticos e econômicos de uma pequena elite representada, diferentes jogadas políticas foram executadas, desde o veto de algumas propostas do texto original do projeto, postergar a votação para pós- recesso parlamentar do ano em questão, resistência da oposição quanto à 5Diário de Pernambuco, 3 de novembro de 1959, p. 1. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp125.htm 42 nomeação de Celso Furtado como superintendente. Apesar disso a Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste foi criada em 15 de dezembro de 1959,26 pela Lei no. 3.692, como meio de intervenção do Estado no Nordeste, com o objetivo de promover e coordenar o desenvolvimento da região. A delimitação de fronteiras de atuação do projeto, que ao contrário da delimitação do Nordeste usual até 1940 que compreendia os Estados da Bahia ao Ceará, inclui também, por um motivo estratégico, Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Alagoas, Sergipe, Bahia e parte de Minas Gerais (TAVARES, 2012). A Nomeação de Celso Furtado como superintendente só é certa após matéria do Diário de Pernambuco em 24 de Dezembro de 1959, em matéria intitulada “Inalterada, até agora, a opinião de Juscelino: SUDENE fora da política” (CABRAL, 2011). Sua intitulação era importante, pois era defendido que ele seria o técnico necessário para manter a SUDENE fora da política partidária. É evidenciada ainda a importância da estrutura da SUDENE onde havia uma integração permanente do poder público com os aspectos técnicos de desenvolvimento. Em síntese, o Superintendente da SUDENE, na sua dupla vinculação – Presidente da República e Conselho Deliberativo da SUDENE – teria de realizar um permanente trabalho de negociação para encontrar a melhor resultante entre os aspectos técnicos da programação e o poder político emanado dos governadores (SILVA FILHO, 2007). 2.2. GTDN e SUDENE - base da concepção e criação A elaboração da SUDENE foi embasada no estudo realizado por Celso Furtado com o GTDN que gerou o documento “Uma Política de Desenvolvimento Econômico para o Nordeste” em 1959. Neste é apontado dados e um estudo elaborado quanto ao perfil e problemática que existia na Região Nordeste e suas disparidades com as demais regiões. As intenções do GTDN estavam centradas na recuperação da economia regional nordestina e reduzir as disparidades que a separavam do eixo Centro-Sul do país. Em seu relatório, que colocava a industrialização como questão central para a região sair da estagnação - numa vertente de pensamento bastante influenciada pela CEPAL – tem grande parte de suas propostas voltadas também ao setor agrícola (CARVALHO 2001), questões como a excessiva concentração de renda na 43 economia açucareira e os grandes oligopólios são levantadas. Havia a necessidade de substituição dessas monoculturas para a produção de multiculturas, centrada na agricultura familiar de alimentos, com uso de irrigação, que seria investido na região. O relatório do GTDN aponta que as transformações fundamentais só podiam ser aplicadas mediante inicialmente das transferências de recursos feitas pelo Governo Federal para o nordeste, através dos ministérios e dos programas especiais, bem como do setor externo, formando ambas as forças dinâmicas da região do Nordeste Brasileiro. Posteriormente, com as bases instaladas, outros investimentos seriam executados, mesmo que fosse ainda necessário incentivos públicos, gerando dinamismo nos setores industriais, financeiros, privados e de serviços na região (DUARTE, 2015). De acordo com SUDENE (1980), duas metas principais foram traçadas. A primeira meta era aumentar a resistência do Nordeste contra as secas, e a segunda meta consistia no aumento da produtividade média da força de trabalho e formação dos investimentos industriais. É levantado no Estudo, realizado por Celso Furtado e o GTDN, um plano de ação. No capítulo quatro do documento esse plano é exposto e sintetizado em oito políticas estratégicas, sugeridas para a solução das diversas problemáticas e para que se alcance um objetivo principal, o desenvolvimento da região Nordeste. (UMA POLITICA, p.79, 1987). A primeira delas é quanto a Seca intitulada: “Reformulação da Política de Aproveitamento de Solos e Águas na Região Semiárida”, essa dividida em sub tópicos: - É sugerida uma reformulação das diretrizes das políticas federais ao problema das secas, indicando prioridades básicas no que se diz respeito à construção de açudes, irrigação e outras formas de aproveitamento das águas já represadas, tendo em vista a organização econômica da região, tornando-a mais resistente as secas. - É ainda necessária a articulação das várias frentes de trabalho, tanto com os órgãos, secretárias e dirigentes legais responsáveis quanto e principalmente os grupos da frente de trabalho de técnicos atuante sobre essa questão, com já reconhecida experiência com problemas de uso de terras e águas em regiões semiáridas, inclusive os das Nações Unidas que já se encontram na região. Convém 44 deixar ainda, certa autoridade a esses grupos técnicos atuantes, quanto à elaboração das reais necessidades e o quanto as políticas atuais do governo são de fato relevantes para a solução do problema das secas, sendo esses mais capazes de indicar e elaborar um estudo analítico mais precisa por atuarem de fato na problemática da seca na região. - As diretrizes traçadas pelos grupos atuantes, citado no subitem a cima, devem ser traduzidas em planos de trabalho dos diversos órgãos governamentais que atuam na regiam, coordenando assim as ações dos órgãos atuantes e administrativos à mesma direção quanto a solução do problema de maneira articulada e mais aprofundada quanto as raízes e emergências a serem sanadas. A segunda política sugerida é a “Reorganização Econômica da Região Semiárida e Abertura de Frentes de Colonização”, nesse item a frente das ações é pelo lado econômico, onde é necessária uma coordenação dos órgãos públicos para a realização de uma reorganização da economia agropecuária tornando-a mais resistente as secas e aumentando sua rentabilidade independente dos planos de ações sugeridos no primeiro item. Levantar estudos para a formulação de medidas e financiamentos que tornem as atividades econômicas já estabelecidas mais rentáveis e principalmente resistentes as secas. Articular essa reorganização as frentes de colonização para absorver os excedentes populacionais bem como modificar uma estrutura de produção de subsistência para uma de alta produção de alimentos para abastecer essa região. Com a organização de correntes migratórias coordenadas para regiões de frente coloniais, indicando possíveis novos lugares para esses fluxos e os tipos de economia produtora mais eficiente para esses locais otimizando suas produções, é preciso ainda fornecer um mercado consumidor para absorver essa produção e garantir assim uma renda estável. O seguinte item se refere a “Intensificação dos Investimentos Industriais” que leva em consideração a elevada densidade populacional da faixa litorânea do Nordeste e indicando que é necessário o aumento da densidade de capital por pessoa ocupada, para tanto a Indústria seria protagonista dos investimento dado sua facilidade em absorver a massa de mão de obra local injetando capital e renda. O primeiro passo para isso seria identificar o setor industrial que teria maior viabilidade econômica no local analisando as concorrências com os setores industriais já instalados em outras regiões do país e se aproveitando da enorme demanda local 45 latente da região Nordeste, é sugerido o setor siderúrgico para a região e aquelas que se apoiariam do fornecimento de matérias primas locais como as do cimento e de adubos fosfatados e ainda a Indústria Tradicional em razão da demanda local e do baixo custo de mão de obra da região. O quarto ponto levantado é a “Solução para o Problema da Oferta de Energia Elétrica”, com a recém-instalada CHESF, parque gerador de energia, a região encontra um fator positivo de desenvolvimento, é ainda preciso que em dois Estados específicos (Ceará e Rio Grande do Norte), ainda dependentes de uma energia de fonte geradora térmica, e portanto vulneráveis a enorme flutuação dos preços desse tipo de energia, seja elaborado planos estratégicos de fornecimento de energia instalando neles novas fontes geradoras de energia. A quinta política é o “Aproveitamento de Conquistas Tecnológicas Recentes” que basicamente é utilizar as tecnologias utilizadas e bem sucedidas em regiões semelhantes e apropriá-las à região Nordeste. O “Aumento da Oferta de Alimentos nos Centros Industriais” é a sexta política sugerida, sendo a escassez de alimentos nos grandes centros é um entrave para a industrialização destes, portanto é necessário que se dê prioridade no abastecimento de centros industriais já instalados, como de Recife, aumentando os centros de produção de alimentos dentro do próprio Nordeste para atender essa demanda. O sétimo ponto ressaltado é uma “Assistência Técnica dos Governos Estaduais” coordenando-os à cooperar ao plano de desenvolvimento econômico da região. Habilitando-os a formular seus próprios planos de ação de desenvolvimento e que esse seja articulado ao conjunto de ações presentes no plano de ações de toda a Região Nordeste. Por fim, o oitavo plano é a “Articulação Geral da Execução do Plano”, ou seja, é partir de um claro diagnostico do problema nordestino e tentar modificar o curso dos acontecimentos via um ataque simultâneo de um conjunto de ações em diferentes frentes consideradas vitais. O Grupo do Nordeste, à quem caberá a supervisão de todos os trabalhos e o controle de execução do plano deverá ter sua sede permanente numa capital nordestina e manter um grupo também no Rio para articular os interesses junto ao Conselho Nacional do Desenvolvimento. 46 Como visto no capítulo anterior, os efeitos foram diferentes em cada setor, sendo pouco positivos na questão agrária da região, ao contrário do que se desejava com o GTDN, observou-se um aprofundamento da oligarquia, fruto das várias pressões dos usineiros e conservadores, que se apropriaram dos investimentos em infraestrutura nas áreas rurais do Nordeste consolidando ainda mais a concentração das terras na região. Já no setor industrial houve maiores sucessos, muito embora, com trajetória diferente da originalmente proposta pelo GTDN foi considerável o processo de substituição das bases produtivas industriais da região (CARVALHO, 2001), mas esses não foram conduzidos por investidores locais, como era intencional na formulação do estudo, mas foi dirigido através de filiais dos grandes grupos do Sul e do Sudeste do país, de capitais com interesses não ligados à região nordestina. 2.3. Fases da Sudene e sua evolução. Podemos Dividir o projeto e diretrizes da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste em três fases principais, como sugere Silva Filho (2007). a) Autonomia absoluta: 1959/1964; b) Centralização parcial: 1964/1979; c) Centralização total: 1979/2001. Mas vamos incluir uma quarta fase pós 2001 que seria a Extinção e a recriação da SUDENE do governo LULA. 2.3.1. Autonomia absoluta 1959/1964. Também chamada por alguns autores como “SUDENE Originária” (TAVARES 2012), na época era conferido o status de Ministério, consequentemente com rápido acesso ao Presidente e aos Ministros dos Estados. A decisão do Poder Executivo em conferir prioridade ao Nordeste possibilitou facilidades para as negociações de recursos, programas e projetos, tanto a nível nacional quanto os provenientes de uma iniciativa internacional. 47 SUDENE teria um belo começo de seus trabalhos, contando com regras que priorizavam a classe empresarial local, destacando-se o modelo em que a empresa investidora abdicava do seu imposto de renda para repassar o dinheiro ao Nordeste. No entanto, faria aquilo por meio de uma companhia regional, que receberia o montante para cumprir um plano de implantação de uma nova indústria. Isto fazia parte do plano de “evoluir” os empresários nordestinos que tivessem projetos a apresentar. Além disso, a SUDENE também tinha seus recursos complementados pela volumosa percentagem de 3% do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e também do Imposto de Renda (IR), compondo assim um bom orçamento próprio. (CABRAL, 2011). O Artigo 10 da lei nº 3692, garante, ainda, recursos à SUDENE não inferiores a 2% da renda tributária da União. Esse conjunto de ações representava uma grande inovação, onde a aprovação dos orçamentos pelo congresso ao projeto representava uma fonte segura e contínua de investimentos ao programa. Outra medida que entra em destaque é a decisão da sede da autarquia no Nordeste (Recife) e não na capital da república. O ponto de partida de funcionamento da SUDENE caracterizava-se de uma instituição flexível capaz de produzir condições de pesquisar, estudar, programar e executar, quando necessário, programas de desenvolvimento, antes inexistentes para a região, em parceria com a Comissão Econômica para América Latina (CEPAL) gestões foram realizadas no intuito da estruturação de cursos de desenvolvimento para profissionais de todas as categorias. Paralelamente, a SUDENE passou a financiar as universidades em função de programas específicos a ser realizado, enfoque principal na elaboração do primeiro Plano Diretor da SUDENE. Que conforme o artigo 14 da lei nº 3692, dentre as competências da Secretaria Executiva, está a formulação de Planos Diretores de Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste destacados nos subitens seguintes: a) elaborar o projeto do plano diretor e preparar os atos de revisão anual do mesmo, submetendo-os ao Conselho Deliberativo; b) coordenar a ação de outros órgãos ou entidades, para a elaboração de programas e projetos que se enquadrem no plano diretor; c) coordenar e fiscalizar a execução dos programas e projetos que consubstanciarem as diretrizes do plano diretor; 48 d) elaborar relatório anual sobre a execução do plano diretor e submetê-lo ao Conselho Deliberativo6. Nesse período foi submetido o primeiro Plano Diretor da Sudene ao congresso – I Plano Diretor de Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste – 1961 a 1963, aprovado pela lei 3995 de Dezembro de 1961. Em síntese O I Plano Diretor teve sua estrutura assentada, principalmente, no diagnóstico da economia nordestina. A sua política foi orientada para criação da infraestrutura econômica, aproveitamento racional dos recursos de água e recursos minerais, reestruturação da economia agrícola, colonização, racionalização do abastecimento, industrialização, saúde pública, educação de base e levantamento cartográfico (SUDENE, 1980). Vale destacar que foi nesse primeiro Plano Diretor da SUDENE a criação de Incentivos Fiscais e Financeiros, em termos legais, pessoas jurídicas que se instalassem no Nordeste poderiam ter isenção e/ou redução do seu imposto de renda, e ainda possibilitou para empresas de todo o pais uma dedução de 50% no imposto de renda para a aplicação de empresas no Nordeste, desde que os projetos fossem considerados prioritários para a Sudene. É facultado às pessoas jurídicas e de capital 100% nacional efetuarem a dedução de até 50% nas declarações do Imposto de Renda, de importância destinada ao reinvestimento ou aplicação em indústria considerada, pela SUDENE, de interesse para o desenvolvimento do Nordeste (SILVA FILHO, 2007). Quanto ao financiamento, além do orçamento aprovado no congresso e diversas medidas que foram tomadas que garantia o fluxo de capital às diretrizes do projeto, temos ainda uma aliança com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) que garantiu recursos ao saneamento das grandes capitais nordestinas, a garantia que os recursos obtidos pela filosofia Operação Pan-americana, lançada por Juscelino seriam concentrados basicamente no Nordeste. Ainda sob esta fase de autonomia absoluta foi lançado o segundo plano diretor: II Plano Diretor de Desenvolvimento Econômico e Social do Nordeste - 1963 a 1965, No Segundo plano diretor tem-se que já havia um pessoal mais capacitado já envolvido no projeto e foi dado continuidade ao primeiro plano destacando outras demandas sociais como educação, a construção de habitações populares, 6LEI No 3.692, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1959. http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%203.692-1959?OpenDocument 49 modernização das instituições e criação de novas que pudessem ser estratégicas às diretrizes do SUDENE, é lembrado por Leônidas Filho que o SEBRAE é fruto da SUDENE: No caso do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE, atual Agência de Apoio ao Empreendedor e Pequeno Empresário) torna-se relevante ressaltar que sua origem foi na SUDENE, porque, inicialmente, a Autarquia criou o Núcleo de Assistência Industrial (NAI), transformado em Núcleo de Assistência Empresarial (NAE), posteriormente transformado em Centro Empresarial de Assistência Gerencial (CEAG), centros esses cuja experiência foi levada pelo BNDES a outras regiões do país, e posteriormente, surgindo por Lei Federal, o SEBRAE, com recursos próprios incluídos no Orçamento Federal (SILVA FILHO, p. 13, 2007). Quanto às indústrias, é resolvido o impasse quanto se empresas que contassem com capital estrangeiro pudessem usufruir dos incentivos fiscais garantidos no primeiro plano diretor, listados anteriormente, onde a tese foi aceita e a lei nº 4239 de junho de 1963, que aprovou o segundo plano diretor, no seu artigo 18 autorizou que essas empresas pudessem usufruir de benefícios de isenções fiscais quando dentro das diretrizes de desenvolvimento para o Nordeste. Esse período de cinco anos, sob a liderança de Celso Furtado, é certamente o melhor período da SUDENE, mesmo com o país passando por um período complicado onde sua economia, apresentando no início da década de 60, um ritmo de crescimento declinante. O modelo baseado no setor da indústria de bens de consumo parecia estar se esgotando como polo alavancador de crescimento econômico. JK começara a reduzir o volume de investimentos e transferindo problemas para o seu sucessor, recorrendo a empréstimos externos de curto prazo e a emissões de moeda, com reflexos posteriores no agravamento do serviço da dívida e na elevação dos índices de inflação. No governo de Goulart as pressões demandada pela ascensão de uma camada populacional geravam diversos problemas políticos e a economia apresentava um desempenho preocupante, chegando em 1963 a um crescimento de apenas 0,6% e uma inflação de 79,87%, além de dificuldades econômicas externas, com balanço de pagamento com saldo negativo consecutivo. Fica claro a influencia progressista e desenvolvimentista de Celso Furtado nesse período e sua preocupação em transformar e evoluir as classes públicas e empresariais do Nordeste, e há grandes avanços, sobretudo quanto ao 50 planejamento, que mesmo o ministério do planejamento nacional passou a existir depois da implementação da SUDENE. No entanto durante toda essa primeira fase fica descartada a possibilidade de uma reforma agrária, mesmo com enormes pressões sociais para esse lado, No texto Reforma X Revolução: Celso Furtado e a questão regional no pré-1964 de Juliana Gomes Sousa7 a autora destaca esse caráter de Furtado em não mencionar questões de caráter esquerdistas dentro das pautas de estudos do GTDN e em sua participação dentro da SUDENE (Sendo a reforma agrária apenas usada como objeto de estudo por Furtado apenas após o golpe de 64). Tal posição foi tomada a fim de evitar um conflito direto com as enormes pressões das oligarquias presentes e que resistiam bruscamente ao modelo desenvolvimentista sugerido por Furtado. Outra crítica é quanto ao perfil da indústria instalada no Nordeste, que por mais que venha a contribuir com o desenvolvimento econômico, acaba sendo mais relevante em PIB do que num desenvolvimento social e distributivo, pois a relação de dependência permanece quanto ao capital estrangeiro e quanto ao capital nacional proveniente do desenvolvido centro Sul, mesmo as relações de trocas desiguais entre as regiões brasileiras se mantém e, portanto, esse novo parque industrial instalado fica aquém de fornecer o desenvolvimento ao Nordeste esperado. Apesar dessas críticas é inegável a importância inicial da SUDENE não só para começar a se pensar nas problemáticas infinitas provenientes de um país tão desigual, mas também para movimentar economicamente uma região que permaneceu estagnada e esquecida do poder publico durante séculos. Francisco de Oliveira, que participou dessa primeira etapa do projeto, mesmo com fortes críticas posteriores, relata em depoimento sobre a importância do trabalho realizado pela primeira fase da SUDENE. Um vasto sopro de esperança varreu a região. Uma convergência nunca antes vista de classes e setores sociais, desde o campesinato, mobilizou-se para o que pensávamos ser a tarefa do século, a mais ingente e espinhosa de quantas reclamavam solução para construção de uma Nação harmônica, sem gritantes disparidades que se constavam e que, infelizmente, estes vinte anos não conseguiram desfazer. Minha geração jogou-se por inteiro naquele empreendimento, e tentamos converter nossa fraqueza em força: despreparados para tão grande cometimento, substituímos o conhecimento cientifico, de que não dispúnhamos, pelo ardor, pelo vigor e, porque não 7 Mestre em Ciências Sociais pela PUC-SP e membro do Neils (Núcleo de Estudos de Ideologias e Lutas Sociais) 51 dizê-lo, pelo desprendimento. Com inteiro apoio da população, vale a pena lembrar, sem que isso seja uma vangloria, que a SUDENE inovava completamente o estilo de desempenho dos poderes públicos, não apenas na escala regional, mas até mesmo medida pela escala nacional[...]. (OLIVEIRA, 1978 apud TAVARES, 2004). Foram tamanhas as inovações alcançadas pela primeira fase da SUDENE