UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” CAMPUS DE OURINHOS FRANCIELE CAROLINE GUERRA AS ÁREAS DE RISCOS HIDROLÓGICOS NO MUNICÍPIO DE OURINHOS/SP Profa. Dra. Andréa Aparecida Zacharias Orientadora Ourinhos – SP 2017 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” CAMPUS DE OURINHOS FRANCIELE CAROLINE GUERRA AS ÁREAS DE RISCOS HIDROLÓGICOS NO MUNICÍPIO DE OURINHOS/SP Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à banca examinadora para a obtenção do título de Bacharel em Geografia pela UNESP – Campus de Ourinhos. Orientadora: Profa. Dra. Andréa Aparecida Zacharias Ourinhos – SP 2017 FRANCIELE CAROLINE GUERRA AS ÁREAS DE RISCOS HIDROLÓGICOS NO MUNICIPIO DE OURINHOS/SP Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à banca examinadora para a obtenção do título de Bacharel em Geografia pela UNESP – Campus de Ourinhos. Banca Examinadora Profa. Dra. Andréa Aparecida Zacharias (orientadora) (assinatura do membro) Profa. Dra. Marcilene dos Santos (professora convidada) (assinatura do membro) Profa. Dra. Daniela Fernanda da Silva Fuzzo (professora convidada) (assinatura do membro) Ourinhos, Junho de 2017. Dedico este trabalho aos meus pais Francimara Ap. Beil Guerra e José Donizetti Guerra. AGRADECIMENTOS À minha querida orientadora Profa. Dra. Andréa Ap. Zacharias, pela orientação desde o inicio da graduação, pelo apoio, confiança e incentivo pela pesquisa, e que me permitiu voar cada vez mais alto. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP pela concessão da bolsa durante dois anos, e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, pela concessão da bolsa durante um ano, sem as quais não seria possível o desenvolvimento desta pesquisa e do meu crescimento acadêmico. À Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, pelo apoio concedido durante minha trajetória, através do programa de inclusão de alunos da escola pública na universidade, pela concessão por dois anos da Bolsa de Apoio Acadêmico e Extensão I (BAAE I) e permanência estudantil, e pela contemplação e oportunidade de realizar intercâmbio durante um semestre pelo Programa de Apoio ao Intercâmbio Internacional, com convênio bilateral entre a UNESP e a Universidade de Santiago de Compostela (USC) na Espanha. À UNESP campus de Ourinhos-SP, a qual disponibilizou o acesso aos equipamentos dos laboratórios, e também a seus funcionários que não mediram esforços no auxilio e contribuição. À Secretária de Planejamento Urbano da Prefeitura Municipal de Ourinhos pelas informações empregadas neste trabalho, e à Defesa Civil de Ourinhos especialmente ao agente de proteção e defesa civil Harold Adolf Scharf por conceder os registros de ocorrências de riscos ambientais dos últimos anos. Aos professores da UNESP Ourinhos, que foram essenciais para minha formação, em especial a Profa. Dra. Daniela Fernanda da Silva Fuzzo pelo auxilio e observações no meu trabalho e aos colegas de pesquisa/laboratório que contribuíram com as trocas de experiências. A toda minha família que sempre me apoiaram para a realização desta etapa e me incentivaram dando forças nos momentos mais difíceis. Aos meus amigos e colegas dos mais diversos momentos que construí durante a graduação, em especial vocês meninas do “Team Londrina” Marina, Raíssa, Calu e Hannem, que nossa amizade seja duradoura. Ao meu companheiro Cláudio mais que especial, pelo incentivo, força, carinho e paciência dispensada. Sou eternamente grata por tudo! E a todos que de alguma forma contribuíram com este trabalho e estão contribuindo com minha formação acadêmica e profissional. RESUMO Este trabalho tem como objetivo avaliar as áreas vulneráveis a riscos hidrológicos, por alagamentos, enchentes, enxurradas e inundações no município de Ourinhos (SP), com o intuito de auxiliar nas políticas públicas municipais visando a sustentabilidade e gestão do patrimônio ambiental urbano. Para isso, utilizou-se como base os conceitos vulnerabilidade, risco e patrimônio ambiental. Em uma abordagem etimológica, a palavra “risco” significa situação de perigo, “vulnerabilidade” pode ser entendida como suscetibilidade por parte do ser humano a uma situação de perigo ou dano, e “patrimônio ambiental” são todos os elementos considerados pelos processos de construção cultural do ambiente urbano – entendido enquanto materialização das relações sociais. Se relacionados à cartografia de síntese, seus objetos tornam-se importantes indicativos de sustentabilidade na ordenação territorial, pois espacializam as áreas de potencialidades e vulnerabilidades de um dado território, contribuindo diretamente para propostas de políticas públicas municipais que compõem as etapas de planejamento ambiental dos Planos Diretores. Assim, tomando como base as novas políticas ambientais federais − em especial a Lei nº 12.608/2012 −, que estabelecem como competência dos municípios identificar e incorporar os mapeamentos de riscos e vulnerabilidades, promovendo a fiscalização dessas áreas para a preservação do patrimônio ambiental urbano. O trabalho adota como concepção teórica o método de investigação da análise sistêmica da paisagem, em que natureza, homem, sociedade e cultura passam a ser planejados e compreendidos de maneira integrada. Para isso, utilizou- se como metodológica as considerações de Alves (2006) por permitir exemplos dotados de indicadores e variáveis relevantes sobre a temática envolvida e os critérios de análise e de classificação de riscos do Ministério das Cidades, juntamente com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo – IPT. Ao final, tem-se a cartografia de síntese com o cenário das áreas vulneráveis aos riscos de inundação, juntamente com catalogação das ocorrências da Defesa Civil dos anos de 2011 a 2016, com a perspectiva de algumas medidas mitigadoras que contribuam para políticas públicas municipais de gestão patrimonial e de qualidade ambiental, além de efetivar discussões para um ordenamento territorial em áreas de potencial desequilíbrio ambiental que necessitam de conservação, proteção, controle e monitoramento enquanto patrimônio natural e cultural, ou seja, patrimônio ambiental urbano. PALAVRAS CHAVES: Cartografia de Síntese, Áreas de Riscos Hidrológicos, Ordenamento Territorial, Sustentabilidade. ABSTRACT This work aims to evaluate the vulnerable areas to hydrological risks, such as, flooding, inundation and overflowing in the city of Ourinhos (SP), with the purpose of assisting in the municipal public policies aiming at the sustainability and management of environmental urban patrimony. For that, it was used the concepts of vulnerability, hazard and environmental patrimony. In an etymological approach, the word "hazard" means a situation of danger, "vulnerability" can be understood as susceptibility by the human being in a situation of danger or damage, and environmental patrimony "are all elements considered by the processes of cultural construction of urban environment – understood as materialization of social relations. When related to cartography, its objects become important indicators of sustainability in territorial ordering, because spatialize the areas of potential and vulnerabilities of a given territory, contributing directly to municipal public policy proposals that make up the steps of environmental planning. So, based on the new federal environmental policies − in particular Law Nº 12.608/2012 − which establish as competence of the municipalities identify and incorporate the mappings of risks and vulnerabilities, promoting supervisory of these areas for urban environmental patrimony preservation. The work adopts as theoretical conception the method of investigation of the systemic analysis of the landscape, in which nature, man, society and culture are now planned and understood in an integrated way. In order to do so, Alves (2006) considered the methodological approach to allow examples with relevant indicators and variables on the theme involved and the criteria for analysis and hazard classification of the Ministry of Cities, together with the Institute of Technological Research Of the State of São Paulo - IPT. At the end, there is the synthesis cartography with the scenario of areas vulnerable to flood risks, together with the cataloging of Civil Defense occurrences from 2011 to 2016, with the perspective of some mitigating measures that contribute to municipal public policies of Patrimonial management and environmental quality, as well as to carry out discussions for a territorial planning in areas of potential environmental imbalance that need conservation, protection, control and monitoring as natural and cultural patrimony, that is, urban environmental patrimony. KEYWORDS: Cartography, Hydrological Risk Areas, Spatial Planning, Sustainability. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Mapa de localização da área urbana de Ourinhos/SP. ........................................ 16 Figura 2 - Risco ................................................................................................................... 25 Figura 3 - Relação entre níveis de ameaça e de vulnerabilidade na determinação de intensidade de riscos. .......................................................................................................... 28 Figura 4 - Seção da calha do rio em área rural. ................................................................... 31 Figura 5 - Seção da calha do rio em área urbana. ............................................................... 31 Figura 6 - Exemplo de enchente, inundação e alagamento em área urbana. ....................... 32 Figura 7 - Interações entre Planejamento, Gerenciamento, Gestão e Zoneamento Ambiental. ............................................................................................................................................ 46 Figura 8 - Representação de perfil longitudinal de canais fluviais: (a) morfologia do leito do córrego em condições naturais (em equilíbrio); (b) morfologia do leito do canal após processo de retificação. ....................................................................................................... 57 Figura 9 - Movimento de massa, em média vertente, do tipo corrida de terra, tendo como material em movimento o regolito e Perdas de Patrimônio, Memória, Identidade e Vidas com a enchente do Córrego Monjolinho. ..................................................................................... 76 Figura 10 - Registros ao redor dos córregos urbanos do município de Ourinhos/SP. .......... 80 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Extensão dos Córregos Urbanos do Município de Ourinhos/SP. ........................ 17 Tabela 2 - Dados de temperatura e precipitação do município de Ourinhos/SP. .................. 18 Tabela 3 - Atividades econômicas em Ourinhos/SP. ............................................................ 19 Tabela 4 - População urbana e rural e evolução do grau de urbanização do município de Ourinhos, de sua fundação até o ano de 2000. .................................................................... 21 Tabela 5 - Definições de risco no discurso ocidental em Bankoff (2004). ............................. 24 Tabela 6 - Conceito de Risco ............................................................................................... 27 Tabela 7 - Classes de declividade e o afastamento das curvas de nível. ............................. 39 Tabela 8 - Considerações adotadas para o cenário de riscos hidrológicos. ......................... 43 Tabela 9 - Total de construção em obras com infraestrutura e valor total utilizado com os recursos do PAC. ................................................................................................................. 53 Tabela 10 – Totais de construção com a canalização dos córregos e investimento. ............ 58 Tabela 11 - Legenda iconográfica (Apêndice 06). ................................................................ 72 Tabela 12 - Cenários de Inundação ..................................................................................... 74 LISTA DE IMAGENS Imagem 1 - Bairros Jardim Ouro Verde e Jardim Paulista com elevado IAV - presença do Parque Ecológico respectivamente cercado por construções e pavimentação. ................... 18 Imagem 2 - Vila São Luiz (lado esquerdo do córrego), do lado direto presença do cemitério municipal. ............................................................................................................................ 62 LISTA DE FLUXOGRAMAS Fluxograma 1 - Interações entre risco e vulnerabilidade – enchente, inundação, alagamento e enxurrada. ........................................................................................................................ 33 Fluxograma 2 - Critérios de análise de risco sujeitas a processos de enchentes e inundações. ......................................................................................................................... 34 Fluxograma 3 - Fluxograma metodológico da pesquisa. ...................................................... 36 LISTA DE FOTOS Foto 1 - Casas desapropriadas pela Defesa Civil. ............................................................... 41 Foto 2 - Foto da comunidade irregular, localizada na margem, há poucos metros do córrego. ............................................................................................................................................ 63 Foto 3 - Casas de alvenaria. O córrego se localiza após as bananeiras, ao fundo da foto. Pode-se observar a presença de um muro ao fundo, impedindo o contato entre as pessoas residentes desse setor com o córrego. ................................................................................ 63 Foto 4 - Córrego Christoni canalizado. ................................................................................. 64 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Evolução da População Urbana e total do Município de Ourinhos. ..................... 69 Gráfico 2 - Número de ocorrências de eventos hidrológicos registrados pela defesa civil. ... 70 Gráfico 3 - Número de ocorrências por bairros de eventos hidrológicos. ............................. 71 Gráfico 4 - Registro de ocorrências da defesa civil em Ourinhos no período de 2011 a 2016. ............................................................................................................................................ 72 LISTA DE APÊNDICES Apêndice 1 - Mapa da drenagem urbana, curvas de nível e imagem de satélite da área urbana - Ourinhos/SP. ......................................................................................................... 90 Apêndice 2 - Mapa da drenagem urbana canalizada - Ourinhos/SP .................................... 91 Apêndice 3 - Mapa de declividade, hipsométria e imagem de satélite da área urbana - Ourinhos/SP ........................................................................................................................ 92 Apêndice 4 - Mapa de uso e ocupação do solo urbano com as ocorrências de eventos hidrológicos e imagem de satélite - Ourinhos/SP ................................................................. 93 Apêndice 5 - Mapa dos bairros afetados pelos eventos hidrológicos na área urbana - Ourinhos/SP ........................................................................................................................ 94 Apêndice 6 - Imagem de satélite com registros dos eventos hidrológicos de 2011 a 2016 no município de Ourinhos/SP ................................................................................................... 95 Apêndice 7 - Imagem de satélite com ocorrências de alagamento, enxurrada e inundação - Ourinhos/SP ........................................................................................................................ 96 Apêndice 8 - Mapeamento de cénários das áreas com riscos de inundação e ocorrências da defesa civil, 2011 – 2016. .................................................................................................... 97 Apêndice 9 - Glossário dos riscos ambientais na área urbana de Ourinhos/SP. .................. 98 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA ................................................................................ 12 2. OBJETIVOS ................................................................................................................. 14 3. CARACTERIZAÇÃO DO TERRITÓRIO ........................................................................ 15 3.1. Área de Estudo .................................................................................................... 15 3.2. Processo Histórico de Desenvolvimento Urbano de Ourinhos ............................. 19 4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .................................................................................... 24 4.1. Riscos Ambientais e Vulnerabilidades ................................................................. 24 5. PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS ...................................................................... 30 5.1. Revisão de Literatura ........................................................................................... 30 5.2. Critérios de Identificação e Classificação das Áreas de Riscos Hidrológicos ....... 34 5.3. Elaboração dos Mapeamentos Temáticos ........................................................... 35 6. RESULTADOS E DISCUSSÕES: O ESTUDO DE CASO NA ÁREA URBANA DE OURINHOS/SP .................................................................................................................... 44 6.1. As Propostas de Politicas Ambientais do Plano Diretor de Ourinhos: algumas reflexões 44 6.2. Patrimônio Ambiental Urbano, Gerenciamento de Riscos e Sustentabilidade do Território ..................................................................................................................... 59 6.3. As áreas de Riscos Hidrológicos no Município de Ourinhos ................................ 65 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS .......................................................................................... 81 REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS ..................................................................................... 84 12 1. INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA As encostas e os cursos d’água são periodicamente deflagrados por precipitações com diferentes intensidades e durações, foco de grande atenção nas pesquisas geomorfológicas, provocando problemas de ordem socioambiental e por vezes socioeconômico, principalmente no meio urbano, como: inundação, alagamento, deslizamento de terra e queda de barreiras entre outros, podendo gerar impactos que vão dos desastres a catástrofes. “Seu estudo é fundamental para a compreensão das paisagens naturais, bem como para sua aplicação no controle de erosão dos solos tanto em áreas rurais ou urbanas” (GUERRA, 2011 p. 15). As mudanças na urbanização global têm incentivado, cada vez mais, nas esferas governamentais, criações de programas de desenvolvimento com elevado investimento financeiro, na perspectiva de seus controles em centros urbanos, fatos de ocupação desordenada e acelerada que devem ser destacados como exemplos o caso de Petrópolis, “[...] cujas características do meio físico, como encostas íngremes, solos profundos e chuvas concentradas, têm causado centenas de mortes nas últimas décadas”. (GUERRA, 2011, p. 25). No Brasil as enchentes em áreas urbanas têm sido cada vez mais frequentes, haja vista que “[...] um dos maiores problemas enfrentados pelas cidades brasileiras hoje é a ocorrência de inundações ou enchentes, que têm causado grandes prejuízos financeiros e até mesmo perdas de vidas humanas” (GUERRA, 2011, p. 82), como os casos de Brasiléia (AC) em 2015 e São Luís do Paraitinga (SP) em 2010 entre tantos outros. “Entre 1940 e 1990, ocorreram 1.161 eventos catastróficos, incluindo deslizamentos, corridas de lama, quedas de blocos e enchentes, com centenas de mortes nesse período, bem como perdas materiais” (GUERRA, 2011, p. 25). Lembrando que, o Brasil não figura entre os países mais susceptíveis a desastres naturais. “Ocupa apenas a 123ª posição em um índice mundial dos países mais vulneráveis a cataclismos” (PIVETTA, p.17, 2016). Porém, “85% dos desastres são causados por três tipos de ocorrências: inundações bruscas, deslizamento de terra e secas prolongadas” [...] “Nas ultimas cinco décadas, mais de 10,225 brasileiros morreram em desastres naturais, a maioria em inundações e devido à queda de encostas” (Ibidem, p.17). 13 Desde o final da década de 1990 a concentração da população em grandes metrópoles, ocasionou o aumento da poluição e da frequência das inundações em função da impermeabilização e da canalização dos rios. Já nos últimos anos, tem-se o papel inverso, o aumento da população urbana ocorre especialmente nas periferias, ocupando áreas de mananciais e de risco de inundação e dos movimentos de massa devido à expansão urbana nas encostas que vem sendo desmatadas para tal. O processo de urbanização juntamente com o grau de saturação, impermeabilização do solo, retificação, assentamento em cursos de água e encostas, contribuíram para o processo de inundações, enchentes e vários outros fatores impactantes advindos da ação antrópica que levam ao risco ambiental. Deste modo, as modificações progressivas da ação do homem sobre o habitat, faz com que os recursos naturais e a população fiquem expostos a situações de riscos. Especificamente, a cidade de Ourinhos/SP, através dos históricos de ocorrências em pesquisas de campo, noticiários e relatórios, constatou que os eventos mais incidentes ocorrem em períodos de altos índices pluviométricos, causando principalmente alagamentos e inundações, intensas erosões no solo devido às enxurradas e também alto índice de queda de árvores devido as fortes rajadas de ventos. Ocorrências que são associadas aos eventos de precipitação mais concentrada quando são registrados grandes volumes de chuva em curto espaço de tempo na área urbana. Nesta perspectiva, optou-se por dar ênfase às áreas de riscos hidrológicos por: alagamento, enchentes, enxurradas e inundações, propondo o mapeamento e buscando princípios a precaução e preservação nos estudos destas áreas no ordenamento territorial. E servindo para a sustentabilidade ambiental, frente aos riscos naturais ou originados das intervenções antrópicas, que englobam o meio social, cultural, econômico e o patrimônio ambiental urbano. Trata-se de uma análise do espaço urbano, por ser um tema cada vez mais presente no cotidiano das pessoas, destas residirem ou não em áreas de riscos. E do fenômeno ser objetivo de pesquisa dos inúmeros trabalhos nas mais variadas linhas de abordagem, a fim de contribuir com políticas públicas voltadas à sustentabilidade ambiental, o papel do poder público, sobretudo, municipal. Além da participação da comunidade nas discussões sobre o planejamento da cidade, e os instrumentos e perspectivas do processo de planejamento e gestão da cidade de Ourinhos/SP. 14 2. OBJETIVOS Este trabalho tem como objetivo identificar as áreas vulneráveis aos riscos hidrológicos por alagamentos, enchentes, enxurradas e inundações, na área urbana do (no) município de Ourinhos/SP, e indagar a ideia dos patrimônios ambientais urbanos considerando as políticas ambientais e exigências federais como cenário de gestão da sustentabilidade e conservação, além da preservação da memória, da identidade e de vidas. Neste sentido, a pesquisa busca como objetivos específicos: a. analisar as propostas de políticas ambientais vigentes no Plano Diretor do Município de Ourinhos, estabelecendo discussões sobre as medidas mitigadoras adotadas pela administração pública; b. identificar as áreas afetadas pelos fenômenos de alagamento, enchentes, enxurradas e inundações através de consultas nos bancos de dados da Defesa Civil Municipal, jornais da imprensa local, bem como algumas aferições em campo; c. quantificar as ocorrências de eventos hidrológicos por alagamentos, enchentes, enxurradas e inundações da drenagem urbana nos bairros do munícipio de Ourinhos/SP; d. elaborar a Cartografia de Síntese com as áreas vulneráveis aos riscos hidrológicos, considerando os terrenos facilmente inundáveis por alagamentos, enchentes, enxurradas e inundações, visando futuras propostas de medidas mitigadoras ao (re)ordenamento territorial do Plano Diretor de Ourinhos/SP; e. classificar as áreas identificadas quanto à tipologia e grau do risco hidrológico urbano, a fim de analisar com maior critério seu cenário hidrológico, seu padrão construtivo e a distância das moradias em relação ao eixo de drenagem. 15 3. CARACTERIZAÇÃO DO TERRITÓRIO Este item tem como objetivo apresentar algumas caracterizações importantes do município de Ourinhos, tais como: localização, aspectos sociais, áreas verdes e arborização urbana, clima e índice pluviométrico, uso da terra, relevo e a hidrografia. Além da evolução histórica do município expondo sua identidade local e o processo de desenvolvimento, até os dias atuais, distinguindo seu espaço urbano, construído e reconstruído ao longo do tempo conforme os interesses históricos, político, econômico, sociais e culturais da sociedade, e sua paisagem urbana constituída pelos resultados das ações humanas que podem ocorrer de maneira desordenada ou de forma planejada e oriunda (Zacharias; Bueno, 2013). 3.1. Área de Estudo Ourinhos é uma cidade de médio porte, localizada na porção sudoeste do estado de São Paulo, cujo limite territorial equivale a 282 km², sendo que destes 90 km² corresponde às áreas urbanas. A população total do município é de 103,035 mil habitantes, segundo o Censo do IBGE de 2010. Deste total 97,42% residem na área urbana e 2,58% na área rural (Figura 1). O município está situado no Planalto Ocidental Paulista, possui o relevo plano de solos férteis e é delimitado por três rios principais apresentando forte potencial hídrico, situado na 17ª Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo/SP, denominado Médio Paranapanema (UGHI –MP). O principal o Rio Paranapanema, que separa Ourinhos da cidade de Jacarezinho estado do Paraná, ao Sul. O segundo, o Rio Pardo, afluente do Paranapanema o qual se impõe como barreira à expansão da área urbana do município, ao Leste e também ao Norte, quando faz a curva em direção ao Paranapanema, dividindo o município em duas partes. E o terceiro, Rio Turvo, que corta a parte leste do município no sentido Leste-Oeste (Boscariol, 2008). 16 Figura 1 - Mapa de localização da área urbana de Ourinhos/SP. Fonte: Zacharias (2006, 2010). 17 A área urbana conta com tributários provenientes do rio Paranapanema, a Tabela 1 indica as extensões da drenagem urbana e no Mapa da Drenagem (Apêndice 1) é possível identificá-los com as curvas de nível. Tabela 1 - Extensão dos Córregos Urbanos do Município de Ourinhos/SP. Drenagem Urbana Extensão (m) Extensão (Km) Córrego Monjolinho 7.545,99 7,5 Córrego Jacuzinho 7.568,29 7,6 Córrego Chumbeadinha 4.062,88 4,1 Água das Furnas 8.970,85 9,0 Christoni 2.693,62 2,7 Água da Veada 2.448,08 2,4 Água da Furninha 3.301,82 3,3 Água do Jacu 1627,22 1,6 TOTAL 38.218,75 38,2 Fonte: Organizado pela autora (2015). Os terrenos ocupados pela área urbana possuem uma variação da altitude de 385m, chegando a 540m na porção sudeste. Já os córregos urbanos do município de Ourinhos predominam as declividades de 6 – 12%, as declividades superiores concentram-se predominantemente nos fundos de vale. Embora Ourinhos possua 86 áreas verdes públicas, sua distribuição é irregular pela malha urbana, tendo presença efetiva dessas apenas na parte central e sudeste da cidade, além de setores habitados por populações de maior poder aquisitivo, e locais particulares mais distantes do centro (Rodrigues, 2008), conforme o recorte da imagem de satélite (Imagem 1). De acordo com o IBGE (2008), “a população de Ourinhos em 2007 foi de 98.868. Dessa forma, o IAV (Índice de Área Verde) do município (segundo a população desse ano) é de 8,62 m²/habitante, abaixo dos 12m2 indicado no Projeto Município Verde”. (RODRIGUEZ, 2008, p. 42). 18 Imagem 1 - Bairros Jardim Ouro Verde e Jardim Paulista com elevado IAV - presença do Parque Ecológico respectivamente cercado por construções e pavimentação. Fonte: (Google Earth, 2016). A área de estudo, possui uma “temperatura média do ar igual a 23,1ºC, sendo os meses com temperaturas mais elevadas em fevereiro e março e os meses com menores temperaturas junho e julho”. O índice de “precipitação média anual é de 1405,3mm, os meses mais chuvosos são novembro, dezembro e janeiro (verão) e os meses menos chuvosos são junho, julho e agosto (inverno)”, conforme a Tabela 02 (CARFAN, 2011, p. 49; 50). Tabela 2 - Dados de temperatura e precipitação do município de Ourinhos/SP. Fonte: Dados Ciiagro.sp.gov.br (Período: 01/05/2000 até 08/02/2010). Apud Carfan (2011). 19 No que tange a principal atividade econômica do município de Ourinhos, conforme dados do IBGE (Tabela 3) é o setor de serviços, abrangendo 73,17%. Tabela 3 - Atividades econômicas em Ourinhos/SP. Variável Ourinhos PIB ($) % São Paulo PIB ($) Brasil PIB ($) Agropecuária 53.971 2,82 11.265.005 105.163.000 Indústria 459.191 24,01 193.980.716 539.315.998 Serviços 1.399.563 73,17 406.723.721 1.197.774.001 TOTAL 1.912.725 100,00 611.969.442 1.737.195.162 Fonte: IBGE, 2010. 3.2. Processo Histórico de Desenvolvimento Urbano de Ourinhos O processo de colonização da área em estudo traz um desenvolvimento histórico e espacial decorrente de vários fatores econômicos, sendo o primeiro povoamento denominado “fase pastoril” e o segundo denominado ao “pioneirismo agrícola”, e um terceiro povoamento derivado do processo de desconcentração da metrópole paulista, através da reestruturação produtiva (urbano-industrial) a partir da década de 1970. A estruturação do povoamento e formação da vila deu-se em 1905, a partir da vinda de trabalhadores para a construção da ferrovia Sorocabana. Vieram imigrantes alemães, japoneses e italianos que compuseram o primeiro contingente populacional do município em busca de terras para plantar e trabalhar. Esta estação foi marco que deu origem ao município de Ourinhos, influenciando seu desenvolvimento durante as primeiras décadas do século XX. Ao longo do tempo estes imigrantes partiram para outros destinos, deixando marcas no espaço ourinhense, como instituições religiosas e civis, marcos e estabelecimentos em geral. (BOSCARIOL, 2008). A história de Ourinhos está envolvida com o fazendeiro Jacintho Ferreira de Sá, grande proprietário de terras na região, sendo este, atuante na política de Ourinhos, o qual exerceu o cargo de prefeito no período de 1923 a 1925. A família do fazendeiro, ainda hoje é a principal proprietária fundiária de terras no entorno da área urbanizada, voltadas ao setor imobiliário. 20 A partir de 1910, as terras que pertenciam ao fazendeiro começaram a serem loteadas, dividindo-as, e formando outras fazendas do município. Ourinhos era denominada como “Ourinho” distrito do município de Salto Grande. Tornou-se município em 1918, possuindo quatro mil habitantes, dos quais um quarto era urbanos, ALVES, (199~) apud SILVEIRA, (2011). Esse período ocasionou a concentração de fluxo de mercadorias e de pessoas entre a região e outros espaços da economia nacional e internacional. O aumento da expansão da área urbana de Ourinhos e da população que em 1938 ultrapassava 8 mil habitantes, destacou-se das outras cidades do estado de São Paulo e de sua região. Desenvolvendo os comércios, a geração de empregos e a criação de indústrias – Indústria e Comércio Marvi (1953), Caninha Oncinha (1958), Colchões Castor (1962) e Café Jaguari (1962). Além dessas indústrias, é importante salientar a entrada da agroindústria canavieira, que foi protagonista do êxodo rural no município. Instala-se na cidade na década de 1950 a Usina São Luís, produtora de álcool e açúcar, de propriedade de Orlando Quagliato, instaurando a fase da cana-de-açúcar em Ourinhos. Outro fato importante é a vinda de unidades de distribuição de derivados de petróleos e combustíveis de empresas como a Ipiranga, Shell, Esso, Petrobrás (álcool) para a cidade. No fim da década de 1940 a 1980, a cidade começa a se modernizar e melhorar sua infraestrutura urbana, explorando um expressivo crescimento horizontal, e incrementar a constituição do Departamento de Água e Esgoto (DAE), do asfalto urbano, da expansão da rede elétrica e do serviço de transporte público. Conforme podemos ver pela Tabela 4, na década de 1940, a população urbana ultrapassava a população rural, intensificando o grau de urbanização para um nível a cima da média nacional. 21 Tabela 4 - População urbana e rural e evolução do grau de urbanização do município de Ourinhos, de sua fundação até o ano de 2000. Ano Pop. Urbana Pop. Rural Grau de Urbanização (%) 1918 1000 hab. 3.000 hab. 25 % 1940 6.666 hab. 6.457 hab. 50,79 % 1950 13.457 hab. 7.628 hab. 63,82 % 1960 25.762 hab. 8.940 hab. 74,23 % 1970 41.059 hab. 8.134 hab. 83,46 % 1980 52.698 hab. 7.060 hab. 88,18 % 1990 70.399 hab. 6.235 hab. 91,86 % 2000 90.696 hab. 3.172 hab. 96,62 % 2010 100.374 2.661 97,41 % Fonte: Censos demográficos do IBGE. Como se pode analisar, nas décadas de 1950 e 1960, o número de habitantes se multiplica. Com essa expansão da população urbana e a criação de novos bairros e loteamentos, tem-se a ampliação do atendimento dos serviços públicos, como o transporte intraurbano, e, sucessivamente, o asfaltamento das vias de circulação, a ampliação do hospital municipal, a criação de mais escolas e a extensão deste serviço. (BOSCARIOL, 2008). E, paralelamente, neste período, a cidade sofre um ritmo de expansão de sua mancha urbana, espacializando-se em sentido norte-sul, com áreas cada vez mais longe do centro urbano expandindo suas atividades comerciais, industriais e melhorando a infraestrutura da cidade e serviços coletivos urbanos para o atendimento das demandas geradas pelo surgimento das novas classes de renda da população. O setor sul da área urbana de Ourinhos, por exemplo, possui em termos históricos a mesma característica do setor norte, uma área mais antiga. Este setor também apresenta grandes vazios internos, ocorrendo nas margens do córrego do Jacuzinho e separa os grupos sociais de média e alta renda da população mais pobre. É também o setor mais populoso e de media renda, possui cerca de 2 mil habitantes a mais do que o setor norte. A partir da década de 1970, surgem os setores oeste e o leste. O setor oeste, ao contrário do setor norte é o local onde se encontra a maior parte dos grupos sociais de alta renda, sendo que a maior parte de seus bairros possui origem na década de 1970. Nesse setor, as Avenidas são largas e bem arborizadas, possui grande quantidade de parques e áreas verdes, serviços de alto padrão, condomínios fechados, além de habitar a menor parte da população urbana. Já o setor leste teve sua ocupação mais acentuada a partir da década de 1970, configurando o mais recente de Ourinhos. Este setor teve a influência do estado na construção de loteamentos realizados pela CDHU e possui grande influência da rodovia Raposo Tavares sobre a sua formação. Pode-se dizer que o setor possui em sua composição, 22 a menor porcentagem dos grupos sociais de renda média, em relação aos outros setores, sendo também o que possui a maior presença dos grupos sociais de baixa renda. Segundo os dados do IBGE a população desse setor ultrapassa os 22 mil habitantes, muito próximo do setor sul, o mais populoso. Sobre a infraestrutura urbana do setor, alguns bairros não possuem asfaltos, e demonstra que há falhas na rede de saneamento básico. Assim, os novos loteamentos até 1974, embora ocorresse em todas as direções da cidade tiveram sua maior concentração nas direções da área Norte e Oeste do município, por serem áreas localizadas próximas à estação ferroviária, lugar em que, as principais relações sociais e econômicas se instalaram inicialmente, equivalecendo os pontos de acesso à população. Nas décadas de 1980 e 1990, surgem em Ourinhos à construção de diversos prédios comerciais, alguns prédios residenciais, e a construção de condomínios fechados. Esse fenômeno provoca alteração no cenário urbano da cidade, o que indica o redirecionamento da produção imobiliária para o atendimento da sociedade de média e alta renda. Em 1980, novas formas de produção de consumo dão destaque à mudança padrão de expansão urbana, passando a ser mais apto com a produção de loteamentos de menor porte com melhores infraestruturas e de serviços, além da mobilidade das populações de média e alta renda. É notável que a parte oeste da cidade concentra-se pessoas com maior renda, enquanto que as populações de menor renda estão situadas em todos os setores. Com a formulação do Plano Diretor a partir de 1982, foi demandado a relocalização industrial e de novas indústrias, o que retirou a maior parte das fábricas da área urbana. Entretanto, ainda existem pequenas fábricas na área urbana próxima as estações ferroviárias, área de pouco interesse imobiliário, habitadas por populações de renda média-baixa. Há de se destacar também os fatores físicos para a localização dos bairros, o que limita a escolha da ocupação de novos loteamentos, como a presença de córregos e de terrenos íngremes. Além destes fatores, a retirada da ferrovia do centro da cidade prevista no Plano Diretor de 1982, não se concretizou e essa por sua vez continua a diminuir a fluidez do espaço urbano até hoje. Outro fator contribuinte para o crescimento e desenvolvimento de Ourinhos são as rodovias, que atuam no crescimento periférico da cidade. A Rodovia Mello Peixoto influencia a área sul da cidade, enquanto que a BR-153 corta a área urbana localizada no extremo oeste. E principalmente á Rodovia Raposo Tavares, que possui longo trecho já englobado pelo avanço da urbanização. 23 Estas rodovias juntamente com o traçado ferroviário, faz-se uma divisão do espaço intraurbano de Ourinhos em quatro setores, cada um com características próprias, sendo tão fragmentado quanto o espaço intraurbano que se compõem. O setor norte da cidade, sendo este o núcleo mais antigo, onde estende parte do centro comercial, correspondente às primeiras áreas urbanas cidade, e tem a Avenida Jacinto Sá como uma das mais importantes. Possui também bairros novos, apresentando a expansão urbana, porém a criação de loteamentos nesse setor visa atender os grupos de renda média e baixa. O setor apresenta diversos vazios urbanos, como a presença do córrego Christoni que atravessa este setor no sentido norte-sul. Este setor concentra pouco mais de 20.000 habitantes, segundo os dados do IBGE 2000. A maioria desta população pertence aos grupos sociais de renda média inferior, somando o total de 84,5% desses grupos sociais que compõe a habitação desse setor. Sua infraestrutura urbana possui varias deficiências quanto à acessibilidade, que são isoladas e afastadas do centro, além de alguns bairros no extremo norte da cidade não possuir ruas asfaltadas, deficiências na rede de saneamento e ausência de iluminação pública. Estas indicações mostram a precariedade que este setor mais populoso se encontra em relação à cobertura dos serviços públicos e infraestrutura urbana. 24 4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Este item tem como objetivo contextualizar as concepções teóricas de “riscos ambientais e vulnerabilidades”, e apresentar seus principais aspectos e autores sobre a discussão. 4.1. Riscos Ambientais e Vulnerabilidades No contexto histórico, se tem a noção de risco intervencionada entre os séculos XVII e XIX, quando os Europeus exploraram novos territórios e confrontaram- se com costumes, condições climáticas e também com o aparecimento de doenças que arruinaram milhares de pessoas. (MENDES et al., 2011). Com a Revolução Industrial nos séculos XVIII – XIX houve uma nova perspectiva ao conceito de risco, passando a ser associado a formas de exploração, relacionados com os elevados acidentes de trabalho. “Na segunda metade do séc. XX, no seguimento das duas Grandes Guerras Mundiais, o conceito de risco era associado à pobreza e à fome” (Ibidem, p.16). De acordo com Mendes et al., até os séculos XIX os desastres naturais eram associados a vontades divinas ao destino. A partir do século XX se tem a racionalização contemporânea e a preocupação científica de estudar o comportamento dos sistemas naturais e humanos, devido às fatalidades causadas. Na tabela 5, têm suas definições a partir do discurso ocidental. Tabela 5 - Definições de risco no discurso ocidental em Bankoff (2004). Conceito Período (século) Condição Cura/Tecnologia Tropicalidade Sec. 17-19/principio do 20 Doença Medicina Ocidental Desenvolvimento Pós II Guerra Mundial Pobreza Investimento/ajuda ocidental Desastres Naturais Séc. 20 até à actualidade Hazard Ciência Ocidental Fonte: Mendes et al., 2011. Nas ultimas décadas do séc. XX, o conceito de risco adquiriu um estatuto social relevante, passando a ser referência de segurança das sociedades tecnologicamente mais desenvolvidas. A partir da década de 1970, passou-se a questionar o maior número de desastres, os quais se deviam a processos físicos e de ordem natural (Bankoff, 2004 apud Mendes et al., 2011). 25 A concepção de risco está ligada a situação de perigo, ameaça ou probabilidade de ações prejudiciais, estragos esperado ou não esperado, esta intervenção pode estar imparcialmente relacionada à sociedade. Assim, o termo risco é associado à vulnerabilidade - entendida como suscetibilidade, resultante de fatores físicos, sociais, econômicos e ambientais de uma comunidade, a uma situação de perigo ou dano, de perdas material e humana, de origem natural ou da ação antrópica, com um conjunto de consequências incertas (Figura 2). Figura 2 – Risco Fonte: Mendes et al., 2011. Há diversos aspectos para os riscos, o qual vem sendo analisados pelos estudiosos há séculos. Esta tradição surgiu antes da degradação ambiental planetária, bem como das discussões oriundas sobre a qualidade de vida urbana. Desde então, os estudos sobre a relação homem-meio/sociedade-natureza fez coincidir nos impactos resultantes da ação antrópica sobre um determinado espaço. De acordo com Carpi Júnior (2001), os conceitos de riscos têm sido utilizados em diversas ciências e ramos do conhecimento e adaptados segundo os casos em questão, sendo assim, muitos autores atribuem à determinação de riscos de erosão, riscos de degradação das terras, riscos de enchentes e riscos de contaminação da água, juntamente com outras denominações. Nestas situações o termo riscos associa- se ao potencial, susceptibilidade, vulnerabilidade, sensibilidade ou danos potenciais. PROCESSO PERIGOSO IMPACTO CONSEQUÊNCIAS INCERTAS RR IS C O 26 De acordo com Dagnino e Carpi Júnior (2007), aparecem em destaque na literatura, quatro tipos de classificação de riscos: o risco natural que não é atribuído à ação humana; o risco tecnológico que deve levar em conta três fatores indissociáveis (o processo de produção; o processo de trabalho e a condição humana); o risco social, que são divididos em dois tipos: os riscos endógenos, relacionadas aos elementos naturais e ás ameaças externas; e os riscos exógenos, relacionados diretamente ao produto das sociedades e às formas de política e administração adotadas; e por último o risco ambiental, que segundo Veyret; Meschinrt de Richemond (2007) é entendido como um termo sucinto que abriga os demais riscos, agravados pela atividade humana e pela ocupação do território. Há também um tipo de risco muito amplo que é o antropogênico, originados a partir da condição humana e ser social e econômico. Ainda através da ação antrópica são classificados os riscos construídos e riscos produtivos. Há ainda outros termos apresentados por alguns autores que são os sistemas de riscos e bacia de riscos. Diversos autores podem ser citados a respeito da questão dos riscos, mas existe certa concordância em relaciona-los às situações ou áreas que correm algum tipo de perigo, ameaça ou probabilidade. Deste modo, “as situações de risco ocorrem no ambiente em seu sentido amplo, natural e construído pelo homem”. (CAPI JÚNIOR, 2007, p. 73-72) Nota-se, que o risco possui uma complexidade de conceitos, estudos e casos. São diversas as situações de riscos ambientais e urbano, podendo apresentar riscos para toda a sociedade humana e em aspectos econômicos. Nesse sentido determinados autores apresentam o conceito de risco como sendo o resultado da multiplicação da perigosidade pela vulnerabilidade, apresentando-se como condição dependente uma das outras como pode ser visto na Tabela 6. 27 Tabela 6 - Conceito de Risco Conceito de Risco Autor O termo risco é usado para descrever a probabilidade de consequências negativas fruto da interação entre perigosidades, comunidade e ambiente. EMA (2002) No que concerne ao risco existe uma concomitância e condicionamento mútuo entre perigosidade e vulnerabilidade. Quando uma ou duas das componentes do risco são alteradas, está-se a inferir com o risco em si. Cardona (2004) 1ª Fase (inicio da década de 90): Desastre = Perigosidade* Vulnerabilidade Davis (2004) 2ª Fase: Desastre = Perigosidade * Vulnerabilidade/Capacidade Risco ~=Perigosidade * Vulnerabillidade Wisner (2004) Risco = Perigosidade * Vulnerabilidade ONU (2004) Risco = Probabilidade * Consequências Almeida (2005) Fonte: Mendes et al., 2011. Para definir melhor os conceitos, perigo/hazard trata-se das chances de acontecer um evento, vulnerabilidade diz respeito às chances deste evento atingir as pessoas e as mesmas se recuperarem, e o risco corresponde o quanto de dano esse evento pode provocar, desta forma o risco é classificado em valores de muito baixo até muito alto, em aspectos financeiros e em números de mortes. “Segundo a ONU (2002) na Estratégia Internacional para a Redução de Desastres enquanto que a perigosidade determina a localização geográfica, intensidade e probabilidade, o conceito de vulnerabilidade determina a predisposição” (MENDES et al., p.21, 2011). Entende-se por perigosidade a causa de dano ou situação que causa perda e ameaças as pessoas, sendo assim, “perigosidade será sinônimo das condições existentes que dão origem a uma situação de risco” (MENDES et al., p.22, 2011). Logo, a vulnerabilidade é um conceito complexo e amplo surgindo à necessidade de dividi-lo por tipologia, sendo essa, o resultado de diversas interações, e que implicam no desenvolvimento tanto de processos físicos, como da dimensão humana (sociais, econômicos e ambientais) podendo ser um fenômeno desestabilizador de origem natural ou antrópica, que vão aumentar a suscetibilidade da comunidade ao impacto dos perigos (Mendes et al., 2011). 28 A identificação de vulnerabilidades permite entender as carências ou vantagens que apresenta uma comunidade ou grupo de indivíduos no âmbito intraurbano, distribuição desigual dos bens e serviços públicos e desigualdades sócio espaciais, materializadas na ocupação diferenciada do território. Na Figura 3 pode-se ter a noção de intensidade de risco (alto, médio, baixo) dependendo da combinação entre o nível de ameaça (eixo horizontal), e o nível de vulnerabilidade (eixo vertical). É possível notar que o risco está presente em todos os quadrantes, mesmo que os níveis de vulnerabilidade e de ameaça sejam baixos, aumentando na medida em que as variáveis vão crescendo. Figura 3 - Relação entre níveis de ameaça e de vulnerabilidade na determinação de intensidade de riscos. Fonte: Carpi Júnior; Dagnino (2007). De acordo com Carpi Júnior e Dagnino, 2007, a complexa fórmula leva em conta a relação R=F(A, V) que significa a função entre ameaça e vulnerabilidade. Esta função depende do problema analisado, podendo estar relacionado a/ao: Uso e ocupação do solo na região; Transposição das águas; Morfometria da Bacia ou do Rio; Índice de Impermeabilização; Obras de Engenharia para conter ou minimizar os riscos. 29 Posto isto, compreende a importância do diagnostico ambiental, através dos mapeamentos de riscos e vulnerabilidades como avanço na direção da identificação e entendimento dos problemas de fragilidades de uma determinada região em que o ambiente ou a população estão sujeitos. Desta forma, as representações cartográficas são meio de comunicação na atuação social. 30 5. PROCEDIMENTOS METODOLOGICOS Para a efetivação desta pesquisa, foram necessárias as etapas de trabalho abaixo detalhadas. 5.1. Revisão de Literatura A metodologia deste trabalho emprega como concepção teórica o método de investigação Sistêmica da Paisagem, tendo como base o conceito de paisagem como um todo sistêmico em que se combinam a natureza, a economia, a sociedade e a cultura, em um amplo contexto de inúmeras variáveis que buscam representar a relação da natureza como um sistema e dela com o homem. Para isso utilizou as considerações de ALVES (2006) por permitir exemplos dotados de indicadores e variáveis relevantes sobre a temática envolvida e os critérios de análise e de classificação de riscos do Ministério das Cidades, juntamente com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo – IPT. Todavia, pelo fato deste trabalho considerar as áreas de enchentes, inundações, alagamentos e enxurradas no ambiente urbano, torna-se fundamental explicitar no método de análise, que embora enchentes, inundações, enxurradas e alagamentos nos levem a um mesmo entendimento – concentração de água –, cada um deles caracterizam situações diversas quando ocorrem, ao envolver vários fatores que podem diminuir ou aumentar o risco, ao qual o ser humano encontra-se exposto. A Figura 4 apresenta um esquema de uma seção de rio em área rural. Nela observa-se a calha principal do rio, que é onde correm as águas durante todo o ano. Quando ocorre uma forte chuva a calha principal do rio, também chamada de leito menor, não tem capacidade suficiente para escoar o fluxo, e então o nível da água sobe até seu limite máximo e as águas passam a ocupar a calha secundária, ou leito maior (cheia fluvial 1ou enchente). Quando ocorrem chuvas mais intensas, a água do rio pode transbordar para as planícies marginais, ocasionando uma inundação. Este fenômeno é natural, mas pode ser agravado pela ação do homem, caso haja intervenção no leito do rio. 1 Cheia fluvial é quando ocorre à elevação do nível d’água dentro do rio, resultante de precipitações sobre a bacia. 31 Figura 4 - Seção da calha do rio em área rural. Fonte: Jacob (2014). Todavia, com a impermeabilização dos solos em áreas urbanas, o escoamento superficial e o volume da água que chega ao rio tornam-se maior, provocando uma inundação de maiores proporções. Como a planície marginal até o leito maior do rio está ocupada pela urbanização, o risco ambiental é caracterizado pela inundação (Figura 5). Já os alagamentos são ocasionados pelo acúmulo de água na superfície urbana que na maioria das vezes, ocorrem por deficiência do sistema de drenagem. Figura 5 - Seção da calha do rio em área urbana. Fonte: Jacob (2014). As enxurradas são escoamentos superficiais provocados por chuvas intensas, com curto tempo de concentração em que existem declividades médias a altas. Elas ocorrem devido ao rápido acúmulo de águas, o que causa acréscimo na velocidade das águas. A essas situações, muitas vezes, estão associadas não só o movimento de água, como também de terras, pedras, pedaços de troncos e tudo o que aparecer no caminho, criando uma condição hídrica ainda mais destruidora. As enxurradas 32 podem ocorrer em áreas rurais e também urbanas. A Figura 6 exemplifica todos os fenômenos associados. Figura 6 - Exemplo de enchente, inundação e alagamento em área urbana. Fonte: Enchente... (2016), adaptado do Ministério das Cidades/IPT (2007). A partir das definições exemplificadas pelas figuras 4, 5 e 6, pode-se chegar ao modelo do Fluxograma 1, que apresenta uma caracterização de situação de perigo ao risco ambiental no ambiente urbano, tomando como exemplo as enchentes, inundações, alagamentos e enxurradas, para entender a dinâmica comum em ambientes urbanos, que ainda ocasionam certo dédalo epistemológico. 33 Fluxograma 1 - Interações entre risco e vulnerabilidade – enchente, inundação, alagamento e enxurrada. Fonte: Guerra e Zacharias (2015). O primeiro caso do Fluxograma 1, mostra um lugar que apresenta ameaça (enchente, inundação, alagamento ou enxurrada) e há habitações no local: a população estará vulnerável e esses fatores resultam em uma situação de risco. Já no segundo caso, se ocorrer uma ameaça em um lugar em que não há habitação, não haverá ninguém vulnerável. Quando um elemento estiver ausente, não haverá situação de risco. No terceiro caso, se ocorrer uma ameaça em um lugar em que não vive ninguém e não existem casas ou bens, não haverá risco nem vulnerabilidade. Diante do exposto, percebe-se que o risco não estará presente quando um dos elementos for nulo ou inexistente. O mesmo acontece com a vulnerabilidade, por ser uma condição indissociável da ocorrência do risco. 34 5.2. Critérios de Identificação e Classificação das Áreas de Riscos Hidrológicos Para identificar e localizar as áreas de riscos hidrológicos deve-se entender os diversos processos passiveis da ocorrência, tanto aqueles de natureza efetivamente hidrológica, quanto os processos consequentes tais como erosão marginal e solapamento, capazes de causar danos para a ocupação. No contexto urbano essas áreas definem-se com os terrenos marginais a cursos d’agua ocupados por núcleos habitacionais precários sujeitos ao impacto direto desses fenômenos. As pessoas que habitam essas áreas estão sujeitas a danos a integridade física, perdas materiais e patrimoniais, além de constituírem os elementos de risco com maior grau de vulnerabilidade. No esquema do Fluxograma 2 são consideradas as tipologias de identificação de identificação e analise dos processos hidrológicos. Fluxograma 2 - Critérios de análise de risco sujeitas a processos de enchentes e inundações. Fonte: Mapeamento de Riscos (2015), adaptado do Min. Cidades/IPT, 2007. 35 5.3. Elaboração dos Mapeamentos Temáticos Seguindo os procedimentos metodológicos da pesquisa a etapa seguinte destinou-se a elaboração de alguns mapeamentos temáticos como indicadores ambientais, importantes, para o desenvolvimento da temática da pesquisa. Segundo Zacharias (2006), [...] Um mapa permite observar as localizações, as extensões, os padrões de distribuição e as relações entre os componentes distribuídos no espaço, além de representar generalizações. Principalmente, devem fornecer a síntese, a objetividade, a clareza de informação e a sistematização dos elementos a serem representados. Garantidas essas qualidades, os mapas temáticos podem ser os melhores instrumentos de comunicação entre planejadores e atores sociais do planejamento, dada sua possibilidade de fornecer a leitura espacial, interpretação e conhecimento das potencialidades e fragilidades das paisagens, por meio das representações gráfica e visual. (ZACHARIAS, 2016, p.48). Para a análise de identificação das fragilidades sujeitas aos riscos hidrológicos da área em estudo empregou o procedimento metodológico de indicadores dos componentes naturais morfométricos e antrópicos, para a elaboração e obtenção dos mapeamentos de acordo com o Fluxograma 3. Foram analisadas as ocorrências obtidas pela Defesa Civil de Ourinhos com registros dos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, 2015 e 2016. A partir destes dados obteve o mapa de riscos hidrológicos da cidade, com o objetivo de espacializar as ocorrências de enchente, alagamento, enxurrada e inundação. Compreende-se a importância dos mapeamentos temáticos que servem de indicadores ambientais, contribuindo com a capacidade de descrever um estado ou uma situação dos fenômenos que ocorrem no ambiente, além do auxilio para o planejamento e gestão urbana. Desta forma por meio de técnicas de geoprocessamento viabilizadas pelo Sistema de Informação Geográfica – ArcMap 10.2.2, as bases cartográficas digitais da área urbana de Ourinhos disponibilizadas pela Prefeitura Municipal de Ourinhos foi possível obter na escala de 1:40.000, os mapas temáticos e morfométricos urbanos correspondentes aos fenômenos geográficos de: a) drenagem e curvas de nível; b) hipsométria; c) declividade; d) drenagem canalizada; e) uso e ocupação do solo; f) bairros afetados por eventos da defesa civil; g) riscos hidrológicos; e por fim o h) cenário de inundação. 36 Fluxograma 3 - Fluxograma metodológico da pesquisa. Organizado pela autora (2017). a) Mapa de drenagem urbana com curvas de nível A rede drenagem urbana compõe as bacias hidrográficas já explicitadas no item 3.1 da área de estudo. De acordo com Zacharias (2006, p. 142) “uma bacia hidrográfica circunscreve um território drenado por um rio principal, seus afluentes e subafluentes permanentes ou intermitentes, estando associado à noção de sistema, nascentes, divisores de águas, cursos de águas hierarquizados e foz”. Qualquer ocorrência de eventos em uma bacia hidrográfica de origem antrópica ou natural poderá interferir na dinâmica de seu sistema, modificando sua qualidade e quantidade de água. 37 Assim, tendo a base cartográfica em meio digital, a seguir organizou-se o Mapa de Drenagem com as Curvas de Nível (Apêndice 1) da área urbana de Ourinhos-SP, visando a análise espacial de sua disposição, bem como a densidade da rede de drenagem urbana. Ao passo que as curvas de nível serviram para a geração do modelo digital através da interpolação de seus valores altimétricos. Desta forma a drenagem foi obtida diretamente pela vetorização das feições correspondentes às drenagens urbanas, a partir da Carta Topográfica de Ourinhos (IBGE, 1973). Ao passo que as curvas de nível, da área urbana de Ourinhos, foram obtidas pelo banco de dados da prefeitura municipal, por: a) possibilitar maiores detalhamentos das informações geográficas nos documentos cartográficos; b) ser o modelo mais utilizado para os estudos que envolvem planejamento de cidades, combate a incêndios, conservação de recursos naturais, entre outras aplicações e; c) apresentar a vantagem, em relação ao modelo SRTM, da elaboração de um documento cartográfico de forma direta, com 5 metros de equidistância, sem a necessidade de interpolação para a criação de novas curvas altimétricas. De acordo com Zacharias (2016): Os principais rios que drenam o município de Ourinhos encontram-se na 17ª Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo/SP, denominado Médio Paranapanema (UGRHI –MP), portanto, seu gerenciamento é da responsabilidade do Comitê da Bacia Hidrográfica do Médio Paranapanema (CBH-MP). Definida pela Lei nº 9.034/94, a UGRHI-MP, localiza-se na porção centro-oeste do Estado de São Paulo, apresentando uma área total de 16.736 km2 , sub-dividida em cinco grandes bacias hidrográficas - Pardo, Turvo, Novo, Pari, Capivara -, além dos tributários até 3ª ordem provenientes do rio Paranapanema. (ZACHARIAS, 2016, p. 121-122). Desta área total, pode-se dizer que a área urbana do município de Ourinhos possui um forte potencial hídrico, proporcionado pelos principais rios: PARDO e TURVO (mais seus afluentes), conforme observado no mapa de drenagem (Apêndice 1). E a concentração urbana se localiza nos interflúvios e encostas médios a superiores, correspondentes as cotas altimétricas que variam entre 465m a 540m. 38 b) Mapa Hipsométrico O Mapa hipsométrico da área urbana (Apêndice 3) foi organizado para mostrar os diferentes níveis topográficos representados pelos valores altimétricos das curvas de nível. O material para sua elaboração teve como base o Mapa de Curvas de Nível elaborado a partir dos MDEs, na escala 1:40.000, com equidistância de 20m entre as curvas, onde posteriormente com a importação realizada no SIG ARCGIS 10.2, geraram-se intervalos de 15m em 15m, subdividas em 11 classes temáticas tendo inicio com 385m e finalizando com 540m. O Mapa Hipsométrico permite uma análise a partir da correlação com outros documentos, tais como, o da identificação de áreas aplainadas, topos, o de maior ou menor movimentação topográfica e de padrão de drenagem, segundo estruturação do relevo (Zacharias, 2006), a fim de obter informações para análise espacial do relevo e contribuir para a compreensão de concentração de água, e identificação das áreas de várzea mais sujeitas à inundação. Nesse sentido, este documento cartográfico torna-se fundamental para as análises e identificação de riscos, o que também ajuda através das imagens de satélite de alta resolução a possibilidade de observar as condições da área em estudo, e averiguar através dos históricos de ocorrências como os dados utilizados da defesa civil dos anos de 2011, 2012, 2013 e 2014, 2015 e 2016, e também em pesquisas de campo. c) Mapa de Declividade Também conhecida como Mapa Clinográfico; trata-se de um mapeamento coroplético, cujo principio básico consiste na análise das eqüidistâncias entre as curvas de nível e de seu distanciamento horizontal. Sendo que este distanciamento pode ser quantificado em grau ou em porcentagem, por uma escala de mensuração, que, neste caso, é representada por uma intensidade gradativa de cores correspondentes às classes morfométricas. (ZACHARIAS, 2006, p.130). O Mapa de Declividade (Apêndice 3) da área urbana foi elaborada considerando a proposta de Lepsch. Assim, a partir das curvas de nível com equidistância de 20m em 20m e os pontos cotados, foi possível obter o modelo digital do terreno (MDT), através da ferramenta 3D Analyst do sofware ArcMap10.2.2. A 39 partir dele foi processado o mapa de declividade através do comando slope, obtendo- se as seis classes de declividade, de acordo com a metodologia adotada. Vale destacar que as classes clinográficas2 são determinadas primeiro, avaliando o desnível de duas ou mais curvas de nível e quantificando o maior e o menor espaçamento entre elas. E, num segundo momento, os valores das classes passam a ser estabelecidos a partir da aplicação da seguinte fórmula: Dc = Dn x 100 onde: Dc = declividade Dh Dn = equidistância das curvas de nível Dh = distância horizontal 100 = fator que possibilita a representação de declividade em porcentagem. Elaborado mapa de declividade, torna-se necessário realizar o recorte do limite utilizando a ferramenta Extract by mask da extensão Spatial Analyst. A Tabela 7 mostra as classes clinográficas, os afastamentos em relação às curvas de nível, bem como as cores gradativas utilizadas para a quantificação do terreno. Tabela 7 - Classes de declividade e o afastamento das curvas de nível. Classes de Declividades Afastamento das Curvas de Nível Cores < 3% > 0,8 cm Verde Claro 3 ├ 6 0,8 ├ 0,4 cm Verde 6 ├ 12 0,4 ├ 0,26 cm Amarelo 12 ├ 20 0,26 ├ 0,20 cm Laranja 20 ├ 40 0,20 ├ 0,16 cm Vermelho > 40% < 0,16 cm Vermelho Escuro Fonte: Organizada pela autora. De acordo com Zacharias (2016), […] pela análise da carta da declividade do Município de Ourinhos (anexo 6), constata-se que os topos dos interflúvios caracterizam-se pela fraca declividade, situando-se entre < 2% até 5%. As declividades mais acentuadas, que vão de 20% a 30%, estão associadas aos fundos de vale em baixas vertentes. Enquanto que aquelas que vão de 5% a 20% são encontradas nas médias vertentes do município. (ZACHARIAS, 20016, p. 132). 2 O número de classes clinográficas varia em função do tipo de estudo que se pretende, das características morfoesculturais da área de estudo, bem como da escala em que está representada. 40 d) Mapa de Drenagem Urbana Canalizada A fim de contrapor as ações aprovadas em 2006 pela Lei Orgânica que aprova o Plano Diretor, que previa a implementação de parques lineares no entorno dos córregos urbanos e, as ações efetivadas pelo Programa de Aceleração de Crescimento (PAC), no município de Ourinhos/SP, a partir de 2008, em relação à drenagem urbana a partir da canalização dos córregos urbanos, foi elaborado o Mapa de Drenagem Urbana Canalizada de Ourinhos (Apêndice 2), com o objetivo de espacializar o andamento do processo de canalização. Nesta lógica, os parques lineares urbanos como áreas verdes, permite a criação de uma faixa de preservação permanente ao redor dos rios e córregos, melhorando a qualidade da água, do ar, bem como o próprio aspecto paisagístico. Ao passo que a canalização de córregos urbanos, como medida de saneamento para a solução de seus problemas, criando galerias fluviais para evitar enchentes, pode representar uma medida inversa. Ou seja, em períodos de maior pluviosidade, a vazão dos rios tende a aumentar e com a impermeabilização de suas calhas, pela canalização, pode condicionar maiores probabilidades de enchentes que, por sua vez, trazem inúmeras doenças. Portanto, as cores vermelha, laranja e amarelo foram utilizadas para espacializar a ordenação dos córregos urbano, mensurados no mapa como totalmente canalizados (vermelho), parcialmente canalizados (laranja) e em processo de canalização (amarelo), a fim de enfatizar que tal curso fluvial foi modificado diretamente pelo homem, visto que um dos objetivos do trabalho é analisar a influência da urbanização no desenvolvimento dos processos hidrológicos. e) Mapa de Uso e Ocupação do Solo O Mapa de Uso e Ocupação do Solo (Apêndice 4) permite a representação das diferentes formas de uso que são materializadas no espaço geográfico e que deixam sua marca ao longo do tempo em transformação permitindo, também, avaliar se a forma pela qual se utiliza o solo é adequada para aquele determinado local, tanto do ponto de vista ecológico, quanto ambiental, politico e social, possibilitando uma visão clara do uso atual e, partir dai adotar medidas em relação às atividades que são ou não adequadas. 41 De acordo com a Lei Federal 12.651/12 de 25 de maio de 2012 os cursos d’ água natural, com largura igual ou menor que 10 metros em zonas urbanas, devem ter suas áreas de preservação permanente (APP) de 30m, a partir do leito regular, com vegetação nativa, e as nascentes devem ser protegidos num raio de 50m. Confrontando o mapa de uso e ocupação com as distâncias buffer, 30m da área de preservação permanente para córregos na área urbana obtém-se um mapeamento que demonstra em que medida a ocupação do solo afeta os recursos hídricos, uma vez que é possível visualizar quais os locais da área em estudo possuem ocupação irregular em relação à legislação ambiental. Este mapeamento foi adaptado com base no mapeamento realizado por Moraes (2013). Apenas para exemplificar, conforme o relatório da Defesa Civil Municipal, algumas casas que ocupam essas áreas irregulares foram desocupadas (Foto 1). Foto 1 - Casas desapropriadas pela Defesa Civil. Fonte: Defesa Civil apud Ielo (2015). f) Mapa dos bairros afetados por eventos da defesa civil A fim de identificar e localizar os bairros afetados por eventos hidrológicos na área urbana foi elaborado o Mapa dos Bairros afetados pelos Eventos Hidrológicos (Apêndice 5), a partir da criação do banco de dados com os registros históricos da defesa civil dos anos de 2011, 2012, 2013, 2014, 2015 e 2016 e, também na rede de jornais disponibilizados na internet. Vale ressaltar que a Defesa Civil começou a registrar as ocorrências a partir do ano de 2011, por isso foi trabalhado com esse curto intervalo de tempo. 42 Após o levantamento dos registros históricos de alagamento, enchente, enxurrada e inundação, foram possíveis apontar os bairros que possuem tais problemas através da identificação dos setores censitários da cidade disponibilizado no site do IBGE e desenvolver um banco de dados com estes dados a fim de permitir uma fácil e rápida visualização focando os estudos nos bairros mais críticos. g) Mapa de Riscos hidrológicos Com o objetivo de espacializar as ocorrências de alagamento, enxurrada e inundação, a partir dos dados obtidos pela defesa civil e dos jornais de imprensa elaborou-se dois apêndices compostos pela Imagem de Satélite do Google Earth da área urbana de Ourinhos, sendo que uma indica a leitura cartográfica em conjunto (geral) em relação às áreas de riscos hidrológicos por alagamento, enchente, enxurrada e inundação (Apêndice 6) na área urbana de Ourinhos/SP. Ao passo que a outra possibilita a leitura cartográfica de forma elmentar (individual) a partir da identificação dos locais onde tem-se áreas de alagamento, aréas de enxurradas e áreas de inundação na área urbana de Ourinhos/SP (Apêndice 7). Para identificar e localizar, essas áreas de riscos hidrológicos deve-se entender os diversos processos passiveis da ocorrência, tanto aqueles de natureza efetivamente hidrológica, quanto os processos consequentes tais como erosão marginal e solapamento, capazes de causar danos para a ocupação. No contexto urbano, essas áreas definem-se com os terrenos marginais a cursos d’agua ocupados por núcleos habitacionais precários sujeitos ao impacto direto desses fenômenos. As pessoas que habitam essas áreas estão sujeitas a danos a integridade física, perdas materiais e patrimoniais, além de constituírem os elementos de risco com maior grau de vulnerabilidade. h) Mapa do cenário de inundação O Mapa do Cenário das Áreas de Riscos por Inundação (Apêndice 8), teve como finalidade a elaboração de cenários, considerando o aumento do volume da água do rio até o seu leito maior, que por se tratar de área urbana, sempre é ocupado pela urbanização o que aumenta a impermeabilização dos solos e consequentemente caracteriza um risco hidrológico por inundação. 43 Para sua elaboração foi utilizada a altimetria das curvas de nível, a partir do MDT gerado para o mapa hipsométrico, considerando as variações altimétricas (385m – 540m) da área urbana de Ourinhos/SP. E para considerar os cenários de riscos de inundação, cinco medidas foram consideradas tomando como sabe as propostas de Alves (2008) e do IPT (Ministério das Cidades), sendo: o risco muito baixo com uma largura de 3 (três) metros do eixo de drenagem tanto para a margem direita quanto para a margem esquerda; o risco baixo com largura de 5 (cinco) metros; o risco médio com largura de 8 (oito) metros; o risco alto com largura de 12 (doze) metros e; o risco muito com largura de 17 (dezessete) metros ou superior. Esta classificação pode ser observada na Tabela 8. Tabela 8 - Considerações adotadas para o cenário de riscos hidrológicos. Altimetria das curvas de nível Largura do cenário de inundação Níveis de risco 385 – 388 3 metros Muito Baixo 389 – 394 5 metros Baixo 395 – 403 8 metros Médio 404 – 416 12 metros Alto 417 - 428 17 metros Muito alto Fonte: Elaboração da autora. A classificação foi realizada utilizando o comando “Reclass” do ArcMap 10.2.2 no menu spatial analyst tools. A partir dos dados do MDT adicionado na ferramenta reclassifity, foram feitas as classificações do cenário de acordo com a altimetria do modelo digital da área urbana de Ourinhos. 44 6. RESULTADOS E DISCUSSÕES: o estudo de caso na Área Urbana de Ourinhos/SP Neste item são apresentados os resultados acerca da proposta do trabalho. Desta forma, em um primeiro momento apresenta uma discussão sobre as políticas públicas de sustentabilidade do atual Plano Diretor de Ourinhos, e discutidas as informações finais dos mapas temáticos integradas para caracterizar as áreas susceptíveis a áreas de riscos hidrológicos de Ourinhos. 6.1. As Propostas de Polit icas Ambientais do Plano Diretor de Ourinhos: algumas reflexões Para que uma cidade se desenvolva de forma adequada tanto no aspecto ambiental quanto no bem-estar social e econômico, estará sujeita a um conjunto de ações e diretrizes voltadas às execuções de políticas que requerem um bom planejamento municipal (Moraes, 2013). Nesta perspectiva não podemos deixar de mencionar os Planos Diretores, pois, assumem importância tanto no âmbito federal quanto municipal. No âmbito federal, a Constituição Brasileira (1988), no capítulo II, publica em seu artigo 182, parágrafo 1º que: O Plano Diretor, aprovado pelas Câmaras Municipais, é obrigatório para cidades com mais de vinte mil habitantes, como o instrumento básico da política de desenvolvimento e de expansão urbana. (CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 1988, s/nº). E no Estatuto da Cidade (lei 10.257 de julho de 2001), em seu artigo 40º, entre os parágrafos 1º a 4º, define o Plano Diretor como: [...] um instrumento básico, aprovado por lei municipal, que determina a política de desenvolvimento e planejamento municipal, devendo englobar o território do Município como um todo; ser revisto, pelo menos, a cada dez anos; promover audiências públicas e debates com a participação da população e/ou vários segmentos da comunidade, além de acessibilidade de qualquer interessado aos documentos e informações produzidos. (ZACHARIAS, 2006 p.130). A prática de planejar implica avaliar as diferentes variáveis que apresentam um processo. Através do planejamento são decididas todas as disposições e também a 45 destinação de recursos para os diversos setores da administração pública, sendo assim, decorre a participação da população, para que este planejamento contemple aos interesses de toda a população e que não tenha perfil autoritário (Moraes, 2013). Desta forma é fundamental que se tenha um diagnóstico permanente através do planejamento ambiental de uma determinada região envolvendo a organização do espaço territorial, respeitando áreas adequadas aos diferentes usos e ocupações das terras tendo em vista diversas atividades antrópicas. A ideia de gestão territorial ou ordenamento territorial envolve a administração de um conjunto de aspectos jurídicos, econômicos e ambiental, garantindo as condições ecológicas para o desenvolvimento efetivo da população, e da proteção dos recursos do meio ambiente. Sendo assim, o planejamento ambiental articula-se em quatro níveis integrados, conforme as considerações de Rodriguez (1994, p.583) apud Moraes (2013). A organização ecológica, determinando uso para cada parte do território; Aplicação ambiental de projetos, o qual determina e avalia a responsabilidade ambiental e potencial de ações e obras previstas a serem implantadas no território, buscando minimizar impactos ambientais; Auditoria e peritagem ambiental, objetivando aplicar as medidas necessárias para corrigir ou mitigar impactos ambientais; E gestão do modelo de planejamento ambiental, a qual será tomada medidas administrativas, jurídicas e econômicas pertinentes, avaliando os estados dos geossistemas tomando as medidas cabíveis para garantir sua preservação e bom funcionamento do sistema. Diante das informações apresentadas, destaca-se a importância que o planejamento vem obtendo rumo às questões ambientais e sociais o que pode levar a contribuir com o desenvolvimento sustentável dos assentamentos humanos. Nesse âmbito não se pode deixar de mencionar o Zoneamento Ambiental, que tem total responsabilidade pela segregação dos diferentes usos e formas de ocupação de acordo com as condições ambientais locais e também demandas sociais, além de, direcionar da melhor forma possível, o processo de urbanização para que os impactos ambientais sejam reduzidos (MORAES, 2013). 46 Compreende-se a importância do zoneamento ambiental para o processo de planejamento, o qual tem papel decisório nas mãos do poder público, fato que: “define espaços segundo critérios de agrupamentos pré-estabelecidos, os quais costumam expressar as potencialidades, vocações, restrições, fragilidades, suscetibilidades, acertos e conflitos de um território” (ZACHARIAS, 2010, p. 16), levando em conta as variáveis ambientais e sociais. Zacharias (2006) adota de acordo com a Figura 7 a classificação do processo de análise “ambiental” ou do “ambiente” para cada uma das etapas distintas no ordenamento territorial. Figura 7 - Interações entre Planejamento, Gerenciamento, Gestão e Zoneamento Ambiental. Fonte: Zacharias (2006). Observando estas concepções, o planejamento ambiental torna-se reiterado entre as demais etapas. Através desses procedimentos é possível garantir um o desenvolvimento sustentável e proteção dos recursos do ambiente. De acordo com a Política Municipal de Meio Ambiente (1991, p. 38), é necessário que o Plano Diretor seja "amplamente discutido entre a sociedade civil e o Poder Público (Executivo e Legislativo), até que se chegue à sua expressão última, na forma de lei municipal, estabelecendo um processo de planejamento dinâmico, participativo, descentralizado, propiciando que mudanças efetivas ocorram na gestão do município". (LEAL, 1995, p.31). 47 Assim, buscando o apoio da precaução do risco ambiental no ordenamento jurídico, devem-se tomar medidas capazes de prevenir esses riscos indicando sua viabilidade para atenuar danos que possam surgir. Conforme Guimarães et al.: [...] o principio da precaução é composto por quatro elementos interdependentes que são: (1) evitar danos ambientais, (2) identificar riscos ambientais pela pesquisa cientifica, (3) adotar ações preventivas mesmo na ausência de evidencias iminentes de danos e (4) amortizar o desenvolvimento tecnológico pela paulatina redução de ônus ambientais. (GUIMARÃES et al., 2012, p.18) Os princípios da precaução e prevenção nos estudos de áreas riscos ambientais no ordenamento territorial, devem servir para a construção da sustentabilidade ambiental, frente a riscos naturais ou originados das intervenções antrópicas, que englobam o meio social, cultural, econômico e oriundo. De acordo com as disposições do artigo 182 da Constituição Federal, referente ao Capítulo III da Lei nº. 10.257 a qual fundamenta o Estatuto da Cidade, o Plano Diretor de Ourinhos estabelece diretrizes ao município à compatibilização do desenvolvimento econômico e social e a preservação ambiental. Desde sua criação, Ourinhos passou por três momentos acentuados relativos à proposta de ordenamento, as quais apresentam concepções, relativamente, diferenciadas entre si. Zacharias/ Bueno (2013), destacam que, pode-se dizer que foram três momentos onde cada uma apresentou-se seguindo uma tendência epistemológica sobre o que entendia como o ideário para o planejamento urbano municipal. São elas: a) A Proposta de Zoneamento Econômico-Humanístico (1954/55), elaborada pelo Padre Louis-Joseph Lebret, na década de 1950, que sobe uma ótica bem particular propunha um planejamento baseado no movimento Economia e Humanismo. b) A Proposta de Zoneamento Funcionalista e Tradicional (1982) do Plano Diretor Físico, elaborada na década de 80, que se apresentou de maneira muito concisa, dentro de um caráter das políticas das macrozonas de ordenamento territorial. 48 c) A Proposta de Zoneamento Ambiental e Participativo (2006), do novo Plano Diretor do Município (Projeto Lei nº. 499 de 21 de dezembro de 2006) que, em resposta ao Estatuto das Cidades (Lei 10.257 de 10 de julho de 2001) prevê políticas com vistas à sustentabilidade e cidade saudável, através de metas e ações voltadas ao desenvolvimento de qualidade de vida para a população municipal. Passados onze anos após sua implantação, Ourinhos se prepara para aferir uma rediscussão das políticas de ordenamento territorial prevista pelo atual Plano Diretor, requerendo-as segundo as novas políticas ambientais e exigências federais, sobretudo a Lei nº 12.608 de 10 de Abril de 2012, criada para que os municípios sujeitos a processos geológicos potencialmente danosos – ou não – incorporem os mapeamentos das áreas de riscos e com vulnerabilidades em seus Planos Diretores. E para isto institui a Política Nacional de Proteção e Defesa Civil (PNPDEC) no âmbito local, que em articulação com a União e os Estados em seu Art. 8º (e incisos IV e V) destaca que é competência aos Municípios: IV - identificar e mapear as áreas de risco de desastres e V - promover a fiscalização das áreas de risco de desastre e vedar novas ocupações nessas áreas. Legislação que potencializa a elaboração de mapeamentos de sínteses que indiquem áreas de riscos e expressem o comportamento do ambiente, segundo suas reais potencialidades e vulnerabilidades. Se aplicados, por exemplo, ao ordenamento territorial previsto nos Planos Diretores municipais, tais mapeamentos podem subsidiar pesquisas ambientais por indicar os espaços com características comuns de potencialidades, fragilidades e suscetibilidades do território. Estabelecendo diretrizes que visa à qualidade de vida dos moradores e também o desenvolvimento socioeconômico e sócio espacial sustentável do município. E, no caso de Ourinhos/SP, como o Plano Diretor foi elaborado de forma a estabelecer um encaminhamento do município à compatibilização do desenvolvimento socioeconômico com a preservação ambiental, “em que a tríade NATUREZA – HOMEM – SOCIEDADE passa a ser planejada e compreendida de maneira integrada” (ZACHARIAS, 2006 e 2014, p. 116), torna-se um dos seus objetivos estabelecer diretrizes que visem, além da qualidade de vida de seus moradores, também o desenvolvimento socioeconômico e sócio-espacial sustentável do município. 49 Nesta lógica, Zacharias (2014), explicita que dos vinte incisos apresentados no artigo 82 do Plano Diretor do Município de Ourinhos/SP, apenas sete apresentam preocupações diretamente ligadas às questões ambientais. São eles: V. contribuir com o desenvolvimento sustentável; XI. requalificar a paisagem; XII. estabelecer um controle ambiental eficiente; XV. permitir o monitoramento e o controle ambiental; XVIII. conter a ocupação de áreas ambientalmente sensíveis; XIX. conservar os recursos naturais; XX. evitar ocupações desordenadas. E ainda, destaca que um dos pontos positivos do Plano Diretor é a Proposta de Política Municipal do Meio Ambiente que prevê a criação da Área Especial de Interesse Ambiental (AEIA), que corresponde as áreas públicas ou privadas que terão na política especial atenção quanto à sua proteção, preservação, conservação, controle e recuperação da paisagem e do meio ambiente, situadas junto às áreas de fundo de vale, áreas de várzea, áreas sujeitas à inundação, mananciais, áreas de alta declividade e cabeceiras de drenagem. Logo, essa colocação vem ao encontro às preocupações levantadas por Braga (2001), ao destacar que o fenômeno de urbanização causa grandes impactos ambientais: [...] a urbanização é um dos processos que mais impactos causa ao ambiente. O calçamento de vias públicas e quintais de casas e a remoção da vegetação do solo, por exemplo, provocam a impermeabilização do solo aumentando as chances de enchentes, ilhas de calor geradas em decorrência da grande absorção de energia solar pelo concreto, poluição sonora, emissão de gases tóxicos provenientes da queima de combustíveis, dentre vários outros problemas mais, dos quais a agressão aos recursos hídricos, como a descarga de efluentes ao uso e ocupação inadequados do solo das bacias urbanas, por exemplo, não é exceção. (BRAGA, 2001, p. 95). Explorando as colocações de Braga frente às propostas do Plano Diretor de Ourinhos, relacionados aos riscos hidrológicos, compreende-se a importância do mapeamento e levantamento dos conflitos de uso e ocupação das áreas de riscos, 50 bem como diretrizes para o zoneamento ambiental mais severo, e a viabilidade de propostas políticas ambientais, que ajudam na minimização do impacto urbano. Dentro das propostas que constam a AEIA o Plano Diretor aprova a criação de Parques Lineares no entorno da drenagem urbana. Porém, quando se toma contato com a Lei Orgânica vigente, nota-se que [...] as propostas apresentadas deixam em segundo plano o estabelecimento de uma melhor definição de o “como fazer” para sua efetiva implantação, em função dos diferentes conflitos oriundos do processo de urbanização da cidade, além do uso e ocupação do solo que deverão ser enfrentados e solucionados uma vez que se têm habitações nas áreas de várzea (Moraes, 2013 – grifo da autora). Entrando na contramão da implantação dos Parques Lineares, e consequentemente nas propostas de políticas ambientais e na sustentabilidade ambiental, eis que surge uma ameaça por um novo dado divulgado pela Secretária de Planejamento e Meio Ambiente Municipal. Com o surgimento do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC3, de nível Federal, e que se estende a política municipal, o Governo de Ourinhos manifesta interesse em utilizar parte desta verba para a canalização dos córregos urbanos. “Fato que demonstrava certa inocência com a proposta do Planejamento Ambiental anteriormente aprovado pelo Novo Plano Diretor que sinalizava pela implantação dos Parques Lineares” (Moraes, 2013). Em suas conclusões Moraes, 2013 relata que o Plano Diretor: [...] trazia os Parques Lineares como solução do problema dos recursos hídricos urbanos, criando uma faixa de preservação permanente ao redor dos rios e córregos melhorando a qualidade da água, do ar, o aspecto paisagístico, entre outros. Ao passo que o PAC concomitantemente a isso propunha a canalização dos cursos d’água urbanos como medida de saneamento para a solução de seus problemas, criando galerias fluviais para evitar enchentes. (MORAES, 2013, p. 31). 3 Foi criado durante o segundo mandato do presidente Luiz Ignácio Lula da Silva (2007-2010), com o objetivo de implementar obras de infraestrutura social, urbana, logística e energética no Brasil em geral. O PAC também foi importante durante a crise econômica que atingiu o país entre 2008 e 2009, pois gerou renda e demanda de serviços para as empresas privadas brasileiras. A verba repassada para ações desse programa governamental na escala local do município de Ourinhos/SP foi de R$ 55.000.000,00 investida apenas na primeira fase do programa, sendo uma quantia relevante para um município de 103.026 habitantes (IBGE, 2010). As obras de infraestruturas atreladas ao PAC foram benéficas para a população de Ourinhos, pois a construção de galerias pluviais, melhoria da iluminação, pavimentação asfáltica, contribuiu para a melhora da qualidade de vida da população, nos loteamentos atendidos pelas referidas obras de infraestrutura. 51 Portanto: Sabe-se que já é clássica a discussão acadêmica de que esse modelo de canalização não resolve os problemas ambientais, muito menos o de saneamento. E em períodos de maior pluviosidade a vazão dos rios tende a aumentar e a impermeabilização de sua calha pode condicionar maiores probabilidades de enchentes que, por sua vez, trazem doenças. Por que isso ocorre? Porque um solo impermeabilizado diminui sua capacidade de infiltração e, aliado a isso há o problema do lixo que entope as galerias pluviais. Por outro lado, a impermeabilização torna maior a velocidade do escoamento superficial, encurta o tempo de concentração e, estes fatores influenciam na quantidade de água que chegará aos corpos dos recursos hídricos num intervalo mais curto de tempo elevando o potencial da vazão e de transporte de sedimentos. Isso ocorre porque a água não consegue penetrar no solo e, através da ação da gravidade, tende a escoar naturalmente para os fundos de vale, onde encontram-se as calhas dos rios. (Ibidem, p.31). Ou em outras palavras, a implantação de Parques Lineares no entorno dos recursos hídricos, apresentava como objetivo mitigar os impactos ambientais, além de recuperá-los. Contudo, frente ao surgimento do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, o Poder Público Municipal iniciou um projeto no sentido de canalizar os mesmos recursos hídricos urbanos que haviam sido citados como prioridades no Plano Diretor (Moraes, 2013). Segundo a Prefeitura Municipal de Ourinhos, em 19 de outubro 2007 o PAC foi lançado no município, sendo utilizados na primeira fase do programa R$55.000.000.00. As primeiras obras realizadas com os recursos do PAC foram à canalização dos córregos Furnas, Furninhas, Christoni, Monjolinho, Jacu e Jacuzinho. Posteriormente ocorreu a execução de 330.000 metros de asfalto, construção de 45.000 metros de guias e sarjetas e implantação de 35.000 metros de galerias de águas pluviais. As atividades tiveram início em 2008 e término na maioria dos casos em 2010. (FERREIRA DIAS, 2014, p. 168). Os recursos do PAC utilizados para a canalização dos córregos entraram em conflito com as disposições ambientais do Plano Diretor do município. Pelos artigos e Diretrizes que regem o Plano Diretor Municipal de Ourinhos/SP, são prioridades: 52 Artigos Diretrizes/Legislações Art. 17 I. Implantar parques lineares, parques de fundo de vale, vias verdes e EPL – Equipamentos Públicos de lazer; Art. 23 São objetivos relativos aos Recursos Hídricos: I. executar o monitoramento dos corpos d'água superficiais do Município e fiscalizar o lançamento de resíduos sólidos; II. implantar as normas técnicas para a aprovação de obras de movimentação de terra que provoquem erosão e ou assoreamento dos corpos d’água; III. estabelecer normas de controle do uso e ocupação do solo, nas áreas de proteção permanente dos mananciais; IV. implantar áreas verdes em cabeceiras de drenagem, às margens de corpos d’água e estabelecer programas de recuperação, em especial: a. Córrego Jacuzinho; b. Córrego Jacu; c. Córrego Monjolinho; d. Córrego das Águas das Furnas; Art. 32 São diretrizes para o sistema de drenagem urbana: I. controlar o processo de impermeabilização do solo; II. proteger os cortes e aterros contra a erosão; III. escoamento rápido das águas de chuvas evitando-se inundações e empoçamento de água nas vias; IV. disciplinar a ocupação nas cabeceiras e várzeas das bacias do Município, preservando a vegetação existente e visando a sua recuperação; V. implementar a fiscalização do uso do solo nas faixas sanitárias, várzeas e fundos Fonte: Plano Diretor Municipal de Ourinhos (2006). “Na busca de novos espaços de ocupação e, principalmente na solução dos problemas de enchentes, o homem alterou profundamente os rios, tornando-os “urbanos”” (GUERRA, A.J.T., 2011), onde segundo o autor: [...] novos elementos são adicionados pelo homem nas áreas urbanas, como “edificações, pavimentação, canalização e retificação e favorecem o escoamento das águas, que atingem seu exultório mais rapidamente e de forma mais concentrada, gerando o aumento da magnitude e da frequência das enchentes. Desde então, as bacias hidrográficas são marcadas pela diminuição do tempo de concentração de suas águas e pelo aumento dos picos de cheias, quando comparadas às condições naturais, podendo chegar a seis vezes mais do que o pico dessa mesma bacia. (GUERRA, 2011, p. 2). 53 Esta condição passa a ser, também, uma realidade em Ourinhos, a partir do momento em que o Governo Municipal inicia o processo de canalização dos córregos urbanos potencializando-os ao escoamento rápido e concentrado quando na ocorrência de chuvas fortes e intensas. Na Tabela 9, estão expostos os recursos investidos em infraestrutura pelo do PAC. Tabela 9 - Total de construção em obras com infraestrutura e valor total utilizado com os recursos do PAC. PROJETO “SANEAMENTO PARA TODOS” DO GOVERNO FEDERAL (PAC), DESTINADO AO MANEJO DE ÁGUAS PLUVIAIS Galerias Pluviais 35 km Pavimentação 42 km Guias e Sarjetas 45 km Canalização 5.537,96 km Urbanização em torno dos córregos 75.000 m² TOTAL INVESTIDO R$ 55 Fonte: Prefeitura Municipal - Organizado pela autora (2014) Por outro lado, nota-se um descompasso entre as políticas públicas aprovadas e as efetivadas pela Lei Orgânica Municipal (Plano Diretor), em detrimento das vantagens oferecidas pelo Programa de Aceleração ao Crescimento (Governo Federal). A implementação dos parques lineares urbanos como áreas verdes, viabilizaria a criação de uma faixa de preservação permanente ao redor dos rios e córregos, melhorando a qualidade da água, do ar, bem como do aspecto paisagístico, possibilitando a disposição e densidade dos cursos d’água. Para o poder público municipal o “Plano de Drenagem Urbana visa garantia de saúde pública. A má condição dos corpos d’águas era o responsável por problemas de saúde e por oferecer perigo para a população residente em suas proximidades” (JORNAL DA DIVISA, 2008). Sendo assim a canalização seria solução desses problemas, facilitando a fiscalização de ligações clandestinas de esgoto e aumentando a preservação da vegetação nativa. (Moraes, 2013, p.66). A notícia deixa claro seu posicionamento quanto à canalização no trecho em destaque: 54 [...] as margens poderão ser garantidas, com a área de preservação permanente – 30 m de cada lado – transformadas em belos parques, com a vegetação nativa a área permeável para penetração natural da água, que também chegará drenada ao córrego [...] O caminho das águas, uma vez dentro do perímetro urbano, deve ser facilitado e direcionado, senão causa erosão ou enchentes, destruindo casa e patrimônio. (JORNAL DA DIVISA, dos dias 1º e 2 de março de 2008). Em análise com a afirmação vemos que as intervenções nos córregos urbanos causam problemas que poderão ser solucionados pelo direcionamento dos cursos d’água, o que promoveria seu fluxo, aumentando a velocidade da vazão, além da criação de parques ao redor. Porém a implantação da arborização da faixa de 30m nas margens seria um obstáculo, pelo fato de haver edificações nas áreas de várzea. (Moraes, 2013). A ocupação irregular nas áreas de várzea podem causar transtornos à própria população, pois se trata de um lugar que expõe as enchentes. Muitas vezes as ocupações irregulares, se dão pelo fato de não haver outra opção de moradia, e não no intuito de prejudicar o ambiente. Processos descontrolados da urbanização que atuam diretamente sobre as inundações pela falta de infraestrutura, planejamento ambiental e da capacidade que o poder público possui para cobrar a legislação. Situação que ocasiona uma insustentabilidade ambiental se considerarmos que o município de Ourinhos/SP apresenta altos índices pluviométricos, chegando até 450 mm mensais, conforme as informações hidrológicas adquiridas através dos dados das estações metrológicas da rede do Departamento de Água e Energia Elétrica do Estado de São Paulo (DAEE). Conforme o boletim de ocorrência da Defesa Civil local é possível localizar os bairros na planta cadastral do município e perceber que quase todos os locais se situam nas proximidades de algum curso d’água. Ou seja, o extravasamento da água na calha do rio é um processo natural que só acontece nos períodos de chuvas, e o fato de Ourinhos apresentar elevados índices pluviométricos e uma grande quantidade de córregos urbanos, tais episódios tendem a ocorrer. (Moraes, 2013). Como sabemos no papel a legislação federal, estadual e municipal trazem medidas de bom planejamento, o principal problema é que essa legislação não é cumprida, enquanto isso os cursos d’ água sofrem com a degradação ambiental. 55 Mas há de questionar os motivos que levam realizar a pavimentação dos córregos urbanos, por ser um processo bastante ultrapassado, “apresenta grave impacto nos países em desenvolvimento, onde a urbanização e as obras de drenagem são realizadas de forma totalmente insustentável, abandonadas pelos países desenvolvidos há mais de trinta anos”. (TUCCI, 2003, p. 36). Concordando textualmente com Moraes (2013) e Tucci (2003) o problema não é originário dos córregos em si, mas sim da urbanização sem planejamento, da ocupação irregular das áreas de várzea que tornam as condições ambientais dos recursos hídricos completamente insustentáveis e perigosos, e devido à dinâmica do ciclo hidrológico e de sua alteração em função da urbanização que torna o solo impermeável, reduzindo a infiltração da água no solo, aumentando o escoamento superficial e, consequentemente diminuindo o tempo que a água leva para chegar aos fundos de vale. Ou seja, a canalização juntamente com o grau de urbanização contribuiria apenas para impermeabilizar mais uma parte do solo urbano, resultando impactos na qualidade da água carecido do aumento da vazão com os resí